Formação e contexto trabalho em engenharia florestal (2004)

June 6, 2017 | Autor: Telmo H. Caria | Categoria: Professional Knowledge, Sociologia da Educação, Sociologia do Conhecimento
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Documento de trabalho nº24

Projecto REPROFOR – ANO III — Estudo 5 Financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian Relatório final

Formação e contexto trabalho em engenharia florestal: culturas profissionais de jovens finalistas e recém licenciados

Telmo H. Caria

Vila Real, 1 de Março de 2004

Índice INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................................3 1. O CURSO E O MERCADO DE TRABALHO............................................................................................................4 2.FORMAÇÃO E EXERCÍCIO PROFISSIONAL ........................................................................................................4 3. O CONTEÚDO FUNCIONAL DO TRABALHO.......................................................................................................6 A) LISTAGEM DE TAREFAS E PROCEDIMENTOS DE TRABALHO ..................................................................6 B) CATEGORIAS DE LINGUAGEM SOBRE O TRABALHO...................................................................................7 4. POSICIONAMENTOS E PROCURA SOCIAL DA PROFISSÃO..........................................................................8 5. CONCLUSÃO: QUE CULTURA PROFISSIONAL NOS RECÉM LICENCIADOS?........................................10 ANEXO .............................................................................................................................................................................12

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Introdução Os resultados finais de investigação que são apresentados correspondem ao estudo 5 do projecto de investigação REPROFOR, realizado com engenheiros florestais ligados ao sector associativo. Através deste estudo pretendeu-se uma contribuição para os objectivos do projecto de investigação, designadamente saber: a relação existente entre a formação obtida e os contextos de trabalho existentes, clarificando quais os elementos de identificação dos profissionais com a cultura da profissão e permitindo colocar hipóteses sobre os usos do conhecimento que lhe estão associados. Ao todo foram inquiridos 18 jovens engenheiros florestais: 9 finalistas com idades compreendidas entre os 21 e 24 anos, sendo apenas um deles do sexo feminino; 9 iniciantes da actividade em associações florestais a Norte do Douro com idades compreendidas entre os 24 e 29 anos, sendo seis deles do sexo feminino, e com uma média de 20 meses de tempo de actividade neste sector, não havendo nenhum com mais do 3 anos de experiência na profissão.

Este estudo dá continuidade a uma pequena pesquisa, realizada em 1999, em que foram inquiridos engenheiros licenciados na UTAD no âmbito das Ciências Agrárias. Na altura começámos por inquirir, através de entrevistas abertas não estruturadas, engenheiros ligados ou à agricultura ou à floresta e a empresas privadas e ao Estado. Procurávamos numa primeira abordagem obter informações e conhecimento sobre o enquadramento e a articulação com a formação da actividade profissional destes licenciados, começando por diversificar as opções para depois se poder focalizar a análise com mais objectividade. Face aos resultados e aos contactos desenvolvidos em 1999, optámos por neste estudo concentrarmo-nos exclusivamente nos engenheiros florestais ligados ao sector associativo, construindo para o efeito um guião de entrevista semi-estruturada. (em anexo 1).

A organização deste relatório segue de perto a organização das temáticas do guião de entrevista, sendo por isso desdobrado em 5 tópicos de análise, a saber: o curso e o mercado de trabalho (mais centrado no tema1 da entrevista); a formação e o exercício profissional (mais centrado no tema 2 da entrevista); o conteúdo funcional do trabalho (mais centrado no tema 3 da entrevista); posicionamentos e procura social da profissão (mais centrado no tema 4 da entrevista); a conclusão que coloca hipóteses sobre a cultura profissional em uso e potencialmente emergente. 3

1. O curso e o mercado de trabalho Na maioria dos inquiridos a escolha do curso está relacionada com familiares ou amigos ligados ao sector agrário ou mesmo à floresta. As outras situações são fruto de circunstanciais variadas que os próprios inquiridos têm dificuldade em identificar. Os primeiros, aqueles cuja escolha foi mais direccionada, tendem a ver o curso como uma progressão em contínuo e conseguem ser mais específicos nas críticas que dirigem ao curso e à sua organização. Os restantes têm uma representação da aprendizagem no curso em fases de maior e menor interesse e são pouco específicos nas críticas que dirigem. A entrada no mercado de trabalho foi rápida para a maioria e sem dificuldades de maior mas reconhecem que tiveram alguma sorte face à conjuntura de desenvolvimento do associativismo que se vivia e que nesse plano foram privilegiados. Fica sugerida em muitos casos que a obtenção do emprego dependeu muito de contactos e conhecimentos pessoais relativos a colegas mais velhos do curso e relativos aos locais de origem residencial. Os inquiridos estão muito divididos quanto à continuação neste tipo de emprego pois a maioria não lhe reconhece futuro e aqueles (alguns dos que entraram no curso por laços e conhecimentos ligados ao sector) que lhe dão o benefício da dúvida fazem-nos mais por militância (“para provar que se pode fazer alguma coisa”) e não tanto por lhe reconhecerem condições de continuidade. Todos admitem que se tiverem outra possibilidade de emprego fora do sector associativo não deixarão de ponderar a hipótese. 2.Formação e exercício profissional Num aspecto todos são unanimes quanto |à organização do curso: o conhecimento e o contacto directo com o sector seria relativamente fácil de organizar mas entretanto é muito reduzido. A maioria reconhece que o curso não poderá deixar de ser teórico “porque é um curso universitário” (“dar os instrumentos e os conhecimentos para aprender e complementar a formação na vida profissional”) enquanto que os outros comparam-no com outros cursos similares do politécnico e parecem ter tido alguma frustração com a orientação seguida, pelo facto de não ter uma componente de formação profissional mais dirigida. Nesta formulação das questões fica sugerida que a oposição entre teoria-ciência e prática-profissão está muito presente na mente dos inquiridos, facto que parece resultar principalmente do tipo de formação e de orientação adquiridas no curso. A componente de

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reflexão pessoal e de construção de um identidade na intercepção teoria-profissão nunca é referida e é sugerida apenas por um inquirido. A formação profissional posterior à licenciatura quando referida nunca é apontada como estando ao alcance de acções orientadas pela universidade. Os contactos com a Universidade pós-licenciatura são justificados pela personalidade do docente em causa (associado ao valor pedagógico das aulas leccionadas) e não por esta instituição poder ser em geral um recurso de formação. A Forestis é destacada como o principal recurso e entidade de formação profissional. A sua acção refere-se principalmente aos contactos informais que permite com colegas que trabalham há mais tempo no sector. Mesmo as acções de formação organizadas por esta entidade revelam-se muito produtivas para alimentar e manter os contactos informais e pessoais. Reconhece-se principalmente o valor do curso para conseguir diagnosticar os problemas mais típicos, para explicar questões gerais de funcionamento da floresta e para saber quais as instituições que se movem no sector. Complementarmente são indicadas como carências de formação as seguintes: conhecimentos limitados (porque muito limitados a situações ideais) para a concepção e formulação de projectos florestais; falta de conhecimentos técnicos para avaliar da qualidade de um projecto florestal; falta de conhecimentos técnicos para avaliar da qualidade da execução dos projectos florestais; falta de conhecimentos sociológicos para melhor saber lidar com a diversidade de proprietários; conhecimentos muito limitados sobre o enquadramento legislativo da diversidade de possíveis intervenções no sector; falta de conhecimentos para conseguir organizar o trabalho administrativo nas Associações. Assim, parece haver uma oposição no tipo de conhecimentos possuídos e necessários: uma formação que habilita a possuir uma linguagem científica, uma capacidade para explicar e caracterizar uma realidade específica mas também uma formação que habilita pouco a intervir sobre a realidade existente. Neste contexto, é a própria auto-imagem profissional de se ser um engenheiro que parece ficar comprometida porque os inquiridos não se sentem capazes à saída do curso de serem técnicos (com competências para intervir como seria esperado num engenheiro) mas também não poderão ser académicos (a menos que se empreguem num Ministério onde as exigências do trabalho são só de diagnóstico e fiscalização legislativa). A oposição teoria-prática, atrás referida, parece traduzir-se numa incapacidade para intervir estrategicamente no terreno enquanto profissional e não só como académico.

