Ferreira, J.; Ferreira, Ó. & Silva, H. (2015). O ensino da História de Enfermagem na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa (ESEL)

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O ENSINO DA HISTÓRIA DE ENFERMAGEM NA ESCOLA SUPERIOR DE ENFERMAGEM DE LISBOA (ESEL) Ferreira, Jorge; Ferreira, Óscar; Silva, Helena1 Professores da ESEL e Investigador da UI&DE Linha de Investigação de História de Enfermagem Escola Superior de Enfermagem de Lisboa Pólo Artur Ravara; Parque das Nações, Av. D. João II, Lote 4.69.01, 1990-096 Lisboa [email protected]; [email protected]; [email protected] RESÚMEN Este trabajo tiene como objetivo identificar la enseñanza de la historia de la enfermería en el currículo de la licenciatura en enfermería que comenzó en 2008/2009 en ESEL y sugerir propuestas para incrementar los conocimientos (saber, hacer y ser) en relación con la Historia de la Enfermería en diferentes ciclos de formación. La metodología fue a consultar y analizar los programas de los tres campos cubiertos, de entrevistar a algunos de los profesores implicados y en la evaluación de los estudiantes. Se concluyó que los estudiantes han demostrado un compromiso en el trabajo y se sugiere que la formación en Historia de la Enfermería se ha ampliado y desarrollado en el curso de maestría y doctorado en enfermería. ABSTRACT This paper aims to identify the teaching of the History of Nursing in the undergraduate curriculum in nursing, started in 2008/2009, in ESEL and suggest proposals to increase knowledge (know, do and be) in relation to the History of Nursing in different training cycles. The methodology was to consult and analyze the programs of the three fields covered, to interview some of the teachers involved, and in assessing and evaluating students. It was concluded that students have shown commitment in the workplace and suggests that training in the History of Nursing has expanded and developed in the masters and doctoral nursing courses. 1

Este artigo foi realizado no âmbito da Linha de Investigação de História de Enfermagem da UI&DE e teve o apoio da ESEL e da Fundação para a Ciência e Tecnologia.

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INTRODUÇÃO A Escola Superior de Enfermagem de Lisboa (ESEL) foi criada em 21 de Julho de 2004 pelo decreto-lei nº 175 como resultado da fusão das quatro escolas públicas de enfermagem de Lisboa, cada uma com o seu passado histórico, filosofia e cultura próprias. Com o plano de estudos do primeiro ciclo, iniciado no ano lectivo 2008/2009, a História de Enfermagem passou a ser leccionada nas disciplinas de História e Epistemologia de Enfermagem I (1º ano), História e Epistemologia de Enfermagem II (3º ano) e História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção (3º ano). Em face das mudanças operadas no ensino da enfermagem, em particular das escolas públicas da região de Lisboa a questão que se coloca é a seguinte “De que modo o processo de ensino-aprendizagem desenvolvido na área da história de enfermagem oferece contributos válidos para o processo de formação de uma memória sólida sobre a enfermagem, enquanto actividade humana e área disciplinar?” Com este artigo pretende-se analisar a pedagogia da história de enfermagem numa escola de ensino superior e sugerir novas propostas curriculares e programáticas que possam contribuir para o processo de formação de uma memória sólida sobre o passado da enfermagem. A metodologia utilizada centrou-se, em particular, na consulta e análise dos currículos das disciplinas que se debruçam sobre a história de enfermagem, na realização de entrevistas aos docentes envolvidos e na avaliação efectuada por estudantes. Através dela foi possível especificar qual foi a pedagogia da história de enfermagem – objectivos, conteúdos programáticos, métodos e avaliação – nas unidades curriculares de História de Enfermagem, no Curso de Licenciatura em Enfermagem da ESEL e, também permitiu identificar as competências que visavam desenvolver. Concluiu-se que no âmbito das disciplinas de História de Enfermagem I e II os estudantes têm revelado motivação e empenho nos trabalhos desenvolvidos. Também, na disciplina de Opção, revelaram interesse e agrado por terem realizado trabalhos que contribuíam para a preservação da memória de enfermagem em Portugal. Nestas circunstâncias, sugerimos que a formação em História de Enfermagem seja alargada ao 2º e 3º ciclos de estudos e como tal desenvolvida no âmbito do curso de mestrado e de doutoramento em enfermagem, contribuindo para a formação de uma memória sólida do passado em enfermagem.

