Falklands ou Malvinas, o Arquipélago da Discórdia: Um passado Contestado e um Futuro Incerto

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Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Rafhael de Paulo Pereira

FALKLANDS OU MALVINAS, O ARQUIPÉLAGO DA DISCÓRDIA: UM PASSADO CONTESTADO E UM FUTURO INCERTO

Goiânia 2014

Rafhael de Paulo Pereira

FALKLANDS OU MALVINAS, O ARQUIPÉLAGO DA DISCÓRDIA: UM PASSADO CONTESTADO E UM FUTURO INCERTO

Monografia apresentada como prérequisito para obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.

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Orientador: Dr.º Pedro Pietrafesa

Goiânia 2014

Rafhael de Paulo Pereira

FALKLANDS OU MALVINAS, O ARQUIPÉLAGO DA DISCÓRDIA: UM PASSADO CONTESTADO E UM FUTURO INCERTO

A Banca resolveu atribuir a nota 10 ao aluno Rafhael de Paulo Pereira na disciplina CRI1025 – Monografia II, pela apresentação deste trabalho.

______________________________________________ Professor Orientador Dr. Pedro Araújo Pietrafesa ______________________________________________ Dra. Maria Cristina Nunes F. Neto

______________________________________________ Dr. Paulo Henrique Faria

Goiânia, 21 de novembro de 2014.

A Deus, que nos criou com tanto carinho e amor. Seu Espírito que em mim habita, me sustenta e me dá coragem para questionar realidades e propor sempre um novo mundo de possiblidades.

AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, que me garantiu que todas as coisas são possíveis, porque é Ele quem me fortalece, pela inspiração, pela força e pela proteção. Agradeço aos meus pais, Flávio e Leurides, pelo amor incondicional com que sempre cuidaram de mim, pelas condições materiais e imateriais que deram bases para formar quem sou. Obrigado pai pela sua honestidade, honradez e resiliência, o senhor nunca conversou comigo sobre essas coisas, aprendi com o seu exemplo, que vale mais do que qualquer palavra; agradeço inclusive as chinelas na bunda, foram no momento certo. Obrigado mãe por ser tão batalhadora, que se reinventa todos os dias para ajudar nas finanças de casa, obrigado porque com apenas 12 anos me ensinou o valor do trabalho, vender coxinha me deixou grandes lições, tenho certeza que meu espírito empreendedor é herança da senhora. Agradeço a minha irmã Lorenna, que me ensinou como é importante conviver com as diferenças, formamos o típico casal de irmãos, que brigam se amando e se respeitando. Agradeço a toda minha família, sempre unida e festiva, e que sempre estiveram prontos para contribuírem de alguma forma, em especial, vovó Benedita, vovô Didi, tia Rosangela, tia Adriana, tio Iraci, minha irmã Lorenna, e meus pais que ajuntaram o dinheiro para que eu pudesse começar a estudar. À comunidade da Igreja Presbiteriana Graça e Vida e Igreja Presbiteriana Maranatha, pois, foi nesse meio que aprendi o valor da minha fé e a importância dela. Ao amigo, pastor e irmão, DJ, que sempre me incentivou e acreditou no meu potencial. A todos aqueles que de alguma forma estiveram e estão próximos a mim, fazendo esta vida valer a pena.

Si vis pacem, para bellum. Vegetius

RESUMO

As Ilhas Falklands/Malvinas são um arquipélago localizado no Atlântico Sul, a cerca de 500 km das terras continentais argentinas e a 12.800 km do Reino Unido. Desde o ano de 1833, após uma incursão de tropas britânicas, é o Reino Unido quem exerce soberania sobre o território, mantendo nele um governo local sob chancela da coroa britânica. Por 74 dias no ano de 1982 foi a Argentina quem exerceu soberania, até que capitula-se frente ao poderio militar britânico, tal episódio ficou conhecido como Guerra das Malvinas ou Falklands War. A Argentina nunca deixou de reivindicar a soberania do território. Os dois países nutrem bons argumentos para legitimar suas aspirações. Este trabalho se propõe apresentar a história do arquipélago e do conflito, os pontos de discordância dentre os relatos históricos, bem como apresentar os argumentos que cada Estado usa para fundamentar suas reivindicações. O objetivo portanto é, dar subsídios ao leitor para que se possa pensar sobre a seguinte pergunta: qual Estado, Argentina ou Reino Unido deve exercer soberania sobre as Ilhas Falklands/Malvinas? Palavras-chave: Argentina, Reino Unido, Ilhas Falklands/Malvinas, Soberania, Direito Internacional.

ABSTRACT

The Falklands / Malvinas Islands are an archipelago located in the South Atlantic, about 500 km from the Argentine continental land and 12.800 km from the UK. Since the year 1833, after an incursion of British troops, it is the United Kingdom who has sovereignty over the territory, keeping it a local government under the seal of the British crown. For 74 days in 1982 it was Argentina who exercised sovereignty until he capitulates up against the British military power, such an episode known as the Falklands War and the Falklands War. Argentina has never ceased to claim sovereignty over the territory. The two countries nurture good arguments to legitimize their aspirations. This paper aims to present the history of the archipelago and conflict, the points of disagreement among historical accounts, as well as presenting the arguments that each state uses to substantiate their claims. The aim, therefore exists to provide subsidies to the reader so that they can think about the following question: which state, Argentina or the United Kingdom should exercise sovereignty over the Falklands / Malvinas? Keywords: Argentina, United Kingdom, Falklands/Malvinas Islands, Sovereignty, International Law.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10 CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 18 1. O ARQUIPÉLAGO DA DISCÓRDIA .................................................................. 18 CONCEITUAÇÃO TEÓRICA - ESTADO, PODER E SOBERANIA ......................... 19 REALISMO ............................................................................................................ 23 SISTEMA INTERNACIONAL ................................................................................. 24 GUERRA ................................................................................................................ 26 HISTÓRIA DAS ILHAS FALKLANDS/MALVINAS .................................................. 28 SÉCULO XVI – UM SÉCULO DE HIPÓTESES ................................................................. 30 SÉCULO XVII – UM SÉCULO DOCUMENTADO .............................................................. 32 SÉCULO XVIII – A EFETIVA COLONIZAÇÃO DAS ILHAS FALKLANDS/MALVINAS ................ 35 SÉCULO XIX – A OCUPAÇÃO BRITÂNICA .................................................................... 43 CAPÍTULO 2 ............................................................................................................. 51 2. A GUERRA DAS MALVINAS (FALKLANDS WAR) - 1982............................... 51 A ARGENTINA ANTES DA GUERRA .................................................................... 52 O REINO UNIDO ANTES DA GUERRA ................................................................. 56 A GUERRA DE 1982.................................................................................................. 59 O ENVOLVIMENTO DE EUA E SUL-AMERICANOS ......................................................... 66 A INTENSIFICAÇÃO DOS COMBATES ............................................................................ 68 A CAPITULAÇÃO DA ARGENTINA ................................................................................. 75 CAPÍTULO 3 ............................................................................................................. 79 3. UM PASSADO CONTESTADO E UM FUTURO INCERTO............................... 79 O FRACASSO DO TIAR ............................................................................................. 81 ARGUMENTOS HISTÓRICOS, JURÍDICOS E CONTESTAÇÃO ............................................ 83 TEORIA DA PROXIMIDADE GEOGRÁFICA ...................................................................... 89 O PRINCÍPIO DE AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS...................................................... 90 CONCLUSÃO ........................................................................................................... 98 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 102 ANEXOS ................................................................................................................. 106

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INTRODUÇÃO Em março de 2014, motivada por uma série de circunstâncias, a Rússia anexou em seu território a região da Criméia, que até então pertencia a Ucrânia, fato que movimentou os bastidores da diplomacia mundial. Situações como essa não são exclusividade dos tempos atuais, problemas dessa natureza, datados de séculos passados, repercutem até hoje. Um território ultramarino é elemento chave na preponderância de um Estado no sistema internacional. Existem no mundo algumas regiões que geograficamente e geopoliticamente são de extrema importância estratégica no jogo de poder mundial. Locais que foram disputados “palmo a palmo”, e conquistados muitas vezes a um custo humano muito alto. Gibraltar, Ceuta e Melilla são exemplos de territórios ultramarinos estratégicos, estão localizados entre o continente europeu e africano, local com grande movimentação de navios e propício ao trânsito entre continentes, incluindo a passagem para o canal de Suez que liga o Oceano Atlântico, Mar Mediterrâneo e o Oceano Índico. Na América do Sul o caso mais emblemático de território ultramarino é o caso das Ilhas Malvinas, assim chamada pelos argentinos, ou Falklands Islands como denominam os britânicos. Para esta monografia será usada a nomenclatura ilhas Falklands/Malvinas, pois, é o termo utilizado nos documentos oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU)1 pelo fato do território ainda estar em disputa (NETO, 2006). As Ilhas Falklands/Malvinas são um arquipélago composto por duas grandes ilhas e 778 ilhas menores, sua extensão territorial é de 12.173 km² e estão localizadas ao sudeste das terras continentais sul-americanas. Elas têm hoje cerca de 2.600 habitantes e sua economia gira em torno da pesca e ovinocultura.2 Atualmente as ilhas Falklands/Malvinas são de soberania britânica, entretanto, a Argentina reivindica a posse do território desde 1833, quando uma expedição da Coroa Britânica, sob o comando do capitão John James Onslow, assumiu o controle das ilhas, mantendo-as sob custódia até 2 de abril de 1982, quando uma incursão de

A Organização das Nações Unidas, também conhecida pela sigla ONU, é uma organização internacional formada por países que se reuniram voluntariamente para trabalhar pela paz e o desenvolvimento mundial. 2 Site Governamental das Ilhas Falklands: www.falklands.gov.fk 1

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tropas argentinas dominou o território, desencadeando uma guerra,3 esta que ficou conhecida como Guerra das Malvinas ou Falklands War. Veja na figura 1 abaixo o mapa com a localização das Ilhas Falklands/Malvinas, e na figura 2, o mapa ampliado do arquipélago com informações geográficas sobre as ilhas: FIGURA 1: Mapa com a localização das Ilhas Falklands/Malvinas no Globo Terrestre

Fonte: g1.globo.com, 02/04/2012, on-line 4

Pelo mapa é possível observar a proximidade das ilhas ao continente sulamericano, principalmente da Argentina. É importante destacar também que, a proximidade das ilhas a Antártida, faz com que elas sejam um ponto importante de trânsito e parada de navios, oriundos do oceano Atlântico com destino ao continente Ibidem. Reportagem especial de 30 anos do conflito: http://g1.globo.com/mundo/noticia/2012/04/entendaguerra-das-malvinas.html 3 4

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gelado, onde diversos países reivindicam possessões territoriais, e ali mantêm estações de pesquisas científicas. O mapa abaixo apresenta as principais cidades e vilarejos das Ilhas Falklands/Malvinas, fornece ainda informações sobre principais. O mapa também apresenta em suas extremidades as coordenadas geográficas e pela diferenciação de cores uma ideia das profundidades oceânicas ao redor do arquipélago. FIGURA 2: Mapa Ampliado das Ilhas Falklands/Malvinas com Principais Cidades, Estradas e Coordenadas Geográficas

Fonte: www.ds-lands.com, s/d on-line

Os arranjos desta guerra envolveram diversos países. A Argentina contou com apoio da grande maioria dos países da América do Sul e também da Rússia, que pretendia enquadrar o conflito na lógica da Guerra Fria, já os Britânicos receberam o apoio dos países da União Europeia e dos EUA (URT, 2009), tais arranjos foram importantes para o desenrolar da guerra e tiveram grande importância para os resultados dela.

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Em 14 de junho de 1982 a Argentina capitulou após a perda do domínio sobre Port Stanley/Puerto Argentino, logo em seguida o governador nomeado por Buenos Aires, Mario Menendez, assinou a rendição decretando a derrota argentina (URT, 2009). Segundo fontes bibliográficas variadas, muitos foram os motivos que levaram a eclosão desta guerra, dentre estes, motivos de natureza econômica, geográfica, histórica e política (NETO,2005). Economicamente, as ilhas se tornaram mais interessantes a partir do momento em que potenciais reservas de hidrocarbonetos foram descobertas, nas quais especulava-se, na época, que poderiam ser maiores do que as reservas de petróleo venezuelanas (MARGHERITIS, 1991). Geograficamente o arquipélago é estratégico, pois, está localizado próximo à Antártida, aonde vários Estados têm reivindicações territoriais. As motivações históricas estão pautadas nos conflituosos processos de imperialismo europeu, pois a Argentina alega que, com a sua independência da Espanha, teria direito as Ilhas Falklands/Malvinas, que até 1811 eram habitadas por colonos espanhóis, que se retiraram em razão dos desdobramentos das guerras napoleônicas, sob ordens do governador espanhol em Montevidéu (URT, 2009). As razões políticas estão fundamentadas principalmente na crise em que passava a Argentina, que sob o regime de um governo militar, profundos problemas de ordem econômica e social assolavam o país. Foi então que, no intuito de se fortalecer e legitimar-se através do envolvimento nacional na causa, antecipou os planos da invasão as Falklands/Malvinas (NETO, 2005). Entender os reais motivos que levaram a Argentina a enfrentar belicamente uma potência europeia é necessário para se ter uma real dimensão da importância das Ilhas Falklands/Malvinas no contexto geopolítico sul-americano. A guerra das Falklands/Malvinas ainda se encontra presente na memória dos argentinos, a questão mexe com o sentimento nacional. Enquanto se anda pelas estradas argentinas é possível ver sempre placas com os dizeres: “Las Malvinas son Argentinas”5 conforme você pode ver na figura 3.

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Tradução livre: “As Malvinas são argentinas”.

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FIGURA 3: Placa com a inscrição “Las Malvinas Son Argentinas”, comumente encontrada nas rodovias argentinas

Fonte: www.panoramio.com, s/d, on-line

Um sentimento proporcional ao argentino é nutrido pelos ingleses, mas principalmente pelos kelpers,6 que, parafraseando os argentinos chegaram a desenvolver uma linha de souvenires7 que vêm sempre com os dizeres: “Keep calm and keep the Falklands British”.8 Semanalmente é possível ver em sites e canais televisivos de notícias governantes argentinos fazendo menção a reivindicação do arquipélago, assim sendo, este é um assunto constante na pauta do secretário geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, principalmente porque tal disputa já se desenrola por quase 200 anos, pois, os argentinos protestam as ilhas desde 1833, quando da tomada pelo Reino Unido. Assim sendo, entendemos ser de vital importância para o estudo das relações internacionais, principalmente para os sul-americanos por questões geopolíticas, ter Kelper é como se auto denominam os moradores das ilhas, apelido inspirado pelos vastos bancos de algas marinhas (Kelp, em inglês) que cercam o arquipélago. (Governo das Ilhas Falklands) 7 Empresa de souvenires: The Harbour View Gift Shop - www.falklandislandsgifts.horizon.co.fk 8 Tradução livre: Mantenha a calma e as Falklands britânicas. 6

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esclarecidas as razões que levaram a eclosão do conflito, os motivos pelos qual ele se perpetua, e a pergunta central dessa monografia: qual Estado, Argentina ou Reino Unido deve exercer soberania sobre as Ilhas Falklands/Malvinas? Tais respostas estão embasadas principalmente através de pesquisa bibliográfica, foram usadas as informações previamente colhidas por diversos pesquisadores, também a pesquisa documental foi utilizada, ou seja, fontes primárias foram consultadas para prospecção, como no caso das várias resoluções que ONU adotou antes, durante e após a guerra. Esta monografia está dividida em três capítulos, sendo os dois primeiros essencialmente históricos, e o terceiro constitui-se em uma análise por lentes do direito internacional, em que é feita a confrontação dos argumentos que dão sustentação as reivindicações de cada Estado. No capítulo 1 trataremos inicialmente de elucidar ao leitor alguns conceitos que as Relações Internacionais usam para se analisar a situação em que o caso da Ilhas Falklands/Malvinas se enquadra, que é o conflito. Dentre os muitos conceitos utilizaremos cinco, os quais acreditamos dar um bom embasamento para se fazer a leitura do conflito, são eles: Estado, Soberania, Poder, Sistema Internacional e Guerra. Alguns autores fazendo o uso destes conceitos para explicar as Relações Internacionais, acabaram por serem enquadrados dentro da perspectiva da teoria realista, teoria esta que será explicada também nesse primeiro capítulo, pois ela será a lente pela qual faremos a análise dos acontecimentos da disputa. Logo após a elucidação dos conceitos e da teoria passaremos a relatar sobre a histórica do arquipélago, falaremos sobre sua descoberta, colonização e também sobre os principais acontecimentos que envolvem as ilhas, a Argentina e o Reino Unido. Prezaremos por contar a história em ordem cronológica, evitando sempre que possível usar mais de uma data dentro dos parágrafos, com o intuito de não confundir o leitor. Este primeiro capítulo é importante do ponto de vista que, elucidará os principais fatos que concernem ao arquipélago, trataremos sobre fatos contestados pela historiografia e fatos mundialmente reconhecidos. Após a sua leitura o leitor terá boa projeção histórica dos eventos que remetem a história das ilhas, bem como terá em mente informações suficientes que nos trazem uma dimensão macro do conflito que se instala e que será narrado a partir do segundo capítulo. Apesar de sintetizar cada fato ao máximo, o primeiro capítulo ficou um pouco mais extenso do que os capítulos dois e três, pois, presou-se pela fidelidade da

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informação e a não omissão de fatos, pois, para qualquer análise do direito internacional recorrer aos fatos históricos é essencial, veremos no capítulo 3 que muitos dos argumentos argentinos e britânicos têm embasamento nos fatos narrados no primeiro capítulo. No capítulo 2 serão relatadas a história de Argentina e Reino Unido anos antes de eclodir o conflito em 1982, veremos que ambos os países não se encontravam em uma situação econômica confortável, o Reino Unido enfrentava desconfiança quanto a capacidade de sua primeira-ministra em promover as mudanças necessárias que os tirassem daquela crise, enquanto a Argentina estava mais uma vez sob julgo de um regime ditatorial, e sua economia quase a falir. Olharemos com atenção os principais eventos que se desenrolaram durante os 74 dias de guerra no Atlântico Sul, e constaremos que a participação de outros países nessa guerra, como Brasil, Peru, EUA e Chile influenciou inclusive em seu resultado. Ainda dentro da narrativa do conflito, apontaremos as principais resoluções e posicionamento da ONU perante a situação, e veremos que sua atuação, principalmente suas resoluções dão sustentação aos argumentos dos beligerantes ainda hoje. Toda essa movimentação da ONU em relação ao conflito relatada no capítulo 2 será importante para embasar a discussão do capitulo 3, que versará sobre os principais argumentos de cada Estado e sua fundamentação para sustentar suas reinvindicações. O capítulo 2 é muito importante do ponto de vista que, possibilitará ao leitor entender melhor como estavam os dois países litigantes, e qual foi o estopim que fez que tomassem a opção de uma luta armada. Após sua leitura o leitor terá boa compreensão dos elementos preponderantes e determinantes para o resultado de uma guerra, bem como constatará as mudanças que uma derrota ou uma vitória provoca nos países em disputa. O capítulo 3 leva o mesmo nome que esta monografia, “Falklands ou Malvinas, O Arquipélago da Discórdia: Um Passado Contestado e um Futuro Incerto”, o motivo é que, essa dicotomia que se estabelece entre o passado contestado do arquipélago e as incertezas sobre seu futuro são a tônica deste capítulo. A princípio trataremos sobre o fracasso de um tratado de assistência recíproca firmado entre países do continente americano, como princípio central preconizava que um ataque contra um dos membros seria considerado como um ataque contra todos, a não efetivação deste tratado deve implicações no resultado da guerra. Em seguida

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abordaremos uma série de argumentos e contra argumentos que os beligerantes utilizam para justificar suas reivindicações, bem como trataremos de pontuar quais são as questões atuais em que os dois países se pautam na mesa de discussões atualmente. O Capítulo 3 é importante do ponto de vista que, o leitor terá a possiblidade de ver quais são as bases que sustentam a reivindicação de Argentina e Reino Unido sobre o arquipélago. É provável que após a leitura deste capítulo o leitor comece a simpatizar com a causa argentina ou britânica, pois, constaremos que os dois países têm bons argumentos para fundamentarem-se.

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CAPÍTULO 1 1. O ARQUIPÉLAGO DA DISCÓRDIA Seguramente os acontecimentos da guerra das Ilhas Falklands/Malvinas envolvem uma série de Estados nos mais complexos aspectos do jogo geopolítico e de poder mundial. Como em toda guerra, existe sempre um vencedor e um perdedor, ou pelo menos aquele que foi mais beneficiado em detrimento ao outro ou de outros. Desta forma, acredita-se que a América do Sul, enquanto agrupamento regional com certa projeção de poder no sistema internacional, perdeu autonomia e até certa soberania em seu próprio continente com a posse das Ilhas Falklands/Malvinas pelo Reino Unido, que mantêm forte municiamento militar a cerca de 500km das terras continentais. Antes propriamente de falarmos sobre os fatos históricos que antecederam e levaram a guerra das Ilhas Falklands/Malvinas, introduzirei alguns conceitos e definições, que serão divididos em tópicos para facilitar a compreensão, estes conceitos são importantes para conectar a teoria ao fato, e servirão de base para a compreensão de todo o trabalho. Primeiramente o conceito de Estado será apresentado na forma o qual abordaremos nessa monografia; dentro ainda de Estado serão trabalhados conceitos intrínsecos a ele, como: Soberania e Poder. Será explanado sobre a teoria Realista, principal ferramenta teórica usada à época para entender as ações dos Estados soberanos, tal corrente influenciou durante décadas a diplomacia internacional, e ainda hoje tem seu espaço na política interna quanto externa dos países. O realismo consolidou-se portanto como uma das primeiras linhas de pensamento e ação dos policy makers.9 Uma definição importante a ser explicada será o conceito de Sistema Internacional, para que seja possível compreender a multiplicidade de interações que acontecem no plano internacional, dentre as quais os arranjos que culminaram na guerra das Ilhas Ilhas Falklands/Malvinas.

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Policy Maker é um termo frequentemente utilizado nas relações internacionais para designar os formuladores de política, seja econômica, diplomática ou outra qualquer.

