Folha Acadêmica VIII - A conformidade constitucional da perda alargada

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A CONFORMIDADE CONSTITUCIONAL DA PERDA ALARGADA

Luiz Eduardo Dias Cardoso1

Entre a cruz e a espada. Entre a eficiência e o garantismo. O direito penal e o direito processual penal têm, em seu centro, um embate: o direito estatal de punir diante da liberdade individual. Esta delimita aquele, na medida em que é o respeito aos direitos individuais que dá os limites em meio aos quais o direito penal – forma mais gravosa de imposição do poder estatal – pode atuar. Paralelamente, há que se afirmar que, em face ao avanço e à modernização da criminalidade, os meios de combatê-la devem também evoluir. A nova criminalidade é marcada, sobretudo, pela busca do lucro financeiro e se desenvolve mediante intrincadas e hierarquizadas redes de atuação. Neste pensar, a União Europeia, por meio da Diretiva 2014/42 do Parlamento Europeu, instituiu a perda alargada, instituto de processo penal já existente em países como Portugal e Inglaterra. A diretiva é um ato normativo do Parlamento Europeu que prevê diretrizes e objetivos a serem acolhidos pelos Estados-membros, a fim de promover harmonização entre suas legislações. Seu mote é alcançar uma maior efetividade na repressão à criminalidade, sobretudo quando esta adquire caráter organizado e transnacional. O instrumento assim dispõe, em seu art. 5o: “Artigo 5º. Perda alargada 1. Os Estados-Membros tomam as medidas necessárias para permitir a perda, total ou parcial, dos bens pertencentes a pessoas condenadas por uma infração penal que possa ocasionar direta ou indiretamente um benefício económico, caso um tribunal, com base nas circunstâncias do caso, inclusive em factos concretos e provas disponíveis, como as de que o valor dos bens é desproporcionado em relação ao rendimento legítimo da pessoa condenada, conclua que os bens em causa provêm de comportamento criminoso.” (grifou-se). A Diretiva, em sua exposição de motivos, assim clarifica o motivo pelo qual institui a perda alargada: “é Graduando do curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. [email protected]. Telefone: (48) 9963-1608. Currículo http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K8738359H9. 1

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necessário clarificar a atual definição de produtos do crime de modo a incluir não só o produto direto das atividades criminosas, mas também todos os seus ganhos indiretos, incluindo o reinvestimento ou a transformação posterior de produtos diretos. Assim, o produto pode incluir quaisquer bens, inclusive os que tenham sido transformados ou convertidos, no todo ou em parte, noutros bens, e os que tenham sido misturados com bens adquiridos de fonte legítima, no montante correspondente ao valor estimado do produto do crime que entrou na mistura. Pode igualmente incluir o rendimento ou outros ganhos derivados do produto do crime, ou dos bens em que esse produto tenha sido transformado, convertido ou misturados.” A perda alargada, tal como disciplina na Diretiva sobredita, distingue-se sensivelmente da perda clássica, a qual, no Brasil, está prevista no art. 91, inciso II, e §§ 1o e 2o, do Código Penal. Esta vincula-se e restringe-se à infração penal em razão da qual houve condenação criminal, ao passo que a perda alargada, como se depreende de sua nomenclatura, permite alcançar patrimônio não necessariamente relacionado ao delito penal objeto da ação penal, contanto que satisfeitos certos requisitos normativos. A perda alargada se trata, à primeira vista, de instrumento que seria de grande valia à repressão à criminalidade moderna – sobretudo àquela organizada –, que vem avançando a passos notoriamente mais largos que aqueles dados pelos órgãos de persecução criminal – destacados o Ministério Público e as polícias. O tema exige, indubitavelmente, discussões aprofundados, mas, desde já, chama a atenção para o fato de que os instrumentos de que os órgãos supracitados estão bastante defasados em relação à criminalidade que intentam combater.

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