Folk Ballads: mulheres e representação na música tradicional estadunidense

July 3, 2017 | Autor: Augusta Silveira | Categoria: Music History, Gender Studies, Folk Music
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

! ! ! ! Augusta Silveira

! ! ! ! ! ! FOLK BALLADS: MULHERES E REPRESENTAÇÃO NA MÚSICA TRADICIONAL ESTADUNIDENSE

! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! Porto Alegre 2014

1 INTRODUÇÃO O presente trabalho busca iluminar a questão da representação de gênero e de estereótipos femininos dentro da música folk estadunidense1, no sentido de trazer a música tradicional não somente como um produto de seu tempo e de sua transformação enquanto folclore, mas também como produto de sua construção a partir dos usos (e desusos) dentro da história. Assim, a música não se mostra somente a partir de um significado inato, dentro somente de seu universo, mas perpassa significados delineados, considerando que “é socialmente construída e determina uma abundância de fatores simbólicos” (GREEN, 1997, p. 7). Nesse ínterim, relacionar conotações que derivam da posição e uso da música num contexto social, como no caso da música tradicional, com estruturas sociais que se mantêm ao longo desses distintos contextos é fundamental para analisarmos de que maneiras se conservam preconceitos e modelos dos sujeitos representados tanto nas letras como nas performances. A partir disso, é relevante colocar a importância de uma História das Mulheres que vai além do adendo à história tradicional e não serve de complemento frente a séculos de esquecimentos que resultaram na necessidade de “mudar-se o olhar” em relação a essa história que prioriza experiências masculinas e invisibiliza a mulher dentro da sociedade. Assim, colocamos o conceito de gênero sob a perspectiva de Joan Scott (1995), como um significado construído a respeito das percepções da diferença sexual e ligado às relações de poder, porém ainda como uma categoria predominantemente descritiva. Ainda podemos encontrar em Tilly aspectos importantes sobre a História das Mulheres: Ainda que definidas pelo sexo, as mulheres são algo mais do que uma categoria biológica; elas existem socialmente e compreendem pessoas do sexo feminino de diferentes idades, de diferentes situações familiares, pertencentes a diferentes classes sociais, nações e comunidades; suas vidas são modeladas por diferentes regras sociais e costumes, em um meio no qual se configuram crenças e opiniões decorrentes de estruturas de poder. (TILLY, 1994, p. 31)

Nessa pluralidade de ser e perceber-se como mulher (ou fora do espectro tradicional dessa percepção e identificação), a música e suas delineações se colocam como discurso dentro do contexto social na qual estão inseridos. Influenciados pelo poder do patriarcado, aqui citado como a “estrutura social de relações de poder onde o equilíbrio geral do poder está nas mãos dos Tratando-se de música folk tradicional estadunidense, considero como parte desse cânon tanto baladas oriundas do folclore europeu e ressignificadas pelos imigrantes dentro das fronteiras conhecidas do “Novo Mundo” como baladas e folclore particular estadunidense, bem documentadas por folkloristas como James Child e John Lomax. 1

homens” (GREEN, 1997, p. 15), o discurso sobre a música e dentro dela, dominado e sistematizado pelo patriarcado, faz parte de uma série de modelos de ação feminina em sociedade estabelecidos como aceitáveis paralela às distintas reinterpretações e resignificações dessa música tradicional na história estadunidense. 2 MODELOS DE REPRESENTAÇÃO A partir da idéia de discursos produzidos pelo patriarcado sobre as mulheres e sua pluralidade, é importante colocar que esse vasto repertório, embora mais tarde apropriado por cantoras mulheres, é (como é a música tradicional no geral) um privilégio essencialmente masculino, dos que têm a oportunidade de viajar, conversar, conhecer e produzir esse repertório a partir de suas experiências. Nesse sentido, originadas ou não da mesma vertente do folclore, a extensa maioria dessas canções são de homens sobre mulheres, colocando-as numa posição ora de admiradas, ora de reprovadas por suas ações e constituindo determinados eixos temáticos dessas baladas aqui em parte reproduzidas. 2.1 FAIR MAIDEN O primeiro modelo de representação traz uma figura comum dentro do folclore americano, a da donzela e seus incontáveis atributos. O estereótipo traz uma fair maiden como uma moça ou garota, relegada ao âmbito doméstico e aos cuidados de pais ou irmãos que se fazem disponíveis para o casamento ou se colocam contra ele por serem fiéis a alguém que partiu. Assim, John Riley (um dos vários títulos masculinos para canções com representações de mulheres) traz a lealdade e fidelidade da mulher que espera por sete anos o amor que prometeu voltar. “No kind sir, I cannot marry thee For I've a love who sails all on the sea He's been gone for seven years But still no man will I marry” A partir daí, quem lhe propõe o casamento passa a tentar a donzela com as possibilidades dos sete anos de separação, sugerindo que o antigo amor poderia estar morto em batalha ou em alto mar ou ainda já casado com outra moça. A fair maiden se mantém leal, prometendo ser fiel à sua memória em caso de morte ou desejando sua felicidade se o antigo amor estiver já casado. "He picked her up all in his arms

