FORMAÇÃO DE PROFESSORES MEDIADA POR BLOGS – A EXPERIÊNCIA DO CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA DA UFRB

May 26, 2017 | Autor: Leandro Almeida | Categoria: Teaching History, Digital Media and Learning
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In: LEAL, Maria das Graças de Andrade; FARIAS, Sara Oliveira. História Regional e Local III: reflexões e práticas nos campos da teoria, pesquisa e do ensino.1ª ed.Salvador : EdUneb, 2015, v.1, p. 159-194. FORMAÇÃO DE PROFESSORES MEDIADA POR BLOGS – A EXPERIÊNCIA DO CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA DA UFRB

Leandro Antonio de Almeida1

Resumo: O objetivo analisar a utilização de um blog para o relato de experiências de estágio de regência no curso de formação de professores de História na UFRB. A metodologia da atividade consistia na postagem semanal, em um blog restrito aos estudantes e convidados, de um relato reflexivo sobre as atividades teóricas da disciplina Estágio Supervisionado e as vivências dos estudantes nas salas de aula das escolas públicas do Recôncavo. Cada estudante também devia fazer comentários sobre as postagens dos colegas, podendo fazer críticas, sugestões, comparações, relações com textos acadêmicos ou notícias. Como resultados, além da familiarização dos estudantes com um blog, a produção de conhecimento sobre a realidade educacional do Recôncavo, ao ser mediada por uma ferramenta virtual, passa a ser coletiva e dialogada. O professor supervisor deixa de ser a única referência para avaliar o saber sobre a experiência do estagiário, tornandose mais um ator em uma rede. Por outro lado, as participações pouco mobilizaram o referencial teórico do curso e nem utilizaram a ferramenta como fonte de compartilhamento de informações, mas se pautaram pela expressão de emoções, motivação e sugestões diante dos problemas relatados. Palavras-chave: Estágio Supervisionado, Blog, formação de professores.

Introdução

No final do primeiro semestre de 2010, um grupo de alunos do curso de Licenciatura em História da UFRB procurou-nos para opinar sobre a disciplina Estágio Supervisionado II, que se encerrava. Realizado no sétimo semestre da graduação, os futuros professores assumiram, por cerca de dois meses, uma turma do Ensino Fundamental II da rede pública da região do Recôncavo Baiano. 1

Doutor em História Social pela FFLCH-USP, Professor de Ensino de História e Estágio Supervisionado da UFRB.

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Em seus comentários, os estudantes disseram que a disciplina foi importante para a formação por compreenderem na prática o ofício de professor. Mas tinham duas reclamações: o pouco peso das avaliações parciais durante o estágio (que carregava o peso do relatório) e, principalmente, a solidão. À exceção de alguns encontros presenciais e comunicações por Email com o professor orientador, as atividades realizadas na escola pouco permitia encontros. Mesmo na universidade, com os colegas de turma, o espaço para trocas de experiências por conta das outras atividades acadêmicas era restrito. No final do curso, uma única aula não parecia suficiente para expressar a complexidade das soluções, ideias e angústias vivenciadas nos meses diante dos alunos do Ensino Fundamental. O currículo do curso de História da UFRB prevê a continuação da experiência de regência no Ensino Médio, na disciplina Estágio Supervisionado III. Tivemos um mês para encontrar uma forma de atender as justas queixas dos estudantes: como compartilhar as experiências durante o próprio processo de regência de modo que também servissem para avaliação? Para tentar resolver esse problema, decidimos utilizar um blog na disciplina, pois ele permitia compartilhar e registrar os relatos das aulas durante os dois meses que os estagiários estivessem ausentes das aulas na universidade, assumindo uma turma no Ensino Médio. A novidade foi bem aceita pelos estudantes e se transformou num laboratório, pois nos permitia observar se a reflexão sobre a realidade educacional do Recôncavo seria transformada pela mudança. O objetivo desta comunicação é analisar o resultado da experiência para compreender a formação de professores de estágio mediada por uma ferramenta de comunicação digital. Para desenvolver o texto, vamos explicitar nosso referencial teórico sobre estágio, descrever a metodologia da atividade e analisar a interação dos alunos no blog.

Referencial Teórico Nossa experiência de quatro anos na orientação do estágio supervisionado, modalidade de regência, mostra que esse é um momento de ruptura dentro da trajetória acadêmica dos estudantes e futuros professores de História. As angústias e medos gerados pelas expectativas de desafios tornam a imersão na escola um momento comparável à aprovação nos exames seletivos ou à defesa de TCC. Como aponta Pimenta e Lima (2004, p. 100), é um rito de passagem. No primeiro dia de aula dizemos aos alunos, até agora sem errar, que “depois dessa disciplina, vocês nunca mais serão os mesmos”.

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A novidade não está no espaço escolar, conhecido pela experiência mínima de onze anos no sistema educacional, aos quais se somam as observações exigidas nos cursos de formação docente. O que muda é o papel desempenhado, não mais de aluno ou observador, em alguns casos pai, vizinho ou funcionário. Com auxílio do orientador e do supervisor na escola, agora o estagiário se torna professor, com a responsabilidade de mediar atividades de ensinoaprendizagem de uma área específica em uma única turma por um período de tempo. Para muitos estagiários, frequentemente jovens, essa é a primeira ocasião para vivenciar a rotina, as tarefas, as dificuldades, interagir com sujeitos, descobrir os prazeres e desenvolver os saberes necessários à docência. Como sintetiza Flávia Caimi: No caso específico do estágio, essa iniciação profissional representa também, para a maioria dos sujeitos, a transição entre o papel de estudante, desempenhado ao longo de aproximadamente 16 anos, desde o início da sua escolarização, e o papel de professor, que precisa assumi-lo como exigência institucional para obter a titulação profissional. Nessa transição está presente a de(com)frontação entre as expectativas sobre a profissão acalentada ao longo de anos e as vivências reais que a prática lhe possibilita, entre o ideal de uma profissão e o real de uma experiência vivenciada, enfim, entre a “teoria” acadêmica e a “prática” escolar. (CAIMI, 2008, p. 169).