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3. O conteúdo funcional do trabalho O conteúdo funcional do trabalho dos engenheiros florestais nas associações pode ser analisado em três dimensões: na listagem descritiva das tarefas, no modo como as tarefas são categorizadas pelos próprios para definir qual o tipo de trabalho que desenvolvem e no modo como as categorias são utilizadas para melhor classifica a profissão e portanto definir aquilo lhe é que é mais ou menos específico. A) listagem de tarefas e procedimentos de trabalho 1. conceber

projectos

de produção florestal (e todo o trabalho a ele associado de carácter

administrativo e de contactos institucionais para a candidatura , a execução e a avaliação) 2. organizar projectos de manutenção (ex.limpeza) florestal (e todo o trabalho administrativo e de contactos institucionais a ele associado para candidatura , execução e avaliação) 3. dialogar e negociar com os proprietários o tipo de produção florestal a implementar num projecto face |às condições do terreno e do enquadramento legislativo 4. dar consultoria florestal no plano do enquadramento legislativo e de operações técnicas a desenvolver na floresta 5. informar o projectista sobre as opções a tomar para a concepção dos projectos, depois de os ter negociado com os proprietários 6. fazer o acompanhamento no terreno da execução dos projectos florestais, zelando pela sua qualidade 7. dar apoio social a proprietários iletrados ou pouco iletrados nas relações que têm que desenvolver com os organismos oficiais ligados ao sector agrário 8. fazer divulgação pública dos programas públicos de apoio à floresta 9. desenvolver acções públicas de prevenção e sensibilização para os fogos florestais 10. desenvolver acções públicas de educação ambiental 11. desenvolver trabalho administrativo e de secretariado relativo às actividades da associação 12. chefiar funcionários administrativos e de secretariado 13. tomar a iniciativa de propor à Direcção acções variadas 14. representar externamente a Associação 6

B) Categorias de linguagem sobre o trabalho As categorias utilizadas pela grande maioria dos inquiridos para classificar o trabalho realizado foram: trabalho técnico, trabalho administrativo-associativo e trabalho de extensão. As divergências são significativas no uso que se faz das categorias para descrever as tarefas atrás referidas e também relevantes sobre quais as categorias que melhor classificam a profissão. Em geral, no uso das categorias a principal divergência está em saber onde fica a fronteira entre o trabalho técnico e o trabalho de extensão: para uns o trabalho técnico e o trabalho de extensão têm delimitações muito restritas, ficando o primeiro circunscrito às tarefas de concepção e acompanhamento de projectos e de consultoria (tarefas a, b, d, f) e o segundo circunscrito às tarefas de contacto com os proprietários no terreno (tarefas e, c, h); para outros (a maioria) os dois tipos de categorias têm delimitações mais vastas, ficando o trabalho técnico circunscrito às mesmas tarefas do anterior mais as tarefas de contacto com os proprietários (a, b, c, d, e, f) e o trabalho de extensão é circunscrito às tarefas de divulgação pública em geral e de apoio social (g, h, i, j). Para os que usam categorias mais restritas o trabalho técnico (na definição dada por estes) é o núcleo essencial do trabalho do engenheiro florestal e é por isso que manifestam maior insatisfação com a formação que tiveram. O trabalho de extensão (na definição dada por estes) é considerado uma actividade que está na periferia da profissão e por isso constitui-se como uma compensação simbólica para a insatisfação, ao valorizar-se a componente humana e intuitiva da interacção com os proprietários florestais. O trabalho administrativo e associativo é visto como uma actividade exterior ao seu papel profissional. Para os que usam categorias mais amplas (na definição dada por estes) a classificação sobre o seu papel profissional é mais variável: (1) nuns casos tanto o trabalho técnico como o de extensão são considerados como actividades inerentes ao seu papel profissional (mais uma vez, nestes casos, é sobrevalorizada a componente humana e intuitiva da interacção com os proprietários); (2) noutros casos o trabalho de extensão e o de adminstração são vistos como periféricos, sendo o trabalho técnico (na definição dada por estes) considerado como o único que é específico à profissão (também nestes casos a insatisfação com a formação é evidenciada). O enquadramento organizacional da actividade dos engenheiros florestais não parece ter constrangimentos institucionais significativos. De facto, a maioria dos inquiridos desempenham ao seu ritmo e de acordo com as suas prioridades as tarefas referidas atrás e acabam por ser eles a condicionar a autonomia decisional das Direcções das Associações pois é deles que dependem as 7