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O ENSINO DA HISTÓRIA DE ENFERMAGEM EM PORTUGAL E NA ESEL Apesar da História do ensino da História de Enfermagem em Portugal estar por fazer pode-se afirmar que o mesmo sempre foi realizado nos Cursos de Enfermagem, embora na maioria das escolas decorresse integrado noutras unidades curriculares como por exemplo na de Fundamentos de Enfermagem. Tal realidade ainda pode ser constatada nos nossos dias. Até 2007 era também esta a realidade que se vivia nas quatro escolas públicas de enfermagem que deram origem à ESEL. A ESEL foi criada pelo Decreto Lei nº 175/2004, como resultado da fusão das Escolas Superiores de Enfermagem Artur Ravara, Calouste Gulbenkian de Lisboa, Francisco Gentil e Maria Fernanda Resende, conforme os estatutos publicados no despacho normativo nº 13 de 27 de Fevereiro de 2007. Destas quatro escolas herdou um património único onde alicerçou as suas referências. A Escola Superior de Enfermagem de Artur Ravara, “outrora Escola Profissional de Enfermeiros (1901) e Escola de Enfermagem de Artur Ravara (1930), foi a primeira escola pública de Enfermagem em Portugal. A sua origem remonta ao século XIX, com a criação, em 1886, do primeiro Curso para a formação de enfermeiros no Hospital de S. José. Foi uma referência incontornável na história de enfermagem portuguesa.”1 A Escola Superior de Enfermagem Francisco Gentil, “criada em 1940, foi designada então por Escola Técnica de Enfermeiras, sob a égide do Doutor Francisco Gentil, preocupado em assegurar ao país a formação de enfermeiros qualificados, capazes de participar, na melhoria da assistência de saúde. Apadrinhada pela Fundação Rockefeller, a sua tutela pertencia ao Ministério de Educação.”2 A Escola Superior de Enfermagem de Calouste Gulbenkian de Lisboa nasceu “em 1957 com a designação de Escola de Enfermagem do Hospital de Santa Maria. Em 1968, a Fundação Calouste Gulbenkian financiou a construção e o equipamento do seu edifício e da Residência das Alunas, que foi inaugurada em 1972. Foi pioneira no associativismo estudantil em Enfermagem.”3 A Escola Superior de Enfermagem Maria Fernanda Resende “foi o nome adoptado a partir de 1986 pela então Escola Pós-Básica de Lisboa, em memória da Enfermeira Maria Fernanda Resende (1923-1988). A Escola Pós-Básica de Lisboa entrou em funcionamento em 1984, integrando três núcleos que correspondiam respectivamente às antigas escolas de Enfermagem Psiquiátrica de Lisboa, de Ensino e Administração de Enfermagem e de Enfermagem de Saúde Pública.”4 3

Em 1989 com o Decreto-lei nº 480 de 23 de Dezembro o ensino de enfermagem passou a integrar o Ensino Superior Politécnico e como tal todas as escolas passaram a ministrar o Curso Superior de Enfermagem. Este conferia o grau académico de Bacharel. Só em 1999 com a criação, pelo Decreto-Lei nº 353, de 3 de Setembro, do curso de licenciatura em Enfermagem foi conferida a estas instituições de ensino a possibilidade de passarem a conferir o grau académico de Licenciado e de fazer formação pós-graduada. As escolas superiores de enfermagem estavam até 2001 sobre a dupla tutela do Ministério da Educação e da Saúde. Pelo Decreto-Lei 99/2001 de 28 de Março passaram à tutela do Ministério da Educação e posteriormente do Ministério da Ciência, Ensino Superior e Tecnologia. A fusão da ESEL foi iniciada em 2004. Para tal foi criada uma Comissão de Acompanhamento que conduziu o processo de elaboração dos estatutos e da eleição dos primeiros órgãos de gestão. Estes tomaram posse em 24 de Setembro de 2007. A origem deste processo remontou a 2001 com a publicação do Decreto-Lei nº 99, de 28 de Março e partiu da necessidade de articular os esforços necessários ao desenvolvimento do ensino e da profissão de enfermagem. A deliberação de se criar uma única instituição em Lisboa, foi uma decisão assumida de forma livre. A mesma consubstanciou-se na elaboração de um plano comum de desenvolvimento e na implementação de vários projectos conjuntos de onde se salienta o Plano de Estudos do Curso de Licenciatura em Enfermagem. De acordo com o mesmo a História de Enfermagem ficou a ser leccionada no 1º ano (Unidade Curricular de História e Epistemologia em Enfermagem I) e no 3º ano (Unidade Curricular de História e Epistemologia em Enfermagem II e Unidade Curricular de Opção: História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea). A inclusão destas três Unidades Curriculares de História de Enfermagem que se complementam e articulam entre si no Curso de Licenciatura em Enfermagem assumese de extrema importância na medida em que através delas os futuros enfermeiros poderão não só conhecer, como aprofundar os seus conhecimentos sobre o passado da profissão, compreender melhor o presente e perspectivar o futuro. No entanto essa compreensão e perspectiva não serão possíveis se a história de enfermagem for ensinada como um objecto exótico. Para ultrapassar tal obstáculo torna-se necessário analisar o passado e confrontá-lo com a actualidade identificando continuidades e rupturas5

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METODOLOGIA A metodologia utilizada teve não só por base a consulta e análise dos programas das três unidades curriculares abrangidas por este estudo, mas também a realização de entrevistas a docentes envolvidos na leccionação destas disciplinas, e a apreciação dos trabalhos realizados e apresentados (1.º e 3.º ano), da avaliação do ensino (Qualitativa) e da aprendizagem realizada pelos estudantes (Quantitativa). A entrevista foi realizada a um total de cinco docentes e teve por base um guião de entrevistas elaborado com base em Silva (Quadro n.º 1).6 Através dos dados colhidos em todas estas fontes foi possível especificar a pedagogia do ensino da história da enfermagem – objectivos, conteúdos programáticos, métodos e avaliação, compreender a experiência e percepção dos docentes envolvidos relativamente a este assunto e identificar as competências desenvolvidas pelos estudantes nas unidades curriculares de História de Enfermagem, no Curso de Licenciatura em Enfermagem da ESEL.

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Caracterização das unidades curriculares A unidade curricular História e Epistemologia de Enfermagem I é uma disciplina do primeiro semestre, do primeiro ano, do Curso de Licenciatura em Enfermagem com uma carga horária total de 81 horas, das quais 32 são de trabalho autónomo dos estudantes. Das 49 horas de contacto com o docente 29 são para ensino teórico (T), 4 para trabalho de campo (TC), 8 para orientação tutorial (OT) e 8 para seminários (S), num total de 3 European Credit Transfer (ECTS) (Quadro n.º 2). A mesma tem como finalidade capacitar o estudante para a compreensão do domínio do conhecimento de enfermagem enquadrado no contexto sócio-histórico. No que diz respeito à unidade curricular de História e Epistemologia II, esta é desenvolvida no 1.º semestre do 3.º ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem, com uma carga horária de 81 horas, das quais 40 horas são de trabalho autónomo dos estudantes. Das 41 horas de contacto com o docente 25 horas são para ensino teórico (T), 4 horas para trabalho de campo (TC), 8 horas para orientação tutorial (OT) e 4 horas para seminários (S), num total de 3 European Credit Transfer (ECTS) (Quadro n.º 2). Esta Unidade Curricular tem como finalidade capacitar o estudante para elaborar

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argumentos conceptuais que fundamentam a tomada de decisão na prática de enfermagem. Por sua vez a unidade curricular de História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção destina-se a estudantes do 1º, 2º e 3º anos do CLE (2ºsemestre) com um total de 81 horas – 3 ECTS, distribuídas por 21 horas (T) e 20 horas (T/P). Com esta unidade curricular pretende-se que o estudante desenvolva um conjunto de competências, um conjunto de saberes humanos e científicos que o ajudem a obter uma visão geral das mudanças sociais, nos cuidados de saúde e na enfermagem como profissão e prática social, na sociedade portuguesa contemporânea, compreendendo-as no seu contexto históricocultural.