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Por fim será trabalhado o conceito de Guerra, desde suas primeiras definições até o qual usaremos para esta monografia. Após a conceituação teórica será feita uma contextualização histórica e cronológica do arquipélago, da Argentina e da Inglaterra, no intuito de pontuar os principais acontecimentos, fatos e motivações que levaram a eclosão do conflito. Nesse primeiro capítulo os fatos serão trabalhados até 1982, ano em que efetivamente se iniciou a guerra. A parte que versa sobre a história do arquipélago será subdivida em séculos, e dentro da perspectiva de cada século será trabalhado os acontecimentos por ano e em ordem cronológica. Essa divisão favorece o entendimento e diminui as confusões que são causadas quando se trabalham com tantas dadas. Algumas fontes usadas para este trabalho desconsideraram muitos possíveis acontecimentos em suas análises, pegando somente os mais aceitos e documentados.10

CONCEITUAÇÃO TEÓRICA - ESTADO, PODER E SOBERANIA Para entendermos o Estado, sua definição, utilidade e configuração nos moldes atuais, é necessário observarmos a evolução pelas quais passaram as ideias que davam e dão sustentação a este arranjo político. Thomas Hobbes trabalha a ideia de que as relações humanas primitivas naturais eram uma guerra de todos contra todos, em que não era possível observar um poder visível acima das interações humanas, em que cada uma agia conforme sua necessidade, para manutenção de sua integridade, posse, e prevalência de sua vontade, por esse motivo afirma que seria necessário um poder suficientemente grande para prover segurança a todos e os manter em respeito (HOBBES, 1651). A problemática apresentada por Hobbes traz à tona a necessidade de uma instância superior aos indivíduos, capaz de garantir-lhes alguns direitos e exigir-lhes alguns deveres, um ponto de partida para a concepção dos Estados. Em 1762, Jean-Jacques Rousseau, um filósofo e teórico político suíço, de modo análogo escreveu que, a mais antiga das sociedades políticas são as famílias, associando a imagem de um pai como representação do governo, e os filhos como

Exemplo de obras que não tratam de todos os possíveis acontecimentos: (VALÉRIO; HENTZ, 2013) e (NETO, 2006). 10

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povo, mas dando ênfase principalmente ao fato de que tendo os filhos (povo) a idade da razão, e não mais dependência do pai (governo), mantêm os laços e subordinação ao pai (governo) somente através da manifestação de sua livre vontade, alienando sua liberdade natural somente a troco de uma utilidade. Essa dinâmica ficou conhecida como Contrato Social, que consiste em o indivíduo abdicar de sua liberdade natural para participar de uma liberdade civil garantida pelo pai (governo) (ROUSSEAU, 1762). Na analogia de Rousseau é evidenciado que, a legitimidade de um Estado é somente idônea se satisfaz as necessidades para qual o povo o contratou, ou seja, essa instância política deve existir para garantir um mínimo de organização social. No século XVII com a assinatura do Tratado de Vestfália em 1648, nascem os Estados, sob o reconhecimento mútuo do exercício de um poder político estatal dentro de um território nacional, ou seja, fundamentados principalmente sobre o exercício de autonomia e soberania dentro de um determinado território, pela sua população e em nome de um governo, portanto, o Estado se constitui quando constatamos três características materiais para sua existência: território, população e governo. Pecequilo (2010) resume esses fatores da seguinte forma: [...] território, refere-se ao espaço geográfico de cada Estado, delimitado por fronteiras reconhecidas por outros Estados, [...] população, por sua vez, será o quadro de habitantes de um determinado Estado, aglutinada em torno de uma identidade comum, promovendo-se sua unidade política, cultural, nacional e linguística. [...] governo, resultado de uma centralização progressiva de todas as autoridades antes dispersa no território estatal, organizando um comando político e desenvolvendo uma administração pública (PECEQUILO, 2010, p. 43 – 45).

A definição de Estado para essa monografia aglutinará sempre esses três fatores explicados por Pecequilo (2010), território, governo e população, pois são estes os fatores comumente aceitos pela maioria dos Estados nacionais constituídos e reconhecidos pela comunidade internacional. A partir da constituição do Estado, existirá por ele uma busca incessante pelo poder, pois, conforme indica a teoria realista a majoração do poder é a única maneira pela qual ele poderá continuar a existir. A teoria realista será explanada no próximo tópico.

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Mas o que é esse poder o qual os Estados buscam? Para Joseph Nye (2012), o poder é surpreendentemente impreciso e difícil de medir, e ele é exatamente o elemento pelo qual os Estados garantem sua sobrevivência no sistema internacional. Como muitas ideias básicas, o poder é um conceito contestado. Nenhuma definição é aceita por todos os que usam a palavra, e a escolha de uma definição reflete os interesses e valores das pessoas. Algumas definem o poder como a capacidade para fazer ou resistir à mudança. Outras dizem que ele é a capacidade para conseguir o que queremos. Essa definição ampla inclui o poder sobre a natureza e também sobre outras pessoas. [...] poder é a capacidade para fazer coisas em situações sociais para afetar outros a conseguirem os resultados que queremos (NYE, 2012, p. 26).

Como argumentado por Nye (2012), o poder é um conceito difícil de se precisar, a visão do poder de um Estado A em relação ao poder de um Estado B, será sempre reflexo dos próprios valores e interesses do Estado A. Dessa forma, para esta monografia usaremos a definição de poder como “a capacidade de fazer ou resistir a mudança (NYE, 2012). Nos desdobramentos do conflito poderemos observar claramente ações de ambos os envolvidos diretamente no conflito que comtemplam os pressupostos realistas, trataremos deles adiante e constataremos que os resultados positivos para o Reino Unido na guerra das Falklands/Malvinas advêm exatamente dos seus poderes econômico, político e principalmente militar. Tamanho eram e ainda são os poderes do Reino Unido, que com o domínio da Ilhas Falklands/Malvinas implica diretamente na soberania dos países sul-americanos sobre o próprio continente, em primeira instância perde a Argentina, em seguida todos os sul-americanos que tem então como vizinho uma potência econômica e militar a poucos quilômetros dos seus territórios. Podemos embasar a perda de soberania da América do Sul sobre suas terras na ideia de que as Ilhas Falklands/Malvinas mantêm vínculos políticos e comerciais principalmente com países fora da América do Sul. Mas o que realmente se expressa por soberania: Em sentido lato, o conceito político-jurídico de Soberania indica o poder de mando em última instância numa sociedade política e, consequentemente, a diferença entre esta e as demais associações

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humanas, em cuja organização não se encontra este poder supremo, exclusivo e não derivado. Este conceito está, pois, intimamente ligado ao poder político: de fato, a Soberania pretende ser a racionalização jurídica do poder, no sentido da transformação da força em poder legítimo, do poder de fato em poder de direito (BOBBIO. MATTEUCCI. PASQUINO, 2010, p. 1179).

A manutenção de forças armadas, a exploração econômica da pesca, a prospecção de petróleo, exploração mineral, voos comerciais semanais, tudo isso controlado pelo governo das Ilhas ou pelo Reino Unido, nos mostra claramente que a Argentina não tem soberania no território, ou seja, o poder de mando em última instância. A soberania é elemento crucial para as relações internacionais, pois os Estados mantêm relações entre si geralmente quando reconhecem a soberania dos outros Estados, nações como Israel e Palestina por exemplo são nações que não são reconhecidos por toda a comunidade internacional, enquanto alguns reconhecem Israel como Estado soberano, outros Estados não o reconhecem, com a Palestina da mesma forma, enquanto alguns a reconhecem, outros negam sua existência e soberania (DAUDÉN; SMOLAREK, 2013). Para se ter uma ideia da importância da soberania, observe a constituição federal brasileira que logo no artigo 1º, inciso I, expressa ser uma nação soberana: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1988).

Não é somente o Brasil que preza por expressar sua soberania através de sua constituição, vejamos o que diz a constituição italiana em seu artigo 1º: Art. 1. L'Italia è una Repubblica democratica, fondata sul lavoro. La sovranità appartiene al popolo, che la esercita nelle forme e nei limiti della Costituzione11 (CONTITUIZIONE DELLA REPUBBLICA ITALIANA, 1947).

11 Tradução livre: A Itália é uma República democrática, baseada no trabalho. A soberania pertence ao povo, que a exerce nas formas e nos limites da constituição.

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É evidente que não se pode somente parecer soberano por haver os fatores levados em conta para tal, é preciso declarar-se soberano, como vemos os Estados brasileiro e Italiano autodeclarando-se. Tendo sido elucidado os fatores que compõe um Estado, veremos a seguir que estes fatores também são preponderantes na teoria realista.

REALISMO Teorias das Relações Internacionais, são plataformas teórico-conceituais, que nos possibilitam compreender e explicar fenômenos relativos à ação humana que extrapolam as fronteiras dos Estados nacionais, ou seja, almeja tornar compreensível aos seus interlocutores os fatos e acontecimentos do meio internacional, em alguns casos propõe explicar e desenvolver possíveis previsões sobre o futuro.12 Uma importante ferramenta teórica para tentar explicar a guerra das Ilhas Falklands/Malvinas é o Realismo, principalmente porque era a teoria em voga à época do conflito, tendo sido uma importante ferramenta de análise dos fatos pelos Estados envolvidos. Segundo Pecequilo (2010), “na política não se aplicam critérios valorativos ou morais, mas sim avaliações relativas à capacidade dos governantes para controlar suas unidades políticas, preservando e avançando seu poder de maneira eficiente”, neste ponto o realismo satisfaz bastante a análise do conflito, pois se estabelece como uma teoria que interpreta o mundo pelo que ele é, desconsiderando princípios morais, idealizações e a ética. Edward Carr era um oposicionista aos pensamentos da teoria idealista,13 assim sendo, exemplifica que “os três princípios essenciais, implícitos na doutrina de Maquiavel, são as pedras fundamentais da filosofia realista”: Em primeiro lugar, a história é uma sequência de causa e efeito, cujo curso se pode analisar e entender através do esforço intelectual, porém não (como os utópicos acreditam) dirigida pela "imaginação". 12 13

The IR Theory Web Site – Disponível em: Acesso em: 05/05/14. Para saber mais sobre o Idealismo ver os autores: Hegel e Immanuel Kant.

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Em segundo lugar, a teoria não cria (como presumem os utópicos) a prática, mas sim a prática é quem cria a teoria. Nas palavras de Maquiavel, "bons conselhos, venham de onde vierem, nascem da sabedoria do príncipe, e não a sabedoria do príncipe dos bons conselhos". Em terceiro lugar, a política não é (como pretendem os utópicos) uma função da ética, mas sim a ética o é da política. Os homens "mantém-se honestos pela coação". Maquiavel reconheceu a importância da moral, mas pensava que não poderia existir nenhuma moral efetiva onde não houvesse uma autoridade efetiva. A moral é produto do poder (CARR, 1939).

Em síntese, o que Carr evidencia é que, os fundamentos da teoria realista estão embasados nos fatos, nos acontecimentos, ou seja, as práticas dos Estados servem a teoria, não o contrário. Hans Morgenthau (1948) com a publicação de Politics Among Nations corrobora com Carr quando afirma que “a teoria consiste em verificar os fatos e dar a eles um sentido, mediante o uso da razão.” Para Morgenthau a luta pela manutenção e aumento do poder em todos os níveis é crucial para os Estados, por isso ele trabalha o conceito de poder nos dois planos, nacional e internacional. Pecequilo (2010) reúne as premissas do pensamento realista. Na base do realismo, o Estado é colocado no centro das discussões, a partir da ideia de que, o Estado é o principal ator das relações internacionais, sendo o único capaz de influenciar a dinâmica e as mudanças do sistema internacional, ele atua para satisfazer o interesse nacional, que primordialmente seria o desejo de sobreviver, em segundo a manutenção e majoração do poder, que se expressa no campo econômico, político e militar. O realismo será portanto a lente pela qual o comportamento dos Estados envolvidos serão analisados por esta monografia.

SISTEMA INTERNACIONAL O termo Sistema Internacional (SI), por si só já nos transmite a ideia de que no âmbito internacional existem uma série de interações que compõe um sistema, como explica Pecequilo (2010):

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[..] o Sistema Internacional (SI) é o meio onde se processam as relações entre os diferentes atores que compõem e fazem parte do conjunto das interações sociais que se processam na esfera do internacional, envolvendo seus atores, acontecimentos e fenômenos (PECEQUILO, 2010, p. 37 – 38).

Para este trabalho será importante ter bem definido as implicações deste conceito, perceberemos que as interações no SI foram preponderantes no conflito. Para a maioria dos teóricos de relações internacionais o SI é sempre anárquico, ou seja, não existe um governo sobre todos os Estados que coordene as interações do SI, definindo leis e parâmetros de comportamentos para prover a ordem (PECEQUILO, 2010). Segundo Hedley Bull (2002, p. 57) “para Hobbes, e outros pensadores dessa escola, não deveria ou poderia existir um contrato social dos Estados que pusesse fim à anarquia internacional.” Para essa monografia partiremos do pressuposto que realmente não exista um governo global que gerencie as interações do SI. Destaco que ainda que a ferramenta teórica para esta monografia seja o realismo, é preciso entender que no SI não atuam somente os Estados, mas também outros agentes com poder de influência (PECEQUILO, 2010). Contrariando Hobbes e outros autores realistas, a teoria neorrealista traz uma nova perspectiva para se pensar as relações internacionais, em que novos atores atuando dentro do SI têm papel preponderante nas ações políticas dos estados, tendo forças inclusive de mudar um status quo.14 Portanto, o único conceito do neorrealismo que essa monografia usará será a multiplicidade de atores atuando no SI, conforme explicado nesse parágrafo. Fundamentados principalmente sobre o exercício de autonomia e soberania dentro de um determinado território, os Estados atuam no Sistema Internacional como um dos principais atores. Os principais atores que atuam no SI além dos próprios

Status quo é um termo frequentemente utilizado nas relações internacionais que significa “estado atual das coisas.”

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Estados são: as Organizações Não Governamentais (ONG),15 Organizações Internacionais (OI),16 Forças Transnacionais (FT)17 e etc (PECEQUILO, 2010). Para processar essas relações vários organismos foram criados, a Organização das Nações Unidas (ONU) criada em 1945 no intuito de manter a paz entre os Estados e promover o desenvolvimento mundial, é hoje a representação máxima de um mecanismo de governança do SI. Ela subdivide-se em agências, cada uma voltada para atuação em uma área, por exemplo: o PNUMA, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, trata de questões relacionadas ao meio ambiente, como preservação, uso eficiente de recursos minerais e desenvolvimento sustentável. Para a resolução do conflito entre Reino Unido e Argentina a ONU será uma importante plataforma de diálogo, não somente entre os dois Estados, mas seguramente da comunidade internacional. Adiante abordaremos com mais especificidade como isso poderá acontecer.

GUERRA Ao se pensar as relações internacionais nos deparamos logo a um paradoxo, em que as interações no SI se orientam por dois eixos básicos, a cooperação ou o conflito, ou em outro termo, cooperação ou a guerra (MIALHE, 2008). Pensar a guerra não é exclusividade de tempos recentes ou atuais, mesmo antes do ano 1 d.C. existem registros de pelo menos dois grandes trabalhos, que ainda hoje têm importância nos estudos de guerra, relações internacionais e segurança. O primeiro trabalho é “A Arte da Guerra” de Sun Tzu, que teria vivido entre os séculos 5 e 4 a.C.; o livro é o mais antigo tratado de guerra, nele são pontuadas estratégias militares. Embora as táticas bélicas tenham mudado bastante nos tempos atuais, a Enciclopédia Britânica aponta que o livro serviu de influência para alguns ONG - Entidade ou órgão social sem fins lucrativos, constituído por um grupo autônomo cujo propósito tem por base ações sociais ou solidárias, as quais visam ajudar as populações e/ou minorias marginalizadas. Não possuí vínculos com nenhum tipo de governo. 16 OI - Também conhecidas como Organizações Intergovernamentais, são instituições criadas por países (estados soberanos), regidas por meio de tratados, que buscam através da cooperação a melhoria das condições econômicas, políticas e sociais dos associados. 17 FT - As FTs diferenciam-se das OIs por representarem fluxos privados múltiplos ligados à sociedade civil (comunicações, transportes, finanças e pessoas) que afetam a política dos Estados tanto positiva, quanto negativamente. 15

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estrategistas modernos, como é o caso de Mao Tsé-tung em sua luta contra os japoneses. Hoje a obra é usada em outras áreas que não as militares, como na economia e na administração (CASSAL, 2000, p. 5).18 O segundo trabalho foi feito por uma testemunha ocular do conflito que registrou, Tucídides, que viveu no 4º século a.C.; a “História da guerra do Peloponeso” versa sobre as relações tensas e posteriormente de conflito, que se deu devido ao grande aumento de poder de Atenas, visto como uma ameaça pelos espartanos (TUCIDÍDES, 2001). Nas palavras de Funari: A Guerra do Peloponeso pode ser considerada, a justo título, um conflito de importância histórica ímpar. Ainda que a guerra tenha terminado há 24 séculos, continuou a fascinar as gerações posteriores e serviu como instrumento analítico para entender inúmeros conflitos posteriores e, mais recentemente, a Primeira Guerra Mundial e a Guerra Fria. Serviu de referência não apenas para historiadores, como generais, diplomatas, estadistas e estrategistas. Por sua significação para os destinos da história posterior, a Guerra do Peloponeso foi considerada particular, ao selar o destino das cidades independentes gregas, conhecidas como póleis. Primeira guerra em larga escala travada em um contexto democrático, de discussão pública das decisões, tem servido, de geração em geração, ao debate sobre a relação entre regime político e guerra (FUNARI, 2008, p. 19).

Notadamente, a guerra do Peloponeso tem grande importância para os estudos sobre guerra, como bem justificou Funari. Dentre os vários autores que se enquadram na perspectiva realista, Carl Von Clausewitz define a guerra como: “um ato de violência com que se pretende obrigar o nosso oponente a obedecer à nossa vontade”. A atitude argentina em 1982 explicita bem essa afirmação, que no intuito de recuperar a posse das ilhas, usou de um ato de violência na tentativa de fazer prevalecer sua vontade, o Reino Unido como forma de prevalecer seus interesses responde também com violência. Clausewitz ainda eternizou a célebre frase em que dizia que “a guerra é a continuação da política por outros meios”. Portanto, para essa monografia tomarei como base a junção dessas duas afirmativas, ficando assim: a guerra é um ato político que utiliza-se da violência

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Prefácio de Sueli Barros Cassal para “A Arte da Guerra” de Sun Tzu.

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para fazer prevalecer a vontade do Estado que recorre a este meio (CLAUSEWITZ, 1832). A lista de guerras que já aconteceram até hoje é incrivelmente longa, é importante destacar que o conceito e tipos de guerra vem sendo atualizados com o passar do tempo. É comum hoje em dia ver nos telejornais e produções científicos termos como: “guerras cambiais”, “guerras cibernéticas”, “guerras econômicas” e etc. Portanto, hoje as guerras não acontecem somente em âmbito militar, um Estado tenta levar o outro a derrocada econômica sem “desembainhar a espada” (TZU, 2006, p.77), no intuito de fortalecer sua própria economia, os mecanismos usados geralmente são, barreiras fitossanitárias, poder de influência sobre o câmbio e outros (TONY STEVÃO, Aula de Regulação do Comércio Internacional, 6º período, PUC-GO). Apesar das diferenças entre as guerras, umas por motivações religiosas, outras disputas territoriais, como é o caso que tratamos nessa monografia, algo elas têm sempre em comum, todas elas significam um ponto de mudança no status quo, transformação das sociedades no tempo em que acontecem (MAGNOLI, 2006, p. 7).

HISTÓRIA DAS ILHAS FALKLANDS/MALVINAS As Ilhas Falklands/Malvinas são um arquipélago composto por duas grandes ilhas, West Falkland e East Falkland, e ainda 778 ilhas menores, sua extensão territorial é de 12.173 km² e estão localizadas ao sudeste das terras continentais sulamericanas. Segundo dados do sistema Earth da empresa Google, as ilhas estão a cerca de 500 km da Argentina, 12.200 km do Reino Unido e 1.200 km da Antártida. Elas têm hoje cerca de 2.600 habitantes e sua economia gira em torno da pesca e ovinocultura, principalmente para a produção de lã.19 A constituição das Ilhas Falklands/Malvinas, intitulada “The Falkland Islands Constitution Order 2008”,20 nos mostra um pouco da organização política vigente. Atualmente a soberania das ilhas é exercida pelo Reino Unido, a autoridade executiva é praticada por um governador sob nomeação e chancela da coroa britânica. Para o parlamento existem eleições quadrienais para escolha de representantes que legislam

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Site Governamental das Ilhas Falklands: www.falklands.gov.fk The Falkland Islands Constitution Order 2008 revogou a antiga constituição datada de 1985.

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e administram a coisa pública, porém, alguns aspectos importantes e estratégicos ficam a cargo do governo britânico, como por exemplo, o departamento de defesa que está ligado a segurança nacional, e assuntos relacionados as relações exteriores, que está subordinada a política externa britânica, entretanto, nem sempre foi assim. A ilha tem um passado que precisa ser investigado, pois ela é objeto de disputa de duas nações. Portanto, voltemos ao passado das ilhas para tentarmos entender o que aconteceu até que ela chegasse a situação atual. Até certo ponto é uma missão complicada, pois os registros históricos sobre o arquipélago são controversos e contestados, a historiografia tem grandes dificuldades em precisar informações sobre seu descobrimento e povoamento, a única certeza é que as ilhas Falklands/Malvinas foram avistadas no século XVI (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 190). Ainda hoje não existe um consenso sobre a história das ilhas, fato que se justifica pela existência de documentos que contam histórias contraditórias sobre o descobrimento e colonização das ilhas, muitos podem ter sidos forjados no intuito de apoiar determinados Estados em suas reinvindicações (MEYER, 2004 apud NETO, 2006, p. 8). Para se aproximar de uma versão oficial da história, poderiam ser usados alguns elementos como: construções, documentos, marcos e outros, para reconstituir a história, contudo, durante as batalhes do século XIX tudo foi destruído (QUELLET, 1982 apud NETO, 2006). A história das Ilhas Falklands/Malvinas podem ser dividas em séculos, cada um com suas particularidades e com fatos importantes para a história das ilhas, como são muitas as datas, entendemos que dividir o recorte histórico em blocos facilitaria a didática e o entendimento do conflito, assim sendo, para essa monografia, trataremos cronologicamente os fatos históricos que compõe a história das ilhas, e tudo isso será divido século a século.21 É possível que durante a leitura dos próximos capítulos o leitor tenha que recorrer a está cronologia para retomar alguns fatos, até por esse motivo se justifica a divisão em séculos e anos, pois facilita ao leitor encontrar os fatos que procuram.

Após pesquisar várias obras que tratam a história das ilhas percebi que muitos autores confundem o leitor ao citar muitas datas dentro de um mesmo fato histórico/parágrafo, o que acaba por causar uma grande confusão nos leitores, assim precisam parar a leitura com frequência para localizar os acontecimentos dentro da época em que o fato aconteceu, Azambuja (1988) é um bom exemplo.