iniciativas, o suporte adminstrativo à decisão formal e a definição de prioridades (tarefas k, l, m). Os poucos casos em que assim não ocorre tratam-se de Associações que têm uma actividade apenas destinada à sua sobrevivência financeira, sem tomarem outras iniciativas de maior sustentabilidade mais de acordo com a sua razão de existir. 4. Posicionamentos e procura social da profissão O aspecto que foi mais desenvolvido pelos inquiridos nas entrevistas relaciona-se com o modo como o mercado de concepção, de acompanhamento e avaliação dos projectos florestais funciona, como é que várias instituições e sub-sectores se posicionam e como é que isso se pode traduzir em opções e escolhas profissionais por parte dos engenheiros florestais (análise do campo florestal). Em síntese, desenvolvem elementos de reflexividade institucional (reflexão ideológico-profissional sobre as escolhas possíveis da profissão em várias instituições) e no plano das procuras da profissão (reflexão sobre as pressões do mercado sobre as escolhas desenvolvidas). O essencial da reflexão dos inquiridos sobre as suas escolhas profissionais parte da ideia de uma complementaridade ou oposição entre o modo como o sector privado (gabinetes de projectos) e o sector associativo funcionam. A reflexão sobre as pressões do mercado parte de ideias sobre a segmentação social dos clientes e as concepções que estes têm sobre a floresta. Os inquiridos referem que gabinetes de projectos actuam no mercado para satisfazer uma clientela de proprietários de média ou grande dimensão já vocacionados para a produção florestal, muitos deles originários do mundo rural mas entretanto deslocados para profissões ligadas às classes médias urbanas. Pelo contrário, as associações actuam para conseguirem criar o seu próprio mercado procurando sensibilizar pequenos proprietários agrícolas com pequenas áreas de terra para a possibilidade de lhe darem um uso florestal ou de desenvolverem as áreas que já têm floresta e darem-lhe um uso mais produtivo. As motivações do sector privado na concepção de projectos são caracterizadas como estritamente financeira e por isso pouco preocupadas em ir ao terreno e em analisar as condições locais de implementação dos projectos. A ideia que fica é a de que se os proprietários não se dispuserem a pagar todos os custos inerentes às deslocações e estudos no terreno, os projectos são feitos de modo esterotipado apenas preocupados em cumprir as exigências formais que são feitas pelos serviços estatais que aprovam e avaliam os projectos. Pelo contrário, o sector associativo, através das práticas e dos discursos dos seus engenheiros florestais,