And kisses gave her one two and three Saying weep no more my own true love I am your long lost John Riley.” Comprovada, então, a lealdade e fidelidade da moça ao amor, o pretendente se revela, na realidade, o “perdido” John Riley. Nesse caso, a fair maiden se mostra digna do amor de John Riley e seu recato e discrição frente ao possível abandono só engrandecem seu caráter. Dessa maneira, se coloca o modelo de fidelidade à todo o custo e se impõe a dádiva do amor puro frente à questões práticas como sustento e às próprias práticas encontradas pelas mulheres ao longo da história para desvencilharem-se do subjugo do pai e da família, quando assim o desejassem: o casamento. Assim, essa fair maiden escolhe, por honra ou por amor que a espera alimenta a esperança do amor realizado, embora ele não seja unânime. Em Wagoner’s Lad, o amor não é somente uma espera, é também impossível e sem resolução. É importante notar que, dentre as baladas selecionadas, essa é a única narrada por uma mulher e cuja letra reflete sobre as agruras do “ser mulher”. “Oh hard is the fortune of all woman kind. She's always controlled. She's always confined. Controlled by her parents until she's a wife, A slave to her husband the rest of her life.” Apesar disso, trabalhar com somente uma versão de determinada balada é ignorar as transformações e adaptações temporais e regionais do folclore a outros contextos no qual é inserido. Nesse sentido, coletâneas como a das Appalachian Mountains de Cecil Sharp, em 1916, não colocam a narradora como mulher nem o primeiro verso que está na gravação de Joan Baez em 1961. O contexto que inseriu esse verso e essa mudança de narrador é, portanto, desconhecido. Assim, a balada segue narrando um amor proibido pela “prudência familiar”, que considera o pretendente indigno da mão da donzela por sua falta de posses. “Oh, I'm just a poor girl my fortune is sad. I've always been courted by the wagoner's lad. He's courted me daily, by night and by day And now he is loading and going away. Oh, my parents don't like him because he is poor. They say he's not worthy of entering my door. He works for a living, his money's his own And if they don't like it they can leave him alone.”

O amor da donzela nas duas baladas, então, segue a moralidade da pureza e do merecimento social. A existência da fair maiden se mostra essencialmente doméstica, embora sua essência clame pelo amor que a levará para longe da tutoria do pai e dos irmãos e, finalmente, para os braços de quem a merece ou de quem ela provou ser digna e fiel. 2.2 MULHERES DE AÇÃO As mulheres que ousam colocar-se em âmbito público e desafiar a lei ou as atribuições de gênero vigentes o fazem, e assim legitimam essa ruptura entre o público e o privado, em nome do amor. Familiar ou sexual, o amor exige sacrifícios que colocam a mulher longe de sua posição tradicional de mãe, irmã e esposa e a aproximam de esferas estritamente masculinas e da barganha envolvida para proteger o homem amado quando esse não pode se defender.
 Anathea traz a história de uma mulher que se entrega ao juiz na tentativa de salvar o irmão do enforcamento por roubo. “Word was sent to Anathea That her brother was in prison. 'Bring me gold and six fine horses, I will buy my brothers freedom.' 'Judge, oh, judge, please spare my brother, I will give you gold and silver.' 'I don't want your gold and silver, All I want are your sweet favors.’" Alertada pelo irmão sobre uma possível armadilha, Anathea, “mad with grief and sorrow” entrega-se para o juiz e, enquanto com ele, ouve o enforcamento do irmão. Uma outra versão da música inclui a maldição que Anathea lança ao juiz: “Cursed be that judge, so cruel Thirteen years may he lie bleeding Thirteen doctors cannot cure him Thirteen shelves of drugs can't heal him” A idéia da fair maiden que abre mão da virtude e sacrifica-se valida sua “impureza” em nome do amor, ainda mais se sua barganha mostra-se em vão. A dor de Anathea mostra-se sem solução assim como a da mãe de Geordie nessa versão (outras versões citam a mulher como esposa ou filha de Geordie). Assim, pelo irmão que roubou e vendeu cavalos de raça do rei (e aí podemos