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O Século XVI foi um século de hipóteses, pois, nada do que se afirmar sobre o descobrimento da ilha pode ser comprovado. Diferentemente, o século XVII registra o descobrimento das ilhas por uma expedição holandesa e o primeiro desembarque nelas por uma expedição britânica, mas somente isso. No século XVIII houveram os primeiros povoamentos, franceses, britânicos e espanhóis criaram as primeiras colônias no arquipélago durante este século, este século também vivenciou os primeiros conflitos armados e diplomáticos pela soberania das ilhas. O século XIX será o último século registrado nesse capítulo, pois o século XX será abordado a partir do capítulo 2. Neste século ocorre a tomada do arquipélago em 1833 pelos britânicos, não houve luta armada porque os argentinos que habitavam o arquipélago na época não tinham condições de resistir. De 1833 até 02 de abril de 1982 os britânicos exerceram soberania nas ilhas, até que forças argentinas conquistaram as ilhas, assunto que será abordado no capítulo 2.

Século XVI – Um Século de Hipóteses Este século é bastante contestado pela historiografia, pois, os fatos aqui relatados não tem comprovação histórica, contudo, ele tem grande importância de ser relatado quando se conta a história das Ilhas Falklands/Malvinas, porque Argentina e Reino Unido ainda se remetem aos fatos para reivindicar o descobrimento do arquipélago. Veremos que existem três versões para o descobrimento das ilhas, sendo que duas dariam direitos a Espanha pelos navegadores Américo Vespúcio e Fernão de Magalhães, e uma outra versão que daria direitos ao Reino Unido pelo navegador John Davis. 1501 - Registros históricos deixam nebulosa a exata data da descoberta das ilhas, a informação mais precisa é que foram descobertas ainda no século XVI. A primeira hipótese é que em 1501 Américo Vespúcio teria avistado terras desconhecidas na latitude 52º sul22, enquanto percorria a costa por cerca de 20 22

Ver coordenadas na Figura 2.

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léguas23 procurando por um porto para abrigar-se de tempestades e do mar revolto, entretanto nem porto e nem habitantes foram avistados (DUARTE, 1986, p. 1). Veja o que diz Vespúcio no ano de 1504 em sua carta endereçada a Pier Soderini:24 Fatto nostro provedirnento, partimmo di questa terra e cominciammo nostra navicazione per eb vento scilocco; e fu a di 15 di febraio, quando già el sole s’andava acercando albo equinozio e tornava verso questo nostro emisperio del settentrione. E tanto navicamino per questo vento che ci trovammo tanto alti che ‘1 polo del meridione ci stava alto fuora del nostro orizzonte ben 52 gradi, e più non vedavamo le stelle né dell’Orsa Minore né della Maggiore Orsa, e di già stavamo discosto del porto di donde partimmo ben 500 leghe per scilocco; e questo fu a dì 3 d’aprile. E in questo giorno cominciò una tormenta in mare tanto forzosa che ci fece amaenar del tutto nostre vele, e corravamo ad arbero secco con molto vento, che era libeccio, con grandissimi mari e l’aria molto tormentosa; e tanta era la tormenta che tutta la flotta stava con gran timore. Le notti eron molto grandi, ché notte tenemmo a dì sette d’aprile, che fu di 15 ore, perché el sole stava nel fine di Aries, e in questa regione era lo inverno, come ben può considerare Vostra Magnificenza. (VESPÚCIO, 1504).

Essa carta ficou conhecida como Lettera a Soderini, entretanto, sua veracidade é contestada pela historiografia, pois a carta original nunca foi encontrada. (MARTINS, 1993, p.146). 1520 - Outra versão sobre a descoberta das ilhas diz que em 1520 uma expedição comandada por Fernão de Magalhães em nome da Espanha descobriu o arquipélago, que foi avistado por um dos navios da frota, estava sob o comando de Esteban Gómez que havia desertado da expedição de Magalhães e rumava de volta a Espanha, e durante o retorno teria avistado as ilhas e colhido dados que deram origem a um mapa encontrado por um geógrafo francês chamado Marcel Destombes em 1938 em uma biblioteca de Istambul, nesse mapa as ilhas se encontram na altura do paralelo 53º05´ (DUARTE, 1986, p.2). 1540 – A Espanha alega que o descobrimento das ilhas foi através do navio Incógnita, contudo, com pouca exatidão sobre suas localizações as ilhas já figuravam em cartas náuticas desde 1522, e assim foi até 1541, tendo sido batizadas com diversos nomes: Sant Antón, Sanson, de los Patos e de los Leones (DUARTE, p.2). 23 24

20 léguas marítimas equivalem a cerca de 110 quilômetros. Pier Soderini foi um homem de estado florentino e amigo de Américo Vespúcio.

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1592 – Para os ingleses, a descoberta das ilhas aconteceu em 1592, quando John Davis, comandante do navio Desire de uma expedição do Reino Unido, teria chegado as ilhas após ser conduzido por uma tempestade (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p), entretanto, segundo a Agência de Inteligência Civil americana, conhecida como CIA, não teria havido desembarque.25 1594 – Dois anos após o desembarque de Davis, um navegador inglês chamado Richard Hawkins teria descoberto terras ainda não registradas nos mapas cartográficos da época, e batizou então com nome de Hawnkins´s Maidenland. Em sua descrição sobre a descoberta disse ser “terras com aspecto e clima, pela sua temperança, a relembrar a Inglaterra”. Entretanto, historiadores contestam essa versão, afirmam que Hawkins poderia estar navegando pela região de Puerto Deseado na Patagônia (AZAMBUJA, 1988, p. 38,39). É importante notar que todos estes acontecimentos são contestados, enquanto a Argentina se sustenta nos acontecimentos de 1501, 1520 e 1540, o Reino Unido reivindica também sob protesto de veracidade os acontecimentos de 1592 e 1594. É importante destacar que todos estes fatos do século XVI carecem de comprovação científica e tem sido repetidos sem constatação dos mesmos (BECK, 2013 apud ETCHEPAREBORDA, 1983, p. 27 -67).

Século XVII – Um Século Documentado Este século é importante, pois, Argentina e Reino Unido concordam que o “primeiro descobrimento” com bases históricas comprovadas aconteceu nesse século, por uma expedição holandesa, contudo não houve desembarque por essa expedição, diferentemente dos os holandeses, os britânicos reivindicam que o primeiro desembarque nas ilhas ocorreu pela expedição britânica já no fim do século, vejamos: 1600 – Em janeiro de 1600, Sebald de Weert comandante do Geleof, após fracassos de sua expedição, voltava a Holanda, e quando o navio encontrava-se na latitude sul 50º40´ avistaram três ilhas em que os tripulantes “puderam ver com nitidez focas e pinguins que povoavam as ilhas.” Desembarcar não foi possível porque durante a travessia do Estreito de Magalhães perderam a última canoa que possuíam. Central Intelligence Agency (CIA – US). The World Factbook, South America: Falkland Islands (Islas Malvinas). Disponível em: . Acesso em: 21 de outubro de 2014.

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Tendo tudo sido devidamente registrado no diário de bordo seguiram viagem, e chegaram na Holanda no fim de 1600. Desde então as ilhas ficaram conhecidas como Ilhas Sebaldinas, nome que por mais de dois séculos foi usado por navegadores (DUARTE, 1986, p. 3). Hoje as ilhas são conhecidas como Jason Islands, estão localizadas a noroeste das grandes ilhas, conforme figura 4. FIGURA 4: Localização das Ilhas Sebaldinas ou Jason Islands

Fonte: slideshare.com, s/d on-line

Prola (2013) afirma que esse é o primeiro fato indiscutível sobre o descobrimento das ilhas, e que em sendo difícil comprovar os acontecimentos anteriores, Argentina e Reino Unido atribuem o “primeiro descobrimento” das ilhas Falklands/Malvinas ao holandês Sebald de Weert, “que seguramente avistou as ilhas Janson (Sebaldinas) em 1600. Um ponto importante a se destacar é que em: [...] meados do século XVI, [...] passou a ser julgada necessária a tomada de posse, indicada por algum sinal externo: uma cruz, uma

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bandeira, um marco. Esse sistema de ocupação nominal foi, ulteriormente, substituído pelo da ocupação efetiva, à qual se considerou necessário unir a manifestação da vontade de possuir o território (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2009 p. 523 apud PROLA, 2013).

Fica evidenciado que independentemente da veracidade dos fatos do século XVI ou do descobrimento em 1600, se não houve ocupação não poderia existir reivindicação de posse. Trataremos desses aspectos do direito internacional nos capítulos 2 e 3. 1684 – Duarte (1986, p.3) relata ainda que no ano de 1684 dois piratas ingleses, Wiliam Dampier e Ambrose Cowley relataram avistar algumas ilhas. O primeiro descreve o que viu entre os 51º e 51º20´ de latitude sul: “três ilhas estéreis e rochosas, sem uma árvore”, o segundo relata que aos 47º ter visto “uma ilha desconhecida, desabitada, com água doce e árvores e um grande porto com capacidade para mil navios”. A ilha foi batizada por Cowley de Pepys, uma homenagem ao secretário do Almirantado britânico. Um fato curioso é que a Ilha de Pepys jamais foi encontrada novamente, alguns a descrevem como ilusória26 ou ilha fantasma. 1690 - No guia “Nossas Ilhas” elaborado em nome do governo das Ilhas Falklands, conta que o primeiro desembarque nas ilhas inabitadas aconteceram em 27 de janeiro de 1690, em uma expedição capitaneada por John Strong em que a descida aconteceu na West Falklands, também conhecida como Isla Gran Malvina ou Malvina Ocidental. Duarte (1986 p. 3 – 4) conta que a chegada na ilha foi ocasionada por ventos fortes que conduziram o navio naquela direção, primeiramente Strong reconheceu as Ilhas Sebaldinas, e tendo continuado a navegar no sentido sudeste chegou até o canal que separa as duas grandes ilhas. O canal foi batizado de Falkland Sound, uma homenagem ao tesoureiro da Marinha Real britânica, o escocês Visconde Falkland, que era também protetor de Strong e patrocinador da viagem. Posteriormente o nome de Falkland se estendeu a todo o conjunto de ilhas (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 191).

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Malvinas na Universidade – Concurso de Ensaios 2012 – p. 226

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Em seu site oficial, a CIA diz que o primeiro desembarque realmente aconteceu no ano de 1690,27 contudo, é de extrema importância salientar que “Strong não executou qualquer ato de posse” (DUARTE, 1986, p. 4). 1698 – Segundo Duarte (1986, p. 4) no ano de 1698, a Companhia de Pesca do Mar do Sul, que tinha sua sede na cidade de Saint-Malo, França, começou a enviar em diversas ocasiões pequenos barcos e “a partir daquele ano as ilhas começaram a ser chamadas de Malouines, de onde se derivou o atual nome espanhol de Malvinas.”

Século XVIII – A Efetiva Colonização das Ilhas Falklands/Malvinas Do fim do século XVII até meados do século XVIII diversas incursões francesas passaram pelas Ilhas Falklands/Malvinas, principalmente pescadores e baleeiros, destes últimos não somente franceses, entretanto, ninguém se estabeleceu por lá, não ocupando efetivamente as ilhas (GUILLAUME, 1994, p.12 apud PROLA, 2013). O século XVIII é extremamente importante para a história do arquipélago, nele ocorre a efetiva colonização das ilhas, primeiramente por franceses, em seguida também por britânicos, e por último os espanhóis que por um acordo com a França adquiriu os direitos de colonizar as ilhas. Veremos que a troca de correspondências entre as coroas britânica e espanhola em 1771 dão fundamentação a reinvindicação britânica sobre o reconhecimento de soberania na parte ocidental do arquipélago, fato que tem importância ainda nos dias atuais para a resolução do conflito, portanto, vejamos: 1740 – Segundo Duarte (1986, p. 4 - 5) um capitão chamado Anson, a serviço da coroa britânica publicou um relatório de viagem no qual destacou o valor estratégico das Ilhas Malvinas, no documento ele defendia o estabelecimento de uma base de operações, para tal recomendou as Ilhas Pepys, as Ilhas Falklands/Malvinas ou a Terra do Fogo. Segundo Duarte, essa é a prova de que os ingleses não tinham um bom conhecimento geográfico do Atlântico Sul. Em posse dessas informações, a Marinha Real britânica tratou de organizar uma viagem para explorar os locais informados pelo capitão Anson. Não tardou muito Central Intelligence Agency (CIA – US). The World Factbook, South America: Falkland Islands (Islas Malvinas). Disponível em: . Acesso em: 21 de outubro de 2014.

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e a notícia da expedição chegou ao conhecimento do Embaixador Wall, irlandês, mas a serviço da Espanha (DUARTE, 1986, p.5). A expedição teria dois objetivos, o primeiro seria o descobrimento completo das Ilhas Pepys e Ilhas Falklands/Malvinas, o segundo seria a exploração do Mar do Sul, contudo, o primeiro ministro inglês sofreu forte oposição do governo espanhol, foi então que decidiu temporariamente abandonar o projeto. Diante do recuo dos ingleses é possível perceber que o Reino Unido reconhecia o direito da Espanha (DUARTE, 1986, p.5). 1761 - No ano de 1761 França e Espanha firmaram um acordo no qual se comprometeram respeitar reciprocamente suas possessões, o tratado ficou conhecido como Pacto Família, no seu artigo 6º previa o respeito mútuo em relação a “todas as terras, ilhas e lugares que lhes pertencessem” (DUARTE, 1986, p. 5). 1764 – Em 1763, Louis Antoine de Bougainville, militar, diplomata, senador e explorador francês, propôs ao ministro de Guerra, um plano de colonização das Ilhas Falklands/Malvinas. Com a autorização do rei, Bougainville partiu em setembro de 1763, (AZAMBUJA, 1988, p. 53) inclusive dispôs a maior parte de sua fortuna para financiar a expedição (DUARTE, 1986, p. 5). Em janeiro de 1764 a expedição composta pela fragata28 L´Aigle e da corveta29 Le Sphinx se aproximaram das Ilhas Falklands/Malvinas, primeiramente avistando as ilhas Sebaldinas, entretanto não encontraram nenhum local propício ao desembarque e seguiram procurando até que, em fevereiro daquele mesmo ano desembarcam na Ilha Soledad (ou Est Falkland) e fundaram Port Louis. Junto aos tripulantes dos navios foram ainda colonos, “mulheres e crianças, um médico, um ferreiro, um carpinteiro, cozinheiros, serventes”, ao todo foram 29 pessoas, que a princípio ocuparam um acampamento improvisado (DUARTE, 1986, p. 6). Em 5 de abril, Bougainville tomou posse das ilhas em nome do Rei Luis V, e iniciou a construção de um Forte.30 Em novembro de 1765 a colônia já contava com 136 habitantes e prosperava, (PROLA, 2013, p. 25) conforme explica Azambuja: Plantavam-se hortaliças, criava-se gado, fabricava-se azeite e curtiam-se couros de animais marinhos que chegavam a comercializar com a França. Foram levantadas, com construção de pedra, a Casa

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Navio de três mastros de marinha de guerra. Navio de combate menor que a fragata. Construção feita para defender uma cidade, região.

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do Governador, os armazéns do Rei e da Companhia de Saint-Malô e o Forte (AZAMBUJA, 1988, p. 55).

Duarte (1988) e Etchepareborda (1983) afirmam ter sido essa a primeira ocupação efetiva das Ilhas Falklands/Malvinas, que ficou sob o comando de Neville enquanto Bougainville retornava a França para buscar operários para a nova colônia. 1765 – Quase que ao mesmo tempo os ingleses também iniciaram um projeto de colonização das Ilhas Falklands/Malvinas. O Comodoro Byron partiu em outubro de 1764 para uma missão que sua tripulação só ficou sabendo quando estavam efetivamente em alto mar. Poucos meses depois, em 23 de janeiro de 1765 havia se estabelecido ao norte da West Falkland (ou Malvina Ocidental) em um local que renomeou para Port Egmont, tomando posse em nome do Rei Jorge III (DUARTE, 1986, p. 7). FIGURA 5: Localização do Port Egmont e do Port Louis

Fonte: naval-history.net, s/d on-line

1766 – Após fazer o reconhecimento das ilhas, o Comodoro Byron se deslocou para Porto Deseado em terras continentais. Foi então que para continuar a exploração

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foi despachado o comandante MacBride com sua escuna31 Janson (DUARTE, 1986, p. 7). Logo foi construído um estabelecimento permanente em Port Egmont. (PROLA, 2013, p. 25) Durante o reconhecimento das ilhas reconheceu as ilhas Sebaldinas, e como de costume alterou seu nome para Janson, conforme figura 4 (DUARTE, 1986, p. 7). Após passar por grande parte da costa, incluindo Port Louis, notificou os habitantes de lá que as terras pertenciam ao rei da Grã-Bretanha (AZAMBUJA, 1988, p. 61). Neville, então coordenador da colônia francesa, ameaçou MacBride a que evacuasse as ilhas imediatamente, foi então que ele se escusou, e disse que não tinha vindo com intenções hostis, estava apenas a cumprir ordens. Tendo em vista a ocupação francesa, o governo espanhol decide protestar contra a indevida ocupação da ilha. Bougainville foi convocado a discutir o assunto em Madri (DUARTE, 1986, p. 8). Então a Espanha invocou vários tratados, Bula Papal Inter Coetera (1493) e o Tratado de Tordesilhas (1494), que foram confirmados em Münster (1648), Madri (1667) e Utrecht (1714), declarando assim sua soberania sobre as terras que se encontravam na América do Sul, com exceção as terras pertencentes aos portugueses. Portanto, antes mesmo que se iniciasse as investidas inglesas e francesas, as terras eram por acordado da Espanha (GUILLAUME, 1994, p. 12 apud PROLA, 2013, p. 26). 32 Sob a alegação de que o arquipélago é extensão do continente americano, o Pacto Família que em seu artigo 6º versava sobre um acordo de respeito recíproco as possessões é evocado pela Espanha, assim sendo, para garantir seus direitos sobre as ilhas a Espanha concorda em pagar a França uma indenização pelos gastos advindos do processo de colonização, bem como pelas estruturas remanescentes da ocupação. Com a soberania espanhola sobre o território logo Port Louis é renomeada para Puerto Soledad, ver figura 5 (SPMUN, s/d, p. 6).33 1767 – Duarte (1986) narra como foi o dia da entrega: A entrega foi feita a 2 de abril de 1767, desfraldado o estandarte da Espanha, com 21 tiros de canhão. Representou o Governo francês o Governador Neville e Bougainville e, em nome do Rei da Espanha, o Tipo de veleiro caracterizado por usar velas de popa a proa em dois ou mais mastros. No ano de 1750 foi assinado o Tratado de Madri, o qual estabeleceu que o limite da fronteira entre os domínios espanhóis e portugueses se daria a partir do ponto mediano entre a embocadura do Rio Madeira e a foz do Rio Mamoré, sempre seguindo em linha reta até visualizar a margem do Rio Javari. Surgia uma linha imaginária que futuramente geraria muitas discórdias. (INFOESCOLA, acesso em: 22/10/2014) 33 Guia São Paulo Model United Nations, s/d. 31 32

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flamante Governador Don Felipe Ruiz Puente, ato a que assistiram a oficialidade e a tropas das fragatas Liebre e Esmeralda com as quais, para esse efeito, haviam navegado do porto de El Ferrol. Pouco depois Porto Luís era conhecido com o nome de Porto Soledad (DUARTE, 1986, p. 8).

A partir de então, dona das ilhas, mesmo que ainda não as tivesse ocupado, foi nomeado um governador, e ele responderia imediatamente ao Governador de Buenos Aires. (DUARTE, 1986, p. 9) Com a permissão do rei, alguns colonos permaneceram habitando as ilhas, enquanto outros foram repatriados (AZAMBUJA, 1988, p. 57). Carlos III ordenou seu embaixador que comunicasse o Rei Jorge que a Espanha não concordaria com o estabelecimento de Port Egmont de modo algum, considerava a instalação inapropriada e intolerável (SPMUN, s/d, p.6). Para a Espanha já não bastava somente ocupar Porto Soledad, era necessário ter conhecimento de tudo o que se passava no arquipélago; por isso, a corte em Madri tratou de enviar um recado a Don Francisco de Paula Bucarelli, Governador de Buenos Aires, ele “não devia permitir estabelecimento algum dos ingleses (DUARTE, 1986, p. 9). 34 1769 – Ruiz Puente, o governador das ilhas, deu ordens a Angel Santos, que comandou uma expedição que saiu a percorrer as costas para inspeção de portos e as baías das ilhas. No canal que separa as duas grandes ilhas, Santos encontrou ancorado um navio inglês, a fragata Tamar capitaneada por Hunt, que convidou o capitão espanhol a subir a bordo. Após permanecer a bordo pelo menos 1 dia, Santos foi despachado por Hunt com instruções para não continuar a inspeção e sob ordens de abandonar as ilhas, pois pertenciam a Sua Majestade britânica (SPMUN, s/d, p. 6). Após Santos voltar a Porto Soledad e informar o ocorrido, o governador Ruiz Puente enviou o Tenente Mário Plata para indagar ao capitão Hunt porque operações em costas e terras de seu governo estavam sendo dificultadas, e concluiu dando ordens para que deixassem as ilhas e mares que eram de seu domínio. Entretanto, Hunt declarou que as ilhas pertenciam a Sua Majestade Britânica por direito de descobrimento. O Tenente Mário voltou a Porto Soledad, de onde o governador comandava as ilhas e transmitiu-lhe o recado (DUARTE, 1986, p. 10 - 11).

Duarte não informa a data deste acontecimento, mas nota-se que está compreendido entre 1767 e 1769.

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1770 – O Governador de Buenos Aires, Bucarelli, enviou uma expedição com 3 navios e comando de Rubalcava, o objetivo era localizar os ingleses, informa-los que as Ilhas Falklands/Malvinas estavam compreendidas em zona consignada a Espanha pelo Tratado de Tordesilhas, e que deveriam evacuar ou seriam tratados como usurpadores através da força. Ao encontrar os ingleses, os espanhóis perceberam que Port Egmont era um posto e não uma população, e que se encontrava nas Ilhas Saunders, essa era a prova de que os ingleses não estavam estabelecidos efetivamente na West Falkland (ou Malvina Ocidental).35 Rubalcava percebeu que havia ali forças equivalentes as suas, assim sendo, decidiu protestar com capitão Hunt sem hostilidades, Hunt contestou em igual modo (DUARTE, 1986, p. 10). Bucarelli, para fazer cumprir o que havia solicitado anteriormente a Rubalcava, enviou dessa vez uma expedição com o dobro de poder de guerra, partiram de Montevidéu sob o comando de Madariaga. A esquadra era composta por 6 navios, 1500 homens e artilharia. Após chegarem ao Porto Egmont, em carta ao capitão do Porto, Jorge Farmer, foi dado o ultimatum por Madariaga, ou evacuavam o Forte e o Porto, ou o fariam cumprir através da força. Como a resposta não chegou, Madariaga abriu fogo, entretanto, logo foi hasteado bandeira branca. A força inglesa no porto era pequena, por isso logo capitulou, o único navio inglês que havia ali era a Favorita, que teve seu leme removido para que não fugissem antes que fossem terminados os inventários (DUARTE, 1986, p. 11). Quando a opinião pública e o parlamento inglês tomam conhecimento da expulsão, começam a mobilizar-se inclusive para a guerra caso necessário (PROLA, 2013, p. 26), fato é que a atitude soou como uma bofetada no prestígio da Marinha britânica. Foi então que, mediante posicionamento francês, que prezava pela resolução amistosa, o rei espanhol Carlos III cedeu, contudo, “obteve algo que não podia prever: que fosse reconhecida a soberania das Ilhas” (DUARTE, 1986, p. 11). 1771 – Foram quatro meses de negociações até que o embaixador espanhol, Príncipe de Masserano, emitisse o seguinte parecer: “Havendo-se queixado S. M. Britânica da violência cometida a 10 de junho de 1770, na ilha geralmente chamada Grã-Malvina (Malvina Ocidental) e pelos ingleses Ilha Falkland, ao obrigar, pela força, o comandante e súditos de S. M. Britânica36 a evacuar o Porto chamado por eles Egmont, ato ofensivo para a honra de sua Coroa, o Príncipe 35 36

Ver Figura 5. S. M. significa Sua Majestade.