Caracterização dos estudantes Os estudantes inscritos à disciplina de História e Epistemologia de Enfermagem I, no ano lectivo 2008/2009, num total de 400, estavam distribuídos por 10 turmas de +/40 estudantes cada. Cinco destas turmas tinham aulas de segunda a sexta-feira no período da manhã (8h-14h) e as outras cinco de tarde (14h30-20h30). A quase totalidade dos estudantes (+/- 95%) acedeu à Escola e Curso vindos do ensino secundário (12º ano de escolaridade) e após a realização de exame nacional de acesso ao ensino superior. Os restantes (+/- 5%), por não terem realizado o exame nacional de acesso ao ensino superior e possuírem mais de 23 anos, foram admitidos após prestação de provas destinadas a avaliar a capacidade para a frequência do ensino superior dos maiores de 23 anos. Os estudantes inscritos à disciplina de História e Epistemologia de Enfermagem II, no ano lectivo de 2009/2010, num total de 271 estudantes a que se acrescentaram mais 20 estudantes do curso de Pós-Graduação de Aperfeiçoamento em Enfermagem para Cidadãos Estrangeiros com Formação Superior em Enfermagem, ficaram distribuídos por 8 turmas, tendo cada uma aproximadamente 37 estudantes. As sessões lectivas desta Unidade Curricular aconteciam à terça-feira e à quinta-feira, havendo quatro turmas no horário compreendido entre as 8 horas e as 14 horas. As restantes turmas tinham as suas actividades lectivas entre as 14h30 e as 20h30. Os estudantes inscritos à unidade curricular de História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção no ano lectivo 2008/2009, num total de 17 estudantes, encontravam-se matriculados nos três 6

primeiros anos da licenciatura. As aulas realizaram-se ao longo de duas semanas consecutivas. De manhã (9-14h) trabalho em sala de aula e de tarde (15-20h) realizavam trabalho para a disciplina em regime de trabalho autónomo.

Objectivos Com a definição de objectivos pretende-se enunciar clara e explicitamente os resultados que se pretendem atingir no final do processo de ensino aprendizagem. Eles conferem objectividade ao processo de ensino/aprendizagem, constituindo-se como orientadores tanto dos estudantes, quanto dos docentes enquanto permitem também a avaliação e controlo da aprendizagem. Consequentemente funcionam como critérios de aferição da validade e eficácia do processo de ensino/aprendizagem em si mesmo. Tendo por base a taxonomia de Bloom et al e de Birzea concluiu-se que os objectivos constantes das fichas das três Unidades Curriculares se centram no domínio cognitivo7,8 (ex: “Conhecer as forças sociais que influenciam a enfermagem ao longo do tempo” (1º ano); “Analisar reflexivamente a evolução dos conhecimentos e fundamentos teóricos necessários à conceptualização do cuidado de enfermagem enquanto área de intervenção autónoma” (3º ano); “Obter uma visão geral das mudanças sociais e da saúde em Portugal, nos séculos XIX e XX, compreendendo-as no seu contexto histórico-cultural” (Opção). Este domínio enfatiza a aquisição de conhecimento por parte do aluno, a capacidade de síntese, a aplicação, a compreensão, a avaliação e a análise ou capacidade de analisar.

Conteúdos programáticos Os conteúdos programáticos a expor durante as aulas devem ter por base os objectivos previamente definidos, fazendo parte dos planos das lições a par das actividades a desenvolver, dos recursos materiais, pedagógicos e temporais necessários, bem como das técnicas de avaliação.9 Pela análise das fichas curriculares das três disciplinas constatamos que a preocupação dos professores nas mesmas se centrou essencialmente nos conteúdos de natureza teórica uma vez que se enfatizou a transmissão/aprendizagem de conceitos e de aspectos relativos aos contextos sociais, económicos e políticos condicionantes do desenvolvimento da saúde e da enfermagem enquanto profissão e enquanto disciplina. Esta situação contrasta em certa medida com o que em geral ocorre no ensino da