pretende defender e desenvolver uma prática 8

de maior qualidade e de exercício

profissional mais ético, dado entender-se que o contacto com o terreno e a negociação com os proprietários são essenciais a uma floresta de qualidade. No entanto, a ideia de uma floresta de qualidade (não intensiva, não monocultural e cuidada) esbarra com as condições e as concepções que a clientela de pequenos proprietários possui: áreas muito pequenas e muita resistência em fazer projectos conjuntos; motivações dos proprietários quase sempre só financeiras; concepção de que a floresta cresce sózinha e não precisa cuidado. Acresce ainda as dificuldades financeiras das associações que não comportam os custos de uma acção profissional deste tipo, a não ser à custa de um sobretrabalho dos engenheiros (sem horários, sem fins de semana, sem perspectivas de carreira e com ordenados em atraso). A escassez do mercado do sector privado e as dificuldades do sector associativo para se implantar e garantir financeiramente o seu desenvolvimento fazem com que a solução pareça ser uma actuação conjunta complementar que vai repartir os rendimentos por todos: (1) os gabinetes continuam a fazer os projectos (desejavelmente e uma forma menos estereotipada) porque entretanto seriam informados pelos técnicos das associações sobre as condições locais e sobre as negociações com os proprietários; (2) as associações garantiriam o acompanhamento e a execução dos projectos no terreno garantindo níveis de qualidade superiores, incluindo os aqui os projectos de maior dimensão que geralmente não passam pelas associações. Algumas interrogações dos inquiridos parecem ficar sem resposta: (1) até que ponto os projectistas seguem as indicações dos técnicos no terreno? (2) até que ponto o número de projectos de maior dimensão justificam a partilha de trabalho entre os dois sectores? Parece que uma parte das possíveis respostas a estas questões dependem dos interesses em presença: (1) de alguns membros das associações que possam ter interesses nos gabinetes de projectos e que conduzirão a sobrevivência das associações mais para actividades (subsidiadas) de divulgação com a finalidade aumentar a dimensão do mercado e manter a complementaridade e eventual relação de trocas desiguais entre o privado e o associativo; (1) do interesse dos engenheiros florestais das associações em garantirem a autonomia e a orientação técnica do seu trabalho, deixando de estar dependentes de outros que só trabalham em gabinete Os tipos de clientes acima referidos concorrem para que as relações de confiança entre engenheiros e clientes sejam de três tipos: (1) a confiança-fé por parte dos proprietários de maior dimensão que não vivendo no mundo rural e não dependendo desses rendimentos para viver, parecem preferir deixar todas as decisões ao engenheiro apenas lhe interessando o resultado financeiro (permitindo assim a prática profissional estereotipada do projectista apenas com valor de troca financeiro para 9

ambas as partes); (2) a confiança-partilha por parte dos proprietários mais informados e de maior dimensão que dão valor ao mundo rural e que vêem a floresta como um investimento financeiro e ambiental a longo prazo (permitindo assim a prática profissional de qualidade do projectista de troca de pontos de vistas tanto com valor técnico e como com de valor de uso); a confiança-educação (sempre com focos de conflito) dadas as condições e as concepções dos pequenos proprietários agrícolas que “fazem” floresta. Assim, contrariamente