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Masserano, embaixador extraordinário de S.M. Católica, considerando o amor à paz de que está animada e a manutenção e boa harmonia com S.M. Britânica e considerando que este sucesso poderia interrompê-la, viu com desagrado esta expedição, capaz de turva-la, e na convicção de que haverá reciprocidade de sentimentos de S. M. Britânica e de seu afastamento para autorizar qualquer coisa que possa turvar a boa inteligência entre ambas as Cortes. S. M. Católica desautoriza a dita empresa violenta e, em consequência, o Príncipe Masserano declara que S. M. Católica compromete-se a dar ordens imediatas para que voltem a deixar-se as coisas na Grã-Malvina, no Porto chamado Egmont, precisamente no estado em que estava antes de 10 de junho de 1770, a cujo efeito S.M. Católica dará ordem a um de seus oficiais de entregar ao oficial autorizado por S. M. Britânica o Porto e o Forte chamado Egmont, com toda a artilharia, as munições de guerra e bens de S. M. britânica e de seus súditos, que hão sido encontrados ali no sobredito dia, conforme o inventário levantado. O Príncipe de Masserano declara ao mesmo tempo, em nome do Rei, seu Senhor, que o compromisso de sua dita Majestade Católica de restituir a S. M. Britânica a possessão do Porto e do Forte chamado Egmont, não pode nem deve afetar em nada a questão do direito anterior de soberania das Ilhas Malvinas, chamadas por outro nome Falkland” (apud DUARTE, p. 12).

Imediatamente a Coroa Britânica aceitou a declaração nos seguintes termos: “Havendo autorizado S. M. Católica ao Excelentíssimo Senhor Príncipe de Masserano, seu embaixador extraordinário, a que se oferecesse em nome de S. M. o Rei de Espanha uma satisfação pela injúria feita a S. M. britânica, despojando-a do forte e Porto Egmont e, havendo firmado hoje o dito embaixador uma “Declaração” que acaba de entregar-me e na qual expressa que, desejoso S. M. Católica de restabelecer a boa harmonia e amizade que subsistia entre as duas Coroas, reprova a expedição contra Porto Egmont, quando se empregou a força contra as possessões, comandante e súditos britânicos e promete também repor imediatamente todas as coisas no mesmo estado em que estavam antes de 10 de junho de 1770; e que S. M. Católica dará comissão a um de seus oficias para entregar ao oficial comissionado por S. M. Britânia o Porto e Forte Egmont, como igualmente toda a artilharia, munições e bens do S. M. britânica e de seus súditos, segundo o inventário que se formou; e havendo-se também obrigado o dito embaixador, em nome de S. M. Católica, a que se realizará o contido na dita Declaração, entregando-se no término de seis semanas a um dos primeiros secretários de Estado de S. M . Britânica a duplicata das ordens que passe S. M. Católica a seus oficiais, S. M. britânica, a fim de manifestar as mesmas disposições amistosas, me há autorizado a declarar que vira a citada Declaração do Príncipe de Masserano e o inteiro cumprimento da promessa de S. M. Católica como uma reparação da injúria feita à Coroa da GrãBretanha. Em fé do qual, eu, o infra-escrito, um dos principais secretários de Estado de S. M. britânica, firmo a presente na forma que costumo e lhe fiz pôr o selo de minhas armas. Em Londres, 22 de janeiro de 1771. Rochford” (apud DUARTE, p. 13).

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Em agosto para cumprir o acordado, a Espanha entregou ao Capitão Scott, nomeado para o recebimento, o Porto e o Forte, em seguida voltaram a se estabelecer por lá os ingleses (BECK, 2013, p. 25). Ao firmar tão importante documento, o Príncipe de Masserano, então embaixador extraordinário, pode ter cometido um erro, pois, ele afirma na declaração que os ingleses estavam na Grã-Malvina, o que não era real, na verdade o porto e o forte se encontravam na ilhota Saunders (DUARTE, 1986, p. 13). Sobre essa negociação, tanto estudiosos argentinos quanto britânicos afirmam haver fortes indícios de que existia uma negociação diplomática secreta, em que o Reino Unido se comprometia algum tempo depois da restituição do Porto e do Forte que eles deixariam as ilhas voluntariamente, entretanto isso não pode ser confirmado (PROLA, 2013, p. 26). Sobre essa negociação secreta Azambuja esclarece que: [..] esse pacto, de caráter secreto, nunca veio à lume; e dele apenas se sabe por referência extraoficiais, em escritos ou epístolas isoladas e em registro de alguns autores, envolvendo uma série de deduções [..] Salvo que para o futuro a heurística possa reunir melhores e mais evidentes elementos que atestem sua materialidade, a promessa secreta não passará de um ponto emergente na linha histórica do diferendo anglo-espanhol a aguardar uma análise mais positiva dos estudioso quanto à importância de sua verdadeira participação no confronto diplomático, sem valor de prova, pelo momento, em quaisquer autos de arbitragem internacional (AZAMBUJA, 1988, p. 77 – 78).

Sem comprovação da veracidade desse acordo, Azambuja (1988, p. 78) deixa claro que tal argumento não poderia ser usado para uma futura arbitragem internacional. 1774 – Alegando problemas financeiros para manter os colonos, o Reino Unido retira-se de Port Egmont deixando pra trás toda estrutura construída e uma placa de chumbo no intuito de manter a soberania (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p). Os Argentinos usam essa retirada voluntária como prova de que o acordo secreto realmente existiu (PROLA, 2013, p. 62). Entretanto, Duarte (1988, p. 14) afirma que a Inglaterra enfrentava problemas nas guerras de independência dos Estados Unidos da América, que até então eram colônias britânicas. Os britânicos em contrapartida

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argumentam que jamais abriram mão da soberania das ilhas, vontade expressa pelos dizeres de uma placa deixada no local: Be it known to all Nations, that Falkland´s Island with this Fort, the store-houses, wharf, harbour, Bays and Creeks thereunto belonging, are the sole right and property of His most sacred Magesty George the Third, King of great Britain, France and Ireland. Defender of the Fait, etc. In witness whereof this plaque is set up and His Britanick Magesty´s colours left flying as a mark of possession by S. W. Clayton, commanding officer at Falkland´s Island, A.D. 1774 (AZAMBUJA, 1988, p. 79).

1780 – Após vários reconhecimentos, no ano de 1780 Port Egmont foi incendiado e reduzido a cinzas. A Inglaterra não se pronunciou a respeito. De fato argentinos e britânicos admitem a existência da placa, que ficou em poder da Argentina de 1780 até a tomada de Buenos Aires em 1806, quando o General Beresford apoderou-se dela e enviou-a a Londres (DUARTE, 1986, p. 15).

Século XIX – A Ocupação Britânica Neste século ocorrem as revoluções que tornam independentes as nações sulamericanas, libertando-as do poder colonial, e assim assumindo as posses de seus colonos, o que no caso da Argentina incluía a posse das Ilhas Falklands/Malvinas. O século XIX abarca um dos acontecimentos mais importantes desse conflito, a tomada britânica de 1833, que assumem a ilha e exercem soberania nela pelos próximos 150 anos. 1810 – Em 25 de maio de 1810 eclode a revolução em Buenos Aires que daria origem a independência da Argentina, (DUARTE, 1986, p. 15) com a independência a Argentina teria herdado todos os títulos e territórios até então pertencentes aos colonos espanhóis, pela aplicação da doutrina de “uti possidetis juris”.37 (BECK, 2013, p. 26).

“Uti possidetis juris” é um princípio de direito internacional segundo o qual os que de fato ocupam um território possuem direito sobre este. 37

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Com a independência da Argentina as autoridades espanholas abandonam as Ilhas Falklands/Malvinas, deixando-as sem defesa alguma, mesmo assim o Reino Unido nada fez, (DUARTE, 1986, p. 17) para traz ficou somente uma placa em que a Espanha afirmava sua soberania (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 192): [...] se construyó una placa de plomo que se coloco en el campanário de la Real Capilla de Malvinas, con la inscripción siguiente: "Esta isla con sus Puertos, Edificios, Dependencias y quanto contiene pertenece a la Soberania del Sr. D. Fernando VII Rey de España y sus Indias, Soledad de malvinas 7 de febrero de 1811 siendo gobernador Pablo Guillén" (DESTÉFANI, 1982, p. 71 apud PROLA, 2013, p. 26).

1820 – As Ilhas Falklands/Malvinas não estiveram portanto sob administração de nenhum governo desde a saída dos espanhóis em 1810, foi então que em novembro de 1820 desembarcou em Porto Soledad o comandante David Jewitt, com a missão de reestabelecer o governo das ilhas em nome de Buenos Aires. Logo publicou uma circular, pondo a par da situação os governos estrangeiros, mas principalmente pesqueiros ingleses e norte-americanos que estavam nas ilhas, degradando-as sem qualquer cuidado para com espécies em extinção, portanto, suas tripulações foram devidamente notificadas pelo funcionário argentino (DUARTE, 1986, p. 17 - 18). 1824 – O Governo argentino tinha uma dívida para com Jorge Pacheco, por haver combatido pelas Províncias Unidas durante as guerras emancipatórias e na invasão de 1806 (AZAMBUJA, 1988, p. 84). Para pagar a dívida, o governador de Buenos Aires Martin Rodriguez, lhe propôs a título de indenização o usufruto da Ilha Soledad, foi então que junto com Don Luís Vernet38 partiram para desenvolver o comércio e auferir lucros para quitar a dívida (DUARTE, 1986, p. 18): Para transportarse a la Isla de la Soledad una de las Malvinas, y usufructar en ella en los terminos que tambien propone, mas en inteligencia que semejant concecion jamas podrá privar al Estado del derecho que tiene á disponer de aquel território del modo que crea mas conveniente á los interesses generales de la provincia, y lo cual se verificará tan luego que sus recursos le proporcionen el poder de establecerse en él de un modo efectivo y permanente [...] (CAILLETBOIS, 1982, p. 194 apud PROLA, 2013, p. 32). Vernet era francês de nascimento, mas considerado alemão por haver residido longo tempo em Hamburgo. (DUARTE, 1986, p. 18)

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Vernet de fato se transferiu para a ilha, levando com ele sua família e alguns colonos, celebrou acordos para comprar navios e também para que viessem famílias dos EUA e Europa e trouxe ainda argentinos dos Pampas para desenvolver a pecuária. Vernet teria liberdade para desenvolver o comércio na ilha nos próximos 20 anos, mas com as reservas previstas no usufruto (DUARTE, 1986, p. 19). Segundo Guede Santos (2013, p. 30), autor argentino, o interesse de Vernet

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não era somente econômico, ele estava convencido de que uma população permanente e crescente traria vantagens para questões relacionadas a soberania das ilhas. 1825 – No ano de 1825 o Reino Unido reconhece a Argentina como país independente e soberano em suas ações, entretanto não se pronuncia sobre as Ilhas Falklands/Malvinas, e o silêncio persiste mesmo com a assinatura de um Tratado de Amizade, Comércio e Navegação naquele mesmo ano (DESTÉFANI, 1982, p. 83 apud PROLA, 2013, p. 32). 1829 – Vernet seguiu administrando a ilha Soledad desde 1824, porém com grande dificuldade, pois, apesar de sua vigilância, pescadores estrangeiros faziam uma competição desleal, fazendo uso de técnicas predatórias, matando anfíbios na época da procriação. Vernet então recorreu ao Governo de Buenos Aires, que não pode oferecer muito, nem mesmo o envio de um barco para apoio militar, pois enfrentava problemas internos, foi então que em 10 de junho de 1829 nomearam Vernet como comandante político e militar das Ilhas Falklands/Malvinas, sob os seguintes termos: Art. 1º - As Ilhas Malvinas e adjacências até o Cabo de Hornos, no mar Atlântico, serão regidas por um comandante político e militar, nomeado imediatamente pelo Governo da República. Art. 2º - A residência do comandante político e militar será na Ilha de Soledad e nela estabelecer-se-á uma bateria sob o pavilhão da República. Art. 3º - O comandante político e militar fará observar pela população das ditas ilhas as leis da República e cuidara em suas costas da execução dos regulamentos sobre a pesca de anfíbios (DUARTE, 1986, p. 19).

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En el Archivo General de la Nación Argentina (AGN)se conserva toda la documentación familiar y oficial de Vernet, bajo el título de “fondo Luis Vernet” (sala VII). (GUEDE SANTOS, 2013, p. 30, nota de rodapé)

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Contudo as ações de Vernet produziram pouco resultado, então em novembro daquele ano, o governo de Buenos Aires publicou um decreto proclamando a soberania da Argentina sobre as Ilhas Falklands/Malvinas, por herança da Espanha, informando a intenção de criar um governo civil e outro militar. Imediatamente o Reino Unido protestou, declarando sua soberania sobre as ilhas. Buenos Aires comunicou o recebimento porém não contestou (DUARTE, 1986, p. 20). 1831 – Entre os anos 1830 para 1831 a colônia de Vernet dava sinais de que ia bem, já contavam com 300 habitantes, a atividade pesqueira e a caça de baleias e focas se multiplicavam (ETCHEPAREBORDA, 1983, p. 27 -67 apud BECK, 2013, p. 26 – 27). Em agosto de 1831 foram presos por Vernet três navios lobeiros de bandeira norte-americana, sob a acusação de tráfico ilegal, eram eles os navios Harriet, Breakwater e Superior, o navio Harriet capitaneado por Gilbert Davison foi encaminhado a Buenos Aires para apreciação do processo. Davison então apela para a embaixada norte-americana intervir; o cônsul Jorge Slacun protesta a apreensão dos navios e reitera a posição norte americana de não aceitação sobre o decreto de regulamentação da pesca e reinvindicação de soberania feito em 1829. Percebendo que sua investida diplomática não daria resultado, convoca o navio de guerra Lexington, com comando de Duncan, para reaver os navios e a mercadoria apreendida (AZAMBUJA, 1988, p. 86), contudo, antes de qualquer investida, em ato de insolência incrível, Duncan reclama diretamente a Anchorena, ministro argentino, que Vernet seja considerado pirata e julgado nos EUA ou Argentina pelos atos de apreensão dos navios e mercadoria (DUARTE, 1988, p. 21). A diplomacia norte-americana considerava a área geográfica que compreendia as Ilhas Falklands/Malvinas uma área de soberania não definida, assim sendo, em 28 de dezembro o navio Lexington chega a Ilha Soledad e: Depois de aprisionar os práticos40 Brisbane e Enrique Metcalf, Silas Duncan, agindo radicalmente, inutilizou canhões, incendiou os arsenais com pólvora e armamento e despachou para os EE.UU.41 a goleta Dash com os produtos confiscados dos lobeiros. Em seguida, concluídos estes atos predatórios, e ainda sob a fumaça dos incêndios que ateou, declarou formalmente as ilhas “libre de todo gobierno” (AZAMBUJA, 1988, p. 87).

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Navegante que conhece bem determinado caminho marítimo. Forma espanhola para abreviação de Estados Unidos da América.

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Segundo (BRITISH GOVERMMENT, s/d, s/p) o capitão Duncan retirou das ilhas a maioria dos colonos europeus de Vernet. Logo Buenos aires protestou a Washington veementemente sobre os atos de Duncan, a embaixada norte-americana responde em nome da Casa Branca: “Que la apreciación de los actos cometidos por el capitán Duncan, estando ligada a la cuestión de la controvertida soberania de las islas Malvinas, daba lugar a suspender toda examen de la reclamación argentina hasta la solución de dito litigio” (AZAMBUJA, 1988, p. 87).

1832 – No ano seguinte ao ataque do Lexington, Buenos Aires enviou uma expedição para instalar em Porto Soledad uma colônia penal. O governador nomeado era o major Esteban Francisco Mestivier, que foi morto em um motim durante a viajem, então José Maria Pinedo, comandante do navio Sarandi que os levava, contornou a situação e assumiu no lugar de Esteban o governo da Ilha Soledad (DESTÉFANI, 1982, p. 90 – 91 apud PROLA, 2013, p. 34). 1833 – Em Londres havia o temor de que as Ilhas Falklands/Malvinas fossem tomadas pela anarquia e se tornasse reduto de piratas, (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p) foi quando S. M.42 britânica envia uma expedição a ilha. Em 2 de janeiro de 1833 chega a Porto Soledad o navio Clio, capitaneado por John James Onslow, que imediatamente comunicou a Pinedo que por ordens de S. M Britânica deveria hastear a bandeira da Grã-Brenha (DUARTE, 1986, p. 26 -27). Muitas fontes consultadas, tratam desse fato concluindo que não houve um tiro sequer durante o processo, como é o caso de Duarte (1986) e Azambuja (1988), entretanto é necessário observar que, Pinedo não tinha condições de resistir lutando, (PROLA, 2013, p. 34) por esse motivo foi embora sem combater, formalizando somente protesto por “ultraje cometido por uma nação amiga e poderosa” (DUARTE, 1986, p. 27). Desde a tomada de 1833 as ilhas permaneceram sob domínio de Londres até 1982, quando eclodiu a guerra, com a invasão de tropas argentinas as ilhas, assunto que será abordado no capítulo 2.

S. M. é a abreviação de Sua Majestade, o termo é frequentemente usado pelos escritores para se referir ao governo exercido pelos reis, ou diretamente ao rei.

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Um fato curioso e interessante é que Charles Darwin,43 passou pelas ilhas nesse mesmo ano, ele viajava a bordo do navio Beagle (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p), provavelmente colhendo dados que resultaria seu Magnum opus, “A origem das Espécies”. Sobre as ilhas ele escreveu o seguinte: “O arquipélago acha-se situado na mesma latitude do Estreito de Magalhães. Sobre uma superfície de 120 milhas geográficas por 60, corresponde a pouco mais da metade da Irlanda. Depois de ter sido disputada pela França, Espanha e Inglaterra a posse dessas míseras ilhas, foram elas abandonadas. O Governo de Buenos Aires vendeua a um particular, mas de modo idêntico servia-se delas, como antes o fizera a velha Espanha, como colônia penal. A Inglaterra, que reclamava seus direitos, apossou-se delas, ali deixando um inglês, encarregado de guardar a bandeira, o qual foi sem demora assassinado. Novo oficial britânico foi destacado, sem apoio de força alguma. Quando lá chegamos, encontramo-la com uma pequena população que, em mais da metade, consistia de rebeldes fugitivos e homicidas” (apud DUARTE, 1986, p. 23).

Destaco que Darwin classificou as ilhas como “míseras ilhas”, seguramente não previa a grande contenda diplomática e militar que se daria desde então. (DUARTE, 1986, p. 23) Em 17 de junho de 1833, Don Manuel Moreno, Ministro para Assuntos Estrangeiros encaminhou sucessivos atos de protestos ao Foreign Office Britânico. Em nota disse que: “Las Provincias Unidas han comprovado com documentos inatacables que sus títulos a Las Malvinas, o se ala Isla de Soledad, o Puerto Louis (separada de Puerto Egmont por um canal de mar) son compra legítima à Francia; prioridade de ocupación, cultivo e habitación formal; de hecho, posesión notória y tranquila de más de médio siglo cuando fueran despojadas por la fuersa em 5 enero del año 1833” (apud AZAMBUJA, 1988, p. 92).

1834 – Não tendo resposta que satisfizesse a correspondência argentina, Moreno em dezembro de 1834 reitera o posicionamento de Buenos Aires sobre a questão das Ilhas Falklands/Malvinas (AZAMBUJA, 1988, p. 92).

43 Charles Darwin (1809 - 1882) foi um naturalista inglês e criador da teoria da evolução natural. Segundo o cientista, o processo acontecia através da seleção natura. (E-BIOGRAFIAS, Acesso em: 28/10/2014)

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1842 – Após anos de silêncio sobre os protestos argentinos, enfim o Lord Aberdeen emiti parecer informando que “el Gobierno britânico consideraba definitivo el arreglo hecho com España em 1771”, ou seja, as illhas permaneceria sob domínio britânico (AZAMBUJA, 1988, p. 92). Nesse mesmo ano chega a Porto Soledad o tenente governador britânico, Richard Moody. 1843 – No ano de 1843 a administração civil é estabelecida nas Ilhas Falklands/Malvinas por uma Lei Parlamentar. Moody é promovido a governador pleno (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p). 1845 – Em 1845 a sede do governo sai de Porto Soledad e é transferida a para Stanley, e os conselhos Executivo e Legislativo são instituídos (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p). 1849 – Segundo Azambuja (1988, p. 92), diante dos insucessos na ação diplomática, Juan Manoel Rosas, então Governador de Buenos Aires tentou a venda das ilhas para pôr fim ao imbróglio, e também a uma dívida contraída com a empresa Baring Brothers & CIA, o valor oferecido foi de 23.347.766 pesos fortes, contudo Londres recusou. Rosas ofereceu novamente para pagamento em moeda britânica, e mais uma vez não foi adiante a transação. O governo britânico não podia contradizerse por reclamar direitos que emanavam da uti possidetis. A Argentina por sua vez caiu em embaraço, tendo em vista a tentativa de negociar terras ainda reivindicadas. 1850 – No ano de 1850 é ratificado um tratado que poria fim as intervenções britânicas no Prata, o documento intitulado “CONVENTION between Great Britain and the Argentine Confederation, for the Settlement of existing Differences and the reestablishment of Friendship (1850)” ou “Tratado Arana-Southern-Lepredou”44 que pode ser facilmente encontrado na internet. Segundo os britânicos, o tratado terminou com todas as reivindicações possíveis da Argentina, pois em sendo um tratado de paz deveria mencionar a disputa, contudo não o faz (PROLA, 2013, p. 35). 1892 – O Reino Unido com o objetivo de firma-se nas ilhas, buscou desenvolver sua economia desde a ocupação de 1833, em 1851 criou a Falklands Islands Company e continuou a crescer até quem em 1855 já contava com 2000 habitantes e era era autossuficiente. Em 8 de fevereiro de 1892 o arquipélago alcançou o status de colônia (BECK, 2013, p. 29). Portal Argentino com informações sobre o tratado: http://www.argentina.ar/temas/historia-yefemerides/23760-tratado-arana-southern-lepredour 44

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O capítulo 1 é muito importante para este trabalho porque informa o leitor sobre todas as hipóteses de descobrimento do arquipélago, além de elucidar os pontos de concordância e contestação que existem sobre o descobrimento e ocupação efetiva das ilhas, pois, descobrimento e ocupação como veremos no capítulo 3 são elementos pelos quais o direito internacional se pauta para dar a soberania de um território a um Estado. Este relato histórico deste capítulo dará bases históricas para entender a guerra que se instala em 1982, e as reivindicações que permanecem nos dias atuais sobre o direito de posse do arquipélago. No próximo capítulo veremos como se encontravam Argentina e Reino Unido nos anos que antecederam “a guerra das Malvinas” ou “Falklands War” em 1982. Veremos também como foi o desenrolar do conflito, que durou 3 meses, e teve fim com a capitulação da Argentina em junho daquele ano.