Entendemos o desenvolvimento dos saberes no estágio não como a prática que executa a teoria aprendida em outro lugar no curso de graduação mas, com Selma Garrido Pimenta (2004, 2006), como a produção de conhecimento teórico e prático a partir da aproximação da realidade educacional, em especial a escolar. A dimensão teórica está presente não apenas na mobilização de pesquisas para analisar tais realidades mas tomando estas como objeto a ser investigado, compreendido, problematizado e criticado durante ou após o período de imersão no campo. Na perspectiva da emancipação social, a concepção de professor que sustenta essa proposta é a formação de um intelectual crítico e reflexivo, capaz de questionar o trabalho docente em sala de aula e os contextos históricos, sociais e institucionais que lhe condicionam. Logo, no estágio se articulam observação, experiência, reflexão, análise, teorização, problematização, investigação e crítica do sistema educacional a partir das práticas dos sujeitos envolvidos na escola, incluindo o estagiário. Ao estágio, sobretudo ligado à aprendizagem da profissão docente na formação inicial, cabe: desenvolver atividades que possibilitem o conhecimento, a análise, a reflexão do trabalho docente, das ações docentes, nas instituições, a fim de compreendê-las em sua historicidade, identificar seus resultados, os impasses que apresenta, as dificuldades. Dessa análise crítica, à luz dos saberes disciplinares, é possível apontar

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as transformações necessárias no trabalho docente, nas instituições. (PIMENTA e LIMA, 2004, p. 55).

A mudança na concepção e nos objetivos leva também a uma mudança no papel do supervisor em campo e do orientador da instituição de nível superior. Ela pode ser marcada por formas rígidas de inspeção e direção, concepção tão arraigada que a maioria dos estagiários ainda temem nossa presença nas escolas. Nosso esforço inicial e em campo é levá-los a compreender, como aponta Chaves (1999, p. 15 apud Pimenta e Lima, 2004, p. 114), que a supervisão tem uma dimensão pedagógica de sustentar reflexão sobre os fenômenos estudados ao permitir distanciamento e aproximações das situações observadas. Tanto o orientador quanto o professor supervisor podem contribuir com o estagiário a partir de seus olhares, conhecimentos e experiências na disciplina específica e na prática docente, além de fornecer um suporte emocional durante as dificuldades encontradas, sendo orientadores com quem pode dialogar na busca de solução de problemas. A mesma percepção tem Isabel Alarcão quando diz que a função dos supervisores institucionais é, fundamentalmente, encorajar os professores [ou estagiários] a trabalharem em conjunto, como colegas, numa atitude indagadora e transformadora. O que é que está em causa nesta concepção? O supervisor não é aquele que faz, nem é aquele que manda fazer; é a pessoa que cria condições para que os professores pensem e ajam e façam isso de uma forma colaborativa, de uma forma crítica, indagadora, portanto, com um espírito de investigação que é hoje absolutamente necessário. Não têm que ser, costumo eu dizer, investigadores no sentido verdadeiramente acadêmico, mas têm que ter o espírito de investigação e têm que ser capazes de fazer algumas pequenas investigações, porque só isso é que possibilita que, realmente, haja inovação e transformação. (ALARCÃO, 2009, p. 120)

As perspectivas de estágio e supervisão acima delineadas fazem parte da rotina de cursos de formação do professor de História no Brasil, inclusive na UFRB onde atuamos. Algumas dessas práticas já geraram frutos acadêmicos. Por exemplo, Aristeu Rocha e Maria Catharina Pozzebon (2013) refletem sobre o trabalho desenvolvido no curso de licenciatura em História da Universidade de Cruz Alta (RS), cujas atividades são orientadas à pesquisa nos quatro estágios - observação, regência fundamental, regência no Ensino Médio e prática em espaços não formais. De maneira distinta, Crislane Barbosa de Azevedo (2011) desenvolve um projeto de formação de professores-pesquisadores na disciplina de Estágio Supervisionado da UFRN a partir da pesquisa em campo que ensejam um simpósio temático em um evento do curso, no qual os estudantes apresentam suas investigações.

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Outra experiência de pesquisa interessa-nos de perto tanto pela densidade das análises, que a tornam a principal referência no assunto, como por fazer uso de um ambiente virtual de aprendizagem. Ensejando um doutorado sobre prática de ensino, foi desenvolvida no ano de 2004 por Flávia Caimi na disciplina Prática de Ensino II – Estágio Supervisionado – do curso de Graduação em História (Licenciatura Plena) da Universidade de Passo Fundo, com 26 universitários matriculados na disciplina. Partindo do referencial teórico de Bakhtin e Piaget, o objetivo de Caimi foi investigar os sentidos produzidos pelos estagiários sobre a aula de história, perscrutar os processos de conceituação da ação docente desenvolvidas no estágio curricular, e avaliar as condições de possibilidade criadas e a qualidade das estratégias com base nos efeitos provocados/produzidos sobre os estagiários (2008, p. 15). As fontes foram coletadas a partir do próprio desenvolvimento do estágio encontros presenciais, interações virtuais e visitas ao campo, consistia de produções dos estagiários e da pesquisadora nesses diversos momentos, além das interações virtuais. O ambiente virtual de aprendizagem (Avenca) utilizado nessa pesquisa foi desenvolvido na UFRGS especialmente para atender situações de Ensino Aprendizagem. Possui diversas ferramentas como webfólio, no qual são postadas a produção individual realizada no estágio como planos de aula, narrativas autobiográficas, produções sistematizadoras de estudos, autoavaliação e avaliação compartilhada. Já o for-chat possibilita discussões síncronas e assíncronas dos professores, supervisores e estagiários, reunindo facilidades de chat e de fórum. Os motivos que levam à utilização do ambiente virtual visam superar os aspectos negativos da aula presencial, a qual: permite que os alunos constituam presença física sem, necessariamente, participarem com autoria do processo coletivo de construção do conhecimento (...); delimita o tempo da interação às quatro horas-aula semanais previstas na organização curricular do curso, disciplinando a vez de cada um ouvir e falar, de forma linear, sem simultaneidades; estabelece uma suposta linearidade permitindo apenas uma temática em discussão a cada vez, o que exige a concentração de todos, ao mesmo num único aspecto, restringindo a multiplicidade de relações. (CAIMI, 2008, p. 65)