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enfermagem. Veja-se por exemplo o estudo realizado por Silva em que foram os saberes processuais e não os teóricos que tiveram uma maior atenção por parte dos professores.10 Salienta-se no entanto que enquanto no primeiro ano se deu ênfase à evolução histórica do cuidar e à perspectiva histórica e evolução da enfermagem portuguesa, com especial incidência no último quartel do séc. XIX e em todo o séc. XX, bem como a Florence Nightingale e Virgínia Henderson, no 3º ano e tendo por base os conhecimentos adquiridos no âmbito do 1.º ano começou-se por fazer uma abordagem do conhecimento do cuidado de enfermagem. Posteriormente analisou-se: Imogene King, Madeleine Leininger, Betty Neuman, Jean Watson e Françoise Collière. Foi também abordada a evolução dos registos de enfermagem: das ocorrências aos registos electrónicos, o conhecimento emergente na prática: domínios e competências do cuidar em enfermagem, e o conhecimento baseado na evidência. No que respeita à Opção, as áreas temáticas incidiram principalmente sobre a evolução da saúde em Portugal e das instituições de saúde portuguesas no século XX. Tendo por base a obra de Gonçalves Ferreira11 – ex-Secretário de Estado da Saúde e Assistência no período compreendido entre 1970 e 1972, inseriu-se o estudo da enfermagem e dos cuidados de enfermagem no contexto social, político e económico deste período. Este enfoque nos conteúdos de natureza teórica nas três disciplinas de História de Enfermagem talvez esteja relacionado com o facto de não se pretender nestas aulas que os estudantes desenvolvam saberes processuais ao contrário do que se passa em muitas outras unidades curriculares do Curso de Licenciatura em Enfermagem. Será que aquilo que se pretende é que os estudantes não aprendam a fazer História, mas antes a conhecer a história da profissão de forma a melhor compreenderem o presente e a perspectivarem o futuro? Em qualquer dos casos consideramos que possa existir neste âmbito uma lacuna que importa rever futuramente no ensino do 1º ciclo, de molde a proporcionar e desenvolver novas competências de pesquisa e de estudo na área da história de enfermagem.

Métodos e técnicas pedagógicas Os métodos e as técnicas pedagógicas são aspectos fundamentais do processo de ensino aprendizagem a desenvolver nas diferentes aulas das unidades curriculares, os quais cabem ao professor seleccionar de acordo com a finalidade, os objectivos 8

definidos para as mesmas e os estudantes com quem irá trabalhar. Enquanto os métodos contribuem para orientar o modo como se gere a transmissão de conhecimentos, as técnicas relacionam-se com a operacionalização do método. Os métodos podem ser classificados em directivos e não directivos. Os primeiros englobam o método expositivo e o demonstrativo12 e orientam-se no sentido do docente, enquanto os segundos também designados de participativos orientam-se no sentido do estudante. As principais técnicas utilizadas no método expositivo e interrogativo são o testemunho, a analogia, as repetições, as experiencias pessoais, os exemplos, as ilustrações e as imagens mentais. Já o método participativo utiliza, entre outras, as seguintes técnicas: debate, discussão em grupo, grupos de trabalho, tempestade de ideias, estudo de casos, dramatização, demonstrações, visitas de estudos, seminários, jogos e enigmas.13 Com base na análise da documentação da disciplina de História e Epistemologia de Enfermagem I e no resultado da entrevista produzida pelo docente conclui-se que apenas o método demonstrativo não foi utilizado no decurso das lições (Quadro n.º 3). O método expositivo foi utilizado durante 29 horas e o participativo durante 20 horas distribuídas da seguinte forma: 4 horas de trabalho de campo (trabalho individual) – entrevistas à população sobre como via o papel do enfermeiro na sociedade e a evolução do mesmo e colheita de histórias de vida profissional junto de enfermeiras reformadas, no activo e estudantes de enfermagem para posterior apresentação análise e discussão em sala; 8 horas de orientação tutorial para elaboração de trabalhos de grupo com base em pesquisa bibliográfica e ou entrevistas subordinados aos seguintes temas: Florence Nightingale, Ethel Bedford Fenwick, Virgínia Henderson, Mariana Diniz de Sousa, Escola de Enfermagem Artur Ravara, Escola Técnica de Enfermeiras, Escola de Enfermagem Calouste Gulbenkian de Lisboa, Escola de Enfermagem Maria Fernanda Resende, Celibato das Enfermeiras, Auxiliares de Enfermagem, Enfermeiras Paraquedistas, Impacto do 25 de Abril na Enfermagem Portuguesa, O Sindicalismo em Enfermagem e a Ordem dos Enfermeiros; e 8 horas de seminário onde foram apresentados, analisados, discutidos e avaliados os trabalhos de grupo desenvolvidos durante o ensino tutorial (Foto n.º 1). Relativamente aos seminários e às orientações tutoriais o docente referiu que a mobilização dos saberes “para além de ser mais simples, foi em meu entender bem mais gratificante e eficiente tanto para mim como para os estudantes. Foram no entanto os espaços dedicados às orientações tutoriais aqueles que melhor permitiram conhecer os estudantes e compreender as suas dificuldades e saberes. Nestes espaços foi possível ver 9