ao que acontece com profissões instituídas (caso dos médicos e dos

advogados) a confiança-fé não é possível de ser desenvolvida com os clientes mais pobres e iletrados, pois neste caso os profissionais ainda têm que provar a legitimidade do seu conhecimento. Em consequência, o poder profissional junto dos clientes depende mais de relações de confiançaeducação. 5. Conclusão: que cultura profissional nos recém licenciados? A cultura profissional dos inquiridos está circunscrita (lembra-se que são recém-licenciados) aos contextos profissionais que experienciaram: a licenciatura e as associações florestais. Neste âmbito, a cultura profissional que detectámos parece ter os seguintes traços: (1) uma reflexão profissional feita na informalidade e na interacção pessoal onde se desvaloriza os recursos teóricos (componente relativa ao uso do conhecimento abstracto) para o efeito, dado divorciar-se estes da prática da profissão em virtude de existirem lacunas nos conhecimentos que habilitam a como intervir e porque intervir de um dado modo; (2) um desempenho e uma interpretação de papel profissional muito divergentes e constrangidas pelas limitações das experiências pessoais, com dificuldade em definir o que é essencial ou acessório ao exercício da autonomia profissional, embora no plano organizacional os limites sejam quase inexistentes; (3) um estatuto profissional muito questionado pelas pressões mercantis do mercado, com fraca legitimidade neste âmbito para se impôr junto de clientes menos informados. Assim, o exercício profissional do engenheiros florestal nas associações caracteriza-se pelas limitações apontadas na formação, pela clareza das orientações apontadas para a qualidade do exercício profissional e nos constrangimentos mercantis e financeiros nas condições da prática. Tal leva-nos a concluir que o uso do conhecimento abstracto por estes profissionais1 é de estilo escolarretórico ou estilo ideológico [C-L+E-]: forte sentido legitimador (orientação para uma certa qualidade do desempenho profissional) associado a um fraco sentido contextual (falta de condições 1

Cf. Caria, Telmo H. 2002, “O uso do conhecimento: os professores e os outros.”, Análise Social, nº164 (no prelo)

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para implementar essas orientações profissionais) e com fraco sentido estratégico (falta de conhecimentos para intervir no terreno com a qualidade desejada). Em alternativa, em conjugação com o sector privado ou por iniciativa própria nas associações, os engenheiros florestais para buscarem maior poder profissional tendem a fazer também um uso do conhecimento abstracto de estilo teórico-pragmático ou estilo crítico-pragmático [C+L-E+]:

revalorizam a componente

relacional com os proprietários, investindo em relações de confiança-educação e no trabalho de extensão como traço essencial da profissão (ganhos acrescidos, respectivamente, de sentido estratégico e de contextual) e em associação compensam as suas falhas de formação técnica com práticas mais ou menos estereotipadas de concepção de projectos (menor sentido legitimador). A estratégia para ganhar poder profissional e conseguir uma plena autonomia profissional parece ser a (de alguns) de (re)construir uma cultura profissional que não tenha um definição estrita e limitada do trabalho técnico e que consiga com o tempo e com a experiência de terreno melhorar a formação técnica para intervir com qualidade, indo ganhando tempo para ver (e contribuir) da possibilidade do sector associativo florestal se consolidar e desenvolver.

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Anexo Guião de entrevista – temáticas abordadas 1. Escolha do curso, aspirações e antecipações profissionais e processos de entrada no mercado de trabalho Perguntas de acompanhamento: Como e porque escolheu o curso? Fases na motivação ao longo do curso? Que expectativas tinha de futuro profissional? Que disciplinas mais gostou, menos gostou e porquê? Que estágio? Que hipótese de trabalho teve e que escolhas fez? 2. Ligação da formação inicial ao exercício profissional Perguntas de acompanhamento: Quais as disciplinas e as matérias que mais ligações têm com o seu exercício profissional actual? Que uso faz dessas matérias? Que falhas ou lacunas sente na sua formação? Que meios usa para se auto-formar? Que sugestões para melhorar a formação? 3. Conteúdo e funções laborais nas associações Perguntas de acompanhamento: Que funções e tarefas desempenha? Quais é que correspondem mais ou menos às suas expectativas de ser engenheiro florestal?

Qual a autonomia de exercício

profissional que tem, como é que é enquadrado e quem é que enquadra? 4. O trabalho dos engenheiros florestais e as solicitações das procuras Perguntas de acompanhamento: Variação do trabalho conforme seja em empresas, no estado e nas associações? Divergências ou complementaridades entre as três modalidades de trabalho? Diversidade das procuras dos agricultores e modos de actuação? Diagnóstico sobre o sector, sobre o associativismo e sobre as perspectivas de futuro?

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