Por outro lado, o ambiente virtual tem a seu favor a) a possibilidade de questionar os processos naturalizados de sala de aula e as posições instituídas de saber centradas no professor; b) a possibilidade de oportunizar lugares de dizer a todos, simultaneamente, potencializando o tempo pedagógico; c) a possibilidade de favorecer as discussões e a produção cooperativa, gerando material abundante para a análise compartilhada e o redimensionamento do trabalho através dos registros postados no ambiente; d) a possibilidade de

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experimentar um processo de construção de conhecimento pautado em perspectivas dialógicas (Bakhtin) e em trocas cognitivas (Piaget). (CAIMI, 2008, p. 66)

A autora pauta-se nas reflexões de Pierre Levy sobre os impactos das tecnologias da informação e comunicação (TICs) na inteligência humana e na sociabilidade do século XXI, endossando a perspectiva de criação de um projeto de civilização fundado nos coletivos inteligentes como possibilidade de “recriação do vínculo social mediante trocas de saber, reconhecimento, escuta e valorização das singularidades” (LEVY, 1993, p. 118 Apud Caimi, 2008, p. 123). Essa possibilidade estaria aberta pelo desenvolvimento do ciberespaço baseado em hipertextos, o qual elimina a distância entre emissores e receptores, instaura espaços e tempos não fixos de comunicação e possibilita a constituição cooperativa de um contexto comum entre muitos interlocutores (ibidem). Tal perspectiva fundamenta o trabalho grupo de pesquisa de sua orientadora, da qual Caimi partilha a importância da investigação sobre ferramentas informáticas no campo da educação para a formação dos professores. Nos estágios supervisionados, com a comunicação em rede possibilitada pelo ambiente virtual de aprendizagem, a sua intencionalidade (e também a nossa) é provocar condições de possibilidade para encontros entre pensamentos, encontros que possam implicar seus participantes, de um modo muito especial, em experiências de aprendizagem de natureza cognitivo conceitual e, ao mesmo tempo, ético-vivencial. (Axl; Elias, 2003, p. 60 apud Caimi, 2008, p 125).

Metodologia Procedimentos No Estágio Supervisionado II, sem o blog, a parte preparatória acontecia na universidade, com discussões sobre o Ensino de História no Ensino Fundamental II (6º a 9º ano) a partir de textos e filmes. A outra parte era realizada na escola. Nessa regência o estagiário foi supervisionado um professor da educação básica e recebeu visita do orientador da UFRB para assistir e opinar sobre uma aula, podendo se reunir com este quando tivesse necessidade. As avaliações consistiram, na primeira parte, de apresentação da observação da sala de aula e dos planos de aula e unidade preparados; no final, de apresentações em sala da experiência de regência e, com maior peso, um relatório reflexivo, individual, de cerca de quinze páginas. A avaliação do estágio III incorporou elementos da disciplina anterior: na parte preparatória

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ocorreram apresentações em sala da observação das salas e dos planos de unidade e, no final, apresentação das experiências finais e entrega de um relatório final de no máximo cinco páginas. Ele teria um caráter sintético porque a parte central, analítica, foi toda transferida para a nova avaliação, que teve metade do peso da disciplina, o blog. No início de agosto criamos um blog intitulado Estágio III – 2 semestre 2010 no endereço eletrônico http://estagio3ufrb2010.blogspot.com.br. A escolha da plataforma Blogger deveuse a esta ser uma das mais acessíveis a pessoas que não tiveram familiaridade com ferramentas digitais, como foi o caso de uma de nossas alunas.

Figura 1 – página inicial do blog.

Na qualidade de administrador, no primeiro dia de aula cadastramos os 21 estagiários como autores do blog. Esta primeira aula foi realizada no laboratório de informática, onde todos puderam criar conta de e-mail específica do Gmail para acesso (caso ainda não o tivessem), cadastrar-se a partir de um convite eletrônico e realizar testes de postagens e comentários. Para que os estudantes sentissem o máximo de liberdade para relatar e comentar os relatos dos colegas, o blog teve acesso restrito, sendo facultada a participação a qualquer interessado, como foi o caso de um veterano que se tornou leitor.

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Figura 2 – página de configurações com os autores.

A principal tarefa semanal consistia na postagem de um relato sobre as atividades do estágio. Na parte preparatória, foram desenvolvidas as seguintes atividades: observação da escola, elaboração livre de uma proposta para organização do Ensino Médio, relato da própria vivência no tempo de estudante do Ensino Médio, entrevista com o(a) professor(a) supervisor e preparação do plano de unidade a ser desenvolvido na escola. Quando os estudantes assumiram a sala de aula, os relatos versaram sobre a experiência de cada semana, devendo comparar reflexivamente o que foi planejado com o que foi efetivado.

Figura 3 - postagem

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Um detalhe importante sobre a forma das postagens foi o título, que servia como identificador. Orientamos os estudantes a colocar sempre o seu nome acompanhado da atividade realizada na semana, por exemplo “Adriano – última aula”, “Rodrigo – Plano de Unidade”, “Ana Paula – aula 2”. Como o arquivo do blog foi organizado semanalmente (ver figura 3 abaixo), através dele era possível ao orientador e a qualquer estagiário acessar o que foi feito por qualquer um. Dessa forma, o próprio arquivo se transformava num mapa de todo o trabalho realizado. Outra forma de acessar informações era pelo mecanismo de busca. Além disso, na semana, cada estudante deveria comentar postagens de três colegas diferentes, nos quais se poderia tecer críticas, sugestões e comparações com a própria experiência ou com a observação da situação escolar. Caso houvesse falta justificada ao estágio ou não houvesse aula na escola, como forma de compensação o estagiário deveria fazer outros três comentários em três postagens diferentes dos colegas. Como orientador, também cabia a nós interagir com o trabalho descrito via comentários, feitos após os dos alunos.

