Freguesia de Souselas: um povo com História

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Freguesia de Souselas

um povo com História

SOUSELAS | COIMBRA | 2013

FICHA TÉCNICA: TÍTULO AUTOR COLABORAÇÃO EDIÇÃO DESIGN E PAGINAÇÃO IMPRESSÃO TIRAGEM DEP. LEGAL N.º 1.ª EDIÇÃO CAPA CONTRA-CAPA

Freguesia de Souselas - um povo com História João Carlos Santos Pinho João Pardal e Paula Moreira Junta de Freguesia de Souselas Nuno Beirão Pantone 4 600 exemplares 363976/13 Setembro de 2013 Conjunto de fotos e documentos sobre a História de Souselas Foto do chafariz de Souselas (de Joaquim Carlos Ferreira)

Nota: O autor é totalmente contrário ao assim denominado Novo Acordo Ortográfico, pelo que continua a escrever segundo a chamada norma antiga. © Copyright 2013 Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor.

JOÃO CARLOS SANTOS PINHO

Freguesia de Souselas

um povo com História

SOUSELAS | COIMBRA | 2013

ÍNDICE PALAVRAS DE ABERTURA ............................................................ MENSAGEM DO PRESIDENTE DA FREGUESIA DE SOUSELAS . AO LEITOR ......................................................................................

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Créditos fotográficos e documentais .................................................... Siglas e abreviaturas utilizadas na obra ................................................. Tábua cronológica ...............................................................................

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APRESENTAÇÃO DA FREGUESIA ................................................

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I – O MEIO FÍSICO E A PAISAGEM............................................... 1. Paisagem ........................................................................................ 2. Geologia .......................................................................................... 3. Hidrologia ...................................................................................... 3.1. Recursos hídricos superficiais.................................................... 3.2. Recursos hídricos subterrâneos ................................................. 4. Análise bioclimática e biogeográfica................................................. 4.1. Flora......................................................................................... 4.1.1. A Natureza Mediterrânica .............................................. 4.1.2. Serra de Brasfemes e do Alhastro .................................... 4.1.3. As Zonas Ribeirinhas...................................................... 4.1.4. Povoamentos Mistos de Pinheiro e Eucalipto.................. 4.1.5. Algumas espécies da flora com interesse conservacionista 4.1.6. Espécies RELAPE (espécies Raras, Endémicas, Localizadas, Ameaçadas ou em Perigo de Extinção) e/ou constantes da Directiva Habitats ou com algum estatuto de protecção ... 4.2. Fauna ....................................................................................... 4.2.1. A avifauna ...................................................................... 4.2.2. A mamofauna................................................................. 4.2.3. Herpetofauna (répteis e anfíbios) ................................... 4.2.4. Ictiofauna ....................................................................... 4.2.5. Invertebrados ................................................................. 5. A Propriedade e a Agricultura .......................................................... 5.1. A vinha..................................................................................... 5.2. O olival .................................................................................... 5.3. A pecuária ................................................................................ 5.4. Os pastos .................................................................................. 5.5. A Floresta ................................................................................. 6. Notas de Geografia Histórica...........................................................

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II – PROCURANDO AS ORIGENS ................................................. 1. Os indícios fornecidos pela toponímia e microtoponímia ................ 2. Contributos da Arqueologia ............................................................ 3. A documentação antiga ................................................................... 4. O Mosteiro de Lorvão intensifica, no Séc. XII, o seu domínio sobre Souselas .................................................................................. 5. Séculos XIII-XIV: Lorvão amplia o património ............................... 6. A Coroa e a Mata de Lagares (sécs. XV-XVI) ................................... III – VIDA ECONÓMICA E SOCIAL – O TERRITÓRIO, OS SENHORIOS, EXPLORAÇÃO E OCUPAÇÃO DO SOLO ...... 1. Introdução ...................................................................................... 2. O Mosteiro de Lorvão: o grande Senhor de Souselas e de parte da Marmeleira ................................................................. 2.1. Em Souselas ............................................................................. 2.2. Na Marmeleira ......................................................................... 2.3. Azenhas, Moinhos e Lagares ..................................................... 3. A Comenda de Santiago de Souselas ................................................ 4. O Cabido da Sé de Coimbra: na Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro ............................................................... 5. A Igreja de Santiago: da Marmeleira a Carrimá, passando pela Zouparria .................................................................. 6. A Universidade: O prazo de Souselas, Marmeleira e Botão .............. 7. A Casa de Aveiro, senhoria directa do Pisão ..................................... 8. O Convento de Santana: Carrimá, Marmeleira e Sargento-Mór ...... 9. As Igrejas de S. Cristóvão e de S. Salvador: senhorios de pequena expressão ....................................................... 10. Os bens da Câmara Municipal de Coimbra na Freguesia de Souselas IV – EVOLUÇÃO ADMINISTRATIVA .......................................... A. Administração Religiosa .................................................................. B. Autonomia Concelhia .................................................................... 1. Introdução ...................................................................................... 2. O funcionamento dos Concelhos de Souselas e Zouparria do Monte... C. Souselas no contexto militar: a Companhia de Ordenanças ............ D. O fim da autonomia concelhia e a entrada em funcionamento da Junta de Paróquia ...................................................................... 1. Enquadramento .............................................................................. 2. Alcance e funcionamento da Junta de Paróquia ............................... 2.1. A continuidade com o passado ................................................. 2.2. Novas competências e realidades...............................................

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2.2.1. Reorganização administrativa e judicial .......................... 2.2.2. Consolidação de antigas estruturas locais: caminhos, pontes, fontes ................................................ 3. Souselas sob orientação da Junta de Freguesia .................................. 3.1. Introdução ............................................................................... 3.2. A freguesia no Estado Novo...................................................... 3.2.1. Mantêm-se velhas preocupações ..................................... 3.2.2. Novas competências e realidades..................................... 3.2.3. Dois exemplos de problemas com limites de freguesia .... 3.3. A Freguesia depois da revolução de Abril: a transmissão de poderes, a Comissão Administrativa da Junta de Freguesia e a acção das Comissões de Moradores ..................................... 3.3.1. Linhas de continuidade e de ruptura ..............................

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V – DEMOGRAFIA, ARTES, OFÍCIOS E OCUPAÇÃO PROFISSIONAL.........................................................................

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VI – EVOLUÇÃO SOCIAL E MATERIAL DA FREGUESIA DE SOUSELAS (PROGRESSOS E RETROCESSOS) .............. Introdução .......................................................................................... A. Da extinção concelhia aos finais do Estado Novo ............................ 1. A polémica e antiga questão dos baldios .......................................... 2. A luta do povo pelos cemitérios: das motivações à realidade............. 3. O abandono do lugar de Carrimá .................................................... 4. Novas Estradas ................................................................................ 5. Saúde e Assistência Social ................................................................ 6. Pela Educação e Ensino ................................................................... 6.1. Em Souselas ............................................................................. 6.1.1 A Escola Masculina ......................................................... 6.1.2. Escola Feminina ............................................................. 6.2. Uma escola para ambos os sexos ............................................... 6.3. Na Marmeleira ......................................................................... 6.4. Sargento-Mor ........................................................................... 7. Caminho de Ferro ........................................................................... 8. Abastecimento de água, luz, saneamento ......................................... 9. Origem e crescimento da zona industrial de Souselas ....................... 9.1. A instalação das primeiras empresas .......................................... 9.2. O impulso dos anos 60 ............................................................. 9.3. À entrada dos anos 70: A CIMPOR agita Souselas ................... 10. A Casa da Junta ............................................................................. 11. Correios e telecomunicações ..........................................................

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12. Campo de jogos ............................................................................ 13. Arranjo urbanístico dos lugares...................................................... 14. Souselas começa a transformar-se: novos bairros e moradias .......... 15. Diversos pequenos (mas grandes) melhoramentos ......................... B. Da Revolução de Abril aos alvores do século XXI ............................ 1. As grandes necessidades da freguesia na transição de poderes ....................................................................................... 2. A Infra-estruturação básica da freguesia: um processo lento, mas gradual, de melhorias ................................ 3. A nova sede da junta........................................................................ 4. A CIMPOR e a freguesia: problemas e contrapartidas ..................... 4.1. A entrada em funcionamento da unidade ................................. 4.2. O pós 25 de Abril .................................................................... 4.3. A co-incineração: Souselas no epicentro de uma questão nacional 4.3.1 Os primeiros momentos: da anunciada decisão em co-incinerar à união de todos no voto contra ............. 4.3.2. Da teimosia em co-incinerar ao documento compromisso .. 4.3.3. A discussão sobe de tom ................................................. 4.3.4. Mudanças de rumo......................................................... 5. A rede viária .................................................................................... 5.1. Expansão .................................................................................. 5.2. Melhoramentos ........................................................................ 6. Progressos ao nível escolar ............................................................... 7. A creche e infantário........................................................................ 8. Por uma rede de transportes de qualidade ........................................ 9. A criação de um mercado ................................................................ 10. Expansão Urbana .......................................................................... 11. O Quartel da G.N.R. .................................................................... 12. O desejo antigo de um novo cemitério paroquial em Souselas ....... 13. A elevação a Vila............................................................................ 14. Pavilhão gimnodesportivo e polidesportivo e requalificação do recinto de festas ............................................... 15. A biblioteca ................................................................................... 16. Souselas no Caminho de Santiago e na rota da peregrinação a Fátima 17. Diversos: delegações bancárias, farmácia, posto de abastecimento, centro cívico, parques infantis e representatividade ........................ VII – PATRIMÓNIO, ARTE E RELIGIÃO ...................................... 1. Introdução ...................................................................................... 2. Património em Souselas ................................................................... 2.1. A Igreja Matriz de S. Tiago de Souselas..................................... 2.2. O Passal e a Residência Paroquial .............................................

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2.3. A Capela do Senhor do Terreiro................................................ 2.4. O Cruzeiro ............................................................................... 2.5. O chafariz ................................................................................ 3. Património na Marmeleira............................................................... 3.1. Capela de São João ................................................................... 3.2. Capela de Nosso Senhor da Agonia .......................................... 3.3. Alminhas .................................................................................. 4. Património em S. Martinho do Pinheiro ......................................... 4.1. Capela de Nossa Senhora da Nazaré ......................................... 5. Património na Zouparria do Monte................................................. 5.1. Capela de São Martinho ........................................................... 6. Património em Sargento-Mor .......................................................... 6.1. Capela de Nossa Senhora das Preces ......................................... 6.2. Capela de Nossa Senhora da Boa Hora ..................................... 6.3. Alminha de S. Romão .............................................................. 7. Arquitectura civil: do rural e tradicional ao senhorial ....................... 8. Um caso singular envolvendo o património religioso ....................... 9. Património desaparecido, destruído e em risco: moinhos, azenhas e lagares............................................................... 10. Irmandades e Confrarias ................................................................

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VIII – COLECTIVIDADES DA FREGUESIA ................................ Adega Cooperativa de Souselas ............................................................ Agrupamento 1360 Souselas................................................................ Associação Escola de Karate Shotokan de Souselas............................... Associação Desportiva de Souselas (ADS) ............................................ Casa do Povo de Souselas .................................................................... Centro de Apoio Social de Souselas (CASS) ........................................ Centro Cultural de Sargento-Mór ....................................................... Centro Cultural de S. Martinho do Pinheiro ....................................... Centro Cultural de Zouparria do Monte ............................................. Centro de Recreio Popular Marmeleirense ........................................... Centro Social de Marmeleira (CSM) ................................................... Grupo Desportivo e Cultural – Marchas Populares de Souselas ........... Grupo de Cordas Allegro..................................................................... Grupo Etnográfico de Souselas ............................................................ Grupo musical A Barca dos Castiços ................................................... Tuna Souselense ..................................................................................

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IX – PERSONALIDADES ................................................................. António da Cunha e Sousa .................................................................. Jeronymo José Baptista Lopes Parente.................................................. Custódio José de Oliveira Nazareth ..................................................... Alberto Dias Pereira............................................................................. José de Almeida Machado ................................................................... José Leopoldino dos Santos ................................................................. Elias Fernandes .................................................................................... Fernando Cunha ................................................................................. Rosalina de Jesus Marques e Álvaro Ferreira ........................................ Licínio Neves Abreu ............................................................................ Peter Ferreira ....................................................................................... Joaquim Carlos Ferreira ....................................................................... António Dias Cação ............................................................................

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X – FESTIVIDADES, ROMARIAS E FEIRAS .................................. 1. Festividades ..................................................................................... 1.1. Em Souselas: Festa a Nossa Senhora do Rosário e Festa ao Sr. do Terreiro........................................................... 1.2. Na Marmeleira: Festa a S. Sebastião e Festa à Rainha Santa ...... 1.3. Em S. Martinho do Pinheiro: Festa a N.ª Sra. da Nazaré .......... 1.4. Na Zouparria do Monte: Festa de S. Martinho ......................... 1.5. Em Sargento Mor: Festa a N.ª Sra. das Preces e Festa a S. Romão 2. Romarias ......................................................................................... 2.1. Romaria do Sr. da Agonia ........................................................ 2.2. Romaria da Rainha Santa ......................................................... 2.3. Romaria do Senhor da Serra ..................................................... 2.4. Romaria do Espírito Santo ....................................................... 3. Feiras ...............................................................................................

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XI – ETNOGRAFIA, FOLCLORE E CULTURA POPULAR .......... Introdução .......................................................................................... 1.Linguagem Popular .......................................................................... 1.1. As Saudações ............................................................................ 1.2. Quadras populares.................................................................... 2. Danças, Cantares e Instrumentos .................................................... 2.1. Modas de Roda, Viras, Verdegais e outras ................................. 2.2. Danças de Fogueiras ................................................................. 2.3. Breve historial dos Ranchos na Freguesia de Souselas ................ 3. Os Trajes ......................................................................................... 3.1. Descrição de alguns trajes usados pelas nossas gentes ................ a) Traje de ver a Deus ............................................................... b) Traje de Romaria ..................................................................

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c) Traje de Noivos..................................................................... d) Trajes de domingar ............................................................... e) Traje de Bairradina................................................................ f ) Traje de Feira ........................................................................ g) Traje de vendedeiras ............................................................. h) Trajes de trabalho do campo ................................................ i) Traje de Vindimas ................................................................. j) Traje da apanha da azeitona .................................................. l) Traje de Ceifeira ................................................................... m) Traje das Crianças ............................................................... 3.2. Adornos dos trajes .................................................................... a) Os xailes ............................................................................... b) Ourivesaria........................................................................... 4. Costumes e tradições ...................................................................... 4.1. Religiosos ................................................................................. a) Do Natal até aos Reis, o ciclo dos doze dias .......................... b) Dia de Nª. Sra. das Candeias (venerada a 2 de Fevereiro) ..... c) Quaresma e Páscoa .............................................................. d) Quinta-Feira de Ascensão ..................................................... e) O cantar das “ALMAS” ou amentar das almas ...................... f ) Toques dos sinos ................................................................... g) Orações ................................................................................ h) Pedir os Santórios ................................................................ i) Novenas ............................................................................... 4.2. Costumes Profanos ................................................................... a) Os Feijões ............................................................................. b) Oferta do Bolo Folar ............................................................ c) As fogueiras .......................................................................... d) Ritual de casamento: deitar amêndoas e flores ...................... e) A Matança do Porco ............................................................. f ) Venda de tremoços e do bolo de cornos ................................ g) Jogos tradicionais ................................................................. h) Queima do Judas ................................................................. i) O trigo da sorte ..................................................................... j) A distribuição do prato de arroz doce. ................................... l) As Maias ............................................................................... m) O Magusto ......................................................................... n) O Acordo ............................................................................. 5. Crendices e Superstições .................................................................. a) A mulher grávida .................................................................. b) Talhar o ar ............................................................................

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c) Quebrante ............................................................................ d) Ter sete filhos varões ............................................................. e) Medicina Popular ................................................................. f ) A meteorologia popular ........................................................ 6. Lendas ............................................................................................. a) A Origem de Souselas ........................................................... b) A origem do nome do Rio Resmungão ................................ c) A Moura Encantada do Buraco da Moira ............................. 7. Alcunhas ......................................................................................... 8. Gastronomia ................................................................................... 9. Instrumentos e tecnologia rural ....................................................... 10. Artesanato .....................................................................................

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LISTA BIBLIOGRÁFICA ..................................................................

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FONTES MANUSCRITAS ...............................................................

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ANEXOS (Tabelas e Documentos)......................................................

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PALAVRAS DE ABERTURA

reguesia de Souselas – um povo com História é uma obra monográfica que percorre, por mais de mil anos, em múltiplos aspectos, a vida da terra e das gentes de um território singular. Desde sempre, os concelhos revelaram um empenho muito especial em guardar a memória dos seus feitos, dos seus privilégios, das suas liberdades. Esses homens, dos séculos XIV, XVI ou XVIII, tinham a convicção de que a posse e conservação dos documentos, independentemente da sua natureza, constitui a fiança da defesa intransigente da diversidade do seu vasto e notável património. O estudo que ora é oferecido aos leitores é, ainda, uma prova, “de mão cheia”, desse esforço. Com efeito, um labor enérgico, sustentado pelo recurso preferencial a fontes escritas, orais, arqueológicas, artísticas e outras, produziu, do passado para o futuro de Souselas, um conhecimento profundo da sua milenar história. De entre os onze capítulos de que se compõe o livro, distribuídos por largas dezenas de itens, e cerca de sete centenas de páginas, seja-nos permitido salientar aqueles que melhor revelam a herança e preservação da identidade cultural e social da freguesia de Souselas. É admirável a riqueza do património, civil e religioso, disseminado pelos muitos lugares da freguesia, assim como o número impressionante de colectividades (perto de duas dezenas) pelas quais passa uma boa parte da formação cívica e cultural dos jovens souselenses. Da cooperação forte entre gerações, vivida através da música, do folclore, do desporto, da solidariedade quotidiana, da etnografia, é legítimo esperar o engrandecimento global deste território que, também, não tem descurado o desenvolvimento dos sectores principais que garantem uma dinâmica actividade económica. Uma saudação grata endereço ao Autor da obra, Dr. João Carlos Santos Pinho. Por fim, é com profunda satisfação que dou testemunho da reconhecida competência do Dr. João Pardal, Presidente da Junta de Freguesia de Souselas, à qual alia sempre um particular espírito de luta sem tréguas na defesa dos interesses da sua Freguesia. Este livro é mais um marco da sua laboriosa acção exercida, em todo o tempo, com afecto, alegria incontida, e uma muito própria simpatia contagiante.

Coimbra, 29 de Agosto de 2013 Maria José Azevedo Santos Vice-Presidente da Câmara Municipal de Coimbra.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

MENSAGEM DO PRESIDENTE DA FREGUESIA DE SOUSELAS

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Freguesia de Souselas é uma terra com uma história secular, com área administrativa-religiosa definida desde o séc. X. São deste século os primeiros documentos escritos que atestam a sua ancestralidade e que se encontram no Arquivo Nacional da Torre do Tombo. As raízes do poder local têm a sua origem no poder concelhio e são antigas por este território. A partir de 1628 a paróquia de Souselas já integrava as localidades que hoje são parte integrante da área administrativa da Freguesia. Com referências desde 1527, Souselas foi sede de concelho até 1834. Em 1719 os lugares da Marmeleira, Zouparria do Monte e Souselas eram sedes de três pequenos concelhos do termo coimbrão. Os registos de natureza histórica e arqueológica são imensos (26 locais de interesse arqueológico para além do património edificado de elevado valor), desde a pré-história, passando pelo Neolítico, pelo período romano e visigótico, até à fundação da Nacionalidade. A freguesia é possuidora de uma identidade própria, a meio caminho entre Coimbra e Bairrada, possui um importante património histórico, cultural, etnográfico e gastronómico. As suas características morfológicas e territoriais, e os seus recursos endógenos, agrícolas, florestais, minerais e hídricos, bem como uma considerável área empresarial, de comércio e indústria, permitem afirmar a freguesia como uma centralidade a Norte do município, estabelecendo conexões com distrito e concelhos vizinhos, aumentando desta forma a sua importância e relevância supramunicipal. O associativismo cultural, recreativo, desportivo e social está bem representado, muitas são as forças vivas da Freguesia a quem presto homenagem,

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também estas organizações fazem parte da história da Freguesia, bem como a todos os autarcas que pertenceram ao executivo e assembleia de freguesia. A Monografia da Freguesia de Souselas é um testemunho escrito do nosso passado e presente, e a projecção no futuro de um legado para as gerações vindouras, permitindo dar a conhecer, a todos, a terra dos seus antepassados. Este documento resulta de um longo e duro trabalho de pesquisa, que deve ser motivo de orgulho e satisfação de todos os cidadãos da Freguesia. Fica uma palavra de apreço e gratidão ao Sr. Dr. João Pinho, que se mostrou um verdadeiro souselense e um homem de grande valor científico, técnico, académico e pessoal, não será nunca esquecido, bem-haja. Um agradecimento a todas as pessoas que colaboraram, dando informações, facultando documentos, fornecendo fotografias e outros elementos, com especial referência ao Dr. Henrique Nazareth, ao Sr. Renato Ferreira e à Sra. Conceição Ferreira. Muito obrigado às instituições e colectividades da Freguesia, à Cimpor, Caixa Geral de Depósitos e Caixa de Crédito Agrícola. E um agradecimento especial pelo apoio da Câmara Municipal de Coimbra, com referência ao Sr. Dr. Carlos Encarnação, ao Sr. Dr. Mário Nunes, ao Sr. Presidente Dr. João Paulo Barbosa de Melo é à Sra. Vice-presidente Profª. Dra. Maria José Azevedo Santos. Em síntese, a Monografia da Freguesia de Souselas – Um Povo com História – é uma homenagem a todos os cidadãos desta freguesia, ao povo trabalhador que depois da saída da fábrica e do seu emprego, ia para as terras de enxada nas mãos, plantar a vinha, o olival, os hortícolas, semear as batatas e regar o milho. Gente laboriosa, frontal, sincera e alegre, que a todos orgulha. Souselas, 20 de Agosto de 2013 Presidente da Junta de Freguesia de Souselas João Pardal

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A

Freguesia de Souselas – um povo com História

AO LEITOR

Monografia da Freguesia de Souselas resultou de um convite, ao jeito de desafio, lançado pelo Presidente da Junta de Freguesia de Souselas, em meados de 2007. João Pardal e sua equipa propuseram-me, desde logo, e independentemente dos custos, tempo de execução ou extensão do trabalho, a elaboração de uma obra sobre a sua História, que abarcasse o máximo de conteúdos, que não ficasse pela rama e que dignificasse a terra e as gentes. Na base da outorga de tal responsabilidade estava o meu trajecto enquanto investigador, e as monografias que havia publicado sobre algumas freguesias do Município de Coimbra. Chegara a vez de Souselas! Durante 6 longos anos a obra fez-se, e o autor passou também a coordenador. O livro ganhou forma e feitio, com diversificados conteúdos, alguns deles não da safra exclusiva do autor, extraídos de arquivos ou bibliotecas, mas de colaborações de pessoas e instituições da freguesia. O próprio João Pardal, entusiasmado, participaria directamente na obra, escrevendo sobre as temáticas que lhe são mais queridas: o ambiente, a paisagem, e a etnografia. A propósito, importa realçar que pelo volume de informação recolhido, analisado e sistematizado, o projecto demorou mais tempo do que o inicialmente definido para a sua conclusão, o que provocou em alguns souselenses natural surpresa e ansiedade. Na verdade, diz-se que há males que vêm por bem. Creio ser este um dos casos. Nestes anos pude constatar que em Souselas existia uma liderança, uma equipa, e um programa para executar. Do qual emergia, do ponto de vista cultural, o livro sobre a freguesia, que nos trouxe rosas, é certo, mas também alguns espinhos. Fizemos várias reuniões, discutimos e ponderámos aspectos não consensuais, tivemos mais dúvidas que certezas, optámos quase sempre pela continuidade em detrimento de cortes dolorosos. No final, venceu aquilo que nos unia: a defesa de um legado histórico e cultural, a identidade da Freguesia de Souselas - a todo o custo! Souselas possui documentação que remonta ao Séc. X, um facto só por si de espantar se pensarmos que é um período cronológico anterior à nacionalidade! Mas mais extraordinário foi, para mim, poder acompanhar a sua História e Estórias durante séculos, em especial a partir da centúria de quinhentos. A evolução administrativa, a afirmação do poder local, o vasto e riquíssimo património, o desenvolvimento infraestrutural, a força das colectividades, a questão duríssima e polémica da coincineração, foram algumas das linhas de investigação motivantes e enriquecedoras. Souselas é hoje uma das mais pujantes freguesias da Área Norte do Município de Coimbra, com uma centralidade catalisadora de bens e serviços, e uma dinâmica económica e social surpreendente. Ao olharmos para a Souselas dos dias que correm tudo nos parece normal. Mas nada aconteceu por acaso e se a Freguesia representa um valor acrescido no contexto municipal, para tal contribuíram, a meu 18

ver e de forma decisiva, dois acontecimentos históricos: em 1864, entrou em funcionamento a via-férrea com estação no lugar de Souselas; e, a partir de 1930, a freguesia afirmou-se como pólo de desenvolvimento industrial a Norte de Coimbra. É evidente que sem caminho-de-ferro não se teria operado o desenvolvimento industrial, pelo que ambos se interligam e confluem num mesmo sentido: Souselas tornou-se um espaço de encontro de pessoas e culturas, de trocas e fluxos comerciais, onde nasceram e cresceram espaços de sociabilidade multifacetados, atraindo operários, industriais e comerciantes, fixando gente de paragens distantes e vizinhas, criando, em suma, uma dinâmica económica e social ímpar na região. Mas, qualquer desenvolvimento humano deveria ser equilibrado e ponderado. Infelizmente Souselas perdeu-se, durante algumas décadas, no frenesim do desequilíbrio trazido pelo desenvolvimento industrial. A primeira imagem que retive de Souselas, ainda criança, não mais se apagou da minha memória. Dados os laços familiares que tenho com Botão, costumava passar parte das férias nesta freguesia vizinha. Um dia, algures nos princípios dos anos 80, saí de Coimbra com a família rumo a Larçã. Era Verão, o dia estava solarengo, a natureza cobria-se dos tons verdes e fortes do estio. Seguindo pela antiga nacional, eis-nos chegados a Souselas: o céu escureceu, as casas pintaram-se de cinza, os telhados perderam a cor, a natureza envergonhava-se num verde tímido. O dia fez-se noite, nos varandins senhoras robustas limpavam pacientemente as camadas de pó. Inquieto e surpreso perguntei o que se passava (sabeis a resposta). E só voltei a sorrir quando chegado a Botão o sol voltou a brilhar e a natureza recuperou alegria. Souselas está hoje livre desta ameaça, embora outras tenham surgido no horizonte. Apesar de alguns contratempos, os últimos anos mostraram uma freguesia capaz de se superar, fruto de uma liderança que sabe o que quer e para onde ir. Avultados investimentos foram feitos em todos os lugares que compõem a freguesia, a maior parte referenciados nesta obra e que traduzem, muito provavelmente, o maior desenvolvimento estrutural e material, quantitativo e qualitativo, alguma vez executado no Município de Coimbra. Ter sido o eleito para escrever a História dos Souselenses enche-me de orgulho e profunda satisfação. Agradado com o produto final, cumpre-me agradecer a Souselas, aos Souselense de hoje e de ontem, em especial à equipa de João Pardal que tudo fez para tornar a monografia possível. Um agradecimento extensível à Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Coimbra, Prof.ª Maria José Azevedo Santos, pelo interesse e estímulo manifestados ao projecto monográfico de Souselas. E é com os olhos postos nos vindouros que dou a missão por concluída, esperando que apreciem o meu testemunho e dedicação. Souselas, Dia de Santiago, 2013 João Pinho 19

CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS E DOCUMENTAIS A Barca dos Castiços: fotos 172, 173 Adega Cooperativa de Souselas: fotos 135, 136 Arquivo Nacional Torre do Tombo: fotos 28, 32 Arquivo da Universidade de Coimbra: 29, 30, 31 e 108A Associação Desportiva de Souselas: fotos 142, 143,144, 145, 146, 147 Câmara Municipal de Coimbra: fotos 24, 25, 33, 34 Casa do Povo de Souselas: fotos 159, 160 Centro de Apoio Social de Souselas: fotos 148, 149, 150, 151, 152 Centro Social de Marmeleira: fotos 158A, 161, 162, 164, 166, 193 Centro Cultural da Zouparria do Monte: foto 155 Escola de Shotokan de Souselas: foto 140 Escuteiros (Agrupamento 1360): fotos 137, 138, 139 Família Nazareth: fotos 1, 2, 7, 21, 44, 45, 57, 58, 103, 109A, 111, 132, 133, 194 Fernando Morais: foto 158 Grupo de Cordas Allegro: fotos 168, 169 Grupo Desportivo e Cultural Marchas Populares de Souselas: foto 167 Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas: 170, 171, 188, 210, 211 Instituto Educativo de Souselas: foto 83 João Pardal/Paula Moreira: fotos 9, 15, 19, 22, 23, 60, 84A, 84B, 94, 131A, 135, 176, 177, 182, 183, 184, 185, 186, 187, 189, 190, 191, 192, 195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202 João Pinho: fotos 3, 3A, 4, 5, 6, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 17, 18, 20, 35, 39, 40, 42, 43, 46, 47, 48, 49, 50, 52, 53, 55, 56, 59, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 68, 69, 70, 71, 74, 76, 77, 78, 79, 85, 86, 87, 89, 90, 91, 92, 92A, 93, 95, 97, 98, 99, 102, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 109A, 110, 112,113, 114, 115, 116, 117, 118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 129, 130, 134, 153, 154, 156, 157, 163, 165, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209 Junta de Freguesia de Souselas: fotos 27, 36, 37, 38, 40A, 40B, 40C, 40D, 40E, 41, 51, 67, 72, 73, 75, 80, 81, 82, 88, 96, 100, 101, 131, 178 Licínio Abreu: foto 179 Renato Ferreira/Conceição Ferreira: fotos 26, 54, 110, 141, 180, 181 Tuna Souselense: 174, 175 21

Freguesia de Souselas – um povo com História

SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS NA OBRA A.C. – Antes de Cristo A.C.C.S.J – Arquivo do Centro Cultural de Sargento Mor AC.C.Z.M. – Arquivo do Centro Cultural de Zouparria do Monte A.C.P.S. – Arquivo da Casa do Povo de Souselas A.C.S.M. – Arquivo do Centro Social de Marmeleira A. F. – Assembleia de Freguesia A.G.E.S. – Arquivo do Grupo Etnográfico de Souselas A.H.M.C. - Arquivo Histórico Municipal de Coimbra A.J.F.S. – Arquivo da Junta de Freguesia de Souselas A.M. – Assembleia Municipal A.N.T.T. – Arquivo Nacional Torre do Tombo A.P.S. – Arquivo Paroquial de Souselas A.R. – Assembleia da República A.R.S. – Administração Regional de Saúde A.C.S.S. – Arquivo do Centro de Apoio Social de Souselas A.U.C. – Arquivo da Universidade de Coimbra B.G.U.C. – Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra B.M.C. – Biblioteca Municipal de Coimbra C. A. – Comissão Administrativa ou Conselho de Administração C.A.J.F. – Comissão Administrativa da Junta de Freguesia C.A.S.S – Centro de Apoio Social de Souselas CCI – Comissão Científica Independente C.E.B. – Ciclo do Ensino Básico C.N.A. – Comissão Nacional do Ambiente C.M. – Caminho Municipal C.M.C. – Câmara Municipal de Coimbra Cx. – Caixa D.L. – Decreto-Lei D.R.E.C. – Delegação Regional de Educação do Centro E.D.P. – Electricidade de Portugal E.N. – Estrada Nacional G.N.R. – Guarda Nacional Republicana Ha - Hectares I.E.F.P. – Instituto de Emprego e Formação Profissional I.N. – Instituto Nacional I.N.E. – Instituto Nacional de Estatística JF – Junta de Freguesia JP - Junta de Paróquia M.A.I. – Ministério da Administração Interna M.O.P. – Ministério das Obras Públicas PC – Presidente da Câmara Municipal PM – Primeiro-ministro Rev. - Revista P. – Página Pp. – Páginas S.M.C. – Serviços Municipalizados de Coimbra S/N – sem numeração T/ - Tonelada(s) 22

I – O Meio Físico e a Paisagem

TÁBUA CRONOLÓGICA ANO

ACONTECIMENTO

919

Um documento do Mosteiro de Lorvão refere a existência da portella de salice.

28 Junho 937

Justa e seus filhos doam ao Mosteiro de Lorvão tudo quanto possuiam na villa de Sausellas, exceptuando a baselica consagrada a S. Tiago.

9 Janeiro 973

Samaritana doa ao Mosteiro de Lorvão as suas villas-herdades1 de Albiaster e Salas. Na demarcação refere os lugares de Vimeneira (Vimieira), Crexemiris, Saias, S. Martinho de Paliales (corresponderá a S. Martinho do Pinheiro) e Marmeleira.

11 Agosto 1086

Árias Mendes e sua mulher Tivilli doam em testamento ao Mosteiro da Vacariça (concelho da Mealhada) a villa de Marmeleira (Concelho de Coimbra), com reserva do usufruto da mesma para o cônjuge sobrevivente.

15 Agosto 1103

Mendo Mides e sua mulher Pomba doam em testamento à Sé de Coimbra uma herdade e uma Igreja junto ao lugar designado por Marmeleira.

Maria Sendiniz e seus filhos vendem ao mosteiro de Lorvão a sua 9 Novembro 1167 parte de uma propriedade (1 herdade) que possuem em Lagares por 30 morabitinos. Janeiro 1232

Pelagius Muniz e sua mulher Maria Suaris vendem ao Cabido da Sé de Coimbra um Casal na Marmeleira pelo preço de 23 morabitinos.

1320

No tempo de D. Dinis, a Igreja de Santiago de Souselas é referida e taxada em 100 libras para reforço da luta contra a pirataria sarracena.

7 Junho 1402

O Cabido empraza a João de Torres, morador na cidade de Coimbra, um casal em Souzellas, que trazia Fagundi Annes, e outro Casal, na Marmeleira, que traz metade Miguel Migueis, e outra metade Domingues Annes.

Tendo-se aposentado no cargo Lourenço Afonso, morador em Vilela, 25 de Setembro de foi nomeado por D. Afonso V monteiro das matas de Botom e Llagares, 1441 Álvaro Afonso, morador em Brasfemes. 1527

No numeramento da população, ordenado por D. João III, surgem as localidade de Souselas, Marmeleira e Zouparria do Monte, integrando a Comarca da Estremadura, onde a cidade de Coimbra tinha toda a jurisdição cível e crime.

1533

No «Juramento dado aos juizes do termo da cidade» surgem os juízes dos concelhos da Marmeleira (Joam Vaz) seguindo-se o de Souselas (Joam Goncallvez) e, por fim, o da Zouparria do Monte (Joane Anes).

Segundo a documentação importa fazer uma importante distinção quando se fala em villa. Assim, uma villa-herdade tem, ao contrário de uma villa-aldeia, os seus limites demarcados por caminhos públicos, montes, fontes, cursos de água, fornos ou outras herdades. Já as villa-aldeia são aquelas villa que quando mencionadas na documentação, não se indicam confrontações ou referem-se outras aldeias em seu redor para as situar.

(1)

23

Freguesia de Souselas – um povo com História

ANO

ACONTECIMENTO

29 de Outubro de D. João III concede privilégio a D. João Soares, bispo de Coimbra, para 1545 poder cortar e trazer lenha das Matas de Botão e de Lagares. 19 Maio 1546

A Universidade de Coimbra toma posse do «prazo dos casaes da Marmeleira e dereitos de Botam» que fora do priorado de Santa Cruz.

1593-1594

Conclusão das obras da Capela do Sacramento na Igreja de Souselas.

21 Março 1628

Primeiro registo paroquial da freguesia de Souselas; baptismo de Maria, filha de Mateus João e Isabel Antónia, moradores em Souselas.

1663

D. Afonso VI agracia Antonio de Sousa de Macedo com a Comenda de S. Tiago de Souselas na Ordem de Cristo.

24 Maio 1705

O Mosteiro de Lorvão principia a realização de um Tombo de propriedades em Souselas e Marmeleira.

7 Julho 1718

Tem início a realização de um Tombo de propriedades da Igreja de Santiago na Marmeleira, Carrimá e Zouparria.

26 Maio 1721

O Vigário de Souselas, Bernardo do Amaral e Cunha, redige as informações paroquiais da freguesia.

1722

O Cabido da Sé de Coimbra dá início à elaboração de um Tombo de propriedades na Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro.

10 Maio 1724

Os inquilinos do Casal da Igreja de S. Cristóvão, em Souselas, reconhecem-na como directa senhoria.

1758

Manuel Madeira constrói, no lugar de Sargento-Mor, a Capela de Nossa Senhora das Preces.

12 Junho 1790

Escritura entre o Mosteiro de Lorvão e o Capitão Manuel Duarte, de Vilela, para a compra de uma terra no sítio do Pereiro para a construção de um lagar de azeite, a pedido do povo.

27 Outubro 1790

O alferes João da Costa reconhece a Casa de Aveiro como directa senhoria dos bens que possuía no Pisão do Canavial.

1795

Joana “da Azenha” é nomeada Depositária Geral das Penhoras do concelho da Marmeleira.

Setembro-Outubro O exército francês invade Souselas provocando mortes e avultados 1810 danos. 10 Junho 1813

Por Provisão do Desembargo do Paço, de 10 de Junho de 1813, o concelho da Zouparria foi anexado interinamente ao de Souselas, voltando posteriormente a desunir-se e a unir-se.

6 Novembro de 1836

Decreto de Passos Manuel suprimindo, a nível nacional, centenas de concelhos, entre os quais os de Souselas, Zouparria e Marmeleira.

4 Agosto 1856

A Câmara Municipal de Coimbra aprecia uma representação dos moradores de Sargento-Mór que, pertencendo à freguesia de Barcouço e Concelho da Mealhada, dizem preferir pertencer à Freguesia de Souselas e Concelho de Coimbra.

14 Dezembro 1859

José Augusto Mendes Dinis é nomeado professor de instrução primária da Freguesia de Souselas.

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I – O Meio Físico e a Paisagem

ANO

ACONTECIMENTO

9 Fevereiro 1863

O município toma conhecimento dos grandes prejuízos causados aos povos de Souselas e Botão pelas obras de construção do caminho-de-ferro.

1864

O censo da população aponta 1000 habitantes para a Freguesia de Souselas.

10 Abril 1864

Inauguração da Estação de Caminho de Ferro de Souselas.

Os habitantes de Souselas protestam, junto da Câmara Municipal, 28 Setembro 1870 contra o aforamento de um baldio necessário para logradouro comum, localizado em S. Martinho do Pinheiro. 1 Agosto 1873

O Governo autoriza a abertura duma estrada de Souselas aos Fornos.

1874

Concluiu-se a construção da Capela de Nossa Senhora da Agonia, na Marmeleira.

2 Agosto 1885

Os habitantes do lugar da Marmeleira apresentam abaixo assinado à Junta de Paróquia de Souselas pedindo a cedência de terreno para a construção do seu cemitério.

Julho a Setembro 1899

Decorre uma campanha de obras na Igreja Matriz de Souselas, custeada pela Junta de Paróquia.

1903 16 Outubro 1910

Constrói-se o cemitério paroquial de Souselas. Formação da Tuna Souselense.

30 Abril 1911

Realiza-se em Souselas o comício do candidato às Constituintes pelo Círculo de Coimbra, Coronel Belisário Pimenta.

23 Junho 1916

Pela lei nº 621 altera-se a divisão administrativa do território; a paróquia é substituída pela freguesia.

15 Janeiro 1921

Criação da Feira de Santa Luzia.

11 Maio 1930

A Companhia das Fábricas de Cerâmica Lusitânia e a Junta de Freguesia celebram acordo pelo qual a primeira passa a explorar nos terrenos da Junta, situados no sítio denominado “Barreiro” limite da Marmeleira, as areias, caolinos e argilas, obrigando-se em contrapartida a reparar a estrada que vai da Marmeleira para o Carqueijo e a pagar uma renda anual.

Abril 1932

O município decide criar um partido médico com sede em Souselas, sendo nomeado como facultativo municipal de Souselas o Dr. Joaquim de Sousa Machado.

Na sequência do alargamento da linha ferroviária do Norte, foi descoberto um cemitério visigótico na zona dos Carrizes, onde se enconNovembro de 1938 travam sepulturas, com esqueletos de elevada estatura (1,80 m), para além de artefactos, fivelas e machados. 1940

O etnógrafo e arqueólogo Vergílio Correia encontra pela freguesia vários vestígios da civilização Romana e, na zona do Pisão, um machado do Neolítico.

A Câmara Municipal de Coimbra e o Conselho Municipal aprovam 15 Fevereiro 1945 a cedência à junta de freguesia, do baldio necessário à regularização da Capela de Nossa Senhora da Nazaré, em S. Martinho do Pinheiro.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

ANO

ACONTECIMENTO

1 Julho 1945

A Junta de Freguesia cedeu, gratuita e temporariamente e com autorização camarária, o primeiro andar do edifício para um posto clínico de assistência a grávidas e crianças.

14 Dezembro 1952 Inauguração da nova Escola Feminina de Souselas. 19 Abril 1956 27 Outubro 1957

Fundação do Centro de Recreio Popular Marmeleirense. É inaugurada a iluminação pública e privada no lugar de Sargento-Mor.

21 Setembro 1958 Inauguração da escola primária da Marmeleira. 6 Março 1959

É inaugurada a Estação de Correios, Telégrafo e Telefone de 3ª classe de Souselas.

1959

Edifica-se a antiga escola primária de Souselas, dentro do Plano de Construções Escolares.

14 Setembro 1967

Inauguração da S.I.A.F em Souselas com a presença do Presidente da República, Almirante Américo Tomás.

23 Junho 1968

Dia de festa em Souselas com a inauguração de um novo fontenário, ligação do antigo à rede de abastecimento, e inauguração da luz eléctrica nos bairros do Calvário, Estreitas e Azenha.

25 Julho 1968

A Junta de Freguesia de Souselas reúne extraordinariamente para tratar de um assunto grave; na sequência das novas matrizes a Freguesia de Torre de Vilela reclama para si todos os terrenos onde se construiu a fábrica S.I.A.F. Souselas contesta agindo com todos os recursos disponíveis.

14 Outubro 1969

A Câmara Municipal de Coimbra aprova as condições de venda dos terrenos na zona do Calvário, destinados a pessoas de baixa condição social.

15 Março 1971

Autorizado, por despacho ministerial, a implantação de uma fábrica de cimentos em Souselas.

15 Julho 1971

Realiza-se no sítio de Porto Seco, de forma séria e responsável, o «Auto de acordo sobre os limites comuns às Freguesias de Souselas e Botão do Concelho de Coimbra».

O vereador Viriato Namora expressa preocupação pela instalação entre 14 Setembro 1971 Souselas e Brasfemes de um complexo industrial cimenteiro, dado o perigo de poluição da área em redor. 11 Maio 1973

A Câmara Municipal de Coimbra concede licença, por maioria de votos, para funcionamento da fábrica de cimentos em Souselas.

12 Julho 1973

Alvará instituindo a Casa do Povo de Souselas.

6 Abril 1974

Fundação da Associação Desportiva de Souselas.

4 Maio 1974

A Junta de Freguesia depõe o seu mandato e os seus elementos manifestam vontade de colaborar com o novo regime.

9 Junho 1975

Reúne pela primeira vez a Comissão de Moradores de Souselas.

1 Maio 1976

Fundação do Atlético Clube Marmeleirense.

8 Maio 1977

A junta de freguesia visita, a convite da Comissão de Moradores da Mata do Machial, o lugar do Pisão do Canavial tomando conhecimento do estado «miserável» da estrada que liga Pisão-Lagares.

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I – O Meio Físico e a Paisagem

ANO

ACONTECIMENTO

O Grupo Antepoluição e Saneamento de Souselas denuncia, em carta enviada ao Centro Distrital de Saúde de Coimbra, a poluição do ar 12 Dezembro 1978 provocada pela Cimpor e contaminação das águas residuais domésticas com origem em fossas. 7 Setembro 1980

É inaugurado em Souselas o parque infantil Doutor Alberto Álvaro Dias Pereira.

28 Agosto 1981

Fundação do Sargento-Mor Futebol Club.

11 Outubro 1982

A C.M.C. adjudica a 1ª fase da rede de esgotos de Souselas.

20 Dezembro 1982 Fundação do Centro Social da Marmeleira. 5 Dezembro 1984 Inauguração da nova escola primária de Souselas. 28 Janeiro 1985

Fundação, no seio da Casa do Povo, do Grupo Etnográfico.

7 Março 1985

Fundação do Centro Cultural de Sargento-Mor.

23 Março 1985

A Assembleia de Freguesia de Souselas demite-se em solidariedade com a Junta de Freguesia, decisão tomada com base na degradação da qualidade de vida da população.

13 Julho 1985

Inauguração, em Sargento-Mor, da Capela de Nossa Senhora da Boa Hora.

2 Novembro 1987

A Câmara Municipal aprova a urbanização da zona do Calvário em Souselas.

Dezembro 1987

A Câmara Municipal e os Serviços Municipalizados de Coimbra aprovam o concurso para o abastecimento de água aos Concelhos de Penacova e Coimbra – Ramo da Marmeleira de Botão.

11 Agosto 1992

Fundação do Centro Cultural de Zouparria do Monte.

5 Outubro 1992

Inauguração da nova sede da Junta de Freguesia de Souselas.

6 Agosto 1993

O Centro de Apoio Social de Souselas é reconhecido como instituição de utilidade pública.

20 Setembro 1993

Início das actividades da escola C+S de Souselas (actual Instituto Educativo de Souselas).

12 Julho 1997

Souselas é elevada à categoria de Vila.

1997-1998

Campanha de reabilitação da Igreja Matriz de Souselas a cargo da Fábrica da Igreja e supervisionada pelo Prof. Dr. Nelson Correia Borges, na qualidade de membro da Comissão Diocesana de Arte Sacra.

16 Março 1998

O vereador João Pardal intervém na reunião camarária pedindo esclarecimentos sobre a provável queima de resíduos na cimenteira de Souselas.

28 Agosto 1998

A Junta de Freguesia toma posição relativamente à co-incineração anunciando ir liderar o processo de contestação.

A Câmara Municipal de Coimbra em reunião do executivo aprova, por unanimidade, uma proposta relativamente à co-incineração: «Não 23 Novembro 1998 concordar com a eliminação de resíduos industriais na cimenteira da CIMPOR em Souselas». 28 Dezembro 1998

A Ministra do Ambiente, Elisa Ferreira, anuncia ao país a co-incineração na cimenteira de Souselas.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

ANO 1 Março 1999

22 Maio 2000 Janeiro 2001 21 Janeiro 2002 14 Abril 2002 3 Setembro 2005 11 Junho 2006 Setembro 2006 07 de Maio 2007 10 Julho 2007 30 Setembro 2007 Outubro 2007 14 Outubro 2007 12 Dezembro 2007 2007/2008 Fevereiro 2008 15 Setembro 2008 27 Outubro 2008 21 Dezembro 2008 12 Fevereiro 2009 15 Fevereiro 2009

ACONTECIMENTO A C.M.C. homologou a decisão dos S.M.A.S.C. que aprovara a abertura de concurso público referente à obra Concepção/Construção do Saneamento Básico da Freguesia de Souselas (Marmeleira do Botão, Zouparria do Monte, S. Martinho do Pinheiro e Souselas). A população do concelho manifesta-se ruidosamente pelas ruas da cidade contra a co-incineração, sendo recebida pelo presidente do município, Manuel Machado, nos Paços do Concelho. A freguesia de Souselas boicota as eleições presidenciais como forma de protesto contra a incineração de resíduos na Cimpor. A primeira reunião do novo executivo da Câmara Municipal de Coimbra presidida pelo Dr. Carlos Encarnação realiza-se, de forma simbólica, na freguesia de Souselas (Casa do Povo), tendo-se reafirmado a oposição ao processo de co-incineração. Inauguração do Centro Cultural Zouparria do Monte. A CMC atribui a Medalha de Mérito Cultural ao Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas. Inauguração oficial do Parque Infantil e de Lazer e do Pavilhão Polidesportivo descoberto da Marmeleira. Na sequência do trabalho conjunto realizado pela Junta de Freguesia, Gabinete de Arqueologia Arte e História da Câmara Municipal de Coimbra e Instituto Português de Arqueologia descobriu-se nos Carrizes (Souselas), um machado de pedra do período do Neolítico. A CMC atribui à Adega Cooperativa de Souselas a Medalha de Mérito Empresarial É desligada a ETAR de Souselas ao fim de 25 anos de actividade. Inauguração das bancadas do Campo do Calvário de Souselas O Supremo Tribunal Administrativo permite o início do processo da co-incineração em Souselas com base nos antigos estudos. Inauguração do chafariz de Souselas depois de trabalhos de requalificação. Realiza-se em Souselas o Fórum Económico e Social, aberto à população. Decorre a obra de construção do saneamento básico em Sargento Mór. A Cimpor anuncia publicamente o início da co-incineração. Inauguração do novo refeitório da Marmeleira. Sob proposta do vereador da cultura, Dr. Mário Nunes, a C.M.C. aprova por unanimidade a concessão da medalha de mérito cultural à Tuna Souselense. Constitui-se a Comissão Social da Freguesia de Souselas, composta por 24 instituições e colectividades da terra. O Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN) suspendeu o licenciamento que permitia a queima de resíduos perigosos em Souselas. - É solenemente inaugurado e benzido o novo cemitério paroquial de Souselas. - Lança-se a 1ª pedra do Centro de Formação e Cultura Paroquial de Souselas.

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I – O Meio Físico e a Paisagem

ANO

ACONTECIMENTO Inauguração da exposição da Freguesia de Souselas no âmbito da 25 Fevereiro 2009 iniciativa do Departamento de Cultura da CMC: «As Freguesias nos Paços do Municipio». Inauguração do Polidesportivo da EB 1 de Souselas e do Parque Infantil 21 Abril 2009 de São Martinho do Pinheiro. 21 Junho 2009 Cerimónia das comemorações dos 25 anos da EB 1 Souselas. A REFER anuncia o encerramento das duas passagens de nível da Linha Abril 2009 do Norte que atravessam a freguesia, construindo um viaduto e um túnel, de forma a não perturbar a circulação rodoviária. 31 Maio 2009

Assinatura do acordo de geminação entre as freguesias de Souselas e Almalaguês.

Setembro de 2009

Os autocarros dos SMTUC passam a fazer carreira dentro da localidade de Sargento Mór, com viragem na rua do Lagar.

6 Setembro 2009

Inauguração do piso sintético do Campo do Calvário.

02 Dezembro 2009

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, suspendendo a decisão do TCAN, permitindo assim a co-incineração de resíduos perigosos.

A Assembleia Municipal de Coimbra aprova a “Declaração de 29 Dezembro 2009 Coimbra”, defendendo que a Assembleia da República suspenda o processo da co-incineração. 30 Junho 2010

Abertura de duas passagens desniveladas (incluindo o viaduto) na Linha do Norte, concretizando um desejo com mais de 25 anos.

10 Janeiro 2011

Inauguração da Biblioteca de Souselas, com a presença do executivo municipal, e adesão de muitos populares.

01 Julho 2012

Inauguração do Polidesportivo Cabeço dos Moinhos, na Marmeleira.

16 Junho 2013

Assinatura, na Biblioteca Anexa de Souselas, do contrato de empreitada para a construção do refeitório da Escola de Souselas e do Contrato Programa para apoio à obra do Centro Social de Formação e Cultura.

Julho/Agosto 2013

Decorre o concurso público para a empreitada da construção do recinto de festas/requalificação do centro urbano de Souselas.

Agosto de 2013

Iniciam-se as obras da construção do sistema de drenagem de águas pluviais e zona pedonal da rua Vale S. Pedro.

Agosto de 2013

Iniciam-se as obras da construção do refeitório da Escola EB1 de Souselas.

Agosto de 2013

É reformulada e colocada sinalética em toda a Freguesia.

Setembro 2013

Inicia-se na Freguesia a construção de lombas e passadeiras sobreelevadas.

É assinado o acordo de cooperação/cedência de instalações entre a Junta de Freguesia de Souselas e Administração Regional de Saúde 3 de Setembro 2013 do Centro, com a presença do Sr. Secretário de Estado da Saúde e o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, para as obras de ampliação da Extensão de Saúde.

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«Souzellas, um dos melhores logares do rico Concelho de Coimbra, a distancia pela medida velha, legua e meia para norte, antiga estrada para Vizeu, occupa um terrapleno nas faldas das serras de Ilhastro e S. Valentim, que com outros a figuram uma caldeira. É banhada com dois rios, de Botão e Remungão, que reunem ao fundo do logar e correm aos Fornos, campo e Mondego: com elles se regam todas as terras do logar, as quaes se andassem bem policiadas, podiam regar-se tres vezes. É mui saudavel, tanto que ha dez ou doze annos contavam-se aqui dez homens ou mais, octogenarios; tres lentes da Universidade e oito bachareis formados. É muito productiva; vegetam aqui bem toda a especie de arvores. Da toda a qualidade de fructos mostra-nos muitas arvores de fructo, de que existem dos velhos, porque nos novos há muito indolencia. (…) São tres os fructos dominantes da terra, milho, vinho e azeite, de que annos regulares tem sobras que leva aos mercados de Coimbra, Mealhada e mais partes. Milho em annos abundantes tem para seu custeio, e exportará para cem moios, egual numero de pipas de vinho, e não menos de azeite». [Jerónimo José Baptista Lopes Parente - «Agricultor» In O Conimbricense, 20 Agosto 1872, P. 4]

A

Freguesia de Souselas – um povo com História

APRESENTAÇÃO DA FREGUESIA Freguesia de Souselas localiza-se a 10 Km de Coimbra e compreende as seguintes delimitações: a Norte com a freguesia da Pampilhosa (concelho da Mealhada); a Nordeste com Botão, a Este com Figueira de Lorvão (concelho de Penacova), Sudeste com Brasfemes e a Sudoeste com as de Torre de Vilela e Trouxemil. A freguesia compõe-se dos seguintes lugares: Souselas (fotos 1, 2 e 3), Marmeleira (foto 4), Zouparria do Monte (foto 5), São Martinho do Pinheiro (foto 6), Pisão dos Canaviais (fotos 7 e 8), Lagares (foto 9), Sargento-Mor (apenas metade da povoação, sendo o limite a Estrada Nacional n.º 1 Lisboa-Porto), Ribeiro de Souselas (foto 10), Junqueira e parte de Santa Luzia (foto 11). A área da freguesia compreende 15,74 km2 nela residindo 3092 habitantes (INE). Dispõe de boas vias de comunicação. Em termos rodoviários liga-se a Coimbra pela Estrada Nacional Nº 336, pelo IP3 e IC2 (foto 12). A partir daqueles itinerários rapidamente se chega à A1 e à A14 (Coimbra-Figueira da Foz). Em termos ferroviários é servida pela linha ferroviária do Norte, e pela linha que dá acesso à Beira Alta e Figueira da Foz-via Pampilhosa. Continua a produzir os alimentos que caracterizaram a economia da freguesia ao longo dos séculos: vinho (insere-se na Região Demarcada de Vinho da Bairrada), milho, azeite (embora os seus lagares e azenhas estejam hoje desactivados), cultura de sequeiro nas zonas mais altas e de regadio nas zonas baixas. A decisão para a criação de símbolos heráldicos da freguesia foi tomada na reunião do executivo datada de 7 de Fevereiro de 1995: «…tendo em conta que a Junta de Freguesia de Souselas ainda não possui o seu símbolo, um seu estandarte ou uma sua bandeira, o executivo deliberou que se mandasse oficializar o referido símbolo, através da Comissão de Heráldica - Associação dos Arqueólogos Portugueses, entidade que tratará da legalização do “Brasão” de Souselas que nunca existiu»(2). A elevação a Vila obrigou a nova ordenação heráldica do Brasão e da Bandeira, que foram publicados em Diário da República de 14 de Setembro de 1998 (Nº 212, III Série, p. 19.251): «Brasão - escudo de alvenaria de prata, lavrada de negro, com uma cruz da Ordem de Santiago de vermelho, em chefe. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco, com a legenda a negro: “VILA DE SOUSELAS”. Bandeira – esquartelada de vermelho e branco. Cordão e borlas de prata e vermelho. Haste e lança de ouro».

(2)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 2

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HERÁLDICA DA FREGUESIA DE SOUSELAS

LIMITES ADMINISTRATIVOS DA FREGUESIA DE SOUSELAS

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I O MEIO FÍSICO E A PAISAGEM

A

1. Paisagem Freguesia de Souselas é atravessada por duas das principais unidades morfo-estruturais de Portugal, a Orla Meso- Cenozóica, de origem sedimentar, onde a maior da parte da Freguesia se situa, com domínio dos calcários e alguns arenitos, e o Maciço Antigo ou Hespérico, do complexo xistograuvático, com ocorrência de xistos (a partir do Ladeirão, de Lagares até ao Pisão dos Canaviais). A paisagem da Freguesia é marcada por serras, planaltos e vales. Os maciços calcários de Souselas são constituídos pelas Serras do Alhastro (ou Ilhastro) e Brasfemes e, ainda, por planaltos, colinas, montes de menor expressão: o Cabeço da Azenha, Cabeço das Almoinhas e o Cabeço dos Moinhos (todos em Souselas); e Alto da Ladeira, na Marmeleira, e Alto de Sargento-mor e Santa Luzia. A altimetria varia das classes de 6-20mt e 20-50mt na parte central da Freguesia, acompanhando o vale do rio dos Fornos. As áreas adjacentes ao rio Resmungão, ribeira do Botão e ribeira de S. Martinho do Pinheiro estão compreendidas na classe de 50-100mt. As zonas mais baixas situam-se em Souselas, com altimetria abaixo dos 28 mt, na Azenha, Ponte de Frades, Carrizes, Matoito e na planície aluvial do Rio Resmungão, Ribeiro de Botão e Rio dos Fornos: As zonas mais altas da Freguesia situam-se na classe de 100-200mt. A zona mais alta localiza-se na parte oriental, entre Lagares e Pisão dos Canaviais, seguindo-se a Serra de Brasfemes e o Alto de Santa Luzia. Os pontos mais altos da Freguesia são a Serra do Alhastro e Serra de Brasfemes (148 mt de altitude), o Alto da Ladeira (151 mt de altitude), Santa Luzia (142 mt de altitude), e a Esculca (166 mt de altitude). O mais alto de todos é, porém, o Alto da Junqueira (204 mt de altitude). Os declives menos acentuados situam-se na classe de 0-2,5%, junto á rede hidrográfica. Os declives vão aumentando para Ocidente (Sargento-Mor), para Norte (Santa Luzia e Alto da Ladeira, na Marmeleira) e para Este com as Serra da Brasfemes e Alhastro, podendo ser superiores a 25% na parte oriental, a partir de Lagares até ao Pisão dos Canaviais e no Alto da Junqueira. A paisagem tem um carácter marcadamente mediterrânico, constituída por espécies vegetais de características mediterrânicas (foto 14), povoada por espécies vegetais de folha persistente e por extensos olivais e vinhedos. A parte 37

Freguesia de Souselas – um povo com História

central da freguesia é formada pelo vale que resultou da acção conjunta do rio Resmungão e ribeiro do Botão, com menor contributo da ribeira de S. Martinho. As áreas florestais localizam-se no quadrante Noroeste e a Este da Freguesia, com domínio do pinhal e eucaliptal. A freguesia possui vários leitores de paisagem ou miradouros, que permitem uma leitura do território num raio de vários quilómetros, abrangendo os concelhos de Penacova e Mealhada. Na Freguesia acaba o Concelho e Distrito de Coimbra e começa o Concelho e Distrito de Aveiro, com localidades divididas, caso de Sargento-mor e Santa Luzia. Pela Freguesia de Souselas passa o limite Sul da Bairrada. Do alto de Sargento-Mor (foto 13) tem-se uma panorâmica sobre a restante Freguesia e o Maciço Hespérico, enquadrado pelas Serras do Roxo e Aveleira, a Oriente. Do Cabeço dos Moinhos, na Marmeleira, tem-se perspectiva para Sul compreendendo Souselas, Serras de Brasfemes e Alhastro, o vale dos Fornos, a freguesia de Torre de Vilela e de Trouxemil, o alto de Logo Deus e, ao longe, a Cidade de Coimbra. Para Este a Freguesia de Botão, o Maciço Hespérico e algumas localidades do Concelho de Penacova, a Mata do Maxial. Voltados para Norte, as terras da Bairrada e a Serra do Buçaco, talvez o miradouro mais bonito da Freguesia. O alto da Serra de Brasfemes é o miradouro mais completo, donde se avista para Sul, todo o vale dos Fornos até aos campos do Bolão, a Ocidente as terras da Gândara, a Norte a Bairrada e o Buçaco, a Este o Maciço Hespérico. A freguesia possui quatro Marcos Geodésicos, sinais que indicam uma posição cartográfica exacta. Estão localizados: na Serra de Brasfemes (148 mt de altitude); Esculca (166 mt de altitude); Cabeço dos Moinhos (105 mt); Zouparria do Monte (76 mt).

2. Geologia Os maciços calcários de Souselas estabelecem os limites Norte do BaixoMondego, guardando a transição para a Gândara e para a Bairrada. Em frente ao Maciço Hespérico fica o espaço morfotectónico de Souselas, de origem sedimentar, com “chão” Margo-calcário. Mais a Ocidente estão as colinas essencialmente arenosas de Sargento-Mór e da Marmeleira, dominadas pelo ressalto da Plataforma de Santa Luzia-Barcouço. De facto, a Norte do Mondego, as macroformas de relevo calco-dolomítico perdem expressão em favor das formas litológicas, essencialmente magro-calcárias guiadas por falhamentos, que deram origem ao desenvolvimento NE-SW do Logo Deus e das Serras de Brasfemes e Alhastro. As formas líticas dominantes são os calcários margosos e margas. As cascalheiras vermelhas e areias vermelhas ocorrem essencialmente na Marmeleira e 38

I – O Meio Físico e a Paisagem

nos depósitos de Santa Luzia. Ocorrendo, também, na Marmeleira, arenitos grosseiros ou esbranquiçados. No passado, a Marmeleira teve exploração de areias vermelhas e areias brancas. A exploração destinava-se à indústria cerâmica, nomeadamente no Pó e na Ladeira da Marmeleira (areias vermelhas e areias brancas) e na Carocha (areias brancas). No Alto da Ladeira explorou-se saibro, nas antigas saibreiras pertença da Junta de Freguesia. A fábrica Lufapo teve explorações de minério, em mina e a céu aberto, na Marmeleira, tal era a riqueza existente. Devido à evolução dos rios e dinâmica fluvial, em Souselas e no Ribeiro, nas zonas baixas, ocorrem depósitos arenosos conglomeráticos e depósitos aluvionares, podendo atingir 5 mt no rio dos Fornos, no Ribeiro de Souselas (Ponte Pedrinha). Na Zouparria do Monte e S. Martinho do Pinheiro, ocorrem depósitos coloviais e de vertente, resultantes do transporte hídrico ou de menor expressão resultante de movimentos de acção da gravidade e erosão hídrica. As Serras do Alhastro e de Brasfemes são constituídas por formas litológicas margo-calcárias e calcárias. Devido à sua natureza calcária são frequentes as ocorrências de diversas formas de morfologia cársica, nomeadamente exsurgências que trazem à superfície as águas subterrâneas e dão origem a regatos de água que descem os desfiladeiros. As grutas (ex: Buraco da Moura) são outra forma cársica presente, que servem de abrigo a algumas espécies de morcegos, os quais saem aos primeiros sinais do crepúsculo para se lançarem na busca de insectos. Os “valeiros” fazem parte do léxico local. Estes barrancos são formas de ravinamentos característicos das unidades líticas margo-calcárias e calcários que estão associados à erosão hídrica. Na zona das Cambalhas e Cabeço dos Moinhos, Marmeleira, ocorrem calcários margosos e margas. Os calcários margosos e margas apresentam tons que variam do acinzentado, azulados ou amarelados. Neste meio calcário muitas formas fósseis ocorrem, sendo muito comuns as amonites. Os calcários de Souselas incorporam testemunhos da História Natural da Terra, através de um enorme legado de fósseis, muitos do período do Jurássico, contemporâneos dos dinossauros, que representam a profusão e diversidade do mundo vivo ao longo de milhões de anos e que atribuem a esta zona um elevado valor científico, devido à sua diversidade paleoecológica. Os grupos de invertebrados são comuns, nomeadamente, os gastrópodes, bivalves e cefalópodes. Em síntese o esboço geológico caracteriza-se pelo conjunto de unidades mesozóicas e cenozóicas, nomeadamente o subconjunto de unidades do Pliocénico Superior/Quaternário, junto às linhas de água e em Santa Luzia e Marmeleira. Pelo subconjunto de unidades do Cretácio/Paleogénico, com arenitos esbranquiçados a rosados e pelitos vermelhos (Marmeleira). As areias finas micáceas e arcosarenitos submaturos e imaturos, calcários gresosos e grés 39

Freguesia de Souselas – um povo com História

margosos conzentos fossilíferos e conglomerados arcosarenitos, distribuem-se por Sargento-Mor, S. Martinho do Pinheiro e Marmeleira. O subconjunto de unidades do Sinemuriano/Dogger é de maior representatividade no território da freguesia, distribuindo-se pela parte central desde o Ribeiro, Azenha, Souselas, Zouparria do Monte, parte de S. Martinho do Pinheiro e Marmeleira, com calcários margosos e margas (a unidade de maior distribuição). Mais para Este e adjacente a esta unidade temos dolinas e calcários. Segue-se, para Este, a partir das Serras de Brasfemes e Alhastro, o subconjunto de unidades do Triássico/Hetangiano, com pelitos cinzentos e dolinas impuras e conglomerados, arenitos e pelitos vermelhos a esbranquiçados: Lagares, Junqueira e Vale Forno. Na parte oriental da Freguesia, a partir de Lagares até ao Pisão dos Canaviais, ocorre o conjunto de unidades ante-mesozóicas, com a unidade xisto-grauvacóide. A litologia caracteriza-se por uma diversidade de unidades litológicas, quase sempre com uma disposição segundo o eixo norte-sul. As unidades arenosa e areno-argilosa, unidades carbonatada concrecionada e unidade arenosa grosseira clara, situam-se na parte ocidental da freguesia: Sargento Mór, Santa Luzia, Marmeleira. A parte central da Freguesia é preenchida pela unidade calco-margosa e margosa, segundo o eixo Ribeiro-Souselas-Marmeleira. Os depósitos aluvionares e coluvionares e de vertente ocorrem associados à rede hidrográfica, ocorrem também, com menor expressão, depósitos superficiais areno-conglomeráticos e depósitos superficiais cascalhentos. As Serras de Brasfemes e do Alhastro são constituídas por unidades calcareníticos e calcilutíticas – calcários e calcários margosos. Na parte oriental da freguesia, a montante das serras do Alhastro e Brasfemes, segundo o eixo norte-sul, e de Ocidente para Oriente, ocorrem unidades areno-argilosas e calco-dolomíticas e calco-margosas – arenitos, pelitos e dolomias., representadas na Junqueira e entrada de Lagares, seguindo-se as unidades conglomeráticas, arenosas e pelíticas do Triásico, em Lagares e na parte mais oriental da Freguesia, de Lagares ao Pisão dos Canaviais, as unidades metagrauvacóides, xisto-quartzosas e quartzíticas – xistos e filádeos.

3. Hidrologia 3.1. Recursos hídricos superficiais A Freguesia tem como principais linhas de água o Rio Resmungão e a Ribeira do Botão, que fazem parte da sub-bacia hidrográfica do Rio dos Fornos. A bacia hidrográfica do Rio dos Fornos situa-se a Norte da cidade de Coimbra, numa área suburbana em rápido crescimento, que engloba, entre outras, as 40

I – O Meio Físico e a Paisagem

povoações de Botão, Sazes de Lorvão, Figueira de Lorvão, Souselas, Vilela e Fornos (Pardal, J. & Ferreira, A., 2003). Sub-bacia Rio dos Fornos

Classif. Décimal

Rio dos Fornos Ribª de S. Martinho Ribª de Paço/Larçã Rio Resmungão

710 24 710 24 02 710 24 04 710 24 01

Área no Área Total Concelho (Km2) (Km2) 76 5,75 5,91 20.7

23,26 5,75 5,91 5,49

Representação Representação no Concelho Topográfica Total(T)/ no Concelho Parcial(P) EB*/EC** P EC T BR - EC T BR - EC P EC

EB – Bacia de recepção representada pela metade superior da sub-bacia hidrográfica *EC – Canal de escoamento e confluência com ordem superior, representados pela metade inferior da sub-bacia hidrográfica. * *

As cabeceiras da sub-bacia hidrográfica situam-se na extremidade Norte do Maciço Marginal de Coimbra, e na vertente ocidental da Serra do Bussaco. A sub-bacia desenvolve-se então em terrenos do complexo xisto-grauváquio, ultrapassa o afloramento de grés do triássico e a área de calcários margosos jurássicos, após os quais, entra no vale do Baixo Mondego a jusante de Coimbra (Tavares, A., 1999; Pardal, J. & Ferreira, A., 2003). A sub-bacia hidrográfica do Rio dos Fornos apresenta uma grande diversidade lítica de enquadramento, que tem um controlo estrutural na orientação da rede hidrográfica, nos perfis longitudinais de declive, bem como nos transversais com frequentes vertentes assimétricas (Tavares, A. 1999). O Rio dos Fornos (Ribeira do Botão) nasce na Serra do Buçaco, numa faixa que se estende desde um pouco a sul do Marco Geodésico do Buçaco até um pouco a Norte da Portela da Oliveira. O Rio Resmungão nasce em Figueira do Lorvão. É à saída de Souselas, nas “Encruzilhadas”, que o Rio Resmungão e a Ribeira de Botão formam um único curso de água, o Rio dos Fornos (foto 15), abrindo numa planície aluvial, atravessando o Ramalhão e a Ponte Pedrinha. O rio Resmungão e a Ribeira do Botão, apresentam, no seu ciclo hidrológico, características típicas dos rios mediterrânicos, caudais muito pequenos no estio, e muito grandes no Inverno, nomeadamente nos períodos de grande pluviosidade, podendo dar origem a cheias, por vezes destruidores, nas partes mais baixas da Vila de Souselas. O Rio Resmungão é a linha de água mais naturalizada, que menos alterações sofreu devido à acção do homem. Alguns dos troços do seu percurso são muito interessantes do ponto de vista paisagístico e natural, nomeadamente entre Lagares e Pisão dos Canaviais, onde corre selvagem, com queda de águas e açudes naturais, e às Fontes onde corre encaixado entre as Serras de Brasfemes e do Alhastro. 41

Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 1 - Souselas em meados dos anos 50, Séc. XX

Foto 2 - Souselas em meados dos anos 50, Séc. XX (em primeiro plano vê-se a fábrica CESOL)

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Foto 3 - Panorâmica de Souselas (Norte)

Foto 3A - Panorâmica de Souselas (Sul)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 4 - A Marmeleira vista do Cabeço dos Moinhos

Foto 5 - O lugar da Zouparria do Monte (pormenor)

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Foto 6 - Panorâmica de S.Martinho do Pinheiro

Foto 7 - Pisão dos Canaviais (meados dos anos 50) Foto 8 - Pisão dos Canaviais (na actualidade)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 9 - Vista da área de Lagares

Foto 10 - O lugar do Ribeiro de Souselas (pormenor)

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Foto 11 - Vista parcial de Santa Luzia

Foto 12 - Sargento-Mor, via rápida e cruzamento da IC2 (antiga EN1)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 13 - Souselas vista de Sargento-Mor

Foto 14 - Vegetação na Serra de Brasfemes na Primavera 2013

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Foto 15 - A encruzilhada do Rio Resmungão com a Ribeira de Botão, formando o Rio dos Fornos

Foto 16 - A diversidade da paisagem entre São Martinho do Pinheiro e a Marmeleira

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 17 - Matagal na Serra de Brasfemes, junto aos Moinhos

Foto 18 - Vinha no sítio dos Mouros - Marmeleira

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Foto 19 - A azáfama das vindimas

Foto 20 - A beleza dos vinhedos por altura das vindimas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 21 - Alminhas numa oliveira junto à Ladeira das Cruzes de Souselas (meados do Séc. XX)

Foto 22 - Um robusto olival na Marmeleira

Foto 23 - A apanha da azeitona, 2011

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I – O Meio Físico e a Paisagem

3.2. Recursos hídricos subterrâneos Localmente os recursos hídricos subterrâneos têm forte expressão, com várias captações de águas subterrâneas (minas, poços, furos e nascentes). Estas características relacionam-se com a recarga aquífera e o potencial hídrico existente no território da Freguesia. A Marmeleira é conhecida pela sua riqueza em água, nomeadamente a Fonte Velha, a Nascente dos Poços, a Mina do Goivo e a nascente do Alto da Ladeira, que abastece os fontanários. Em S. Martinho do Pinheiro hà que referir a Fonte da Loira (em Santa Luzia), que fornece água à localidade da Zouparria do Monte e a mina dos Baraçais que fornece água aos fontanários da localidade e no passado abastecia o chafariz de Souselas. A Fonte da Loira nasce em terrenos particulares, pertença da família Madeira. Segundo acordo antigo, é feita a divisão da água, junto ao Centro Cultural de S. Martinho do Pinheiro, ¼ para a família Madeira e ¾ para abastecer os fontenários e lavadouro da Zouparria do Monte, sendo as sobras cedidas a Manuel Maria Jacinto. Em Souselas, devido à proximidade da superfície e dimensão do aquífero, dominam as captações por poços e furos artesianos, com referência para o Poço da Lavadeira (que faz parte do imaginário histórico e etnográfico da localidade) e as nascentes das Fontes e da Bregolga, que possui água todo o ano, mesmo nos anos de maior seca.

4. Análise bioclimática e biogeográfica De acordo com as grandes divisões aceites em Biogeografia, o território continental Português situa-se no Reino Holoártico e a área de estudo encontra-se enquadrada na Região Mediterrânica, sub-região Mediterrânica Ocidental, Super-província Mediterrânico-Iberoatlântica, Província Luso-Extremadurense, Sector Beirense Litoral (Rivas-Martinez et al., 1987) e inclui-se no Piso Bioclimático Mesomediterrânico com um Ombroclima Sub-húmido. A região Mediterrânica apresenta um macroclima mediterrânico, clima fortemente influenciado por duas grandes massas continentais, a africana e a euro-asiática, sendo caracterizado, em termos gerais, pela ocorrência de longos estios, com temperaturas médias elevadas e grande secura atmosférica, por Invernos amenos, pouco chuvosos e, em ambas as estações, grande luminosidade atmosférica e forte insolação durante o Verão. Neste território, observam-se bosques e matagais de árvores e arbustos de folhas planas, pequenas, coriáceas e persistentes (esclerófilas). A província Luso Extremadurense é muito influenciada pelo Atlântico e com excepção das montanhas a precipitação aumenta em função da proximidade ao oceano. 53

Freguesia de Souselas – um povo com História

Na Região Mediterrânica, o ombroclima semi-árido termina com as hiper-séries de bosques de Pistacio lentisci-Rhamnetalia alaterni. À medida que a secura aumenta, aparecem os agrupamentos de Quercetalia ilicis. Nos ombroclimas sub-húmidos, húmidos e hiperhúmidos, segundo o piso bioclimático, estabelecem-se séries de vegetação de bosques caducifólios de Quercion broteroi, Arisarum-Quercion fagineae, Quercion robori-pyrenaicae. 4.1. Flora A freguesia caracteriza-se por grande diversidade de habitats, de flora e fauna. Recentemente um estudo realizado pelo Departamento Botânico da Universidade de Coimbra, num sector da Serra de Brasfemes e Valas, permitiu identificar cerca de 200 espécies de plantas para um universo potencial de 500 espécies nativas. O que confere à Freguesia uma elevada importância em termos de biodiversidade e conservação da natureza. No que respeita à FLORA e HABITATS, a freguesia caracteriza-se pela existência de um mosaico de habitats, constituídos por campos agricultados, com olival, vinha e culturas arvenses de sequeiro e campos agrícolas que configuram por vezes os habitats naturais, como é o caso das Valas, onde a vegetação arbórea é escassa e os campos de gramíneas e prados de orquídeas são comuns, bem como os tomilhais e alguns estevais. 4.1.1. A Natureza Mediterrânica Floresta Primitiva Na zona oriental da Freguesia (Lagares e Pisão dos Canaviais) e ocidental (S. Martinho do Pinheiro, Marmeleira e Santa Luzia), o coberto vegetal é constituído, essencialmente, por povoamentos mistos de pinhal e eucaliptal (foto 16). Contudo, na Marmeleira, no Pisão e na Junqueira, ainda ocorrem resquícios do que seria o primitivo coberto vegetal natural, a floresta de Quercíneas (Quercus ssp.), vulgarmente designados por carvalhos, que constituem uma relíquia dos carvalhais primevos, com dominância do carvalho-cerquinho ou português (Quercus faginea subsp. broteroi), para além do carvalho-alvarinho (Quercus robur), do carrasco (Quercus coccifera), do sobreiro (Quercus suber), também referir a carvalhiça (Quercus lusitanica). Os carvalhais presentes incluem-se de forma perfeita na transição biogeográfica e climática da região, aparecendo espécies perenifólias como o sobreiro (Quercus suber), marcescentes como o carvalho-cerquinho (Quercus faginea subsp. broteroi), e caducifólias como o carvalho-alvarinho (Quercus robur). Nestas formações surgem folhosas, nos pontos mais húmidos, como 54

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o castanheiro (Castanea sativa) e a aveleira (Corylus avellana). Nas zonas mais secas ocorre a azinheira (Quercus rotundifolia). O azevinho (Ilex aquifolium L.), também ocorre em alguns locais. O Carvalho-português, ou cerquinho (Quercus faginea subsp. broteroi), merece destaque por se tratar de uma relíquia da nossa floresta natural, que no passado terá recoberto parte da região centro. Ocorre predominantemente em bosques e pré-bosques mesofíticos ou hidrofíticos, quase sempre caducifólios. Trata-se de uma espécie espontânea em Portugal, ocorrendo da Beira-Litoral ao Algarve, sobretudo em terrenos calcários e meios ripícolas. Distinguem-se dos outros por terem folhagem tipicamente marcescente, passando pouco tempo sem folhas, por estas serem tardiamente caducas. A “Mata da Candinha” é constituída por uma relíquia da nossa flora o loureiro (Laurus nobilis), planta de folhas verdes, lanceoladas, coriáceas e aromáticas. Antes das glaciações o clima era subtropical húmido e o território português estava coberto por florestas de lenhosas sempre verdes (folha persistente) Laurissilva, da qual fazia parte o loureiro (também designada por floresta de Loureiros, entre outras plantas. 4.1.2. Serra de Brasfemes e do Alhastro As Serra de Brasfemes e do Alhastro são, talvez, a principal área para a conservação da natureza da Freguesia, actualmente objecto de estudo pela Universidade de Coimbra, Departamento Botânico (foto 17). As suas encostas são dominadas pelas estevas (Cistus spp.) e pelos zambujeiros (Olea europaea var. sylvestris), variedade selvagem da oliveira. No planalto da Serra de Brasfemes e no alto do Monte das Almoinhas dominam as madressilvas (Lonicera sp.) e os pilriteiros (Crataegus monogyna), arbusto que na Primavera se cobre do branco das suas flores, que mais tarde se transformam em bagas vermelhas. Apesar do aspecto agreste e despido das vertentes dos maciços calcários, estes possuem uma flora particular, que se agrupa em função dos teores de humidade, da exposição solar e dos ventos. O seu coberto vegetal é constituído por mais de duas centenas de espécies de plantas, muitas delas aromáticas, como a aroeira (Pistacia lentiscus), o aderno (Phillyrea latifolia) a rosa-brava (Rosa sempervirens), a murta (Myrtus communis), o funcho (Foeniculum vulgare), o aderno (Phillyrea latifolia), a rosa-albardeira (Paeonia broteroi), a salva-bastarda (Salvia sclareoides) e os orégãos (Origanum virens). Também ocorre boca-de-lobo (Antirrhinum majus), rosa-albardeira (Paeonia broteroi), erva-de-são-roberto (Geranium robertianum). A Primavera é o período mais interessante; o ar perfumado pelo alecrim (Rosmarinus officinalis), rosmaninho (Lavandula luisieri) e pelos tomilhos (Thymus spp.). No chão, forma-se um tapete primaveril multicolorido com as 55

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orquídeas: satirão-menor (Anacamptis pyramidalis), rapazinhos (Aceras anthropophorum), erva-abelha (Ophrys apifera), erva-língua (Serapias lingua), erva-vespa (Ophrys lutea), serapião-de-língua-pequena (Serapias parviflora), Ophrys picta, entre outras. O amarelo das campainhas (Narcissus bulbocodium), o cor-de-rosa do alho-rosado (Allium roseum) e o vermelho da espadana-dos-montes (Gladiolus illyricus) completam o colorido. As orquídeas existem na Terra há 15 milhões de anos e são consideradas as plantas mais evoluídas. O taxa das Orquídeas está bem representado no “chão” calcário da freguesia, tendo sido já identificadas mais de duas dezenas de espécies das 53 existentes em Portugal Continental, o que confere à zona um elevado valor conservacionista. As estevas cistáceas mais comuns são: sargaço-mouro (Cistus salvifolius) e a roselha (Cistus crispus), roselha-grande (Cistus albidus), sanganho (Cistus psilosepalus). Também ocorrem alguns espécimes do género Halimium sp.. As Monocotiledóneas mais comuns são o panasco-de-folhas-estreitas (Dactylis glomerata), bolo-bole-maior (Briza máxima), erva-lanar (Holcus lanatus), Brachypodium spp, Bromus spp., Poa spp., Arrhenatherum spp.. As comunidades de plantas que têm como nicho os muros velhos e fendas de rochas também se fazem representar nas zonas mais húmidas das serras e entre as pedras das escombreiras das antigas pedreiras da Serra de Brasfemes e do Alhastro, nomeadamente as hepáticas e as pteridófitas, como a selaginela (Selaginella denticulata), a língua-cervina (Phyllitis scolopendrium) e o polipódio (Polypodium australe), fetos do género Asplenium, e as Briófitas, mais conhecidos por musgos, que por alturas do Natal formam autênticos mantos. Na Freguesia ocorrem alguns matagais de influência mediterrânica, que apresentam porte sub-arbóreo e são constituídos por pequenos bosquetes com lentisco-bastardo (Phillyrea angustifolia), medronheiro (Arbutus unedo) e folhado (Viburnum tinus subsp. tinus), e onde o loureiro (Laurus nobilis) se associa à pervinca (Vinca difformis subsp. difformis). Espécies de crescimento muito lento, frequentes nos matagais altos e brenhas, também estão presentes, como a urze-branca (Erica arborea), o sanguinho-das-sebes (Rhamnus alaternus), a murta (Myrtus communis) – muito comum em terras de s. martinho, Carrimá, a aroeira (Pistacia lentiscus), o zambujeiro (OIea europaea var. Sylvestris). O estrato herbáceo tem espécies como o cólquico (Colchicum autumnale) e o jarro (Arum italicum). No estrato arbustivo é de assinalar a presença da gilbardeira (Ruscus aculeatus) e dos espargos-bravos (Asparagus spp.) e as lianas como a hera (Hedera helix subsp. canariensis), que trepam arbustos e árvores, a alegação (Smilax aspera var. aspera), madressilvas (Lonicera spp.), silvas (Rubus spp.) e roseiras (Rosa spp.). Abundantes primaveras (Primula acaulis subsp. acaulis), três-passarinhos ou esporas-bravas (Linaria triornithophora), bem-me-quer (Leucanthemum 56

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sylvaticum) e espécimes bem desenvolvidos de selo-de-salomão (Polygonatum odoratum), campânula-azul (Ipomoea indica), o dente-de-leão (Taraxacum sp.) e a ervilhaca-trepadora (Vicia sativa). A freguesia também é rica em plantas de características medicinais, nomeadamente, o poejo (Mentha pulegium), o sabugueiro-negro (Sambucus nigra), a erva-bicha (Aristolochia paucinervis), o hipericão (Hypericum perforatum), os orégãos (Origanum virens), entre outras. No passado eram apanhadas nas serras de Brasfemes e Alhastro, para serem enviadas, por comboio, para a Suíça. O Medronheiro (Arbutus unedo) é uma árvore de folha persistentes e de pequeno porte, podendo excepcionalmente atingir os 12 m de altura. A cor das flores varia entre o branco e o cor-de-rosa, ocorrem no Outono em simultâneo com os frutos resultantes da floração do ano anterior. O fruto é uma baga globulosa, de cor avermelhada, e no passado, para além de servir na alimentação da população local, por fermentação seguida de destilação, era utilizado na produção de aguardente de medronheiro. As folhas e as cascas também eram utilizadas na medicina popular, para combater diarreias e disenteria. 4.1.3. As Zonas Ribeirinhas O Vale do Resmungão, a partir de Lagares até ao Pisão, é indiscutivelmente um dos locais de maior beleza paisagística. O rio Resmungão apresenta uma peculiar diversidade de biótopos, de grande importância do ponto de vista ecológico, albergando diferentes comunidades de animais e de plantas. Possui uma estrutura da galeria ripicola bem definida, constituída por extraordinários exemplares de vegetação ribeirinha, como: amieiros (Alnus glutinosa), salgueiros (Salix spp.), sabugueiros (Sambucus nigra), amieiro-negro (Frangula alnus), choupo-negro (Populus nigra), choupo branco (Populus alba), ulmeiro (Ulmus minor), freixo (Fraxinus angustifolia). Só a partir do Ramalhão até à Ponte Pedrinha, ao longo das margens do rio dos Fornos, volta a ocorrer vegetação climácia ribeirinha. Nas zonas húmidas, junto às linhas de água e ao longo destas, ocorrem espécies de plantas hidrófitas como: caniço (Phragmites australis), canavieira (Arundo donax), bunho (Scirpus lacustris subsp. lacustris), tabuas (Typha latifolia). A vegetação ripícola herbácea é constituída pelas seguintes espécies: juncos (Juncus sp.), junças (Cyperus sp.), gatunha (Ononis spinosa), agrião (Rorippa nasturtium-aquaticum), a salgueirinha (Lythrum salicaria), pervinca (Vinca difformis), erva-hemorroidal (Ranunculus ficaria), ranúnculo-aquático (Ranunculus peltatus), Ranunculus hederaceus, Ranunculus repens, salgueirinha (Lythrum salicaria), lírio-amarelo-dos-pântanos (Iris pseudacorus). Neste habitat também ocorrem plantas trepadeiras: a alegação (Smilax aspera) e a hera (Hedera maderensis subsp. iberica). Nos pequenos lagos desenvolvem-se plantas aquáticas como o golfão-branco (Nymphaea alba) e golfão-amarelo (Nuphar luteum). 57

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Na localidade do Pisão dos Canaviais uma das imagens de marca é o extenso canavial, de canas-da-índia junto ao rio Resmungão. Habitats de charcos e lagoachos temporários: são biótopos que se encontram sazonalmente cobertos com água e temporariamente sem água de cobertura, embora em geral mantenham humidade edáfica considerável, sendo a vegetação dominante Ranunculus spp., Hypericum spp., Juncus spp., Cyperus spp., algumas espécies dos Géneros Carex, Paspalum e Cerastium, bem como a hortelã-da-água (Mentha aquatica). 4.1.4. Povoamentos Mistos de Pinheiro e Eucalipto A parte Norte (S. Martinho, Marmeleira e Santa Luzia) e Oriental (Junqueira, Lagares e Pisão dos Canaviais) da Freguesia são constituídas por massas florestais mono-específicas e contínuas, de pinhal e eucaliptal. O Pinhal: constituído por povoamentos puros de pinheiro-bravo (Pinus pinaster), por vezes com um ou outro pinheiro-manso (Pinus pinea), ou em alguns casos por povoamentos mistos, com esparsos carvalhos (Quercus spp.), elementos vestigiais da primitiva ocupação natural da área, que se incluem de forma perfeita na transição biogeográfica e climática da região, aparecendo espécies perenifólias como o sobreiro (Quercus suber), marcescentes como o carvalho-cerquinho (Quercus faginea Lam. ssp. broteroi (Coutinho) A. Camus) e caducifólias como o carvalho-alvarinho (Quercus robur). Em alguns pinhais ocorre a carvalhiça (Quercus lusitanica). Também ocorrem alguns exemplares de plantas de folha persistente como o sanguinho-das-sebes (Rhamnus alaternos) e o medronheiro (Arbutus unedo). Um dos aspectos marcantes da vegetação do pinhal são as comunidades arbustivas e subarbustivas, vulgarmente designadas por matos. Os matos são constituídos pelo vulgar tojo-gadanho (Genista triacanthos), por urzes xéricas, a urze-branca (Erica arborea), a queiró (Erica cinerea), a urze-das-vassouras (Erica scoparia), a comum queiroga (Erica umbellata), e os tojos: tojo-arnal (Ulex europaeus) e tojo-molar (Ulex minor). Também ocorre a carqueja (Pterospartum tridentatum). O feto-ordinário (Pteridium aquilinum) é a Pteridófita mais comum e ocorre em todos os pinhais, sendo que também são ricos em cogumelos, localmente designados por míscaros, que ocorrem no Outono e Inverno. A Simethis mattiazzi é uma planta comum, assim como o morrião (Anagallis arvensis) e o morrião-de-folhas-largas (Anagallis monelli). A abrótea (Asphodelus aestivus) ocorre nos bordos dos pinhais e junto aos caminhos, nomeadamente no verão. O Eucaliptal: as áreas de eucaliptal são compostas principalmente por eucalipto (Eucalyptus globulus) e de fraca fitodiversidade, sendo o estrato arbustivo constituído por espécies de tojos (Ulex spp.), urzes (Erica spp.) e algumas estevas 58

I – O Meio Físico e a Paisagem

(Cistus spp.). O estrato herbáceo é pobre e resume-se a espécimes da Família Poaceae, pertencentes aos Géneros Bromus spp., Brachypodium spp., Lolium spp., Poa spp., Paspalum spp. e Arrhenatherum spp.. 4.1.5. Algumas espécies da flora com interesse conservacionista Ocorrem na freguesia vários habitats e espécies de plantas e animais com estatutos de protecção, nomeadamente constantes na Directiva Habitats – (Directiva 92/43/CEE do Conselho de 21 de Maio), transposta para o direito português através do Decreto-Lei nº 140/99, de 24 de Abril, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 49/2005, de 24 de Fevereiro). Na Freguesia, nomeadamente no “chão calcário”, ocorrem formações herbáceas secas seminaturais e fáceis arbustivas, onde se destacam os seguintes habitats: • Habitat 6210* – Prados secos semi-naturais e fácies arbustivas em substrato calcário, importantes habitats de orquídeas; • Habitat 6220* – subestepes de gramíneas e anuais da Thero-Brachypodietea. Ambos são considerados prioritários pela Directiva Habitats. • Os Matos esclerófitos com o Habitat 5330 - Matos termomediterrânicos pré-desérticos. Subtipo - Matos baixos de calcários .Subtipo – Carrascal; • As Florestas mediterrânicas caducifólias com o Habitat 9240 – Carvalhais ibéricos de Quercus faginea e Quercus canariensis; • As Florestas esclerófitas mediterrânicas com Habitat 9340 – Florestas de Quercus ilex e Quercus rotundifolia As formas mais comuns são as de mosaico, nomeadamente o Habitat 6210* - Prados secos semi-naturais e fácies arbustivas em substrato calcário, importantes habitats de orquídeas, Habitat 6220* - Subestepes de gramíneas e anuais da Thero-Brachypodietea, Habitat 5330 - Matos termomediterrânicos pré-desérticos, Subtipo - Matos baixos de calcários. Dominam, por isso, os prados de orquídeas e o tomilhal, nomeadamente na zona das valas, Lambaro e Serra de Brasfemes, com campos agrícolas, sequeiro, olival e vinha. 4.1.6. Espécies RELAPE (espécies Raras, Endémicas, Localizadas, Ameaçadas ou em Perigo de Extinção) e/ou constantes da Directiva Habitats ou com algum estatuto de protecção Na Freguesia ocorre vegetação endémica lusitânica, nomeadamente endemismos lusitânicos: o rosmaninho (Lavandula luisieri), a bocas-de-lobo (Antirrhinum majus subsp. Linkianum (Boiss. & Reut.) Rothm.), o abrunheiro-bravo (Prunus spinosa), endemismo de Portugal Continental, a orquídea Ophrys 59

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tenthrendinifera Willd. subsp. guimaraesii D. Tyteca, a Silene longicillia (Brot.) Orrth., a Scrophularia grandiflora DC. subsp. grandiflora. Endemismos ibéricos com valorconservcacionista: Arenaria conimbricensis Brot. subsp. Conimbricensis; Quercus broteroi (Coutinho) Rivas-Martínez, Ranunculus gregarius Brot.; Ophrys vernixia, norça-preta (Tamus communis). A Ophrys tenthrendinifera Willd. subsp. guimaraesii D. Tyteca é uma orquídea com estatuto de ameaça, que é considerada como rara, ocorre na Serra de Brasfemes Três espécies de plantas, a Silene longicillia (Brot.) Orrth, a gilbardeira (Ruscus aculeatus) e a Scrophularia grandiflora DC. subsp. grandiflora, são constantes da Directiva Habitats - (Directiva 92/43/CEE do Conselho de 21 de Maio), transposta para o direito português através do Decreto-Lei nº 140/99, de 24 de Abril, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 49/2005, de 24 de Fevereiro. As azinheiras (Quercus rotundifolia) e os sobreiros (Quercus suber) são espécies protegidas pela legislação nacional, Decreto-Lei n.º 169/2001, de 25 de Maio. O Decreto-Lei n.° 423/89 de 4 de Dezembro estabelece o Regime de protecção do azevinho espontâneo proibido, em todo o território do continente, o arranque, o corte total ou parcial, o transporte e a venda do azevinho espontâneo Ilex aquifolium L., também conhecido por pica-folha, visqueiro ou zebro. 4.2. Fauna A fauna é muito diversificada, pois a freguesia é rica em habitats e biótopos, naturais e seminaturais, distintos: florestas de pinheiro, bosques de carvalhos, matagais mediterrânicos, charnecas, zonas ribeirinhas, vinhas, olivais, e campos agricultados (milheirais, campos de cereais, entre outros). Muitos são os locais para alimentação, reprodução e refúgio. A riqueza da flora local, nomeadamente grande número de plantas e arbustos nativos, fornecem inúmeras bagas para alimentação das aves. Zonas como o Vale da Azenha, Ramalhão até à Ponte Pedrinha, o Vale do Resmungão, desde as Fontes, Lagares, Rejauga até ao Pisão dos Canaviais, Junqueira e serra da Brasfemes, são verdadeiros santuários para a fauna. 4.2.1. A avifauna Na avifauna o grupo dos passeriformes é o mais representativo em todo o território da Freguesia seguindo-se as aves de rapina. O olival é um dos elementos mais marcantes da paisagem, e, para além do papel que representa na economia das populações locais, tem, também, um papel importante na conservação da natureza enquanto zona de abrigo, 60

I – O Meio Físico e a Paisagem

alimentação e nidificação de muitas espécies de aves, sejam sedentárias, estivais, invernantes ou de passagem. Entre os passeriformes é possível observar o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), o verdilhão (Carduelis chloris), o tentilhão (Fringilla coelebs) e os chapins (Parus spp.) serino, sereno ou chamarizes (Serinus serinus), o pintassilgo (Carduelis carduelis) ocorre com menos frequência, o melro (Turdus merula), o pardal-doméstico (Passer domesticus), o pardal-montês (Passer montanus), a trepadeira-comum (Certhia brachydactyla), a alvéola-branca (Motacilla alba), a carriça (Troglodytes troglodytes). As tocas das árvores mais antigas servem de “casa” à poupa (Upupa epops). Nos pontos mais altos das árvores e dos arbustos das Valas, Lambaro, Cambalhas e Regueira Saias, é frequente observar o picanço-barreteiro (Lanius senator) e o picanço-real (Lanius meridionalis). Já o cartaxo-comum (Saxicola torquata) prefere empoleirar-se no alto das varas das videiras, para daí lançar os trinados do seu canto. Relativamente às aves, o grupo dos Passeriformes, especialmente as espécies, que mantêm uma estreita associação com os bosques de carvalhal, linhas de água, vegetação ripícola e zonas com estrato arbustivo bem desenvolvido está bem representado por espécies como a carriça (Troglodytes troglodytes), o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), o rabirruivo-preto (Phoenicurus ochruros), o chapim-azul (Parus caeruleus), o chapim-real (Parus major), o chapim-preto (Parus ater), o chapim-rabilongo (Aegithalus caudatus), o tentilhão (Fringilla coelebs), o verdilhão (Carduelis chloris), o pintassilgo (Carduelis carduelis), o pintarroxo-comum (Carduelis cannabina), a trepadeira-azul (Sitta europaea), a toutinegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala), o serino (Serinus serinus), a alvéola-branca (Motacilla alba), a alvéola-amarela (Motacilla flava) e o melro (Turdus merula). As aves ribeirinhas presentes são: o guarda-rios (Alcedo atthis), o chapim-rabilongo (Aegithalus caudatus), o rouxinol-bravo (Cettia cetti), a felosa-dos-juncos (Acrocephalus schoenohaenus), o rouxinol-pequeno-dos-caniços (Acrocephalus scirpaceus), o rouxinol-grande-dos-caniços (Acrocephalus arundinaceos), a escrevedeira-dos-caniços (Emberiza shoeniclus), a invernante estrelinha-de-cabeça-listrada (Regulus ignicapillus), e o raro pisco-de-peito-azul (Luscinia svecica), invernante de passagem. Nas áreas mais baixas, vale das Fontes, junto ao Rio Resmungão, e vale da Azenha e Ramalhão, junto ao rio dos Fornos e espacialmente no Inverno e Primavera ocorrem Ardeídeos, a garça-pequena-branca (Egretta garzetta) e a garça-boieira (Bubulcus ibis). O anatídeo presente é o pato-real (Anas platyrhynchos). A galinha-d’água (Gallinula chloropus), a galinhola (Scolopax rusticola) e o galeirão (Fulica atra), também ocorrem nestes rios. A codorniz (Coturnix coturnix) ocorre desde o Ramalhão até á Serena, entre a vala da Azenha, da Serena e o Rio Botão, assim como narceja-comum (Gallinago gallinago). 61

Freguesia de Souselas – um povo com História

As aves de rapina diurnas mais comuns que cruzam os céus da Freguesia são: a águia-de-asa-redonda (Buteo buteo), o milhafre-preto (Milvus migrans) e o peneireiro-vulgar (Falco tinnunculus), que aproveita as cavidades das paredes das antigas pedreiras para nidificar. Outras espécies menos comuns, como a águia-calçada (Hieraaetus pennatus), observada na Serra da Brasfemes, a águia-cobreira (Circaetus gallicus) registada na floresta da Marmeleira, e o falcão-peregrino (Falco peregrinus), que é a mais rápida das nossas aves, em voo picado pode atingir a velocidade de 280 quilómetros/hora, também ocorrem. Nas áreas de pinhal surgem espécies típicas de florestas. As aves de rapina diurnas presentes são a águia-d’asa-redonda (Buteo buteo), o milhafre-preto (Milvus migrans), o peneireiro (Falco tinnunculus), o açor (Accipiter gentilis) e o gavião (Accipiter nisus), que utilizam este biótopo como território de caça. As aves de rapinas nocturnas são: a coruja–das-torres (Tyto alba), o mocho-galego (Athene noctua), o mocho-d’orelhas (Otus scops), o bufo-real (Bubo bubo), a coruja-do-mato (Strix aluco), que devido à disponibilidade de áreas de alimentação (zonas agrícolas) e áreas de refúgio e locais de nidificação (zonas de bosque e olivais com oliveiras centenárias). Nos matos, nomeadamente nos matagais, ocorrem várias espécies do género Sylvia: a toutinegra-do-mato (Sylvia undata), a toutinegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala), a toutinegra-de-barrete (Sylvia atricapilla), toutinegra-real (Sylvia hortensis), a vulnerável toutinegra-das-figueiras (Sylvia borin) a estivante papa-amoras (Sylvia communis). A pequena carriça (Troglodytes troglodytes), também é comum neste biótopo. Nas barreiras das antigas saibreiras da Marmeleira ocorre a andorinha-das-barreiras (Riparia riparia), onde escava os seus ninhos. Nas chaminés, beirais e estábulos e palheiros são comuns a andorinha-das-caminés (Hirundo rustica) e a andorinha-dos-beirais (Delichon urbica). Os corvídeos que ocorrem em área de pinhal são: o gaio (Garrulus glandarius), o corvo (Corvus corax), a gralha-preta (Corvus corone). A pega-rabuda (Pica pica) ocorre em matos, matagais e floresta. A ordem dos Piciformes, família Picidadae, está representada pelo peto-verde (Picus viridis) e pelo pica-pau-malhado-grande (Dendrocopus major), que ocorrem nos pinhais. Nestas aves o bico em forma de buril permite escavar os troncos das árvores e a sua língua comprida, arredondada, com uma mucosa aderente e viscosa, ajuda a capturar os insectos. A perdiz (Alectoris rufa) ocupa espaços agrícolas, charnecas secas e espaços rochosos, nomeadamente nas Valas, Lâmbaro, Serras de Brasfemes, e Alhastro, Junqueira, Cabeço da Azenha até á Zouparria do Monte e a zona das Matuas até às Cambalhas. Tratam-se de zonas abertas de panascos, com estevais e tomilhais, mescladas de vinhas e olivais, onde abunda o alimento, ai se reproduzem e alimentam e na Primavera nas noites de lua cheia é comum ouvir o seu canto. 62

I – O Meio Físico e a Paisagem

Com o fim do Verão, o Outono e Inverno ocorrem espécies oriundas do centro e norte Europa, alguns migradores de passagem e outros invernantes, que ocupam territórios onde abunda o alimento, resultado das colheitas agrícolas, nomeadamente os olivais e as terras agrícolas junto às zonas ribeirinhas dos rios, ribeiros e valas. De referir: felosa-comum (Philoscopus collybita), estrelinha-de-cabeça-listrada (Regulus ignicapillus), lugre (Carduelis spinus), pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), papa-moscas-preto (Ficedula hypoleuca), papa-moscas-cinzento (Muscicapa stricita), petinha-dos-prados (Anthus pratensis), cia (Emberiza cia), laverca (Alauda arvensis), tordo-comum (Turdus philomelos), tordo-zornal (Turdus pilaris), tordo-ruivo (Turdus iliacus), tordeia (Turdus viscivorus), o estorninho-malhado (Sturnus vulgaris) que se junta ao residente estorninho-preto (Sturnus unicolor). Nos Invernos rigorosos e vindo do norte e centro da Europa o abibe (Vanellius vanelius) ocupa os olivais e as zonas ribeirinhas. O pombo-torcaz (Columba palumbus) ocupa s zonas de pinhal e a rola-comum (Streptopella turtur), uma migradora estival, que regressa todos os anos de África para nidificar, ocupa os olivais onde se reproduz e os campos de cereal para alimentação. O cuco-canoro (Cuculus canorus) é uma ave estival, que chega na Primavera, quando a planta rosa-albardeira está em flor, por isso o povo chama à rosa-albardeira o “cuco”, o mesmo acontece com o raro papa-figos (Oriolus orioplus), o noitibó (Caprimulgus europaeus), que ocupa matas abertas e charnecas, que regressam todos os anos. A rola-turca (Streptopelia deacoto) e o bico-de-lacre (Estrilda astrild) são duas espécies de aves exóticas introduzidas no território português que se encontram em grande expansão e que ocorrem na freguesia. 4.2.2. A mamofauna O coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) é muito comum e distribui-se por todo o território, já a lebre (Lepus granatensis) é muito rara. A raposa (Vulpes vulpes) é um dos mamíferos mais comuns, que se distribui por toda a Freguesia, devido á abundância de coelhos, de outros mamíferos, de insectos e de frutos. Outros carnívoros de médio porte, como o texugo (Meles meles) e a geneta (Genetta genetta), o mais pequeno predador da Europa, animal noturno que tem como principais armas a velocidade e a agilidade, também ocorrem. O texugo tem registo de presença no Alto da Ladeira, Junqueira e Carrimá. O javali (Sus scrofa) ocorre no Alto da Ladeira da Marmeleira e na Junqueira. Os micromamíferos presentes são o rato-dos-bosques (Apodemus sylvaticus), a ratazana-de-água (Arvicola spadius), a ratazana-preta (Rattus rattus), o ratinho-caseiro (Mus domesticus) e o ratinho-ruivo (Mus spretus). 63

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Os mamíferos insectívoros mais comuns são o ouriço-cacheiro (Erinaceus europaeus), o musaranho-de-dentes-brancos (Crocidura russula) e os morcegos, nomeadamente o morçego-hortelão (Eptesicus serotinus). A toupeira (Talpa occidentalis) ocorre nos campos agricultáveis, onde ocorrem pequenos montículos de terra que acumula quando abre à superfície saídas do seu complexo sistema de galerias. A família dos mustelídeos está representada pelo texugo (Meles meles), pela doninha (Mustela nivalis) e pela lontra (Lutra lutra). A lontra, animal que se encontra em regressão na Europa, habita o rio Resmungão, no troço entre a ponte do Resmungão e o Pisão dos Canaviais. Aí é possível encontrar marcas da sua passagem através de vocábulos e da ocorrência de pegadas e dejectos. Também já foi registado a presença do esquilo-castanho (Sciurus vulgaris), que se encontra em expansão no país. 4.2.3. Herpetofauna (répteis e anfíbios) Nos répteis, o maior dos lacertídeos, o sardão (Lacerta lepida), observa-se com frequência atravessando os “carreiros” existentes nos campos da Freguesia, bem como maior ofídio da nossa herpetofauna, a cobra-rateira (Malpolon monspessulanus), que pode ultrapassar os 2 metros de comprimento e se que alimenta de pequenos roedores, crias de aves e juvenis de coelhos. Também ocorrem a cobra-de-ferradura (Coluber hippocrepis) e da cobra-de-escada (Elaphe scalaris). Uma espécie particularmente interessante da nossa herpetofauna é o lagarto-de-água (Lacerta schreiberi), endemismo da Península Ibérica que ocorre em zonas relativamente húmidas e próximo de linhas de água. A lagartixa-do-mato (Psammodromus aIgirus) pode ser facilmente observada numa grande diversidade de habitats, especialmente, nos pinhais e matas e a lagartixa-comum (Podarcis hispanica) é comum a todo o território. Nos rios locais ocorre o cágado-mediterrânico (Mauremys leprosa) e a cobra-de-água (Natrix ssp.). A osga-comum (Tarentola mauritanica) ocorre em locais pedregosos, paredes e muros de pedra. O licranço (Anguis fragilis), encontra-se em zonas húmidas e refugia-se debaixo de pedras, troncos e galerias de roedores. Os anfíbios preferem as linhas de águas, lagos, charcos e locais húmidos, requisito ecológico necessário para a respiração cutânea e para a reprodução. As espécies que ocorrem na freguesia são: salamandra-de-pintas-amarelas (Salamandra salamandra), tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai), rã-verde (Rana perezi), rã-castanha (Rana ibrica), rã-de-focinho-pontiagudo (Discoglossus galganoi), sapo-comum (Bufo bufo), sapo-corredor (Bufo calamita), rela-arborícola (Hyla arborea). Uma particularidade foi observada na “Mata da Candinha”, o sapo-parteiro (Alytes obstetricans). 64

I – O Meio Físico e a Paisagem

4.2.4. Ictiofauna Os peixes mais comuns são: enguia (Anguilla anguilla), barbo (Barbus bocagei), boga (Chondrostoma polylepis), ruivaco (Chondrostoma macrolepidotus). Outrora as lampreias (Petromyzon marinus) chegavam à vala da Azenha. Algumas espécies de peixes exóticas, introduzidas nos nossos rios, também podem ocorrer, nomeadamente. a perca-sol (Lepomis gibbosus), o pimpão (Caracius sp.), o achigã (Micropterus salmoides) e a gambúsia (Gambusia holbrooki). 4.2.5. Invertebrados A riqueza da flora permite a existência de uma diversidade de insectos. Os lepidópteros, vulgarmente designados por borboletas, são um grupo muito representativo: É comum observar as borboletas flamula (Iphiclides feisthamelii), a ícaro (Polyommatus icarus), a borboleta-cauda-de-andoinha (Papilio machaon), a borboleta-almirante-vermelho (Vanessa atalanta), a borboleta-do-medronheiro (Charaxes jasius), a bela-dama (Vanessa cardui), cujas larvas consomem cardos e urtigas (Urtica sp.); a ariana (Pararge aegeria), que prefere lugares sombrios, a azul-celeste (Celastrina argiolus), entre outros. No Verão as cigarras ou “cegarregas”, como lhe chamam localmente, enchem os olivais e os matagais com o seu canto. Junto às linhas de água são comuns os alfaiates e as libélulas, por vezes a loba-a-deus. Na Primavera e verão os gafanhotos. Nas charnecas e matos mediterrânicos ESPÉCIES COM INTERESSE CINEGÉTICO As espécies cinegéticas que ocorrem na freguesia são: • Mamíferos: coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus); lebre (Lepus granatensis); javali (Sus scrofa), raposa (Vulpes vulpes); • Aves sedentárias: perdiz-vermelha (Alectoris rufa), faisão (Phasianus colchicus)- só de largada para caçadas, gaio (Garrulus glandarius); pega-rabuda (Pica pica); gralha-preta (Corvus corone); • Aves migradoras ou parcialmente migradoras: pato-real (Anas platyrhynchos); galinha-d´água (Gallinula chloropus), galeirão (Fulica atra); galinhola (Scolopax rusticola); rola-comum (Streptopelia turtur); rola-turca (Streptopelia deacoto); codorniz (Coturnix coturnix), pombo-torcaz (Columba palumbus), tordo-zornal (Turdus pilaris); tordo-comum (Turdus philomelos), tordo-ruivo (Turdus iliacus); tordeia (Turdus viscivorus); estorninho-malhado (Sturnus vulgaris); narceja-comum (Gallinago gallinago).

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ESPÉCIES COM ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO Espécies constantes do Anexo I da Directiva 79/409/CEE - Directiva Aves: ocorrem algumas espécies de aves constantes da Directiva Aves, Anexo I, nomeadamente: o milhafre-preto (Milvus migrans), o noitibó (Caprimulgus europaeus), a felosa-do-mato (Sylvia undata). A lontra (Lutra lutra), é uma espécie estritamente protegida pela Convenção de Bona (Anexo II, encontra-se registada na Lista dos Mamíferos Raros e Ameaçados do Conselho da Europa e na Directiva Europeia dos Habitats, Anexo II). A geneta (Genetta genetta), é um mamífero constante da Directiva Habitats, Anexo V - Espécies animais e vegetais de interesse comunitário cuja captura ou colheita na natureza e exploração podem ser objecto de medidas de gestão e o morcego-hortelão (Eptesicus serctinus), Anexo IV - Espécies animais e vegetais de interesse comunitário que exigem uma protecção rigorosa. Nos peixes ocorrem alguns endemismos: o ruivaco (Chondrostoma macrolepidotus), endemismo Português do sector central; o barbo (Barbus bocage) e a boga (Chondrostoma polylepis), ambos endemismos Ibéricos. A boga (Chondrostoma polylepis) e o ruivaco (Chondrostoma macrolepidotus) constam da Directiva Habitats, do Anexo II. O lagarto-de-água (Lacerta schreiberi) é um endemismo ibérico que ocorre em habitats, relativamente húmidos, próximos dos cursos de água com coberto vegetal denso. O tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai), a rã-de-focinho-pontiagudo (Discoglossus galganoi) e a rã-verde (Rana perezi) são igualmente endemismos ibéricos. O sapo-corredor (Bufo calamita), o sapo-parteiro (Alytes obstetricans) e a rela-arborícola (Hyla arborea), são espécies constantes da Directiva Habitats, Anexo IV - Espécies animais e vegetais de interesse comunitário que exigem uma protecção rigorosa e a rã-verde (Rana perezi), espécie constante da mesma directiva, Anexo V - Espécies animais e vegetais de interesse comunitário cuja captura ou colheita na natureza e exploração podem ser objecto de medidas de gestão, respectivamente.

5. A Propriedade e a Agricultura O terreno, quer nas terras baixas, quer nas terras de encostas e até aos cumes das serras, montes, cabeços e outeiros, está profusamente dividido, sem distinção de culturas, não obstante do domínio da vinha e do olival. Aliás, Henrique Nazareth (1951) dava nota que em algumas situações havia mais de 250 prédios rústicos por km2. 66

I – O Meio Físico e a Paisagem

A base da distribuição é o minifúndio. Este microfundismo poderá estar relacionado com a fertilidade dos terrenos, pois a Freguesia está no extremo norte do “Campo do Mondego” e possui uma área considerável de terras irrigadas pelos Rio Botão e a Ribeira de Souselas (o outro topónimo do Rio Resmungão) bem como o elevado número de valas e pequenos ribeiros seus afluentes. O apego à terra, ainda hoje é manifestado no acto das partilhas. É muito raro um dos herdeiros vender ao outro dos herdeiros a sua parte. Por vezes todos os herdeiros exigem ficar com uma pequena parcela o mesmo prédio rústico, independentemente de ele ficar dividido em pequenas “Leiras”. Nestes momentos de pouco vale a posição dos “Louvados” (conjunto de homens bons que ajudam a fazer a distribuição e avaliação dos bens através das partilhas). Aquando das primeiras fixações de população humana na área geográfica da Freguesia, teria início nos terrenos mais férteis, no chão compreendido entre as Serras Alhastro e Brasfemes, Cabeço da Azenha e Almoinhas, Alto da Marmeleira e Alto de St.ª Luzia, aproveitando os vales dos rios Botão e a Ribeira de Souselas, com o aumento da população e o apego à terra, a ocupação dos cumes encostas e planaltos e a reconquista das encostas desnudadas pela erosão. De facto, toda a área da Freguesia tem, ou teve, ocupação agrícola e distribuição de propriedade. Assinale-se, a título de exemplo, que no alto das serras do Alhastro e de Brasfemes existia, e nesta última ainda há, a cultura do olival. A natureza geológica da freguesia, a sua topografia, com montes, outeiros, planaltos e vales, bem como uma importante rede hidrográfica permitem-lhe ter uma agricultura rica e variada. Ao longo de muitos anos a Freguesia teve uma agricultura desenvolvida e forte, sendo o olival e a vinha as culturas dominantes. Até ao Séc. XIV, o azeite era tido como um dos principais produtos de Coimbra. Na parte central e Sul da Freguesia, se repararmos com atenção, existe em cada canto uma oliveira, muitas delas centenárias. Actualmente, a vinha ainda é a actividade agrícola mais forte e representativa da Freguesia, estando o olival em desenvolvimento, com o plantio de novas oliveiras (foto 18). Cultivava-se, e ainda se cultiva, culturas de sequeiro como trigo, centeio (em menos escala), e aveião (cereal utilizado na alimentação do gado), tremoço (nos terrenos cascalhentos do Pedregal), a fava, a ervilha e a batata. Nas culturas de regadio destacam-se: milho, hortaliças (como a couve e a alface), tomate, cebola, cenoura, pimento, pepino e feijão. Para além da abóbora-menina (utilizada na confecção das filhoses de Natal), da abóbora-porqueira e beterraba, ambas utilizadas na alimentação dos animais. No passado, chegou-se a cultivar arroz nas terras da Azenha, também designada em topónimo antigo como “Chão de Arroz”, localizadas entre o Rio Botão e vala da Azenha. Por fotografias antigas também é possível afirmar que se cultivava, na Freguesia, o linho. 67

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Para além dos vinhedos e olivais, a paisagem compõe-se com alguns pomares. Os de maior expressão são os laranjais dos terrenos de areia e cascalhentos de Sargento Mor, os de Lagares, nos terrenos de aluvião do Rio Resmungão que se estendem até ao Pisão dos Canaviais, existindo também alguns na Marmeleira. Seguem-se os pomares de macieiras e pereiras, enquanto as ameixieiras, cerejeiras, nespereiras, nogueiras e damasqueiros distribuem-se em pequenos núcleos. Menos comuns são o diospireiro e a romãzeira. A aveleira, uma árvore atlântica, é rara na Freguesia. As figueiras são comuns, por vezes nas estremas dos terrenos ou nos limites das vinhas. Aliás, as vinhas mais antigas possuíam, dispersas, várias árvores de fruto como macieiras, pereiras, pessegueiros e damasqueiros. Para delimitar caminhos e veredas utilizava-se o marmeleiro, que ocorre em toda a freguesia. 5.1. A vinha As vinhas distribuem-se especialmente pela parte central de Freguesia, dentro de círculo definido pelas localidades de Souselas, Zouparria do Monte, S. Martinho do Pinheiro e Marmeleira (fotos 18, 19 e 20), que inclui Vale Miguel, Regeirasaias, Matuas. Outros importantes núcleos ocorrem em Souselas, na Junqueira, Valas e Lâmbaro e no Cabeço da Azenha. Na Marmeleira, nas Cambalhas e Relva e, na Zouparria do Monte, na Oitava e Cova das Silvas. As vinhas com castas de Baga, Alfocheiro, Castelão, Jeam e Touriga são utilizadas na produção de vinhos tintos. Na produção de vinhos brancos são utilizadas castas como Fernão Pires, Arinto, Rabo de Ovelha, Verdelho, entre outros. A vinha é a maior riqueza agrícola da freguesia. Muito se deve à Adega Cooperativa de Souselas que já conta com mais de meio século de vida. Os vinhos tintos acompanham o mais característico prato gastronómico, o sarrabulho, e o espumante bruto o leitão à Bairrada. O vinho-bica-aberta é feito directamente de mosto que sai do tanque depois de pisado e vai ferver na pipa. Para o S. Martinho era e é feita a água-pé, um vinho tinto de graduação alcoólica mais baixa, feito de mosto com água. Manda a tradição fazer jeropiga pelas vindimas, bebida espirituosa feita em três partes de mosto não fervido, tirado do tanque do vinho no dia da vindima, sendo filtrado num passador, no passado em pano-cru ou de linho, e uma de aguardente, depois de mexer bem conforme se vai colocando na pipa. Tapada a pipa, a aguardente, de preferência de alambique, corta a fermentação e o frio fará o resto até ao Natal onde se faz a primeira prova. O bagaço era queimado em alambique e mais tarde nas destilarias para a produção de aguardente, sendo a mais fraca designada como fleuma. A uva branca e os figos eram vendidos como novidade nas feiras. E alguns cachos eram colocados a secar para produzir passas para as broinhas de Natal. 68

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5.2. O olival Em Portugal, a cultura da oliveira é antiga. Os Visigodos já a herdaram dos Romanos e estes, possivelmente, tinham-na encontrado na Península Ibérica. Os Árabes mantiveram e desenvolveram a cultura. A palavra azeite tem origem no vocábulo árabe al-zait, que significava “sumo de azeitona”. O Azeite sempre esteve presente nos recantos da vida diária dos portugueses: na candeia do pobre e no candelabro do rico, na mesa do povo e nos solenes templos de velhos cultos. A oliveira tem virtualidades e qualidades medicinais, alimentares, económicas, proféticas e sagradas (foto 21). Na Freguesia de Souselas, com excepção das zonas ribeirinhas e florestadas da Freguesia, a maior parte da paisagem é mesclada de vinha e olival (foto 22). A oliveira (Olea europaea L.) comum é a variedade de azeitona-galega. No passado existiam vários lagares de azeite. Uma das localidades tem, inclusivamente, o topónimo Lagares, onde não muito longe funciona, numa antiga quinta que foi pertença do Mosteiro de Lorvão, o ultimo lagar de azeite. Depois da apanha da azeitona, através da técnica do varejar e recolha em panais de serapilheira (foto 23), procedia-se à sua limpeza e colocação em sal até ao dia de ir para o lagar (há quem a coloque em água). A azeitona para consumo era apanhada à mão, respigada. Depois de retalhada era colocada num pote de barro, em água, e temperada com serpol e murta, plantas aromáticas característica dos calcários, com rodelas de limão ou laranja, coentros, louro e alho pisado. Quando retirada para comer levava umas pedras de sal. A oliveira pega de estaca, contudo também poderá ser feita enxertia no zambujeiro (Olea europaea var. sylvestris), variedade selvagem da oliveira que funciona como porta-enxerto e confere resistência a determinadas doenças. No lagar fazia-se o azeite, mandando a tradição assar batata e bacalhau na fornalha da caldeira, temperado com o azeite novo e um dente de alho. Depois de pagar a maquia ao dono do lagar, era o regresso a casa sendo o azeite colocado em potes de barro, vidrado ou em pias de pedra. A baganha, bagaço de azeitona, era usada na alimentação dos animais. A oliveira para além de fornecer lenha para o Inverno, devido à sua dureza, também fornece os cabos para as alfaias agrícolas como as enxadas, alviões e farpões. Curiosamente, a serra do Alhastro, Oleastro ou Ilhastro de outros tempos, em Souselas, é um topónimo romano que significa “monte das oliveiras”.

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APARELHOS DE ELEVAR ÁGUA Os sistemas de rega das terras resumiam-se a dois processos. Com aproveitamento das nascentes naturais em locais mais altos ou através de aparelhos de elevar água. O homem aproveitava as nascentes naturais situadas e locais mais altos que os campos, aproveitando a força da gravidade, para fazer uma “presa”, “represa” ou “poça”. A presa acumulava água que depois era encaminhada para os campos através dos “regos” ou “regadeira”, onde se fazia “rega por pé”, com o auxílio da enxada, canteiro a canteiro, talhão a talhão. A “torna da água” era uma partilha da água entre inquilinos. Era obrigação dos utilizadores zelarem pela limpeza das valas e fontes. Quando a água tinha de atravessar linhas de água, como era o caso das encruzilhadas, no Rio Botão, na Azenha, eram construídas calhas de madeira. Os sistemas de regra através de aparelhos de elevar água, utilizavam a força motriz dos agentes naturais como a água e o vento, ou dos animais (bois, mulas e burros) e do homem. Os aparelhos de elevar água que utilizavam a força motriz dos animais (bois, mulas e burros), mais comuns na freguesia, para retirar água dos poços, eram o engenho ou nora de buchas (noras de rodas dentadas, noras de sarilho, noras de eixo curto). Os aparelhos de elevar água que utilizavam a força motriz do homem eram: a roldana (sistema simples de tirar água dos poços), o sarilho, a picota ou cegonha (geralmente junto a pequenas valas e ribeiros e rios). Também se regava com o cabaço e com o regador, regava-se planta a planta, técnica conhecida por «abicar». Alguns poços possuíam bomba de rabiço. 5.3. A pecuária A pecuária assentava, essencialmente, na produção para consumo doméstico, de coelhos e galinhas, para além da imprescindível criação do porco, nomeadamente da raça Bísaro, que se comprava na “Feira dos 23” ou de Sta. Luzia. Era criado e engordado com a lavagem (sobra de comidas da casa), completada de beterraba e abóbora porqueira. Posteriormente seria morto, desmanchado e salgado na salgadeira, com sal grosso, servindo de alimento para todo o ano. Em Souselas criavam-se os bovinos da raça Marinhoa, raça bovina autóctone da Beira Litoral, (distribuída de Ovar a Soure), também designado por “ gado amarelo “, devido à cor da sua pelagem. Os animais eram usados como força de tracção nos trabalhos agrícolas, para lavrar a terra ou para transportar no “carro de bois”, o mato, a azeitona, as uvas, etc. Raramente era usado o cavalo, e o burro só de apoio ao trabalho dos moleiros. 70

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A criação de ovinos e caprinos tinha, indiscutivelmente, uma forte expressão e peso económico. Devido à existência de muitos pousios, principalmente nos montes e outeiros, e fartos pastos nas zonas ribeirinhas, bem como a grande extensão de olivais e vinhas utilizadas após as vindimas. 5.4. Os pastos Em Souselas existiram grandes rebanhos de ovelhas, que percorriam as Valas, Moenda e Almoinhas, até à Serra de Brasfemes e, após as colheitas, as terras baixas, pastando junto aos rios. A Marmeleira também possuía uma pastorícia considerável sendo de menor expressão na Zouparria do Monte e S. Martinho do Pinheiro. A riqueza de pastos era tão assinalável, que no Verão vinham rebanhos da Beira Alta transportados por comboios de mercadorias pela linha da Beira Alta e descarregados em Souselas, para se alimentarem dos pastos aqui existentes. Vendia-se a lã das ovelhas, após a tosquia, para a indústria dos lanifícios, sendo alguma usada localmente na tecelagem. A pele das ovelhas e das cabras era vendida para a indústria dos curtumes. O leite era destinado à alimentação e ao fabrico de queijo e requeijão, pois o cardo usado na sua confecção abunda na freguesia. 5.5. A Floresta A floresta está representada na parte oriental da freguesia (Junqueira, Lagares e Pisão dos Canaviais), e na parte Norte (S. Martinho e Marmeleira, até ao limite do Concelho e Distrito), Nalguns locais, os povoamentos destas espécies são mistos, pinheiro-bravo e eucalipto. Na Marmeleira ocorrem, também, pequenos núcleos de pinheiro-manso. A exploração da floresta tema alguma representatividade na economia local, com a venda da madeira de pinheiro para as serrações e a de eucalipto para a indústria de celulose. No passado, a exploração e venda da resina eram um complemento no orçamento familiar. O mesmo se verificava, com a apanha do pinhão, de lenha e de mato, para consumo próprio ou para venda. Tanto na Marmeleira, a partir do Alto da Ladeira, como em Souselas, na Junqueira, subsistem vestígios de floresta primitiva, existindo exemplares de carvalho-cerquinho ou português (Quercus faginea subsp. broteroi), para além do carvalho-alvarinho (Quercus robur), do carrasco (Quercus coccifera), e do sobreiro (Quercus suber). Nas zonas ribeirinhas surgem importantes núcleos de Salgueiros (salgueiro-preto e salgueiro-branco). A verga, nomeadamente a amarela que é mais 71

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maleável, é recolhida e preparada para ser utilizada na “empa” das vinhas. A verga verde é utilizada na confecção de cestos e poceiros de vindima, sendo que o último artesão da freguesia foi o Sr. Júlio, da Zouparria do Monte. No passado, o pau de salgueiro era procurado e vendido às paliteiras de Lorvão e de Chelo, para fazerem palitos. Em Souselas, nos vales da Azenha, junto à vala da Azenha e ao Rio Botão, e no Ramalhão, existem importantes choupais de Choupo-branco, destinados à indústria da madeira.

6. Notas de Geografia Histórica Ao longo da história, a essência de alguns elementos e aspectos geográficos da freguesia não escapou a olhares mais atentos e perspicazes. Tal foi o caso do pároco João Francisco Montenegro, que redigiu a relação paroquial de Souselas que veio a integrar o Dicionário Geográfico de 1758. Datada do dia 1º de Maio daquele ano nela são de destacar as seguintes passagens: «…está cituada em vale, por isso senão descobrem della povoações (…) esta com dous pequenos outeiros juntos de si; hum chamado a Serra de Ilhastro; e outro a Serra de S. Valentim; os Rios q. por ella passão he hum regato chamado o Rio de Botão q’ no Verão poderá conservar duas telhas de agoa, e huma ribeira chamada do Pizão q’ no d.º tempo seca de todo».(3) Importa esclarecer que se o Rio de Botão não oferece qualquer dúvida quanto à sua localização, já esta ribeira do pizão corresponde, actualmente, ao Rio Resmungão. No entanto, uma das mais ricas descrições da freguesia foi feita pela pena de Jerónimo Lopes Parente em Agosto de 1872: «Souzellas, um dos melhores logares do rico Concelho de Coimbra, a distancia pela medida velha, legua e meia para norte, antiga estrada para Vizeu, occupa um terrapleno nas faldas das serras de Ilhastro e S. Valentim, que com outros a figuram uma caldeira. É banhada com dois rios, de Botão e Remungão, que reunem ao fundo do logar e correm aos Fornos, campo e Mondego: com elles se regam todas as terras do logar, as quaes se andassem bem policiadas, podiam regar-se tres vezes. É mui saudavel, tanto que ha dez ou doze annos contavam-se aqui dez homens ou mais, octogenarios; tres lentes da Universidade e oito bachareis formados. É muito productiva; vegetam aqui bem toda a especie de arvores.

(3)

A. N. T. T. – Dicionário Geográfico de 1758, Souselas, Vol. 35, nº 238, P. 1701

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I – O Meio Físico e a Paisagem

Da toda a qualidade de fructos mostra-nos muitas arvores de fructo, de que existem dos velhos, porque nos novos há muito indolencia. (…) São tres os fructos dominantes da terra, milho, vinho e azeite, de que annos regulares tem sobras que leva aos mercados de Coimbra, Mealhada e mais partes. Milho em annos abundantes tem para seu custeio, e exportará para cem moios, egual numero de pipas de vinho, e não menos de azeite»(4). O povo vivia na sua esmagadora maioria da lavoura estando, por isso, exposta aos rigores do clima. Lopes Parente fala-nos das consequências da seca de 1870 que atrasava as sementeiras dos Souselenses, os quais continuavam «…à espera da lua de S. Jorge, reguladora da lavoura (…) algumas vezes vimos passar pelos montes fronteiros comboios carregados d’agua, a descarregar n’outras estações: aqui nem uma só gota (…) Em minha pequena lavoura, já conto de menos de 6 moios; e á proporção em toda a freguezia, com o voto de outros; calculo 100 moios de menos que o regular (…) Conto 93 annos de edade, e nunca vi tamanha secca»(5). Rezava a tradição, em meados do séc. XX, que as encostas dos montes de Alhastro e Brasfemes estiveram outrora cultivadas com vinhas. Na monografia de Souselas, Henrique Nazareth de Souza, aborda o assunto. O autor, sem colocar de parte a possibilidade do desaparecimento e consequente arrastamento das terras se dever a ataque da filoxera, considerou outra hipótese: «Parece-nos porém pouco verdadeira esta explicação, não só porque as pessoas antigas da região já conheceram os montes com o aspecto actual, mas também porque a extensão da erosão leva a atribuir-lhe mais de cem anos. Se as vinhas destas encostas alguma vez existiram, devem ter desaparecido em época mais remota, talvez em meados do Século XVIII quando o Marquês de Pombal mandou arrancar todas as vinhas da Bairrada com o pretexto de que estes terrenos eram mais úteis para a cultura de cereais»(6).

Lopes Parente - «Agricultor» In O Conimbricense, 20 Agosto 1872, P. 4 Lopes Parente - «Noticias agricolas» In O Conimbricense, 2 Julho 1870, P. 3. (6) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, Pp. 6-7 (4) (5)

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II PROCURANDO AS ORIGENS

S

1. Os indícios fornecidos pela toponímia e microtoponímia ouselas é o lugar sede da freguesia e é um topónimo pouco frequente em Portugal. A sua evolução toponimica acusa variações recentes como o facto de, até há bem pouco tempo, se escrever Souzelas ou Souzellas. Temos duas hipóteses consistentes para a origem do topónimo. Souselas, poderá ser um diminutivo medieval de Sousa(7), ou seja; o seu nome derivar de um antropónimo, talvez alguma família que ali se fixou na Alta Idade Média. Segundo José Leite de Vasconcelos, Souselas será um diminutivo medieval de Sousa (antigo Sausa), apelativo relacionado com o latim salsa, isto é “terra, água” o que aliás está de acordo com as caracteristícas da região «…pois estamos inseridos numa região de origem sedimentar, que no seu passado geológico teria sido um fundo marinho onde predomina o calcário margoso»(8). No entanto, o topónimo poderá ter outra origem, intimamente relacionada com a flora, se levarmos em linha de conta o documento do longínquo ano de 919, que nos remete para a portella de salice. De facto, salice é o nome científico do salgueiro, pelo que poderá ter acontecido o seguinte; salice ter dado origem ao diminutivo plural “salicelas”, que se transformou em Souzelas, pela vocalização de “Sauz”. Tal hipótese viria ao encontro da forma que encontramos no documento de 937 – Sausellas. Acorre a favor desta tese o facto de muitas aldeias da região de Coimbra possuirem nomes derivados de plantas: Louredo, Soutelo, Oliveira, Murtede ou Sazes. Quanto ao topónimo Marmeleira é frequente em Portugal, especialmente no Centro e Sul do país, encontrando-se nos concelhos de Arraiolos, Estremoz, Montemor-o-Novo, Mortágua, Óbidos e Portel. Relaciona-se com a flora, derivando do substantivo feminino marmeleira, ou seja; da bem conhecida e vulgarizada árvore que produz marmelos «…cultivado mais ou menos por toda a parte. Na toponímia medieval e, na moderna, da Beira e do Sul, encontra-se marmeleira»(9). De facto, o marmeleiro é uma planta comum nesta freguesia.

José Pedro Machado – Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Terceiro Volume (N-Z), Livros Horizonte, Lisboa, 1993, P. 1367

(7)

João Pardal; Daniel Crespo; João Crespo; Albino Crespo; Vasco Gonçalves; Joaquim Gonçalves – Apontamentos da Nossa Terra, Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, Setembro, 1997, P. 6 (8)

(9) José Leite de Vasconcelos – Etnografia Portuguesa, Vol. II, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, [reimpressão fac-similada da edição de 1980], 1995, P. 102

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Freguesia de Souselas – um povo com História

São Martinho do Pinheiro creio ser um topónimo raro, caso único no país. O seu nome derivará , por um lado, do latim Martinu, antropónimo masculino que se vulgarizou a partir da popularidade atingida por dois santos do mesmo nome (séculos IV e VI)(10), o que de modo algum permite datar a antiguidade da povoação nessa cronologia. A existência de outro topónimo no seu nome suscita desde logo a hipótese de algures no passado o lugar se ter designado apenas como Pinheiro. Este topónimo deriva de pinho, ou seja do latim pinu, que designa uma floresta de pinheiros ou pinhal, mas que também corre com o signficado de rama e madeira do pinheiro(11), o que aliás vem ao encontro da exploração e ocupação florestal da área: «S. Martinho do Pinheiro e Marmeleira apresentam uma importante mancha florestal com domínio do pinheiro»(12). Relativamente às origens desta povoação apresentamos uma hipótese sedutora. A documentação mais antiga relativa a esta área, e que analisamos abaixo, refere a existência de uma povoação (aldeia) entre Souselas e Marmeleira designada por Sancto Martini de Paliales (ou Paliares). Se tivesse acontecido a evolução toponímica provável a povoação designar-se-ia actualmente como S. Martinho de Palhais (ou Palheiros). Tal designação derivaria, certamente, da existência de uma ou mais casas cobertas de colmo ou palha (palhais) ou de um ou mais edifícios anexos a habitações de residência onde se guardaria palha ou feno(13). Aliás, história agrária parece estar de acordo com esta hipótese, uma vez que os Tombos de propriedades por nós consultados e relativos ao Séc. XVIII confirmam a profusão destas estruturas, que surgem designadas por palheiros ou pardieiros. Assim, e durante algum tempo (talvez mesmo séculos) o lugar de S. Martinho do Pinheiro talvez fosse conhecido por aquela designação. A alteração de topónimo poderá explicar-se pela história florestal de Portugal. De facto, estes documentos datam dos séculos X e XI, ou seja; são anteriores à expansão do pinheiro em Portugal (recorde-se, a propósito que a iniciativa do pinhal de Leiria tem-se atribuído a D. Dinis no Séc. XIII). A alteração do coberto vegetal (que ainda hoje é fortemente marcado pelo pinheiro apesar da expansão do eucalipto), poderá ter precipitado a mudança de topónimo.

José Pedro Machado – Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Segundo Volume (E-M), Livros Horizonte, Lisboa, 1993, P. 956 (11) José Pedro Machado – Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Quarto Volume (M-P), Livros Horizonte, 1977, P. 368 (10)

João Pardal; Daniel Crespo; João Crespo; Albino Crespo; Vasco Gonçalves; Joaquim Gonçalves – Apontamentos da Nossa Terra, Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, Setembro, 1997, P. 3

(12)

Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Vol. II (G-Z), Academia das Ciências de Lisboa, Verbo, 2001, P. 2724

(13)

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II – Procurando as Origens

Zouparria apenas começa a ser amplamente designada como Zouparria do Monte em meados do séc. XVIII, como forma de se diferenciar da Zouparria do Campo. Zouparria poderá ter evoluído de Zoupo, Zopo (neologismo castelhano) ou Sopo, vocábulos de origem obscura que significam aquele que tem pé ou pés torcidos (coxo)(14). Nazareth de Sousa sugere, por outro lado, que possa ter evoluído do nome árabe Zouparal, a que se juntou o sufixo ia, vocábulo que aplicado a nomes de pessoas indica uma «relação de posse». Na zona mais serrana da freguesia, para Este, temos o lugar de Lagares e, mais adiante o Pisão dos Canaviais. Lagares derivará de Lagar, um substantivo cuja origem se relaciona com lago e este por sua vez do latim lăcu e que tem várias acepções: reservatório, tanque, cuba, charco, fonte, cisterna e instalação para cereais(15). Provavelmente Lagares estará intimamente relacionado com a existência de uma casa, ou oficina, com tanque e utensílios necessários ao fabrico de vinho e ou azeite. O topónimo Pisão é frequente em Portugal e na Galiza. Apesar de poder derivar de pisar (pisadela) ou do adjectivo e substantivo Pisa, deverá andar proximamente relacionado com o latim pisãre ou pinsãre e que significa esmagar, pilar, triturar(16). De facto, dada a localização geográfica do lugar, parece perfeitamente plausível a existência de maquinaria com que nas tecelagens se aperta e bate o tecido para o tornar mais resistente, que por vezes surge com a designação de “máquina para pisoar”. Talvez ali existisse um pequeno centro produtor de tecidos. Por outro lado, os canaviais ainda existem de forma abundante na localidade, e assim deve ter acontecido ao longo de séculos. No passado, o lugar surge quase sempre referido como «Pizam do Canavial» e, no Tombo de 1705, aparece designado como «pizão dos canevéaes». No extremo Norte da freguesia temos o curioso lugar de Sargento-Mor, um topónimo frequente em outros concelhos como Covilhã, Guarda, Maia ou Salvaterra de Magos. Trata-se aqui de um substantivo masculino que remete directamente para um cargo militar. O vocábulo Sargento deriva do françês sergent, o qual por sua vez deriva do latim serviente/servire. Na Idade Média tinha o sentido de servidor mas, posteriormente, passou a designar homens de armas ou oficiais(17). É bem possível, como recorda Henrique Nazareth que José Pedro Machado – Dicionário Onomástico, Etimológico da Língua Portuguesa, 2ª edição Editorial Confluência e Livros Horizonte Lda., Lisboa, 1993, P. 1364 (14)

Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Terceiro Volume (Q-Z), Livros Horizonte, 1977, Pp. 372-373 (16) José Pedro Machado – Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Quarto Volume (M-P), Livros Horizonte, 1977, P. 375 (17) José Pedro Machado – Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Quinto Volume (Q-Z), Livros Horizonte, 1977, P. 162 (15)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

o seu nome «…deve provir de qualquer oficial das antigas “ordenanças” ou “milícias” que se tenha fixado no local e indica-nos uma povoação de formação muito mais recente do que as anteriormente referidas»(18). Carrimá. Assim se designou, até há bem pouco tempo, um pequeno lugar, nas proximidades da Marmeleira, que por razões misteriosas foi abandonado e hoje está em ruína adiantada. Na documentação que fomos consultando, verificamos que o topónimo evoluiu através das formas: Carnemá (séc. XII), ou Carnimá e Carroma (sécs. XVI-XVII). Lugar outrora cheio de vida e organizado em casais dependentes da Igreja de Santiago em Coimbra, ali existia, segundo o tombo organizado por esta instituição em 1718, uma ««irmida de nosa senhora de nazare», ou simplesmente «irmida de carrima», bem como a «Confraria de Nossa Senhora da Nazareth de Carrima». O topónimo aproxima-se de carima e de carimá e carimã formas que nos merecem alguma reflexão. De facto estes vocábulos surgem associados à língua tupi-guarani, um grupo de idiomas da América do Sul falado pela grande família dos povos ameríndios, seminómadas, que nos tempos dos descobrimentos habitavam quase todo o litoral brasileiro e grande parte do interior. O idioma por eles falado tornou-se a língua geral do Brasil no início da colonização. Assim, estes topónimos existem em regiões brasileiras como Baía, Pará, Pernambuco e Piauí. Ora, segundo aquela língua carima significava macaco, enquanto que carimá e carimã aparece em documentação do séc. XVI com um significado estranho «…sangrando-se, bebendo unicórnio ou carimã, ou água do pão de cobra»(19). Acrescente-se ainda, a informação de Nazareth de Sousa, que defende ser Carrimá, a forma «apocopada de “carril mau”, mau caminho. O mau acesso a este antigo lugar da freguesia, hoje abandonado, justifica-lhe plenamente o nome»(20).

2. Contributos da Arqueologia De acordo com a opinião da maioria dos autores, corroborada pela tradição, a antiga Estrada Nacional nº 1, Lisboa-Porto, segue o traçado da via romana

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 19 (19) José Pedro Machado – Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, Segundo Volume (C-E), Livros Horizonte, 1977, P. 77 (20) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, Pp. 18-19 (18)

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II – Procurando as Origens

vinda de Olissipo, pelo que o troço Aeminium-Cale da dita via passaria no extremo ocidental da freguesia, atravessando o lugar de Sargento-Mor. No entanto, não restam hoje vestígios aparentes desta estrada romana, nem noutro lugar da freguesia. Na área da freguesia de Souselas localizam-se, actualmente, 26 locais com potencial arqueológico: Vale de Sá (a localizada mais a Norte), Mouros (na Marmeleira de Botão), S. Martinho do Pinheiro, Zouparria do Monte, Bacêlos (Zouparria do Monte), Quinta dos Lagares (próxima a Sargento-Mor), Vales Barrocos (junto a Santa Luzia), Carrimá e o cemitério visigótico em Carrizes. Os vestígios mais antigos de ocupação humana colhem-se na estação arqueológica recente, designada por Vale de Sá, no extremo noroeste da freguesia. Os trabalhos arqueológicos decorreram entre 1997 e 1999, resultado de um protocolo entre o IPA e a Transgás. Segundo o relatório fornecido pelo GAAH, a estação localiza-se numa plataforma aplanada sobranceira à Bacia do Mondego. O nível arqueológico encontra-se embalado num coluvião de areias argilosas sobrejacente a um terraço. A indústria de pedra lascada é numerosa, com grande percentagem de sílex. Encontram-se representadas várias classes tecnológicas, pelo que provavelmente as diversas cadeias operatórias de redução das matérias-primas foram executadas no local. Principais tipos de utensílios: raspadeiras carenadas e buris. O espólio arqueológico resultante desta campanha consiste, exclusivamente, de material lítico, destacando-se a presença de lascas de quartzito brutas, lamelas e esquírolas, núcleos bipolares sobre bigorna, núcleos prismáticos e algumas raspadeiras unguiformes sobre lascas de sílex. O arqueólogo e etnógrafo Vergílio Correia afirmava, em 1940 no seguimento de expedição ao concelho de Coimbra, que no caso de Souselas «com os calcáreos crescem os vestígios neolíticos, os machados aparecem com frequência, as grutas mostram-se mais»(21). Na zona do Pisão, onde assinala não ser «dificil encontrar machados nesta região», descreve a descoberta de um machado neolítico de 0,0095 de comprimento e 0,04 de largura de gume, de rocha negra «durissima». Importa referir que o Neolítico foi um período da pré-história (8.000-5.000 A.C.) também chamado Idade da Pedra Polida, em que surgiram instrumentos em pedra polida ou pedra lascada. Essa época trouxe a fixação das populações, o desenvolvimento das actividades agrárias e a domesticação dos animais, bem como pelo aparecimento dos primeiros instrumentos de pedra polida, da cerâmica e da agricultura. Em Souselas, as últimas descobertas relacionam-se de

(21) Vergílio Correia - «Notas de Arqueologia e Etnografia do Concelho de Coimbra», In Rev. Biblos, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Vol. XVI, Coimbra Editora, L.da, Coimbra, 1940, P. 135

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Freguesia de Souselas – um povo com História

perto com a idade neolítica: em 1995, na estação de Vales Barrocas, descobriu-se material supostamente do período Neolítico, com pedras talhadas em quartzito; em Setembro de 2006, e na sequência do trabalho conjunto realizado pela Junta de Freguesia, Gabinete de Arqueologia Arte e História da Câmara Municipal de Coimbra e Instituto Português de Arqueologia descobriu-se nos Carrizes (Souselas), um machado de pedra do período do Neolítico (foto 24). O período civilizacional romano é o mais bem referenciado e estudado na freguesia, com um extenso rol de elementos desde logo descritos e inventariados na expedição de Vergilio Correia. Em Souselas relata que ouvira dizer que no Calvário «…quando há alguns anos plantaram uma bacelada, apareceu grande quantidade de tijolos grossos; e que no Curadoiro, para baixo da estação do Caminho-de-ferro se tinham encontrado sepulturas antigas. A uns 200 metros do extremo sul da povoação, no sítio das Moendas, vi ao fim de uma azinhaga vários fragmentos de barros, que pareciam romanos»(22) Para a povoação da Zouparria do Monte socorreu-se, uma vez mais, dos relatos orais: «…afirmaram-me no povo que lá, a uns 800 metros de distância da terra, nos Bacelos, apareciam telhões grossos como os dali. Não é raro também encontrar nos arredores, machados de pedra». Actualmente e na área da Zouparria existem duas estações romanas: a que referimos atrás, designada por Bacêlos e outra designada pelo nome do lugar, Zouparria do Monte. No território da freguesia existiam, na altura da expedição de Vergílio Correia apenas três estações romanas. A estação de S. Martinho do Pinheiro era uma delas e talvez a que mais despertara a sua curiosidade dado o «…interessante passado romano, digno de mais profundo estudo do que o que aqui lhe posso dedicar». A área da estação, segundo o distinto investigador, cobria o cabeço e os campos vizinhos. No cabeço destacavam-se os restos de cerâmica romana como «…telhas, tijolos, cacos diversos. Numa barreira cortada a pique, vêem-se sair do terreno grandes porções de ossos, em especial longos, mas sem ar de estarem dispostos em sepulturas (…) Junto das habitações vi restos dalguns círculos de tijolo, com mais de um metro de diâmetro, talvez antigas bôcas de poço, ou covas de bagaço. Em frente da povoação, no Campo, em volta de uma eira, há também numerosíssimos fragmentos cerâmicos, de tipo romano. Para quem vem da Zouparria para o povo, do lado esquerdo, encontram-se no caminho, e nos terrenos marginais, muitos tijolos, e grandes pedaços de telhas curvas e planos, com rebôrdo»(23).

(22) (23)

Id. P. 135. O Curadoiro é um topónimo de uma zona localizada junto à Adega Cooperativa. Id. P. 136

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II – Procurando as Origens

Outra estação romana localizava-se na Quinta de Lagares junto a SargentoMór e nela, em frente duma propriedade chamada do Forno, destacava-se um cabeço coberto de pinhal: «Quem o subir, encontrará os taludes abertos no terreno pelas passagens dos carros, cobertas de uma extraordinária quantidade de pedaços de tegulae, ímbrices, lateres, tijolos de coluna, uns negros outros vermelhos, e que ficam todos enterrados a mais de 0,80 de fundo. Além da cerâmica vi lá também ossos e pedras afeiçoadas, algumas de mós. Seguindo os caminhos que se cruzam no cabeço verifica-se que todo êle está recheado dêste espólio arqueológico, e que os destroços se prolongam principalmente na direcção de Souzelas e Quinta de Lagares, que fica em baixo»(24). A terceira estação foi integrada na descrição que então fez da freguesia de Brasfemes. Tratava-se da estação romana de Lagares, possivelmente de uma villa, onde o espólio era imenso: «Num espaço pouco superior a 200 metros de comprido por 50 de largo, os fragmentos cerâmicos amontoam-se, tegulae, imbrices, tijolos, todo o variado e pesado material de construção romana. Um proprietário das terras descobriu a dois palmos de fundo uma coluna com seu núcleo de tijolos de sector. A pequena povoação apresenta-nos o seu espólio completo. À superficie deparei com quatro mós manuais, meio deterioradas: duas de 0,5 de diâmetro, sendo uma girante, outra estante, de jogos diferentes; e outras duas pertencentes a um jôgo completo, com 0,8 de diâmetro. Diversos pesos me mostrou o proprietário: um grande, com 0,13 de comprido por 0,45 de largura, com um só orificio de suspensão; outro com dois orificios, quadrangular, mais pequeno; e ainda um terceiro, que apesar de partido pesava um quilograma, também com um único buraco»(25). Muito tijolo de 0,035 de espessura e dúzia e meia de sepulturas cavadas na rocha, total ou parcialmente destruídas, localizadas num morro, foram também mencionadas. No entanto, o autor destacou ainda uma insígnia religiosa pintada num nicho de um santo, cuja origem remontava à idade dos metais: «Perto do lugar de Lagares, está uma casa arruinada. Sôbre o portal cava-se um nicho vazio, e por cima dêste, ao centro de habitação, entre duas janelas, destaca-se a negro sôbre o rebôco avariado uma esgrafito em pintura, com o simbólio tetrascelo castrejo, continuação ignorada de uma tradição milenária»(26). Na povoação da Marmeleira existe uma estação arqueológica romana, recente, na Rua dos Mouros, onde foi encontrada uma ânfora (foto 25) e

(24) (25) (26)

Id. Pp. 136-137 Id. P. 112 Id. P. 113

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pesos do tear para além de uma grande quantidade de cerâmicas onde havia ruínas de casas e um antigo balneário, elementos que parecem apontar para a existência de uma villa romana. O sítio arqueológico situa-se a Sudeste da povoação de Marmeleira do Botão, numa encosta levemente inclinada para Oeste, em terrenos plantados com vinha. A estação assenta de um e outro lado do caminho - recentemente transformado em urbano - que tem início na estrada 1127, a qual atravessa a Marmeleira. O mais recente sítio arqueológico de Souselas localiza-se junto à Adega Cooperativa e tem o nome da zona – Lambaro. Ali se detectaram fragmentos romanos. À ocupação romana seguiu-se o Período Suevo-Visigótico, com os povos germânicos a ocuparem Aeminium (Coimbra actual), entre 412-586 d.C. Mas não só na grande urbe se fixaram, pois em Novembro de 1938 e na sequência do alargamento da linha ferroviária do Norte, foi descoberto um cemitério visigótico na zona dos Carrizes, onde jaziam sepulturas, com esqueletos de elevada estatura (1,80 m), para além de artefactos, fivelas e machados (foto 26). Menos vestígios materiais deixou a herança árabe, cuja presença se atesta, sobretudo, pela toponimia e, indirectamente, pelo aspecto lendário. De facto, em Souselas e ao nível da micro-toponimia assinalam-se alguns topónimos de origem árabe como Azenha e Almoinhas (pequenas hortas), ou outros que evocam a presença desta civilização como; Rua dos Mouros, Travessa dos Mouros, ou Buraco da Moura. De origem moçárabe temos vários topónimos como Alqueves, Amoreira, Arneiro, Arroios, Arroteia, Carrizes, Rosmaninhal ou Varzia. Nos tombos setecentistas que consultámos surge, também, a referência a uma zona de cultivo designada por cazinha dos mouros. Também têm sido encontrados alguns marcos que delimitavam os antigos senhorios na área de Souselas, caso do detectado no Carril (Marmeleira), e referente ao Mosteiro de Lorvão (foto 27).

3. A documentação antiga A povoação de Souselas poderá ter surgido entre o já referido documento de 919, que menciona a «portella de Salice» e outro, de 28 de Junho de 937(27), que é, na realidade, o primeiro a referir claramente a existência de uma povoação na nossa área de estudo (foto 28). Trata-se de uma doação ao Mosteiro de Lorvão (então de frades beneditinos) pela qual Justa e seus filhos lhe deixam

Alexandre Herculano; João Basto – Portugaliae Monumenta Historica, Vol. I, Diplomata et Chartae, Doc. Nº 44, 1867

(27)

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II – Procurando as Origens

tudo quanto possuíam na villa de Sausellas, exceptuando a baselica consagrada a S. Tiago: «Vos legámos conscientemente, com conselho íntegro e comum consenso, fazer pequena carta de Testamento, assim como fizemos de toda a nossa Herança e Propriedade. Desde as primeiras casas de pedra até tudo o resto do interior: ouro, prata, utensílios; todo o género de metais; panos sírios de linho e de lã; madeiras, vasilhas; leitos e cadeiras; mesas; alimentos e vinho; vinhas e hortas; terras cultas e incultas. Ainda tudo o que vier a usar da herança, por todos, neste século. Tudo vos concedemos integralmente depois da nossa morte em remédio da nossa alma. Retiro daqui o domínio da Igreja de São Tiago, naquela nossa vila de Souzelas, com seu serviço e seus utensílios. Referida atrás pela parte os sobrinhos e ainda para os meus netos que da sucessão serão preservados aquelas coisas na Igreja. Acrescentamos aqui também se aquela igreja vier a ser acabada com 60 passais à volta, que a sirvam fielmente, a favor da nossa alma»(28). Os termos do documento suscitam algumas dúvidas de acordo com a expressão utilizada (villa nostra de Sausellas), Justa e seus filhos seriam os únicos proprietários da villa-aldeia? E a referida baselica, seria uma igreja ou mosteiro? Outras cláusulas, como a reserva de propriedade sobre a baselica, parece explicar-se pelo facto de a mesma ter sido doada com a condição de nela serem párocos os seus sobrinhos e netos e, não os havendo, ficaria ao mosteiro. Justa consignou ainda ao mosteiro sesaginta passales in goio (60 passais) o que merece atenção especial: «era uma boa quinta, tendo o passo geométrico dous pés e meio portugueses, que são três palmos e meio de craveira. E dos passos, a que se estendia a imunidade, se chamaram passaes»(29). Este documento enquadra-se, cronologicamente, no tempo tumultuoso das guerras religiosas entre cristãos e árabes. Em 871 Coimbra foi reconquistada pelos cristãos tornando-se centro do Condado de Coimbra até 1093, passando a partir desta data a integrar o Condado Portucalense. Porém, os tempos eram de instabilidade pelo que, em 987, Coimbra caía para os mouros liderados por Almansor em 987, vindo a ser definitivamente reconquistada em 1064 por Fernando Magno de Leão. O contexto histórico desta documentação remete para um período muito específico da nossa história local, que medeia entre a Reconquista de Afonso III e a retomada da cidade de Coimbra por Almançor. Por estes anos, as aldeias no território de Coimbra eram numerosas, aproximando-se das 4 dezenas,

Anexos, Documento A. Joaquim de Santa Rosa Viterbo; Mário Fiúza – Elucidário das palavras, termos e frases, Livraria Civilização Editora, Porto, 1964, P. 467

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cujas origens devem andar relacionadas com a movimentação de povos bem característica da ambiência da reconquista, como nos recorda Jorge de Alarcão: «Tudo ponderado, parece-nos muito admissível que muitas (ou a maioria das aldeias documentalmente atestadas entre 883 e 976 tenham sido, porém, instaladas nesse período e tenham resultado de uma imigração de gentes vindas do Norte já cristão ou do Sul ainda muçulmano» ((30)). Estes imigrantes, a serem responsáveis pelo surto de formação de aldeias, como nos parece ter sido o caso, teriam necessidade de estruturas de apoio como alfaias, gados e sementes para darem início às suas explorações e, no plano religioso, de uma igreja local. Para tal contaram com o apoio do Condado de Coimbra, do Mosteiro de Lorvão e de famílias ricas. Importa aqui recordar o que dissemos noutro local: «O território vive os dramas da guerra religiosa contra o domínio árabe e os mosteiros asseguram o funcionamento possível das estruturas religiosas da Cristandade herdadas do tempo dos Romanos. Centros de religião, de cultura e de saber, os mosteiros esforçam-se por controlar a vida económica e social que decorre à sua volta, tentando estender, tão longe quanto possível, a sua influência»(31). Ainda dentro desta cronologia temos referências à Marmeleira. Trata-se de um documento de 9 de Janeiro de 973, em que Samaritana doa ao Mosteiro de Lorvão as suas villas-herdades(32) de Albiaster (Fornos) e Salas: «Eu, a referida Samaritana, tirei o testamento de concessão, fizeram assim como fizeram, e fiz a partir desta parte, em memória ao presbítero Pedro, de toda a minha herança, de quanto agora tenho ou venha aumentar sucessivamente e ainda poderei publicar até à minha morte. Esta é a vila de Fornos com terras cultas e incultas, vinhas, pomares; e vila de Salas com terras cultas e incultas, vinhas, pomares, a casa e todas as coisas no interior das casas que para uso possui. Aqui são os limites delas: sobre aquele rio de Fornos e continuai por aquela lomba daquele monte, do modo que se estende entre Crexemiris e Salas e atravesse aquela via que avança até Marmeleira, segui sempre naquela via da Vimeneira e continuai através de São Martinho de Paliares e ainda pelo lugar de Lombo; segui sempre naquele rio de Fornos.

Jorge de Alarcão – In Territorio Colimbrie, lugares velhos (e alguns deles, deslembrados) do Mondego, Trabalhos de Arqueologia, Nº 38, IPA, 2004, P. 22 (31) João Pinho – Freguesia de Eiras: A Sua História (Do século Décimo ao séc. XXI), Junta de Freguesia de Eiras, Coimbra, P. 83 (32) Segundo a documentação importa fazer uma importante distinção quando se fala em villa. Assim, uma villa-herdade tem ao contrário de uma villa-aldeia os seus limites demarcados por caminhos públicos, montes, fontes, cursos de água, fornos ou outras herdades. Já as villa-aldeia são aquelas villa que quando mencionadas se não indicam confrontações ou se referem outras aldeias em seu redor para as situar. (30)

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II – Procurando as Origens

Concedo-te tudo aquilo que acima refiro, para que na tua vida, em tudo te seja destinado. Depois da tua morte, permaneça simultaneamente o direito ao mosteiro Louvernense (de Lourvão)(33). Na demarcação referem-se os lugares de Vimeneira (Vimieira), Crexemiris, Saias, S. Martinho de Paliales e Marmeleira. Saias é um topónimo muito antigo na freguesia, que durante séculos correu com a forma Sayas e que em seiscentos e setecentos andava associado a uma regueira – a Regueira de Sayas. No último quartel do século XI, a villa da Marmeleira aparece na órbita de um desaparecido mas bem conhecido mosteiro: em documento datado de 11 de Agosto de 1086, Árias Mendes e sua mulher Tivilli doavam em testamento ao Mosteiro da Vacariça (concelho da Mealhada) a villa de Marmeleira (concelho de Coimbra), com reserva do usufruto da mesma para o cônjuge sobrevivente. Os restantes bens que possuíam destinavam-se à igreja de S. Salvador de Coimbra e à redenção de cativos(34). O estudo deste documento assume relevância especial não só no contexto local, mas também a nível regional: «A delimitação ia pelo cume do mons Triticus, que poderia ser o Alto da Cabeça Gorda e pelo mons Skulka, eventualmente coincidente com o marco geodésico da Marmeleira. O mons Triticus derivaria o nome do facto de aí se cultivar trigo ou de aí haver moinho(s) que moía(m) trigo? Neste caso, no alto de um monte, o(s) moinho(s) seria(m) de vento e teríamos a primeira atestação indirecta de tais moinhos, na região de Coimbra, em 1086»(35). Acrescente-se que, durante os séculos XVII e XVIII e de acordo com os Tombos de propriedades, existia na zona da Marmeleira o Cabeso do Monte de Trigo, possivelmente coincidente com algum dos acimas referidos, havendo ainda a acrescentar que no caso do Cabeço dos Moinhos existiam, até há pouco tempo, 2 moinhos de vento. Um está arruinado, enquanto o outro será objecto de recuperação pela autarquia. Num documento datado de 883, Afonso III de Leão e sua mulher D. Ximena, doam a D. Sesnando (bispo de Compostela ou um bispo de Coimbra) algumas vilas no termo de Coimbra. Uma delas localizava-se «in ripa de fluvio Viaster, cum ecclesia Sancti Martini»(36). Se o rio Viaster corresponde ao rio dos Fornos a dita villa bem poderia ser S. Martinho do Pinheiro ou Torre de Vilela (que tem como orago S. Martinho). O documento é do tempo de Anexos, Documento B. Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 372 P. 526 (35) Jorge de Alarcão – In Territorio Colimbrie, lugares velhos (e alguns deles, deslembrados) do Mondego, Trabalhos de Arqueologia, Nº 38, IPA, 2004, P. 63 (36) Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 12 P. 21 (33) (34)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

D. Sesnando e nele se refere (37) uma Belide Justes proprietária de terras não só em S. Martinho do Pinheiro, como em Botão e Arriel (Montemor). Porém, cremos que durante muito tempo a povoação de S. Martinho do Pinheiro teve a designação de Sancto Martino de Paliales (ou Paliares). É certo que se tivesse ocorrido a evolução toponimica normal a povoação teria, actualmente, a designação de S. Martinho de Palhais ou (Palheiros), o que não sucedeu. Pelo contrário, o que se reconhece e comprova é o aparecimento da povoação de Sancto Martino de Paliales em vários documentos e, apesar de interpretações contrárias, o conteúdo dos documentos (nomeadamente referências geográficas e toponimicas), aponta para uma localização que parece identificar-se com a povoação de S. Martinho do Pinheiro. Senão vejamos: A primeira referência detecta-se na já referida doação feita a Lorvão por Samaritana em 973. Noutro documento, datado de 1090, Basilissa designa a sua herdade por Sancto Martino de Paliales. Mas, em 1095, a dita Basilissa (ou Bailessa) e filhos doam, em testamento à igreja de S. Salvador de Coimbra e ao mosteiro da Vacariça, a igreja de Sancto Martino de Paliales com respectivos bens situada no território de Coimbra(38). No testamento, não datado, do presbítero João beneficiando entre outros a Sé e a redenção de cativos volta a mencionar-se a dita herdade. Mas, é no documento de 1095 que convèm centrarmos a nossa atenção: «… falar de heremita e não de ecclesia sugere, não um templo cujo sacerdote teria a cura animarum normal, mas um santuário que seria lugar de romaria. A sua exacta localização não é fácil. Dos documentos, parece depreender-se que ficava no limite da herdade de Basilissa com a de Árias Mendes (…) a ermida poderia situar-se na extrema oriental da herdade de Basilissa, isto é, onde confrontava com a herdade da Marmeleira. Isto, aliás, parece bater certo com a referência a S. Martinho de Paliares na doação, atrás vista de Samaritana (…) O facto de, no documento, os nomes das diversas herdades não aparecerem precedidos pela palavra villa permite-nos pensar que as herdades de Samaritana (ou de Salas) não vinham até à ermida de S. Martinho, mas até à herdade de S. Martinho de Paliares, isto é, até à extrema da herdade onde ficava a ermida e que, desta ermida, tinha recebido o nome. Quanto à data da fundação da ermida, podemos, pois, recuá-la para antes de 973»(39). A importância da ermida terá justificado o nome que o presbítero João deu à hereditas, com o prédio assinalado em S. Martinho de Paliaes, não por estar no interior da herdade de Basilissa, mas porque ficava numa área na

Jorge de Alarcão – In Territorio Colimbrie, lugares velhos (e alguns deles, deslembrados) do Mondego, Trabalhos de Arqueologia, Nº 38, IPA, 2004, P. 32 (38) Id. P. 64 (39) Id. P. 64 (37)

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II – Procurando as Origens

qual a ermida era um ponto de referência. Ermida que poderia ter existido no sítio assinalado por Vergílio Correia em 1940: Cabeço de S. Martinho(40). O documento de 15 de Agosto de 1103(41), pelo qual Mendo Mides e sua mulher Pomba, doaram à Sé de Coimbra uma herdade e uma igreja na Marmeleira, parece confirmar o que atrás expusemos. A descrição da herdade contida neste documento, intitulado «Testamentum de Sancto Martino de Paliares», permite-nos afirmar que pode tratar-se da mesma propriedade referida em 1095, apresentando contudo ligeiras alterações; a localização é agora explicitamente junto da Villa da Marmeleira, referindo-se a existência de uma «ecclesia» (e não já em ermida) em honra do «beati Martini». Outro documento, datado de 2 de Fevereiro de 1124, aponta no mesmo sentido da identificação de S. Martinho do Pinheiro com S. Martinho de Paliares. Trata-se de uma carta de venda, pela qual Bona Menendis e suas filhas Justa e Maria, vendem ao Cabido, por 100 soldos, uma herdade que possuíam em S. Martinho de Paliares, a qual confrontava a Ocidente com a estrada que ia para a Marmeleira(42).

4. O Mosteiro de Lorvão intensifica, no Séc. XII, o seu domínio sobre Souselas O Mosteiro de Lorvão foi fundado no último quartel do séc. IX, depois da tomada de Coimbra em 878(43). Os primeiros documentos conhecidos para Souselas enquadram-se no esplendor que alcançou por esses anos, antes do forte abalo trazido no séc. undécimo: «…atingiu enorme prestígio e riqueza durante o séc. X e mergulhou em grave crise no séc.XI»(44). A reconquista definitiva de Coimbra deu novo alento à casa monástica, que se reorganizou e estabilizou sob o governo do prior Eusébio (1086-1117): «Durante ele se processaram mudanças significativas na vida deste mosteiro, nomeadamente a adopção da regra beneditina, a sua concessão à Sé de Coimbra e ao seu bispo D. Gonçalo e a restauração do mosteiro pelo mesmo bispo» (45). Vergílio Correia - «Notas de Arqueologia e Etnografia do Concelho de Coimbra», In Rev Biblos, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Vol. XVI, Coimbra Editora, L.da, Coimbra, 1940, P. 135 (41) Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 12 P. 21 (42) A.U.C. – Cópia dos Documentos Latinos, Parte II, Fl. 1; Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 40 P. 70 (43) Maria Leonor Ferraz de Oliveira Silva Santos – O Domínio de Santa Maria do Lorvão no século XIV: gestão feminina de um património fundiário, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2001, P. 31 (44) Maria Alegria Fernandes Marques - «Vida e Morte de um Mosteiro Beneditino: o caso de Lorvão», Sep. de Os Beneditinos na Europa, 1º Congresso Internacional, Santo Tirso, 1995, P. 46 (45) Id. Pp. 46-47 (40)

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Como teremos oportunidade de constatar noutro local desta obra, o Mosteiro de Lorvão não foi o único grande senhorio a explorar a área territorial da freguesia de Souselas. Mas foi seguramente o maior, controlando e administrando o território para efeitos religiosos e económicos. No entanto, é curioso analisar o documento de 19 de Março de 1156, pelo qual D. Gonçalo, bispo de Coimbra, restaura o Mosteiro de Lorvão, que lhe tinha sido doado 7 anos antes pelo Conde D. Henrique e sua mulher, Dª. Teresa, entregando-lhes os respectivos bens e sujeitando-o ao beneplácito régio. É que nele não surge qualquer referência à povoação de Souselas como estando na dependência do mosteiro, embora assinale Vilela e Botão com sua igreja bem como o lugar de Salas(46), já referenciado nos documentos de 973 e 1095, que com algum esforço poderemos considerar correspondente a Regueira de Saias, microtoponímia actual de zona localizada entre Souselas e Zouparria do Monte. No séc. XII, e depois da restauração do mosteiro, o domínio territorial parece intensificar-se sobre a área em redor de Souselas. Estes anos correspondem, na história da comunidade monástica, à sua afirmação como mosteiro beneditino masculino, até se transformar, nos inícios da centúria seguinte, em cisterciense feminino. De facto, no decurso do séc. XII, a comunidade começa por impor-se no pequeno povoado de Lorvão e, aos poucos, o seu poderio vai-se estendendo pelas terras em redor. Atingirá a nossa área de estudo no final da terceira década da centúria, iniciando-se a partir de então um movimento de aquisição de terras (via compras) e doações (via testamentos). O património fundiário aumentará à custa da absorção de Casais, herdades e villas. O quadro abaixo (Tabela 1) sintetiza essa movimentação: Tabela 1 – Aumento do património fundiário do Mosteiro de Lorvão na área de Souselas, séc. XII Data Descrição Fonte Mendo Nunes e sua esposa Truila fazem testa- Fernando Garcia Pires, O Março mento ao mosteiro de Lorvão de uma proprie- Mosteiro de Lorvão – subsídios 1129 dade (herdade – tota hereditas) que possuem em para a sua História, 1126Souselas 1181, Coimbra, 1971 pp. 3-5 Paio Ramires e sua esposa Maria Rodrigues fazem Abril testamento de uma propriedade que possuem em Id. Pp. 36-38 1143 Outeiro de Rando, entre Vilela e Souselas Agosto Gonçalo Vaqueiro faz testamento ao de uma Id. P. 56 1147 propriedade (herdade) que possui em Souselas Dezembro Gonçalo Trotano faz testamento de um casal, com Id. P. 72 1156 todos os seus pertences, em Souselas

Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 61

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Data

Descrição Maria Sendiniz e seus filhos vendem ao mosteiro 9 de Lorvão a sua parte de uma propriedade (1 Novembro herdade) que possuem em Lagares por 30 mo1167 rabitinos Diogo Bom e irmão vendem uma propriedade Janeiro que possuem em Souselas, constituida por 1/3 da 1169 sua villa com casas, almoinhas, árvores Mendo Nunes e sua mulher Ermesinda Pais vendem ao mosteiro uma propriedade em Sazes (concelho de Penacova), outra perto de Marmeleira, Abril uma terceira em local não especificado e outra 1174 em Curral. Ermesinda faz também testamento ao mosteiro da terça parte dos bens que possuir, móveis ou imóveis Martinho Anaia e sua esposa Elvira Afonso venMaio dem um Casal com almoinhas que possuem em 1174 Souselas por 20 morabitinos Maria Açoreira e sua filha Elvira vendem as proAgosto priedades (hereditas) que possuem em Souselas, 1175 no “Vale de S. Pedro”, em Porto Seco e em Vilela

Fonte Id. Pp.118-120

Id. Pp. 131-132

Id. P.186

Id. Pp. 189-190 Id. Pp. 207-208

Sauselinis, que corresponderá a Souselas ou a uma pequena povoação junto desta (Souselinhas?) também surge na órbita do mosteiro. De facto, em 1165 e 1168 Diogo Godinho vendia ao mosteiro, respectivamente, 1/3 da villa e 1/6 da hereditas(47). Corresponderá esta povoação ao sítio ou local actualmente designado por Souzellinha ou Souzellinhas junto de Trouxemil? Em 1718 apresentava-se como uma zona de terras de cultivo exploradas pela Igreja de Santiago que ali detinha alguns Casais(48). O mesmo sucede com uma povoação designada por Saas (cujo nome poderá estar conservado no microtopónimo actual Saias e não em Sás como seria de esperar) onde o mosteiro recebe, entre 1168 e 1174, através de três vendas e um testamento, 2 hereditas e ¼ de outra e ¼ de villa. Mas Lorvão não estava só na disputa pelo território. Emergentes senhorios como o Mosteiro de Santa Cruz ou a Sé surgem na documentação produzida no decurso desta centúria, embora de forma esporádica. Em 1167, por exemplo, Gonçalo Godins doa ao Mosteiro de Santa Cruz 1/3 da sua herdade (totius hereditatis)(49). Por volta de 1180 e na conhecida notícia dos bens usurpados e posteriormente restituídos à Sé de Coimbra (graças aos

Jorge de Alarcão – In Territorio Colimbrie, lugares velhos (e alguns deles, deslembrados) do Mondego, Trabalhos de Arqueologia, Nº 38, IPA, 2004, P. 76 (48) Igreja de Santiago – Tombo dos Casais do Campo, Trouxemil, Carrima, Marmeleira e Rios Frios, 1718, Fl. 122v. (49) Jorge de Alarcão – In Territorio Colimbrie, lugares velhos (e alguns deles, deslembrados) do Mondego, Trabalhos de Arqueologia, Nº 38, IPA, 2004, P. 76 (47)

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esforços do bispo D. Miguel Salomão), pode constatar-se que esta poderosa instituição religiosa de Coimbra detinha herdades em Sausellas e em Sancto Martino de Paliales(50). E, entre os anos 1172 e 1182, receberá de Ermesinda Martins, por via testamentária, os bens que esta possuía em Souselas, designadamente, um Casal que pertenceu a Ama, deixando o usufruto do mesmo a Cipriano Clemente com a condição de este manter uma lâmpada acesa, dia e noite, na catedral de Coimbra(51). Porém, o Mosteiro de Lorvão manteve-se como o mais consistente senhorio da zona, vindo a ampliar o seu dominío pelo final do século: «Em Maio de 1197, ainda eram boas as relações entre a Sé de Coimbra e o abade de Lorvão, pois fizeram entre si um acordo sobre a posse e direitos episcopais nas igrejas de Souselas e S. Martinho (c. Coimbra), e Casal Comba (c. Mealhada)» (52). De facto, através desta permuta com o Bispo de Coimbra, D. Pedro Soares, o abade de Lorvão, Afonso, cedia os direitos que detinha na igreja de Casal Comba e Silvã (povoações hoje integradas no município da Mealhada) recebendo, em troca, a Igreja de Santiago de Souselas com sua paróquia e a de S. Martinho. A partir de Outubro de 1206, o Mosteiro de Lorvão seria ocupado por uma comunidade feminina. O fim do mosteiro beneditino e a passagem para mosteiro cisterciense resultaram de uma trama cujos contornos não se conhecem em pormenor. No entanto, sabe-se que a partir de Abril de 1206 ocorrem alguns episódios que parecem justificar, parcialmente, o que estava para ocorrer: o abade de Lorvão escusa-se a assumir como juiz apostólico numa questão entre o bispo e cabido de Lisboa e o mosteiro de S. Vicente; o abade de Lorvão renúncia ao seu mosteiro nas mãos do bispo de Coimbra; e a entrega do mosteiro por este bispo nas mãos de D. Teresa «…com a justificação de decadência moral e material da comunidade masculina» - são momentos que prenunciam os desenvolvimentos futuros ((53)). Neste contexto, o mosteiro mergulha em grave crise e alguns membros recorrem para a cúria romana, acusando o rei de Portugal de expulsão violenta dos monges e entrega do mosteiro a sua filha e freiras. Segundo Maria Alegria «…a figura central foi a ex-rainha de Leão e o desgosto da sua vida, a separação de seu marido e filhos, em 1195. Regressada a Portugal, terá preferido a vida retirada da corte, ainda que próxima dela. E nenhum mosteiro lhe terá agradado Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 3 P. 8 (51) Id. Doc. Nº 236, P. 367 (52) Maria Alegria Marques – Estudos sobre a Ordem de Cister em Portugal, Edições Colibri, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Lisboa, 1998, Pp. 85 e 100. (53) Maria Alegria Fernandes Marques - «Vida e Morte de um Mosteiro Beneditino: o caso de Lorvão», Sep. de Os Beneditinos na Europa, 1º Congresso Internacional, Santo Tirso, 1995, P. 61 (50)

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tanto como Lorvão – era prestigiado pela sua antiguidade e pelo seu passado, de ligação a reis e alta nobreza, não era na cidade (de Coimbra), mas próximo dela e da corte que aí sedeava com frequência. Escolhido o mosteiro, porque masculino, houve que iniciar um processo que justificasse o desalojamento dos frades»(54). A questão foi-se arrastando pronunciando-se sentença final por bula de Inocêncio III datada de 15 de Novembro de 1210: «…mandou retirar as freiras, reintroduzir os monges, restituir bens e dignidades e a rainha D. Teresa proceder à indemnização dos frades, pelas despesas feitas com o processo. Depois, retirar-se-iam os monges e distribuir-se-iam por mosteiros bem considerados, posto o que a rainha D. Teresa podia entrar no mosteiro, com quarenta freiras ou mais, segundo a Ordem de Cister»(55). A sentença papal foi cumprida e o facto consumado pelos inícios de Julho de 1211. Porém, os monges não aceitaram a reentrada no mosteiro nas condições estabelecidas, preferindo a renúncia pública e perpétua, forma de refutarem acusações e defenderem a memória futura. Esta mudança no rumo religioso do Mosteiro de Lorvão não produziu grandes alterações na administração do território, mantendo-se as relações senhoriais, económicas e religiosas, que se desenhavam na área territorial ao redor de Souselas.

5. Séculos XIII-XIV: Lorvão amplia o património Partindo de um património fundiário constituído em grande parte no séc. X, o mosteiro ao longo dos séculos seguintes, (XIII e XIV) foi alargando a zona de implantação, sendo de destacar a área entre as margens do Vouga e do Mondego. Acima do Mondego assumia especial relevo Botão (com o seu paço), mas também Souselas, Brasfemes, Penacova, Carvalho, Figueira de Lorvão, Pampilhosa e Sepins. Tudo aponta, no entanto, para um acréscimo de bens no séc. XIV e, em especial, pelo final da centúria, o que não deixa de ser contraditório: por um lado, esse foi um século de crise (económica e social, destacando-se a peste negra) e, por outro, a compra de património fundiário seria proibido às corporações religiosas (nas Cortes de Coimbra em 1211) e aos clérigos. Contudo, o acréscimo de bens da instituição, processado de forma dispersa e desordenada,

(54) (55)

Id. P. 61 Id. P. 62

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resultava daquilo que os seus fiéis lhe foram deixando (doações, heranças e legados), em especial na margem esquerda do Mondego e Ceira(56). Foi por esta altura que o mosteiro terá entrado na posse de mais propriedades na área de Souselas. A título de exemplo, colhemos a notícia (curiosa), de o ter feito através de uma permuta. Na última década do séc. XIV Álvaro Fernandes «…senhor de Carvalho, conseguiu que o Lorvão lhe entregasse casais, herdades e possessões que tinha no couto de Carvalho, dando-lhe em troca bens em Sabugosa (terra de Besteiros) e Souselas, que ofereciam mais elevados rendimentos do que aqueles de que o mosteiro ali desfazia»(57). Paralelamente, o mosteiro, que tinha metade de um Casal em Souselinhas, e para ficar com ele por inteiro, entrega a Fernão Gomes de Carvalho, um outro localizado em Carvalho. Por esta altura, assinala-se a existência de diferentes espaços maninhos (terras incultas ou estéreis), dispersos pela nossa área; Vilarinho, Botão, Rios Frios e Souselas, de grande utilidade no fornecimento de lenha e pastagens(58).

6. A Coroa e a Mata de Lagares (sécs. XV-XVI) Quando estudámos a freguesia de Botão (Pinho, 2002), referimos uma disputa entre o Mosteiro de Lorvão e a Coroa em 1280, a propósito da coutada de Botão, a qual se inseria na «…privilegiada situação natural da zona, de abundantes recursos florestais»(59). Esta coutada era rica em flora e fauna e, segundo os documentos que então consultámos, pertencia na altura à Coroa. No entanto, e de acordo com algumas testemunhas, transitara em data incerta e a pedido de D. Henrique, de Lorvão para os bens da coroa. Seja como for, em 1280 não existia consenso entre os litigantes quanto aos limites da mesma, obrigando à sua demarcação. A coutada, também conhecida por Matas de Botão, era um dos reguengos que o monarca possuía na região de Coimbra, sendo muito provavelmente aquele que os documentos assinalam com a designação de «Terras Galegas». Embora a documentação não seja muito clara a esse respeito, cremos que também a Mata de Lagares faria parte deste reguengo. Plausível é, também, a

Maria Leonor Ferraz de Oliveira Silva Santos – O Domínio de Santa Maria do Lorvão no século XIV: gestão feminina de um património fundiário, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2001, P. 38 (57) Id. P. 50 (58) Id. P. 69 (59) João Pinho – Botão mil ano(s) de historias(s), CCRC, Coimbra, 2002, P. 73 (56)

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hipótese de esta mata ter integrado os bens que transitaram para a Casa de Aveiro e que, com a sua extinção alguns séculos depois, voltaram à posse da Coroa. Estas matas, devido à sua grande extensão, necessitavam de funcionários régios que as vigiassem. Designados como monteiros, tinham de possuir um conhecimento territorial aprofundado, e estarem aptos a caçar e julgar em nome do monarca. Data do séc. XIII a documentação referindo a nomeação de monteiros para vigiarem a mata de Botão em nome do rei. Aos poucos, esta mata foi tomando a designação de Mata de Botão e Lagares, sendo conhecidas diversas cartas de nomeação de monteiros para os séculos XV e XVI (vide Anexos, Tabela 1). As cartas mais antigas de nomeação de monteiros para as Matas de Botão e Lagares datam de 25 de Setembro de 1441. Naquele dia e tendo-se aposentado no cargo Lourenço Afonso, morador em Vilela, foi nomeado por el- rei D. Afonso V, Álvaro Afonso, morador em Brasfemes: «…carta de Aluaro Afomso filho de Trabanlho (sic) morador em Brafemes termo de Coymbra per que o dam por monteiro das matas de Botom e Llagares em logo de Lourenço Afomso morador em Vyllella que se apousentou etc. Dada em a Aldea do Outeiro xxb dias de Setembro»(60). Os documentos régios do séc. XVI confirmam a importância da Mata de Lagares e Botão, mesmo que fosse em coisa pequenas e curiosas, como a que se segue. A 20 de Novembro de 1526, D. João III fez doação de uma árvore na Mata de Lagares para caçar pombos a Rui Galvão: «…eu ey por bem fazer merçe a Ruy galluãa arcediago da see da dita cidade de h a aruore que esta homde se chama ho lombo da ejra na mata de lagares termo da dita cidade pera que posa caçar nela pombos»(61). Em meados de quinhentos a mata conheceu grande esplendor. Tanto assim era que por duas cartas de privilégio separadas por aproximadamente um mês, D. João III (então em Évora) autoriza o corte de lenha (árvores) nas ditas matas: • A 29 de Outubro de 1545 concede tal privilégio a D. João Soares, bispo de Coimbra; «…me apraz e ey por bem que ello possa daquy em diamte mamdar cortar e trazer das matas do botão e de lagares ou de cada h a dellas toda a lenha que lhe for necesaria pera despesa de sua casa».

C.M.L Baeta Neves (direcção); Maria Teresa Acabado (Transcrição e revisão); Maria Luísa Esteves (compilação, sumário e indices) - História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. II, 1439-1481, Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas, Direcção Geral de Florestas, Lisboa, 1982, P. 34 (61) C.M.L Baeta Neves (direcção); Maria Luísa Esteves (compilação, transcrição e sumário) - História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. V, Fasc. I 1521-1527, Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, Secretaria de Estado da Agricultura, Direcção Geral de Florestas, Lisboa, 1988, P. 127 (60)

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• A 10 de Novembro de 1545 autoriza semelhante acto a Luís Pires corregedor da Cidade de Coimbra; «..que elle posa daquy em dyante mandar cortar e trazer das matas do botam e llagares ou de cada h a dellas toda a llenha que lhe for neçeesarya pera despesa de sua casa»(62). Este diploma tem, no entanto, a particularidade de acentuar importante papel reservado ao monteiro-mor a quem cabia decidir os locais donde extrair a lenha: «…a qual llenha se cortaraa e traraa daquelles postos e llugares que for asynado pelo meu monteiro moor das dictas matas (…) naquellas partes homde menos dano e perjuizo fizer». Sobre as funções, obrigações e privilégios do monteiro, recordemos o que dissemos há alguns anos, acerca da nomeação de António Roiz como monteiro das matas reais de Lagares e Botão: «Nesse documento o monarca além de nomear o referido indivíduo define-lhe também um conjunto de privilégios. Desde logo a isenção da pousadoria, isto é da obrigação de dar dormida e comida ao rei e seu séquito em caso de visita, definindo então “que não pouzem com elle nas casas de morada, adeguas nem cavallariças nem lhe tome pao, nem vinha, nem roupa, nem palha, nem sevada, nem galinhas, nem lenha, nem gado, nem bestas de sella, nem outra cousa nenh a do seu contra sua vontade…”. Do mesmo modo ficavam isentos de encargos concelhios, como o pagamento das fintas (contribuições municipais lançadas sobre os contribuintes quando as rendas do concelho não eram suficientes para suprir determinadas despesas), talhas, ou serviços em prol da comunidade tais como: pontes, fontes e calçadas. Estas isenções abrangiam ainda outros tributos registados em foral, como a jugada, ou o oitavo do pão, vinho e linho. Por outro lado, ficavam também isentos dos deveres militares, não devendo o almirante do rei obrigá-lo a integrar a vintena do mar ou os besteiros do conto. Além disso, o monarca advertia ainda “que não vá chamado de gallés nem servira por mar nem por tera salvo co o meu corpo avendo de ir em pesoa ou com meu filho…” Em contrapartida, os monteiros tinha obrigações a cumprir. A vigilância da mata não se cingia apenas aos recursos florestais. Se porventura algum porco, salvo os pertencentes aos moradores da dita mata, fossem encontrados no espaço territorial vigiado era determinado «que os matems em coima nenh a que seja e se alg a pesoa ou pesoas comtra esto forem parte ou em todo mando a este monteiroe aos outros monteiros seus parceiros que os prendão e os entreguem

C.M.L Baeta Neves (direcção); Maria Teresa Barbosa Acabado (compilação, transcrição) História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. V, Fasc. II, 1528-1564, Ministério da Agricultura, Pescas

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e Alimentação, Secretaria de Estado da Agricultura, Direcção Geral de Florestas, Lisboa, 1990, P. 181

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II – Procurando as Origens

as minhas justiças”. Estes delegados do poder régio, deviam no exercício da sua actividade obedecer a um conjunto de normas para sua própria segurança. Assim, além de recomendar que “tenha uma bosina e hum sabreiro e hum pellote verde”, deviam “trazer as armas de noite e de dia quais e quamtas elle quizer”, sob pena de ficar sujeito ao pagamento de 6.000 réis»(63).

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João Pinho – Botão mil ano(s) de historias(s), CCRC, Coimbra, 2002, Pp. 78-79

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III VIDA ECONÓMICA E SOCIAL – O TERRITÓRIO, OS SENHORIOS, EXPLORAÇÃO E OCUPAÇÃO DO SOLO

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1. Introdução o contrário do que em alguns locais se tem escrito, a Freguesia de Souselas não pertenceu apenas, em termos senhoriais, a dois importantes donatários como Lorvão ou a Comenda de S. Tiago. A nossa investigação prova o contrário. Segundo os registos compulsados para a área territorial da Freguesia de Souselas, e válidos para os séculos XVI-XVII-XVIII, nela intervêm uma multiplicidade de senhorios que organizam e exploram o território, e as gentes que neles habitam, em termos económicos. Além do Mosteiro de Lorvão e da dita Comenda, destacavam-se na área da Freguesia de Souselas: o Cabido, as Igrejas Colegiadas de Santiago, S. Cristóvão e S. Salvador (todas de Coimbra), a Universidade e a Casa de Aveiro. A um nível inferior, detinham pequenas unidades, de fraca expressão territorial, outros senhorios, que eram chamados a testemunhar a feitura de tombos, tais como; Mosteiro de Sant’Ana, Mosteiro de Arouca ou Convento de Odivelas. Dum modo geral, foi a riqueza agrícola que havia atraído os poderosos. Estudos recentes relativos ao séc. XIV, referem as vinhas das monjas e do mosteiro nas proximidades de Souselas(64). A elevada produtividade e rendimento de alguns géneros extraídos das férteis terras era, desde tempos imemoriais, apetecido. Já na relação paroquial de 1758 se assinalava; «…os frutos são: trigo, milho, vinho, e azeite; a mayor abundancia he de azeite»(65). A análise dos Tombos de propriedades promovidos pelos principais senhorios, assinalados anteriormente e respeitantes aos séculos XVI-XIX (fotos 29 e 30), permitirá compreender a geografia de implantação do seu domínio, quase sempre traduzida na organização do território em Casais(66).

Maria Leonor Ferraz de Oliveira Silva Santos – O Domínio de Santa Maria do Lorvão no século XIV: gestão feminina de um património fundiário, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2001, Pp. 62-63 (65) A. N. T. T. – Dicionário Geográfico de 1758, Souselas, Vol. 35, nº 238, P. 1701 (66) Por Casal compreende-se uma unidade agrícola de organização e exploração da terra, em regra constituída pela casa de habitação com os terrenos a ela anexos. Na dependência de determinado senhorio, a sua estrutura compreendia a existência de diversos cabeças de casal, cabendo a cada, um número variável de foreiros (ou inquilinos). O cabeça ficava responsável pela cobrança das rendas e pagamento ao seu senhor dos tributos e rendas dos inquilinos do seu casal. (64)

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O pagamento dos tributos que pendiam sobre as várias propriedades, que no conjunto constituíam cada Casal, seguiam determinada lógica: para as construções como casas, lagares, currais ou pardieiros, o foro era satisfeito em dinheiro (por vezes em capões ou ovos), enquanto nas propriedades de cultivo, os foros eram satisfeitos em cereais através de medidas de capacidade bem conhecidas do mundo rural: alqueires, solomis…com uma ou outra medida mais curiosa – caso do cabaço, meio cabaço ou rede de palha. No que toca aos senhorios religiosos, a relação com Souselas manteve-se até à extinção das ordens religiosas. Por exemplo, em 1827 e no livro de lançamento da décima na Freguesia de Souselas, referem-se os rendeiros dos dizimos(67) do Cabido, Universidade, Lorvão, Semide, S. Cristóvão e de D. Rolim, realidade que nos surge de novo em documentos pós-extinção. A existência desta realidade senhorial, que se reconhece nos registos manuscritos, é também testemunhada por numerosos marcos divisórios dos senhorios que se têm encontrado pela região.

2. O Mosteiro de Lorvão: o grande Senhor de Souselas e de parte da Marmeleira 2.1. Em Souselas Como se pode ler nas Memórias Paroquiais de 1758 relativas à Freguesia de Souselas «He Senhorio o Convento das Relligiozas de Lorvão». De facto, a comunidade cisterciense feminina de Lorvão era donatária de uma área muita significativa da freguesia, dela recebendo avultadas rendas e tributos. Uma primeiro indicio dessa relação detecta-se no já referido documento do ano 937. A sua influência estendia-se, essencialmente, em volta de Souselas, mas também na zona da Marmeleira. Dados que se colhem do Tombo de Souselas(68) de 1705, feito no triénio da abadessa Mariana Freira de Albuquerque (fotos 29 e 30). Para os senhorios, os Tombos eram instrumentos indispensáveis para a inventariação, avaliação e controlo das terras e das gentes que estavam sob sua administração. Um meio de fiscalizar, económica, social e juridicamente o território. O Tombo de 1705 foi antecedido por outros. Bem redigido e organizado foi também seleccionado porque, a nosso ver, se trata de um livro importantíssimo para a compreensão de diversas variáveis da relação Lorvão-Freguesia: área de

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Antigo imposto que se entregava à igreja para sustentação do culto e dos clérigos. A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705

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influência, organização e exploração da terra, espaço edificado, estruturas de produção agrícola, ocupação profissional dos seus habitantes, entre outras. O auto de reconhecimento geral feito pelos possuidores de fazendas «do lemite do lugar de Souzellas» realizou-se, em Souselas, a 24 de Maio de 1705, sendo Juiz do Tombo o Dr. Martinho Cortes de Carvalho e Procurador-Geral e Feitor do Real Mosteiro de Lorvão o padre Fr. Bartollomeu de Figueiredo. A citação aos moradores, e demais possuidores de fazendas, para «nomearem e declararem os foros que pagam ao dito Mosteiro» foi realizada por Manoel Gonsalves (morador no Ribeiro e escrivão do Concelho de Vilela) e Manoel Dias (pedreiro e morador no lugar de Souselas onde era escrivão do concelho). À partida para a feitura deste tombo, o Mosteiro de Lorvão era possuidor de 11,5 Casais os quais, por andarem «dezemcabesados e comfumdidos», prejudicavam a recepção dos foros. Assim e para a reposição dos foros, demarcações e medições elegeram-se como louvados: Antonio Simois (moleiro, morador no lugar da Azenha), Manoel de Souza Molle (morador em Souselas) e Manuel Fernamdes Parente (de Souselas, sendo nomeado pelo procurador do mosteiro). Os senhorios confinantes citados para assistirem ao acto, ou enviarem procurador, foram: a Casa de Aveiro, o Comendador de Souselas, a Universidade de Coimbra, o Cabido, a Igreja de S. Tiago, Mosteiro de Arouca, Gafaria de S. Lázaro, e o Mosteiro de Semide. Como curador dos ausentes e menores nomeou-se, a 5 de Junho de 1705, o Dr. Sipriano da Costa, morador em Souselas. O espaço territorial ocupado pelo senhorio lorvanense - os Casais de Souselas foi demarcado a partir do dia 14 de Novembro de 1705. A demarcação, balizada por dezenas de marcos, operou-se por etapas, sendo de destacar a medição e demarcação do espaço edificado. Esta, que corresponde à demarcação do lugar de Souselas, processou-se em dois momentos distintos. As diversas etapas sintetizam-se abaixo. A) Demarcação do espaço edificado (casas de habitação) • «Demarcação e medição da ametade do lugar de Souzellas com seus quintães do meio da Rua que vem da Igr.ª athe a Chrus do simo do lugar pera a bamda do Rio de Laguares»(69). Esta demarcação compreendeu diversas casas e quintais, desde a entrada do lugar junto à Igreja Matriz, à estrada que conduzia à fonte, e toda a área que conduzia à extrema com o Rio de Lagares (hoje Resmungão). • «Demarcação e medicão da outra meação e ametade do mesmo lugar de Souzellas que fica do meio da Rua pera a bamda das eyras em a qual demarcação emtrom tambem muntas terras que estom atras do lugar»(70).

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Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fl. 27 Id. Fl. 28

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Esta área confrontava com terras do Cabido, S. Cristóvão (neste caso terras e casas) e D. João Rolim. Compreendia as terras de cultivo em volta do povoado, as eiras localizadas atrás das últimas casas: ««…que fica do meio da Rua pera a banda das eyras com todas as terras que estam atras das cazas e pera aquella parte que pretensem ao mosteiro de Lorvão». Pela microtoponimia percebe-se que esta metade de Souselas se estendia para Norte: tinha princípio «na borda da estrada que vem da Igreia na quina dos pasaes da mesma Igreia», passava por baixo da eira de Manoel de Souza Manso, batia junto à «estrada que vem de Botão pera Coimbra», mais a Norte deixava esta estrada e tocava «pella estrada que se chama da borgolqua, junto ao covão» e chegava à vala do moinho da borgolqua. Mais para Nascente ia a Val de Vaide. Intimamente relacionada com a demarcação do lugar de Souselas, está a medição «das cazas e cham atras dellas que sam de Mel. Dias, e de Manoel Fernamdes Alentejano, e de Manoel Francisco Mariano as coais cazas estão no simo do dito lugar», bem como a «…de outras cazas e quintães que estam neste lugar de Souzellas junto a caza do conselho das quaes sam pesuidores Manoel Fran.co Mariano e Mel. de Souza Molle e Izabel padeira e Mel. dias e Fran.co de Souza, todos deste lugar»(71). No mesmo sentido vai a «Demarcação das terras e cazas pretensentes ao Real mostr.º de Lorvão no lugar de Souzellas emtre o Rio de Botão e o Rio que vem de Lagares»(72). Esta demarcação incluiu a Quinta de Martinho Pires Cordeiro, de Coimbra. Principiou «junto à ponte do murto entre as estradas», partia com estrada que vem de Botão «athe a quina do muro que esta peguado a chrus da porta da Igreia», seguia pela estrada principal e terminava na quina das casas do caseiro Martinho Pires. B) Demarcação da área rural (campo) Esta refere-se a uma multiplicidade de pequenas e grandes terras que constituíam a “reserva agrícola” por excelência da área em torno de Souselas: • «Demarcação de todas as terras que estam do Rio de Botão p.ª alem p.ª a bamda da Zouparria e Marmeleira»(73). Esta demarcação partia com os limites de Trouxemil, Zouparria, Marmeleira e Botão. Começava por cima do lugar do Ribeiro, na ponte pedrinha, ia pela estrada que seguia para Coimbra, cortava pelo mato até à estrada que vem da Marmeleira para Coimbra, ia à estrada da Marmeleira (carvoeyros(74)), Cabeço do Pezo e portella de almas (onde acabava de partir com os limites de Trouxemil e Zouparria).

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Id. Fls. 32v. e 34 Id. Fl. 25 Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fl. 15 Corresponde este topónimo à actual Estrada dos Carvoeiros

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Seguidamente iniciava-se a divisão com a Marmeleira. Acompanhava a regueira que vinha da zouparria, basellos, Cabeço da Carvalheira, batia na estrada que ia de S. Martinho do Pinheiro para Souselas, partia com as terras da Zouparria até chegar à regueira de sayas e, mais além, com a regueira de Val de Miguel, Cabeço da Carvalheira e porto do cleriguo. Com os limites de Botão partia em Porto Barreiro, na borda do Rio de Botão, ia à borgolga, ponte de frades «aonde se ajuntam as estradas da Marmeleira e a de Botão», «azinhaga do porto da Zouparria do Monte», Poso Redondo, «vala e levada das azenhas» e de novo Rio de Botão atè à ponte pedrinha onde teve princípio a demarcação. A delimitação prosseguiu, incluindo um conjunto de pequenas e grandes propriedades, ocupadas por cereais, vinhas e olivais (por vezes com associação de culturas), algumas consideradas individualmente (devido à sua importância económica) ou colectivamente quando diziam respeito a um conjunto de pequenas terras dispersas pelo território. Para melhor compreensão atente-se na descrição abaixo: • «Demarcação de huma terra e vinha q. esta por sima da ponte de frades alem do Rio de Botão defronte da borgolqua parte com a estrada que vem de Botão e o Rio e São Christovão e Cabbido e Lorvão e sam pessuidores o p.e Luis Pereira da Cunha de Coimbra e João Nugr.ª de Souzellas» • «Demarcação de hum cham que esta por baixo da ponte do murto do qual he pesuidor Manoel Lopés cardador de Souzellas» • «Demarcação de húm cham e terras e olival que esta por baixo da ponte do murto junto a ponte da azenha e chegua a estrada que vai de Botão pera Coimbra, da qual propriadade sam pesuidores Ursulla franc.ª v.ª e Mel. da Cunha murto e o p.e Mel. machéves (?) de Souza de Souzellas e outros» • «Demarcação de huma vinha que esta aonde chamão as estreytas junto a Ig.ra de Souzellas de q. sam pesuidores Sepriano da Costa e Luis Marques e Jozeph de Souza e Manoel Rodrigues todos de Souzellas e João Rodrigues do pizão dos Canevéaes» • «Demarcação de outra vinha que esta no mesmo sitio das estreytas de que som pesuidores João Couseiro e Manoel Dias pedreiro, e Manoel de Souza Manso e o Reverendo Vigairo, Manoel de Amaral e Cunha moradores neste lugar de Souzellas e outros» • «Demarcação de huma terra e vinha que esta aonde chamão o poso redondo peguado aos comaros das vinhas das estreytas, do qual he pesuhidor Manoel Françisco Mariano de Souzellas» • «Demarcação de outra vinha que esta ao porto da Zouparria por baixo do comaro das vinhas das estreytas pera o Rio de Botão de que he pesuidor Manoel de Souza Marques de Lisboa» • «Demarcação de huma terra que esta aonde chamão o pasal alem da Igreia, de que sam pesuidores Manoel Rodrigues e Manoel Fernamdes 105

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Violante, moradores neste lugar de Souzellas, e Ilena Antunes viuva, moradora nas Canetas» «…huma terra com suas oliveiras que esta aonde chamão o Rexio de que sam pesuidores Ursulla Fran.ca veuva de Souzellas e Antonio Simois Larco moleiro e m.or na Azenha» «…humas terras e olival ao Rexio…pesuidores An.to Simois Larco moleiro da azenha e Manoel Ribeiro e João Rib.ro e Pascoal Luis e Manoel de Souza Molle, todos de Souzellas e a comfraria de N. S. do Rozario desta Igr.ª de Souzellas e outros» «..humas terras que estão aonde chamão o simo de villa de que são pesuidores An.to Simois Castelhano e Mel. da Cunha Murto e Mel. Fran. co Mariano, e os erdeiros que ficarão de An.to Fran.co e Mel. de Souza Molle todos mo.rs no lugar de Souzellas e Mel. Duarte da Torre e Ant.º Frz. v.º do Ribr.º, e o Capitão mor fran.co da Costa Cardozo da Siogua e Jozeph de Brito m.or em Botão e tambem a dita terra chegua a Crus do Porto que esta no simo deste lugar de Souzellas» «…humas terras que estam aonde chamão a pedregueira por sima da Crus do Porto que esta no simo deste lugar de Souzellas pera a bamda de Val de Vaide das quaes sam pesuidores Manoel Fernamdes Parente o novo e Manoel Fran.co Mariano m.ors neste lugar de Souzellas» «…huma terra que esta aonde chamão a Portella defronte das azenhas que sam do Capp.am mor Antonio de Torres Pereira da Torre, de que são pesuidores da dita terra João Couseiro, e Mel. de Souza Manso e os erdeiros q. ficarão de M.ª Fran.ca v.ª todos mo.rs neste lugar de Souzellas e Antonio Fernamdes v.º m.or no Ribr.º» «…huma terra q. esta a Portelinha de Val de Vaide, e corre da dita Portelinha pera o dito valle da qual são pesuidores João Couceiro e Manoel de Souza Molle e Manoel da Cunha Branco todos deste lugar de Souzellas e o D.or Pedro Rodrigues de Alm.da de Coimbra» «…huma terra que esta pegada na barroqua de Val de Vaide de que he pesuidora Anna Fran.ca v.ª de Souzellas» «…huma terra que esta emtre o Val de Vaide e o Piluteiro …do pedoso pera sima athe chegar ao Piluteiro do qual são pesuidores, os erdeiros de An.to Fran.co e Pascoal Luis e An.to Rodrigues e o padre Mel. da Cunha Manso todos de Souzellas, e João Roiz Guavão da Torre, e o D.or Pedro Roiz de Almd.ª de Coimbra» «…huma terra que esta dentro da vinhas do pedaso, de que são pesuidores Manoel de Souza Manso, e João Rodrigues Marguarido, e Manoel da Cunha Branco todos de Souzellas, e An.to Simois Larco da Azenha» «…de todas as mais terras que vão da Barroqua do Mourão p.ª sima emtre o Rio de Laguares, e o Rio de Botão e partem com o lemite do Botão e 106

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com o lemite do Outr.º, e com terra de Monte Redondo, e com o lemite de Brasfemias que são de m.tos pesuidores…» «…das terras que estão da ponte do murto, athe a ponte pedrinha e partem como lemite da Torre e do Ribeiro das quaes terras ha muntos pesuidores» «…de outras terras que estão do Rio de Laguares pera a banda dalem, chegam ao Cabeso do Simois e sobre as almoinhas athe o curral do conselho e dahi pella estrada que vem da Torre athe a ponte e dahi pello Rio de Lagares abaixo, que são de muntos pesuidores» «…de humas terras que estão aonde chamão o isqueiro pera a banda do Lamoso defronte de Souzellas de que som pesuidores Luis de Oliveira pintor da Azenha e outros» «…humas terras que correm do Cabeso do Simois athe a estrada que vai de Souzellas pera a Torre que são de varios pesuidores» «…huma vinha que esta a Remolha de q. he pesuidor o Capitam Mor Ant.º de Torres Pereira do lugar da Torre» «…huma terra que esta ao porto per sima da crus q. esta no simo do lugar de Souzellas de q. he pesuidor o D.or Pedro Rodrigues de Almeida de Coimbra» «…das maes terras que correm da estrada que vai pera a Torre pera a Serra de Ilhastro pera a Quinta do Remungam, que são de muntos pesuidores» «…hum bocado de terra e caneveal que esta aonde chamão o Porto da Zouparria lemite de Souzellas, de que he pesuidora Marguarida da Costa veuva de Manoel Fernandes moradora no lugar de Souzellas»(75).

A demarcação destas terras ajudou, certamente, a reorganizar o território. Porém, de 11,5 Casais existentes à partida no território, passaram a 24(76) depois da feitura do tombo os Casais de Souselas na dependência de Lorvão. E, nessa forma de gerir e administrar economicamente o território todas as parcelas existentes (mesmo as mais ínfimas) foram levadas em linha de conta. Assim, o encabeçamento recaiu nos seguintes cabeças, a maioria dos quais residentes, obviamente, na sede da freguesia: António Simois, o novo (de Souselas), Bras Denis (Souselas), Antonio Fernandez Gorgoleiro (Souselas), Manoel da Cunha Branco (Souselas), Manoel Dias, lavrador (Souselas), Paschoal Luis (Souselas), Antonio Rodrigues Lisboa (Souselas), Jorge de Souza Molle (Souselas), Luis Marques (Souselas), Manoel Duarte (Souselas), Francisco da Cunha (Souselas), Antonio Simois Mariano (Souselas), Diogo Matheus, viúvo (Marmeleira),

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Dados retirados do Tombo de 1705 entre as Fls. 34v.-79v. Vide Anexos, Tabela 2.

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Ursulla Francisca,viúva (Souselas), Manoel Ribeiro (Souselas), Antonio da Cunha, pedreiro (Souselas), Manoel Roiz (Pizão do Canavial), Antonio Simois Zarquo, moleiro (Azenha), Domingos Francisco (S. Martinho do Pinheiro), Antonio Simois de Torres Pereira (Torre), Manoel Alvarez (Marmeleira), Jozeph Ribeiro (Marmeleira), Francisco de Souza Marques (Souselas) e Antonio Fernandez, viúvo (Ribeiro). Cada um dos cabeças de casal ficou responsável por determinado número de inquilinos (ele incluído), que por sua vez traziam aforadas um conjunto de terras do senhorio. Estes Casais, considerados na sua totalidade, deviam entregar ao Real Mosteiro de Lorvão, anualmente e por dia de S. Miguel de Setembro, prestações avultadas, nalguns casos reguladas por cláusulas complexas, que havia que respeitar: «…sento e dezouto alqueires de trigo emtrando a fogasa; e ou semto alqueires e meio de segumda, e querendo pagar hum de trigo por dous de segumda o poderão fazer, e que cada hum dos ditos cazaes antes que andasem mesturados e cumfundidos deviam pagar des alqueires de trigo e sete de sevada e huma coarta de trigo de fogasa, e huma gualinha e des ovos, e cada hum dos ditos cazaes era obriguado a pagar sete alqueires de trigo e sete de sevada de todo o monte antes de o rezoado e dezimado, e tres de trigo do seo proprio, e que dispois pello tombo mais moderno que se fes se comvierão com o dito mosteiro de pagarem tres por des do dito foro de todo o monte amtes de se rezoar e dezimar; e a coarta parte do proprio do lavrador dispois de resoado e dezimado, e outrosim tinham obriguasam de pagar doze guallinhas repartidas pellas fazemdas dos sitos cazaes, as coais doze guallinhas se devem repartir pellas cazas dos ditos cazaes os sento e quinze ovos (…) e que outrosim reconhesem que das mesmas fazendas dos ditos cazaes sam obriguados a pagar ao dito mosteiro o quinto de todos os fruitos e llegumes eseto o vinho e o azeite porque destes devem pagar de outo hum, e o vinho sam obriguados a pagar a bica do lagar, e o azeite sam obriguados a fazellos nos lagares do dito mosteiro, porem que o dizimo e a resam pagam em azeitona ao pe da olliveira, e emcoanto o pom o não podem tirar da eira sem primeiro chamarem o dito Senhorio o seu procurador ou rendeiro pera o resoarem e dezimarem e o linho devem pagar no temdal cortido e seco e que tem obriguasam de fazerem as fazemdas dos ditos cazaes sempre munto bem cultivadas e que não as podem vemder sem lisensa do Senhorio e vemdemdoos com sua lisensa lhe pagarão o terradigo comforme a partilha das terras, e que das cazas devem pagar de corenta hum, e coando venderem sam obriguados a cometer o cabesa se a quer tamto pello tamto, e que querem e som contentes que não pagando os inclinos o foro aos cabesas estes posom lansar mão das fazemdas sem que os inclinos posam ter asão alguma comtra elles, e que outrosim o reconhesem sam obrigados a pagar ao dito Mosteiro 108

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asim das terras dos ditos cazaes como de todas as maos de toda esta freguezia a tersa parte dos dizimos, e por coanto os ditos onze cazaes e meio andom dezemcabesados e comfumdidos querem e sam comtentes que de novo se reposita por toda a fazemda delles o dito foro de trigo e segumda, e galinhas, e ovos»(77). Os inquilinos distribuíam-se, geograficamente, como residentes em lugares da freguesia, ou fora dela: Souselas, Marmeleira, S. Martinho do Pinheiro, Zouparria do Monte, Lagares, Canetas, Vila de Botão, Outeiro do Botão, Larçã, Brasfemes, Vilela, Torre, Ribeiro, Fornos, Rios Frios, Trouxemil, Barcouço, Casal Comba, Pampilhosa, Coimbra, Dianteiro, Cioga, Vila de Ançã, Vila Verde, Vila Nova de Monsarros, Enxofães e Lisboa. Os caseiros de Souselas não estavam apenas sujeitos às exacções do senhorio. Pelo contrário, o poder civil exigia-lhe muitas vezes que contribuísse para determinadas obras públicas. Em 1590, o município coimbrão pediu que contribuíssem para uma obra pública fora da freguesia. A tal solicitação se opôs o mosteiro, alcançando por sentença de 17 de Maio desse ano «…que pelos privilegios do mosteiro de Lorvão, não estavam os seus caseiros, dos logares de Vilella e Sousellas obrigados a servirem com bois e carros na obra do caminho e ponte d’Assamassa»(78). Os privilégios dos caseiros estendiam-se a direitos reais como a jugada. De facto, por sentença da suplicação de 30 de Janeiro de 1623 julgou-se que «… não eram obrigados a pagar jugadas os caseiros e lavradores do mosteiro de Lorvão por qualquer guisa que lavrassem e posto não fossem encabeçados, sendo n’este privilegio comprehendidos os do logar de Sousellas que era limitado e demarcado do dicto mosteiro»(79). Uma análise atenta e pormenorizada à área cultivada nos 24 Casais de Lorvão existentes em Souselas(80) permite-nos apurar qual o tipo de ocupação do solo prevalecente em cada um deles o que nos facilita uma dupla leitura; em particular, quais as culturas dominantes em cada um deles e, numa segunda leitura, mais abrangente, quais as culturas prevalecentes na área na qual se implantaram e organizaram (ver gráfico 1).

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fls. 4-5v. A.H.M.C. – Registo, Tomo XIII, Fl. 106v. (79) A.H.M.C. – Registo, Tomo XXXIII, Fl. 108 (80) Desta análise se excluiu o espaço edificado, habitável permanentemente, e área em seu redor (que por vezes incluía unidades como quintais ou chãos também eles cultivados e agregados ao núcleo habitado pelo cabeça de casal ou inquilinos. (77)

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Gráfico 1 – Constituição dos 24 Casais do Mosteiro de Lorvão em Souselas por volta de 1705, quanto ao número de parcelas e ocupação do solo.

A totalidade dos Casais perfez 1118 propriedades, o que dá uma média de 46,5 por Casal. Com tamanhos e rentabilidades diversas, dividimos as ditas propriedades por classes, respeitando a organização definida no Tombo. Assim, a classe predominante em todos os casais era, sem dúvida, As Terras, totalizando 1005 propriedades (90% do total), o que indica uma característica do aproveitamento agrícola da zona – a superioridade esmagadora do recurso cerealífero. De facto, outras importantes culturas, como a Vinha representavam somente 6% (69 parcelas), seguida a longa distância pelos Chãos (31 propriedades ou 3%) ou ainda dos Olivais (apenas 6). Além destes, merecem referência outras classes que não analisámos em pormenor, como os Canaviais (4) ou as Eiras (3). Não sendo possível apurar, em toda a extensão, o tamanho destes casais optámos por analisá-los no que toca à concentração das propriedades ou seja; em que áreas da freguesia as duas principais culturas – Terras e Vinhas - se distribuíam. Assim inventariámos todas as propriedades que nestes Casais eram constituídas por terras e destinadas ao cultivo de cereais. E, para obtermos um registo das principais áreas, eliminámos todas aquelas que eram referidas menos de 4 vezes, obtendo-se uma amostra final de 500 registos (cerca de 87% do total) que produziu a seguinte distribuição geográfica (gráfico 2):

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Gráfico 2 – Localização e número de parcelas destinadas ao cultivo de cereais nos 24 Casais de Lorvão em Souselas, 1705

No sentido descendente, as principais áreas de concentração de propriedades destinadas a cultivo de cereais eram: Carris (47 propriedades localizadas nesta zona), Azenha, Vale de Vaide, Vale de Estrada, Vales, Regueira de Saias (com 28 propriedades), Basellos, Atrás das Eiras, Hortas, Pedaso, Carreira da Marmeleira, Valongo e Junqueira (com 15 parcelas). Quanto à cultura imediatamente dominante utilizámos todos os registos disponíveis; cerca de 78 vinhas. A distribuição da propriedade produziu uma concentração (ver gráfico 3) em torno das seguintes áreas: Estreitas (12 vinhas aí localizadas), Ramalhão, Varzia, Lapa Cavada, Basellos, Arneiro (com 6 vinhas), Azenha, Ribeiro, Lagares e Rugoyga (apenas 3).

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Gráfico 3 - Localização e número de parcelas destinadas a cultivo de vinha nos 24 Casais de Lorvão em Souselas, 1705

2.2. Na Marmeleira Assim que se finalizaram e sentenciaram os Autos do Tombo de Souselas, em Abril de 1706, o Mosteiro de Lorvão avançou para idêntico processo nos Casais que possuía em Larçã, Paço e Marmeleira, lavrando-se novo Tombo de propriedades(81). Deixando de parte os dois primeiros lugares da Freguesia de Botão, que já analisámos noutro momento (João Pinho, 2002), importa-nos perceber o que sucedeu na Marmeleira, ultimo dos três lugares a ser inventariado e organizado territorialmente. O reconhecimento geral dos possuidores das fazendas «do lemite da Marmeleyra» ocorreu, uma vez mais, na Vila de Botão e no Paço que o mosteiro ali possuía, no dia 14 de Maio de 1706. As autoridades (Juiz e Procurador do mosteiro) foram as mesmas que intervieram em Souselas, mudando apenas o responsável pelas citações, recaindo a escolha em Manoel de Oliveira, escrivão do concelho do Outeiro do Botão e ali morador. Porém, e à partida, os caseiros partem numa situação desfavorável perante o seu senhor, uma vez que declaram «… todos juntos e por cada hum de persi foi dito que elles nam tinham titollo algum»(82). Por outro lado, a feitura do tombo recorre ao costumado argumento de que «os ditos cazais andam confuzos», o

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A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 7 – Tombo de Larçã, Paço e Marmeleira, 1706 Id. Fl. 261

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que resultava em «que o foro novamente se reparte pellas fazendas dos ditos cazais», ou seja; em aumento das prestações. No terreno, o processo não nos parece que tenha corrido bem. Se, por um lado, não nos ficam dúvidas acerca dos 2,5 Casais que o mosteiro ali possuía, o mesmo não se pode dizer do número final dos encabeçamentos. Seriam três (o que estaria de acordo com o nosso levantamento efectuado ao longo das folhas do tombo) ou quatro (segundo a síntese final inserta no mesmo livro?). De facto, segundo o nosso levantamento os 2,5 casais passaram a 3 casais, de que eram cabeças: Manoel Fernandes Mathias, Manoel Fernandes Preto e João Francisco Ferreira (todos da Marmeleira). Contudo, no final, aparece a menção a mais um indivíduo que seria, deste modo, o 4º cabeça de casal – Manoel Simões o velho (também morador na Marmeleira). As obrigações dos caseiros, para com o seu senhorio, ficaram expressas na sentença final do tombo, datada de 10 de Junho de 1707, e pronunciada em Botão. Os caseiros da Marmeleira (3 ou 4), deviam entregar ao Mosteiro de Lorvão, pelo simbólico dia de S. Miguel de Setembro, um foro que totalizava: 19,5 alqueires de trigo, 3 galinhas, 1 capão e 35 ovos. Por outro lado, e segundo um costume antigo, cuja origem se perdia no tempo, fazia-se uma divisão territorial no que tocava à ração: «…e alem disto a Resam de todos os frutos, e legumes que Deos der nas ditas terras, a saber da estrada que vay de Botam para a Zouparria do Monte todas as terras que ficam pera a banda do Norte pagam de Resam a outava parte, e das terras que ficam da dita estrada pera a parte de Souzellas e a resam do vinho e azeite de oito hum e do pam e mais legumes de cinco hum, e que alem dos ditos foros e resões pagam tambem ao dito Mosteiro a terça parte dos dizimos de todos os fructos que deus der, e tambem das premicias e nam podem vender os bens dos ditos cazais sem licença do Mosteiro e vendendo (…) e nam pagando os inclinos dous annos perdem pera os cabeças as fazendas»(83). Acrescente-se, a título de curiosidade, que o pagamento de foros a recair sobre bens rústicos era, por vezes, satisfeito ao cabaço e meio cabaço (além das usuais medidas solomi e maquia). Passemos ao estudo do modo como se organizavam os Casais no território da Marmeleira. Em seu redor eram senhorios confinantes: Mosteiro de Odivelas, Universidade de Coimbra, Igreja de Santiago, Igreja do Salvador e Mosteiro de Semide. No entanto, nenhum comparece nem envia representantes, pelo que o processo segue “à revelia”.

(83)

Id. Fls. 328v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Por outro lado, o mosteiro possuía um prazo fatoezim, designadamente, «…huma vinha que está aonde chamam As Bragas, lemite da Marmeleira»(84), que tinha foro particular e não entrava na contabilidade dos Casais. Na altura, era foreira Anna Gil, filha de Diogo Gil, solteira e moradora no lugar da Marmeleira. A 17 de Novembro de 1706 reconhece o mosteiro como directo (ou direito) senhorio, com as obrigações de lhe pagar foro, ração e dizimo de todos os frutos que der «… e alem disto lhe paga em cada hum anno de foro e pençam por dia de São Miguel de septembro huma boa galinha e isto pera sempre»(85). Antes de definir, ao pormenor, as propriedades e inquilinos sujeitos a cada Cabeça de Casal, e à semelhança do sucedido em Souselas, demarcou-se, primeiro, a área conjunta ocupada pelos Casais. Tal como fizemos para Souselas, podemos subdividir esta demarcação em duas áreas: A) Espaço edificado (casas de habitação) • «Demarcaçam de muitas propriadades que estam juntas, e correm do simo do lugar da Marmeleyra comprendem em si cazas e vinhas, e terras que estam As Levogadas e orta do largo e Mainho que sam de varios pessuidores»(86). Esta demarcação iniciou-se ao cimo do lugar da Marmeleira e entre duas estradas «huma que vay pera a Pampilhoza, e outra pera as fazendas das levogadas». Passava pelos seguintes sítios ou locais: pam molete, cimo das levogadas, vinhas das levogadas, ortas do largo (ou Orta do Castelhano), Outeiro do Mainho, Souto, Cabeço da Pereira, tocava no «carreiro que vem de Santa Luzia pera o Sobral» e antes de findar ia «pello Rexio». • «Demarcaçam de humas cazas e currais de que sam pessuidores Antonio Simões Mariano e Bras Denis moradores no lugar de Souzellas, e Antonio Francisco o Lindo e Domingos Fernandes e Maria Francisca veuva e Manoel Rodrigues, e Antonio Francisco o novo, e Domingos Francisco Barrete e Joam Francisco Ferreiro e Manoel Simões o novo, e Maria Francisca veuva e Manoel Francisco o Neto, e Jozeph Francisco, todos moradores no lugar da Marmeleyra»(87). B) Área rural (campo) • «Demarcaçam das terras e propriadades que o Mosteiro de Lorvam tem no lugar da Marmeleira, e seu lemite». Compreende terras nos seguintes locais: Regueira de Sayas, Isgal, Crux, Banhos e Varzias.

(84) (85) (86) (87)

Id. Fl. 267 Id. Id. Fl. 277 Id. Fl. 283v.

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

• «Demarcaçam de humas vinhas que estam aonde chamam As Varzias da Regueira pera álem e chegam ao meyo do valle que chamam o Sidral das quais sam pessuidores Paschoal Fernandes e Jozeph Francisco Neto Manoel Fernandes Mathias e Domingos Francisco Sapateiro, e Manoel Fernandes Calçam Joam Francisco Ferreiro todos moradores no lugar da Marmeleira e o padre Manoel de Amaral e Cunha vigairo da Igreja de Souzellas e outros mais». Esta terra seria classificada e destacada como a «…propriadade grande que consta de vinhas e terra, e corre da dita Regueira pera o Poente pello monte asima, e chega ao meyo do valle que chamam do Sidral, a qual anda repartida e devidida por muitos pessuidores»(88). • «Demarcaçam de huma vinha que está As Bragas que he prazo de Lorvam, de que se paga em cada hum anno huma galinha e dez ovos, do qual sam pessuidores Manoel Gil e Anna Francisca Masulla moradores no lugar da Marmeleira e Joam da Cunha morador no lugar de Souzellas» • «Demarcaçam de humas terras que estam a Peza e á Relva, de que são pessuidores o padre Joam da Costa e Manoel Simões o velho e Manoel Fernandes Calçam e Manoel Fernandes Mathias (Marmeleira) e Manoel Couseiro de alcunha o Bispo (Villa de Botam) e outros mais» Além destes registos, foram inventariadas uma multiplicidade de pequenas propriedades em volta da Marmeleira. Nos Casais da Marmeleira, e como se pode ler na última folha do Tombo, o Mosteiro de Lorvão deu continuidade ao trabalho colossal de levantamento dos seus bens, indo em seguida para S. Martinho de Árvore, Sandelgas e lugar da Costa (no termo de Ançã). Tratando de modo mais específico, a área rural dos 3 Casais que o Mosteiro de Lorvão possuía na Marmeleira, importa referir que, no total, eram constituídos por 231 parcelas, o que dá uma média de 77 propriedades por Casal. No que toca à ocupação do solo, estas 231 propriedades, à semelhança do verificado com os 24 Casais em torno de Souselas, distribuíam-se por dois tipos de cultura (ver gráfico 4): as terras de cultivo de cereais (dominantes com 174 parcelas equivalentes a 75 % do total), seguido das vinhas com 37. Marmeleira que era, também, uma zona de alguma proliferação de chãos (11) e de alguns (poucos) olivais (6).

(88)

Id. Fl. 270

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Gráfico 4 – Distribuição das parcelas dos 3 Casais de Lorvão na Marmeleira por classes de ocupação do solo, 1706

As terras encontravam-se distribuídas por diversas zonas da freguesia (ver gráfico 5). No nosso estudo procedemos ao levantamento dos locais mencionados em Tombo, por mais de duas vezes (inclusive). Do conjunto há que destacar; Sobreiros (15 unidades), Carrapiteiros, Forno, Fonte do Sapo (9 unidades), Vale de Botão, Leira Longa, Vale de Ovelhas, Regueira de Saias (6 parcelas), Vale de Marinha, Regueira da Pedrulha, Vale Bom, Horta do Largo e Relva (4 parcelas). Gráfico 5 - Localização e número de parcelas destinadas a cultivo de cereais nos 3 Casais do Mosteiro de Lorvão na Marmeleira, em 1706

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A segunda classe de ocupação do solo mais representativa nos Casais de Lorvão na Marmeleira eram as vinhas (ver gráfico 6). Totalizavam 42 parcelas e distribuíam-se por diversas áreas entre as quais se destacavam: a Varzia (13 vinhas), Levogadas, Santa Luzia (5), Bragas, Horta do Largo, Mainho e Ribeiro (2). Gráfico 6 - Localização e número de parcelas destinadas a cultivo da vinha nos 3 Casais do Mosteiro de Lorvão na Marmeleira, em 1705

2.3. Azenhas, Moinhos e Lagares A Idade Média trouxe a difusão extraordinária dos engenhos de roda hidráulica, como as azenhas e os moinhos, já conhecidos de tempos distantes. Sabemos, por exemplo, que em pleno séc. XIV, a abadia cisterciense de Lorvão possuía uma assinalável concentração destes engenhos nas proximidades de Coimbra. Em 1422 – D. João I, a pedido do infante D. Pedro concede que Fernão da Fonseca, seu escudeiro e vassalo, e seus sucessores, tenham o monopólio de construção e exploração de todos os moinhos e “arteficios” desde Penacova até Buarcos, pagando 1/3 do que moerem, mas apenas 20 anos após a sua entrada em funcionamento. Por outro lado, desde 1516 que uma postura da CMC determinava que todo o moleiro que acarretasse cereal para os seus moinhos, situados nas freguesias à volta da cidade, era obrigado a passar com as cargas pelo “peso da farinha” isto é, por um posto de fiscalização situado na Praça da Portagem e destinado a verificar se não cobrara maquia em excesso.(89)

(89)

Carlos Alberto Dias Machado – Moinhos e moleiros de Cernache, Col. “Coimbra-Património”,

n. 8, CMC, 2007, Pp. 33-34

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Escreveu-se no Tombo de Souselas do ano 1705 e, a propósito dos tributos que o mosteiro devia receber «… que na quantia dos sobresditos foros não empoem os aforamentos das azenhas e moinhos por serem foros aparte»(90). De facto e pela análise deste Tombo, constata-se que o Mosteiro de Lorvão era senhorio directo das principais azenhas da área: lagares, moendas «no simo deste lugar de Souzellas» e dos moinhos do lugar da Azenha e da borgolga(91). Assim, fez reconhecimento ao Mosteiro de Lorvão como seu directo senhorio no dia 20 de Março de 1706, Antonia Gomes, de Coimbra. Tratava-se da viúva de Antonio Simois, ourives, a qual «…pesuhia humas azenhas sitas neste lemite deste mesmo lugar aonde chamão Lagares per prazo fatiozim» ((92)), e pelas quais pagava de foro e pensão por dia de S. Miguel de Setembro, 10 alqueires de «pam meado e huma gualinha e des ovos». A 25 de Março do mesmo ano, fez reconhecimento das azenhas «q. estam aonde chamão as moendas limite de Souzellas», o Capitão-mor Antonio de Torres Pereira, solteiro e morador em Torre de Vilela, que os tinha «por prazo fatiozim e perpetuo»(93). O foro e pensão cifrava-se em 10 alqueires de pam meado e «duas boas gualinhas», a saldar no emblemático dia de S. Miguel. Em Maio, reconheceram-se os moinhos. Primeiro, no dia 23, «hums moinhos de duas pedras que estam no dito lugar da Azenha». Andavam aforados por prazo fatiozim e perpétuo a Antonio Simois e mulher e Vitorio da Costa e mulher, os primeiros moradores na Azenha e os segundos em Ançã. O foro e pensão, a liquidar no mesmo dia dos anteriores reconhecimentos, consistia em 7 alqueires de pão meado. Entre Março e Maio, e com a realização do Tombo a caminhar para o seu términus, a atenção das autoridades envolvidas no processo centrou-se em engenhos semi-destruídos ou desaparecidos. No dia 20 de Abril, e nas pousadas do juiz, em Coimbra, o procurador do Tombo, Fr. Bartolomeu de Figueiredo, protesta direitos antigos do mosteiro: «…e por elle foi dito que no tombo antigo se acham reconhesidos dous ingenhos de moinhos no sitio da borgolga hums que moiem com Agoa da borgolga e outro com Agoa do Rio de Botão, os quaes de prezente estão derruidos e as pesoas a quem pretensem sam pobres e não tem poses pera os poderem rreedificar e que assim porteista pello direito do mosteiro se em algum tempose puderem por correntes, e que na mesma forma portestava por parte do dito mosteiro pera que lhe ficase seu Direito Rezervado (…) e a respeito de hum

(90) (91) (92) (93)

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fls. 4-4v. Borgolga localiza-se junto ao Rio de Botão, nas proximidades da Cimpor. A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fl. 540 Id. Fl. 541

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moinho do murto que esta no tombo antigo e delle não hoove signais que se dis o levou hum deluvio portestava tambem»(94). Uma das mais antigas referências à existência de um engenho de fazer azeite na freguesia, data dos anos 80 do séc. XVI e nele se refere o lagar do lugar de Lagares, numa altura em que no aro da cidade e seu termo se contabilizavam 61 lagares(95). O Tombo de 1705, refere a existência de vários lagares na área da freguesia: “da Robala”, da “Rugoyga”, o da Zouparria e o “lagar novo”, que se situava no limite de Souselas e defronte do ribeiro. Em 1748, o município efectuou o levantamento de todos os lagares de azeite, registando-se a existência de 84 unidades no termo coimbrão, cifra para a qual contribuíram os lagares de azeite da Zouparria do Monte e de Souselas(96). Dados que são confirmados pelo Dicionário Geográfico de 1758 onde se diz que «há nesta freg.ª dous lagares de azeite pertencentes a R. M. Abb.ª de Lorvão; e hum de Antonio Luis de Almdª.; do lugar da Torre; tem quatro azenhas de moer pão»(97). Contudo, e por duas escrituras separadas por apenas um dia, o Mosteiro de Lorvão e o povo do lugar de Souselas acordaram na construção de um lagar de azeite (provavelmente reedificação de um anterior existente no mesmo lugar) e de uma levada para o mesmo. O primeiro instrumento data de 12 de Junho de 1790 e foi celebrado nas «Cazas do Passo» da Vila de Botão. Tem o título esclarecedor de «Escritura de compra que fes este Real Mostr.º de Lorvão ao Capp.am Mel. Duarte do lugar de Villella e a seu irmáo Ant.o Duarte do lugar de Souzellas, de huma terra que esta no sitio do Pereiro ao simo do lugar de Souzellas na qual terra se fes hum lagar de Azeite a requerimento do Povo do d.º lugar de Souzellas»(98). A terra seria vendida por 10.000 rs e nela, além do lagar, poderia fazer-se «huma Azenha se lhe parecer e for preciza». O terreno «com soas pertenças e serventias», partia do Norte com a estrada que vaj de Souzellas para o Remungão e do Sul com a estrada que vaj junto ao Rio, e do poente parte Manoel de Oliveira, e com Pedro de Souza, e do nacente com Izabel de Souza viuva todos do lugar de Souzellas»(99).

Id. Fl. 544 António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. I, Coimbra, 1971, P. 507 (96) Sérgio Cunha Soares – O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo, Vol. I «Geografia do Poder Municipal», Centro de História da Sociedade e da Cultura, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2001, P. 76 (97) A.N.T.T. - Dicionário Geográfico, 1758, Vol. 35, Nº 238, P. 1701 (98) A.U.C. - Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Livro de Notas do Tabelião Manuel d’Azevedo, Fl. 1 (99) Id. Fl. 1v. (94) (95)

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O segundo documento (complementar do primeiro), data de 13 de Junho do mesmo ano e por ele se fez «Escritura de contrato de convenção feita entre varios labradores do lugar de Souzellas e o Real Mostr.º de Lorvão para se fazer huma levada para o lagar de Azeite no sítio do Pereiro ao simo do dito lugar, pelas terras dos sobreditos lavradores». Percebe-se, pelas cláusulas do contrato, o quão necessário era a reedificação do lagar: «E llogo ahi por elles todos juntos e por cada hum delles foi dito parante mim Tabalião e das testemunhas deste instromento ao diante nomiadas (…) que elles por reconheçerem a grande utilidade que lhe rezulta da fabrica de hum lagar de Azeite que denovo mandáo fazer as Relegiozas do Real Mosteiro de Lorvão no sitio do Perejro (….) pella rezão da grande comeniencia que recebem de lhes ficar o sobredito lagar mais perto de suas cazas para a fatura da sua azeitona que tem de desfazerem nos lagares do mesmo Mosteiro, que ficão mais distantes; e por não poder efeituarsse o dito lagar sem que a Agoa, que he propria do mesmo Mosteiro seja conduzida pellas fazendas delles sobreditos extipulantes; disserão que por este instromento davão licença ao dito Mosteiro para este poder mandar abrir valla pellas fazendas delles estipulantes para a condução da mesma Agoa para o referido lagar de Azeite = ou para qualquer Azenha que queirão fazer no mesmo sitio e que por esta se obrigavão por si e seus socessores, e erdeiros a nunca empedirem, ou tolherem de modo algum por si nem por interpostas pessoas a condução das ditas Agoas; obrigandosse tambem o dito Real Mosteiro a todo o preiuizo e damno, que aquellas agoas possão vir a cauzar pello tempo futuro, aos bens delles estipulantes»(100). O povo de Souselas, que mais uma vez se deslocou à Vila de Botão para defesa dos seus interesses, compreendia um leque alargado de indivíduos representativos da freguesia: Dr. João Alves (procurador de seu pai o Dr. Manoel Alves da Crus da Vila de Eiras) = Izabel Francisca e sua irmã Thereza Francisca = Lucas de Souza e sua molher = Pedro de Souza e sua molher = João Correja e sua molher = Antonio da Cunha e sua molher = Andre da Cunha, viuvo = Antonio da Murta e sua molher = Joze de Campos e sua molher = o padre Antonio Marques = Manoel da Cunha e sua molher = Joaquim Simoens e sua molher = padre Adrião de Souza = e o padre Theotonio da Cunha , todos do lugar de Souselas. Do lagar de azeite do sítio do Pereiro sabe-se que tinha uma azenha de roda vertical. Quanto ao lagar novo ainda existem vestígios da antiga construção.

(100)

Id. Fls. 3-3v.

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3. A Comenda de Santiago de Souselas Na Comarca de Coimbra existiam algumas Comendas, quase todas da Ordem de Cristo, como era o caso da Comenda de Santiago de Souselas. Esta, a par da Comenda de Almalaguês eram, aliás, as únicas sob a invocação de Santiago. A Comenda de Souselas anda relacionada com uma grande figura da história portuguesa do séc. XVII, António de Sousa de Macedo. Não sendo nosso objectivo traçar aqui a sua biografia completa, não podemos deixar de anotar os principais dados de uma vida intensa e preenchida. António de Sousa de Macedo nasceu no Porto a 15 de Dezembro de 1606, filho de famílias ilustres da zona de Amarante; era seu pai Gonçalo de Sousa de Macedo (fidalgo da Casa Real e Desembargador na Casa da Suplicação) e mãe D. Margarida Moreira. Ainda criança, o pequeno António de Macedo veio estudar para Lisboa, frequentando o Colégio de Santo Antão, onde aprendeu latim, Humanidades e filosofia, passando depois à Universidade de Coimbra onde se doutorou em Direito Civil. Em termos profissionais destacar-se-ia como notável político. Em 1641 foi nomeado Secretário da embaixada portuguesa junto da Corte de Inglaterra, numa altura muito sensível para o reino português que recentemente se havia livrado do domínio espanhol. Juntamente com o embaixador português na Inglaterra, D. Antão de Almada, defendeu a causa de D. João IV: «Aos esforços destes dois portugueses distintíssimos se deveu em grande parte, que a Inglaterra viesse a reconhecer os direitos do duque de Bragança, porquanto não parecia aquele governo muito disposto a favorecer a restauração patriótica»(101). Ainda naquele ano, envolveu-se na polémica questão que havia motivado a prisão do Infante D. Duarte, irmão do monarca português. Assinado o tratado de aliança entre Portugal e Inglaterra, a 29 de Janeiro de 1642, Macedo manteve-se em Inglaterra como ministro residente. Durante os tempos próximos, tomaria parte activa na questão política que agitava aquele reino, entre Carlos I e o parlamento, auxiliando o monarca inglês o mais que pôde, de tal modo que este lhe daria mostras de dedicação pessoal, escrevendo-lhe, por exemplo, uma carta em Fevereiro de 1645, onde manifestava pesar pela sua próxima partida para Lisboa. De regresso à pátria, Macedo não se quedou por cá muito tempo. Em 1650 foi nomeado embaixador na Holanda, ao tempo uma das mais difíceis missões

Portugal – Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Numismático e ArtísticoI, Vol. VI, (edição electrónica), 2000-2009. Pp. 1084-1807

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diplomáticas, pois aquele reino procurava a harmonia com todas as nações europeias receando, contudo, que a Espanha se tornasse sua inimiga devido às boas relações que mantinha com Portugal. Em 1652, regressa novamente a Portugal, intervindo decisivamente na recuperação de Pernambuco, sem que desse facto resultasse uma guerra marítima com a Holanda. Os dez anos seguintes foram, para Macedo, de interregno na vida política, mas de trabalho como jusrisconsulto. Em 1662, o jovem monarca D. Afonso VI nomeia-o, por conselho de Castelo Melhor, seu Secretário das Mercês e, em Janeiro de 1663, foi nomeado Secretário de Estado. Este ano aproximaria António de Sousa de Macedo da Freguesia de Souselas, embora de forma acidental e distante, na medida em que por decisão del-rei foi «…agraciado com as comendas de S. Tiago de Souselas na Ordem de Cristo, e de Santa Eufémia, de Penela, na ordem de Avis, e com a alcaidaria-mor de Freixo de Numão»(102). Figura de dimensão nacional, produziu ao longo da sua vida imensos documentos, livros, folhetos, etc, (alguns em língua castelhana) que permitem classificá-lo como escritor e jornalista. A relação das obras que compôs pode ser consultada na Biblioteca Lusitana e no Dicionário Bibliographico. António Macedo faleceu a 1 de Novembro de 1682 em Lisboa, no Largo do Poço Novo, onde tinha o solar de família (local onde mais tarde funcionou a Escola Rodrigues de Sampaio e, posteriormente, a Escola Comercial D. Maria I) e residência dos seus descendentes, os condes de Mesquitela. Foi sepultado na igreja do Convento de Jesus, na capela do Senhor Jesus da Misericórdia (freguesia das Mercês). O Largo do Poço foi rebaptizado em homenagem ao comendador, sendo actualmente designado como Largo Dr. António de Sousa de Macedo. António de Macedo deixou um filho, Luis Gonçalo de Sousa de Macedo, 1º Barão da Ilha Grande, de que seu pai era donatário (título que aparece em muitos documentos relativos à vida económico-social da Freguesia de Souselas). Conhecemos alguns dados acerca da Comenda de Souselas, embora de cronologia relativamente recente. Entre 1810 e 1814 dela saiu um total de 587$998 para a contribuição extraordinária de defesa(103). Com mais pormenor pode-se acompanhar a evolução da Comenda de Souselas entre 1812 e 1828. Durante estes anos prestou contas na Provedoria de Coimbra, tendo andado sempre arrendada. Até 1816 foi comendadora a Viscondessa de Mesquitela e Armeira-Mor, D. Maria Joze de Souza de Macedo Vidal, embora a comenda fosse administrada por seu filho, o visconde D. Luiz

Portugal – Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Numismático e ArtísticoI, Vol. VI, (edição electrónica), 2000-2009. Pp. 1084-1807 (103) A.U.C. – Fundo da Provedoria: Livro das Comendas Colectadas nesta Comarca de Coimbra pela Provedoria, 1810-1819, Fl. 25 (102)

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da Costa e Souza de Macedo. A partir daquele ano ficou vaga na real coroa, passando a ser administrada pelo Juizo da Comarca de Coimbra, por ordem do Tribunal da Mesa da Consciencia e Ordens (104). Esta comenda sustentava a congrua do Vigário de Souselas (40$000 reis) e garantia o pagamento das décimas. No que toca aos rendimentos (que eram variáveis) vejam-se, a título de exemplo, os de 1817. Neste ano totalizou 190$378 reis, produto da venda dos seguintes géneros agrícolas: 257 alqueires de milho a 300 rs o alqueire; 13 alqueires de «feijão rajado» a 300 rs; 11 alqueires e 1 maquia de «fajão frade» a 300 rs o alqueire; 12 alqueires de trigo a 400 rs o alqueire; 5 alqueires «menos hum selamim de cevada» a 200 rs o alqueire; 103 almudes de vinho a 200 rs o almude, e de miunças 9$865(105).

4. O Cabido da Sé de Coimbra: na Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro Comparativamente a Lorvão, o Cabido da Sé de Coimbra não detinha muitas propriedades na freguesia, nem ocupava uma área destacada. No entanto, a sua presença detecta-se nos três lugares da freguesia assinalados. Já no século XIII o Cabido adquirira propriedades na Marmeleira: em Janeiro de 1232, Pelagius Muniz e sua mulher Maria Suaris vendiam-lhe um Casal aí situado pelo preço de 23 morabitinos; em Janeiro de 1276 recebia, por doação, um meio Casal e metade de uma vinha que pertenciam a Urraca Martis, comprando no mês seguinte a outra metade ao mesmo possuidor por 58 morabitinos; e, em Junho, comprava metade de outro Casal a Maria Felicis por 55 morabitinos(106). Ao longo dos anos, o Cabido foi rentabilizando estas propriedades, havendo notícia de ter emprazado dois Casais, a 7 de Junho de 1402, a João de Torres morador na cidade de Coimbra: «…dum cazal que havemos em Souzellas, que tragi Fagundi Annes, e doutro cazal, que havemos na Marmelleira, e tragi hum meio Miguel Migueis, e outro meio Domingues Annes», com a renda e pensão de 12 libras de dinheiros portugueses (metade pelo Natal e outra metade por dia de Páscoa) e 1 par de capões por dia de S. Miguel de Setembro(107).

A.U.C. – Fundo da Provedoria: Livro de Lançamentos da Décima das Comendas da Comarca de Coimbra, Fl. 4v. (105) A.U.C. – Fundo da Provedoria: Livro de Lançamento das Comendas situadas na Comarca de Coimbra a cargo da Provedoria, 1817-1828 Fls. 4v.-5 (106) A.U.C. – Fundo do Cabido: Cópia dos Documentos Latinos – Parte II, Fl. 94-96v. e 104 (107) Id. Fls. 96-96v. (104)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

No cartório do Cabido constam elementos que nos mostram uma política de emprazamento, promovida nas centúrias seguintes por este senhorio, nos Casais que possuía na Marmeleira. Assim, e segundo o reportório dos prazos, datado de 1481, o Cabido detinha no designado «Titullo da Marmeleira» 10 aforamentos de casais em «fatiota»: um casal a A.º Domingues; um Casal a Rodrigo A.º; outro Casal a Bastião Esteves, outro a A.º Roiz e Brites Annes; outro a B.am A.º e D.º Prz; mais 2 Casais a Fr.cº e a Alvariannes; um Casal a Acenco Vaz; outro Casal a Rodrigo A.º. e um Casal ao Bacharel Eitor Teix.rª (108) Os dados relativos ao séc. XVI dão conta da mesma opção pelo emprazamento em «fatoezim»: de um casal feito em 1557 a Francisco Afonso, da Marmeleira, com o foro anual de 4 alqueires de pão meado e um alqueire de fogaça, 2 capões e 20 ovos pelo S. Miguel; emprazamento em «fatoezim» perpetuo de um Casal feito em 1557 a Asensso Vas, da Marmeleira, com foro anual de 4 alqueires de trigo, 4 de cevada 3 2 de trigo de fogaça, 6 capões e 20 ovos e 1 alqueire de trigo para a capela; emprazamento em 3 vidas de dois Casais feito no ano de 1584 a Antonio Carvalho com o foro anual de 1500 reis e 6 capões(109). Este senhorio elaborou um Tombo das propriedades, datado de 1722. Na Marmeleira possuía 2 meios Casais e, o processo para a sua destrinça e inventariação, iniciou-se a 4 de Novembro de 1722. As autoridades reuniram-se nas «cazas de apozento», em Barcouço, numa altura em que havia findado o trabalho relativo ao «tombo de Barcouso e suas pertensas». A autorização para a elaboração doTombo do «cazal da Marmelleira de Botão», datava de 9 de Agosto de 1710 (alvará régio) tendo nomeado como Juiz, Lourenso Gonsalves Vaz Morilhas, Procurador do Cabido, o padre capelão Manoel Carvalho Curado (procuração datada de 10 de Julho de 1721) e para escrivão do mesmo, o bem conhecido Christóvão de Almeida. Os senhorios confinantes foram citados a 16 de Novembro de 1722: os conhecidos Mosteiro de Lorvão, Igreja de Santiago, Igreja de S. Cristóvão, Universidade de Coimbra e Mosteiro de Semide, mas também outros ainda desconhecidos como Callisto Rangel (morador na sua quinta do Rangel junto a Coselhas), ou Lourenso Aires de Saa e Mello, morador na Anadia. Neste Tombo adoptou-se o sistema de reconhecimento geral dos inquilinos por cada meio Casal. Assim, o auto de reconhecimento do 1º meio casal, ocorreu a 27 de Novembro, nas casas de aposentadoria do juiz, no lugar da

A.U.C. – Fundo do Cabido: Reportório breve dos prazos da Sé, 1481, Fls. 263-264 A.U.C. – Fundo do Cabido: Documentos diversos (cx 2), Subpasta “Diversos emprazamentos, Index do Lº 13 e 14 (108) (109)

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Marmeleira. Este meio Casal, de que fora antigamente cabeça Alvaro Annes e seu filho Jorge Alveres, passou a ter um novo cabeça, Antonio Simois, de Souselas. Na destrinça e nova divisão do Casal, feita pelos louvados Andre Fernamdes Barrete e Domingos Fernamdes Christina, atribuiu-se o foro de «Quatro alqueires de pão meado trigo e sevada de todo montee hum alq.re de trigo de fogasa proprio dos lavradores»(110). Este meio Casal era constituído apenas por área agrícola. No âmbito do seu circuito geral destacavam-se as seguintes áreas e respectivas culturas: terras, vinhas e mato «no sitio do Souto»; uma terra «ahonde chamão Bragas»; uma vinha e terra «ahonde chamão Santa Luzia»; duas terras «ahonde chamão as ortas da fonte»; uma terra ahonde chamão as ortas da pepa» e «hum sercuito de vinhas ahonde chamão do pee do carril»(111). O segundo meio Casal na Marmeleira, teve auto de reconhecimento geral no mesmo dia do anterior. Pertencera a Affonco Roiz, mas passou a ter novo cabeça, Manoel Fernandez Barrete, morador na Marmeleira. Ao contrário do anterior, a área ocupada estendia-se pelo espaço edificado da Marmeleira: abrangendo as «cazas terrias» do cabeça de casal Manoel Fernamdes Barrete e sua mulher; bem como as de Manoel Simois boticario e mulher; «a caza terria que serve de curral de bois» de Antonio Francisco Lindo e sua mulher; a «caza terria com seus pardieiros e cham por detras» de Domingos Fernamdes Christina e mulher; e ainda a «vinha com sua caza de lagar de fazer vinho com seus matos pinheiros e terra», localizado no citio do Lameiro, na posse conjunta dos inquilinos Roza Maria, viúva de Antonio de Almeida, ourives e Jozeph Duarte da Gama (boticario). No entanto, a área agrícola seria, obviamente, dominante, tendo-se demarcado: uma terra no canto da Nugueira, outra a Relva, duas leiras de terra na Leira Longa, outra leira de terra na Remolha, uma terra ao carril, com a particularidade de «que chega a rua com suas moradas de cazas e currais» e uma vinha na Vargea. Mas, eram as terras de cereais a grande área deste meio Casal, estando situadas nos seguintes locais: Val de Botão, Val Bom, Arneiros, cazinha dos mouros, Regueira de Saias, Mixilhão, Lameiro, Matinho Redondo, Porto da Pedra, Permozelha, Outeiro Grande, Val de Ovelhas, Tapado do Goivo e Leira Longa – um conjunto de microtopónimos que na sua maioria ainda subsistem. Em Souselas, o Cabido também detinha algumas propriedades. Segundo o citado reportório de 1481, e integrando o «Títullo de Souzelas», encontramos os seguintes Casais: um a Pero Glz e Marg.dª Piz, que incluía a satisfação de um foro constituído por 12 alqueires de pão meado de todo o monte, 1,5 alqueire de trigo de fogaça, de medidagem 1 alqueire de trigo do seu próprio, e de carreto

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A.U.C. – Fundo do Cabido: Tombo da Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro, 1722, Fl. 38 Id. Fls. 28-36

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de cada quarteiro, 1 alqueire e 1 «espadoa de porquo de 9 costas, e 1 pinta de manteiga», e 1 capão, 10 ovos, «1 teielada, e hua escudela de leite»; outro a B.ar Piz, Simão Piz, Ines Piz e B.ar Piz seu cunhado; um meio Casal que foi de Pero Glz; e ¼ de Casal a Mateus A.º(112). Além deste bens, o Cabido aforou, a Martim Alz e Branca Annes umas terras situadas entre Souselas e a Torre. A documentação do cartório regista, para o século XVI, a continuação do fomento ao aforamento: um Casal, em 1543, aos irmãos Simão, Baltezar, Igns e Isabel (todos usando o apelido Inz) passando assim a 4/4 de casal, de que deviam pagar ao todo 6 alqueires de pão meado, 1,5 alq. de fogaça, 4 capões e 40 ovos; aforamento em «fatoezim de ¼ de Casal, feito em 1563, a Matheus Affonco pagando de foro 3 alqueires de pão meado, 1 capão e 10 ovos de fogaça e de carreto meio alqueire e «salami»; aforamento ao mesmo, em «fatoezim» perpétuo, de meio Casal no ano de 1605 (o qual pertencera a Pero Goncalves, de Souselas, com o foro anual de 2 capões, 20 ovos e 6 alqueires de pão meado e ¾ de trigo de fogaça e meio alqueire de trigo de carreto(113) Já no século XVIII, e um pouco antes de tombar os casais administrados na Marmeleira, o Cabido aproveitou para proceder à inventariação dos 4 meios Casais que possuía em Souselas e de que também era directo senhorio. Neste caso e com as mesmas autoridades envolvidas, tudo se iniciou com o alvará régio autorizando os autos de Tombo, datado de 19 de Agosto de 1722. O primeiro meio Casal foi reconhecido e demarcado durante o mês de Dezembro de 1722, embora a destrinça só tenha ficado concluída em Fevereiro do ano seguinte. Pertencera, como atrás se viu, a Matheu Affonco e foi nesta ocasião encabeçado em Manoel Francisco, víuvo de Souselas. Compreendia 10 inquilinos e, toda a sua extensão, era agrícola, à excepção das «moradas de cazas terrias», pertença de Antonio de Souza, Mathias de Souza e sua irmã, moradores no Lugar da Azenha. A demarcação do seu território assinalava terras nos seguintes locais: Atras das Eiras, Borgolga, As Vallas, Fonte da Azenha e Lamozo. Contudo este meio Casal assume especial importância pois nele se incluiu a «demarcasão de huma terra ahonde chamão o pasal»(114). Sobre este meio casal pendiam os seguintes tributos: Foro de «seis alq.res de pão meado de todo o monte e tres quartas de tr.º de fogasa do seu proprio e meio alq.re do carreto dous capoes e vinte ovos (…) Resão de quinto de toda a novidade q. se tira por dizimar com o dito foro (…) Laudemio na forma da partilha»(115).

A.U.C. – Fundo do Cabido: Reportório breve dos prazos da Sé, 1481, Fls. 336-336v. A.U.C. – Fundo do Cabido: Documentos diversos (cx 2), Subpasta “Diversos emprazamentos, Index do Lº 13 e Lº 17; Indice dos Acordos do Cabido, Fl. 47 (114) A.U.C. – Fundo do Cabido: Tombo da Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro, 1722, Fl. 132 (115) Id. Fl. 128 (112)

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O segundo meio Casal do Cabido em Souselas foi destrinçado durante o dia 15 de Fevereiro de 1723. Tinha apenas 6 inquilinos, tendo-se nomeado novo cabeça, Jozeph Roiz, de Souselas. Toda a área era agrícola, excepto as «cazas terrias em que vive com seu curral», da viúva Maria de Souza. As principais terras concentravam-se no Lamaro, Cabeço do Lamaro, Poso Redondo, Barroca do Carneiro (ou Vallas). O terceiro meio Casal, foi demarcado ainda no ano de 1722, em 27 de Novembro. Pertencera, anteriormente, a Pedro Gonsalves e, depois, a Francisco Pires (de Souselas), e seria de novo encabeçado em Jozeph de Souza, de Souselas. Constituído, esmagadoramente, com área de cultivo, excepto as «cazas e curral» de Ursulla Francisca, viúva, de Souselas. Pendia sobre ele um conjunto de terras localizadas: no caminho q. vay pera o porto da zouparria athe o Rio, ponte de frades, isqueiro ou margulhão e as estreitas. Compreendia a satisfação dos seguintes tributos: o Foro de «Tres alq.res de pão meado do dito do monte e tres quartas de tr.º de fogassa hum capão e des ovos», a «Resão de quinto» e o «Laudemio na forma da partilha»(116). O quarto meio Casal foi demarcado e destrinçado no mesmo dia do anterior. Pertencera a Thome Affonso, de Souselas, e veio a ser encabeçado em Sebastião Soares, também de Souselas. Compreendia 8 inquilinos e todo ele era constituído por terras de cultivo localizadas em redor da Remolha, Rotura, Val de Vaide e detrás das eiras. Tinha o foro de «Tres alq.rs de pão meado do tr.º e seg.da de todo monte e tres quartas de trigo de fogassa hum capão e des ovos» a «Resão de quinto de toda a novidade e por dizimar» e o «Laudemio na forma da partilha». S. Martinho do Pinheiro foi outra área da freguesia onde o Cabido agiu como senhorio. A 21 de Agosto de 1430 foi emprazado a Joannes Affonso e Margarida Vicente sua mulher, «hum cazal de S. Martinho na Marmelleira» que andava na posse de Joanne Appariço. Pelas cláusulas deste contrato se comprova que o Casal de S. Martinho e o lugar de S. Martinho eram realidades diferentes, sendo de especial importância algumas referências a lugares da freguesia: «…hum cazal com suas herdades, e cazas, e vinhas e currais, com suas entradas, e saídas que chamam de S. Martinho, que jaz acerca do dito logo da Marmeleira, que parte com herdade dos cazaes de Carnemá, e do dito logo da Marmelleira, e com herdade dos cazais da Chouparria, e huma terra que pertecce ao dito cazal, que jaz acerca de Souzellas, que parte com herdades do dito logo de Sam Martinho, e que elles nom podeiam por agora hir morar no dito cazal porque nom tinham portas pera as cazas, e as cazas nom heram corregidas, e que elles de suas boas livres vontades renunciarom logo o dito cazal, e todo dereito, e fruto,

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que em el tinham por bem do dito aforamento, que lhes fora feito per o dito Cabbido (…) emprazarom o dito cazal com todas suas pertenças, e herdades (…) aos ditos Joannes Affonso e Margarida Vicente sua molher (…) com esta condiçom que se venham logo morar ao dito cazal, e que alcem e corregam as cazas, e curraes do dito cazal de todallas couzas (…) e que tapem o vallo da dita vinha, que soia hi de estar, e a façom e chantem, e corregam, do que lhe cumprir por guiza feita, e tornada a seu boom estado que a mantenham de todos seus boons adubios que lhe cumprir e fezer mister em cada hum anno, e esto todo a as suas proprias despezas, e que a rompam lavrem e alquevem, e esterquem e a frutem as terras do dito cazal cada hum anno cada humas de suas folhas»(117). Acrescente-se que ao Cabido se devia de ração anual a 8ª parte de todo o pão, vinho, linho, milho e legumes, mais um capão e 10 ovos, a saldar por dia de S. Miguel de Setembro. O reportório de 1481 refere os aforamentos de 3 Casais na área de S. Martinho do Pinheiro: um a A.º Anes «na povoa de São Mart.º junto da Zouparria»; outro a Bastião A.º e Isabel Annes com a mesma descrição; e o terceiro ao Bacharel Eitor Teixeira, situado na Zouparria e designado por «cazal de São Martinho» e que pode muito bem ser o mesmo casal emprazado em Agosto de 1430 a Joannes Affonso e sua mulher(118). No século XVIII, e em simultâneo com o tombar de propriedades na Marmeleira, o Cabido aproveitou para proceder da mesma forma na área de S. Martinho do Pinheiro. No entanto, há muito que manifestara essa intenção, pois o alvará dando autorização régia tinha alguns anos, datando de 20 de Julho de 1710. Agiram no terreno, as mesmas autoridades acima declaradas: juiz, procurador e louvados. A 16 de Novembro de 1722 foram citados na Marmeleira os senhorios confinantes, havendo a acrescentar aos já conhecidos senhorios da área, os nomes de Jozeph Correia de Brito, da Quinta das Barandas e o Administrador da Casa de Aveiro (Capitão-Mor Manoel Cardozo Torres, do lugar dos Fornos). Esta parte do Tombo, incidindo sobre a área de S. Martinho, merece-nos especial atenção. De facto, nele se fala de um «Prazo intitullado de Sam Martinho» (talvez o atrás mencionado «cazal de S. Martinho na Marmeleira que referimos para 1430), dando a sensação que esta propriedade, cuja origem se perde no tempo, fora outrora um espaço organizado em casais «…chamados de Asensovas e da povoa de São Martinho do pinheiro q. herão do prazo que o dito Reverendo Cabido hera direito senhorio e util»(119).

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A.U.C. – Fundo do Cabido: Cópia dos Documentos Latinos – Parte II, Fl. 97v. A.U.C. – Fundo do Cabido: Reportório breve dos prazos da Sé, 1481, Fls. 263, 263v. e 336 Id. Fl. 215

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Também nos parece que o Cabido seria (pelo menos reivindicava-o) o senhorio directo, não só destes casais, mas também da própria povoação. Um dado que se colhe do «Auto de medesão e demarcação de hum sercuito q. comprehende em si todo o lemite de São Martinho do Pinheiro»(120). Segundo aquele auto, lavrado a 23 de Novembro de 1722, os limites das terras do Cabido em S. Martinho passavam pelos seguintes locais e/ou sítios: principiava «…neste citio donde chamão a Regueira de agoa suja junto da estrada que vem da Marmelleira pera Coimbra», ia ate as ortas, cabeso da mara, cabecinho da roza, cabeso dos carreiros, tocava na então designada «estrada de Aveiro», ia ao Val da Roza, daqui em diante e para Sul partia com «terra do Reguengo da caza de Aveiro», a seguir e para Nascente com o «prazo da Zouparria» (que era da Igreja de Santiago), bordejava a «quinta dos grillos», ponte do lobo «lomba abaixo ate estrada que vai da Zouparria para S. Martinho», acabando de partir com este prazo na «regueira que vai da orta velha abaixo», para depois atravessar a «estrada que vaj para carrima», virando para Nascente e depois Sul «ate estrada que vem de coimbra para a marmeleira» e, daí, voltando ao 1º marco onde principiara a demarcação. Posteriormente passou-se aos reconhecimentos gerais feitos pelos inquilinos de cada um dos 4 meios casais. Os primeiros dois meios casais designavam-se por «de São Martinho». O primeiro meio casal pertencera a João Roiz e, depois, a Francisco Machado, de Coimbra. Foi encabeçado de novo, em Manoel Simois, de São Martinho do Pinheiro. Ficou com o foro destrinçado em 4 alqueires de pão meado de todo o monte, 1 capão, 1 galinha e dez ovos. A ração fixava-se em «sete hum de toda a novidade». No foro destrinçou-se ainda «p.ª a capella do Rdo. Cabido hum alq.re de trigo».(121) Esta capela, caso fosse a existente em S. Martinho do Pinheiro (e não temos outra alternativa), daria consistência à nossa teoria de que o lugar estaria na dependência directa do Cabido. O segundo meio casal, passou a ser encabeçado por Domingos Francisco, de S. Martinho do Pinheiro. Com foro e ração idêntica ao primeiro meio casal, menciona novamente 1 alqueire de trigo «para a capella malheira». Os terceiro e quarto meios Casais eram chamados «de Asensovas» e localizavam-se junto à Marmeleira, estendendo-se na direcção de Botão. Por esse motivo devem ser considerados (no que toca à área edificada), como fazendo parte da Marmeleira. Destes, o primeiro foi demarcado a 27 de Novembro de 1722. Antigamente fora seu cabeça Bastião Esteves, tendo-se encabeçado desta

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feita em João da Costa, da Marmeleira. Tinha uma forte componente de casas e quintais e, avaliando pela destrinça do foro, andava aforado pelo Cabido: «quatro alq.res de tr.º e quatro de segunda de todo monte e dous alq.res de trigo de fogasa do seu proprio e hum alq.re de tr.º p.ª a capella dous capoes e vinte ovos os quais capoes ovos e alq.r de trigo he p.ª o R.do Cabido di.to Senhorio e o mais são p.ª seu emphiteuta»(122). A ração era de «seisto de toda a novidade e do vinho e azeite de outavo». Os dois primeiros casais, considerados no conjunto, permitem-nos identificar as áreas edificadas e rurais de S. Martinho: O espaço edificado compreenderia: as «cazas em que vivem com suas serventias e logradouros» Manoel Simões e mer; as «cazas em que vive com seus currais Anna Francisca, viúva; as «cazas em que vivem com suas serventias», Antonio da Cunha e mulher; as «cazas em que vive com suas serventias e logradouros» Catherina Francisca, viúva; as «cazas que serve de palheiro» de Jozeph Rodrigues e mulher; as «cazas em que vivem com seus currais palheiros e serventias e logradouros, Domingos Francisco e mulher; as «cazas terreas em que vive» Antonio Fernamdes Guerra, viúvo; as «cazas terrias em que vive com seus currais» Antonio Fernamdes e mulher; as casas em que vive com seus currais e serventias, bem como a casa que serve de palheiro com seus pardieiros, pertença de Domingos Fernamdes Mallegiozo, viúvo; e as «cazas com seu cham por detras» de Jozeph Simoes e mulher. Os Casais «de Asensovas», como dissemos, andam mais relacionados com a área e povoamento da Marmeleira do que com S. Martinho. O espaço edificado cinge-se ao 1º meio casal e anda todo correlacionado com a Marmeleira: «Moradas de cazas terreas em que vive [Manoel Simoes, viúvo, morador no Cabeço da Marmeleira] com seu chão por detras com arvores de fructo»; e as casas terrias em que vive Manoel Fernamdes Marianno e mulher (da Marmeleira). A área de cultivo (ou agrícola), destes casais, deixa-nos algumas dúvidas, uma vez que ocupam uma vasta área que abrange um raio que vai de S. Martinho, passando pela Marmeleira, às imediações de Botão. Segundo a destrinça e medição do 1º meio casal de Asensovas a maior parte das terras concentrava-se ao redor de: Carril, a Relva, os Banhos, Regueira de Saias, Val de Cavallos, Val de Dono e Val Grande. Demarcou-se ainda «hum sercuito de terras vinhas pinhais e matos no citio do Souto», afinal a parte do Casal que andava emprazado. O segundo meio Casal «de Asensovas» é, na totalidade, um casal agrícola (sem espaços edificados) e nele foi nomeado cabeça, Manoel Alveres, da Marmeleira. As suas principais áreas de cultivo eram: Leira Longa, Sobreiros, Arneiros, Torre, Monte de Trigo e cazinha dos mouros. O foro repartido foi de 4

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Id. Fl. 269

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alqueires de pão meado (trigo e cevada) «de todo o monte». Andava aforado pelo Cabido, a um útil senhorio que devia receber de foro dos inquilinos do Casal 1,5 alqueire de trigo «de fogasa do proprio do Lavrador». A 5 de Dezembro de 1722 concluiu-se o processo.

5. A Igreja de Santiago: da Marmeleira a Carrimá, passando pela Zouparria Uma das mais antigas referências à Igreja de Santiago relacionando-a com a freguesia data de 21 de Janeiro de 1584. Trata-se de um instrumento de renunciação de Casal, sito em Carrima, e novo aforamento do mesmo, em fateusim perpétuo. A colegiada aforava a Francisco Gonçalves mercador e morador em Carrimá, ao mesmo tempo que renunciava a antiga foreira, Maria Rodrigues, viúva de António Tavares, escrivão das sisas da cidade de Coimbra. Este Casal constava de «...casas, terras de pão e oliveiras, matos rotos e por romper, vinhas e árvores de fruto, de que paga em cada ano de foro e pensão 4 alqueires de trigo de todo o monte e 6 alqueires do próprio joeiro(?) e 4 alqueires de cevada de todo o monte, uma galinha , 2 capões e 15 ovos, e a ração de pão de seis um, e 2 quartilhos de azeite»(123). O estudo da documentação do cartório desta igreja apresenta-a, ao longo dos tempos, como possuidora de Casais numa vasta região ao Norte de Coimbra, compreendendo as povoações de Casais do Campo, Trouxemil, Rios Frios, Carrima e Marmeleira. Por razões óbvias interessam-nos, em especial, os dois últimos lugares, onde possuía no séc. XVIII, respectivamente, 7 e 3 casais. Em 1718, este senhorio promoveu um Tombo de Propriedades naquelas áreas (fotos 29 e 30). A destrinça dos 3 Casais da Marmeleira, de que a igreja era directa senhoria, foi autorizada por Provisão de D. João, de 23 de Fevereiro de 1718, tendo-se citado os inquilinos e cabeças a 7 de Abril do mesmo ano. Para a feitura do Tombo foram designadas as autoridades seguintes: Juiz – Dr. Miguel Freire de Coelho; e Procurador da igreja – o Reverendo Francisco Marques(124). Para louvados nomearam-se Andre Francisco Barrete e Domingos Fernamdes Cristina. A 7 de Julho de 1718, teve início o processo de demarcação, no lugar da Marmeleira e nas casas de aposentadoria do juiz, pelas 6 horas da manhã. Entre os senhorios confinantes estavam os mosteiros de Lorvão e de Semide,

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Arrematação, Dotes, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1388-1797, Nº 39, Fl. 637

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A.U.C. – Igreja de Santiago: Tombo dos Casais do Campo, Trouxemil, Carrima, Marmeleira e Rios Frios, 1718, Fls. 367-371

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Calisto Rangel e, com alguma surpresa dada a distância geográfica, as freiras do Mosteiro de Odivelas. No entanto, em algumas confrontações, o escrivão do Tombo anotou que «se não sabe senhorio». O 1º Casal da Marmeleira foi reconhecido entre 7 de Abril e 18 de Julho de 1718, tendo ficado encabeçado em Manoel Simões Ramalho, da Marmeleira. Aplicou-se-lhe o foro de 4,5 alqueires de trigo, 3 de segunda, 1 galinha e 10 ovos. O 2º Casal da Marmeleira foi reconhecido e destrinçado entre 9 de Abril e 28 de Julho de 1718. Ficou encabeçado em Gabriel Barreto, da Marmeleira, com o foro de 4,5 alqueires de trigo, 2,5 de segunda, 2 capões e 10 ovos. Por fim, o terceiro Casal foi reconhecido entre 7 de Abril e 29 de Julho, tendo ficado por cabeça Manoel Alvarez, da Marmeleira, com o foro de 5 alqueires de trigo e 3,5 alqueires de segunda. A área destes Casais, correspondente a habitações (espaço edificado), foi demarcada em dois momentos distintos: • O primeiro, assinalando as casas localizadas dentro do perímetro desenhado pelas seguintes marcações: «quina do forno de Izabel Francisca (…) pella serventia da fonte (…) athe dar no caminho que vaj para os posos (…) athe entrar no lugar junto da capella de Samto Antonio (…) corre por detras da dita capela athe a quina das cazas de Andre Francisco que são desta igreja», virando então a Nascente pela rua até onde se começou a demarcar. • O segundo momento da demarcação do espaço edificado compreendeu as «cazas e terras entre as serventias da fonte». Começava na quina das casas de Domingos Fernandes ia ate ao «porto do caminho da fonte», depois até outro caminho da mesma fonte, mais adiante por estrema de terra até chegar à rua, onde seguia sempre direito ao Nascente, virando a dada altura a Norte seguindo ainda pela mesma rua, até à quina onde começara. Analisando os três Casais ao pormenor, a partir dos reconhecimentos feitos pelos inquilinos, pode definir-se a área edificada da Marmeleira abrangida por esta demarcação: as casas em que vivia o cabeça do 1º Casal, Manoel Simões Ramalho e mulher e outra casa no lugar que lhe pertencia; três casas (uma onde morava e outra localizada na «heira, limite do lugar») de Maria Catherina, víuva de Domingues Rodrigues; duas casas (uma onde morava com «hum pedaso de chão por detras») de Magdalena Gil, solteira e maior de idade; a casa onde vivia Magdalena Francisca, viúva; a «caza que serve de palheiro» de Maria Francisca, também viúva; as casas com «seu chão pegado do cabeça Gabriel Barreto e mulher; duas casas de Domingos Fernandez (uma em que vive); duas casas de Andre Francisco e mulher (uma em que vive); as duas casas de Jozeph Francisco, viúvo (uma em que vive, a outra «com seus pardieiros»); duas casas de Maria, solteira e maior de 25 anos (uma em que vive); a casa de Manoel Simões e mulher, moradores no Cabeso; a casa em que vive Anna Francisca, 132

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viúva; a casa da viúva Izabel Francisca localizada «junto a irmida de Samto Antonio»; a casa de Domingos Francisco e mulher; a casa em que vive João Simões e mulher; a casa terrea com seu curral, do orfão Manoel. O espaço de cultivo por excelência, dominava uma ampla área compreendendo: as terras do Sobreiro, Ribeiro, Banhos, Val da Trota; as leiras de terra no Citio da Fonte, Leira Longa, Regueira de Saias, Torre e Arneiro; courelas de terra na Relva, Esculca, Regueira de Saias, Posa, Carrapiteiros, Porto da Pedrulha; as vinhas da Casinha dos Mouros, Vargea, Sancta Luzia; vinhas e terras na Vargea; as terras, vinhas e matos no Souto, Ribeiro, Bragas, Alforeira; terras e oliveiras na Rigueira, Chrus; matos e oliveiras em Val de ovelhas e diversas propriedades na Relva e Carril. A Igreja de Santiago possuía, ainda, 7 casais, de que era directa senhoria, em torno da povoação de Carrimá, hoje deserta, abandonada e em ruínas. Já na altura o lugar sugeria uma realidade distante, pois quando se deu inicío aos autos o juiz declarou que se ia «…proceder nas medisões dos comfins dos cazais de carrima»(125). Da parte da igreja, as autoridades envolvidas no processo foram as mesmas designadas para a demarcação dos Casais da Marmeleira. No entanto, nomearam-se outros louvados, dois deles residentes em Carrima (João Rodrigues e Domingos Fernandes Bicho) e outro de Coimbra (Manoel de Goes). O reconhecimento geral pelos inquilinos fez-se no dia 7 Abril de 1718, quando já se haviam citado os senhorios confinantes, dos quais se destacava não só o Mosteiro de Odivelas, mas o Marquês de Ançã, Lorvão, e o CapitãoMor Manoel Cardozo Torres, dos Fornos. A 17 de Julho mediu-se o «cercuito de carrima», ou seja; a área ocupada no terreno pelos 7 Casais. Este acto teve a particularidade de começar e terminar «…neste sitio do lagar de fazer azeite defronte della na borda do caminho que vaj de São Martinho para Souzellas ahi se comesou esta medisão»(126) Segundo a demarcação, as terras partiam do sul com «prazo da zouparria, que são desta Igreja», delimitando pelos seguintes locais: citio das pepas, citio do covão. Depois, a demarcação seguia pelo Nascente, passando pela pontinha de carrimá, sitio do cabesinho do clerigo, virava a Norte por sima da carreira da marmeleira, sitio da cham, aqui virava novamente a Nascente pelo sitio do forno, «atravesando a estrada que vaj da Marmelleira para Coimbra», citio do cabeso do monte de trigo. E, novamente para Nascente seguia pelo citio do cabeso do vigairo para a Norte, até chegar ao «alto do cabeso gorda que devide os conselhos» e, depois dos cabesinhos, partia com «terras e matos das freiras de odivellas athe chegar a estrada publica que vem

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Id. Fl. 468 Id. Fl. 497

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Freguesia de Souselas – um povo com História

da Marmelleira para Barcouso»(127). Daqui ia de novo aos cabesinhos donde descia as posas, partindo do Norte com «matos do termo de caza comba que são da Mitra the chegar a estrada publica que vaj de Coimbra para o Porto e para Aveiro»(128). Dali a delimitação seguia para Poente «the chegar ao citio da venda da serra», virando a Sul até chegar á dita estrada nacional. Daqui guiava a Nascente, passando pelo cabesinho da Roza, ate ao «caminho que vaj de carrima para São Martinho», depois a Sul, até a «estrada que vem da Marmelleira para Coimbra», ia ao «fundo da lenteira», e na direcção Poente até «regueira que vem da orta velha», de novo até estrada Marmeleira-Coimbra onde voltava a contactar com o prazo da Zouparria, finalizando defronte do lagar onde começara a demarcação. Todos estes Casais foram reconhecidos entre princípios de Abril e Julho de 1718, ficando como cabeças: Dominhos Fernandes Bicho (de Carrimá); Domingos Francisco (de S. Martinho do Pinheiro); André Fernandes (de Carrimá); António da Cunha (de S. Martinho do Pinheiro); João Fernandes (de S. Martinho do Pinheiro); Antonio de Almeida, ourives (de Coimbra); e Religiosas de Santa Ana, de Coimbra. Sendo a Igreja de Santiago, como nos parece, senhora do lugar de Carrimá, podemos definir a área edificada do lugar, de modo aproximado: as duas casas de Domingos Fernandes Bicho e mulher, sendo uma aquela em que vive «com seu quintal por detras»; as casas em que viviam João Rodrigues e mulher; as duas casas do cabeça de Casal André Fernandes e sua mulher, tendo aquela em que vive um «chão pegado»; as casas com chão de Paschoal Francisco e sua mulher; o «asento de humas cazas dos órfãos de Manoel Ramalho; as casas que possuía no lugar, Antonio de Almeida, ourives, de Coimbra. De todos estes Casais de Carrimá, os únicos inteiramente agrícolas eram o 5º, encabeçado em João Fernandes, de S. Martinho do Pinheiro e o 7º, encabeçado e administrado pelas religiosas do Mosteiro de Santa Ana, de Coimbra. No Tombo da Igreja de Santiago, realizado um pouco mais tarde, entre 17881801, verificamos que Carrimá andava organizado já não em 7 mas em 8 Casais. Também a Igreja de Santiago era senhoria directa do prazo da Zouparria do Monte, faltando apurar se a evolução da própria povoação não se terá processado a partir desse prazo ou, em alternativa (ou mesmo em simultâneo), com os Casais que o Mosteiro de Lorvão detinha nessa área. No fundo documental relativo à Igreja de Santiago não encontrámos elementos que nos esclarecessem acerca da área ocupada por este Casal. Aliás, os dados mais concretos extraem-se do Tombo realizado por outra instituição, no caso o Mosteiro de Lorvão, em 1705. De facto, quando procedeu à demarcação

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Id. Fl. 492v. Id.

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

do que possuía na área envolvente a Souselas mencionou a sua existência. Na altura, era senhorio útil do prazo o Capitão-Mor Manoel Cardozo Serigodo, ao tempo também procurador de Santiago. Algumas terras deste prazo foram descritas no dito Tombo: «Huma terra com seu olival que corre do cabeso dos papos desde a estrada pera o sul atravessa a Regeira da Agoamá chega aonde chamão a vinha do touro (…) athe a Regueira dos basellos»; e «Huma terra com seu olival que chamão olival da manca», localizada perto da Regueira de Saias(129). Os documentos registam, também, um termo de composição, feito entre o dito senhorio útil do prazo e o procurador de Lorvão, datado de 14 de Novembro de 1705, em que foi acordada a troca de terras, uma espécie de emparcelamento do território, que pretendeu beneficiar as duas instituições: «…por elles ambos foi dito que o mosteiro de Lorvão tinha huma terra pegada na Regeira de val de migel e logo junto a ella estava outra da Igreia de São Tiago e dahi comtenuarão outra ves terras de Lorvão e per que hera mais utelidade pera hum e outro senhorio ficarem as terras juntas convierão e comtratarão que as terras de Lorvão que estava pegado a Regueira ficase pera São Tiago parasim ficar mistica com as terras da mesma Igreia que correm da outra bamda da rregeira, e que a terra que hera de São Tiago ficase pera Lorvão, por ficar mistica com as terras do mesmo Mosteiro e serem ambas de igal bomdade e por vertude deste comtrato se fes a demarcação atras em que fica enculida pera o mosteiro de Lorvão a terra que era de São Tiago…»(130). Esta reorganização fôra, em muito, provocada por certa confusão assinalada pelos louvados de Lorvão: «E declararão os louvados que dentro da dita demarquação e medição estam muntas terras outaveiros que estão aonde chamão a outava o foro dos quaes pretensem aos cazaes de souzellas e que pagam a outava e todo o dizimo ao mosteiro de lorvão…»(131). Os Casais que a Igreja de Santiago possuía nesta zona, distribuíam-se em volta do triângulo Marmeleira-S.Martinho do Pinheiro-Carrimá. As propriedades observadas, foram por nós estudadas ao pormenor, tal como havíamos feito para os Casais que o Mosteiro de Lorvão possuía na zona Souselas-Marmeleira. Assim, os 3 Casais que a igreja possuía na Marmeleira compunham-se de 133 propriedades, distribuídas por diversas classes de ocupação do solo (ver gráfico 7). As terras de cultivo cerealíferas eram, uma vez mais, dominantes ocupando 65 propriedades (49% do total), seguida dos olivais com 37 propriedades (ou 28%) e as vinhas com 20 propriedades equivalentes a 15% do total.

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A. U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão; Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, Fl. 21 Id. Fls. 22-22v. Id. Fl. 21

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Gráfico 7 - Constituição dos 3 Casais da Igreja de Santiago na Marmeleira, quanto ao número de parcelas e ocupação do solo, em 1718

Na zona em volta de Carrimá e S. Martinho do Pinheiro a situação era ligeiramente diferente. Os 7 Casais aí existentes, na dependência da Igreja de Santiago, eram constituídos por 329 parcelas, obtendo-se uma média de 47 unidades por Casal. Em termos de ocupação do solo, as terras destinadas ao cultivo de cereais representavam 65% do total, com 214 parcelas a serem exploradas (ver gráfico 8). Porém, esta área trazia como novidade o facto de nela existirem, à data, um número apreciável de pinhais (tal como ainda hoje apesar da proliferação do eucalipto). De facto, esta classe ocupava 37 parcelas que no total tinham um peso de 11%. Em terceiro lugar tínhamos os olivais que representavam 7% com 24 propriedades seguindo-se, a curtíssima distância, os matos também com 7% ou 23 parcelas. Gráfico 8 - Constituição dos 7 Casais da Igreja de Santiago em Carrimá e S. Martinho do Pinheiro, quanto ao número de parcelas e ocupação do solo, em 1718

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Para um estudo mais aprofundado desta área, outrora tão pujante em termos económicos, optámos por adicionar os dados dos 3 Casais da Marmeleira com os 7 de Carrimá e S. Martinho, para obtermos uma mais clara identificação e localização das principais áreas de concentração das propriedades relativas às classes terras, olivais e vinhas, optando por incluir, separadamente, os pinhais pois parecem ser dominantes apenas na área Carrimá-S. Martinho do Pinheiro. Assim, e no que toca à classe dominante em todos os Casais (as terras), incluímos as áreas referidas em mais de 3 ocasiões (inclusive) nos 10 Casais (ver gráfico 9). Terras que se localizavam preferencialmente: em Vale de Miguel (11), Borralheira, Pedrulha, Ponte de Carrimá (8), Alqueve de Carrimá e Barro de Carrimá (7), Covão, Lameiros, Monte de Trigo, Vale de Marinha (5), Areas Carvalhal, Fontainhas, Hortas, Pesa, Relva, Tapado e Vale de Trota (4). Gráfico 9 - Localização e número de parcelas destinadas a cultivo de cereais nos 10 Casais da Igreja de Santiago na Marmeleira-S.Martinho do Pinheiro-Carrimá, em 1718

No caso das culturas dominantes e, embora com menos expressão, tínhamos os olivais e as vinhas. No caso dos olivais, contabilizámos as zonas referidas em cada Casal duas ou mais vezes, identificando-se deste modo a sua área de eleição (ver gráfico 10). Uma vasta área que ia desde a Regueira de Saias (com 7 olivais), passando por Vale de Marinha (com 5), a Vale de Miguel e Pedrulha (com 4 cada) até sitios como Valcovo ou Relva (com 3). No caso das vinhas, optou-se pela inclusão de todas as plantações referidas (30) o que permitiu definir áreas concretas da sua implantação (ver gráfico 11). 137

Freguesia de Souselas – um povo com História

Assim, destacaram-se o Roxio de Carrimá e Roxio (com 5 cada), Siara e Santa Luzia (com 3 cada); Valcovo, Tapado, Souto e Sobreiros (com 2). Gráfico 10 - Localização e número de parcelas destinadas a olival nos 10 Casais da Igreja de Santiago na Marmeleira-S.Martinho do Pinheiro-Carrimá, em 1718

Gráfico 11 - Localização e número de parcelas destinadas a vinha nos 10 Casais da Igreja de Santiago na Marmeleira-S.Martinho do Pinheiro-Carrimá, em 1718

Por fim, uma palavra para a zona dos pinhais que proliferavam entre Carrimá e S. Martinho do Pinheiro. Aqui existiam pelo menos 30 pinhais (uns maiores que outros) e distribuídos por zonas aptas a esse tipo de cultura (ver gráfico 11). De acordo com o levantamento efectuado, os Vales de Carrimá eram ocupados por 9 olivais, seguido de Carregos e Bica (ou “Biqua”) com 4, Carreiros de S. Martinho e Cabeço do grou com 3. 138

III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Gráfico 12 - Localização e número de parcelas destinadas a pinhal nos 7 Casais da Igreja de Santiago na área S.Martinho do Pinheiro-Carrimá, em 1718

6. A Universidade: O prazo de Souselas, Marmeleira e Botão A Universidade de Coimbra, juntamente com a Comenda de Santiago e Casa de Aveiro eram os senhorios não religiosos, implantados na região envolvente a Souselas. Os dados recolhidos remontam à segunda metade do Séc. XVI e registam a existência de um prazo de consideráveis dimensões disperso pelo território. No Livro da Fazenda da Universidade, de 1570, consta o «prazo dos casaes da Marmeleira e dereitos de Botam», o qual integra o «Titulo doutras rendas e fazenda que a universidade ouve do priorado de Santa Cruz»(132). Importa esclarecer que este prazo, à semelhança de outros bens, pertenceram ao Mosteiro de Santa Cruz, mas transitaram para a fazenda universitária. Esta anexação fôra, afinal, uma consequência directa da transferência da Universidade para Coimbra em 1537, com o rei a determinar a extinção do Priorado-Mor do mosteiro, após o falecimento do último prior, em 1543, ordenando a aplicação daquelas rendas na sustentação do estudo superior. No caso deste prazo e segundo informação colocada à margem do texto, a Universidade terá tomado posse em 19 de Maio de 1546. Este prazo, compunha-se de propriedades na Marmeleira, Souselas e Botão. Centrando a nossa atenção nos dois primeiros lugares, é possível seguir uma parte muito significativa da sua evolução histórica.

Simão de Figueiró (org.); Rocha Madahil (leitura e publicação) - Livro da Fazenda e Rendas da Universidade de Coimbra em 1570, Coimbra, 1940, P. 40

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Na Marmeleira, e pelos inícios do séc. XVI, o prazo compreendia a existência de 2 Casais, ambos administrados pelos crúzios. Porém, e ainda no tempo do mosteiro, tomou-se uma primeira decisão que passou pelo aforamento de um dos Casais; «A dezanove de novembro de quinhentos E vinte E dous annos, per titulo feito per Anrrique de parada deu o convento seu nome E do prelado h destes dous casaes a p.º Alvarez fatiosim»(133). Já sob administração da fazenda da universidade, um dos casais (não sabemos qual) seguiu idêntico caminho: « A quatorze de fevereiro de quinhentos E sesenta annos derã h dos dous casa s da marmeleira a alvaro eanes E dioguo pirez fatiosim». Em Souselas, ¾ de Casal integravam este prazo, cujas propriedades haviam sido emprazadas; duas terras em 14 de Junho de 1512 a joão pirez e, a 2 de Novembro de 1514, a Francisco Enes, de Souselas(134). O prazo ficava completo com «h s matos» (cuja localização se desconhece), aforado a Antonio Pirez, da Marmeleira, a 3 de Janeiro de 1512. Entretanto, o prazo passou para Manoel de Vargas, morador em Coimbra, por titulo de aforamento feito a 25 de Outubro de 1558, nele se incorporando «h olival E chão que está no lemite da cidade, a assamassa que trazia per outro titulo»(135). O destino que seguiu o prazo pode retomar-se, por consulta de outras fontes, alguns anos depois. De facto, a 5 de Julho de 1589 e na sequência da realização do Tombo da Universidade na Marmeleira, reconheceu a Universidade como directa senhoria do prazo, o Licenciado Antonio Deboim. Naquele tombo percebe-se que Antonio Deboim, casado com Joana de Vargas, era genro de Manoel de Vargas. Falecido este, a viúva fez um dote a seu genro, lavrado nas notas de tabelião público a xxbij [27] de Dezembro de 1583, deixando-lhe o prazo que então corria na terceira vida, pagando de pensão 1.200 reis(136). Porém, do prazo que registámos em 1558, já não fazia parte o olival em Assamassa, isto porque «a dita sua sogra depois de morto seu marido, vendeo o dito olival ao d.or Jorge Brandão com licença da Universidade». E que havia sucedido com os Casais do prazo situado na freguesia? A resposta consta das páginas do dito Tombo. Antonio Deboim havia-o aforado a terceiro (subenfiteuse): os ¾ de casal de Souselas andavam na posse de Gaspar Diz, morador em Souselas, enquanto os 2 Casais da Marmeleira andavam emprazados, com licença da Universidade, a Alvaro Anes e Simão A.º (um deles) e o outro a Antonio Fernandez, o rascão, morador na Marmeleira, embora neste último caso apenas uma parte dele, já que «ho demais trazem repartido entre

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Id. P. 85 Id. Id. P. 86 A.U.C. – Fundo Documental Universitário: Tombo do prazo da Marmeleira, 1589-1819, Fl. 2

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

si e despedaçado os herdeiros de pedro alvareso penteado»(137). Desaproveitados andavam, ainda e no lugar da Marmeleira «dous pedaços de matos q. forão vinhas» e «hum chão no lemite do dito lugar da marmeleira q. chamão as bragas», e que haviam sido explorados pelos herdeiros «do penteado». Em Souselas refere-se, também, a existência de uma vinha e terra, trazida por Domingos diz, por titulo de emprazamento, e parte integrante do prazo. As terras do prazo, localizadas nas proximidades de Botão, haviam seguido idêntico destino - o arrendamento: um chão era trazido por Gaspar de Seabra; um olival por Antonio Fernandez, sapateiro e morador em Botão; uma horta trazia Asenso Fernandez; uma vinha Inofre de Figueiredo e umas terras a «Sante Estevão», no limite do dito lugar, andavam arrendadas a Jeronimo Moniz, aí morador. O processo de destrinça, divisão e demarcação deste prazo decorreu durante os meses de Janeiro e Maio de 1593. No entanto, algo terá corrido mal, pois o último auto de encabeçamento (2/3 de Casal que foram de Pº Alvarez o penteado), seria realizado muitos anos depois, a 14 de Janeiro de 1610. Aliás, e a propósito de uma terra deste prazo, os louvados informavam que «tinhão muita duvida na demarcação da terra (…) e que pera desemcareguarem sua consiensias tinhão necesidade de tomarem certas informações»(138). Também neste caso é possível distinguir a área edificada da cultivada, sendo de destacar a intenção que a Universidade demonstra em que se construam casas. Por exemplo, Antonio Fernandez, o rascão, no reconhecimento feito a 30 de Janeiro de 1593, ficara «emcabesado nas casas que hera obryguado a fazer nas terras do dito terco de casal as quaes mandou que fizese em termo de dous annos»(139). Na Marmeleira, e em termos de espaço edificado temos: a casa com seu curral e palheiro com «hum curtinhal por detras» do dito cabeça Antonio Fernandez, o rascão; as casas com curral do cabeça Alvaro Anes; o «asento de cazas tereas com seus currais quinta e quintia» de Simão Afonso; outro «asento» idêntico de Alvare Anes; outro asento de casas e pardieiros derrubados, de Pedro Alvarez, o penteado (já defunto). Para Souselas, constituia área construída: as casas de sobrado com sua quinta, forno, lagar, currais e palheiros do cabeça Gaspar Diz, morador em Souselas.

7. A Casa de Aveiro, senhoria directa do Pisão A Casa de Aveiro era detentora na região de Souselas de um imenso património fundiário. O seu domínio, estendia-se para Nascente, ocupando uma vasta área da serrania que se desenha logo acima de Botão e se estende até às faldas do Buçaco.

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A.U.C. – Fundo Documental Universitário: Tombo do prazo da Marmeleira, 1589-1819, Fl. 1v. Id. Fl. 28 Id. Fl. 6

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Freguesia de Souselas – um povo com História

O Pisão do Canavial (hoje Pisão) era a única povoação da Freguesia de Souselas que integrava esse senhorio, cujos bens depois de extinta a casa foram incorporados na Coroa. O Pisão, fazia parte do Couto de Monte Redondo e, pelos finais do séc. XVIII, a maior parte dos bens ali situados pertenciam ao Alferes João da Costa. De facto, a 27 de Outubro de 1790, o dito alferes fez reconhecimento à Casa de Aveiro como directa senhoria dos bens que aí possuía, depois de citado pelo Desembargador Joze de Magalhaens da Costa Branco, Almoxarife e Juiz dos direitos reais. Os bens que reconheceu e sobre os quais se obrigava a pagar foros, rações e pensões foram: «casas em que vive no Pizam do Canavial; casa que serve de caza de eira no mesmo sitio; casa que serve de caza de forno pegada na Azenha do Pizam que vai para a Matta do Machial (…) huma caza aonde está hum engenho e huma Azenha (…) huma propriedade pegada que consta de terras de milho, e olival, quintal de lanageyras, testadas de mato com sobreyros, e carvalhos»(140). Por esta descrição podemos identificar a Azenha do Pisão com o antigo engenho. Acrescente-se que, ao longo das páginas deste enorme livro, detectámos muitos indivíduos da freguesia possuindo, por diversos títulos de aforamento, bens localizados nos limites do imenso senhorio da Casa de Aveiro.

8. O Convento de Santana: Carrimá, Marmeleira e Sargento-Mór O Convento de Santana cedo manifestou interesse pelo rendimento das terras do lugar da Marmeleira. De facto, em 1588, Manuel Cotrim, cidadão de Coimbra e escrivão das execuções da Universidade, penhorou a Manuel Vieira, morador no Couto de Semide, 30 alqueires de trigo, relativo a um Casal situado nas proximidades da Marmeleira, que Diogo de Leite, procurador do Convento de Santana, lhe comprara de renda em fateusim. (141). A 13 de Agosto de 1605, o Vigário Geral do Bispado confirmava o direito do convento a receber 30 alqueires de trigo do dito Casal, cuja posse era também reivindicada pela Igreja de Santiago. Muitos anos depois, a 27/01/1769, o convento empraza em fateuzim perpetuo o dito Casal a 3 famílias, todas da Marmeleira do Botão: Joze Francisco e sua mulher Roza Maria, Manoel Jozé e sua mulher Thereza Maria, e Antonio Jozé (Alfaiate) e sua mulher Esperança Maria. Este Casal era constituído esmagadoramente por terras: nos Carrapiteiros (1 terra e 1 terra com oliveiras); Sobreiros (2 terras com oliveiras, partindo com estrada de

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Casa de Aveiro – Livro dos próprios da Casa de Aveiro nesta cidade de Coimbra, 1734-1791, Nº 39, Fls. 264-264v. (141) A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Arrematação, Dotes, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1388-1797, Nº 39, Fl. 204 (140)

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Botão para Souselas); Cruz (2 terras, uma delas com oliveiras); Rigueira da Pedrulha (3 terras, sendo 2 com oliveiras), Bragas (uma terra com vinha), nas Vargias (2 terras), e uma terra em cada um destes locais – Ribeiro, Poços, Fonte, Cabreiro, Lavegada e Val Bom. Além destas propriedades destacava-se uma terra, com vinha e oliveiras, no Pousio, e o foro imposto em casas no lugar da Marmeleira, aforadas a Maria Simões e Manoel Lopes, e Marcelina de Sancto Antonio, aqueles da Marmeleira, e esta da Vila de Botão(142). Os inquilinos foreiros deviam satisfazer, anualmente e por dia de S. Miguel, 26 alqueires de trigo, e 5 alqueires de azeite, de 2 em 2 anos. Noutro local da freguesia, o mosteiro deu posse do «cazall de carnimá», a Geralldo Lopez, morador na cidade de Coimbra. O facto data de 2 de Agosto de 1597 e tratava-se de cumprir a vontade do cunhado Manoel Tavares, que por escritura antiga (e apresentada neste acto), queria que o dito Geraldo tomasse posse de todo o Casal, do qual se destacava uma casa no dito lugar de Carnimá, um olival em Asur e uma vinha no Alqueve(143). Geraldo Lopes destacar-se-ia nos anos seguintes, ao adquirir alguns bens em Carrimá: a 15 de Junho de 1599, comprando a André Afonso e sua mulher Domingas Pires, do lugar de Carrima, um lagar de vinho com sua casa e quintã por preço de 2.000 reis; e, a 13 de Setembro de 1609, comprando o quinhão de Domgs Gnzls lavrador, e sua mer Ana Joam, moradores em Carrimá e o de Amtonio Joam, lavrador, e sua mer Maria Diz, moradores na Zouparria do Mõte referentes «as tres partes de hû pardieyro com seu chã» pelo preço de 800 reis cada um(144). Leão Lopes de Morais, Mestre em Artes pela Universidade de Coimbra, natural desta cidade e filho do Cidadão Geraldo Lopes, deu continuidade à política de seu pai, emergindo como um poderoso detentor de propriedades na área de Carrimá-Souselas mediante doações e desistências: • A 21 de Janeiro de 1643, toma posse, como herdeiro, de todos os bens de sua meia irmã Maria Lopes (filha de Geraldo), por morte da mesma. Um conjunto assinalável de bens de raiz, onde avultavam 3 moradas de casas (uma na Rua das Esteirinhas, em Coimbra), uma horta na «Reguassa por baixo da fonte do bispo com suas cazas e olival», um olival a Cheira e o Casal de Carnimá «que contem em si cazas térreas vinhas matos guandaras e olivais e em toda a vista moradas de cazas orta olivais terras e vinha e matos»(145).

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Arrematação, Dotes, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1388-1797, Nº 39, Fls. 188-194 (143) A. U. C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Arrematação, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos da cidade de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1551-1801, Nº 41, Fl. 334v. (144) A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Compras, Sentenças, Arrendamentos, Doações, Inventários e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1564-1800, Nº 42, Fls. 633 e 645 (145) Id. Fl. 423 v. (142)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

• A 21 de Outubro de 1646, Pedro Fernandes, lavrador, e sua mulher Brites Fernandes, moradores na Quinta e Povoa do Pinheiro (Freguesia de Souselas), doam a Leão de Morais, depois de suas mortes, a metade de todos os seus bens móveis e raiz com as seguintes condições (algumas bem curiosas): «…que elle ditto doutor Leão Lopes de Morais lhe fará todos os leguados de suas almas que serão os seguinttes a saber – lhe fara per mortte de cada hum delles ofisios de nove liçois com as oferendas …ordinarias ho costumadas e que serão emterrados dentro na igreija de Santhiaguo de Souzellas defrontte do altar de nossa Senhora do terreiro e paguara as sepulturas conforme he costume e que paguara per mortte [Fl. 413] de cada hum hum alqueire de triguo de palhas e lhe mandara dizer a cada hum sua missa pera sempre pello oitavario dos santos na igreia de Santiaguo de Souzellas he de cada huã das missas dará sincoenta reis de esmolla E mais lhe mandara dizer per morte de cada hum delles doadores tres missas no altar preveligiado de São João de Santa Cruz depois de seu falecimento E dara per cada huã sincoenta reis E mais lhe dara (…) dous alqueires de pão segundo cozido aos pobres da freguezia delles doadores E diserão que elle ditto doutor doadaria a Confraria do Senhor depois da mortte de anbos da igreia de Souzellas tres oliveiras no olival de val de forno as mihores e mais a Senhora do Rozario duas oliveiras as milhores que se seguirem ha em nome de Jhus outras duas E huã a Senhora da Nazareth de Carnima E duas a Sam Sebastião que todas estão no ditto olival (…) hua leira de terra que esta a lenteira a que chamão a terra do brigno a Antonio filho que foi de Dominguos [Fl. 413v.] Gonçalveres o grande he de sua molher Francisca Simois moradores em a ditta povoa de São Martinho…».(146) Falecidos os doadores, os seus sobrinhos Manoel Francisco, massulo (de alcunha), e sua mulher Catherina Fernandes, moradores na Marmeleira, desistem a 7 de Abril de 1650 dos bens que por uma segunda doação os tios lhe haviam deixado. • A 9 de Julho de 1647, Gaspar Dias e sua mulher Margarida Simois, de Souselas, desistem de uma terra que possuíam em Vale de S. Pedro. A terra localizava-se no limite de Carnima, e segundo declaram era «pertensa do cazal de Lião Lopes de Morais»(147). Em Sargento-Mor encontramos o convento a tomar posse de «humaz cazas terrias com seus currais e quintal e outras maiz fazendas»(148), que pertenciam a Manoel Francisco Carrima, morador no dito lugar.

Id. Fls. 412v.-413 Id. Fls. 404. (148) A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana de Coimbra - Livro de Cartas de Arrematação, Dotes, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1388-1797, Nº 39, Fl. 116 (146) (147)

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

O processo inicia-se a 3 de Março de 1766, quando o Juiz Executivo do convento lança execução ao dito Manoel, como fiador e principal pagador do órfão Manoel da Murtta, solteiro e morador no lugar de S. Martinho do Pinheiro. A dívida estimava-se em 30.000 reis, a que acresciam os juros vencidos, sendo afixada em Sargento Mor a certidão respectiva. Manoel Carrimá apresenta petição para nomeação de bens à penhora bem como escritura de obrigação de juro feita com o pai do órfão, Joaquim da Murta, datada de 19/05/1743, no Convento de Santa Ana. Por esta escritura, Manoel Francisco e sua mulher Luiza Francisca, Manoel Francisco solteiro (todos do lugar de Carrimá), e Joaquim da Murta e sua mulher Anna da Comsseisam, do lugar de S. Martinho do Pinheiro, contratavam com o convento o empréstimo de 70.000 réis, à razão de 5%, pelo tempo de um ano «…que lhes heram nesesarios para sertto neguocio»(149). Para salvaguarda do contratado obrigaram todos os seus bens móveis e de raiz, em especial um conjunto de bens localizados na zona definida pelo triângulo Carrimá-Marmeleira e S. Martinho do Pinheiro: umas casas com seus pardieiros e chão por detrás sitas na Marmeleira; uma vinha no acento dos Basselos (limite de Carrima), outra vinha no sitio dos Valles; uma vinha com 3 oliveiras no sítio do Ribeiro (limite de Carrima) uma terra com oliveiras e matos em Val Covo; uma terra ao pé da capela de Nossa Senhora de Nazaré de Carrima; uma terra com carreira de oliveiras onde chamam A Chave; outra terra com 3 oliveiras onde chamam A Pesa; uma terra com mato e pinhal onde chamam Os Valles; um pinheiro no sitio dos Pardieiros, e terras no Caniço, nas Areas, e em Val de Miguel. Neste conjunto de bens, assumia, especial destaque as casas do executado Manoel Francisco Carrima «com seu quinttal e currais e logradouros e serventtias e com todas as mais pertensas». Os bens, avaliados na totalidade em 10.000 réis, foram a praça a 24/4/1766 mas ninguém os arrematou, pelo que reverteram à posse do convento. Uma parte dos bens afectos ao convento chegou ao Séc. XIX na posse de 10 enfiteutas. A sua relação encontra-se no inventário de foros suprimidos no Concelho de Coimbra, organizado entre 1886-1889 (Vide Anexos, Tabela 3).

9. As Igrejas de S. Cristóvão e de S. Salvador: senhorios de pequena expressão Estas igrejas também possuíam propriedades na freguesia. A 13 de Outubro de 1664, a Igreja de S. Cristóvão promoveu auto de reconhecimento e encabeçamento de um Casal que possuía em Souselas, em Simão Fernandes do dito

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Id. Fl. 120v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

lugar. Este homem, lavrador e morador, aceitou ser cabeça do dito casal, ficando responsável pela cobrança e entrega do foro, constituído por 11,5 alqueires de trigo, 6 de cevada, 3 capões, 15 ovos, e 2 frangos por dia de S. Miguel(150). Em 1688, e sendo cabeça Manoel Fernandez Parente, correu questão entre a Igreja e os inquilinos deste Casal(151) a propósito da repartição do foro. Depois de uma primeira audiência realizada em Março, nos Paços do Concelho da cidade de Coimbra, a audiência de repartição do foro fez-se a 4 de Novembro de 1688, em Souselas, à revelia dos ditos inquilinos(152). Por provisão de D. João, datada de 12 de Fevereiro de 1724, foi autorizada a realização de um Tombo de propriedades, não só em Souselas, mas também em Ançã, Cioga e Quimbres (fotos 29 e 30). Tratava-se, certamente, de dar resposta aos Tombos que os senhorios confinantes iam promovendo nas regiões em redor. Foi Juiz do Tombo, Antonio Marinho Fiúza e escrivão Christovam de Almeyda enquanto o procurador da igreja foi o reverendo, Miguel Francisco da Costa. A Igreja de S. Cristóvão possuía o «cazal de Souzellas». O reconhecimento geral da igreja, como direito senhorio deste Casal, foi feito pelos inquilinos em Coimbra, a 10 de Maio de 1724. No entanto, e a pedido dos inquilinos que diziam que o casal era «grande para hum emcabesamento se devidise»(153), o Casal seria reorganizado em 3 terços com a aprovação dos louvados: «vjsto e apegado as propriedades do dito cazal o qual tinham devidido em tres partes». Importa referir, com especial atenção, que os louvados tiveram a preocupação de medir, antes da área agrícola, as casas pertencentes aos três terços de casal, ou seja; a área construída em Souselas pertença do senhorio directo da igreja de S. Cristóvão. Estas casas, estavam todas juntas e pertenciam aos seguintes inquilinos: «cazas de sobrado em que vive com suas logeas e sua parreira a porta» de Antonio da Murta e mulher; a «caza terrea que serve de palheiro» de Antonio de Souza, solteiro; a «caza terria em que vive» Francisca Parenta, solteira; as «cazas terrias com huma janella para o nasente» de Ignacio Lopes e mulher; a casa térria em que vivia João Fernandes Monico e Mer, as «cazas terrias em que vivem com seus quintais Manoel Lourenço e mulher» e as «cazas terrias em que vive com seu curral e parreira a porta» de Mathias Marques e mulher, inquilino que também possuía as «cazas que foram de Diogo de Souza e sam terrias» O primeiro terço de Casal, medido e dividido nos dias 27 e 28 de Setembro de 1724, e ficou encabeçado em Manoel Fernandes Parente, o novo, de Souselas. A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica – Livro 6º das escrituras da Igreja de S. Cristóvão, 1650, Fl. 116. (151) A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica – Livro das Fazendas da Igreja de S. Cristóvão em Casal Comba e Souselas, Fl. 84 (152) Id. Fls. 90-90v. (153) A.U.C. – Fundo das Congregações Religiosas: Igreja de S. Cristóvão – Tombo de Souselas, Ançã, Cioga e Quimbres, 1724, Fl. 16v. (150)

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III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Dentro do seu circuito constavam as seguintes propriedades: «hum sercuito de vinhas no citio das Estreitas»; «outro sercuito de vinhas no mesmo citio»; «sercuito de terra de Val de Sam Pedro»; «metade de hum quintal atras das Eyras»; «huma terra ahonde chamam as Hortas»; «Mais huma leyra de terra ahonde chamam as hortas»; «huma leyra de vinha ao porto da zouparria»; «huma terra em Val de Vaide»; «Mais huma terra com suas tanchoeiras entre os cabesos»(154). Os louvados, Manoel Dias Lavrador e Manoel Francisco Mariano (ambos de Souselas) aplicaram o seguinte foro: «dous alqueires de pam meado trigo e sevada de todo monte tres alqueires e meio de trigo pello pam cozido meyo capam hum frangam e des ovos». O segundo terço de Casal foi destrinçado a 28 de Setembro de 1724, ficando como cabeça Manoel Rodrigues, de Torre de Vilela. Compreendia as «terras do Isqueiro e Zambujeiro», onde se incluíam as seguintes propriedades: a «propriedade da Quinta do Clerigo e Cabeso do Lamaro»; «huma terra na matua»; «huma leyra de terra no Roxio»; «huma vinha dentro da Quinta da Remolha»; «huma terra com suas oliveiras no Silval»; «huma leyra de terra ao porto da Zouparria»; «huma terra ao Porto de Souzelas»; huma terra em Val de sam pedro». Ficou com o foro de «Sinco alqueires de pam meado trigo e sevada de todo monte e alqueire e quarta de trigo de fogasa do seu proprio hum capam e des ovos». O último terço de casal, foi medido e dividido a 28 de Setembro de 1724 e tinha como referência o «caminho que vay para o Remungam». Ficou encabeçado em Mathias de Souza, da Azenha, e era constituído pelas seguintes propriedades: «Terra das Almoinhas e amendoeyra junto do curral do concelho», a «propriedade do Poso Redondo», a «terra ahonde chamam os Valles», «huma leyra de terra ahonde chamam o Morgulham», «hum cham entre o rio e a valla atras das eiras», «terra com suas oliveiras na Matua»(155), «huma vinha ao Porto da Zouparria», «vinha e terra no Borbollegam» e ainda um conjunto de terras em Val de Vaide, Rutura, Rigueira de Val de Giraldo, Entre os Cabesos, Pedrigueira, Atras das Eiras e Mantua. Ficou com o foro de «sinco alqueires de pam meado trigo e sevada de todo monte tres quartas de trigo de fogasa do proprio do Lavrador gallinha e meia e sinco ovos». Na Marmeleira, também possuía um Casal a Igreja de S. Salvador. Não sabemos desde quando mas, em 1807, foi reconhecido e demarcado. A Provisão Régia autorizando a demarcação data de 15/12/1797 e foi passada por D. Maria. Por ela se nomeou Juiz o Dr. Thomas de Brito Martins Macedo e Guedes. Foi procurador da igreja o Padre Joze de Campos Branco e louvados Manoel Rodrigues Silvestre e João Soares.

Id. Fls. 22-25v. Matua é um microtopónimo localizado junto ao Instituto Educativo de Souselas/IP3/Caminho de Ferro.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

O reconhecimento geral pelos inquilinos ocorreu a 18 de Junho de 1807, tendo-se concluído o processo a 27 do mesmo mês e sentenciado os autos em 15 de Julho do mesmo ano. O Casal da Marmeleira foi reorganizado em dois cabeças: o 1º reconhecimento foi feito no cabeça Joze Marques Louro e, o segundo, em Manoel Botelho. Em conjunto tinham de pagar ao seu senhorio 7 alqueires de trigo, 5 de cevada, 50 ovos, 2 capões e 20 reis, por dia de S. Miguel de Setembro(156). À semelhança do sistema utilizado no Tombo da Igreja de S. Cristóvão, também neste caso se principiou pela demarcação da área edificada; as «Cazas e Quintal junto ao lugar da Marmeleira e Cabeço da Eira». Estas casas faziam todas parte do 1º reconhecimento (1º Casal) e ficavam balizadas por 2 caminhos - «caminho que vai para a cidade de coimbra (…) caminho que vai do lugar para a heira longa» e a Rua Publica. Travam-se, afinal, das habitações dos inquilinos: Joze Marques Louro (casas térrias com quintal), Bernardo Simois Souto (casas), Joaquim Lopes dos Paços (casas com sua quintã), Joaquim dos Santos e mulher (casas com metade de um quintal por trás), Theotonio da Costa (casas com seu quintal), João Antonio e mulher (casas com metade de um quintal, mais uma casa), Joaquim Francisco Lopes e mulher (casa mais outra «caza que serve de meter gado com seu pardieiro pegado), Roza Mana, viúva (casas e 2 palheiros), Joaquim Lopes dos Reis («huma caza de lagar» e um palheiro), João Soares e mulher (um pardieiro e um palheiro), João dos Santos e mulher (casas), Maria Clara, viúva (casas e curral pegado e um palheiro). A área de cultivo compreendia: terras nas Hortas da Larangeira,Val de Botam, Areeiro, Crux e Mantua; vinhas no Lameiro, terras e oliveiras na Leira Longa, Relva, Carapiteira, Remolha, Mexilhão, Regueira de Saias e Peça; terra e vinhas no Tojal;Vargia e Isgal; terras oliveiras e vinha no «sitio de Val de Domno»; vinha e pinhal nas Hortas da pipa, Torre; vinha, pinhal e terras ao Barreiro, Carril. Todo o segundo Casal reconhecido era área agricultada.

10. Os bens da Câmara Municipal de Coimbra na Freguesia de Souselas A Câmara Municipal de Coimbra também era detentora de alguns bens na freguesia, especialmente na Marmeleira. O seu inventário extrai-se dos Tombos de propriedades mandados organizar pelo município em 1678 e 1748 (Tabela2):

A.U.C. – Fundo das Congregações Religiosas: Igreja de S. Salvador – Tombo do Casal da Marmeleira, 1807, Fl. 21

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A.H.M.C. – Tombo dos bens, propriedades, rendas, heranças e mais coisas da Cidade de Coimbra, 1678, Fls. 86-87; Tombo dos bens, propriedades, rendas, heranças e mais coisas da Cidade de Coimbra, 1768, Fl. 135-136v.

Pela leitura dos ditos tombos da cidade de Coimbra de 1678 e 1768, ficamos com a sensação que Matheus Francisco, Manoel Francisco Maleiro, Joze Francisco, Manoel Simões e Sebastião Fernandes, todos da Marmeleira, devem ter sido os herdeiros destas casas, pois são eles que surge pagando o foro até 1807.

Tabela 2- Bens situados na Marmeleira e foreiros à Câmara Municipal de Coimbra, em 1678 e 1768(157) Bem em 1678 Foreiros Foro Descrição Confrontações Situação em 1768 Uma morada de casas pra- Pascoal Fernandes Por dia de S. Miguel Comprimento: 10 varas Nascente: com Rossio e As casas andam aforadas a Manoel zo da Câmara (nº161) e sua mulher Anna de Setembro 40 rs. Largura: 5. estrada Francisco Calcam, do dito lugar e a Jorge. Poente: com caza prazo da sua mulher. Têm o nº 266 e mantêm câmara o foro Outra casa prazo (nº 162) Id. Id…20 rs. Comprimento: 5 varas Nascente: com estrada pú- As antigas duas casas reúnem-se sob Largura: 4 varas blica que vem para a cidade um único número - o 265. Poente: Casas de Domin- Andam aforadas a Manoel Francisco gos Francisco Maleiro. Paga-se 30 rs. Outra casa (nº 163) Id. Id…10 rs. Comprimento: 8 varas Nascente e Poente: com a Largura: 6 estrada Sul: casas de Domingos Francisco Outra caza (nº 164) Margarida Antonia, 10 rs. Comprimento: 9 varas Nascente:estrada que vai No tombo de 1768 surge o nº 267, viúva de Simão Vaz Largura: 10 para a cidade sob qual se reúnem duas casas, ambas Poente: casas de Manoel na Marmeleira. As suas dimensões são Simois avaliadas em 9 varas de comprido e 10 de largura. Pagam de foro 10 rs por dia e andam na posse dos casais Adriam Francisco e Jozefa Maria e Joze Francisco e Maria.

III – Vida Económica e Social – o território, os senhorios, exploração e ocupação do solo

Freguesia de Souselas – um povo com História

Estas casas foram descritas pela Câmara Municipal no inventário dos prazos de 1875. Neste documento, surge um conjunto de 3 casas (numeradas do 290 ao 292), todas com indicação de terem sido arrematadas por António Rodrigues Silvestre, da Marmeleira, a 24 de Abril de 1878, o qual por sua vez as aforara a Theotonio Serodio, também da Marmeleira(158). Segundo aquele inventário o município era detentor de mais bens na área da freguesia que aos poucos foi aforando. Um número que talvez se explique pela extinção dos concelhos de Souselas, Zouparria e Marmeleira, revertendo para a posse da Câmara Municipal de Coimbra um conjunto alargado de propriedades(159): • A casa do concelho de Souselas com o nº 293 (que analisamos adiante) • Um bocado de terreno junto a uma propriedade no sítio do «caminho do forno» no limite do lugar da Zouparria do Monte. Tinha o nº 294 e era dos herdeiros de Manoel Cardoso, pagando de foro 50 rs. Confrontava a Poente com o caminho que vai para Sargento-Mor, com um baldio do concelho e com caminho que ia para um forno que houve no sítio dos Lagares. De facto, por escritura de 2/2/1831 o município aforara o terreno a Manoel Soares Cardozo, natural da Zouparria do Monte mas residente em Coimbra. Em 1868, este terreno passou para Joaquina Santos, v.ª de João Soares Cardoso, da Zouparria do Monte(160). • Uma vinha no sítio da Solheira, limite de S. Martinho do Pinheiro, com o nº 295. Confrontava do Poente com Manoel Grillo, da Marmeleira, e dos restantes com «rocio do concelho». Estava avaliada em 50.000 rs e era enfiteuta Jacintha Caetana, viúva, de Sargento-mor. Desconhecia-se o título ou a posse. A estes bens pode-se ainda acrescentar, o aforamento de um baldio a Joaquim Nogueira, do lugar da Marmeleira, a 29/12/1838. Uma cedência que obrigou a despacho da CMC, depois de informação da Junta de Paróquia e do Regedor. Tratava-se de um «insignificante bocado de pouzio em que o Suplicante pertende construir huma caza em hum baldio no simo daquelle lugar a partir com a estrada…»(161). Foi arrematado a 2 de Dezembro do dito ano pelo valor de 100 reis. Alguns anos depois, a 24/04/1878, foi o foro colocado em praça pela CMC, tendo sido arrematado por Manoel Nogueira da Marmeleira, por 6.810 rs(162).

(158) (159) (160) (161) (162)

A.H.M.C. - Inventário dos prazos da Câmara Municipal do Concelho de Coimbra, 1875, Fl. 98 Id. Fl. 184 A.H.M.C. - Livro de Foros da Câmara Municipal de Coimbra, 1862-1897, Fl. 131 A.H.M.C. – Livro de Notas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 20, 1830-1844, Fls. 156-156v. A.H.M.C. - Livro de Autos de Arrematação da Câmara Municipal de Coimbra, 1877-1878, Fl. 4

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IV EVOLUÇÃO ADMINISTRATIVA

A

A. Administração Religiosa

té às transformações operadas pelo liberalismo no século XIX, a freguesia de Souselas tinha uma noção e expressão essencialmente religiosas. Integrada no Bispado de Coimbra, os seus limites contavam mais para efeito de controlo dos actos de fé do que para actos de administração de natureza civil. Contudo, os documentos apontam para a existência de mais do que uma paróquia na área da actual freguesia: uma teria sede em Souselas e a outra na Marmeleira. Não sabemos quando foi criada a paróquia de Souselas embora a sua antiguidade esteja bem demonstrada. Relembre-se a existência de uma baselica em Souselas, segundo documento do ano de 937; Justa doara tudo quanto possuia na villa de Sausellas ao mosteiro de Lorvão, excepto a baselica, que seria uma Igreja sede da paróquia (ou vigararia), então consagrada, como hoje, a S. Tiago, e que se manteve pertença da Sé de Coimbra até 1197, ano em que o Bispo D. Pedro, a doou ao Mosteiro de Lorvão. Contudo, a Marmeleira (e ou S. Martinho do Pinheiro) fôra também, uma paróquia, ou seja; uma freguesia religiosa autónoma, sem dependência a Souselas. A revelação consta de um documento de 15 de Agosto de 1103, quando Mendo Mides e sua mulher Pomba doam em testamento à Sé de Coimbra, uma herdade e uma Igreja junto ao lugar designado por Marmeleira(163). O documento, redigido em latim, refere as confrontações da herdade e igreja, cujas coordenadas excluem a hipótese de se referir a qualquer outro local conhecido com o mesmo nome no actual concelho de Coimbra: a Oriente partia com a via publica que vai para a Vacariça; a Ocidente com a via da Vimieira; a Norte com a villa de Arias Menendit (que pode muito bem ser a referida villa da Marmeleira mencionada no ano de 1086). Acrescente-se que, no referido documento de 1197, o mosteiro recebeu uma igreja de S. Martinho «de Caimbria», que pode muito bem ser a que se localizava no lugar de Marmeleira ou de S. Martinho do Pinheiro.

Manuel Augusto Rodrigues; Avelino de Jesus da Costa - Livro Preto, Cartulário da Sé de Coimbra, 1999, Doc. Nº 40 Pp. 70-71

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153

Freguesia de Souselas – um povo com História

Refira-se que a existência de uma Igreja – e paróquia - na Marmeleira fora relembrada nas informações paroquiais de 1721. O pároco de então, Bernardo do Amaral e Cunha, em resposta a um inquérito do Bispado anotava que relativamente à capela da Marmeleira «dizem foi antigam.te Igr.ª Matris»(164). Um dado que, à semelhança dos demais, fôra recolhido das consultas feitas a pessoas antigas e que poderá apenas significar que a capela da Marmeleira teria desempenhado a função de Matriz, talvez enquanto decorressem as obras na Igreja de Souselas durante o séc. XVI. No entanto, há um dado intrigante no documento de 1103 que se prende com o seu título. «Testamentum de Sancto Martino de Paliares». Como se depreende do conteúdo do documento, a «ecclesia» fora edificada «in honore beati Martini». Contudo, actualmente, na Marmeleira apenas existe uma simples capela dedicada a S. João Baptista, ao passo que não muito distante, para Sul, se localiza uma povoação que invoca o orago da dita igreja, quem sabe a sede da antiga paróquia da Marmeleira – S. Martinho do Pinheiro (embora a invocação da capela seja actualmente Nossa Senhora da Nazaré). Terá a povoação de S. Martinho do Pinheiro - que como vimos poderia existir antes de 1095 com a designação de S. Martinho de Paliaes ou Paliares sido a sede de uma paróquia que cresceu, posteriormente, na peugada da antiga herdade e igreja vindo a ser extinta mas conservando no topónimo a memória do santo padroeiro da paróquia de que era sede ou a que pertencia? Ou os seus habitantes adoptaram a designação para se distinguirem da Marmeleira logo que esta paróquia foi extinta ou anexada por Souselas? Ou ainda seriam, na realidade, duas paróquias distintas? O que parece ter fundamento é a hipótese da igreja-sede da desaparecida Freguesia da Marmeleira, se ter localizado na área onde mais tarde se veio a desenvolver a povoação de S. Martinho do Pinheiro. Dá-lhe crédito a informação de Vergilio Correia registada em 1940 e colhida na vox populis: «No cabeço crê o povo que houve uma antiga capela»(165). Ou seria uma igreja? (perguntamos nós…). Maria Leonor Santos publicou, em trabalho de investigação relativo ao Mosteiro de Lorvão, uma lista de auxiliares do clero onde surgem as designações de Afonso Pires «Prior da Marmeleira» em Fevereiro de 1349 e de Afonso Vicente, também «Prior da Marmeleira» entre Janeiro de 1372 e Setembro de 1379(166).

A. U.C. – Fundo do Cabido: Informações Paroquiais 1721, Souselas, Fl. 1 Vergílio Correia - «Notas de Arqueologia e Etnografia do Concelho de Coimbra», In Rev Biblos, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Vol. XVI, Coimbra Editora, L.da, Coimbra, 1940, P. 135 (166) Maria Leonor Ferraz de Oliveira Silva Santos – O Domínio de Santa Maria do Lorvão no século XIV: gestão feminina de um património fundiário, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2001, P. 149 (164) (165)

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IV – Evolução Administrativa

A paróquia da Marmeleira (e ou de S. Martinho do Pinheiro) suscita como vimos, muitas interrogações que permanecem sem resposta; quando se constituiu(ram) tal(is) paróquia(s), porque razão dela(s) não existe qualquer referência escrita (nem mesmo livros de registo paroquial) e que área territorial abrangeria(m)? Porém, algo terá acontecido nos anos posteriores aos documentos de 1086 e 1103, uma vez que a Paróquia de Souselas, nos finais do séc. XII, foi cedida ao Mosteiro de Lorvão pelo Bispo D. Pedro Soares incluindo, surpreendentemente, o lugar da Marmeleira, além dos de Sauselinis (Souselas?), Carnemá (Carrimá), e Saas com suas igrejas. Uma situação que parece ter estabilizado a partir de então, uma vez que mais de 100 anos depois e no Rol das igrejas do Bispado de Coimbra de padroado régio(167), datado de 1209 (ou 1229), consta a Igreja de Santiago de Souselas – Sanctus Jacobus De Sauselas – como a única sede de paróquia na área do actual território da freguesia. Uma realidade que se manteve nos tempos seguintes e que foi reafirmada nos anos de 1320-1321. De facto, no reinado de D. Dinis procedeu-se ao apuramento do rendimento de todas as igrejas, dos quais se pretendia deduzir a décima parte para fortalecer a marinha de guerra na luta contra a pirataria sarracena. A retenção da dízima de todas as igrejas, durante três anos e, aplicação da mesma, para tão relevante fim seria autorizada por bula do papa João XXII. No catálogo daquelas igrejas, Santiago de Souselas aparece integrada no Arcediagado de Vouga, sendo taxada em 100 libras. Era, sem dúvida, uma paróquia importante na região envolvente(168). Um pouco mais tarde, em 1344, Souselas surge como uma das cinquenta igrejas que o Bispo de Coimbra, D. Jorge, ordena que contribua para as fontes, pontes e calçadas do concelho(169). Em 1402, Souselas era uma das igrejas do dito arcediagado que pagava colheita ao Bispo de Coimbra bem como 1 libra de cera(170). No elenco, figura também a Igreja da Marmeleira, sem que consigamos saber se é ou não a referente à “nossa” terra. Faltam-nos muitos elementos para compreendermos como se organizou a administração religiosa da área a partir de então. Os livros de registo paroquial de Souselas, que se conservaram até aos nossos dias, têm princípio em 1628, António Gomes da Rocha Madahil – Milenário de Aveiro, Colectânea de Documentos Históricos, Vol. I, 959-1516, Câmara Municipal de Aveiro, 1959, P. 49 (168) Fortunato de Almeida – História da Igreja em Portugal, Vol. IV, Livraria Civilização-Editora, Porto-Lisboa, 1971, P. 124 (169) António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. I, Coimbra, 1971, P. 22 (167)

A.U.C. – Fundo da Mitra Episcopal de Coimbra: Censuais e registos de receitas de foros e rendas, 1402, Liv.º n.º 122, Fls. 7; 38-40.

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mas sabemos através do registo das colações do Bispado, que foram apresentados párocos pelo Mosteiro Lorvão em datas muito recuadas, havendo menção a uma confirmação datada de 1342(171). No entanto, parece-nos que a Paróquia de Souselas se organizou (ou reorganizou) em tempos relativamente recentes (século XVII), sem que saibamos onde os seus habitantes receberiam os sacramentos antes dessa reforma. De facto, consultando os livros paroquiais das freguesias em redor (incluindo Botão, Brasfemes, Barcouço, Torre de Vilela e Trouxemil) em nenhum se encontram registados actos praticados pelos fregueses provenientes dos lugares correspondentes à actual Freguesia de Souselas. Na realidade, os primeiros registos paroquiais da freguesia são um pouco tardios. Datam de 1628 e atestam a existência de um vigário, o que significa que Souselas era então uma vigariaria, ou seja um espaço de administração eclesiástica cuja área de jurisdição pertencia ao vigário que ali exercia o seu cargo ou função, administrando os sacramentos. Esta vigariaria era da apresentação, desde tempos remotos, do Mosteiro de Lorvão. No que toca à paróquia de Souselas, o primeiro assento paroquial (um baptismo) data de 21 de Março daquele ano (foto 31): «Aos 21 do mes de março de 628 annos baptizei eu Mel. Simois vigr.º desta igr.ª a m.ª filha de Matheus João e de sua m. Izabel ant.ª forão pp. Diogo frz campos e Izabel ioão todos m.ors neste lugar de Souzellas»(172). Assina este registo o pároco Manoel Simois, que é também quem assina o primeiro casamento e o primeiro óbito conhecido; o casamento datado de 29 Novembro de 1628 e relativo aos esposos d.º Simois e Joanna Gaspar e, o óbito, de um menor da «idade de 8 p.ª 9 annos». Chamava-se Paullo e falecera a 18 de Outubro, tendo sido sepultado no adro da igreja. Os registos paroquiais permitem constatar como a área da freguesia religiosa de então corresponde, grosso modo, aos actuais limites da freguesia civil. Com uma particularidade; é que neles se assinalam, ao longo dos tempos, algumas povoações hoje desaparecidas ou integradas em aglomerados maiores. Assim, e nos primeiros anos (1628-1643), destaca-se aquele que devemos considerar como o núcleo estruturante da freguesia, os lugares e sítios de: Souselas, Azenha, Marmeleira, Zouparria, Lagares, Pisão, S. Martinho, Carrimá, Canetas, Berbolega, Venda do Carneiro e Venda da Serra. Alguns destes topónimos acusam variações como Carrimá-Carnimá e S.MartinhoCasal de S. Martinho e Zouparria-Zouparria do Monte (a partir de 1643).

Vide nesta obra, o texto referente à Igreja Matriz de Santiago de Souselas, no Capítulo do Património. A.U.C. – Fundo Registos Paroquiais, Freguesia de Souselas (Coimbra): Livro Misto de Baptismos, Casamentos e Óbitos, 1628-1769, Fl. 1

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IV – Evolução Administrativa

Sem dúvida que do conjunto integrante da vigariaria, as vendas assumem especial curiosidade, pois hoje não existe qualquer povoação com tal nome nos limites da freguesia. Valeu-nos, uma vez mais, o estudo um pouco mais demorado dos registos paroquiais para tentar uma explicação. Se o lugar Venda do Carneiro nos parece pontual, o mesmo não sucede com a Venda da Serra. Esta desaparece em 1674 dos registos, dando lugar a uma «venda da Zouparria iunto ao Sargento-mor». O dado colhe-se no baptismo de Jozeph, filho de João Roiz e Anna Cardoza, ocorrido em 24 de Março de 1686, cujos pais dizem habitar nesse local. Esta venda parece ser na Zouparria e junto ao lugar de SargentoMor. Porém, também desaparece dos registos paroquiais nos anos seguintes. Registos posteriores de baptismos dos filhos resultantes de um outro casamento, o de Paulla Cardoza (talvez irmã da referida Anna Cardoza) com Antonio Ferreira e datados de Julho de 1692 e Março de 1695, apresentam-nos como moradores na «venda do Sargento-Mor desta freg.ª». O nascimento e registo do terceiro filho do casal esclarecem este caso, ao informar que Antonio, baptizado em necessidade, morava com os pais no lugar de Sargento-Mor. É assim muito provável que na origem do lugar de Sargento-Mor tenha estado a venda do Sargento-Mor, que por sua vez seria a herdeira, tanto da venda da Zouparria como da antiga Venda da Serra. Estes comércios estariam certamente situados bem perto da Estrada Real, também designada nos assentos paroquiais (a partir de 1634) por «Estrada de Castella», aproveitando o movimento de pessoas e bens que nela circulavam. Vendas que, por estes anos, também se detectam nas povoações de Souselas, Canetas e Santa Luzia. Os registos paroquiais relativos a Souselas dão ainda conta de algumas situações pontuais, como o facto de se terem administrado sacramentos de indivíduos oriundos de Picanços (1699 e 1730), lugar hoje pertencente à Freguesia de Barcouço. Segundo as informações paroquiais de 1721, a freguesia compunha-se apenas dos lugares de Souselas, Marmeleira, Zouparria do Monte e Carrimá. O pároco de então omitiu alguns lugares, erro que se repetiu em menor escala anos mais tarde. De facto, e segundo o Dicionário Geográfico de 1758 (foto 32) a freguesia de Souselas abrangia oito lugares: «Souzellas; Marmeleira Zouparria, S. Martº Canetas e Sargentomor; e Azenha e Carrimá»(173). Evidentemente que aqui havia ainda que acrescentar os lugares do Pisão, de Lagares e Ribeiro. Em termos de culto importa referir a intensidade da veneração a S. Martinho. Não só pelos antigos documentos, mas também pela existência de uma capela dedicada a S. Martinho no lugar da Zouparria do Monte.

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A. N. T. T. – Dicionário Geográfico de 1758, Souselas, Vol. 35, nº 238, P. 1701

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B. Autonomia Concelhia 1. Introdução Se existia desde tempos antigos, uma freguesia religiosa de Souselas, que para efeitos de administração dos sacramentos integrava (pelo menos desde 1628) não só o próprio lugar sede, mas também os da área envolvente, o mesmo não se aplica à vida concelhia. De facto a essa malha religiosa sobrepunha-se uma outra, de carácter civil, na dependência do Município de Coimbra. Na realidade, os principais lugares da freguesia inseriam-se desde séculos no termo coimbrão, afinal uma vasta área composta de imensos lugares, alguns a sede de pequenos concelhos, dotados de certa autonomia. Informações mais específicas chegam-nos do numeramento ou censo da população do país ordenado por D. João III, através de alvará de 17 de Julho de 1527. Analisando a parte tocante à Comarca da Estremadura, onde Coimbra se inseria, verificamos que Souselas, Marmeleira e Zouparria do Monte integravam o «Titolo das aldeas que estam da banda daqu contra o Porto, que a cidade tem toda a jurdição civel e crime»(174). Um dos levantamentos mais antigos do Termo coimbrão resulta da carta régia de 12 de Março de 1533, em que com a nova divisão administrativa do país se criou a Comarca de Coimbra, ficando assim separada da Estremadura de que até então fazia parte. De acordo com os documentos da época, Souselas e Zouparria do Monte eram povoações do termo, sendo de estranhar a ausência da Marmeleira(175). Termo que tinha, segundo este registo, 99 concelhos, 45 dos quais localizados a Norte do Mondego. No livro que registou o lançamento da finta da levada dos presos sobre os concelhos do termo surge, em 1597, a Marmeleira contribuindo com160 reis e Souselas com 440 reis. Este livro, cuja cronologia avança até 1623, regista também a contribuição de outro concelho, a Zouparria do Monte, a partir de 1599, fixando-se neste ano o valor de 110 reis(176). Esta relação Souselas-Município de Coimbra manifesta-se em diversas ocasiões, especialmente no domínio fiscal. Na verdade, as freguesias eram as unidades mais estáveis para a cobrança tributária centralizada, o caso dos usuais. Tratava-se de um imposto de consumo, que era repartido pelos concelhos do

Armando Carneiro da Silva - «Evolução Populacional Coimbrã» In Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII, Boletim da Biblioteca Municipal de Coimbra, P. 213 (175) Id. P. 216 (176) A.H.M.C. - Finta da Levada dos Presos, 1597-1623 (174)

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IV – Evolução Administrativa

termo sob a forma de cabeção. No caso de Souselas, permite verificar a importância económica da área da freguesia; entre 1675 e 1698 o contributo anual foi de 30.000 réis colocando-a no nono lugar a par de Taveiro(177). Alguns direitos antigos e imemoriais da cidade sobre os concelhos e lugares do termo, como as juradias, eram também cobrados ciclicamente. Assim, entre os anos 1739 e 1791, os concelhos da Zouparria do Monte, Souselas e Marmeleira pagaram anualmente à Câmara Municipal respectivamente 550 rs, 1150 rs e 550 rs(178). Como vimos e na área de Souselas regista-se, desde tempos recuados, a actividade de três pequenos concelhos: Souselas, Marmeleira e Zouparria do Monte. Uma realidade que nem sempre era avaliada pelas autoridades religiosas; se nas informações paroquiais de 1721 nem sequer vêm mencionados, já nas memórias de 1758 é-lhes feita uma breve referência, embora se confunda o concelho da Zouparria com o (inexistente) de S. Martinho do Pinheiro. A antiguidade destes concelhos é dificil de datar, desde logo porque nos faltam muitos dos livros que compunham o seu arquivo (designadamente os de actas e os de termos). Nos diversos Tombos setecentistas dos senhorios da área, foram-lhes feitas breves referências. No que toca ao concelho de Souselas refere-se, por exemplo: • «terra das Almoinhas e amendoeyra junto do curral do concelho do dito lugar de Souzellas»(179). • a casa em que vive Francisca Parente, inquilina do casal de S. Cristóvão, que «parte do nasente com azenhaga do conselho»(180) Quanto à Marmeleira temos também as seguintes referências: • uma vinha aforada ao orfão Jozeph, que parte com «caminho do conselho» (Tombo do Cabido de 1722), ou o «Rexio do Conselho» (Tombo de Lorvão em Souselas, 1705 e, na Marmeleira, 1706). À frente destes concelhos estava um quadro de oficiais, constituído por um juiz, um procurador e um escrivão, no conjunto designados por justiças da terra. Os mais antigos registos de oficiais destes concelhos datam do ano 1533 e constam do «Juramento dado aos juizes do termo da cidade».

Sérgio Cunha Soares – O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo, Vol. I «Geografia do Poder Municipal», Centro de História da Sociedade e da Cultura, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2001, P. 56 (178) A.H.M.C. – Juradias, 1739-1791, Fls. 3-8 (179) A.U.C. – Fundo das Congregações Religiosas: Igreja de S. Cristóvão – Tombo de Souselas, Ançã, Cioga e Quimbres, 1724, Fl. 46 (180) Id. Fl. 33. Esta azinhaga deve corresponder ao arruamento actual conhecido como Azinhaga do Arco. (177)

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O primeiro fez-se a Joam Vaz, do concelho da Marmeleira, seguindo-se Joam Goncallvez, de Souselas e, por fim, Joane Anes para a Zouparria do Monte(181). Abaixo destes oficiais principais existia o pequeno oficialato: avaliadores dos prédios rústicos e urbanos, bem móveis e frutos, depositário geral das penhoras e louvados. E foi no conjunto dos depositários gerais das penhoras, nomeados para o concelho da Marmeleira, que descortinámos aquele que será um caso raro a nível nacional; o desempenho da função por uma mulher! O facto data de 1795 e sabemos o seu nome e o lugar onde habitava: «Joana da azenha»(182). Em termos de desempenho de funções, recorda-nos António de Oliveira que «A primeira função do juiz das aldeias, ao entrar em exercício, consistia em reunir-se em conselho com os homens-bons e eleger uma pessoa que guardasse a terra. O guardador, de preferência, devia servir todo o ano e com soldada paga pelos moradores (…) Os guardadores eram responsáveis pelos danos praticados durante o tempo que servissem e, como tal, compelidos a pagá-los ou a darem danador»(183). O guardador, para desempenho da sua função teria de conhecer o gado e cuidar de saber quem era o seu dono. Coimas que se aplicavam quando o gado era achado em lugares coimeiros e defesos. Neste caso o gado devia ser conduzido e encerrado no curral do concelho, uma estrutura cuja construção era feita à custa dos moradores, de que era responsável o juiz e do qual só saía assim que fossem saldadas as coimas e danos. A especificidade da sua função trazia-lhe amizades, inimizades e represálias, até porque metade do valor da coima era para si. Contudo, a primeira referência directa ao juiz do lugar de Souselas nas actas do município colhe-se a 19 de Dezembro de 1646, quando por estar impedido por doença o juiz, um vizinho apresentou queixa contra as apropriações dos caminhos e poisios públicos feitos por alguns indivíduos: «…pareceo fr.co Frz o Mole de Souzellas; e disse q. como homé do povo do ditto lugar q. por estar enfermo o juiz delle requeria a elle offc.es da Camara q. fossem na forma da ordenassão desforsar o conselho ao limite do ditto lugar e em m.tas partes que se tem tomado caminhos rozios e seus logradoures e em especial Matheus Frs. do ditto lugar; e Ant.º Simois e Ant.º frz; Dog.s frs de Treixomil os quais tendo propriedades junto ao Rio do ditto lugar, forão plantando nas Rib.ras delle arvores e censr.ºs com q. estereitarão o ditto Rio e se taparão ao depois de paredes de man.ra q. enchendo o rio não tem vazão e entra pello ditto lugar fazendo grande percursso ao bem com ». No acto Frz molle obrigou-se a pagar as custas da vistoria e assinou o dito termo (184).

A.H.M.C. – Livro de Vereações, 1533, Nº 6, Fls. 26, 26v. e 27 A.H.M.C. - Livro dos Juramentos das Justiças dos concelhos do Termo da Cidade de Coimbra, 1795 (183) António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. I, Coimbra, 1971, P. 63 (184) A.H.M.C. – Livro de Vereações da Câmara Municipal de Coimbra, 1644-1648, Fl. 65 (181) (182)

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IV – Evolução Administrativa

A documentação que consultámos mostra que o concelho de Souselas possuía algumas estruturas edificadas: uma Casa da Câmara onde realizava as suas sessões e servia de tribunal (foto 35), um arquivo, símbolos de poder (brasões, varas dos juizes), um curral onde se aprisionava o gado do concelho e uma prisão. A Marmeleira e a Zouparria tinham casa da Câmara e, pelo menos a Marmeleira, possuía também curral. Cada concelho conhecia bem a sua área, que havia sido fixada e acordada ao longo dos séculos, conhecimento que passava de geração em geração. Limites que tinham uma especial relevância quando em causa estavam matérias relativas a pastagens do gado. A 24 de Maio de 1830 o concelho de Souselas ordenava em postura «A outro sim que o gado do concº da Zoup.ª tambem não pasase da estrada dos corvaixos»(185). Concelhos cuja lei principal, nos séculos XVIII-XIX, era ditada pelos regimentos, como aquele que se conservou de Souselas, embora cópia do impresso em 1740 e intitulado Novo Regimento para os Concelhos do Termo da Cidade de Coimbra. A importância deste regimento mede-se pelo facto de, amiúdas vezes, ser referido aquando da definição das posturas feitas pelos concelhos. Tal foi o caso de Souselas que na sequência das audiências às coimas, fixará uma postura datada de 24 de Junho de 1835 e a requerimento do povo, onde a memória e importância do regimento salta à vista: «Nesta requereu o povo a observensia do regimento para os conselhos da sidade de coimbra soubre os artigos Artº quatorze das pesoas que se acharem em fazendas alheias e furtos. Item que senão consintão cabras neste destrito na forma do mesmo regimento e por esta forma se porsedeu audiensia eu escrivão com o meu juis e procurador ha maior parte do povo»(186). Por questões de segurança e operacionalidade, e de acordo com o dito regimento, o município racionalizou e controlou, a partir de 1748, os diversos concelhos do termo elaborando um mapa de trajectos a percorrer por caminheiros, quando eram portadores de ordens régias, camarárias ou concelhias. Assim, foram agrupados num sistema conhecido por «Methodo ou Cordas, para expedir Caminheyros aos Conselhos pello seu Caminho direitto, para trazérem as pauttas»(187). Reunidos segundo o critério geográfico, os três concelhos da freguesia foram integrados na 7ª corda, que era constituída pela Marmeleira-Larçã-Figueira de Lorvão-Sazes-Brasfemes-Souselas-Lorvão-Zouparria do Monte-Outeiro do Botão-Vilela-Logo de Deus-Casais de Eiras e S. Paulo.

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A.H.M.C. - Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, Fl. 70 v. Id. Fl. 79v.

A.H.M.C. – Livro de Pautas das Justiças do Termo da Cidade de Coimbra, 1748-1754, Fl. 6v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A toponimia dos antigos lugares que foram concelhos conserva a memória dos tempos idos. Na Marmeleira temos, por exemplo, uma artéria sem saída designada por «Beco Paços do Concelho». Talvez por aí se localizasse a casa que serviu para as reuniões dos oficiais concelhios.

2. O funcionamento dos Concelhos de Souselas e Zouparria do Monte Da actividade destes concelhos, conservaram-se alguns livros que nos ajudam a reconstituir o seu modo de funcionamento no período que antecedeu a extinção (foto 33). As justiças que estiveram à frente dos destinos destes concelhos (bem como do da Marmeleira) são conhecidas, de forma regular, para os anos 1719-1829(188). Deve, no entanto, ressalvar-se que por Provisão do Desembargo do Paço de 10 de Junho de 1813, o concelho da Zouparria foi anexado interinamente ao de Souselas (189). E, ao que parece, em 1834 voltou a unir-se e a desunir-se. O Livro das eleições das justiças do Concelho de Souselas relativo ao período 1823-1834 fornece-nos preciosas informações sobre o funcionamento do concelho. Nas suas sessões de Câmara elegiam-se não só os oficiais concelhios principais - juizes, escrivães e procuradores - mas também funcionários de menor relevância como Louvados «para repartisão das Agoas de Rega», Depozitarios, Recebedor, Mestre de Vallas (que depois dá lugar ao Juiz das Vallas em 1832). Ao nível da eleição dos oficiais verifica-se que o acto não era definitivo. Consistia na simples elaboração de pautas, com os nomes dos mais votados, capazes de desempenharem o cargo para que eram eleitos. Contudo, posteriormente, esta pauta era remetida ao corregedor que poderia não aceitar o mais votado. O acto de feitura da pauta fazia-se na presença do povo e ficava registado em acta: «E por esta forma fizemos a ditta Pauta = Aos vinte dias do mes de Novembro do Anno do Nacimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil e outocentos e vinte cete annos Em este lugar de Souzellas sendo No dia antes todos os moradores do Conselho notificado para a fatura da dita Pauta e com os que

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Vide Anexos, Tabelas 4, 5 e 6. A.H.M.C. – Registo da Legislação, Tomo 4º, Fl. 309

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se juntarão se prosedeu A ileição asima declarada que asignarão os botantes aqui com o Juis e Procurador comigo Escrivão que athualmente servio neste prezente anno de 1827»(190). Felizmente que este livro serviu também para registar algumas audiências com o povo, pelo que se conhecem algumas decisões tomadas pelos seus representantes. As duas primeiras, conhecidas e lavradas pelas próprias justiças souselenses, referem-se à proibição (certamente por prevaricação grave da lei) do exercício de cargos concelhios por certas pessoas: «No dia tres de Março de mil oitocentos vinte e sete annos na Seção de Camara foi detreminado que Joaquim Gomes Canora e Joaquim Simoes dos Santos ambos do Conselho de Souzelas não entrarom mais a ser eleitos para cargo algum do Concelho Coimbra 10 de Março de 1827» (…) «Aos des dias do mês de Marco de 1827 Neste Conçelho de Souzellas estando nos em Camara com a p.te do povo fesemos siente a todos o Despacho do Ilustre Senado da Camara p.ª que nenhum homem do d.º Concelho tornasem a deitar botos nos sup.tes asima declarados de que asignaram»(191). JURAMENTO DADO ÀS JUSTIÇAS DOS CONCELHOS DE SOUSELAS, MARMELEIRA E ZOUPARRIA DO MONTE EM 1719 (foto 34) Souselas: «Aos onze dias do mes de fevr.º de 1719 aparesserão Mel. Frz. Franc.º Simois e Mel. Ribrº para escrivão todos do lugar de Souzellas e tomarão o juramt.º dos stºs evangelhos Mel. Frz. de juis Franc.º Simois e Mel. Rib.º de escrivão e prometerão fazer verd.e ao povo e comprir suas cartas q. todos levarão e aqui asignarão eu Franc.º de Moraes da Serra o sobscrevi» Marmeleira: «Aos 12 de Janr.º de 1719 apareserão Mel. Franc.º matalão Andre Franc.º e Ant.º Franc.º Lindo todos do lugar da Marmeleira e lhe foi dado o juramt.º em os St.ºs evangelhos e debaixo do coal prometerão fazer verdade ao povo e comprir suas obreguasoins de q. tudo se fes este tr.º q. elles asinarão e eu Franc.º de Moraes da Serra o sobscrevi» Zouparria: «Aos 17 de janr.º de 1719 aparesserão Dos. Frz. Mel. Ribr.º e Pascoal Franc.º todos do lugar da zouparria do monte todos tomarão o juramt.º dos santos evangelhos debaixo do qual prometerão fazer verd.e ao povo e comprir suas obrigacoins e cartas q. todos jurarão e aqui asignarão e eu franc.º de Moraes da Serra o sobscrevi» Fonte: A.H.M.C. - Livro dos Juramentos das Justiças dos concelhos do termo: 1719-1723

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A.H.M.C. - Livro das eleições das justiças do Concelho de Souselas, 1823-1834, Fl. 9 Id. Fl. 7v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

As restantes sessões lavradas neste livro, referem-se aos acordos tomados pelo povo acerca de coimas relativas ao gado. Pelas sessões camarárias de Souselas passou também a «Eleicão dos cobradores da Renda da Comenda de S. Thiago de Souzellas p.ª os frutos da Comenda do anno de 1834»(192). Através de outra fonte, conseguimos definir uma área, aproximada, de influência do concelho de Souselas. Em termos fiscais, a sua geografia estendia-se a outros lugares, parecendo abranger a área de outros concelhos, caso da Marmeleira. De facto, a geografia das coimas informa-nos que a fiscalidade se estendia além de Souselas; Azanha, Sargento Mor, Canetas, S. Martinho, Corrima, Lagares, Pizão do Canavial, Matta do Machial, Marmeleira. Estas coimas eram fonte de receita importante, na medida em que os concelhos viviam aflitos com falta de verbas. E, ao falarmos de coimas, reportamo-nos sobretudo, a algo que vinha desde os tempos medievais - aos animais encoimados quando entravam em terrenos coimeiros. Ora, em Coimbra e seu termo «…como noutros lugares, havia pastos privados e comuns. O direito de compáscuo era exercido nas terras própriamente comunais e, depois das colheitas, nas propriedades particulares abertas e principalmente “comistas”. Maninhos privados e olivais devassos podiam ser também logradoiro comum dos gados. Nos terrenos fechados era proibida a entrada do gado alheio sem autorização do dono e cumprimento, por vezes de certas formalidades. Igualmente constituíam pastos particulares os de terrenos abertos mas coutados»(193). O livro de audiências às coimas do Concelho de Souselas mostra-nos como estas incidiam em aspectos públicos, como a preservação e conservação de caminhos, pontes, valas e águas de rega, mas também a salvaguarda da propriedade particular, nomeadamente a penalização de quem provocasse estragos nas novidades, vinhas, olivais através do gado (bois, cavalos, cevados, bezerros, porcos). Também as pessoas não escapavam directamente à lei, sendo de destacar, em especial, aqueles que andassem a apanhar azeitona em olivais alheios. Embora suspeitemos da existência de outros livros do tipo para tempos mais recuados, o livro que regista as audiências feitas pelo concelho e povo de Souselas abrange uma cronologia muito restrita, entre 1827 e 1836. Para os anos 1830 e 1834 apurámos as despesas feitas pelo concelho de Souselas, cujas contas se tomavam ao fim do 1º semestre e pelo fim do ano, perante o Provedor da Comarca (tabela 3):

Id. Fl. 18v. António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. I, Coimbra, 1971, P. 83

(192) (193)

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IV – Evolução Administrativa

Tabela 3 – Despesa feita pelo Concelho de Souselas em 1830 e 1834(194) 1830 Com a juradia de Souselas e da Marmeleira 1.700 rs Com a “leva dos prezos” 560 Com o “casareiro” 140 Com a audiência das coimas do 1º semestre 1.440 Com o conserto de pontes no conselho 1.200 Com a propina e lanc.to da desima 400 Com o “afrimen.to de pezos e medidas 560 Com a “ordem p.ª a devassa jenrª 508 Com os “velhetes da terça” 320 Com o papel para o escrivão 800 Com a audiência do fim do ano e rubrica do livro 3.200 1834 Para a Juraria 1:100 Para a “leva dos prezos” 240 “Ordem que veio do Juizo” 240 “na primeira conta” 1740 “lansamento da desima” 500 “conserto da Ponte pedrinha que he estrada Rial” 1600

Estas despesas, mostram como tais concelhos, apesar de pequenos, tinham muito com que se preocupar, muitos gastos a realizar. Fosse com material necessário ao seu funcionamento – papel, velhetes – com o cumprimento da lei – audiência das coimas, aferimento de pesos e medidas, ordens superiores – fosse ainda com os bens concelhios, servindo de exemplo o «conserto da Ponte pedrinha que he estrada Rial». São conhecidas algumas decisões tomadas pelo Concelho de Souselas no período 1827-1835. Através das audiências às coimas, as justiças do concelho ouviam as reclamações do povo, atendendo aquelas que achavam por relevantes. Tomadas as decisões, daí em diante valiam como lei. O conjunto destas pequenas decisões constituía um código de posturas, que vigorava de acordo com o regimento dos concelhos aprovado pelo município conimbricense. Não deve causar admiração que o objecto da lei estivesse intimamente ligado com a vida local, de base agrícola e campesina. Nestas audiências às coimas nem sempre o povo requeria justiça, do mesmo modo que em diversas ocasiões as autoridades concelhias declaram nada ter a assinalar. A maioria das decisões eram tomadas sem grande organização ou sistematização, embora tenhamos exemplo do contrário. Na audiência de 19 de Novembro de 1827, abordou-se um fenómeno curioso da vida agrária

(194)

A.H.M.C. - Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas Fls. 5v.-6

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local, em que o gado de forma sazonal era levado do Alqueive (terra lavrada e deixada em poisio) para a Serra: «…se fes Audeensia ao Povo e se prantaro as posturas nesesarias para que o gado sahise do Alqueive e fose para a serra posto dado e requerido por todo o Povo o qual assim se determinou e se prometeu dar as Provedensias nasesarias para todo ou contesedir retro e determinado para o que logo se determinou que se devião guordar todas as Posturas detreminadas a seg.tes Observasão e Postura Primeira Todo o rabanho de gado que se apanhasse no Alqueve sem que se fezesse huã Audiencia de soltura e cavada azeitona sirea condenado na fforma do Regemento 2ª observ.ªº Que tambem senão consentisse bois nas vinhas senão seram condenados na forma supra 3ª observ.ªº que se não consentisem aleijadeiros(195) sem se determinarem e darem lesen.ª como o hera supra»(196). Intentos de uma sistematização da lei voltam a ser detectados nas posturas fixadas a 15 de Fevereiro de 1834 e relativas aos pastos dos Carrizes: «Ahi aparesendo a maior parte do povo nesta Audiencia requererão os item seguintes 1º Item - «que todo o gado miudo que se achase a pastar nos Carrizes da valla do lagar para baixo e nos tresitos fose condenado na for[ma] da postura de cincoenta reis por cada cavessa. Da valla do lagar pera baixo o nos treitos fose condenado na for[ma] da postura de cincoenta reis por cada cavessa. 2º Item - que toda a pesoa que se lhe visse lanha de oliveira a porta e a cavesa não tendo oliveiras suas o não dizendo q.m lha deu fose comdenada na quoantia de sem reis. 3º Item - que toda a pesoa que fose apanhada nas bordas dos rios a lanha pelo muito dano que fazem desta pondo portais tirando estacas e travesas fose condenada em sem reis.

Aleijadeiros seriam os que andavam à leija, ou seja; à lenha A.H.M.C. – Fundo Concelho de Souselas: Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, Fls. 61v.-62

(195) (196)

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IV – Evolução Administrativa

4º Item - que toda a pesoa que atravesase fazendas cotivadas não sendo p.r elas seu caminho obrigado fose condenado em sem reis»(197). Contudo, a maior parte das posturas foram fixadas de forma não programada e a requerimento de particulares ou do povo no geral. Nelas, pedia-se na maior parte dos casos que carreiros, vinhas, olivais ou terras ficassem coimeiros a gado e mesmo a pessoas. Vejamos alguns exemplos: Sobre carreiros, a postura de 2 de Maio de 1833; «…requereo Antonio da Costa q. ficase comeiro o carreiro de tras das eiras p.ª toda a colidade de guado condenado em – 100»(198). Para vinhas, a postura de 13 de Agosto de 1831; «…requero Joaq.m dos Cantos toda a pecoa que ce apanhace na vinha de Valongo sera condenada cem reis»(199). No que toca a terras a postura de 1 de Outubro de 1832; - «toda a peçoa que ce apanhare em teras baixas apanhar ervas cera condenada a cem reis»(200). Sobre olivais a postura de 21 de Abril de 1829 onde se «Requereu a maior parte do povo que toda a pesoa que trrouxer lanha de oliveira nam sendo das suas se condenace na conantia de quinhentos reis»(201). A preservação dos caminhos e pontes foi também objecto de algumas posturas, sendo de realçar a atenção dada à ponte da azenha, em dois momentos distintos mas relacionados: a 28 de Dezembro de 1830 «…para determinasão de caminho no çitio da Ponte dazanha». Nesta audiência determinou-se que a 7 de Janeiro de 1831 se fizesse « «Termo de caminho feito a Ponte dazanha neste conc.º no dia sete de Janeiro o que se fez reformando h a ponte de novo…»(202). Também a ponte de murto será objecto de termo de caminho em Setembro de 1831. Algumas posturas não deixam de ser surpreendentes pela originalidade que encerram. Estão neste caso as 3 posturas de 13 de Agosto de 1831 em que o povo requereu que «… todo cam que se apanhe solto sera cond.º - cem reis // e tdos repas que ce apanha em vinha alheias cera condenados cemco testones (…) toda pecoa q. pacace por huma caleira Sr. Dr. jeronimo por cima da ponta dazanha cera condenada cem reis»(203).

Id. Fls. 77-77v. Id. Fl. 76v. (199) Id. Fl. 74 (200) Id. Fl. 74v. (201) Id. Fl. 67v. (202) Id. Fl. 71 (203) A.H.M.C. – Fundo Concelho de Souselas: Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, Fls. 73v.-74. A título de curiosidade é relevante notar que algumas pessoas ainda se lembram de ver as caleiras para condução da água na Azenha e nas Encruzilhadas, onde se junta o Rio Botão com o Rio Resmungão. (197) (198)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

O concelho de Souselas registava nos seus livros ordens superiores de interesse nacional, que lhe eram transmitidas pela Corregedoria de Coimbra. Tal foi o caso de uma ordem de D. Miguel I, datada de 18 de Janeiro de 1829, e relativa ao gado cavalar e muar: «Sendome prrezente as afetivas deligencias que alguns emdevidos atualmente emprreguão em comprrar guado cavalar e o muar por toda a parte destes meus Reinos pera ser trranspurtados fora deles asim pelos Reinos como pelas costas do mar com os porvecos fins e de nequilar e demenuir a força (…) e querendo o corerer a tão porniciozas como melhevolas emtencois hé por bem que toda a pesoa se achar comprendoda neste escandelozo deluto seia mediatam.te prreza e atuada e condenada no trresdobrio do guado que lha for aprrenhendido com des Annos de degredo pera h dos prrezidos da Afrrica e avendo denuncias se havera com os denuciantes o prrimeiro que as leis prrescrevem a semilhantes respetivos cada hum dos menistros e julguadores nos seus destrritos darão pronta excuzão a este meu Rial decrreto sendo obejeto de rendencia em sua rezendencias coalquer omisão na sua excução o conde basto do concelho de Estado Menistrro e Secratario de Estado dos neguocios do Reino emcarreguado emteiramente do ministerio da Marinha e do Ultramar assim diguo atenda assim emtendido o faça expedir as ordens necesarias palácio de quellus em dezouto de Janeiro de mil e outosentos e vinte e nove»(204). Acrescentava o corregedor, em informação do dia 3 de Fevereiro, que as justiças do concelho de Souselas «…cumprão e guardem em seu comprimento prrendão emmidiatamente a todas as pesoas sem emceicam que no seu destrrito comprrarem guado cavalar e o muar pera fora do Reino fazendoos loguo remeter a cadea da portaiem desta cidade a minha ordem sendome loguo parte de assim o haverem comprrido e com pena de desponcebelidade a todas as justiças que não comprirem excatamente na dita forma»(205). Relativamente aos outros concelhos apenas se conservou documentação directamente produzida pelo Concelho da Zouparria do Monte, designadamente o livro de coimas, relativo aos anos 1834-1835. Naquele livro de coimas as justiças da Zouparria também inscreveram as despesas do concelho relativas a esses anos, algumas delas bem curiosas (tabela 4):

(204) (205)

Id. Fls. 120-120v. Id. Fl. 121v.

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IV – Evolução Administrativa

Tabela 4 – Despesas do Concelho da Zouparria do Monte 1834-1835(206) 1834 Valor (em réis) Emporte o visto deste livro 2975 Huma hordem de lancamento da decima 200 enportada do Escrivão 400 Mais huma vara de levantar pertencente ao juis como nas pinturas 720 Mais huma vara de algebeira 120 despeza do marco devizorio dos conselhos que se achou imcoverto 1100 Afrimento de medidas do mesmo conc.º 790 Conserto do coral do conselho 830 Conta do livro do primeiro somestre 1710 Mais da ordem do imcartamento 80 Mais uma ordem p.ª o lansamento da desima 100 Mais tambam se abonou as custas da devasa das justisas 3100 Mais huma arvinha que se achou caida sobre… 1150 p.ª tinta i … 200 1835 (1º semestre) Despezas do Libro Afrimt.º das medidas 525 …de Besta 200 Comserto do cural do comc.º 160 Mais 2 caradas de pedra para comserto da fonte 240 Tinta e papel 400 Mais huma cansela para cural 120 Mais para … huma arrenha 400

As despesas do concelho da Zouparria abrangeram todo o ano de 1834 até ao primeiro semestre de 1835. Embora nem todas se compreendam muito bem, salta à vista que uma parte considerável das despesas se relacionava com o material necessário ao funcionamento administrativo do próprio órgão concelhio; papel, livros, varas e tinta. Mas, sem dúvida que a conservação e manutenção dos bens concelhios absorvia uma quantia muito significativa, entrando neste caso as despesas com o curral do concelho, o conserto da fonte, os caminhos («huma arvinha que se achou caida»). Por fim, o cumprimento da lei; as despesas com o «marco devizorio dos conselhos que se achou imcoverto», as custas da «devasa das justisas» ou a «hordem de lancamento da decima». As coimas, como dissemos, eram a principal fonte de receita destes pequenos concelhos. Segundo o livro de 1834-1835, ocorreram no 1º semestre de 1834, doze «condenacois de faltas de caminho», ou seja, gente do povo (incluindo gente de S. Martinho do Pinheiro e Carrimá) que faltou ao trabalho de limpeza, manutenção ou abertura de caminhos (Anexos, Tabela 7).

A.H.M.C. – Fundo Concelho da Zouparria do Monte: Livro das Coimas da Zouparria do Monte,1834-1835, Fls. 3v.-4

(206)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A última das condenações é original e diferente de todas as outras: «Foi condenado Ant.º Fernandes Bixo por não ter medidas aferidas e nem licença e cauzando barulhos de violas por varios…que o povo se queixou dezancomodado». Data a condenação do dia 20 de Maio de 1834, aplicando-se-lhe a multa de 4.000 réis(207). Este António Fernandes Bicho era, na altura, o dono da Venda da Zouparria do Monte. Insatisfeito com a penalização apelou directamente para a instância superior, o Corregedor da Comarca, marcando presença no auto de conferência das coimas, realizado em Coimbra a 22 de Julho de 1834. Na presença das autoridades apresentaria sua petição, não concordando com o motivo da condenação: «…e não achando nem licença nem aferimentos, e fazendo-se continuamente barulhos na venda do suplicante, o condenara na forma do Regimento». O condenado classificou estas alegações como «falço fundamento» e «menos verdadeiro» pedindo «que se julgue sem effeito a coima lançada ao mesmo por falta de licença e afferimentos», denunciando em seguida uma suposta corrupção por parte das justiças da Zouparria: «Tem-se mais a ponderar a Vossa Senhoria que a Justiça tem prevaricado no seu officio em perjuizo da Fazenda Nacional, fazendo Coimas, recebendo as, e não lançando as no livro com sucedeu com as pessôas constantes da Relação junta»(208). Uma acusação grave, feita nas vésperas da audiência às coimas. No entanto, o comerciante será condenado e a razão não lhe seria dada, até porque a 20 de Julho «Em Audiencia, Correição, e Caminhos que se fez (…) e na venda do suplicante se não achou licença nem aferimentos de medida, e continuamente se achão barulhos fóra d´hóras com violas dezacomodando o Povo…»(209). Confirmava-se assim, a condenação lançada em Maio de 1834. Quanto à acusação feita às autoridades, o dono da venda perderá todo o crédito para contestar, uma vez que citado pelas autoridades não comparece à «audiencia e revista aos livros». Em termos de área, o concelho da Zouparria do Monte chegou a abranger Sargento-Mor. Na verdade, e de acordo com o registo da licença concedida a 11/02/1806 a Francisco do Santos, para venda de vinho em Sargento-Mor, nele se afirma que este lugar é do «concelho da Zoparria do Monte»(210).

A.H.M.C. – Fundo Concelho da Zouparria do Monte: Livro das Coimas da Zouparria do Monte,1834-1835, Fl. 2 (208) Id. Fls 5-5v. (209) Id. Fl. 6 (210) AHMC – Licenças e Juramentos, 1805-1807, fl. 116v. (207)

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IV – Evolução Administrativa

C. Souselas no contexto militar: a Companhia de Ordenanças Em Portugal, a constituição de companhias de ordenanças militares, data do início do séc. XVI. D. Sebastião estruturou, de forma organizada, as Ordenanças do Reino; com o Regimento dos Capitães Mores, de 1570, alargou aquela estrutura a todo o reino, criando a base de um exército nacional (até então existiam somente duas Capitanias Mores, uma em Lisboa e outra no Porto). Na época, cada companhia de ordenanças era constituída por 250 homens, distribuídos por 10 esquadras, compreendendo como oficiais: um capitão, um alferes, um sargento, um meirinho, um escrivão e 10 cabos. Cada companhia possuía um símbolo próprio; uma bandeira. Neste contexto, desde os princípios do séc. XVI que a freguesia de Souselas assumiu relevância em termos militares. Nos finais dessa centúria foram reformuladas as áreas geográficas da cidade, reforçando-se o sistema de vigias, procedendo-se à nomeação de capitães para lugares do termo: em 1586 foi nomeado como Capitão das Ordenanças de Souselas, Simão de Oliveira, morador em Botão, ficando também responsável pelos lugares de Botão, Outeiro, Marmeleira, Pampilhosa, Monte Redondo, Figueira, Sazes e Lorvão(211). Este capitão de infantaria, tal como os demais nomeados para o termo coimbrão, deviam estar prontos para tudo, nomeadamente socorrer a baía de Buarcos. No princípio do séc. XVII, a Comarca de Coimbra organizava-se, para efeitos militares, em três Capitanias mores às quais se sujeitavam as 30 companhias de ordenanças dos lugares do termo: a Capitania Mor das Ordenanças do Distrito de Coimbra (integrando a Companhia das Ordenanças de Souselas) bem como as Capitanias-mores do «Destricto de Alvorge» e «Destricto de Poiares». Durante o período da União Ibérica, as companhias de ordenanças entram em declínio, sendo restabelecidas após a Restauração da Independência «a 01/12/1648, naquela que foi uma das primeiras medidas de carácter militar de D. João IV. A partir de então, as ordenanças passaram a prestar um serviço militarmente activo, na defesa e manutenção das fortalezas e pontos estratégicos de cada localidade. Por esta altura, Souselas contribuiu para as despesas de guerra. Estávamos em Maio de 1647 quando se aplicou ao lugar de Souselas 139$776 de um bolo municipal que perfazia o total 29.333$333 réis, montante que a cidade e freguesias do termo e vilas da comarca tinham de pagar(212).

António de Oliveira – Pedaços de História Local, Vol. I, Coimbra, 2010, Terra Ocre – edições, Palimage, CHSC, P. 383. (212) José Pinto Loureiro (org. de) - Anais do Município de Coimbra, 1640-1668, Biblioteca Municipal de Coimbra, MCMXL, P. 157 (211)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Com o prolongar da Guerra das Restauração criaram-se tropas auxiliares (tropas de 2ª linha) e tropas pagas (de 1.ª linha), levando a que as ordenanças deixassem de constituir corpos activos, assumindo funções de recrutamento e mobilização de homens para aquelas linhas do exército. A partir de 1646 deixam de ter qualquer obrigação de serviço militar activo, tanto em tempo de guerra como de paz. Durante o séc. XVIII, caberia às ordenanças elaborarem listas de moços capazes para o serviço militar. A Companhia de Ordenanças de Souselas, dependente e integrada na Capitania Mor de Coimbra, organizava-se no terreno em esquadras, sedeadas não só em lugares actuais da freguesia, mas também em outros, actualmente fora da sua área territorial. De acordo com o Registo Militar relativo a 1764, a Companhia de Ordenanças de Souselas compreendia as seguintes esquadras(213): Souselas (lugar sede da Companhia e de 2 esquadras), Zouparria (esquadra englobando também os lugares de Sargento-Mor e Carrimá), Marmeleira (uma esquadra) – todos lugares actualmente integrantes da freguesia – e os lugares da Pampilhosa (duas esquadras), Canedo (1 esquadra), Outeiro (uma esquadra) e Larçã (uma esquadra) – estes lugares fora dos limites da freguesia actual (os dois primeiros da Freguesia da Pampilhosa, os outros da Freguesia de Botão). Como a partir de 1626 se passou a registar, em livro próprio, no cartório da Câmara Municipal, os termos de nomeação, juramento e posse dos cargos de capitão, alferes e sargento, apurámos os nomes de alguns dos oficiais da Companhia de Ordenanças da Freguesia de Souselas, até finais do séc. XVII: • 14/05/1642: eleição e juramento do Capitão Manoel Ribeiro (substituindo Manoel Roiz Pereira) e do Alferes João dos Santos • 14/06/1642: juramento do Capitão Manoel Roiz Pereira • 13/02/1649: juramento do Capitão Francisco Dias Barreto, que sucede a Manoel Ribeiro. • 13/3/1649: nomeação e juramento do Capitão António de Torres e do Alferes Manoel de Souza - 05/01/1664: juramento do Capitão Manoel de Souza (até então Alferes da Companhia) (214): Durante o séc. XVIII, a Coroa tentou centralizar e aumentar a militarização das ordenanças: em 1707 os Capitães-mores deixam de ser designados pela Câmara Municipal e passam a escolhas do Governador Civil; em 1762, os oficiais de ordenanças usam uniforme militar e insígnias correspondentes às respetivas patentes. Os livros de registo dos autos de nomeação e juramento dos oficiais de ordenanças, incluindo as cartas de patente, abrangem uma considerável cronologia, de 1626 a 1823. Esses documentos permitiram-nos

(213) (214)

A.H.M.C. – Registo Militar, Nº II, 1764-1781, Fls. 22-23v. A.H.M.C. – Eleições Militares Nº I, 1626-1707, Fls. 83, 105, 106v.

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IV – Evolução Administrativa

reconstituir, com algum rigor, parte do quadro de oficiais da capitania das ordenanças Souselas durante o século XVIII e princípios do XIX (tabela 5): Tabela 5 - Quadro de Oficiais da Companhia de Ordenanças de Souselas, Séc. XVIII-XIX (215) Data Nomeação/Juramento Auto de nomeação como Capitão a João Alvz (do Paço do Botão), até então 15/06/1736 Alferes da Companhia, por falecimento do capitão Theotonio Cardozo (nomeação justificada pelos relevantes serviços prestados) 24/03/1738 Auto de Manuel Francisco das Neves (até então Sargento do número) como Alferes Nomeação como Alferes a Manuel de Souza (do lugar de Souselas) por baixa 31/10/1764 do antecedente Nomeação como Capitão a Manoel de Souza Marques (por falecimento do 09/09/1767 anterior no cargo, João Alveres Pires Pinto) Juramento como Alferes, a João Simões Migueis de Andrade, da Pampilhosa 11/06/1776 (até então Sargento do número) Nomeação de António da Cunha, de Souselas, como Sargento do número, 10/05/1786 (por falecimento de Antonio Deniz) Nomeação como Sargento do número a Vitorino Rodrigues, da Zouparria 11/12/1786 do Monte Nomeação como Alferes a Francisco José dos Santos, de Larçã (por baixa do 02/07/1790 anterior, João Simões Andrade) 22/04/1794 Nomeação como Cabo de Esquadra a João Marques (Outeiro do Botão) Juramento como Capitão a Francisco José dos Santos, (até então Alferes da 02/06/1798 companhia) Juramento como Alferes a Antonio da Cunha Soares, morador no lugar do 12/09/1798 Sargento-Mor Nomeação como Sargento, a Francisco Joze Joaquim, do Canedo (até então 12/01/1800 soldado da companhia) Na elaboração das listas dos soldados, assina como Capitão Francisco Joze 02/01/1807 dos Santos Nomeação como Alferes a Francisco José Joaquim, do Canedo (em consequên16/02/1824 cia do falecimento de António da Cunha Soares) Nomeação como 1.º Sargento a Francisco António da Silva, de Souselas e, como 21/02/1824 2.º Sargento, a Manoel Dias, da Marmeleira (por falecimento de Victorino Rodrigues do lugar da Zouparria

As eleições dos oficiais das Companhias de Ordenanças compreendiam uma solenidade própria: em acto de vereação da Câmara Municipal, perante o Capitão-mor do Distrito, Procurador-Geral da Câmara, Misteres e Procuradores da Casa dos 24, analisava-se o currículo de 3 candidatos. Com o tempo, a estrutura das companhias acabaria por refletir a organização social das localidades onde se inseriam, com os cargos dirigentes a serem atribuídos aos mais notáveis

A.H.M.C. - Eleições Militares, N.º II, 1707-1770, Fls. 44v. e 140v.; Eleições Militares, N.º III, 1771-1794, Fl. 32; Eleições Militares, N.º IV, 1794-1806, Eleições Militares, N.º V, 1805-1814, Eleições Militares, N.º VI, 1814-1834 (215)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

das terras. A título de exemplo publicamos, na tabela abaixo, os elementos que compunham a Companhia de Ordenanças de Souselas em 1764 (tabela 6): Tabela 6 - Companhia de Ordenanças de Souselas, 1764(216) OFICIAIS: • Capitão: João Alv.res Pires Pinto, do lugar de Paso, não tem filhos, lavrador, possui uma junta de bois • Alferes: M.el Fran.c.º das Neves, da Pampilhosa, 60 anos, lavrador, possui uma junta de bois • Sargento de nmr.º: M.el Dinis da Conceição, de Larçã, 62 anos, 3 filhos, lavrador • Sargento de supra: An.tº Dinis Jozé, da Pampilhosa, 48 anos, um filho • Escrivão: Duarte Jozé Ferr.ª da Pampilhosa, 37 anos, 3 filhos • Depozitario: João Fran.cº, 64 anos, 2 filhos, uma junta de bois Esquadra: «de que hé cabo M.el Lopes Bap.tª», 37 anos, 2 filhos [Nota: todos os alistados são de Souselas] Alistados Nome Idade Número de filhos Profissão Mello da Cunha 60 1 Lavrador com junta de bois An.tº da Murta 32 Não tem M.el Frr.ª 60 2 An.tº Roiz 28 Não tem Mauriçia de Souza (viúva) 1 An.tº Correa 38 2 Bartelo da Cunha 55 2 Bernardo de Bap.tª 39 1 Sebastião Alvrz. 25 2 M.el da Cunha 24 Não tem Jozé Gomes Felipe 60 1 Lavrador com junta de bois Thomás Ferr.ª 24 Não tem Pedro Gon.ces 50 Idem. João Corr.ª 33 2 M.el Simões 26 1 Lavrador com junta de bois. M.el Duarte 60 1 «Privilegiado da Trind.e» M.el da Cunha 42 2 Sebastião Frz. 24 1 Jozé de Olivr.ª 28 Não tem João Ribr.º 40 Idem. Jozé Ferr.ª 25 1 An.tº Roiz 33 Não tem An.tº Torres 26 1 M.el Lopes 42 1 Jozé da Costa 41 Christóvão Simões 26 1 Jozé Correa 27 1 Calisto dos S.tºs (auxiliar) 42 anos 2 filhos Lavrador com junta de bois Manoel Soares 43 1 Idem.

(216)

AHMC – Registo Militar¸ N.º 1, 1764, Fls. 110v.-115v.

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IV – Evolução Administrativa

Esquadra do Cabo Andre Fran.cº, de Souselas, 50 anos, 4 filhos, Nome Idade Número de filhos Profissão Victorino Joze de Souza 40 3 Lavrador com junta de bois (Souselas) Jozé Lopes (Souselas) 38 2 M.el de Souza, «priviligiado 45 1 da Bulla» (Souselas) An.tº Fran.cº (Souselas) 45 2 Lavrador com junta de bois M.el Luis (Souselas) 30 2 João da Cunha (Souselas) 40 Não tem An.tº Cardozo (Souselas) 26 Não tem Jozé Gomes (Souselas) 25 1 An.tº da Cunha (Souselas) 20 Não tem Crizostemo (pai é de 22 Lavrador Carrimá) Raymundo da Cunha 38 1 (Souselas) An.tº da Costa estanqr.º 50 4 Lavrador com junta de bois (Souselas) João Lopes (Souselas) 25 Não tem Agost.º da Cunha (Souselas) 40 3 Bernardo Simões (Souselas) 35 2 M.el Frz. (Souselas) 25 Não tem An.tº de Souza (da Azanha) 55 2 Lavrador com junta de bois M.el de Almd.ª (da Azanha) 60 Não tem Jozé de Almd.ª (da Azanha) 30 Idem. M.el Correa (da Azanha) 50 3 João Gomes (da Zouparria 35 Não tem do Monte) D.ºs Simões (da Zouparria 45 1 do Monte) An.tº Gon.ces (da Zouparria 25 Não tem do Monte) Jozé Nogr.ª (da Zouparria 26 Idem. do Monte) Sebastião Fran.cº (da 60 1 Lavrador com junta de bois Zouparria do Monte) Jozé Carneiro (da Zouparria 45 Idem. do Monte) Esquadra do Cabo Manoel da Murta, do lugar de Souzelas, 40 anos, 2 filhos, lavrador com junta de bois Nome Idade Número de filhos Profissão An.tº Duarte (da Zouparria) 40 3 Lavrador com junta de bois An.tº Madr.ª dos S.tºs (da 30 Zouparria) An.tº Frz. (da Zouparria) 32 1 D.ºs Frz. (da Zouparria) 25 M.el Fran.cº (de Sargento45 3 Mor) M.el Madr.ª estanqr.º 60 (Sargento Mor)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Nome Idade Número de filhos Profissão M.ª da S.ª (viúva, de 2 Sargento Mor) M.el Gaspar (Sargento Mor) 40 1 Lourenço Carnr.º (Sargento 30 Mor) M.ª Franc.ª (Sargento Mor) 3 Tem uma junta de bois Luis Frz. (de S. Martinho) 30 Jozé Frz. (de S. Martinho) 25 M.el Frz. (de S. Martinho) 30 1 Ignaçio Frz. (de S. 60 3 Martinho) M.el Frz. Barbado (de S. 55 Martinho) M.el Frz.o novo (de S. 26 Martinho) Theotonio Simões (de S. 30 Martinho) Jozé Frz. (de S. Martinho) 28 Ant.º, f.º de M.ª Corr.ª (viúva) «fugio da leva» (de S. Martinho) An.tº Fran.cº (de S. 26 Martinho) M.el da Cunha (de Carrimá) 60 Ag.ºSoltr.º (de Carrimá) 24 M.el Frz. Guerra (de 60 3 Lavrador com junta de bois Carrimá) Sebastiana Fran.c, (viúvaª, 2 de Carrimá) M.el Frz. (de Carrimá) 30 1 Amaro Pr.ª (de Carrimá) 45 Esquadra do Cabo João Simões Bimbo, da Marmeleira, 57 anos, lavrador com junta de bois [Nota: todos os alistados são da Marmeleira] Nome Idade Número de filhos Profissão Agostinho Frz. 50 Jozé Frz. 25 Lavrador com junta de bois Anna Simões (viúva) 1 Tem junta de bois João da Costa 65 1 Tem junta de bois Bernardo Lopes 50 1 An.t.º Jozé 42 3 Adrião Fran.cº 30 1 Lavrador com junta de bois M.el Simões Malino 60 Jozé Fran.cº 30 Me.l Simões Bimbo 50 2 Lavrador com junta de bois M.el Duarte 45 2 An.tº Lopes dos S.tºs 50 1 Lavrador com junta de bois M.el Roiz das Neves 42 1 Idem. M.el Duarte 40 -

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IV – Evolução Administrativa

Nome Idade Número de filhos Profissão Jozé Fran.cº Capatr.º 30 Bernardo Alvares 70 M.el Fran.cº Moleiro 50 1 Lavrador com junta de bois M.el Jozé da Gante 40 1 João Fran.c.Nettoº 56 M.el Fran.cº Calcão 70 M.el Simões da Costa 45 1 João Simões Serodio 50 2 Jozé Fran.cº Barrete 70 2 Lavrador com junta de bois An.tº Dinis 50 João Dinis 45 1 Lavrador com junta de bois M.el Joze de Cabeço 49 1 Idem. M.el Frz. Mathias 70 2 Idem. An.tº Fran.cº 56 1 Idem. M.el Fran.cº dos S.tºs 56 Idem. Sebastião f.º de Luiza Fran. cª, (viúva) Pascoal Jozé 30 M.el Soares 57 1 Bernardo da Cunha 30 1 Lavrador com junta de bois Thereza M.ª 1 João Fran.cº Neto 34 Sylvestre Roiz 54 2 Lavrador com junta de bois Esquadra do Cabo Luís Simões, 30 anos, da Pampilhosa [Nota: todos os alistados são da Pampilhosa] Nome Idade Número de filhos Profissão An.tº Fran.cº Qr.º 40 Jozé Fran.cº 30 1 João Dinis 40 2 Jozé 8 An.tº Jozé 30 Jozé Fran.cº da Conceição 70 2 Lavrador com junta de bois Jeronimo Dinis 33 1 Bernardo Jozé 30 Estanqueiro Fran.cº Simões (solteiro) 30 M.el Jozé 50 Jozé, f.º que ficou de An.tº 12 Frr.ª das Neves Mathias Fran.cº 60 1 Lavrador com junta de bois M.el dos Reis 65 1 Idem. An.tº Simões do adro 70 1 Jozé Ventura 40 2 M.el An.tº Sereno (livre da 55 1 Lavrador com junta de bois revista por ser incapaz) M.el Duarte 60 An.tº Duarte 30 M.el An.tº Quintr.º 60 2 Lavrador com junta de bois Bento Roiz 60 1 An.tº da Cunha 40 1 M.ª Simões 1 Jozefa Pr.ª 1

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Esquadra do Cabo João Simões de Andr.e da Pampilhosa, 38 anos, 1 filho, lavrador com junta de bois [Nota: Todos os alistados são da Pampilhosa] Nome Idade Número de filhos Profissão João Fran.cº de Mird.ª 45 3 M.el Roiz 36 3 Thereza Frr.ª (viúva) 1 Sebastião Fran.cº 50 2 Lavrador com junta de bois Bernard.º An.tº 42 1 Fran.cº Marques 37 An.tº Fran.cº Simões 45 2 Izabel M.ª (viúva) 3 Elias Fran.cº das Neves 48 2 M.el Frz.Lao 70 An.tº Paes 30 1 An.tº (solteiro) 37 M,el das Neves (solteiro) 46 M.el Duarte Maliçia 45 1 M.el Dinis 53 An.tº de Almd.ª 28 1 M.el An.tºQr.º 80 João Simões 28 Joanna Duarte (viúva) 2 Mathias dos Reis 39 Anna da Cunha (viúva) 1 Julião Fran.cº 45 2 Jozé M.ª (veio livre por ser cego de um olho) M.ª da Conceição (viúva) 1 Bernardo Fran.cº das Neves 56 6 Lavrador com junta de bois An.tº Fran.cº Mano 45 2 Leandro Simões 60 1 Lavrador com junta de bois Esquadra do Cabo João Pr.ª do lugar de Larçã, 38 anos [Nota: Todos os alistados são de Larçã] Nome Idade Número de filhos Profissão M.ª de S. João (viúva) 2 Lavrador com junta de bois Anna M.ª (viúva) 1 Anna Bapt.ª (viúva) 2 Lavrador com junta de bois João da S.ª 60 1 M.el Frz. Paseiro 60 1 João da Cunha 38 Fran.cº Carv.º 36 Lavrador com junta de bois M.el Marques 42 2 João Fran.cº Preto 35 3 Mathias Fran.cº 50 Fran.cº, filho de Josefa Rola 18 (viúva) M.el Roiz Macipado 40 1 João dos S.tºs 40 Jozé An.tº 40 -

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IV – Evolução Administrativa

Nome Idade Número de filhos Profissão Simam Francisco (auxiliar) 40 Antonio Jozé 30 M.el Gomes 45 Manoel Nunes 60 Manoel da Cunha 60 Manoel Roiz Borralho 30 M.el Fran.cº Estanqr.º 45 1 Lavrador com junta de bois Joaquim Fran.cº 45 Manoel de Christo 30 1 Ant.º Luis 60 João Bernardes 40 1 An.tº Corr.ª 30 M.el Dinis (viúvo) 35 1 Jacinto da S.ª 20 1 Esquadra do Cabo João Fran.cº da Cruz, do Canedo, 60 anos, 1 filho, lavrador com junta de bois Nome Idade Número de filhos Profissão João Roiz (Canedo) 35 M.ª Roiz (Canedo) 30 1 Lavradora com junta de bois Luis Roiz (Canedo) 38 1 Lourenço da Cunha (Canedo) 39 2 Lavrador com junta de bois An.tº Jozé (Canedo) 40 1 Luis Simões (Canedo) 30 Jozé Henriques (Canedo) 60 1 Lavrador com junta de bois João Simões (Canedo) 40 3 An.tº Dias (Canedo) 35 1 Lavrador com junta de bois Jozé Soltr.º (Canedo) 26 M.el Alvz. (Canedo) 60 M.el Frr.ª (Canedo) 40 1 Lavrador com junta de bois Dionizio Jozé (Canedo) 30 Estanqueiro. Lavrador com Caetano Roiz (Canedo) 40 1 junta de bois An.tº da Costa (Canedo) 40 1 Lavrador com junta de bois João Dias (Canedo) 39 1 Idem. João, filho de Esperança Frz. 2 (Canedo) Caetano de Matos (da 45 Pampilhosa) Lourença de Jesuz (da 4 Lavrador com junta de bois Pampilhosa) Bernardo dos S.tºs (da 40 Pampilhosa) Mathias Dinis (da 40 Lavrador com junta de bois Pampilhosa) Esquadra do Cabo Ant.º Simões, do Outeiro, 72 anos [Nota: todos os alistados são do Outeiro] Nome Idade Número de filhos Profissão Jozé Simões 40 2 M. el Simões 27 1 Ursula das Neves 1 Thereza do Espirito S.tº 2

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Nome M.el Dias Anna Fran.cª (viúva) M.el dos Reis An.tº Frz. Dionizio de Agante M.el Esteves An.tº Soares João Frr.ª João Frr.ª Amaro Antunes

Idade 35 40 27 50 44 40 40 35 30

Número de filhos Profissão 2 1 1 4 3 Lavrador com junta de bois 1

Este alistamento, realizado em Souselas, tem aposto a data de 3 de Maio de 1764. Perfaz o total de 218 soldados, ascendendo a 226 se contabilizarmos os menores de idade. As Companhias de Ordenanças, fruto de pequenas reorganizações, variaram quanto ao número de ordem no âmbito do destrito militar. Tomemos Souselas como exemplo: em 1792 era a 26.ª companhia, em 1794 a 27.ª, em 1803 a 28ª companhia, em 1805 a 21.ª e, em 1807, a 8.ª Em 1809, a Companhia de Souselas integrava o conjunto Norte da Capitania de Coimbra, juntamente com as companhias sedeadas nas freguesias da Sé, S. Tiago e Santa Justa (Cidade de Coimbra) e nos lugares dos Fornos, Souselas, Sazes e Lorvão. O uniforme das ordenanças, era, de acordo com o Plano para uniformes do Exercito, de 19/05/1806, composto por: «Botão amarello = Farda verde =Golla azul = canhão azul = Forro Branco = e Pluma azula». Ainda ao nível militar, e levando em consideração toda a primeira metade do séc. XIX, nada marcaria tanto a freguesia como os estragos provocados pelas invasões francesas, cuja memória o povo ainda hoje conserva. Em Agosto de 1809, e obedecendo às ordens do General Beresford, Comandante Chefe do Exército, foram reorganizadas as ordenanças do destricto de Coimbra: «Em cada Capitania Mór se formarão aquellas companhias de ordenanças que permitir o numero de espingardas existentes segundo a força, e pella maneira seguinte». Assim, cada Companhia de Ordenanças Armadas passava a organizar-se do seguinte modo: 1 Capitão, 1 Alferes, 1 Primeiro Sargento, 2 Segundos Sargentos, 1 Furriel, 8 Cabos de Esquadra, 1 Tambor e 96 soldados, totalizando cada companhia 111 homens(217). A movimentação militar na zona é conhecida: «Após a batalha do Bussaco no dia 27 de Setembro de 1810 as tropas francesas, batidas, tentaram um movimento de envolvimento às hostes anglo-lusas e, por duas estradas saídas de Moura e Santo Antonio do Cantaro, partiram

(217)

AHMC - Eleições Militares, Vol. V, 1805-1814, Fl. 153v.

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IV – Evolução Administrativa

em direcção a Mortágua. Daí passando por Mata de Boialvo e Boialvo foram apanhar a estrada do Porto a Avelãs do Caminho e, descendo para Coimbra, tentaram assim cercar os exércitos aliados que julgavam ainda no Bussaco. Porém, estes, ao aperceberem-se da manobra, tinham já retirado a caminho das linhas de Torres em duas colunas saídas da Serra, vindo apanhar a estrada principal na Mealhada e nos Fornos, passando por Botão e Souselas…»(218). A relação das atrocidades ficou assinalada em manuscrito, e nela, além da mortandade deve realçar-se o modo como a vida religiosa ficou especialmente afectada. Com o Liberalismo, e pelo decreto de 18/03/1823, foram extintas as ordenanças na sequência da criação da Guarda Nacional, que assumiu as funções destas. Com D. Miguel I foram restabelecidas e, mais tarde, definitivamente extintas pela Guarda Nacional após a vitória liberal na Guerra Civil (decreto de 24/03/1831).

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 17

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Freguesia de Souselas – um povo com História

ESTRAGOS PROVOCADOS EM SOUSELAS PELAS INVASÕES FRANCESAS «Freguezia de Souzellas Esta freg.ª de Souzellas ficou m.to estragada com a pasaje do Exercito françez que por elle tranzitou hua grande p.te delle. Mortos Matarão nesta freguezia os Francezes sinco pesoas tres homens, e duas mulheres Roubos Roubarão esta freg.ª de tal sorte não so pellos campos; como tambem pellas cazas que se pode dizer nada ficou; pois ahinda m.mo m.tas couzas que estavão escondidas derão com ellas quazi todas em razão de que topando alguma pesoa tais martirios lhe fazião para ellas confesarem que não tiverão remedio p.ª salvar a sua vida dizer ahonde as couzas estavão escondidas Sacrilegeos Entrarão na Egreja e aronbando o Sacrario forcarão o vazo das sagradas formas; e não se sabe o que obrarão em as sagradas partticulas. Lancarão por terra os Santos Oleos e de ambulas não appareçeo senão huma. Degolarão a Snr.ª do Rozario e lhe quebrarão tambem os braços lancando-as em huma silveira. He paralamentos semelhante desmazelo no Paroco Roubos Sacrieleguos Roubarão o vazo das sagradas formas, a custodia dous caliçes; e levarão toda a roupa branca a saber as toalhas dos Altares, alvas amittos Incendios Lancarão o fogo a tres proprie.des de cazas duas das quais arderão sem ficar absolutam.te nada dellas e hua não acabou de arder e no incendio de huma arderão os livros da Egreja» Fonte: «Relação dos assassinatos, roubos inçendios, e atrocidades cometidas no Arciprestado de Mortagoa desde o dia vinte e hum de Setembro de mil outocentos e des, athe o dia quatro de Outubro pelo Exercito doz Fracezes comandado pelo gem.al Maçena feitas pelo arcipreste Joaquim Lebre Teixeira, 5 Junho 1811» In Colecção Belisário Pimenta, Doc. Nº 84

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IV – Evolução Administrativa

D. O fim da autonomia concelhia e a entrada em funcionamento da Junta de Paróquia 1. Enquadramento Com o triunfo da revolução liberal consolidou-se uma nova ordem e regime político. Entre as diversas alterações produzidas de âmbito nacional esteve a reorganização administrativa, cujo objectivo principal passava pela «…criação de uma administração local centralizada e hierarquizada que visava o controlo do território nacional e das comunidades locais pelo Terreiro do Paço»(219). Assumiria grande destaque, o reformador e legislador, Mouzinho da Silveira, que enquanto esperava o triunfo liberal na Ilha Terceira (1826-1834) foi preparando uma série de medidas. Ao nível da administração, adoptaria o modelo francês, vertido no decreto nº 23 de 16 de Maio de 1832, que criou um corpo de magistrados e órgãos cuja função era administrar o território em representação do Governo: em cada Província coloca um Prefeito; na Comarca (subdivisão territorial menor que a Província) outro magistrado o Sub-Prefeito, agente intermediário do poder. Por fim, na base da nova divisão administrativa surgia o concelho, administrado pelo Provedor, agente fiscalizador da autoridade central. No novo esquema, a freguesia de Souselas integrava a Província, Comarca e Concelho de Coimbra. Contudo, o sistema provincial será colocado em causa devido a um conjunto de irregularidades, entre as quais avultava a falta de preparação dos magistrados, abusos vários e prepotências que se traduziram em protestos ruidosos. Após larga discussão e reflexão, publica-se a Lei de 25 de Abril de 1835, admitindo-se a existência do Distrito, unidade intermédia entre a Província e a Comarca. Este diploma seria, posteriormente, consolidado pelo Decreto de 18 de Julho de 1835 onde aqueles Distritos foram «…subdivididos em concelhos e estes podendo ser compostos por uma ou mais freguesias (…) Por outro lado, e quanto aos corpos administrativos, definem-se as Juntas de Paróquia, como sendo compostas por três membros nas freguesias que tivessem menos de 200 fogos, de cinco nas que tiverem de 200 a 600 fogos e de sete nas de 600 para cima»(220). Neste quadro, não detectámos da parte dos antigos concelhos existentes na área da freguesia de Souselas, qualquer preocupação relativamente ao desfecho

(219) (220)

João Pinho – Freguesia de Eiras: a Sua História…Coimbra, 2009, P. 204 Id. P. 205

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Freguesia de Souselas – um povo com História

da nova divisão e, mais propriamente, à conservação da sua municipalidade. O que não quer dizer que tais elementos não existam ou não tenham existido! A verdade é que foi por esta altura que os antigos concelhos começaram a diluir-se na nova malha administrativa. O golpe de misericórdia chegaria com o Setembrismo e o primeiro Código Administrativo Português. De facto, com a revolução de Setembro de 1836 ascendia ao poder a facção liberal progressista liderada por Passos Manuel. Os Setembristas avançaram para uma descentralização administrativa definida no Decreto de 31 de Dezembro de 1836, onde o Governador Civil seria substituído pela figura do Administrador Geral do Distrito, criando-se os cargos de Administrador do Concelho e de Regedor da Paróquia. Este Código havia sido precedido pelo decreto de 6 de Novembro de 1836, os quais transformariam a vida administrativa do país, levando à extinção de grande parte dos pequenos concelhos existentes em Portugal: «Passos Manuel, de uma só assentada, suprimiu 455 municípios, ficando o reino dividido em apenas 351 concelhos»(221). Números que não geram consenso entre os especialistas mas que se relacionam intimamente com a história concelhia de Souselas: foi por esta altura que o golpe de misericórdia caía sobre Souselas, Zouparria e Marmeleira, povoações então pertencentes ao terceiro Distrito Administrativo português com maior número de concelhos. O longo caminho de autonomia concelhia e administrativa chegava ao fim, ficando por apurar o peso que teve na extinção, a anterior adesão e lealdade à causa absolutista, quando hoje sabemos que o triunfo foi o da ordem liberal. Na História do Direito Local Português não mais surgiria qualquer intenção de refundar estes concelhos. Souselas, Zouparria do Monte e Marmeleira foram três dos quase 40 pequenos concelhos do Distrito de Coimbra definitivamente extintos. As casas da câmara e os tribunais encerravam (foto 35), os currais do concelho e as prisões desapareciam, transformando a aparência dos próprios lugares. A transição concelho-junta de paróquia foi complexa e algo confusa. De tal modo assim foi que, no antigo livro de audiências e coimas do concelho de Souselas, se registaram matérias e decisões partidas da Junta de Paróquia recentemente criada. Talvez as autoridades ainda acreditassem no regresso da autonomia, no retomar de uma continuidade com o passado. A estrutura orgânica da Junta de Paróquia compreendia um Presidente, um Vice-Presidente, um Tesoureiro e um Secretário, eleitos pelos vogais efectivos em escrutínio secreto e sob a presidência do vogal mais velho.

César de Oliveira - «Os Municípios no Liberalismo Monárquico-Constitucional», In História dos Municípios e do Poder Local [Dos Finais da Idade Média à União Europeia], Círculo de Leitores, 1995, P. 208

(221)

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O Código Administrativo de 1842 traria algumas modificações, com a administração paroquial ficando a cargo da Junta de Paróquia e do Regedor de Paróquia. Segundo consta do artº 291, a Junta era composta pelo pároco «vogal nato e Presidente» e dos vogais eleitos directamente pelos eleitores da paróquia(222). Por outro lado, acrescentava a lei, nas paróquias que não excedessem os 500 fogos seriam 2 os vogais mas, nas povoações de população superior seriam 4 os vogais em exercício. Por outro lado, e segundo refere o artº 292, a Junta de Paróquia haveria de ter um tesoureiro e um escrivão, que nomearia entre os seus vogais ou fora deles. Acompanhava esta lei um mapa (nº 2), com a definição de 17 distritos administrativos, compostos pelos antigos concelhos. Souselas integrava o Distrito de Coimbra (o 7º). Este órgão de administração civil local, mas de natureza religiosa, sobreviverá a várias convulsões, trazidas pelos finais da Monarquia e Implantação da República. De facto, apenas pela lei nº 621, de 23 de Junho de 1916 a divisão administrativa do território se veio a alterar, com a Paróquia Civil a ser substituída pela designação de Freguesia. Este novo órgão «…manter-se-à até aos dias de hoje, independentemente das várias alterações dos órgãos supra locais que entretanto se verificaram: ao nível da Divisão Administrativa, Magistraturas e Corpos Administrativos e Órgãos Consultivos/Contenciosos»(223). Foi também por aquela altura, que surgiu nas freguesias a figura do Regedor, com autoridade delegada pela administração central, com amplos poderes no campo da lei e da ordem, cuja actividade perdurou até à queda do Estado Novo.

(222) (223)

Código Administrativo de 1842, Imprensa Nacional, 1842, P. 70 João Pinho – Freguesia de Eiras: a Sua História…Coimbra, 2009, P. 236

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A CASA DA CÂMARA DO CONCELHO DE SOUSELAS O concelho de Souselas teve uma Casa das Sessões, onde os seus oficiais se reuniam, periodicamente, e o povo acorria para tratar dos mais diversos assuntos. Desconhecemos todos os locais onde tal estrutura funcionou, mas sabemos a localização e destino da última casa do concelho de Souselas. Após a extinção concelhia, e já com a junta de paróquia em actividade, a casa da câmara reverteu à posse da Câmara Municipal de Coimbra que a aforou em «phateuzim perpetuo» a António Joaquim de Figueiredo Serra, de Coimbra, por escritura de 3 de Março de 1842, aplicando-se o foro de 205 rs a «…huns pardieiros que em outro tempor servirão de Caza do Concelho, no Lugar de Souzellas» [A.H.M.C. – Livro de Notas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 20, 1830-1844, Fl. 182v.] No requerimento anexo aquela escritura, entregue por António Serra a 4/07/1841, dizia-se que «… que tendo varias propriedades, e cazas no lugar de Souzellas, e junto a humas cazas do suplicante existem huns pardieiros, que em outro tempo servirão de Caza do Concelho, pertencente a este Município, hoje demolida, e levada a pedra por quem della se quiz utilizar; requereo o suplicante a esta Illustre Camara para que lhe afforassem aquele pequeno terreno, para conjuntar ao seu prédio, mandando-se informar a Junta de Parochia, que então servia…» [Id. Fl. 183]. Alguns dias depois, a 28 de Julho do mesmo ano, procedeu-se, de acordo com ordem camarária, a auto de medição e demarcação dos referidos pardieiros. Uma tarefa que coube a Manoel Carlos e António Marques (ambos de Souselas, aquele pedreiro, este carpinteiro), sobre vigilância do juiz eleito da freguesia, Dr. Joaquim Joze de Souza e Oliveira, e sendo escrivão Luiz Correa da Fonseca. Na ocasião, declararam os peritos que «…os sobreditos pardieiros tem cinco varas de comprido, e quatro varas de largura, e que confinão do Nascente com rua publica, do Poente com Joaquim da Costa Torres, do Norte com o refferido afforante, e do Sul com o sobredito Joaquim da Costa Torres, e meterão dois marcos nas extremidades dos referidos pardieiros da parte da rua junto aos seus alicerses…» [Id. Fl. 183] Por fim, a CMC anunciou e efectuou a 7/11/1841, pelas 10h da manhã e na sua Sala das Sessões, a arrematação de aforamento do «pardieiro que em outro tempo servio de Casa do Concelho do lugar de Souzellas»: «Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil oitocentos e quarenta e hum annos, aos sete dias do mez de Novembro do dito anno nesta Cidade de Coimbra e Sala das Sessoens da Camara, onde se achava Antonio Manoel Pereira, Presidente da Camara, e o Veriador e Fiscal Manoel Joze de Freitas, onde eu Secretário vim; e logo pelo referido Presidente, e Fiscal, foi mandado ao official de deligencias Joaquim de Oliveira Branco, pos em praça para se arrematar de afforamento

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hum pardieiro, que em outro tempo servio de Caza do Concelho no lugar de Souzellas conforme se acha medido, e demarcado, o qual se vai afforar a quem mais der, e com o Laudemio de dez no cazo de venda; o que o dito official logo fez, pondo em praça e lançando pergoens por grande espaço de tempo, e o maior lanço que teve foi o de duzentos e cinco reis, e o Laudemio de dez, offerecido por Antonio Joaquim de Figueiredo Serra, Botiqueiro, e morador nesta cidade; e logo pello referido Presidente, e Fiscal da Camara foi mandado ao dito official, que visto não haver quem mais desse, afrontasse e arematasse, com todas as solemnidades da Lei, e estillo: o que o dito official logo fez, affrontando e arrematando com todas as solemnidades da Lei, e estillo, entregando o ramo ao arrematante em signal de sua arrematação; a que tudo forão testemunhas presentes Manoel Caetano de Moraes, e Joaquim Frederico Machado de Almeida Peixoto, ambos desta cidade. Eu Francisco Theophilo d’Andrade Pereira da Rocha Secretario da Camara o Escrevi». [Id. Fls. 183v.-184] No inventário dos prazos do município de 1875, este bem surge com o nº 293 e vem classificado como os «pardieiros da casa do ext.º Concelho de Souzellas». São avaliados em 100.000 rs, mantendo-se tanto o enfiteuta como o valor do foro. Em 1893 passou para Manuel Joaquim Marques, de Souselas, por compa feita a Genoveva Rosa, viúva de António Joaquim de Figueiredo Serra. [Livro de Foros da Câmara Municipal de Coimbra, 1862-1897, Fl. 103]

2. Alcance e funcionamento da Junta de Paróquia A actividade da Junta de Paróquia de Souselas deixou vários registos ao longo da sua existência, como órgão de excelência ao nível local (1836-1916). O seu envolvimento na história da freguesia colhe-se, essencialmente, de duas fontes: nas actas da Câmara Municipal de Coimbra e nas cópias das actas enviadas ao Governo Civil. Pena é que os seus livros de actas se tenham perdido, alforge de valiosa fonte de informação. A Junta de Paróquia de Souselas, que tinha sede na Igreja Matriz, reunia num espaço designado por Sala das Sessões da Junta de Parochia(224) (onde possuía uma Secretaria). A 15/06/1913, a Junta de Paróquia aprovou por unanimidade, a proposta apresentada pelo presidente Joaquim Lopes, e orçamento suplementar, no valor

A Junta de Paróquia foi reunindo em espaços designados, sucessivamente, por «residencia parochial de Souzellas», «sachristia da egreja parochial», «caza da residencia parochial» e, por último, na «sala das sessões desta junta».

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de 40.000 reis, para reconstrução de «uma arruinada dependência da Egreja Paroquial, que de nada serve» e aplicação a Casa de Sessões. Para justificar a obra, argumenta-se ser «indispensável uma Caza de Sessões não só para este efeito, mas também para depositar o arquivo e outros objectos pertencentes a esta Junta»(225). A Junta de Paróquia responsabilizava-se e administrava religiosa e civilmente (em parte), uma área aproximadamente coincidente com a freguesia civil de hoje: Souselas, Marmeleira, Zouparria do Monte, S. Martinho, Pisão, Lagares e Sargento-Mor. Equilíbrio que seria perturbado, em 1865, com a anexação pela freguesia de Trouxemil, de parte do lugar de Sargento-Mór. As principais funções da junta passavam pela gestão do culto e vida religiosa. O exame a paramentos e alfaias, ou a realização regular de inventários entregues às autoridades civis superiores (Administração do Concelho e Governo Civil), são dois exemplos evidentes desta preocupação. Ao nível do funcionamento interno, a junta aprovava os orçamentos pelo final do ano e as contas nos primeiros meses, altura em que os novos eleitos tomavam posse. Com parcas receitas, obtém fundos das sepulturas abertas nos cemitérios, do arrendamento dos matos da paróquia (localizados nos terrenos baldios), da arrematação do estrume das ruas, da arrematação da azeitona da igreja(226), do arrendamento de algumas leiras de terra, propriedade da paróquia, como a das “Estreitas” que em Maio de 1900 foi dada de renda ao Sr. José Fernandes Cação, moleiro, do Casal d’Azenha(227). A junta era ainda responsável pela residência paroquial. Uma casa que por decisão de Março de 1891 seria recomposta: «Em vista da propósta do Rd.º parocho desta freguezia deliberou a junta por em arematação por meio de anuncio a reparação da caza da rezidencia parochial, como tinha examinado a mesma junta a achou em mao estado»(228). Poucos livros e documentação se conservaram deste órgão os quais, porém, nos ajudam a perceber o seu funcionamento. Tal é o caso do livro de contabilidade relativo a 1839, onde se anotou ao nível das receitas, em Janeiro de 1840: que «Não tem esta Parochia bens alguns de que possa receber rendimentos, à exceção do direito das covágens». Verbas que se incluíram na receita extraordinária sob a designação de «nove fechos de sepulturas de peçoas maiores a trezentos reis cada hum», juntamente com as dívidas anteriores não saldadas, a finta lançada na freguesia e os 2% da décima que contudo «não tem cido pocivel o receber esta quantia qualquer que ella seja» (229).

AUC – Fundo do Governo Civil: Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 405, 1910-1928, Pasta 1913 (226) Na Estrada da Azenha/Estreitas ainda existem oliveiras da igreja. (227) A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 6/5/1900, Cx. 328 (228) A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 15/3/1891 In Cx. 323 (229) A.H.M.C. - Livro de receita e despeza da Junta de Parochia da freguezia de Souzellas, Fl. 1 (225)

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Por outro lado, e ao nível da despesa, haviam-se saldado gratificações ao Secretário e ao Tesoureiro, porém, existiam verbas a saldar com estes funcionários relativas a gratificações do ano 1839. Estes dados apontam para uma realidade bem conhecida. As juntas de paróquia viviam aflitas com falta de recursos, tal como os antigos concelhos, não se estranhando que no resumo da receita e despesa daquele ano se registasse um saldo positivo de 13.400 rs, que no entanto não traduzia saúde económica dado que a receita em falta era de 32.600 rs e a despesa ainda não satisfeita andava nos 19.200 rs. Conhece-se o quadro de elementos que faziam parte da Junta de Paróquia entre 1868 e 1914, com algumas falhas (Anexos, Tabela 8), bem como o quadro de regedores para o período 1853-1934 (Anexos, Tabela 9). Sobre os regedores, acrescente-se que o nome que detectámos como sendo o mais antigo, é o de uma grande figura da freguesia: Jerónimo José Baptista Lopes Parente, que desempenhava o cargo de regedor da paróquia em 1838. A complexidade das funções executadas por este órgão, nomeadamente a exigência de saber ler, escrever e organizar a contabilidade, conjugada com a falta de recursos humanos e financeiros, tornou inevitável a decisão tomada em 1891, de entregar a indivíduo fora do meio (advogado/procurador), a elaboração do orçamento, suportado na constatação do real: «Na Freguezia não há quem saiba organisar orçamentos e contas e se preste a fazelo pello insignificante ordenado de secretaria»(230). 2.1. A continuidade com o passado A junta de Paróquia de Souselas de 1836 era composta pelo Pároco (e Presidente) Joze Ferreira Cardozo, Jeronimo Jose Baptista Lopes Parente (Secretário) e João Borges (Tesoureiro). Segundo nos é dado perceber, a continuidade com o passado será, no entanto, assegurada pelas magistraturas ligadas com a Comarca. A partir 12 de Junho de 1836, e durante algum tempo, surge a figura do Juiz Eleito, administrando uma área territorial que abrangia os antigos concelhos da Marmeleira e Zouparria do Monte. As decisões tomadas nesta sessão, presididas pelo Juiz Eleito, Manoel Joaquim da Silva, foram uma herança do passado concelhio, fixando uma série de penalizações, a requerimento do povo e em dinheiro, relativas ao desrespeito de questões públicas. As diversas decisões tomadas podem, na verdade, dividir-se em duas grandes áreas: reparos de caminhos e fixação de zonas coimeiras.

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 398, 1892-1895

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Quanto a reparos de caminhos registam-se os seguintes pedidos: o vigário da freguesia pede «compostura os caminhos no citio das fontes e a regeira de saias»; o Dr. Antonio da Cunha e Sousa requer que se «…compuzesse o caminho juntamente com o povo desde São Martinho athe a venda da serra»; e, Joaquim Carneiro, de Sargento Mor, e algumas pessoas da Zouparria do Monte requerem «…o reparo do caminho desde a Zouparria, athe as canetas»; na Marmeleira requer-se a «..abertura da fonte publica do m.º lugar (…) e bem assim, como os consertos e reparos, dos caminhos do m.º lugar» (231). No entanto, o grosso dos pedidos tinha por base as velhas questões concelhias plasmadas nas posturas – a questão do gado coimeiro. Como exemplo, registe-se o pedido feito por Manoel Francisco Neto, da Marmeleira do Botão, e mais pessoas do mesmo lugar «…que todo o boi ou bezerro que fosse apanhado em novidade, com huma testemunha seria condenado em – 200. Bem como o gado miúdo que for apanhado em o sitio que sempre foi coimeiro, em serto tempo, sera prezo, e lovado [ao] curral do conselho e dele não sairá sam pagar a condenassão declarada»(232). Se dúvidas subsistissem quanto à continuidade com o tempo concelhio, esta menção ao curral do concelho é suficientemente esclarecedora. Em 1864, a questão das coimas ainda lança brado, uma vez que eram potenciadora de situações de malvadez e vingança entre a população: «N’um dos dias passados appareceu aqui decepada à fouce roçadoura, uma vinha nova, algumas arvores, e seu couval. Pertence a um trabalhador, bom visinho, que a tanto não deu causa. Tinha apenas poucos dias antes accusado, e feito condemnar duas coimas, a dous visinhos, por damninhos de gado»(233). Mas, a continuidade com o passado detecta-se não apenas na relação juiz-povo, mas também povo-município, de que é exemplo muito interessante o praticado pelo conhecido Jeronimo Lopes Parente que em Setembro de 1862 pedia que a Câmara proibisse «…a vindima antes do S. Mateus, como o impunham as nossas antigas posturas municipais»(234). 2.2. Novas competências e realidades A organização de actos eleitorais passou a ser uma das funções da junta de paróquia. Logo em Novembro de 1836, enviava ao município o livro de matrícula dos cidadãos da freguesia com direito a voto na eleição dos deputados à Corte (Anexos, Tabela 10). Ao nível municipal e durante alguns anos, a Paróquia de Souselas foi centro de um círculo eleitoral que elegia o presidente do município. Existe um livro

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A.H.M.C. - Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, Fls. 42-42v. Id. Fl. 42v. Lopes Parente - «Malvadez» In Conimbricense, 16 Fevereiro de 1864, P. 3 A.H.M.C. - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra, 1861-1863, Nº 87, Fl. 58

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onde tais eleições ficaram registadas, válido para 1855, no qual se assentou a eleição dos vereadores da Câmara Municipal de Coimbra, para o biénio 1856-1857 saída do acto eleitoral de 9 de Dezembro de 1855. Nessa acta é de salientar a inclusão, no círculo de Souselas, das freguesias vizinhas: «Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil e oitocentos e cincoenta e cinco aos nove dias do mez de Desembro do dito anno, reunidos os elleitores nesta Parochial Igreja de Sam = Thiago de Sousellas, destinada por Edital da Camera Municipal, para centro do Circulo Elleitoral das Freguezias de = Botam = Brasfemeas e Torre de Villela e Souzelas, apareceo o Bacharel Manoel Maria da Cunha nomiado pela mesma Camera como mostrou pelo documento, que apresentou, para presidir á Elleição a que se vai proceder de veriadores, que ande servir no bienno de mil oitocentos e cincoenta e seis e mil oitocentos e cincoenta e sete»(235). A mesa eleitoral ficou composta pelos seguintes cidadãos: Manoel Maria da Cunha (Presidente), o Reverendo padre Joze Lucio de Figueiredo e Antonio Lopes dos Santos (Escrutinadores), e João Manoel de Carvalho e o reverendo Joaquim Maria Santa Anna Pacheco (vigário de Brasfemes). Sairia como lista mais votada a liderada por António Augusto da Costa Simois, com 97 votos. Alguns anos depois, as eleições em Souselas para o município coimbrão e relativas a 1861 ficaram marcadas pela polémica. A 26 de Dezembro de 1861 o Governador Civil intimava a Câmara «…a não dar posse aos vereadores eleitos para o ano seguinte, enquanto se não julgassem as dúvidas levantadas por protesto das eleições nas freguesias de Assafarge e Souselas»(236). A Câmara Municipal continuaria em exercício até à dissolução, por decreto de 3 de Agosto de 1862 e nomeação de uma Comissão Administrativa que tomou posse a 13 do mesmo mês. Novas funções e realidades que se estenderam à melhoria das condições sociais e materiais do povo. A construção de escolas e de cemitérios impulsionadas pela Junta de Paróquia de Souselas (tal como noutros lugares e paróquias). Realidade que abordamos noutro capítulo e cuja história e estórias se prolongam para lá da existência deste órgão. 2.2.1. Reorganização administrativa e judicial A criação da junta de Paróquia de Souselas levantou alguns problemas ao nível dos seus limites. Um facto que deve até ser encarado com naturalidade

A.H.M.C. - Livro das Actas das eleições da Câmara Municipal na Assembleia Eleitoral da Paróquia de Souzellas, 1855, Fl. 2 (236) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1840-1869, Edição Comemorativa do Cinquentenário da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1972-1973, P. XLIII (nota 2) (235)

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pois os limites geográficos de actuação da paróquia civil foram desenhados com base não só nos antigos limites concelhios como também de freguesia religiosa. Ora é sabido que estes continham aqui e ali alguns problemas não resolvidos que, afinal, transitaram para o novo órgão. Assim, a 25 de Janeiro de 1850 e em sessão de Câmara Municipal, apreciava-se o pedido feito por alguns moradores da freguesia de Torre de Vilela «…para a paróquia ser desanexada de Brasfemes e junta à de Souselas». A questão terá motivado séria divisão entre os vilelenses, de tal modo que na sessão seguinte (30 de Janeiro) dava entrada outro pedido, agora de um «…grupo de moradores de Vilela, Torre de Vilela e Ribeiro reclamam o indeferimento do pedido dos seus conterrâneos para se juntarem à freguesia de Souselas»(237). Em meados dos anos 50 de oitocentos, emerge a questão relativa ao lugar de Sargento-Mor, já disputado por concelhos e freguesias diferentes. A 4 de Agosto de 1856 a vontade do povo era expressa ao município de forma clara: «Conhece-se a representação dos moradores do lugar de Sargento-Mor em que, por lhes constar que o Governo quer que aquele lugar, que pertence à freguesia de Barcouço, passe para o concelho da Mealhada, preferem que ele venha a pertencer à freguesia de Souselas»(238). Entre 1862 e 1865 decorreram os trabalhos da “Comissão de Arredondamento das Freguesias”, cuja existência fora motivada pela criação das freguesias de Torres do Mondego e Arzila. Contudo, a comissão nomeada para tratar dessa divisão acabou também por abordar situações conflituosas ou dúbias, relacionadas com outras freguesias. O tema ficaria conhecido como “Divisão parochial” consumindo páginas de notícias em diversos jornais. Ainda em 1860 O Conimbricense dava conta de estarem a ser ultimados os trabalhos da comissão que havia de propor nova divisão das freguesias no concelho de Coimbra, bem como das imensas dificuldades de levar adiante tal tarefa: «Conhecemos perfeitamente as enorme difficuldades, com que hade ter luctado a commissão para levar a cabo a sua incumbencia. Sempre que se falla em divisão parochial apparecem mil contrariedades, a mais porfiada reluctancia filha de antigos habitos, de interesses que se julgam offendidos». Mais adiante referia-se, em concreto, as dificuldades relativas ao concelho: «O concelho de Coimbra apresenta anomalias extraordinárias na divisão parochial. Há freguezias que apenas contêm 70, 80, e 90 fogos; ha outras com o numero desproporcionado de 600, 800 e 900 fogos! Algumas sustentadas, antes

José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1840-1869, Edição Comemorativa do Cinquentenário da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1972-1973, Pp. 192

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Id. P. 277

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de 1834, pelo producto avultado dos dizimos existem hoje à custa de enormes sacrificios dos povos, que pagam congruas onerosissimas, estando apesar disto por falta de meios a cair em ruinas os templos, vasios d’alfaias e paramentos sagrados; Outras d’uma area limitadissima, possuem todavia importantes passaes: emquanto muitas, bem mais populosas e extensas, nem residencia teem para o parocho!»(239). Era já do domínio público as resistências que a comissão sofria e por parte das comunidades, pelo que este jornal e com conhecimento de causa lançava grandes dúvidas ao sucesso do projecto: «Nós receiamos que o projecto não fique tão perfeito como era para desejar, porque sabemos que nos limites do concelho há as maiores difficuldades no arredondamento, e as commissões careciam de poderes mais amplos, para nestes limites organizarem os seus trabalhos». O ano de 1860 seria, em Souselas, de grande discussão em torno do projecto de arredondamento, uma vez que se discutia a eventual criação de uma grande paróquia civil com sede em Souselas, com anexação ou fusão de outras freguesias, caso de Botão. Ideia desde cedo desenvolvida pelos responsáveis pela nova divisão paroquial, mas que despoletará polémica no seio das comunidades locais, arrastando diversos intervenientes, que impediram a sua concretização. O assunto Souselas-Botão foi dos mais emotivos e discutidos ao nível da praça pública (via jornais) sendo objecto de troca de argumentos entre dois amigos, de forma respeitosa e cordial, durante alguns anos; de um lado Diogo José dos Santos, proprietário e morador em Larçã, manifestava-se contra as propostas iniciais da comissão (defendendo a Freguesia de Botão) e, do outro, Jerónimo Lopes Parente (defendendo Souselas), partidário da divisão proposta. Não trataremos em pormenor o assunto, até porque no final ambas as paróquias (Botão e Souselas) se manteriam. Mas importa ver as diferentes perspectivas sobre um mesmo assunto. - Diogo José dos Santos. Reage pela primeira vez à projectada divisão paroquial, remetendo carta a partir da sua residência, em Larçã, assinada e datada do dia 10 de Outubro de 1860, com o fim de «…mostrar o quanto é prejudicial aos povos da freguezia de Botão o projecto de suppressão d’ella, e da sua annexação à de Souzellas». A sua tese passou, inicialmente, pela argumentação baseada em factores de ordem religiosa - quando curiosamente o que estava em causa era a criação de uma circuncrição civil – e geográfica: «…uma das condições essenciais da sua organisação deve ser o ficarem de forma, que os povos possam ser socorridos a tempo nas suas necessidades espirituaes (…) e neste supposto deve a Ill.ma Commissão lembrar de que entre as povoações de Botão e Souzellas, medeiam trez kilometros, pouco mais ou menos, e de que há um rio, que tem de atravessar em trez partes; e em todas

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«Divisão Parochial» In O Conimbricense, 29 Setembro 1860, P. 1

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com difficuldade (…) E se a isto accrescentarmos, que varias povoações desta freguezia de Botão distam ainda d’aqui para o lado do norte, opposto na de Souzellas, um dous e outras tambem trez kilometros; em que distancia ficariam estas da igreja matriz, se lhe ficam sendo em Souzellas? (…) a nova freguesia com a séde em Souzellas, diremos que descrevendo-se um circulo, ficaria Souzellas no arco em lugar do centro: ficaria na extremidade sul, com a maior parte das povoações a trez-quatro-cinco e seis kilometros ao norte como já indicámos. E diremos mais que se houvesse de ser supprimida uma destas freguezias, o que appoiariamos, deveria ser a de Souzellas, ja porque Botão ficaria no centro da maior parte das povoações, já porque a sua igreja matriz talvez exceda em tamanho o triplo da de Souzellas (…) a melhor de quantas ha nas freguezias ruraes deste concelho»(240). A finalizar a sua tese, apresenta o que seria a melhor de todas as propostas, que passava pela conservação de Botão e Souselas como paróquias; Botão conservando as povoações que já tinha, unindo-lhe a Marmeleira (então pertença de Souselas), Monte Redondo e Casqueira (povoações de Figueira de Lorvão) uma nova realidade fundamentada em razão religiosa: «É facto incontroverso, que os povos destes lugares, não tendo missa nas suas capellas, vêem sempre ouvil-a a Botão». Quanto a Souselas conservaria as povoações que tinha (excepto Marmeleira), unindo-lhe a Freguesia da Torre e «alguma coisa de Brasfemes». Diogo José acena com razões de natureza histórica: «Se querem que Souzellas seja grande, por ter uma cadeira d’ensino primario, creada haverá dous ou tres annos, porque o não hade ser Botão, que tem essa regalia desde tempo immemorial, quando ellas apenas eram concedidas a terras distinctas?»(241). Diogo dava mostras de conhecer bem a história de Botão, aludindo diversas vezes ao facto de ter sido concelho e cabeça de julgado até 1836. E, para captar a atenção de Jeronimo Parente, recorda o seu envolvimento nos trabalhos que se fizeram depois da supressão de Botão como concelho, quando se projectou formá-lo de novo anexando-lhe diversas freguesias «…o que não faria se não reconhecesse que Botão merecia o ser cabeça de concelho». - Jerónimo José Baptista Lopes Parente. Ainda em Outubro de 1860 reage à carta do amigo Diogo dos Santos: «Vamos já ao meu intento, que é tractar da conservação da minha parochia de Souzellas; mostrar que deve conservar-se no statuo quo, sem ambição, d’augmento de parochianos desannexados d’outras e sim promptos a receber os que nos busquem»(242). Duma simples reacção ao desejo de manter Souselas como sede de freguesia e paróquia civil, Lopes Parente volta a manifestar a sua opinião em Novembro,

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Diogo José dos Santos In Conimbricense, 13 de Outubro 1860, Pp. 1-2 Diogo José dos Santos – «Correspondência» In O Conimbricense, 19 Janeiro 1861, P. 2 Jerónimo Lopes Parente In O Conimbricense, 17 Outubro 1860, P. 2

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uma vez que corria inquietante “zum zum”: «…a suppressão desta parochia está decretada e dividida entre as parochias limitrophes a contento de seus parochos, e approvação das auctoridades». Questiona vivamente o projecto da divisão parochial que terá esquecido «a commodidade dos povos» e pede que o governo ouça as populações, dando conta de um acontecimento, a este propósito desastroso: «Para que inquietal-os, e violental-os para irem unir-se a diverso rebanho? Ainda ha pouco em occasião de festividades em Brasfemes e Longo de Deus, houve grandes barulhos, mortes e ferimentos entre os parochianos de Souzellas e Brasfemes. Como agora tentar unir taes povos?»(243). Neste cenário pede que as autoridades atendam ao descontentamento dos povos e lhes permita a escolha, dando como exemplo maior o verificado com a povoação de Sargento-Mór. Entretanto, em Dezembro de 1860, um total de 168 chefes de família de Souselas enviam ao Bispo de Coimbra um abaixo-assinado (onde se sente o “dedo” de Lopes Parente) pedindo a conservação da paróquia de Souselas: «Dizem 168 souzellenses, chefes de familia abaixo assinados, que lhes consta haver certo trama para a suppressão da sua parochia no todo, ou na maioria dos seus povos, e assim divididos annexal-os ás 3 circumvisinhas, Trouxemil, Botão e Brasfemes. Respeitosamente fallando vem expor que sua parochia deve conservar-se, ou seja no statuo quo como desejam, ou ainda no caso de haver lei que mande augmentar o n.º dos fogos supprimindo algumas outras. Souzellas por sua população, riqueza, e posição topographica, tem merecido do governo de S. Magestade ser escolhida para cabeça de julgado de paz de 11 parochias visinhas; circulo eleitoral, cadeira de ensino primario e esta indicada para estação de caminho de ferro. Ella esta no centro de 4 outras grandes parochias, em igual distancia de legua para os diversos ventos, Eiras, Antuzede, Barcouço e Pampilhosa para cujas devem ser annexadas as 3 pequenas intermedias, Trouxemil, Botão e Brasfemes, ficando assim as restantes com meia legua de circumferencia demarcadas pelos caminhos de Coimbra a Mealhada, e do alto de Longo de Deus, e outros. Os signatarios vão levar o negocio ao conhecimento de S. Magestade com refferencia a esta sua assignatura, e receiosos que v. ex.ª faça obra por informações pouco sinceras, sem audiencia dos representantes, Por isso P. a V. Ex.ª se digne tomar em consideração o exposto»(244).

(243) (244)

Jeronimo Lopes Parente - «Correspondências», In O Conimbricense , 13 Novembro 1860, P. 3 Jerónimo Lopes Parente – «Correspondência» In O Conimbricense, 18 Dezembro 1860, Pp. 1-2

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Nos princípios de 1861 e no seguimento dos argumentos de natureza histórica apresentados por Diogo dos Santos para se conservar a paróquia de Botão, contra-argumenta: «…são contraproducentes, e de ter sido villa antiga por graça dos antigos foraes lhe ganhou o odio e a aversão que inda hoje lhe tem todos os povos visinhos, pelas violencias, extorsões e despotismos que soffreram das suas justiças, pela maior parte entregue a indignos» A Comissão de Arredondamento das freguesias teve, no que toca a Souselas, a delicada situação de analisar e decidir acerca do lugar de Sargento-Mor, no seguimento de um conjunto de reuniões onde foi deliberando sobre o assunto: A 25 de Outubro de 1864 acordava que «Que todo o logar do Sargento Mór e o dos Adões, pertençam d’ora em diante á freguezia de Trouxemil». Esta decisão motivaria reacções fortes. Em primeiro lugar, da freguesia de Barcouço, que quase um ano depois, a 3 de Outubro de 1865, reclama contra a anexação. Analisada a situação em sessão comarcã é justificada a opção pela inclusão em Trouxemil: «Servio de fundamento a esta annexação, contra a qual se reclama, relativamente á parte do logar do Sargento Mór, a razão de estar repartido este logar por duas freguezias, sendo a parte pertencente á freguezia de Barcouço, do dominio d’um Concelho, Comarca e Districto alheio, mais distante d’estes centros do que o está a outra parte da povoação, que pertence ao Concelho de Coimbra, Comarca e Districto da mesma cidade (…) e não tem o Sargento Mór, para esta freguezia, uma communicação egual, antes muito peor, do que para a de Trouxemil, por que para esta freguezia tem a estrada real de Coimbra ao Porto em optimas condições; fica, alem disso, toda a povoação pertencendo á mesma freguezia (Trouxemil) pela nova divisão parochial, que assim faz desapparecer a anomalia de ser uma povoação dividida por duas freguezias, o que muitaz vezes tem originado conflitos d’authoridades»(245). Estes dados parecem esquecer a freguesia e paróquia de Souselas, uma das grandes prejudicadas pela divisão projectada. Mas não andavam distraídos os souselenses. Assim, e na mesma sessão, aprecia-se oficío da Junta de Paróquia de Souselas «…reclamando os 40 fogos do Sargento Mór que actualmente pertencem a esta freguezia, e que foram, pela nova divisão parochial, annexados a Trouxemil»(246). A comissão manterá a decisão e argumentação anterior, informando Souselas das razões que a levaram a proceder de tal modo. Neste particular sobressai, naturalmente, o interesse religioso:

(245) (246)

A.H.M.C. - Actas da Comissão de Arredondamento das Freguesias, 1862-1865, Fl. 19v. Id. Fl. 21

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«A linha ferrea de Lisboa ao Porto passa entre Souzellas e o Sargento Mór; a passagem atravez da linha é expressamente prohibida, excepto nas passagens de nivel, e em certas horas; dado o caso que tal prohibição não houvesse, o trajecto atravez da mesma linha é assás perigozo, e, em qualquer das hypotheses, é possivel dar-se o caso d’uma urgente necessidade d’administração de Sacramentos a um enfermo, ou outra qualquer dependencia dos habitantes do Sargento Mór da sede de sua parochia; é claro que na primeira hypothese havia d’esperar-se pela hora em que fosse permittido a passagem pela linha ferrea, e nesse meio tempo pereceria o enfermo sem os soccorros espirituaes, na segunda hypothese, pôr-se-hia em risco as vidas dos que levassem os soccorros a quem os necessitasse. Ora para Trouxemil não se dá tal inconveniente, por isso foi para esta freguezia que a Commissão entendeu dever passar os 40 fogos do Sargento Mór (conjuntamente com os que pertencem a Barcouço) pertencentes actualmente a Souzellas; e ainda pela razão de que não fica o Sargento Mór, a maior distancia daquella do que d’esta freguezia, tendo para aquella freguezia de ficar em caminho do Sargento Mór para Coimbra, onde os seus habitantes fazem quasi todo o seu comercio»(247). Jerónimo Lopes Parente intervém publicamente sobre o assunto em Novembro de 1865, pronunciando-se sobre o arredondamento paroquial e criticando duramente a comissão a quem acusa de «…arrogar-se o poder a seu arbitrio, de irem tirar d’um rebanho as ovelhas que querem, ajuntal-as a outro; queiram ou não as mesmas ovelhas, queiram ou não seus pastores»(248). O mapa geral da nova divisão paroquial elaborado pela comissão de arredondamento estará na sua mira, devido ao deslocamento dos já referidos 40 fogos de SargentoMór que passam de Souselas para Trouxemil: «No referido mappa o lugar do Sargento-Mór está para Trouxemil na mesma distancia que está para Souzellas (…) seus usos e costumes são os mesmos, e sempre, e de immemorial posse, seus paes pertenceram para Souzellas, e em sua igreja jazem seus restos mortaes. Acresce: este lugar do Sargento-Mor é dividido, e demarcado pela immemorial estrada real, hoje de macadame, que não só divide as freguezias de Souzellas e Barcouço (donde deita 20 fogos para poente, e 40 para Souzellas a nascente) mas tambem divide os concelhos de Coimbra e Mealhada. É por isso que neste caso, e semilhantes as commissões não podem fazer obra boa (…) devem aggregar-se n’um só ponto, a uma só parochia». A discussão em torno da divisão paroquial continuaria nos anos seguintes. Em Setembro de 1867, e no resumo dos mapas da projectada circunscrição dos

(247) (248)

Id. Fls. 21-21v. Jerónimo Lopes Parente - «Correspondências» In O Conimbricense, P. 2

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concelhos e paróquias civis, do futuro Distrito de Coimbra, lá aparecia Souselas como sede da paróquia civil que abrangia as povoações de Sazes, Pampilhosa e Botão, num total de 845 fogos(249). Souselas era, para efeitos judiciais, sede de um «districto de juizo de paz» que abarcava as freguesias de Brasfemes, Eiras e S. Paulo de Frades. E foi também durante muito tempo a sede de uma assembleia eleitoral do concelho. Nas eleições de 1857 e 1858, para escolha de deputados e designação da Câmara Municipal, era a 3ª assembleia do círculo eleitoral de Coimbra, abarcando os 1162 fogos também das freguesias em redor; S. Paulo de Frades, Eiras, Brasfemes, Torre, Botão e Trouxemil. Em Abril de 1860, era a 2ª assembleia do concelho e abarcava além da freguesia de Souselas, as mesmas acima descritas (menos Brasfemes) num total de 1362 fogos. As eleições em Souselas para a Câmara Municipal foram muitas vezes polémicas, tendo sido a de Agosto de 1862, particularmente agitada. Dela nos deixou rasto Lopes Parente, um dos principais envolvidos na qualidade de presidente da assembleia eleitoral. No dia 31 de Agosto, reunida a assembleia eleitoral de Souselas (e também em Assafarge) foram ambas anuladas porque «…foram preteridas solemnidades essenciaes e praticados actos contrários a lei»(250). Anulada a de Souselas, marcou-se nova data, o dia 7 de Dezembro para a realização do acto, cuja assembleia voltaria a ficar tristemente assinalada. Num primeiro momento, Parente vem a público protestar contra a validade da eleição «…por ter presidido a ella o sr. dr. Lourenço de Almeida e Azevedo, que não é vogal da commissão municipal (…) Só na falta de membros d’aquella commissão é que podia ser nomeada outra pessoa para presidir às assembleias eleitoraes; e como é quasi impossivel que sete homens se impossibilitassem todos conjunctamente na vespera da eleição (…) A esta circunstancia accresce o ser o sr. presidente um dos vogaes do conselho de districto que hão-de intervir no julgamento da validade das eleições…»(251). Estas eleições seriam ganhas pelo partido do governo, motivando um protesto conjunto de Lopes Parente e do chefe do partido da oposição, o Dr. Raymundo Venancio Rodrigues – um notável documento de época - onde apresentam seus fundamentos para a inviabilização do acto eleitoral: «1º Porque muitos parochos das diversas freguezias, que constituem esta assembleia eleitoral, exerceram grande pressão na consciencia dos seus parochianos para os obrigarem a votar na lista da auctoridade (…) 2º Porque os regedores percorreram constantemente de dia e de noute as casas dos eleitores ameaçando uns com a vingança da auctoridade (…)

(249) (250) (251)

Vide O Conimbricense, 10 Setembro 1867, P. 2 In O Conimbricense, 23 Novembro 1862, P. 1 Lopes Parente In O Conimbricense, 10 Dezembro 1862, P. 2

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3º Porque no proprio dia da eleição o regedor de Souzellas, coadjuvado por alguns proselytos da auctoridade teve encarcerados n’uma casa d’esta povoação de Souzellas, muitos elleitores, que nas duas horas d’espera foram escoltados e guardados até á urna pelos regedores de Eiras e Souzellas e parocho d’Eiras, accrescendo a esta circumstancia, outra não menos grave de embriagarem muitos d’elles cuja repugnancia em votar na lista da auctoridade nem pela força podiam vencer, a ponto de commetterem na igreja, o escandalo de fumar, tal era o estado d’allucinação, produzido pela embriaguez (…) 4º Porque um empregado do governo civil – Cunha Novaes – se apresentou a trocar e tirar listas á porta da egreja»(252). A finalizar pediam que o Conselho de Distrito anulasse a eleição, protificando-se a apresentar rol de testemunhas. No ano seguinte mantêm-se as criticas aos actos eleitorais, designadamente aos preparativos. De facto, em Abril a comissão de recenseamento eleitoral chegava pela hora de almoço a Souselas, depois de trabalhar em Trouxemil. A sua actividade seria duramente criticada por Lopes Parente: «Ao meio dia começou o de Souzellas pela leitura do ultimo recenseamento, a requisição d’um dos seus membros. E sendo approvado, quiz o mesmo se desse o recenseamento por findo (…) Então reclamei eu pela leitura da matriz da decima, por ser o censo a base essencial do recenseamento (…) e não o recenseamento anterior, que só serve de auxilio (…) Eis levanta-se a voz do dito membro da commissão, que para isso não estava, e que quem quizesse requeresse por fora, e documentasse»(253). Neste artigo, explica-nos o venerando souselense, que reclamando alguns contribuintes que pagavam suficiente censo, em 7 nomes 3 não apareciam na matriz, e 5 estavam excluídos por seu nome não constar: «Assim perante o publico reclamo, contra a commissão por deixar de inscrever n’esta freguezia (talvez para mais) 30 contribuintes, que a lei chama a votar, e a commissão achando-se superior exclue, por falta da tão recommendada base de fiscalização do censo». Em termos da organização comarcã, Souselas continuou como sede de um “Disctricto de Paz”, o qual em 1865 estava em pleno funcionamento, embora motivasse a apreensão dos moradores que abarcava, os quais se viram forçados a sair a terreiro. Dispostos a «fazer subir ao conhecimento do governo de S.M. um escandalozo abuzo», solicitavam que para «commodidade dos povos» o seu escrivão de paz resida dentro do districto de Souselas e não em Coimbra(254). Pelo decreto de 12 de Novembro de 1875 foram extintos os juízes eleitos e remodelados os julgados ordinários da comarca, desdobrando a cidade em dois, tendo-se criado os de Assafarge, S. Silvestre, Souselas e Taveiro.

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Lopes Parente e Venâncio Rodrigues In O Conimbricense, 10 Dezembro 1862, P. 2 Lopes Parente - «Correspondência» In O Conimbricense, 18 Abril 1863, P. 2 Vide O Conimbricense, 28 Abril 1865, P. 3

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Durante este período mantêm-se os laços com o município baseados, também, em questões fiscais. De facto e á semelhança de outras freguesias aqui se arrematam os impostos indirectos de consumo de géneros e bebidas ou o imposto de sal. 2.2.2. Consolidação de antigas estruturas locais: caminhos, pontes, fontes A junta de paróquia foi, aos poucos, substituindo-se às antigas justiças concelhias, agindo como intermediário entre o local e o municipal. Especialmente quando as situações envolviam bens e estruturas públicas, como pontes, fontes e caminhos. Preocupações que eram, na sua maior parte, uma herança do tempo senhorial e concelhio. Ao nível das pontes, detectámos a interferência directa da junta em diversas situações, de que realçamos: a 5/11/de 1860, pede ao município a conclusão da ponte de frades «…que a Câmara de 1852 começara»(255); a 14 de Março de 1882, o município manda reparar a Ponte Pedrinha, na Estrada dos Fornos a Souselas; em Julho de 1887, autoriza a reconstrução da ponte no sítio da Ribeira de Saias, no caminho de Souselas à Zouparria, ficando concluída em Agosto desse ano(256); em Setembro de 1888 e, em Agosto de 1890, a Junta de Paróquia pede a reparação da importante Ponte da Azenha (que punha em contacto o lugar da Azenha com o de Souselas) neste último caso por estar em «completa ruína»(257). Na reparação dos caminhos e, por vezes, das fontes aplicava-se o serviço braçal (ou contribuições de serviço) das respectivas localidades. Outras vezes, era decisivo o apoio do município que reservava dotações em orçamento para tal fim ou financiava através da concessão de subsídios. Estão neste caso: as reparações de 1887 relativas ao caminho de Souselas a Sargento-Mor; a reparação do caminho rural de Antuzede para Sargento-Mor, em Dezembro de 1889; os caminhos de Souselas em Dezembro de 1895; os caminhos entre a Estrada de Souselas e a Marmeleira, em Agosto de 1903. Reparações que também se estendiam a parte da principal estrada municipal da zona; a de Souselas-Botão (ordenando o município a sua reparação em Fevereiro de 1906). Quanto a fontes, e depois de feitos os pedidos pelas juntas locais, ordenava-se a reparação das mesmas quando os recursos o permitissem: em Setembro de 1893, o município ordena a reparação das fontes de Souselas, Brasfemes e S. Paulo de Frades. José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1840-1869, Edição Comemorativa do Cinquentenário da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1972-1973, P. 347 (256) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1870-1889, Biblioteca Municipal de Coimbra, 1937, P. 248 (257) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1890-1903, Biblioteca Municipal de Coimbra, 1939, P. 14 (255)

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A REPÚBLICA EM SOUSELAS No início do século XX, a Implantação da República em 1910 foi o principal acontecimento politíco nacional. Porém, não dispomos de fontes (actas da junta de paróquia, por exemplo) para aquilatar do modo como o movimento foi sentido em Souselas. Porém, temos a memória da realização do comício de um candidato a deputado às Constituintes pelo círculo de Coimbra. O evento, data de 30 de Abril de 1911 e ficou registado pelo punho do próprio candidato, o Coronel Belisário Pimenta. De realçar a menção a Alberto Dias Pereira, em casa de quem os participantes jantaram antes de regressar a Coimbra, de comboio: «Ao outro dia houve comicio em Souzellas organisado pelo major Bandeira. Era um domingo, 30 d’abril. O José Maria de Sousa Napoles levou-nos no seu automovel até lá, eramos quatro: o Bandeira, o Napoles, o alferes Carlos Mascarenhas e eu. Choviscava. Na aldeia o povo, depois da missa, esperava no largo fronteiro á egreja. O Alberto Dias Pereira, bello rapaz de 18 a 20 annos, filho do antigo cacique de Souzellas, manobrava de um para o outro lado, recomendando cousas. E ahi cerca do meio dia, sob a ameaça de borrasca, nós lá trepámos a um pequeno estrado construido à ultima hora sobre dois bancos de carpinteiro e deu-se começo ao comício. Duzentas pessoas, não mais, com mulheres e creanças; o major abriu o comicio e apresentou as contas dos adeantamentos á familia real; depois foi o Napoles q. desatou a descascar nos padres com anedotas alegres e picantes de tal forma q. conservou constante hilaridade; depois o Mascarenhas q. fez a sua estreia e q. se apresentou bem; a seguir…eu! (…) Comecei por me apresentar como candidato ás Constituintes. Procurei tirar efeitos, não os massei muito e recebi fartos aplausos no fim… Falou ainda o Alberto Dias Pereira e por fim o major encerrou o comicio entre vivorio e palmas e o toque da Portugueza executada por uma tuna, obrigada a pandeireta… E, enquanto se fazia horas para o jantar, tivemos de conferenciar com as comissões politicas da terra, do Botão, de Brasfemes (…) conversando sobre as necessidades da região» [In Memórias de Belisario Pimenta, Vol. 9º, 1910-1911, Pp. 260-261]

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Freguesia de Souselas – um povo com História

3. Souselas sob orientação da Junta de Freguesia 3.1. Introdução Como já referimos, a lei nº 621, de 23 de Junho de 1916, provocou alterações na divisão administrativa do território, entre as quais a substituição da Paróquia Civil pela designação de Freguesia. Este órgão manter-se-ia com esta designação até aos nossos dias. No caso souselense, conhecemos a sua actividade directa entre 1917-1974, excepto o período 1951-1957, do qual não subsiste qualquer registo em acta. Durante muito tempo, a junta foi administrada por comissões administrativas que cessaram a sua actividade em 1926 (foto 36). A partir de então, o órgão local passou a designar-se apenas por Junta de Freguesia de Souselas, nomenclatura que subsistiu até à actualidade. Repercussões desta alteração detectam-se na acta de 9 de Agosto de 1926, que refere a reunião na «sala das sessões de freguesia de Souzelas» expressão que será substituída por «casa das sessões da Junta de freguesia de Souselas». No entanto, a primeira vez que se definiu, claramente, uma «reunião da Junta de Freguesia de Souselas» foi a 1 de Janeiro de 1938. Antes de avançarmos para a análise ao funcionamento interno da freguesia importa elencar os lugares que dela faziam parte: Souselas, Carrimá, Casal da Azenha, Casas de guarda do caminho-de-ferro, Estação do caminho-de-ferro, Lagares, Marmeleira, Pisão, Quinta de Lagares, S. Martinho do Pinheiro, Zouparria do Monte e Sargento-Mor (parcialmente)(258). Em Souselas conhecem-se os diversos executivos entre 1918-1974 (incluindo as comissões administrativas), excepto o período 1951-1957, por falta de dados documentais (Anexos, Tabela 11). Dentro deste período cronológico, cada executivo tomava posse no princípio do ano, por norma em Janeiro, sendo o regedor responsável pelo acto, incluindo a apresentação dos alvarás com a nomeação da nova comissão administrativa (depois junta de freguesia). A acta desse acontecimento intitulava-se por «transmissão de poderes». Acrescente-se que também o próprio regedor tomava posse na presença das autoridades locais. Ao nível do funcionamento interno da JF, a contabilidade tende a ser cada vez mais organizada e rigorosa, apresentando os orçamentos nos últimos 3 meses do ano e as contas da Receita e Despesa, anualmente, e pelo final do ano. Importante alteração foi a substituição do ano económico pelo ano civil, que passou a ser aplicado em 1938. Por outro lado,

(258) Annuario Commercial de Portugal, 1911, 31.º ano de publicação, propriedade de Manoel José da Silva, Vol. II – Províncias, Pp. 1985-1986

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IV – Evolução Administrativa

devido às diversas solicitações e competências, a junta admite um contínuo a que mais tarde se junta o coveiro. As receitas do executivo provêm de várias fontes, com especial relevância para alguns baldios. Num deles, que não conseguimos identificar, extraiu-se durante algum tempo areia, chegando mesmo a utilizar-se um boletim que registava as carradas retiradas e o nome dos requerentes. Por outro lado, mantém-se a prática do tempo paroquial em afixar editais, e pôr em praça os matos e pinheiros existentes nesses terrenos e de os cortar dentro de determinado prazo. Eis alguns dos baldios dos quais se extraia um regular rendimento: Gândara, Barreiro, S. Martinho e Cabeço da Rosa (limite de S. Martinho do Pinheiro), Vale Pardinho, Matinhos, Ladeira, Fonte Soalheira. Também da gestão dos dois cemitérios da freguesia – Souselas e Marmeleira - chegavam receitas provenientes dos pedidos para venda de terrenos e sepulturas, os quais continuavam a passar pela junta. Porém, e quando as finanças apertavam era por aí que se esticava a corda. Tal foi o caso de Abril de 1930 em que se eleva o valor dos covatos para 5$00 (crianças até 10 anos) e 10$00 (crianças com mais de 10 anos e adultos) «… pois doutra forma não consegue esta Junta fazer face às despesas com a limpeza e conservação do dito cemiterio». O preço de venda das sepulturas sofreria diversos aumentos, um dos quais em Maio de 1964 e para 1.000$00, com a justificação de evitar a compra delas, dado haver pouco espaço no cemitério. A freguesia mantém-se como sede de dois importantes serviços: • Juízo de Paz. Cargo que foi ocupado pelos seguintes indivíduos: Constantino de Carvalho (1915-1916)(259) e Manoel Maria de Quadros (Juiz, 1917-1928); • Posto de Registo Civil: Alfredo Augusto dos Santos (ajudante, 19151918), e Tiberio Pires Aldeia (ajudante, 1919-1928) (260) 3.2. A freguesia no Estado Novo 3.2.1. Mantêm-se velhas preocupações As principais preocupações que eram objecto da atenção da junta de paróquia transitam para o novo órgão, em tempos do Estado Novo, excluindo parte da gestão do culto e vida religiosa da freguesia.

(259) (260)

Anuário Comercial de Portugal 1915-1928 Id.

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Ao nível rodoviário, a junta estará atenta a reparações necessárias nas vias fundamentais: não só nas ruas dos principais lugares, mas também na Estrada camarária Fornos-Souselas, na estrada Souselas-Sargento Mor (correndo as obras com a comparticipação de 18.190$00 do M.O.P.), na estrada SouselasMarmeleira (que em Novembro de 1941 não consegue ainda reparar; primeiro devido à estiagem e, depois, à falta de pessoal). A este nível, e não raras vezes, sente-se a grande preocupação dos eleitos e do próprio povo. Servirá de exemplo, o pedido feito em Março de 1950 à C.M.C. para a reparação de diversos caminhos «…especialmente do que da Marmeleira, conduz a Santa Luzia, que se encontra intransitavel, ou a concessão de um subsidio para a referida obra, informando que alguns lavradores estão dispostos a auxiliar este melhoramento, conforme consta de um abaixo assinado em poder desta junta»(261). Ao longo dos anos, intensifica-se a preocupação com a reparação dos antigos caminhos: o de ligação de S. Martinho à estrada de Zouparria do Monte, o Caminho Mainho e o Caminho do Cemitério da Marmeleira, bem como os da Junqueira e Pisão, todos reparados durante 1951; em Dezembro de 1957 realiza-se escritura para reparação do Caminho Municipal da Marmeleira ao limite do concelho, no valor de 25.000$00. Reparações que se estendiam a coisas de menor dimensão como muros de suporte de caminhos. Em jeito de balanço, e no final de 1958, a junta de freguesia dava conta da conclusão das seguintes obras(262): paredão do Casal da Azenha (7.825$00, tendo os moradores contribuído com 860$00); reparação do Caminho do Pisão (1199$00, tendo os moradores contribuído com 320$00); reparação do Caminho da Junqueira (gastou-se 2.933$00, contribuindo «os proprietarios confinantes» com 187$50); reparou-se a Estrada de S. Martinho do Pinheiro (3.992$00); o Caminho do Cemitério da Marmeleira (1584$00); e o Caminho das Cantarinhas (1659$00). Os anos seguintes, confirmam esta especial atenção, talvez a principal das preocupações materiais do órgão autárquico: Caminho de Marmeleira às Almas da Ladeira; Caminho do Cabêço da Meirinha-Souselas, caminhos de Fonte do Lobo e Mainho (em Sargento-Mor) e Rua dos Canteiros (Zouparria, em 1963). Reparações que a partir dos anos 60 são feitas com a inovação do «revestimento superficial betuminoso», e que por vezes tornavam necessárias expropriações de terrenos e cortes de árvores inesperados, saldados com indemnizações. Os seus trabalhos poderiam ser suspensos devido ao mau tempo, como sucedeu em Outubro e Novembro de 1963, na reparação do caminho

(261) (262)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 50 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 5v.

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de ligação a Lagares onde também se andava construindo um aqueduto sobre a Vala de Lagares. Em Março de 1965, foi objecto de especial reparação, a Estrada de Souselas para a Marmeleira, que a junta em final de mandato lamentará não ter ficado concluída. E, a propósito da obra que fôra feita, lançam um voto de louvor ao «Execlentissimo Senhor Doutor Manuel Parente que foi incansável no sentido de se realizar tão grande necessidade, para esta freguesia, nomeadamente para o povo da Marmeleira do Botão»(263). Em meados dos anos 60, volta a pairar a ameaça da falta de braços na região para realizar as obras previstas, pelo que a junta delibera pelos finais de 1967, que para todas as obras se peçam propostas a diversos empreiteiros. Paralelamente, as reparações de estradas e caminhos assumem outros contornos; devido ao aumento do tráfego rodoviário deixam de ser simples obras de conservação passando a assumir as formas de alargamento e rectificação. Assim aconteceu com a Estrada de S. Martinho do Pinheiro, de SouselasBrasfemes (Estrada Municipal 537-4 onde se aplicou calçada nos finais de 1970) e Caminho Municipal do Cabeço de S. Pedro a Marmeleira do Botão (em 1969); a reparação da E.M. 537-4, lanço Brasfemes-Souselas (em 1973); a reparação e beneficiação do C.M. 1132 de Zouparria do Monte a S. Martinho do Pinheiro (Março de 1974). Souselas manteve-se como sede de Juízo de Paz e de Posto de Registo Civil. Assim, e durante este período, foram Juízes de Paz (a partir de 1940 designado por Julgado de Paz): Armando d’Almeida (Juiz, 1929-1939) Francisco S. Marques (1940) Joaquim Ferreira (1941-1945), Antonio Diniz (1946-1949), Adriano dos Santos Silva (1950-1951), Carlos Nunes de Almeida (Juiz, 19521955), José Pereira da Silva (1956-1957) Saúl Maria da Conceição (19581959), Fernando Martins Anacleto (Juiz, 1960-1961), Alberto Carlos Neves de Oliveira (Juiz, 1962-?)(264). Como responsável pelo Posto de Registo Civil manteve-se Tibério Pires Aldeia (ajudante, 1929-1932). Sucedeu-lhe, Joaquim Ferreira (1933-1939), e Manuel Parente Júnior (da Marmeleira, ajudante, 1940-1954). A partir de 1933, Souselas passa a dispor de um Encarregado de Correio (de 1944 em diante acumulando com o telefone), de que foi primeiro responsável Joaquim Ferreira que se manteve na função até 1958. A partir de 1959, e já com a estação em funcionamento, assume a função António Cerveira de França Martins (265).

(263) (264) (265)

Id. Fl. 46 Anuários Comerciais de Portugal, 1929-1968 Anuário Comercial de Portugal, 1934-1968

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3.2.2. Novas competências e realidades Aos poucos, a junta tornou-se directamente responsável pelo património público que administrava. Os seus orçamentos passam a contemplar a reparação de fontes, estradas e edifícios como escolas ou templos religiosos. No início são obras que, apesar de anunciadas por edital, ficam sem proponentes, seja por falta de informação ou porque, simplesmente, a sua execução não era rentável. Junta de Freguesia que passa também a certificar, legalmente, a situação dos seus habitantes: atestados de pobreza, de residência, de bom comportamento moral e civil. A este nível, procedemos ao levantamento dos dados relativos ao ano 1938, durante o qual se passaram 60 atestados, 5 dos quais não conseguimos apurar qual a matéria atestada. De facto, nos restantes sabemos que 36 diziam respeito a atestados de residência e 19 eram atestados de pobreza. A maioria destes certificados ou atestados foram para moradores em Souselas e Marmeleira e, alguns (poucos), para S. Martinho do Pinheiro, Zouparria e Sargento-Mor. De 1916 a 1926, a administração dos bens da igreja e do culto na freguesia esteve sob dependência da junta de freguesia. Porém, em Dezembro de 1926, passam para a alçada da Comissão Cultual(266), criada pelo decreto nº 11887 de 6/6/1926, a quem se fez a entrega de «…todos os bens pertencentes a esta igreja de Souselas e que estão situados nesta freguesia»(267), incluindo uma inscrição da divida interna consolidada, destinada a «encargos pios», mas que será devolvida à junta, posteriormente, por a comissão ter constatado lhe pertencer por direito. O isolamento das populações começa a esbater-se, e os assuntos de âmbito nacional, chegam mais depressa às terras, apressando a manifestação de solidariedade; o Terramoto na Ilha do Faial, em Setembro de 1926, motiva um voto de pesar da junta pelas vítimas que provocara. Mas, também ao nível local, a solidariedade era apanágio da junta, que em Dezembro de 1944 assume as despesas de pagamento do caixão de Mariana Martins, falecida em Souselas «…por a familia sêr pobre não poder pagar o funeral»(268). Os lugares de enterramento mereciam especial atenção, daí que os executivos passem a incluir verba em orçamento para a limpeza e conservação do cemitério de Souselas. À medida que as questões relativas à saúde e assistência foram sendo divulgadas, junto das populações, os órgãos locais procuraram acompanhar e apoiar várias

Composta pelos cidadãos: Manuel Rodrigues da Silva (pároco da freguesia), José Antunes de Sousa, Jaime Eulalio Gomes, Joaquim Marques de Figueiredo, Alfredo dos Reis Pato, Joaquim Marques e Joaquim Sousa (267) A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 2v. (268) A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 24 (266)

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medidas. Em Souselas, e a partir dos anos 40 do séc. XIX, os orçamentos inscreviam verbas para assistência, inicialmente sem especificação, mas que aos poucos vão sendo reveladas, tornando-se fixas e regulares a partir de meados dos anos 50. Tal foi o caso dos donativos para o Instituto de Oncologia, a Assistência aos Tuberculosos e Cegos (Obra Social de Bissaya-Barreto) ou para assistência aos pobres e indigentes da freguesia. Já nos anos 70 colaboraria com a Liga Contra o Cancro. A partir de meados dos anos 40, sente-se que a junta de freguesia de Souselas caminha a passos largos rumo ao aperfeiçoamento e modernidade. Nesse sentido, e no orçamento para 1947, inscreve verba para assinatura de jornais e revistas e, por deliberação do executivo de 7 de Março de 1965, decide comprar uma máquina de escrever marca smithcorona «…dado que o movimento desta junta o justifica»(269). A JF começa a ser ouvida pelo município de forma regular, sempre que em jogo estavam interesses da sua região. Assim, e pelos finais de 1957 é chamada a pronunciar-se «…sobre a conveniência da realização da feira de gado do Espirito Santo»(270), que se efectuava nos Fornos. As melhorias estendem-se ao nível da higiene, tornando-se habitual a limpeza das ruas e valetas dos lugares da freguesia. Também a sinalização das povoações se torna preocupação, tendo a junta solicitado ao Serviço de Obras da C.M.C., em Fevereiro de 1972, a colocação de uma placa indicativa de «Marmeleira-2 Kms» no começo da estrada que de Souselas conduzia ao lugar. E, até ao final do regime, com especial intensidade nos anos 70, chegam diversos subsídios municipais, destinados aos mais diversos melhoramentos, com especial destaque para pavimentação de arruamentos. 3.2.3. Dois exemplos de problemas com limites de freguesia No dia 25 de Julho de 1968, a JF reuniu para tratar de um tema quente, incendiado pela aquisição de terrenos da recentemente instalada fábrica SIAF: «Tendo chegado ao conhecimento de que a Junta de Freguesia de Torre de Vilela, pretendia fôsse encorporado na area da sua freguesia, todo o terreno adquirido pelas Fabricas SIAF, com a alegação de que parte dele já pertencia ao seu patrimonio matricial, questão levantada por efeito das novas matrizes, foi resolvido protestar por todos os meios ao nosso dispôr, justificando-se que a maior parte desses terrenos, senão todos, estão na area da freguesia de Souselas, razão porque esta Junta não abdicará dos direitos que julga ter sobre eles»(271).

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 37 José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P.401 (271) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 25/7/1968 (269) (270)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Pela primeira vez na curta história da Freguesia de Souselas, os seus limites eram postos em causa. Dois dias depois, a 27 de Julho, a junta volta a reunir, extraordinariamente, para tomar conhecimento das declarações espontâneas tomadas pela “Comissão de Avaliação da Nova Matriz Predial da Freguesia de Souselas”: «Por eles foi dito que o Presidente da Junta de Freguesia de Torre de Vilela, os havia prevenido para não incluirem na Matriz de Souselas, os terrenos onde se encontram instaladas as Fabricas SIAF no total de 132.000 metros quadrados; aqueles seriam inscritos na Freguesia de Torre de Vilela»(272). Na mesma reunião, o órgão representativo do povo souselense toma desde logo uma posição, lavrando veemente protesto, onde apresenta argumentos legais, historia o sucedido, e anuncia medidas futuras: «Este Corpo Administrativo, após ter sido o assunto posto à discussão; considerando que a linha divisória entre as duas freguesias se encontra definida, desde há longos anos pela existencia de um marco do antigo Mosteiro de Lorvão, cravado junto do lugar do Ribeiro a cêrca de 140 metros da Ponte Pedrinha, que delimita a Poente atè à freguesia de Trouxemil e a Nascente pela Barroca das Valas ou do Carneiro até aguas vertentes da Serra de Brasfemes; considerando que as instalações da SIAF e seus terrenos se encontram a Norte da Ponte Pedrinha, absolutamente dentro dos nossos limites; considerando que os filhos de Souselas, calorosamente se interessaram para engrandecimento do patrimonio da sua freguesia com contactos directos e frequentes com as pessoas interessadas na aquisição dos terrenos, cedencia dos mesmos por preços módicos e facilidades de toda a ordem, para que nela se fixasse aquela unidade industrial, manifestando por último a sua maior alegria, o seu maior reconhecimento, por verem na sua terra o Mais Alto Magistrado da Nação, Sua Excelencia o Presidente da Republica Almirante Americo Tomaz, quando no dia catorze de Setembro de 1967 a veio inaugurar; considerando injustas as pretensões da Torre de Vilela, esta Junta levanta o seu protesto, até porque o artº 7º do Código Administrativo esclarece que as circunscrições administrativas só por lei podem ser alteradas; considerando o aspecto publico, esta Junta reconhece que a população da freguesia de Souselas exige deste Corpo Administrativo, na sua qualidade de gestor de Negocios Paroquiais, uma defesa seria, firme, e enérgica do que lhe pertence; deliberou por unanimidade: Primeiro: Enviar convite ao Presidente da Freguesia de Torre de Vilela para comparecer no dia 5 de Agosto de 1968, junto da linha divisória, pelas dez horas; Segundo: pessoalmente expôr o assunto em causa, ao Excelentíssimo Senhor Presidente da Camara Municipal de Coimbra e Excelentíssimo Senhor Director de Finanças de Coimbra»(273).

(272) (273)

Id. Acta de 27/7/1968 Id.

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Por bandas de Souselas adivinhava-se um Verão quente. E o dia 6 de Agosto (e não a 5 como previsto) seria tórrido. Nesse dia e, por sugestão do Director de Finanças de Coimbra, reuniram pelas 16 horas no local da polémica, as duas comissões de avaliação da nova matriz de Souselas e Torre de Vilela e as respectivas juntas «comparecendo muito povo de ambas as partes e ainda o Excelentíssimo Senhor Presidente da Câmara Engenheiro Araújo Vieira, que se fez acompanhar do Vereador Senhor Doutor Francisco Augusto Cortez. O Senhor Presidente da Camara, aconselhou a retirada do povo, decidindo que o assunto fôsse exposto e resolvido por Sua Excelência o Ministro do Interior. A tão judiciosas, como oportunas palavras é de salientar a correcção e obediencia imediata do povo de Souselas, na certeza de que o Senhor Presidente da Camara, só procedera dentro do maior espirito de justiça»(274). Enquanto o assunto não conheceu evolução significativa, a JF procurou reunir os elementos possíveis; solicitando, da Câmara Municipal, fotocópia da Planta Corográfica da Freguesia e Carta do Foral ou Decreto que elevou Souselas à categoria de freguesia; e do Arquivo da Universidade cópia certificada do Tombo 3º da demarcação e destrinsa dos Casais de Souselas. Andava a junta ocupada na resolução deste problema com Torre de Vilela, quando estoira idêntico problema, mas noutra área da freguesia. De facto, a 15 de Setembro de 1968 reúne a junta em sessão extraordinária, solicitada «…por vários proprietarios, donos e legítimos possuidores de terrenos situados entre a Fábrica Cesol (Cerâmica de Souselas, Limitada), Valor e Ponte de Porto Seco, que pessoalmente e na sede da Junta, desejavam apresentar o seu protesto por terem sido inscritos pela Comissão de Avaliação da freguesia de Botão, os seus terrenos para aquela freguesia. E mais disseram que a dita Comissão de Avaliação não os atendeu, apesar de alguns terem exibido escrituras antigas da freguesia de Souselas. Posto o assunto a discussão, foi deliberado e aceite por unanimidade que os reclamantes apresentassem o seu protesto por escrito, que seria levado ao conhecimento das instâncias superiores»(275). O problema dos limites administrativos e fiscais passou a ter, a partir de então, duas frentes. Um problema sem solução à vista e que é, retomado numa reunião das juntas de freguesia com o Presidente de Câmara, a 16 de Dezembro, onde Souselas se insurge; por um lado, contra a inscrição na Freguesia de Torre de Vilela do imóvel Fabricas SIAF e terrenos anexos e, por

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Id. Acta de 7/8/1968 Id. Acta de 15/9/1968

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outro, contra a inscrição na Freguesia de Botão de alguns terrenos calculados em vários hectares(276). Analisada a situação em nova reunião extraordinária de 18 de Dezembro, decide-se enviar, com o acordo do Governador Civil, uma dura exposição ao Ministro do Interior: «Porque entendemos que os factos refletem uma evidente violação dos nossos direitos, há muito fixados e nunca contestados, levantamos muito respeitosamente, perante Vossa Excelencia, o nosso sereno mas vigoroso protesto, cônscios de que o acto sentido de Justiça que tão nobilitante o enobrece Senhor Ministro, não deixará de manifestar-se, repondo as coisas como de Direito». Deve aqui sublinhar-se que uma parte dos problemas com os limites administrativos entre as freguesias de Souselas e Botão seria resolvido de forma elegante e cordata, numa reunião extraordinária ocorrida a 15 de Julho de 1971, precedida por uma outra, original e rara, que teve lugar em espaço público, próximo da zona conhecida por Ponte do Porto Sêco. Um acordo valioso na história conturbada dos limites de freguesias, e que bem pode constituir um exemplo para as gerações presentes e futuras. Os autarcas envolvidos, Amilcar Barreto Rajado (da parte de Souselas) e Marcolino de Carvalho (da parte de Botão), decidiram dar ao documento o título de «Auto de acordo sobre os limites comuns às Freguesias de Souselas e Botão do Concelho de Coimbra», remetendo cópia à Repartição de Finanças de Coimbra, para os devidos efeitos legais.

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Id. Acta 18/12/1968

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AUTO DE ACORDO SOBRE OS LIMITES COMUNS ÀS FREGUESIAS DE SOUSELAS E BOTÃO DO CONCELHO DE COIMBRA «Aos quinze dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e um, compareceram, pelas dez horas e trinta minutos, no local denominado “Ponte do Porto Sêco”, os Presidentes das Juntas de Freguesia de Botão e Souselas, respectivamente Senhores Marcolino de Carvalho e Amilcar Barreto Rajado, em exercício das suas atribuições, e bem assim os Senhores José Simões Lopes e Manuel Esteves Alves, escriturários de primeira classe da Primeira Repartição de Finanças de Coimbra, em representação da mesma e ainda o agente técnico de engenharia senhor José Martins em representação da Câmara Municipal de Coimbra a fim de apreciarem o problema da delimitação administrativa das duas citadas freguesias. No local foi interpretada a “Carta Administrativa “ do Concelho de Coimbra em poder da sua Câmara Municipal e aprovada sem quaisquer reclamações (…) Verificaram, assim, os presentes, confirmando o alegado na exposição do referido processo, a bem vincada e nitida existência de um caminho público que, partindo da Estrada Nacional número 336/3º classe, vai à passagem de nível do caminho de ferro situada ao quilómetro 226,460 metros, e, considerando que a Divisão Fiscal sempre se subordina à Divisão Administrativa, reconheceram eles, os presentes, que os prédios inscritos sob os artigos 4242 a 4379, na matriz predial rústica da freguesia de Botão, o foram, indevidamente, por êrro originado pela manifesta ignorância ou desconhecimento da parte dos membros da Comissão de Avaliação que efectuou o respectivo cadastro. Deliberaram, assim, as Juntas de Freguesia de Botão e Souselas, solicitar à Primeira Repartição de Finanças de Coimbra, que tais prédios voltem a ser inscritos na matriz rústica da freguesia de Souselas, à qual, de facto, sempre pertenceram» [Fonte: Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, Acta do dia 15/7/1971]

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3.3. A Freguesia depois da revolução de Abril: a transmissão de poderes, a Comissão Administrativa da Junta de Freguesia e a acção das Comissões de Moradores Os acontecimentos do 25 de Abril de 1974 motivaram naturais reacções em Souselas. Porém, os dias seguintes parecem ter sido de alguma normalidade ao nível do funcionamento da junta; deferiram-se requerimentos, respondeu-se a correspondência e passaram-se atestados. Mas tudo tinha um limite e, a 4 de Maio, a junta ainda em exercício depõe o seu mandato e os seus elementos apresentam a exoneração dos cargos, manifestando vontade em colaborar com o novo regime(277): «Que em face aos acontecimentos ocorridos no dia 25 de Abril do ano em curso e ao desejo de colaborar, no máximo, na livre representação do povo da freguesia dentro da sua junta, apresentar a sua exoneração dos cargos que vinham exercendo, ao Excelentíssimo Delegado da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Coimbra; Facilitar por todos os meios, uma livre escolha dos elementos que hão-de constituir a Comissão encarregada de gerir este Corpo Administrativo, no futuro; Dar a maior publicidade à Convocatória que haverá necessidade de fazer-se ao povo da freguesia, para uma reunião a realizar em breve, para se levar a efeito a referida escolha; Que cada um dos vogais presentes, fique à disposição e até onde se tornar necessário, para facilitar ou auxiliar a actividade da Comissão, na solução ou conhecimento dos vários problemas que preocupam a nossa freguesia; Saudar, na pessoa do Excelentissimo Representante Militar em Coimbra, as Heroicas Forças Armadas, que tão bem se houveram na instauração das Liberdades em Portugal; e finalmente Saudar o Digno Representante em Coimbra, da Junta de Salvação Nacional, nas medidas já tomadas e outras que irão seguir-se, no propósito firme do engrandecimento da Pátria, que é de todos nós». A 10 de Julho, e na sede da Casa do Povo, far-se-ia a transmissão de poderes entre a junta cessante e os elementos da Comissão Administrativa composta por Gil Celso Domingues Pais de Figueiredo, José Joaquim Henriques Simões Leite e José Duarte Simões e que esteve em funções de 1974 a 1976. Desta comissão, faziam ainda parte mais 5 elementos; Alfredo de Sousa Lopes,

(277)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975

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António Fernandes de Almeida, António Carneiro dos Santos Madeira e Rogério Marques Carneiro. Os executivos democraticamente eleitos sucederam-se a partir de 1977 atè à actualidade (Anexos, Tabela 12). As primeiras eleições livres, em 1976, tiveram como secções de voto os seguintes locais: as eleições de Março na Escola Primária (secções 1 e 2) e na Casa do Povo (a 3.ª); e, as de Maio, na Escola Primária (as 3 secções). Uma das primeiras medidas dos elementos de gestão da freguesia, no período pós-revolução, foi a elaboração de um caderno de necessidades. A 5 de Fevereiro de 1975, e em reunião extraordinária que terminaria pela noite dentro, os elementos da JF e representantes delegados da JF nos lugares de Sargento-Mor, Marmeleira e S. Martinho viam o seu trabalho reconhecido e sancionado pela população na sede da Casa do Povo, depois de várias sessões de esclarecimento nos diversos lugares da freguesia. O caderno era lido e aprovado por unanimidade para entrega posterior à CA da C.M.C. Para um melhor acompanhamento dos problemas sentidos pelas populações, constituem-se comissões de moradores eleitas pelo povo (fotos 37 e 38) e constituídas por elementos das diversas forças políticas emergentes; a de Souselas reuniu pela primeira vez a 9 de Junho de 1975, tendo sido reconhecida pela C.M.C. no mês seguinte. Funcionou até 1976 e dela fizeram parte os seguintes moradores: Valério Nunes Madeira, José Fernando Pimenta Mendes, Gil Celso Domingues Pais de Figueiredo, Fernando Esteves Gaudencio, João da Silva Pombeiro, José Monteiro da Cunha, Manuel Fonseca Borges, Vasco Serrano Ventura dos Santos, Aida Maria da Silva Silvério, Maria de Lourdes de Oliveira e Silva, Ilda Maria da Silva Silvério Filipe(278). Esta comissão, teve a funcionar um secretariado e uma subcomissão encarregue de elaborar os seus estatutos. A Comissão de Moradores de Souselas foi responsável pelos primeiros passos de algumas obras fundamentais para a freguesia, que ficaram registadas no seu Caderno de Prioridades: «Caminho do Matoito à Moenda e Valas, Caminho do Cemitério. Para o efeito seriam necessárias máquinas e manilhas. Rua de Traz das Eiras, junto à Casa do Povo, Instalações Sanitárias no terreno da antiga escola, Parque Infantil no local onde esteve a antiga sede da Junta de Freguesia, Transporte e despejo dos bidons do lixo, ao menos duas vezes por semana, Sinalização em diversos locais»(279). Foi também no seio da comissão que se criou um grupo de vigilância da poluição na freguesia, e que se deu seguimento à abertura de uma nova estrada do Passal ao Largo da Igreja.

(278) (279)

A.J.F.S. – Livro de Actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976, Fl. 1 Id. Fl. 3v.

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Mas não só em Souselas se organizaram comissões de moradores. A da Marmeleira foi eleita um pouco tardiamente, em Assembleia Geral de Moradores dos habitantes, realizada a 20 de Março de 1976, no salão de festas da Delegação da Casa do Povo. Eram seus membros: António Pardal Batista, Gil Figueiredo, Elias de Almeida, João Manuel Pereira Gonçalves, Domingos Almeida Simões Serra, Arménio Fernandes Pereira Forte e Fernando Ventura Custódio(280). Em Sargento-Mor também funcionou uma Comissão de Moradores. Destas comissões saíram várias propostas para melhoramentos nos lugares da freguesia, que a junta transmitia ao município e cuja aprovação esteve dependente, durante algum tempo, do Secretariado das Juntas de Freguesia do Concelho de Coimbra. 3.3.1. Linhas de continuidade e de ruptura A freguesia mantém, na sua fase inicial de liberdade, alguns modos de funcionamento ou linhas de continuidade vindos do passado: vende-se a lenha dos baldios, passam-se atestados, trata-se do expediente recebido. Os compromissos anteriores não são colocados de lado, especialmente se importantes para o progresso da vida material da freguesia. Assim, a reparação de estradas é incentivada; o município, por exemplo, abre concurso para a adjudicação da empreitada do C.M. 1132, Zouparria-S.Martinho (em Maio de 1974). O posicionamento da freguesia no contexto do município é definido, em 1981, pelo Engº Urbanista Manuel Leal da Costa Lobo, que em relação à cidade continua a manter Souselas, Ceira, Taveiro e S. João do Campo como «seus subúrbios ainda destacados»(281).

(280) (281)

A.J.F.S. - «Acta da Assembleia Geral de Moradores do lugar de Marmeleira do Botão» (cópia). A.J.F.S. - Correspondência Recebida, 1981 (pasta)

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AS AGRURAS DE SARGENTO-MOR «Aproximadamente a dez quilómetros (fixe bem, leitor:10 quilómetros…) da Praça 8 de Maio no sentido do Norte, existe uma povoação que todos bem conhecemos: Sargento-Mor. Cerca de oitocentos habitantes, é a comunidade que a forma, distribuída por uns trezentos fogos. A população dedica-se especialmente à lavoura, embora muitos dos seus naturais exerçam em Coimbra e noutras terras próximas, variadíssimas actividades, alguns dos quais com posições de relevo. Pois essa povoação, divide-se pelas freguesias de Souselas e de Barcouço, pelos concelhos de Coimbra e da Mealhada, e pelos distritos de Coimbra e de Aveiro!!!...Engraçado não é? Estamos mesmo a ver o leitor a ficar com os “olhos em enviés” perante tal trapalhada! E reparem: acontece isto a dez quilómetros do centro da nossa cidade, portanto, a menos uns tantos do seu limítrofe Norte. É evidente que, por este quadro de magnificente divisão administrativa, aquela comunidade de portugueses, não estando fixada no Algarve, passa as “passas do Algarve”, quer para saber qual o seu “Norte”, quer fundamentalmente no cumprir das obrigações que envolvem o cidadão como elemento activo da sociedade. E a essa infeliz povoação e suas gentes acontece ainda, desde que há cerca de oito anos foi aberta ao trânsito a nova variante da estrada do Norte, que passa ao lado do lugar, jamais a estrada antiga que passa pelo seu centro, serviu qualquer acção de limpeza ou de conservação! O seu estado é precário e praticamente intransitável, com buracos em toda a extensão, dando origem a que, talvez em breve, os autocarros das carreiras que servem a população, deixem de lá passar, deslocando-se para a variante, o que transporta os maiores transtornos. Claro, este desinteresse só pode ser motivado por a antiga estrada ter passado ao domínio de “terra de ninguém” consoante a divisão administrativa que a enforma. Dada, porém, a campanha de promoção rural em que se empenha o Presidente do Conselho, lebramos a quem de direito “as agruras das gentes de Sargento-Mor”. Mas há muito mais por aqui…» [«Uma povoação infeliz “quase” na zona limítrofe da cidade» In Diário de Coimbra, 20 de Abril de 1969, P. 1]

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Ao nível dos limites administrativos, continuou na ordem do dia a situação de divisão do lugar de Sargento-Mor, que até aos dias de hoje se mantém pertença de duas realidades administrativas diferentes: uma parte é da freguesia de Souselas (Concelho e Distrito de Coimbra), a outra da Freguesia de Barcouço (Concelho da Mealhada e Distrito de Aveiro). Contudo, e a este respeito, no levantamento feito pela junta de freguesia em Setembro de 1974 reportando das necessidades e benefícios que cada lugar esperava, nos anos seguintes, respondeu o povo de Sargento-Mor de forma clara: «Considera a população deste lugar que a unificação administrativa do mesmo é apesar de tudo prioritária a qualquer outro beneficio que se lhes possa oferecer. Pretendem sobretudo que toda a povoação fique a pertencer à freguesia de Souselas e portanto ao concelho e distrito de Coimbra»(282). Ainda ao nível da área administrativa da Freguesia de Souselas, é interessante verificar como o lugar de Adões foi, até ao princípio dos anos 90 do século passado, considerado como parte do seu território. As juntas do pós-25 de Abril herdam a complicada situação das passagens de nível. Em carta enviada pela JF a diversas entidades (C.M.C., G.C., Ministro da Agricultura e Pescas, Ministro dos Transportes e Provedor de Justiça), a 25 de Fevereiro de 1981, dava-se conta de um desses episódios: «…encerrada, das 20 horas das sextas feiras atè às 8 horas das segundas feiras seguintes e, ainda, das 20 horas às 8 horas de 2ª feira até à 5ª feira, a passagem de nível ao Km. 223,990, situada no lugar do Ribeiro, pertencente parte à freguesia de Torre de Vilela e a outra parte a esta freguesia de Souselas». A JF protesta então «energicamente contra tal decisão tomada pela C.P.» e solicita a a intervenção das autoridades para bem dos habitantes do lugar e agricultores da região. De facto, pode ler-se na carta que ali «residem nove familias, que não teem outra forma de acesso (…) os prejuizos dos agricultores por ali não poderem passar os veiculos de transporte das uvas (…) o caso de se poder dar em qualquer das moradias ali existentes um incendio (…) uma ambulância para transporte de pessoa ferida por acidente ou doença grave»(283). Um problema que se estendia às zonas da freguesia atravessadas pela linha férrea, incluindo a Marmeleira, onde em Julho de 1995 os seus moradores elaboraram um abaixo-assinado devido aos horários de funcionamento da passagem de nível que servia o lugar (P.N. ao Km. 227.680). Um problema em parte resolvido pela entrada em funcionamento do sistema automático. A partir de finais da década de 70, a JF começa a interessar-se por aspectos formativos, recolhendo elementos acerca da convenção sobre segurança social

(282) (283)

A.J.F.S. - «Necessidades mais urgentes na Freguesia de Souselas», Setembro 1974, Fl. 4v. A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta)

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entre Portugal e França (1978), droga ou participação nas reuniões inter-juntas. Em 1981, e como nenhum elemento da Junta de Freguesia sabia escrever à máquina, foi contratado em part-time um dactilógrafo, o que permitiu a abertura da sede ao público durante 3 dias por semana. Foi também neste ano, que se pediram à C.M.C. e Junta Autónoma de Estradas a colocação de placas de localização com o nome das diversas aldeias. A outro nível, a JF torna-se a placa giratória dos pedidos de apoio vindos de outras juntas para obras e melhoramentos, a quem solicitam que interceda junto da CIMPOR ao nível financeiro e material. Os princípios da década de 80, trazem sérias dificuldades financeiras aos executivos locais. Em Souselas, por exemplo, o Plano de Actividades para 1981 previa um conjunto de obras a executar com verbas da Câmara Municipal de Coimbra, pois os recursos internos apenas garantiam o pagamento do expediente. De acordo com o recenseamento eleitoral elaborado pela Junta de Freguesia em 1982, os inscritos em 1981 eram 2090, os quais após as eliminações por transferência e novas inscrições em Maio de 1982, perfazia um total de 2059. Devido à degradação da qualidade de vida dos habitantes da freguesia, o executivo toma a decisão de se demitir, em Março de 1985, a que se associou a Assembleia de Freguesia. Um facto comunicado às autoridades administrativas superiores:

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«Ex.mo Senhor Presidente da Camara Municipal de Coimbra A Assembleia de Freguesia de Souselas, reunida em sessão ordinária para apreciação e votação do Relatório de Actividades e Contas de 1984, apreciou igualmente o pedido de demissão da Junta de Freguesia de Souselas, baseada no facto de esta não ver resolvidas as mais prementes necessidades, ao contrário, ver cada vez mais degradada a qualidade de vida dos seus habitantes com desprezo pela Câmara e outras entidades oficiais na resolução dos seus problemas, entre outros os seguintes: Reconstrução da estrada nº 336 no troço entre Fornos e Souselas, que a torna intransitável e que é um sorvedoiro de dinheiro com reparações (…) estrada da Marmeleira cheia de buracos e que qualquer dia se tornará intransitável. Rua do Alto das Eiras em Souselas completamente degradada e quási intransitável: falta de abastecimento de àgua domiciliária aos lugares da Marmeleira, Sargento-Mor, Zouparria e S. Martinho, já há muito prometido e sempre adiado Deficiente iluminação pública em locais já habitados; paragem das obras do Recinto Desportivo de Souselas (…) A população de Souselas e sua Freguesia é indubitavelmente uma população martirizada pela poluição e que vê dia após dia o seu património destruido, as suas culturas inutilizadas, a sáude dos seus filhos altamente comprometida sem que veja por parte da Câmara Municipal e de outras entidades oficiais, motivadas para a resolução de tão urgentes problemas. A Assembleia de Freguesia por unanimidade está solidária com a Junta de Freguesia (…) a falta de aproveitamento dos terrenos do Calvário para construção de habitação social, de que Souselas está tão carenciada (…) Basta de tanta injustiça! Basta de tantas promessas! Os membros da Assembleia de Freguesia esperam de uma vez por todas, da Câmara e das outras entidades oficiais, a melhor atenção para os factos que se teem passado e pedem o maior empenho na resolução dos problemas para bem da Freguesia de Souselas que exige e merece. Assembleia de Freguesia de Souselas, 23 de Março de 1985»(284).

(284)

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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A verdade é que o futuro de Souselas parecia hipotecado, com obras a transitarem do Plano de Actividades de 1985 para o de 1986 e assim sucessivamente; Estrada de Souselas a Brasfemes (240 contos); Rua do Prior em Sargento-Mor (114.750$00), Rua do Anibal em Sargento-Mor (110.250$00) e Rua do José Mendes em Souselas (279 contos). Os anos seguintes iriam ressentir-se deste facto, com obras a não serem cumpridas e a transitarem para o ano seguinte. Nos anos 90, a JF lançou-se num novo rumo, participando no Congresso da ANAFRE. Novos tempos também ao nível tecnológico, pois em Abril de 1994 concluía-se «…que para um bom funcionamento desta casa, seria o ideal a informatização. Assim, e dadas as dificuldades económicas encontradas, deliberou-se fazer um esforço e adquirir de imediato numa primeira fase, um computador com a impressora»(285). No sentido de melhorar a prestação de serviços à população a JF decidiu, em 2005, protocolar com o Instituto de Emprego a colocação de um funcionário na Secretaria, utilizando como critério fundamental ser um cidadão da freguesia. Por outro lado, e ao abrigo de um protocolo celebrando com o I.E.F.P., passaram a fazer-se nas instalações da JF a apresentação quinzenal dos cidadãos desempregados. Freguesia que, nos últimos anos, tem vivido com sérias restrições financeiras, em parte ultrapassadas através da reorganização financeira e administrativa. Paralelamente, têm sido implementados diversos projectos necessários ao desenvolvimento da freguesia: • Criação de um posto de internet público e do site da freguesia (foto 39). • A criação de acordo com a lei, da Comissão Social da Freguesia de Souselas, tendo em vista colmatar as necessidades sociais existentes. A Comissão, constituída a 21 de Dezembro de 2008, foi subscrita por 24 instituições e colectividades da terra. • Projecto de grande impacto regional de que se deu conta em Janeiro de 2006. Face à localização geoestratégica de Souselas, e dadas as potencialidades que esta possui a nível de acessibilidades rodo e ferroviárias, poder-se-á criar uma nova centralidade, funcionando a freguesia como âncora das freguesias da Zona Norte do Concelho de Coimbra», e tendo em vista «o desenvolvimento económico e social da Freguesia de Souselas, nomeadamente o desenvolvimento do projecto da Plataforma Logística»(286). • Desenvolvimento cultural: procedeu-se ao levantamento do património histórico e arqueológico da freguesia (que conduziria à elaboração desta monografia), bem como do património edificado; Jogos da Freguesia de Souselas (fotos 40A a 40E); Mostra Gastronómica e Cultural - Encontro

(285) (286)

A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 1 Id. Fl. 53v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

das Colectividades e Instituições da Freguesia (organizada pela A.D.S. em colaboração com a JF e C.M.C.); Feira do Vinho do Azeite e da Terra; Feira das Tasquinhas (foto 40); Comemoração do Dia da Freguesia (foto 41) e do documento mais antigo; geminação entre as freguesias de Souselas e Almalaguês baseado num protocolo de colaboração e cooperação entre as partes assinado a 31 de Maio de 2009, e assinalada com o descerramento de uma placa na Adega Cooperativa (foto 42). • Plano de Requalificação Urbano de Souselas. • Requalificação (estudo prévio) do recinto de festas. • Desenvolvimento económico; realizando na freguesia (Casa do Povo) um inédito Fórum Económico e Social, em 12/12/2007, aberto à participação popular onde se discutiram ideias para o presente e futuro. DISTINÇÕES DE MÉRITO NO DIA DA FREGUESIA Comemorações do Dia da Freguesia 2007 (Centro Social da Marmeleira) - Joaquim Manuel Correia Gonçalves - João da Costa Paulino - Euclides da Costa Baptista (Reconhecimento pela luta contra a co-incineração) - Ana Margarida Morais (pelo percurso académico) - Gonçalo Sousa (Campeão do Mundo Kempo) - Ana Cláudia Sousa Ferreira (Campeão do Mundo Kempo) Comemorações do Dia da Freguesia 2008 (Casa do Povo de Souselas) - Delfim Várzeas (Presidente de Junta) - Licínio Abreu (Campeão Mundial Tiro aos Pratos) - Adega Cooperativa (50 anos da instituição) - Vasco Rafael Gonçalves Nunes (Selecção Nacional de Raguebi, 1996-99) Comemoração do Dia da Freguesia de Souselas 27 de Novembro de 2011 (Casa do Povo de Souselas) No dia 8 de Outubro de 2011, foi deliberado por unanimidade pelo executivo da Junta de Freguesia de Souselas a atribuição de: Medalha de Mérito de Freguesia a CASA DO POVO DE SOUSELAS, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da recolha, inventariação e caracterização do Folclore e Etnografia, da cultura e da música tradicional e do património histórico da Freguesia. Na promoção e divulgação da Freguesia de Souselas, no país e estrangeiro (França, Espanha e Itália), na rádio e 220

IV – Evolução Administrativa

televisão, através do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas e da Barca dos Castiços. Releva-se, igualmente, o passado da instituição que durante muitos anos funcionou com delegações na Marmeleira e no Botão, tendo prestado um serviço de apoio social de elevada relevância aos cidadãos das Freguesias de Souselas e de Botão. Medalha de Mérito de Freguesia à ASSOCIAÇÃO DESPORTIVA DE SOUSELAS, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas, do acompanhamento e da prática desportiva para crianças e jovens e da obra de requalificação do Campo do Calvário de Souselas. Medalha de Mérito de Freguesia a INSTITUTO EDUCATIVO DE SOUSELAS, pelo excelente trabalho desenvolvido no âmbito da acção educativa, formativa e pedagógica dos cidadãos da Freguesia de Souselas. Medalha de Mérito de Freguesia a CENTRO CULTURAL E DESPORTIVO TUNA SOUSELENSE, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção, desenvolvimento e ensino da música e da cultura. Bem como na divulgação da Freguesia de Souselas. Medalha de Mérito Desportivo a ARMANDO MANUEL SIMÕES PRATA, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas, na qualidade de Presidente da Associação Desportiva de Souselas e da obra de requalificação do Campo do Calvário de Souselas. Medalha de Mérito Social a MANUEL QUEIROZ DE OLIVEIRA, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da acção social na Freguesia de Souselas e da obra social e educativa promovida pelo Centro de Apoio Social de Souselas, do qual é presidente. Medalha de Mérito Cultural a ANA PAULA MOREIRA DA SILVA (Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas), pelo trabalho desenvolvido no âmbito da recolha, inventariação e caracterização do Folclore e Etnografia, da cultura e da música tradicional e do património histórico da Freguesia. E enquanto elemento fundador e Directora Técnica do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas. Bem como pelo trabalho desenvolvido que permitiu ao Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas ser filiado na Federação do Folclore Português, Classificado pelo Gabinete Nacional de Folclore e Etnografia do Inatel e Classificado pela Câmara Municipal de Coimbra como Grupo de Interesse Folclórico. Medalha de Mérito Cultural a PATRICIA SALOMÉ SANTOS FERREIRA (Barca dos Castiços, Tuna Souselense), pelo trabalho desenvolvido no âmbito funções como directora artística e pedagógica da Tuna Souselense e da Escola de Música. Como solista do grupo de música étnica/ folk “A Barca dos Castiços”, com um CD editado e participação

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Freguesia de Souselas – um povo com História

em vários festivais europeus. Bem como docente de Educação e Expressão Musical, em instituições de Ensino Publico, tendo leccionado Canto e Bandolim na Academia de Música do Centro Norton de Matos, em Coimbra. Participado como coralista do Choral Aeminium, realizado obras como “Requiem” e “Davide Penitente” de Mozart, “9º Sinfonia” de Beethoven com a Orquestra do Norte, Orquestra Filarmonia das Beiras, Orquestra Clássica do Centro e Orquestra Filarmónica da Varsóvia, na Festa da Música “Beethoven e Amigos” no Centro Cultural de Belém, “Carmina Burana” de Carl Orff, “Stabat Mater” e “Missa em Ré” de Dvorak, “Messias” de Haendel, “Missa” de Baldi e “Auto de Coimbra” de Manuel Faria resultando, este último numa primeira e única gravação desta obra. Ainda como coralista realizou “O Requiem Alemão” de J. Brahms, no âmbito da disciplina de Coro internada no curso Superior de Canto na Universidade de Aveiro. Medalha de Mérito Cultural a DANIEL DE JESUS ANDRADE E CRESPO (Grupo Etnográfico da Casa do Povo, Barca dos Castiços, Tuna Souselense), pelo trabalho desenvolvido no âmbito da cultura e da música tradicional. E enquanto elemento fundador musico do grupo de música étnica/folk “A Barca dos Castiços”, com um CD editado e participação em vários festivais europeus. Músico do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas e da Tuna Souselense. Medalha de Mérito Cultural a JOÃO PEDRO DE JESUS ANDRADE E CRESPO (Grupo Etnográfico da Casa do Povo, Barca dos Castiços, Tuna Souselense), pelo trabalho desenvolvido no âmbito da cultura e da música tradicional. E enquanto elemento fundador musico do grupo de música étnica/folk “A Barca dos Castiços”, com um CD editado e participação em vários festivais europeus. Músico do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas e da Tuna Souselense. Medalha de Mérito Desportivo a ALCIDES MANUEL DA CUNHA MARQUES, pela carreira desportiva, enquanto atleta de atletismo, tendo obtidos importantes títulos e prémios em competições nacionais internacionais. Medalha de Mérito Desportivo a ALBERTO SANTOS MONTEIRO (Associação Escola de Karaté Shotokan de Souselas), pela carreira desportiva nacional e internacional, enquanto atleta de KARATÉ, com a graduação de 3º DAN na Shotokan Cultural Institute de Itália liderada pelo Mestre Hiroshi Shirai, 9º DAN, e pelo excelente trabalho desenvolvido na Associação Escola de Karaté Shotokan de Souselas. Medalha de Mérito Desportivo a RUI MANUEL SOUSA SOARES, Centro Social da Marmeleira, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas, nomeadamente na Marmeleira, bem como a construção do Polidesportivo.

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IV – Evolução Administrativa

Comemoração do Dia da Freguesia de Souselas 09 de Dezembro de 2012 (Centro Cultural de Sargento-Mor) No dia 8 de Outubro de 2012, foi deliberado por unanimidade pelo executivo da Junta de Freguesia de Souselas a atribuição de: Medalha de Mérito Cultural ao Grupo Desportivo e Cultural Marchas Populares de Souselas, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da cultura, bem como pela divulgação da Freguesia de Souselas. Medalha de Mérito Desportivo ao Sr. Vítor Sousa, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas, do acompanhamento e da prática desportiva para crianças e jovens Medalha de Mérito Desportivo à AEKSS – Associação Escola Karate, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas, do acompanhamento e da prática desportiva para crianças e jovens Medalha de Mérito Desportivo ao Centro Cultural de Sargento Mor, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção e desenvolvimento desportivo na Freguesia de Souselas Ano 2013 Medalha de Mérito Freguesia ao Centro de Apoio Social de Souselas (Dia do Centro) Medalha de Mérito Freguesia ao Centro Social da Marmeleira (25 de Abril)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 24 - Machado de pedra do Neolítico encontrado nos Carrizes (Souselas)

Foto 25 - Fundo de ânfora romana encontrada na Rua dos Mouros (Marmeleira)

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Foto 26 - Cemitério visigótico descoberto em Carrizes, 1938

Foto 27 - Marco de propriedade do Mosteiro de Lorvão, Carril (Marmeleira)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 28 - Documento da doação da villa de Sausellas ao Mosteiro de Lorvão, ano de 937

Foto 29 - Tombos de propriedades do Mosteiro de Lorvão, da Igreja de Santiago e da Igreja de S. Salvador na área de Souselas (Séc. XVIII-XIX)

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IV – Evolução Administrativa

Foto 30 - Tombos de propriedades do Mosteiro de Lorvão, da Igreja de Santiago e da Igreja de S. Salvador na área de Souselas (Séc. XVIII-XIX)

Foto 31 - Registo do 1.º baptizado realizado na Igreja de Santiago de Souselas (21 de Março de 1628) Foto 32 - Dicionário Geográfico 1758: relação da Freguesia de Souselas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 33 - Livros do extinto concelho de Souselas, Coimas e Regimento de 1740

Foto 34 - Registo do juramento aos oficiais concelhios da Marmeleira (1719)

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IV – Evolução Administrativa

Foto 35 - A antiga Casa do Concelho de Souselas

Foto 36 - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 37 - Comissão Moradores de Souselas - convocatória

Foto 38 - Solicitação da Comissão de Moradores da Mata do Machial

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IV – Evolução Administrativa

Foto 39 - Inauguração do site da Junta de Freguesia de Souselas, pelo vereador Eng. João Rebelo, 2008

Foto 40 - A Feira das Tasquinhas de Souselas, 2009

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 40A - Jogos da Freguesia 2008 Centro Cultural de S. Martinho do Pinheiro

Foto 40B - Jogos da Freguesia 2008 Centro Cultural de Zouparria do Monte

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IV – Evolução Administrativa

Foto 40C - Jogos da Freguesia 2008 Associação Desportiva de Souselas

Foto 40D - Jogos da Freguesia 2008 Centro Cultural de Sargento Mor

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 40E - Jogos da Freguesia 2008 Centro Social da Marmeleira

Foto 41 - Sessão Solene do Dia da Freguesia de Souselas, Casa do Povo de Souselas, 2011

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IV – Evolução Administrativa

Foto 42 - Geminação da Freguesia de Souselas com a Freguesia de Almalaguês (31 de Maio de 2009)

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V DEMOGRAFIA, ARTES, OFÍCIOS E OCUPAÇÃO PROFISSIONAL

Q

uantos eram ao longo dos tempos, e quais as ocupações dos habitantes da freguesia? Eis a pergunta que justifica este capítulo. De acordo com o numeramento de 1527(287), Souselas tinha neste ano 23 vizinhos (aproximadamente 90 habitantes) e Zouparria do Monte 16 (63 habitantes). Lamentavelmente, desconhece-se a que número chegava a povoação da Marmeleira, uma vez que à semelhança de 11 povoações do termo, fora vítima de deficiente transcrição de documentos. Sabe-se, no entanto, que seria bem povoada. Acrescente-se ainda que, nesta altura, a população do termo de Coimbra perfazia 3241 vizinhos, ou seja, aproximadamente 12.730 habitantes. Nos séculos XVI-XVII esboçou-se uma curiosa relação económico-social cidade-campo. A cidade favorecera o desenvolvimento de certas indústrias na região que dominava, pelo que nas povoações do termo vamos encontrar indústrias que a abastecem, ao mesmo tempo que fabricam objectos vários para consumo local. A este nível, não podemos esquecer uma realidade particular: «E a cidade não pode viver sem a moagem do pão e da azeitona que se faz, sobretudo, nos moinhos espalhados pelo campo»(288). No capítulo relativo aos senhorios referimos a localização de alguns destes engenhos na freguesia, os quais, no contexto alargado do termo coimbrão se destacavam: «A norte do Mondego não há grandes concentrações de moleiros. O maior conjunto depara-se-nos em Souselas»(289). Na impossibilidade de contabilizarmos os moinhos e moleiros para a freguesia de Souselas, importa realçar outra realidade surpreendente; a existência de uma indústria florescente de teares. De facto, segundo as cartas de exame relativas a 1623, e passadas aos seus proprietários, Souselas era a quarta localidade do termo com mais teares em funcionamento (13), depois de Castelo Viegas, Sobral e Fala(290). No princípio do Séc. XIX, e a julgar pelas licenças tiradas para o ofício de tecedeira, esta actividade estaria já em decadência: a

Armando Carneiro da Silva - «Evolucional Populacional Coimbrã» In Arquivo Coimbrão, Vol. XXIII, Boletim da Biblioteca Municipal de Coimbra, P. 213 (288) António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. I, Coimbra, 1971, P. 489 (289) Id. P. 495 (290) Id. P. 511 (287)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

08/10/1805 foram aprovadas para o dito oficio, Maria Joaquina e Thereza Murta, ambas de Souselas(291). Ainda neste ano há registo da existência de duas vendas em Souselas, sendo uma «de pão e vinho; outra de comer e beber»(292). A este nível não poderemos deixar de referir a Venda das Canetas, que em 1623 tinha a obrigação de disponibilizar vendeiro e estalajadeiro. Documentada para 1617, situava-se no caminho Lisboa-Porto, a légua e meia de Coimbra: «Aqui possuía António Fernandes umas casas, na estrada, onde dava comida e pousada. Mas os rendeiros, meirinhos e alcaides da cidade vexavam-no ao demandarem coimas e penas. E como a referida estalagem «era muito importante […] para os caminhantes não terem tanta opressão, alcança as isenções acostumadas»(293). A venda ou lugar das Canetas situava-se a Norte de Sargento-Mor, tendo sido por este absorvida (foto 43). Se adicionarmos a estas referências, a existência da Venda de Sargento-Mor e a de Santa Luzia (esta pertencia, em 1623, a Manuel Francisco, que se obrigou perante o município a vender vinho aos quartilhos e palha às joeiras), podemos apontar para um total de 5 vendas na área da freguesia em funcionamento, no século XVII. Ainda sobre as vendas, podemos afirmar que, à entrada do séc. XIX (18051807) a Freguesia de Souselas, com 10 unidades deste tipo, seria das comunidades do Município de Coimbra com maior implantação desta actividade(294): • Em Souselas: vendas de Manoel da Costa Torres (vinho), Joze Gomes (vinho), Maria Joaquina (vinho e o mais «que lhe ofrecer»), Maria de Jesus (de «vender líquidos») • Na Marmeleira: vendas de Joaquim de Souza (vinho), Eufrazia Thereza (vinho e «do que se lhe ofrecer»), Joaquim Joze (vinho e «o mais que se lhe ofrecer»), Joze Joaquim dos Santos (venda «o que lhe ofrecer»), Manoel Pereira (venda do que lhe oferecer). • Sargento-Mor: venda de Francisco dos Santos (vinho e o mais que lhe oferecer). O Padre António Carvalho da Costa, na sua Chorographia Portuguesa, em 1708, afirma que a freguesia teria 180 fogos, aproximadamente 770 habitantes.

AHMC – Licenças e Juramentos, 1805-1807, Fls. 56 António de Oliveira – A Vida Económica e Social de Coimbra, de 1537 a 1640, Primeira Parte, Vol. II, Coimbra, 1972, P. 21 (293) Id. P. 59 (294) AHMC – Licenças e Juramentos, 1805-1807, Fls. 10, 13v., 46, 90v., 100, 116v., 118, 119, 120, 125, 138v., 182v., 186v. (291) (292)

240

V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Segundo as informações paroquiais de 1721, Souselas teria por esta altura uma população de 457 fregueses de acordo com o Rol dos Confessados(295). Alguns anos depois, em 1758, o pároco da freguesia apontava para «cento e outenta e seis vezinhos em toda a frg.ª; e pessoas poderão ser mil pequenos e grandes»(296). Mas que área teria a freguesia? No primeiro caso, além de Souselas menciona-se Marmeleira, Carrima e Zouparria; enquanto que no segundo, referem-se os lugares de Souselas, Marmeleira Zouparria, S. Martinho, Canetas, Sargento-Mor, Azenha e Carrimá. Os diversos Tombos de propriedades realizados na freguesia, e que utilizámos para compreender o mecanismo senhorial, fornecem-nos preciosas indicações acerca da ocupação das gentes no século XVIII. Em Souselas detectámos: os pedreiros Manoel Fernandez, Antonio da Cunha e Manoel Dias; os ferreiros Manoel da Cunha e Antonio da Cunha; os alfaiates João de Souza e Antonio de Almeida; o barbeiro Bento Correia; o cardador Manoel Lopes; o boticário João da Cunha, o tanoeiro Manoel Dias, e o moleiro Antonio Simois Zarquo (ou Larco) e o pintor Luis de Oliveira (ambos da Azenha). Indivíduos com formação superior, inquilinos daqueles Casais, como o doutor Supriano da Costa (Souselas). Mas também de áreas próximas como: P.º Roiz de Almeida (Coimbra), Diogo Ribeiro da Crus (Coimbra), Bras Ferreira (Casal Comba), Manoel Cordeiro de Siabra (Vila de Botão), Manoel Lopes (Vila de Eiras) ou o licenciado Antonio Castanho (de Coimbra). Na vida militar destacam-se os Capitães-Mor, Antonio de Torres Pereira (da Torre), Francisco da Costa Cardozo (da Cioga) ou Manoel Cardozo de Torre (dos Fornos), que possuía a Quinta da Remolha. Ao nível da formação e desempenho de funções religiosas destacam-se os párocos: Manoel da Cunha Manso, Manoel Matheus de Souza (todos de Souselas), João Carneiro (Canetas). Mas, outros párocos possuem também propriedades aforadas na área de Souselas embora não sejam daí oriundos: Luis Pereira da Cunha (Coimbra/Quinta da Rachada), Manoel Pires Pinto (Outeiro do Botão), Hyeronimo Martins (cura na Igreja da Pampilhosa) Francisco Ribeiro da Crus (Vilela), Antonio Marques (Coimbra), Manoel do Amaral e Cunha (vigário de Souselas), e Manoel de Avellar (Coimbra). Também ligados com a vida religiosa tínhamos algumas instituições religiosas como a Irmandade de S. Sebastião, a Confraria de Nª Sra.ª do Rozario, a Confraria do Senhor e a do Santíssimo (todas de Souselas), a Irmandade das Almas (de Brasfemes) e a Confraria do Senhor (da Torre).

(295) (296)

A.U.C. – Fundo do Cabido: Informações Paroquiais 1721, Souselas, Fl. 1v. A.N.T.T. - Dicionário Geográfico, 1758, Vol. 35, Nº 238, P. 1701

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Freguesia de Souselas – um povo com História

No que diz respeito à Marmeleira também se detecta uma multiplicidade de ocupações: do cardador Francisco Fernandes, do tecelão João Fernamdes, dos ferreiros Jozeph Francisco e João Francisco, dos sapateiros Domingos Francisco e Manoel Francisco ou dos boticários Manoel Simoes e Jozeph Duarte da Gama. E, ainda, indivíduos de formação superior como o pároco João da Costa (Marmeleira). De fora da freguesia, mas tendo propriedades na Marmeleira surge-nos o Dr. Manoel Cordeiro, da Vila de Botão, ou o Reverendo beneficiado Manoel de Miranda, de Coimbra. Desde o numeramento da população e até 1758, poderemos concluir que em termos demográficos, a Freguesia de Souselas regista um fraco crescimento médio anual, mantendo-se um crescimento lento até 1854. A 1 de Fevereiro de 1808, por decreto do comandante do exército francês, lançou-se uma contribuição extraordinária de guerra, que incidiu sobre «os oficiais de porta aberta» bem como «lugares de venda nas praças públicas e fora delas»(297). Esta contribuição levou à organização de listas em cada lugar, especificando nomes, profissões e valores a cobrar: • No lugar de Souselas: contribuição lançada sobre 4 moleiros, no valor de 240 reis cada, perfazendo o total de 960 reis. Os seus nomes eram: Theotonio Cardozo, Manoel da Fonceca, Joaquim Antonio e Joaquim Joze de Sousa; • Na Marmeleira: foi o lugar com mais lançamentos de contribuintes, 13 no total, perfazendo uma contribuição integral de 2.140 reis. A relação compreende 3 sapateiros - Francisco Joze Ventura, Antonio da Cunha e Manoel da Cunha, com 240 reis cada - 1 carpinteiro, Joze Roiz, e um alfaiate, Joze Joaquim dos S.tos, ambos com 240 reis de contribuição. No entanto, deve-se realçar a presença de 7 tecedeiras (Rebeca, Silveria, Josefa, Thereza e 3 Marias), fixando-se valores mais baixo a saldar, com 100 reis cada. • Na Zouparria do Monte: ocorre situação semelhante ao verificado na Marmeleira. Com 9 contribuintes e uma contribuição total de 1.560 reis, compreendia mais de metade dos lançamentos (5), respeitando à profissão de tecedeiras, cada uma com 100 reis (Escolástica Caetana, Clara, Bernarda Joaquina, Maria Correia, e a mulher de Joaquim Oliveira). Os restantes contribuintes eram homens, recaindo sobre cada um o valor de 240 reis: Manoel Fra.cº Errimão, calsoteiro; Sebastião Madeira, pedreiro; Antonio Joze de Souza, ferreiro e Joaquim Joze de Oliveira, alfaiate(298).

Carlos Santarém Andrade - «A contribuição extraordinária de Guerra no Termo Coimbrão, em 1808» In Arquivo Coimnbrão, Boletim da Biblioteca Municipal, vol. XXI-XXII, Coimbra, 1988-89 (298) Id. Pp. 227, 233 e 249 (297)

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V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Perante estes dados, devemos realçar os seguintes elementos: a diversidade de profissões existentes na freguesia, prevalecendo a actividade de moleiro em Souselas e a de sapateiro na Marmeleira; o número elevado de mulheres no conjunto (12 num total de 26), que se dedicam à mesma actividade: tecedeira. Este último facto, confirma a existência para princípios do séc. XVIII, de um centro, artesanal e familiar, dedicado a esta actividade – a tecelagem manual – na área compreendida entre a Marmeleira e a Zouparria. Embora mais nenhum lugar actual da freguesia tenha sido descriminado será de supor que, pelo menos S. Martinho do Pinheiro se integrasse também nesta área produtiva de tecidos manufacturados. No documento base da contabilidade referente ao imposto da décima da freguesia, do ano de 1827, assinalaram-se algumas profissões nos cerca de 287 lançamentos registados (Tabela 7). No entanto, estes apenas se referem às povoações de Souselas, Marmeleira e Azenha. Apesar desta limitação, a profissão mais referida foi a de trabalhador, existindo pelo menos 25 habitantes assim classificados. Profissão que abrangeria um vasto leque de possibilidades, compreendendo também os trabalhadores por conta de outrem. Seguia-se a ocupação de seareiro, ou seja; aquele que trabalha e cultiva cereais nas searas, com 10 registos. As restantes profissões assinaladas dispersavam-se por diversas actividades; alfaiate, moleiro, barbeiro, ferreiro, sapateiro, lavrador e meliciano. Em duas situações ocorreu a acumulação de profissões, e ambas na Marmeleira: Manuel Simões como boticário/seareiro e Adrião Francisco como seareiro/sapateiro. Tabela 7 – Profissões na Freguesia de Souselas segundo o lançamento da décima, 1827(299) SOUSELAS Nome Profissão José Lopes Tricana Seareiro Joaquim Nunes Alfaiate João da Silva Lavrador Adrião das Neves Trabalhador Antonio Ferreira Id. Cosme Dias Id. Sebastião Gomes Id. José Murta Moleiro Isidoro de Sousa Trabalhador Manoel Simões Id. Joaquim António Id.

(299)

Levantamento realizado a partir do Livro das Decimas da Freguesia de Souselas, 1827

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Nome

Joze Gomes Joaquim de Sousa Marques Manoel da Silva Manoel da Cunha Ramalho Bento de Lima Antonio de Campos Manoel Rodrigues José Rodrigues Manuel Simões Direito António dos Santos Agulha José Rodrigues Novo Francisco Correia Manuel Marques Novo Manuel da Cunha Manaia Francisco Rodrigues Adrião Rebelo J.e Rodrigues Manuel de Almeida Sebastião da Fonte Adrião Soares Domingos Diniz Adrião Francisco José da Cunha Manoel Simões António dos Reis João Ramos Maria Clara, viúva Manuel Prior José Lopes João Antonio Manuel Francisco Manuel Correia Manuel de Almeida Teotónio Soares Cardozo

SOUSELAS

Profissão Id. Seareiro Trabalhador Id. Barbeiro Trabalhador Seareiro Ferreiro Trabalhador Id. Id. Sapateiro Trabalhador Id. MARMELEIRA Seareiro Trabalhador Id. Id. Seareiro Trabalhador Seareiro Seareiro/Sapateiro Seareiro Boticário/Seareiro Trabalhador Id. Lavradora Trabalhador Meliciano Seareiro Id. Trabalhador AZENHA Trabalhador Seareiro

A evolução demográfica fez-se de avanços e recuos. Por vezes conseguindo superar períodos de crises, como as que derivavam das epidemias. Em 1832/1833, Souselas e as demais freguesias do concelho sofriam os efeitos da epidemia «Colera morbus», que findou a 9 de Setembro. Na avaliação final, lançavam-se os números da morte: 10 falecidos e 16 atacados, numa população avaliada em 890 habitantes(300).

(300)

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Documentos relativos a epidemias, Cx. 1

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V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Voltamos a aproximar-nos dum esboço da estrutura profissional masculina souselense, 10 anos depois do lançamento da décima e com um grau maior de acerto no que toca às funções e moradas dos indivíduos. Números que se extraem do Recenseamento Eleitoral de Souselas, de 1836, onde se registaram os cidadãos da freguesia com direito a voto para a eleição de deputados às Cortes(301). Num total de 161 habitantes (cidadãos com direito de voto) contam-se, ao nível das ocupações, 97 trabalhadores, 39 lavradores, 10 proprietários, 3 alfaiates, 3 párocos, 2 carpinteiros, 2 taberneiros, 1 barbeiro, 1 sapateiro, 1 cortador, 1 mendigo e 1 paneleiro. Cidadãos que se distribuíam pelos lugares da freguesia do seguinte modo: Souselas com 67, Marmeleira 62, Zouparria 13, Sargento-Mor 8, Azenha 2, S. Martinho, Lagares, Pisão dos Canaviais e Canetas todos com 1. Excepção feita ao último lugar enunciado, não podemos deixar de estranhar o diminuto número de cidadãos de S. Martinho, Lagares e Pisão, o que poderá indicar que estes lugares tenham pertencido a outras juntas de paróquia, pelo menos transitoriamente. Perante este levantamento, podemos afirmar que a freguesia mantém os seus traços económicos e sociais que a caracterizaram desde sempre; por um lado, a dependência da terra e, por outro o peso no conjunto, dos lugares de Souselas e Marmeleira que segundo este registo forneciam 80% dos cidadãos aptos a votar em eleições e igual percentagem de ocupações. Importa ainda referir que este documento foi elaborado pela junta de paróquia mais antiga que se conhece para Souselas, composta pelo Pároco (e Presidente) Joze Ferreira Cardozo, Jeronimo Jose Baptista Lopes Parente (Secretário) e João Borges (Tesoureiro). De acordo com o Mapa Administrativo de 1854, a freguesia teria 235 fogos, aproximadamente 940 habitantes, assim distribuídos: Carrimá (5), Casal de Lagares (1), Casal do Pisão (3), Marmeleira (86), Sargento-Mór (26), S. Martinho do Pinheiro (15), Souselas (85) e Zouparria (14). Nestes números, será de destacar o facto de existirem dois centros populacionais muito fortes, com a Marmeleira a afirmar-se, por esta altura, como a maior povoação da freguesia em termos demográficos, assim se mantendo até 1940, quando Souselas dispara consequência devido ao desenvolvimento industrial(302). Para os anos subsequentes a 1860, e dada a projectada divisão administrativa da freguesia, Souselas iria perder população uma vez que Sargento-Mor transitaria para a Freguesia de Trouxemil.

Anexos, Tabela 10. Antonio Luiz de Sousa Henriques Secco - Mappa do Districto Administrativo de Coimbra, 1854, Imprensa da Universidade, Coimbra, P. 35 (301) (302)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A partir de 1864 entra-se, a nível demográfico, numa nova era em Portugal, uma vez que o censo realizado naquele ano foi o primeiro de um longo período que se manteve até à actualidade, com base em estatísticas organizadas e programadas. A partir desta altura, e devido a um conjunto de condições, entre as quais se contam a melhoria das condições de vida e o estabelecimento da via-férrea – a freguesia começa a crescer demograficamente de forma sustentada, culminando com a industrialização. Gráfico 13 – Evolução da população total da Freguesia de Souselas, 1864-2011

Até então nunca se fizera um censo tão rigoroso, embora o mesmo se tenha realizado num clima de desconfiança face ao governo. Segundo aquela contagem Souselas tinha 1000 habitantes, um número relativamente baixo e que é contrariado logo em 1865 por outra fonte, em que a freguesia apresentava um total de 1190 almas para 250 fogos(303). Pelos finais do séc. XIX Lopes Parente aludia à estrutura profissional dos habitantes da freguesia: «São estes dados ao trabalho, e pouco rixosos, sujeitos às auctoridades, dados à agricultura, pouco lhes importa darem-se a officios, ou outro modo de vida; poucos annos ha se contavam para cima de oitenta os trabalhadores de enchada, e todos no serviço da freguezia se empregavam»(304). A partir da década de 60 do séc. XIX e até aos nossos dias, foi possível acompanhar a evolução da população de 10 em 10 anos graças à realização dos censos (ver gráfico 13). E os dados apontam para uma nítida tendência de

Mappa Geral das Povoações, casaes, quintas das freguesias que compõem a Comarca de Coimbra, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1865, P. 22 (304) Jerónimo Lopes Parente - «Agricultor» In O Conimbricense, 20 Agosto 1872, P. 4 (303)

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V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

crescimento demográfico, acusando no entanto três situações de retrocesso; 1890-1900, 1911-1920 e 1991-2001. Perdas que têm a sua explicação: nos dois primeiros casos haverá, seguramente, uma influência decisiva quer da emigração para as nossas províncias do Ultramar e Brasil, quer o aparecimento de algumas doenças causadoras de elevada mortalidade, associadas ao cultivo do arroz, e que a partir do BaixoMondego contagiaram a região. A diminuição do ritmo de crescimento da população em Souselas, na última década do Séc. XIX está de acordo com o sucedido no Distrito de Coimbra. No Município de Coimbra, o conjunto de freguesias composto por S. António dos Olivais, S. Martinho do Bispo, Cernache, Almalaguês e Souselas, tem sido apontado como casos extremos de desenraizamento populacional, devido ao fluxo emigratório detectável entre 1865-1916, apontando-se como causas prováveis: «O declínio sensível do trabalho artesanal, em particular da actividade manufactureira do linho, o endividamento rural e a crise vitícola (1882-84) são alguns dos factores que favoreceram a emigração nas freguesias de Almalaguês e Souselas (…) Freguesia “exclusivamente vinhateira”, como referem os documentos, e sem grande dinamismo económico, Souselas não conseguiu “resistir” à invasão da filoxera. Na sequência dos seus danos, em 1883, a emigração intensifica-se fortemente»(305). No último quartel do Séc. XX, a vinha portuguesa foi duramente afectada, primeiro pelo oídio e, posteriormente, pela “philloxera vastatrix”. A filoxera estendeu-se progressivamente e no sentido N-S, a partir das vinhas do Alto Douro. Em Junho de 1880, foi detectada na cerca do Jardim Botânico de Coimbra e, no ano seguinte progride pela região, sendo oficialmente reconhecida nos concelhos de Coimbra, Miranda do Corvo e Arganil. Souselas seria a freguesia mais castigada: «O mapa da área filoxerada, realizado sob a direcção do agrónomo da Quinta Regional, instituição que centralizou a nível distrital a campanha contra esta moléstia, comprova esta disseminação. No concelho de Coimbra foi bastante atingida a freguesia, “exclusivamente vinhateira”, de Souselas. Seguiram-se-lhe, por ordem decrescente de áreas atingidas, a freguesia de Trouxemil e em menor incidência, Torre de Vilela e Santa Clara»(306). No conjunto, a moléstia atingiu 50,9 hectares do município, metade dos quais localizados em Souselas.

Irene Maria Vaquinhas – Violência, Justiça e Sociedade Rural: os campos de Coimbra, Montemor-o-Velho e Penacova de 1858 a 1918, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento, História, nº 11, Porto, 1995, P. 89 (306) Id. P. 203 (305)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

De uma forma geral podemos afirmar que a freguesia não foi muito fustigada pela emigração para outros países da Europa e Américas, pois quase sempre se encontrava localmente trabalho disponível. A emigração resume-se, efectivamente, a dois períodos fundamentais: o primeiro, dos inícios do Séc. XX até aos anos trinta, com destino ao Brasil e Argentina; e, um segundo, nas décadas de 60 e 70 do Séc. XX, para a Europa (França, Alemanha, Suíça e Luxemburgo) e, em menor escala, rumo aos estados Unidos da América. Mais recentemente, e fruto das dificuldades que o país atravessa, têm os habitantes procurado soluções laborais na Suíça e Angola. A relação entre a emigração e o número de habitantes por fogo não permite relacionar directamente os dois factos, designadamente que se possa falar de sobrepovoamento da Freguesia de Souselas no período 1864-1920. No entanto, podem definir-se dois períodos: o primeiro, que vai até 1890, com valores ligeiramente superiores à média do município – 1864 (Freguesia 3,9/ Município 3,9), 1878 (4,2/3,9), 1890 (4,0/3,9); e, o segundo, que vai até 1920, com valores inferiores à média municipal, indiciadores do peso da emigração – 1900 (3,7/3,9), 1911 (3,9/4,1), 1920 (3,8/4,0). A propósito de emigração para as nossas ex-colónias, apurámos os nomes de alguns habitantes da freguesia (24) , que decidiram rumar a outras paragens na busca de melhores condições de vida. A tabela seguinte enumera os emigrantes, suas origens, datas de partida e destinos:

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(307)

Lugar

Carrima Marmeleira Marmeleira Sargento-Mor Sargento-Mor Marmeleira Id. Id. Id. Id. Marmeleira Souselas ? ?

Idade

31 31 35 58 21 26 20 36 30 32 48 67 23 31

A.U.C. - Mapas de Emigração, 1891-1936, cx. 138

Nome Francisco Rama, casado António dos Santos Madeira, solt. António Fernandes, casado Manuel Fernandes (filho anterior), solt António da Silva João d’Almeida, casado Elias Francisco, casado Joaquim dos Santos Parente, casado Joaquim da Cunha Novo, casado José Ventura, solt. Joaquim Fernandes (da família Bicho) António Custódio João dos Santos António dos Santos Madeira Manuel Baptista Francisco Diniz José Diniz (irmão do anterior) Joaquim Francisco Joaquim Duarte Joaquim Borges Joaquim Maria Gonçalves António Netto Luis Nogueira Joaquim Fernandes

Freguesia Souselas Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Souselas Id. Souselas Souselas Souselas Id. Id. Id. Id. Botão Souselas Id. Id. Id.

Dia da Saída Fevereiro 1891 Id. Id. Id. Maio 1891 Setembro 1891 Outubro 1891 Id. Id. Id. 25/11/1896 Id. 26/03/1897 14/05/1897 11/08/1897 2/12/1897 Id. Id. Id. Id. 10/5/1898 20/07/1898 6/08/1898 09/09/1898

Vapor

Orissa Id. Santa Fé Carolina Lanfranc Moçambique Id. Id. Id. Id. Rei de Portugal Id Loanda Madoc

Tabela 8 - Emigração em Souselas, 1891-1899(307)

Real do Pacifico Id. Chargeurs Reunis Id. Red Cross Mala Real Portuguesa Id. Id. Id. Id. Mala Real Portuguesa Id. Empresa Nacional Messageries

Companhia

? ? S. Tomé ?

Destino

V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Freguesia de Souselas – um povo com História

No decénio de 1910-1920, a diminuição terá justificação no facto de o país ter atravessado nessa altura uma grave crise económica, a que se associou a perda de muitos homens mobilizados para a Guerra Mundial de 1914/1918 (a maioria em idade viril) e a pandemia de gripe pneumónica dos anos 1918/1919 – a este propósito dizem os mais antigos que não havia dia sem funeral! Em sentido inverso, e de grande crescimento, destaca-se o período de 1940 aos anos oitenta e que, grosso modo, corresponde ao desenvolvimento industrial da zona e do qual se não pode dissociar. De facto entre 1940 e 1981 a freguesia regista um ganho de população de 1288 habitantes! O que significa que a freguesia teve força demográfica suficiente para suportar uma conjuntura adversa trazida quer pela emigração para os países do Ocidente Europeu que se reconstruíam no pós-2ª Guerra Mundial, quer o êxodo das populações dos meios rurais para os centros industrializados ou em vias de industrialização. Nas primeiras duas décadas do séc. XX a freguesia dá mostras de crescimento demográfico: em 1900 apresenta 331 fogos para 1240 habitantes, em 1911 (353 fogos para 1390 habitantes) e, em 1920, um ligeiro decréscimo para 348 fogos equivalentes a 1336 habitantes(308). Números que escondem um grave problema da freguesia; o elevado índice de analfabetos, em 1900 cerca de 1095 habitantes não sabiam nem ler nem escrever (88% da população), em 1911 o número cifra-se nos 1147 (83%) e, em 1920, decresce a população pelo que o número de analfabetos reduz-se a 1034 (77%). São escassos os dados que permitem reconstituir os quantitativos animais. No entanto, sabemos pelo manifesto do gado bovino de 1916 que existiam na freguesia de Souselas cerca de 74 bois, número apenas superado pelas freguesias de Botão, Lamarosa, S. Martinho do Bispo, S. Silvestre e Trouxemil(309). Mas, neste início do século e, em termos profissionais, nada terá produzido tanto impacto como a existência de uma estação dos caminhos-de-ferro em Souselas; um importante factor de progresso não só em termos de comunicação, mas também ao nível das ocupações. De facto, e consultando os registos disponíveis para o período 1903-1920, é possível aferir do peso ocupacional da estação de Souselas, a qual atraía gente não só de Souselas mas de outras áreas do país para o desempenho de funções tais como «factor-agulheiro» «agulheiro», «chefe de estação» ou «telegrafista». Para um melhor esclarecimento analise-se a tabela que se segue:

José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1904-1919, Edição da Biblioteca Municipal de Coimbra, Coimbra, MCMLII, Pp. XVIII e XX. (309) Irene Maria Vaquinhas – Violência, Justiça e Sociedade Rural: os campos de Coimbra, Montemor-o-Velho e Penacova de 1858 a 1918, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento, História, nº 11, Porto, 1995, P. 151 (308)

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Dados extraídos do Livro de termos de juramento a empregados dos caminhos-de-ferro (1903-1920)

No entanto, e com base nos anuários comerciais, verificamos que uma grande parte da população da freguesia se mantinha ligada à exploração da terra e à pecuária, bases da economia doméstica. A tabela seguinte inventaria as principais ocupações profissionais da população de Souselas, e respectivos nomes, entre 1910 e 1960, e para intervalos de 10 anos.

Tabela 9 – Funções de alguns empregados dos caminhos-de-ferro na estação de Souselas, 1903-1920(310) Nome Função Data juramento Observações Eduardo Frederico dos Santos Aguiar Factor-agulheiro na estação de souselas 3 Junho 1904 Natural de Lisboa e residente em Souselas José Rodrigues Factor-agulheiro 4 Agosto 1904 Natural de Moinho d’Almoxarife e residente em Souselas Antonio Pereira Motta Factor-agulheiro da estação de Souselas 12 Setembro 1904 Natural de Sobreiros e residente em Souselas Antonio dos Santos Agulha Factor da estação de Taveiro 21 Outubro 1905 Natural de Souselas residente em Taveiro António da Encarnação Silva Chefe da estação de Souselas 26 Janeiro 1906 Natural de Ancião e residente em Souselas Antonio Jorge dos Santos Factor da estação de Souselas 29 Janeiro 1906 Natural e residente em Souselas Antonio Ferreira Agulheiro da estação de Souselas 6 Março 1906 Id. Tomaz d’Aquino Lima Factor da estação de Souselas 17 Maio 1908 Natural da Vermioza e residente em Souselas Adriano da Cunha e Silva Id. 21 Novembro 1908 Natural de Póvoa de Midões e residente em Souselas Manoel Pinto da Costa Agulheiro da estação de Souselas 11 Fevereiro 1909 Natural de Sinfães e reisdente em Souselas Natural de Belver (ou Belvez ou Relvez), José Frias Chefe do districto nº 55 26 Março 1909 conc. Abrantes e residente em Souselas José Vicente do Amaral Monteiro Chefe da estação de Souselas 24 Abril 1909 Natural da Marmeleira e residente em Souselas Basilio Rodrigues Pinto Factor da estação de Souselas 30 Abril 1909 Natural de Travasso e residente em ? Carlos Maria da Gama Factor da estação de Souselas 21 Maio 1910 Natural de coimbra e residente em Souselas Custodio José do Amaral Martins Telegrafista da estação de Souselas 8 Agosto 1910 Natural de Ovar e residente em Souselas João Jorge de Mattos Agulheiro da estação de Souselas 22 Dezembro 1911 Natural de Alfarelos e residente em Souselas Manuel Lopes Velho Factor da estação de Souselas 4 Maio 1918 Natural do Tramagal e residente em Souselas Antonio da Silva Agulheiro da estação Coimbra B 9 Dezembro 1919 Natural e residente em Souselas

V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 10 – Ocupações Profissionais em Souselas, 1910-1960(311) 1910 Ocupações Nomes Proprietários e António Pinto Machado, Francisco dos Santos Madeira, José Augusto lavradores principais Dias Pereira e José Moraes Farmacêutico José Antunes de Sousa 1920 Ocupações Nomes Alfredo Augusto dos Santos, António Mendes Júnior, Francisco dos Proprietários e Santos Madeira, Joaquim Calhôa, José de Aguiar, José Ferreira Júnior, lavradores principais José Moraes e Manoel Bento Pacheco Farmaceuticos José A. Dias Pereira, José Antunes de Sousa e António Mendes Júnior A Mundial de José Antunes de Sousa e a Atlântica de António Mendes Agência de Seguros Júnior 1930 Ocupações Nomes Adelaide de Sousa Leitão, Alfredo Augusto dos Santos, António Mendes Júnior, Joaquim Prior d’Almeida, José Antunes de Sousa, José Proprietários e Ferreira Júnior, José Moraes de Sousa, Manoel Bento Pacheco, Maria lavradores principais Agulha de Carvalho, Maria Luiza Nazareth Themudo, Maria do Ó Santiago de Carvalho (Quinta de Lagares) e Dr. Mário dos Santos Adriano Júlio (Marmeleira), Joaquim Ferreira (Souselas), José Ferreira Comerciantes Júnior (Souselas) e Manoel Bento Pacheco (Souselas) Ferradores Francisco Jorge dos Santos e Lino Jorge dos Santos Farmaceuticos José Augusto Dias Pereira e José Antunes de Sousa Médico Dr. António Branquinho e Dr. Joaquim de Sousa Machado 1940 Ocupações Nomes Adelaide de Sousa Leitão, Adelino Lopes Viana (S. Martinho do Pinheiro), Alfredo Augusto dos Santos, José Antunes de Sousa, José Proprietários e Calhoa (Sargento-Mor), José Ferreira Júnior, José Morais de Sousa lavradores principais (Sargento Mor), José Simões Neves (Zouparria), Júlio dos Santos Madeira, Maria Luiza Nazareth Themudo, Maria do Ó Santiago de Carvalho (Quinta de Lagares) e Dr. Mário dos Santos Adriano Júlio (Marmeleira), António Ferreira (Sargento Mor), Armando Marques Moreira, Augusto de Albuquerque (Santa Luzia), Mercearias Joaquim Deniz (Marmeleira), Joaquim Ferreira, José Calhoa (Santa Luzia), José Rodrigues, José Simões Serra (Marmeleira), Júlio Cavaco (Santa Luzia) e Manuel Gaudêncio Negociantes de António Garcia (Marmeleira), José Maria (Sargento-Mor), Manuel peixe fresco Rodrigues Júnior (Zouparria) Negociantes de António S. Serra (Marmeleira), Joaquim Paiva Neves & Irmãos madeiras (Sargento Mor) Padaria José de Sousa Calisto Apicultor Joaquim Carlos Ferreira Ferrador Francisco Jorge dos Santos Lagar de Azeite Maria da Assunção Leitão Pacheco Farmaceutico José Antunes de Sousa e Farmácia Hebel

Anuários Comerciais de Portugal, 1910-1961. Neste registo não colocámos as ocupações públicas (relativas por exemplo às funções como vogais na junta de freguesia) nem as industriais, optando por utilizá-las no capítulo relativo à industrialização de Souselas

(311)

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V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

Ocupações Proprietários

Mercearias

Peixe fresco (negociantes) Médicos Lagares de azeite Rep. de bicicletas Casa de pasto Padaria Ferrador Apicultor Ocupações

Proprietários

Mercearias Peixe fresco (negociantes): Padarias Reparação de bicicletas Alfaiates Médicos Barbeiros Negociantes de madeiras Casa de pasto Café Lagares de azeite Mobílias Talho Ferrador Apicultor Farmacêutica

1950

Nomes Adelaide de Sousa Leitão, Adelino Lopes Viana (S. Martinho do Pinheiro), Alfredo Augusto dos Santos, Francisco Natividade da Cunha Ramalho (Marmeleira), Francisco de Sousa Lucas (Marmeleira), José Simões Calhôa (Sargento-Mor), José Simões Neves (Zouparria), Maria de Sousa Parente (Marmeleira), Dr. Mário dos Santos Adelaide de Sousa Leitão, Adelino Lopes Viana (S. Martinho do Pinheiro), Alfredo Augusto dos Santos, Francisco Natividade da Cunha Ramalho (Marmeleira), Francisco de Sousa Lucas (Marmeleira), José Simões Calhôa (Sargento-Mor), José Simões Neves (Zouparria), Maria de Sousa Parente (Marmeleira), Dr. Mário dos Santos António Garcia (Marmeleira), Felisbela da Conceição, Jesus Valentim (Sargento-Mor); José Maria Ferreira (Sargento-Mor); Júlio de Sousa (Sargento-Mor); Manuel Rodrigues Júnior (Zouparria) Dr. Gonçalo Manuel dos Reis Torgal; Dr. Opílio Gomes Alberto Correia; Maria Cândida Rodrigues Pacheco Alfredo Dias Coelho; Joaquim dos Santos Madeira (Sargento-Mor) Manuel Gaudêncio Mário Baptista Francisco Jorge dos Santos Joaquim Carlos Fernandes 1960 Nomes Abel Maia Costa, Adelino Lopes Viana (S. Martinho Pinheiro), Dr. Alberto Dias Pereira, Alfredo Augusto dos Santos, António Rodrigues, Custódio Morais, Eng.º Custódio Nazaré, Evaristo Pacheco Rodrigues, Francisco Jorge Santos, Francisco Natividade da Cunha Ramalho (Marmeleira), Francisco de Sousa Lucas (Marmeleira), Joaquim Carlos Ferreira, Joaquim Leite, José S. Santos, José Jacinto Maria, Manuel Lopes, Maria de Sousa Parente (Marmeleira) e Dr. Mário dos Santos Adelino de Sousa Lucas (Marmeleira), Adriano Júlio (Marmeleira); Alberto dos Santos Madeira (Zouparria), Altamiro de Jesus, Francisco Silva, António Ferreira (Sargento-Mor), Augusto de Albuquerque (Santa Luzia), João Pereira de Almeida Júnior, Preciosa de Jesus Cunha (Sargento-Mor), Manuel Gaudêncio e José de Sousa Calisto António Garcia (Marmeleira), Felisbela da Conceição, Jesus Valentim (Sargento-Mor) e Júlio de Sousa (Sargento-Mor) Elias de Almeida & Irmão (Marmeleira), Francisco da Costa Ferreira (Sargento-Mor) e José de Sousa Calisto Alfredo Dias Coelho, Joaquim dos Santos Madeira (Sargento-Mor) e Alberto dos Santos Madeira Amadeu Abreu, José Augusto Campos e Manuel Veiga da Ponte Dr. Gonçalo Manuel dos Reis Torgal, Dr. Opílio Gomes e Dr. António Manuel Alves Martins Fausto dos Santos Rodrigues e Serafim Cação Joaquim Paiva Neves & Irmãos (Sargento – Mor, negociantes de); M.D.M. Falconer Ld.ª (Santa Luzia) e Manuel da Costa Gomes (Marmeleira) Manuel Gaudêncio e João Pereira de Almeida Júnior Augusto Geraldes Rendilho Evaristo Pacheco Rodrigues Aníbal Correia Hilário Pereira Raimundo Francisco Jorge dos Santos Joaquim Carlos Fernandes Maria Isabel Castilho M. dos Santos

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Este registo ocupacional de Souselas, relativo a grande parte do séc. XX demonstra, a nosso ver, o efeito que o progresso e desenvolvimento podem trazer a comunidades de base rural. De facto, e ao entrar no séc. XX a freguesia apresentava-se, fundamentalmente, baseada no cultivo da terra. Contudo, a fixação industrial aliada à ferrovia, dinamizaria, comercialmente e, em especial, o lugar de Souselas. Por outro lado, e noutra área da freguesia (Sargento Mor e Santa Luzia) também o comércio sairia beneficiado, desta feita devido ao desenvolvimento trazido pela principal via rodoviária nacional. Porém, e até 1930, os dados apresentados acentuam o peso da terra na economia local: em 1910 existiam 4 grandes proprietários (António Pinto Machado, Francisco dos Santos Madeira, José Augusto Dias Pereira e José Moraes), número que subiria para 8 em 1920. Neste período, destacavam-se duas ocupações: os farmacêuticos José Antunes de Sousa (em funcionamento pelo menos desde 1907), José A. Dias Pereira e António Mendes Júnior; e as agências de seguros A Mundial, de José Antunes de Sousa e a Atlântica de António Mendes Júnior, cujos proprietários em ambos os casos acumulavam a função com a de farmacêuticos. Como dissemos, o ano de 1930 opera significativa mudança em termos ocupacionais. Se é verdade que aumentou o número de proprietários (para 12, incluindo 4 mulheres), começa a emergir, paralelamente à dependência da terra, a actividade comercial: 4 indivíduos são identificados como comerciantes (3 em Souselas e 1 na Marmeleira), embora não particularizem a sua actividade. Por outro lado, a diversificação ocupacional é traduzida no aparecimento do ferrador (Francisco Jorge dos Santos e Lino Jorge dos Santos) e na importância dos médicos (Dr. António Branquinho e Dr. Joaquim de Sousa Machado). A partir de 1940, acentua-se a área comercial e de serviços oferecidos na freguesia, sendo de destacar o peso das mercearias; 11, três das quais na Marmeleira e outras tantas em Santa Luzia. No mesmo sentido, outras ocupações começam a definir-se: surgem os negociantes de peixe fresco (3), os negociantes de madeiras, mas também o padeiro, o apicultor, ou o ferrador. O peso do comércio mantém-se durante os anos seguintes: em 1950 existiam tantos merceeiros como proprietários (9), sendo também de realçar o crescimento dos negociantes de peixe (6). E surgem novas profissões como o caso dos reparadores de bicicletas. Contudo, estes anos marcam ainda o início da afirmação do sector da restauração, com o aparecimento da 1ª casa de pasto, de Manuel Gaudêncio. Por factores diversos, entre os quais as políticas de fomento à agricultura ou a fragmentação da propriedade, a actividade lavrador/proprietário assumiria até aos anos 70 um papel cada vez mais relevante. Na verdade, e chegados a 1960, o número de grandes proprietários cresce de forma acentuada (18), enquanto o peso do sector comercial se acentua, tanto em termos de diversificação da 254

V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

oferta como no número de indivíduos: mantem-se o total de mercearias (11), e assinalam-se ocupações como alfaiate ou barbeiro. Nos anos seguintes, e pelos dados disponíveis, o sector que mais se desenvolveu foi o da restauração: em 1967, existiam os cafés de Altamiro de Jesus (S. Martinho), José da Costa Sousa Calisto (Café Briosa, Souselas), Mário Coelho da Rocha (Café Central, Souselas) e José Ventura Lopes Fazenda (Marmeleira). Quanto a casas de pasto assinalam-se as de Assunção Moreira, Cipriano Ferreira Gomes, Francisco Silva, João Pereira de Almeida Júnior, Manuel Gaudêncio e ainda um restaurante em Santa Luzia. O crescimento da população em Souselas, nos finais da década de 60, repercutia-se na actividade administrativa da junta de freguesia, que registava «…passagem de atestados, que todos os anos e neste mês, vai a alguma centenas, mas este ano em número nunca atingido, sinal de substancial aumento da sua população»(312). No princípio dos anos 80, a freguesia contabilizava 3051 habitantes, prevendo-se um aumento de 10% nos próximos 5 anos – uma expectativa da JF comunicada aos C.T.T. em Setembro de 1981. Mantinha-se a tendência de crescimento demográfico suportado, em parte, pelo regresso de muitos cidadãos vindos das ex-colónias, designados por “retornados”, que facilmente se integraram na comunidade, sendo a força de trabalho absorvida pelas fábricas da região. Na altura, a zona industrial compunha-se por 7 fábricas em laboração, além de uma adega cooperativa. Os estabelecimentos comerciais existentes na freguesia estimavam-se em 30, incluindo 3 restaurantes, 7 cafés e 1 padaria(313). Os anos 90 trouxeram a diversificação de comércio e serviços na freguesia. Segundo o Inventário Municipal de 1994 (INE – Direcção Regional do Centro) podia encontrar-se no comércio os seguintes produtos ou serviços: pão, carne, charcutaria, peixe, flores, fruta, vestuário, calçado, gás, livros escolares, papelaria, móveis, adubos e sementes, materiais de construção, fotografia, jornais e tabaco. Quanto aos «serviços e comércios não alimentares a retalho» contabilizavam-se; 2 cabeleireiros, 5 vestuário, 1 loja de calçado, 1 loja de móveis, 2 livrarias/ papelarias, 1 florista, 1 loja de fotografia, 1 stand automóvel, 1 clube de vídeo, 5 postos de abastecimento de gás, 1 loja de abastecimento agrícola. Dados complementados com a categoria «outros comércios» que consistia em 9 estabelecimentos de bebidas e 4 restaurantes.

(312) (313)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 29/10/1969. A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta).

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A freguesia dispunha ainda de outros equipamentos importantes tais como; 1 farmácia, 1 consultório médico generalista, 1 extensão do centro saúde, 1 centro de dia, 6 associações desportivas, 1 centro de apoio à juventude e 1 escola de música dança e outras artes, 1 grupo folclórico, 1 pensão(314). De 1991 para 2001 a freguesia perdeu 13 habitantes e, de 2001 para 2011, perdeu 54, números que se explicam pelas dificuldades impostas pelo P.D.M. à construção de habitações. Tal facto levou a que alguma população, essencialmente jovem, procurasse outras áreas em redor da freguesia, onde os preços dos terrenos e da construção eram mais compatíveis com as suas possibilidades. Apesar desta estagnação, neste período assistiu-se à imigração, tornada possível após a queda do muro de Berlim, de vários cidadãos oriundos dos Países da Europa de Leste, tais como Ucrânia, Rússia, Bielo-Rússia e Moldávia – força de trabalho que foi absorvida, essencialmente, pela indústria da construção civil. Os 3092 habitantes da Freguesia de Souselas, de acordo com o Censos 2011, correspondem a 1115 familias. Estas, ocupam cerca de 1414 alojamentos, 900 casas próprias e 142 casas arrendadas. Cerca de 1265 pessoas estão empregadas, enquanto 784 são reformados.

(314)

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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V – Demografia, Artes, Ofícios e Ocupação Profissional

SOUSELAS E AS MIGRAÇÕES INTERNAS A localização geográfica da freguesia, a sua centralidade e proximidade aos principais eixos rodoviários e ferroviários do País, uma agricultura desenvolvida e forte, nomeadamente no passado, mas ainda com expressão no presente, e uma industrialização precoce, quando comparada com o resto do concelho de Coimbra e região, levou a que a freguesia recebesse gentes de Norte a Sul, que procuravam melhores condições de vida. Muitas pessoas vinham para Souselas, procurando os trabalhos sazonais na agricultura, como era o caso das gentes de Penacova, nomeadamente de Lorvão e S. Mamede, que chegavam em Setembro e partiam para as suas terras em Dezembro, pelo Natal. Vinham para as colheitas, para a vindima e todos os trabalhos associados (apanha das uvas, lavagem dos tanques, balseiros, pipas e tonéis, repiso, enchimento das vasilhas e acompanhamento da fermentação e feitura da aguardente), e para a apanha da azeitona, limpeza e salga da mesma até ao lagar e feitura do azeite. Aqui, mandava a tradição, assavam-se batatas e bacalhau na fornalha da caldeira do lagar, regadas com azeite novo. Pelo meio, limpavam-se os cereais nas eiras, nomeadamente o milho. Muitos destes trabalhadores acabariam por ficar para sempre em Souselas (uma grande parte pela via matrimonial), designadamente, os vindos de Lorvão. Do Sul do país chegavam, também, os “bordas-de-água”, para limparem e prepararem as oliveiras, pois eram mestres nessa arte. Das terras mais próximas vieram para a Freguesia, nomeadamente para Souselas e Marmeleira, muitas pessoas para trabalharem nas casas abastadas, como criadas e moços, para tarefas domésticas e acompanhamento do gado. Do Alentejo chegaram famílias inteiras para trabalhar na fábrica Mármores Batanete (1968-2008). Esta fábrica viria a ter uma grande importância económica e social no contexto da freguesia. Tratavam-se de famílias que vinham das zonas das pedreiras de extração de mármore, como Estremoz, Vila Viçosa e Borba, e que acabaram por se radicar, com as respectivas famílias, em Souselas. Também do Norte do País, Douro, Minho e Trás-os-Montes, chegaram pessoas para trabalharem nas fábricas de Cortiça, Cal, Cerâmica, Siaf (mais tarde Somit-Aglomerados de Madeira) e, por fim, para a construção da fábrica de Cimento Cinorte (hoje Cimpor). O Caminho-de-ferro foi outro factor que originou a vinda de gentes para Souselas. Provenientes da Beira Baixa, Ribatejo, Beira Alta e do Norte, muitos em regime de destacamento, aqui se radicavam, pois era necessário ocupar os lugares de chefes de estação, factores, carregadores, guardas de passagem de nível, chefes de distrito, trabalhadores da via.O caminho-de-ferro, também foi importante para os locais, onde trabalhavam famílias inteiras. Diga-se em abono de verdade, que a Freguesia de Souselas e as suas gentes sempre souberam receber quem de novo chegava, e que não existem registos de algum problema de integração. 257

VI EVOLUÇÃO SOCIAL E MATERIAL DA FREGUESIA DE SOUSELAS (PROGRESSOS E RETROCESSOS)

O

Introdução s tombos setecentistas dão-nos uma primeira ideia da evolução material e social da freguesia. Como ponto de chegada de progressos e retrocessos acontecidos anteriormente, fornecem-nos uma visão de conjunto para um dado momento – o século XVIII. De facto, a partir daqueles registos procedemos a um levantamento dos espaços e estruturas públicas na área da freguesia de Souselas, identificáveis pelo tipo e pela localização. Um conjunto de obras fundamentais num mundo essencialmente rural: • Ao nível das pontes: Ponte Pedrinha, Ponte da Azenha, Ponte do Murto, Ponte do Remungão (fotos 44 e 45), Ponte de Frades, Ponte do Ribeiro, Ponte dos Clérigos e Ponte de Carrimá. • Fontes e poços: Fonte da Azenha, Fonte Nova, Fonte do Sapo (na Marmeleira) e Poso Redondo. • Açudes e presas: de Rugoyga, do «Remungam» e do Ribeiro. • Regueiras: da Amoreira, da Ponte, de Saias, da Junqueira, da Ponte, «de Agoamá», do Carneiro, Vale de Giraldo, do Ribeiro, da Pedrulha, da Pedrinha (estas duas localizada na área da Marmeleira) e «dagoa» (na área de Carrimá). • Barrocas: da Pilveira, do Moinho, do Juncal e do Carneiro. • Portos: da Zouparria, de Porto Seco, do Clerigo, do Barreiro, do «Simo», da Cruz, do Castelhano e da Pedrulha (ambos na zona da Marmeleira). Neste levantamento assume especial destaque o número de portos existentes, o que aponta a uma vida comercial intensa, aproveitando as várias linhas de água que atravessam a freguesia. Estruturas que durante anos foram objecto da maior atenção por parte da população, e das autoridades locais e regionais, que as preservavam a todo o custo dado o papel transversal e essencial que desempenhavam; fosse ao nível da comunicação e transporte entre os povos (caso das pontes e portos), ou ao nível do abastecimento de água para consumo ou irrigação dos campos (regueiras, barrocas, fontes, açudes ou presas). Construídas de forma rudimentar, na sua maior parte, estas estruturas sobreviveram a convulsões importantes como a extinção concelhia, implantação da República e ascensão do Estado Novo. Exemplar é o caso das fontes, que até 261

Freguesia de Souselas – um povo com História

há bem pouco tempo mantinham papel fundamental na vida da freguesia. De facto, em Souselas como em tantos outros locais do município, os esforços de modernização da vida social e material trazidos pela revolução industrial e pelos fomentos e planos de ajuda ao mundo rural, demoraram o seu tempo a chegar. Com a modernização da vida material e social local, visível logo nas primeiras décadas do séc. XX, muitas destas estruturas desapareceram ou passaram a desempenhar outras funções.

A. Da extinção concelhia aos finais do Estado Novo 1. A polémica e antiga questão dos baldios Nos tombos setecentistas encontramos algumas referências aos espaços comuns, aos baldios que nesta freguesia existem em grande quantidade. Ao longo dos tempos, sempre que os direitos sobre os mesmos eram postos em causa por interesse particular, a voz pública levantava-se. E disso colhemos imensa informação. A 28 de Dezembro de 1870, os habitantes de Souselas protestam junto da Câmara Municipal contra o aforamento de um baldio necessário para logradouro comum, localizado em S. Martinho do Pinheiro: «Um abaixo assignado doz habitantes de S. Martinho do Pinheiro, do Sargento-Mor, da Zouparria do Monte, e de Carrimá, todos da freguezia de Souzellas, prevenindo a Camara contra o aforamento d’um baldio, existente no lugar de São Martinho, por ser necessário ao goso publico, e pedindo que em virtude do Decreto de 25 de Novembro de 1869, se deve informar o Governo de Sua Magestade que tal logradouro é indispensável». Responderá o município que «Não consta que alguem tenha requerido o aforamento d’este logradouro, e em tempo competente será attendida a pretenção dos supplicantez e tomada na devida consideração»(315). Alguns anos depois, volta a suceder algo semelhante, desta vez noutro lugar da freguesia, onde o município deliberou em Fevereiro de 1877 «… vistoriar um terreno público na iminência de ser usurpado, em Marmeleira do Botão»(316). Em consequência, e não raras vezes, detectamos ordens municipais intimando a entrega ao uso público de determinado terreno usurpado. Uma das mais inesperadas polémicas acerca deste tema, ocorre no Verão de 1890 e envolve directamente um membro da junta e a construção da escola. Tudo

A.H.M.C. - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra, 1870-1873, Nº 91, Fls. 58v.-59 José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1870-1889, Biblioteca Municipal de Coimbra, 1937, P. 86

(315)

(316)

262

VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

começa com uma denúncia que leva a que os elementos da junta de paróquia se desloquem, a 13 de Julho, ao «sitio de Val Escuro lemite do lugar da Marmeleira ezaminar se era ou não verdade o ter alguem cortado pinheiros em terreno parochial»(317). Avaliada a situação no local, o tema é retomado na sessão seguinte. Afinal o próprio presidente da paróquia havia dado ordem para cortar os pinheiros, não do baldio mas no pinhal que comprara recentemente naquele sítio. Mais declarou o presidente a razão para o sucedido «… e mandando cortar os pinheiros comprados por travalhadores que desconheçião a demarcação estes por engano cortarão alguns em terreno da parochia»(318) E aquilo que poderia ser um grave problema foi resolvido de forma pacífica: «Em vista do que a junta delivrou que, sendo neceçario cortar alguns pinheiros da parochia para enchimento dos enchameis da caza da Escola, o Prezidente os dese seus…». Os terrenos baldios, com uma economia tradicionalmente baseada na terra, constituíam uma atracção para particulares. Os pedidos, embora feitos ao município, careciam da informação decisiva da junta paroquial. Solicitações que nem sempre eram atendidas do mesmo modo, devido à importância específica da matéria em causa. É bem exemplo, a avaliação e deliberação díspare, feita a dois pedidos no dia 18 de Janeiro de 1891: primeiro, a junta responde afirmativamente sobre a venda de «…uma porção de terreno baldio no sitio denominado val de ovelhas proximo a povoação da Marmeleira»; mas, no mesmo dia e sessão, e na resposta a outro pedido para venda de 50 m2 de baldio contíguo às casas de Marcelino Vieira, de Sargento-Mor, responde negativamente porque «…souberão que este terreno éra o principal e talvez unico logradouro de todo o povo do Sargento-Mor»(319). A importância económica dos baldios estendia-se ao aproveitamento florestal nos casos em que tal fosse possível. Por essa razão a junta de paróquia colocava em praça, para entrega ao maior lanço oferecido, os matos dos mesmos. Um dos primeiros casos conhecido foi o de Jose Nogueira, da Marmeleira, que o arrematou em Fevereiro de 1891 e se obrigou a tirar o mato no prazo de 6 meses. Em 1939, o Ministério da Agricultura através da Junta de Colonização Interna publicou o resultado do reconhecimento nacional dos baldios existentes no Continente. Nesse trabalho, na parte relativa ao Distrito e Concelho de Coimbra, surgem elencados os diversos baldios existentes ao nível das freguesias. Souselas surge com 11 baldios identificados e reconhecidos na sua área, quase todos económico-socialmente classificados como úteis (excepto o da Soalheira), e na maioria localizados em solos argilo-arenosos, datados geologicamente do

(317) (318) (319)

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 13/7/1890 In Cx. 322 Id. Acta de 10/8/1890 In Cx. 322 Id. Acta de 18/1/1891 In Cx. 323

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Jurássico, e não tendo disponibilidade de água. Quanto aos direitos que recaiam sobre o aproveitamento dos mesmos, registe-se que do conjunto identificado, 3 baldios pertenciam à paróquia, 7 ao Município e, apenas num, existiam dúvidas quanto à propriedade do corpo administrativo(320). Assim, os 3 baldios pertencentes à paróquia eram os seguintes: • Colmeal: com 0,4 hectares, situava-se junto à estrada Souselas-Botão, era logradouro comum, estando inculto e sendo em parte eira pública, todo ele representava área social; • Alagoa: tinha 0,2 ha, tudo área social, com logradouro comum e não tinha vias de comunicação que lhe dessem acesso. Inculto, tinha parte relvado e servia de «estendedouro de roupas»; • Vale Pardinho: com 1,5 ha, era o maior baldio, também um logradouro comum sem vias de comunicação e sem área social, estando aproveitado com Mato. Os 7 baldios classificados como dependentes do Município foram: • Trás da Ladeira: 0,5 ha, logradouro comum, sem vias de comunicação, inculto, e localizado no lugar do Rossio. Tudo área florestal; • Poços: pequeno baldio com 0,04 ha, com características idênticas ao anterior e localizado na mesma zona; • Soalheira: outro pequeno baldio com 0,02 ha, destacava-se não só por ser o único classificado como “indispensável”, mas também pela disponibilidade de água dado que possuía uma “fonte publica”. Era, também, um logradouro comum, sem vias de comunicação, inculto, sem aproveitamento florestal e inteiramente enquadrado em área social; • Cabecinho da Rosa: com 0,1 ha, com logradouro comum, sem vias de comunicação, inculto e na totalidade área florestal; • Detrás da Cadeira: era o segundo maior dos baldios, com 1 ha. de extensão, tinha as mesmas características do anterior; • Lugar do Marmeleiro: um dos mais pequenos baldios, com 0,018 ha, tinha as mesmas características do anterior, excepto o facto de estar dividido em 2 parcelas; • Estrada do Carril: o mais pequeno dos baldios, com 0,016 ha., com as mesmas características do antecedente, constituindo uma parcela apenas. O único baldio onde não foi possível apurar a que corpo administrativo pertencia – se à Paróquia, se ao Município - foi o de S. Martinho do Pinheiro. Tinha 0,12 ha, abundância de água dado possuir uma fonte pública, estava inculto, e todo ele representava área social.

Ministério da Agricultura/Junta de Colonização Interna – Reconhecimento dos Baldios do Continente, Vol. II, Parte I, 1939, Pp. 888-889.

(320)

264

VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Os baldios de Souselas mantiveram-se no topo das preocupações das autoridades nos anos seguintes. De facto, entre 1943-1945, ocorreu uma interessante questão, relativa ao baldio onde se construíra a capela de Nossa Senhora da Nazaré, em S. Martinho do Pinheiro (vide capítulo Património). Nesse processo, consta uma relação dos baldios existentes na freguesia que a Junta de Colonização Interna (então dependente do Ministério da Economia) remeteu à Câmara Municipal de Coimbra, a 15 de Dezembro de 1943 (dados constantes de um relatório de reconhecimento e recolhidos por um técnico da dita junta em 1940, fornecidos pelo Presidente da Junta de Freguesia). A estes baldios se adicionaram, no decorrer do processo, mais alguns não identificados naquele primeiro trabalho. Assim, existiam na freguesia em 1943, mais 6 baldios dos que os arrolados no reconhecimento nacional dos baldios, publicado em 1939. Vejamos as características de cada um deles na tabela seguinte: Tabela 11 – Baldios existentes na Freguesia de Souselas em 1943(321) Baldio Descrição Situado a 300 mt para Sudoeste de S. Martinho do Pinheiro, 0,03 ha. ALAGOA «…fica junto a um ribeiro está enlameirado, serve para estender roupa, e pela função que desempenha, deve considerar-se área social» Pequeno tracto de terra, 1Km a Norte da Marmeleira, 0,004 ha «… COLMEAL ao lado dum caminho e aproveitado como coradouro. Área Social Começa a 200 m para Este da Estrada Nacional Coimbra-Porto, «…próximo da povoação da Carqueja (500 mt. para Sul) e vai até ao local denominado “Valas”». Comprimento de 600 mt e largura média 25 mt; área de 1,5 ha. «Está regularmente povoado de pinheiVALE PARDIEIRA ros de várias idades (…) pertence à Junta de Freguesia pois é ela que o administra: vende o mato, não deixa ninguém cortar pinheiros e cedeu, dêste pinhal, os postes, quando da electrificação da freguesia. Dá bom mato de tojo, erva, carqueja, fetos e algumas urzes» S. MARTINHO DO Pequeno, tem 0,012 ha. Ligado ao baldio «Alagoa», «…tem fonte, PINHEIRO e pela funcção que desempenha é área social» Situado a 1,5 Km para Noroeste da Marmeleira «…é formado por faixa estreita e comprida que se estende desde a capela das Almas, no alto “Traz da Ladeira”, e vai ao longo dum caminho, até ao sítio denominado “Covas de Bernardo Loiro”», Largura variável não superior a 40mt nem inferior a 10mt, cerca de 2,5 ha. «Está revesTRAZ DA LADEIRA tido de pinheiros, mas o povo tem feito, nos últimos anos, bastante estrago, não só cortando e levando para seu gasto uns, como ainda inutilizando outros. O terreno é fraco, areento, com bastante calhau e, nalguns sítios, barrento. O caminho que o atravessa em todo o comprimento chega a ter proporções enormes (mais de 8 a 10 metros). A Junta de Freguesia costuma vender o mato de 4 em 4 anos»

(321)

A.H.M.C. – Dados extraídos de Diversos Maço III, Doc. Nº 13

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Baldio POÇOS SOALHEIRA CABECINHO DA ROSA

Descrição Fica na povoação da Marmeleira, para Este; 0,04 ha. Atravessado por caminho, «…parte enlameirado, serve de coradouro e possui ao lado fonte e lavadouro pelo que se deve considerar área social» A 200 mt para Oeste de SM Pinheiro, 0,3 ha. Idêntico ao baldio «Traz da Ladeira» A 200 m do anterior, mais para Oeste. 0,25 ha., idêntico ao anterior

Com este nome não se identificou nenhum baldio «…mas como encontramos outros além dos mencionados no Relatório de Reconhecimento, talvez seja algum dêsses» «Devem ser dois pequeníssimos recantos entre casas que existem na Lugar da Marmeleira povoação da Marmeleira», 0,018 ha. Área Social «Pequeno tracto ao longo da estrada que vai de Marmeleira para ESTRADA DO o local onde a Emprêsa Cerâmica de Coimbra tira barro». Tem CARRIL 0,016 ha. «pode alienar-se» Situado a 500 mt para Noroeste da povoação da Marmeleira «…e junto à estrada, é paroquial, como todos os da freguesia». 0,05 ha. «Do Cretácico, com calhau rolado … atravessado por um caminho e limitado pela estrada, outro caminho e um barranco. Povoado MATINHOS de mato e alguns pinheiros novos. Administrado pela Junta de Freguesia; vende o mato de 3 em 3 anos. Por ser dispensável ao povo e de reduzida área deve alienar-se. Não o alienando, a Junta registá-lo-á como sua propriedade» Situado a 1,5 Km de Marmeleira, para Norte e junto a uma estrada. Paroquial, com 0,035 Ha. Terreno Cretácico «…plano e junto a um riGOIVO beiro enlameirado. Serve de corádouro. Necessário ao povo. Logradouro comum. Pela função que desempenha deve considerar-se área social» A 2,5 Km para Noroeste do lugar de Marmeleira, paroquial, 0,4 ha. Cretácico, calhau rolado «Cabeço seguindo a lomba do monte. Mato CABEÇO e coberto de pinheiros. Dispensável. Administrado pela Junta; de 4 MINHOTO em 4 anos vende o mato; o povo não tem cortado pinheiros neste baldio. Por ser pequeno e dispensável ao povo deve alienar-se» A 500 m do anterior, mais para Noroeste, no sítio com o mesmo VALEIROS nome, «…próximo do local denominado Vale Mós». Paroquial, 0,05 ha. Identico ao anterior» «Situado a 3 Km para Oeste da povoação de Marmeleira, paroquial, COVAS DE BERNARDO LOIRO 0,6 ha. Idêntico ao anterior» a 1,5 Km para Oeste da Marmeleira, Paroquial, 0,035 Há. Idêntico BALSA ao anterior. «Localiza-se ao longo de uma serventia e não tem pinheiros grandes» DETRAS DA LADEIRA

Em Novembro de 1960, José Leopoldino dos Santos em artigo publicado na imprensa, referia a necessidade dos baldios serem delimitados e arborizados: «Delimitados que sejam os baldios outro problema se impõe resolver – a sua arborização – medida que, se tivesse sido tomada há vinte ou trinta anos se colocaria, hoje em situação privilegiada»(322).

(322)

«O problema dos baldios em Marmeleira do Botão» In Diário de Coimbra, 14/11/1960, P. 5

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Ainda nesta década, o baldio junto da estrada de S. Martinho do Pinheiro tornou-se especialmente apetecível. Em Novembro de 1967 e com a colaboração técnica do Engº Coelho da Silva, da C.M.C., aferiu-se a qualidade do saibro do baldio que foi classificado como «muito bom». A partir de então tornou-se uma fonte valiosa de matéria-prima para a construção de estradas. Pelos finais da década de 60, alguns baldios sob administração da junta estariam sobre explorados. De facto, se o orçamento para 1970 já o fazia prever, ao contemplar uma verba para a «Arborização dos Baldios», mais esclarecedora é a deliberação da junta de 31 de Janeiro de 1970, solicitando ao Presidente do Conselho de Administração dos S.M.C. a cedência de camioneta «…para se deslocar a Portalegre, para condução de 5.000 eucaliptos com tórrão, em sacos de plastico, à nossa disposição nos viveiros dos Serviços Florestais e se destinam á arborização dos Baldios da Junta». Eucaliptos que se plantaram nos princípios de Fevereiro. Pelo Decreto-Lei nº 39/76, de 19 de Janeiro, os baldios foram devolvidos às comunidades. Já em tempos de liberdade colhemos a notícia de um conflito acerca de um logradouro da freguesia. Trata-se do logradouro do povo onde em 1943 se construíra o lavadouro e que no Verão de 1981 foi ocupado por um particular motivando a intervenção da C.M.C. através de envio do processo para o Advogado Síndico. Porém, no Verão de 1982 a junta andava muito apreensiva com o assunto, receando em ofício enviado à municipalidade, uma «manifestação de força» da população. A partir de 1990 inicia-se. na Marmeleira. o processo para a eleição da Mesa da Assembleia do Conselho Directivo dos Baldios, concluído a 12 de Setembro de 1993, na sede do Centro Social da Marmeleira, onde decorreu a 1.ª Assembleia de Compartes dos Baldios da Marmeleira, com a eleição dos corpos gerentes: para presidente da Mesa da Assembleia, Orlando Alves, presidente do Conselho Directivo, José Martins Figueiredo e presidente da Comissão Fiscalizadora António Pardal Batista. Mais tarde seria constituído o BALMAR- Conselho Directivo dos Baldios da Marmeleira, que é associada da Selbaldio – Secretariado de Baldios do distrito de Coimbra. A 15 de Outubro de 1994, na sede do Centro Cultural de S. Martinho do Pinheiro decorreu a primeira Assembleia de Comportes dos Baldios de S Martinho do Pinheiro, com eleição dos corpos gerentes: presidente da Mesa da Assembleia de Compartes, Fernando Lopes Madeira, presidente do Conselho Directivo, Manuel de Sousa e presidente da Comissão Fiscalizadora, Ramiro da Costa Dias Simões.

2. A luta do povo pelos cemitérios: das motivações à realidade A documentação do Governo Civil de Coimbra, fiscalizando a situação dos cemitérios do concelho, não deixa dúvidas quanto ao que durante anos, décadas, 267

Freguesia de Souselas – um povo com História

séculos…foi ocorrendo em Souselas: não havendo cemitério os enterramentos eram feitos na Igreja e no Adro. Desta realidade fazem prova diversos mapas relativos aos anos 50 do séc. XIX, os quais também transmitem as razões porque a obra se não fazia: «Falta de meios», registando ainda a resposta «Nenhuns» quando se inquiria acerca dos meios que tinham sido «empregados para vencer estes obstaculos»(323). Porém, em Setembro de 1859 o cemitério de Souselas já estava em construção, juntamente com o de Almalaguês, Sé Nova, Sé Velha, S. Bartolomeu, Santa Cruz, Cernache e S. Martinho do Bispo. Apesar desta indicação, algo terá corrido mal na dita obra. Na verdade, tudo parece estar na estaca zero quando a Junta de Paróquia toma posição, em sessão de 20/12/1871, remetendo ao Governador Civil, a cópia respectiva. Pela voz do seu presidente, a freguesia relembrava «…a grande necessidade que ha de faser-se um cemitério que esteja nas condições legaes para evitar os enterramentos dentro da Egreja que são muito prejudiciaes á saúde publica, e até particular, e se oppoem á decencia e aceio que deve haver na Egreja como logar distinado para o Culto Divino»(324). Nesse documento, a junta definiu também um local apropriado a cemitério: «que julgava nas boas condições hygeenicas fazer o referido cemiterio no passal do parocho junto á Egreja do lado do Norte (…) attendendo a que os cadáveres sahem da Egreja immediatamente para o cemiterio, dispensando-se desta forma fazer uma Capella no mesmo, alem de outras vantagens e commodidades que offrece ás corporações da Irmandade o dito local». A junta de paróquia anexou a esta acta, um orçamento de peritos, descriminando os valores previsíveis para tal empreendimento. Ascendia a um total de 116.000 reis, propondo o executivo que os meios para a sua realização viessem dos capitais da Irmandade de S. Sebastião (66.000 reis) e Junta de Paróquia (50.000). Alguns anos depois, e no mapa intitulado «Nota dos locaes em que nas parochias d’este concelho se fazem actualmente os enterramentos», datado de 7 de Novembro de 1883, assinado e remetido ao Governo Civil pelo Administrador do Concelho, a situação relativamente aos dois lugares de enterramento na freguesia – Souselas e Marmeleira era a seguinte: «Na egreja matriz, os da paroquia menos a Marmelleira, que é núma capela»(325). Com a igreja paroquial da freguesia a “rebentar pelas costuras” no que toca a enterramentos, pois recebia fregueses de toda a área excepto os da Marmeleira, a legislação começava a apertar e era urgente resolver a situação. E esta começa a desanuviar-se a partir da concessão feita a 11 de Dezembro de 1885, pela Junta Geral do Distrito de 150.000 rs. para construção de um cemitério(326). Mas, é nesta altura que a Marmeleira toma a dianteira face a Souselas na resolução do problema com os seus enterramentos. E fá-lo de forma unida e

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Documentos relativos a obras nos cemitérios, 1851-1856, Cx.12 A.U.C - Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra; cx. 394, 1870-1876, Sub pasta 1870/1871. (325) A.U.C. – Fundo Governo Civil: Documentos relativos a obras nos cemitérios, 1862-1880, Cx. 13 (326) Id. (323) (324)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

decidida, construindo um cemitério privativo dos seus habitantes, a expensas suas, no terreno considerado adro da antiga igreja, sito no Alto de Santa Luzia. Os moldes da sua construção e localização ficaram registados na sessão da junta de paróquia de Souselas, do dia 2 de Agosto de 1885, onde se concedeu a licença pedida e os requerentes prometeram cumprir as obrigações assumidas. O seu requerimento ou petição, de alto valor e simbolismo histórico, transcreve-se abaixo na íntegra(327): «Os habitantes do logar da Marmelleira d’esta freguezia de Souzellas abaixo assignados, levados pelo respeito e consideração que tem para com as cauzas dos seus antepassados, e considerando que desde tempo antiquissimo tem sido sepultados os seus maiores na Egreja da mesma povoação que fica ao occidente da dita povoação a distancia consideravel em sitio apprazivel e arejado por todos os ventos pois que fica numa elevação; considerando que os parochos da nossa freguezia tem sempre feito os suffragios pelas almas dos finados da dita povoação na sua capella; considerando que a dita Egreja onde se sepultam pela sua antiguidade está em completa ruína pois já metade do edificio desabou e a outra parte não poderá resistir aos impetos d’um inverno rigoroso; considerando que não querem absolutamente nenhum subsidio da junta de parochia, pois querem fazer a desejada obra única e eclusivamente por seus esfforços; considerando que são completamente prohibidos por lei os enterros feitos dentro das Egrejas parochiaes e não havendo cemiterio commum na freguezia nem probabilidade de ser feito tam depressa em virtude dos poucos meios da mesma juncta; considerando que sendo um grande mal os enterros feitos dentro da Egreja Parochial dos restantes povos da freguezia, muito maior o seria se fossem todos n’ella sepultados, o que é completamente prohibido por lei como dissemos; considerando que reconhecem à mesma junta todos os covatos do pretendido cemiterio e sua administração, estando promptos a lavrarem uma acta em que lhe reconhecem este direito por pertencer isto mesmo de direito à junta de parochia da freguezia; por todas estas considerações vem respeitosamente pedir á Ex.ma junta a consessão do terreno que é considerado como adro da dita Egreja; para se fazerem uns muros em volta do dito adro, esperando que diffira a seu favor a sua petição» Na altura, a Junta de Paróquia era constituída pelos seguintes elementos: Joaquim Carlos d’Oliveira Nazareth (Presidente) e Francisco Ferreira, Manoel Joaquim Marques e Manoel da Costa (Vogais). Como regedor, Joaquim dos Santos Torres. Autoridades locais que acompanharam todo o processo, inclusive, a fase seguinte - o auto de designação de terreno para cemitério, lavrado a 17 de Agosto de 1887 no sítio do Alto de Santa Luzia, próximo do lugar da Marmeleira. «Processo sobre o cemitério da Marmeleira» In Documentos relativos a obras nos cemitérios, 18621880, Cx. 13

(327)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Naquele lugar e perante autoridades supra locais, como o Administrador do Concelho, Dr. Francisco Ferreira Camões, ou o Sub-Delegado de Saúde, o Dr. Manoel Justino d’Azevedo, bem como o reverendo Francisco Ventura Corrêa e os proprietários Manoel Ventura e Joze Dinis, moradores na Marmeleira, aprova-se o local escolhido pelos habitantes do lugar para cemitério «…denominado do Alto de Santa Luzia contiguo à egreja de S. João»(328). Ou seja; junto das ruínas da antiga Igreja da Marmeleira. O lugar de Souselas sofria certo vexame com esta situação, uma vez que havia subsídio mas não havia obra feita. Perante a passividade da junta de paróquia alguém tinha de agir. E a reacção chega de um técnico, de um especialista da saúde. A 3 de Agosto de 1892, o Bacharel Custódio d’Oliveira Nazareth, médico e residente no lugar, remete oficio às autoridades concelhias e distritais (Administração do Concelho e Governo Civil). E denuncia o imenso perigo que se corre: «Illustrissimo e Excellentissimo Senhor Administrador do Concelho de Coimbra. Ameaçado o paiz, como est´actualmente, da invasão d’uma epidemia grave, é dever meu, na qualidade de clinico e morador n’esta freguezia de Souzellas, levar ao conhecimento de Vossa Excellencia a necessidade urgente de se remediar o abuso, que ainda hoje se pratica n’este logar, de fazer os enterramentos na egreja parochial, em cujo adro se enterrou ha poucos dias o primeiro cadaver, por não haver já espaço dentro do templo».(329) Àquele pedido, associam-se as autoridades paroquiais que oficiam em Setembro de 1893 ao município pedindo a conclusão do Cemiterio Paroquial, dado que se estão fazendo os enterramentos na «…Egreja contra todas as prescripções legaes e hygiennicas». As autoridades, incomodadas, reagem e trocam correspondência com a Junta de Paróquia. Esta, assume, a realidade nefasta, reconhece que gostaria de resolver a situação, mas que não tem recursos. E responde ao Governo Civil, em 9 de Dezembro de 1893: «Há um cemiterio principiado hà quatro annos e não acabado. Fazem-se enterramentos na egreja matriz, e no respectivo adro, por aquella ter pequena capacidade»(330). O assunto prolonga-se para o século seguinte e a solução parece passar pelo aproveitamento do cemitério da Marmeleira. Discussão que é tratada com grande sigilo entre a Administração do Concelho e o Governo Civil, recebendo este do primeiro, o seguinte oficío de 7 de Abril de 1902: «Tendo conhecimento de que em Souzellas não ha cemiterio, que um recinto no adro da egreja onde impropriamente se têem feito os enterramentos se acha quasi todo occupado, e que no logar da Marmelleira daquella freguezia existe um cemiterio onde podem fazer-se os enterramentos de todas as pessoas que falleceram na mesma freguezia, officiei ao sub-delegado de saude em 31 de Março… para que fosse, com a maxima brevidade, examinar o dito cemiterio»(331). (328) (329) (330) (331)

Id. A.U.C. – Fundo Governo Civil: Documentos relativos a obras nos cemitérios, 1890-1920, Cx. 14 Id. Id.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

O Sub-Delegado de Sáude, antes de inspeccionar o cemitério, adverte as autoridades, em comunicação de 3 Abril 1902, para as consequências de uma ocupação do mesmo por habitantes de Souselas «pois foi construido a expensas suas e motivado pelo odio e rivalidade reciprocas d’estes habitantes com os de Souzellas». E, a 5 de Abril procede à vistoria programada, avaliando o espaço disponível para enterramentos; em 12 por ano. A ideia foi abandonada e, a 7 de Dezembro desse ano, a junta de paróquia aprova por unanimidade a proposta do presidente, na verdade a grande oportunidade para resolver o problema da falta de um cemitério em Souselas: «…propoz, em virtude da grande necessidade de um cemiterio para inhumação de cadaveres, que se pedisse à auctoridade superior a necessaria auctorisação para desviar dos fundos desta Junta a quantia de 88.000 reis, existente actualmente em moeda corrente nos cofres da mesma Junta: bem como alienar uma porção de ouro parte do que existe em poder desta Junta, como offertas a Nossa Senhora do Rosario desta Egreja, para com este producto proceder á construcção do referido cemiterio»(332). O novo ano traria consigo boa nova! Na reunião paroquial de 1 de Janeiro de 1903, o presidente e reverendo da freguesia, José Pinto Machado, anunciava que por deliberação do Governo Civil, datada de 13/12/1902, fôra aprovado o solicitado desvio de fundos e a venda do ouro, tudo para a construção do cemitério da freguesia(333). Nesta reunião, aprova-se o orçamento suplementar para a obra do cemitério, descriminando a aplicação da verba total de 184.900 reis: arranque e condução da pedra (43.000 reis), cal (20.000), areia (21.000) e operários (48.500), verbas entregues pelos peritos Joaquim Fernandes e Manuel Ferreira; cantaria (22.000), pelos peritos Joaquim Lopes e António Machado; e, o portão de ferro (30.400), pelos peritos Carlos Gomes Arinto e Eugenio Salles de Magalhães. Durante 1903 construir-se-á e abrirá as portas ao serviço fúnebre o cemitério de Souselas, localizado ao cimo da antiga Ladeira das Cruzes (fotos 46 e 47). A construção da Capela do cemitério, será a última etapa, resolvida por decisão registada na acta de 1 de Março de 1908: Martinho Marques Moreira cede «uma porção de terreno para construção da capella do cemiterio, d’esta mesma freguezia», dando a junta e em compensação «uma parcella de terreno em logar pervelegiado para uma sepultura cuja cedencia esta Juncta concordou»(334). Porém, e para legalização da situação, era necessário o acórdão de autoridade superior. Como esse documento tardou, a junta resolve conceder ao benemérito cidadão da freguesia a sepultura privilegiada.

(332) (333) (334)

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 7/12/1902, In Cx. 330 Id. Acta de 1/1/1903, In Cx. 331 Id. Acta de 1/5/1908, In Cx. 332

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A partir de então, a freguesia de Souselas passava a ser dotada de dois cemitérios; o paroquial, localizado em Souselas e outro, privativo, do lugar e dos habitantes da Marmeleira (foto 48). A capela do cemitério de Souselas foi reparada em 1930 e uma nova se construiu na sequência do alargamento do cemitério em 1943. Importante obra que resultou de um acordo entre a junta e particulares, cujos termos se definiram na reunião de 1 de Julho de 1943: «Resolveu aceitar dos Ex.mos Senhores Manuel Marques, Manuel Barroso e Sebastião Carvalho de Souselas o terreno necessário para o alargamento do Cemiterio de Souzelas e construção de uma capela cedendo em troca ao Ex.mo Senhor Manuel Marques duas sepulturas para si e sua espoza, ao Ex.mo Senhor Manuel Barroso uma sepultura em terreno e local que oportunamente se indicará aos interessados e serventia pelo lado nascente e poente do cemiterio aos Ex.mos Senhores Sebastião Carvalho e Manuel Marques».(335) O cemitério paroquial conheceria novo alargamento em 1970, tomando o município a decisão de comprar o terreno necessário nos finais de Abril de 1969, tendo celebrado contratos de compra e venda, dos terrenos necessários, em Maio de 1970, os quais pertenciam aos indivíduos seguintes: Manuel dos Santos e mulher (408m2 por 10.200$00), Fausto Ferreira Morais e mulher (38m2 por 950$00) e Silvino Marques Silvestre e mulher (240m2 por 6.000$00), todos residentes em Souselas(336). Em 1971, realizaram-se importantes melhoramentos no cemitério de Souselas que principiaram em Março daquele ano. A intervenção incluiu a construção de uma nova capela, edificada a Sul da antiga por esta ameaçar ruína, reconstrução de velhos muros e construção de novos, tendo o município contribuído com 45 contos (facto que ficou assinalado em placa afixada na fachada da nova capela). Os trabalhos ficaram concluídos nos finais de 1971, e para a sua construção, o presidente da junta, Amilcar Rajado, adiantou verbas do seu próprio bolso de que foi reembolsado em Fevereiro de 1972(337). Já nos anos 90 do século passado, a Cimpor financiou a construção de anexos no cemitério, obra que foi executada pela JF e que ficou assinalada também numa placa. Quanto ao cemitério privativo da Marmeleira foi alargado em 1980, depois do município ter subsidiado a JF com 40 contos para a compra de um terreno para esse efeito com a área de 350 m2(338). Em 1990 a Junta de Freguesia restaurou a pequena capela que existe no seu interior.

(335) (336) (337) (338)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fls. 22v.-23 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, actas de 28/2/1970 e 30/5/1970 Id. Acta de 26/2/1972 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 274, (1979-1980), Fl. 49

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

3. O abandono do lugar de Carrimá O lugar de Carrimá era um dos lugares habitados e mais antigos da freguesia, havendo referências à sua existência logo a partir do séc. XII. Ali existia a Capela de Nossa Senhora da Nazareth, à sombra da qual se realizava anualmente a festividade em sua honra, cuja preparação e despesas eram suportadas, pelo menos no séc. XIX, pela junta de paróquia. A festa realizava-se no dia 15 de Agosto e compreendia «…fôgo, missa resada e sermão»(339). O lugar, localiza-se nas proximidades de S. Martinho do Pinheiro. Abandonado na primeira metade do século passado, para ali se transferiram, não só os seus habitantes mas ainda os seus bens, incluindo o recheio da capela. Assim, aquilo que outrora foi pujante de vida é hoje um monte de ruínas. Importando questionar: o que aconteceu para Carrimá ter sido abandonada? Henrique Nazareth, alude ao desaparecimento deste lugar, avançando com a explicação que na época lhe pareceu mais ajustada: «Um caso curioso a relatar na freguesia de Souselas, é o desaparecimento, em nossos dias, de uma povoação. Na realidade até há pouco mais de dez anos ainda o lugar de Carrimá tinha habitantes. Pouco a pouco porém, - por causas várias – a população foi-se transferindo para as terras circunvizinhas. Não podemos explicar este fenómeno por insalubridade do local ou qualquer causa no género. Cremos que devemos atribuí-lo à sua sempre escassa população e ao acaso de todos os jovens do lugar casarem fora e a dificuldade de acesso já explicita no seu nome Carrimá-Carril-Mau»(340). As hipóteses consideradas por Nazareth, serão amiúde adiantadas como causas prováveis para o desaparecimento do lugar. A estes argumentos, acrescentaremos, porém, um adicional; acreditamos que um violento crime possa ter precipitado o abandono. A 1 de Abril de 1933, os diários locais anunciavam o desaparecimento de um homem, aventando-se como hipótese que teria sido vítima de um crime ou desastre. Tratava-se de um trabalhador, Bernardino da Silva de seu nome, 55 anos e residente em Souselas, que exercia o seu ofício numa serração na Pampilhosa. Segundo constava da notícia, a 28 de Março o homem dirigiu-se, como habitualmente, do seu posto de trabalho para casa por volta das 17h00. Levava, no entanto, uma missão perigosa a cumprir que poderia ter sido o móbil do crime:

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 2/9/1900, In Cx. 327 Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 25

(339)

(340)

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«Antes, porém, de partir, o seu visinho Joaquim Marques Leite encarregou-o de receber determinada quantia a um negociante de madeiras no Carquejo (…) Como ia fazer um negócio admite-se que tenha sido vítima dos ratoneiros que abundam naquela estrada, entre Mealhada e Coimbra, fazendo o seu ponto de reunião no Carquejo e Adémia»(341). A verdade é que ninguém voltou a ver o tal homem, pai de 5 filhos (3 deles menores) desaparecendo numa noite de chuva torrencial. Alarmou-se o povo da freguesia com o caso, organizando-se espontaneamente a sua busca, a 3 de Abril, dia em que seria conhecido o desfecho: «Ontem, ao começo da tarde homens de Souzelas, e alguns da Pampilhosa, companheiros de trabalho do desaparecido, num gesto de humanidade que só os dignifica, munidos de enxadas, foices, paus, fateixas, etc., fizeram uma batedura em todos os matos, pinhais, vales e poços, entre esta localidade e o Carquejo (…) Quando, porém, vinham próximos a Souzelas, surgiu-lhes a notícia de que o pobre homem tinha sido visto por umas crianças, numa vala entre Carrimá e S. Martinho do Pinheiro, desta freguesia, as quais ficaram aterradas, caindo uma delas ao vêr um cadaver na vala, quando naquele local tentavam cortar umas canas para a sua festa de domingo de Ramos»(342). O homem havia morrido e, segundo informação posterior, a autópsia revelara «asfixia por submersão»(343). Um caso que terá lançado pânico e insegurança entre os poucos habitantes de um dos locais mais isolados da região, precipitando o seu abandono definitivo. Porém, e escutando a voz do povo, têm sido adiantadas outras razões para o abandono do lugar de Carrimá, designadamente o aparecimento de esqueletos ou o facto das casas serem toscas e pouco seguras.

4. Novas Estradas Não é difícil imaginar que as velhas vias romanas da zona de Souselas tivessem sido aproveitadas e reparadas, posteriormente, abrindo-se novos caminhos para facilitar as comunicações entre os povos. Uma das estradas mais conhecidas e antigas da zona era a de penetração no planalto da Beira, partindo de Coimbra até Viseu, com passagem por Eiras e Botão. Daqui se deduz que passaria dentro da freguesia, seguindo um de dois traçados possíveis:

(341) (342) (343)

Gazeta de Coimbra, 1/4/1933, P. 8 Gazeta de Coimbra, 4/4/1933, P. 8 Gazeta de Coimbra, 6/4/1933, P. 8

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«1º De Eiras passaria por Torre de Vilela e seguindo a poente da Colina de Brasfemes até Souselas, tomaria aí o traçado da Estrada Nacional nº 336 2º e mais provável – De Eiras seguiria por Brasfemes, entraria na freguesia de Souselas pela antiga ponte do Remungão que hoje serve a Estrada Municipal (…) na Sede da freguesia tomaria o traçado da acima referida Estrada Nacional – pois não é admissível o traçado directo entre Brasfemes e Botão devido ao acidentado do terreno»(344). Outra estrada importante que atravessaria pela freguesia ligando Coimbra a Aveiro, também no seu limite ocidental, era a conhecida Estrada dos Carvoeiros, cuja designação decorre de ser frequentada pelos negociantes de carvão para abastecimento daquelas cidades. Parte desta estrada sobrepôs-se à Estrada Real nº 10 (antiga nacional nº 1), deixando de verificar-se esta coincidência em Santa Luzia, dado que aquela seguia mais a poente, por Mala, Murtede e Mira. Uma das primeiras notícias sobre a construção de modernas estradas na Freguesia de Souselas, data de Janeiro de 1851, e refere a construção de uma estrada muito importante na área, a estrada real que atravessava o lugar de SargentoMor na direcção Norte, cujas obras haviam começado alguns anos antes: «Começaram de novo os trabalhos no Sargento Mor, a légua e meia ao norte d’esta cidade. É urgentíssimo continuar neste ponto o lanço d’estrada real, que ali se tinha feito em 1846, porque havia um grande precipício no alto de St.ª Luzia, e terríveis atoleiros que é preciso fazer desaparecer. Consta-nos que por ora foram admitidos poucos operários. Não passarão de 50 os que trabalham, tendo concorrido imensidade de povo, pela falta de trabalho que nesta estação há na agricultura»(345). Tratava-se aqui de rasgar uma estrada nacional, estruturante no plano nacional, e fundamental do ponto de vista da circulação de pessoas e bens. Uma via que de Sargento-Mór seguia para Santa Luzia e dali para Mealhada, galgando o Bussaco na direcção de Viseu. No Verão de 1851, a estrada real já com o novo traçado regularizado, fruto do trabalho de 80 operários, macadamizada de forma contínua, apresentando-se bela e segura para os viajantes, com eliminação de alguns obstáculos, motivava os maiores elogios da parte da imprensa local, que vinha acompanhando de forma entusiasmada os trabalhos desde o seu princípio: «Continuam as obras da estrada real nas vesinhanças de Coimbra. Empregam-se n’estes trabalhos quatro partidos d’operários, dous ao sul e dous ano norte, não contando o da serra do Bussaco.

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, Pp.. 42-43 (345) «Estradas» In O Observador, Nº 368, 18 Janeiro, 1851, P. 3 (344)

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No Sargento-Mór não excederão a 80 pessoas, as que trabalham actualmente na continuação do lanço d’estrada começada n’aquelle local em 1846. Mas a principal dificuldade está vencida. O alto de Santa Luzia está cortado, e uma elegante e espaçosa estrada, bellamente macadamisada, com um declive suave e uma direcção recta e commoda atravessa aquelles pinhaes, que o viajante até agora era obrigado a transitar por veredas tortuosas e precipícios terríveis. Desappareceu já esse abysmo medonho e esse tremedal immenso, que à sahida do Sargento-Mor, ameaçava tragar, quem no Inverno se aventurasse a romper por meio d’aquellas paragens. Agora eleva-se magestosa sobre as ribanceiras visinhas, uma porção d’estrada construída com segurança e solidez sobre atterros consideráveis, e toda ella sobranceira aos estragos das águas por aqueductos, rampas e vallas lateraes. Em 1846 ficou completamente construída e macadamisada, desde o pinhal da Gerea até à entrada do lugar, uma extensão de perto de cinco mil palmos. Hoje já não faltará muito para se concluir quasi outro tanto e para alcançar a estrada larga e plana, de Charneca, que se extende quasi sem interrupção até à Mealhada. Ainda nesta semana visitámos de passagem estes sítios, e apezar da brevidade com que fizemos nossas observações, admirámos a importância e perfeição d’aquelles trabalhos. A estrada na depressão, que fica entre o Sargento-Mór e o alto de Santa Luzia, teve de subir a grande altura sobre os terrenos circumvisinhos, ficando sobranceira aos telhados das casas edificadas nas margens do antigo leito do caminho. Um dos melhoramentos que muito nos satisfez, foi a ideia de construir uma fonte à beira da estrada. Já se trabalha numa mina em certa altura do monte, e na canalisação da agua até ao ponto conveniente. Um chafariz d’agua potável e cristalina em tal situação, é uma necessidade e um regalo para os viajantes e para os animaes, e um mimo precioso para os povos d’aquelles sítios»(346). Efectivamente, a nova estrada tornou-se um caso de sucesso, muito frequentada pelo trânsito regular de pessoas, animais e bens diversos. Sargento-Mor tornava-se, aos poucos, um ponto de paragem quase obrigatória para os viajantes, local onde se retemperavam forças, se comia, bebia e dormia. Por estes motivos, o lugar era ideal para apurar estatísticas oficiais, sendo o contraponto a Norte, da contagem feita a Sul de Coimbra, na Venda do Cego: «Passaram no sitio do Sargento-Mór, légua e meia ao norte de Coimbra, na estrada do Porto, no mez de Fevereiro do corrente anno: Cavalgaduras sem carga, menores 224, maiores 168, com carga, menores 448, maiores 1120; passageiros, a pé, 4312, em cavalgadura, menor 644, maior

(346)

«Interior» In O Observador , Nº 430, 23 de Agosto 1851, P. 2

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952; gado em manada, caprino 140, suíno 1428, cavallar 24, vaccum 588; liteiras 16; carros 924. Passaram no mesmo mez pelo sitio da Venda do Cego, uma legua ao sul de Coimbra, na estrada de Lisboa: Cavalgaduras, sem carga, menores 672, maiores 112; com carga, menores 1652, maiores 1764; passageiros, a pé, 14616, em cavalgadura, menor 896, maior 1428; gado em manada, caprino 336 suino 616, cavalar 84, vaccum 1876, corroagens 4; carros 128»(347). Contudo, só a partir de finais da década de 60 do séc. XIX é que a viação rural sofreu significativo impulso, pela mão dos regeneradores. Algo enquadrado, legalmente, na Carta de Lei de 6 de Junho de 1864 que veio regular a execução material e formas de obtenção dos financiamentos para construção e prossecução de estradas municipais. No âmbito deste decreto, e da iniciativa da Repartição das Obras Públicas do Distrito, efectuou-se «…um projecto de rede viária, na extensão de 1797 km, aplicável a todo o distrito de Coimbra»(348). Neste contexto, a viação rural, financiada pelos municípios, representava mais de metade dos itinerários definidos, totalizando 955 km. De acordo com o inventário das estradas projectadas para construção, em 1870(349), a freguesia estava fortemente envolvida e preparava-se para uma autêntica revolução na rede viária: Estrada Distrital de Coimbra para Sargento-Mor (10 km); Caminhos Concelhios de Cantanhede-Souselas (18 km) e Laranjeira-Souselas (14 km); e Caminhos Vicinais entre Souselas-Fornos (4 km), Trouxemil-Fornos-Souselas (2km), Souselas-Sargento-Mor (2,5 km) e Souselas-Pisão (3 km). De realçar o peso da rede de caminhos vicinais, mas também a urgência na construção da estrada de Cantanhede-Souselas, na extensão de 18 km. No relatório apresentado à Junta Geral do Distrito, em 1871, defende-se a construção por razões económicas e comerciais regionais: «…por onde se transportam producções agrícolas e fabris para as feiras de Poiares e Goes, bem como pescado, gado bovino e cavallar para a de Trouxemil»(350). Quanto o souselense Custodio de Oliveira Nazareth desempenhou o cargo de vice-presidente da Câmara Municipal de Coimbra (1866-1867), realizaram-se importantes melhoramentos na freguesia ao nível das vias de circulação: repararam-se as ruas do lugar de Souselas na importância de 150$485 reis, envolvendo aterros e aplicação de calçadas; reparou-se o aqueduto e estrada

(347)

«Estatística de transito» In O Conimbricense, Nº 27, 25 Abril 1853, P. 3

Irene Maria Vaquinhas – Violência, Justiça e Sociedade Rural: os campos de Coimbra, Montemor-o-Velho e Penacova de 1858 a 1918, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento, História, nº 11, Porto, 1995, P. 250 (349) Id. P. 252 (350) Id. P. 254 (348)

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junto ao Remungão (por 11$980 rs.); reparou-se a importante estrada de Souselas a Botão (com terraplanagem na extensão de 1500 mt); e a não menos fundamental estrada dos Fornos a Souselas (Terraplanagem e enroscamento de pedra na extensão de 2500,0 mt) (351). Foi ainda no tempo da junta de paróquia, que se concretizaram os primeiros planos de abertura de estradas na área da freguesia, intensificados a partir da concretização do projecto de rede viária nos anos 70. Assim, entre 1869-1872, as atenções centram-se na abertura da Estrada Municipal de 2ª Classe, de Antuzede a Sargento-Mór, em especial o lanço da Zombaria a Sargento-Mór, processo que conheceu algumas paragens. Com uma extensão de 3,796, 19 mt, a obra ficou concluída em Junho de 1872 pelo valor de 3282$000(352). Esta opção pela abertura e ou consolidação de estradas, compreendeu também infra-estruturas fundamentais como as pontes. Tal foi o caso da Ponte da Azenha, que seria reparada durante o ano de 1862. Os trabalhos, orçados em 90$000, consistiram na pregadura de almofadas, e começaram a 26 de Abril sob direcção do bem conhecido Jerónimo José Baptista Lopes Parente(353). No ano seguinte, a atenção centrou-se na construção da nova Ponte de Frades(354), dirigida pelo Mestre de Obras da CMC. Trabalho que ficou concluído em Junho de 1866(355). Por esses anos, também assumiu grande destaque, aquela que é hoje a principal estrada que atravessa a freguesia: por alvará de 1 de Agosto de 1873 o Governo autoriza a abertura duma estrada de Souzelas aos Fornos, em Setembro pede a inclusão no mapa das estradas municipais a que unirá Souselas a Botão e, a 13 de Novembro de 1873, o município decide «abrir praça para arrematação da estrada de Souzelas aos Fornos e recebe-se o plano da de Souzelas ao Botão»(356), Nos inícios de 1874, a estrada de Souselas a Botão era objecto de especial atenção, com a Câmara Municipal e o Conselho Municipal a estudarem o assunto, que culmina com a aprovação do projecto provisório, pela Comissão de Viação, em Abril de 1874 e organização do processo. Decidiu-se, após muita reflexão, que a estrada deveria prolongar-se até ao limite do concelho(357). O alvará autorizando a construção da Estrada Souselas-Botão data de 15 de Maio de 1874. No entanto, este processo de prolongar a estrada para lá de

A.H.M.C. - Mapas das Obras Municipais, 1851-1877 Fls. 17v.-18v.; O Conimbricense, 7 Dezembro 1866, P. 2 (352) A.H.M.C. - Estradas Municipais: Antuzede-Sargento-Mór, 1869; Antuzede- Sargento-Mór, 1872 (351)

A.H.M.C. - Mapas das Obras Municipais, 1851-1877, Fl. 12 v. A designação desta ponte derivará do facto de os frades de Lorvão a terem utilizado nas suas comunicações. (355) A.H.M.C. - Mapas das Obras Municipais, 1851-1877 Fls. 14v.-16v. (356) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1870-1889, Biblioteca Municipal de Coimbra, 1937, Pp. 43, 44, 46 (357) Id. Pp. 53 e 67 (353)

(354)

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Botão, não foi tarefa fácil, pois a 27 de Julho de 1876 o município solicitava «…à Junta de Paróquia do Botão informações acêrca da continuação da estrada de Souzelas ao Botão, para, nos termos da lei de 6 de Julho de 1864, se pedir a sua classificação até o lugar de Larçã ou até onde mais convier»(358). As referidas estradas eram de 2ª classe, tendo a de Fornos-Souselas orçado em 5.170$000 e a de Souselas-Botão em 6.249$000(359). A ambas foi concedido um subsídio depois de apresentada representação ao Rei e às Cortes; para a primeira 1.410$175, por Portaria de 4 de Dezembro de 1874 e, para a de Souselas-Botão, 1.680$705 por Portaria de 7 de Outubro de 1876. Tanto num como noutro caso, as despesas repartiram-se pelas expropriações, terraplanagens, pavimentação, diversas obras (incluindo as de arte) e fiscalização. Os pagamentos desta importante via de comunicação começaram a ser liquidados em Dezembro de 1885. Por outro lado, e no troço Fornos-Souselas, o Director das Obras Públicas ofereceu-se para dirigir a sua construção. Em Agosto de 1886 também os trabalhos de construção da via estavam a ser liquidados. Esta via tem funcionado até aos dias de hoje, como principal acesso a Souselas a partir dos Fornos; primeiro, a partir da Estrada Nacional Nº 1 e, posteriormente, a partir do IC 2. No entanto, em Agosto de 1973, o município previa a construção de novo acesso a Souselas a partir da E.N. 1 aos Fornos, com vista à substituição da estrada existente considerada «obsoleta». Para tal, foi adquirido pela C.M.C. uma parcela de terreno com 1770 m3 ao Sr. Evaristo Pacheco Rodrigues (foi vereador da C.M.C.)(360). Paralelamente, preparavam-se outras obras na freguesia. Pelo final desse ano, estavam prontos os cadernos de encargos para arrematação das empreitadas da estrada de Zouparria ao Sargento-Mór. Mas seria a estrada de Souselas a Marmeleira a centralizar as atenções. De facto, a partir de 1874 colhe-se notícia da sua construção, datando dos anos seguintes os dados mais concretos sobre obras no seu trajecto: a 9/8/1875 iniciou-se a empreitada orçada em 367$000 e que consistia no «Enrocamento de pedra miúda, ensaibramento e enpedramento na extensão de 1:600,0»; e, a 30 de Junho de 1877 estavam concluídos pequenos reparos iniciados no princípio do ano na extensão de 2,000 mt (361). O novo século traria novas realidades do ponto de vista da estrutura económica do país. Uma delas foi a expansão e difusão do turismo nacional, que se manifestava também a nível local. Em Agosto de 1917, o condutor da Repartição de Obras apresentava ao município «…o projecto do alargamento (358) (359) (360) (361)

Id. P. 78 A.H.M.C. – Estradas Municipais – Souselas, 1874 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 255, Fls. 66-66v. A.H.M.C. - Mapas das Obras Municipais, 1851-1877, Fls. 35v.-40v.

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da estrada que dos Fornos segue por Souzelas à Pampilhosa e Luso, considerada de turismo, por modo a não sobrecarregar as despesas municipais»(362). Nas décadas de 30 e 40 construíram-se, a nível nacional, mais de 500 quilómetros de estradas, que se concentraram junto aos principais pólos de desenvolvimento, tardando a chegar a Souselas. Em Maio de 1933, arrancaram as obras de reparação da estrada da Zouparria, que o governo ofereceu a significativa comparticipação de 36.800$00. Intimamente relacionada com as estradas, esteve a construção de pontes. Tal foi o caso do pontão da Azenha-Souselas, obra estrutural da junta para 19491950, cujo custo ascendeu a 12 contos. Em Julho de 1958 decorriam obras de construção de paredão nesse local. Temos também notícia da construção da ponte sobre o rio Resmungão (Ponte do Mergulhão), concluída em Agosto de 1961, no sítio denominado «fundo da Quinta» que importou em 2.000$00. Mas, a mais antiga necessidade da freguesia, ao nível das pontes, era a Ponte do Matoito, também sobre o Rio Resmungão e que ficou concluída no mandato de 1964-1967, o qual a classificou como «…obra que já vem, de há cêrca de cem anos para se realizar»(363). Esta obra foi adjudicada pela C.M.C. a Luis Adriano Pinto dos Santos, engenheiro civil, por escritura de 11 de Outubro de 1966, na quantia de 41.300$00(364). Por volta de 1950, a freguesia dispunha já de uma rede viária considerável, base das existentes na actualidade: a Estrada Nacional nº 1 (Lisboa-Porto) servindo de limite da freguesia numa extensão de 3 quilómetros; a Estrada Nacional nº 336, em macadame, que saindo da E. N. nº 1 na povoação dos Fornos, atravessa a freguesia, passando por Souselas na direcção Norte, por Botão, Pampilhosa, Luso e Boialvo terminando em Bolfiar (Águeda); e as estradas municipais unindo os lugares da freguesia – Souselas Sargento-Mor, passando pela Zouparria, Souselas com Pampilhosa do Botão passando por Marmeleira (então em construção o troço Marmeleira-Pampilhosa) e Souselas com Brasfemes passando pelo Resmungão(365). As necessidades de vias rodoviárias condignas começaram a fazer-se sentir em torno do lugar sede. Em 1958, constrói-se a Estrada Municipal da Marmeleira ao limite dos concelhos de Coimbra/Mealhada no valor de 80 contos e, em Junho de 1961, abre-se concurso para a empreitada de abertura da rua «…que ligará a estrada municipal de Souselas a Brasfemes ao Alto das Eiras (…) terá a extensão de 230 metros de comprimento por cinco de facha de rodagem sendo as valétas calcetadas»(366). Obra que será adjudicada por Manuel da Costa Gomes por 20.000$00.

José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1904-1919, Edição da Biblioteca Municipal de Coimbra, Coimbra, MCMLII, P. 260 (363) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 46 (364) A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 71, 1966, Fl. 66 (365) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, Pp. 42-44 (366) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 18v. (362)

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Como ficou registado nas actas da freguesia, a estrada do Alto das Eiras e de Sargento-Mor «…foram possíveis fazer-se dada a boa vontade do Excelentissimo Senhor Presidente da Camara Municipal de Coimbra, que nos enviou catarpilares para o efeito, e a colaboração dos proprietarios confinantes com as estradas em causa que ofereceram os terrenos»(367). Na viragem de 1959 para 1960 construiu-se o novo traçado da Estrada Nacional Nº 1 no lugar de Sargento-Mor. Esta obra embora tenha melhorado a circulação rodoviária, trouxe outro tipo de problemas, que os moradores do lugar através de petições, levaram ao conhecimento do executivo municipal. Assim, a 25 de Fevereiro de 1960 um grupo de moradores reclamava contra o novo traçado da estrada junto da povoação «…já que a estrada separa a povoação e as suas crianças, da escola primária, constituindo-se assim num perigo constante para elas»(368). De facto, com aquela obra o lugar de Sargento Mor ficava dividido em três áreas de ocupação populacional, intercaladas por duas importantes vias de circulação; a antiga e a nova estrada nacional nº 1. Na sessão de Câmara de 13 de Dezembro de 1962, os problemas trazidos pela nova variante voltam de novo à ordem do dia, analisando-se nova petição apresentada pelo vereador Francisco Cortez. Desta vez, os moradores reclamam contra os Serviços Municipalizados de Coimbra, que os haviam informado que teriam de pagar 50% do custo total da nova obra de electrificação. Um assunto que a edilidade remeteu para os ditos SM e que se relacionava, proximamente, com os efeitos da reocupação habitacional do lugar: «Nestas circunstâncias, alguns habitantes foram compelidos, ainda com grandes prejuízos, a construir outras moradias em terrenos que possuíam perto daquele aglomerado populacional (…) Ora os interessados são pessoas de parcos recursos financeiros, na maioria operários, e veêm-se privados de obter luz electrica - por uns escassos 100 m. de rede - por não poderem satisfazer tal verba. Nestes termos, vêem apelar para o alto espírito de V.ª Ex.ª a fim de que tal melhoramento lhes seja proporcionado, uma vez que sacrifícios já fizeram ao terem de abandonar as suas velhas, mas muito queridas moradias»(369). Além destes problemas, a construção de tão importante via trouxe ainda perturbações ao nível do comércio do próprio lugar, dado ter desviado o trânsito do centro do lugar. Os anos 60 trouxeram a preocupação em dotar S. Martinho do Pinheiro com uma estrada mais moderna, que incluía a construção de um pontão, tendo

(367) (368) (369)

Id. Fl. 46 Anais do Município de Coimbra, 1960-1969, Câmara Municipal de Coimbra, P. 142. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 212, Fls. 67-67v.

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o município aprovado um subsídio de 10.000$00 em Fevereiro de 1964. Para esta obra foi importante a compra de 84 m2 de terreno de vinha no sítio do Lagar da Revala ao Sr. António Fernandes de Sousa, para construção do dito pontão e desvio da estrada tendo as obras principiado em Agosto. A importância daquele pontão ficou bem expressa no balanço que o executivo local fez em finais de 1967: «Vimos no início da nossa gerencia a resolução de um dos grandes problemas que afligia a população, que foi a construção de um pontão no Ribeiro, pois sem esta construção a população teria de atravessar o referido Ribeiro descalça e com os pés na água sobretudo durante o inverno, muito embora não estejamos completamente satisfeitos, pois a estrada ainda terá que ter uma reparação geral, fazendo uma caixa com pedra e depois devidamente alcatroada»(370). Os anos setenta trouxeram a difusão da calçada à portuguesa na freguesia: em Abril de 1972, a junta pedia que técnicos da C.M.C. vistoriassem as calçadas que foram executadas, nas obras junto à Capela de Sargento-Mor, na rua para o Bairro da Azenha e junto ao chafariz de Souselas(371).

5. Saúde e Assistência Social A primeira manifestação para ser criado em Souselas um posto médico, data do dia 6 de Agosto de 1885. Em plena sessão camarária analisou-se uma declaração dos médicos Custódio de Oliveira Nazareth, António Augusto Cortesão (figura proeminente de S. João do Campo e pai de Jaime Cortesão) Maximino de Matos Carvalho e Joaquim Martins Teixeira de Carvalho em que «…prontificam-se a prestar os seus serviços em postos médicos que se estabeleçam em Souzelas, S. João do Campo, Conraria e Sernache»(372). Enquanto os partidos não foram criados, Custódio Nazareth disponibiliza-se para exercer clínica em Souselas, colocando-se ao serviço do município. Vivia-se, na época, o pânico da cólera e, em oficio de 05/08/1885, responde à CMC, sobre prevenções a tomar contra a doença: «… tenho a honra de certificar a Ex.ca que, até onde chegarem as minhas forças, fico à disposição da Ex.ª Camara, no caso, que Deus de nós affaste, de ser o país invadido: e pelo que respeita a meios hygiénicos, é opinião minha que as habitações deixam muito a dezejar e que são indispensáveis e inadiáveis visitar domiciliarias»(373). O assunto da criação dos partidos médicos seria largamente discutido nos tempos próximos, até que nas sessões camarárias de 5 e 10 de Fevereiro de 1887, o vereador José Soares dá conta do parecer da comissão nomeada para a

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 45v. A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 8/4/1972 (372) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1870-1889, Biblioteca Municipal de Coimbra, 1937, P. 209 (373) A.H.M.C. – Diversos, Doc. N.º 19 (Documentos referentes aos Partidos Médicos Municipais). (370) (371)

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criação dos partidos médicos, a qual propunha um partido ao Sul e, outro, ao Norte do Mondego. Este, com sede em Souselas e ordenados de 400$000 réis anuais, abrangeria as freguesias de Souselas, Botão, Eiras, Brasfemes, Vilela, S. Paulo, Trouxemil e lugar da Pedrulha(374). Algum tempo depois, em Agosto de 1915, um conjunto de juntas de paróquia do concelho (Souselas, Torre de Vilela, Botão, Trouxemil, Vil de Matos, S. Martinho de Árvore, S. Silvestre e Lamarosa), unidas por preocupações comuns e laços geográficos, solicitam ao município a criação de mais um partido médico municipal. Porém, o pedido terá caído em «saco roto» pelo que, em Março de 1927, a Comissão Administrativa da Junta de Freguesia insistia na criação de um lugar de facultativo municipal para atender as freguesias de Souselas, Botão, Trouxemil e Antuzede. Desta vez o pedido seria satisfeito; em Abril de 1932 o município decide criar dois partidos médicos, com sede em Souselas e Santa Clara, o que motiva remodelação das áreas existentes. Por fim, a 28 de Abril daquele mês, é nomeado interinamente para facultativo municipal de Souselas o Dr. Joaquim de Sousa Machado, que será exonerado a seu pedido em Novembro de 1933 (375). Através do já referido acordo, de arrendamento de espaços do edifício sede da junta para outros fins, datado de 1 de Julho de 1945, o executivo local cedeu, gratuita e temporariamente, e com autorização camarária, o primeiro andar do edifício «para um posto clinico de assistencia a grávidas e as creanças»(376). Designado como «posto sanitário», a ele vinha «tres vezes por semana uma equipe clínica de Coimbra – constituída por um médico, uma enfermeira e uma visitadora sanitárias. Além disso há ainda a assistência prestada pelas caixas de Previdência das várias fábricas da freguesia»(377). Souselas não deixou de ter médico municipal de partido até aos fins do Estado Novo. Em Janeiro de 1970, era exonerado da função o Dr. João Manuel Abreu Barreto (médico interino) e nomeado, também interinamente pela C.M.C sob proposta do vereador Francisco Cortez, por unanimidade e escrutínio secreto, o Dr. Hernâni Viriato de Azevedo Teixeira Beltrão»(378). Em Abril de 1972, o município delibera não abrir concurso para provimento da vaga deixada em aberto pela exoneração do facultativo municipal, justificando com o facto de a assistência médica estar assegurada. De facto, e por esta altura, funcionava em Souselas uma delegação do Centro de Assistência MaternoInfantil do Doutor Bissaia Barreto, no Bairro das Almas. Esta delegação era afinal um dos postos rurais da região, constituídos por uma brigada de técnicos que faziam visitas (consultas) a diversas localidades de forma periódica e regular. Id. P. 240 José Pinto Loureiro (Dir. de); Armando carneiro da Silva (nota preambular e sintese) - Anais do Município de Coimbra, 1920-1939, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, Pp. 339 e 341 (376) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 30v. (377) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 28 (378) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 245, 1969-1970, Fl. 46v. (374) (375)

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6. Pela Educação e Ensino 6.1. Em Souselas 6.1.1 A Escola Masculina Desde os princípios da segunda metade do séc. XIX que Souselas possuía instrução primária masculina na freguesia. Os seus professores, entre 1859 e 1895, seguem na tabela abaixo: Tabela 12 - Professores de Instrução Primária Masculina para a Freguesia de Souselas, 1859-1895(379) Professor Registo Provisão Observações Joze Augusto Mendes Professor de instrução primária da fregue14 Dezembro 1859 Diniz sia de Souselas entre 1859-1865. - Regia a Cadeira de Ensino Primário Masculino - Veio transferido de Folques, concelho de Provido vitaliciamente a Arganil, onde estava colocado de forma viJoão da Costa e Mello talícia, para a de Souselas que estava vaga. 11 Maio 1868 Aqui Foi provido vitaliciamente a 11 Maio 1868. Transferido posteriormente para S. Martinho do Bispo. Recebia 110.000 rs (90.000 pagos pelo estado e os restantes pelas Câmaras ou Juntas de Paróquia); Provido vitaliciamente a Transferido de Sammel, concelho de Soure Carlos Vieira d’Abreo 12 Novembro 1867 por despacho de 13 Junho 1871. Foi depois transferido para Reveles, concelho de Montemor-o-Velho por despacho de 28 Maio 1873. José Maria Rocha da Provimento temporário Transferido por despacho de 2 Março Fonseca de 5 Novembro 1873 1877 para Antanhol. Antonio Maria Provimento temporário Transferido para o concelho de Mira, por Antunes de 7 Abril 1877 despacho de 6 Outubro de 1877. Provimento temporário Transferido para Candosa, concelho de Jose Augusto Ajres de 20 Agosto de 1878 e Tábua por despacho de 26 Fevereiro de Castello Branco vitalício em Março 1890 1880. Voltará posteriormente a Souselas. José Augusto Dias Provimento temporário Regia o Ensino Masculino Elementar. Pereira a 21 Abril 1894 Anttero Pereira de Idem, a 4 Junho 1894 Falecerá no hospital a 5 Novembro 1895. Moura Regeu a 3ª Classe de Ensino Elementar. Elvira Ferreira das Provimento vitalício a Diz que tem «caza e mobilia proprias. Tem Neves Eliseu 18 Novembro 1895 residencias para o prof.ºr».

(379) Dados extraídos das seguintes fontes: Livro de Registo de diplomas de professores de instrucção primária, 1841-1861, Nº 156; 1861-1881, Nº 158; Livro da descrição das cadeiras de instrucção primária do sexo masculino no distrito, Nº 171; Nº 172; Livro de Matricula dos Professores d’instrucção primaria do concelho de Coimbra, Nº 174, Movimento dos professores e professoras, Nº 175; Nº 176

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Nos anos 60 do séc. XIX, e por iniciativa do Comissário de Estudos depois de uma visita às escolas do distrito, criaram-se em diversas localidades «onde estão estabelecidas as escolas de instrução primaria» comissões promotoras da instrução popular. Em 1863, a de Souselas era constituída pelo reverendo Vigário António Joaquim Lopes (Presidente), o regedor Francisco José da Silva, os bacharéis Jerónimo Lopes Parente, Custódio de Oliveira Nazareth, Manoel Maria da Cunha e reverendo Joaquim Rodrigues(380). Estas comissões tinham diversas finalidades: «…vigiando os professores, animando-os com os seus amigaveis conselhos, dotando as respectivas escolas com boas casas e com a conveniente mobilia, fornecendo livros aos alumnos pobres, e, sobretudo, estimulando o zelo dos meninos com os exames finaes e com os premios que são solemnemente distribuidos aos mais distinctos»(381). No entanto, pelos inícios do ano lectivo 1864/65, eram vários os condicionalismos ao ensino escolar em Souselas, facto que a imprensa revelou, lançando acusações a todas as entidades e pessoas com responsabilidades: «Consta-nos que a escola de instrucção primaria de Souzellas, deste concelho de Coimbra, desde que se abriu no actual anno lectivo, não tem sido frequentada por mais de 4 a 8 alumnos! É para lamentar um semelhante facto, que muito pode depor contra a illustração dos povos daquella freguezia e circumvisinhas. Chamamos para este objecto toda a attenção do reverendo parocho e mais membros da commissão promotora da instrucção popular, que alli foi creada pelo sr. commissario dos estudos deste districto. Do seu zelo, e dos mais proprietários d’aquella localidade, é de esperar, que promovam pelos meios ao seu alcance que os pães de família façam ir seus filhos à escola (…) As escolas ruraes do concelho de Coimbra são, na sua quasi totalidade, do numero das peores deste districto, consideradas a todos os respeitos. A frequência dos alumnos é quasi nulla, as casas das escolas são péssimas, a mobília é miserável; em fim tudo revela uma reprehensivel indifferença pela instrucção primaria, objecto que devia merecer todo o cuidado. E para nada faltar a este deplorável quadro, os administradores de concelho e câmaras municipaes têem lançado este importantíssimo ramo do serviço público ao mais completo e escandaloso desprezo (…) Ninguem ignora que a instrucção popular é a base da civilisação...»(382). A designada Benemerita Commissão Promotora da Instrucção Popular de Souzellas continuou em funcionamento nos anos seguintes. E, em Janeiro de

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«Inspecção às escolas» In O Conimbricense, 13 Outubro 1863, P. 3 «Serviços á instrucção primaria» In O conimbricense, 16 de Agosto 1865, P. 3 «Escola de Souzellas» In O Conimbricense, Nº 1129, terça-feira, 22 Novembro de 1864, P. 3

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1865, dá mostras de actividade, publicando a lista dos subscritores que haviam concorrido para a compra de livros destinados aos alunos pobres, num total de 4$050 reis: Dr. Jeronymo Lopes Parente, Dr. Manoel Maria Pereira da Silva, Dr. Manoel Maria da Cunha, Reverendo Joaquim Rodrigues, Professor José Augusto Mendes Diniz, Dr. Custodio Nazareth e Luiz Manoel de Figueiredo Parente(383). Com aquela verba havia-se dado um passo significativo em termos de manuais, adquirindo-se 10 abecedários, 5 catecismos, 5 biblias da infância, 5 tabuadas e 5 exemplares do sistema métrico de Matta e Silva. Além desta acção benemérita, praticada por aqueles cidadãos, Souselas contava ainda com a generosidade de D. Jeronyma Benedicta de Sousa Soares Frazão a qual «…offerecera á commissão a quantia de 4$500, em cada anno, para a compra de premios, que deverão dar-se aos meninos mais distinctos da escola. E que para o mesmo fim, e tambem annualmente, offereceram a quantia de 3$600 as exm.ªs sr.ªs D. Joaquina Rita Lopes de Figueiredo e D. Maria José Lopes de Figueiredo, filhas do sr. Jeronymo José Baptista Lopes Parente»(384). O jornal terminava a sua notícia lançando «louvores a todos». E bem o mereciam…. Ainda sem escola, a Junta de Paróquia foi assumindo as suas responsabilidades: inscrevendo em orçamento verbas para subsidiar os alunos pobres «com livros papel e pennas, linha, lápis, e outras miudezas de que carecem para o seu aperfeiçoamento litterario» (orçamento de 1888); de acordo com a portaria de 7 de Junho de 1871, fornecendo a mobília para a escola, sendo os modelos aprovados pela comissão; e reservando em saldo verbas para construção de um edifício próprio para ensino. Um dos professores de que colhemos relevante notícia é José Augusto Aires Castelo Branco. Dez anos depois de nomeado temporariamente, o processo para se manter no cargo passava pelo município. Assim, e em Março de 1887, na qualidade de professor do ensino elementar da freguesia, envia o requerimento oficial à Câmara Municipal, que o analisa em sessão do dia 10 e do qual se deduz da grande frequência do estabelecimento: «…informando que a mesma Junta é conforme o parecer do inspector, que ahi ter o professor prestado há mais de oito annos bons serviços escolares em Souzellas, sendo a sua aula uma das maiz frequentadas do concelho; e que, estando este professor legalmente habilitado para o magistério official, se póde deferir á sua pretenção»(385). Acrescente-se ainda que este professor foi secretário da junta de paróquia no período 1887-1890, abandonando a meio

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«Cadeira de ensino primario de Souzellas» In O Conimbricense, 17 Janeiro 1865, P. 3 Id. A.H.M.C. - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 101, Fl. 53v.

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do seu mandato e apresentando reclamação contra as contas apresentadas pela junta em 1890. Mas nem todos os professores granjeavam estima entre a população. Elvira Eliseu não teve em Souselas vida fácil, uma vez que a 10 de Dezembro de 1899 a junta de paróquia analisava uma reclamação popular que a colocava na linha de fogo: «…compareceram perante todos os membros da mesma Junta mais de trinta e cinco individuos da referida freguezia, pedindo providencias immediatas para ser substituida a professora official d’esta freguezia por outro individuo que com mais competencia possa e deva desempenhar o magisterio elementar que a mesma está exercendo, visto que durante os quatro annos que aquella se acha de posse da cadeira nenhuns alumnos habilitou para exame e nem haverem esperanças d’elles approveitarem cousa alguma com a dita professora»(386). Reclamação que seguia para o município avaliar. Se havia alunos e professores onde funcionava a escola? Sabemos que desde meados dos anos 60, a Junta de Paróquia financiava anualmente a renda de uma casa particular, onde funcionava a escola, inicialmente no valor de 7.200 reis, verba que em 1888 subira a 19.200 reis(387). Em 1889, a junta de paróquia avança decidida para a aquisição de um edifício escolar, elaborando orçamento suplementar, datado de 24/11/1889, para a compra da casa da escola e habitação do professor. A opção fez-se pela adaptação em detrimento da construção de raiz e, assim, orçamentou-se em despesa 375$000 para a «Compra da Casa da Escola» e 96$300 para execução das obras de adaptação da casa para escola, segundo planta e orçamento. Para este fim se utilizou o capital acumulado em anos anteriores e capitais distratados. A compra seria aprovada pela Junta de Paróquia, que lançaria em acta do referido dia um voto de louvor ao seu presidente, considerando o passo então dado como um «grande melhoramento para esta freguezia»(388). A 13 de Junho de 1889, a Câmara Municipal aprovava a compra de duas casas, separadas pela rua do lugar, escolhidas pela Junta de Paróquia de Souselas em sessão de 9 de Junho. Segundo cópia da deliberação paroquial «… para a installação da escola elementar da freguesia e habitação do professor, pela quantia de tresentos setenta e cinco mil reiz, as quaes pertencem a Jose Quaresma de Moura, de Coja, medindo 172m,710 de superfície, com um pateo contíguo de 66m,710, a que é destinada a escola. A junta declara que a despesa é costeada

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 10/12/1899, Cx. 328 A.U.C. – Fundo do Governo Civil: Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 393, 1863-1869; cx. 396, 1888-1889 (388) Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 396, 1888-1889 (386)

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pela verba de cem mil reiz, votados no respectivo orçamento e pelo distrate de capitaes mutuados»(389). Esta primeira escola, seria construída no decurso de 1890 e todo o processo passou pelo incentivo, diálogo com as autoridades supra-locais, autorização e fiscalização da junta de paróquia: a 1 de Junho de 1890, paga a Luis Pereira de Sousa a quantia pela qual tinha arrematado a obra de carpinteiro da escola; a 15 de Junho do mesmo ano o presidente da junta, António Quinteiro, da Marmeleira, arremata a cal, areia e telha para a guarnição das paredes e telhados da casa da Escola bem como «…um concerto na casa de abitação do Profeçor, de que foi arematante o carpinteiro Jose Forte do lugar dos Fornos pela quantia de 16:000 rs com obrigação de ezecutar neste travalho a planta da mesma escola»(390). Obras difíceis e prolongadas, motivando a aprovação de um orçamento suplementar para acabamento da mesma, nos finais de Junho de 1890, e a aplicação de 12$500 rs, de capital distratado por Joze Cação(391). Assim e durante o Verão daquele ano foi-se pagando o possível com os recursos disponíveis, alguns vindos da fábrica da igreja: a Manoel Nogueira da arrematação da madeira para a casa da escola (80$935 reis) e ferragem das portas e janelas por (11$130 rs); a Jose Ferreira da Silva o prego utilizado na casa (9$000 rs); a Antonio Gomes, a madeira, cal e areia (7$540); a Francisco Quiarios o serviço de pedreiro (18$000); a Joaquim Maria Martins de Coimbra os vidros aplicados (6$820 rs) e a Antonio Denis, da Marmeleira, a telha para a cobertura (2$790 rs)(392). Para a conclusão da obra, a junta votará outra verba adicional, em orçamento de 1891, no valor de 49$000. O desgaste do tempo acabou por manifestar-se na escola masculina. A casa da escola seria reparada com urgência no decurso de 1895. A 21 de Outubro de 1917, a Junta de Freguesia toma decisão de pedir ao Ministro da Instrução um subsídio para a reparação da escola do sexo masculino do lugar de Souselas, obtendo resposta afirmativa, em Dezembro do mesmo ano, com a concessão por decreto de 1.000$00 para esse efeito.(393) 6.1.2. Escola Feminina Em Julho de 1895, Souselas ainda não tinha escola feminina mas ela seria uma realidade. De facto, de 1895 até à criação da freguesia civil de Souselas,

A.H.M.C. - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 102, 1888-1890, Fl. 81v. A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, 15/6/1890, Cx. 322 (391) A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 29/11/1891 In Cx. 323 (392) A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Actas de 24/8/1890 e 7/9/1890, Cx. 322 (393) A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, Fls. 2v. e 3 (389)

(390)

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não dispomos de registos directamente relacionados com a junta de paróquia, que possamos utilizar, uma vez que desapareceram os livros de actas desse período. No entanto, podemos acompanhar a evolução do processo escolar em Souselas, através das actas do município coimbrão. E foi precisamente o município que representou ao governo, em Maio de 1909, pedindo a criação de escolas femininas em diversas localidades necessitadas do concelho, entre as quais incluiu Souselas. Como a resposta tardava e havia passado um ano, o município assume a responsabilidade possível sobre o assunto na reunião de 12 de Maio de 1910: «Tendo-se representado ao Governo sobre a criação e transformação de diferentes escolas de ensino primário e sendo indispensável ir completando a organização deste ramo de ensino no concelho, a Câmara delibera responsabilizar-se pelas despesas de mobiliário, casa de escola e habitação dos professores para as escolas»(394). E o desejo passa à realidade, em Março de 1911, com a aplicação de verba destinada a mobiliário em diversas escolas necessitadas, entre as quais se integra pela primeira vez (caso não seja engano) a escola da Marmeleira. O município manter-se-á firme na decisão em fornecer casa para uma escola feminina em Souselas, que reafirma na sessão de 22 de Fevereiro de 1912. Entretanto, várias soluções foram equacionadas até que um rumo se define na sessão camarária de 9 de Outubro de 1913, solicitando à Comissão Administrativa dos bens das igrejas agora pertencentes ao Estado «…que sejam retiradas da praça as casas de residência dos párocos das freguesias de Souzelas e Arzila, para serem destinadas às escolas destas freguesias»(395). Sendo difícil perceber a partir de quando é que começou a funcionar uma escola feminina em Souselas, sabe-se que, pelo menos durante a década de 20 e parte da de 30, funcionava numa casa, cuja renda era suportada pelo Estado. Em Dezembro de 1934, e perante a intenção de dotar Souselas com novos edifícios escolares (perspectivava-se a construção de 20.000 novos edifícios em todo o país) registou-se que a escola feminina «…funciona em casa de renda, faltam muitos dos mais elementares requisitos pedagogicos, pois não só o material didático é reduzido e ordinarissimo, como até a própria sala de aulas nada tem que, higienicamente, a recomende para o fim a que foi destinada, pelas suas deficientes condições de arejamento e iluminação»(396). 6.2. Uma escola para ambos os sexos Em Souselas, manifestou-se cedo o desejo em dotar o lugar com casa escolar para os dois sexos. Quando, em Janeiro de 1918, o Presidente da Junta informa

José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1904-1919, Edição da Biblioteca Municipal de Coimbra, Coimbra, MCMLII, P. 109 (395) Id. P. 181 (396) «Escolas e Ensino» In Diário de Notícias, 23/12/1934 (394)

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o Inspector do Círculo Escolar de Coimbra, sobre a recepção dos 1.000$00 destinados à reparação da escola masculina, sugere que se vendam as casas onde funciona a escola masculina e a casa da residência do professor – de cuja transacção previa um rendimento de 600$00, cuja verba adicionada aos 1.000$00 já destinados a uma escola, poderiam financiar a construção do edifício pretendido. Havia, inclusive, já um sítio pensado; «no passal junto á egreija», cuja cedência podia o Governo alcançar da Comissão Jurisdicional dos Bens da Igreja(397). Para a concessão deste subsídio, muito contribuiu a intervenção directa da grande personalidade da freguesia, Alberto Álvaro Dias Pereira. A ele caberia a responsabilidade pelo maior passo dado, até então pela freguesia, rumo a uma escola para os dois sexos. A história vem relatada na acta da JF do dia 18 de Maio de 1919, quando o regedor, Joaquim Grilo Ferreira dá conta que solicitara a Dias Pereira, na altura Governador Civil de Braga «…para fazêr um pedido ao Ex.mº Ministro da Instrução, afim de ser concedido um subsidio de seis contos de reis, para construção de um edifício escolar para hesta freguezia, de os dois sexos, melhoramento tão importante para esta terra e de que tanto carecemos»(398). Esse requerimento, importantíssimo do ponto de vista da história da educação na freguesia, dá-nos uma visão do estado da situação por volta de 1920. O documento, transcrito para acta da junta, data de 2 de Abril de 1919: «Ex.mº Sñr. Ministro da Instrução Publica. O regedor da freguezia de Souzélas, concelho de Coimbra, interpretando a vontade dos habitantes d’esta freguezia, vem perante V.ª Ex.ª mostrár o abandono, a que ésta freguezia tem sido votada relativamente à instrucção. No lugár de Souzellas há duas escolas. A escola do sexo feminino funciona numa cáza de renda, sem condições higiénicas de espécie alguma, pela renda da qual paga o Estado 50$00. A escola do séxo masculino acha-se instalada numa cáza do Estado mas préstes a desábár, tal é o estado em que se encontra, sendo um perigo para as crianças, que a frequentam, o entrár em tal edifício. Nestas condições, sendo certo que o Governo da Republica, hoje mais do que nunca, se acha representado por quem está disposto, a bem servir o paiz e a instrução, ouzo pedir a V.ª Ex.ª Ilustre Ministro da Instrução Publica que se digne concedêr um subsidio de 6:000$00, para a construção de um edifício escolar nesta freguezia, para os dois sexos, melhoramento de que tanto caréce»(399).

(397) (398) (399)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, Fl. 4v. Id. Fl. 13v. A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, Fls. 13v.-14

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Os tempos eram de grandes necessidades educativas, e resposta vinda da Repartição das Construções Escolares foi encarada com naturalidade: «…com vista de se achár esgotada a verba destináda á construção dos edificios escoláres, no actuál ano económico, seja incluido o pedido de V. Ex.ª na lista das escólas a subsidiar pela vérba de 5:000:000$00, que brevémente, será regulamentada». A nova escola, localizada onde hoje se situa o mercado da Vila de Souselas, estava já em funcionamento em Março de 1928, pois a junta delibera «… anunciar a venda da cantaria que serviu a um portão da antiga frontaria da Escola de Souselas e com o produto da venda concluir o pagamento das despesas feitas na nova frontaria da Escola»(400). Recebidas as propostas em carta fechada, aceitou-se o valor da única recebida; a de António Tintim no valor de 120$00. Nesta escola, tal como na da Marmeleira, funcionaram cursos nocturnos. Iniciativa apoiada pelo município fornecendo, nos finais de 1932, 500$00 para a compra de candeeiros de petróleo. No início do ano escolar de 1936, parte do edifício onde funcionava a escola do sexo feminino entrou em ruínas. Comunicado o facto pelo director escolar do distrito ao município, este delibera na sessão de 22 de Outubro «… pedir autorização para que as aulas funcionem provisoriamente na escola do sexo masculino e encarregou o Vereador Senhor Evaristo Pacheco Rodrigues de procurar adquirir terreno para a construção de um edifício escolar»(401). Sendo urgente encontrar uma solução para a continuidade do ensino na freguesia, e renovado o pedido para a construção de um novo edifício escolar pelo vereador Abel Mendonça em Junho de 1943, tomará o município a dianteira do processo; a 11 de Dezembro de 1947 pede ao Governo a construção de uma escola mista na freguesia de Souselas dentro do Plano dos Centenários(402). Pretensão que não mais se abandona, e é “agarrada” pelas entidades envolvidas. Na reunião de câmara de 20 de Dezembro de 1951, toma-se a decisão de expropriar 2.000 metros quadrados de terreno, no valor de 10$00 por metro quadrado, para construção da dita escola. Em consequência daquela decisão, no dia 23 de Setembro de 1952 lavra-se escritura de aquisição do dito terreno (contrato de compra e venda) pela qual o município adquire por 20 contos e via expropriação amigável «…diversas parcelas de terreno com a área total de dois mil metros quadrados, no sitio de Traz das Eiras, ou Pedaço, limite e freguesia de Souzelas, para implantação e construção do edificio escolar de Souzelas, ao preço de dez escudos cada

A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 7v. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 145, 1936-1937, Fl. 77 (402) José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 143 (400) (401)

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metro quadrado»(403). Foram testemunhas no acto Arménio de Jesus e Cunha e Fernando Correia Umbelino. Aquelas parcelas correspondiam, na realidade, a 4 lotes com diferentes tamanhos pertença dos seguintes outorgantes: José Simões Calhôa, natural da freguesia de Souselas e Maria da Conceição Morais (Lote A); Augusto Simões Morais, proprietário, natural da freguesia de Souselas, morador em Sargento-Mor (Lote B); Francisco Duarte Leite, casado com Rosa da Encarnação Morais, natural da freguesia de Torre de Vilela e residentes em Sargento-Mor (lote C) e Manoel Simões Duarte, proprietário, natural da freguesia de Torre de Vilela (Lote D). O novo edifício escolar de Souselas, inicialmente apenas destinado ao sexo feminino, foi inaugurado a 14 de Dezembro de 1952, tendo a sua construção sido acompanhada de perto por uma comissão e pela JF presidida por Adriano dos Santos Silva. Aquele dia foi de festa, nele marcando presença o Presidente da C.M.C. (Brigadeiro Cordeia Cardoso), o Governador Civil (Dr. Eugénio de Lemos), o Director Escolar (Prof. Bernardo Rodrigues) o “Rancho Infantil Souselense” e muito povo. Recebidos na escola masculina pelos membros da dita comissão, os convidados tinham motivo especial para ali se reunirem: «…deslocaram-se a Souselas onde foram presidir á inauguração de um novo e magnifíco edifício escolar, destinado ao sexo feminino (…) Depois das crianças das escolas e o “Rancho Infantil” terem entoado o hino “Maria da Fonte”, o Sr. Governador Civil procedeu à inauguração do novo edificio cortando a fita simbólica entre prolongados aplausos da enorme multidão»(404). Seguiu-se a sessão solene, onde as principais figuras usaram da palavra, entre as quais a professora da nova escola, D. Clarisse do Céu. A finalizar e antes do tradicional “copo de água” organizado pelas “senhoras de Souselas”, houve lugar à actuação dos mais pequenos: «As crianças das diferentes classes recitaram em seguida mimosas poesias impregnadas de patriotismo e fervor religioso». O novo edifício escolar de Souselas seria finalizado em 1959, dentro do Plano de Construções Escolares levado a efeito pela Delegação das Escolas Primárias dependente da D.G.E.M.N. / M. O.P. Um plano que obedecia a critérios rigorosos, como os relativos a conceitos higiénico-pedagógicos e que foi implementado como resposta às necessidades crescentes da população escolar do país. A escola seria entregue à C.M.C., ainda naquele ano, e deixou de desempenhar a função para que fôra criada em tempos recentes, sendo actualmente a sede da Tuna Souselense (foto 49).

(403) (404)

A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 53, 1952-1953 «Inauguração de um novo edifício escolar em Souselas» In Correio de Coimbra, 2 Janeiro 1953, P. 8

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Quanto ao velho edifício escolar, viria abaixo, na sua maior parte, no ano de 1968, sendo mandado demolir por completo, pela junta de freguesia em Maio de 1973, transportando-se a pedra aproveitável para depósito no «baldio da Ponte da Murta»(405). Conhecemos, com bastantes limitações, alguns dos professores que exerceram na Escola Primária de Souselas a partir de 1907 e até 1947(406): • 1907/1912: Elvira Ferreira das Neves Eliseu (escola do sexo masculino); • 1913/1914: Elvira Ferreira das Neves Eliseu (sexo masculino) e Virgínia Ferreira (sexo feminino); • 1915/1916: Olimpia Barros de Campos (Sexo masculino) e Virgínia Ferreira (Sexo feminino); • 1917: José Pires da Fonseca (sexo masculino); Virgínia Ferreira (sexo feminino); • 1918/1928: Manoel Mendes dos Santos (sexo masculino); Virgínia Ferreira (sexo feminino); • 1929/1939: Arthur Taborda de Moraes (sexo masculino), Maria Amelia Taborda (sexo feminino); • 1940/1944: Maria Amélia Taborda e Silvina R. Coimbra; • 1945/1947: Silvina R. Coimbra; • 1957: José Pereira da Silva • 1958/1959: Saul Maria da Conceição (?) • 1966: Júlio Duarte Morais 6.3. Na Marmeleira Sabemos, por informação registada à posteriori, que «Foi criada, no lugar da Marmeleira, concelho de Coimbra após a implantação da Republica, uma escola para o sexo masculino que funciona em cáza arrendada pelo Estado, a quál não tem as condições higiénicas necessarias para tál fim, nem habitação para o professor»(407). Como se sabia que o Governo iria mandar construir vários edificios escolares nas localidades onde não existiam, e se reconhecia urgência neles, a Comissão Administrativa da Junta de Freguesia de 1922 pediu ao Ministro da Instrução Pública que concedesse um subsídio de 6.000$00 para construção de casa própria para a escola e habitação do professor. Em Dezembro de 1938, a C.M.C. concedeu autorização para instalação de energia eléctrica na escola da Marmeleira, a qual seria na realidade um posto escolar. Na década seguinte, registamos a atenção permanente do vereador Abel

(405) (406) (407)

A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, Acta de 305/1973 Anuário Comercial de Portugal, Vol. II, 1908-1960 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926 Fls. 15-15v.

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Mendonça que, entre Março e Junho de 1943, intervém por 3 vezes nas sessões camarárias; primeiro para assinalar um conjunto de povoações carecidas de escolas onde incluiu a Marmeleira) e, por último, para proferir uma exposição sobre o estado de ruína da escola da Marmeleira do Botão «… já abandonada por professora e alunos, que se transferiram para o antigo posto escolar»(408). Nos tempos próximos, jogou-se o futuro escolar da Marmeleira, o qual parece estar hipotecado em Setembro de 1957, quando o município assume que dada a dificuldade na aquisição de terreno para a escola primária «…pede-se para a escola a edificar ali fosse erigida em Torre de Vilela»(409). A notícia deve ter feito soar o alarme logo que foi conhecida por terras marmeleirenses e souselenses, de tal modo que em Novembro e Dezembro o município analisa a expropriação amigável de lotes de terreno para edificação da escola, dada a oferta feita por três proprietários rurais da zona. A escritura de doação dos terrenos necessários, realizou-se a 21 de Junho de 1958, sendo Presidente da C.M.C. o Dr. Moura Relvas (1º outorgante no documento). Os doadores (2º outorgantes) foram: Sebastião Pedro, agricultor e sua mulher Maria Ferreira dos Reis, doméstica, ambos residentes na Marmeleira; Maria da Conceição Diniz, viúva de António Ventura de Campos, doméstica e residente também na Marmeleira; e Marcelino de Carvalho e sua mulher. A área total dos terrenos perfazia 1200 M2 e foi avaliada em 8.400$00, aceitando o município a dita cedência «…para implantação e construção do edifício escolar da Marmeleira, freguesia de Souzelas, deste concelho, no sitio do Tojal, limite do referido lugar da Marmeleira»(410). A escola, financiada e entregue à C.M.C. pelo Ministério das Obras Públicas/ D.G.E.M.N, principiou a ser construída em Abril de 1958, sendo inaugurada de forma apressada em 21 de Setembro, já depois de dois adiamentos. Um facto que motivou apreensão das gentes da terra, e que trouxe problemas acrescidos veiculados pelo correspondente local do Diário de Coimbra, em Novembro daquele ano: «Chama-se a atenção da Camara Municipal de Coimbra, para o facto de apesar de ter sido oficialmente inaugurada (…) o novo edificio escolar desta localidade, as duas salas de que se compõe ainda não estarem em funcionamento, devido à falta de mobiliário e outro material didáctico (…) Lembramos, também, que não foi ainda colocada no edifício a haste-suporte da bandeira nacional que, a nosso ver, já ali devia estar quando da inauguração,

José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P.63 (409) Id. P. 462 (410) A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 58, Fls. 18v.-21v. (408)

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o que certamente não aconteceu devido à maneira precipitada como tal inauguração foi organizada sendo, talvez, até, extemporanea»(411). Foi possível recolher os nomes de alguns dos professores da Escola Primária da Marmeleira a partir de 1915: (412): • 1915/1916: Eduardo dos Santos Marcello (escola do sexo masculino); • 1917/1918: Manoel de Almeida Santos Costa (escola do sexo masculino); • 1929/1936: Armando d’Almeida (escola mista da Marmeleira); • 1937/1944: Dália A. Ramos Pereira (escola mista, Marmeleira); • 1945/1949: Maria Generosa Lopes (Marmeleira); • 1950/1956: Carlos Nunes de Almeida, Clarisse do Céu, Maria Generosa Lopes; • 1957: Arminda de Morais, José Pereira da Silva, Leónia Fernandes Correia; • 1958/1959: Arminda de Morais, Leónia Fernandes Correia; • 1960/1961: Arminda de Morais, Fernando Martins Anacleto e Leónia Fernandes Correia; • 1962/1963: Leónia Colaço e Leónia Fernandes Correia; • 1963/1964: Leónia Fernandes Correia O edifício foi remodelado em meados dos anos 80 do séc. XX. Situa-se na Rua João M. P. Gonçalves, n.º 44 (estrada que liga a Marmeleira a Souselas). Compreende 2 salas de aula, 4 pequenas casas de banho, 1 pequena sala de apoio e 1 refeitório, inaugurado a 15/09/08 (fotos 50, 51 e 52). 6.4. Sargento-Mor A recomposição da história da vida escolar neste lugar, reveste-se de especial dificuldade dado que, à semelhança de outros temas, é prejudicado pelo facto de pertencer a duas freguesias, de concelhos e distritos diferentes. Sabemos, no entanto, que a 13 de Maio de 1948, a C.M.C. deliberou em reunião ordinária expropriar, amigavelmente, terrenos para construção de uma escola. A escritura celebrou-se a 20 de Novembro de 1948, sendo presidente do município Alberto Sá de Oliveira. Pelo valor de 5.850$00, José Simões Calhoa e sua mulher Maria da Conceição Morais, proprietários e moradores no lugar de SargentoMor, freguesia de Souselas, foram expropriados de «…uma parcela de terreno com a área de setecentos e oitenta metros quadrados, ao preço de sete escudos e

«Pede-se o funcionamento da Escola Primária de Marmeleira do Botão» In Diário de Coimbra, 9/11/1958 (412) Anuário Comercial de Portugal, Vol. II, 1916-1964 (411)

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cincoenta centavos cada metro quadrado, do prédio que os segundos outorgantes possuem no sítio da Cova ou olival da Couceira, limite do logar do Sargento-Mór, freguesia de Souselas, destinada à implantação e construção da escola primária do referido logar do Sargento-Mór, pertencente aos concelhos de Coimbra e da Mealhada, para cuja construção Augusto Morais, viúvo, do dito logar, cedeu a parte restante do terreno necessário para o edificio e suas dependências»(413). A escola primária foi electrificada durante 1958, tendo tido como professores(414): • 1959/1961: Alberto Carlos Neves de Oliveira e Maria dos Prazeres Barbosa Baptista; • 1962/1963: Alberto Carlos Neves de Oliveira, Maria dos Prazeres Barbosa Baptista, António Bentes de Oliveira e Júlio Morais; • 1963/1964: Alberto Carlos Neves de Oliveira, Armanda Zulmira Vasconcelos Cardoso, Júlio Morais e Maria dos Prazeres Barbosa Baptista (Sargento-Mor). Assim, e por volta de 1960, a Freguesia de Souselas dispunha de 4 estabelecimentos escolares de ensino primário: duas escolas em Souselas, uma na Marmeleira e outra em Sargento-Mor (foto 53). Na sua monografia, Nazareth refere o elevadíssimo nível de analfabetismo em Portugal anotando «…que a freguesia não possui um número desmesurado de analfabetos, mas este era até aos últimos dados, em valor absoluto, enorme»(415). Para fundamentar a sua observação, apresenta um quadro síntese, que exprime a elevada taxa de analfabetismo na freguesia, cujos valores definem, no entanto, uma curva descendente: 1900 (88,2%), 1911 (82,5%), 1920 (77,4 %) e 1930 (72,9%). Para esta redução de taxa, contribuíra de forma decisiva a construção de estabelecimentos escolares, que no entanto se apresentavam ainda com várias deficiências: «…de instalação muito medíocre e com deficientes condições higiénicas. Pátios de recreio não os há ou são de deminutas dimensões»(416). Mas nem só de escolas oficiais se faz a história do ensino na freguesia. Na sessão de junta, 25 de Julho de 1968, aborda-se o funcionamento em Souselas e numa casa particular, de um Curso de Formação Familiar Rural «…com especialização em costura, corte, bordados, puericultura, culinária e outros por iniciativa da Junta de Acção Social». Tratava-se de uma iniciativa da Junta de Acção Social, tendo a JF se associado ao projecto, contribuindo com o pagamento de um mês de renda.

A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 51, 1947-1950, Fls. 51v.-53 Anuário Comercial de Portugal, Vol. II, 1960-1965 (415) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 27 (416) Id. (413) (414)

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7. Caminho de Ferro O caminho-de-ferro foi, é e será uma mais-valia da Vila de Souselas. Apesar do imenso benefício que trazido pela linha férrea, a verdade é que a sua construção acarretou muitas situações desagradáveis. A 9 de Fevereiro de 1863, o município constatava uma dura realidade: «Toma-se conhecimento dos grandes prejuízos que as obras da linha férrea têm causado aos povos de Souselas e Botão»(417). Nos princípios de Abril de 1864, o governo decidiu «…que se abra ao uso do publico o caminho-de-ferro do norte, desde Taveiro e Coimbra atè Villa Nova de Gaia»(418). Entretanto já se havia publicado a Portaria de 31/3/1864 com o horário dos comboios, sendo Souselas a 3ª estação (sentido Sul-Norte) situada ao 14º quilómetro do troço construído, com passagem da composição marcada para as 7h25m, e preços estabelecidos; 1ª classe 260 rs, 2ª classe 200 rs e 3ª classe 140 rs. A inauguração oficial da estação de Souselas integrou-se, na cerimónia mais vasta da inauguração do Caminho de Ferro do Norte. O acontecimento foi marcado para o dia 10 de Abril de 1864, um domingo de grande festa na freguesia: «Haec dies, quam fecit. Dominus exultemus, et laetemur inea. Refiro-me ao dia de hontem, 10 do corrente, dia grande, de jubilo, prazer e alegria para os Souzellenses, e que igual nunca viram, nem imaginaram seus antepassados. Santificado e bello, pareceu feito por Deus para todos virem admirar a grande maravilha do século»(419). As palavras são de Jerónimo Parente que acompanhou com entusiasmo toda a cerimónia. O dia começara com missa na igreja, tocada pela Philarmonica de Cantanhede, seguindo depois o povo para a estação: «…e em breve as janellas das casas, e todos seus contornos estavam apinhados de gente. Ás 7 horas dadas apparece a machina nº 2, que em suas carroças, parecia trazer todos os cavalheiros e gente de Coimbra, e seus academicos; começa o enthusiasmo, e festejos, uns sahiam das carroças, outros entravam, abraçando-se (…) tocava a philarmonica de Cantanhede. O ceu nublou-se com o foguetorio, tanta era a alegria, e confusão, que nem occasião deu a darem-se os vivas, a quem são devidos; a pouca demora do comboio tambem foi causa. Passados poucos minutos partiu o comboio para o Porto com tanta velocidade como no ar voa o gavião. Deixou alguns estudantes e familias, que entre nós passaram esse dia (…)

José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1840-1869, Edição Comemorativa do Cinquentenário da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1972-1973, P. 384 (418) «Caminho de Ferro do Norte» In O Conimbricense, 6 Abril 1864, P. 1 (419) Jerónimo Lopes Parente - «Caminho de Ferro do Norte» In Conimbricense, 16 Abril 1864, P. 3 (417)

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Por todo o dia passaram 4 comboios, 2 para o Porto, e 2 vindos para Coimbra»(420). Neste artigo, Lopes Parente reinvindica o seu quinhão pelo estabelecimento do melhoramento na freguesia, antecipando a importância no presente e no futuro: «Trabalhei sempre quanto me foi possivel para o estabelecimento desta estação, para bem destes povos; nos poucos annos que me restarão de vida, farei o mesmo pela sua conservação, hypoteco-lhe minha pessoa, e casa. A molestia das vinhas, e oliveiras de que abundam estes sitios, ameaçam a conservação desta estação; porem cá temos para supprir sua falta as duas serras de Ihastro e S. Valentim, proximas da estação, que dão optima e abundante pedra de cantaria para toda a qualidade de obra; temos cal, e telha, que tudo pode chegar barato ao Porto, Lisboa e Inglaterra». São conhecidas as dificuldades porque passaram as obras executadas pela empresa construtora do caminho de ferro. Lopes Parente enalteceu a acção levada a cabo pelos chefes de secção, D. João de Sancta Maria e depois por D. Luiz Zapata, bem como os problemas especiais vividos no «monte de Valle de Cavallos». Mesmo depois da inauguração, as obras executadas continuavam a dificultar o trânsito de pessoas e bens, pelo que desde cedo as passagens de nível e estradas congestionadas emergiram como tema fundamental. A 22 de Setembro de 1865, a Administração do Concelho oficia ao município «…pedindo providencias para se tornar viável uma passagem de nível entre os Fornos e Souselas, tapada pela linha férrea. A Câmara oficiou ao advogado da Empresa dos Caminhos de Ferro, dando-lhe cumprimento da queixa e pedindo providências»(421). Assunto que irá subindo de tom, uma vez que o município coloca, em Fevereiro de 1866, a Companhia do Caminho de Ferro em tribunal, alegando «…ter inutilizado a estrada entre Fornos e Souselas com as obras da via» e, em Maio do mesmo ano decide «…representar a Sua Magestade sobre os abusos cometidos pela empresa dos Caminhos de Ferro do Norte, usurpando uma estrada pública em Souselas, e perante parecer do advogado, accionar aquela empresa»(422). Tratava-se aqui de uma temática altamente polémica e que motivou troca de argumentos e palavras duras, entre o advogado da empresa construtora dos caminhos-de-ferro portugueses, Alexandre de Seabra, residente em Anadia e o

Id. José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1840-1869, Edição Comemorativa do Cinquentenário da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1972-1973 P. 430 (422) Id. Pp. 437 e 442 (420) (421)

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souselense Custodio de Oliveira Nazareth, na qualidade de vice-presidente da Câmara Municipal de Coimbra, entre 1866 e 1867. De facto, o advogado dos caminhos de ferro viria a público, em Maio de 1866 , subscrevendo um edital, onde se declarava que as dividas da companhia «…têem sido todas satisfeitas sem que os interessados tenham recorrido aos tribunaes»(423). Reage Custodio Nazareth alguns dias depois: «Se s. ex.ª se quizesse lembrar quantas vezes para comigo tem responsabilisado a sua palavra de indemnisar o publico da usurpação da estrada feita ao kilometro 223 (…) de certo eu escusava dizer que são tantas quantas tem faltado. E lembrando-se do modo como tem tractado este negocio do publico, e os dos particulares, proprietarios de Souzellas, Marmeleira, etc., que pedem serventias e os valores das expropriações…»(424). Nazareth fora encarregado pela C.M.C. de resolver, amigavelmente, com o Dr. Seabra esta e outras situações. Mas este defende-se, também publicamente, da acusação. Que quando foi chamado a gerir a situação, no tempo da presidência do Dr.Antonio Seco «…encontrei pendentes com a camara de Coimbra várias questões (…) ninguem então me fallou na questão do ribeiro de Souzellas, que agora se agita (…) No Outono de 1865 é que fui prevenido pelo meu collega Rosado, que a camara de Coimbra insistia na concessão de uma nova estrada no ribeiro de Souzellas (…) se pretendia a mudança d’uma passagem de nível»(425). Acrescentava ainda que o local fora vistoriado, mas que ninguém da C.M.C. aparecera nesse dia, pelo que se decidiu reparar o caminho. A polémica durará mais algum tempo, e uma das últimas informações acerca do assunto mantém o tom de rispidez; a 7 de Junho de 1866, e perante o acordo proposto pela Companhia de Caminho de Ferro, o município delibera «Que se lhe respondesse que a maneira era entrar no cofre municipal com os 150$000 reis estipulados para a indemmnisação da suppressão d’estrada ao kilometro 223»(426). Havia desacordo de verbas, dado que a empresa construtora apenas estava disposta a avançar com 100$000, num imbróglio onde o Dr. Seabra acusava o Dr. Nazareth de «instigações». No entanto, o tema da estrada FornosSouselas, tornada intransitável pelas obras na via-férrea, acabará de forma favorável ao município. Em Dezembro de 1866, e entre diversos melhoramentos em execução na freguesia estava a «Estrada aberta de novo para substituir a que foi supprimida ao kilometro 223, pelo caminho de ferro, e para a qual obra deu a empreza do mesmo caminho, por convenção (…) 150$000» ((427)).

(423) (424) (425) (426) (427)

Alexandre de Seabra - «Ao Publico» In O Conimbricense, 22 Maio 1866, P. 4 Custodio Nazareth - «Communicados ao publico» In O Conimbricense, 2 Junho 1866, P. 3 Alexandre de Seabra, carta de Anadia, In O Conimbricense, 9 Junho 1866, P. 4 A.H.M.C. - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra, 1866-1868, Nº 89, Fl. 52 In O Conimbricense, 7 Dezembro 1866, P. 2

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Mas sem dúvida que os grandes problemas resultaram dos efeitos indirectos e indesejados da construção da linha férrea. De Coimbra até à Pampilhosa as questões iniciaram-se com a expropriação de terrenos, que muitas vezes acabavam de forma litigiosa: A 3 de Julho de 1875, Antonio da Costa Grilo e sua mulher Maria Esteves, do lugar da Marmeleira, pedem a citação de peritos para que meçam os terrenos expropriados, entrando em litígio «…com a Empresa Construtora dos Caminhos de Ferro, porque esta lhes usurpara terrenos com oliveiras no sitio da Cheira, limite daquela localidade, para a construção de taludes e rampas. Tinha pago apenas o terreno ocupado por dez oliveiras, quando na realidade se locupletara de uma grande parte do terreno para construção de trincheiras»(428). Por outro lado, o novo meio de transporte de pessoas e mercadorias foi dos primeiros problemas ambientais sentidos em Souselas, pois queimava muitos combustíveis fósseis e emitia gases nocivos. Realce-se no entanto, que o comboio trouxe para a região aspectos muito positivos. No início do séc. XX, os caminhos-de-ferro eram uma das principais entidades empregadoras da freguesia (vide capítulo da Demografia). O comboio tornara-se, então, um dos principais meios de comunicação da área, motivando reacções locais quando alterações ao seu ritmo se faziam sentir. Foi o que aconteceu em Fevereiro de 1927, levando a junta de freguesia a tomar posição: «Deliberou-se oficiar à Direcção Geral da Companhia dos Caminhos de Ferro Portuguêses a fim de que esta companhia restabelecesse os comboios nº 2001 e 2002 por serem de grande necessidade para êstes povos. Fez-se sentir o grave prejuízo ocasionado pela supressão de tais comboios e pediu-se que, a ser impossivel a satisfação do nosso pedido, lembravamos a grande conveniencia que tinhamos em que os comboios n.ºs 2101 e 2104 trouxessem atrelados uma carruagem para passageiros, visto êstes comboios já fazerem serviço de passageiros entre as estações de Entroncamento e Alfarelos»(429). Um pedido que seria prontamente satisfeito. A história do caminho-de-ferro na freguesia esteve, no entanto, intimamente ligada com o prejuízo feito na vida agrícola. A 4 de Fevereiro de 1964 dava entrada na JF uma solicitação de classe: «A pedido de um grupo de proprietários confinantes com o caminho dos canteiros (à passagem de nível do Ribeiro ao quilómetro 224) foi esta Junta verificar o estado intransitavel em que se encontra devido a um desvio das águas pluviais feito por funcionarios da C. P. sem autorização desta Junta e

Alice Correia Godinho Rodrigues – Pampilhosa – origem do lugar do entroncamento. Subsidio para o estudo dos Caminhos de Ferro Portugueses: a linha da Beira Alta (1882-1920), Câmara Municipal da Mealhada, 2006, P. 21 (429) A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 5 (428)

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reconhecendo impossibilidade de passarem carros de bois para as propriedades, foram autorizados os referidos proprietários a porem para lá atêrro com a condição de arranjarem o referido caminho»(430). Duraram décadas os problemas com as passagens de nível, acarretando inclusivamente, vários acidentes (alguns deles mortais). Contudo, caminhar-se-ia para uma solução eficaz e duradoura. Em Abril de 2009, a REFER anunciava o encerramento das duas passagens de nível da Linha do Norte que atravessam a freguesia, construindo um viaduto e um túnel, de forma a não perturbar a circulação rodoviária. Em Souselas existe uma estação com alojamentos para o pessoal, duas vias de comunicação e linhas de resguardo e uma de cais, prestando serviço completo de passageiros e mercadorias (fotos 54, 55 e 56). Sempre de grande movimento, apresentava em 1948 os seguintes dados: 74.800 passageiros saídos; 96 toneladas de mercadorias de grande velocidade recebidas e 98 expedidas; 955 toneladas de mercadorias de pequena velocidade recebidas e 1263 expedidas.

8. Abastecimento de água, luz, saneamento Hoje em dia ter luz, água e saneamento em casa parece-nos algo normal. Mas esta reconfortante realidade actual um longo percurso de dificuldades. Em termos de abastecimento de água podemos definir duas grandes etapas: o tempo das fontes e fontenários como forma de resolver o abastecimento à população e, posteriormente, o abastecimento ao domicílio. No lugar de Souselas, e ao nível das fontes, sabemos que em Outubro de 1919 o povo abriu uma subscrição pública para a sua construção, tendo o município concorrido com 100$00. Porém, muitos anos depois, a JF delibera solicitar da C.M.C «…a construção duma fonte no lugar de Souselas, pois que nêste lugar nunca existiu nenhuma e os povos tem sido obrigados a abastecer-se dum poço infecto que se encontro em local mais que impróprio para a saúde publica»(431). Este poço é o conhecido por «Matoito» e, ao pedido juntou-se um abaixo-assinado de pessoas do lugar, a corroborarem a solicitação. O Poço e Fonte do Matoito, passou a funcionar com auxílio de uma bomba e seria reparado em Dezembro de 1943, na sequência de um orçamento extraordinário. Passado algum tempo, chegam-nos informações mais precisas; a 22 de Agosto de 1935 o município aprovava para Souselas, projecto e orçamento para a captação de água e construção do respectivo fontanário, na soma de

(430) (431)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 32 A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 18

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40.849$08, solicitando a comparticipação estatal.(432). Obra que demorou algum tempo a concretizar-se, pois em Agosto de 1936 a CP autorizava que um tubo condutor de água pudesse atravessar subterraneamente a passagem de nível de Souselas, para abastecer o chafariz a construir. O novo chafariz nem sempre chegou para as necessidades. O Verão de 1943 foi especialmente difícil, pelo que no princípio de Junho a junta corre a reparar a fonte e o poço do Matoito «…em vista do ano sêco se prevêr que falte a agua no chafariz»(433), tendo-se entregue essa empreitada a António Vinagre. Nos anos sessenta, parte-se para a segunda etapa na história do abastecimento de água às freguesias rurais do concelho. E, em particular, o tema seria bandeira do vereador José Filipe, que na sessão de 17 de Fevereiro de 1955 «…insiste na urgência do abastecimento de água a Souselas», respondendo o presidente do município em Outubro de 1955 que, em Souselas, tal como Brasfemes e Vilela havia condicionantes técnicas e económicas. Neste jogo de troca de argumentos, volta a insistir o vereador quando «…enaltece as vantagens do abastecimento de água às povoações rurais, lamentando que a medida da tubagem de canalização para o abastecimento de água à Adémia não tivesse maior calibre, para permitir o abastecimento até Souselas»(434). Uma necessidade que a partir de Maio de 1956 passa a ser defendida pelo também vereador Francisco Cortês. Pelos finais de 1961, os estudos para abastecimento de água às povoações de Ceira, Souselas, Brasfemes e Eiras parecem gerar consenso; os problemas técnicos só seriam ultrapassados mediante a construção de um reservatório no Logo de Deus, etapa que por sua vez se inseria num problema de dimensão maior – a melhoria e ampliação da rede da cidade, então já em marcha. Entretanto, e enquanto o problema se não resolvia, o município decidiu beneficiar diversas fontes públicas no concelho, entre as quais a Fonte do Matoito em Souselas, trabalho entregue a 25 de Janeiro de 1963 a Arsénio Martins, empreiteiro de obras públicas, por 12.100$00(435). A iluminação pública chegou a Souselas em 1936, graças a um grupo de habitantes, constituído por Gonçalo Reis Torgal, Joaquim Ferreira e Jaime Eulálio Gomes «…que se organizaram em comissão para conseguir a construção da cabine»(436). Uma comissão que pagou do seu bolso a construção das obras da cabine de instalação eléctrica, sendo depois reembolsada pela junta de freguesia em Março de 1939. José Pinto Loureiro (Dir. de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular e síntese) - Anais do Município de Coimbra, 1920-1939, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 420 (433) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 22v. (434) José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P.352 (435) A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 66, 1962-1963, Fl. 82 (436) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 4 (432)

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Em Abril de 1949 a junta decide pedir à C.M.C. que a iluminação pública de Souselas fosse ampliada «..até à entrada do ramal da estrada da Marmeleira»(437). E, nos finais de Dezembro de 1964, e em face de um pedido dos habitantes dos bairros da Azenha e Calvário, a JF pede ao município a electrificação destas zonas habitacionais. Será, no entanto, um melhoramento que demorará o seu tempo e provocará o lamento da JF no balanço do ano de 1967: «No entanto não conseguimos apesar de todas as diligencias tomadas, que se fizesse tambem a electrificação nos bairros da Azenha e Calvario (…) nem tão pouco a iluminação publica e floorescente bem como a colocação de mais lampadas nas ruas de Souselas, melhoramento que tambem nos foi prometido»(438). A povoação de Souselas conhecerá preocupações acrescidas ao nível do fornecimento da água, a partir de meados da década de 60, fruto do desenvolvimento industrial. Nesse sentido, realizaram-se estudos de fornecimento de água, em Abril e Maio de 1965, solicitados pelo vereador Francisco Cortez, de que ficou encarregue o Serviço de Obras e Urbanização. Na realidade, a partir de meados da década de 60 o problema da água e da luz em Souselas passam a andar de mãos dadas: em Agosto de 1966, reúne-se a junta com o Presidente da Câmara para que o lugar seja beneficiado com electrificação e abastecimento de água canalizada. Não por acaso, no orçamento da junta para 1968 inscrevia-se uma verba para a construção de um chafariz na Ponte de Frades, no valor de 6 contos. E chegará um dia histórico para a freguesia. A 23 de Junho de 1968 Souselas celebrava uma tripla vitória, com a inauguração de um novo fontenário, ligação do antigo à rede de abastecimento, e a inauguração da luz eléctrica aos bairros do Calvário, Estreitas e Azenha: «Pelos presentes foi manifestado o regozijo de todos possuído, pela inauguração de um novo fontenario na Ponte de Frades e o abastecimento de água ligado com a rêde de Coimbra, ao mesmo fontenário e ao antigo chafariz e num futuro proximo aos domicilios e ainda a ligação e inauguração da luz electrica aos Bairros do Calvario, Estreitas e Azenha, cerimónias efectuadas no dia 23 deste mês, e a que presidiu o Ex.mº Senhor Presidente da Camara Municipal de Coimbra, acompanhado d’alguns Ex.mos Vereadores e Funcionarios Superiores da Camara e Serviço Municipalizados, as quais tiveram lugar em Tribuna montada junto ao fontenário da Ponte de Frades. Ali, uzaram da palavra varios oradores, entre eles o Presidente da Junta, Dr. Abreu Barreto, Dr. Joaquim da Conceição Ferreira, Paroco da Freguesia Padre Manuel Cristo Martins, Dr. Francisco Cortez, e por último o Presidente da Camara Engº

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 39 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 45v.

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Julio Araujo Vieira. Todos se referiram de maneira a salientar o valor da obra e o contentamento do povo, manifestado de forma muito calorosa, por terem finalmente conseguido o que tanto desejam, a água boa e a luz. Estas obras de abastecimento de água, foram feitas por administração directa da Junta, com a comparticipação do povo que se subscreveu com 25.000$00 e o resto coberto pela Camara e Serviços Municipalizados, num total que ultrapassou os 220.000$00. As obras foram começadas em quatro de Maio e concluidas a vinte e dois de Junho, véspera das inaugurações»(439). Uma grande satisfação que encerrava vários anos de angústias e dúvidas e onde a colaboração do povo foi decisiva: • Quando pelos finais de 1967 a junta reuniu com o Presidente da Câmara para lhe expõr directamente a necessidade de abastecimento de água a Souselas, Moura Relva foi sensível ao apelo, mas inquiriu os membros do executivo «… se esta Junta tinha possibilidades de mandar abrir as valas para os tubos de condução de agua desde a Fabrica S.I.A.F. Foi-lhe exposto que não tinhamos possibilidade de mandar abrir as valas, mas teriamos sim possibilidades de angariar do povo comparticipação para aquele fim»(440). • Não desistiu a junta do objectivo e, confiando plenamente no povo que representava, decidiu enviar propostas para a abertura de valas desde a SIAF atè à povoação a alguns empreiteiros e pedir, na sequência, a comparticipação de fundos populares. E como dispunha de algumas verbas adjudicou à “Sociedade de Mármores Calipolense” a cantaria para o fontenário a construir junto ao Bairro das Almas por 2.324$50. • Em Janeiro de 1968, e contando já com a comparticipação do povo, a junta solicita mais alguns subsídios ao Governo Civil e ao Vereador Francisco Cortês para cobrir as despesas de abertura de valas, fecho e reposição de bermas e instalação de canos de condução de água. • Na altura, havia um obstáculo adicional a ultrapassar; a falta de braços para trabalhar. Óbice contornado com a colaboração do poder religioso; anunciado com grande antecedência o dia 4 de Maio de 1968 para execução de obras fundamentais «… foi dirigida aos Rev._dos Parocos de Trouxemil, S. Silvestre e S. João do Campo, pedido por circular, para anunciarem à Santa Missa, de que esta Freguesia aceitava o serviço de trabalhadores ao preço minimo de sete escudos hora. Deu-se tambem conta de que o dinheiro prometido pelo Povo, como comparticipação para

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, Acta do dia 26/6/1968 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fls. 49-49v.

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abertura das valas, estava a ser recebido com regularidade»(441). Trabalhos que progrediram a bom ritmo, permitindo que tudo ficasse concluído antes de 10 de Junho. Estava dado um passo de gigante para que a água chegasse ao domicílio pela primeira vez na história da freguesia. Pelos finais de 1968 e, no seguimento de pedidos de subsídio para tal fim, começou a desenhar-se o esquema de abastecimento a implementar: «…prolongamento da distribuição de aguas aos Domicílios de Souselas, desde o chafariz até à Escola Primaria, pela rua nova, e ligação desde a casa do Senhor Engenheiro Nazareth até à entrada da estrada de ligação para o Alto das Eiras»(442). Sequência que será reafirmada quando o município subsidia a freguesia com 17.500$00 nos finais de Abril de 1969, destinados a instalação da canalização. Em Julho era grande o incremento dos trabalhos de instalação de canos para condução de água aos domicílios nas ruas de Traz das Eiras e Alto das Eiras, para os quais haviam concorrido «… com subsidios da Camara e comparticipação de alguns moradores, directamente interessados»(443). A fase seguinte do abastecimento de água ao domicílio, segundo pedido da junta aos Serviços Municipalizados em Março de 1973, consistiria no prolongamento do ramal desde a escola primária até ao Pereiro e Rua da Fonte, numa distância de 500 metros. Em Março de 1972, o município fazia um balanço do programa de iluminação pública da cidade; um verdadeiro sucesso dado a «notável redução de acidentes nesses arruamentos». Por esse motivo, decidiu-se na sessão de 3 de Março de 1972, que essa programação fosse extensiva à zona rural, definindo um plano de expansão avaliado em 1000 contos e onde desde logo se incluíram as povoações de Marmeleira do Botão, Souselas e Sargento-Mor(444). Na povoação da Marmeleira existia já em 1866 uma fonte que o município mandou reparar, certamente a Fonte Velha. Actualmente entulhada junto das Alminhas de 1775, tinha poieiras e degraus. Com o desvio das águas pelos dedtiladores (alambiques), fez-se a Fonte Nova. No que diz respeito à iluminação, a primeira notícia que colhemos extrai-se da acta da junta de freguesia de 2 de Janeiro de 1938, quando se resolveu «…ceder ao logar da Marmeleira 13 postes para a instalação electrica d’aquela povoação, a cortar nos pinhais dos baldios da Junta de Freguesia»(445), e que devem ter vindo do baldio de Vale Pardieira.

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 27/4/1968 Id. Acta 29/12/1968 Id. Acta 12/7/1969 A.H.M.C.- Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 250, 1972, Fl. 42v. A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 49v.

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Em 14 de Fevereiro de 1963, o município deliberou autorizar na Marmeleira «…montagem de armaduras de iluminação pública»(446). Na Zouparria do Monte, foi também aprovado pelo município o projecto de abastecimento de água à povoação a 24 de Abril de 1941, na soma de 44.964$00(447) Em S. Martinho do Pinheiro, e no orçamento para 1943, a junta aprovava a verba de 918$00 para os trabalhos de exploração de água no lugar. A povoação possuía desde alguns anos um fontenário. Porém, a JF é obrigada a intervir em Julho de 1960 dando conhecimento aos moradores «… da proibição de utilizarem o Fontenário de abastecimento de agua ao publico como lavadouro, devido ao perigo que representa para a saude pública»(448). Em Sargento-Mor, e a 27 de Outubro de 1957, foi inaugurada a iluminação pública e privada no lugar. Um acontecimento que atraiu entidades oficiais de freguesias, concelhos e distritos diferentes: da parte de Coimbra, marcaram presença o presidente do município Moura Relvas, o vereador Francisco Cortez e o engenheiro dos S.M.C., Manuel Magalhães; e, da parte da Mealhada, o presidente da edilidade, José de Melo Figueiredo. O relato feito pelo jornal da época é bem elucidativo de como tudo decorreu: «Estas entidades eram aguardadas pelo sr. dr. Fernando Cunha, grande impulsionador dos melhoramentos da região; Comissão de Melhoramentos local constituída pelos senhores Manuel Paiva de Almeida, Manuel Duarte Simões, Joaquim Paiva Neves, Julio dos Santos Madeira, Manuel Casimiro e Antonio dos Santos Madeira (…) As entidades citadas, acompanhadas de muito povo e por entre o estralejar dos foguetes dirigiram-se à cabine onde o senhor padre Luis Domingues, pároco da freguesia de Souselas, procedeu à benção, a cujo acto se seguiu a ligação da corrente eléctrica feita pelo senhor dr. Moura Relvas»(449) Uma cerimónia que contaria ainda com uma sessão solene realizada na escola primária e com o brilhantismo da banda da P.S.P. A electrificação dos lugares de Zouparria do Monte e de S. Martinho do Pinheiro foi uma conquista da junta de freguesia em 1965. Sendo de referir, no primeiro caso, os donativos dos moradores da Zouparria do Monte para a iluminação de que a C.M.C. tomou conhecimento em Julho de 1962(450) e,

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 213, 1963, Fl. 38v. José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 19; Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, N.º 150, 1941, Fl. 33v. (448) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 14 (449) José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P.469; «Foi ontem inaugurada a luz electrica em Sargento-Mór» In Diário de Coimbra, 28/10/1957, Pp. 6-7 (450) Paula França (nota histórica revisão e índices); Armando Carneiro da Silva (síntese e nota), Anais do Município de Coimbra, 1960-1969, Edição Câmara Municipal de Coimbra, 2008, P. 222 (446) (447)

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em consequência, a autorização para aquisição dos materiais, existente desde Fevereiro de 1963. Em Maio de 1965, realizou-se uma reunião entre os membros e o então presidente de câmara, o Eng.º Arújo Vieira. Apresentadas as razões, ficou a promessa da parte do município em ter a electrificação pronta até finais de Agosto daquele ano. Entretanto, muda a presidência da câmara e aquilo que poderia ter sido um passo atrás foi, na realidade um passo adiante; para grande satisfação de todos tal obra estaria concluída antes de…inícios de Agosto, daí que a junta tenha lançado um voto de louvor ao recém-empossado presidente de câmara: «Foi deliberado louvar a Câmara Municipal de Coimbra na pessoa do seu Ilustre Presidente Excelentissimo Senhor Dr. Moura Relvas, pela electrificação dos lugares de Zouparria do Monte e S. Martinho do Pinheiro, conforme petição que haviamos feito e exarado na acta do mês Maio do corrente ano»(451). Lagares foi dos últimos lugares da freguesia a reagir à necessidade básica de iluminação. De facto, na reunião de 26 de Fevereiro de 1969 a JF aprecia e decide reenviar para os Serviços Municipalizados de Coimbra uma exposição remetida pelos habitantes do lugar «…e assinada em primeiro lugar por António da Costa Paulino, na qual se pede a instalação electrica para a parte pertencente à freguesia de Souselas, já que a do lado de Brasfemes já lá a teem à mais de vinte anos».

9. Origem e crescimento da zona industrial de Souselas 9.1. A instalação das primeiras empresas Desde o século XIX que se conhecia a aptidão das serras de Ilhastro e S. Valentim para fins comerciais e industriais, designadamente, para o fabrico de boa cal. E, mais antigo ainda, quase imemorial, era a extracção de pedra de cantaria com que se fizeram muitas obras na região, incluindo a construção dos Gerais da Universidade de Coimbra. Estas pedreiras asseguraram trabalho irregular a algumas pessoas, fornecendo canteiros e lavrantes. Industria extractiva que também se detecta na Marmeleira, com antigas minas de caulino, que foram exploradas, por exemplo, pelas Fábricas de Cerâmica Lusitânia (foto 57). Nesta zona, e perto da desaparecida povoação de Carrimá, existiu uma mina deste tipo, compreendendo carris subterrâneos e vagões, que se diz iria até Santa Luzia.

(451)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 38

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Uma das primeiras informações sobre uma fábrica na zona de Souselas data de 1909. A 28 de Janeiro, a Comissão Distrital dava a necessária aprovação ao processo 79 autorizando a «… licença para estabelecimento de uma fábrica para serração de madeira na estrada dos Fornos a Souzellas, freguesia de Souzellas, concelho de Coimbra, em que é impetrante a Companhia Portugueza de Phosphoros; foi a commissão districtal de parecer que, em vista das informações das entidades competentes, constantes do referido processo, não vê inconveniente algum em que seja concedida a respectiva licença»(452). Uma breve análise ao processo que preparou esta decisão, revela alguns pormenores do estabelecimento industrial a criar pela dita companhia: compreendia «… um deposito de madeiras e uma officina semi-fixa de serração de madeira para caixotes», bem como o emprego de «duas locomoveis de alta pressão», sendo o processo conduzido pelo representante da empresa, Albano Gomes Pais, comerciante, residente na Rua dos Sapateiros (453). Alguns anos mais tarde, esta empresa seria notícia pelos piores motivos. A 6 de Abril de 1911, o Inspector de Incêndios comunica ao município que a Companhia dos Fósforos mandou entregar o donativo de 20$000 «…pelos serviços prestados num incêndio na sua fábrica de Souzelas e que a comissão paroquial local lançara na acta da sua sessão um voto de louvor à corporação dos bombeiros»(454). Outra unidade industrial implantada em Souselas, por volta de 1920, foi a firma de Eduardo Nogueira Seco Ld.ª, que conheceu ao longo dos tempos períodos de decadência e reacção. Dedicava-se à fabricação de rolhas e quadrados de cortiça. Quando atingia a sua máxima prosperidade seria atingida por um drama. Em meados de Setembro de 1935, e num Domingo, seria devorada por um violento incêndio: «O incêndio, declarou-se às 16 horas numa meda de cortiça, que em parte, já se encontrava enfardada aguardando, nos terrenos da C.P. anexos à estação a chegada de vagões de embarque, a fim de seguir para a Inglaterra. O fogo tomou tamanhas proporções que, apesar dos socorros prontos dos ferroviários e dos moradores da povoação não foi possível evitar que ele se propagasse a um armazem da União Expedidora, Lda., de Chelo, que continha uns 6 vagões de madeira de salgueiro pertencente aos srs. Manuel e Justiniano

A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital de Coimbra: Livro de actas das sessões da Comissão Distrital de Coimbra, 1908-1913, Fls. 36v.-37

(452)

A.U.C. – Fundo do Governo Civil: Processos de Licenças para estabelecimentos industriais, 19031916, cx. 45, Pasta 1908 (454) José Pinto Loureiro (Dir. de) - Anais do Município de Coimbra, 1904-1919, Edição da Biblioteca Municipal de Coimbra, Coimbra, MCMLII, Pp. 126-127 (453)

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Figueiredo, de Lorvão, e maquinismos diversos, destinados à indústria de fabricação de palitos, bem como 3 cascos e dois bidões cheios de azeite»(455). Segundo consta no artigo, a causa do incêndio fora a «faúlha de uma locomotiva», ascendendo os prejuízos a mais de 200 contos. Com esforço, evitou-se a propagação a várias casas no local e a uns toros de pinheiro, depositados nos terrenos da C.P. Porém, e apesar do envolvimento das corporações dos Bombeiros Voluntários e Municipais de Coimbra, bem como da corporação da Pampilhosa do Botão, o fogo destruiu os postes das linhas telefónicas, fazendo parar ou condicionar a circulação na via férrea, caso do comboio “Sud”. Apesar deste percalço, a empresa recuperou dos escombros funcionando até aos anos 50. A 03 de Julho de 1924 foi constituída uma sociedade relativa à firma Pacheco Sobrinho & Morais Ld.ª, com o capital social de 80.000$00, dedicada à moagem, massas alimentícias e bolachas(456). No entanto, foi na década de 30 que se deu o grande impulso industrial. E a primeira manifestação, ficou registada nas actas do executivo local com certo secretismo. A 20 de Abril de 1930 avaliara-se um requerimento da Companhia das Fábricas de Cerâmica Lusitânia, com sede em Lisboa «…em que se pedia a resolução de um assunto de interêsse para esta Junta e para a freguesia»(457). Deliberado estudar o assunto, o tema não volta à baila nos tempos próximos, o que parece significar que o mesmo tenha sido objecto de diálogo e negociações entre as partes. Por fim, na sessão de 11 de Maio, o assunto surge em forma definitiva, deliberando-se atender o pedido da companhia com as seguintes condições: «Primeiro – a Companhia das Fábricas Ceramica Lusitânia obriga-se a reparar a estrada que vai da Marmeleira para o Carqueijo, no troço compreendido entre a Marmeleira e as Almas do Caminho Novo, e a conservá-lo em bom estado durante a vigência dêste contrato; Segundo – A mesma Companhia poderá nos termos do seu requerimento, explorar nos terrenos desta Junta, situado no sítio denominado “Barreiro” limite da Marmeleira, as areias, caolinos e argilas que lhe convier, mas o mato e pinheiros continuam a ser propriedade desta Junta que dêles disporá como entender, obrigando-se a Companhia a avisar esta Junta com pelo menos trinta dias de antecedência do espaço que projectem explorar, a fim desta junta mandar retirar, se lhe convier, o mato e pinheiros que porventura existam nesses terrenos; Terceiro – a pagar-nos, a Companhia, a renda anual de cinquenta escudos durante a vigência deste contrato, cuja

«Grande Incêndio em Souzelas» In Correio de Coimbra, 14 Setembro 1935, P. 2 José Maria Amado Mendes – A Área Económica de Coimbra: Estrutura e Desenvolvimento, 18671927, P. 202, CCRC, Coimbra, 1984 P. 202 (457) A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 15v. (455) (456)

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duração mínima será de cinco anos, a começar em um do corrente mês de Maio e a terminar em um de Maio do ano de mil novecentos e trinta e cinco, podendo ser prorrogado…»(458) O presidente ficou encarregue de assinar o respectivo contrato que será modificado em Abril de 1935: «…na parte que diz respeito à exploração de caolinos, areias e argilas, continuando apenas a permitir-se que façam deposito dos materiais explorados nos terrenos da Companhia, confinantes com os desta Junta e bem assim a depositarem os entulhos provenientes das suas explorações nos terrenos baldios que ficam situados para baixo da estrada pública para regularização dos mesmos. Como de futuro fica a dita Companhia sem pagar a renda estipulada pelo contrato ficando sómente com a obrigação de reparar a estrada pública que sai da Marmeleira e passa junto aos referidos baldios»(459). Em 1940 estava em laboração a fábrica de rolhas Manuel Ferreira & C.ª(460) e, por volta de 1945, edificou-se em Souselas outra fábrica de serração de mármores, da firma Madeira de Castro Ld.ª. Além da secção de mármores tinha, por volta de 1950, uma outra de madeira e um pequeno forno de tijolo(461). Também em Santa Luzia, se instalou no final dos anos 40 outra serração, a Cordeiro & Gonzaga Ld.ª. A CESOL (Cerâmica de Souselas Ld.ª) foi outra empresa atraída pelas condições de Souselas (foto 58). Fundada em 1948 dedicou-se, inicialmente, aos seguintes sectores fabris: louça doméstica, refractários, grés, louça sanitária e azulejos. Em 1949 foi inaugurada pelo Ministro da Economia, contando então com 200 trabalhadores, e compreendendo uma área murada de 16.000 m2, com um edifício de 2 andares, ocupando a área de 4.000 m2, rodeado de 5 altas chaminés(462). A partir de 1968 assumiu os seus destinos uma nova gerência, que remodelou o sistema de fabrico, incidindo a produção nos sectores de louça doméstica e azulejo, paralisando primeiro os fabricos de grês e refractários e, posteriormente, a louça sanitária dada a fraca rentabilidade e o facto de não haver espaço para o lançamento de uma linha de fabrico(463). Na sequência do surto revitalizador da década de 70, a empresa construiu uma nova fábrica na Mealhada, destinada ao fabrico do pavimento, porque em Souselas não foi possível arranjar terreno. Id. Fls. 16-16v. A.J.F.S. – Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, Fl. 37 (460) Anuário Comercial de Portugal, 1941 (461) Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 59 (462) Id. P. 60 (463) Dados extraídos de historial anexo ao livro de actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976 (458) (459)

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Os números de 1976 mostram bem a pujança da empresa. Contava com 485 trabalhadores nas instalações de Souselas (mais 95 na Mealhada) e apresentava os seguintes valores diários da produção: azulejo (1700 m2 dia), louça doméstica (6500 peças dia) e pavimento (1.000 m2 dia). Em termos sociais dispunha de uma cantina fornecedora de géneros alimentares, instalações sociais com refeitório anexo e consultório médico com consultas diárias. Entre os trabalhadores desenvolveram-se actividades de carácter cultural, desportivo e recreio. Tiveram orquestra e equipa de futebol. No final de 1950 foi inaugurada, em Souselas, uma fábrica de Cal Hidráulica, de J. Nogueira & C.ª Ld.ª, utilizando as margas extraídas da exploração de pedreiras e calcáreos nas serras de Brasfemes e Ilhastro (foto 59). Em meados dos anos cinquenta entrou em funcionamento a fábrica de moagem de José de Almeida Júnior e, por volta de 1969 a fábrica de rolhas Santos & Coimbra Ld.ª (464) 9.2. O impulso dos anos 60 No meado da década de 60, o desenvolvimento industrial de Souselas exigia um reforço do abastecimento de água, dado o município ter concluído que no local «se estão a montar indústrias de vulto»(465). E, entre as diversas indústrias de vulto que procuraram e se instalaram em Souselas nos anos 60 a principal foi, sem dúvida nenhuma, a SIAF. Esta empresa fora constituída em Fevereiro de 1946, com a designação de Sociedade de Iniciativas e Aproveitamentos Florestais, S.A.R.L.-S.I.A.F e tinha sede em Lisboa. Na altura da sua constituição, a fabricação de aparite não fazia ainda parte dos seus objectivos negociais, que passavam pela «exploração de matas e venda de produtos extraídos das suas propriedades»(466), pelo que tinha como grande propósito mandar plantar choupos para aplicações industriais como matéria prima para o fabrico de fósforos de alta qualidade, que eram feitos pela Sociedade Nacional de Fósforos (fábricas em Lisboa e Porto). Nos finais da década de 50 a empresa começou, paulatinamente, a encaminhar-se para o reaproveitamento de materiais, iniciando-se a utilização dos desperdícios de madeira no fabrico de fósforos, para o que chegou a criar, em 1957, uma pequena indústria de aglomerados ao Beato, em Lisboa, fabricando mobiliário e materiais para a construção civil. A S.I.A.F. tornava-se a partir desta data, no primeiro fabricante de aglomerados, comercializados sobe a marca

Anuários Comerciais de Portugal, vol. II, 1954, 1960 Paula França (nota histórica revisão e índices); Armando Carneiro da Silva (síntese e nota), Anais do Município de Coimbra, 1960-1969, Edição Câmara Municipal de Coimbra, 2008, P. 333 (466) Sandra Rute Fonseca Gomes – S.I.A.F. de Souselas; uma fábrica pioneira no fabrico de aparite, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1998, P. 8 (464) (465)

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registada de aparite – nome que segundo parece surgiu de um desconhecido operário que manuseava as aparas de madeira. O sucesso da experiência lisboeta provocou aumentos na procura e produção, levando os seus responsáveis a pensarem na expansão do projecto, impulsionados pelo sucedido em 1958 na cidade de Bruxelas, onde a empresa havia ganho uma medalha de ouro com o fabrico de aparite(467). A região de Coimbra seria escolhida pelas excelentes condições oferecidas, nomeadamente as boas zonas florestais e de florestação (especialmente de pinho) e a existência de muitas fábricas de serração. E Souselas oferecia, a este nível e face a outras localidades evidentes vantagens; estava fora do perímetro urbano mas, simultaneamente, perto de Coimbra, tinha facilidades de vias de comunicação rodoviárias e ferroviárias e matéria-prima disponível na serrania envolvente. A zona ganhou imenso com a edificação da fábrica; absorvia mão-de-obra disponível e consumia a matéria-prima abundante, valorizando a terra e as gentes. Além disso, a instalação da unidade fabril acrescentou melhorias estruturais na sede da freguesia, obrigando a que o município abastecesse a zona com energia eléctrica e água a partir das redes públicas. O projecto foi cuidadosamente estudado pela Companhia Sueca de Fósforos (STAB), a empresa líder do grupo em que a SIAF se integrava, tendo-se investido na nova fábrica 100.000 contos, obrigando a aumento de capital(468). Numa área de 123.000 m2 nasceria, com projecto integralmente concebido por técnicos da empresa, uma das fábricas mais modernas do país, automatizada e com grande parte das máquinas e peças a serem executadas por oficinas mecânicas da região. Construída no tempo recorde de 10 meses, dispunha de uma área coberta de 7500 m2, com linha de fabrico, armazéns, oficinas de manutenção, controle de qualidade, escritórios, posto médico e instalações sociais(469). O acontecimento relativo à inauguração, extravasou tudo quanto ao nível de cerimónias públicas alguma vez se fizera na freguesia. O dia festivo foi marcado para 14 de Setembro de 1967 e, o pulsar do acontecimento, ficou historiado pelo executivo local: «Deliberou de colaboração com o Paroco da Freguesia Senhor Padre Manuel Cristo Martins, convidar o povo da freguesia, e solicitar das entidades patronais das Fabricas “Cesol”, Cortiça e Marmore, todo o pessoal que podessem dispensar para uma simples mas vincada manifestação à chegada a Souselas pela dez horas e trinta minutos de catorze de Setembro passado do mais alto magistrado da Nação Senhor Almirante Americo Tomaz, verificando-se que (467)

Id. P. 10

Sandra Rute Fonseca Gomes – S.I.A.F. de Souselas; uma fábrica pioneira no fabrico de aparite, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1998, P. 11

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Id. P. 12

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naquela manifestação expontanea do povo se reuniram cêrca de quatrocentas pessoas sendo cêrca de cento e cinquenta da Cesol, e oitenta das restantes. Por tal motivo não podemos deixar de registar o nosso mais vivo reconhecimento ao povo, e de forma especial o fazemos às entidades patronais daquelas Fabricas, dado que o nosso pedido por varias razões, foi feito apenas com quarenta e oito horas de antecedencia».(470) À data da fundação, a produção anual da fábrica, cifrava-se nas 20.000 toneladas, com 3 turnos diários e sistema de laboração contínua. Em 1974, a fábrica dava emprego a 48 trabalhadores, disponibilizava transporte aos seus trabalhadores do domicílio-casa e vice-versa, e possuía uma cantina para abastecimento do pessoal em géneros alimentares e domésticos, custeadas pela maioria dos trabalhadores em horário pós-laboral(471). A revolução dos cravos traria importantes alterações à SIAF. Perante a evolução político-social do país, os administradores de origem sueca abandonaram a gerência da fábrica. Na época, o seu capital social pertencia 54% ao Grupo S. de Fósforos (na maioria na mão dos suecos) e os restantes 46% a accionistas portugueses, sendo os maiores; o Grupo Espírito Santo e a Companhia de Seguros Tranquilidade. Depois do 25 de Abril o Estado interveio na empresa, passando o IPE a titular das acções do capital português, tendo-se nomeado um administrador pelos trabalhadores, assessorado por um administrador sueco. Situação que se alterou em 1977, com o administrador indicado pelos trabalhadores a ser substituído por outro, designado pelo Governo. No início dos anos 80 a empresa passava por dificuldades económicas tendo o Governo português vendido em hasta pública os seus títulos, em Outubro de 1982, que foram arrematados pelo emergente Grupo Espírito Santo. Houve grande agitação social na empresa, com reuniões constantes entre a administração e comissão de trabalhadores e entrega por estes de um caderno reivindicativo e realização de uma greve. O rumo da empresa mudaria em 1987, quando a S.I.A.F. foi comprada pelo grupo SONAE «…passando as suas fábricas, e entre elas a de Coimbra, a fazer parte de uma grande estrutura empresarial, que com esta empresa passava a deter cerca de 50% da produção nacional de aglomerados (…) Com a entrada para o grupo SONAE, a S.I.A.F. passa aproveitar muitos dos desperdícios resultantes de outras empresas do grupo, encontrando nelas alguns dos seus consumidores»(472).

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 48v. Dados extraídos de historial anexo ao livro de actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976 (472) Sandra Rute Fonseca Gomes – S.I.A.F. de Souselas; uma fábrica pioneira no fabrico de aparite, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1998, P. 16 (470) (471)

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Actualmente está sedeada nas antigas instalações da SIAF a empresa Ecociclo, Energia e Ambiente S.A. (foto 60). Trata-se de uma empresa que opera na área da gestão de resíduos, designadamente resíduos de madeira não contaminados, que são posteriormente encaminhados como matéria-prima na indústria do aglomerado de madeiras. Depois da inauguração da SIAF, o ritmo de implantação de indústrias continuou nos tempos seguintes. Ainda assim, em Novembro de 1968 o município concedia licença para a Fábrica de Cal de Coimbra, Lda., poder «…construir uma instalação fabril de cal hidráulica, no local denominado Fontes, freguesia de Souselas»(473). Uma área actualmente conhecida por Junqueira. 9.3. À entrada dos anos 70: A CIMPOR agita Souselas A conhecida fábrica de cimentos constitui, por si, não só um pólo de desenvolvimento de Souselas, mas também de toda a região (fotos 61 e 62). A instalação desta unidade fabril remonta ao princípio dos anos 70 e, o interesse da indústria cimenteira pela área de Souselas-Brasfemes, resultou da constatação da qualidade da pedra que a Fábrica da Cal começara a extrair, em 1969, no sopé da Serra do Alhastro. Esta área transformar-se-ia na pedreira em exploração pela Cimpor, da qual se têm extraído calcários e calcários margosos, com vista à produção de cimento. Um interesse pela pedra já revelado noutra altura, por exemplo com a pedreira das Fontes, na estrada de Souselas para Brasfemes. A entrada em laboração desta importante unidade cimenteira, trouxe consequências conhecidas para a freguesia: algumas de impacto positivo como a empregabilidade, a melhoria dos acessos, o desenvolvimento comercial da área envolvente, diversas contrapartidas sociais para a população…; mas outras, como a poluição ambiental e sonora, ou a queima de resíduos, são por demais conhecidas pelos impactos negativos que trouxeram à área envolvente. A 15 de Março de 1971, seria autorizado por despacho ministerial, a implantação de uma fábrica de cimentos em Souselas. Desde a primeira hora a questão da previsível poluição alarmou o povo e as autoridades locais, municipais e regionais. Tudo começou no Verão de 1971, quando deu entrada no Departamento de Obras da Câmara Municipal de Coimbra, uma queixa contra os envasamentos que a empresa andava a fazer em Souselas, sem que possuísse licença para tal. Um assunto que chegou à sessão camarária do dia 14 de Setembro de 1971, trazida pelo autarca que primeiro se interessou pelo assunto:

Paula França (nota histórica revisão e índices); Armando Carneiro da Silva (síntese e nota), Anais do Município de Coimbra, 1960-1969, Edição Câmara Municipal de Coimbra, 2008, P. 446

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«O Vereador Sr. Dr. Viriato Namora usando da palavra disse do muito interesse que lhe merece, bem como a toda a Câmara, todas as iniciativas com vista à industrialização e progresso da cidade e do concelho, manifestando, no entanto a sua preocupação pelas notícias vinda a público sobre a implantação de um importante complexo industrial na zona norte, entre Souselas e Brasfemes para a exploração e fabrico de cimento, pois os efeitos da poluição, em resultado dos ventos dominantes, podem constituir um perigo para a cidade. Que fazia o reparo não por possuir elementos técnicos precisos para assim abordar o problema, mas ùnicamente a servir de cautela quanto ao futuro, no sentido das necessárias diligências, evitando-se situações de facto, posteriormente sem remédio, o que lhe parece da maior gravidade. Em face do exposto estabeleceu-se um diálogo entre o Exm.º Presidente, o Sr. Vereador Dr. Viriato Namora e os demais Vereadores, todos se mostrando na verdade, apreensivos, ficando o Exm.º Presidente de estudar o assunto e esclarecê-lo numa próxima reunião, reconhecendo-se no entanto, o melindre do problema que obriga a ser conduzido com muito tacto, sem se deixar contudo de salvaguardar a defesa da cidade e da sua população»(474). Viriato Namora, vereador com o pelouro de Turismo e Assistência, era também piloto aviador amador, o que lhe conferia no seio da CMC uma grande vantagem; conhecia em pormenor os rumos de ventos dominantes na região (Noroeste/Norte), que em caso de poluição trariam para a cidade as nuvens de poeira e pó, provenientes da cimenteira. O assunto despertou, a partir de então, grande atenção e discussão entre a vereação coimbrã a quem cabia tomar importantes decisões. Durante um mês o vereador Francisco Cortez reflecte e prepara-se tecnicamente, apresentando na sessão de 19 de Outubro dois artigos científicos chamando a atenção para os malefícios da poluição, com base em estudos feitos no estrangeiro: um, extraído do boletim da Faculdade de Farmácia, colocando a tónica na «…fenomenal quantidade de silicatoz e sulfato de silício e alumínio, que projecta nas povoações e campos vizinhos, cerca de 15 toneladas para uma produção diária de 400 toneladas de cimento»; e, o outro de uma revista alemã onde se referia que a eliminação de gás fluorídrico pelas cimenteiras «..podem contribuir para um prejuizo da silvicultura e outras culturas, entre as quais, as forraginosas, que, por sua vez, têm um efeito nocivo sobre o gado, com elas alimentado»(475). A estes argumentos não reage o presidente do município, pois não havia nenhuma comunicação oficial veiculando a instalação de uma unidade fabril

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 248, 1971, Fl. 55v. Id. Fl. 74v.

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cimenteira em Souselas. Apenas circulavam informações dispersas, boatos na maioria dos casos. Porém, o caso muda de figura em Novembro de 1971, mês em que se reuniram na Câmara Municipal o presidente do município e os administradores da empresa de cimentos, os quais manifestaram, formalmente a intenção de instalar a tão propalada unidade fabril. O presidente, Júlio Araújo Vieira, dará conta das conclusões desta reunião à vereação, no dia 23 de Novembro: «A sociedade já está constituída, e tencionam apresentar, em breve, o projecto da instalação. Considerando os receios da poluição atmosférica, largamente debatidos por todas V.as Ex.ªs, em sessões desta Câmara, aqueles senhores informaram-me que a empresa, no estado económico do empreendimento, contou com a verba de 50.000 contos para eliminar a poluição, fazendo a recuperação dos produtos. Informei-os que, se houver a garantia duma fábrica limpa, a Câmara verá com muito agrado a sua instalação»(476). A articulação entre os poderes municipal-governamental, rápida e eficaz, antecipava-se a tudo e todos, pelo que na mesma sessão o presidente acrescenta que na véspera havia estado em Coimbra o Presidente da Comissão de Protecção do Ambiente, Engº Correia da Cunha, a quem a Câmara Municipal pedira colaboração e que levara elementos para estudo. Lisboa tomava a dianteira do processo. No amplo e discutido processo negocial, o município consegue em Março de 1972 um dos grandes objectivos, que o presidente se apressa a comunicar à vereação: «Tenho a honra de informar V.as Ex.as que recebi da administração da empresa Cinorte a comunicação de terem deliberado instalar a sua sede em Souselas, como fora prometido. Este facto constituía uma das nossas pretensões, que poderia facilitar a instalação futura, sem perder de vista os condicionamentos a que deve ficar sujeita a instalação duma fábrica de cimentos. Temos de tomar precauções severas quanto à poluição, procurando que esta unidade fabril seja um elemento de progresso e não perturbador do nosso crescimento económico»(477). Na mesma comunicação fica claro que Júlio de Araújo Vieira, sem motivos objectivos para duvidar, confia plenamente na administração da empresa, acreditando num futuro risonho ao nível económico e social: «Garantindo-se que essa fábrica de cimentos se transformará numa fábrica limpa, por meios convenientes, não se vêem motivos de preocupação. Temos de estar atentos e procurar uma garantia eficiente, quanto à eliminação de toda a poluição. Desde que este requisito seja satisfeito, facilitaremos tudo o que estiver ao nosso alcance para levar a bom termo o empreendimento.

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 249 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 250, Fl. 50v.

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A fábrica que se pretende instalar terá a produção de um milhão de toneladas de cimento por ano, o que vai aumentar a capitação nacional, tornando-a talvez a nível europeu. Esta capitação é um dos índices que servem para aferir do desenvolvimento económico do País». Na mesma reunião do executivo, a 10 de Março de 1972, chegariam ecos do modo entusiástico como a povoação de Souselas vira a instalação da empresa: «Foi grande a satisfação do povo de Souselas, quando teve conhecimento da instalação da nova unidade fabril que, mesmo antes de se construir, já viu valorizados os seus terrenos. Associo-me ao seu regosijo e proponho que se agradeça à empresa a deliberação de instalar a sua sede na freguesia de Souselas. Foi deliberado por unanimidade, agradecer à administração da empresa Cinorte a instalação da sua sede na freguesia de Souselas»(478). Apesar de um clima de aparente união e tranquilidade em torno do projecto da cimenteira, o vereador Viriato Namora mantinha as suas reservas e, em Maio, insiste nas preocupações acerca da poluição atmosférica, pedindo que a Comissão de Ambiente transmita à C.M.C. os resultados da sua consulta. Entretanto, a 2 de Julho de 1972, inicia-se a construção das instalações fabris. Num clima de certa concórdia, o ofício da Comissão Nacional do Ambiente é presente e analisado na reunião camarária do dia 7 de Julho, numa acta que tem o curioso título de «Complexo de Produtos de Cimento de Souselas». Tal comunicação não acrescentava, na realidade, nada de novo ao processo, concluindo que «…se deve procurar assegurar todas as garantias possíveis em relação ao futuro funcionamento da referida fábrica e, em especial, quanto aos inconvenientes da poluição»(479). A partir deste momento, o tema da cimenteira fracturaria a vereação em dois sectores ou correntes de opinião; de um lado, o Presidente do Município Júlio Araújo Vieira e alguns vereadores; do outro, os vereadores Viriato Namora e Campos Neves que nesta sessão logo reclamam «…atenção da Câmara para a necessidade de um acompanhamento cuidadoso sobre a aludida instalação fabril a fim de que a sua concretização não surja em circunstancias que, depois, nada se possa fazer, tornando-se, por isso, necessário tomar as devidas precauções antes dos factos consumados». O caldo ia-se entornando aos poucos, numa altura em que o Estado Novo era tudo menos permissivo a vozes contrárias. Mas, estes vereadores não desarmariam e, ainda no decorrer da reunião, conseguem que o município indagasse junto da DG dos Serviços Industriais se já tem o projecto da dita instalação

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Id. Fls. 50v.-51 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 251, 1972, Fl. 37v.

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e, que em caso afirmativo, fornecessem uma cópia do mesmo para apreciação. A desconfiança é tal que, em especial, pedem que a Cinorte informe por escrito «… ser cláusula de acordo, situar-se em Coimbra a sede do referido empreendimento industrial». Ia quente o Verão de 1972, mas as coisas sossegam um pouco na última reunião do executivo do mês de Agosto, com as anotações por escrito da Cinorte onde informava a C.M.C.: «…por proposta da sua administração, aprovada em Assembleia Geral, foi deliberada a transferência da sua sede para Souzelas, ficando a respectiva efectivação apenas dependente da construção dos edifícios necessários à instalação de todos os serviços»(480). Por outro lado, a Cinorte fornecia uma cópia da carta que enviara à Comissão Nacional do Ambiente onde descrevia, em pormenor, as medidas tomadas contra a poluição na fábrica, as quais respeitavam a lei portuguesa em vigor: «A Cinorte, perfeitamente consciente das suas responsabilidades, não se poupou a esforços no sentido de dotar a fábrica, que vai instalar, com os dispositivos de despoeiramento capazes de assegurarem um funcionamento sem incómodos para as populações das áreas confinantes. A sua instalação foi concebida de modo a dar cabal satisfação à exigências de legislações específicas em vigor nos países situados na vanguarda do progresso, onde cimentarias laboram mesmo dentro de agregados populacionais importantes»(481). Na mesma altura, também a Comissão Nacional do Ambiente (C.N.A) dava conhecimento ao município de que haviam recolhido elementos na fábrica de Port-la-Nouvelle, dos cimentos Lafarge, cujo funcionamento era considerado «exemplar» e, a partir do qual, estabelecia um paralelo com a Cimpor advertindo apenas para as avarias e desvios «voluntarios ou involuntários». E, para que os espíritos ainda mais se tranquilizassem, a Cinorte fornecia cópia de outra carta enviada à C.N.A., onde solicitava que se procedesse oficialmente às medições de deposição de poeiras na zona urbana de Coimbra, anunciando um futuro promissor: «Estamos crentes que as medidas solicitadas nos permitirão demonstrar futuramente que a entrada em laboração da Cinorte não contribuirá de forma alguma para um acréscimo da deposição de poeiras na referida zona»(482). Com estes argumentos e garantias, fornecidos por documentos e estudos, a Câmara Municipal de Coimbra abrandaria a vigilância sobre a empresa: «…se conclui estarem a ser conduzidos com o propósito de se acautelar devidamente os legítimos interesses de Coimbra no que respeita a poluição, e tendo ainda

(480) (481) (482)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 251, 1972, Fls. 76v.-77 Id. Fl. 77 Id. Fl. 77v.

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em atenção a oportuna intervenção legal dos departamentos oficiais, nomeadamente o Ministério da Economia, no processo de licenciamento desta unidade industrial, poderá pois prever-se que a instalação da fábrica de cimentos da Cinorte e o seu funcionamento terão em conta os interesses de Coimbra em todos os aspectos, nomeadamente o que respeita à poluição. Só assim, aliás, Coimbra e a sua Câmara Municipal concebem, desejam e aceitarão a fábrica de cimentos de Souzelas»(483). No terreno, porém, as coisas precipitam-se e sucede um inesperado golpe, denunciado pelo Chefe de Secretaria da CMC. Os trabalhos de construção arrancavam sem licença camarária e, a Companhia de Cimentos entregara na Camara um requerimento com a data viciada, no intuito de anular os efeitos da comunicação do vereador. A fiscalização do município vai ao terreno e sugere a notificação de embargo mas, sem o projecto ter sido legal e tecnicamente estudado, a Câmara Municipal concede uma autorização especial. Anunciado o começo da laboração para o primeiro trimestre de 1974, a C.M.C. delibera no mesmo dia e, por unanimidade, agradecer a transferência da sede da empresa para Souselas. E quando tudo fazia prever que a reunião de câmara se encerrasse pacificamente, Viriato Namora volta a fazer notar a apreensão que vinha sentindo: «…embora se esteja a verificar que se estão a envidar todos os esforços no sentido de se acautelar os perigos que possam adevir para o concelho com a construção da Cinorte, tem de se manter a posição rígida de se exigir que entidades responsáveis assegurem no processo de licenciamento que se encontram devidamente acautelados os perigos de poluição para o concelho e cidade de Coimbra»(484). O novo ano traria a construção dos envasamentos de algumas das instalações da empresa «sob sua exclusiva responsabilidade», que o município aprova sob proposta do seu presidente e justificada com a finalidade de «…não atrasar o andamento do complexo industrial, corresponder à ansiedade da industrialização do concelho e a ser coerente com as facilidades tantas vezes apregoadas nesta Câmara Municipal (…)»(485). Um primeiro momento de construção da unidade fabril, agitaria a pacatez da aldeia de Souselas, com o transporte de máquinas de grande peso e volume pela Estrada Nacional 336-3ª classe. Para tal, foi necessário alargar-se a dita estrada em cerca de 3 metros e no comprimento aproximado de 200 metros desde a Ponte da Murta até à antiga Sede da Junta, o que foi aprovado em

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Id. Fl. 78 Id. A.H.M.C. – Livro de Actas da Cãmara Municipal de Coimbra, Nº 253, Fls. 27v.-28

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reunião extraordinária de junta de freguesia do dia 5 de Janeiro de 1973, e que teve da empresa a compensação monetária de 10.000$00 «para serem empregados em melhoramentos da freguesia»(486). Após os trabalhos de transporte de materiais, 14 proprietários de Souselas enviam à junta um abaixo-assinado, em Abril de 1973, acusando a empresa do desmoronamento de uma parede suporte do caminho para o cemitério. Trabalhos que requereram uma autorização especial, em muito apoiados pelo presidente do município Júlio Vieira, mas que o vereador Namora engole a custo: «Julgo não haver razões para não aprovar a proposta do Exm.º Presidente, assente como fica, na mesma, que do facto não se podem deduzir quaisquer prévias tomadas de posição desta Câmara, em face da futura apreciação do projecto da Fabrica Cinorte. De resto, e como o respectivo projecto só entrou nesta Câmara em dezoito do corrente mês de Janeiro, não foi o mesmo ainda estudado, legal e tecnicamente, por forma a ser apreciado por esta mesma Câmara. É pois evidente que outro entendimento não poderia ser dado à autorização especial que acaba de ser concedida em relação aos envasamentos»(487). É facilmente perceptível como o assunto tocava particularmente este vereador. De tal modo que, em 9 de Fevereiro de 1973, apresenta aos seus pares uma informação técnica constando de 16 items ou seja; um conjunto de pontos a serem observados no funcionamento da fábrica e que em parte transcrevemos no apêndice. Tratava-se, na verdade, de um relatório técnico que incidia sobre os perigos da emissão de gases, poeiras, fumos e gases e medidas a adoptar para minimizar a poluição atmosférica. Um documento que lhe permitiu questionar o vazio existente: «Mas pergunta-se: Quem são as entidades fiscalizadoras? Quais são os seus poderes legais? Quais as possibilidades que a Câmara tem com o Governo Civil, como sucede em Espanha, de mandar paralizar a fábrica uma vez ultrapassados os níveis aceitáveis?». Conseguia, assim, a margem de manobra necessária para que uma proposta sua fosse analisada antes da aprovação do «projecto Cinorte». Uma proposta aceite por unanimidade, que consistia na recolha de elementos, na realidade numa melhor definição das variáveis em jogo (índices de poluição, fiscalização, competências dos organismos públicos): «1º - Índices Toleráveis (poeiras, gases, e outros elementos de poluição) confirmados pela Direcção-Geral de Saúde); 2º - Identificação das Entidades Fiscalizadoras e legislação respectiva;

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 5/1/1973 Id. Fl. 28

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3º - Competência da Câmara ou do Governo Civil, para actuação imediata em defesa da saúde pública, uma vez ultrapassados os limites fixados pela Direcção-Geral de Saúde. Proponho ainda que, se antes de findar o prazo que fixa a aprovação automática, a Câmara não dispuzer dos elementos indispensáveis para decidir, o Exm.º Presidente prorrogue aquele prazo, pelo tempo necessário, usando a faculdade prevista no número dois, do artigo doze e artigo vinte e dois, ambos do Decreto-Lei número cento e sessenta e seis de mil novecentos e setenta»(488). À voz de Namora associa-se a dos vereadores Campos Neves que embora «reconhecendo o interesse da fábrica para o desenvolvimento do concelho (…) quanto à poluição se devem tomar todas as medidas de segurança», e a do Engº Santos Rosa para quem o problema da poluição «…não pode circunscrever-se apenas ao ambiente, mas também aos efluentes do complexo que se instala». Mas seria a voz do Dr. Soares Coimbra a mais decidida perante os elementos reunidos: «Sinto o dever e o direito de não ser considerado responsável pela invasão de poeiras e de poluição de toda a sorte que o funcionamento dessa fábrica possa trazer, se não se tomarem, em tempo, as medidas eficazes para o evitar. Não me parece que essas medidas estejam neste momento efectivamente asseguradas e, enquanto isto suceder não posso dar o meu voto à aprovação do projecto das instalações da fábrica em causa». Suspendida a aprovação do projecto, o ambiente volta a ficar tenso no seio da vereação, motivando muita discussão e troca de argumentos. De facto, somente três meses depois é que voltamos a ter notícias importantes sobre o assunto, que regressa à ordem do dia da vida camarária. Estamos a 11 de Maio, e sobe à sessão de câmara o pedido de licenciamento, que seria largamente discutido. Nesta reunião, o presidente do município pega no assunto com «pinças». Começa por destacar a preocupação da C.M.C. em aumentar o seu parque industrial, referindo o esforço na aquisição de terrenos nas zonas industriais de Souselas, Taveiro e S. Martinho do Bispo, discurso que lhe permite focar o que na realidade ia no seu espírito: «Isto vem a propósito da instalação, em Souzelas, duma fábrica de cimento que poderá funcionar sem prejuizo da população, desde que os efluentes sejam tratados e as poeiras reduzidas ao mínimo admissível. Esses mínimos, embora fixados, serão aqueles que não prejudiquem a vida das pessoas, dos animais e das plantas. Desde que estes mínimos estejam garantidos, controlados por equipamento apropriado (…) entendo que devemos conceder a licença para a instalação dessa fábrica de cimento. Alguma poluição deve trazer, mas se não

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Cãmara Municipal de Coimbra, Nº 253, Fls. 42v.-43

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constituir prejuizo para a zona de influência será o preço da riqueza e do grande número de empregos que irá trazer ao concelho e à Região. A poluição é o preço do progresso, mas desde que sejam tomadas as providências necessárias»(489). Uma solicitação que motiva a intervenção, uma vez mais, do insatisfeito e atento Viriato Namora (homem de forte ligação ao campo da saúde e assistência). Apresentando os argumentos que já mencionara na reunião de Fevereiro, conclui que continua a faltar «a competência da Câmara ou do Governo Civil para actuação imediata em defesa da Saúde Pública». E, numa atitude de grande coragem e sem precedentes, expõe e anuncia aos presentes: «Temos o dever de aceitar e acatar as leis. Mas temos o dever de, não as desrespeitando, interpretá-las no seu aspecto prático, objectivo e, se possível, exemplificado. É por isso que não nos satisfaz a legislação invocada, tantos os casos em que ela não funcionou ou funcionou tardiamente. Assim, à falta de legislação que possibilite a actuação imediata da Câmara ou do Governo Civil, só um entendimento entre qualquer destas Entidades, a Direcção-Geral dos Serviços Industriais e Direcção-Geral de Saúde, baseado em relatórios com a frequência julgada conveniente, pode garantir aos habitantes de Coimbra a defesa deste seu legitímo e elevado interesse – o direito à Saúde. Enquanto não existir essa disposição oficial, não está satisfeita a exigência que a Câmara determinou em nove de Fevereiro de mil novecentos e setenta e três. Nesses termos, não posso dar voto favorável ao licenciamento solicitado, porque não quero ficar responsabilizado pelos prejuízos que, seguramente, advirão para a saúde pública, se não existir um instrumento legal expedito, garantindo a imediata detecção de anomalias, e a sua também imediata correcção. Entretanto lamento que, para além dos embasamentos autorizados, a fábrica seja já uma realidade»(490). Além de Viriato Namora, também Campos Neves e Soares Coimbra solidários com a declaração do colega, dão voto desfavorável à aprovação do projecto. Porém, a proposta apresentada pelo presidente municipal foi aprovada por maioria de votos. A fábrica de cimento da empresa Cinorte iria avançar, embora dentro de alguns condicionamentos (Anexos, Documentos 1 e 2).

10. A Casa da Junta Não sabemos onde funcionava a sede da junta até Abril de 1944. De facto, no dia 20 desse mês a Câmara recebia o pedido da Junta de Freguesia de

(489) (490)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Cãmara Municipal de Coimbra, Nº 254, Fls. 66v.-67 Id. Fls. 69-69v.

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Souselas para adquirir uma casa no lugar, por 10.000$00, para nela se instalar «…dizendo que não tem casa propria nem qualquer outra onde convenientemente possa reunir»(491). Esta casa (que já não existe) localizava-se na Rua do Mercado, em frente da papelaria, e tornou-se a sede da junta até 1970. Para além de sede da junta, a casa acolheu outros serviços: 1.º posto de telégrafo, 1.º posto de correios e posto médico. Uma sala do edificio serviu de sede do Club Recreativo de Souselas, quando o município autorizou a 12/04/1945 a cedência de «uma ou duas dependencias na casa da sede da junta para funcionamento do Club Recreativo»(492). Um curioso negócio que se concretizou no arrendamento feito pela JF, a 1 de Julho de 1945, ao Grupo Recreativo Clube Souselense, de uma dependência do edifício enquanto a junta reuniria numa outra sala do mesmo. Porém, e em meado do ano de 1970, o edifício começa a dar sinais de ruína, pelo que, durante o Verão segue o pedido para que técnicos da Secção de Obras da C.M.C. o vistoriem. Age rapidamente o executivo, inscrevendo como um dos grandes objectivos para 1971 a compra de um edifício para ampliação da sede da junta. Na verdade, em 29 de Maio de 1971, a JF tomava conhecimento da análise feita pela Comissão de Técnicos enviada pela C.M.C. «…a qual foi de parecer que a antiga séde da Junta deve ser abandonada por ameaça de derrocada (…) dado o prazo de trinta dias para o efeito. Como esta antiga séde está condenada a demolição para alargamento projectado da estrada Nacional Nº 336-3.ª, terá este Corpo Administrativo de aguardar a possibilidade da construção de uma nova séde»(493). Encontrará a JF uma solução provisória, ficando instalada nas dependências da Delegação de Souselas do Centro de Assistência-Materno-Infantil do Doutor Bissaia Barreto, no Bairro das Almas. Decisão tomada depois de uma reunião com o Dr. Viriato Namora - Administrador da Comissão Instaladora daquele centro – em que se acordou oficializar o assunto por escrito: «O pedido de autorização será feito com validade até ao final do ano corrente, ou antes, caso se consiga casa de renda para o efeito, e sem dispendio de qualquer verba pela sua utilização, excepto gasto de luz, se fôr exigido»(494). Quanto à velha sede, seria demolida em 1972, dado o perigo de derrocada. Uma acção importante concretizada a expensas da empresa Cinorte. Reunirá a junta de freguesia pela primeira vez na sede provisória, a 30 de Junho, ali se mantendo até à mudança para a antiga Escola Primária, quando

José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 71 (492) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 30 (493) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 29/5/1971 (494) Id. (491)

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esta foi transferida para o actual edifício. Da antiga escola primária, hoje ocupada pela Tuna Souselense, a junta seria transferida para o actual edifício construído já em tempos democráticos. E, foi ainda no tempo de validade do velho regime, e na sessão de junta de 30 de Julho de 1973, que o executivo aceitou a doação de um terreno para esse fim: «Aceitam-se 230 metros quadrados de terreno destinados á construção da sede da junta de freguesia oferecido pelo Excelentissimo Senhor Coronel Alexandre Mendes de Almeida e sua esposa Excelentissima Senhora Dona Maria Fernanda Mendes de Almeida, em local já demarcado que confronta pelo nascente, sul e poente com terrenos dos doadores e pelo norte com o Baldio da Ponte da Murta»(495). Talvez pelo calor da revolução, a verdade é que esta doação de parte da Quinta das Almoinhas, não foi avante. Muitos anos depois, o doador chegou a enviar uma carta à junta de Freguesia de Souselas, datada de 26 de Fevereiro de 1981, onde considerava sem efeito a promessa de doação, por até aquela data não ter sido contactado. Responderá a JF no mesmo sentido, informando o doador em Março do mesmo ano: «Não temos conhecimento nem nos arquivos desta Junta consta nada sobre qualquer doação que V.ª Ex.ª fazia na quinta dos Almoinhas de terreno para a sêde da Junta em 1973 ao Sr. Barreto, pelo que consideramos sem efeito tal prometemento de doação»(496). Tratava-se de m grosso erro cometido pelo executivo.

11. Correios e telecomunicações Ao nível das comunicações, Souselas foi durante muito tempo um lugar mal servido. Já em 1758 se dizia «…o correyo de q’ se serve he o de Coimbra q’ dista desta terra legoa e meya». Só na segunda metade do séc. XIX, o panorama das comunicações começou a desanuviar-se; em 1870 criava-se a Estação Postal de Souselas. Mais tarde, e já no novo século, inaugurou-se a 14 de Maio de 1933 (um Domingo), uma cabine telefónica. Um acto importante a que assistiram o presidente e o secretário da C.M.C., o Tenente Valério (secretário particular do Governador Civil) e o director dos correios do distrito. A sessão solene decorreu na escola do sexo masculino e o copo de água em casa do doutor Sousa Machado (facultativo municipal). A inauguração fez-se de forma simbólica:

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975 A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta)

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«Dirigiram-se depois para a cabine telefónica, que foi inaugurada pelo sr. Alves Ribeiro, com uma chamada para o sr. Presidente da República, que se encontra no Buçaco, atendendo o seu secretário particular, a quem o sr. Director dos Correios deu conta da inauguração…»(497). Em 1941, a Estação Postal de Souselas passou à categoria de Posto de Correio, Telégrafo e Telefone. Uma evolução positiva que conheceria novo episódio a 12 de Junho de 1949, quando a JF toma importante decisão: «Deliberou comunicar á Circunscrição Técnica dos C.T.T. de Coimbra que mediante parecer favorável da Camara Municipal, cede a titulo precário, um compartimento do rés-do-chão da sua sede para nele ser instalada uma estação telefonica semi-automatica, sem prejuiso, porém, para os serviços já instalados no edificio»(498). Por despacho de 30/09/1957, o posto foi elevado a Estação de Correios, Telégrafo e Telefone de 3ª classe. Outro passo importante, e que certamente contribuiu para o desejo em se construir novo edifício, mais condigno com a função a desempenhar. Para tal, valeu a benemerência do casal Lino Santos e D. Maria da Piedade Fernandes Santos, residentes na América do Norte, que mandaram construir para arrendar aos C.T.T., o edifício que se veio a inaugurar numa sexta-feira, 6 de Março de 1959 (fotos 63 e 64). Uma decisão fundamental e devidamente assinalada na “plaquete” distribuída no dia da inauguração: «A importancia crescente do comércio e industria locais era de si suficiente para reclamar a criação de uma moderna estação de correio em substituição do antigo posto. Reconheceram-no há muito os CTT quando, em 1945, aqui tentaram criar uma estação regional, o que então não foi viável por impossibilidade de se obterem instalações convenientes. (…) Melhoramento notavel, se considerarmos que o velho posto executava simples registos e distribuição de correspondencia, dispondo apenas de dois distribuidores, que percorriam a freguesia de Botão, Brasfemes, Trouxemil, Torre de Vilela e parte de Barcouço»(499). Ao acto compareceram importantes individualidades: Correio-Mór (Engº Couto dos Santos), Presidente da C.M.C. (Moura Relvas) também representando o Governo Civil e o Ministro das Comunicações; Chefe da Circunscrição de Exploração dos C.T.T. da Beira Litoral, Comandante da P.S.P. (representado pelo Tenente Galhardas), inspector Sachetti (da P.I.D.E), pároco da freguesia

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«Em Souzelas na inauguração de uma cabine telefónica» In Gazeta de Coimbra, 16/5/1933, P. 8 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 47 «Foi ontem inaugurada a Nova Estação dos Correios de Souzelas», In Diário de Coimbra, 7/03/1959, P. 1

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(Luís Domingues, que benzeu o novo edifício), e o presidente da JF (Adriano dos Santos Silva). Discursaram o Correio Mór e o Presidente da C.M.C., tendo este último cortado a fita simbólica, a que se seguiu a entrega das chaves ao presidente da JF e um “copo de água” aos convidados e presentes, tendo a festa sido animada pela Banda da P.S.P. A cerimónia de inauguração da 142ª realização do «Plano de Instalação e Reinstalação das Pequenas Estações de Provincía», mereceu honras de abertura dos principais jornais da região: «Vestiu ontem as suas melhores galas a freguesia de Souselas, a bem dizer paredes meias com Coimbra. (…) O pavimento das artérias foi tapetado de verdura, ornamentaram-se as fachadas dos prédios, e aquelas pessoas que tinham colchas, estenderam-nas ás janelas, o que emprestou no conjunto da pitoresca localidade uma fisionomia cheia de cor. (…) Estralejaram os foguetes, trocaram-se saudações, as crianças das escolas lançaram pétalas sobre os visitantes, tendo-se organizado um cortejo que se dirigiu ao novo edificio dos correios, e no qual se incorporaram alguns rapazes de capa e batina»(500). Esta nova estrutura constituiria um êxito na freguesia, de tal modo que, a 10 de Fevereiro de 1963, a JF decide enviar ao Correio-mor «…um telegrama em que se pede que seja criado mais um giro de correio na Estação dos C.T.T. de Souselas, a fim de satisfazer as reclamações de diversas povoações, que ainda não são servidas com distribuição domiciliar»(501).

12. Campo de jogos A 5 de Fevereiro de 1967, a junta de freguesia delibera «.. fazer-se a compra do terreno onde se encontra o actual campo de footeball à Ex.m.ª Senhora Dona Maria Candida Pacheco Rodrigues, pela importancia de 20.000$00, e nomear com os poderes necessarios para fazer a escritura de compra o seu Presidente»(502). Este campo foi arrendado ao Club Recreativo de Souselas a 2 de Outubro de 1967. A JF e o clube reuniram-se para tornar a infra-estrutura acessível a todas as colectividades da freguesia: «De comum acordo deliberou-se facilitarem

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Id. Pp. 1 e 7 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, Fl. 26v. Id. Fl. 44v.

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a utilização do campo aos grupos desportivos dos lugares da freguesia, sempre que não necessitem da sua utilização»(503). A 27 de Agosto de 1969 a junta aceitava a proposta de José Ferreira Morais para cedência de uma faixa de terreno com vista à ampliação do Campo de Jogos pelo lado Norte, com a largura de 5x115, total de 575 m2 por 10.000$00(504). Do acordado se lavrou escritura no último trimestre de 1970. Em sequência o Campo de Jogos da Freguesia seria terraplanado e vedado.

13. Arranjo urbanístico dos lugares Este tipo de melhoramento resultava, por norma, de orientações vindas do poder municipal. No caso de Souselas, a primeira notícia parte de um órgão estranho à freguesia. Um facto normal pois em jogo estava o repartido lugar de Sargento-Mor: a 30 de Julho de 1959 a Câmara Municipal da Mealhada comunicava ao município coimbrão «…que foi tornada obrigatória a caiação dos prédios da povoação de Sargento-Mor, sugerindo que a Câmara de Coimbra tome igual iniciativa quanto à parte da povoação que pertence ao concelho de Coimbra»(505). Não sabemos se a medida terá influenciado a JF de Souselas mas, a verdade é que em Maio de 1962, solicita ao Presidente de Câmara «…para os proprietários de prédios urbanos procederem ao arranjo e caiação das frentes que confinem com as ruas publicas»(506). Porém, as juntas de freguesia do concelho de Coimbra de finais dos anos 60 e princípios dos anos 70 foram, talvez, das mais bem preparadas que alguma vez existiram no concelho. Uma formação humana e, nalguns casos, técnica também, que em muito ajudou a melhorar o aspecto das nossas aldeias, numa altura em que Portugal começava a ser procurado por muitos turistas. Nesse sentido se deve compreender a decisão tomada na reunião de 27 de Setembro de 1969, e que foi reproduzida em editais: «Confirmar aos habitantes de Marmeleira, a autorização recebida da Camara por solicitação desta Junta, para caiação, pintura e pequenos arranjos nos predios daquele lugar, nos meses de Setembro, Outubro e Novembro, sem necessidade de licença, com base no arranjo e alcatroamento da estrada da Marmeleira e dentro do lugar».

Id. Fl. 48v. A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 27/8/1969 (505) José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 552-553 (506) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 23 (503) (504)

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14. Souselas começa a transformar-se: novos bairros e moradias O parecer emitido pela junta de freguesia, em 29 de Outubro de 1969 e enviado para a C.M.C., apesar de simples e sucinto encerra, em si, o princípio de uma nova era em termos de habitação. Naquele dia votara-se favoravelmente a construção de uma moradia na Estrada do Alto das Eiras, pedida por Francisco Morais Marques. À semelhança do sucedido noutras freguesias, a área urbana tende a expandir-se em redor dos núcleos primitivos de povoamento. E podemos mesmo definir dois tipos de edificações; as moradias e os bairros para indivíduos carenciados. No que toca às moradias, verifica-se que algumas estradas haviam sido abertas para em seu redor elas se edificassem. Tal foi o caso da Estrada SargentoMor-Quinta de Lagares, aberta em 1968 e onde em princípios de 1970 «… já existem moradias e projectos para outras»(507). A 14 de Outubro de 1969, a C.M.C. aprovava para a freguesia uma proposta muito importante: «Esta Câmara já tomou compromisso de adquirir terrenos nesta freguesia, denominados Calvário, que se destinam à construção de casas para indivíduos economicamente débeis. Porém, a quase totalidade destes terrenos deve ser vendida em lotes de cerca de 250 m2., a preço fixo e baixo, somente a indivíduos de limitados recursos económicos, não podendo ser vendidos dentro de curto espaço de tempo»(508). Desta decisão nasceria o Bairro do Calvário. Uma nova zona habitacional que, no entanto, trouxe grandes problemas ao nível da infra-estruturação. Em Agosto de 1970, os Serviços de Águas e Saneamento da C.M.C. estimavam em 34 contos o custo para abastecimento de água ao bairro, ao mesmo tempo que inquiriam a JF acerca do montante da sua comparticipação, bem como dos moradores do bairro. Responde o executivo que, apesar da falta de disponibilidade, podia assumir: «… a responsabilidade e deligencias com o atravessamento de canos pela passagem de nivel do Caminho de Ferro, ao Km 225,4; recrutar pessoal para abertura e tapamento de valas, até ao montante de 5.000$00, importancia da contribuição dos moradores e posta à disposição desta Junta»(509).

(507) (508) (509)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 28/2/1970 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 244, 1969, Fl. 40v. A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta 29/8/1970

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15. Diversos pequenos (mas grandes) melhoramentos Coisas simples, como a construção de um paredão na margem direita do Rio de Souselas, de que a junta obtém apoio do Ministério do Fomento em Dezembro de 1917 ou a construção de aquedutos para escoamento das águas pluviais em vários locais – foram pequenos mas relevantes melhoramentos que se estenderam para as outras povoações. Na Marmeleira, anotamos a torre sineira para a capela e um lavadouro (1952). Em meados de 1964, o Ribeiro do Resmungão foi regularizado e sistematizado com construção de paredões. Em Sargento-Mor, os melhoramentos apontavam para a protecção aos peões. Em Fevereiro de 1960, o município recebia uma numerosa comissão de moradores do lugar solicitando «…a construção de uma passarela para assegurar ás crianças o acesso à escola local, sem que tenham de atravessar a Estrada do Porto, uma vez feito o seu desvio projectado»(510). Petição que a C.M.C. vota, unanimemente, reencaminhando-a para o M.O.P. Em Julho de 1969, concederam-se subsídios à Junta de Freguesia para a condução de água do chafariz para o lavadouro da Zouparria do Monte(511).

B. Da Revolução de Abril aos alvores do século XXI 1. As grandes necessidades da freguesia na transição de poderes Em Setembro de 1974, a C.A. da Junta de Freguesia de Souselas procedeu a um levantamento das necessidades mais urgentes e sentidas pelos diversos lugares que a compunham. Esse processo, permite fazer um curioso diagnóstico da situação por alturas da passagem de testemunho entre dois regimes. As necessidades não satisfeitas, mas reclamadas no passado, misturavam-se com as esperanças no futuro. Estas necessidades tornar-se-iam os princípios norteadores da actividade dos próximos executivos. No respeitante a Souselas, a primeira das necessidades apontava para a construção de um edifício para sede da junta de freguesia, pois o anterior havia sido demolido por ameaçar ruína iminente. Uma solução que se queria abrangente pois, à data, existiam em Souselas quatro entidades que funcionavam em casas

(510) (511)

Ver Diário de Coimbra, 26/02/1960, P. 5 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 243, 1969, Fl. 54

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alugadas (Casa do Povo, Instituto Maternal, Caixa de Previdência e Junta de Freguesia) as quais «…não possuem o minimo indispensável de condições de trabalho nem de conforto, sugeria-se a ideia de se entrar em contacto com os mesmos e, conjuntamente com a junta e a Câmara, procurar uma solução que servisse as quatro entidades»(512). Em termos de iluminação e electrificação pública pedia-se a reestruturação e ampliação da rede, a qual desde os seus primórdios, em 1936, «nunca beneficiou de quaisquer melhoramentos». Em especial, solicitava-se a iluminação pública de três estradas; Alto das Eiras, do Cemitério e Souselas-Brasfemes. No que dizia respeito ao abastecimento de água ao domicílio solicitava-se, à semelhança da iluminação, a reestruturação e ampliação da rede. Anotava-se a falta de pressão nas zonas altas, com «semanas sem água» e pedia-se a distribuição do precioso líquido ao domicílio, nos sítios da Moenda e Matoito, onde os moradores já haviam feito uma colecta de 10 contos. Ao nível do saneamento do lugar sede, pedia-se a implementação de uma rede apropriada de esgotos considerando «absolutamente necessária a deslocação dos técnicos da Câmara, para estudar o problema in loco» (513). De fora do levantamento não poderiam ficar a construção e/ou reparação de vias rodoviárias: ruas do lugar, construção da Estrada do Alto das Eiras (fora aberta em Junho de 1967 com máquinas da C.M.C. mas os trabalhos ficaram por aí) sendo «…imperiosa a sua conclusão dado o movimento que a mesma hoje possui», reparação da estrada que serve o cemitério, construção da Estrada Matoito-Moenda na extensão aproximada de 600 metros. Os pedidos relativamente a Souselas concluíam-se com a solicitação de melhoramentos no Campo de Jogos, propriedade da junta - alargamento, terraplanagem, vedação e balneários – e com a implementação da recolha de lixo. Da Marmeleira, chegavam os seguintes pedidos de melhoramentos: distribuição de água ao domicílio, reestruturação da electrificação e iluminação pública com alargamento da rede existente, construção de rede de esgotos, reparação do lavadouro e fontenário, alargamento do cemitério. Ao nível rodoviário reclamava-se: o arranjo dos caminhos no interior do lugar e a reparação de diversos; Caminho da Quinta, Caminho da Fonte este «…de dificil acesso ao fontenário ali existente e conhecido por Fonte Velha». As solicitações do lugar de S. Martinho vinham no mesmo sentido: construção de estrada para ligação ao lugar a Zouparria, o arranjo de caminhos no interior da aldeia, a construção de lavadouro público, a distribuição de água ao domicílio e o arranjo do largo.

(512) (513)

A.J.F.S. - «Necessidades mais urgentes na Freguesia de Souselas», 1974, Fl. 1 (Processo) Id. Fl. 3

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Na Zouparria, o povo sentia preocupações semelhantes pelo que pedia; a reestruturação da electrificação, a reparação do Fontenário e, a reparação das ruas da aldeia e dos caminhos de acesso às propriedades agrícolas. Quanto a Sargento-Mor, a unificação administrativa do lugar integrando-o na Freguesia de Souselas foi considerada, desde cedo, como o grande benefício a satisfazer pelas autoridades. Ao nível das necessidades básicas o levantamento apontava no mesmo sentido dos demais lugares: a criação de uma rede de distribuição de água ao domicílio ou, em seu lugar, de um fontenário central que servisse toda a população, a construção de lavadouro publico e a construção de uma rede de esgotos. Porém, e à cabeça vinha algo simples mas importantíssimo: a construção de uma ponte passadeira sobre a E.N. do Porto «a fim de servir as crianças que têm de vir a escola e prevenir possíveis acidentes mortais»(514). Um pedido satisfeito com a colocação da passagem superior para peões nos finais de 1983, princípios de 1984 e que actualmente permanece a cumprir a sua função.

2. A Infra-estruturação básica da freguesia: um processo lento, mas gradual, de melhorias A falta de uma rede de esgotos em Souselas foi seleccionada, pela Comissão Administrativa de Souselas de 1975, como um dos maiores problemas locais. A 5 de Maio de 1980, a JF informava os S.M.C. da necessidade de um projecto de rede de saneamento por questões higiénicas e de saúde pública: «Como no lugar de Souselas, já existe há bastantes anos água ao domicílio e não tem rêde de saneamento, origina que as ruas estejam transformadas em pântanos, pelas águas das casas de banho, de lavagem de roupa e do que sai das fossas depositando-se nas valetas, provocando maus cheiros e focos de infecção, muito especialmente durante o verão, o que tem dado lugar a grandes protestos da população contra o estado deplorável em que se encontram as ruas. Como a Junta de Freguesia deseja acabar globalmente com tal situação, que já se arrasta há bastante tempo e devia já estar solucionado, visto que numa terra com água a domicílio devia ser imediatamente dotada de rêde de esgotos, para não acontecer o que de mau aqui se está a passar, pede para que êsses Serviços deliberem com urgência a autorização para ser elaborado o projecto por esta Junta, o que logo foi intenção da mesma ao tomar posse, tendo até já entrado em contacto com o Snr. Presidente da Camara para tal fim»(515).

(514) (515)

A.J.F.S. - «Necessidades mais urgentes na Freguesia de Souselas», 1974, Fls 4v.-5 A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta)

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O estudo prévio da rede de esgotos, no lugar sede da freguesia foi elaborado pela Tecnocentro em 1980. Enquanto os trabalhos não arrancaram, o povo foi tomando conhecimento das implicações da implementação da rede de esgotos. E foi na análise do projectado que se levantou alguma polémica em torno da localização da fossa asséptica, contra a qual reclamou junto dos S.M.C., em Julho de 1981, um dos comproprietários do terreno, o Sr. Henrique de Queiroz Nazareth depois de ter enviado uma carta à JF datada de 12 de Maio onde justificava e manifestava a sua discordância: «…que o lugar escolhido pela Junta não me parecia o mais indicado, uma vez que iria prejudicar uma unidade agrícola de apreciável potencialidade económica e solicitei que fossem estudadas soluções alternativas»(516). Por ofício dos S.M.C., a JF foi informada nos finais de Agosto de 1981 que o novo projecto da estação de tratamento dos esgotos do lugar de Souselas estava pronto e «…feito de acordo com a quantidade de habitantes existentes neste lugar» Contudo, demoraria algum tempo o início do processo até porque não abundavam os recursos financeiros. Assim, e de acordo com o Plano de Actividades para 1982, o município afectou 3 mil contos para obras de saneamento em diversas povoações das freguesias rurais, incluindo Souselas. Assim, apenas a 11 de Outubro de 1982 a C.M.C. homologou a deliberação tomada pelo C.A. dos S.M.C em adjudicar à “Empresa de Construções Quinteiro & Simões, Ld.ª” a execução da obra «Construção da Rede de Esgotos Domésticos de Souzelas – 1ª fase», por 6.528.841$80. e poderes para celebração escritura(517). E, ao falarmos de saneamento e de esgotos não poderemos deixar de referir a higienização da freguesia. Nos inícios de 1981, a freguesia solicitara o fornecimento de contentores de lixo aos Serviços Técnicos-Especiais do município, os quais respondem por comunicação de 17/2/1981 «como necessário proceder à recolha, com um carro tipo urna dos Serviços de Higiene», às segundas e quintas-feiras. E que se forneceriam mais recipientes plásticos dado o «aglomerado populacional ser já bastante grande, mas principalmente por existirem 2 fábricas com grandes cantinas donde provem quantidade apreciável de lixos com percentagem elevada de matéria orgânica».(518) Ao nível da electrificação, o município aprovou em Agosto de 1975 a empreitada de remodelação das redes de baixa tensão em Souselas, S. João do Campo e Casas Novas, firmando-se acordo de adjudicação da empreitada com a empresa Isolux Ldª em Setembro do mesmo ano. Nos finais de 1977, a

(516) (517) (518)

A.J.F.S. - Correspondência Recebida, 1981 (pasta) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 288, 1982, P. 86 A.J.F.S. - Correspondência Recebida, 1981 (pasta)

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JF disponibilizava-se a comparticipar monetariamente nos trabalhos da nova instalação eléctrica. Tratava-se afinal, da remodelação de toda a rede eléctrica em Souselas e Marmeleira que deixava muito a desejar, com os lugares completamente às escuras durante a noite. O abastecimento de água e luz, entre a passagem de nível e o Parque de Jogos de Souselas, foi das primeiras medidas reclamadas pelo povo no pós-25 de Abril. Contudo, e como haviam expressado os Serviços Municipalizados em Setembro de 1977 tal não seria possível enquanto se não fizesse o reforço de caudal à Zona Norte. Aos poucos, a água foi chegando a toda a zona de Souselas, de tal modo que em Outubro de 1981 a JF informava os S.M.C. da prioridade na colocação da água ao domicílio do que restava: 1º Bairro do Matoito, 2º Bairro das Estreitas e Azenha e 3º Bairro do Vale de S. Pedro(519). Mais tarde, seriam abrangidos os domicílios dos Bairros da Moenda e das Almoinhas. Neste último caso, e dado o seu crescimento, foi pedido o reforço de corrente no Verão de 1982. O abastecimento de água ao lugar da Marmeleira obrigou à compra de um poço e terreno em seu redor num raio de 10 mt para zona de protecção, pertença de José de Sousa Parente. Uma decisão tomada pelo município em Outubro de 1976 e objecto de escritura em Outubro de 1977. Poço que seria reparado em Julho de 1980, com oferta do tijolo feita pela Fábrica de Cerâmica Progresso da Pampilhosa. Em Agosto de 1981, decidiu a junta de freguesia iniciar novas explorações de água para os lugares de S. Martinho do Pinheiro e Zouparria do Monte, contratando técnicos e máquinas para o fazer, numa obra orçada em 300 contos e que se justificava pois os lugares «…estão sem água para a população que se abastece de duas fontes existentes em cada um dos lugares. Também os lugares de Marmeleira e Sargento-Mór estão a ter a água racionada por ser pouca e portanto para não ser desviada para outro fim que não seja destinado à população(520). Também qualquer destes lugares não tinha reabastecimento de água próximo, fazendo-o em poços de chafurdo, que seja considerada água bôa para gastos, com prejuizo os habitantes». Quanto à água, os trabalhos de abastecimento a Zouparria e S. Martinho decorriam em Setembro de 1981, abrangendo a «Estrada da Zouparria» em Setembro de 1982. O abastecimento de energia à Marmeleira, motivou a deslocação a este lugar do Presidente da Câmara Municipal, no dia 22 de Junho de 1977,

(519) (520)

Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) Id.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

acompanhado do Director dos Serviços de Electricidade da C.M.C. Das conclusões da visita foi informada a JF pelos finais de Julho, dando conta de que o projecto do novo ramal estava concluído e orçamentado, sendo necessário adquirir um grupo electro-bomba a instalar no posto abastecedor (materiais já encomendados), e que a obra em breve se iniciaria. E na história do abastecimento de água a este lugar foi momento importante a construção de um reservatório de água para abastecimento ao domicílio, em terrenos da JF «por se tratar de uma obra para o bem publico»(521). Em Outubro de 1980, a JF pediu à EDP o reforço da corrente eléctrica para os lugares de Zouparria e S. Martinho. Para a Zouparria do Monte sabe-se que nos planos de trabalhos da E.D.P. – Centro, para 1980, se previa a melhoria das condições de fornecimento de energia (1ª fase) que, no entanto, não se concretizou pelas razões expostas na comunicação da E.D.P. à JF, de 12 de Agosto de 1981: «na medida em que a remodelação da rede de BT e iluminação pública ultrapassou o inicialmente previsto, e em face do plano de obras para 1981 que pretendemos cumprir»(522). A deficiente iluminação da Zouparria motivará um abaixo-assinado dos seus moradores, pedindo a montagem na Rua dos Olivais, que a Junta de Freguesia subscreveu em Agosto de 1981 lembrando «…o mau estado do caminho naquela estrada durante o inverno». O abastecimento de água às populações nos anos 80, a partir dos fontenários da freguesia, fazia-se na maior parte dos casos por meio de bombas eléctricas ou manuais. Foi por essa altura que as autoridades se aperceberam do grave problema das águas inquinadas. Lavadouros de Souselas e S. Martinho seriam finalizados nos princípios de 1980. Este de água canalizada a partir do poço. Por outro lado, nos princípios de 1980, ficaram concluídos os lavadouros de Souselas e de S. Martinho do Pinheiro (de água canalizada a partir do poço), enquanto o lavadouro do Goivo, construído nos anos 60, seria remodelado já no princípio deste século (foto 65). Em Dezembro de 1987, a C.M.C. e os S.M.C. aprovam o concurso para a execução da empreitada das obras intermunicipais de abastecimento de água aos concelhos de Coimbra e Penacova – Ramo da Marmeleira do Botão(523). E, em Setembro de 1988, aprova-se a empreitada de reforço de água a Souselas. Na década de 90 o esforço de abastecimento de água ao domicílio manteve-se, anunciando-se em Novembro de 1992 o prolongamento da rede em Sargento-Mor.

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A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.J.F.S. – Correspondência Recebida, 1981 (pasta) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 323, P. 251

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Apesar de um imenso esforço ao nível do abastecimento de água, a verdade é que em meados da década e segundo o Inventário Municipal de 1994, havia ainda problemas sérios a resolver na freguesia: estimando-se em 890 os alojamentos servidos por contadores, a verdade é que o número de dias por ano em que o abastecimento de água se definia como insuficiente era de 220, apontando-se duas razões para tal – irregularidade e pressão. Acrescente-se que a privação de água ao domicílio esteve na origem de uma revolta dos habitantes das zonas de Almoinhas, Alto das Eiras e Ladeira do Cemitério, expressa em comunicação ao município nos finais de Julho de 1995. A 1 de Março de 1999, a C.M.C. homologou a decisão dos S.M.A.S.C. que aprovara a abertura de concurso público referente à obra Concepção/ Construção do Saneamento Básico da Freguesia de Souselas (Marmeleira do Botão, Zouparria do Monte, S. Martinho do Pinheiro e Souselas(524). Em Abril do ano 2000, homologou-se a deliberação do C.A. dos S.M.A.S.C, de 29/03 que havia aprovada a adjudicação da obra à firma Sopovico. O auto de consignação da obra foi assinado em Outubro. Entre 2007 e 2008 decorreu a obra do saneamento básico em Sargento Mor. Em 2002 chegavam à freguesia os primeiros eco-pontos. E, nos finais de 2005 a JF decidia arrancar com uma medida inovadora e original «…a implementação de um plano de erradicação das lixeiras existentes, começando por S. Martinho do Pinheiro», tendo solicitado apoio aos Serviços Urbanos de Higiena da C.M.C.(525). A 10 de Julho de 2007, a ETAR de Souselas foi desligada após 25 anos de actividade, uma vez que a partir dessa altura os esgotos das 7 freguesias que servia (Souselas, Botão, Torre de Vilela, Brasfemes, S. Paulo de Frades, Antuzede e Trouxemil) passaram a ser encaminhados para a ETAR do Choupal. Uma estrutura que não deixou saudades dado que há muito estava ultrapassada (fora criada para servir 800 pessoas), e era geradora de situações desagradáveis com maus cheiros e exalações que frequentemente provocavam queixas dos habitantes. Em Agosto de 2013 iniciaram-se as obras de construção do sistema de drenagem de águas pluviais e zona pedonal em Vale S. Pedro.

3. A nova sede da junta Funcionando a JF num espaço provisório (antiga escola primária), os executivos foram procurando um espaço condigno para instalação ou construção da sede. Recorde-se que, em 1974, essa era a primeira das necessidades apresentadas para Souselas pela Comissão de Moradores. (524) (525)

Id. Nº 391 P. 18 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 48

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Freguesia de Souselas – um povo com História

No entanto, logo nas primeiras reuniões da Comissão Administrativa se abordou a necessidade «urgente de se construir um edificio que servisse não só para sede da Junta de Freguesia mas ainda para a própria Casa do Povo que também não tem condições de trabalho»(526). De facto, no mesmo edifício vinham funcionando diversas instituições, onde se incluía além das já referidas, a Caixa de Previdência e Abono de Família, que por ofício de 17/09/1975 pedia a colaboração da CAJF para novas instalações dado que as existentes eram consideradas «insuficientes para a prestação de uma assistência razoável»(527). Pelos finais de 1975, a JF parecia garantir um espaço para o seu funcionamento. No contrato de cedência de um terreno rústico municipal, à Casa do Povo de Souselas para construção da sua sede, previa-se que o dito edifício deveria comportar diversas dependências uma delas «…a ceder gratuitamente à Junta de Freguesia de Souselas, para instalação e funcionamento da sua sede»(528). Neste edifício, alugado à Casa do Povo, funcionariam também e por autorização desta, as sedes da Junta de Freguesia e da Associação Desportiva de Souselas, apesar das divergências e ameaças de despejo do senhorio. Em 1982, e com a JF a funcionar por especial favor na sede da Casa do Povo, o Dr. Alberto Álvaro Pereira chegou a doar-lhe «uma casa velha, mas ainda com as paredes e telhado em bom estado, precisando apenas de ser adaptada a séde da junta», tendo-se pedido ao município «para que a mesma seja analisada por um técnico e feito o projecto de adaptação nessa Câmara para nos ser dada a respectiva comparticipação para as obras que precisar, para assim a junta conseguir uma séde própria de que tanto precisa»(529). Pensava a JF reservar para si o 1º andar e, no rés-do-chão, ficar instalada a A.D.S. Estranhamente o benemérito cidadão pedirá, por ofício enviado em Janeiro de 1983, que o caso fosse reconsiderado pois tivera conhecimento de que a casa já não era para a junta mas para a igreja(530). Dado o desacordo instalado, a junta pedirá as instalações da Casa do Povo para o triénio de 1983-1985, tanto para os serviços de atendimento ao público, duas horas por semana, como para reuniões. Uma solução de recurso pois nem espaço havia para a organização do arquivo da junta. Contudo, um facto precipitará a mudança de instalações. Com o abandono das actividades da antiga Escola Primária de Souselas, a Junta de Freguesia muda as suas instalações para a sala que serviu as crianças do 1º ano escolar.

(526) (527) (528) (529) (530)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975, acta de 5/2/1975

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 83, 1975, Fl. 59 A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) Id.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Serviços que ali começaram a funcionar a 6 de Novembro de 1984, depois de obtida autorização de cedência da parte da Cimpor(531). Ao espaço se adaptou bem a freguesia, de tal modo que a 29 de Julho de 1985 a CMC toma uma decisão: «Sob proposta do Sr. Dr. Manuel Machado foi deliberado, por unanimidade, solicitar à Direcção Escolar do Distrito de Coimbra autorização para ser desactivada a antiga escola primária de Souselas a fim de se tentar instalar, no respectivo edificio, a sede da Junta de Freguesia de Souselas bem como um posto da Guarda Nacional Republicana»(532). A resposta demoraria e, inclusive, teve o município de insistir para que a resposta chegasse. Até que, nos princípios de Janeiro de 1986, a Direcção Escolar de Coimbra informa do ponto da situação: «Aguarda-se apenas comunicação da Direcção-Geral do Património para se efectuar a escritura de devolução na Direcção de Finanças de Coimbra para se legalizar a situação. Uma vez que tudo está normalizado não se vê qualquer inconveniente na adaptação das instalações escolares de Souselas para funcionamento da Secção da Guarda Nacional Republicana»(533). O assunto sofreria, no entanto, uma mudança de rumo. A nova sede seria construída de raiz, obedecendo ao projecto elaborado pela Divisão de Estudos e Salvaguarda do Património Arquitectónico da C.M.C, em 1987, sendo a memória descritiva assinada pelo arquitecto António Monteiro, coadjuvado por uma equipa técnica constituída por Cristina Frangalho (arquitecta), António Rebocho e António Reis (desenhadores). Como se pode ler na memória do projecto, os objectivos da nova estrutura eram claros: «Procurar-se uma solução arquitectónica funcional tendo em vista suprir as necessidades sócio-culturais da população da zona. A construção do edifício desenvolve-se à volta de um pátio pavimentado, criando mais um espaço de convivio/lazer e tendo como função principal articular um conjunto de edificios cujas funções são distintas» Distribuição: • A Junta de Freguesia com átrio de entrada acumula funções de sala de espera, e está directamente ligada à secretaria/atendimento. Zona esta, servida ainda por duas salas para a Junta com instalações sanitárias de apoio, uma sala de reuniões e nesta mesma área ainda estão englobadas duas salas para a Casa do Povo.

(531) (532) (533)

A.J.F.S. – Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 307, 1985, Fl. 8v. Id. Nº 310, 1985-1986, Fl. 58

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Freguesia de Souselas – um povo com História

• Imediatamente a seguir entre a área da Junta e o Salão Polivalente desenvolve-se a área de lazer e cultura, nomeadamente a biblioteca, o bar (com cozinha de apoio), prevendo-se ainda a ligação do bar ao salão e ainda uma bilheteira que poderá funcionar ocasionalmente. • O Salão-Polivalente apoiado por instalações sanitárias é equipado por um palco, para actuação de espectáculos e realizações culturais. • Anexo ao palco prevê-se áreas que acumulam funções de apoio ao palco e arrecadação para cadeiras, mesas etc. • Segue-se um terceiro edifício independente que engloba os serviços necessários ao funcionamento de um posto médico. Este composto por quatro consultórios médicos, gabinete de direcção, secretaria/arquivo, vestiário para o pessoal, instalações sanitárias necessárias, zonas de espera e uma sala destinada a pequenos tratamentos»(534). Em Novembro de 1987, o Presidente da JF, Delfim Várzeas, solicita ao município o desbloqueamento de verbas para a fase inicial das obras da nova sede, lembrando que Souselas se encontrava em 4º lugar na ordem de prioridades quanto à construção de sedes de junta. E, nos princípios de Dezembro, propõe à C.M.C. executar as obras por administração directa(535), deliberando o município a 25 de Janeiro de 1988 delegar conforme ao pedido, ficando a cargo dos Serviços do Departamento de Obras Municipais a fiscalização dos trabalhos(536). Em Agosto aprovará ainda um subsídio de 1000 contos, para reforço da construção da sede e destinado a compra de material(537). Para as obras, também concorreu a Casa do Povo que comparticipou a obra com verbas próprias. O lançamento da 1ª pedra da nova sede ocorreu a 2 de Julho de 1988 (um Sábado pelas 17h30m). Mas, o processo de construção obrigou a contornar um pequeno problema; o município apenas aprovou definitivamente a construção da sede em Setembro de 1988, depois de observado o parecer desfavorável do Centro de Saúde. Ainda nesse ano e a 19 de Dezembro, aprova-se um subsídio no valor de 1000 contos para aquisição de materiais destinados à construção da sede da JF(538). E, em Março do ano seguinte, idêntica verba destinada também a apoio à construção da sede. O empurrão decisivo para a concretização do objectivo começa a desenhar-se no final da década, quando o Ministério do Planeamento e Administração do

(534)

A.J.F.S. - «Documentos Construção da Sede, Polidesportivo e Capela de Sargento Mór» (pasta)

A.J.F.S. - Correspondência Recebida e Expedida (apenas de e para a Câmara Municipal de Coimbra), 1986-1990

(535)

(536) (537) (538)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 324, Pp. 130-131 Id. Nº 327, 1988, Pp. 169-170 Id. Nº 329, P. 198

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Território mediante Despacho Normativo 107/89, publicado a 30/11, definiu um leque de 67 freguesias a apoiar na construção de sedes – Souselas e Penalva do Castelo apareciam como as duas a financiar no Distrito de Coimbra. Em Novembro de 1989, a Administração Regional de Saúde de Coimbra, dava conta das alterações e acabamentos necessários a introduzir nas instalações em construção da Extensão de Saúde de Souselas (transferência de instalações). Em 1990, o edifício da sede estava já em acabamentos. Nos finais de 1991, a JF solicita um orçamento para alimentação em baixa tensão das suas instalações, bem como às instalações do Posto Médico, Assistência Social e Casa do Povo. Um trabalho que seria executado pela Divisão de Equipamento Electromecânico da C.M.C.(539). A construção do Posto Médico foi adjudicado à firma Carlos Caldeira Marques & Filhos, em Janeiro de 1991, por 6.898.565$00, contando com a comparticipação da Cimpor, ficando pronta pelo Verão de 1991(540). Em Junho de 1992, novo subsídio foi concedido pelo município à JF no valor de 2.250 contos para acabamento da construção e destinado ao pavimento do salão, pinturas interiores, iluminação e instalações sanitárias(541). Curiosamente, o protocolo de cedência do terreno com 5.730 m2, feito pela Câmara Municipal de Coimbra à Junta de Freguesia, realizou-se a 27 de Julho de 1992, com a estrutura praticamente concluída. Naquele espaço previa-se a instalação da Casa do Povo, Serviços Médicos (Posto Médico), Associações e C.A.S.S.C(542). Entretanto, em Março de 1992, a JF e AF chegaram a acordo com a A.R.S., quanto ao valor da renda a pagar pela cedência de instalações do complexo onde se edificou a Extensão de Saúde e para a qual aquele organismo do Ministério da Saúde comparticipara com 1.000 contos(543). O novo edifício da Junta de Freguesia (sede) foi inaugurado a 5 de Outubro de 1992 (foto 66). A Casa do Povo iniciou ali a sua actividade um pouco antes, em Setembro, com autorização da JF e AF e antes da assinatura de um protocolo de cedência de instalações datado de 5/10/1992. Em Abril de 1994, a JF pede a vistoria para efeitos de ocupação de todo o edifício. Em 2007 decorreu a ampliação das instalações do Centro de Saúde de Souselas (Extensão do CS de Eiras) com o apoio da JF. A 3 de Setembro de 2013 foi assinado o acordo de cooperação/cedência de instalações, entre a Junta de Freguesia de Souselas e a ARS do Centro, para ampliação da Extensão de Saúde.

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Id. Nº 347, P. 214 A.J.F.S. – Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 350, P. 282 Id. Nº 351, P. 126 A.J.F.S. – Livro de Actas da Assembleia de Freguesia de Souselas, 1992-1999, Fls. 3-3v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

4. A CIMPOR e a freguesia: problemas e contrapartidas 4.1. A entrada em funcionamento da unidade De acordo com o previsto, a grande unidade fabril da região de Coimbra, entrou em laboração, a título experimental, nos últimos meses de 1974, tendo sido dotada, inicialmente, com duas linhas de fabrico de 500.000 t/ ano. E, sem grande surpresa, a poluição acompanhou as primeiras experiências, causando mau estar não só entre o povo souselense mas em toda a área afectada. A primeira reacção politico-social dá-se a 2 de Dezembro de 1974, com uma reunião extraordinária na sede provisória da JF onde marcaram presença «… representantes das populações de Souselas, Eiras, Torre de Vilela, Brasfemes e Botão, que discutiram entre si e abertamente tudo quanto se relacionava com a poluição provocada pela fabrica de cimentos “Cinorte”»(544). Uma reunião que decorreu em pleno processo revolucionário em curso no país, e onde os ânimos facilmente se exaltaram. Porém, e como em tantas outras coisas na vida, da discussão nasceria a luz, deliberando-se enviar a algumas autoridades (Câmara Municipal, Governo Civil, Secretariado do Ambiente) uma moção aprovada na véspera pelo povo de Souselas e freguesias limítrofes: «Um – Solicitar ao Exmo. Presidente da Comissão Administrativa da Camara Municipal de Coimbra que efectue as necessárias diligências no sentido da suspensão da laboração da Fábrica “Cinorte”, em situação de poluição. Dois – Que do facto seja dado imediato conhecimento ao digno representante do M.F.A. Três – Que, se não forem tomadas as necessárias medidas, o povo impeça o funcionamento da Fábrica até que ela possa laborar sem prejuizo para a saude publica. Adenda: Que desta proposta seja dada a necessária publicidade nos orgãos de informação. 1 de Dezembro de 1974. Casa do Povo de Souselas»(545).

Dois dias volvidos, a C.M.C. analisa o problema em sessão do executivo. Apanhada de surpresa, apoia-se nos esclarecimentos dados pelos administradores da empresa: «Que o problema que se põe à Câmara é o da defesa da saúde pública e das culturas. Compreendendo desde já que, em princípio e perante a situação de

(544) (545)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975 Id.

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facto para a qual esta Comissão Administrativa nada contribuiu, que numa fase de arranque há que ajustar os electrofiltros, os quais pelas informações prestadas parecem ser dos mais eficientes e esse ajustamento provocará curtas e transitórias poluições, reserva a sua posição definitiva a um estudo mais aprofundado, em curso. Informou ainda que lhe foi garantido pelos administradores da empresa o total cumprimento do compromisso assumido no respeitante à poluição»(546). A partir desta altura, a poluição provocada pela actividade da CIMPOR não mais deixará de marcar a agenda da vida local, regional e até nacional. Contudo, em 1975 e com o processo industrial cimenteiro a dar os primeiros e tímidos passos, ninguém poderia imaginar o inferno diário de poluição em que Souselas se transformaria. Pese embora as diversas reuniões que se promoveram no início do processo: em Janeiro de 1975 realiza-se uma reunião entre a C.M.C., representada pelo vogal Octávio Lopes, e representantes de moradores da região afectada pela poluição, na qual se reclamou a adopção de medidas idênticas às usadas no estrangeiro para minimizar a poluição e nas quais, dizia-se, a «Cinorte está altamente interessada». A empresa Cimpor, Cimentos de Portugal, S.A., apenas surge enquanto tal em 1976 «…através da integração de antigas empresas cimenteiras, de capital privado que foram nacionalizadas: Cimentos de Leiria (Maceiras), Cimentos Tejo (Alhandra), Cinorte (Souselas), Cisul (Loulé), Cibra (Pataias), Cabo Mondego e Sagres. Dotada, na época, com uma capacidade nominal de produção na ordem das 3,1 milhões de t/ano, decidiu-se em 1977, face ao crescimento do consumo de cimentos em Portugal, instalar uma terceira linha para 1 milhão de t/ ano, que entrou em laboração em Maio de 1982»(547). Entretanto, formara-se em Souselas um curioso grupo denominado inicialmente por Comissão de Vigilância da Poluição, nascido no seio da Comissão de Moradores em Julho de 1975. Este grupo, passaria a designar-se por Grupo Antepoluição e Saneamento(548) e, da sua vigilância e actuação, resultou a denúncia de muitas situações ilegais, através de queixas formalizadas junto das autoridades político-administrativas e sanitárias. Um dos bons exemplos é a carta enviada ao Centro de Saúde Distrital de Coimbra a 12 de Dezembro de 1978 «…em que se queixa da poluição do ar provocada pela Cimpor, e a de águas residuais domésticas que tem origem em efluentes de fossas que escoam directamente para as ruas»(549). Este grupo, na realidade, substituiu-se à função de vigilância que a Comissão Nacional de Ambiente e a própria C.M.C.

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 260, 1974-1975, Fl. 51 João Pinho – Botão mil ano(s) de historias(s), CCRC, Coimbra, 2002, P. 155 (548) Deste grupo faziam parte em 1979: Adelino Dias Cordeiro, João Monteiro, Manuel dos Santos, João da Costa Paulino, Manuel Silvérico, Francisco de Oliveira Campos e Joaquim Ferreira. (549) A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). (546) (547)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

deveriam ter desempenhado. A partir de Maio de 1979, decidiu comunicar mensalmente à CIMPOR todos os casos de poluição que fossem acima do aceitável para que a empresa tomasse as devidas providências. Mas um dos seus documentos emblemáticos data de 12 de Setembro de 1979. Trata-se de um carta enviada ao Administrador-Residente da Cimpor: «Mais uma vez o Grupo Antepoluição e Saneamento de Souselas, representante do Povo desta Freguesia, na sua comunicação referente ao mês de Agosto, protesta enérgicamente contra a terrível poluição, que se continua a fazer sentir em grande quantidade, tanto sonora como poeiras, e sem que V.Ex.ª tome medidas enérgicas para que tal tenha fim, ou, pelo menos, reduzi-la ao mínimo, de forma que não atingisse com tanta gravidade a população da Freguesia. Também protestamos contra a futura montagem da 3ª fase no local onde se nos afigura irá ser montada, pois, julgamos que a mesma devia ser montada o mais longe possível da população (…) No entanto, já sabemos que de nada vale, tanto agora para V. Ex.ª como para os nosso Governantes, os nossos protestos, visto que quanto mais protestamos, mais poluição se faz sem qualquer respeito pelas pessoas, e, especialmente pelas crianças, que são os seres mais atingidos e que tanto terão de sofrer, enquanto não houver alguem que, ao ouvir a nossa vóz, diga não a este deplorável estado de coisas, que se está a passar em Souselas e imediações»(550). 4.2. O pós 25 de Abril A confiança entre as partes envolvidas estava definitivamente hipotecada e, a partir de então, qualquer movimentação era vista com descrédito. Contudo, passo a passo, a CIMPOR instalava-se em Souselas, fazendo dela o seu habitat: a montagem do ramal de caminho-de-ferro, para futuro serviço da fábrica, motiva um abaixo assinado enviado pela J.F. ao G.C. em Fevereiro de 1975. A empresa sofreria consequências decorrentes da mudança de regime. De facto, a Cimpor, Cimentos de Portugal, E. P, foi nacionalizada nos termos do Decreto/Lei 221 A/75, de 9 de Maio de 1975. Na altura, o Centro de Exploração de Souselas abastecia essencialmente o Norte e Centro do País(551). Contudo, a poluição continuaria a ser o eco de fundo da freguesia. Em Abril de 1975 era a própria empresa a assumir a responsabilidade da contaminação da Ribeira de Botão «…consequência da fase de construção e arranque simultâneos em que a Cinorte se encontra, uma fuga de fuel-oil através da rede de

A.J.F.S. – Correspondência Recebida, 1976-1979 (pasta) Dados extraídos de historial anexo ao livro de actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976

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esgotos, do que resultou passagem para a Ribeira»(552). Para sossego de todos, a empresa pedia desculpa e anunciava ter a situação controlada. Mas o descontrolo seria a regra e não a excepção. A 14 de Fevereiro de 1976, a Junta de Freguesia envia um ofício ao Secretário de Estado do Ambiente historiando o processo de poluição, as entidades envolvidas e, o pior de tudo, a continuidade de uma situação insustentável no terreno: «Desde o início do arranque da 1ª linha deste complexo fabril logo se verificou uma poluição que nos pareceu - e de imediato tivemos a confirmação – altamente exagerada dadas as longas descargas que permanentemente não só afectaram este lugar mas toda a freguesia e outras limitrofes (…) nunca e atè à presente data e com nosso conhecimento houve uma intervenção directa da parte das mesmas entidades com excepção para o Governo Civil e Câmara Municipal de Coimbra que logo de imediato promoveram visitas e encontros com a Administração que na época estava à frente da Cinorte. Desde então até esta data pouco ou nada melhorou a situação provocada pela poluição, havendo períodos que chegou a criar pânico e a fomentar a revolta em todos quantos são abrangidos pela extensa área flagelada pela constante caída de pó. Períodos houve em que própriamente o lugar de Souselas se viu e vê, de quando em quando envolvido em espessas nuvens de pó (…) as culturas agrícolas e pastos são de tal forma prejudicados que na maior parte das vezes os próprios animais recusam aquilo que antes tinha sido erva verde ou couves e era a sua alimentação principal»(553). Nos anos seguintes, a empresa continuaria a sua expansão territorial: adquire dois prédios para armazenamento de material, constrói um depósito para água cujo processo de licenciamento merece o voto desfavorável do vogal Aurélio Santos, que era de opinião que «…a fábrica não devia ter sido construída naquele local e que qualquer deferimento de processos daquela Empresa não era mais do que um incitamento à continuação do seu funcionamento, aumentando assim os riscos da poluição daquela zona» (554). Em Dezembro de 1977, a empresa anuncia por edital a expropriação e tomada de posse administrativa «…do terreno de pousio, sito no Vale Mourão de Cima, freguesia de Souselas, concelho de Coimbra com a área de 7.000 m2»(555). Em 1978, a fábrica coloca em funcionamento nova linha cimenteira, motivando apreensão acrescida na população, levando a um encontro entre

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A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

Id. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 265, 1976, Fl. 70v. A.J.F.S. – Correspondência Recebida, 1976-1979 (pasta)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

membros das juntas de freguesia limítrofes e a C.M.C. representada pelo vereador Bazilio Barreiros. O assunto é apresentado na sessão de 12 de Outubro de 1978, decidindo-se fazer face ao problema com um conjunto de medidas, tendentes a melhorar as condições habitacionais e agrícolas das povoações afectadas, financiadas pelo alargamento do orçamento para 1979: «a) Pavimentação de todo o parque com revestimento de cimento ou alcatrão, de modo a evitar a aglomeração de poeiras que os ventos fortes e o trânsito arrastam para a povoação de Souzelas. b) Limpeza adequada do interior e exterior da fábrica e sua manutenção conveniente e continuada. c) Eliminação de todos os focos de libertação de poeiras existentes nas instalações fabris»(556). Os executivos camarários não estiveram desatentos aos diversos problemas resultantes da actividade fabril em Souselas. Porém, a verdade é que as indicações que chegavam dos organismos do Estado eram no sentido inverso ao colhido no terreno: «que aquela fábrica estava equipada com a aparelhagem, do que há de mais moderno na Europa, no campo da anti-poluição e cuja eficácia dependia apenas da afinação dos electrofiltros»(557). Em 1980, anunciava-se a entrada em funcionamento de nova linha de fabrico (a terceira, que na realidade apenas iniciou actividade em 1982), assunto que o presidente do município, António dos Santos Moreira, leva a sessão de Câmara no dia 21 de Abril, dando conhecimento ao restante executivo do evoluir de um processo com duas faces ou gumes: «…das conversações havidas em reunião anterior com responsáveis da Cimpor acerca do grave problema da poluição em Souzelas provocada pelas linhas de fabrico de cimento; acrescentou que o problema é grave e as perspectivas da diminuição da poluição com a aplicação de filtros, são quase nulas e, naturalmente, mais se agravarão com a existência de nova linha de fabrico. Não há, evidentemente (e isso ficou bem expresso), má vontade por parte do Município, da Junta de Freguesia e da própria população de Souzelas, contra a existência da Cimpor, pois ela é uma situação irreversível, a sua exploração tem de considerar-se necessária para o desenvolvimento da região e do País. Há que estabelecer todas as regras possíveis de atenuamento poluitivo o que tem sido desprezado, pois os prejuízos para além dos poluitivos, são grandes, como o caso do quase total esmagamento das estradas»(558).

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 270,1978, Fls. 63-63v. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 264, 1976, Fls. 69-69v. Id. Nº 275, 1980, Fl. 68v.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Percebe-se, a partir deste momento, que o poder de intervenção municipal é diminuto, sendo esclarecedora a intervenção do vereador Bazilio Barreiros, advertindo para o facto de a empresa não poder fechar, dada a importância sócio-económica e o investimento de 8 milhões de contos. Quanto ao PC, ficou de recolher elementos junto da Circunscrição Industrial quanto aos indíces toleráveis, realizando-se, posteriormente, uma reunião na Cimpor com os seus responsáveis. Mas nem só a poluição ameaçava Souselas. Em meado de 1980, a Cimpor manifesta intenção de fazer do seu paiol provisório, na Serra do Alhastro, um paiol permanente, aumentando a capacidade de armazenamento de 2.500 para 5.000 kg. Uma hipotética explosão poderia, a partir de então, trazer outro tipo de problemas à freguesia. Mas o perigo decorrente das explosões era algo que nascera com a própria empresa; dada a sua natureza só assim conseguia extrair a pedra. Devido à proximidade ao aglomerado populacional, os estragos nas casas tornaram-se frequentes, enviando a JF relatórios periódicos com o levantamento dos prejuízos a saldar. Em 1981, a fábrica estava instalada havia 7 anos e Souselas já estava saturada de tanta poluição. Uma situação que passou a constituir um motivo de repulsa popular para a expansão industrial da zona (então com 7 fábricas em laboração), como se afere do ofício enviado em Dezembro, para a C.M.C. e Governo Civil, pedindo que se não concretizasse o boato da implantação de uma fábrica de rações na Quinta do Mendes. O povo, alarmado, reagia aos previsiveis maus cheiros e, a JF sublinhava «O lugar de Souselas já está bastante sacrificado com as poluições da Cimpor»(559). Na presidência da JF por Adelino Cordeiro, chegou a ser enviado ao Presidente da República uma lista de reclamações directamente relacionadas com a actividade da cimenteira. Em Maio de 1984, a C.P. informava a freguesia que os trabalhos de ampliação das linhas da Estação de Souselas, devido à actividade da Cimpor, trariam impactos negativos na vida das populações: «…diversos trabalhos de ampliação das linhas da estação de Souselas, a fim de se poder escoar grande parte do cimento produzido no Complexo Cimenteiro ali existente. As obras a realizar obrigam à construção de novos caminhos protegidos por muros de suporte, que invalidam as passagens de nível existentes aos Km.ºs 224,620 e 224,914 da Linha do Norte, as quais terão de ser suprimidas.

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A.J.F.S. – Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Para suprir os inconvenientes resultantes da supressão da primeira, vai ser construído um caminho de ligação provisório ao Pontão da Murta até que se completem todas as ligações definitivas. Quanto à PN ao Kmº 224,914 (dentro da estação de Souselas) ficará, ainda, a permitir o atravessamento de Peões»(560). Outro problema trazido pela Cimpor, e objecto de reclamações dos agricultores, foi a falta de água nos poços de rega, acusando-se a empresa de bombear água em excesso retirando-a assim do consumo público, através de outros poços que abrira a grande profundidade. Em Setembro de 1987, a empresa constrói uma instalação de moagem de carvão e central de compressores e, em 1988 edifica um armazém para recolha de explosivos no Alhastro. Importa frisar que a instalação da CIMPOR em Souselas trouxe algumas vantagens para a freguesia, como foi o caso da empregabilidade; em 1976 dava emprego a 278 trabalhadores, com ordenado minimo de 5.500$00 e máximo de 32.000$00. Na altura, perseguia a criação de verdadeiras comunidades de trabalho e lançamento de obras comuns, como o parque desportivo. Outra vantagem a assinalar, foi o fornecimento racionalizado de sacos de cimento para habitação do pessoal mais necessitado da freguesia. Um processo centralizado na junta de freguesia, que remetia as requisições de particulares para entrega semanal na empresa. Coube também à CIMPOR o financiamento da construção da nova escola primária, o que constituiu uma clara manifestação de consciência pelo facto da sua actividade ao nível da extracção de pedra com explosivos, ter colocado em risco, durante anos, as crianças que frequentavam o antigo estabelecimento. Um facto gravoso que levou mesmo a protestos populares à porta da Cimpor. Quando a Junta de Freguesia pediu à C.M.C. emissão favorável de parecer para elevação a Vila, em Maio de 1996, destacou um dos papéis mais notáveis desempenhado pela Cimpor em proveito de Souselas e da região: «São estas empresas que todos os dias levam a todo o país e a toda a Europa, o nome de Souselas e do mesmo modo, o nome de Coimbra. Damos como exemplo apenas a fábrica de cimentos/Cimpor. Todos os dias saem de Souselas milhares e milhares de sacos de cimento, através de combóios e de camiões de carga com destino aos grandes empreendimentos no país e no estrangeiro e, veja-se com realismo: em cada um desses sacos lá está inserto o nome da nossa terra Souselas e também o nome de Coimbra»(561).

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A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). Id.

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4.3. A co-incineração: Souselas no epicentro de uma questão nacional Não era a primeira vez que o Município de Coimbra poderia acolher a co-incineração de resíduos perigosos. De facto, e como recordava o presidente do município Manuel Machado: «…quando tomou posse em 1990, a Câmara Municipal de Coimbra tinha aberto e recebido as propostas de um concurso público internacional para instalar na Cegonheira uma incineradora de resíduos sólidos. As propostas não chegaram a ser abertas, assumindo a responsabilidade de ter mandado arquivar o processo por falta de garantias de segurança para a saúde pública e o bom ambiente. É um dossier que poderá ser aberto aos historiadores que o pretendam»(562). O final do séc. XX trouxe a Souselas uma notoriedade nacional, nunca antes verificada. Mas não foi devido a nenhum achado histórico de impacto à escala do país, nem tão pouco devido à projectada plataforma logística. Nem a elevação a Vila mereceu qualquer reparo na imprensa e meios de comunicação de âmbito mais vasto. De facto, a partir de 1997 Souselas, a Cimpor e a co-incineração cruzam-se de forma dramática; uma situação que se arrastaria durante anos, reacendendo querelas antigas entre o povo e a empresa, arrastando as massas populares, primeiro da freguesia, depois da área envolvente e, mais tarde incendiando a cidade, centro de um poder político decisório que se viu subitamente atado de mãos e pés (fotos 67 a 71). Na área Norte do município todos os caminhos passam a conduzir a Souselas, pois ali se jogaria muito do presente e futuro da região em termos ambientais. Vejamos como tudo começou, quem foram os protagonistas ao longo deste historial tão amplamente analisado, dissecado e discutido. A nossa perspectiva será aquela que provavelmente falta divulgar: a que partindo da população contagiou os órgãos da freguesia – executivo e assembleia – dali se propagando para o poder municipal e daí para os diversos órgãos do poder. Um caminho que trilharemos com todo o gosto e imparcialidade, tendo sempre presente que a decisão partiu do poder governamental, algo distante e distanciado da realidade local. De Souselas foi-se afastando aos poucos a ideia pré-concebida de uma freguesia conhecida apenas por ter uma fábrica de cimento, uma adega cooperativa e uma estação de C.P. Ali residia gente e essa comunidade tinha sangue na guelra.

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 390, P. 39

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Freguesia de Souselas – um povo com História

4.3.1 Os primeiros momentos: da anunciada decisão em co-incinerar à união de todos no voto contra Durante 1997, foram saindo notícias acerca duma eventual queima de resíduos tóxicos em Souselas, embora não chegassem pela via oficial. Já com sensibilidade para a questão ambiental, fruto de décadas de co-habitação com fábricas, a população organiza-se num de muitos gestos voluntários que tomará sobre o tema; a noite de 18 para 19 de Julho é passada em vigília. No entanto, em Março de 1998, o processo conhece evolução significativa motivando a intervenção do vereador João Pardal, na reunião de câmara do dia 16 de Março, pedindo esclarecimentos sobre a provável queima de resíduos em Souselas. A sessão aquece mas o assunto é agendado para reunião futura. Até que, a 1 de Junho de 1998 usa da palavra, novamente na reunião do executivo camarário: «Relativamente a este assunto o Senhor Vereador João Pardal referiu a sua preocupação, já anteriormente manifestada, sobre a queima de resíduos industriais no concelho de Coimbra. Leu uma notícia publicada no Jornal de Notícias no passado dia 26 de Maio, com o título de “Cimenteiras vão queimar lixo perigoso”, o que o preocupou ainda mais, uma vez que a notícia resulta de uma entrevista com a Sra. Ministra do Ambiente. Assim espera que o estudo de impacto ambiental seja enviado pelo Ministério do Ambiente o mais rapidamente possível e afixado nos locais próprios, de forma a que os cidadãos se possam pronunciar, porque o assunto carece de uma avaliação séria e cuidada, sendo de preservar aquilo que é o direito à saúde dos cidadãos do concelho de Coimbra»(563). Nesse dia, reagiram também outros protagonistas do poder camarário. Luís Vilar relembra a resolução do Conselho de Ministros de Maio de 1997 «… que estabeleceu que não irão ser incinerados em nenhuma cimenteira portuguesa aquilo que é considerado pela directiva comunitária de lixos perigosos. Disse ainda não saber se foi a Sra. Ministra do Ambiente que disse isso, mas se foi, está a contrariar e violar a resolução do Conselho de Ministros». E, o próprio Presidente da C.M.C., Manuel Machado, intervém de forma a serenar a questão, afirmando que era «… necessário aguardar o Estudo do Impacto Ambiental», anunciando ao executivo que iria desencadear um pedido de audiência à Ministra do Ambiente para obter esclarecimentos. Sucede que João Pardal, natural de Souselas, possuía formação específica na matéria. Assim, não mais abandonaria o problema, mantendo-se sempre ao corrente e em contínua actualização face ao evoluir do processo. E torna a insistir na sessão seguinte:

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 386, P. 91

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«…assistiu a uma entrevista dada à TVI pela Sra. Ministra, onde verificou que o nome de Souselas foi falado várias vezes, tendo sido referido pela Sra. Ministra que a queima seria um benefício para as populações. Neste sentido questionou o Senhor Presidente se a audiência que disse ir ter com a Sra. Ministra já tinha decorrido e se tinha ficado definido a data em que o estudo do impacto ambiental vai ser colocado a consulta pública»(564). A custo, o presidente do município mantém a discussão do tema a um nível não político, respondendo ao vereador como primeiro defensor dos interesses da cidade e da região: «…quando tiver informações concretas trá-las-à ao conhecimento da Câmara Municipal (…) Não deixou no entanto de referir que a queima de resíduos industriais não será implementada em Souselas por este Governo contra a vontade da Câmara Municipal de Coimbra». Durante o Verão de 1998, a co-incineração, discutida até então de forma discreta nas sessões da Câmara Municipal, alarga-se a partir daí pelos corredores dos poderes regionais, movimentando instituições, associações e pessoas, tornando-se tema de análise e discussões nos mais variados locais, da cidade, da região, da Vila de Souselas. Na freguesia, o movimento de contestação vai germinando e, face à inquietação dos moradores, a A.D.A.S. reúne e discute as possibilidades em cima da mesa. A Junta de Freguesia de Souselas, que esperara algum tempo para tomar uma posição sobre um caso que desconhecia em toda a sua real extensão, posiciona-se a 28 de Agosto de 1998 (Acta Nº 17): «Dado o momento crítico e perigoso que se vive à volta da Vila de Souselas, face à anunciada incineração de resíduos tóxicos e não tóxicos, e à hipótese de queima nos fornos da Cimpor, com todos os perigos daí resultantes, o Executivo da Junta de Freguesia de Souselas, na sua reunião de hoje, deliberou na qualidade de único Organismo Oficial e representante legal de toda a população desta freguesia, liderar o processo de contestação, ao ora pretendido pelas respectivas cimenteiras, apadrinhado pelo Governo. Assim, irá de imediato pedir parecer à Assembleia de Freguesia, pedir uma análise e parecer ao projecto do IPAMB, solicitar reunião com as Juntas de Freguesia limítrofes, com os Grupos Parlamentares dos partidos na Assembleia da República, assim como com a Senhora Ministra do Ambiente»(565). Souselas torna-se, a partir de então, uma espécie de centro do mundo nacional, abrindo noticiários televisivos e polarizando as discussões camarárias, as reuniões da JF de Souselas e das JF envolventes, as decisões de associações. A

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Id. P. 113 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 5v.

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dada altura, o problema já mexia com a própria estabilidade do poder político governamental; a 2 de Outubro a JF participava numa audiência realizada na Assembleia da República com todos os presidentes dos grupos parlamentares (excepto o C.D.S.). Em consequência da dimensão do problema, lançou a C.M.C. um processo de audiência pública que terminava a 23 de Novembro de 1998, dia em que havia reunião do executivo municipal. Na sequência desse processou, mas também do projecto governamental de eliminação de resíduos industriais pelo sector cimenteiro, seria apresentada pelo vereador Luís Vilar uma proposta que a partir de então veiculava a C.M.C. a principal opositora ao processo de co-incineração: «1. Atendendo a que todas as tomadas de posição recebidas na Câmara Municipal, na sequência do processo de audiência pública que termina a 23 de Novembro, se manifestaram no sentido da não incineração de resíduos industriais em Souselas, nomeadamente G.A.A.C., a Associação de Defesa do Ambiente de Souselas e as Juntas de Freguesia da área envolvente; 2. Atendendo ao facto do Concelho de Coimbra não ser um grande produtor de resíduos industriais; 3. Atendendo ao facto de não se verificarem quaisquer vantagens quer para o Município de Coimbra, quer para a freguesia de Souselas, nomeadamente no que respeita a investimentos ambientais ou outros; 4. Atendendo a que não existe um estudo global para a tomada de medidas de redução e reutilização de resíduos industriais, o que permite encarar a possibilidade do respectivo aumento de produção; 5. Atendendo que em tempo oportuno, embora sem perturbar a consulta pública, em audiência com a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado, o Sr. Presidente da Câmara Municipal e eu próprio, informámos o Ministério do Ambiente da nossa discordância, relativa ao projecto de incineração, posição esta que foi tornada pública…»(566). A proposta, é bem acolhida por todos, dela resultando a deliberação nº 1236/98 tomada por unanimidade: «Não concordar com a eliminação de resíduos industriais na cimenteira da CIMPOR em Souselas; Comunicar esta decisão à Sra. Ministra do Ambiente, ao Presidente do Instituto de Promoção Ambiental e Presidente da Comissão Avaliadora do Estudo de Impacto Ambiental, no âmbito da Audiência Pública»(567). Com este documento, ao qual a A.M. se associa pela deliberação de 29 de Dezembro de 1998, encerrava-se um período da história da co-incineração em

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Id. P. 130 Id.

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Souselas. Todos os protagonistas do poder local estavam em sintonia, independentemente da área política na qual se inseriam; co-incineração em Souselas não. A partir de então, a discussão do problema é travada na esfera política, condicionada porém por aspectos de natureza técnica e científica, mas com ampla participação popular não só da freguesia mas do próprio município. 4.3.2. Da teimosia em co-incinerar ao documento compromisso Apesar da vontade contrária das populações directamente envolvidas, a Ministra do Ambiente anuncia, a 28 de Dezembro de 1998, a co-incineração na cimenteira de Souselas. Um balde de água fria, um presente de Natal envenenado. A reacção da população fez-se em acto contínuo: «Conhecida a decisão, a população levantou-se de imediato e bloqueou a entrada da Cimpor. Coimbra está de luto, com o “presente” de Elisa Ferreira»(568). Ainda nos princípios do mês, a JF de Souselas analisara ponderadamente a questão, referindo a «situação do problema bastante grave que afecta psicologicamente a população de Souselas face à eventual queima de resíduos industriais»(569). Por esse motivo delegara todos os poderes no presidente da JF, o qual fazia parte da emergente Comissão Anti-Poluição da associação cívica Pró-Urbe, sedeada em Coimbra. Em Janeiro de 1999, e face ao comunicado ministerial, a JF reafirma a sua «completa oposição à instalação da co-incineração», e decide por unanimidade propôr uma acção judicial contra a Ministra do Ambiente e outras entidades para impugnar a decisão de escolher Souselas para co-incineração(570). A C.M.C. analisa o novo problema na primeira sessão de Janeiro de 1999, onde todos os vereadores intervêm sobre a questão, inclusive o PC que por essa altura já não excluía a demissão. De forma inesperada, João Pardal apresenta um documento intitulado “Uma Farsa chamada Co-incineração”, na realidade o primeiro de muitos documentos de base técnica e científica apresentados pelo vereador-biólogo: «A Sra. Ministra do Ambiente ao anunciar de forma precipitada, impensável e contra todos os pareceres incluindo o da Comissão Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentado (inclusive a opção inicial da SCORECO pelas cimenteiras do Outão e de Alhandra), as unidades de produção de cimento de Souselas e Maceira, para realizarem a tão mal amada co-incineração.

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Diário de Coimbra, 29/12/1998 (capa). A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 7v. Id. Fls. 9v.-10

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Não estamos pois no momento do julgamento, mas sim no período da análise dos argumentos utilizados pela Sr.ª Ministra na sua escolha. Trata-se de uma decisão com duas vertentes, uma marcadamente política, ao colocar o mais longe possível do Terreiro do Paço, tentou diminuir a possível penalização eleitoral nas eleições que se aproximam (…) A outra vertente foi de natureza económica com o controlo por parte das cimenteiras da estratégica nacional do ambiente, o que é mau para o país impedindo assim a elaboração de um Plano Nacional de Resíduos e não tão somente daqueles que interessam à indústria cimenteira, por terem valor calorífico e não prejudicarem as qualidades hidráulicas do cimento, todos os outros ficam de fora. Isto não passa de um bom negócio para a SCORECO»(571). No seguimento, e ponto por ponto, o jovem vereador rebaterá os argumentos técnicos apresentados pelo governo (Anexos, Documento 3). Por estes dias, reúne a associação Pró-Urbe, promovendo um debate que contou com a presença de Vital Moreira, constitucionalista que ali afirmou que Souselas e Maceira foram escolhidos porque «dos quatro locais possíveis, estes são os menos onerosos politicamente para o poder central»(572). O tema aqueceria no interior da vereação, que reúne extraordinariamente no dia 9, com ponto único na agenda de trabalhos: a cada vez mais incontornável co-incineração. Uma sessão longa, serviu para o Presidente da C.M.C. dar conta das conclusões saídas da reunião que tivera com o Primeiro-Ministro na sequência do despacho da Ministra do Ambiente, que escolhera a Cimpor para a co-incineração de resíduos tóxicos e perigosos. Na reunião, realizada em Lisboa, participara uma delegação coimbrã chefiada pelo Presidente da Câmara e constituída pelo Presidente da A.M., Presidente da JF Souselas, o Presidente da A.D.A.S., o Vereador do Ambiente da C.M.C., Luís Vilar, o Governador Civil. Da parte do Governo, e além do PM havia participado a Ministra do Ambiente, o Ministro dos Assuntos Parlamentares e vários assessores. Deste encontro resultara a elaboração de um documento compromisso intitulado “As cimenteiras e a Co-incineração de Resíduos Industriais”. Um documento que não abdicava da decisão governamental já tomada; tendo em conta «o passivo ambiental», «a ausência de qualquer sistema eficiente e de dimensão nacional de recolha e tratamento de resíduos industriais», «o clima de confiança» e «garantias pelos direitos», lançava um conjunto de medidas

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 390, P. 28 Diário de Coimbra, 7/01/1999, P. 5

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para resolver os «problemas ambientais em absoluto respeito e consonância pelos direitos dos cidadãos»(573). Um documento com oito pontos (Anexos, Documento 4) no qual o governo se comprometia a pôr fim, no espaço de um ano e nos fornos de Souselas, Maceira e Outão, ao «flagelo ambiental das poeiras de cimento (…) determinando a instalação de filtros de mangas», a implementar a «requalificação ambiental», a recuperação da qualidade de vida eliminando o «passivo ambiental», a criação de uma «Comissão Científica de Controlo e Fiscalização Ambiental das Cimenteiras» e a constituição, junto de cada município, de uma Comissão de Acompanhamento Local (vide documento no Apêndice…). Acreditava o poder político dominante na C.M.C. que este documento marcaria o fim da discussão, como se deduz da intervenção do seu presidente: «A solução encontrada com o Sr. Primeiro-ministro irá resolver um passivo existente de mais de 25 anos, de lutas que até agora não levaram à resolução de facto dos problemas»(574). João Pardal, líder na contestação, também aceita o documento especialmente «porque ele contém a vertente da requalificação ambiental que é um direito das populações», enquanto a questão dos filtros merecia certa reflexão pois estava relacionada com a velha questão da poluição pela poeira: «…os filtros de mangas acabam por ser uma vitória das pessoas da freguesia atingida, pois sempre lutaram por uma diminuição das poeiras, e pensa que as cimenteiras a curto prazo iriam ser obrigadas a dar cumprimento a essas disposições»(575). No final da reunião a C.M.C. toma a deliberação Nº 1396/99: «Aprovar a metodologia apresentada, as condicionantes estabelecidas e as medidas adoptadas e expressas no “documento compromisso” apresentado em resultado da reunião havida em 08/01/99 na Presidência do Conselho de Ministros, entre o Sr. Primeiro-ministro e o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Coimbra…»(576). Abstêm-se os vereadores do P.S.D. que a partir daquele momento assumem oficialmente que João Pardal é o «vereador qualificado para o efeito», votando contra Gouveia Monteiro pela C.D.U., para quem faltava clarificar muitos aspectos em torno do documento apresentado. Nesse dia, e a encerrar os trabalhos, Manuel Machado tem uma afirmação histórica: «Sobre a eficácia das intervenções e de mais actos a história o dirá. Pela sua parte reafirmou que continuará empenhado a fazer tudo o que esteja ao seu alcance para que «o pão dos pobres em Souselas não continue amassado em cimento».

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 390, P. 34 Id. Pp. 39-40 Id. P. 39 Id. P. 41

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Janeiro seria, aliás, um mês pródigo, em que a propósito da co-incineração se realizaram gestos públicos vindos dos mais variados quadrantes; abaixo assinados, protesto da equipa sénior da A.A.C. no Estádio da Luz em jogo contra o S.L. e Benfica, recomendação do Provedor de Justiça para revogar o despacho que autorizou a co-incineração e, a 26 de Janeiro pelo final da tarde, um enorme buzinão ecoa entre Souselas e Coimbra. Entretanto, o Diário de Coimbra pública uma sondagem onde a co-incineração é rejeitada por 87,3% dos inquiridos e 78,5% se manifestavam a favor de um referendo. Perante as críticas, Elisa Ferreira mantém-se firme, afirmando assumir o «ónus político da decisão». 4.3.3. A discussão sobe de tom No início do ano de 1999 Souselas atrai tudo e todos. Em Janeiro ali se reúnem mais de 50 estruturas associativas do concelho para debater a co-incineração. A oposição não dá descanso ao presidente do município, pois segundo a sua opinião a escolha de Souselas fôra opção de natureza política, com desvalorização dos argumentos de natureza técnica. Na sessão do dia 11/01, João Pardal anuncia já ter em seu poder o parecer da Comissão Avaliadora do Estudo do Impacto Ambiental bem como o relatório das conclusões da audiência pública «…que deveria ter servido de base ao trabalho da Comissão Avaliadora. Referiu ainda que ao ler os documentos em apreço constatou ser uma indignidade para Coimbra e uma falta de responsabilidade política a escolha das duas cimenteira devendo o respectivo Estudo de Impacte Ambiental não ter sido aprovado (…) Para terminar, e mais grave ainda, diz o Sr. Vereador que no referido relatório se diz que não existe projecto de eliminação de resíduos industriais para a fábrica de Souselas e Maceira, havendo somente planos para Alhandra e Outão. No caso de Maceira e Souselas serem escolhidas, os projectos serão adaptados»(577). O assunto estava definitivamente relançado e, ainda durante aquele mês, o Partido Ecologista “Os Verdes” debate na A.R. o Projecto de Resolução sobre a co-incineração de resíduos perigosos na Cimpor, ao qual assistem dezenas de pessoas de Souselas e região envolvente. Por esta altura a discussão centrava-se na fiscalização, tomando o executivo conhecimento, no início de Fevereiro, do ante-projecto de Decreto-Lei relativo ao Sistema de Controlo e Fiscalização do processo de co-incineração – um documento ainda não encerrado e que resultara de um trabalho conjunto do Governo, representantes dos municípios de Coimbra e Leiria e colaboração

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Id. Pp. 59-60

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do Prof. Vital Moreira. Ante-projecto aprovado com parecer favorável da C.M.C. (por maioria) a 8 de Fevereiro, e que ainda nesse mês será tornado lei pelo Conselho de Ministros e, no seio da qual, se formou a célebre Comissão Científica Independente (C.C.I). Perante os dados apresentados, o presidente do município declara que «não lhe agrada a co-incineração na cimenteira de Souselas», mas que «deposita toda a confiança na Comissão Científica». Assim, e na reunião do primeiro dia de Fevereiro, anuncia que em colaboração com a presidente da C.M. de Leiria elaborara uma proposta de despacho conjunto a remeter aos ministérios competentes e que determinava a criação de um Gabinete Técnico para a Requalificação «…visando a requalificação física, ambiental, social e urbanística da áreas de Maceira e Souselas»(578). Entretanto, Vital Moreira dá uma entrevista a um diário, onde declara que a co-incineração não vai para a frente. E, em outra entrevista de 23 de Fevereiro, o geógrafo Nuno Ganho «…alertou para os perigos de concentração de poluentes no vale de Souselas, considerando que as características de relevo e climáticas da localidade desaconselham a instalação de indústrias poluentes»(579). A 25 de Fevereiro, o processo de queima é adiado, fruto da votação na especialidade do projecto de lei de suspensão da queima dos lixos tóxicos apresentado pelo PSD em sintonia com o PCP e apoio do CDS/PP e Os Verdes. Até resolução em contrário, não se iria co-incinerar em Souselas e Maceira. O então deputado Carlos Encarnação afirmará que «era o fim do pesadelo» e que «continuarão a votar contra a queima dos tóxicos nas cimenteiras»(580). Pouco depois de ser conhecida a decisão, as mulheres de Souselas concentraram-se, silenciosamente, em frente à Igreja, promovendo «o velório da co-incineração». Os tempos próximos giram em torno da Requalificação Ambiental de Souselas: nos finais de Fevereiro, o PC havia informado que o plano de acção a desenvolver e constituído nos termos do despacho conjunto acima citado (Ministério do Equipamento Planeamento e Administração do Território, Ministério da Economia, Ministério do Trabalho e da Solidariedade e Ministério do Ambiente), seria entregue ao Gabinete Técnico de Requalificação Ambiental liderado pelo Arquitecto Gonçalo Byrne sob orientação das Câmaras Municipais; a 15 de Março, e depois de ouvidas em reuniões seis juntas de freguesia (Botão, Brasfemes, Souselas – cujo presidente integrava a equipa do plano de acção – S. Paulo de Frades, Torre de Vilela e Trouxemil) o presidente

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Id. P.133 Diário de Coimbra, 23/02/1999, P. 7 Diário de Coimbra, 26/02/1999, P. 3

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apresenta o documento de trabalho elaborado, tendo em vista o plano de requalificação; e, pelo final do mês, o arquitecto Gonçalo Byrne desloca-se a Souselas em visita de trabalho, tendo em vista a elaboração de um relatório da situação. A 16 de Setembro celebra-se o contrato-programa, entre a Cimpor e o Estado, para adjudicação dos filtros de mangas a instalar em todos os fornos da cimenteira de Souselas, com prazo de entrega de 90 dias, merecendo reacção de congratulação de João Pardal. Tudo parecia relativamente pacificado. Mas tudo se precipita novamente pelos finais de Novembro. De facto, na sessão, do dia 22 é o próprio Manuel Machado quem traz à discussão os últimos desenvolvimentos: «…referiu que através de uma entrevista dada pelo Sr. Ministro do Ambiente à Rádio Renascença e por diversas retransmissões em cadeia e articuladamente, tomou conhecimento que a instalação da co-incineradora na “CIMPOR” no Norte do Concelho de Coimbra, seria uma medida tomada pelo actual Governo e que iria ser implementada de imediato. Disse ainda que a co-incineração de resíduos industriais tóxicos e perigosos é uma problemática que este Executivo teve oportunidade de abordar com suficiente detalhe, pelo que a informação transmitida pela rádio pelo Sr. Ministro do Ambiente se afigura, no mínimo, estranha, precipitada e prematura»(581). Uma notícia que caíra mal na região, surpreendendo todos os envolvidos no processo. Perante uma decisão tornada pública, sem a vinculação ao parecer da Comissão Científica e Independente, o presidente do município age de imediato e anuncia que ainda naquele dia iria reunir-se com o Ministro do Ambiente, José Sócrates. Uma vez mais não andava distraído João Pardal que, logo ali, reage técnica e politicamente apresentando um conjunto de esquecimentos que vulnerabilizavam o dito ministro: respeitar a Lei 20/99 da AR (órgão máximo do país), recomendação do Provedor da Justiça que deu razão ás populações, ignorou a petição lançada pelo diário de Coimbra existente na AR e que ainda não subiu ao plenário, a recomendação da Comissão de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, esqueceu-se de apresentar o Plano Estratégico de Gestão de Resíduos Industriais e de sujeitá-lo a consulta e discussão publica, o Plano Nacional de Prevenção de Resíduos (não existe!), o Cadastro Nacional de Resíduos, esqueceu-se de nomear o Conselho de Acompanhamento da Execução da Estratégia de Gestão dos Resíduos Industriais e de apresentar a Comissão Independente, de respeitar as linhas do Plano Nacional de Desenvolvimento Económico-Social 2000-2006, de apresentar legislação apropriada…

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 395, P. 90

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Sofreria o processo um ligeiro abrandamento até que no princípio de Fevereiro do ano 2000, José Sócrates volta a anunciar a intenção de co-incinerar em Souselas e Maceira, enquanto quase em simultâneo é celebrado o protocolo entre o Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território e a CMC visando a requalificação ambiental de Souselas, pelo qual se criou o Gabinete Técnico de Requalificação da Vila. No dia 7 de Abril reúnem-se na JF de Souselas quase todos os partidos políticos para discussão do assunto da incineração. Deste encontro nascerá o “Pacto de Defesa da Saúde Pública das populações de Souselas e Coimbra”, que os vereadores João Pardal e Gouveia Monteiro entregam ao executivo. No entanto, o tema volta a fraccionar as forças partidárias em jogo, alegando o presidente do município não ter sido convidado para o encontro, mas que iria prosseguir e intervir junto do P.M., defendendo a este propósito a realização de um fórum sobre a co-incineração. Este fórum internacional realizou-se em Maio de 2000 e foi organizado em cooperação com a Universidade de Coimbra, a Quercus e a Pró-Urbe com a participação de especialistas nacionais e estrangeiros. A 22 de Maio, foi apresentado por Manuel Machado aos vereadores, o relatório da C.C.I. (composta por Sebastião Formosinho, Casimiro Pio, José Henriques Barros e José Cavalheiro) cujas conclusões não são animadoras: «O relatório apresentado, pese embora ainda dele não ter o conhecimento total, contém um conjunto de aspectos que levam a concluir que o sistema proposto não salvaguarda em absoluto a saúde pública. As dúvidas dos cientistas estão patentes e se no relatório não houver suficiente detalhe para confirmação final deverá ser devidamente ponderado em instância própria, seja do Governo, seja da Assembleia da República, que tem uma palavra a dizer no âmbito do processo legislativo»(582). Dúvidas que levam o poder municipal a deliberar no sentido da prudência mas também da desconfiança – uma vez mais – face à grande cimenteira: «1 – Manter a deliberação da Câmara Municipal nº 1236/98, de 23/11/98, tomada por unanimidade 2 – Solicitar à Universidade, que, através dos seus Conselhos Científicos, se pronuncie sobre o Relatório apresentado pela Comissão Científica Independente 3 – Que a Câmara Municipal, acompanhada de especialistas, entre em contacto com a cimenteira de Souselas, no sentido de analisar da boa ou má fé que houve no processo, nomeadamente verificando se as obras para o processo de co-incineração, não em termos de filtros de mangas, foram executadas antes

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmrara Municipal de Coimbra, Nº 398, P. 114

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do parecer da Comissão Cientifica Independente, que possam indiciar eventual má fé em todo este processo»(583). Uma reunião que ficaria marcada pela agitação no exterior, uma vez que a população de Coimbra se manifestava, ruidosamente, junto ao edifício dos Paços do Concelho. O Presidente da Câmara, Manuel Machado, encerra os trabalhos anunciando que iria receber os manifestantes, não sem antes ler aos presentes um fax acabado de chegar e enviado pelo deputado Manuel Alegre: «Devido à ausência do Dr. Almeida Santos, encontro-me a desempenhar as funções de Presidente da Assembleia da República, em exercício. Por esse motivo institucional não posso deslocar-me hoje a Coimbra. Como deputado eleito pelo Círculo de Coimbra, quero no entanto reafirmar a minha fidelidade aos compromissos assumidos com o eleitorado no sentido de votar contra a co-incineração em Souselas, que é a única maneira de honrar o meu mandato de deputado, de defender a saúde pública da população que me elegeu e ser coerente com os valores democráticos porque toda a vida lutei. Manifesto ao Presidente da Câmara Municipal e a todos os eleitos por Coimbra, bem como ao povo e autarcas de Souselas e a todo o concelho a minha indefectível solidariedade. Com as melhores saudações e um abraço amigo do Manuel Alegre»(584).

A discussão em torno da co-incineração era uma autêntica fogueira que não se sabia quando extinguiria a sua chama. E um dos momentos mais curiosos, dá-se na sequência da publicação dos resultados da actividade da C.C.I. e, em especial, da interpretação em torno de um gráfico sobre dioxinas e afins no qual se detectaram erros de cálculo de 1.000 vezes, trocando-se uma tonelada por um quilo. Isto numa altura em que o ministro anunciava a realização de testes no prazo de meses! E, a 29 de Maio o presidente do município, certamente desanimado, anunciava mais uma acha para a fogueira, que a escolha estava feita: «…teve conhecimento, através dos meios de comunicação social e Internet, das Resoluções do Conselho de Ministros da passada Quinta-feira (…) Em todo o caso o que é enunciado na comunicação social permite extrapolar, com suficiente segurança, que o Conselho de Ministros terá feito a opção pela localização da co-incineração, na CIMPOR em Souselas, com base no Relatório da Comissão Científica Independente. Disse ainda o Sr. Presidente que pelo que

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Id. P. 116 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 398, Pp. 116-117

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lhe têm dito os juristas encarregados de estudar o processamento de resíduos tóxicos industriais e perigosos e em qualquer circunstância terá sempre de ser pedido um parecer à Câmara Municipal de Coimbra. A dúvida que pode existir e que está a ser analisada do ponto de vista técnico-jurídico, é se esse parecer é vinculativo ou meramente consultivo»(585). A co-incineração tornava-se uma questão psicológica e emocional, não só dos Souselenses mas de todos aqueles que acima da freguesia não concordavam com a proposta. E, para incendiar os ânimos, sucediam-se informações preocupantes: em Maio de 2000, dando conta que a Cimpor teria preparado e adaptado a fábrica a pensar na co-incineração; em Julho, descrições de fumo preto, nunca antes visto, a sair das chaminés da cimenteira; e, a 21 de Junho uma vistoria à unidade cimenteira feita pelos Ténicos da Administração Urbanística e Companhia de Bombeiros Sapadores constatara «… que a construção da cimenteira não está de acordo do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (…) A co-incineração na Unidade Cimenteira de Souselas, no seu entendimento, carece de novo licenciamento industrial e compete à Câmara Municipal a sua emissão»(586); por fim, o final do ano traria acidentes de trabalho numa altura em que decorria o processo de privatização da empresa. Entretanto, a Assembleia de Freguesia de Souselas decide voltar a recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo. Pelo final do mês de Maio de 2000, o reitor da Universidade de Coimbra, Fernando Rebelo «…aceitou nomear, a pedido de várias entidades da cidade contrárias à co-incineração em Souselas, um grupo de especialistas que irá “desmontar alguns dos argumentos e opiniões expressos no parecer da Comissão Científica Independente (CCI)” escolhida pelo Governo»(587). Ainda neste mês Joaquim Gonçalves, da A.D.A.S., entregava em Lisboa e nas mãos de Almeida Santos, um documento solicitando a pronta análise da petição do Diário de Coimbra que juntara 55.000 assinaturas contra a co-incineração. O mês de Junho trouxe, a nível nacional, um jantar de desagravo ao Ministro José Sócrates, motivando reacção do seu colega de partido contra a co-incineração, Manuel Alegre, que no dia 6 e durante a reunião da Comissão Política Nacional se demite do Secretariado Nacional e da Comissão Política Nacional do Partido Socialista, cargos que ocupava desde 1974. Perante os acontecimentos, jogados praticamente apenas na esfera política, Manuel Machado anuncia, na reunião da Assembleia Municipal do dia 7 de Junho, que a autarquia poderia inviabilizar o processo de co-incineração, não

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Id. P. 157 Id. Nº 399, P. 135 Diário de Coimbra, 26/05/2000, P. 5

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licenciando o que considera nova actividade industrial resultante da queima de resíduos na cimenteira. Mas uma vez mais os ventos políticos parecem empurrar o presidente do município em sentido contrário; no dia seguinte (8 de Junho) o Conselho de Ministros aprovava a queima de resíduos industriais perigosos nas fábricas de cimento de Souselas e Outão. Os movimentos de contestação reactivam-se e, finalmente, a petição lançada pelo Diário de Coimbra é levada à discussão no Parlamento, perante uma sala quase vazia de deputados (apenas 29 marcaram presença). A 6 de Julho, discute-se na Assembleia da República o projecto lei do partido “Os Verdes”, que pretendia suspender o processo de co-incineração. Um momento de grande imediatismo a que não faltaram os souselenses e conimbricenses que acorreram a Lisboa para assistir a um momento importante na história da democracia: por maioria de votos aprovava-se favoravelmente o projecto de um pequeno partido, agregando pessoas de diversas áreas políticas, e que pretendia suster o processo. O caso levantará polémica no interior do partido com maioria na A.R., atingindo directamente os deputados do P.S. eleitos pelo círculo eleitoral de Coimbra. A tal facto aludirá a vereadora Teresa Portugal no rescaldo da votação: «…esta é uma causa da cidade de Coimbra, transformada numa causa comum capaz de juntar os mais diversos partidos, as mais diversas personalidades, o maior número de movimentos de cidadãos, utilizar as energias de um partido para na Assembleia da Republica arranjar uma alternativa e uma maneira de travar a questão, nos passos que já tinham sido dados, levando a que deputados do Partido Socialista consigam liberdade de voto na questão ao votarem contra a co-incineração e a favor do projecto de “Os Verdes”(588). Em Julho, e apesar da suspensão do processo pela A.R., o Governo publica a resolução do Conselho de Ministros em avançar com a co-incineração. O ambiente entre as instituições volta a toldar-se, ainda para mais quando em Setembro são relatadas chuvas de material sólido na área de Souselas. A C.M.C reafirma as posições anteriormente tomadas mas, de todo o lado chegam notícias perturbadoras; no meado de Setembro é o Dr. Henrique de Barros da Comissão de Médicos a dar uma entrevista, onde fazia o pré-anúncio de que a co-incineração iria em frente e, como sempre, na direcção de Souselas. Em Dezembro, a atitude de Manuel Machado motiva a intervenção do vereador Gouveia Monteiro: «…manifestar a sua estranheza pela posição assumida pelo Sr. Presidente relativamente à co-incineração. Disse ainda que ninguém compreende um tão absoluto contraste entre as informações produzidas pelo Sr. Presidente há alguns

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A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmrara Municipal de Coimbra, Nº 398, P. 203

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meses atrás relativamente à sua disposição para a luta e que poderia ir até ao não licenciamento do novo processo fabril a instalar em Souselas e um tão súbito cair de braços e resignação ao parecer da comissão médica e às “investidas” do sr. Ministro José Sócrates»(589). O vereador João Pardal também não desistira da sua luta e, na sessão de 14 de Dezembro, apresenta mais um documento discordando dos grupos de trabalho médicos e solicitando um rastreio epidemiológico à Saúde Pública da população de Souselas. Na mesma informação, alerta para a não realização de nenhuma avaliação da qualidade ambiental da região, da inexistência de monitorização à fauna e flora e salientando o facto de a dita comissão ter votado contra um dos melhores especialistas de saúde pública em Portugal, o Dr. Massano Cardoso. Manuel Machado assim que toma conhecimento das conclusões do Grupo Médico criado pela A.R. no âmbito da C.C.I., e depois de um dia de reflexão e de consultas a diversas personalidades, toma posição pública a 11 de Dezembro, assumindo estar tranquilo pois o relatório apresentado «…conclui que, do ponto de vista científico e desde que sejam adoptados os procedimentos técnicos adequados e se implementem os necessários sistemas de controlo das operações e de monitorização dos seus impactes, não existem riscos para a saúde pública que justifiquem a recusa do processo de co-incineração na cimenteira»(590). Sem dúvida que este foi um momento importante na história da co-incineração. Pela primeira vez, o presidente do município manifestava-se publicamente a favor do processo. Mas fá-lo com cautela: «O relatório hoje divulgado responde às dúvidas legitimamente levantadas (…) Mas só tranquilizará as populações quando virmos implementadas todas as medidas preconizadas de monitorização, controle e segurança, da responsabilidade da entidade licenciadora (…) Como Presidente desta Câmara Municipal quero reafirmar e garantir a todos que continuarei a acompanhar e a intervir no desenvolvimento futuro do processo da Co-incineração…». A fechar a sua informação, Manuel Machado propõe que a C.M.C. designe um especialista para integrar a Comissão Científica, que se constitua a Comissão Técnica Local e que as entidades e instituições universitárias e técnicas especializadas implementem a rede de controlo epidemiológico. E o ano não terminará sem mais uma manifestação simbólica em Souselas; o padre Manuel Carvalheira, solidário com a luta dos populares e, como forma de protesto contra a decisão do Grupo de Trabalho Médico, que no relatório das consequências da co-incineração para a saúde pública abriu as portas ao processo, cancelava a Missa do Galo.

(589) (590)

. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 401, P. 122 Id. Nº 401, P. 159

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No início de 2001, João Pardal volta a agitar a calmaria municipal ao revelar um estudo anterior ao processo da co-incineração, realizado pela Faculdade de Medicina de Coimbra e divulgado pela A.R.S., que sugeria o rastreio ao cancro da mama e a identificação das causas que estavam a provocar um índice elevado de doenças à população (bronquite, asma, pneumoconiose, cancro da mama). Um documento que tentam fazer chegar a José Sócrates mas que este apelida de «desonestidade intelectual». E o que se andava a passar em Souselas, o epicentro de todo este terramoto? Em Dezembro de 2000 o executivo aprovara uma moção a apresentar à Assembleia de Freguesia: «…de repúdio pela tentativa governamental de persistir na queima de resíduos perigosos, pondo em causa as populações num raio de trinta quilómetros da Cimpor, sujeita aos perigos da contaminação através da cadeia alimentar»(591). E, em Janeiro de 2001 surge a decisão de maior alcance; o boicote às eleições presidenciais. Ainda durante o ano 2001, vive-se o espírito carnavalesco de forma escurecida; o Instituto Educativo de Souselas - alunos, professores, funcionários – a que se associou muito povo – realizava um inédito «carnaval fúnebre». A 23 de Março concluiu-se o processo de consulta pública, anunciando-se para Junho/Julho os testes de co-incineração. Entretanto, regista-se em Abril o emergir de uma voz importante e ainda não escutada; o bispo Albino Cleto anuncia oposição ao processo de co-incineração em Souselas. O Verão de 2001 anunciava-se quente e teria momento muito tenso no dia 23 de Julho: «à porta da Cimpor em Souselas viveram-se ontem à tarde momentos de agitação. A notícia de que a fábrica estava a queimar resíduos industriais perigosos trouxe o povo à rua. Durante duas horas, um cordão humano impediu a entrada e saída dos camiões na cimenteira, onde começaram já testes de co-incineração, sem que tenha sido feito o estudo epidemiológico à população. Um manifestante ficou ferido quando um camião tentou furar o bloqueio»(592). Na reunião de 3 de Setembro de 2001, e nas vésperas da realização de um acto eleitoral autárquico, o presidente Manuel Machado dá conta aos vereadores dos desenvolvimentos relacionados com a Convenção de Estocolmo (realizada a 22 e 23 de Maio): «Do exposto na Convenção de Estocolmo, conclui-se que o Sistema de Coincineração de Resíduos Industriais Perigosos em cimenteiras é perigoso para a Saúde Humana e para o meio ambiente»(593). Da discussão entre os vereadores

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 15v. Diário de Coimbra, 24/7/2001 (capa). A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 406, P. 15

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nasce a última das deliberações acerca da matéria, tomada por unanimidade, antes do acto eleitoral: «Reafirmar as posições que assumiu anteriormente de discordância da instalação da co-incineração de Resíduos Industriais Perigosos nos fornos da cimenteira de Souselas; Registar como relevante, a assinatura, pelo Governo Português, da Convenção de Estocolmo sobre Contaminantes Orgânicos Persistentes; Apelar à Assembleia da Republica no sentido da rápida discussão e aprovação da Convenção; Requerer ao Governo a paragem imediata dos testes e do processo da co-incineração, nomeadamente na Cimenteira de Souselas; Mandatar o Sr. Presidente da Câmara Municipal para promover uma reunião de trabalho com a Comissão Científica Independente e o Executivo Municipal, no sentido de ser explicado o trabalho já desenvolvido, o que tem em curso e o que pretende desenvolver»(594). Entretanto, e conforme o planeado, decorrem em Julho os testes na cimenteira, havendo relatos de aumento da poluição sonora, de fornos desmontados e de nuvens de poeira. A Comissão Científica Independente publica, em Novembro, os resultados dos testes, havendo registo de medições de alguns componentes como o Carbono Orgânico Total muito acima da média. João Pardal solicita, uma vez mais, a paragem do processo a que quase toda a vereação se associa, até que as autarquias e populações sejam esclarecidas. 4.3.4. Mudanças de rumo As eleições de Outubro de 2001 trouxeram importantes alterações políticas no município conimbricense; o P.S. cedia lugar ao P.S.D. que no acto eleitoral fôra a força política mais votada. E, a primeira reunião do novo executivo é simbolicamente realizada em Souselas, na Casa do Povo, das 15 às 18 horas, do dia 21 de Janeiro de 2002. O assunto, escusado seria dizê-lo, foi a co-incineração e a primeira deliberação do novo executivo versou sobre o tema (deliberação 1/2002 – Anexos, Documento 5). Partindo da Convenção de Estocolmo reafirmou-se a «total oposição à co-incineração em Souselas», trazendo propostas inovadoras como a «necessidade da realização de um referendo local». Por outro lado, criticou-se o atraso na realização do estudo epidemiológico à população de Souselas e a manifesta perda de confiança na CCI. A finalizar, relembrou algo de muito importante e sucessivamente adiado: «Exigir o cumprimento da requalificação

(594)

Id. P. 16

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urbana e ambiental de Souselas e freguesias vizinhas designadamente: Brasfemes, Botão, Eiras, Torre de Vilela, Trouxemil e S. Paulo de Frades»(595). Desde a tomada de posse do executivo municipal presidido por Carlos Encarnação, a questão da co-incineração passou a ser duramente combatida, independentemente da evolução do processo. De facto, logo que se anunciaram para Março de 2002 novos testes na cimenteira, houve lugar a interposição de uma acção judicial da Quercus, visando impedir a realização dos mesmos. Entretanto, a 17 de Março de 2002, realizaram-se eleições legislativas que deram a vitória ao P.S.D., uma alteração importante dado que poder local e poder legislativo pertenciam à mesma cor política. Por isso, Carlos Encarnação envia uma clara mensagem para Lisboa, anunciando que esperava o fim da co-incineração. E, de facto, o seu pedido seria atendido, na medida em que por despacho do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, Isaltino de Morais, de 19/04/2002 se declara: «Considerando por fim que, nos termos do art.º 199.º al.g) da Constituição da República Portuguesa, no exercício da sua competência administrativa ao Governo incumbe praticar todos os actos e tomar todas as providências necessárias à promoção do desenvolvimento económico e social e à satisfação das necessidades colectivas, determino: a) A suspensão de todo o processo que visa a realização de ensaios de queima de resíduos industriais perigosos nas unidades cimenteiras. b) Encarregar o Senhor Secretário de Estado do Ambiente de, com urgência, proceder ao estudo das medidas de natureza técnica, administrativa ou normativa destinadas a enquadrar as novas opções politicas neste domínio constantes do Programa do XV Governo Constitucional, com especial prioridade para a cessação de funções ….» (da CCI). c) «…preparação de um novo quadro normativo de gestão e tratamento de resíduos industriais perigosos»(596). Beneficiando de uma sintonia plena entre Coimbra e Lisboa, a co-incineração foi suspensa por algum tempo, podendo a empresa queimar resíduos não perigosos e proceder a valorização interna dos resíduos próprios da empresa. No entanto, e pelo final do ano, chegariam relatos do despejo de resíduos na cimenteira pela calada da noite, os quais estariam a ser queimados sem que a empresa tivesse licença para tal. Contudo, em Maio de 2003, o assunto co-incineração parecia encerrado, pensamento expresso pelo próprio presidente Carlos Encarnação:

(595) (596)

Id. Nº 408, P. 8 Id. Nº 409, P. 222

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«…se comprovou pelo estudo encomendado pelo Governo a várias universidades em relação ao volume dos resíduos industriais perigosos, que na verdade não existia razão para fazer nem a co-incineração nem a incineração dedicada. Este assunto está definitivamente “enterrado”, havendo agora que estudar soluções alternativas»(597). Entretanto, em 2003, o Secretário de Estado do Ambiente José Eduardo Martins anuncia que o lixo perigoso vai ser tratado em dois CIRVER (Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos. Mas, em 2004, nova reviravolta no processo; o governo P.S.D. cai e na campanha eleitoral que se segue, José Sócrates anuncia que se for primeiro ministro haverá co-incineração. Ao nível local, o antigo vereador João Pardal transita para o poder local basilar e tornou-se, em 2005, presidente da Junta de Freguesia de Souselas, a sua terra natal. E tudo o que envolvesse a co-incineração não poderia deixar de estar sob atenção especial. Assim, e logo que se tomou conhecimento do Estudo Saúde-2005, que abrangeu a região centro e especialmente a população da Freguesia de Souselas, feito pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e da responsabilidade da A.R.S. – Centro, a Junta de Freguesia deliberou solicitar a esta instituição: «a) Todos os elementos do estudo b) Um Plano de Intervenção a nível de Saúde Pública, para a população da Freguesia de Souselas c) Identificação da causa das doenças e implementação de medidas de minimização d) Melhores condições a Extensão de Saúde de Souselas, nomeadamente, ampliação de instalações, aumento do número de médicos e enfermeiros e) Convidar a ARSC para uma reunião em Souselas com a população»(598). Com a mudança no rumo político governamental, em 2004 voltou a ameaça a pairar sobre Souselas. De facto, sendo ministro do Ambiente Correia Nunes, a C.C.I foi reactivada, anunciando-se que não se abdica da co-incineração e que os CIRVER devem ser construídos. Nesta altura, a Cimpor foi dispensada pelo Ministério do Ambiente do estudo de Avaliação de Impacte Ambiental para poder co-incinerar. Em resposta quer a JF quer a C.M.C. tomam posição: a primeira recorrendo aos tribunais, a segunda; através do Edital Nº 233/2006 de 29 de Agosto de 2006 que aplicou em Souselas uma Postura Municipal de Trânsito, proibindo e condicionando o transporte de mercadorias e resíduos tóxicos nas vias sob jurisdição municipal.

(597) (598)

Id. Nº 416, P. 95 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 56v.

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Os processos em tribunal foram adiando o arranque da queima dos fornos das cimenteiras até que, em Outubro de 2007, o Supremo Tribunal Administrativo permitiu o início do processo com base nos antigos estudos. Depois de duas decisões em que se considerou como necessária a realização de novo Estudo de Impacte Ambiental, para retoma do processo, a terceira sentença foi contrária às anteriores. A Cimpor anunciou publicamente o início do processo, em Fevereiro de 2008, e os Cirver foram inaugurados em Junho de 2008. Por acórdão do dia 12.02.2009, o Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN) suspendeu o licenciamento que permitia a queima de resíduos perigosos em Souselas, obrigando à paragem da co-incineração na unidade cimenteira. Deferia-se assim a acção cautelar interposta por um grupo de cidadãos de Coimbra. Contudo, aquela decisão seria anulada por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 02.12.2009, permitindo que fosse retomada a queima desses resíduos na localidade. Entretanto, a 29 de Dezembro de 2009, a Assembleia Municipal de Coimbra aprovou a “Declaração de Coimbra”, onde se defende que a Assembleia da República deve suspender o processo(599). Actualmente, o processo mantém-se em aberto, correndo uma acção em tribunal devido à postura municipal que proibiu a circulação de mercadorias perigosas em Souselas.

5. A rede viária 5.1. Expansão Ao longo das mais de três décadas de poder democrático em Portugal, e um pouco por todo o lado, a melhoria das condições de circulação de pessoas e bens tem sido um dos pilares da actuação dos diversos poderes. Uma das primeiras melhorias em Souselas foi discutida e concretizada pela Comissão de Moradores do lugar, a 10 de Abril de 1976: a abertura de uma nova estrada entre o Passal e o Largo da Igreja. De facto, nesse já distante Sábado o povo juntou-se para contribuir directamente para a obra, a que se associaram duas máquinas e quatro camionetas da C.M.C. Desse acto, preserva-se a memória das ofertas em géneros e dinheiro que alguns indivíduos fizeram na medida das suas possibilidades:

(599)

Ver Diário de Coimbra, 30 Dezembro de 2009, P. 3

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«Amadeu Abreu – batatas, Joaquim Simões Leite – 500$00 para a estrada e poço, Mário da Cunha Marques – um dia de trabalho quando fôr preciso, Anibal Madeira da Silva – 500$00, Mário Delgado – 500$00, Judite Campos – 10 litros de vinho, Maria (das Estreitas), ajuda a cozinhar, Francisco de Oliveira Campos – Azeite, José Lopes da Silva – uma fessura, Manuel Silvério – 500$00, Francisco Lopes da Silva – 200$00, Abel Maia da Costa – 500$00, João Monteiro Magalhães – 250$00 e 5 litros de vinho, José Ferraz Lopes – um dia de trabalho»(600). Em oficío enviado pela junta à C.M.C., em Novembro de 1977, pedem-se providências e coloca-se como «problema nº 1 deste lugar de Souselas» a construção da «Estrada do Matoito, que serve uma enorme área habitacional, que se encontra num estado lastimoso»(601). Os anos seguintes foram pródigos na expansão da rede viária local abrindo-se, precisamente em 1978, a tão desejada estrada de Souselas para Matoito e Moenda. E, ainda nesse ano, abria-se a pedido de um grupo de interessados, uma estrada pública no sítio do Calvário para que pudessem ser construídas casas. Em Maio de 1987 a JF está fortemente empenhada na abertura da via que ligará as estradas de Souselas a Marmeleira e Sargento-Mor. Nesse sentido, solicita a vinda de um técnico ao local, a fim de se efectuar o projecto da Estrada do Calvário, que fazia parte do Plano de Actividades para o triénio 1987/89. Nos anos 90 abrem-se novas estradas pela freguesia: a Rua do Espanhol e a Rua da Fonte até à Adega Cooperativa (ambas em Souselas no ano de 1993). E, em 1997, começou-se a executar a ponte sobre o Rio Resmungão que ficaria concluída em 1999. Uma velha aspiração da área, ao nível rodoviário, começou a ser satisfeita em Novembro de 2006, quando na sequência de uma reunião conjunta das JF de Souselas e Vilela se acordou: «…no sentido de darem início aos procedimentos que conduzam à construção da estrada que ligará Souselas através das Almoinhas à Torre de Vilela» (…) «obra muito ambicionada pelas duas Freguesias»(602). A 1 de Julho de 2010, o Diário de Coimbra noticiava que «Ficou mais fácil circular em Souselas». O título da notícia reportava-se à abertura no dia anterior de duas passagens desniveladas na Linha do Norte: «…uma passagem superior para todo o tráfego e de outra inferior (apenas para tráfego ligeiro), sendo que no primeiro caso a passagem funciona também como uma variante a Souselas»(603).

(600) (601) (602) (603)

A.J.F.S. – Livro de Actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976, Fl. 34v. A.J.F.S. – Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 74 «Ficou mais fácil circular em Souselas» In Diário de Coimbra, 1/07/2010, P. 9

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Nas palavras do PJ o acto foi «…a concretização de um desejo com 25 anos (…) motivo de satisfação e orgulho». A conclusão destas obras veio, aliás, pôr fim ao risco que era atravessar a Linha do Norte, melhorando-se as acessibilidades à vila e distribuição do tráfego, e eliminando-se a perigosa passagem de nível na rua do Bairro do Calvário. A cerimónia contou com a presença de Carlos Encarnação (Presidente da CMC) e de responsáveis da REFER (a obra resultou de um protocolo entre a CMC e a Refer), ficando as novas vias integradas na Rede Rodoviária Municipal (fotos 72 a 76). Além destas vias de comunicação, percorrem a freguesia diversos caminhos vicinais, ligando propriedades e povoações, caminhos e veredas de pé-posto, sobretudo nos montes, que constituem património inestimável da freguesia.

5.2. Melhoramentos De Abril de 75 à actualidade passaram algumas dezenas de anos. O decorrer do tempo acarretou desgaste nas vias rodoviárias, obrigando a cíclicas reparações, algumas delas financiadas pelo município. A 8 de Maio de 1977 a junta de freguesia visita, a convite da Comissão de Moradores da Mata do Machial, o lugar do Pisão do Canavial onde toma «… conhecimento da mísera estrada que liga Pisão-Lagares»(604). Em ofício à C.M. de Coimbra a junta esforçava-se por transmitir os sucessivos pedidos do grupo de trabalho de habitantes da Mata do Machial, e outros lugares, que solicitavam a abertura da Estrada que liga o Resmungão, Lagares e Pisão à Mata do Machial. Em Outubro de 1979, o executivo era curto mas duro nas palavras: «Considera esta Junta, que a presente estrada, tem condições primitivas»(605). Tratava-se afinal do caminho municipal de acesso a Lagares, a partir de Souselas, cuja empreitada de pavimentação foi adjudicada em Outubro de 1981,(606) embora se tivesse colocado a hipótese da construção de uma variante alternativa, em Maio de 1980, que ligasse Lagares ao Pisão. Trabalho que de pouco ou nada serviu, pois durante anos os pedidos para o seu arranjo sucederam-se sem que fossem atendidos. Uma delicada situação sem solução à vista, mesmo quando a JF inscreveu a terraplanagem e alargamento dessa estrada como a maior necessidade da freguesia.

(604) (605) (606)

A.J.F.S. – Correspondência Recebida, 1976-1979 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 283, 1981, Fl. 8

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O caso motivou uma comunicação da dita comissão de moradores (foto 38), solicitando uma visita de trabalho no dia 5-3-83 às 15h no Pisão-Souselas, onde era esperada a presença da junta de freguesia e presidentes das câmaras de Coimbra e Penacova: «Estas presenças, servirão para assim apressar e ver o miseravel carreiro estrada, que há tanto ano se fala, e os nossos orgãos autárquicos pouco se teem ocupado»(607). Bem perto de Souselas a situação também não era famosa. Em Julho de 1980, uma comissão de habitantes da aldeia da Zouparria preparou-se para cortar a estrada devido ao facto de estar intransitável, aprovando a Assembleia de Freguesia uma moção sobre o assunto a 27 de Setembro: «1º Considerando que a estrada que liga Souselas ao Sargento-Mor, está intransitável a partir de Zouparria (…) 2º Que o povo de Zouparria, já ameaçou com o corte da mesma até à sua reparação e só não o fez por ter havido uma promessa da Câmara Municipal (…) 3º Que a estrada que liga Souselas aos Fornos e Souselas a Brasfemes se encontra quase nas mesmas condições (…) 4º Que esta luta è justa, a Assembleia de Freguesia de Souselas, delibera por unanimidade dar todo o apoio a qualquer tomada de posição das populações no sentido da resolução rápida deste problema»(608). A 22 de Janeiro de 1986, novo abaixo-assinado sobre o assunto dava entrada na C.M.C. Naquele documento, os moradores relembravam a visita das autoridades há dez anos atrás, e chamavam de novo a atenção para os gravíssimos inconvenientes da situação: «O mau estado da estrada prejudica gravemente as duas povoações citadas no dia-a-dia, as dezenas de operários que a utilizam para ganhar o seu pão na zona Industrial de Souselas e arredores, nos acessos às propriedades agrícolas, e ainda aos Transportes de madeiras criadas nesta zona. O mais triste e degradante foi, e será no futuro, a recusa de visita médica ao Pisão pelo facto do estado da referida estrada, como qualquer morador local o pode comprovar»(609). Apressa-se a despachar o presidente do município (Manuel Machado), ordenando que se consultasse a JF acerca do interesse da obra, que em Agosto confirma o mais que óbvio. Porém, o problema arrastou-se no tempo, pelo que o problema se tornou emergente, gritado do fundo da voz do povo: por oficío de 25 de Abril de 1994 a JF comunicava ao Vereador Jorge Lemos e ao Dep. Obras Municipais «…do desagrado e da revolta demonstrada junto desta autarquia, pelos moradores da povoação do Pisão do Canavial, desta

(607) (608) (609)

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.J.F.S. – Livro de Actas da Assembleia de Freguesia, 1977-1983, Acta do dia 4/7/1980 e 27/9/1980 A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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freguesia, acerca do mau estado da estrada que liga o referido lugar à povoação de Lagares - 1300 metros»(610). O mau estado das estradas, dentro dos limites da freguesia, motivou a elaboração de uma Moção, aprovada pela Assembleia de Freguesia em 27/9/1980 e enviada à Assembleia Municipal, onde se deliberou por unanimidade dar todo o apoio à tomada de posição das populações, no sentido de resolver o problema sobre as seguintes estradas: 1º Estrada que liga Souselas a Sargento-Mor «esta intransitável, a partir de Zouparria 2º - Estrada que liga Souselas aos Fornos e Souselas a Brasfemes se encontra quase nas mesmas condições»(611). Em Março de 1981 foi reparado o caminho Moenda-Souselas, velha aspiração dos sucessivos executivo desde os anos 40, como espelha o ofício enviado ao Presidente de Câmara a 3 de Junho de 1980: «à espera desde 1948, data em que foi alargada para tal fim, e como é uma das obras que esta Junta julga da maior necessidade (…) serve cerca de 200 habitantes entre eles muitas crianças que se deslocam para as escolas, e no inverno é um verdadeiro martírio que passam quanto à lama e água que corre em quantidade pela mesma»(612). Durante 1977 decorreu a reposição de calçada à portuguesa no lugar da Marmeleira e, em Setembro de 1981, a pavimentação do caminho municipal Regalo-Marmeleira. Durante 1983 repara-se a estrada nº 336/1 então «bastante danificada desde a povoação dos Fornos até á Cimpor, mas muito especialmente dentro do lugar de Souselas (…) junto à Fábrica de Cerâmica Cesol» e seria pavimentado o C.M. Marmeleira-S.Martinho do Pinheiro. Os anos 80 trazem o calcetamento alargado; em 1983 à Rua das Eiras (Marmeleira) e Rua dos Olivais e Rua do Charco (Zouparria do Monte) e Rua do Cimo (S. Martinho). Já em Julho de 1984 adjudicam-se o pavimento e alcatroamento da Rua da Quinta dos Lagares (Sargento-Mor) e da Rua da Oliveirinha (na Marmeleira) e a pavimentação do C.M. que liga a Capela ao Lavadouro de S. Martinho do Pinheiro. A propósito de estradas, diga-se que a partir do momento em que a Câmara Municipal passou a delegar obras em algumas Junta de Freguesia, em regime de administração directa, foram elas a preencher a maior fatia dos trabalhos a executar. Veja-se o ano de 1985 em que, durante o mês de Agosto, o município aprova doze processos entre os quais o de Souselas, com as seguintes obras:

(610) (611) (612)

Id. A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta)

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«1) Estrada de Souselas-Brasfemes, 2) Prolongamento de uma rua em Lagares; 3) Alargamento da Rua Primeiro de Maio; 4) Estrada de SouselasZouparria; 5) Rua dos Olivais-Zouparria; 6) Rua do Prior-Sargento-Mor; 7) Rua do Aníbal – Sargento Mor; 8) Estrada Municipal Marmeleira-Pampilhosa; 9) Rua da Peixaria; 10) Rua do Zé Mendes»(613). Em sintonia com esta preocupação relativa à rede viária, estavam os planos de obras anuais que a junta de freguesia se propunha realizar. Na segunda metade da década de 80 fazem-se os seguintes melhoramentos: em 1987 a pavimentação da Rua da Fonte até à Ponte do Rio Resmungão (Souselas) e Rua do Bairro da Carriça na (Zouparria); em 1989 a obra do caminho municipal que liga a Estrada de Marmeleira/Zouparria a Souselas e, a reparação da estrada Marmeleira-Botão. Nos anos 90, repara-se a estrada Marmeleira-Botão e alarga-se a Ponte do Matoito (1994). Neste último caso, o alargamento era promessa camarária com mais de 12 anos, pelo que a JF decidiu avançar com o processo. Em 1995 pavimentam-se as ruas do Brasileiro, Rua do Pó e Rua do Carril (em Souselas); em 1996 a Rua da Alagoa (em S. Martinho do Pinheiro).

6. Progressos ao nível escolar Em meados dos anos 70, o crescimento de Souselas, visível em termos demográficos e assente numa zona industrial ainda pujante, fez com que as autoridades chegassem a pensar em criar uma escola preparatória na freguesia. Pelos finais de Dezembro de 1976, a Direcção Geral das Construções Escolares pediu, também, ao executivo local informações complementares sobre o assunto: «Estando programada para Souselas uma escola Preparatória com a lotação final de 12 turmas, solicito a V. Ex.ª a indicação de um terreno provável para a implantação da referida escola, com a área aproximada de 15.000 M2»(614). Quanto ao panorama escolar do ensino primário, a situação pelos finais dos anos 70/inícios de 80, assumia contornos de certo dramatismo de que nos chegaram informações bem esclarecidas: • Por ofício de 28 de Fevereiro de 1977, as professoras da Escola de Sargento-Mor dão conta das «péssimas condições existentes nas instalações escolares», com as crianças não podendo utilizar as instalações sanitárias, pedindo o arranjo e transformação de toda a canalização de esgotos e

(613) (614)

A.H.M.C. Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 307, 1985, Fls. 39-39v. A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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de água; conserto dos recreios, mobiliário, portas e das janelas em mau estado(615). Sargento-Mor que em 1983 possuía, um jardim de infância. • A 7 de Novembro de 1978 a JF pedia à C.M.C. que viessem técnicos à freguesia verificar «o estado caótico em que se encontra práticamente todo o equipamento escolar no que se refere ao caso de carteiras e secretárias das duas salas de aulas, da Escola de Souselas»(616). • Mas, mais gravosa era a situação em Março de 1981, quando em ofício para o Presidente de Câmara a JF solicita a transferência da escola para outro local «com a maior urgência possivel» uma vez que a mesma «… se encontra a funcionar em péssimas condições, por se encontrar apenas a cêrca de 150 metros de distância da Cimpor, estando por isso a ser diariamente afectada pelos tiros e poeiras o que prejudica grandemente as crianças durante as aulas muito especialmente os tiros que em muito lhe afecta o sistema nervoso»(617). Telhas arrancadas, chuva nas salas, danos nos artigos escolares e instalação eléctrica foram consequências directas dum tempo muito difícil para o ensino. Daí que a construção de uma escola fosse cada vez mais sentida e reclamada, de preferência em local afastado da poluição e zona industrial. O assunto será resolvido, de forma provisória, com a colaboração decisiva da Cimpor em dois momentos diferentes: • Primeiro, cedendo por empréstimo e para instalação da escola, a casa que pertencera ao Sr. Arnaldo dos Santos Fernandes, sita na Estrada de Brasfemes, enquanto não estivesse concluído o novo edifício escolar. No processo, envolveu-se activamente a Câmara Municipal de Coimbra, que em Agosto de 1983 envia como seu representante o Engº Rebocho na visita feita à casa que irá servir de escola e onde marcaram presença o Presidente da JF e o Director Escolar. Concluindo-se «que as condições eram excelentes», o município solicita ao Director do Centro de Exploração da Cimpor o derrube de uma parede para fazer uma sala única e tambem serem construídas três casas de banho. Todas estas obras serão custeadas pela Câmara Municipal de Coimbra. Também a Junta de Freguesia, em Agosto de 1983, concorda com as condições impostas pela empresa e assume sua quota-parte na tarefa negocial «…tomando a responsabilidade pelas obras de beneficiação do imóvel, assim como a instalação de água e luz, sendo todas as despesas daí inerentes, suportadas por esta Junta de Freguesia»(618).

(615) (616) (617) (618)

Id. A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) Id. Id.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

• O segundo momento de participação da empresa foi o financiamento total da construção do novo edifício escolar. A 10 de Outubro de 1983, o então vereador Manuel Machado apresentou em reunião de câmara o projecto de construção de um edifício escolar para Souselas com 4 salas «…que é totalmente financiado pela CIMPOR e resulta de um acordo entre esta empresa e a respectiva Junta de Freguesia»(619). O assunto foi discutido largamente pela municipalidade, numa altura em que a poluição estava (como sempre esteve) na ordem do dia, tendo-se «…chegado ao consenso de que a oferta da escola à população de Souselas não invalida que prossigam as negociações entre a CIMPOR e a Autarquia local para uma melhoria das condições atmosféricas daquela zona». Na mesma sessão aprova-se o projecto, e o caderno de encargos adjudicando-se a obra a Carlos Caldeira Marques, por 5.595.828$00. Os trabalhos iniciam-se nos princípios de 1984, e o edifício seria inaugurado oficialmente a 5 de Dezembro de 1984 pelas 15h00, sendo a JF presidida por José Monteiro Cunha. Um facto comemorado a 21/06/2009 com o descerramento de uma placa assinalando os 25 anos da escola (actual EB1 de Souselas) e a acção daquele autarca que seria distinguido na ocasião pela Junta de Freguesia (foto 81). Construída a escola primária de Souselas (fotos 77 e 78), logo se pensou em adicionar-lhe uma importante estrutura de apoio à população infantil; em ofício de 12/10/87, a JF informava a C.M.C. das frequentes interpelações feitas pelos professores da escola, no sentido de instalar nos terrenos anexos uma pré-primária. Um projecto abraçado de imediato pelo executivo local, para quem «urge a instalação da pré-primária», que vinha figurando nos vários planos de obras dada a densidade populacional(620). Contudo, será necessário esperar algum tempo pela nova estrutura. A 13 de Março de 1989 o município adjudicava a construção da Pré-Primária de Souselas por 7.222.017$00 à já referida firma de Carlos Caldeira Marques e Filhos(621), concluindo-se a obra pelos inícios de 1991 (foto 79). Entretanto, havia iniciado actividade a Telescola de Sargento-Mor, um benefício para a população mas cujas condições de acesso preocupavam quer a escola quer a freguesia. Por esse motivo a JF decide pedir em Novembro de 1983, no seguimento de uma informação vinda da Comissão de Pais dos alunos do 1º e 2º ano da telescola, que o município assegure o transporte no regresso das actividades, designadamente de 26 crianças até à Marmeleira e 15

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 294, 1983, Fl. 43 A.J.F.S. - Correspondência Recebida e Expedida (apenas de e para a Câmara Municipal de Coimbra), 1986-1990 (621) A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 331, P. 82 (619) (620)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

até Souselas. Nessa exposição assinala-se, com preocupação, o «regresso que é feito já com noite cerrada, portanto ocasião propícia aos bandidos que assolam o nosso país»(622). Telescola que chega a Souselas no ano lectivo de 1984/85, depois de autorização para funcionamento requerida pela JF junto do Instituto de Tecnologia Educativa em Maio de 1984, «…para as crianças de Souselas e Marmeleira, que actualmente frequentam o posto de Sargento-Mor, pois são as que mais kilómetros tem de percorrer a pé, por não terem meio de transporte». Por comunicação do dito instituto, de 3 de Agosto de 1984, autorizou-se o funcionamento do desdobramento do posto que funcionava em Sargento-Mor(623). Os anos 90 trouxeram a beneficiação da Escola Primária da Marmeleira, aprovando-se na reunião camarária de 14 de Junho de 1991, o projecto elaborado pela Eng.ª Teresa Ferreira, em 1990, bem como o programa de concurso e o caderno de encargos. O mau estado do edifício era evidente: «Este edifício encontra-se em mau estado de conservação, sendo necessário uma intervenção profunda, a fim de o dotar das condições de conforto e segurança, para o desempenho das funções que nele se desenvolvem»(624). Em Agosto de 1991 adjudicou-se a execução da obra à firma Bento & Bento, prolongando-se os trabalhos para lá de Junho de 1992, com alterações ao projectado «…de modo a melhorar a protecção e conservação da área envolvente ao edifício escolar e oferecer melhores condições de funcionalidade»(625). Uma obra finalizada somente em finais de 1994. No Verão de 1995, e nos termos do D.L. N. 173/95 de 20/7, a JF apresentou na D.R.E.C. uma candidatura para a criação de uma Pré-primária no lugar da Marmeleira. Ideia que não avançou, apesar do pedido, a 15 de Março de 2002, e à Divisão de Desenvolvimento Social da C.M.C. de «…um projecto com feitura e acompanhamento para uma escola pré-primária em terreno do Centro Social da Marmeleira adjacente a sua sede para ultrapassara situação de carência da instituição e crianças do lugar de Marmeleira(626). Um momento muito relevante para o progresso escolar da Freguesia de Souselas, e área envolvente, foi a criação do Instituto Educativo de Souselas (foto 83). A 8 de Maio de 1991, a Junta de Freguesia de Souselas recebia uma carta vinda de Pombal e assinada por João Dias Martins e Manuel Augusto Serralha Duarte, professores

(622) (623) (624) (625) (626)

A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 344, P. 224 Id. Nº 350, P. 177 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 19v.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

efectivos do ensino secundário. Um documento onde ambos se propunham realizar na freguesia: «…um projecto de implantação de um estabelecimento de ensino que englobe o 2º e 3º ciclos do ensino básico e o ensino secundário e, que, embora particular, irá funcionar com paralelismo pedagógico com o ensino estatal. Desejam fazer a sua localização no concelho de Coimbra, e onde mais carência haja de salas de aula». Alguns meses depois, esta iniciativa encontraria acolhimento no decreto-lei n.º 229 de 04/10/1991, que justificava a necessidade da existência de um equipamento educativo daquelas características na região de Souselas. A própria DREC comunicaria aos interessados, por ofº de 11/11/1991, que a Carta Escolar do Concelho de Coimbra previa a implantação de uma «Escola Básica Integrada em Souselas, cobrindo o território educativo de SargentoMor/Souselas»(627). Assim, depois de alguns elementos recolhidos pelos promotores, junto da DREC e da CMC, apontando para a existência de espaços educativos mal cobertos pela rede escolar, com destaque para a área de Souselas, a Junta de Freguesia congratulava-se com a possibilidade real de uma colaboração reciproca entre autarquias, DREC e entidade particular, apontando o ano lectivo de 1992/93 para início de actividade(628). Um projecto acarinhado pela autarquia local desde o seu princípio, pois tratava-se de dotar a freguesia com uma importante infra-estrutura da rede escolar: uma C+S. Assim, e em Janeiro de 1993, envia uma comunicação endereçada ao vereador Henrique Fernandes, dando conta do empenhamento do executivo e dos «promotores da futura Escola C+S de Souselas» na sua construção, e pedindo que a água dos SMASC chegue ao local pois o arranque das obras estava previsto para a semana seguinte(629). De facto, a 20 de Setembro de 1993 a C+S iniciava a sua actividade, incluindo aulas nocturnas. O Instituto Educativo de Souselas é, actualmente, uma instituição de ensino particular e cooperativo, localizado na Rua Oliveira do Arco, Nº 6, 3020-871 Souselas. A Escola é constituída por dois edifícios principais: • Edifício nº 1: compõe-se de 39 salas que acolhem: gabinetes de direcção/ coordenação, serviços administrativos, laboratório de química, laboratório de biologia, laboratórios de prótese dentária, sala de educação visual, salão de cabeleireiro, sala de música, sala de teatro, gabinete de psicologia e

(627) (628) (629)

Informação gentilmente cedida pela direcção do Instituto Educativo de Souselas. A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). Id.

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orientação profissional, biblioteca, mediateca, sala multimédia, salas de informática, gabinete de informática, secretaria, papelaria/reprografia, sala de professores, arrecadações diversas, salão polivalente com palco, zona de jogos e espaço de música, cozinha, refeitório, bar. • Edifício nº 2: pavilhão gimnodesportivo, piscina coberta aquecida, oficina de mecânica auto, salas de aula, salão de estética e cosmetologia. O espaço exterior é ocupado com terreno arborizado compacto a Norte, polidesportivo descoberto vedado, campos de jogos, um átrio a sul anexo ao edifício 1, um jardim pedagógico a Sul(630). Ministra ensino diurno a 680 alunos, distribuídos em 32 turmas, do 5º ao 12º ano, que é assegurado por 58 docentes e apoio de 26 funcionários não docentes. Disponibiliza cursos de educação e formação, de nível II, organizados em 3 turmas (cursos de Mecânica de Veículos Ligeiros e Cuidados e Estética do Cabelo) e Cursos Profissionais de nível IV em 6 turmas (Técnico Auxiliar Protésico e Técnico de Manutenção Industrial). Tem ainda um curso profissional EFA – Estética e Cosmetologia, com 1 turma. A maioria dos alunos é proveniente da Freguesia de Souselas, seguida das freguesias envolventes, onde se destacam: Botão, Trouxemil, Torre de Vilela, e Brasfemes. Recebe ainda alunos de outros concelhos vizinhos devido à procura dos cursos profissionais e outros. No ano lectivo 2010/2011 obteve os seguintes índices de aproveitamento escolar: 2º Ciclo (5º ano, 95%; 6º ano, 97%); 3º ciclo (7º ano, 94%; 8º ano 95%; 9º ano, 92%) e Secundário (10º ano, 77%; 11 º ano, 96%; 12.º, 88%). No princípio de Julho de 1997 a JF enviava ao cuidado do vereador do Pelouro do Desenvolvimento Social, Jorge Lemos, um pedido de reparação da Escola do 1º C.E.B. de Sargento-Mor «que se encontra num avançado estado de degradação»(631). Uma situação que se arrastaria para o novo século; na sessão camarária de 7 de Dezembro de 2000, o vereador Luís Vilar refere que estava aprovado um projecto de grande intervenção para a escola, a qual iria fechar durante aquele mês para que técnicos municipais pudessem resolver «…os principais problemas que incomodam e não satisfazem minimamente o bom funcionamento da escola»(632).

(630) (631) (632)

Elementos recolhidos do Projecto Educativo do Instituto Educativo de Souselas, 2010-2011 A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 401, P. 122

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A questão relativa a esta escola chegou aos ouvidos do presidente Manuel Machado e da pior forma possível. De tal modo que motivaria do próprio uma reacção pouco habitual na sessão de 3 de Setembro de 2001, no seguimento de uma intervenção do vereador Gouveia Monteiro que questionava o facto de as obras ainda não terem começado: «…que se deslocou à Escola Primária de Sargento-Mor tendo ficado indignado com o estado em que a mesma se encontrava, admitindo até a hipótese de procedimento disciplinar sobre os responsáveis de determinado tipo de coisas verificadas (…) estando a avaliar a exacta dimensão da razão da negligência detectada e outras da responsabilidade da Junta de Freguesia (…) Disse ainda que assumiu o compromisso e controle directo de operações imediatas que vão ser iniciadas no sentido do recreio da escola não ter aquele tipo de piso, para que os pedaços de muro não estejam no recreio, para que as telhas velhas sejam removidas, já que é chocante o estado de manutenção daquele equipamento educativo»(633). A concluir, referiu ainda que o caderno de encargos e orçamento estariam prontos brevemente para lançamento do concurso público de empreitada geral, no valor de aproximadamente 50.000 contos. Contudo, a obra de remodelação desta escola seria adjudicada já no tempo da presidência municipal de Carlos Encarnação, a 1 de Julho de 2002(634), tendo a escola funcionado, enquanto as obras decorriam, nas instalações cedidas pelo Centro Cultural de Sargento-Mor. Por despacho de 09/03/2001 abriu-se concurso limitado para a conservação e reparação da Escola Primária de Souselas e, em 28 de Junho de 2003, comemorou-se a instalação de uma vedação de protecção em redor da escola, totalmente financiada pela Cimpor. Em Novembro de 2005, a JF desenvolveu diversas reuniões com os encarregados de educação das escolas primárias da freguesia os quais «…manifestaram o seu desagrado pelo abandono das escolas», tendo o executivo deliberado proceder de imediato às necessárias reparações(635). A Escola do 1º C.E.B. da Marmeleira seria dotada com um novo refeitório inaugurado a 15 de Setembro de 2008. E, a 21 de Abril de 2009 foi inaugurado o novo Polidesportivo da EB1 de Souselas (fotos 80 e 82). A 16/06/2013 foi rubricado na Biblioteca Anexa de Souselas o contrato de empreitada para a construção do refeitório da escola de Souselas, no valor de 130.000 euros, que permitirá dar corpo ao Centro Escolar. As obras iniciaram-se em Agosto de 2013. (633) (634) (635)

Id. Nº 406, P. 17 Id. Nº 411, P. 31 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 47

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Freguesia de Souselas – um povo com História

7. A creche e infantário A criação de uma creche em Souselas germinou no seio da Comissão de Moradores em Junho de 1975: «Foi apresentada a ideia, de escrever ao Senhor Doutor Alberto Dias Pereira, para se saber, quando podia receber alguns elementos da Comissão de Moradores, Junta de Freguesia, e Casa do Povo, a fim de se saber da sua opinião, quanto ao terreno e casa do passal, para uma futura creche ali a instalar»(636). Entretanto, constituiu-se uma Comissão Pró-Infantário e Jardim de Infância que solicitou à JF a cedência de uma parcela de terreno municipal, no sítio do Calvário, para esse fim. O pedido mereceu parecer favorável da Junta de Freguesia que disso deu conta, via ofício de 11 de Setembro de 1980, junto do município onde realçou « tratar-se de uma obra que faz bastante falta nesta Freguesia, devido ao seu meio bastante industrial»(637). A verdade é que a 7 de Setembro de 1980 foi inaugurado em Souselas o parque infantil Doutor Alberto Álvaro Dias Pereira, uma obra que contou também com a colaboração da Casa do Povo. Na cerimónia, marcou presença, em representação do município, o vereador Engº Pinto dos Santos que na presença do doador do terreno leu um pequeno discurso, na realidade uma pequena biografia do homenageado (vide apêndice). Em 1982, e por doação feita à Junta de Freguesia de Souselas pelo já mencionado Dr. Álvaro Pereira, de um lote de terreno com 3612 m2, veio a construir-se a creche (infantário), transferindo-se o parque infantil, cujo terreno seria ocupado pelo actual recinto de festas, projectado pela Arquitecta Teresa e edificado com a ajuda da Cimpor. O projecto de construção foi elaborado pelo GAT de Coimbra em 1983, com assinatura do arquitecto José Fernando Silva de Oliveira. O infantário era destinado a 75 crianças (25 em creche e 50 em jardim de infância). Previase: coberto da entrada principal, entrada principal/espera, circulação, copa de leites, instalação sanitária dos pequenos, sala dos pequenos (3 a 6 meses), instalação sanitária do Jardim de Infância, lavandaria, instalação sanitária do pessoal, vestiário do pessoal, coberto de entrada de serviço, circulação da zona de serviço, arrecadação, dispensa, cozinha, sala polivalente, arrecadação de apoio ao salão polivalente, instalação sanitária das educadoras, sala do pessoal e gabinete da direcção(638).

(636) (637) (638)

A.J.F.S. – Livro de Actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976, Fl. 2 A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - «Infantário de Souselas» (processo)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

8. Por uma rede de transportes de qualidade No princípio dos anos 80, os habitantes do lugar de Sargento-Mor reclamavam a extensão da linha de transportes colectivos desde os Fornos. Como o problema não era resolvido, as comissões de moradores dos diversos lugares da área afectada organizaram-se e expuseram o caso ao Governo Civil, por ofício de 9 de Março de 1982: «Desde 1979 que a Junta de Freguesia de Souselas em colaboração com uma Comissão de Moradores dos lugares de Sargento-Mór, Adões, e Trouxemil, Quinta Branca, e Zouparria do Monte, está interessada e, atender aos anseios do povo daqueles lugares para a continuação da carreira do autocarro dos Serviços Municipalizados de Coimbra a Fornos até Sargento-Mor, passando pelos lugares acima indicados»(639). No final da década de 90 Souselas continuava a sofrer de deficiências ao nível dos transportes. Uma situação denunciada por João Pardal, na sessão camarária de 31 de Maio de 1999, com especial atenção ao nível da C.P. e Transportes Urbanos: «…que a estação da CP de Souselas está transformada num mero apeadeiro facto que considera grave pois traduz-se numa desclassificação com prejuízos para os seus utentes que têm de se deslocar a Coimbra para adquirir os seus passes, já que a referida “estação” deixou de ter serviço de bilheteira (…) referiu que a Câmara Municipal de Coimbra deve tomar uma posição no sentido de equacionar a constituição de uma linha dos Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra que possa servir as freguesias do Botão no sentido de superar a carência de transporte que hoje se verifica. Disse também ser oportuno a Câmara Municipal de Coimbra equacionar a CP sobre a situação actual, já que não é compreensível que uma Estação como a de Souselas, que no passado recente teve uma importância estratégica para a região e uma utilidade inquestionável para os munícipes da zona, tenha os seus serviços resumidos à circulação de comboios de mercadorias para a Cimpor e cada vez menos ao transporte de cidadãos para Coimbra nomeadamente para os estudos e respectivos empregos»(640). O vereador souselense referiu, ainda, os atrasos nos comboios e supressão de outros, as péssimas condições dos apeadeiros da Adémia e Fornos, bem como a qualidade duvidosa dos autocarros da Rodoviária da Beira Litoral que servem a região. A freguesia está actualmente bem servida de transportes tendo-se resolvido a situação de Sargento Mor a partir de Setembro de 2009: os autocarros dos SMTUC passaram a fazer carreira dentro da localidade com viragem na Rua do Lagar. (639) (640)

A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 391, P. 179

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Foto 43 - A antiga povoação de Canetas, hoje integrada no lugar de Sargento-Mor

Foto 44 - Ponte do Remungão em 1916

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 45 - Ponte de Frades sobre o Rio Botão (meados do Séc. XX)

Foto 46 - Cemitério antigo de Souselas

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Foto 47 - Cemitério antigo de Souselas (interior)

Foto 48 - Cemitério da Marmeleira

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 49 - A antiga Escola Primária de Souselas (hoje sede da Tuna Souselense)

Foto 50 - Escola do Ensino Básico da Marmeleira

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 51 - Inauguração do refeitório da EB1 da Marmeleira (15 de Setembro de 2008)

Foto 52 - Refeitório da EB1 da Marmeleira (interior)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 53 - EB1 de Sargento-Mor

Foto 54 - A Estação de Souselas em meados do Séc. XX

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Foto 55 - A Estação de Caminho de Ferro de Souselas na actualidade

Foto 56 - Linha do Norte (vista para Norte)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 57 - Mina de Caolino na Marmeleira (meados do Séc. XX)

Foto 58 - A Fábrica CESOL (meados do Séc. XX)

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Foto 59 - Fábrica de Cal Hidráulica (abandonada) no sopé da Serra do Alhastro

Foto 60 - Instalações da antiga SIAF (actual Ecociclo)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 61 - A Cimpor

Foto 62 - Vista da Cimpor a partir da Serra de Brasfemes

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Foto 63 - A nova Estação de Correios de Souselas inaugurada a 06-03-1959 (notícia no Diário de Coimbra)

Foto 64 - A nova Estação de Correios de Souselas inaugurada a 06-03-1959 (notícia no Diário de Coimbra)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 65 - O Lavadouro do Goivo na Marmeleira

Foto 66 - O complexo onde está a sede da Junta de Freguesia de Souselas (à esquerda), a Casa do Povo de Souselas (ao centro) e a Extensão de Saúde de Souselas (à direita)

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Foto 67 - Poluição da Cimpor (final do Séc. XX)

Foto 68 - Capa de um jornal da cidade sobre as manifestações contra a co-incineração em Souselas

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Fotos 69, 70 e 71 - Capas dos jornais da cidade sobre as manifestações contra a co-incineração em Souselas

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9. A criação de um mercado A falta de um espaço para transacção de bens, para realização de comércio numa zona tão rica do ponto de vista agrícola constituía uma falha secular. De facto, já nas memórias paroquiais de 1758 se referia que a freguesia «não tem feira alguma». A 20 de Março de 1958 e pressionados pelo povo, a JF envia ao Presidente da Câmara um pedido especial: «…autorização para se criar um pequeno mercado de cereais e legumes, hortaliças, frutas, aves e animais de capoeira e peixe fresco e salgado, no Largo principal de Souselas, ás terças-feiras, quintas e Domingos, sem qualquer contribuição, enviando-lhe um pedido feito por vários moradores nesta freguesia»(641). De facto, a criação de um pequeno mercado justificava-se porque os mercados existentes na região ficavam a vários quilómetros de distância. E não demorou muito a chegar a resposta desejada, já que em Abril desse ano o município delibera, favoravelmente, pelo que a junta de freguesia define o dia 13 de Abril (um Domingo) como início da realização (e inauguração) regular do mercado(642). No final de 1982, decidiu-se construir um mercado no local da antiga escola, que avançou depois de concluídas as obras de saneamento, indispensáveis para um bom funcionamento das casas de banho. Em Abril de 1983 a JF pedia ao município a cedência de 6 bancas metálicas para vendedores «que se encontram na secção de higiene (…) para serem utilizadas num mini-mercado que esta Junta está preparando em Souselas, no terreno da antiga Escola. Esta nossa iniciativa, tem por objectivo retirar as vendedoras que presentemente fazem as suas vendas nas escadas de entrada da Igreja Paroquial»(643). A construção do dito mercado, programada desde 1982, passou a ser um objectivo perseguido pelos executivos posteriores. O mercado seria inaugurado em 1984, homenageando o 1º carteiro da freguesia e presidente da Junta de Freguesia de Souselas entre 1957-1959 (fotos 84A e 84B). A JF deliberou, em 12 de Março de 1996 «…proceder à elaboração de um projecto para a divisão do Mercado Abastecedor de Souselas afim de serem criadas as condições mínimas exigidas em condições de higiene e para que esta Autarquia possa celebrar contratos de cedência aos munícipes interessados, de modo a que haja alguma rentabilidade para a Junta de Freguesia de Souselas»(644).

(641) (642) (643) (644)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, Fl. 1v. Id. Fl. 3 A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 3

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Em 2003 apresentou-se um projecto para remodelação do mercado da Vila e, em Junho de 2006 a JF solicitou ao município a elaboração de um projecto para a requalificação do Mercado Adriano Santos Silva.

10. Expansão Urbana A Freguesia de Souselas, impulsionada pelo desenvolvimento industrial, possuía em meados dos anos 80 uma série de bairros em volta do núcleo central e primitivo, Azenha, Calvário, Estreitas, Almas, Matoito, Vale de S. Pedro, Moenda e Almoinhas, a que se juntou pelos finais dos anos 90, o Bairro dos Carrizes, até então um pequeno e antigo aglomerado populacional. Sendo previsível a continuidade do crescimento urbano de Souselas, a Câmara Municipal de Coimbra elaborou pelo G.A.T. o estudo de expansão urbana da freguesia, cabendo ao então vereador Carlos Encarnação apresentar aos seus colegas o programa em 1984. De facto, na sessão de 9 de Abril, Carlos Encarnação apresenta o plano, embora desalentado com algumas dificuldades no terreno: «…disse ter constatado, com surpresa, que foi construído um edifício escolar em Souselas que, por si e com a zona de protecção envolvente, praticamente inviabiliza a concretização da expansão urbana prevista para o local, o que é de lamentar e se deve, como é evidente, a falta de ligação entre entidades que se podem prejudicar mutuamente na prossecução dos seus fins»(645). Este plano previa a implantação de habitações sociais, a construir pela Câmara Municipal para transferência da população de Souselas. Porém, ficará na prateleira até Abril de 1986, quando volta a discussão camarária, solicitado pelo vereador Manuel Machado, quando relatava algumas diligências que fizera com a empresa pois «importava estabelecer negociações que envolvam compromissos financeiros com a CIMPOR»(646). Uma das urbanizações que marcaram as relações JF-C.M.C. na década de 80 foi, sem dúvida alguma a Urbanização do Calvário, aprovada pelo executivo a 2 de Novembro de 1987, sob proposta de Manuel Machado e elaboração dos Serviços de Divisão de Habitação Social. Contudo, apenas a 20 de Março de 1989 o município aprovou por unanimidade o projecto, caderno de encargos, projecto de execução e anúncio de concurso público, solicitando-se financiamento junto do I.N. de Habitação(647).

(645) (646) (647)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 297, Fl. 48 Id. Nº 313, 1986, Fl. 16 Id. Nº 331, Pp. 114-116

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Freguesia de Souselas – um povo com História

A partir de então será conhecida como Urbanização de Souselas, e acerca dela se tomaram decisões importantes nos tempos próximos: em Junho abrem-se propostas para a construção de arruamentos, rede de abastecimento de água, drenagem de esgotos residuais, trabalhos adjudicados no mês seguinte à firma J. Dias. Particularmente importante para Souselas foi a implementação da rede de drenagem de esgotos exteriores ao loteamento, que consistiu no prolongamento da existente, na extensão de aproximadamente meio quilómetro do caminho municipal à estrada nacional 336. A rede a montar, serviria não só o loteamento mas também o campo de jogos, escola primária, futuras instalações da Junta de Freguesia e edificações que ladeiam o acima citado caminho. Os esgotos seriam, deste modo, conduzidos para a ETAR de Souselas(648). Os trabalhos da urbanização tornaram necessária a contracção de empréstimo junto do I.N. de Habitação no valor de 7.980.000$00. No contexto da informação prestada pelo presidente do município, Manuel Machado, em Setembro de 1989, percebe-se toda a dinâmica inerente ao plano de urbanização em curso: «A carência de alojamentos, tanto em quantidade como em qualidade é ainda um problema grave que se coloca a grande parte dos municípios e aliada à falta de recursos compatíveis, obriga muitos deles a suportar condições de habitabilidade inaceitáveis, sempre na esperança de um dia melhorar essa situação. Mas torna-se igualmente importante ter presente que “a habitação” não é apenas o alojamento onde se vive, mas também um conjunto de infraestruturas e equipamentos sociais que correspondem às necessidades da vida familiar, social, cultural e económica. Nesse sentido procuramos desenvolver o projecto da urbanização do terreno municipal do Cabeço do Calvário, em Souselas e previsto no Plano de Actividades / oitenta e nove criando um novo pólo de atracção habitacional na sede da freguesia em local suficientemente protegido dos efeitos da poluição industrial. Encontra-se assim em curso um plano de urbanização (que se destina a ser alargado) e, no terreno já disponível foi construída a escola primária e encontram-se em construção a escola pré-primária, a sede da junta de freguesia, o posto médico e o complexo cultural e recreativo. Tais acções têm sido desenvolvidas pelos diversos serviços e departamentos municipais e com a cooperação indispensável e relevante da Junta de Freguesia e mesmo de empresas Simultaneamente, encontra-se em execução a infraestruturação de toda a urbanização, onde vão ser igualmente criados 36 lotes para venda no regime de “preços controlados” e destinados à “promoção privada individual” , por auto-construção, de 36 habitações.

(648)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 333, 1989, P. 19

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Um dos lotes com a área de 750 M2, dadas as suas características e as necessidades habitacionais conhecidas, é reservado para a construção (pela Câmara Municipal de Coimbra) de 6 habitações sociais»(649). Enquanto decorria a execução das terraplanagens dos arruamentos, o município aprova, a 15 de Março de 1990 e por unanimidade, a minuta do contrato de financiamento para a execução das infraestruturas de solos no loteamento Cabeço do Calvário, tendo em vista a construção de 42 fogos de habitação social(650). Em Setembro de 1991 estava concluída a infra-estruturação da urbanização; arruamentos, abastecimento de água, drenagem de esgotos, pelo que na sessão do dia 9 avança-se para uma nova fase aprovando, quer o concurso elaborado pelo Departamento de Desenvolvimento Social para venda de 36 lotes de terreno «… para construção de habitação própria permanente no regime de auto-construção ou promoção privada», quer o regulamento de construções a edificar na urbanização(651). O lote 1 ficava reservado para a C.M.C, tinha a área de 485 m2 e nele se previa construir um prédio em propriedade horizontal com 6 fogos. O loteamento seria aprovado por unanimidade pela C.M.C. na sessão de 2 de Dezembro de 1991(652) ficando as áreas assim distribuídas: Área de equipamento – 6.447 m2; Área de reserva da C.M.C. – 9.239 m2; Arruamentos e passeios (inclui a área de 115 m2 provenientes de um particular) – 3.407 m2; Área dos lotes – 10.128 m2; Área total do terreno – 29.275 m2. Em Fevereiro de 1993 estavam já vendidos, através de concurso público, seis lotes, deliberando-se dar sequência à venda dos restantes nos tempos seguintes, numa altura em que no concelho estava em marcha outra urbanização com caracteristicas semelhantes – a da Moita Santa (Cernache). Em Março de 1994 é vendido o lote Nº1 à então pujante Cooperativa de Habitação Habijovem de Coimbra para construção de habitação para venda a custos controlados(653). A procura de Souselas para residência de população, oriunda da própria freguesia ou da área envolvente, tem continuado nos últimos anos, apesar das restrições trazidas pelo P.D.M. Ainda recentemente, o executivo local deliberou, em sessão de 28 de Março de 2007, solicitar a inclusão no P.D.M. como área urbana, o espaço compreendido entre o Instituto Educativo de Souselas e as primeiras habitações da Marmeleira(654).

(649) (650) (651) (652) (653) (654)

Id. Nº 344, Pp.143-145 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 337, 1990, P. 54 Id. Nº 346, P. 19 Id. Nº 347, P. 134 Id. Nº 361, P. 51 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 85v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

11. O Quartel da G.N.R. Pelo final de 1959, uma exposição conjunta das Juntas de Freguesia de Souselas, Botão, Torre de Vilela e Trouxemil, dirigida ao município, solicitava que a edilidade patrocinasse o pedido para a criação de um sub-posto na sede da freguesia de Souselas. Um pedido baseado na falta de policiamento da zona: «Apontavam-se os atentados de que a propriedade rural é alvo e indicava-se a serie de roubos e assaltos verificados nos últimos tempos, que vão desde o arrombamento da igreja matriz, com violação do sacrário, até ao da estação dos C.T.T., cujo cofre foi roubado, aos assaltos a casas particulares e ao café local, etc., todos eles impunes até ao presente»(655). A 2 de Junho de 1986, e depois de um longo processo onde foi necessário pedir autorização à Direcção Escolar de Coimbra e legalização do prédio nas Finanças, o executivo municipal delibera por unanimidade, ceder o antigo edifício escolar de Souselas para nele ser instalado um quartel da GNR «… entidade a quem deve ser pedido o programa respectivo para estudo, devendo dar-se assistência técnica à Junta daquela freguesia para concretizar a operação». A partir deste momento a autoridade municipal abdicava, em simultâneo, da ideia em instalar aí a sede da junta de freguesia. Porém não desistirá de lutar, a par da JF, por esse objectivo extensível à área Norte do concelho, voltando o assunto a ser largamente debatido pelo executivo municipal em 1989. Um assunto trazido à actualidade pelo vereador Álvaro Seco, na reunião de 12 de Junho: «…começou por referir sobre este assunto, ser uma velha aspiração de Souselas a localização de um Posto da Guarda Nacional Republicana naquela localidade. É um assunto que se vem arrastando ao longo dos tempos, e que a Guarda Nacional Republicana não dá o seu apoio, por falta de meios, segundo o informaram»(656). Este vereador trouxera para a sessão uma proposta elaborada pelo Arquitecto Paisagista Rui Campino, da Divisão do Plano Director Municipal (P.D.M.), em resposta a uma solicitação da Junta de Freguesia de Souselas. Um documento fundamental, que reforça e permite compreender a necessidade de um posto da G.N.R em Souselas: «O Plano Director Municipal no seu documento “PROGRAMA BASE” aprovado pelo Executivo Municipal, aponta para a criação de um Posto da Guarda Nacional Republicana no aglomerado urbano de Souselas.

(655) (656)

«Interesses Locais» In Diário de Notícias, 20/04/1960 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 332, P. 276

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Este aglomerado que no mesmo documento assume a função de núcleo central dum Espaço-Plano (zona norte do Concelho) com uma área aproximadamente cinquenta e dois quilómetros quadrados e uma população residente de dez mil habitantes e que se prevê venha a atingir o valor de quinze mil até ao ano dois mil (…) Outros factores relevantes que contribuíram para a nossa proposta foram: • área em pleno desenvolvimento urbano; • área de características marcadamente industriais; • existência de uma unidade bancária (Caixa Geral de Depósitos); • localização a curto prazo de uma secção de Finanças; • construção a curto prazo de uma Escola do tipo C+S; • estação de caminho-de-ferro, importante não só como terminal de passageiros como de mercadorias (cimentos, mármores, etc); A nossa proposta é ainda reforçada pelos estudos do Centro de Estudos e Planeamento, número doze – Setembro de mil novecentos e setenta e sete – quando afirma justificar-se a localização de um Posto da Guarda Nacional Republicana para policiamento de áreas rurais de aglomerados por cada dez mil habitantes»(657). Esta informação será aprovada por unanimidade, deliberando-se oficiar ao M.A.I e Comando Geral da G.N.R. insistindo na instalação do posto na sede da freguesia. E, enquanto se não davam passos concretos no terreno, a C.M.C. foi aprovando a sua parte: em Novembro de 1990, o anteprojecto do dito quartel e, em Agosto de 1992, a localização num terreno com a área de 2.500 m2, sito no Cabeço do Calvário. Adormeceria o assunto nos tempos próximos e novidades sobre este tema só alguns anos depois. A 1 de Fevereiro de 1999, o Gabinete de Estudos e de Planeamento de Instalações informava a C.M.C. que a freguesia de Souselas fora incluída nos locais abrangidos pelo concurso limitado por prévia qualificação para trabalhos de concepção, solicitando que o município disponibilizasse o terreno, o que de imediato faz; pela deliberação Nº 1470/99 e, por unanimidade, reafirma-se a cedência de terreno no local indicado atrás(658). A localização do terreno em planta cadastral é aprovada em Abril e, a 26 de Agosto assina-se protocolo entre a C.M.C. e o M.A.I. relativo à construção das novas instalações do quartel. Em Março de 2000, os projectos das novas instalações da G.N.R. para Souselas e Taveiro são incluídos no PIDDAC-2000, prevendo-se o início do processo de concurso para os próximos meses.

(657) (658)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 332, Pp. 276-277 Id. Nº 390, P. 121

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Freguesia de Souselas – um povo com História

No entanto, e mais uma vez, o processo tende a ser esquecido. Porém, João Pardal na sessão de câmara de 11 de Junho de 2001 e partindo de uma notícia publicada num jornal local alertava: «No caso de Souselas há terreno disponível e não se evolui para a respectiva construção. Disse ainda que a zona norte é extremamente complexa, com crescente marginalidade e criminalidade, vivendo-se uma situação de insegurança. Pensa que a Câmara Municipal de Coimbra deveria diligenciar junto do Ministério responsável, para que o lançamento do projecto dos quartéis seja efectuado rapidamente»(659). No mesmo sentido, mas no ano seguinte, a JF decide enviar ofícios a várias autoridades com responsabilidade (C.M.C., G.C. e G.N.R.) informando que «…a onda de assaltos está a aumentar abruptamente na Freguesia, e também sensibilizar estes organismos do Estado para a construção do quartel da GNR na Vila de Souselas, onde já existe terreno para a sua construção»(660). No último trimestre de 2003 a JF de Souselas assume a dianteira do processo, reunindo com as juntas de freguesia a Norte de Coimbra, para debater o tema e enviando ofícios a diversas entidades, dando conta do grave problema. Mas só em Novembro de 2008 se conheceu fumo branco a este respeito; nos inícios de Novembro uma equipa do M.A.I, em colaboração com a JF, aprovavam a localização do novo quartel, em terreno ao lado da Casa do Povo, tal como há 20 anos havia sido designado. Quatro anos depois de ter sido criado no âmbito da lei orgânica da Guarda Nacional Republicana, o posto territorial de Souselas passou à fase de projecto(661). De facto, em Julho de 2011, o MAI, por intermédio da Direcção Geral de Infra-Estruturas e Equipamentos, concluiu o estudo geotécnico ao terreno dando início à fase de execução.

12. O desejo antigo de um novo cemitério paroquial em Souselas Dois factores precipitaram a decisão em avançar para um novo cemitério; a sobrelotação e o facto da proximidade à Cimpor ter tornado um espaço de respeito e recolhimento, num espaço sacrificado pelo pó e lixo. Através de ofício de 26 de Setembro de 1992, enviado pela JF para a CMC, dava-se conta da deliberação por unanimidade da AF [de 26/09/1992] em que o local indicado para a construção do novo cemitério de Souselas seria em Vale Miguel(662).

(659) (660) (661) (662)

Id. Nº 404, P. 206 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 22v. «Posto da GNR de Souselas está em fase de projecto» In Diário de Coimbra, 6.ª Feira, 22/07/2011 A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Em ofício enviado a 3 de Junho de 1994 ao vereador Jorge Lemos, a JF lamentava «com grande espanto» o corte na verba destinada ao novo cemitério de Souselas, previsto no Plano de Actividades, uma situação grave dada a sobrelotação do espaço(663). Tão grave era a situação que, em comunicação datada de 12 de Dezembro de 1996 remetida pela JF ao Vereador Jorge Lemos, dava-se conta que no cemitério de Souselas só existem 3 campas livres e que a direcção da Cimpor não aceitava o alargamento contrapondo na construção de um novo. O assunto é então classificado como «a prioridade das prioridades», desenvolvendo-se nos tempos próximos contactos com os proprietários do terreno(664). Em Abril de 1997, modificam-se um pouco as coisas dado que a Cimpor, depois de muita insistência da JF, acedera às suas pretensões e colocava à disposição cerca de 600 m2 de terreno confinante com o cemitério e destinados ao seu alargamento. No mês seguinte a C.M.C. consideraria viável a ampliação do Cemitério Paroquial de Souselas, desde que se obtivessem as garantias de cedência do terreno por parte da empresa. A 14 de Maio de 2001, o vereador Gouveia Monteiro alertava a municipalidade em relação à ampliação do cemitério da freguesia: «…espera que o processo da obra seja desencadeado o mais rapidamente possível, adquirindo a Câmara o terreno disponível na zona de S. Martinho do Pinheiro, conforme preconiza o Plano Director Municipal»(665). Na sessão seguinte alertará ainda para o facto de o terreno não estar de acordo com a localização preconizada no PDM. O empurrão decisivo, para a construção de um novo cemitério em Souselas, chegou em tempos recentes, sendo reactivado pela JF em Outubro de 2002 por ofício enviado ao executivo municipal «…solicitando a construção do novo cemitério na Rua Vale Miguel em S. Martinho do Pinheiro, conforme PDM em vigor»(666). Ao pedido seria sensível o município que, a 26 de Dezembro de 2002 e por despacho de João Rebelo, aprova o parecer técnico e avaliação com a Junta de Freguesia onde se considerou a existência do cemitério como de «manifesto interesse público». Na sessão camarária de 30 de Dezembro e, pela deliberação nº 1645/2002, foi aprovada a sua localização, baseada na informação da Divisão de Estudos e Projectos: «Na sequência da apresentação, pela junta de Freguesia de Souselas, do problema da saturação do actual Cemitério, e em consonância com o programado no Plano Director Municipal em que se prevê um novo cemitério

(663) (664) (665) (666)

Id. Id. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 404, P. 54 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 25v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

que sirva os lugares da Zouparria do Monte e S. Martinho do Pinheiro, foi desenvolvido o processo de escolha do terreno para construção do citado equipamento. A escolha recaiu em terreno localizado maioritariamente em zona agrícola de acordo com o PDM e em Reserva Agrícola Nacional pelo que foi necessário proceder à sua desafectação da RAN»(667). A mesma informação referia que se procedera a vistoria do terreno, definindo-se as parcelas de terreno necessárias à construção do equipamento, designadamente a área total a adquirir de 3.267 M2 localizado em Vale Miguel – S. Martinho do Pinheiro, tendo-se procedido às necessárias negociações. O impulso final, chegou em meados de 2006, quando a C.M.C. tomou posse administrativa das parcelas de terreno necessárias à construção do novo cemitério(668). No seguimento, a C.M.C. lançou concurso público para a execução da obra nos finais de 2006, ocorrendo a adjudicação da mesma em Março de 2007. A consignação da obra fez-se a 29 de Maio de 2007 e, a nova infra-estrutura destacar-se-ia pela dimensão: 394 campas repartidas por 4 talhões, uma área para jazigos e outra para ossários, instalações de apoio constituídas por casas de banho gabinete e arrumos. O arranjo exterior incluiu um amplo parque de estacionamento, floreiras para enquadramento paisagístico e iluminação pública. Ao todo investiram-se 220 mil euros. A 15 de Fevereiro de 2009, o novo cemitério paroquial de Souselas foi solenemente inaugurado, numa cerimónia que contou com a presença do Presidente da C.M.C, de destacados elementos do executivo camarário e, com o Bispo D. Albino Cleto que procedeu à bênção do espaço (fotos 85 e 86).

13. A elevação a Vila A 12 de Julho de 1994 e em reunião do executivo da freguesia tomou-se uma decisão histórica: «…que se iniciasse o processo da recolha dos elementos necessários; históricos, culturais, etc., a fim desta Autarquia propôr à Assembleia da República, a elevação de Souselas à categoria de Vila»(669). A 17 de Maio de 1996, a JF oficiava ao Presidente da C.M.C. pedindo que o executivo municipal emitisse parecer favorável para elevação de Souselas a Vila:

(667) (668) (669)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 413, 2002, P. 318 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 60 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 1v.

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

«…por se tratar duma velha aspiração dos habitantes desta localidade (…) Para esse fim cumpre-nos informar V. Ex.ª que para Souselas, é mais do que merecida essa distinção pelo valor do seu passado histórico, a sua localização, a sua actual grandeza no sector comercial e o que indiscutivelmente esta hoje representa no campo industrial. Nenhuma outra aldeia do nosso distrito ou até do país lhe é comparável neste campo (reconheça-se que Souselas tem a maior fábrica cimenteira do país e que é uma das maiores da Europa no género), não esquecendo ainda o grande aumento habitacional verificados nos últimos anos»

Acompanhava esta comunicação as «Razões de ordem histórica» (vestígios arqueológicos, documentação antiga, monumentos), bem como o facto de Souselas ser servida pelas principais vias de comunicação; a via-férrea (Linha do Norte), a IP3 e o IC2. A estrutura socioeconómica do lugar surgia de forma também destacada: «Além do acima indicado, não queremos deixar de referenciar que existem nesta povoação, nos sectores da Indústria – 5 fábricas; Comércio – 4 mini-mercados, 5 prontos-a-vestir, 1 papelaria, 1 armazém de ferragens, 1 armazém de adubos e rações, 1 casa de móveis, 1 sapataria, 2 talhos, 1 mercado de abastecimento, e um posto de abastecimento de combustiveis; Indústria Hoteleira – 1 pensão, 4 restaurantes, 9 cafés e 2 tabernas; Transportes – é servida por 1 estação ferroviária, pela R.B.L. e por uma praça de táxi; Saúde – 1 Posto Médico, 1 farmácia, 1 consultório de estomatologia e 1 posto de recolha de análises clinicas; Campo Técnico – 1 Instituto de soldadura e qualidade (inspecção de veículos automóveis), Outras Indústrias Transformadoras - 1 padaria, 1 Adega Cooperativa; Indústrica Automecãnica – 2 oficinas de reparação de automóveis, Serralharia Civil – 1 oficina, Ensino – 1 liceu com ensino básico e secundário, 1 escola de ensino básico com 4 salas, 1 pré-primária, 1 ATL e 2 escolas de música; Associativismo – 4 colectividades; Instalações Desportivas – 1 campo de futebol e 1 recinto polidesportivo; Outros Serviços – Sede da Junta de Freguesia; 1 Estação dos C.T.T. e 1 Agência Bancária da C.G. Depósitos; Apoio Social – 1 infantário/creche e 1 lar da 3ª idade; Etnografia – 1 grupo etnográfico da Casa do Povo, reconhecido e classificado pelo Gabinete Nacional de Etnografia»(670). Munido de todos os pareceres e documentos necessários (inclusivamente da Assembleia Municipal que na reunião de 28/6/1996 e acerca da elevação deliberou emitir parecer favorável com duas abstenções), deu entrada na A.R. o

(670)

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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projecto lei da autoria do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português que conheceu um final feliz, e que mereceu a realização de uma reunião do executivo «excepcionalmente» - de que resultou a Acta Nº 14 do dia 12 de Julho de 1997: «Aos doze dias do mês de Julho do ano de mil novecentos e noventa e sete reuniu excepcionalmente o Executivo da Junta de Freguesia de Souselas, a fim de se congratular com a publicação de hoje no Diário da República em 1.ª Série – A Nº 159, da elevação de Souselas e Vila. A referida elevação que tem o seu epílogo nesta data e que deixa extraordináriamente feliz o actual Executivo, pela insistência, pelo querer e pela ultrapassagem de barreiras numa luta contra aqueles que tudo fizeram e lamentávelmente a Câmara Municipal de Coimbra, para que este objectivo não fosse alcançado; veio a ser concretizada pela Lei Nº 54/97, de 12 de Julho – Aprovada em 4 de Junho/97 pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos – Promulgada em 20 de Junho/97 pelo Sr. Presidente da República, Jorge Sampaio; e Referendada em 20 de Junho/97 pelo Sr. Primeiro Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres»(671).

Uma acta que não deixa de ser algo polémica, e da qual interessa sublinhar o regozijo do órgão local pelo feito alcançado, certamente o reflexo do sentir da população.

14. Pavilhão gimnodesportivo e polidesportivo e requalificação do recinto de festas Ao percorrermos as actas da Junta de Freguesia ou da Câmara Municipal de Coimbra, encontraremos referências a um antigo desejo do povo; ter um Pavilhão Gimnodesportivo. O polidesportivo de Souselas, que em breve será remodelado, foi uma estrutura que resultou de luta conjunta da Junta de Freguesia e A.D.S. pela sua construção. A JF organizou um cortejo de oferendas em 30/10/1983 destinado a angariar fundos para a construção de um campo desportivo polivalente, no qual actuou a Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Brasfemes.

(671)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fls. 4-4v.

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A 1ª fase de construção do polidesportivo(672) concluiu-se em Maio de 1985, e teve a contribuição da C.M.C com a verba de 200 mil escudos. Foi executado segundo a orientação da Junta de Freguesia, cabendo o projecto ao GAT de Coimbra. Em Maio de 1986, faltava apenas a pavimentação e vedação, tendo a JF pedido apoio junto da C.M.C. Em Junho de 1989, novo apoio municipal, de 200 contos, foi destinado para a construção do polidesportivo, data em que também se apoiaram, com idêntica verba, alguns melhoramentos no campo de futebol; piso, vedação, alargamento, balneários e iluminação(673). Em Janeiro de 1995, deliberou a JF dar início à execução de um projecto completo para o Pavilhão Gimnodesportivo existente «…cobertura, vedação, balneários, bancadas, posto clínico, etc., a fim de se concluir o pavilhão já existente, património desta Autarquia e que se localiza no Recinto de Festas de Souselas»(674). Para esta obra disponibilizou-se a Cimpor a colaborar. Inclusivamente fora apresentado o processo na C.M.C. em 25 de Julho de 1996 e registado com o nº 24681. No entanto, o processo não avançou justificado com problemas relacionados com o alvará, o que motivou a reacção de dois vereadores da oposição na bancada do município, na sessão de 9 de Março de 1998. Num primeiro momento Gouveia Monteiro manifesta-se «…em desacordo com a proposta dos serviços técnicos, dado tratar-se de um equipamento de inegável interesse, sobretudo se tiver em conta que, em toda a zona norte do concelho de Coimbra, não existe nenhum espaço de prática desportiva com dimensão que permita nível competitivo». Em seguida, um filho da terra não poderia deixar de usar da palavra: «…manifestar a sua estranheza pelo facto da Câmara Municipal de Coimbra argumentar que não é possível construir o Pavilhão Gimnodesportivo de Souselas pelo facto de o referido espaço ser possuidor de um alvará para a construção da Casa do Povo de Souselas. Sucede que a Casa do Povo já foi construída noutro local e estranha-se que seja este o impedimento já que o referido espaço já possui outras construções como um ringue, palco e Caixa Geral de Depósitos o que significa que as ilegalidades já foram executadas no passado. Também referiu a importância do Pavilhão para a população sendo necessário desbloquear o processo com a maior celeridade»(675). Contudo, a maioria camarária não aprova a viabilidade de construção, pelo que o tema adormeceu durante algum tempo, despertando em Agosto de 2002 quando a JF oficia ao Vereador do Desporto da C.M.C., Nuno Freitas:

(672) (673) (674) (675)

De referir que na altura existia outro campo polivalente na freguesia, pertença da Cesol. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 332, P. 238 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 2 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 385, P. 37

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Freguesia de Souselas – um povo com História

«…a fim de ser disponibilizado um terreno entre a Escola do 1º Ciclo do Ensino Básico de Souselas e a Pré-Escola, propriedade da Câmara Municipal, solicitar ainda a feitura do projecto além dos apoios necessários para que em colaboração com a Cimpor e a esta Autarquia seja possível construir o referido campo e o mesmo seja relvado à sua volta»(676). A 29 de Novembro de 2006, e na sequência das deliberações da JF e AF, e na continuidade do trabalho desenvolvido ao nível do projecto de requalificação do Largo 25 de Abril/Recinto de Festas e terreno anexo, solicitou-se à C.M.C: «…a cedência ou doação à Junta de Freguesia de Souselas, do terreno sito na Rua dos Correios, anexo ao polidesportivo e pertença da C.M. de Coimbra, para que aí se possa construir o Pavilhão Polidesportivo, estacionamentos e área verde»(677). Em Julho de 2007, a JF solicitou apoio técnico à C.M.C. para a execução da obra, anunciando que a associação de pais estaria disposta a colaborar. Em Setembro de 2009, e na inauguração do campo sintético, foi anunciada pelas autoridades municipais a construção de um pavilhão na freguesia de Souselas. O tão desejado polidesportivo de Souselas integrará a requalificação do recinto de festas de Souselas, que representará um investimento de 110.000 euros: «Nas traseiras da biblioteca deverá ser construído um palco, zona de casas de banho e um pequeno bar, o polidesportivo em frente também deverá ser redesenhado»(678). Este desejo ainda não está cumprido mas, por outro lado, têm-se construído diversos polidesportivos. Tal é o caso do Polidesportivo da EB1 de Souselas (inaugurado a 21/04/2009) ou o Polidesportivo do Cabeço dos Moinhos, no lugar da Marmeleira, inaugurado a 01/07/2012 (foto 87). Entre Julho e Agosto de 2013 decorreu o concurso público para a empreitada de construção do recinto de festas/requalificação do centro urbano de Souselas.

15. A biblioteca A ideia da criação de uma biblioteca na freguesia foi das primeiras necessidades sentidas pelo executivo actual da freguesia, cedo encetando as diligências necessárias: «Face à necessidade e importância da existência da Biblioteca Anexa da Biblioteca Municipal de Coimbra na Freguesia de Souselas, procedeu-se, no dia 11/11/05, a uma reunião com o Sr. Vereador Dr. Mário Nunes, que de imediato abraçou e aprovou o projecto»(679).

(676) (677) (678) (679)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 24 Id. Fl. 74v. «Souselas vai ter um novo recinto de festas» In Diário de Coimbra, 17/06/2013. P.5 A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008, Fl. 47

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

No seguimento decorreu uma visita ao Centro Cívico, onde a JF, e o Vereador e Responsável pelas Bibliotecas aprovaram o local para instalação da biblioteca de Souselas anexa à B.M.C; o edifício da antiga Caixa Geral de Depósitos que necessitaria, no entanto, de intervenção e requalificação. A 26 de Novembro de 2009 assinou-se, nas antigas instalações, da CGD, o auto de consignação da obra (foto 88). Removidos todos os obstáculos e investidos 50.000 euros, a 9 de Janeiro de 2011 a nova biblioteca anexa de Souselas era finalmente inaugurada, na presença de muitos populares (fotos 89 a 92). Um momento cultural particularmente relevante para Souselas, como expressou na ocasião o presidente da freguesia: «Faltava um equipamento na área da cultura, precisamente uma biblioteca, que permitisse a crianças e jovens da freguesia o acesso a livros, computadores e Internet», disse, agradecendo aos responsáveis da Câmara Municipal ali presentes e não esquecendo também os contributos de Carlos Encarnação e de Mário Nunes, respectivamente presidente e vereador da Cultura à data do lançamento do projecto»(680). A cerimónia contou com a presença do presidente da Câmara Municipal Dr. João Paulo Barbosa de Melo, que se fez acompanhar das vereadoras Maria José Azevedo Santos, Maria João Castelo-Branco e do vereador Paulo Leitão. As novas instalações foram benzidas pelo padre Fernando Carvalho.

16. Souselas no Caminho de Santiago e na rota da peregrinação a Fátima Souselas tem como orago Santiago, desde o longínquo ano de 937. Um facto de extrema importância dado que, até ao séc. X, o culto a Santiago teve um carácter local, circunscrito à Galiza. De facto, e a partir de então, verificou-se a internacionalização do itinerário, pela afluência de peregrinos chegados de toda a Europa, potenciando contactos e intercâmbios, que no campo religioso tornaram a peregrinação a forma mais difundida de devoção, reactivando a vida comercial e artesanal das populações. Souselas não escapou a esta nova realidade e terá sido a primeira comunidade no Município de Coimbra a aderir à devoção pelo santo compostelano. Em documentos antigos sobre a freguesia (Sécs. XVII-XVIII), nomeadamente nos registos paroquiais, surgem referências na área de Sargento-Mor à Estrada Real, que também é designada como Estrada para a Galiza ou Estrada para Castela (foto 92A). Deste facto nos é lícito concluir que, por terras da

(680)

«Autarca de Souselas reclama mais atenção ao norte do concelho» In Diário de Coimbra, 10/01/2011, P. 2

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Freguesia de Souselas passavam os caminhos, principais e secundários, que conduziam para Norte os peregrinos (alguns estrangeiros) na direcção de Santiago de Compostela. De facto, Sargento-Mor desenvolveu-se socialmente devido ao intenso tráfego de pessoas e bens que a cruzavam rumando aos mais diversos lugares a nível nacional. Por isso, assim surgiu o pequeno comércio, «as vendas», contribuindo para fixar as gentes à terra e criar um certo hábito de paragem para retemperar forças. É conhecido, aliás, o trajecto medieval do caminho de Santiago até ao Porto, partindo de Coimbra: Mealhada, Avelãs de Caminho, Águeda, Albergaria-a-Velha, Vouga, Oliveira de Azeméis, Santiago de Riba-Ul, Feira, Mosteiros de Grijó e Pedroso – que foi aliás o trajecto de Confalonieri (no Século XVI) e de outros viajantes italianos, como Nicolas Albani (já no Séc. XVIII). Mais difícil de identificar e, de gerar consenso, anda o trajecto (principal ou secundário) ligando Coimbra a Mealhada. Um facto, no entanto, facilmente compreensível: «Na realidade nunca houve uma rede exclusiva de caminhos jacobeus em Portugal. Peregrinos e todos os que, por razões várias, demandavam a Galiza, serviam-se e usavam uma complexa rede de caminhos, muitos dos quais eram tão ou mais remotos que a própria descoberta do túmulo do Apóstolo Santiago em terras de Iria Flavia»(681). A importância e pertinência do tema levou o executivo de Souselas a agir: a autarquia local pretende marcar a passagem e melhorar a sinaléptica do caminho português, colocando a Igreja Matriz e as capelas de Sargento-mor e da Zouparria como pontos de partida de nova caminhada, divulgando os cafés e restaurantes das freguesias junto dos peregrinos. Na cerimónia de inauguração da nova biblioteca, a freguesia apresentou publicamente os símbolos escolhidos; a vieira com a Cruz de Santiago que figurará em folhetos informativos e documentação da junta, nos sinais da estrada ou no carimbo que atestará a passagem do peregrino por Souselas, terra que dista 15 dias a pé de Compostela. Com a intensificação do culto mariano e devoção a Nossa Senhora de Fátima, no mesmo local da freguesia mas no sentido Sul, outra rota se foi estabelecendo no decurso do séc. XX – o caminho para Fátima. Um facto que a freguesia pretende também divulgar. Francisco Iglesias – A Grande Obra dos Caminhos de Santiago – Caminho Português I: os caminhos do Norte de Lisboa, Hercules de Ediciones, 2007, P. 66

(681)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

17. Diversos: delegações bancárias, farmácia, posto de abastecimento, centro cívico, parques infantis e representatividade Por ofício de 6 de Fevereiro de 1979 a Junta de Freguesia enviava a resposta à Direcção Geral de Saúde (Lisboa) emitindo: «…parecer favorável, ao requerimento da farmacêutica Maria do Céu Almeida Cabral Albuquerque Fernandes (…) baseado no facto, da farmácia aqui existente, não ter um serviço, como é exigivel, às muitas centenas de beneficiários abrangidos pelos Serviços Médicos Sociais, existentes nesta localidade»(682). Em Outubro de 1986, sendo presidente da junta de freguesia Delfim Várzeas, oficiou-se ao Gerente da Filial da CGD de Coimbra apresentando proposta/contrato de aluguer de terreno (400 M2) para instalação da filial em Souselas(683). A C.G.D. apresentaria a 7/12/1988, ao município, projecto para um pré-fabricado na Rua 1º de Maio, para acomodação das suas instalações, tendo-se deferido a sua construção a 25 de Setembro de 1989(684). E, em Maio de 1987, é a Caixa de Crédito Agrícola quem remete informação, dando conhecimento dos procedimentos a seguir para a abertura de uma delegação em Souselas. Em ofício enviado à equipa do P.D.M. da C.M.C. a JF solicitava, em Junho de 1993: «…se digne com urgência possível conceder a execução do plano do pormenor contemplando as Bombas de Gasolina a instalar no respectivo local dos troviscais-Souselas, dando preferência ao terreno de Manuel Esteves Gaudencio o único ali existente com fundo e comprimento, reunindo as condições necessárias para o projecto em estudo»(685). Um pedido que vinha na sequência de outro, feito em Março e em nome de Manuel Esteves Gaudêncio, para que fosse dado aval ao pedido de viabilidade para um posto de abastecimento. Decorre, actualmente, a construção do Centro de Formação e Cultura Paroquial de Souselas tendo a JF colaborado, desde 2005, na formalização da candidatura aos fundos comunitários. A 15 de Fevereiro de 2009 procedeu-se ao lançamento simbólico da primeira pedra e bênção pelo bispo (fotos 93 e 94). Representará um investimento de 350 mil euros. O rés-do-chão terá um salão com capacidade para 90 lugares sentados, um palco e casa de banho; o primeiro andar será destinado a 5 salas de formação. Nas traseiras será criado

(682) (683) (684) (685)

A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 334, P. 191 A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação).

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Freguesia de Souselas – um povo com História

um espaço de lazer onde se construirá um jardim. A 16/06/2013, e na biblioteca anexa de Souselas, foi assinado o contrato programa para apoiar a obra, no valor de 10.000 euros. Na Marmeleira construiu-se o Parque de Lazer e Infantil, resultado da colaboração entre a JF e o Centro Social de Marmeleira, disponibilizando este o terreno e, aquela, o apoio financeiro (foto 95). A 11 de Junho de 2006 o parque infantil e o Pavilhão Polidesportivo descoberto foram inaugurados oficialmente. Outro parque infantil seria construído na freguesia e no lugar de São Martinho do Pinheiro, sendo inaugurado a 21 de Abril de 2009 (foto 96). Outros projectos a concretizar: Plataforma Logística de Mercadorias; requalificação do centro urbano de Souselas, prevendo-se a criação na área por detrás da nova biblioteca de um jardim, um recinto de festas, e um pavilhão desportivo, o novo refeitório da escola primária e do jardim-de-infância; extensão do centro de saúde. A representatividade da freguesia não tem sido esquecida, antes estimulada. Momento particularmente significativo foi a participação na iniciativa do Departamento de Cultura da CMC: «As Freguesias nos Paços do Municipio». A inauguração da exposição de Souselas ocorreu a 25 de Fevereiro de 2009 (fotos 97 a 99). Ainda ao nível da representatividade e divulgação, destaca-se a feira das tasquinhas, e os encontros de colectividades. Os passeios dos idosos, que têm levado o nome da freguesia pelo país, constituem uma aposta ganha pela freguesia através do reforço da afirmação da identidade do seu povo (fotos 100 e 101).

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 72 - Inauguração do viaduto (30 de Junho de 2010)

Foto 73 - Inauguração do viaduto (30 de Junho de 2010)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 74 - Perspectiva do viaduto

Foto 75 – Passagem desnivelada na Linha do Norte (inaugurada a 30 de Junho de 2010)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 76 – Passagem desnivelada na Linha do Norte

Foto 77 - EB1 de Souselas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 78 - Escola e Recinto Desportivo da EB1 de Souselas

Foto 79 - Pré-Escola de Souselas

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 80 - Inauguração do Polidesportivo da EB1 de Souselas (21 de Abril de 2009)

Foto 81 - Cerimónia evocativa dos 25 anos da EB1 de Souselas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 82 - Inauguração do Polidesportivo da EB1 de Souselas (21 de Abril de 2009)

Foto 83 - Vista do Instituto Educativo de Souselas (INEDS)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 84A - Mercado Adriano dos Santos Silva em Souselas (exterior)

Foto 84B - Mercado Adriano dos Santos Silva em Souselas (interior)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 85 - Inauguração e benção do novo cemitério de Souselas sito em Vale Miguel, São Martinho do Pinheiro (15 de Fevereiro de 2009)

Foto 86 - Exterior do novo cemitério de Souselas

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 87 - Polidesportivo do Cabeço dos Moinhos, na Marmeleira, inaugurado a 1 de Julho de 2012

Foto 88 - Cerimónia da consignação da obra da Biblioteca de Souselas (26 de Novembro de 2009)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 89 - Aspecto da Biblioteca de Souselas

Foto 90 - Aspecto do interior da Biblioteca de Souselas

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 91 - Inauguração da Biblioteca de Souselas, 10 de Janeiro de 2011

Foto 92 - Cerimónia da inauguração da Biblioteca de Souselas, 10 de Janeiro de 2011

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 92A - A povoação de Sargento-Mor e a antiga estrada real (lado Norte)

Foto 93 - Cerimónia da benção do Centro de Formação e Cultura Paroquial de Souselas, 15 de Fevereiro de 2009

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 94 - Cerimónia do lançamento da primeira pedra do Centro de Formação e Cultura Paroquial de Souselas. Os dinamizadores da obra, João da Costa Paulino e Maria Alexandrina Santos Moreira (15 de Fevereiro de 2009)

Foto 95 - Parque Infantil e de Lazer e Pavilhão Polidesportivo descoberto da Marmeleira (inaugurado a 11 de Junho de 2006)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 96 - Inauguração do Parque Infantil de S. Martinho do Pinheiro (21 de Abril de 2009)

Foto 97 - Exposição da Freguesia de Souselas no átrio da Câmara Municipal de Coimbra (25 de Fevereiro de 2009)

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VI – Evolução Social e Material da Freguesia de Souselas (Progressos e Retrocessos)

Foto 98 - Exposição da Freguesia de Souselas no átrio da Câmara Municipal de Coimbra (25 de Fevereiro de 2009)

Foto 99 - Exposição da Freguesia de Souselas no átrio da Câmara Municipal de Coimbra (25 de Fevereiro de 2009)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 100 - Passeio dos idosos (Junho de 2009)

Foto 101 - Passeio dos idosos ao Douro, 2011

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VII PATRIMÓNIO, ARTE E RELIGIÃO

A

1. Introdução o longo dos tempos, o património da freguesia despertou atenções e preocupações. O mais antigo registo será, porventura, o do ano 937; a doação ao mosteiro de Lorvão da villa de Sausellas, em que se menciona a basilica consagrada a S. Tiago. Ao longo dos séculos foi-se construindo património na área da freguesia, civil ou religioso. Contudo, pouco sabemos acerca de antigas construções ligadas ao património religioso para datas anteriores ao séc. XVIII. De facto, as informações mais pormenorizadas resultam das memórias paroquiais de 1721 e 1758, as quais não deixam de ser breves referências. Em 1721 além da Igreja Matriz assinalavam-se os seguintes templos: «Nesta Frg.ª ha no lugar da Marmelr.ª huã cappella de S. Joam com tres altares hum de noça sr.ª outro d. S.ta Luzia, e outra capella do S.to An.to estas sam do povo; no lugar de Carrima outra capella d. nossa Sr.ª d. Nazaret, e outra no lugar da Zouparria d. S. Mar.to tambem do povo sem haver outras q. sejam de instituidores particulares, e nam sam ferquentados degrande concursso de gente»(686). A mencionada Capela de Santo António corresponderia ao actual Templete das Alminhas, embora o pároco das memórias paroquiais de 1758, a excluísse do conjunto: «Tem huma capella de S. João no lugar da Marmeleira e outra da S.ra da Nazareth no lugar de Carrimá; e huma de S. Martº no lugar da Zouparria; sem romages»(687) É natural que, aos nossos olhos, os párocos não tenham referido mais património, fosse por esquecimento ou por desconhecimento da área abrangida pela freguesia ou…porque ele ainda não existiria no seu tempo. Actualmente, constitui o núcleo patrimonial da freguesia os seguintes monumentos: Em Souselas: a Igreja Matriz, a Capela do Senhor do Terreiro, o Chafariz e o Cruzeiro. Na Marmeleira: a Capela de S. João, a Capela da Senhora da Agonia e o Templete das Alminhas. Em Sargento-Mor: a Capela de Nossa Senhora da Boa Morte, a Capela de Nossa Senhora das Preces e a Alminha de São Romão. Na Zouparria do Monte: a Capela de São Martinho.

(686) (687)

A.U.C. – Fundo do Cabido: Informações Paroquiais de 1721, Souselas, Fl. 1 A.N.T.T. - Dicionário Geográfico, 1758, Souselas, Vol. 35, Nº 238, P. 1701

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Em São Martinho do Pinheiro: a Capela de Nossa Senhora da Nazaré. Deste vasto conjunto, já inventariado e classificado, foi protegido com grau 3 a Capela de S. João na Marmeleira e está em vias de classificação a Igreja Matriz de Souselas com o grau 1(688).

2. Património em Souselas 2.1. A Igreja Matriz de S. Tiago de Souselas A Igreja Matriz de Souselas tem como titular S. Tiago (fotos 102 e 103), invocação já referida no documento do ano 937. Ao longo da história regista-se uma forte ligação com o Mosteiro de Lorvão, uma vez que a freguesia de Souselas foi, desde tempos remotos, uma vigariaria da sua apresentação, ou seja; os párocos eram apresentados pela comunidade de Lorvão, realidade que teve seus princípios em 1197, quando D. Pedro, bispo de Coimbra, cedeu ao abade de Lorvão, D. Afonso, S. Tiago de Souselas e outros domínios, pelos direitos que este possuía em Casal Comba. Lorvão que no Séc. XVIII apresentava o pároco em 14 paróquias(689), sendo também elevado o número de paróquias onde o pároco era apresentado por conventos ou mosteiros de ordens religiosas (52 casos ou seja; 14,8%). Uma situação em certa medida esperada, dada a importância que certos mosteiros tiveram na fundação de igrejas em territórios rurais durante a reconquista e o papel que desempenharam na agregação dos povos em torno da religião e fé. A extinção das ordens religiosas em 1834 acabaria com esta dependência. Até então os párocos de Souselas recebiam de côngrua 40$000 réis mais o pé de altar. O mosteiro, ao longo dos tempos e sempre que a oportunidade surgisse exigia que o pároco o reconhecesse como padroeiro. Foi o que sucedeu, por exemplo, aquando da feitura do tombo de 1705, em que o vigário Manoel de Amaral e Cunha, intimado pelo juiz, fez o seguinte reconhecimento: «…ao qual elle juis do dito tombo fes pregunta por quem estava aprezentado nesta Igreia e quem era o padroeiro della, e quem lhe pagava congroa e se tinha pasais e se pagava delles alguma reção, e por elle foi dito que o mosteiro de Lorvam era padroeiro da dita Igreia insollidum, e que em qualquer tempo que vagou era daprezentação do dito mosteiro e que o emcomendador era o que lhe pagava a sua comgroa, e que tem huns pasais pegados a dita Igreia mas que os pesue livres sem delles pagar reçom dizimo nem outro algum trebuto e que nesta forma reconhese o dito mosteiro por padroeiro da dita Igreia e por estar prezente o Reverendo padre frey Bartollomeu de figueiredo procurador geral do dito mosteiro de Lorvam por elle foi dito e requerido a elle juis do tombo (688) Ana Sofia Gervásio; Carmen Pereira; Raquel Santos – Património Edificado com Interesse Cultura:Concelho de Coimbra, Câmara Municipal de Coimbra, Departamento de Cultura, Gabinete de Arqueologia, Arte e História, Coimbra, 2009, P. 509. (689) Id. P. 227

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VII – Património, Arte e Religião

que comforme os seus tombos e sentensas (…) se lhes devia pagar a reção dos fruitos que nos ditos pasais se recolherem»(690). Esta igreja nada terá a ver com a referida baselica do ano 937. Por outro lado, o seu aspecto actual (fotos 102 a 105) resulta duma reforma da segunda metade do séc. XVIII, a qual terá incidido num templo, construído talvez no séc. XVI, mas que entretanto entrara em adiantada ruína (como aconteceu com diversos templos na área do concelho de Coimbra, de que é exemplo o sucedido com a antiga Igreja de Eiras). Dessa desaparecida igreja de Souselas restam as descrições da 1ª metade do século XVIII, as quais nos dão uma ideia do que seria o templo: segundo as memórias paróquias de 1758 tinha 5 altares, incluindo o da capela-mor dedicado a S. Tiago, tendo os restantes como invocações: «S. Sacramento, de S. Sebastiam, S.ra do Rozario, Sr. Jezus» Adiantava o mesmo registo que o templo «Não tem naves»(691). Alguns anos antes, e centrando-se na importância da Capela-Mor anotava o pároco da freguesia: «Na igr.ª Matris ha à Cappella Mayor de S. Tiago q. tem sinquo mil reis de Fabriqua p.ª os ornam.tos da sancrestia q. he obrigado pagar em cada hum anno, e todos os reparos della o Baram da Ilha grande por ser Comendador, e se lhe pagar duas partes dos dizimos»(692). De facto, o Comendador de Souselas tinha obrigação de contribuir para a conservação da Igreja Matriz, custeando as obras necessárias. E tinha, também, a responsabilidade de manter «… o costume desde tempo immemorial de se pagar hum alqueire de azeite para a alampada da Capella mor, o era á custa do Rendeiro da Comenda». Em Fevereiro de 1781 esse costume estava por satisfazer «ha huns annos», enquanto o rendeiro da comenda na freguesia, Theotonio Simoens Prior, morador na Zouparria do Monte, apesar de avisado «… nada tem satisfeito, ao mesmo tempo, consta haver huns vinte annos se não paga semelhante azeite conservando-se a alampada, porem sem acendersse; quando aos Domingos e dias S.tos se accendem todas as demais da Igreja»(693). Por estes factos, o Promotor da Câmara Eclesiástica manda que o Prior da freguesia, Agostinho Castro, apresente teor do capítulo de visita para assim se obrigar o comendador a restabelecer o costume no espaço de um mês. A fachada da Igreja de S. Tiago de Souselas transmite um ar de graciosidade: «cunhais em forma de pilastras dominadas de fogaréus, empena cortada nos arraques [simulando um frontão triangular]; porta de dupla moldura com a cabeceira rematada em cimalha de traçado mistilinio; óculo rectangular, de ângulos cortados. Torre à direita, de cobertura piramidal»(694).

A.U.C. – Fundo Próprios Nacionais: Mosteiro de Lorvão, Nº 5, Tombo de Souselas, 1705, Fls. 7-7v. Dicionário Geográfico, 1758, Souselas, Vol. 35, Nº 238, P. 1701 (692) A.U.C. – Fundo do Cabido: Informações Paroquiais de 1721, Souselas, Fl. 1 (693) A.U.C. - Fundo da Câmara Eclesiástica: Doc. Nº 46 - «Autos de Reprezentação e conta do R. Par.º sobre capitullos de Vizita», s/n (694) Vergílio Correia; Nogueira Gonçalves – Inventário Artístico de Portugal, Distrito de Coimbra, Vol. IV, Academia Nacional de Belas Artes, Lisboa, 1953, P.72 (690) (691)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

PLANTA E ALÇADO DA IGREJA DE S. TIAGO DE SOUSELAS

14

LEGENDA:

11

1 - ANTE-CÂMARA 2 - NAVE CENTRAL 3 - ALTAR-MOR 4 - BATISTÉRIO 5 - CAPELA LATERAL 6 - ENTRADA DE SERVIÇO 7 - SALÃO 8 - SALA DE APOIO 9 - I.S. 10 - SACRISTIA 11 - ARRUMOS 12 - ACESSO AO CORO ALTO 13 - ADRO DA IGREJA 14 - PÁTIO EXTERIOR

11

10

3

9

8

5

8

7 12

4

2

1

6

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VII – Património, Arte e Religião

O interior mostra-nos uma igreja de nave única (mantendo o esquema do antigo templo), retábulo principal, arco triunfal e dois nichos nos flancos da nave (fotos 104 e 105). Não tem retábulos laterais ao arco, mas sim nichos no seu lugar. Acedemos à capela-mor por um arco do século XVII. Nela está o retábulo principal, edificado aquando da reforma da 2ª metade do século XVIII, onde se destaca um arco triunfal, da época e estilo pombalino (época Josefina). Apresenta quatro colunas e anjos acroteriais, sendo os dois dos arcos da esquerda da mesma época e, o do arco da direita do séc. XVII. Em tempos, fechava o camarim uma tela representando a Degolação de S. Tiago, assinada por A.J. Gonçalves e datada de 1874, que hoje se encontra numa das paredes da igreja. Logo a seguir aos arcos do flanco direito (de quem entra) temos a muito bela e valiosa Capela do Sacramento «…de segunda ordem mas formando conjunto agradável».(695) É, sem dúvida alguma, o elemento arquitectónico com maior interesse, apresentando cobertura de cúpula em caixotões de pedra e retábulo pétreo distribuído em dois andares (fotos 106 e 107). Quer pela data de construção quer pelo registo estilístico, situa-se em plena época de contornos maneiristas, utilizando uma gramática estética que segue os parâmetros europeus, reinterpretada por artistas locais que terão aprendido na região, com mestres como João de Ruão. Utilizando como material a pedra de Ançã, ao contrário de toda a igreja que foi construída em calcário margoso, terá sido edificada em meados dos anos 90 do séc. XVI, dado que apresenta as datas de 1593 na abóbada e 1594 numa pilastra do retábulo. Apresenta portal de arco gótico enviesado e composição de ordens sobrepostas; em baixo duas colunas de cada lado, na parte do arco duas pilastras e, entre elas a Virgem e o Anjo da Anunciação. Nas cantoneiras destacam-se medalhões com bustos. A cúpula é em caixotões com quartelas ornadas. O retábulo é de pedra, com sacrário central, ladeado de espaços de pilastras em dois andares. No do alto estão as esculturas dos Santos Pedro e Paulo e, no da base, S. João Evangelista e S. João Baptista. Ao nível escultórico, deve anotar-se a existência na igreja, de duas esculturas de pedra de boa qualidade, ambas de meado do séc. XV: a Virgem com o Menino ao colo; e um S. Tiago, vestido de apóstolo, bordão quebrado, bolsa e chapéu de aba levantada – obra que foi recuperada pelo Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas nos finais dos anos 90 do século passado (foto 108). Com a criação da Junta de Paróquia em 1836, os bens da igreja passaram a ser administrados por este órgão, que procedia regularmente a inventário dos bens e paramentos, seguindo ordens superiores emanadas da Administração do Concelho.

(695)

Id. P. 73

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Em Agosto de 1836 a Junta de Paróquia promoveu inventário dos bens que se encontravam dentro da igreja. Por esse rol se vê o quanto estavam os bens expostos e desprotegidos: «Uma banqueta d’estanho com seis castiçaes e uma cruz» haviam sido furtados quando levaram o sacrário; um vaso de prata do sacrário com sua copula seguira idêntico destino. Mas esse inventário regista o modo como o povo, enchido de fé, reagia aos assaltos: «uma custodia pequena de prata com caixa forrada de veludilho verde» havia sido «comprada pelo povo quando os Francezes levaram a que havia»(696). Um dos mais completos inventários que encontrámos data de 27 de Maio de 1894 e nele já se incluiram os bens resultantes da anexação da Irmandade de S. Sebastião (Anexos, Tabela 13). Importa introduzir aqui uma pequena nota acerca dos bens que rendiam para a Igreja de Santiago de Souselas. De facto, e segundo documentação consultada no arquivo paroquial, e um pouco à semelhança das oliveiras que rendiam para as confrarias da freguesia, também para a igreja se regista facto semelhante, mas de maior dimensão. Segundo o inventário feito pela Junta de Paróquia em 1868(697) rendiam para a Igreja de Santiago 546 oliveiras espalhadas pela freguesia. Resta saber qual a origem destas oliveiras; se constituíram desde tempos antigos um fundo próprio da paróquia ou se seriam oliveiras pertencentes à Comenda de Santiago, que passaram para a administração da junta de paróquia ou de uma incorporação das duas situações. Retomando a história do templo. Por volta de 1870 e tomando conta da freguesia o pároco Manoel Gomes Pereira, deu começo a duas obras de vulto: reparação da residência paroquial e reforma da igreja. De facto, e apesar de ter ficado somente três anos à frente dos destinos da freguesia, o pároco promoveria destacada obra no templo, que aos olhos dos seus contemporâneos se havia de tornar o seu principal legado, perdurando o facto na memória das gerações futuras. Recorde-se o que a propósito desta obra escreveu Jerónimo Parente: «Passando à Casa de Deus, começou a concertal-a tanto interna como externamente, e com tanta efficacia a deu por concluida, forrada de novo, pintada a óleo fino, e seu côro, até o annunciar a seus freguezes no dia de Natal, o que não poude levar a effeito por falta de operarios, tendo por consequencia de deferil-a para o dia da Circuncisão do Senhor, em que na realidade a muito trabalho seu e dos operarios de dia e de noite o conseguiu. Para este dia, promoveu fazer á sua custa festa solemne, de missa cantada e sermão, convidando seus collegas parochos vizinhos, e ao munto reverendo conego e arcipreste prior de Barcouço, para pregar (…) A.U.C. – Fundo do Governo Civil: Livro de posse aos Mestres e Mestras de ensino primário no Distrito, 1836, Fls. 75-75v. (697) A.P.S. - «Inventário das propriedades e oliveiras das confrarias», 1868, Fls. 2v.-8 (696)

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VII – Património, Arte e Religião

Chegado o dia 1º do corrente [Janeiro 1871], ás dez e meia horas, o reverendo arcipreste benzeu a egreja, e em seguida o parocho, com dois dos seus collegas ao lado, com as irmandades e povo, sahiram em procissão á capella aonde estava depositado o Santissimo Sacramento, e com Elle percorreram as ruas do costume, e voltaram para a egreja, a encerral-o no Sacrario»(698). De facto, e enquanto decorriam as obras esteve o Sacramento noutro lugar, vindo a ser trasladado com toda a solenidade naquele Domingo, 1º de Janeiro. Neste artigo, referem-se pormenores importantes envolvendo a cerimónia: ouve missa cantada, o reverendo arcipreste pregou sermão sobre o Evangelho, tendo ainda destacado o distíco que o pároco da freguesia havia escolhido para colocar no tecto da igreja: Hic este domus Dei, et porta coeli. No final do acontecimento foi dado o Menino Jesus a beijar, enquanto, mais tarde, se soltaram foguetes, e as ruas se encheram de pessoas, acompanhando os gaiteiros. Manoel Pereira, havia encontrado uma freguesia em mau estado: o templo a cair, falta de objectos de culto e inabitável a casa paroquial. Com ele a fácies mudará e para bem melhor! Porém e para tristeza dos seus paroquianos, depressa abandonou a freguesia, dela se despedindo a 11 de Agosto de 1872, donde partiu para novo desafio, em Sepins. No pouco tempo que esteve em Souselas deixou, como vimos, obra feita, a que devemos acrescentar o paramentar da igreja ou a revitalização das confrarias. Aos olhos de Jerónimo Parente também as qualidades humanas se destacavam: «Era incansavel de noute e de dia, sempre prompto a levar o socorro aos necessitados; a trabalho nenhum em fim se poupava; a todos os seus freguezes ricos ou pobres, moços ou velhos tractava pelo mesmo modo; e por isso todos o estimavam e veneravam…»(699). Pelo final do séc. XIX entrou o templo principal da freguesia em adiantado estado de ruína. Uma situação que se vinha arrastando, pelo menos desde 1893, quando em Outubro se ordenou a reparação dos telhados da igreja e casas anexas e reparos diversos. A Junta de Paróquia oficiará ao Governo Civil, enviando representação datada de 23 Agosto 1898 e assinada pelo então presidente, João Arede: «A Junta de Parochia da minha presidencia, vendo que a Egreja Matriz, d’esta freguezia de Souzelas, ameaça ruina completa e que a sua reparação se torna inadiavel, e não tendo meios ao seu alcance para occorrer aquella despeza, deliberou esta unanimemente, para aquelle fim, pedir a V.Ex.ª se digne conceder-lhe auctorisação para que ella possa cobrar todos os capitaes mutuados que lhe pertencem e cujos titulos se encontram no archivo da referida Junta; e

(698) (699)

Jeronimo Lopes Parente - «Casa de Deus reparada» In O Conimbricense, 3 Janeiro 1871, P. 3 Jeronimo Lopes Parente - «Um bom velho» In O Conimbricense, 17 Agosto 1872, P. 4

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Freguesia de Souselas – um povo com História

para que possa ainda mandar executar todo aquelle que se recuse a satifazer a sua divida respectiva. Como, infelizmente, nem todos os seus capitaes mutuados são cobraveis (…) pedem tambem auctorisação a V. Ex.ª para poderem alienar um pousio, situado n’esta freguezia e denominado “do Moinho de Vento” (…) uma gargantilha d’ouro com cruz (…) e uma solitaria d’ouro com cruz (…) objectos que pertencem à imagem da Senhora do Rozario (…) para assim obstar á ruina total da referida Egreja Matriz»(700). A urgência e, até certo desespero, deduzem-se deste pedido reproduzido na acta do dia 7 de Agosto de 1898 e onde se descreve o cenário aflitivo: «…a Egreja Matriz se achava em pessimas condicções, ameaçando ruina por completo e que não estava nas circunstancias de n’ella se poderem celebrar os actos religiozos»(701). As decisões demoram quase um ano. Obras que seriam, na totalidade, custeadas pela Junta de Paróquia, a qual em Julho elabora um orçamento suplementar remetido às autoridades competentes tendo em vista a obtenção de autorização superior. O exame ao templo arruinado seria feito em Julho de 1899, pelos peritos Francisco Joaquim Marques e Joaquim Fernandes, ambos pedreiros e moradores em Souselas. O diagnóstico fazia antever uma obra em larga escala: «…orçaram para as óbras da mesma a quantia de 85.000 rs, constando as mesmas obras do seguinte: virar o telhado do côrpo da Egreja, sendo dois fios de telha assentes em cal e tres sem ella, dando a Junta de Parochia a telha que há no armazem da Egreja e a que faltar ser fornecida por conta do arrematante. Collocar os barrotes e ripas que forem indispensaveis, dando a Junta, para o mesmo fim, somente os cyprestes que ha no adro da Egreja e tambem uma arvore que se acha do lado sul do mesmo. Limpar o telhado da capella do Santissimo, fornecer e virar algum que for precizo. Pôr um novo fecho no arco cruzeiro e assentar de novo as peças lateraes do arco até às duas que se acham sobre os capiteis; depois levantar a parede que deve ficar sobre o dito arco e pôr ainda um travão de ferro com chavetões da parte exterior, tendo de diametro quatorze centimetros e que ligue as paredes laterais da Egreja, passando o dito junto ao fecho do alludido arco. Tapar as fendas das paredes da Egreja, das capellas conteguas e da passagem que dá subida para o pulpito tanto interior como exteriormente. Arrematar com cal e areia a parede da parte inferior do corpo da Egreja do lado sul e dar duas mãos de cal na Egreja e suas capellas, interior e exteriormente, incluindo a torre da parte exterior.

(700) (701)

A.U.C. – Fundo do Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, 7/8/1898 In Cx. 326 Id.

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VII – Património, Arte e Religião

Fornecer o arrematante por sua conta todo o material para a obra, sendo a sua conducção feita pela Junta, a qual dará dez pinheiros para se assentarem as cambotas no arco cruzeiro. Dar finda a obra dentro de setenta dias…dar fiador capaz»(702). A obra da igreja seria arrematada por Antonio Joaquim Marques, casado, pedreiro de Brasfemes, que se obrigou a concluir as obras até ao fim de Setembro de 1899 com uma cláusula adicional «… que o arco cruzeiro da mesma Egreja Matriz devia ser composto desde a sua base»(703). De forma natural e regular, a Igreja foi o templo que mais mereceu a atenção dos fregueses, sendo por isso objecto de pequenas, médias e grandes intervenções ao longo do séc. XX. Em 1962 decorreram obras de restauro na igreja paroquial, cuja repercussão chegou à imprensa: «…grande iniciativa do pároco desta freguesia, padre Luís Domingues e que tem tido a colaboração da Comissão Central que se não tem poupado a esforços para que a nossa igreja que data do século XVI deixe de mostrar o aspecto que tem tido. As obras que se estão a realizar são custeadas com importâncias dos peditórios que foram feitos na sede da freguesia e dos lugares que a compõem, e que teve a colaboração da Câmara Municipal, Direcção dos Serviços Florestais e de um subsídio a conceder pelo Sr. Governador Civil. Todo o povo da freguesia soube corresponder ao apelo lançado pelo pároco e é de registar o contributo dos souselenses radicados no Brasil, Venezuela e Estados Unidos da América que não esqueceram a sua terra e que muito contribuíram para a realização desta obra»(704). A reabertura ao culto, em ambiente festivo, ocorreria a 30 de Dezembro do dito ano. No Outono de 1968 foi restaurado o soalho e, entre 1997-1998 decorreu uma importante campanha de reabilitação a cargo da Fábrica da Igreja, supervisionada pelo Prof. Dr. Nelson Correia Borges, na qualidade de membro da Comissão Diocesana de Arte Sacra. A 1.ª fase consistiu na reabilitação da Sacristia, sala de reuniões e interior da igreja - a capela-mor foi recuada, restaurado o tecto; a 2.ª fase compreendeu a recuperação de cantarias e de pintura de paramentos exteriores, restauro da capela do Santíssimo e retábulo, remodelação das instalações eléctricas, para obter iluminação suave e agradável e recuperação da pia baptismal.

(702) (703) (704)

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, 2/9/1899 In Cx. 327 Id. Acta de 23/7/1899 «Restauro da Igreja Paroquial de Souselas» In Diário de Coimbra, 19/9/1962, P. 2

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Freguesia de Souselas – um povo com História

As obras orçaram em cerca de 10.000 contos e, para esse fundo, contribuiram diversas pessoas e entidades; a iniciativa popular, através de jantares, corso carnavalesco, festas, leilões, peditórios e ofertas; 2 500 contos oferecidos pela C.M.C. de Coimbra; o contributo material de empresas da região; a Junta de Freguesia cedeu terreno para o recuo da capela-mor e o auxílio de alguns trabalhadores; a Igreja contribuiu com verbas e receitas próprias. A Câmara Municipal concedeu um subsídio de 2.500 contos à Fábrica da Igreja Paroquial de Souselas tendo em vista a recuperação do retábulo da Capela do Santíssimo(705). Há alguns anos atrás abriu-se processo de instrução relativo à eventual classificação do imóvel, por despacho de 1999.04.04 do Vice-Presidente do IPPAR. Enviando-se ofício à JF para que se pronunciasse, esta respondeu que não existia qualquer inconveniente. A abertura do processo de classificação fôra requerida pela JF, na sequência de um conflito com a Fábrica da Igreja Paroquial. Na base da polémica e consequente pedido de classificação, esteve a amputação da escada de acesso á Torre Sineira, alteração da traça na fachada lateral esquerda a expensas e ordens da Comissão Fabriqueira. O povo dividiu-se, redigindo-se um abaixo-assinado, sobrescrito por cidadãos da freguesia acerca da eventual classificação da igreja. A JF pediu parecer jurídico e publicou um esclarecimento à população sobre o assunto, com a questão a centrar-se no usufruto da igreja para culto e no manter da traça. Em Janeiro de 2000, o IPPAR/Delegação Regional de Coimbra recomendava a suspensão do processo de classificação do imóvel, tendo em conta as reclamações apresentadas, deliberando a C.M.C. proceder de acordo com a informação(706). De facto, o pároco da freguesia e Fábrica da Igreja haviam reclamado junto do IPPAR, decidindo o município que para evitar males maiores se deveria acatar aquela recomendação, sustendo a intenção de classificação e esperando pela articulação com o Plano de Reconversão Ambiental de Souselas. Em Dezembro de 1999 o espaço da igreja foi valorizado com iluminação e, no Verão de 2006, foi pintada exteriormente ao abrigo do programa “Coimbra com mais encanto” desenvolvido pela C.M.C. Pela portaria nº 584/2011, de 03/06/2011, emanada do Ministério da Cultura, a igreja matriz da Vila de Souselas foi classificada como monumento de interesse público (MIP), tendo-se fixado uma zona especial de protecção (ZEP), em seu redor: «…que teve em consideração a malha urbana da envolvente próxima, em que se integra, a sul e a poente, a existência de morfologias ou detalhes relevantes e ainda a paisagem natural, de características quase rurais, a nascente e

(705) (706)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 381, P. 12 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 396, Pp. 14-15

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VII – Património, Arte e Religião

a norte, estabelecendo uma protecção eficaz, quer no edificado urbano quer na área paisagística, constituída por espaços vazios, tratados, como jardins, ou expectantes,cuja integridade deve ser salvaguardada»(707). Uma palavra ainda para os párocos que conduziram os destinos religiosos da Paróquia de Souselas ao longo dos séculos. Eram apresentados pelo Mosteiro de Lorvão através de carta, exibida e arquivada no Bispado, o qual organizava um processo especial – os autos de colação. Estes, compreendiam diversas etapas, sendo as principais: a validação dos documentos, a inquirição de testemunhas, o auto de exame sinoidal do proposto e, em caso de aprovação, o registo da colação na paróquia. Este direito de padroado foi, no entanto, questionado pelo Bispado como se vê da certidão anexa ao auto de colação de António de Campos Branco(708) (foto 109). Aquele documento fôra alcançado no Juizo da Legacia, a favor do padroado da igreja e apresentação aquando da colação de Francisco Rebelo da Cunha. Uma questão que se levantou pela ausência de documentação, nomeadamente de escrituras antigas, onde Mosteiro provasse pertencer-lhe o padroado. Em concreto, o Cabido desvalorizou as cartas de confirmação datadas de 21/03/1342 e de 11/02/1545 (esta do pároco Francisco Lopes, aquela de pároco desconhecido), por serem anteriores ao Concilio Tridentino, e colidirem com a Bula do Papa Pio IV, de 1/05/1574, que estabeleceu a obrigatoriedade de apresentações continuadas por espaço de 50 anos. O Mosteiro de Lorvão, para provar seu direito, juntou uma sentença favorável do tribunal e um instrumento de testemunhas «…porque constava a dita Igreia de Sam Tiago de Souzellas anexa do dito Mosteiro de Lorvam e que somente o Mostejro punha nella capellam e que todas as rendas se recolhiam para o Mostejro». Neste processo, deu-se razão ao Mosteiro de Lorvão por sentença de 30/03/1639, chegando mesmo a dar-se posse da Igreja de Souselas e da anexa da Marmeleira a 16/5/1639, contra a vontade do pároco de então, Guaspar da Cunha. No entanto, e por razões que desconhecemos, este pároco manter-se-ia no desempenho da função nos anos seguintes, como se vê dos registos paroquiais. Questões à parte, conhecem-se os nomes dos párocos da Freguesia de Souselas a partir de 1545, retirados de várias fontes, incluindo a data da colação, o primeiro e ultimo registo paroquial celebrado na freguesia, e alguns dados biográficos, como se vê da tabela abaixo.

Diário da República, 2ª Série, N.º 115, 16/06/2011 A.U.C. – Colações de Souselas (cx): «Autos da collação da Igr.ª de Souzellas feita na pessoa do R.dº An.tº de Campos Branco da freg.ª de Eyras Vgr.º de Foz de Arouce apresentação da M.e Abbadeça do Real Conv.tº de S.tª Maria de Lorvão deste Bispado»

(707) (708)

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440 06/10/1745 12/08/1757

D. Fernando Santo António Botelho

João Francisco Montenegro

15/08/1757 (o)

25/05/1745 (o)

29/03/1741

21/03/1628 08/06/1638 (o) 08/08/1643 26/06/1644 (o) 29/06/1645 (c) 02/07/1647 12/07/1654 19/06/1655 (c) 22/03/1663 29/06/1664 (o) 26/06/1669 (o) 30/08/1673 22/07/1713 (o)

23/03/1774

09/08/1757 (o)

03/04/1745 (o)

13/06/1638 19/07/1642 06/06/1644 (o) 18/06/1645 13/07/1647 27/06/1654 (o) 16/06/1655 22/08/1663 (o) 06/05/1664 (o) 28/05/1669 (o) 08/08/1673 (o) 29/06/1713 (o) 13/02/1741

Primeiro Registo Paroquial Último Registo Paroquial

- Natural de Eiras - era vigário em Foz de Arouce - Faleceu a 01/06/1745 - Natural da Vila da Feira, Bispado do Porto - Natural da freguesia de S. Pedro, Coimbra - falecimento a 10/9/1774

Dados Biográficos

(709) Dados retirados de: AUC – Fundo dos Registos Paroquiais: Souselas - Mistos 1628-1769; Mistos 1748-1805; Mistos 1783-1858; Baptismos 1849-1859; Baptismos 1860, 1861, 1862; Livro do registo das collações do Bispado de Coimbra, 1528-1568; 1589-1593; Livro de registo dos títulos das colações e confirmações das Igrejas do Bispado de Coimbra, Nº 129 (s/n); Nº 130 (s/n); Livro XVII do Registo das Collaçõens; Colações de Souselas (cx); Registo dos benefícios das Igrejas do Bispado de Coimbra, 1630

30/1/1741

Data da Colação 11/02/1545 29/04/1589 1618-1623

António de Campos Branco

Nome Francisco Lopes António Camelo Francisco Gomes Manuel Simões Gaspar da Cunha João Leal Mateus Couceiro Manuel Francisco Francisco Rebelo da Cunha Manuel Cordeiro Francisco Rebelo da Cunha Manuel d’Avellar João Carvalho Domingos Duarte Manuel Amaral e Cunha Bernardo do Amaral e Cunha

Tabela 13 – Párocos da Fregeusia de Souselas 1545-2013(709)

Freguesia de Souselas – um povo com História

2/08/1785

José Joaquim Pereira da Silva José Ferreira Cardoso Manuel Duarte Pinto d’Azevedo José Ferreira Cardoso António Joaquim Lopes António Maria dos Santos Mello João Domingos Arede José Pinto Machado Pedro Marcela Albino Pedro Manuel Gonçalves José M. Rodrigues Francisco Dias Ladeiro Arlindo Fernandes Pontes David Luís Domingues Manuel Joaquim Cristo Martins Luís Domingues Paulo Ribeiro Joaquim Duarte Gomes Sertório Batista Martins Manuel Carvalheiro Dias Pedro Manuel Quintas Franco Nunes Pedro Fernando Rodrigues de Carvalho Fernando Simões Pascoal Luis de Jesus Ventura de Pinho

Legenda: b (baptizado), c (casamento), o (óbito)

1895-1897 1898-? 1907(?)-1928(?) 1929-1935(?) 1935-1939(?) 19401941-1944 1945-1947 1948-1956(?) 1957-1966 1966-1971 1971-1972 1972-1995 1995-1996 1996 (Julho/Setembro) 1996-2003 2003-2004 2004-2011 2011-2012 2012-?

05/10/1775

Data da Colação

Agostinho de Jesus Maria Pitta de Castro

Nome Joaquim dos Reis Pereira

09/08/1785 (o) 31/10/1826 (o) 27/06/1830 (c) 13/05/1832 15/08/1859

22/10/1775 (c) 09/10/1826 (o) 21/04/1830 (c) 01/05/1832 7/08/1859 14/12/1862

16/04/1785

Primeiro Registo Paroquial Último Registo Paroquial 31/05/1774 07/04/1785 - Natural do Arcebispado de Braga - Fora Cónego Regrante do Mosteiro de Santa Cruz - Natural de Coimbra

Dados Biográficos

VII – Património, Arte e Religião

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Além destes párocos, que de forma continuada serviram na freguesia de Souselas, outros desempenharam a função de forma transitória, em períodos inferiores a meio ano, enquanto não se concretizava a colação definitiva: Domingos Duarte (1661), João Carneiro (1700), António Marques (1741), António Marques (1741), Sebastião Mendes, (1742-1742), Antonio Brito Brandão e Antonio Mendes Barreto e João da Cunha (1745), Manuel Henriques da Silva (1755), e Theotonio da Cunha (1785). FRANCISCO GOMES – PÁROCO DE SOUSELAS, 1618-1623(710) Francisco Gomes foi vigário de Souselas entre 1618 e 1623. Nascido em Coimbra, depois de 1583, filho do livreiro António Fernandes (nat. de Taveiro) e de Isabel Gomes, também natural de Coimbra, e da familia do chapineiro Simão Dias, morador ao Arco de Almedina. Bacharel em Cânones ocupou por doença, as lições de Prima dadas pelo Dr. António Homem. Com beneficio curado na Igreja de Souselas desde 1618 de que esteve de posse embora com pouca residência. Nas vésperas de professar, e nas disposições testamentárias declarou «…que teve a Igreja de Souselas de 1618 a 1623. Nela residiu os meses das férias de Agosto e Setembro e alguns domingos e dias santos. Durante os cinco anos e meio que a possuiu rendia, por ano, 40.000 reis em dinheiro potável, os passais, pé de altar e casas do vigário. Quem a servia poderia ter o passal, pé de altar e 1 000 reis por mês. Dos 30 000 reis que restariam Francisco Gomes afirma que “…não comia nem della teve numqua nada” (…) A pensão na vigaria de Souselas é computada em 60 000 reis por uns, 20 000 ou 30 000 por outros. Francisco Gomes avalia em cento e setenta e tantos mil reis o “encargo” que tinha na Igreja de Souselas durante os anos que a possuiu».

Um momento interessante da vida cristã dá-se com o crisma. Nos livros de registo paroquial lavrou-se o rol dos crismados na Igreja de Souselas pelo Bispo D. Miguel de Anunciação, em Junho de 1748 (Anexos, Tabela 14). Um total de 311 crismados entre ambos os sexos (151 mulheres e 160 homens). A maioria dos crismados eram oriundos de Souselas (139), seguindo-se a Marmeleira (63), Zouparria (31), S. Martinho e Sargento-Mor, que aparecem unidos (25) e Carrima, então pujante social e demograficamente (com 21 crismados). Os

António de Oliveira – Pedaços de História Local, Vol. II, Coimbra, 2010, Terra Ocre – edições, Palimage, CHSC, P. 301, nota 10.

(710)

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VII – Património, Arte e Religião

restantes crismados eram oriundos de povoações ou sítios tanto da freguesia – Azenha e Lagares – como, sobretudo, de fora da mesma: Murtede, S. Fagundo, Barcouço, Botão, Pampilhosa, Logo de Deus, Luso, Espinho, Carvalho, Trezoi, Mata e Mata do Penis. Na cerimónia, foi madrinha das mulheres Maria, filha de João de Agante da Zouparria e, dos homens, foi padrinho o padre Manuel da Costa da Freguesia de Brasfemes. QUEM FOI S. TIAGO?(711) Durante a reconquista cristã da Península Ibérica, muitas igrejas foram tomando como padroeiro o mártir Santiago. A devoção do povo souselense a este Santo está bem marcada, não só por ser o orago da freguesia, mas também pela existência de uma tela e escultura quinhentista. No séc. XVIII e nas 369 paróquias então existentes na Diocese de Coimbra, 22 tinham-no adoptado, o que significava 5,9 % do total, ou seja; era o 3º culto mais praticado. 2.2. O Passal e a Residência Paroquial Em Souselas, existia desde tempos que não podemos precisar uma residência paroquial. Por volta de 1870 tomara conta da freguesia o pároco Manoel Gomes Pereira, logo promovendo importantes melhorias, de que se tornou emblema, como vimos, a reforma na igreja. Porém, o pároco foi mais além, e assim que tomou posse «…logo deu começo ao concerto da residencia, para nella poder viver e em breve a concluiu; sem ter os materiaes precisos, sujeitando-se a pedil-os a uns dos seus fregueses, emprestados, a outros comprados com o auxilio da junta de parochia»(712). Junto às igrejas existiam os passais, recintos constituídos nalguns casos por terrenos cultivados, anexos à residência do pároco e que eram utilizados para seu rendimento. Contíguo existia a residência paroquial, de que temos informações para os anos 70 do séc. XIX, quando era mantida a expensas da JP entrando em obras pelo final da década. Já no Séc. XX, e após a implantação da República, o Governo Provisório publica a muito discutida Lei da Separação da Igreja do Estado. Com esta

(711) Joaquim Carvalho; José Pedro Paiva – «A Diocese de Coimbra no século XVIII, População, Oragos, Padroados e Títulos de Párocos», Sep. Revista História das Ideias, Vol. 11, Faculdade de Letras, Coimbra, 1989, P. 216 (712) Jeronimo Lopes Parente - «Casa de Deus reparada» In O Conimbricense, 3 Janeiro 1871, P. 3

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Freguesia de Souselas – um povo com História

legislação foram criadas no país republicano as Comissões Concelhias de Inventário cuja função era, em cada concelho, proceder ao arrolamento de todas as catedrais, igrejas e capelas, bens imobiliários e mobiliários que têm sido ou se destinavam a ser aplicados ao culto público da religião católica e à sustentação dos ministros dessa religião e de outros funcionários empregados, incluindo as respectivas benfeitorias e até os edifícios novos que substituíram os antigos. A Comissão Concelhia de Inventário procedeu, em Coimbra, ao arrolamento e inventário dos ditos bens, de paróquia em paróquia. Da sua actividade se colhem informações na troca de correspondência para e da Comissão Central de Execução da Lei de Separação. E é nesse contexto que nos surgem informações preciosas sobre o antigo passal e presbitério (casa de residência do pároco) de Souselas, e que desde a constituição da comissão concelhia andou sempre arrendado a António Ferreira Jorge, de Souselas. O primeiro ofício da Comissão Central é de 19/07/1913, solicitando informações sobre o presbitério e casas de residência do pároco. Ainda neste ano, em Outubro, a CMC pede que sejam retiradas da praça as casas de residência do pároco de Souselas. A comissão concelhia informará a Comissão Central quase três anos depois, a 19/05/1916, dando conta que o pároco requerera o arrendamento da casa onde habitou «…muitos anos e sahiu della em virtude da Lei da Separação, que a casa não tem quem a pertenda e necessita de reparações urgentes e importantes, parecendo a esta comissão que o pedido deve ser deferido, visto que o Estado tem tudo a lucrar»(713). Esta opinião, solicitando o arrendamento como forma de obviar à ruína da casa paroquial, seria seguida pela comissão. Porém, estala a polémica entre o arrendatário e outro pretendente, motivando o envio de um memorial (ofº Nº 81 de 10/12/1917) para a comissão central pedindo esclarecimentos: «Para que se digne dizer-me como devo proceder (…) António Ferreira Jorge, de Souzelas, era arrendatário, pela quantia de 10$05 anuais, do passal que foi do pároco d’aquela freguesia, terminando esse arrendamento em 30 de Novembro findo, como consta do respectivo documento. Em 29 de Julho último foi o mesmo prédio arrendado, em hasta pública, por 35$20 a José Ferreira Júnior, da mesma localidade, pelo ano que devia começar em 1 do corrente mês e termina em 30 de Novembro de 1918, lavrando-se o competente documento com as formalidades e garantias legais.

A.H.M.C. - Copiador de correspondência recebida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1936; Copiador de correspondência expedida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1937, Fls. 24v.-25

(713)

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VII – Património, Arte e Religião

O referido arrendatário não ignorou que se ia realisar a aludida praça, não só porque naquele lugar foram afixados editais a anunciá-la, mas até porque, segundo informações que me deram, apesar d’ele não assistir, outra pessoa, a seu pedido, veio licitar nesse acto, a qual, não cobrindo o último lanço, deu motivo a que o prédio fosse arrendado ao outro. Apesar d’isto foi ele avisado por um postal, com data de 19 de Outubro, daquele facto, prevenindo-o de que o novo arrendatário devia entrar na posse da propriedade no dia 1 de Dezembro presente. Sucede, porem, que indo este, na presença de testemunhas, para esse fim, aquele individuo lhe impediu a entrada no prédio, alegando que não havia sido despedido legalmente. À vista do que deixo exposto, rogo a V. Ex.ª se digne dar-me a sua abalisada opinião sobre este caso, com a máxima urgência, informando-me também se haverá alguma lei que ordene o arrendamento, annualmente, dos prédios pertencentes ao Estado (quando o contracto não seja feito por mais tempo), obrigando os arrendatários a considerar-se despedidos ao terminar o praso do contracto sem mais formalidades»(714). Desconhecemos quais as recomendações dadas pela Comissão Central. Porém, a 29 de Maio de 1920 a Comissão Concelhia solicita ao Delegado do Procurador da Comarca, que promova a denúncia dos contratos feitos por ela com o dito António Ferreira Jorge: «…numa casa arruinada que era residência do pároco de Souzelas, pela renda anual de 2$00, cujo contracto finda em 31 de Dezembro do corrente ano. Ao mesmo, o passal e quintal que foi do pároco de Souzelas, pela renda anual de 10$10, cujo contracto finda em 30 de Novembro do corrente ano»(715). Com esta denúncia contratual, António Ferreira Jorge vai agir no sentido de se manter como arrendatário do presbitério e passal da freguesia. Assim, e dois meses após aquela decisão desfavorável aos seus interesses, remete requerimento ao Presidente da Comissão Central: «…pedindo que lhe seja concedido renovar, sem ir à praça, o arrendamento do presbitério e passal da freguesia de Souzelas, de que é arrendatário há alguns anos, oferecendo o dobro da renda actual, ou seja 24$20. Cumpre-me informar a V.Ex.ª que é verdade o que o requerente alega e que a Comissão da minha presidência acha justo que se aceite a renda oferecida, em vista dos benefícios que ele, à sua custa, tem ali realizado, único elemento que tem concorrido para valorizar o prédio.

A.H.M.C. - Copiador de correspondência expedida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1937, Fl. 49 (715) Id. Fl. 68 (714)

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A renda está paga em dia»(716). Com a Comissão Concelhia e arrendatário de acordo quanto ao negócio a executar, a Comissão Central defere o requerimento a 7/8/1920, dando indicações para a renovação do arrendamento do passal de Souselas pelo dobro da renda. E é já com o negócio feito que algum tempo depois, a 21/02/1922, António Ferreira Jorge solicita à Comissão Central: «…a incorporação definitiva nos bens da Fazenda Nacional da casa de residencia e passal que era do paroco da fréguesia de Souzelas, actualmente administrado por esta Comissão Conselhia, a fim de o adquirir por compra. Atendendo ao mau estado em que a casa se encontra, parece-me de conveniencia para o Estado a sua venda imediata, pois de contrário, para se poder conservar, necessitará de obras importantes e dispendiosas»(717). As pretensões de António Jorge serão satisfeitas. Por ofício da Comissão Central de 22/02/1922 foi comunicado a incorporação na Fazenda Nacional do foro do passal e residência do pároco de Souselas. Sabemos que entre 1917 e 1921 o passal esteve arrendado pela Comissão de Administração dos Bens da Igreja (encarregue da execução da Lei de Separação) a António Ferreira Jorge, juntamente com o quintal e a «casa arruinada que era residência do pároco de Souzelas»(718). O arrendatário, por ofício de 21 de Fevereiro de 1922, pediu a incorporação definitiva nos bens da Fazenda Nacional da casa e passal que foram do pároco, o que foi aceite e lhe possibilitou a compra. Estas propriedades acabariam por chegar à posse do Dr. Alberto Álvaro Dias Pereira que, por escritura de doação datada de 25 de Junho de 1976 «…fez doação, com dispensa de colação e transferência imediata à Fábrica da Igreja Paroquial de Souselas, aqui representada pelo segundo outorgante, [reverendo pároco de Souselas Paulo Ribeiro, presidente da dita fábrica] de uma terça parte indivisa de uma casa de habitação de rez-do-chão e primeiro andar, sita no Passal, no lugar e freguesia de Souselas»(719). Ainda nesse ano avançou-se para a reconstrução da casa, elaborando-se em Dezembro projecto e memória descritiva, assinado pelo Engº Civil Joaquim Augusto Diniz Vieira. O projecto seria aprovado pela C.M.C. a 15 de Fevereiro de 1977. A construção da casa envolveu activamente os paroquianos, tendo-se constituído uma Comissão de Senhoras constituída por: Maria Manuela da Silva

Id. Fl. 71 Id. Fl. 86; - Copiador de correspondência recebida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1936 (718) A.H.M.C. – Copiador de correspondência expedida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1937, Fl. 68 (719) A.P.S. - «Casa Paroquial – Documentação» (processo) (716) (717)

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VII – Património, Arte e Religião

Marques, Maria Alexandrina Ramalho, Maria Emília Ferreira e D. Maria Cândida Pacheco Rodrigues. Nos finais dos anos 70 reverteram recursos de várias proveniências para a obra: capitais e juros, cortejo de oferendas realizados pela dita comissão de senhoras; venda de vários materiais de obras, ofertas de paroquianos e dinheiro recolhido noutras freguesias (Brasfemes, Torre de Vilela), dinheiro vindo das comissões de festas, peditório e outros. Também as indústrias locais não ficaram indiferentes aos pedidos: a Cimpor forneceu «o cimento para toda a obra»; a fábrica da cal «a cal necessária», a fábrica de mármores Batanete «marmores para portas e janelas»; a Cesol «azulejos e mosaicos; a Ceres «os sanitários»; a S.I.A.F. as «portas interiores (12)», a fábrica de vidros da Fontela e R.A.F. de Coimbra «vidros lisos e martelados; a fabrica de blocos de Souselas os «blocos, telha e cimento para a capoeira» e a fabrica de pavimentos pré-esforçados de Sargento-Mor «40% de redução no custo das compras ali efectuadas»(720). 2.3. A Capela do Senhor do Terreiro Esta pequena capela foi, em tempos, um cruzeiro em forma de templete de colunas, ou seja; um cruzeiro de caminho, dos que se localizavam à entrada das povoações de grande importância e, embora neste caso esteja disfarçado pelo acrescento, na vizinha povoação de Botão pode observar-se um desses exemplares menos aldulterado. Acede-se à capela por uma porta de verga curva, encimada por um óculo ladeado por aletas onde se encontra inscrita a data de 1809. Cobre o templete uma cúpula a terminar em cruz e pináculos na base (foto 109). Quando em Agosto de 1900 o pároco da freguesia transitou de Souselas para o Couto de Cucujães, procedeu-se a revisão do inventário de bens paroquiais. No exame desses objectos registou-se «…uma pedra d’ara pertencente ao altar de São Sebastião que ficava tambem na Capella do Senhor do Terreiro»(721). O Largo do Senhor do Terreiro foi requalificado durante 2009 e enriquecido com calçada tal como nas suas origens. 2.4. O Cruzeiro Localizado na Rua do Cimo (foto 109A). Assenta em coluna dórica com plinto quadrangular e base trapezoidal dos sécs. XVI-XVII. Trata-se de um

(720) (721)

Id. A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 7/8/1900, Cx. 328

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cruzeiro de caminho, dos que antigamente se localizavam junto das principais ruas das sedes de concelhos com alguma importância. Não era esta a localização original do cruzeiro, que esteve até aos anos 20 do séc. XX, no largo da igreja de Souselas. Na primeira metade do séc. XX, e citando Nazareth de Sousa «…foi retirado por qualquer Vereação que o julgou impecilho à circulação…dos inúmeros carros de bois que passam no local!»(722). Poderia ser a “Crus do Porto” que vem designada no Tombo de Souselas, promovido pelo Mosteiro de Lorvão em 1705, onde se diz estar localizado no cimo do lugar. Foi recuperado e requalificado em 2008 pela Junta de Freguesia. 2.5. O chafariz O chafariz faz parte da memória colectiva da Vila de Souselas, ponto de encontro de novos e velhos (foto 110): de cântaro à cabeça as mulheres a ele se dirigiram, durante anos, recolhendo o precioso líquido; em seu redor se convivia, falando e discutindo os acontecimentos da freguesia; aí se namoriscou, cantou e dançou, registos que passaram para o cancioneiro popular local. Foi construído em 1939, e para a sua concretização, foi decisiva a intervenção do Vereador da C.M.C., Evaristo Pacheco Rodrigues, e das senhoras Cunhas Leitão que cederam a parcela de terreno onde foi construído, recebendo, em contrapartida, as águas sobrantes para a pia do gado e seu quintal. Era abastecido a partir da nascente da “Fonte da Loira” e, em 1967-1968, ficou ligado à rede pública gerida pelos Serviços Municipalizados, quando era presidente da JF, o Sr. Amílcar Barreto. No seguimento da colaboração entre a JF e as Águas de Coimbra, o chafariz foi requalificado durante 2007 (projecto da responsabilidade da Eng.ª Anabela Duarte do Gabinete de Apoio às Freguesias) tendo sido inaugurado a 14 de Outubro, numa cerimónia presidida pelo Presidente da C.M.C., Carlos Encarnação. Em termos artísticos trata-se de um elemento de inspiração Arte Déco, da Escola do Estado Novo. Construído em pedra calcária é constituído por elemento escultórico central, composto de pilastra encimada por um motivo geometrizante inserido numa base rectangular. Nele se inseriram duas torneiras, orientadas para Oeste e Este, respectivamente, tanque para recolha da água de desperdício, grades de apoio para os cântaros, o epigrama “CMC” e data da construção em bronze. Como elemento acessório tinha uma pia para dar de água a beber ao gado.

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 82

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VII – Património, Arte e Religião

3. Património na Marmeleira 3.1. Capela de São João Construída nos finais do Séc. XIX/princípios do Séc.XX, depois que a antiga capela do lugar, localizada junto do actual cemitério da Marmeleira, ter entrado em adiantado estado de ruína nos últimos anos de oitocentos. Templo de pequenas dimensões, de fachada composta por uma porta de verga rectangular (fotos 111 e 112), encimada por nicho que alberga uma escultura em pedra representando Jesus Cristo, a Virgem Maria e São João Baptista, provável obra do Séc. XV. Nicho que é ladeado por dois óculos. À direita torre sineira, construída com dinheiro do povo, e por intercessão do Dr. Fernando Cunha, tendo o Sr. Elias dos Santos oferecido o sino em 1952, ano em que as obras foram concluídas. O interior é de uma só nave com capela-mor (foto 113). Destaca-se um painel pintado que evoca as almas do purgatório, talvez do sec. XVIII. Ao nível escultórico refiram-se as imagens em pedra de São João Baptista (foto 114) e S. Sebastião (Séc. XVI), de Santa Luzia (Séc. XVII) e a de Nossa Senhora da Conceição (Séc. XVIII) - todas provavelmente oriundas da antiga igreja. Nesta capela, havia o costume de haver missa nas quartas Domingas do mês. A capela foi recuperada pela Junta de Freguesia durante o ano de 2008. As informações paroquiais de 1721 e os capítulos de visitação entre 1748 e 1753, referem que a antiga capela, localizada junto do cemitério no sítio conhecido por Alto de Santa Luzia teria sido Igreja Matriz. Uma referência que nos faz ponderar duas hipóteses: ou a Marmeleira foi paróquia e freguesia autónoma de Souselas em centúrias passadas (existem elementos nesse sentido, como se viu no Capítulo II), ou então a capela da Marmeleira foi a Matriz da Freguesia enquanto duraram as obras na Igreja de Souselas (provavelmente no Séc. XVI). A Capela de S. João Baptista, tal como todas as demais capelas da freguesia, foi objecto de intensa preocupação das autoridades religiosas entre 1748 e 1753, como se pode observar nos capítulos de visitação. Em 1752, e estando à frente dos destinos religiosos da freguesia D. Fernando Botelho, o Bispado abriu processo na Câmara Eclesiástica conduzido pelo Dr. Manoel Rodrigues Ferreira, Comissário do Santo Oficio, tendo como ponto de partida a visitação à capela de S. João, na Marmeleira, feita em 1748, cujo teor aponta as necessidades estruturais do templo: «Vesitando as capellas desta freguezia achey necesitar o Altar mor do glorioso São João Baptista do lugar da Marmeleyra de ser forrado com madeira por sima por diante e pellos lados de hum Pedra de Ara grande e com Reliquias que serão nella encaixadas e de huma banqueta de madeira feita a moderna, e 449

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pintada por modo de pedra fingida de huma cruz e dous castiçaes tudo feito á Romana para estarem sobre a banqueta de hum subpedaneo e hum frontal tambem de madeira sendo este pintado de festa e pella outra parte com as proporcionadas para o tempo do Advento, e Quaresma e como nos termos de haver tradição que a tal cappella foy Igreja Matris desta freguezia se me propos por parte do povo do dito lugar que a fabrica da mesma Cappella Mor na qual tambem há necesidade de se concertar o Arco levantando-se mais na forma quem por boa Architetura de serem Mestres Pedreyros peritos e juntamente as bichas que nella se achão era obrigada a Comenda desta freguezia de Souzellas»(723). Neste capítulo de visita, o pároco emitiu opinião contrária à execução das obras do modo como ficou determinado, dizendo que era ao povo que cabia tal obrigação, e fazendo menção aos requerimentos que pendiam na Câmara Eclesiástica sobre o assunto, cuja dilação estava retardada por descuido e falta de diligência do povo. Para resolver a situação ordenou-se que os moradores fizessem os autos conclusos no prazo de 2 meses. A 11 de Fevereiro de 1751, e no cumprimento das ordens recebidas, o pároco da freguesia D. Fernando Botelho redige e envia à Câmara Eclesiástica uma extensa comunicação, dando conta da complexidade dos factos que envolvem as obras na capela: • «Quando vesitei a dita Cappella se me fes certo que toda esta freguezia pella mesma tradição de ella haver sido antigamente Igreja Matriz estava obrigada a paramentar os Altares Collatraes que ahi se achão hum de Nosa Senhora e outro da gloriosa Santa Luzia» • Que os altares colaterais (e não apenas o Altar-Mor de S. João, como se dizia na visitação de 1748) necessitavam «…de serem forrados e de frontaes de madeira pella parte de diante e pellos lados e de frontaes de madeyra pintados por huma parte com boas pinturas de festa e pella outra com as proporcionadas para para o tempo do Advento e Quaresma alem de haver necessidade no da glorioza Santa Luzia de huma banqueta tambem de Madeira e feita a moderna, e pintada por modo de pedra fingida e de huma cruz e dous castissaes tudo feito á Romana para estar sobre ella e no de Nosa Senhora de huma Pedra de Ara grande com relíquias que seram nella encarnadas e de seguintas o Retabollo que nelle se acha • Que de acordo com decisões anteriores da Câmara Eclesiástica as obras se façam ordenando ao Juiz da Igreja e aos Mordomos dos ditos altares

A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica: Caixa documentação variada (7-1-5), Doc. Nº 59, «Conta que dá o Reverendo Vigário da Igreja de Souzellas [D. Fernando Botelho] em resposta ao Capitulo de Vezita», 1752 (723)

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VII – Património, Arte e Religião

«…sob pena de dous mil reis cada hum aplicados na forma ordinaria que no termo de dous mezes mandem fazer tudo isto pellos líquidos da fabrica do povo e dos mesmos Altares com Advertencias porem que não chegando os tais líquidos suprirão os freguezes desta freguezia o que faltar e isto por meyo de fintas o que entre elles e em sua execusão procedera o Reverendo Parocho na forma que fica disposta» • Que de acordo com a mesma sentença «…a fabrica mayor paramentase o Altar de São João e a fabrica menor paramentase os dous Altares colletraes e que não havendo dinheiro fizese a freguezia». O pároco conclui a sua exposição expressando as preocupações económicas - que o dinheiro que havia fôra gasto na Igreja Matriz de Souselas em 3 frontais de damasco, duas capas de asperges, posto «que não tinha senão hum frontal velho», e que a freguesia era pequena e pobre: «…não pode concorrer para estas despezas e para as da Marmeleyra porque so nesta Matris fora o Altar mor tem quatro Altares que paramentar e a Marmeleyra dous quem hade dar posses para estõ só estando indecentes, e se a da Marmeleira foy Matris como lhe querem chamar se extinguio pella Igreja que se fez neste lugar de Souzellas e como a mayor parte dos meus freguezes sam pobres temo me digam não estão obrigados a duas Igrejas Matrizes». Por fim, a capela estava sem mordomos e, apesar de lido o capítulo aos moradores em estação da missa, não se decidiam a cumprir o determinado «… por mais que lhe diga hei-de fazer a dita finta como se detremina». O despacho do Chanceler e Vigário Geral, Dr. Vicente da Gama Leal, de 7 de Julho de 1751, baseado em sentença anterior, ordenou que o custo das obras na Igreja da Marmeleira fossem repartidas: «…para a Cappella Mayor os fructos da Comenda ou fabrica mayor e para o Corpo da Igreja a Fabrica menor ou Juiz da Igreja e Parochia». Acrescentará ainda, em despacho, que sobre as obras a fazer nos Altares Colaterais e Corpo da Capela (ou Igreja) «passe ordem contra os mordomos dos ditos Altares e o Juiz da Igreja de Souzellas afim de serem notheficados para que no termo de trinta dias juntem certidam jurada do Reverendo Parocho; porque consta haveremse feito na realidade as tais obras e não as mandando fazer no dito termo proceda logo o mesmo Reverendo Parocho, sob penna de suspensão contra elles na forma da ordem geral da vezita pella pena de dous mil reis» e que quanta às obras da Capela Mor «…se passe tambem ordem com o termo de seis dias contra o fabricario da Fabrica Mayor da dita Igreja de Souzellas para que presente neste Juizo o livro della afim de se examinar o liquido da mesma a vista della que se juntara por appenso a estes autos». Manoel Fernandes Parente, fabricário ou depositário do dinheiro da Fábrica da Freguesia de Souselas, solicita uma data para prestar suas contas, recordando 451

Freguesia de Souselas – um povo com História

no requerimento quer a sentença favorável à Marmeleira, quer a falta de dinheiro na Fábrica da Matriz de Souselas: «…os moradores do lugar da Marmeleyra de Bottão da mesma freg.ª obtiverão Sn.ça p.e que a Fabrica da referida Matriz de Souzellas concorresse p.ª o paramt.º da Cappella daquelle seu lugar da Marmelleyra, e p.ª pôr dr.º prompto (não o havendo na Fabrica) fizerão proceder com censuras contra o Supp.e obteve despacho p.ª dar contas, e se suspenderão as censuras pello recurso incluzo athé a Dominga do Bom pastor» A 17 de Abril de 1751, o Provisor cita os moradores da Marmeleira que agem na questão como representantes do povo: Luis Francisco Barrette, Joam Simoenz Bimbo, e Sebastiam Simoens, para comparecerem a 20 do dito mês na Cidade de Coimbra, perante o Desembargador Joseph Tavares, com o objectivo de tomar contas a Manuel Parente. Neste dia, e além dos referidos, marcam presença mais dois moradores da Marmeleira; Agostinho Lopes e Domingos Gomes. O auto de contas é esclarecedor da míngua de recursos porque passava a fábrica da freguesia. Os moradores confirmam as declarações de Manoel Parente; que havia recebido as parcelas mencionadas, e que do anterior depositário, Joam Simoens Serquedo recebera 20.937 reis os quais «…mostrou tambem ter gasto em ornamentos da Igreja como constou por çertidõens do vestimenteiro Manoel Gomes Louro que emportaram em 21.905 reis ficando por este modo o mesmo fabricario gastando 968 reis allem do liquido como consta de hum rol avulsso e tambem de huns róis avulssos do mesmo vestimenteyro»(724). O Bispado, pela opinião do Promotor e do Provisor Teixeira, exarou despacho onde concluia que não havendo na Fábrica Maior dinheiro para cumprimento do mandado a fazer na Capela-mor, que o dinheiro necessário saia dos frutos dos dízimos e Comenda, ou seja; que o Comendador faça as obras no termo de vinte dias, e que faltando se faça sequestro na mão do Rendeiro da Comenda. E que no que respeita às obras dos altares colaterais e do corpo se expeça ordem para tal aos mordomos da capela e ao Juiz da Igreja de Souselas. As peças deste processo informam-nos, a par e passo, do evoluir da situação nos meses seguintes. Havendo o costume de se fazer as eleições de Juiz da Igreja e Fabricário, em passando o dia de S. João, e tendo o livro de contas (que também registava estes actos eleitorais) ficado apenso aos autos, tornou-se necessário que o vigário solicitasse que o mesmo fosse desapensado, tendo sido entregue no dia 3 de Julho de 1751.

A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica: Caixa documentação variada (7-1-5), Doc. Nº 59, «Autos de contas que dá o Reverendo Dom Fernando de Santo Antonio Botelho vigário da Igreja de Souzellas sobre o Capitulo de vezita respeito a Cappella de Sam Joam do lugar da Marmeleira», 1751

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VII – Património, Arte e Religião

Os novos eleitos foram notificados a cumprir o despacho: o Fabricário a compor o altar de S. João Baptista no termo de 6 dias, e os Mordomos ou Juiz da Igreja os altares colaterais. Porém e, como consta de uma declaração, os novos eleitos estavam «com grande fogo» e para obstar ao determinado enviaram petição ao Vigário Geral, alcançando mandado para que fossem exibidos os documentos existentes. Em requerimento conjunto o Juiz, José da Cunha (de Souselas), e o Fabricário, Paulino da Costa (da Zouparria do Monte), pressionados ou não pelas autoridades, vêm declarar que as obras afinal foram feitas do modo determinado, dando-se culpados de alguns erros processuais cometidos: «…os Supp.tes como rústicos, e ignorantes de negócios cuidarão em dár satisfação ao q.e estávão obrigados, tendo recursos em q.e não concluirão, e ultimam.te absolvição como mostra o Requerim.t.º junto, q.e tudo foy feito antes da condemnação em q.e o desp.º os suppoem». Em seguida, e na qualidade de Mordomos da Senhora do Rosário e fabricários da Igreja da Freguesia, requerem a absolvição geral, justificando os recursos e o arrastar da situação com a falta de dinheiro. Para que o processo seja encerrado, o Bispado exige um termo de confissão dos moradores da Marmeleira, o que vem a acontecer, datado e assinado a 19 de Setembro de 1751: «Nos em nome de todos os moradores do lugar da Marmelleyra de Bottão, eu Luiz fran.cº barr.te; e João Simoens bimbo e Sabastião Simoens e Domingos Gomes confessamos estarmos satisfeitos com a dillig.ª que tem feito os fabricarios da fabrica mayor e menor da Igr.ª de Souzellas, e os Mordomos da N. Snr.ª do Rozario da d.ª Igr.ª em paramentar-mos os altares desta nossa Igr.ª da Marmellr.ª comforme a nossa von.te; e em satisfação dos Cappitullos e Sn.ca q’ alcanssamos contra os Supplicados: pois estão os altares compostos como frontais, e pinturas como se pedia como tambem a tribuna de N. Snr.ª; que juntam.te esta pintada m.to ao nosso gosto, e sabemos tem encomendado as cruzes, e castiçais a Romana p.ª os mesmos altares, e porq nos fiamos de q`os Suppl.ºs, se obrigarão a nos porem os mais aprestes de q`necesitão os altares sem mais algum temor pois se tem vestido de zello p.ª o fazerem, pode Vm.ce dar absolvicão aptual aos Supplid.ºs, e por verd.e rogamos a Joachim dos Reys q. este nos fez e nos asignamos»(725). Mas não era ainda o fim deste conturbado processo. O decretado nos capítulos de visita demorou a ser concretizado, como consta dos sucessivos exames que se mandavam fazer às obras, de pouco adiantando as notificações e apresentação do despacho condenatório. No último auto de exame a que tivemos acesso, feito pelo vigário de Eiras, António de Almeida, em Março de

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Id. Fl. 27

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1753, a Igreja de S. João da Marmeleira estava ainda longe do determinado nos capítulos de visita: «…o Altar de S. João Bap.tª não está forrado de taboa de ambos os lados (…) e q.e só está forrado de taboa pella p.te de sima: tambem senão taparão as bichas daz paredes da Cap.ª mór, e he precizo mandar-se virar o telhado della, q.`de outra sorte ameaça ruína. O arco da d.ª Capella não se levantou (…) O Altar de N. Snr.ª não está forrado de taboa pellos lados, e por diante como manda o Cap.º, mas sim, o está pella p.te de sima: Tambem não tem pedra de Ara nem grd.e nem pequena como manda o mesmo Capitulo (…) O Altar de S. Luzia sim está forrado de taboas pella p.te de sima, mas não pellos lados, e por diante (…) Ainda q.` senão levantou o Arco da Capella Mór, está com tudo m.tº bem concertado, e tapadas as bichas q.`nella havia»(726). As autoridades colocaram grande empenho em que se cumprisse a determinação de arco novo na Capela-Mor e a forra no altar de S. Luzia. Chamados a resolver a questão José da Cunha e Paulino da Costa, declaram que a responsabilidade é dos novos oficiais, acrescentando que as obras do arco se não fizeram por falta de dinheiro, e o forro do altar de S. Luzia deve sair das esmolas que se lhe derem, anotando ainda que o povo não concorrerá em caso de se lançar finta «por se contentarem com o que está feito». Em resposta, e para dar cumprimento às obras, a Câmara Eclesiástica intima-os a pagarem 4.000 reis de condenação. Verba que os suplicantes depositam, solicitando porém que tal «vexação» seja remetida contra os actuais oficiais. O último registo deste processo, data de 4 de Maio de 1753 e refere-se à certificação da notificação feita pelo pároco D. Fernando Botelho, aos novos oficiais, Manoel de Souza, Juiz da Igreja, e José Duarte, depositário da Fábrica da Capela-Mor, para que dêem comprimento às obras que nos capítulos se mandaram fazer. A partir de então poucas informações conseguimos reunir sobre intervenções ou ocorrências envolvendo a Igreja de S. João Baptista da Marmeleira. Restam da antiga Matriz da Marmeleira os seguintes elementos: no muro Poente do cemitério da Marmeleira foi reaproveitado um remate de retábulo, datável do Séc. XVI, que tem como tema o Padre Eterno, bastante comum no remate de retabulos pétreos quinhentistas (foto 115), do qual também faria parte o nicho que foi recolocado no interior da actual capela do cemitério. Vestígios de um passado distante, mas relevante, que os antigos desejaram que não se esquecesse, colocando-os de forma destacada em novas construções. Por outro lado, a tradição dos “carreiros de missa” ou “carreiros do cemitério” são, quiçá, testemunho do respeito pelo passado: antigos caminhos rurais que

(726)

Id. Fl. 36

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ligavam as povoações da Marmeleira, Carrimá, S. Martinho do Pinheiro e Barcouço à antiga igreja matriz, e que atravessando propriedades lavradas eram refeitos pelos habitantes logo que concluída a tarefa. Estes caminhos, aliados ao posicionamento da antiga igreja, fazem-nos ponderar a hipótese de o templo ter sido lugar de romagem e ou peregrinação. Diz-se, também, que o último morador da Marmeleira a ser baptizado na antiga matriz, terá sido José Vicente do Amaral Monteiro a 13/09/1872. Também corre entre o povo que os sinos do antigo templo foram levados para Barcouço. 3.2. Capela de Nosso Senhor da Agonia Esta capela, de planta rectangular, apresenta telhado de duas águas, cruz na empena e cunhais assinalados por pináculos (fotos 116 e 117). A porta de acesso ao interior é rectangular, em cantaria pintada. No altar dispõem-se as imagens do Senhor da Agonia e de Nossa Senhora das Dores, bem como a da Rainha Santa (de fabrico moderno). A capela de Nossa Senhora da Agonia ficou concluída em 1874. A sua história relaciona-se com o cumprimento de um voto feito pela família Maleiro. De facto, data de 4 de Junho de 1874 o requerimento pedindo a bênção da Capela com invocação do Senhor da Agonia, solicitado por Maria Barbeira, viúva de José Joaquim Moleiro e seus filhos Joaquim Maleiro e Sebastião Maleiro (727). O próprio requerimento conta parte da história desta capela, nomeadamente a razão para a sua edificação: «Disem Maria Barbeira, viuva de Jose Joaquim Maleiro, e seos filhos Joaquim Sebastião, todos do lugar da Marmelleira desta freguesia de Souselas, que tendo mandado construir à entrada da sua povoação da Marmelleira uma piquena capella para cumprimento d’um voto de seo defunto marido e pai; e desejando levar a cabo a referida obra, para o que se achavão justos e consiliados, se promptificavão a conservar a dita capella sempre desente, munida de todos os paramentos e mais ornamentos precisos, bem como a fazer-lhe de futuro todos os reparos nesessarios para a sua boa consevação, para o que obrigavão suas Pessoas e bens». No entanto, o processo de construção da capela estava ferido de vício, com certa gravidade do ponto de vista da lei religiosa: não fôra pedida licença para

(727) A.U.C. – Fundo do Cabido: Capelas, Cx. XII, Nº 33 - Autos de requerimento de licença de benção da Capela com invocação do Senhor da Agonia, pedidos por Maria Barbeira, viúva de José Joaquim Moleiro e seus filhos Joaquim Maleiro e Sebastião Maleiro, para cumprimento de um voto do falecido, do lugar de Marmeleira, freguesia de Souselas, 1874-1878, Fl. 1

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a escolha do local nem para a edificação da capela. Um facto importante que atrasou a legalização em cerca de 4 anos. Assim, foi necessário regularizar a situação, que passou pela elaboração de uma conciliação amigável entre as partes, assinada perante o Juiz de Paz de Souselas (na altura Adriano da Cunha e Souza) a 5 de Junho de 1878: «…logo por todos foi dicto a elle Juiz de Páz que tinham mandado construir uma Capella de baixo da invocação do Senhor d’Agonia á entrada da sua povoação da Marmelleira, com as seguintes condicções: que todos se prontificavão a concervar a dicta capella sempre decente, munida de todos os paramentos e mais ornamentos precisos, affim de nella se poder celebrar o Santo Sacreficio da missa, e mais actos relegiosos (…) todos os reparos necessarios (…) obrigavão suas pessoas e bens».(728) Acompanhava este processo uma informação, datada de 1 de Julho de 1878, do Bispo D. Manuel Correia de Bastos Pina e dirigida ao pároco da freguesia para que procedesse a vistoria da capela. E, junto ao processo, se anexou nova petição dos pretendentes em que pediam «…a benção do Senhor da Agonia; Orago da mesma, assim como do crucifixo que tem de ser collocado no Altar da dita Capella, disculpando-lhe a falta que por ignorancia cometteram de não pedirem licença para a escolha do local e edificação da mesma, por isso – Pede a Vossa Exçellencia se digne deferir-lhe». Termina o processo com o «Auto de Revista» ao pequeno templo, realizado pelo pároco da freguesia, Augusto Cesar Henriques: «…que a Capella, de que se trata é conveniente para satisfacer à devoção não só daquella povoação, mas tambem d’outras visinhas, que nas suas afflições costumão implorar o auxilio do Senhor d’Agonia: a mesma capella foi por mim visitada e encontrei-a com a devida desencia, e munida dos paramentos indispensaveis para nelle se poder celebrar o Santo Sacrificio da Missa; a imagem do Senhor d’Agonia foi mandada fazer e pintar de novo, e por isso pode sem escrupulo de consciencia se exposta à veneração dos fieis: o local da capella é bom, e daqui a alguns annos, estou certo, que hade prosperar, e ter o rendimento necessario para a sua sustentação…». Ainda no mês de Julho de 1878 se passou a tão desejada provisão para a benção da capela e legalização do culto católico. 3.3. Alminhas As Alminhas difundiram-se em Portugal, a partir do momento em que Confrarias e Irmandades das Almas alcançaram grande popularidade, nos finais

(728)

Id. Fls. 1v.-2

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do séc. XVI, inícios do XVII. De facto, e a partir de então, assistiu-se a uma expansão das representações do Purgatório, ao ar livre, simples e acompanhadas de legendas. No centro do povoado da Marmeleira, e na rua principal, existe um Templete das Alminhas, do tipo capela (foto 118). Obra datada do séc. XVIII, de forma irregular e enquadrada na arquitectura popular. Apresenta porta rectangular de verga curva, sendo encimado por uma cruz, um sinete do lado direito e dois pináculos. Sob a cruz está um painel de azulejo, em mau estado «…representando N.ª S.ª do Carmo com o Menino ao colo e o Santo Escapulário nas mãos. Aos pés da Senhora, três alminhas, um homem, uma mulher e um frade, expiam as suas penas no fogo do Purgatório. Em baixo a legenda – “P.N.A.M. / Pelas almas” (Padre Nosso, Avé-Maria, pelas almas)»(729). Acede-se ao interior do templete (foto 119) por 3 degraus curvos onde se destaca: «…um altar e um retábulo em madeira onde se pode observar um painel com a representação do Purgatório ladeado por duas imagens marianas. O painel, policromo e de cores muito vivas, tem representado, em relevo, cinco alminhas – três do sexo feminino e duas do masculino. Mãos postas em gesto de oração, expiam, serenamente, as suas penas nas labaredas vivas do Purgatório. No céu, a entidade protectora – o Espírito Santo ladeado por dois anjinhos. Estas alminhas pertencem à família de Marcelino de Carvalho e datam de 1783»(730). Este singelo retábulo pétreo data do séc. XVIII. O templete teve, no passado, a designação de Capela de Santo António, referida nas informações paroquiais de 1721, e que foi objecto de especial atenção no capítulo de visitação relativo à Marmeleira, datado de 1752, onde ficaram expressas as suas necessidades cultuais e materiais: «Alem da dita Cappela /pq.tº vem falando de outra/ ha no mesmo lugar da Marmeleira outra do glorioso St.º Ant.º cujo Altar tambem nescessita de ser forrado não somt.e por sima, mas tambem por diante, e pellos lados, de huã pedra de Ara nova, e g.de com Relliquias, na mesma forma sera nella encaixada, de hum frontal de madr.ª pintado por hua p.te com boas pinturas da festa, e pella outra com as porpocionadas p.ª o tempo de Advento, e Quaresma, com dous castiçais de bom metal branco, ou estanho fino feitos a Romana de hú missal novo, ou de ser consertado o q.e há, de hú vão de Tafeta verde, p.ª o cálix, de tres pallas líneas, de meya dúzia de sanguinhos de palmo e meyo emquoadro cada hum de huã

António José Ferreira Quinteira - «Alminhas da Marmeleira do Botão» In Rev. Munda, Nº 15, Maio, 1988, P. 75 (730) Id. (729)

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Bolça p.ª os corporaes feita á Romana, de huã p.te de damasco verde, e pella outra de damasco roxo, de se consertar o cálix conforme fique mais pezado do he»(731). Em resposta, a Câmara Eclesiástica agiu em conformidade, ordenando aos mordomos da capela, sob pena de dois mil reis cada um, que no termo de dois meses dessem providencias ao referido, pelo líquido dela, e não havendo equivalente, as obras se fizessem à custa dos tais moradores. Porém, este capítulo da visita não foi cumprido, levando o Vigário de Souselas, a insistir junto dos mordomos. Num primeiro momento, a resposta foi simples e directa «…disserão, q.e não herão obrigados a fazer as tais obras, e a confraria de S.to Ant.º da Matrix, he a devia fazella, ou a freguezia». Mas, respondendo o vigário que sendo assim o assunto não era da sua conta, reagiram violentamente os mordomos ameaçando não só com petição ao Bispo mas ainda «…que se os obrigacem as tais obras, q.e havião de arazar a tal capella, e levar o S.tº p.ª a de S.ta Luzia». O vigário de Souselas comunicaria à Câmara Eclesiástica mais pormenores sobre a questão. Os mordomos, não apresentaram, na ocasião, o despacho que provasse a isenção dessa obrigação, alertando o vigário para a possibilidade de ser lançada finta. Mas, nem assim os mordomos e povo da Marmeleira desistiram da questão, até porque haviam alcançado sentença favorável sobre idêntica questão na Capela de S. João, conseguindo que o rendimento da Capela-Mor da Matriz de Souselas revertesse para as obras necessárias na Marmeleira: «…e como elles são teimozos, e hão de fazer, e eu não quero pagar alguas custas Vm.ce m.to bem os conhece, pello q.e se passou, sobre a outra Cappella , q.e como alcancarão sentença estão m.to ufanos, de tal sorte q.e os sinco mil reis q.e esta pobre cappella mor da Matrix, tem, elles os levão e ella fica tão mizeravel, q.e não tem senão coatro toalhas do seu Altar». Os mordomos foram notificados para efectuar as obras no prazo de um mês, sob pena de excomunhão. Na realidade, a povoação da Marmeleira é rica em alminhas, umas mais antigas do que outras. No antigo largo da fonte velha, e a caminho do cemitério, estão umas curiosas alminhas datadas de 1775 (foto 120), construídas em alvenaria e encimadas ao centro por uma cruz. Nelas são de destacar diversas particularidades: «O nicho resguardado do exterior por um alpendre abrigava um retábulo em madeira já desaparecido. Na frontaria do monumento, a legenda gravada em pedra calcárea – “DAI ESMOLA PELAS ALMAS DA FÉ / ANNO D 1775 A P.N. AVM”

A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica: Caixa documentação variada (7-1-5), Doc. Nº 59, «Conta que dá o Reverendo Vigário da Igreja de Souzellas [D. Fernando Botelho] em resposta ao Capitulo de Vezita», 1752 (731)

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Estas Alminhas marcavam, ainda, o local de paragem do féretro a caminho do cemitério e o tempo para uma oração pela salvação da alma do defunto»(732). De volta à rua principal, e num pequeno largo, existem outras alminhas; um nicho metido na parede de uma casa particular, resguardado do exterior por uma porta com grade de ferro e encimado por uma cruz (foto 121). Interiormente tem uma imagem da Rainha Santa Isabel e a pequena estrutura terá sido construída no princípio do século XX «…em substituição de umas mais antigas que havia no largo fronteiro»(733). À saída do lugar e na estrada que conduz à Pampilhosa estão as mais recentes alminhas do lugar: «Foram edificadas no mesmo local onde existiam umas antigas com um retábulo em madeira. Segundo me disseram, estas foram reconstruídas por Alberto Baptista em cumprimento do desejo expresso por seu pai (…) Tem dois painéis. No primeiro, um Cristo crucificado, dois Anjos e as Almas do Purgatório. Em baixo a legenda “P.N.A.M”. O segundo painel representa S. José e o Menino»(734) (foto 122). Por fim, refira-se o desaparecimento das Alminhas que existiam no Alto da Ladeira. Eram construção em alvenaria, com nicho a abrigar um painel de madeira. Seria uma obra de finais do séc. XVIII, princípios do XIX.

4. Património em S. Martinho do Pinheiro 4.1. Capela de Nossa Senhora da Nazaré Capela construída na primeira metade do séc. XX, com telhado de uma água e fachada assimétrica, e pequena torre sineira à direita (foto 123). A sua edificação relaciona-se, intimamente, com o abandono da antiga povoação de Carrimá a mesma invocação. De facto, em 1943 a capela estava já construída e depositado o recheio da antiga capela de Santa Luzia, proveniente da abandonada povoação de Carrimá: «Porem a povoação de Carrimá que ainda há uns 20 anos tinha 3 ou 4 casas de habitação e a referida capela, desapareceu, já nada existindo a não sêr o terreno tendo o povo do logar de S. Martinho do Pinheiro retirado dali os materiais aproveitaveis e construído a expensas suas uma nova capela no Baldio

António José Ferreira Quinteira - «Alminhas da Marmeleira do Botão» In Rev. Munda, Nº 15, Maio, 1988, Pp. 77-78 (733) Id. P. 76 (734) Id. Pp. 76-77 (732)

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existente naquele logar que possue 2 oliveiras e um tronco supondo que um Baldio era pertença da junta de freguesia»(735). Os terrenos da desaparecida capela de Santa Luzia eram um baldio paroquial, enquanto o local onde em S. Martinho se edificou a nova capela era também baldio mas…municipal. Porém, a ânsia do povo levou-o a cometer um erro, como se relata no ofício de Souselas para a Câmara Municipal de Coimbra, datado de 1 de Agosto de 1943: «Acontece porem que este Baldio é pertença da Camara e para que a capela ali construida possa sêr benta como o povo e o párocho desejam torna-se indispensavel que a Camara transfira os direitos de propriedade daquele Baldio para a junta de freguesia que por sua vez entregará à Comissão de Culto»(736). A inversão dos procedimentos poderia ter custado caro. Valeu, no entanto, a condescendência do município, como se infere da comunicação da C.M.C. para a Junta de Freguesia, datada de 14 de Agosto desse ano: «Sendo os baldios, como são, bens do domínio público, por ninguém podem ser apropriados, podendo, tão somente, determinados grupos de indivíduos tirar dêles proveito, em conformidade com os regulamentos administrativos (artº 388º do Cód. Admiv.º), e isto quer os baldios sejam municipais ou paroquiais. Assim, os habitantes de S. Martinho não podiam nem deviam construir a capela naquêle terreno, nem podiam ainda proceder à construção sem darem cumprimento ao disposto no nº 20.º do art.º 51.º do citado Código, que obriga a licença as obras de edificação, reedificação ou quaisquer obras em terrenos confinantes com ruas ou outros lugares públicos sujeitos à jurisdição municipal ou paroquial. Nem sôbre a escolha do local, nem sôbre a construção da aludida capela foi ouvida a Junta de Freguesia, nem tão pouco foi concedida qualquer licença, só mais tarde tendo tido conhecimento dos factos. Assim, por falta das formalidades necessárias, haveria que mandar proceder-se à demolição da capela, como também à aplicação da respectiva sanção, pela falta de licença. Parece, porém, que não deverá considerar-se a falta com tão extremo rigor, porquanto: Atendendo a que os habitantes de S Martinho do Pereiro [Pinheiro], ou a Comissão por êle escolhida, para levar a efeito a construção da capela, procedeu de boa fé e na persuasão de que nenhum inconveniente traria a escôlha do referido local, visto tratar-se de um terreno baldio e cuja área aproveitada para a construção deve ter sido relativamente pequena»(737).

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A.H.M.C. - Diversos Maço III, Doc. Nº 13 Id. Id.

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Resolveu-se a situação de forma pacífica, e aproveitando o facto de a utilização do baldio permitir a sua cedência: «…no referido local apenas existem 2 oliveiras e um tronco, donde parece poder conluir-se que aquêle baldio não tem sido aproveitado para cultura, produção e corte de matos, combustível ou estrume ou ainda qualquer outra utilização (§ único do art.º 393.º) e assim resultará que tal baldio, não só é dispensável do logradouro comum, como até é impróprio para cultura. E, sendo assim, o art.º 399.º do Cód. Admv.º diz: “Os baldios dispensáveis do logradouro comum e impróprios para cultura são considerados bens do domínio privado disponível do concelho ou da freguesia”, acrescentando o art.º 400.º que tais baldios são alienáveis em hasta pública, independentemente das leis de desamortização. Portanto os corpos administrativos podem proceder à sua alienação, e, consequentemente, a Exm.ª Câmara poderá, desde que se verifique tratar-se de um baldio impróprio para cultura, aliena-lo em favor da Junta de Freguesia»(738). Na reunião do município de 2 de Setembro, a Junta de Freguesia oficializou o pedido para que «…a Câmara desista do direito que tem sobre um baldio em São Martinho do Pinheiro, para aquela Junta reconstruir uma capela de Santa Luzia, que antes existira num baldio da Junta na povoação da Carrimã, povoação e capela agora desaparecidas»(739). Deliberaria a municipalidade desistir do baldio em favor da junta de freguesia. Mas antes havia que cumprir as formalidades legais. Uma delas passava pelo Ministério da Economia e, mais propriamente, pela Junta de Colonização Interna a quem era necessário pedir que o baldio fosse classificado como dispensável do logradouro comum. Deseja a Junta de Colonização colaborar mas, para surpresa dos envolvidos, o baldio não estava registado! Assim, e durante quase um ano decorreu o processo de legalização, que culmina a 14 de Outubro de 1944 com a comunicação final da Junta de Colonização Interna informando da inclusão do terreno, com 1042 m2 «no tombo dos baldios da freguesia de Souzelas» e consequente classificação como «dispensável do logradouro comum» e «impróprio para cultura»(740). Os últimos passos, para sossego do povo, promoveram-se em Fevereiro de 1945. No dia 8 o município delibera: «Tendo os moradores de Souselas construído uma capela num terreno que era baldio municipal, ele é desafectado com a declaração de “dispensável de logradouro comum” e “impróprio para cultura”»(741). Por fim, a 15 de Fevereiro Id. José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 60 (740) A.H.M.C. - Diversos Maço III, Doc. Nº 13 (741) José Pinto Loureiro (Dir de); Armando Carneiro da Silva (nota preambular) - Anais do Município de Coimbra, 1940-1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1971, P. 84 (738) (739)

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de 1945 o Conselho Municipal aprova por unanimidade a cedência do baldio à junta de freguesia(742). Em 1987 organizou-se, no lugar, uma Comissão de Melhoramentos que pediu subsídio ao município para a sua reestruturação e ampliação. Na sequência, a C.M.C. pediu à JF um parecer sobre o caso, que foi enviado a 22 de Abril, e no qual apoiou e incentivou a iniciativa: «Dado que a citada Capela se encontra em estado de degradação, a população de S. Martinho do Pinheiro, achou, por bem, organizar-se na sua recuperação e ampliação. Em consequência, a povoação em causa aumentou consideravelmente, o que impossibilita as pessoas de terem acesso à Capela. Queremos dizer que a mesma se torna insuficiente e incapaz de albergar quantos ali vão assistir aos actos religiosos»(743). Do recheio destaca-se um S. Bento de pedra (séc. XVI), proveniente da antiga e desaparecida capela de Carrimá (foto 124), e uma Nossa Senhora da Conceição.

5. Património na Zouparria do Monte 5.1. Capela de São Martinho Apresenta planta rectangular, com telhado de duas águas e cruz na empena. A ela se acede através de portão em ferro, a partir do qual se prolonga um gradeamento que protege um pequeno pátio ajardinado. Um alpendre, sustentado por colunas antecede a porta de verga curva que dá entrada (fotos 125 e 126). O templo foi reparado em Março de 1967 sob responsabilidade de uma comissão de obras, tendo a junta de freguesia oferecido 3 pinheiros para seu madeiramento.

6. Património em Sargento-Mor 6.1. Capela de Nossa Senhora das Preces Esta capela (foto 127) foi construída por Manuel Madeira(744), do lugar de Sargento-Mor durante o ano de 1758. O requerimento que apresentou à justiça A.H.M.C. - Livro de Actas do Conselho Municipal, 1937-1949, Fl. 68 A.J.F.S. - Correspondência Recebida e Expedida (apenas de e para a Câmara Municipal de Coimbra), 1986-1990 (744) Manuel Madeira seria homem de consideráveis posses. Na escritura de obrigação e fiança da obra do retábulo da capela-mor da Igreja Matriz de Ourentã, datada de 14/04/1758, surge como fiador do Cabido de Coimbra (vide Nelson Correia Borges - «Dois retábulos bairradinos – Ourentã e Murtede», In Munda nº 3, Maio 1982, P. 29 (742) (743)

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eclesiástica, para a construção da capela, transmite um conjunto de informações valiosas, entre as quais avulta o facto de a área ser deficientemente servida de culto, a especial importância da estrada que passava pelo lugar, e até, um suposto milagre obrado por Nossa Senhora das Preces em beneficiação do suplicante: «Diz Manoel Madr.ª do lugar do Sarg.to mor freg.ª de S. Thiago de Souzellas, q no insinuado paiz se acham tréz lugares = Sargentomor e Pincanços, e canettas, ainda que pequenos mas perto huns dos outros sem q. em algum delles haja capella alguma p.ª se dar o Sacram.to aos infermos, e como a Igr.ª Matriz fica distancia de meya legoa e de m.os maos caminhos, e hú Rio muy caudelozo, q. p.ª a mesma se passa, o que em .tas ocazioes fica m.ª g.te sem ouvir missa pello mencionado motivo; e o referido lugar do Sarg.º mor fica em hua estrada a mais publica q. tem o Reyno, por cuja passão m.tas pessoas eccleziasticas huns p.ª dizerem missa e outros p.ª a ouvirem. Sendo assim dezeja o Sup.te fazer huma Capella publica com porta p.ª a mesma estrada, e nella por a Imagem de N. Sr.ª das Presses em gratificação de hum milagre q. féz ao Sup.te; e sendo isto húa obra tam pia, e comua p.ª todos recorre a vm.ce p.ª lhe conçeder licença p.ª o insinuado procedendo informe sendo necesr.º; e juntam.te obrigando o Sup.te bens sufiçientes p.ª o param.to da mesma p.ª o que P.a vm.ce se digne deferirlhe o exposto»(745). O vigário da freguesia, João Francisco Montenegro, confirmaria, por informação de 18 de Março de 1758, esta argumentação seleccionando, inclusivamente, o lugar onde queria se fizesse a construção, junto às casas que o suplicante possuía no lugar: «Não há duvida q. o lugar do Sargt.º mor fiqa dist.e desta Parochia o espasso de meya legoa; e esta dividida com hum Rio, q. nas emchentes faz seu impedim.to p.ª se vir a missa, ě cam.o he de sua natureza lameozo; e os lugares de q. o Supp.te fas menção se achão juntos sem Capp.ª alguma donde se possão sacramentar os enfermos e ficão sendo a Capp.ª q. o Supp.te pertende edeficar de m.ta utilid.e não só aos Parochos desta freg.ª pella utilid.e dos sacram.tos mas tambem aos sacerdotes e passageiros da estrada por ser aquella a mais p.ca do Reyno comua p.ª todo o minho, e Beira Alta e Galiza; e como o Supp. te sequer obrigar a ter a porta aberta ao Parocho pareçe senão pode perder este bem; abalizei a area no citio mais decente junto das cazas do supp.te por ser o mais livre de agoas e inundaçois por alto; fica com quarenta palmos de cumprida, e vinte de largo em vão, conforme mandão as arquitecturas…»(746). A 7 de Abril o suplicante e sua mulher obrigam um conjunto de bens de raiz, para rendimento e segurança da capela e, a 29 do mesmo mês, são inquiridas

(745) A.U.C. – Fundo do Cabido: Capelas, Cx. XIX, Nº 3 - Requerimento apresentado por Manuel Madeira do lugar de Sargento-Mor, freguesia de Souzelas a pedir autorização para ser construída uma capela sob a invocação da Senhora das Preces, 1758-1759, Fl. 2 (746) Id. Fl. 2v.

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5 testemunhas na Capela de S. Martinho (na Zouparria do Monte), por uma comissão constituída pelo vigário Francisco Montenegro e Joaquim dos Reis. As testemunhas (Joze Carneyro, casado, do lugar da Zouparria, trabalhador na freguesia, 35 anos; Manoel Fran.co, da Azenha, viúvo, trabalhador e morador no Casal da Passoa, freg.ª de Trouxemil, 58 anos; Sebastiam Fran.co, casado, lavrador, da Zouparria do Monte, 56 anos; Manoel Simoes, casado, trabalhador, morador no Casal da Passoa, freg.ª de Trouxemil; Jozé Frz. Manquo, casado, lavrador, da Zouparria do Monte), avaliam em mais de 200.000 rs e rendimento anual 24.000rs, a propriedade principal localizada «na fonte de Arroyos junto ao Sargentomor que consta de vinhas, terras, e oliveiras (…) tem tambem huma morada de cazas dentro da mesma». A 3 de Janeiro de 1759 fez-se, finalmente, auto de revista da capela, pelo já referido vigário de Souselas. A capela estava primorosamente ornamentada e preparada para receber o culto, excepção feita à sacristia: «…fui ao lugar do Sargento mor da m.ª freg.ª e ahi fis a revista na Capp.ª que instituhio M.el. Madr.ª do d.o lugar com o Orago de N. S.ra das Presses; ter na mesma huma Imagem da referida invocação primorozam.te estofada de ouro azul e emcarnado; conforme o pede a arte segundo me informou hum pinto q. estava prez.e esta a S.ra posta em trono do Retabulo; q. está fabricado de madeira de castanho, e a moderna; com perfeição; esta o mesmo m.to bem pintado; porem he só da boca do oratorio p.ª dentro; e dali p.ª fora se vai continuando a mesma pintura; tem mais huma Imagem de S. Seb.am m.to bem feita e outra de N. S.r Jhezus Christo cruxificado em huma cruz de pau preto bem emcarnadas todas; a S.ra tem huma primoroza Capp.ª de prata; tem seo altar m.to bem feita, e em boa proporção com pedra de ara, já sagrada; duas toalhas frontal de pau bem pintado das duas cores de branco e esmearado; tem huma planeta; com stolla manipulo, cordão, alva e amito de seda branca liza mas em bom uso, e o mais de linho; veo do calix bolça e corporal m.to bom; tem hum calix e patena de prata, tudo liza; sem rotura, ou disformid.e com cujos param.tos e vazos bem se pode celebrar o altissimo sacrificio da Missa; castiçais destanho, e galhetas; Tem a Capella seo arco cruzeiro de pedra de Ancaã, com seo degrau forada de pinho manço porem sem pintura pella hir continuando; esta m.to bem rovocada e dealbada por dentro e por fora, tem seo pulpito e pia de agoa benta de pedra; tudo bom; esta situada np lugar balizado com porta p.ca p.ª a rua nam tem tribuna nem fresta por honde (…) se possa ouvir missa; tem huma sachristia q. lhe falta ainda fazerselhe a parede anterior della p.ª q. não haja comunicação das casas de Instituidor p.ª a Capp.ª; e se esta cauza não for impeditiva; no mais está em tr,ºs de se selebrar nella benta q seja com as Imagens q ainda o não estão». Apesar das diversas peças deste complexo processo darem a entender que, pelos finais de 1759 se terá alcançado autorização para benzer a capela, a verdade 464

VII – Património, Arte e Religião

é que os documentos também mostram que o instituidor da capela andou em processo judicial movido por sua irmã. Contudo, e segundo as suas próprias palavras, a irmã fora instrumentalizada por um vizinho que queria «fabricar huas casas no sitio da Cappella». A capela de Sargento-Mor chegaria a 1781 em condições difíceis, obrigando as autoridades religiosas a agirem em conformidade, especialmente depois de ser conhecido o capítulo da visita feita ao templo. Nessa época, era vigário de Souselas D. Agostinho Pitta de Castro e, Administrador da capela, António Madeira. Depois de organizado o respectivo processo, o Promotor da Câmara Eclesiástica resolve proceder a sequestro nos bens dotados para a conservação, como forma de resolver os problemas materiais visíveis no dito capítulo de visita: «A Capella do Sargento mor preciza de ser reparada nos telhados, e de ser caiada ao menos pella parte de dentro. Preciza de huma vestimenta branca, e encarnada com estola, e manipulo das mesmas cores, como tão bem bolsa de corporaes das mesmas cores, dois vêos branco, e encarnado, duas mezas de corporaes, os sanguinhos, e toalhas necessarias; e tudo isto mandará fazer o administrador da dita Capela no precizo termo de dois mezes (…) Por virtude deste capitulo mandei notificar, e avizar ao Administrador, he hum Antonio Madeira assistente no lugar do Sargento mor desta mesma freg.ª; porem só tem satisfeito em mandar reparar os telhados, e caiar a capella, no mais não tem cuidado ao mesmo tempo, se faz tão precizam.te necessário, quanto he a administração de alguns sacramentos, e a celebração do s.to sacrifício. Ouço dizer, o dito Administrador quer satisfazer com comprar huma vestmenta ja uzada. He já passado o termo de dois mezes no qual devia cumprir o se lhe ordenava neste capitulo»(747). O templo apresenta planta rectangular com telhado de duas águas, cruz na empena e pináculos nos cantos. A fachada é dominada por porta rectangular ladeada por duas aberturas rectangulares para caixas de esmolas. À direita temos o campanário, ligeiramente recuado relativamente à fachada, com cobertura piramidal. É de realçar o altar neoclássico (fotos 127 a 129). Pela deliberação camarária nº 2388/2003 aprovou-se o projecto de recuperação da capela, elaborado pela Divisão de Estudos e Projectos da C.M.C. Em Março de 2006, a JF na sequência de uma reunião com a Comissão da Fábrica da Capela apoiou as obras de requalificação com 3.500 €. A inauguração das obras realizou-se a 30 de Abril de 2006, cerimónia presidida pelo Bispo de Coimbra D. Albino Cleto, com a presença do Presidente da C.M.C. e diversas figuras do município.

A.U.C. – Fundo da Câmara Eclesiástica: Doc. Nº 46 - «Autos de Reprezentação e conta do R. Par.º sobre capitullos de Vizita», s/n

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6.2. Capela de Nossa Senhora da Boa Hora Trata-se de uma capela de construção recente, inaugurada em 13 de Julho de 1985 (foto 130). De planta rectangular, apresenta telhado de duas águas e cruz na empena, tendo nas esquinas setas. O portão é de serralharia civil e apresenta motivos geométricos. 6.3. Alminha de S. Romão Pequena construção com telhado de duas águas e cruz na empena. Ao centro um gradeamento.

7. Arquitectura civil: do rural e tradicional ao senhorial Nazareth de Sousa, em 1951, abordou as tipologias de casas antigas existentes na freguesia, assinalando a existência de dois tipos fundamentais: • Na parte oriental do lugar de Souselas, destacou «…a representação do velho estilo da casa abastada, e notar nelas os balcões e alpendradas e as pesadas, mas elegantes cantarias de calcáreo da região»(748). Esta categoria era consequência directa de certa abastança, que permitiu o requinte e o «prazer de alindar». Como principais características exteriores desta construção, que apelidou de casa antiga de pequena lavoura, definiu: «…fachada sóbria, telhado à portuguesa, de velha telha de canudo, beiral simples e raramente duplo». E, num esforço de pormenorizar, refere como sendo o tipo mais vulgar a fachada rectangular, janelas de guilhotina no primeiro andar, guarnecidas de cantaria - predominantemente de forma rectangular, ou em forma de cúpula árabe invertida sob o peitoril - e, no rés-do-chão, a porta simples, a janela de outro quarto e o portão de entrada para o pátio. Assinalou ainda que, algumas vezes, o rés-do-chão era ocupado pela adega, havendo então escada exterior e alpendrada coberta da mesma telha de canudo, sendo a chaminé simples, mas grande (fotos 131 e 131A). Quanto ao espaço interior, a casa abastada tinha características próprias: • o primeiro andar, assoalhado e com forro de madeira, a sala de entrada com mobiliário muito reduzido e, o restante espaço ocupado com quartos;

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 29

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• a cozinha, quase sempre é térrea, sendo muitas vezes uma edificação externa, pegada à casa, onde não raro se come, e nela encontramos quase sempre a «…cantareira, colocada do lado direito da lareira, decorada com os tradicionais barros de Coimbra»(749). Na cozinha, marcam presença duas bilhas aguadeiras (os azados), e diversos utensílios como pratos, tachos e panelas de barro (quase sempre preto, para a comida caseira) e os panelões de ferro fundido, com três pés (para a cozinha do gado). A lareira por vezes é de canto, com banco corrido e, por cima, há sempre o fumeiro e o fogo é feito sobre o «lar de tijoleira e por debaixo da trempre de ferro». • os quartos são mobiliados com cama de ferro, mesinha de cabeceira, um lavatório, um arca-roupeiro, cadeiras e, muitas vezes um oratório. A cama tem colchão, enxergão, lençóis e «…são vulgares as antigas colchas de chita de Alcobaça»; • O pátio, localizado adjunto à casa, atapetado com mato. Nele estão as instalações para o gado, o galinheiro, o forno, o palheiro (por cima do curral dos bois, por onde se lança por dois buracos no estrado, e directamente para a mangedoura, a alimentação do gado). Nas instalações para animais, destinguia-se o cortelho (para as ovelhas e cabras) a pocilga (para os porcos) e o curral (para os bois). Para os restantes núcleos populacionais, nada definiu em especial, apenas «…velhas habitações, mas sem qualquer outra característica além da extrema rusticidade». Tratava-se de um estilo antigo, ainda hoje visível mas a caminhar para o desaparecimento, com uma construção simples, de pedra sobre pedra, ligada com argamassa, uma ou outra cantaria simples e pequena, de dimensão modesta. De 1950 para cá, deu-se a invasão de modernos materiais de construção, que vieram alterar a fisionomia das construções, designadamente a introdução do cimento armado, do tijolo, ou a substituição da telha de canudo pela telha marselhesa. Em Souselas, e de acordo com estudos recentes, apesar das muitas transformações trazidas pela industrialização, ainda se detectam ao nível rural e tradicional, três tipos de casas tradicionais. Dado o posicionamento geográfico da freguesia não será de estranhar que estes tipos tenham sofrido a influência bairresa e gandaresa: «A primeira com influência bairresa com dois pisos, sendo o primeiro construído de pedra que funcionava como habitação e o segundo de adobes em que

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Id. P. 31

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o sobrado servia para secar os cereais [ou armazenamento de víveres]; o segundo tipo de construção apresenta um portão grande seguido de um corredor com acesso ao pátio, dois pisos (construção exclusiva de pedra) funcionando o primeiro piso como arrumos, cozinha e adega e o piso superior como habitação [zona residencial por excelência]; o terceiro tipo de habitação é uma variante também de dois pisos mas com uma escada exterior e um balcão, sendo de realçar também as grades de ferro de algumas varandas e os típicos aventais das janelas»(750). Estas casas pertenciam, na maioria dos casos, aos pequenos agricultores. Entretanto e, a partir de meados do séc. XX, Souselas assistiu à transformação de muitas destas fachadas, sem planos ou orientações: «Com o desenvolvimento industrial, vieram novas pessoas, que com elas trouxeram novos gostos, imprimindo à arquitecura corrente uma nova linguagem. Muitas das habitações anteriores passaram para a posse de operários. Manteve-se a tipologia, mas introduziram-se novos elementos estéticos, das novas correntes arquitectónicas, que neste local foram reinterpretadas!»(751). Há na freguesia algumas casas quinhentistas e algumas casas solarengas (uma do século XVII outra do séc. XIX). Algumas utilizaram o ferro forjado, vendo-se aqui e ali portas e janelas geminadas, de guilhotina ou de avental recto ou recortado, com apoios para a colocação de gelosias.

8. Um caso singular envolvendo o património religioso Nos inícios de 1923, a Junta de Freguesia e a Direcção do Museu Machado de Castro reuniram-se, em Souselas, para tratar de um assunto de grande interesse para a arte. A pedido do Director do Museu, o bem conhecido António Augusto Gonçalves, fez-se a cedência de uma imagem de pedra existente na igreja, lavrando-se um contrato por escrito do seguinte teor: Declaro que se acha depozitada no Muzeu Machado de Castro uma pequena figura, de esculptura muito rude, pertencente à igreja de Souzelas. Mais declaro: que com o Snr. Prezidente da Junta de paroquia combinei dar, em compensação, qualquer peça de paramento ou imagem, ou alfaia = contrato, que estou prompto a satisfazer logo que pessoa ou via competentemente auctorisada, se aprezente no referido Muzeu.

João Pardal; Daniel Crespo; João Crespo; Albino Crespo; Vasco Gonçalves; Joaquim Gonçalves – Apontamentos da Nossa Terra, Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, Setembro, 1997, P. 4 (751) Maria Antónia Lucas da Silva; Eduardo Mota - O Centro da Vila de Souselas: o edificado urbano (relatório histórico-artístico), Gabinete para o Centro Histórico, Coimbra, 2007, P. 13 (750)

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Coimbra, 4 de fevereiro 1926 O Director do Muzeu A. Augusto Gonçalves»(752). Na altura era Presidente da Junta de Freguesia (e não da paróquia como se escreveu) António Mendes Júnior, que recebeu em troca os seguintes objectos: «…uma casula de damasco branco. Duas peças de brocado para um frontal. Darei mais o galão dourado para o mesmo frontal». Esta relação foi entregue e assinada pelo dito director do museu, decidindo o presidente da junta expôr ao público os objectos referidos. Foi então que alguns paroquianos se indignaram e levantaram tumulto popular, tendo por base a troca acordada. No auge do conflito, os membros do executivo chegaram a ser apelidados de «contrabandistas de santos». O incidente, cuja repercussão se espalhou pela área, exigiu mesmo um oficio enviado pelo presidente para o Administrador do Concelho, relatando o caso, pedindo a presença da GNR para a próxima sessão. O documento foi preparado com todos os pormenores na sessão de junta do dia 7 de Fevereiro de 1926: «…participa e chama attenção de V. Ex.ª para os factos anormais que se desenrolaram em Souzelas nos dias 1 e 2 de Fevereiro de 1926. Tendo vindo a esta localidade a Direção do Muzeu Machado de Castro, para obter qualquer objecto que enriquecesse o dito Muzeu, entre o Presidente da Junta de Paróquia e o Director do Muzeu fez-se contracto por escripto, no qual a Junta dava uma pequena figura de pedra (…) Certos discelos, com o pretexto que o Presidente da Junta fazer esses contractos, era para locupletar-se, promoveram um levantamento popular, cujo fim manifesto foi para insultarem pessoas de respeitabilidade e alcunharem de ladrões os membros d’esta junta. Dá como instigador principal, Manoel Bento Pacheco, prop. Souzelas, Joaquim Marques de Figueiredo, prop., S.las, auctor do motim, incitador a espancamento e, com desobediencia ao guarda da Egreja, pregar uma porta lateral da Egreja, Antonio Lopes Ribeiro, carregador na Estação de S.las por chamar ladrões aos membros da Junta»(753).

9. Património desaparecido, destruído e em risco: moinhos, azenhas e lagares Existiam vários moinhos de vento nos cabeços e serras da área envolvente de Souselas que, no seu conjunto, constituiriam, senão o maior pelo menos um dos maiores conjuntos de engenhos de moer de toda a Região Centro, perfazendo no total cerca de 30 exemplares.

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A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, Fl. 43v. Id. Fls. 44-44v.

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A geografia da sua implantação abrange toda a freguesia, embora a maior concentração fosse a Sul/Nascente. Um dos maiores núcleos, irremediavelmente perdido, era o que se dispunha ao longo da linha de cumeada da Serra do Ilhastro, que desapareceu fruto da intensa exploração pela Cimpor. Um segundo núcleo é o que ainda se detecta e dispõe pelo cimo da Serra de Brasfemes, no sentido S-N, constituído por 9 exemplares, a maioria deles (5) na área administrativa da Freguesia de Souselas (os restantes na Freguesia de Brasfemes), embora alguns acusem grande ruína ou destruição quase total. Para além destes dois núcelos fundamentais, ainda existem vestígios ou memória da existência de pelo menos um moinho de vento no Lâmbaro (elevação atrás da Adega Cooperativa), no Cabeço das Almoinhas (fotos 132 e 133), no Cabeço da Azenha, no lugar da Zouparria, e 2 no Cabeço dos Moinhos sito no lugar da Marmeleira (estando um em razoável estado de conservação e o outro em ruínas) (foto 134). Estes engenhos, tipologicamente, pertenciam na maioria dos casos a um tipo comum - o moinho de vento fixo, de torre de alvenaria com sistema de tracção por meio de rabo e tejadilho rodando sobre grade: «constituídos por um corpo cilíndrico de alvenaria, com pequena porta e janela no primeiro andar, e cobertos com telhado cónico de madeira, por vezes recoberto de zinco, e solidário com o eixo onde estão implantadas as velas, podendo este conjunto girar em torno da vertical de forma a ser orientado conforme a direcção do vento, orientação que é conseguida à mão, por intermédio duma haste obliqua, de madeira, também ligada ao telhado e conhecida pela designação de “rabo”. No eixo do moinho estão implantados oito “varais”, sustidos por cordas, formando oito sectores preenchidos alternadamente por “velas” de lona formando a cruz de Malta. Estas velas podem enrolar-se parcial ou totalmente em torno dos varais (…) Dentro e montado sobre o eixo há uma roda com dentes chamada “rodízio” que acciona por intermédio dum carreto, também de madeira chamado a “entrosa” o eixo vertical no qual está montada a pá móvel. Esta gira sobre a mó fixa. O cereal tomba dum recipiente colocado superiormente sobre um orifício ao centro da mó, por meio de trepidação conseguida com uma pequena roda ligada a esse recipiente e girando sobre a face rugosa da mó»(754). O período de laboração anual dos moinhos era limitado, dominante na época estival, obrigando, por vezes, a deslocações para lugares isolados e afastados da povoação. As características do engenho e horário de laboração, em função do regime de ventos, implicavam um desgaste físico maior. Neste contexto é de referir a articulação moinhos de vento com azenhas vizinhas, demonstrando complementariedade entre engenhos eólicos e hídricos

João Pardal; Daniel Crespo; João Crespo; Albino Crespo; Vasco Gonçalves; Joaquim Gonçalves – Apontamentos da Nossa Terra, Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, Setembro, 1997, Pp. 56 e 58

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e uma hierarquização entre ambos: processo de alternância era determinado pelas possibilidades de laboração das azenhas das ribeiras, assumindo os moinhos de evento um carácter meramente supletivo. Azenhas que apresentavam claras vantagens face aos moinhos de vento: maior regularidade do movimento da azenha em termos da qualidade da farinha produzida, aliada ao facto de se tratar de um engenho menos exigente quanto à assistência que requeria, e situado próximo dos locais de residência e de cultivo, permitindo ao moleiro desenvolver outras actividades quotidianas. A geografia das azenhas existentes na freguesia não é tão expressiva como no caso dos moinhos de vento: em Souselas tínhamos a da Azenha (foto 135), a da Rua do Lagar, e a da Moenda (esta totalmente destruída), enquanto na Marmeleira se destacavam a da Portela e a do Chão do Ferreiro, havendo ainda a assinalar a Azenha do Pisão. Sobre o engenho que existia no lugar da Azenha conhecemos o seu proprietário (moleiro) para princípios do séc. XVIII; de acordo com o Tombo de 1705 era Antonio Simois Larco (ou Zarquo). O mesmo sucede para os finais do séc. XVIII, altura em que muda o moleiro: nos finais do séc. XVIII: a 01/06/1796 e perante as autoridades municipais, foi aprovado no dito oficio Manoel da Fonseca «…moleiro da Azenha de Souzellas», examinado por Francisco dos Santos, e apresentando como fiador Jozé da Costa Soares, do mesmo lugar.(755) Mais complexo é perceber a que moinhos se refere o registo de 29/10/1805. Nesse dia e perante o Senado de Coimbra compareceu «…Theotonio Soares Cardozo moleiro senhor e pessuidor dos muinhos de Souzellas e por elle foi dito que para ademenistrar a dita azanha e muinhos requeria exzeminar»(756). O exame seria conduzido por Joze Ferreira da Silva, moleiro, de Vilarinho (Casais de Eiras), que o julgou aprovado, a cujo título se passou carta, sendo fiador o próprio examinador. Dúvidas que se estendem a outro registo, de 09/10/1805, pelo qual Jozé Joaquim de Souza, de Lagares, do «concelho de Souzellas», foi examinado e aprovado no ofício de moleiro(757). Seria o proprietário da Azenha do Pisão sucedendo na posse ao Alferes João da Costa? Em termos tipológicos, existiam dois tipos de azenhas: a azenha de rodízio de pequena roda horizontal sob a casa da azenha – tipo este de origem romana – e, a de origem árabe – com a grande roda vertical num dos lados do edifício. Pertencia ao primeiro tipo a construção da Azenha (em Souselas) e, ao segundo, a Azenha do Pisão.

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AHMC – Licenças e Juramentos, 1793-1798, Fl. 77 AHMC – Licenças e Juramentos, 1805-1807, Fl. 58v. Idem. Fl. 56

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Documentação régia e municipal antiga, e em dois momentos distintos, prova a importância dos moinhos e azenhas na produção de cereais, alimentando a economia local e regional, designadamente a Cidade de Coimbra: O declínio da agricultura e as transformações ocorridas na indústria de moagem no país, levaram à decadência dos sistemas tradicionais, com repercussões na degradação dos testemunhos correspondentes aos moinhos e azenhas: a maioria dos casais de mós, por exemplo, desapareceram sem deixar rasto. Para obstar a que a memória deste património se perca, a Junta de Freguesia pretende transformar a antiga Azenha de rodizio de Souselas em Ecomuseu. Uma palavra ainda para os lagares, simbolo das casas abastadas, que praticamente desapareceram na freguesia: em Souselas temos o existente na Rua do Lagar enquanto o do Pereiro mencionado no Tombo de 1705 e modernizado nos anos 50 do Séc. X, com instalação de motor a gasoil e prensas metálicas já não existe o da Remolha está praticamente destruído; o lagar de SargentoMor; enquanto o do Resmungão (junto ao lugar de Lagares) conserva a traça original mas está dentro dos limites administrativos da vizinha Freguesia de Brasfemes.

SISTEMAS DE MOAGEM Souselas, dada as suas características físicas potenciou a instalação de três sistemas de moagem que desde tempos imemoriais permitiu às populações rurais completarem os ciclos da terra: depois da colheita moíam-se os cereais para fabricar o pão. Os Moinhos de Vento na Serra de Brasfemes e Monte das Almoinhas eram fixos, construídos em calcário, de torre e onde o sistema de rotação do tejadilho era por meio de rabo. Possuíam uma cobertura cónica que inicialmente era de madeira e que nos últimos tempos de laboração foi substituída por chapa de zinco. Além deste sistema, tínhamos também, as Azenhas de Rodízio com presa: trata-se de um moinho de água com roda horizontal, accionando-se o rodízio através do declive da corrente entre a entrada e a saída de água. No exterior existia uma presa que servia para acumular a água necessária para accionar o rodízio caso o caudal fosse insuficiente. Outra tipologia eram as Azenhas de Copos de Roda Vertical ou de Queda: tinham a roda aplicada a um nível inferior à queda de água, que caía em copos que guarneciam a periferia da roda, aproveitando a acção da gravidade com o peso da água para accionar o sistema. Tinham a vantagem face ao sistema anterior, de trabalharem com pouca água.

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10. Irmandades e Confrarias Nas informações paroquiais de 1721 refere-se a actividade de quatro confrarias e uma irmandade na freguesia: «Tem mais a confraria da Sr.ª do Rozario St.º An.to e Jasus, e Santissimo Sacram.to q. o povo esta obrigado sustentar, e das esmolas se sustentam; tem mais a Irmandade de S. Sebastiam q. he ospitialiçia com 5 Jubileos em cada hum anno, q. pello Livro mais antiguo das contas se acha ser erecta avera 35 annos governandoze esta por hum compromisso confirmado pello Sor. D. Joam de Mello, e por bulla Pontifiçoa»(758). Por volta de 1840 estavam activas, não só as acima referidas, mas ainda a de Nª Senhora da Nazareth, cabendo à Junta de Paróquia gerir os seus bens, entrando o saldo das irmandades e confrarias no seu cofre. Em 1890, ainda se registou a entrada dos saldos da Irmandade de S. Sebastião e Confraria de Nossa Senhora do Rosário (de Souselas). A Irmandade de S. Sebastião foi extinta em 1890, e os seus bens anexados à Junta de Paróquia. Porém, em 1893, ainda a lei se não tinha cumprido, decidindo a JP oficiar ao Governo Civil em Abril «...afim de que elle houvesse por bem mandar dar posse a esta Junta de todos os bens pertencentes à extincta Irmandade de S. Sebastião, visto seus bens terem sido adjudicados à Junta por Alvará de Março (?) de 1890 e ainda não ter sido dada a posse legal»(759). Contudo, apenas em Agosto de 1898 se regularizaria a situação, quando a JP recebe um documento do G.C. e Administrador do Concelho, datado de 3/7 «…dando posse a esta Junta de Parochia das inscripções da Irmandade da Confraria de Sam Sebastião, de Souzellas e bem assim de todos os seus bens e valores»(760). Como se pode ler na descrição orçamental para 1895, parte da receita da junta de paróquia (foros) resultava da incorporação das irmandades extintas: «Estes fóros, capitães e inscripções, segundo se vê dos respectivos títulos, pertenciam a varias Irmandades, erectas na Egreja parochial, e que tinham a seu cargo as despezas da Fabrica. Estas Irmandades foram-se extinguindo successivamente, e os seus bens e rendimentos entregues á administração da Junta que lhes dá a mesma applicação»(761). Estas confrarias possuíam bens fundiários de assinalável expressão territorial, sendo conhecidos os das confrarias do Santíssimo, de Nossa Senhora do

A.U.C. – Fundo do Cabido: Informações Paroquiais de 1721, Souselas, Fls. 1-1v. A.U.C. – Fundo Governo Civil: Acta da Junta de Paróquia de Souselas, Acta de 16/4/1893, In Cx. 324 (760) Id. Acta 21/8/1898, In Cx. 326 (761) AUC – Fundo do Governo Civil: Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, Cx. 398, 1892-1895, Pasta 1894 (758) (759)

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Rozario, Santo António, Nossa Senhora da Nazareth e Senhor Jesus por volta de 1870(762). Um património constituído na maioria por oliveiras: • Confraria do Santíssimo Sacramento: Era a mais poderosa das confrarias possuíndo 288 oliveiras dispersas por diversas áreas da freguesia: Estreitas, Ponte de Frades, Cruzes, Eiras de Souselas, Corral do Concelho, Moenda, Lagar da Robala, Rigueira de Saias, Gorgolão, Carreira da Marmeleira, Val de Bexigas, Serra do Oiteiro, Valle da Negra Arretura, Fontes, Rigueira da Ponte, Citio da Capela, Val de Vaide, Ladeira, cimo do lugar da Zouparria, Remolha, Sobreiros, Rio de Botão, Cova da Adriôa, Carrizes, Lamaro, Mathua, Valoure, Barroca da Peça, fundo das terras de S. Martinho, Val de Miguel, Ponte dos Clerigos e Covão. Embora a maioria das oliveiras estivessem dispersas, e não organizadas no terreno de forma continuada, existiam algumas propriedades que se destacavam das demais: o olival com 18 oliveiras na Regueira de Saias, o olival com 25 oliveiras no Citio da Arretura, ou o olival com 14 oliveiras no Citio da Regueira da Ponte, ou o olival com 15 oliveiras na Cova da Adriôa. • Confraria de Nossa Senhora do Rozario: possuía 60 oliveiras, que se dispunham pelas seguintes zonas: Rio de Botão, Costeira de Val de Fora, Pedaço, Val Longo, Arrabana, cimo da Zouparria, Horta Velha, Canetas, Val de Botão, Cambalhas, cimo [e fundo] da Marmeleira, Remolha, Lamaro, Troviscais, Vale de Miguel, Lagar da Robala, Rigueira de Saias, Arneiro, Vale de Mourão e Ponte dos Clerigos. Os dois maiores olivais localizavam-se no Citio do Pedaço (com 10 oliveiras) e em Val de Botão (com 8). • Confraria de Santo António: a que menos oliveiras tinha a render, contabilizando somente 13, não existindo nenhum olival que particularmente se destacasse. As árvores dispunham-se pelas Cambalhas, Vera Cruz, Porto Seco, Vallas, Pedralva e junto às cazas de Luis Pereira. • Confraria do Senhor Jezus: tinha, a seguir à confraria atrás mencionada, o menor conjunto de oliveiras, com 42 pés, assumindo especial destaque o olival em Valle de S. Pedro com 13 oliveiras. À semelhança das demais confrarias, assinala-se a existência de oliveiras nas seguintes zonas: Remolha, Barroca da Peça, Citio da Mathua, Asude do Remungão, Ladeira do Espantalho, Brogolga e Rio de Botão. • Confraria de Nossa Senhora de Nazareth: uma confraria intimamente ligada com o lugar de Carrimá que nos princípios do séc. XX foi abandonado pelos seus habitantes. Possuía 117 oliveiras, localizando-se o mais importante conjunto junto aquele lugar onde existia um expressivo olival

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A.P.S. - «Inventário das propriedades e oliveiras das confrarias», 9 Agosto 1870, Fl. 8 e ssg.

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VII – Património, Arte e Religião

com 56 oliveiras. As restantes dispersavam-se por zonas específicas da freguesia; Braçal, Brogolga, Valoure, Rio de Botão, Sobreiros, Val de Geirão, Quinta do Vigário, Caleiras, Borralheira, Ponte Clerigos, Vale de S. Pedro, Troviscais, Cabeço de Meirinhas, Barroca da Peça, Valle de Estrada, Serra do Oiteiro e Remolha. Ao nível da gestão e dinamização do culto, funcionaram na freguesia durante o séc. XX algumas organizações. Em Souselas e de acordo com o Decreto Nº 11.887 de 6 de Julho de 1926 criou-se a Corporação do Culto Católico da Freguesia de Santiago de Souselas. Tinha a função de promover e sustentar o culto católico na paróquia e era formada por um Presidente (o pároco da freguesia), um Tesoureiro e um Secretário. Ao seu presidente competia a direcção do culto e ensino religioso na igreja e suas dependências, e demais capelas na freguesia: Marmeleira, Carrimá, Zouparria do Monte, Sargento-Mor e Senhor do Terreiro. Foi primeiro presidente da comissão o padre Manuel Rodrigues da Silva e dela faziam também parte: Jaime Eulálio Gomes (Secretário), José António (Tesoureiro), e os vogais Joaquim Marques, Joaquim de Sousa, Alfredo dos Reis Pato e Joaquim Marques de Figueiredo. Da sua actividade resultou um livro de inventário dos bens pertencentes à igreja (entre 1927 e 1972), uma vez que entre as suas funções constava a elaboração de um rol do património existente e envio do mesmo às autoridades. Nos anos 50 funcionou em Souselas o Núcleo Organizador da Juventude Escolar Católica de Souselas (J.E.C.) de que foram fundadores os estudantes: Alberto Baptista dos Santos, Fernando António Soares dos Reis Torgal, Luis Manuel Soares dos Reis Torgal, Augusto José Abrantes, Ernesto Torantins Rodrigues, Antonio Rodrigues Abrantes, Carlos Azevedo e Sousa, Manuel Fernandes Rocha, Túlio Cordeiro e Joaquim da Conceição Ferreira. Era assistente diocesano ou eclesiástico o padre Arlindo Fernandes. Em Abril de 1957 a J.E.C. de Souselas comemorou o “dia jécista” com a participação dos núcleos de S. Martinho do Bispo, Taveiro, Pampilhosa e Secção do Liceu D. João III. Mais de 30 estudantes do movimento assistiram à missa, comungaram e conviveram numa jornada de grande relevo(763). Por fim, colhemos ainda a informação de ter funcionado na paróquia o Centro Canónico de Souselas da Cruzada Eucarística das Crianças, dirigido pelo Pe Manuel Gonçalves. Em 1918 fundou-se a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, que é na actualidade a única em funcionamento na freguesia.

(763)

«Festa da J.E.C. em Souselas» In Correio de Coimbra, 18 Abril 1957, P. 7

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 102 - Igreja de Santiago, Souselas

Foto 103 - Igreja de Santiago, Souselas (meados do Séc. XX)

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 104 - Igreja de Santiago (interior)

Foto 105 - Igreja de Santiago (vista para o altar)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 106 - Capela do Santíssimo Sacramento (1593-1594)

Foto 107 - Retábulo da Capela do Santíssimo Sacramento (1593-1594)

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 108 - Igreja de Santiago (altar mor) e imagem de Santiago, Séc. XV (pormenor)

Foto 108A - Registo da Colação de António Campos Branco (30 de Janeiro de 1741)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 109 - Capela do Senhor do Terreiro (meados do Séc. XX)

Foto 109A - Cruzeiro em meados do Séc. XX e na actualidade

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 110 - Chafariz em meados do Séc. XX e na actualidade

Foto 111 - Capela de São João Baptista, na Marmeleira (meados do Séc. XX)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 112 - Capela de São João Baptista, na Marmeleira (na actualidade)

Foto 113 - Interior da Capela de São João Baptista

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 114 - Imagem de São João Baptista (Séc. XVI)

Foto 115 - Fragmento - Padre Eterno - da antiga Igreja Matriz da Marmeleira colocado no muro do cemitério (Séc. XV)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 116 - Capela do Senhor da Agonia

Foto 117 - Capela do Senhor da Agonia (interior)

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 118 - Templete das Alminhas, Marmeleira

Foto 119 - Interior do Templete das Alminhas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 120 - As Alminhas junto ao antigo Largo da Fonte, na Marmeleira

Foto 121 - Alminhas da Rainha Santa e composição relativa ao Dia de Vera Cruz, na Marmeleira

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 122 - Alminhas junto à Rua do Carril, na Marmeleira

Foto 123 - Capela de Nossa Senhora da Nazaré, em São Martinho do Pinheiro

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 124 - Capela de Nossa Senhora da Nazaré (interior) e imagem de São Bento (Séc. XVI)

Foto 125 - Capela de São Martinho, na Zouparria do Monte

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 126 - Capela de São Martinho, na Zouparria do Monte (interior) e imagem de São Martinho (Séc. XVII)

Foto 127 - Capela Nossa Senhora das Preces, em Sargento-Mor

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 128 - Capela Nossa Senhora das Preces, em Sargento-Mor (interior)

Foto 129 - Altar neoclássico (2.ª metade Séc. XIX)

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 130 - Capela Nossa Senhora da Boa Hora, em Sargento-Mor

Foto 131 - Uma casa antiga, típica e tradicional de Souselas, com alpendre (meados dos anos 50)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 131A - Exemplos de casas abastadas ou senhoriais de Souselas

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VII – Património, Arte e Religião

Foto 132 - O moinho de vento das Almoinhas (meados do Séc. XX)

Foto 133 - Enrolando as velas de lona em torno dos varais (meados do Séc. XX)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 134 - Moinho em ruínas na Marmeleira (Cabeço dos Moinhos)

Foto 135 - A Azenha, em Souselas (hoje abandonada)

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VIII COLECTIVIDADES DA FREGUESIA

A

Adega Cooperativa de Souselas constituição da Adega Cooperativa de Souselas – Sociedade Cooperativa Agrícola Anónima de Responsabilidade Limitada (S.C.R.L) – bem como dos seus estatutos, data de 18 de Maio de 1957, tendo sido aprovada por alvará do Ministério da Economia de 18/06/1957 (764). Naquele dia e na presença de José Pereira da Silva, professor oficial, residente em Souselas, e de Adriano dos Santos Silva e José de Sousa Calixto, na qualidade de testemunhas, respectivamente presidente da Junta de Freguesia e Regedor de Souselas, compareceu um conjunto de 15 proprietários, sócios fundadores «todos agricultores explorando a terra directa e efectivamente» que assinaram o título de constituição da cooperativa agrícola: Dr. Augusto Pais da Silva Vaz Serra (professor da Universidade de Coimbra e residente na dita cidade), Delfim Simões Morais Neves (residente em Barcouço, concelho da Mealhada), Artur da Silva Marques (residente em Souselas), Joaquim Carlos Ferreira (residente em Souselas), Adriano dos Santos Silva (residente em Souselas), Custódio Maia Costa (residente em Vilarinho, Freguesia de Brasfemes), José Simões Morais (Sargento Mór, Freguesia de Barcouço, concelho da Mealhada), António Cerveira de França Martins (residente em Souselas), Evaristo Pacheco Rodrigues (residente em Souselas), Amilcar Barreto Rajado (residente em Souselas), Alfredo Augusto dos Santos (residente em Souselas), João Maria Cadima (residente em Sargento Mór, lugar da Freguesia de Souselas), Francisco Carvalho (residente em Souselas), Manuel Parente Júnior (residente em Marmeleira do Botão, freguesia de Souselas), Carlos Lopes de Morais Neves (residente em Barcouço, concelho da Mealhada). De acordo com estes primeiros estatutos (lavrados na casa do dito professor por não existir em Souselas notário público), a cooperativa tinha o capital social mínimo de 225.000$00 e funcionava em ligação com o Grémio da Lavoura de Coimbra, sendo assistida por um representante da sua direcção. A sua

(764) Estatutos da Adega Cooperativa de Souselas, 1957, 17 Fls. (cedidos gentilmente pela direcção da Adega Cooperativa de Souselas para a elaboração deste texto).

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Freguesia de Souselas – um povo com História

circunscrição ficou limitada às freguesias de Antuzede, Botão, Brasfemes, Eiras, S. João do Campo, S. Paulo de Frades, Souselas, Torre de Vilela e Trouxemil, do concelho de Coimbra «…e provisoriamente pelas restantes freguesias deste concelho e freguesia de Barcouço do concelho da Mealhada, enquanto não forem criadas outras adegas cooperativas que melhor as sirvam»(765). Para o primeiro período de gerência, de 1957-1959, foram nomeados os associados seguintes: Direcção: Delfim Simões Morais Neves (Presidente), Joaquim Carlos Ferreira (Secretário), Artur da Silva Marques (Tesoureiro). Conselho Fiscal: Custódio Maia Costa (Presidente), Manuel Parente Júnior (Vogal), José Simões Morais (Vogal). Mesa da Assembleia Geral: Dr. Augusto Pais da Silva Vaz Serra (Presidente), Evaristo Pacheco Rodrigues (1.º Secretário), e António Cerveira de França Martins (2.º Secretário). Em Março de 1959 foi publicado o edital para construção da instalação da Adega Cooperativa. Conforme recomendação do Grémio da Lavoura de Coimbra, a C.M.C. deferiu o requerimento para a construção das instalações da Adega Cooperativa de Souselas em Maio de 1959, aguardando-se pela entrada em funcionamento ainda no decorrer deste ano(766). A Adega veio a elaborar o primeiro vinho em 1960. Em 1962 tinha como presidente o Eng.º Alberto Morais, ano em que lhe foi conferido o 1.º prémio ao vinho tinto ali produzido, no âmbito do XXVI concurso “O Melhor Vinho”. Em 1967, tinha, como presidente, Delfim Simões Morais Neves(767). A 2 de Junho de 1966 alteraram-se os seus estatutos, de acordo com deliberação da AG do dia 29/05 do dito ano, e na presença do professor oficial de Souselas, Júlio Duarte Morais, e das testemunhas António Cerveira de França Martins (Presidente da Junta de Freguesia) e Francisco Morais Silvestre (Regedor). Ao acto compareceram os directores Delfim Simões Morais Neves, Amilcar Barreto Rajado e Joaquim da Silva Rama. Nesta alteração realça-se a referente ao artigo segundo, que definiu uma nova circunscrição: «…ficará limitada pelas freguesias de Almedina, Ameal, Antuzede, Botão, Brasfemes, Eiras, Ribeira de Frades, S. Bartolomeu, S. João do Campo, S. Martinho do Bispo, S. Paulo de Frades, Santa Clara, Santa Cruz, Santo António dos Olivais, Sé Nova, Souselas, Taveiro, Torre de Vilela, Torres do Mondego e Trouxemil, do concelho de Coimbra, e provisoriamente

(765) (766) (767)

Idem. Vide Diário de Coimbra, 15/5/1959, P. 5 Anuário Comercial de Portugal, Vol. II, 1968

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VIII – Colectividades da Freguesia

pelas restantes freguesias deste concelho e freguesia de Barcouço, do concelho da Mealhada, enquanto não forem criadas outras Adegas Cooperativas que melhor as sirvam». A área de recolha das uvas é constituída, na maioria, por pequenas parcelas, das encostas do Bussaco às vizinhanças de Conímbriga. A tradição e qualidade filiam-se em tempos recuados: no Mosteiro de Lorvão (séc. X) e no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra (séc. XIII), cedo se elaboraram vinhos de muito prestígio. Um dos momentos de maior azáfama na adega vive-se pelo final do Verão com a entrega de vindimas pelos seus associados. Os tintos representam 75% da produção vinícola e são provenientes, na sua maioria, das castas Baga, Alfrocheiro, Castelão (Piriquita), Jaen e Touriga, conferindo-lhe pujança no aroma, paladar amplo, irreverentes e macios. Pouco demorados no envelhecimento atingem-no com notas de perfeição e excelência. Os brancos são provenientes das castas Arinto (Pedernã), Bical, Cercial, Chardonnay, Fernão Pires (Maria Gomes), Rabo de Ovelha, Sercealinho e Verdelho. Revelam nobreza e carácter na juventude, e são ricos e generosos na maturação. A adega tem uma capacidade total de recepção de 5000 toneladas, sendo a vinificação de 250 e 150 toneladas, respectivamente de vinho tinto e branco. A adega desenvolveu um conjunto de marcas que vem comercializando: Lambaro, Souzellas, Frei Telo e Bairrada, Porta Férrea e Premium (Reserva da Adega Cooperativa de Souselas). Nos espumantes será de realçar o Frei Telo (branco e tinto) e o Cortejo (branco), este último em parceria com a CMC). A partir de 1983 estendeu a sua actividade à Freguesia de Almalaguês, com a instalação de um posto de recepção de uvas. Esta ligação a outra freguesia levou à comercialização do vinho regional Almalaguês. Ao longo dos anos, os vinhos produzidos na Adega Cooperativa de Souselas (fotos 135 e 136) têm sido reconhecidos em diversos concursos de especialidade, nacionais e internacionais, obtendo medalhas de ouro, prata e menções honrosas. Por proposta da Junta de Freguesia de Souselas, a C.M.C. deliberou atribui-lhe, a 07/05/2007, a “Medalha de Mérito Empresarial”. Recentemente celebrou dois protocolos de grande importância: em Novembro de 2011, com a Confraria da Chanfana de Vila Nova de Poiares, pelo qual os vinhos da adega passaram a fazer parte da carta do restaurante “O Confrade”, e descontos especiais na aquisição para os confrades; e, a 07/12/2011, com a Associação Humanitária dos Bombeiro Voluntários de Coimbra, com descontos especiais para associados na aquisição de vinhos. A Adega, que é a única do Município de Coimbra, tem, actualmente, 848 associados. O quadro de pessoal permanente é constituído por 10 empregados. A direcção é composta por 3 elementos, eleitos para mandatos trienais, assumindo funções operacionais, sendo coadjuvada por um gerente. 499

Freguesia de Souselas – um povo com História

Os actuais corpos sociais foram eleitos para o período 2011-2013: Assembleia - Rogério Esteves Lopes, João Nobre Mendes Cortesão e Domingos Almeida Simões Serra; Direcção – Fausto Custódio Correia, António Fernandes de Almeida e Francisco Lopes Prior de Almeida; Suplentes - Fernando Lopes Morais, Alberto Lucas Machado, Euclides da Costa Baptisa; Conselho Fiscal - Aristides Simões Dias, Álvaro Lucas Machado e Carlos Valter Dias Costa Areias; Suplentes - Alberto Fernando da Costa Paulino,Valdemar Nascimento Alves Pinheiro e Armando Piedade Santos Cardoso.

Agrupamento 1360 Souselas O CNE – Corpo Nacional de Escutas – é um movimento católico criado, na maior parte dos casos, a partir da iniciativa do respectivo pároco. Assim aconteceu em Souselas, no ano de 2007, com o Padre Fernando Carvalho, que convidou seis candidatos que logo iniciaram a sua formação frequentando os cursos necessários para se tornarem dirigentes do CNE. No mesmo ano, o agrupamento abriu com a 1ª secção; cerca de 40 “patas tenras” – aspirantes a lobitos, divididos por quatro bandos. Comemora-se o seu aniversário a 24 de Novembro. Inicialmente foi chamado de “Agrupamento de escuteiros inter-paroquial BBSTV” (Botão, Brasfemes, Souselas e Torre de Vilela) pois era intenção do Pe. Fernando Carvalho a junção, também nos escuteiros, das suas quatro paróquias. Dado não ser possível esta designação optou-se pelo local de morada da sede, então designado por Agrupamento em formação 9054 Souselas. Em 2008, foi reforçado com mais dois candidatos a dirigente, que iniciaram a sua formação nesse ano e, a 30 de Novembro, fez as primeiras promessas de cinco Dirigentes e de todos os lobitos na Igreja Paroquial de Botão. Em 2009, o agrupamento abre a segunda secção e participa no primeiro acampamento regional “Jambeiras” levando um explorador, cerca de 30 lobitos, dois dirigentes e dois candidatos a dirigente que fizeram a sua investidura em campo. No ano de 2010, abriu a terceira secção aumentando a diversidade de actividades escutistas e, em 2011, o agrupamento assiste finalmente à “promessa” do primeiro caminheiro (foto 137), contando hoje com as quatro secções em funcionamento. Passados quatro anos, e já com as quatro secções, o agrupamento é finalmente oficializado na Ordem de Serviço Nacional Nº 604, de 31 de Outubro de 2011, passando a ter o número definitivo 1360 (fotos 138 e 139). O seu patrono é Nossa Senhora de Fátima e dele fazem parte a Alcateia nº 62 - Nossa Senhora do Ó, a Expedição nº 86 - São Tiago Maior, a Comunidade nº 55 - Rainha Santa Isabel e o Clã nº 46 - João Paulo II. 500

VIII – Colectividades da Freguesia

A cerimónia de filiação realizou-se a 8 de Janeiro de 2012 e, para além do actual chefe assistente padre Fernando Pascoal e de muitos convidados, contou também com o criador do agrupamento, o Padre Fernando Carvalho. O chefe de agrupamento, Marco Lopes recebeu, finalmente das mãos do chefe regional, Pedro Monteiro, a bandeira de agrupamento, gentilmente oferecida pela senhora Maria Margarida Tenreiro, avó de duas escuteiras do agrupamento. Ao longo destes 5 anos de existência o 1360 tem efectuado diversas actividades com os seus elementos nomeadamente acampamentos, acantonamentos, raides, hikes… e para além do “jambeiras”, o agrupamento tem tentado participar nas actividades a nível regional e de núcleo. Esteve presente no ACASECNUC (acampamento de núcleo) em 2011 e 2012, no Curso de Guias realizado pelo núcleo centro norte. O agrupamento tem abertas inscrições durante o ano inteiro. Os novos elementos, com idades entre os 6 e os 21 anos podem efectuar uma inscrição provisória e de Agosto a Outubro fazer a inscrição definitiva. O ano escutista começa em Setembro vai até meados de Julho do ano seguinte. As actividades de sede realizam-se aos sábados das 15h30 às 17h30 seguidas de missa na igreja paroquial de Souselas, animada pelo agrupamento e pela catequese. Durante o ano há actividades no exterior que podem durar um dia como: raids, hikes, jogos de pistas, serviços à comunidade… ou incluírem a dormida fora de casa de pelo menos uma noite em acantonamentos e acampamentos. Presentemente o agrupamento integra um efectivo de 48 elementos, repartido por Lobitos, Exploradores, Pioneiros, Caminheiros e Dirigentes, e mantém o entusiasmo para continuar a viver grandes aventuras pelos caminhos de B. P.

Associação Escola de Karate Shotokan de Souselas O Karate-Do (“o Caminho das Mãos Vazias”) é uma arte marcial que tem as suas origens na ilha de Okinawa no Sul do Japão, surgindo na Idade Média como forma de defesa dos habitantes da ilha, que se encontravam proibidos de possuir qualquer arma, e daí o seu nome. Esta arte foi ensinada durante séculos em secretismo até ao Grande Sensei Gichin Funakoshi, no final do século XIX e início do século XX, ter popularizado esta arte marcial, dando assim início à era do Karate moderno. Depois da Segunda Guerra Mundial, o Karate Shotokan espalhou-se pelo Mundo, inicialmente para a Europa, E.U.A. e Brasil, chegando a Portugal nos anos 60. Na Região Centro a modalidade principiou com o Centro de Karate de Coimbra, em 1969, que antecedeu o actual Instituto Karate de Coimbra – Associação Regional do Centro, fundado em 1987. 501

Freguesia de Souselas – um povo com História

Em Souselas, o Karate Shotokan teve o seu início em 1989 com os Senseis Camilo Oliveira e João Francisco Oliveira. Em Fevereiro de 2005, criou-se a Escola de Karate Shotokan de Souselas, tal qual como ela existe hoje (foto 140). O número de atletas tem vindo a aumentar, gradualmente, tendo neste momento a funcionar duas turmas, uma de iniciados e outra de intermédios e avançados. O treinador é o Sensei Alberto Monteiro, 3º Dan da Shotokan Cultural Institute de Itália, Presidente do Conselho Técnico do ISP-ANK Instituto Shotokan Portugal – Associação Nacional de karate e Treinador Grau III da Federação Nacional Karate – Portugal. Tendo em conta a idade dos atletas, a escola tem optado por colocar em primeiro lugar a formação desportiva dos seus alunos em detrimento da competição. A competição deve fazer parte da vida desportiva dos atletas, mas não deve ser, de forma alguma, o seu objectivo principal. Tanto os atletas como o Instrutor têm participado em vários estágios de formação, Nacionais e Internacionais. Todos os alunos propostos a exame, têm conseguido obter boas classificações. A Escola de Karate Shotokan de Souselas tem participado em algumas competições, obtendo classificações no podium: 2007 Entroncamento – Campeonato Regional do IKC – ARC 2008 Alcobaça - Campeonato Regional do IKC – ARC 2009 Anadia - Campeonato Regional do IKC – ARC 2010 Torres Novas - Campeonato Regional do IKC – ARC 2011 Tocha - Campeonato Regional do IKC – ARC Delães – Vila Nova de Famalicão – Campeonato Nacional de Cadetes e Juniores da FNKP 2012 Tocha - Campeonato Regional do IKC – ARC Trancoso – Campeonato Nacional de Infantis, Iniciados e Juvenis da FNKP Pampilhosa – Campeonato Regional do ISP-ANK Montemor-o-Velho – Campeonato Nacional de Cadetes e Juniores da FNKP 2013 Mealhada – Campeonato Regional do ISP-ANK Castelo de Paiva – Campeonato Nacional de Infantis, Iniciados e Juvenis da FNKP 502

VIII – Colectividades da Freguesia

Acima de tudo, é importante conseguir que crianças, jovens e adultos da Freguesia de Souselas possam ter acesso ao desporto de uma forma educativa, equilibrada e sensata, disponível para todos, sem excepção, sem tornar a prática deste desporto inibida aos menos hábeis ou menos dotados. Não pretendemos, de forma alguma, seleccionar ou diferenciar os praticantes. O Karate é um desporto para a vida inteira e para todos e é esse o principal objectivo, difundir, promover e defender a prática do Karate Shotokan.

Associação Desportiva de Souselas (ADS) As raízes do futebol em Souselas são antigas, existindo documentos que remetem para os princípios do Séc. XX (foto 141). A ADS é, nos nossos dias, a mais significativa colectividade da freguesia ligada à prática de futebol. Fundada em 6 de Abril de 1974, por um grupo de pessoas, que decidiu criar esta colectividade destinada exclusivamente ao desporto e cultura. Organizou-se inicialmente em Comissão Administrativa, a qual se manteve em funções de gestão até à eleição dos seus Corpos Directivos. Desde a sua criação que a ADS se mostrou vocacionada para a prática do futebol de formação, dando aos jovens da freguesia uma formação desportiva e, também, a integração social. O emblema símbolo da colectividade, potência três aspectos emblemáticos da instituição (desporto, trabalho e cultura). A Associação Desportiva de Souselas conta no seu palmarés bastantes títulos e presenças honrosas em várias competições: • Época de 1974/1975: Campeão Distrital de Seniores da 1ª. Divisão (AFC) (foto 142). • Época 1977/1978: Campeão de Série e 3º. Classificado da fase final do Campeonato de Juniores; Vencedor da Taça de Encerramento de Iniciados. • 1981-1982: Campeão de Série do Campeonato de Juniores e ViceCampeão Distrital (foto 144). • Época 1982/1983: Finalista da 1ª. Edição da Taça “Associação Futebol Coimbra” (foto 143); Época1992/1993: Campeão Distrital 2ª Divisão (Seniores) – A.F.C. (foto 145). Teve como sede o edifício alugado à Casa do Povo e, por esta cedido a título provisório, enquanto não dispusesse de edifício próprio. Em 1983, sendo presidente Augusto da Silva Duarte, surgiram várias hipóteses para sede da colectividade, entre as quais algumas casas particulares e uma 503

Freguesia de Souselas – um povo com História

sala da antiga escola primária. Chegou a formar-se uma Comissão de Angariação de Fundos. A sede da ADS passaria para a casa do associado Gil Figueiredo, por aluguer, onde se manteve até hoje, apesar da mudança de senhorio, dado que o CASS adquiriu aquela parcela em 2002. As obras do campo foram a primeira preocupação ainda em 1975. Na alteração de estatutos, em 1980, definiu-se que a ADS tinha por fim desenvolver a Educação Física, o Desporto, a Cultura e o Recreio (artº2º), tendo três secções: Administrativa, Desportiva, e Secção Cultural e Recreativa. Em Março de 1980 tinha 310 associados. Em Novembro de 1979 recebeu subsídio camarário (20 contos) para construção dos seus balneários e, em Janeiro de 1980, pediu a associação à C.M.C., através da Junta de Freguesia, que o Campo de Jogos fosse electrificado «… para bem do Desporto da terra, pois a continuarem a fazer os treinos fora do seu campo, quasi não chega o dinheiro das cotas (…) quasi todos os elementos que compoem o grupo são empregados cerâmicos»(768). Em Junho de 1980, sendo presidente da ADS Manuel Veiga Ponte, foi solicitado que a JF doasse «…a esta Associação o referido campo de jogos; a exemplo de outras Juntas de Freguesia deste concelho» condição necessária para obtenção de subsidios junto da Direcção Geral de Desportos que apenas os concede a quem tem património próprio»(769). A resposta chegaria em Outubro daquele ano. Depois da aprovação pela Assembleia de Freguesia em reunião de 27 de Setembro, a JF informava a A.D.S. das condições em que lhe era doado o terreno e construções do Campo de Jogos. Contudo, a escritura apenas se realizaria em 1983. Em 1981, a equipa principal de futebol sénior ascendia da 3ª para a 2º Divisão Distrital. Esse sucesso levou a associação a solicitar apoio monetário ou material à JF «…para suportar as despesas com a electrificação, mesmo provisória, do campo de jogos desta localidade, condição prioritária para colocar uma equipa de Souselas no lugar a que legitimamente tem direito e dar aos trabalhadores da sua Freguesia um local adequado à prática do desporto nas suas horas livres»(770). Em Julho de 1981, a EDP estimava em pouco mais de 162 contos a electrificação do campo, que no entanto apenas seria concluída em Junho de 1983. Em 1986 esteve para ser dissolvida a instituição, que foi salva por uma Comissão Administrativa, suportada num grupo de trabalho, ambos nomeados a 5/7/1985 e que funcionou até 27 de Junho de 1986, data em que se elegeu

(768) (769) (770)

A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Recebida, 1980 (pasta) A.J.F.S. - Correspondência Recebida, 1981 (pasta)

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VIII – Colectividades da Freguesia

nova direcção(771). Contudo, a 2 de Julho de 1988, seria designada outra CA, que emergiu de 2 listas apresentadas, eleita a 2/07/1988. Em Dezembro de 1989 faleceria ao serviço da colectividade, no decorrer de um treino da equipa sénior de futebol, Paulo Alexandre Marques Lourenço, suportando a colectividade as despesas inerentes ao funeral. Por dívidas às finanças, a direcção decidiu suspender o futebol sénior na época 1994-1995. Elegeu-se a 6/5/1995 nova CA, mas em 1996 esteve iminente o fecho da instituição, por falta de listas concorrentes à direcção e fraquíssima adesão de associados. Na sessão de 29/6 (extraordinária) apenas 3 sócios comparecem á AG. Porém, a instituição seria salva na sessão seguinte (extraordinária) de 26/7, com José Monteiro da Cunha a assumir «que a associação nunca fecharia, nem que ele ficasse sozinho a tomar conta da mesma». E, também por sua iniciativa, seria eleita nesse dia, nova Comissão Administrativa e, no ano seguinte, uma outra. Tempos difíceis, que resolveram o problema das dívidas. A 8 de Maio de 1998, seria eleita para corpos gerentes, a lista apresentada e encabeçada pelo sócio e ex-jogador de futebol, Armando Prata. Contudo, no ano seguinte colocou-se a ADS num vazio directivo, sem apresentação de listas, atingindo-se o limite na sessão de 29/05/1999, em que o ponto único foi a discussão da dissolução da ADS. Cinco dos sócios presentes aceitaram formar uma Comissão de Gestão, evitando o encerramento, até que alguém aparecesse para liderar a colectividade. Pediram estes a sua demissão em Março de 2000, sendo sucedidos por nova comissão de gestão a que sucedeu, em 28/10/2000, nova CA, de que saiu eleita a direcção presidida por Helder Lopes, em 27/01/2001. Desde 3/02/2006, e até Julho de 2013, que a ADS teve como presidente, sucessivamente reeleito, Armando Manuel Simões Prata. O Campo de Futebol de Souselas é actualmente sua propriedade – Campo do Calvário - foi melhorado com a construção de novas bancadas, depois da requalificação da sua área feita por projecto executado pelo Gabinete de Apoio ás Freguesias da C.M.C, lançando-se em Julho de 2006 o concurso para a elaboração das obras, suportadas pela Junta de Freguesia. As obras de remodelação do Campo do Calvário ficaram concluídas em Setembro de 2007, inaugurando o espaço a 30 de Setembro de 2007 na presença de centenas de pessoas. Em finais de 2008, adquiriu a ADS uma parcela de terreno ao Sr. Fausto Morais por 12.500 euros, para alargamento do seu campo de futebol e (771) De acordo com o Livro de Actas da Assembleia Geral da Associação Desportiva de Souselas, (Outubro 1975-Dezembro 1989), a Comissão Administrativa compunha-se dos senhores: Manuel Veiga da Fonte, Eurico Sousa Ribeiro dos Santos, António Serrano Ventura dos Santos, Raul Cação da Cunha, Aníbal madeira da Silva, Sérgio Silva Dias Cação, Alfredo Oliveira e Silva, Alberto João Bras Gomes, Fernando Manuel Almeida Dias Santos, Mário Dinis Alves.

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implantação de um relvado sintético, obra que seria paga pela CMC em protocolo celebrado com a ADS. A 6 de Setembro de 2009, e na presença de milhares de pessoas, foi inaugurado o piso sintético do Campo do Calvário, pelo Dr. Carlos Encarnação, presidente do município, sendo vereador do Desporto Luis Providência e presidente da JF, João Pardal. A ADS é Filiada na Associação Futebol de Coimbra. A sua actividade tem sido ultimamente vocacionada no desenvolvimento e participação de vários escalões etários do futebol, nomeadamente com bambis, escolas, infantis, iniciados e juvenis, desenvolvendo também a vertente do futebol feminino (fotos 146 e 147). Presentemente, a Associação Desportiva de Souselas é dirigida por um grupo de ex-atletas com esforço meritório e dedicação, executando um trabalho de valor, que todos os Souselenses reconhecem. Desenvolve as modalidades de futebol nos escalões de: petizes, traquinas, bambis, benjamins, infantis, iniciados e júniores. Tem aproximadamente 120 sócios e 120 atletas. A sua sede localiza-se na Rua do Parque Desportivo, Souselas.

Casa do Povo de Souselas Na sua génese esteve o Centro de Recreio Popular de Souselas, colectividade que teve estatutos aprovados, nos termos da lei, a 30 de Março de 1951 pela Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho (FNAT), onde ficou inscrito como Centro de Recreio nº 14 (foto 160). Veio a desenvolver actividades sociais, culturais e desportivas (foto 159). No seu salão de festas acolheu diversos eventos sociais ao longo do séc. XX, tais como: • Festa de encerramento do Curso de Corte, Costura e Bordados “Alfa”, o qual decorreu durante Julho de 1962. A Sessão solene foi presidida pelo Padre Luis Domingues. Evento que a imprensa destacou: «Decorreu com o maior brilho a festa de encerramento do Curso de Corte, Costura e Bordados, que durante cerca de 3 meses funcionou nesta terra sob orientação do Sr. Alcino Tenreiro, inspector da Marguil. