FRASEMÁRIO LITERÁRIO : COLETA, ORGANIZAÇÃODE DATAÇÃO DE EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS NOS ROMANCES REGIONAIS

June 7, 2017 | Autor: Vicente Martins | Categoria: Literatura, Fraseologia, Regionalismos
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FRASEMÁRIO LITERÁRIO COLETA, ORGANIZAÇÃO E DATAÇÃO DE EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS NOS ROMANCES REGIONAIS

Prof. Dr. Vicente Martins (UVA/CENFLE) Crateús, 25 a 27 de fevereiro de 2016

Vicente Martins ₢ 2015

INTRODUÇÃO O léxico é o nível da língua que melhor traduz características regionais de um grupo social. As obras literárias conferem às pesquisas linguísticas (fraseológicas) maior possibilidade de exploração da riqueza expressional de uma língua (vernaculidade). Os romances regionais, por excelência, são importantes fontes lexicográficas porque trazem o registro coloquial dos falantes através dos personagens (dialetismo regional, dialetismo social, metaplasmos, arcaísmos etc). Vicente Martins ₢ 2015

A FACE LITERÁRIA DO GLOSSÁRIO FRASEOLÓGICO O Projeto Frasemário Literário (doravante, FL) situa-se no âmbito dos estudos linguísticos e literários com fundamento teórico na Lexicografia e Fraseodidática . No âmbito dos estudos linguísticos, os fundamentos teóricos do projeto se apoiam em trabalhos anteriores que se ocupam das expressões fraseológicas em suas diversas abordagens como Casares (1950), Zuluaga (1980) e Corpas Pastor (1996). A ideia do Frasemário Literário decorreu de estudos de trabalhos anteriores como CARVALHO (2008, obra de Graciliano Ramos), SOUZA (2013, obra de Rachel de Queiroz)

Vicente Martins ₢ 2015

OBJETIVOS DO FRASEMÁRIO LITERÁRIO • Apresentar o Frasemário Literário (glossário) como recurso didático de incentivo às práticas de leitura literária na sala de aula. • Levar os iniciantes da pesquisa a planejar, coletar, organizar e elaborar de um glossário de expressões idiomáticas do Português Brasileiro (PB) • Mostrar a importância de um glossário acompanhar as obras regionais como forma de desvelar aspectos ideológicos, sociais e culturais da comunidade linguística expressões na riqueza expressional dos textos e contribuir para a compreensão leitora.

Vicente Martins ₢ 2015

DATAÇÃO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS NAS OBRAS LITERÁRIAS O principal objetivo linguístico do projeto é digitar paleograficamente a edição mais antiga das obras literárias, coletar suas expressões idiomáticas e outras combinatórias, datá-las de acordo com a data de publicação dos textos e recorrer a outros corpora linguisticamente ricos em relação aos dados do português brasileiro popular para refinar os resultados já obtidos e retroagir as datas com base nos estudos de LEONE (2013).

Vicente Martins ₢ 2015

HIPÓTESES DA PESQUISA • Partimos da hipótese de que toda a visão de mundo, a ideologia, os sistemas de valores e as práticas socioculturais das comunidades humanas são refletidos em seu léxico. • Os romances regionais têm sido criticado por “linguagem viva, espontânea e inventiva” (dialetismo regional) bem como seus autores acusados de conivência com a miséria dos retirantes, com o patriarcalismo, o nepotismo e o coronelismo gerados pela “indústria da seca”. (ARAGÃO, 2008) • O léxico é o nível da língua que melhor traduz características regionais de um grupo social. Vicente Martins ₢ 2015

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1ª Edição: 1952

2ª Edição: 1929

Vicente Martins ₢ 2015

VALOR DOCUMENTAL E HISTÓRICO

O principal objetivo do Frasemário Literário é coletar expressões nas obras literárias, datá-las de acordo com o ano de sua publicação e recorrer a outros corpora linguisticamente ricos em relação aos dados do português brasileiro popular para refinar os resultados já obtidos e retroagir as datas. • Os dados linguísticos coloquiais utilizados por Luzia-Homem (1903) e Dona Guidinha do Poço (1952) conferem às publicações um valor documental e histórico, tornando-as fontes importantes para a reconstrução do português coloquial do início do século XX. Vicente Martins ₢ 2015

PROCEDIMENTOS • As pesquisas iniciam-se com uma revisão da literatura que trata da das obras objeto de estudo, através de captura de artigos científicos, dissertações e teses na biblioteca e disponíveis no Google Acadêmico. • Os pesquisadores iniciantes digitam as obras a partir de suas edição mais antigas com fins paleográficos (estudo das antigas formas de escrita) • Os pesquisadores iniciantes proveem, após criteriosa leitura, e manualmente, o Frasemário Literário com um número expressivo de éxpressões idiomáticas identificadas (fixação) reconhecidas (idiomaticidade) no romance.