os estudantes crescerem e desenvolverem os seus conhecimentos. Algo que me surpreendeu pela positiva foi sempre o seu enorme empenho e a qualidade dos resultados, para além até do expectável, dado tratar-se duma disciplina que no imediato para o seu futuro profissional parece não ter aplicação, porque estavam com uma enorme carga de trabalho a outras unidades curriculares e porque os resultados obtidos não iriam ter qualquer peso na avaliação sumativa da disciplina. Os estudantes mostraram uma generosidade, uma vontade de aprender e um desempenho que eu de facto não esperava”. No que se refere à Unidade Curricular de História e Epistemologia de Enfermagem II, esta foi programada, tendo em conta o pressuposto que os estudantes conheciam e dominavam o pensamento de Florence Nightingale e de Virgínia Henderson, adquirido na Unidade Curricular de História e Epistemologia de Enfermagem I do 1.º ano. Assim o trabalho desenvolvido privilegiou as leituras, reflexões, elaborações de sínteses, discussões e debates, numa orientação interactiva. Deste modo fez-se recurso a uma exposição teórica de conceitos estruturantes desta unidade curricular. O trabalho de grupo serviu, entre outros aspectos, para os estudantes identificarem e analisarem os conceitos do metaparadigma de enfermagem segundo um autor (Imogene King, Madeleine Leininger, Betty Neuman, Jean Watson e Françoise Collière) representativo de uma escola do pensamento em enfermagem e de acordo com os critérios seguintes: situar a obra (país, ano, escola de pensamento, filosofia/teoria); identificação da questão essencial desenvolvida pelo autor; identificação dos conceitos do metaparadigma da enfermagem: - Saúde; - Cuidado de Enfermagem; - Pessoa; Ambiente. Comentário crítico que incluía a análise e a reflexão do grupo sobre o conceito apresentado, mobilizando o contributo trazido pelo autor com este conceito e contextualizando-o no actual conhecimento em enfermagem. Foi ainda pedido que comparassem os conceitos estudados com os de Florence Nightingale e apresentassem posteriormente o trabalho em sala de aula. O trabalho individual serviu para confrontar os conceitos estudados com a definição que cada estudante tinha definido na primeira aula. Já o trabalho de campo foi realizado através da análise da obra de Maria Teresa Leal –“A CIPE” e a visibilidade da enfermagem: mitos e realidades. Os seminários da responsabilidade dos professores, versaram temas como entre outros os modelos teóricos de enfermagem na prática e o conhecimento baseado na evidência. Na disciplina de História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção, pretendeu-se que os estudantes se 10

apropriassem dos conteúdos programáticos, partindo das suas experiências pessoais e das aprendizagens realizadas anteriormente, tendo por base a realidade da saúde e das instituições de saúde na sociedade portuguesa contemporânea. Para o efeito recorreu-se à análise crítica de textos seleccionados, permitindo um amplo debate. Por outro lado, motivou-se os estudantes para a pesquisa de documentação, orientando-os antecipadamente para essa actividade de estudo autónomo. Realça-se pelo sua riqueza a visualização de filmes seguidos de debate com a presença de enfermeiros que vivenciaram algumas das realidades apresentadas.

Procedimentos de avaliação A avaliação é um processo sistemático e contínuo que se realiza a partir da recolha e análise de dados. Esta pode incidir sobre a aprendizagem dos alunos ou sobre o ensino.14 A avaliação do ensino tem como objectivo principal melhorar a sua qualidade. Quando realizada pelos estudantes reflecte as suas opiniões relativamente aos docentes, a eles próprios e às relações existentes entre eles e os docentes, importando que os docentes estejam atentos aos seus resultados pois se a percepção dos alunos for de que determinadas aulas são de pouco valor o declínio de motivação para elas poderá resultar em absentismo.15 Ela pode ser realizada de modo informal ou formal, sendo neste último caso os discentes convidados a preencher um pequeno questionário.16 A avaliação da aprendizagem é o meio mais satisfatório para avaliar a eficácia das aulas e tem como objectivo identificar os conhecimentos que os estudantes adquiriram com a sua frequência. Pode ser inicial, contínua ou final consoante o momento em que se realiza.17 Esta última é habitualmente sumativa podendo para a sua realização utilizar-se testes de escolha múltipla, perguntas de resposta curta, resposta longa e ou exames orais estruturados.18 A avaliação do ensino da disciplina de História e Epistemologia de Enfermagem I foi realizada no final da unidade curricular com envio aos estudantes por e:mail de um pequeno questionário pedindo-lhes que avaliassem a forma como decorreram as aulas e que as criticassem identificando: aspectos positivos, aspectos negativos e o que mudar. Dos resultados obtidos e relativamente ao docente os estudantes referiram que este “sempre se preocupou em motivar os alunos”, dando “ênfase aos diversos temas abordados”. Entenderam também ser importante a pesquisa realizada pois “A procura de documentos para estudarmos facilitou o nosso estudo” e os trabalhos de grupo que 11

