Filosofia da Ciência e Pensamento Crítico (2016)

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Curso de

Biologia evolutiva Filosofia da Ciência e Pensamento Crítico Claudio Ricardo Martins dos Reis [email protected] Julho de 2016

“O nosso futuro como espécie depende em grande parte da capacidade que tivermos para cultivar o pensamento crítico — essa atitude que a ciência descobriu nos séculos XVII e XVIII e que a filosofia aprofundou nos séculos XIX e XX. Compete a cada um de nós, profissionais da ciência e da filosofia, divulgar não apenas os conteúdos próprios de cada uma das nossas áreas do conhecimento, mas também essa atitude que constitui o maior monumento alguma vez erguido por mão humana: o pensamento crítico e a inteligência clara.”

“O nosso futuro como espécie depende em grande parte da capacidade que tivermos para cultivar o pensamento crítico — essa atitude que a ciência descobriu nos séculos XVII e XVIII e que a filosofia aprofundou nos séculos XIX e XX. Compete a cada um de nós, profissionais da ciência e da filosofia, divulgar não apenas os conteúdos próprios de cada uma das nossas áreas do conhecimento, mas também essa atitude que constitui o maior monumento alguma vez erguido por mão humana: o pensamento crítico e a inteligência clara.”  Desidério Murcho em Filosofia e pensamento crítico

http://criticanarede.com/

Minha estratégia nessa apresentação 1. Utilizar (e homenagear) um cientista para exemplificar as conexões entre ciência e filosofia; 2. Fazer uma brevíssima contextualização das relações entre filosofia e ciência; 3. Abordar um tema bastante atual: a relação entre ciência e valores.

 Perguntas:

1. Que relações será que existem entre filosofia e ciência/biologia? 2. Que relações deveriam existir?

Filosofia

?

Ciência/Biologia

Richard Levins

(01.06.1930 – 19.01.2016)

Richard Levins

 “Ex-agricultor tropical [em Porto Rico] tornado ecólogo”;  Áreas: biologia evolutiva, genética de populações, modelagem científica, ecologia de populações e de comunidades, ecologia matemática, ecologia humana, filosofia da ciência, ativismo social, etc.

[2008]

[2008]

 Uma pequena autobiografia (7 pág.). •

Destaque para seus interesses científicos e seu engajamento social (e para a relação entre essas atividades).

[1968]

 Diferente dos modelos da Síntese Moderna, que assumiam o ambiente constante, Levins trabalhou a evolução em ambientes alterantes.

Teoria de metapopulações [1969]

Teoria de metapopulações [1969]  Descreve uma rede de manchas, umas ocupadas e outras vazias, na qual as sub-populações interagem.

Teoria de metapopulações [1969]  Descreve uma rede de manchas, umas ocupadas e outras vazias, na qual as sub-populações interagem.

 Levins cria o conceito, a teoria e o 1º modelo (clássico) de dinâmica de metapopulações.

Teoria de metapopulações [1969]  Descreve uma rede de manchas, umas ocupadas e outras vazias, na qual as sub-populações interagem.  Em vez de propor modelos com populações isoladas, pressupõe sub-populações em interação!

 Incorpora a heterogeneidade do ambiente!

 Levins cria o conceito, a teoria e o 1º modelo (clássico) de dinâmica de metapopulações.

Synthese [1980]

 Crítica aos programas reducionistas e holistas como “mistificadores” de propriedades (do todo ou das partes).

 “A comunidade como um todo dialético”.

[1985]

Cap. 3: “O Organismo como Sujeito e Objeto da Evolução”

Strategies of abstraction Richard Levins

Pages 741-755

Biology & Philosophy [2006]

 “Os dois tipos de ferramentas [de abstração] que nós temos são a matemática e a filosofia”.

Biology & Philosophy [2006]

 “Os dois tipos de ferramentas [de abstração] que nós temos são a matemática e a filosofia”.  “O ensino de matemática para os cientistas deve incluir a matemática que visa compreender ao invés de resolver equações ou projetar números”. Destaque para a matemática qualitativa!

Biology & Philosophy [2006]

 “Os dois tipos de ferramentas [de abstração] que nós temos são a matemática e a filosofia”.  “O ensino de matemática para os cientistas deve incluir a matemática que visa compreender ao invés de resolver equações ou projetar números”.  A filosofia “nos permite ver como diferentes abordagens se complementam ou entram em conflito”, contribuindo para a formação de um pensamento crítico.

[1966]

[1966]

 Esse artigo “é uma das mais influentes discussões filosóficas sobre construção de teorias” (Weisberg, 2006).  Problema da complexidade.

“precisamos simplificar os modelos de forma a que preservem as características essenciais do problema”.

[1966]

 Esse artigo “é uma das mais influentes discussões filosóficas sobre construção de teorias” (Weisberg, 2006).  Problema da complexidade.

 Problema da existência e da consequência de tradeoffs. Generalidade, Realismo e Precisão

[1966]

 Esse artigo “é uma das mais influentes discussões filosóficas sobre construção de teorias” (Weisberg, 2006).  Problema da complexidade.