Figura 4 – comentários (esquerda) e arquivo do blog (direita)

Orientamos os estagiários a escrever postagens e comentários prioritariamente reflexivos. Na tentativa de transcender o nível da experiência e mobilizar os estudos feitos na universidade,

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solicitamos que mobilizassem os textos lidos na disciplina atual e nas anteriores, ou outros com os quais tivessem contato. Nesse sentido, para dinamizar a participação, incentivamos também a divulgação e o comentário, dentro do blog, de textos acadêmicos e notícias sobre educação e ensino de história digitalmente disponíveis na internet. Compartilhadas como postagens pelo orientador e pelos estudantes, essa seria uma forma de criar uma rede de informações que pudesse fundamentar as reflexões sobre as experiências das escolas. Os estagiários também escolheram, via enquetes e comentários no blog, os melhores prazos semanais para escrever. Estabeleceu-se por consenso que, na medida do possível, as postagens deveriam ser feitas até as 23:59 de sexta-feira, para dar tempo de todos lerem, e os comentários até 23:59 do domingo. O cômputo da participação era feito na semana subsequente, o que foi utilizado como critério de avaliação.

Vantagens esperadas Essa flexibilidade de horário foi a primeira das vantagens que vislumbramos na utilização da nova ferramenta porque ela permitiria os estudantes organizarem as atividades de estágio de acordo com suas necessidades e afazeres. Podendo escrever e publicar a partir das suas residências ou vizinhanças, eles não estariam presos a horários e locais para interagir com os colegas. Isso permitiria superar uma das dificuldades frequentemente encontradas no estágio e nas aulas presenciais da universidade: o deslocamento entre as cidades gerava atrasos por conta da precária rede de transportes da região do Recôncavo. Outra vantagem esperada foi a possibilidade de realizar uma avaliação continuada. Além das questões burocráticas de nota exigida pelo sistema acadêmico, até então o orientador universitário tinha contato com a experiência do estagiário na sua visita ao campo, feita apenas em uma ocasião, ou quando era procurado, o que ocorria apenas quando haviam dúvidas ou problemas. Com os registros semanais no blog, haveria um acompanhamento efetivo dos trabalhos do campo, além de um contato maior do estagiário com o orientador. A maior expectativa direcionava-se ao papel pedagógico que o estágio teria para a turma com a participação no blog. Se a produção de relatos sobre a experiência nas escolas passasse a ser compartilhada e dialogada de maneira sistemática entre os estagiários, o professor deixaria de ser o centro de referência do saber e se tornaria mais um ator em uma rede. Como os relatos estariam sob o olhar de toda a turma para avaliação, críticas, comentários e sugestões, a produção de saberes seria feita de maneira coletiva.

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Outra vantagem em longo prazo poderia ser propedêutica. Ao término da disciplina Estágio III, oferecida no último semestre do curso, esperávamos que os estagiários estivessem suficientemente

familiarizados

com

a

ferramenta

“blog”

e

com

a

dinâmica

postagens/comentários. Assim, caso desejassem, poderiam utilizá-la nas aulas de História na escola básica quando se tornassem profissionais da educação, repetindo a mesma experiência de compartilhamento de experiências e informações e construção coletiva de conhecimento.

Resultados Visão Geral Baseados na metodologia do trabalho de Caimi (2008), vamos analisar os padrões dos relatos dos alunos no blog. Vamos considerar as atividades feitas pelos 21 estagiários e pelo orientador no período de observação das aulas, preparação dos planos de unidade e regência nas escolas. Isso aconteceu entre 27 de setembro e 3 de dezembro (para postagens) ou 5 de dezembro de 2010 (para comentários), apesar de haver atividades atrasadas até terça da semana seguinte. Podemos analisar quantitativamente a participação dos alunos através dos gráficos abaixo, expressos em termos de notas que incidiam sobre a realização da atividade, nunca sobre seu conteúdo. Cada postagem valia 0,15 e cada comentário 0,05, totalizando o máximo na semana de 0,3. O total máximo na disciplina, incluindo a parte preparatória, valeria 5,1, ou seja, a metade da nota (0 a 10). Considerando apenas as 10 semanas relativas ao trabalho de campo (a observação/plano de unidade mais 9 semanas de aula), a nota máxima é 3,0. Assim,

Gráfico 1 – níveis de participação dos alunos (nota máxima:3,0)

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Gráfico 2 – Participação total dos 21 alunos ao longo das 10 semanas (máxima: 6,3)

Os gráficos mostram que a participação dos estudantes na atividade não foi total, como esperávamos. Através do primeiro, percebemos que um terço da turma (7 alunos) teve notas abaixo (4) ou na faixa da média (3). É interessante notar que o comportamento dos quatro alunos que menos participaram foi distinto: uma expressou, inclusive verbalmente, aversão ao blog, solicitando fazer o relatório à moda antiga; outro fez 5 postagens ocasionais, mas não fez nenhum comentário; uma terceira aluna, que trabalhava, participou ativamente das quatro primeiras semanas, deixando apenas de fazer um comentário, mas depois abandonou totalmente o blog; e o quarto aluno deixou de participar nas quatro primeiras semanas de aula em campo e depois participou ocasionalmente do blog através de postagens. De maneira geral, a participação da turma situou-se acima da média. Em termos de notas, vemos quase um terço da turma na faixa mais alta, o que significava que realizavam postagens e todos comentários, e uma outra faixa que oscilava entre essas duas atividades. Se observarmos o segundo gráfico, veremos que a tendência se mantém ao longo do tempo. Atribuímos a participação maciça na primeira semana ao fato de ser nela que se relataram as observações das aulas e foram apresentadas os planos de unidade, coincidindo com a apresentação presencial. Depois dela, notamos uma queda brusca nas duas primeiras semanas do campo, retomada e mantendo-se estável acima da média (entre 4 e 5) pelas seis semanas seguintes, diminuindo na última, que era a semana de entrega e defesas do TCC na graduação. Outro indício que a maior parte dos alunos cumpriram a atividade porém sem maior engajamento foi a quase ausência de realização de atividades excedentes: somente 4 comentários além dos solicitados foram registrados por três alunos em semanas diferentes.