“foram uma boa estratégia, uma vez que foram aulas diferentes” e “são-nos úteis enquanto forma de aprendizagem e de desenvolvimento”. Dos aspectos negativos salientaram: “o trabalho não contar para a nota final da disciplina”; “o facto do trabalho ser feito em grupos de 10, fez com que não houvesse empenho e dedicação da parte de todos os membros”; “aulas serem dadas para tantos alunos dificultava a atenção e a motivação quer dos alunos, quer do professor”. No entanto referiram que “no geral todos gostaram da disciplina” e que “foram as melhores aulas do primeiro semestre” embora sugerissem que “ler textos ou frases e debatê-la em aula seria enriquecedor”. No que diz respeito à Unidade Curricular de História e Epistemologia de Enfermagem II a avaliação do ensino foi realizada no final do ano lectivo pelos responsáveis pela gestão pedagógica do curso. No entanto ainda não tivemos acesso aos resultados dessa avaliação em tempo útil para efeitos do presente estudo. Quanto à disciplina de História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção, foi feita através de questionário. A avaliação da aprendizagem (Quadro n.º 4), no 1º ano foi sumativa. Decorreu no final da disciplina. Para tal realizou-se uma prova escrita em sala durante 120 minutos. Prova tipo americano com uma bateria de questões de resposta múltipla e de respostas verdadeiro e falso. Resultados superiores ou iguais a 10 valores significaram aproveitamento à disciplina. Dos cerca de 400 estudantes inscritos à unidade curricular no início desse ano inscreveram-se para exame 353. Obtiveram aprovação 343 estudantes os quais obtiveram a média final de 13, 68 valores. No que diz respeito à Unidade Curricular de História e Epistemologia de Enfermagem II os estudantes no início do ano lectivo, informaram por escrito a equipa pedagógica da modalidade de avaliação em que se inscreviam – se contínua, se final. Outro tanto deveria acontecer em caso de desistência da avaliação contínua. A avaliação contínua foi realizada nos moldes seguintes: trabalho realizado pelo estudante em grupo; apresentação desse trabalho em sala de aula, em quatro momentos diferentes (conceitos do metaparadigma da enfermagem); e uma prova escrita individual em sala de aula. O trabalho de grupo teve como critérios de avaliação os seguintes: Nível Mínimo – situar a obra: país, ano, escola de pensamento, filosofia/teoria; identificação da questão essencial desenvolvida na obra; identificação dos conceitos do metaparadigma da enfermagem: - Saúde: Bem-estar, doença, conforto, estilos de vida, 12

qualidade de vida, projecto de saúde, projecto de vida, outros. - Cuidado de Enfermagem: acções, intervenções, estratégias, processo de cuidar/processo de enfermagem, interacção, individualização do cuidado, parceria, empatia, o poder do cliente, transição. - Pessoa: homem, pessoa, cliente, ser humano, indivíduo, corpo sujeito, corpo objecto, corpo vivido, self, incorporação. - Ambiente: tipo de ambiente, ecologia humana, transversalidade dos ambientes. Nível de desenvolvimento – apresentação de um comentário crítico que incluísse a análise e a reflexão do grupo sobre o conceito apresentado, mobilizando o contributo trazido pelo autor com este conceito para a ciência da enfermagem, contextualizando-o no actual conhecimento em enfermagem. Os estudantes que optassem pelo exame final teriam uma prova de avaliação individual e escrita que abrangia a totalidade dos conteúdos abordados ao longo do semestre. Poderiam ainda ir a exame final os estudantes que tendo optado pela avaliação contínua reprovassem nas avaliações intercalares, desistissem da avaliação contínua ou fossem excluídos por não cumprimento das regras acordadas entre o estudante e a equipa pedagógica. As provas de avaliação individual escrita tiveram uma duração de 2 horas. As mesmas abrangiam todos os conteúdos abordados ao longo do semestre. Esta prova escrita foi constituída por questões de desenvolvimento, por questões abertas e por questões de escolha múltipla. Dos 291 estudantes inscritos nesta disciplina, obtiveram aprovação 287. A média final foi de 13,62 valores. Quanto à disciplina de História da Saúde e dos Cuidados de Enfermagem na Cultura e na Sociedade Portuguesa Contemporânea – Opção procurou-se instituir o modo de avaliação contínua, apesar da sua concentração no período em que decorreu, em que o próprio estudante foi chamado a participar com a sua auto-avaliação. Para além da apresentação oral de um tema foi realizado em grupo um trabalho que consistiu na elaboração de um poster, sobre um tema seleccionado de um conjunto de temas apresentados. No final dos 17 inscritos, a totalidade obteve aprovação (100%).