 Problema da existência e da consequência de tradeoffs. Generalidade, Realismo e Precisão valores cognitivos em tensão

[1966]

Generalidade, Realismo e Precisão

[1966]

Generalidade, Realismo e Precisão

 “Predições precisas aplicáveis a situações particulares”.

[1966]

Generalidade, Realismo e Precisão

 “Suas equações são claramente não realistas”, mas gerais e precisas. Exemplos na física, a teoria dos gases perfeitos, as equações de Volterra, etc.

[1966]

Generalidade, Realismo e Precisão

 “Essa abordagem é favorecida por MacArthur (1965) e por mim”.  Preocupação maior com aspectos qualitativos.

Enquanto isso...

 Neil deGrasse Tyson pensa que a filosofia é uma “empreitada inútil” que formula “questões ridículas”.

 Neil deGrasse Tyson pensa que a filosofia é uma “empreitada inútil” que formula “questões ridículas”.

 Stephen Hawking afirmou que “a filosofia está morta”.

 Neil deGrasse Tyson pensa que a filosofia é uma “empreitada inútil” que formula “questões ridículas”.

 Stephen Hawking afirmou que “a filosofia está morta”.  Para Richard Feynman: “A filosofia da ciência é tão útil para os cientistas quanto a ornitologia o é para as aves”.

 Defender a irrelevância (ou morte) da filosofia é contradizer-se ou aceitar o irracionalismo.

 Uma posição diferente (não cientificista):

 Para Daniel Dennett: “Não há tal coisa como ciência livre de filosofia; há apenas ciência cuja bagagem filosófica é tomada a bordo, sem exame”.

 “Os filósofos ocupam-se do estudo cuidadoso das nossas convicções e crenças mais básicas. Tão básicas que por vezes não temos sequer consciência de que as temos: apenas agimos aceitando-as como pressupostos óbvios”. (Murcho em A irrelevância da filosofia)

 “Os filósofos ocupam-se do estudo cuidadoso das nossas convicções e crenças mais básicas. Tão básicas que por vezes não temos sequer consciência de que as temos: apenas agimos aceitando-as como pressupostos óbvios”. (Murcho em A irrelevância da filosofia) Filosofia

Pensamento crítico

Breve contextualização

Breve contextualização

 A filosofia e a ciência eram inseparáveis até o Renascimento (séc. XVII).  É na Modernidade que a ciência começa a se desprender gradativamente da filosofia.  Nos séc. XVI e XVII temos a filosofia natural, em obras como as de Francis Bacon, Galileo Galilei, Isaac Newton, entre outros.

Breve contextualização

 O positivismo de Auguste Comte e Saint Simon (séc. XIX) marca uma quebra na relação entre estes dois campos do saber.

 A partir daí a comunidade científica diminui profundamente o diálogo com a filosofia, o que segue na primeira metade do século XX.

Breve contextualização  Três momentos da filosofia da ciência/biologia:

1. Positivismo lógico/(Ruse,1973)

Ideal reducionista

2. Um papel para a história e para as especificidades das ciências/(Mayr,1988)

Biologia como ciência autônoma

3. Interface entre ciência e sociedade (Lacey, 1999; Kitcher, 2001, 2011)

Ciência e valores, usos e abusos da ciência

Além de temas do item 2

Breve contextualização

Karl Popper

Thomas Kuhn

Hugh Lacey

Breve contextualização

Hugh Lacey

Hugh Lacey

1999

2008

2010

- Artigos desde 2003 Lacey e Mariconda (2014)

[M-CV]

2005

Ciência e Valores

Questionamentos iniciais  A ciência é livre de valores? “Sim” • Ela deveria continuar sendo?

“Sim” A ciência é e deve ser neutra Pureza epistêmica

Questionamentos iniciais  A ciência é livre de valores? “Sim” • Ela deveria continuar sendo?

“Sim”

“Não”

A ciência é e deve ser neutra

A ciência é neutra mas não deve ser

Pureza epistêmica

Inclusão de valores

Questionamentos iniciais  A ciência é livre de valores? “Não” • É possível livrá-la dos valores?

“Sim” A ciência não é neutra mas deve ser

Ideal de pureza epistêmica

Questionamentos iniciais  A ciência é livre de valores? “Não” • É possível livrá-la dos valores?

“Sim”

“Não”

A ciência não é neutra mas deve ser

A ciência não é neutra nem pode ser

Ideal de pureza epistêmica

Ideal pluralista

Questionamentos iniciais  A ciência é livre de valores? “Não” • É possível livrá-la dos valores?

“Sim”

“Não”

A ciência não é neutra mas deve ser

A ciência não é neutra nem pode ser

Ideal de pureza epistêmica

Ideal pluralista

Um modelo para as interações entre valores e atividade científica

Hugh Lacey

O modelo das interações entre ciência e valores  Cinco momentos da atividade científica: M1 – da adoção da estratégia de pesquisa; M2 – do empreendimento da pesquisa;

M3 – da avaliação cognitiva das teorias e hipóteses; M4 – da disseminação dos resultados científicos; M5 – da aplicação do conhecimento científico.