• Preencheem, para cada frasema, uma entrada do glossário da qual constam: a classificação, a definição, a abonação e a versão na variante da culta da língua portuguesa contemporânea, uma vez que as expressões idiomáticas e combinações lexicais são originalmente registradas nas obras literárias.

Vicente Martins ₢ 2015

EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS. AFINAL, O QUE SÃO? • São combinações de palavras convencionais de uma língua: memorizadas como um todo, estáveis (portanto, fixas ou com um certo grau de fixação) e recorrentes cujo sentido não é deduzível dos sentidos das palavras que as compõem e que geralmente não podem ser entendida ao pé da letra (Casares, 1950; Zuluaga, 1980.; e Corpas Pastor , 1996). • Outras unidades fraseológicas encontradas com frequência nos romances regionais: locuções, fórmulas de cortesia, clichês, provérbios ou ditados.

Vicente Martins ₢ 2015

EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS EM LUZIA-HOMEM

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EXEMPLÁRIO • MANDAR DESTA PARA MELHOR. Matar. “— É porque você não conhece o Crapiúna, nem a Gabrina. Ele é o que se sabe, capaz de tudo, até de mandar gente desta para melhor”. (cap. XVII). • NÃO SE AFOGAR EM POUCAS ÁGUAS. Não se abater por coisa pouca: "— Não suponha que ela esteja amuada... Qual o quê!... Aquela não se afoga em poucas águas, e a prova é que continua a fazer o possível para obter a sua soltura...”. (cap. XVI). Vicente Martins ₢ 2015

EXEMPLÁRIO DETALHADO • FICAR A PANOS DE VINAGRE. Ficar muito doente: "Tivera eu a sua força, não precisaria de arma: quebrava-lhe a cara safada que ficaria a panos de vinagre.”.(cap. IV). Variante.: Ficar entre a vida e a morte. COMENTÁRIO: • Na atualidade, a expressão é pouco usada em Portugal. Mas há atestações no passado, por exemplo, no século XIX, em autores portugueses, tal como se verifica com autores brasileiros: «Achou o rei de cama todo em panos de vinagre» (Teófilo Braga, Contos Tradicionais do Povo Português, p. 106). Depreende-se que «a panos de vinagre» significa muito doente». Acrescente-se que o vinagre é utilizado para embeber compressas (ou seja, «panos»), como remédio caseiro para fazer baixar a febre. Vicente Martins ₢ 2015

EXEMPLÁRIO DE ZOOMATISMOS • FICAR COM A MOSCA ATRÁS DA ORELHA. Ficar desconfiado: "— Pensei que se engraçara de ti. Fiquei com a mosca na orelha desde aquele mimo dos cravos.”.(cap. XXV). Var.: Ficar coma pulga atrás da orelha. • SER COMO MACACO POR BANANA. Gostar muito de algo: — Estava quase requerendo — tornou o sertanejo. Por essa bebida, sou como macaco por banana. No tempo da fartura, eu era capaz de tomar uma canada de café por dia.”(cap. XXVI). Var.: Ser como jumento por biscoito. Vicente Martins ₢ 2015

EXEMPLÁRIO DE SOMATISMOS • BOTAR A ALMA PELA BOCA. Ficar com a respiração acelerada, ofegante: "— Bênção de Deus, filha. Vens tão cansada. Teimas em carregar água nessa jarra... Estás a botar a alma pela boca...”. (cap. V). Var.: Estar com o coração na garganta. • BOTAR A BOCA NO MUNDO. Contar um acontecimento para várias pessoas. Contar algo para alguém: "Elas botam a boca no mundo e estamos perdidos..”. (cap. XIII). Var.: Colocar a boca no trombone. Vicente Martins ₢ 2015

EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS EM DONA GUIDINHA DO POÇO

Vicente Martins ₢ 2015

EDIÇÃO DE 1952 DE DONA GUIDINHA DO POÇO: GLOSSÁRIO DE AMÉRICO FACÓ • ANDAR MUITO CABANO – É no uso popular sertanejo o mesmo que andar cabisbaixo, cismático, alheio às coisas circunstantes. V. cabano. • BOTAR TERRA NOS OLHOS – Expressão da fraseologia popular do Norte: enganar, iludir a outrem: “Nem mesmo o Cão farrabás Me bota terra nos olhos...” (Dona Guid. Do Poço).