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CAPÍTULO 2 2. A Guerra das Malvinas (Falklands War) - 1982 Como vimos no capítulo um, muitos são os fatos históricos envolvendo os três principais atores dessa disputa, Argentina, Reino Unido e as Ilhas Falklands/Malvinas, passamos por cerca de 400 anos da história das Ilhas Falklands/Malvinas, uma história controversa, muitas vezes trabalhadas no campo das hipóteses por falta de comprovação histórica, dificultando a análise que se possa fazer sobre a soberania do arquipélago em uma perspectiva do direito internacional. Vimos que as ilhas foram habitadas por franceses, britânicos, espanhóis e argentinos, cada um exercendo soberania em um momento, as vezes soberania compartilhada, como por exemplo, quando britânicos estavam na parte ocidental e espanhóis no lado oriental. Desde a tomada em 1833 a Argentina nunca deixou de reivindicar sua soberania sobre as ilhas. Tendo em vista que uma solução concreta e definitiva para as ilhas por vias diplomáticas parecia distante, e por não chegar a um veredito, aumentava exponencialmente a frustração pela ocupação britânica em terras que reivindicam serem suas, não somente por herança da Espanha, mas também por estarem estabelecidos em zona de segurança americana, por essa razão considerava descabido o domínio de uma potência europeia sobre a região. (SPMUN, s/d, p. 10) Igualmente, o Reino Unido defende sua posse alegando que as Ilhas são de soberania britânica desde a reintegração concedida em 1771 pelo Príncipe de Masserano (BRITISH GOVERNMENT, s/d, s/p). Roberto Godoy, especialista em assuntos militares,45 disse que o Reino Unido se mantém em guerra constante em algum lugar do mundo há pelo menos 1000 anos. Tendo por base a fala de Godoy, inferimos que para se manter assim há tanto tempo, o Estado precisa ter um poder político, econômico e militar muito grande, para confrontar qualquer ultraje a seus interesses. Esse poder se confirma se observarmos os acontecimentos relatados no

45 Roberto Godoy em entrevista ao SBT Repórter, o programa foi ao ar no ano de 2012, quando completava 30 anos que havia ocorrido o conflito, o vídeo pode ser acessado no Youtube por este link: https://www.youtube.com/watch?v=nRUkLSSvRY8

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primeiro capítulo, e novamente o veremos neste capítulo, quando estudaremos a situação em que se encontravam os beligerantes anos antes de eclodir a guerra. Entender o contexto no qual estavam inseridos os países anos antes da guerra é importante do pondo de vista que, uma série de questões de cunho econômico, político, social serviram como motivadores do conflito armado. Veremos por exemplo que a Argentina quando se dispôs a lutar pela soberania das ilhas enfrentava uma ditadura política e grande recessão econômica e social. O Reino Unido passava por um momento conturbado em sua economia, num contexto de desmantelamento do estado de bem estar social. Tendo sido já abordados os fatos que envolvem a história do arquipélago, é necessário portanto dar ênfase no contexto local de cada um dos países antes que eclodisse o conflito, será esse o objeto de estudo do capítulo 2, abordaremos a história de Argentina e Inglaterra anterior a guerra de 1982.

A ARGENTINA ANTES DA GUERRA Entre os anos 1930 e 1983 a Argentina vivenciou momentos marcados principalmente por 6 golpes de Estado, nos anos de 1930, 1943, 1955, 1962, 1966 e 1976 o Estado democrático de direito foi substituído por governos militares. A Argentina intercalou momentos de democracias frágeis com ditaduras, promovidas pelas Forças Armadas, e muitas vezes com apoio de civis. Sob o mantra de “poner orden” interromperam a vida constitucional do país. 46 O último golpe aconteceu em 23 de março de 1976. María Estela Martínez de Perón, também conhecida como Isabelita Perón, governava no lugar do marido, Juan Domingo Perón que faleceu em 1974.

Aquele ano iniciou-se sob uma crise

institucional do governo argentino e marcado principalmente por um desacerto econômico. A elevação do valor do petróleo e a desvalorização dos alimentos anunciavam um desajuste na balança comercial. A inflação disparava após tentativas frustradas de controlá-la. De março de 1975 a março de 1976 os preços subiram 566,3%, e a tendência era que nos 12 meses subsequentes subisse até 800%. No

Para mais informações sobre todos os golpes de estado, consultar o site do Ministério da Educação argentino: http://www.me.gov.ar/efeme/24demarzo/golpes.html

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princípio de 1975 o governo lançou um pacote de ajustes de salários e desvalorização do peso, medida que ficou conhecida como “rodrigazo”,47 contudo a medida não teve os efeitos esperados, pelo contrário, teve efeito negativo para os trabalhadores assalariados e não conseguiu reverter a tendência geral, tal qual se agravou a situação que as forças sindicais exerceram grande pressão sobre o executivo. No início de 1976, Mondelli, o então ministro da economia, também falhou com seu pacote de medidas, prejudicando ainda mais os assalariados e não gerando efeito algum para o resto da economia. No início de março era superado outro recorde, a Argentina já enfrentava inflação de 56%. Por estes motivos temia-se que os pagamentos fossem suspendidos, tendo em vista que as reservas internacionais já haviam esgotado (NOVARO; PALERMO, 2007, p. 23 - 24). Em março de 1976 o jornal La Opinión divulgou estatísticas interessantes que refletiam bem a turbulência política que vivenciava a argentina nos meses que antecederam o golpe, segundo a publicação, a cada cinco horas morria alguém por motivações políticas, e a cada três horas uma bomba era explodida. Enquanto tudo isso acontecia, o governo e o peronismo48 travados por conflitos internos estavam impossibilitados de reagirem aos avanços das forças de oposição, que aglutinavam principalmente paramilitares, dissidentes do governo, sindicalistas e militares (NOVARO; PALERMO, 2007, p. 24). Em sua mensagem de Natal, o comandante chefe do exército argentino, Jorge Rafael Videla, transmitiu um recado as autoridades constitucionais como um ultimatum, o governo devia se purificar da “imoralidade e corrupção [...], da especulação política, econômica e ideológica” ou seria destituído. Nesse ínterim, Novaro e Palermo (2007, p. 26) afirmam ser esse o prelúdio de um pesadelo sem fim. Na manhã do dia 24 de maio de 1976 Buenos Aires amanheceu diferente, os edifícios do governo, o Congresso Nacional, as principais estações de rádio e televisão e os principais sindicatos, não eram mais controlados por civis de paletó e gravata, mas sim por militares fardados. Esse processo ficou conhecido como “Processo de Organização Nacional, cujos objetivos eram reestabelecer a ordem, reorganizar as instituições e criar as condições para uma “autêntica democracia.” Logo Rodrigazo é o nome dado a um conjunto de políticas econômicas anunciadas na Argentina em junho de 1975. 48 Peronismo é a denominação dada genericamente ao Movimento Nacional Justicialista, criado e liderado a partir do pensamento de Juan Domingo Perón, militar e estadista argentino, presidente eleito em 1946, 1951 e 1973. 47

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no dia seguinte Galtieri tornou público através do editorial La Nación uma “ata de objetivos”: Vigência dos valores da moral cristã, da tradição nacional e da dignidade do ser argentino; [...] vigência da segurança nacional, erradicando a subversão e as causas que favorecem sua existência [...] relação harmônica entre o Estado, o capital e o trabalho, com o desenvolvimento fortalecido das estruturas empresariais e sindicais, ajustadas a seus fins específicos [...] conformação de um sistema educacional [...] que sirva efetivamente aos objetivos da Nação; [...] inserção internacional no mundo ocidental e cristão (LA NACIÓN, 25/03/1976 apud NOVARO; PALERMO, 2007, p. 27).

Seguramente a citação anterior representa bem qual seria a tônica de governança dos militares argentinos. No ano de 1981 os militares ainda não haviam conseguido contornar uma séria de problemas, a inflação já beirava os 150%, os sindicatos estavam inflamados por causa da elevadíssima taxa de desemprego, a população bramia devido a precarização da qualidade de vida, e a forte repressão que era exercida sobre a população incomodava a comunidade internacional (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 193). Nesse ínterim, em 22 de dezembro de 1981 assumia o cargo de presidente da república o General do Exército Leopoldo Galtieri, pois Roberto Viola, então atual presidente abandonara o cargo alegando problemas de saúde, contudo Galtieri alcançava o poder principalmente pelo fato do Comandante Chefe da Marinha, Almirante Jorge Isaac Anaya que tinha grande prestígio no meio militar manifestar seu apoio a ele (DUARTE, 1986, p. 53). No seu discurso em ato de posse, Galtieri disse que: “No plano da política externa, creio conveniente ressaltar que a situação argentina em relação ao mundo não é mais compatível com as posições equívocas ou cinzentas, suscetíveis de debilitar a nossa raiz ocidental, nem com devaneios, nem coquetismos ideológicos que possam desnaturar os interesses permanentes da nação” (apud DUARTE, 1986, p. 53).

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FIGURA 6: Presidente da Argentina Leopoldo Galtieri (1981 – 1982)

Fonte: wikipedia.com, s/d, on-line

Duarte (1986, p.55) nos informa que eram três as questões externas que absorviam a atenção de Galtieri, a primeira era o entrave com o Chile pela posse das ilhas Lennox e Nueva, no canal Beagle. A segunda estava ligada “a atitude de alinhamento com o governo de Washington na sua política de intervenção na América Latina; e a terceira era a disputa com o Reino Unido pela soberania dos três arquipélagos, as Ilhas Falklands/Malvinas, as Geórgias e Sandwich do Sul. Tendo em vista a precária situação em que assumiu a Argentina, Galtieri para fazê-los esquecer e se sustentar no poder, precisaria dar uma cartada de mestre, reconquistar as Ilhas Falklands/Malvinas (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 193). Antes de tomar a decisão pelo arquipélago, Galtieri examinou hipóteses de uma guerra com o Brasil ou Chile.49 No ano seguinte, em 1982 completaria 150 anos que o Reino Unido havia conquistado as ilhas, portanto uma reconquista antes dessa data elevaria o status de Galtieri a herói nacional. Ainda que o Reino Unido fosse uma das maiores potências 49

Fonte: Programa SBT Repórter, abril de 2012.

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militares, o objetivo argentino não parecia assim tão distante. Por anos eles tentaram o diálogo que por vezes foi ignorado pelos britânicos. A impressão que ficava era de que caso tomassem as ilhas, os britânicos não criariam dificuldades em reconhecer como fato consumado. A Argentina além disso acreditava na neutralidade dos EUA por causa de sua campanha anticomunista na América Latina, (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 194) ou ainda embasados no Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR),50 em que um ataque a qualquer Estado membro seria considerado um ataque a todos. Adiante falemos com mais profundidade acerca do TIAR. Por fim, a primeira ministra do Reino Unido, na época era Margaret Thatcher, os argentinos não previram que Thatcher, mesmo sendo mulher, poderia demostrar um espírito altamente belicoso (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 194). Nesse contexto Galtieri decide arriscar e em 02 de abril de 1982 parte para retomar as ilhas, mas, antes de falarmos sobre o conflito vejamos como estava o Reino Unido.

O REINO UNIDO ANTES DA GUERRA “As coisas vão piorar antes de melhorar”, assim disse Margaret Thatcher antes de se tornar primeira-ministra do Reino Unido em 1979. Figura emblemática para o mundo neoliberal, logo no início do seu governo declarou em entrevista que precisava de “vários mandatos” para cumprir com seus objetivos, para isso um período de 10 anos seria necessário para nas suas palavras: “encaminhar este país para uma nova direção e para modificar nosso modo de ver as coisas (...)” (GARFINKEL, 1987, p. 83, 87). Ao se ler a história dos governos Thatcher constataremos que teve um início conturbado no fim dos anos 70, porém, um fim com certo prestígio (GARFINKEL, 1987, p. 84), de fato, Thatcher consegue se eleger por três mandatos, 1979, 1983 e 1987, exercendo as funções de primeira ministra de 1979 até 1990.

50 O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, conhecido pela sigla TIAR, é um tratado de defesa mútua celebrado em 1947 na cidade do Rio de Janeiro entre diversos países americanos. O princípio central do acordo é que um ataque contra um dos membros será considerado como um ataque contra todos, com base na chamada "doutrina da defesa hemisférica".

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FIGURA 7: Primeira-Ministra do Reino Unido (1979 – 1990) Margaret Thatcher Discursa na Tribuna da ONU

Fonte: abcnews.go.com, 08/04/2013, on-line

Entre os anos de 1974 e 1979 o governo do Reino Unido enfrentava problemas para controlar a inflação e não conseguia reanimar a decadente economia britânica, em 1975 a inflação já atingia a casa dos 27%, 1,5 milhões de trabalhadores não tinham emprego e a indústria diminuía a produção. Os sindicatos pressionavam o governo, mas contudo precisavam agir em conjunto, como concordaram em não aumentar os salários foi possível conter a inflação a 9% em 1979, quando toma posse Margaret Thatcher (GARFINKEL, 1987, p. 9, 30 – 31). Thatcher havia prometido que restauraria a economia britânica, seu programa previa conter a inflação, enfraquecer o poder sindical, criar indústrias e incentivar o comércio, e isso levaria o país a um novo tempo de prosperidade, mas que só seria possível com o desmantelamento do Estado de bem-estar social, também conhecido como Welfare state.51 Thatcher dizia que “não pode haver liberdade sem uma economia livre”, com o mínimo de interferência estatal, por isso o Welfare state

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O Estado do Bem-estar social também é conhecido por sua denominação em inglês, Welfare State. Os termos servem basicamente para designar o Estado assistencial que garante padrões mínimos de educação, saúde, habitação, renda e seguridade social a todos os cidadãos. (EDUAÇÃO.UOL, )

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destruíra a autoconfiança, a iniciativa e tornava as pessoas preguiçosas (GARFINKEL, 1987, p. 10). Contrariando o discurso de Thatcher, nos seus três primeiros anos a prosperidade tão prometida parecia distante de chegar, o desemprego alcançava a marca dos 12,5%, o que representava a época pelo menos 3 milhões de trabalhadores, um número recorde de 10.000 empresas fecharam as portas, e a economia operava abaixo do governo anterior ao dela. Contudo, a Dama de Ferro, como Margaret Thatcher ficou conhecida após editoriais russos a apelidarem assim, continuava confiante, e friamente dava explicações ao parlamento que quando a livre concorrência fosse restaurada e os gastos do governo fossem diminuídos a economia iria se recuperar (GARFINKEL, 1987, p. 10, 51). A essa altura era exercida forte pressão do parlamento sobre a primeira-ministra, e as tensões aumentaram quando em 02 de abril de 1982 a Argentina envia tropas que invadem e instalam novo governo nas Ilhas Falklands/Malvinas, que até esse momento estava sob os cuidados da Dama de Ferro, que convocou sob caráter de emergência sessão do parlamento, e enquanto se encaminhava para o parlatório escutou: “Demita-se, demita-se!”, bradavam alguns membros do Parlamento. E os gritos vinham não só do Partido Trabalhista como do próprio Partido Conservador, ao qual a primeira-ministra pertencia. Um por um, os trabalhistas manifestavam sua cólera e sua crença de que aquela humilhação sofrida pela Grã-Bretanha era culpa do governo e de sua líder – Margaret Thatcher (GARFINKEL, 1987, p. 8).

Como já anunciado anteriormente, as coisas pioraram no início da gestão de Margaret Thatcher, entretanto a guerra das Ilhas Falklands/Malvinas significou para o Reino Unido um turning point, após a retomada das ilhas, Thatcher gozou de prestígio e conseguiu inclusive reeleger-se em 1983 (GARFINKEL, 1987, p. 84). No final do seu terceiro mandato Thatcher havia conseguido controlar a inflação e acelerou a valorização da moeda inglesa, contudo, na taxa de desemprego não houve melhora significativa. 52 A seguir falaremos dos dias de conflito, e dos fatos importantes que deram os rumos da guerra. Fonte: Brasil Escola. Disponível em: Acesso em: 14/11/2014.

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A Guerra de 1982 No ano de 1960, a ONU proclamou a necessidade de “pôr um fim ao colonialismo em todas as suas formas e manifestações” através da resolução nº 1514/1960.53 Cinco anos mais tarde, em 16 de dezembro de 1965 a Assembleia Geral da ONU adotou a resolução nº2065 sem votos contrários, inclusive o do Reino Unido, em que considerava o caso das Ilhas Falklands/Malvinas como um caso colonial, portanto convidava os países em disputa a negociarem uma solução para a soberania das ilhas (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 189 - 190). Em 1966, um grupo de 18 jovens armados, dentre eles apenas uma mulher, sequestraram o voo nº 648 das Aerolíneas Argentinas, após renderem o piloto, deram instruções para que mudasse o curso e se encaminhasse até as Ilhas Falklands/Malvinas. O ato foi batizado por eles de Operação Condor, que tinha como objetivo mínimo ser um ato simbólico, e objetivo máximo recuperar as ilhas. O mínimo eles conseguiram, fincaram bandeira argentina, cantaram o hino nacional e viraram notícia em todos os jornais. Três horas após o desembarque, os sequestradores se renderem em uma negociação mediada pelo padre Rodolfo Roel, e ficaram presos por 9 meses. O ato comoveu os argentinos e encorajou ainda mais as reivindicações de soberania do arquipélago.54

Declaração sobre a Concessão de Independência aos Países e Povos Coloniais. Fonte: < http://extra.globo.com/noticias/mundo/os-jovens-que-sequestraram-um-aviao-para-pousarnas-malvinas-4459208.html> Acesso em 31/10/2014 53 54

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FIGURA 8: Os Jovens que Sequestraram o Vôo nº 648

Fonte: extra.globo.com, 31/03/2012, on-line

Oito anos se passaram após a primeira resolução da ONU, em que convidavam os países ao diálogo, e até então não houve progresso satisfatório, assim, em 14 de dezembro de 1973 a ONU adota outra resolução, a de nº 3160, com teor similar a de 1960. Novamente não houve avanços, então em 1º de dezembro de 1976 a ONU se manifesta através da resolução nº 31/49, só que desta vez além de convidar os países ao diálogo como de praxe, pediu que nenhuma ação unilateral fosse tomada, pois isso seguramente prejudicaria o diálogo. A ONU parecia prever que algo aconteceria. (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 193). No próximo capítulo veremos como o direito internacional julga essas questões legais e também qual a capacidade de mediação por organismos internacionais. Outro fato emblemático aconteceu dias antes do conflito eclodir, em 19 de março de 1982 um comerciante de sucatas desembarcou nas ilhas Geórgias do Sul e hasteou bandeira argentina, logo Londres reagiu enviando o navio quebra-gelo HMS Endurance para pôr fim ao ato. Estava consumado o “detonante final da crise” (ETCHEPAREBORDA, 1983 apud BECK, 2013, p. 40). Por décadas o governo Argentino instava o Reino Unido a negociar a soberania das Ilhas Falklands/Malvinas, pautados também nas resoluções supracitadas, para os

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argentinos a causa era tratada como causa nacional, contudo Londres se esquivava sobre o pretexto de que os kelpers desejavam permanecer sob custódia britânica, de fato a Argentina acreditava que era realmente esse o motivo pelo qual os britânicos evitavam o diálogo (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 194). Como não estava dando certo o diálogo, e a ditadura argentina quase sucumbindo, Galtieri precisava de algo que unisse a população em um propósito e desviasse a atenção dos problemas internos os quais estavam vivendo, foi então que tratou de organizar a investidura (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 193). Até meados de 1981, os britânicos acreditavam que os argentinos não ousariam chegar as vias de fato para reaver as ilhas, como podemos ver pelo excerto extraído do site governamental das Ilhas Falklands: In July 1981, the British Joint Intelligence Committee reported that the most likely Argentine response to the lack of progress on sovereignty talks would be punitive economic measures against the Islanders (disrupting transport links, food and fuel supplies, or medical aid arrangements) or even to occupy uninhabited parts of the Falklands Islands Dependencies. 55

Contudo, alguns meses despois essa situação mudaria. Muitas das fontes consultadas afirmam que o serviço de inteligência britânica já havia enviado um alerta ao governo do Reino Unido informando-os de que os argentinos poderiam ter planos de ataque as ilhas (BECK, 2013, p. 38). Não somente o Reino Unido estava de olho nessa movimentação, mas também os americanos, veja o que disse Ronald Reagan, presidente dos EUA, que já havia sido alertado pelo seu serviço de inteligência: “Señor Presidente ‘señaló Reagan, tengo noticias confiables de que la Argentina doptará uma medida de fuerza em las islas Malvinas. Estoy, como usted comprenderá, muy preocupado por las repercusiones que uma acción de est tipo podría tener. Quiero manifestarle, señor Presidente, la preocupación de los Estados Unidos y la necessidade de que se encuentre uma alternativa al uso de la fuerza” (apud AZAMBUJA, 1988, p. 178). Tradução livre: Em julho de 1981, o Comitê da Junta de Inteligência Britânica reportou que a resposta argentina mais provável para a falta de progresso nas negociações de soberania seriam medidas econômicas punitivas contra os ilhéus (interrompendo linhas de transportes, abastecimento de comida e combustível ou assistência médica) ou mesmo a ocupação das partes desabitadas das dependências das Ilhas Falklands. (FALKLANDS GOVERNMENT, Acesso em: 31/10/2014)

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Entretanto, o pedido da ONU e de Reagan de não tomarem medidas unilaterais não foi atendido, Galtieri estava decidido. De acordo com Duarte (1986, p. 84) o governo militar havia estabelecido uma comissão de trabalho, e que após análises esboçou ser viável a tomada através da força, partindo de duas hipóteses básicas: a) Após estar consumada a tomada das ilhas, o Reino Unido não reagiria com força bélica máxima, iria usar de sanções econômicas e militares de pequena envergadura, somente para “manter as aparências”. b) Acreditaram que receberiam apoio dos EUA, ou que pelo menos permaneceria neutro. E assim, em 28 de março, a força tarefa encarregada da invasão, que ficou conhecida como “operação Azul”, começou a se movimentar, informando oficialmente que saíra para participar de exercícios militares em Montevidéu. Os radares norteamericanos logo detectaram a movimentação, e prontamente avisaram Londres através do seu adido militar. Moscou também já havia detectado o deslocamento da esquadra. Essa preciosa informação serviu aos ingleses para organizar um modo de defesa, ainda que não fossem muitas as provisões das quais dispunham, contudo, isso eliminou o fator surpresa na empreitada argentina, tanto que o Governador Hunt determinou aos seus liderados que não combatessem na cidade, para salvaguardar a vida dos habitantes (DUARTE, 1986, p. 86 – 90). Em 2 de abril de 1982, por volta das 00h30min, cerca de três mil argentinos desembarcam nas ilhas, logo após dominarem a pequena resistência que ofereceram os Royal marines56, outros nove mil soldados ocuparam diversas ilhas do arquipélago. Restaram duas opções ao Governador Hunt, continuar a lutar até a morte do último homem, uma opção suicida, tendo em vista que o efetivo argentino era muito maior, ou poderia render-se e aguardar que Londres reagisse enviando reforços, ele optou pela segunda considerando que não adiantava o sacrífico de vidas (DUARTE, 1986, p. 92 – 93). Os argentinos logo trataram de organizar a cerimônia de rendição, para dar posse ao novo governador das Ilhas Falklands/Malvinas, o General Oswaldo Garcia, que a partir daí exerceria a função (DUARTE, 1986, p. 93).

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Fuzileiros Navais da Coroa Britânica

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Buenos Aires tratou de embarcar com destino a Londres todos os prisioneiros militares do Royal marines, incluindo o governador Hunt e sua esposa, mas antes, fizeram algumas fotos dos prisioneiros sendo rendidos e revistados, como na figura 9. Os britânicos acharam ultrajante as imagens, que logo rodaram o mundo através da imprensa, isso fez com que uma reação política e armada fosse mais aceitável (DUARTE, 1986, p. 94). FIGURA 9: Soldados Britânicos Rendidos

Fonte: fotosdomundo.com.br, s/d, on-line

Já pela manhã do dia 02 de abril, a Casa Rosada e a Plaza de Mayo foram tomadas pelo povo argentino, que levavam faixas e bradavam gritos de ordem em comemoração a conquista (DUARTE, 1986, p. 94).

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FIGURA 10: Argentinos em Comemoração na Plaza de Mayo

Fonte: theatlancic.com, s/d, on-line

No dia seguinte a invasão, em 03 de abril, Margaret Thatcher mesmo pressionada pelo parlamento por problemas internos, convocou a Câmara dos Comuns e imediatamente se pronunciou sobre a invasão, teve postura firme e defendeu que as ilhas deveriam ser retomadas, obteve apoio unânime na câmara (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 194 - 5). Ainda em 3 de abril, tendo sido levado os fatos perante o Conselho de Segurança da ONU, organismo criado no intuito de manter a paz, emitiu a resolução nº 502, em que determinava o imediato fim das hostilidades, a retirada das tropas argentinas do arquipélago e convoca os países beligerantes ao diálogo. A resolução teve somente um voto contra, o do Panamá, abstiveram-se URSS, China, Espanha e Polônia (AZAMBUJA, 1988, p. 180). Em 5 de abril, após o Peru declarar apoio aos argentinos,57 Thatcher despachou uma força tarefa que saiu em direção ao arquipélago, o excerto abaixo demonstra a grandiosidade do evento:

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Infográfico Anexo – www.infografiasos.wordpress.com

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Suas belonaves sulcam as águas do Atlântico no rumo das Malvinas ou das Falkland Islands, das quais fora despojada. São cerca de 100 naves de guerra, de composição heterogênea, composta do portaaviões Hermes, Insígnia, do Invencible, fragatas, contratorpedeiros, submarinos atômicos, transportes de tropas, cruzadores, destroieres, cargueiros, petroleiros, arrastões e rebocadores. Observada das alturas, constituía um espetáculo inédito. Aquelas proas, vigorosas e revestidas de aço, são como aguilhões a romper as águas que os aliseos agitam com seu sopro equinocial. Um rastro ondulante de espuma vai espalhando-se por sobre a imensidão. Um espetáculo majestoso ver assim aqueles titans dos mares cabecearem, indômitos, destemíveis, convictos de seu poderio, invencíveis. A seu bordo, aviões, helicópteros, tanques e reforços de desembarque [sic] (AZAMBUJA, 1988, p. 183).

O infográfico a seguir mostra uma comparação entre as forças disponibilizadas por cada um dos países: FIGURA 11: Infográfico Comparativo das Forças Disponibilizadas

Fonte: afp.com, s/d, on-line

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A força britânica era incrivelmente superior a força dos argentinos, além da falta de recursos para combate, os soldados argentinos foram torturados por oficiais inseguros, e alguns combatentes se mutilaram para não combater até o fim,58 a ditadura argentina chegou a enviar rapazes totalmente despreparados para lutarem.59 Logo após o Reino Unido despachar sua força tarefa, Thatcher declara como “zona de guerra” ou de exclusão marítima, toda área de 321 km ao redor do arquipélago, por esse motivo, qualquer embarcação argentina, mesmo que fosse mercante, seria considerada hostil e tratada como tal caso ultrapassasse o estabelecido (AZAMBUJA, 1988, p. 181).

O Envolvimento de EUA e Sul-Americanos Segundo Valério e Hentz, (2013, p.195) o presidente norte-americano Ronald Reagan colocou como intermediário entre Londres e Buenos Aires seu Secretário de Estado, Alexander Haig, entretanto, foi algo só “de fachada”; Prentice (2012) e Pisani (2013) destacam que a suspeita de que Washington jamais foi imparcial na disputa pode ser comprovada por documentos revelados recentemente (PRENTICE, 2012; PISANI, 2013 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195). De fato, os EUA assumem um lado, condenam a invasão e disponibiliza ao Reino Unido sua base na Ilha de Ascensão, que está localizada na metade do caminho entre a Inglaterra e as Ilhas Falklands/Malvinas, além disso no fim de abril declaram que responderiam a qualquer demanda de material militar feita pelo Reino Unido (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195). No caso do Brasil, documentos de cunho confidencial60 que foram recentemente liberados pelo Itamaraty e Conselho de Segurança Nacional revelam que o Brasil encobriu pousos de aeronaves provenientes da Líbia e Israel, e que estavam carregadas de armamentos, e tinham como destino a Argentina, para equipar suas forças. Ainda que o governo de João Batista Figueiredo tentasse manter-se neutro, ou pelo menos aparentar, muitas vezes ficava claro a preferência pelo país sulamericano. A correspondência do Reino Unido com o Brasil revela inclusive que os

Fonte: SBT Repórter, abril de 2012. Fonte: Programa Painel da Globo News, abril de 2012. 60 Relatório nº 011.650 do Serviço Nacional de Informação (SNI) referente as correspondências secretas entre o Ministério das Relações Exteriores e o Presidente Figueiredo. 58 59

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dois países beiraram um problema diplomático por causa da inclinação brasileira a causa argentina: “à luz das antigas e amistosas relações entre o Reino Unido e o Brasil, o governo de Sua Majestade Britânica acredita ter o direito de esperar tratamento equilibrado na atual situação de crise. Nesse contexto, tem conhecimento de que aviões militares argentinos e outras aeronaves utilizaram e continuam utilizando aeroportos brasileiros ao transportarem equipamento militar para uso pela Argentina” (BELISÁRIO, 2010 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195).

O Peru foi o sul-americano menos ambíguo em suas manifestações, logo no início do conflito declarou abertamente seu apoio aos Argentinos, que não limitou-se apenas em palavras, teria o Peru também enviado armamentos e remédios aos argentinos (RUNDSTEDT, s/d, s/p). O Chile secretamente ajudou o Reino Unido, revelou o General Matthei, que era membro da Junta Militar Chilena, além de fornecer bases chilenas para que os britânicos estabelecem centro de operações, os chilenos permitiram que aviões britânicos usassem insígnias chilenas para que pudessem sobrevoar a região da Patagônia (RUNDSTEDT, s/d, s/p). As outras nações, incluindo o Brasil, limitou-se a generalizadas manifestações de pedidos de paz e solidariedade diplomática (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196). Contudo, muitas coisas ainda virão à tona, tendo em vista que o Reino Unido estabeleceu que somente em 2082 os documentos secretos e relatórios do conflito poderão ser divulgados (RUNDSTEDT, s/d, s/p). Seguramente o envolvimento desses países significaram muito para ambos os beligerantes, todos os dois tiveram algum tipo de ajuda que foi importante para os resultados do conflito, destaco a Ilha de Ascensão que serviu de base para os britânicos e a ajuda do Peru com armamentos e remédios. Outro fato importante foi a não efetivação do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), em que os EUA deram primazia a outro tratado que tinham com os países do Atlântico Norte.61 Falaremos de maneira aprofundada no capítulo 3.

O tratado ao qual me refiro é a OTAN - Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), é uma aliança militar intergovernamental instituída em 1949. A organização constitui um sistema de defesa coletiva através do qual seus Estados-membros concordam com a defesa mútua em resposta a um ataque por qualquer entidade externa à organização. 61

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A Intensificação dos Combates No dia 30 de abril, o Reino Unido dá início a operação “Black Buck”,62 consistia no envio de aviões modelo Vulcan63 carregados de bombas para destruir a pista de pousos e decolagens da capital Port Stanley, para que não fosse possível que aviões argentinos levantassem voo para ataque da armada britânica que sitiava o arquipélago (GIORDANI, 2014).64 Um fato curioso envolvendo a Força Aérea Brasileira (FAB) aconteceu durante o retorno de um bombardeiro inglês Vulcan, que por problemas mecânicos não pode ser reabastecido em voo depois de um ataque a Port Stanley, o piloto pediu um pouso de emergência no Rio de Janeiro, e foi escoltado por caças da FAB ao penetrar no espaço aéreo brasileiro, quando já beirava o aeroporto do Galeão: “Um controlador que falava inglês norte-americano entrou na linha e disse: ‘Você está vendo a pista à sua frente?'; eu respondi: `Sim’. Ele disse: ‘Se você estiver com quantidade crítica de combustível, tem permissão para pousar nela.’ Naquele momento, nós estávamos com quantidade crítica de combustível: os instrumentos mostravam cerca de 1 400 kg, e um Vulcan necessita de quase 1 200 kg para efetuar o circuito de pouso. Em outras palavras, se nós errássemos a primeira aproximação, cairíamos, sem dúvida” (GIORDANI, 2014).

Infográfico Anexo – www.infografiasos.wordpress.com Notável bombardeiro tático a baixa altura. 64 O artigo completo pode ser encontrado através deste link: http://www.cavok.com.br/blog/?p=78715 62 63

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FIGURA 12: Bombardeiro Vulcan no Aeroporto do Galeão

Fonte: cavok.com.br, s/d, on-line

O Vulcan foi devolvido a Inglaterra sem o míssil que transportava, e após o armamento ter sido desmontado, pode ter fornecido informações importantes a indústria bélica brasileira, contudo, oficialmente essa informação não se confirma.65 A Argentina havia sido avisada sobre a zona de exclusão, por isso a Inglaterra “tomaria quaisquer medidas suplementares que fossem necessárias para exercer seu direito de autodefesa”, após o cruzador General Belgrano traspassar várias vezes a linha de guerra, Thatcher resolve autorizar o ataque, pautada pelo artigo 51 da carta da ONU (AZAMBUJA, 1988, p. 185), ainda que o navio no momento não estivesse dentro da zona de guerra.66 Foi então que em 2 de maio a guerra das Falklands/Malvinas vive um dos seus episódios mais importantes e mortal, quando o submarino de propulsão nuclear Conqueror dispara um torpedo contra o único

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Fonte: SBT Repórter, abril de 2012. Infográfico Anexo – www.infografiasos.wordpress.com

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cruzador da armada argentina, o navio General Belgrano, que era remanescente do ataque a Pearl Harbor em 1941, que a Argentina comprou dos EUA; após 50 minutos o navio afunda, e apesar dos socorros, morreram 338 soldados argentinos, ou seja, pouco mais da metade dos que morreriam durante todo o conflito (AZAMBUJA, 1988, p. 185). FIGURA 13: Posição do General Belgrano no Momento do Ataque

Fonte: laperlaaustral.com.ar, s/d, on-line

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FIGURA 14: Cruzador General Belgrano

Fonte: theatlantic.com, s/d, on-line

O cruzador argentino estava sendo escoltado por dois destroieres quando foi atingido, o Hipólito Bouchard e Piedra Buena (AZAMBUJA, 1988, p. 185), contudo, não foram atacados, segundo o Ministro da Defesa Britânico, John Nott, estes dois serviriam para recolher os tripulantes do cruzador (DUARTE, 1986, p. 368). Em Londres: A Primeira-Ministra Margareth Thatcher lamentou profundamente, em pronunciamento na Câmara dos Comuns, a perda de vidas humanas no Atlântico Sul, numa referência ao afundamento do Cruzador argentino, General Belgrano, mas assinalou que o primeiro dever britânico é proteger e minimizar o perigo contra os militares que integram a força britânica. Disse “Se tivéssemos deixado para (atacar) depois, poderia ter sido muito tarde e eu viria à Câmara dos Comuns para informar a perda de um de nossos navios” (o pronunciamento fora feito pouco antes da perda do destroier Sheffield) (DUARTE, 1986, p. 368).

Portanto, o ataque ao cruzador argentino foi uma ação de defesa, pois, segundo afirmam os britânicos, se navegassem mais algumas horas poderiam colocar em risco

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os navios britânicos, devido ao alcance dos mísseis que transportavam no cruzador e nos destroieres que faziam a escolta (DUARTE, 1986, p. 369). A Argentina não tardou em responder, esboçando inclusive uma reação, em 4 de maio, mísseis exocet de fabricação francesa foram disparados e destruíram o mais moderno navio da armada britânica, o Destroyer HMS Sheffield, que dias depois afundou. O preço a ser pago pelo Reino Unido pelo incidente foi a morte de 20 homens e outros 24 ficaram feridos, além do próprio navio que naufragou (DUARTE, 1986, p. 374). Foi então que Margaret Thatcher pressionou o presidente francês para ter o código de desativação ou ela atacaria Buenos Aires.

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A França impôs um bloqueio

a venda de armas a Buenos Aires, o que fez com que os argentinos não pudessem mais comprar os mísseis na fábrica, teria então que apelar para o mercado negro.68 Quem mandou dois aviões cheios de armamento foi o ditador da Líbia, Muamar Kadafi, Leopoldo Galtieri retribuiu com frutas frescas e cavalos de raça argentinos. 69

Fonte: SBT Repórter, abril de 2012. Fonte: Jornal Nacional exibido em Maio de 1982 69 Fonte: SBT Repórter, abril de 2012. 67 68

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FIGURA 15: Destroyer HMS Sheffield em Chamas

Fonte: defesanet.com.br, s/d, on-line

Em Londres a imagem negativa de Margaret Thatcher começou a mudar, devido a sua postura firme diante da situação e o ímpeto pelo qual se movia, Kersaudy (2007) destaca que a muitos ela parecia ser “o único homem do governo”, e que logo entenderiam o porquê de ser chamada de “a Dama de Ferro” (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195). Em 6 de maio, dois dias após ao ataque ao HMS Sheffield, a ONU se manifesta pedindo a retirada imediata das forças dos dois países para o início das negociações. No dia seguinte Londres amplia a linha de guerra para somente 22 km do litoral continental argentino, e no dia 10 informa uma zona de exclusão marítima de 185 km ao redor da Ilha de Ascenção.70 A partir do fim de maio os britânicos decidiram que era o momento de sair dos navios e garantir posições em terra, para que isso fosse possível, detectaram que a 70

Infográfico Anexo

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baía de São Carlos que ficava a Oeste da capital Port Stanley parecia propícia ao desembarque, pois o local não estava minado e pouco protegido pelos argentinos, que esperavam que o desembarque fosse feito diretamente em Port Stanley. Logo então, em 21 de maio desembarcaram cerca de 3400 Royal marines71 que tinham a missão de se consolidarem do lado oeste da ilha antes de seguirem 100 km a leste até Port Stanley, entre os dias 21 e 29 houveram intensos combates e baixas dos dois lados (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196), os argentinos não puderam conter o avanço dos britânicos, o General Menéndez, governador provisório comentou sobre aqueles penosos dias de luta: “Foi o de Darwin (região localizada a oeste de Port Stanley) um combate realmente duro, muito prolongado, nele se foi trocando espaço por tempo, até que não se pôde mais” (DUARTE, 1986, p. 527). Em 26 de maio a ONU adotou a resolução nº505, em que obrigava os beligerantes a cooperarem com o então secretário geral, Javier Pérez De Cuellar, nos esforços de achar fim ao conflito. Dois dias depois, em 28 de maio: Reuniram-se na sede da organização dos Estados Americanos, em Washington, os chanceleres dos 21 países membros do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca. Foi aprovada uma resolução com 17 votos a favor e 4 abstenções – representadas pelos votos dos EUA, Colômbia, Chile e Trinidad-Tobago – condenando o ataque do Reino Unido à Argentina e solicitando aos estadunidenses que cessassem sua assistência militar aos britânicos. Para completar, autorizou os países latino-americanos a ajudar os argentinos; ou seja, a decisão deixou uma porta aberta para uma ação coletiva contra o Reino Unido. Isso não chegou a concretizar-se e o apoio ficou em generalizadas expressões de solidariedade diplomática (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196).

Os britânicos continuaram a avançar até que reduziram a posição argentina a capital Port Stanley (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196), segundo o General Menéndez, a cidade estava preparada para resistir em 360º, ou seja, estava pronta para ataques vindos do mar e terra, a manutenção da área “a qualquer preço” foi julgada de vital importância porque era o objetivo definitivo do inimigo e também porque era a ligação com o continente (DUARTE, 1986, p. 581).

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Infográfico Anexo

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A Capitulação da Argentina Em 14 de junho era travado o combate final desta guerra, regras de combate militar preconizam que o avanço de tropas deve acontecer quando se tem três contra um, contudo nesse dia, o exército real decidiu ignorar essa regra, e avançou com um contingente de 4500 homens contra 12000 argentinos, parecia uma missão suicida, mas não, como já destacamos anteriormente, os argentinos além de estarem despreparados estavam mal equipados. Foi então que o General Menéndez hasteou bandeira branca e os britânicos fizeram os 12000 prisioneiros (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196). Cinco dias após a rendição argentina, os soldados britânicos começaram a ser enviados de volta ao Reino Unido, tiveram tantas honrarias, atenção e cuidados que deixaram os prisioneiros argentinos que assistiam a tudo aquilo sem palavras (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196).

FIGURA 16: Prisioneiros de Guerra Argentinos

Fonte: floresdeumdeserto.blogspot.com, s/d, on-line

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Ainda em 14 de junho desembarcou em Port Stanley o Brigadeiro Wilson que logo se pronunciou, segundo Duarte (1986): “É um esplêndido sentimento que, após esta longa e dura série de combates nesta ilha, em uma região tão distante e inóspita, viria a ter fim esta campanha. Não há dúvida que os homens, contra os quais lutamos, foram corajosos, soldados competentes, muitos dos quais morreram nos seus postos. Nós perdemos uma triste quantidade de homens.”

A partir de então era questão de tempo até a Argentina se pronunciar oficialmente sobre o fim das hostilidades, ou isso poderia custar a vida de milhares de prisioneiros de guerra, que nas palavras do Contra-Almirante John Woodward estavam “com problema de hipotermia, má nutrição, congelamento dos pés, diarreia provocada pela má alimentação, água pura e instalações sanitárias adequadas” [sic] (DUARTE, 1986, p. 650). Diante das circunstâncias, Menéndez propõe a Galtieri que aceite a proposta britânica, que consistia em aplicar a resolução nº 502 da ONU, que punha fim as hostilidades e dava início a um processo de diálogo, profundamente abalado Galtieri autoriza a negociação. O representante da Real Armada, Rose, organiza com o comando da Força Aérea Argentina as diretrizes da capitulação. Enquanto isso, a bordo do Navio Fearless, chegava o comandante das forças britânicas de terra, o General Jeremy Moore, com ele estava ao documento de rendição, que sem a presença da imprensa foi assinado em 14 de junho de 1982 (AZAMBUJA, 1988, p. 209 – 210).

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FIGURA 17: Termo de Rendição da Guarnição Geórgia do Sul Sendo Assinado

Fonte: fotosdomundo.com.br, s/d, on-line

Chegava ao fim mais um episódio da tão conturbada reinvindicação argentina sobre o arquipélago. Naquele mesmo dia o General Moore se pronunciou em frente a Casa da Governação: “Em Port Stanley, a las 9 de la noche hora local del 14 de junio de 1982, el general Menéndez me rindió todas las fuerzas argentinas de la East y la West Falkland, junto com su impedimenta. Se están haciendo arreglos para reunir todas sus armas y petrechos y para marcar y poner a buen resguardo sus municiones. Las Islas Falkland están uma vez más ajo el gobierno deseado por sus habitantes. Dios Salve a la Reina” (apud AZAMBUJA, 1988, p. 210).

Como resultado da derrota, Galtieri foi destituído, e a crise na Argentina se agravou ainda mais, a perda da guerra instalou uma crise nos governos militares e abriu portas para a democracia. Thatcher que antes tinha “o poder na corda bamba” gozou de prestígio pelo pulso firme em que conduziu a situação, e foi reeleita para primeira-ministra (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196).

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No próximo capítulo veremos quais as razões que fizeram com que o TIAR não fosse eficaz e tivesse grande implicação na derrota argentina. Veremos também algumas questões na perspectiva do direito internacional, recorrendo aos fatos históricos do arquipélago, bem como cruzaremos argumentos e contra-argumentos dos países em disputa no intuito de ver quem melhor tem fundamentação para reivindicar a soberania do arquipélago. Analisaremos o princípio de autodeterminação dos povos e sua aplicabilidade para o caso das Falklands/Malvinas, tem em vista que é este hoje o principal argumento britânico para reivindicação do arquipélago.

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CAPÍTULO 3 3. Um Passado Contestado e um Futuro Incerto No capítulo anterior vimos um pouco da história de Argentina e Reino Unido anterior a época em que eclodiu o conflito. Vimos que a Argentina enfrentava na década de 70 pela sexta vez um regime ditatorial, e atravessava uma grande crise econômica. Em 1981 o então presidente da Junta Militar Argentina era Leopoldo Galtieri, que tinha no âmbito das relações exteriores três assuntos importantes que absorviam sua atenção, o primeiro era o entrave com o Chile pela posse das ilhas Lennox e Nueva, o segundo estava ligado “a atitude de alinhamento com o governo de Washington na sua política de intervenção na América Latina, e o terceiro era a disputa com o Reino Unido pela soberania dos três arquipélagos, as Ilhas Falklands/Malvinas, as Geórgias e Sandwich do Sul. Foi quando que em 1982, quase ao ponto de sucumbir o regime, Galtieri decidiu partir para a reconquista das Malvinas, como forma de impedir a destituição da Junta Militar, e talvez passar para a história argentina como herói nacional (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 193). O Reino Unido também vivia na década de 70 momentos conturbados em sua economia, o governo enfrentava problemas para controlar a inflação e não conseguia reanimar a decadente economia britânica. A primeira ministra eleita em 1979, Margaret Thatcher, havia prometido que restauraria a economia britânica, seu programa previa conter a inflação, enfraquecer o poder sindical, criar indústrias e incentivar o comércio, segundo Thatcher, isso levaria o país a um novo tempo de prosperidade, que só seria possível com o desmantelamento do Estado de bem-estar. Contudo, a fórmula dava sinais de que não estava funcionando após seus três primeiros anos de governo, a essa altura já era exercida forte pressão do parlamento sobre a primeira-ministra, as tensões só aumentaram quando em 02 de abril de 1982 Galtieri toma as Ilhas Falklands/Malvinas através da força (GARFINKEL, 1987, p. 9, 30 – 31). A ONU acompanhou ativamente o conflito, contudo, não teve atuação eficaz para os resultados da guerra, vimos que apesar de inúmeras resoluções adotadas antes e durante a guerra, os países não cumpriram com suas demandas, que eram

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basicamente iniciar e manter um diálogo sobre a soberania do arquipélago, e o fim das hostilidades durante o conflito. Já a participação de outros países teve mais influências para o resultado do conflito, vimos que a participação dos EUA ao fornecer bases e equipamentos para uso militar do Reino Unido, melhorou as condições para a vitória britânica, como no caso do uso da Ilha de Ascenção como base de operações. O Chile também teve papel preponderante ao permitir que os britânicos usassem bases em seus territórios e voassem em aviões britânicos com insígnias chilenas (RUNDSTEDT, s/d, s/p). O Peru logo no início do conflito declarou abertamente seu apoio aos Argentinos, que não limitou-se apenas em palavras, teria o Peru também enviado armamentos e remédios aos argentinos (RUNDSTEDT, s/d, s/p). O Brasil encobriu pousos de aeronaves provenientes da Líbia e Israel que estavam carregadas de armamentos, e tinham como destino a manutenção do exército argentino (BELISÁRIO, 2010 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195). O combate durou 74 dias, e teve fim com a capitulação argentina em 14 de junho. Como resultado da derrota, Galtieri foi destituído, e a crise na Argentina se agravou ainda mais (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 196). Em Londres a imagem negativa de Margaret Thatcher melhorou, devido a sua postura firme diante da situação e o ímpeto pelo qual se moveu. Kersaudy (2007) destacou que a muitos ela pareceu ser “o único homem do governo”, tal situação eternizou a ela cognome “Dama de Ferro” (KERSAUDY, 2007 apud VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 195). Neste capítulo analisaremos o papel do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), devido a importância do tratado como uma das bases que convenceu Galtieri partir para o conflito, bem como para o resultado dele, trataremos sobre seus objetivos e sua aplicabilidade, e tentaremos entender o motivo pelo qual os EUA não efetivaram seu apoio aos argentinos. Abordaremos ainda os vários argumentos históricos e jurídicos em que os países se fundamentam para legitimar sua soberania sobre o território, veremos também como cada um faz sua contestação das teses aplicadas por eles. Frequentemente ao se tratar sobre as Ilhas Falklands/Malvinas, um dos primeiros questionamentos que vem em mente é, “porque um país tão distante possui um território no Atlântico Sul, sendo que a Argentina está muito mais próxima”? Existe uma teoria chamada “teoria da proximidade geográfica” que defende que o território é

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argentino pela proximidade com as terras continentais. Portanto, veremos como o direito internacional trata essa questão. Por fim trataremos sobre o princípio de autodeterminação dos povos, princípio este consagrado pela ONU no ano de 1960, que preconiza que “todos os povos têm o direito à sua autodeterminação [...]”. O principal argumento britânico para reivindicação do arquipélago está fundamentado neste princípio. Veremos como a comunidade internacional e a Assembleia Geral da ONU trata essa questão, quanto a sua aplicabilidade no caso das Ilhas Falklands/Malvinas, e também como a Argentina contesta o princípio (FINO; PEZZANO, 2012, p. 19). Este capítulo é importante do ponto de vista que, elucida uma séria de questões que concernem ao fracasso do TIAR, além de aglutinar os principais argumentos utilizados pelos países em disputa, tenta ainda apontar as contradições no argumento utilizado pelos britânicos sobre a autodeterminação dos povos. Ao ler o capítulo 3, o leitor terá uma dimensão aprofundada das causas do conflito, terá uma noção do papel das Nações Unidas até a atualidade e poderá elucubrar sobre o futuro do caso.

O Fracasso do TIAR No capítulo 2 mencionamos o TIAR como uma dos elementos que embasaram a decisão da Junta Militar argentina em invadir as Ilhas Falklands/Malvinas, durante o levantamento histórico dos fatos que precederam e que deram fundamentação as ações dos Estados envolvidos, constatamos o TIAR como elemento de vital importância para os resultados da guerra, por esse motivo vejamos agora de maneira mais detalhada o que é o TIAR, e os motivos pelos quais não permitiram que ele se consolidasse como instrumento de defesa dos americanos . O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), é um tratado de defesa coletiva, foi celebrado em 02 de setembro de 1947 na cidade do Rio de Janeiro entre diversos países americanos. O princípio central do acordo é que um ataque contra um dos membros será considerado como um ataque contra todos.72

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Princípio Expresso no Tratado. O texto pode ser facilmente encontrado na internet.

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Como vimos no capítulo 2, os argentinos acreditaram que os EUA se manteria neutro, pois, os países viviam um momento de aproximação e os EUA estava no ataque para tentar acabar com o avanço de ideias e regimes comunistas na América Latina (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 194), lembrando que o contexto era ainda o da Guerra Fria. Além disso, estariam “resguardados” pelo TIAR, como destaca Azambuja (1988, p. 189), informando que o embaixador argentino invocou o TIAR logo após a tomada das ilhas, pautando-se nos artigos 6º e 13º, pois já estavam diante da iminente possiblidade de agressão do Reino Unido, visto que já havia sido decido por Thatcher que seria enviada uma força tarefa até as Ilhas Falklands/Malvinas, de fato isso logo aconteceu. Segundo o texto do tratado “o uso da força armada contra a soberania, integridade territorial e a independência de outro Estado, envolve o conceito de agressão, pondo, em consequência, cada um de seus signatários ao respaldo ou proteção de todos.” Azambuja (1988, p. 191) afirma que “existem dois pressupostos básicos para a invocação do TIAR: primeiro, o país que recorrer a ele, deve ser democrático e respeitar os direitos: segundo, observa-se quem atacou primeiro. “A julgar por essas duas afirmativas percebe-se que a Argentina moveu-se sob circunstâncias nada favoráveis, pois, vivia sob o governo de uma Junta Militar que destituiu a presidente constitucional, ou seja, não estava sob comando de um regime democrático, e segundo, quem atacou primeiro foi a Argentina, mesmo sob pedido da ONU nas resoluções nº 1514/1960, 2065/1965, 3160/1973 e 3149/1976. O tratado é tipicamente defensivo: diz que um ataque a um Estado americano obriga que as partes façam frente a este ataque, no exercício de legítima defesa. No caso das Malvinas, a iniciativa militar foi da Argentina, país que decidiu tomar o arquipélago pela força (MORALES, 2012 apud BECK, 2013, p. 49).

Os EUA também sustentaram essa ideia, Reagan após culpar o governo argentino pelo incidente disse: Devemos lembrar que a agressão partiu da Argentina nessa disputa pela soberania daquele pequeno pedaço de terra coberto de gelo, e eles finalmente recorreram à agressão armada. Acho que o princípio que todos devemos seguir é o de que não se pode permitir que uma agressão armada desse tipo, tenha sucesso (DUARTE, 1986, p. 211 212).

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Beck (2013, p. 49) resume o pensamento brasileiro acerca do fracasso do TIAR, não era possível que se concretizasse o respaldo do TIAR aos argentinos, principalmente em decorrência de problemas de natureza política, que seria a resistência dos EUA. O Jornal do Brasil em 4 de julho de 1982 fez uma análise do TIAR, publicou que: Durante 35 anos o TIAR foi apresentado aos povos latino-americanos como um instrumento de defesa do hemisfério e de segurança coletiva, contra a “agressão ou ameaça de agressão externa.” Foi, portanto, com surpresa e até aturdimento que muita gente percebeu o emperramento do TIAR na crise recente das Malvinas/Falklands. Descobriu-se de repente que o TIAR não funcionaria, a não ser que os Estados Unidos patrocinassem ou apoiassem decididamente uma resolução de apoio à Argentina, em seu conflito com a Inglaterra. Descobriu-se de repente também a falência do sistema interamericano enquanto uma comunidade de interesses comuns face a outro sistema regional (OTAN),73 este muito mais importante do ponto de vista da grande potência do Norte (JORNAL DO BRASIL, 1982 apud DUARTE, 1986, p. 216).

Concluindo a reflexão acerca do TIAR, Duarte (1986, p. 216) destaca que após um exame mais aprofundado sobre as circunstâncias em que nasceu o TIAR, historiadores concluíram que o tratado não servia tanto a defesa hemisférica contra agressões externas, mas, significava principalmente a consolidação dos Estados Unidos como liderança político-militar sobre o conjunto de americanos.

Argumentos Históricos, Jurídicos e Contestação Muitos são os argumentos dos países em disputa para justificar os porquês de cada um ter o direito sobre as Ilhas Falklands/Malvinas, como vimos nos capítulos anteriores, são argumentos de natureza política, econômica, cultural, jurídica e histórica.

Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), é uma aliança militar intergovernamental instituída em 1949. A organização constitui um sistema de defesa coletiva através do qual seus Estados-membros concordam com a defesa mútua em resposta a um ataque por qualquer entidade externa à organização. 73

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Muitos estudiosos têm investido tempo para entender, buscar e até mesmo criar argumentos para sustentar a fundamentação dos países em suas reivindicações. Para que a cientificidade seja privilegiada é necessária atuação com imparcialidade, entretanto, o que se nota é que, quando consultados fontes argentinas, as construções argumentativas são sempre justificando as aspirações nacionais, quando se



os

textos

produzidos

por

autores

britânicos

acontece

o

mesmo

(ETCHEPAREBORDA, 1983 apud BECK, 2013, p. 57 -8). Os argentinos têm muitos argumentos de cunho histórico nos quais se apegar, ainda que os britânicos não os levem tanto em consideração. O arquipélago está localizado no interior de uma antiga linha de demarcação, que de acordo com as bulas pontifícias “Inter Coetera”74 e “Dudum siquidem”, que posteriormente foram complementadas pelo Trado de Tordesilhas (1494) com Portugal, poderiam navegar somente

os

Espanhóis

e

ou

outros

navegadores

com

autorização

(ETCHEPAREBORDA, 1983, p. 32). É importante salientar sobre os processos de descobrimento e possessões coloniais das Américas, que doutrinas de caráter religioso-espiritual e as provenientes do direito romano, que regiam as relações a época, vão sendo substituídas por doutrinas de relações interestatais, pela formação do novo sistema europeu de poder. Com os tratados da Vestfália em 1648, novos princípios passam a reger o sistema colonial, que passa a primar pela ocupação efetiva como substância para posse e navegação pelos mares. Nesse sentido o Argentina defende que a Espanha tinha primazia

ao

ocupar

primeiro

o

território

em

nome

de

um

soberano

(ETCHEPAREBORDA, 1983, p. 33 - 4). Beck (2013, p. 56) afirma que “outro argumento argentino baseado em fatos históricos é a presença incontestada da Espanha e da Argentina no arquipélago:” Os argentinos destacam que entre 1774 e 1829 ocorreu um extenso período de silêncio e desinteresse britânico, no qual, primeiramente a Espanha e, logo após, “sua herdeira” (Argentina) tiveram a tranquila possessão das ilhas. Nesse período, vinte governadores administraram a possessão, que também serviu de presídio, o qual proporcionava, ao mesmo tempo, mão-de-obra à população. Na mesma época, aumentou consideravelmente a presença de navios pesqueiros e lobeiros, principalmente norte-americanos, o que tornou Inter Coetera - Assinada pelo Papa Alexandre VI , o documento estabelecia que o chamado "novo mundo" seria dividido entre Portugal e Espanha, através de um meridiano situado a 100 léguas a oeste do arquipélago do Cabo Verde: o que estivesse a oeste do meridiano seria espanhol, e o que estivesse a leste, português. 74

85

mais difícil o papel da pequena guarnição espanhola. Também foi aumentando a população e estenderam-se as construções de Porto Soledad (BECK, 2013, p. 56).

Etchepareborda (1983, p. 43) assinala que existia uma proibição dos britânicos navegarem nos mares do sul, desde o fim da guerra de independência dos Estados Unidos, o embasamento seria o Tratado de Versalhes de 1783 que garantia a proibição. Em 1810 a Argentina se tornou independente da Espanha, logo após as autoridades espanholas abandonam as Ilhas Falklands/Malvinas, deixando-as sem defesa alguma, mesmo assim o Reino Unido nada fez, não se manifestou sobre sua soberania e nem se movimentou no intuído de ocupar a ilha (DUARTE, 1986, p. 17). Historicamente os britânicos apelam para o tempo em que mantêm a soberania sobre o arquipélago, quase 200 anos ininterruptamente, com exceção dos 74 dias de guerra no ano de 1982, e o fato das ilhas terem se tornado parte da “região ultra periférica da União Europeia” pautada no Anexo II do Tratado de Lisboa de 2007,75 fortalece a fundamentação britânica sobre o direito de soberania. O primeiro ministro britânico David Cameron disse que “a realidade é a realidade [...] enquanto as Ilhas Malvinas quiserem seguir sendo território soberano britânico devem seguir sendo território soberano britânico. Ponto final da história” (BECK, 2013, p. 62 – 3). O fato dos kelpers se declararem britânicos como destacou Cameron é o principal argumento jurídico que os britânicos defendem, baseados no direito de autodeterminação dos povos. Prola (2013, p. 84 – 5) informa que a reivindicação também se sustenta quando analisamos o princípio da prescrição aquisitiva, seria uma forma legítima de aquisição de um território no direito internacional, noção essa trazida do direito romano, consiste segundo Aciolly, Silva e Casella na "aquisição do domínio de território mediante o exercício efetivo, ininterrupto e pacífico da soberania territorial sobre esse território, por um prazo suficientemente longo", existem ainda quatro fatores que precisam ser observados para que essa relação se estabeleça: 1ª – A posse deve ser pública e notória; 2ª – Deve apresentar-se como exercício efetivo da soberania própria; 3ª – Deve ser pacífica e ininterrupta;

75

Associação dos Países e Territórios Ultramarinos.

86

4ª – Dura por prazo suficiente, para que se possa presumir o consentimento (ACIOLLY; SILVA; CASELLA, 2009 apud PROLA, 2013, p. 84 – 5). No direito interno seria algo como a usucapião,76 o Reino Unido contesta alegando que possui o território desde o ano de 1833, em virtude de sua ocupação efetiva, a Argentina protesta dizendo que jamais deixou de reivindicar o território, portanto não seria uma ocupação consentida e pacífica (PROLA, 2013, p. 85). Mas se a Argentina deixasse por algum momento de reivindicar o arquipélago haveria uma prescrição aquisitiva? Sobre isso: O direito privado fixa, por exemplo, entre nós, o prazo de trinta anos para que se dê a prescrição aquisitiva. Em Direito Internacional, porém, é natural que o prazo deva ser mais longo, não só porque os interesses dos estados são mais importantes do que os dos particulares, mas também porque a sua vida é, em geral, muito mais longa do que a destes últimos. Em todo caso, o direito internacional ainda não fixou prazo algum para a prescrição. O que ela exige é que tal prazo seja suficiente, conforme escreveu Audinet, "para fazer presumir o consentimento tácito do Estado despojado de uma parte do seu território e do povo submetido a uma nova dominação" (ACIOLLY; SILVA; CASELA, 2012 apud PROLA, 2013, p. 86).

Segundo Prola (2013, p.98) "a Argentina deixou de protestar por 38 anos contra a ocupação britânicas das ilhas", isso foi após 1850 quando ratificaram o tratado de paz Arana-Southern-Lepredou, e também por 58 anos antes de ser admitida na ONU. Esse silêncio poderia indicar uma prescrição aquisitiva segundo Prola. Anteriormente os argumentos históricos eram muito mais usados pelos britânicos, como vimos no capítulo um, os ingleses reivindicam o descobrimento e ocupação do território, em Por Egmont, contudo, esse argumento tem sido menos usado devido ao fato de que muitos pesquisadores, que tem se aprofundado no estudo histórico do arquipélago nas últimas décadas, tem indicado que Espanha e depois Argentina teriam provas e títulos históricos mais sólidos (BECK, 2013, p. 57). No caso das Ilhas Falklands/Malvinas, nunca houve um só tratado, ainda que fosse arbitrário ou imposto que legaliza-se a soberania britânica no arquipélago, esse é o principal aspecto que se diferencia de outros casos, como Gibraltar no século XVIII O dicionário on-line dicio.com.br define usucapião como: Direito Maneira legal de se adquirir propriedade móvel ou imóvel pela posse pacífica e ininterrupta do bem durante certo período de tempo. Para os bens imóveis, o prazo para que ocorra a prescrição aquisitiva é de 20 anos, e para os bens móveis, dez anos, independentemente de justo título ou boa-fé. 76

87

ou

ainda

no

caso

dos Territórios

Marítimos

da

Bolívia

no

século

XX

(ETCHEPAREBORDA, 1983 apud BECK, 2013, p. 58). Um dos argumentos em pauta dos argentinos está embasado nas normas do Direito do Mar, tendo como marco a III Conferência da ONU sobre o Direito do Mar que reconheceu como Zona Econômica Exclusiva (ZEE) 370 km a partir do mar territorial, ou seja, o Estado é soberano para uso daquelas águas, bem como do subsolo do mar e etc. Nesse sentido, a Argentina tem sua ZEE usurpada, tendo em vista que parte dela se encontra sob controle militar britânico, ver mapa a seguir com os limites da ZEE (DELGADO, 2012 apud BECK, 2013, p. 59).

FIGURA 17: ZEE Atlântico Sul

Fonte: ggpht.com, s/d, on-line

Os argentinos afirmam querer levar o caso a Corte Internacional de Justiça (CIJ) para julgar a questão, contudo, Londres já se manifestou afirmando que não aceita a jurisdição desse tribunal para resolver a disputa. Tendo em vista que submeter-se a

88

jurisdição da CIJ é voluntário essa possiblidade já fica descartada (BECK, 2013, p. 60). Um caso semelhante já foi julgado pela CIJ, a “Disputa Territorial e Marítima (Nicarágua v. Colômbia)”77. Nesse caso, primeiro a CIJ deliberou sobre quem detinha a soberania no arquipélago de San Andrés, ou seja, primeiro a questão territorial, em seguida resolveu a questão da ZEE, ou seja, as questões marítimas. Disto podemos inferir que antes de se resolver pendências marítimas é necessário resolver as questões territoriais, pois são diferentes (PROLA, 2013, p. 90). Desde 1970 até os dias atuais, o princípio de autoderminação dos povos tem sido o principal álibi dos britânicos para justificar a soberania do território (BECK, 2013, p. 61), devido a importância do argumento para a resolução da disputa ele será tratado em separado no subcapítulo 4 deste capítulo. Beck (2013, p. 58 – 61) fez uma ótima síntese dos aspectos jurídicos que são suprimidos em detrimento de aspectos políticos, criando barreiras ao exercício do cumprimento do Direito Internacional. Segundo essa autora, a Argentina tenta usar o arcabouço jurídico do Direito Internacional, resoluções da ONU e outros organismos internacionais para pautar suas reivindicações, porém, percebemos que devido ao alto poder do

Reino

Unido, aquele

“poder” que

conceituamos e

explicamos

detalhadamente no capítulo um, que abrange aspectos, políticos, econômicos e militares, de certa forma faz parecer que os britânicos estão imunes as normas do Direito Internacional e das resoluções da ONU. Muito críticos argentinos atribuem esse fracasso ao fato do Reino Unido ter assento no Conselho de Segurança e poder de veto, ou seja, ser juiz da sua própria causa, portanto os argentinos alegam que o Reino Unido atua de má-fé na resolução do conflito (BECK, 2013, 58 – 9). O expresidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva fez uma crítica nesse sentido no ano de 2010, indagou: “Será que é o fato de a Inglaterra participar como membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, e eles podem tudo e os outros não podem nada?”

78

A pergunta do ex-presidente é muito importante, e precisa sim ser

pensada, pois, ser parte do Conselho de Segurança da ONU tem implicações diretas sobre a resolução do caso.

O parecer emitido pela Corte Internacional de Justiça pode ser acessado por este link: http://www.icjcij.org/docket/files/124/17162.pdf 78 Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2010/02/698605-chanceler-argentino-pede-mediacaoda-onu-em-briga-pelas-malvinas.shtml Acesso em: 07/11/2014 77

89

A seguir, trataremos em separado a teoria da proximidade geográfica, pois, sempre ao se falar do caso das Ilhas Falklands/Malvinas, alguém se recorre ao argumento de que as ilhas estão mais perto da Argentina do que do Reino Unido, portanto devem ser argentinas. Veremos se isso realmente procede e se tem sustentação jurídica.

Teoria da Proximidade Geográfica Muitos autores defendem a posse do território devido a proximidade do arquipélago as terras continentais argentinas, geralmente o público em geral, isso é repetido inclusive por brasileiros e sul-americanos. Contudo, o argumento é totalmente inválido tendo por base o direito internacional, que não diz nada sobre a determinação de soberania em algum território com base na proximidade geográfica, ao contrário, contraria o princípio de uti possidetis, ou seja, os que de fato ocupam um território possuem direito sobre este (FARO JUNIOR, 1956 apud BEVILAQUA apud PROLA, 2013, p. 87). Prola (2013, p. 87) é irônico ao tratar o argumento: Muitos exemplos podem ser dados, que provam o descabimento de tal ideia. O Reino Unido ser obrigado a ceder as Ilhas Malvinas à Argentina com base na proximidade geográfica, seria o mesmo que obrigar a Itália a entregar a Ilha de Lampedusa à Tunísia; a Espanha entregar as Ilhas Canárias ao Marrocos; a Cora Britânica dar as ilhas de Guernsey e Jersey para a França; a Dinamarca entregar as Ilhas Faroé ao Reino Unido; a França entregar a Córsega à Itália; a Índia entregar as Ilhas Andaman para Myanmar e as Ilhas Nicobar para a Indonésia; o Japão dar as Ilhas Ishigaki para Taiwan ou para a China; os Estados Unidos entregarem a Ilha de St. Lawrence para a Rússia; O Reino Unido entregar as Ilhas Cayman para a Jamaica; ou as Bermudas para os Estados Unidos; [...]

Logo conclui que defender a teoria da proximidade geográfica deixa a fundamentação desguarnecida de juridicidade. Chehabi (1985) afirma que o argumento é atrativo a leigos, e que se algo assim tivesse embasamento jurídico nenhuma ilha do mundo estaria a “salvo dos desígnios do poder continental mais próximo” (CHEHABI, 1985 apud BECK, 2013, p. 72).

90

O governo brasileiro dá sinais de que o argumento é válido e precisa ser colocado em pauta, o ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva em pronunciamento no ano de 2010 questionou “qual é a explicação geográfica [...] de a Inglaterra estar nas Malvinas?" Disse ainda que “não é possível que a Argentina não seja dona das Malvinas e seja um país que está a 14 mil km de distância das Malvinas?" [sic] 79

O Princípio de Autodeterminação dos Povos O princípio da livre determinação dos povos não é um conceito novo para o direito internacional, é um princípio de grande importância para o caso das Ilhas Falklands/Malvinas, por isso vejamos quais os efeitos deste conceito e qual a sua aplicabilidade, tendo em vista que nos últimos tempos o assunto das disputa entre argentinos e britânicos tem ganhado ainda mais importância, segundo a presidente da Argentina Cristina Kirchner em pronunciamento no Comitê de Descolonização das Nações Unidas, não é mais uma disputa bilateral, mas um assunto de interesse para o mundo e sociedade (FINO; PEZZANO, 2012, p. 17). Vejamos como se posiciona o Reino Unido com relação ao apelo deste princípio: O Reino Unido não tem dúvidas com relação a sua soberania sobre as Ilhas. O princípio da livre determinação, consagrado na Carta das Nações Unidas, subjaz à nossa posição. Não pode haver negociação sobre a soberania das ilhas, a menos e até que seus habitantes o desejem. Os habitantes deixam claro, regularmente, que desejam permanecer britânicos (BRITISH GOVERNMENT, 2012, p. 100).80

Beck (2013, p.63) destaca que, a aplicação deste princípio é um dos temas mais importantes e discutidos, por estudiosos de múltiplas nacionalidades que se dedicam ao estudo do caso das Ilhas Falklands/Malvinas. Ainda segundo Beck, esse seria “praticamente o único argumento”, que serve de certa forma como um “escudo perante

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2010/02/698605-chanceler-argentino-pede-mediacaoda-onu-em-briga-pelas-malvinas.shtml Acesso em: 07/11/2014 80 A publicação pode ser acessada através deste link: https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/12249/ot-wp-0612.pdf 79

91

a comunidade internacional”, o intuito é evitar o diálogo com a Argentina e protelar as negociações de soberania do arquipélago. Sobre este princípio a Argentina tratou logo de se manifestar; em 1964, José María Ruda81 se pronunciou perante o Comitê de Descolonização da ONU, de lá pra cá a Argentina continua negando o princípio de autodeterminação dos povos defendido pelos britânicos: Consideramos que o princípio da livre determinação seria mal aplicado em situações nas quais parte do território de um Estado independente tenha sido separada, contra a vontade de seus habitantes, em virtude de um ato de força realizado por um terceiro Estado, como no caso das Malvinas, não existindo nenhum acordo internacional posterior que convalide esta situação de fato e, pelo contrário, ante o protesto permanente do Estado agravado contra esta situação. Estas considerações são agravadas, muito em especial, porque a população originária foi despejada por este ato de força, tendo sido substituída por grupos flutuantes de nacionais da potência ocupante. Por outro lado, a aplicação indiscriminada do princípio da livre determinação a territórios tão escassamente povoados por nacionais da potência colonial colocaria o destino desse território nas mãos da potência que ali se instalou pela força, em violação das mais elementares normas do direito e da moral internacional. O princípio fundamental da livre determinação não deve ser utilizado para transformar uma posse ilegítima numa soberania plena, sob o manto de proteção que as Nações Unidas lhe dariam (FINO; PEZZANO, 2012, p. 18 – 9).

Ruda coloca em dúvida a aplicabilidade do princípio de autodeterminação para o caso das Ilhas Falklands/Malvinas. Mas, observemos que tanto o parágrafo 2º da resolução 1514 da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), bem como o artigo 1º comum as Pactos Internacionais de Direitos Humanos adotam que “todos os povos têm o direito à sua autodeterminação [...]”. A palavra “todos“ não deixa brechas para dúvidas sobre o alcance da aplicabilidade do princípio, ou seja, independente do povo ele tem direito a sua autodeterminação, sendo assim, o problema recai sobre a definição do que é povo (FINO; PEZZANO, 2012, p. 19). Segundo Fino e Pezzano (2012, p.20) a sociologia reúne algumas premissas que o “povo” deve reunir para ser “povo”: a) […] a existência de uma população concentrada e amplamente majoritária em certo território, capaz de expressar uma vontade 81

Embaixador argentino na ONU.

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comum [...]. b) A população em questão deve viver num território delimitado [...]. c) O terceiro elemento é a firme vontade dessa coletividade, por um lado, de viver em comum, e por outro, de separarse do Estado no qual vive [...]. d) O elemento complementar que pode reforçar a vontade para a autodeterminação é a existência de uma organização interna, de um embrião de poder dessa coletividade, que simboliza seu particularismo.

Ainda que o “povo” titular do direito à autodeterminação seja efetivamente um conceito jurídico, é necessário analisa-lo sem desconectar-se da realidade histórica e sociológica (FINO; PEZZANO, 2012, p. 22), de fato, o direito internacional leva em consideração a história de uma população que se relaciona com um território desde tempos imemoriais, ou seja, uma população autóctone, assim sendo, a AGNU determinou que a autodeterminação é um direito da população autóctone (CLÉMENT, 1987-1989, p. 193 – 240 apud FINO; PEZZANO, 2012, p. 23), pelo menos é o que indicam as resoluções: “2138 (XXI) e 2151 (XXI), sobre a questão da Rodésia do Sul; 2228 (XXI) da Somália Francesa; 2229 (XXI), 2711 (XXV), 2983 (XXVII) e 3162 (XXVIII) do Saara Ocidental; 2795 (XXVI) dos territórios sob administração portuguesa, entre outras” (FINO; PEZZANO, 2012, p. 23). Nesse sentido observamos que: O povo autóctone conserva seu direito à livre determinação mesmo se tiver sido expulso sem causa justa e artificialmente substituído por outra população. Isso é importante não só para efeitos da imprescritibilidade do direito, mas também para indicar que a população que substitui o povo não é um “povo” em si mesma e, portanto, não tem direito à livre determinação (FINO; PEZZANO, 2012, p. 23).

Assim sendo, entendemos que “o exercício do direito à livre determinação só é cabível aos povos autóctones e com personalidade inconfundível, e não às populações adventícias oriundas da potência colonial, a ela afins e a seu serviço” (ROBLEDO, p. 5). 82

Antonio GOMEZ ROBLEDO, “Resolución sobre el Derecho de autodeterminación de los pueblos y su campo de aplicación”, Resoluciones adoptadas en el XI Congreso del Instituto Hispano Luso Americano de Derecho Internacional, Madrid-Salamanca, 1977, Link de acesso ao texto: http://www.ihladi.org/resoluciones_XI.pdf.

82

93

Ao se observar o caso das Ilhas Falklands/Malvinas imediatamente percebemos através da história que o requisito de ser autóctone não é atendido, pois a população não está vinculada aquele território desde tempos imemoriais, pois foi transplantada da Europa (FINO; PEZZANO, 2012, p. 23), vide acontecimentos do ano de 1833, quando uma expedição da Coroa Britânica assumiu o controle das ilhas, o acontecimento está detalhado no capítulo 1. Segundo Delgado (2012), após a conquista em 1833, Londres comandou uma limpeza étnica no arquipélago, tais informações coincidem com os anais da Foreign Office.83 O Reino Unido repovoou o arquipélago com imigrantes britânicos, vindos a princípio da Ilha de Santa Helena, e com o passar do tempo, Londres começou a criar barreiras para o estabelecimento de argentinos nas ilhas, Delgado chama isso de “monopólio de transmissão cultural identitária” (DELGADO, 2012 apud BECK, 2013, p. 63). Reflexos dessa imigração repercutem mesmo após algumas gerações, veja que no ano de 2012 foi realizado um censo no arquipélago, dentre muitas informações que se pode achar no documento final do censo, constatamos que atualmente 52,9% da população, ou seja, 1501 habitantes dos 2840, não nasceram nas ilhas, são oriundos principalmente do Reino Unido (28,1% ou 798 habitantes), St. Helena (10,4% ou 295 habitantes), Chile (6,4% ou 181 habitantes) e 227 habitantes (8%) de outras nacionalidades. Veja tabela a seguir elaborada pelo governo das Ilhas Falklands e que pode ser encontrada no censo de 2012.

Foreign and Commonwealth Office (FCO), também chamado de Foreign Office é o órgão do governo britânico responsável por promover e defender os interesses britânicos no mundo. 83

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FIGURA 18: Censo 2012 - População por Local de Nascimento e Sexo

Fonte: Falklands Islands Government, 24/04/2012

84

Observe que, no ano de 1983 em virtude do British Nationality, (Falkland Island) Act, os habitantes das ilhas se tornaram nacionais britânicos (FINO; PEZZANO, 2012, p. 23), ou seja, até então não eram, portanto se estabelece uma contradição com a afirmação anterior de que a terra é habitada por britânicos desde 1833. O governo britânico mantem atualizada uma publicação sobre as suas possessões ultramarinas, nessa publicação afirma a nacionalidade dos kelpers da seguinte forma: “The majority of the population of the Falkland Islands are British by birth or descent”,85 ou seja, a maioria da população é britânica por nascimento ou ascendência. No ano de 2013 o governo britânico realizou um referendo, nele os Kelpers puderam manifestar sua vontade respondendo “SIM ou “NÃO” se gostariam que as ilhas continuassem como território dependente do Reino Unido (PROLA, 2013, p. 39). Assim que Londres anunciou que faria o referendo, o ministro das relações exteriores argentino Héctor Timerman se pronunciou a respeito afirmando que "o referendo é ilegal porque as Nações Unidas declararam que é uma ação implantada desde 1833, quando Londres invadiu e expulsou os habitantes argentinos", destacou que a ONU já emitiu mais de 40 resoluções em que convida os dois países a

O Censo pode ser acessado através deste link: http://www.falklands.gov.fk/assets/79-13P.pdf Tradução Livre: A maioria da população das Ilhas Falklands é britânica por nascimento ou por ascendência”. A publicação pode ser acessada através deste link: https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/12249/ot-wp-0612.pdf

84 85

95

negociarem a soberania das ilhas. Ainda segundo Timerman, "não há nenhum país no mundo que reconheça os direitos britânicos nas Malvinas", disse que o Reino Unido "quer ter uma base militar nas Malvinas com projeção na Antártida" e denuncia que o arquipélago "é o território mais militarizado do mundo, com um soldado a cada três habitantes".86 De fato, Roberto Godoy, especialista em assuntos militares afirma que a Inglaterra construiu a mais sofisticada base aeronaval do Atlântico Sul.87 Para garantir a transparência do referendo, estiverem presentes representantes de 7 países para supervisionar a votação. O “SIM” venceu com 99,8%, ou seja, 1513 votos contra apenas 3 para o “NÃO”. A comemoração dos kelpers foi grande, enquanto isso o governo britânico tratou de conclamar a comunidade internacional a reconhecer a vontade da população do arquipélago (PROLA, 2013, p. 39). FIGURA 19: Kelpers Comemoram Resultado do Referendo de 2013

Fonte: g1.globo.com, 11/03/2013, on-line

G1 MUNDO – < http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/02/referendo-nas-malvinas-e-ilegal-dizchanceler-argentino.html> Acesso em 11/11/14. 87 Entrevista de Roberto Godoy para o programa SBT Repórter: https://www.youtube.com/watch?v=nRUkLSSvRY8 86

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O principal elemento de contestação dos britânicos é que não existe uma definição universalmente aceita para “povo” (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 207). somase a este também o ótimo resultado obtido no referendo. Os argentinos estão alicerçados na resolução nº 1514/1960, em que a ONU proclama a necessidade de “pôr um fim ao colonialismo em todas as suas formas e manifestações”, e junto a esta resolução também a de nº 2065/1965, que sem votos contrários, inclusive o do Reino Unido, considera o caso das Ilhas Falklands/Malvinas como um caso colonial (VALÉRIO; HENTZ, 2013, p. 189 - 190). A resposta do governo argentino sobre a nacionalidade dos kelpers e o princípio de autodeterminação defendido pelos britânicos, está declarado em seu site governamental do Ministério das Relações Exteriores: Los intereses de los habitantes y no sus deseos son los que deben ser tenidos en cuenta, según lo indicado por las Naciones Unidas en los distintos documentos relativos a la Cuestión de las Islas Malvinas. Ello es así porque la Organización entendió que una población transplantada por la Potencia colonial, como es la actual de las Islas Malvinas, no es un pueblo con derecho a la libre determinación ya que no se diferencia del pueblo de la metrópoli. El carácter británico de esa población ha sido reconocido por el Reino Unido, y, desde 1983, sus integrantes tienen status de ciudadanos británicos, de acuerdo con la Ley de Nacionalidad Británica en vigor a partir de ese año. Si en el caso de las Malvinas se admitiera la autodeterminación de los actuales habitantes, cuyo carácter y nacionalidad son británicos, se estaría admitiendo que un grupo de personas de la propia Potencia colonial decidiese el destino de un territorio que es reclamado por otro Estado al que esa Potencia despojó por un acto de fuerza hace casi doscientos años. 88

Assim sendo, Fino e Pezzano (2012, p. 24) concluem que é possível “afirmar sem maior hesitação, que a população das Ilhas Malvinas, por não ser autóctone, senão implantada pela potência colonial [...] não é um povo e, portanto, carece do direito à livre determinação”. Em consequência disso, “sua natureza como tal não foi – nem pode ser – reconhecida pelos órgãos das Nações Unidas encarregados do processo de descolonização. Kohen aponta que, “em matéria de descolonização, é a Assembleia Geral quem tem a competência para reconhecer, nos habitantes de um território, a qualidade ou 88 Site Governamental do Ministério das Relações Exteriores Argentino. No link a seguir é possível ter uma dimensão da visão argentina acerca do conflito: http://enaun.mrecic.gov.ar/node/4077

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não de povo” (KOHEN, 2003, p. 866 apud FINO; PEZZANO, 2012, p. 21). De fato, a resolução nº 2065 adotada pela Assembleia Geral em 1965 aponta que o caso das Ilhas Falklands/Malvinas é um caso de descolonização. Temos portanto a seguinte situação para as Ilhas Falklands/Malvinas, trata-se de uma situação colonial, assim é reconhecida, contudo não como no modelo clássico, em que o “povo” quer sua liberdade em relação a metrópole, mas, uma disputa entre dois Estados pela soberania de um território (FINO; PEZZANO, 2012, p. 26).

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CONCLUSÃO Vimos que os acontecimentos que remetem ao século XVI não podem ser provados através da historiografia, assim sendo, não é possível precisar se foi Américo Vespúcio em 1501, Fernão de Magalhães em 1520 ou John Davis em 1592 o descobridor das ilhas. Qualquer afirmação nesse sentido seria portanto uma mera hipótese. O primeiro fato indiscutível sobre o descobrimento das ilhas, em sendo difícil comprovar os acontecimentos anteriores, Argentina e Reino Unido atribuem o “primeiro descobrimento” das ilhas ao holandês Sebald de Weert, que avistou as ilhas Janson (Sebaldinas) em 1600, ver figura 4. No ano de 1690, a expedição britânica de John Strong desembarcou pela primeira vez nas ilhas, quando na oportunidade batizou o canal que separa as duas grandes ilhas de Falkland Sound, nome que se estendeu a todo o arquipélago. De fato a CIA chancela essa informação em seu site. O primeiro a tomar posse de fato das ilhas foram os franceses em 1764 fundando Por Louis na ilha oriental, no ano seguinte os britânicos também tomam posse fundando Port Egmont do lado ocidental. Em 1767 a França entrega sua possessão a Espanha por causa do Pacto Família que haviam firmado anos antes, a Espanha logo rebatiza Port Louis para Puerto Soledad. Se por base aplicarmos o princípio de uti possidetis, ou seja, quem ocupa adquire os direitos de soberania, constaremos que tanto os britânicos ocupando o lado ocidental teria seus direitos, quanto os espanhóis do lado oriental. Em 1771 involuntariamente ou não o príncipe de Masserano reconhece89 esse princípio ao devolver Port Egmont após terem sido expulsos. Posteriormente por causa dos movimentos emancipatórios de suas colônias, Reino Unido e Espanha abandonaram o arquipélago, deixando para traz placas com reivindicações sobre o território. No caso do Reino Unido, especula-se que ele desocupou Port Egmont por um acordo diplomático, contudo isso não se confirma, portanto não pode ser levado em conta. A Argentina tornou-se independente em 1810, e pelo direito de uti possidetis herdou todas os títulos e possessões espanholas, o que incluía as Ilhas Falklands/Malvinas. Quando em 1829 que Buenos Aires tomaria medidas para

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Releia a carta no Capítulo 1, Século XVIII, Ano 1771.

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consolidar a soberania o Reino Unido protestou, contudo não houve resposta Argentina. Em 1833 os britânicos tomam as ilhas, expulsando os argentinos que nelas se encontravam, mesmo para o direito praticado na época, essa ação constituiu uma violação ao Direito Internacional. Em 1850 ratificou-se o Tratado Arana-Southern-Lepredou, como determina a doutrina, nos tratados de paz, territórios não mencionados devem ser confirmados em posse do Estado que os ocupava no momento, como quem ocupava na época eram os britânicos e os argentinos não fizeram nenhuma menção, tornava-se legítima a soberania sobre o território. Por coincidência ou não a partir daí foram 38 anos de silêncio até a Argentina se manifestar novamente, assim sendo teria se configurado a prescrição aquisitiva. Vimos no decorrer deste trabalho algumas formas que o Direito Internacional reconhece para legitimar a posse do território, como a prescrição aquisitiva, a ocupação

efetiva,

a

emancipação

da

colônia;

mas,

no caso

das

Ilhas

Falklands/Malvinas, qualquer um desses embasamentos, se utilizados em um possível arbitramento, seriam contestados. Mais uma maneira para se determinar a soberania sobre um de território é o princípio de autodeterminação dos povos, no caso das Ilhas Falklands/Malvinas, tem sua aplicação contestada, pois esse direito caberia somente a um povo, e não a um grupo transplantado para o território. Os Argentinos se apegam a este fato para contestar os britânicos, pois, como vimos deve ser autóctone a população que reivindica direitos sobre um território, e que neste caso específico não o é. O Reino Unido insiste que não existe uma definição para “povo” universalmente aceita. Os moradores das ilhas já afirmaram o desejo de continuarem sob soberania britânica. Em março de 2013, foi realizado um plebiscito trazendo justamente essa questão para ser respondida, o resultado foi que 99,8% dos kelpers que votaram, ou seja, 1501 foram a favor da manutenção da posse por parte do Reino Unido, somente 3 votos foram contrários. Tal fato corrobora com o argumento argentino que os kelpers não são um povo à parte. O Reino Unido defende que os ilhéus têm sim direito a autodeterminarem-se. São quatro os pontos que precisamos observar para pautar as discussões de soberania das ilhas: a ONU reconhece que existe uma disputada pela soberania do arquipélago entre Argentina e Reino Unido; a ONU exige o fim do colonialismo nas

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ilhas através da resolução nº 2065/1965; a ONU determina a resolução pacífica das controvérsias em torno do arquipélago; e a ONU afirma que a população das ilhas precisa ser ouvida. Rodolfo Terragno (2006) considera que o tempo, por si só, não resolverá o problema, a Argentina precisa compreender que “tudo ou nada” significa nada. O Reino Unido parece entender essa questão, e se recusa a negociar a soberania das ilhas. Voltemos então a questão que permeia todo este trabalho: qual Estado, Argentina ou Reino Unido tem o direito de exercer soberania sobre as Ilhas Falklands/Malvinas? Entende-se que, não é necessário portanto que nenhum dos Estados tenha a razão integral, Prola (2013 p. 103) resume que “à luz dos tratados, [...] consagrados pelo Direito Internacional Público, a soberania deve ser decidida em favor daquele que melhor satisfizer às condições que possam legitimar o exercício do domínio.” Mas quem melhor então satisfaz às condições? Valério e Hentz (2013) consideram que ambos os litigantes têm argumentos de peso a seu favor, e que caso Argentina e Reino Unido decidissem por submeteremse a uma arbitragem internacional para deliberar sobre a disputa de soberania, seria complicado apontar “um favorito nessa disputa”. Beck (2013, p. 106) destaca que um dos principais fatores que levam a perpetuação do conflito “é a intransigência das partes”. Ambos os países demonstraram grande dificuldade em ceder no decorrer da história. O tema é tão controverso que, dos muitos autores consultados para este trabalho, cada um responde a essa questão de uma forma diferente, por exemplo, enquanto Beck (2013) afirma que “Argentina tem melhores títulos históricos e jurídicos”, Prola (2013) afirma que o Reino Unido adquiriu legitimidade sobre o arquipélago, Duarte (1986) diz apenas que espera contribuir com as atividades de pesquisas dos Policy Maker, e que o Brasil precisa estar atento a tudo que acontece no Atlântico Sul por ser área de seu interesse, já Valério e Hentz (2013) e Azambuja (1988) resumem seu pensamento em afirmar que “os ilhéus” [...] “possam também, como outros povos [...] decidir por si mesmo sua sorte, [...].

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Enquanto uma solução para o problema não vem à tona, se tivesse voz para dar qualquer conselho aos diplomatas argentinos e britânicos, limitaria minhas palavras ao antigo ditado romano: “Si vis pacem, para bellum”.90

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Se quer a paz, prepara-se para a guerra.

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