CONCLUSÃO Com esta investigação no âmbito das disciplinas de História de Enfermagem I e II verificou-se que os estudantes mostraram grande empenho nos trabalhos desenvolvidos. Também na disciplina de Opção revelaram interesse e agrado por terem realizado 13

trabalhos que contribuíram para a preservação da memória de enfermagem em Portugal. Baseados nestes dados sugere-se que a formação em História de Enfermagem seja alargada ao 2º e 3º ciclos de estudos e como tal desenvolvida no âmbito dos mestrados e doutoramentos em enfermagem com vista à sua contribuição para a construção do corpo de conhecimentos desta disciplina. No entanto, considera-se que o ensino da História está ainda numa fase incipiente, uma vez que a tónica recai mais na epistemologia da enfermagem do que no seu passado. Como pudemos constatar e com excepção da unidade curricular de Opção, as preocupações dos professores estavam relacionadas com a transmissão de saberes que se prendiam com o desenvolvimento teórico da disciplina. Naturalmente, este ponto merece todo o valor, na formação dos enfermeiros, porém o ensino da história revelou-se insuficiente, não incentivando à pesquisa, nem à realização de estudos, que levassem a uma construção sólida do passado da enfermagem portuguesa (Quadro n.º 5). Por outro lado, a metodologia embora tivesse apelado à participação dos estudantes não foi suficientemente tutorada de modo a orientar os estudantes, que obviamente tinham experiências anteriores e aprendizagens muito diversificadas no âmbito da história, para a construção e consolidação de uma aprendizagem consistente e motivadora nesta área disciplinar. Assim, entende-se que nesta matéria haverá que promover mais o debate de ideias, a pesquisa, a visualização de filmes, a ida a museus, as entrevistas a pessoas que viveram determinadas circunstâncias, promovendo o gosto, o interesse e o desenvolvimento do estudante aspectos essenciais para a construção da sua identidade como enfermeiro (Quadro n.º 6). 1

ESEL, Breve história da http://www.esel.pt/ESEL/PT/ESEL/Apresentacao/Historia/historia.htm

ESEL,

2

Idem.

3

Idem.

4

Idem.

5

M. FERRO, Comment on raconte l`Histoire aux enfants à travers le monde entier, Paris, 1983.

2008,

6

M.H.R. SILVA, Planificação curricular em enfermagem. Um estudo sobre o pensamento pedagógico do professor, Lisboa, 2004. 7

B. S. BLOOM et al, Taxionomia de objectivos educacionais, Vol. I e II, Porto Alegre, 1977.

8

C. BIRZEA, Rendre opérationnels les objectifs pédagogiques, Paris, 1979.

9

A. R. MACHADO, A função do formador, Lisboa, 1995

10

M.H.R. SILVA, op. cit., p.121.

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11

F. A. G. FERREIRA, História da saúde e dos serviços de saúde em Portugal, Lisboa, 1990.

12

Esta classificação não é consensual, pois alguns autores classificam o método interrogativo como um método não directivo. Para efeitos do presente estudo consideramos o método interrogativo dentro do método participativo. 13

A. M. FERRO, Métodos e técnicas pedagógicas, Lisboa, 1993.

14

P. T: FERREIRA, Guia do animador: animar uma actividade de formação, 4ª ed., Lisboa, 2001.

15

D. A. BLIGH, What´s the use of lectures? San Francisco, 2000.

16

A. MEIGNANT, A gestão da formação, Lisboa, 1999.

17

R. MARQUES, Dicionário breve de pedagogia, Lisboa, 2000.

18

J. METZ et al, Avaliação de aptidões, In: J. METZ et al (ed.), Medical skills. Aptidões médicas um auxiliar para docentes, Lisboa, 1999, pp.119-150.

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