traçar a origem antiga da balada), a mãe de Geordie também tenta barganhar com o juiz encarregado da sentença. Two pretty babies have I born the third lies in my body I'd freely part with them every one if you'd spare the life of Geordie The judge looked over his left shoulder he said fair maid I'm sorry he said fair maid you must be gone for I cannot pardon Geordie.

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A mãe oferece a vida de outros filhos, inclusive o que ainda espera, em troca pela vida de Geordie. Apesar disso, o juiz outra vez não aceita perdoar o delito de Geordie, porém dessa vez não há virtude a se tirar ou donzelas a enganar como em Anathea, e a mãe se resigna ao destino de Geordie, a ser enforcado em uma corrente dourada.
 Por último, a balada Jackaroe se une à proposta de mulheres de ação seguindo uma tradição que se inicia na idade moderna e chega até a época vitoriana de mulheres guerreiras. Assim, desafiando definições de gênero e colocando em dúvida a sexualidade, a figura da mulher guerreira dentro das baladas ilustra histórias reais de mulheres que participaram da Guerra de Independência e da Guerra Civil Americana (DUGAW, 1989). O padrão na história e na música é a mulher assumir-se como homem no campo de batalha para substituir o marido ferido ou buscar um amor perdido. As que buscavam a guerra por recompensas ou glória pessoal eram mal-vistas em todos os âmbitos. Assim, Jackaroe conta uma história bem sucedida de amor heterosexual. Já a bordo do navio, vestida com roupas “masculinas”, Jackaroe é questionada por sua aparência. "Well, I know my waist is slender My fingers are neat and small But it would not make me tremble To see ten thousand fall Oh, to see ten thousand fall” Assim, questionar a aparência e ironizar o semblante frágil de alguém que se apresenta como homem coloca padrões de masculinidade supostamente necessários para a guerra. O amor, porém, valida os esforços de Jackaroe e põe de lado qualquer questionamento sobre sua habilidade guerreira, nada a faria tremer pois há um objetivo em mente. Encontrado o amor e curados seus

ferimentos, a experiência de Jackaroe mostra outros tipos de sacrifícios como perder a feminilidade, e colocar-se em perigo sozinha em nome do amor puro. 2.3 MULHERES E MORTE O senso comum muitas vezes coloca a música tradicional como um folclore sobre morte e desilusão. Em outros eixos temáticos, já percebemos que outros aspectos são mais relevantes para a história narrada na música e a morte é apenas mais um elemento dessas baladas. Em oposição a isso, outra baladas focam na morte como solução para os problemas. Na conhecida Banks of the Ohio, a questão de gênero está explícita no feminicídio pela recusa à proposta de casamento. O pretendente se sente no direito de matar a amada por ela não corresponder ao sentimento. Em Railroad Boy, o amor não correspondido (ou ainda a infidelidade) levam ao suicídio. "Oh mother, oh mother, I cannot tell That railroad boy that I love so well. He courted me my life away And now at home will no longer stay." "There is a place in yonder town Where my love goes and he sits him down. And he takes that strange girl on his knee And he tells to her what he won't tell me." Após confessar para os pais a traição do marido (e aí está o seu refúgio além do homem que a abandonou), o pai encontra a filha enforcada. "He took his knife and he cut her down And on her bosom these words he found: "Go dig my grave both wide and deep, Put a marble stone at my head and feet, And on my breast, put a snow white dove To warn the world that I died of love” “Avisar ao mundo que morri de amor” deixa margem para outras questões sobre a moralidade que cerca a personagem e o motivo da morte. Teria sido a dor da traição que a levou ao suicídio? Ou ainda a honra manchada pelo homem que publicamente tem outras mulheres? O morrer de amor pode estar ligado ao amor rejeitado, ao casamento falido e à vergonha da exposição pelo homem que a enganou. O suicídio, então, seria a válvula de escape da dor e a maneira mais pura de limpar a honra.