• DAR VOLTAS AO RODO – Expressão da fraseologia popular, que significa tornar atrás de uma resolução; mudar de pensamento ou propósito. • ENXUGAR O COPO – Expressão da fraseologia popular. Beber o seu tanto, se não também embebedar-se. • FICAR ALGUÉM PELOS CABELOS – Encher-se de cólera, revolta ou desespero, “A Guida ficou pelos cabelos: Ah! Cabra cobarde, ruim, miserável! Não sei para que aquilo veste ceroula!” (Dona Guid. do Poço • FACO, Américo. Glossário. In PAIVA, Oliveira. Dona Guidinha do Poço. São Paulo. Saraiva. 1952. (p.223-256)

Vicente Martins ₢ 2015

EXEMPLÁRIO • COMER O PÃO QUE O DIABO AMASSOU: É uma expressão popular que significa passar por um grande sofrimento ou por grandes dificuldades. “Os que estavam ainda em marcha, como uns que êle ouvira ali, desejavam ter morrido antes nas suas terras do que se ter atirado assim pelos caminhos, comendo, e quando comiam! o pão que o diabo amassou. (DGP:1952, p. 40) • NÃO BOTAR PANELA NO FOGO: Expressão popular: diz-se de quem não se confia, ou é dado a desconfiar. “Mais o velho pega, e se hai de compô as coisas cos adversaro, que êle bem que lhe dixe que cum uma política ninguém bota panela no fogo, que por adonde entre um sai dois, mais tarde ou mais cedo...” (DGP:1952, p.39) Vicente Martins ₢ 2015

EXEMPLÁRIO • PADECIMENTO PASSADO É LOGO ESQUECIDO: Ditado popular que significa ignorar aborrecimento passado para que não interfira na vida atual. “Ai menino! êle não lhe podia contá todo o sucedido, vexames e agonia, de que não queria se lembrar mais. Padecimento passado é logo esquecido...” (DGP:1952, p.39) • QUEM NASCEU PARA DERREIS NÃO CHEGA A VINTEM : Ditado popular que significa não ter solução para alguém ou coisa. “Desde que deixara em Goianinha, metera-se para o Rio Grande do Norte, adonde possuía os seus bichinhos, na Serra do Martins. Com o auxílio de Deus ia vivendo. Mais porém quem nasceu pra derréis não chega a vintém.” (DGP:1952, p.39) Vicente Martins ₢ 2015

AS CLÁSSICAS “ DUAS PALAVRAS” “Aconselharam-me a fazer um glossário. Mas, glossário, é cousa muito grave. É para livro consagrado, livro em terceira ou quarta edição. Num romance anonymo, editado em província, ele dá uma impressão terrível de presunção e pernosticismo... E resolvi não o fazer”

Rachel de Queiroz à época do lançamento de "O Quinze

(Rachel de Queiroz, em maio de 1930)

Vicente Martins ₢ 2015

NOVOS FRASEMÁRIOS LITERÁRIOS PROJETOS DE PESQUISA APROVADOS E VALIDADOS PELA PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO DA UVA

Vicente Martins ₢ 2015

Considerações Finais • Os dados coletados nas fontes literárias podem ser classificados em três grandes grupos de fatores interferentes nas construções fraseológicas: (i) o fato tempo (diacrônico); (ii) o fator espaço (diatópico); e (iii) fator estratificação social (diastrático) • As fontes literárias permitem a valorização do registro e abonações autorizadas das formas fraseológicas, inclusive com identificação da preferência lusitana e preferência brasileira(PB). • A culminância do Projeto é a publicação da edição paleográfica (ou semidiplomática) das obras regionais de modo a reproduzir fielmente o texto, obedecendo à ortografia e à pontuação, e em que as alterações necessárias são representadas entre colchetes com seus devidos comentários.

Vicente Martins ₢ 2015

REFERÊNCIAS • ARAGÃO, Carmélia Maria . Luzia-homem: aspectos da crítica sobre uma obra. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Departamento de Literatura, Curso de Mestrado em Literatura, Fortaleza (CE), 2008. • CARVALHO, Maria da Salete Figueiredo de. Glossário regional/popular da obra São Bernardo de Graciliano Ramos. João Pessoa: CEFETPB, 2008 • CASARES, Julio. Introducción a la lexicografia moderna. Madrid: 1969 [1950]. • CORPAS PASTOR, Gloria. Manuel de fraseologá española. Madrid: Gregos, 1996. • LEONE, Juliana Bianchi. Datação de fenômenos lexicais e expressões idiomáticas na obra de Juó Bananére: subsídios para o estudo diacrônico do português brasileiro . Dissertação (Mestrado)- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas. - São Paulo, 2013. • OLYMPIO, Domingos. Luzia-Homem. Rio de Janeiro: Castilho, 1929. [2ª edição com Prefácio de Gustavo Barroso]. • PAIVA, Oliveira. Dona Guidinha do Poço. São Paulo. Saraiva. 1952. • SOUZA, Carlos Alberto de. A linguagem regional-popular nos romances de Rachel de Queiroz. 2013. 256f. – Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Departamento de Letras Vernáculas, Programa de Pós-graduação em Linguística, Fortaleza (CE), 2013. • ZULUAGA, Alberto. Introducción al estúdio de expressiones fijas. Frankfurt am Maim: Peter D. Lang, 1980. Vicente Martins ₢ 2015

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