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014)

O modelo das interações entre ciência e valores  Cinco momentos da atividade científica: M1 – da adoção da estratégia de pesquisa; M2 – do empreendimento da pesquisa;

M3 – da avaliação cognitiva das teorias e hipóteses; M4 – da disseminação dos resultados científicos; M5 – da aplicação do conhecimento científico.  Apenas em M3 valores não-cognitivos são ilegítimos M-CV (Lacey & Mariconda, 2014)

O modelo das interações entre ciência e valores  Cinco momentos da atividade científica: M1 – da adoção da estratégia de pesquisa;

autonomia

M2 – do empreendimento da pesquisa;

M3 – da avaliação cognitiva das teorias e hipóteses; M4 – da disseminação dos resultados científicos; M5 – da aplicação do conhecimento científico.

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014)

O modelo das interações entre ciência e valores  Cinco momentos da atividade científica: M1 – da adoção da estratégia de pesquisa; M2 – do empreendimento da pesquisa;

M3 – da avaliação cognitiva das teorias e hipóteses;

autonomia



imparcialidade

M4 – da disseminação dos resultados científicos; M5 – da aplicação do conhecimento científico.

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014)

O modelo das interações entre ciência e valores  Cinco momentos da atividade científica: M1 – da adoção da estratégia de pesquisa; M2 – do empreendimento da pesquisa;

M3 – da avaliação cognitiva das teorias e hipóteses;

autonomia



imparcialidade

M4 – da disseminação dos resultados científicos; M5 – da aplicação do conhecimento científico.

neutralidade

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014)

O modelo das interações entre ciência e valores S

M1

M3

T1

T2 A

M5

N

autonomia

T3

O modelo das interações entre ciência e valores

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014, p. 650)

Proposta de Hugh Lacey  Pluralismo de estratégias Lacey

• Complementaridade entre SDs e SCs. SDs:

SCs:

Investigam apenas as possibilidades materiais dos fenômenos (fisicalista)

Investiga o mundo dos valores e da experiência humana (intencional)

• Complementaridade entre investigações de eficácia e de legitimidade. • Além de gerar entendimento que serve a aplicações tecnológicas, precisa gerar entendimento que avalie seus valores, riscos e alternativas.

Estratégias de pesquisa descontextualizadoras (SD)

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014, p. 658)

Olhando “de fora” o circuito fechado das SDs

M-CV (Lacey & Mariconda, 2014, p. 650)

Proposta do pluralismo estratégico

(Lacey & Mariconda, 2014, p. 653)

Estratégias de pesquisa S

M1

M3

T1

T2 A

M5

N

T3

Estratégias descontextualizadoras (SDs) SDs

M1

M3

TD1

TD2 A

M5

TD3



Imparcialidade Abrangência

Neutralidade N

Estratégias sensíveis ao contexto (SCs) M1

M3

SCs

TC1

TC2 A’

M5

TC3



Imparcialidade Abrangência

Neutralidade N’

Proposta do pluralismo estratégico SDs

M1

M3

TD1

TD2

SCs

TDC

A M5

TC1

TC2

TC3

  

Imparcialidade Abrangência

Neutralidade

N

Comentários finais

Comentários finais  Não existe ciência livre de filosofia, nem ciência livre de valores;

Comentários finais  Não existe ciência livre de filosofia, nem ciência livre de valores;  O pensamento crítico envolve a atitude de avaliar pressupostos, e deve mover tanto a filosofia como a ciência;

Comentários finais  Não existe ciência livre de filosofia, nem ciência livre de valores;  O pensamento crítico envolve a atitude de avaliar pressupostos, e deve mover tanto a filosofia como a ciência;  Investigações críticas sobre a prática científica podem contribuir para o próprio desenvolvimento da ciência;

Comentários finais  Não existe ciência livre de filosofia, nem ciência livre de valores;  O pensamento crítico envolve a atitude de avaliar pressupostos, e deve mover tanto a filosofia como a ciência;  Investigações críticas sobre a prática científica podem contribuir para o próprio desenvolvimento da ciência;  Estratégias de pesquisa precisam se mostrar fecundas para que sejam tomadas como ciência;

Comentários finais  Não existe ciência livre de filosofia, nem ciência livre de valores;  O pensamento crítico envolve a atitude de avaliar pressupostos, e deve mover tanto a filosofia como a ciência;  Investigações críticas sobre a prática científica podem contribuir para o próprio desenvolvimento da ciência;  Estratégias de pesquisa precisam se mostrar fecundas para que sejam tomadas como ciência;

 Os ideais de abrangência, imparcialidade e neutralidade (enquanto pluralidade de valores) devem regular a atividade científica.

Curso de

Biologia evolutiva OBRIGADO [email protected]

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