Em Willie Moore, a morte vem para o homem e a mulher envolvidos. Cortejada por Willie Moore, a donzela aceita o pedido de casamento e vai à família pedir o consentimento. Nesse caso, a proibição do casamento pelos pais de Sweet Annie a coloca em duas possibilidades de ação: ou o casamento já proibido ou a morte por não poder estar com o amado. ‘I love Willie Moore’ Sweet Annie replied Far better than I love my life And I’d rather die than weep here and cry Never to be his wife” "Willie Moore never spoke that anyone heard,
 And at length from his friends did part, 
 And the last heard from him, he'd gone to Montreal, 
 Where he died of a broken heart.” Confirmada a morte trágica de Sweet Annie, os pais arrependidos da proibição, a saída encontrada por Willie Moore é o isolamento. Sem apelar para resoluções drásticas como as da amada, Willie se resigna a viver sozinho (sem cogitar juntar-se à Sweet Annie na morte) e morre, sozinho “de coração partido”. A morte nas baladas, então, se mostra como a saída para a resolução dos problemas que envolvem amor e honra, o escape dos conflitos que colocam a mulher em posição inferior, restando poucas alternativas frente a traição e impedimento do amor. 2.4 MULHERES E SORORIDADE Esse tipo de balada é um aviso a outras mulheres sobre os perigos do amor e de confiar nos homens. É importante ater-se nas diferentes apresentações e construções do folclore musical tradicional, que ensina a sociedade sobre o que pensar da mulheres e às próprias mulheres a o que pensar sobre elas mesmas, nesse sentido é relevante trazer músicas narradas por uma personagem mulher e que falam diretamente com que a escuta. Dessa maneira, também podemos refletir sobre os contextos nos quais esse repertório se inseria logo de sua popularização, se era cantado por mulheres ou ainda fazia parte do discurso masculino sobre o “ser mulher”. Em “Come All Ye Fair And Tender Maidens” o aviso é para as donzelas em geral, um chamado para que tenham atenção com os homens e seus “truques” na arte do cortejo. "Come all ye fair and tender maidens Take warning how you court young men. They're like a star of a summer's morning. First they appear and then they're gone. They'll tell you some loving story

They'll swear to you their love is true Straightway they will go and court another And that's the love they had for you." O aviso é certamente uma previsão do que vai acontecer com a mulher que se deixa levar pelo amor: primeiro os homens aparecem e depois se vão. Mais além nessa versão da balada, se descobre que o aviso é fruto de experiência própria de quem canta e lembra-se de quando foi cortejada e que afirma que se soubesse antes o que aconteceria, jamais teria se deixado ser cortejada por um homem que a deixou. Em Silver Dagger, o que dá nome à canção é o punhal de prata que dorme sob o travesseiro da mãe da narradora, que busca proteger a filha de qualquer pretendente que possa enganá-la. Outras versões da música sugerem que o pretendente, ao ser rejeitado pela família da donzela, se mata com o punhal, ato que a moça repete em seguida para “acompanhar a quem ela mais ama”, como o suicídio em Railroad Boy. Assim, vemos mais uma vez a questão da transmissão oral do folclore, da adaptação e transformação que a música assume dentro de diferentes contextos. “All men are false, says my mother They'll tell you wicked, lovin' lies The very next evening, they'll court another Leave you alone to pine and sigh." "Go court another tender maiden And hope that she will be your wife For I've been warned and I've decided To sleep alone all of my life” Nessa versão, portanto, a filha segue os conselhos da mãe e desacredita nas intenções do pretendente, escolhendo viver sozinha o resto de seus dias. É importante notar que em baladas desse tipo, quem merece esses avisos e os conselhos de mulheres que já conhecem os enganos dos homens são as donzelas. O afastamento do contato e das investidas masculinas preveniria os suicídios por amor, os abandonos e os sacrifícios a serem feitos por um delito cometido por alguém que se ama ou para acompanhá-lo em guerra e abrir mão da feminilidade. Nesse sentido, o aviso é válido e um pedido por prudência vindo de mulheres mais experientes para as donzelas a mercê da ação da família (e que encontram maneiras extremas de escapar dessa ação) e, mais tarde, do marido.

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3 USOS E DESUSOS DA MÚSICA TRADICIONAL - FOLK REVIVAL As baladas citadas acima e inseridas em modelos temáticos sobre mulheres foram extensamente utilizadas e apropriadas pelos cantores e outros performers em seu repertório ao longo do anos. Nesse ínterim, é importante citar que no contexto do Folk Revival Americano entre 1930 e 1970, essas baladas voltam com a força da mídia de massa para os lares estadunidenses em vozes femininas. O modelo de mulher presente nas baladas também se enraiza nas cantoras desse período da história. Acompanhando as letras das músicas, a imagem da cantora folk Joan Baez corroborava para que o público a percebesse dessa maneira, suas canções narravam o lamento de uma “fair maiden” esquecida que poderia ser ela mesma. Entre 1959 e 1963, Joan se consolida como a “Rainha do Folk” dentro da cena musical americana cantando boa parte das baladas já citadas. Joan se aproxima das definições do patriarcado sobre a performance feminina, fechada em seu corpo e usando-o como instrumento (a voz), além do ato de cantar ter relação com a maternidade e ser relacionado a uma atividade do âmbito doméstico. Assim, a feminilidade da mulher artista faz parte dos significados delineados da música, visto que quando ouvimos uma artista mulher, também estamos cientes de sua posição discursiva num nexus de gênero e sexualidade (GREEN, 1997, p. 16). Outras mulheres, embora com menos atenção da mídia e menos sucesso comercial, também conquistaram espaço nos festivais e fizeram parte da cena folk americana do início dos anos 1960, seja em conjuntos musicais (como Mary Travers, de Peter, Paul and Mary) como em carreira solo (como Judy Collins, Carolyn Hester e Hedy West), todas se apropriando desse repertório de baladas e da imagem da madonna. Enquanto a performance feminina dá margem para a dicotomia madonna/prostituta e para questionamentos sobre a sexualidade de quem interpreta as baladas, o discurso presente nessas canções afirma as definições patriarcais do “ser mulher”. A união das duas esferas, portanto corrobora com os estereótipos femininos dentro da música e suas delineações. Assim, pouco se problematiza o discurso presente nessas músicas e seu uso e apropriação num contexto que propunha Direitos Civis e ideais de liberdade e contestação nos Estados Unidos da década de de 1960.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesse trabalho, portanto, trazendo como fontes as baladas tradicionais que se inserem em estereótipos firmados dentro da sociedade sobre as mulheres, seu caráter e seu papel social em contextos distintos, é possível reafirmar a pluralidade de discursos que se estabelecem sob influência do patriarcado e valorizando a narrativa masculina ao longo da história. De que maneiras esse discurso dentro das baladas penetra a sociedade e influencia outras delineações musicais como a imagem que estabelecemos das artistas e o comportamento esperado dessas cantoras? Dessa maneira, se legitimam modelos de comportamento e de ação feminina dentro do folclore musical e de cantoras dentro das interpretações dessas canções. A partir disso, o uso do discurso do patriarcado, mesmo que enraizado no folclore e na música tradicional, não é isento de responsabilidade. A música, e principalmente a música folk tradicional, não é feita somente uma vez. A balada (e o discurso imbricado nela) é fruto de seu tempo, mas é ressignificada, transformada, reescrita e apropriada de diversas maneiras e em diferentes contextos sociais e é nesse sentido que se deve problematizar o seu uso e seus esquecimentos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COHEN, Ronald D. Folk Music: the basics. Nova Iorque: Taylor & Francis, 2006. COOK, Susan. “Cursed Was She”: Gender and Power in American Balladry. In: COOK, S. e TSOU, J. (Ed.) Cecilia reclaimed: feminist perspectives on gender and music. Champaign: University of Illinois, 1994, pp. 202-222. DUGAW, Dianne. Warrior Women and Popular Balladry 1650-1850. Cambrigde: Cambridge University Press, 1989. GREEN, Lucy. Music, Gender and Education. Cambridge: Cambridge University Press, 1997. SCOTT, Joan Wallach. “Gênero: uma categoria útil de análise histórica”. Educação & Realidade. Porto Alegre, vol. 20, nº 2, jul./dez. 1995, pp. 71-99. TILLY, Louise. Gênero, História das Mulheres e História Social. Cadernos Pagu (3), Núcleo de Estudos de Gênero/UNICAMP, São Paulo, 1994.

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