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Nesse período de dez semanas foram realizadas pelos alunos no blog: 143 postagens, com 120 relatos de atividades e 23 recados, na maioria informes ao professor sobre ausência de aulas; 3 reproduções de notícias; 588 comentários de alunos em postagens dos colegas; 1 comentário em postagem do orientador e 24 comentários em notícias2. Tendo em vista o baixíssimo nível de compartilhamento de notícias e a ausência de textos acadêmicos, percebemos que a proposta de transformar o blog numa rede de partilha de informações não foi atendida, e o mesmo foi basicamente utilizado para relatar e comentar as atividades feitas na escola. Quanto aos temas, as postagens são mais padronizadas, pois trazem os objetivos e conteúdos dos planos da aula, o desenvolvimento das mesmas, incluindo dificuldades e imprevistos, com manifestação de emoções. Chamou a atenção o fato de quase metade das postagens serem destinadas ao mero relato do “transcorrido”, sem mobilizar a bibliografia do curso para reflexões mais amplas ou mesmo arrolar os textos utilizados no preparo da aula. A aula transcorreu no dia 17 deste mês. Objetivo: Realizar um revisão dos principais pontos abordados nas aulas passadas, sobre o Iº Império do Brasil e a Regência. Transcorrido: A aula ocorreu sem muitos transtornos, pois a revisão partiu dos alunos que, a apresentaram algumas dúvidas, mas no demais, estes demonstraram que aprenderam relativamente, pois, os que mais frequentaram se mostraram mais firmes, enquanto os que faltaram um dois dias estavam mais inseguros. Assim, a aula durou um pouco menos do que o que deveria durar, visto que, após responder as dúvidas dos alunos, acabei dispensando e, marcando a prova - e como ele será realizada - para a semana que vêm. Além disso, disse a eles que eu não daria o resultado da quarta unidade a eles e sim o professor X. Com isso, praticamente me despedi deles, pois não quero interrompê-los no momento da prova. Reflexão: A aula foi boa, apesar de que revisar se torna uma atividade necessária, porém muito chata, tanto para mim como para os alunos. Desse modo, a aula foi positiva, pois os alunos não mostraram tão cansados, mas sim, colaboraram, perguntando algumas questões interessantes, que ajudaram a complementar a revisão. (Postado por GB, 19 novembro de 2010 às 20:13:00)

Vemos nas postagens uma organização buscando atender os critérios estabelecidos pelo orientador, expressando o movimento entre preparo, sinteticamente mencionado o conteúdo, relato e reflexão. Na postagem acima foi destacada a tranquilidade da aula, os diferentes níveis da turma, a curta duração, a prova e seu resultado. O objetivo aqui foi pontuar os momentos chave, porém sem levantar e aprofundar questões. Tanto é que narrativa se mantém 2

Já o orientador atuou em 6 postagens, classificadas como: 6 instruções para o blog, 4 informes gerais sobre a disciplina, 2 intervenções em discussões, 1 divulgação de texto acadêmico, 16 divulgações de notícias externas e 80 comentários

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num nível vago: por exemplo, não sabemos quais foram as dúvidas dos alunos, o que significa aprender relativamente, qual a natureza da segurança e da insegurança mencionadas. O depoimento chama “Reflexão” uma avaliação da aula que, apesar de vagamente expressa (boa), o critério é definido, a participação dos alunos, considerada positivamente porque o estagiário a concebe como chata e cansativa. Esse sentido de reflexão como avaliação a partir das percepções e sentimentos sobre a atividade foi um padrão nas postagens do blog, como pode ser visto em outro relato: Nessa semana, a aula do dia 23/11 estava reservada para a apresentação dos seminários dos alunos. Entretanto devido a problemas técnicos (tv pendrive) e aos pedidos de alguns alunos, decidi adiar o seminário para o dia 26/11. Então, resolvi passar o filme " O nome da Rosa" (por precaução) caso os alunos não quisessem apresentar o seminário, assim, pediria um resenha sobre o mesmo. Mas atendendo às minhas expectativas, os alunos compareceram à aula e apresentaram o seminário que tinha o intuito de retratar as peculiaridades das pinturas, esculturas, da música, etc, no Renascimento. De maneira geral, as apresentações foram satisfatórias, mas alguns problemas foram identificados. Os alunos ainda se prendem ao papel para explicar o seu assunto e ainda ficam bastante nervosos durante as apresentações. Estes também ainda se preocupam estritamente com as suas falas, de maneira que não têm o interesse para compreender o assunto como um todo. No que diz respeito à minha relação com a turma esta modificou bastante desde a primeira aula. Os alunos assistiam a aula mais interessados e não se comportaram mais como no primeiro dia de aula (os alunos se uniram com o intuito de atrapalhar a aula). (Postado por ML, 27 novembro de 2010 às 17:51:00)

A postagem da estagiária ML também está centrada nas questões do dia-a-dia: as dificuldades prévias com o seminário, a apresentação dos alunos e a própria relação com os estudantes ao longo dos encontros. Deixa entrever que este último e crucial problema foi superado pelo interesse, comportamento, comparecimento à aula e exposição do tema. Além da questão da infraestrutura, a grande dificuldade a ser trabalhada é a apresentação do seminário, ou seja, um problema de aprendizagem da forma, não do conteúdo específico, que foi considerado satisfatório. Em toda a postagem são apresentadas as dificuldades do estágio, os caminhos alternativos de sua resolução, os resultados do trabalho, tanto no nível do ensinoaprendizagem quanto do relacionamento pessoal. Porém, a tentativa de contextualização para além da situação não ocorre, com ou sem mediação de textos. Mesmo a carência de infraestrutura ou a forma de encaminhamento dos seminários, apontadas, não ensejam maiores reflexões nem críticas.

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Observamos o mesmo padrão nos comentários. A maior parte foi relativa à prática na regência, contendo avaliação da postagem do colega, relações com a própria experiência em sala, comentários gerais sobre educação ou sugestões/ideias para aula. Por exemplo: “Quando escolhemos um filme para trabalhar nas aulas, o elemento complicador é a concentração dos alunos, piora se o filme for extenso. Vejo que no seu caso isso não comprometeu seu plano, o filme despertou a atenção da classe, parabéns!” (GBA 27 de novembro de 2010 19:08) “Que bom que tenha se dado bem com sua turma, assim como você também tentei a estratégia das atividades passadas para casa mais não deu muito certo, eles copiavam uns dos outros, mais valeu a experiência.” (ND 19 de outubro de 2010 00:47) “MC, gostei da ideia de fazer uma atividade utilizando-se de cruzadinhas...você deveria ter postado aqui no blog para nós, pois deve ter ficado muito interessante!” (GC 15 de novembro de 2010 18:55) LR bem legal a relação que você descreve entre você e seus futuros alunos, espero que no decorrer da regência continue dessa forma. É uma pena que você não pode concretizar o seu planejamento, mas acredito que o momento valeu como uma préavaliação diagnostica. (AC 25 de outubro de 2010 16:16)

Nesses comentários o compartilhamento das postagens permitiu confrontos que modificavam a percepção prévia dos estudantes e quebrava estereótipos, como fica evidente em dois comentários – sobre o filme e sobre atividades de casa. No terceiro comentário novas perspectivas são abertas com o contato com técnicas não conhecidas como a cruzadinha, e o entusiasmo com a proposta leva ao diálogo para que se aprofunde a postagem, com perspectivas de novas interações. O conhecimento produzido dessa forma teve pouco do formato acadêmico, com poucas pontes construídas com a bibliografia e teorias vistas ao longo da graduação, nas disciplinas anteriores e no próprio estágio supervisionado III. As postagens e comentários dos estagiários seguiam uma razão prática, observando as estratégias utilizadas pelos colegas à luz das concepções gerais, que podem ou não vir da própria vivência no estágio. Porém, tinham como referência sua mobilização para a situação de ensino-aprendizagem na escola. Nos comentários também aparecem um tom de cordialidade, expressão de emoções através de desabafos e incentivos. O quarto comentário apresenta mais fortemente esse caráter, sendo marcado pela expectativa da manutenção de uma boa relação entre a estagiária e a turma, e também pelo consolo diante da impossibilidade de concretizar um planejamento. Nos comentários, é praticamente impossível separar esse tom cordial das considerações práticas

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sobre a sala de aula. Quando havia reparos, críticas ou sugestões, frequentemente eram feitos de maneira cuidadosa, para não ofender.

A Polêmica sobre Seminários Em uma ocasião uma essa cordialidade ganhou contornos agressivos em um debate sobre a viabilidade dos seminários no ensino médio que, além de polarizar a turma, resvalou para ataques pessoais, necessitando da intervenção do orientador dentro e fora do espaço virtual. A polêmica partiu de um relato do estagiário MC quando observava a avaliação da turma: À medida que os grupos apresentavam, a professora levantava suas críticas tradicionais “falta material ilustrativo, fulano leu, o grupo não deu sua conclusão sobre o tema, etc.”. Eram 4 equipes sobre o mesmo tema, achei muito desgastante tal metódica, alguns alunos não tinham uma autoestima e apresentaram sem prazer. MC 30 de setembro de 2010 14:09)

Na postagem seguinte, ao optar pelos seminários como forma de avaliação no seu plano de unidade, ele recebeu o seguinte comentário de uma colega: Gostei do seu plano. A questão que coloco está diretamente ligada a sua postagem sobre a observação da sala. Notei que você criticou a metodologia da professora no tocante a atividade que você observou, seminários. E você propõe no seu plano também seminários, será que não era hora de você mudar? será que os alunos não estão saturados dessa atividade? Como você bem falou a atividade não estava estimulando a autoestima do aluno. Pense na questão. (APC, 1 outubro de 2010 11:16)

A réplica veio no comentário à postagem da primeira aula da estagiária SLV (6 de novembro), que pretendia realizar um trabalho em grupo com os alunos. MC incentiva a colega: “Nunca descarte o trabalho em grupo de suas atividades, elas são interessantes. Já fui criticado por uma colega por utilizar os seminários, acho que ela não entende dessa metodologia.” (MC 8 novembro 2010 12:43). A tréplica foi feita em uma postagem especialmente destinada ao assunto e ao interlocutor MC: Caro colega achei sem fundamento e incoerente a sua colocação, quando você destaca que eu não devo entender da metodologia de seminários, simplesmente por que coloquei uma pergunta para você, uma vez que, na sua postagem você criticou a metodologia da professora titular da sua turma que diga-se de passagem eram seminários e você decidiu fazer a sua avaliação com seminários, perguntei se não era a hora de mudar, já que você tinha feito uma crítica contundente a metodologia da professora titular. Não disse que seminários não funcionam, mesmo tendo certos

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problemas em trabalhar com essa metodologia. Na verdade as minhas experiências com seminários não foram boas até o presente momento, mas não descarto fazer trabalhos em grupos e acredito que cada turma expressa um aprendizado diferente. (APC 8 novembro 2010 20:47)

Os trechos evidenciam que ambos buscam uma solução para uma situação de ensinoaprendizagem problemática, a desmotivação dos estudantes nos seminários, e apontam a mesma causa, a utilização incorreta da técnica. Porém, as experiências prévias ao estágio levam a identificações distintas, que condicionam as soluções apresentadas. A crítica de MC incide sobre as observações feitas pela supervisora à apresentação dos alunos, para ele fruto da falta de envolvimento, e ao formato de seminário que ela utilizou, cansativo porque leva a uma repetição do conteúdo. O problema não é da técnica em si, mas da maneira de sua aplicação pela docente, o que seria resolvido por uma correção. Portanto, para MC não havia contradição em utilizá-la como avaliação. Além disso, a expressão “críticas tradicionais” mencionada por MC aponta para a postura da professora, não para a técnica. Como foi a primeira vez que esteve com a turma, o “tradicional” provavelmente se refere a uma situação vivida ou observada enquanto estudava na educação básica ou mesmo na universidade. A atribuição do problema à autoestima fruto das críticas mostra um tom de denúncia que aponta para uma identificação com os estudantes, como se o estagiário fosse porta-voz do grupo. Já APC leu a crítica à docente de maneira mais generalizante ao questionar o colega sobre a eficácia da própria técnica. Para ela, a baixa autoestima não vem da incapacidade da professora e sim do desgaste que o seminário causa nos estudantes, o que lhe leva a sugerir a substituição. Suas dificuldades prévias com a aplicação dos seminários evidenciam que ela já exerceu a docência antes do estágio, o que explica a empatia com a docente e a propensão em abandonar essa forma de avaliação. Notemos que é no espaço virtual do blog que essas experiências são mobilizadas, seja pelo relato de uma vivência de campo, no caso de MC, seja pela interação com esse relato, como ocorreu no comentário de APC. É pouco provável que um debate como esse surgisse de um modelo de estágio onde os futuros professores realizem isoladamente suas atividades no campo e as analisassem isoladamente em um relatório. Se existe um potencial pedagógico no compartilhamento e interação presencial das experiências adquiridas nas diversas escolas, tal potencial é amplificado pelo blog pois a flexibilidade interação dos sujeitos permite que esta ocorra em múltiplas direções. No caso acima, vemos como uma postagem gerou uma cadeia

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de comentários e novas postagens envolvendo os dois estagiários em torno de uma questão problemática. Além disso, essa cadeia envolveu outros estagiários, pois o debate gerou outros comentários sobre a validade ou não dos seminários, respondendo à última intervenção de APC citada acima: “Sou uma pessoa que tem aversão a seminários. acho que não funcionam com a gente na universidade ainda mais com Ensino médio. É uma prática que não gosto e não coloco no meu planejamento.” (NF 8 de novembro de 2010 22:07) “Acredito que temos que levar em conta que cada turma interage melhor com uma metodologia e por isso devemos observar a turma para poder pensar estratégias para construir o conhecimento da melhor forma.” (GN 8 de novembro de 2010 22:22) “Eu optei por seminários coordenados por perceber que estavam acostumados a metodologia, entretanto inseri detalhes como cada grupo questionar os demais, prepararem resumos e usarem outros recursos que não o livro didático deles que usam como a Bíblia. São casos e casos. cada turma tem um ritmo distinto.” (APL 10 de novembro de 2010 11:17)

Mesmo quando, numa postagem de 10 de novembro, o orientador interveio a favor da utilização dos seminários enfatizando a preparação do conteúdo e da apresentação oral como condições de êxito, foi respondido por uma estagiária nos seguintes termos: No que tange ao seminário propriamente dito, tenho ressalvas quanto a sua utilização quando se ministra turmas dos ensinos fundamental e médio pelo simples fato de estarmos lidando pré-adolescentes e adolescentes. Acho uma metodologia válida e pertinente para trabalhar a oralidade dos alunos, mas apenas no ensino superior. Por quê? Porque que é absolutamente enfadonho. Há possibilidade de conteúdos serem trabalhados com sucesso em seminários sim, mas existem outras formas bem mais interessantes e criativas. É possível, inclusive, oferecer opções para os alunos e deixar que escolham a que preferem. Acho um desperdício deixar passar toda a riqueza que adolescentes podem trazer para uma aula enquadrando-os em seminários. Por essa razão, nem no semestre passado e nem no atual os seminários figuraram em meus planos. Se eu tiver que escolher entre lhes passar seminário ou aplicar prova, fico com a segunda opção mesmo tendo em vista o trabalho de corrigi-las. Além de pensar no conforto e possibilidades de aprendizado dos meus alunos penso também, é claro, na minha frustração aos lhes passar uma atividade chata e com possibilidades reais de não obter êxito. (LLL 11 de novembro de 2010 13:42)

O tom do comentário de LLL é veemente: não há concessões nem mediações, apenas a perspectiva certa do fracasso com o uso dos seminários. Isto se expressa nos advérbios de

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intensidade (absolutamente, bem mais), na conotação negativa de adjetivos (“enfadonhos”, “chatas”) e verbos (“enquadrando”, “desperdiçando”), na preferência por uma avaliação considerada mais tradicional como a prova escrita. Reforça essa hipótese a proposição de atividades ao gosto das faixas etárias da educação básica, “interessantes” e “criativas”, que reforçam a perspectiva centrada no estudante, inclusive dando-lhe voz para escolher a avaliação. Todavia, o diálogo está presente. Ao ver sua crença confrontada pelo relato dos colegas e a postagem do orientador, à qual se dirige, LLL elabora uma explicação para fundamentar sua percepção: o seminário funciona melhor no nível superior que na educação básica, porque os adultos conseguem lidar com o enfado e os adolescentes não; para melhor aproveitar a riqueza desses, deve-se utilizar formas mais criativas e interessantes. Tal explicação não tem fundamento teórico ou bibliográfico, mas vivencial – apesar de não ser explicitado. Se LLL nunca utilizou seminário em estágios anteriores, é provável que a base da sua repulsa seja sua experiência como aluna. A mesma postura de absoluta “aversão” à utilização da metodologia aparece no primeiro dos três outros comentários citados antes. Ambos referendam a percepção já apresentada: as experiências pessoais, como alunos ou professores, podem basear as crenças educacionais usadas na interpretação das situações de estágio, próprias ou alheias. Seria preciso um estudo mais aprofundado, como o feito por Caimi (2008), para saber se, no semestre letivo, essas crenças são modificadas rumo a uma postura teoricamente mais fundamentada ou empiricamente mais aberta à experimentação (como a que aparece nos dois últimos comentários da lista acima) e rastrear os rumos dessa mudança. Porém, já é possível afirmar que a situação de estágio é propícia à emergência dessas vivências soterradas mas não completamente esquecidas. As interações, em especial aquelas potencializadas pela ferramenta virtual, multiplicam os estímulos e acolhem, como válvula de escape, as tensões não apenas do presente – do trabalho na turma designada para estágio – mas trazidas do passado pessoal, em especial nos anos de estudo na escola básica.

Conclusões Como ferramenta para atividade de estágio, acreditamos que o blog cumpriu o seu papel, pois permitiu ao orientador um acompanhamento efetivo da atividade, permitiu aos alunos uma flexibilidade devido à possibilidade interagir numa rede a partir de seus horários, e também notamos que todos dominaram a dinâmica de postagens e comentários do blog até o final do

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curso, tornando-se capazes de utilizar a ferramenta. Dentre os empecilhos que sugiram, o menor deles foi o fato de nem todos os alunos acessarem a internet em casa e mesmo nos finais de semana, por morarem em zonas rurais. Longe de ser um impedimento, mostra que o orientador precisa estar mais atento à infraestrutura de internet e ao perfil dos alunos do local onde atua. Além disso, a expectativa da ampla participação foi hiperdimensionada e precisa ser considerada em experiências futuras. Aqui, o desafio é criar formas de engajamento para não cair no perigo da realização “burocrática” das atividades do blog, o que comprometeria os objetivos do estágio e da utilização da ferramenta. As expectativas acadêmicas de reflexões teoricamente orientadas sobre educação e ensino de história também não foram atendidas. Predominou no blog reflexões pautadas na vivência, voltada à solução de problemas, à expressão de solidariedade e de emoções individuais. A ênfase na prática e na emoção são expressões diferentes desse tenso momento da trajetória acadêmica e profissional que é assumir uma turma de jovens das escolas públicas. Acreditamos que as postagens e comentários ajudaram a representar e compartilhar os dilemas e problemas concretos do estágio, minimizando a sensação de fracasso individual, e a criar uma comunidade de interlocutores para a qual se pode expressar as emoções advindas de todo o processo como medo, frustração, angústia etc., esperando e tendo como contrapartida acolhimento e incentivo. Por isso as orientações para compreensão da experiência foram buscadas naquilo que lhes parecia mais próximo, à distância de um clique: menos no referencial teórico visto na universidade e mais na experiência pessoal e dos colegas que simultaneamente atuavam nas escolas públicas do Recôncavo. Como saldo positivo, a mudança do suporte de comunicação levou a mudanças qualitativas na atividade de estágio supervisionado de regência. O grande objetivo alcançado foi a criação de um ambiente fértil e acessível para trocas de ideias e experiências de estágio, que diminuiu a sensação de solidão do estágio anterior. Como houve o registro da interação entre os estagiários durante todo o processo, a experiência individual foi socializada e comentada, caracterizando uma produção não apenas compartilhada e coletiva de saberes. Por fim, houve protagonismo dos estagiários no processo formativo. Além das percepções e comentários verbais, esse protagonismo aparece em um comentário da mesma estagiária que “ousou” discordar da posição do orientador, a qual expressa, à sua maneira (boa para terminar esse texto), os objetivos últimos do estágio supervisionado e da utilização de ferramentas digitais no ensino:

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quero dizer que estou adorando toda essa polêmica acerca da utilização dos seminários como metodologia que está acontecendo no blog. Mais ainda, adoro o fato do debate ter partido muito mais dos meus colegas, a partir de suas próprias experiências, do que de Leandro. Acho que isso sinaliza um amadurecimento bacana da turma no sentido de uma maior aproximação de todos com as questões do ensino de história. Não que antes não houvesse essa preocupação, pelo contrário acho que nossa turma é bem engajada com a docência, mas antes nossa preocupação estava mais restrita à nossa sala de aula. Nós discutíamos como que para cumprir uma obrigação burocrática. Por exemplo, na aula de história da educação tem que discutir isso e aquilo. Agora está diferente na medida nós estamos fazendo discussões menos superficiais com uma preocupação genuína. Isso me deixa muito orgulhosa de meus colegas e de mim mesma. (LLL 11 de novembro de 2010 13:42).

Referencias Bibliográficas ALARCÃO, Isabel. Formação e Supervisão de Professores: uma nova abrangência. Sísifo: Revista de Ciências da Educação, n. 8, jan/abr 2009, pp. 119-128. (Conferência de 2007) AZEVEDO, Crislane Barbosa. História e Investigação na Escola: a experiência de formação do professor pesquisador. História & Ensino, Londrina, v. 2, n. 17, jul./dez. 2011, p. 339-359. Blog de Estágio Supervisionado em História III – 2. Semestre de 2010. Disponível em http://estagio3ufrb2010.blogspot.com.br, acesso em 20. dez. 2013. CAIMI, Flávia Eloisa. Aprendendo a Ser Professor de História. Passo Fundo: Ed Univ. Passo Fundo, 2008. PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e Docência. São Paulo: Cortez, 2004. PIMENTA, Selma Garrido. O Estágio na formação de professores: unidade teoria e prática? 7ª Ed. São Paulo: Cortez, 2006 (1994) ROCHA, Aristeu Castilhos da; POZZEBON, Maria Catharina Lima. Reflexões sobre a Práxis: as vivências no Estágio Supervisionado em História. História & Ensino, Londrina, v. 19, n. 1, jan./jun. 2013, p. 71-98.

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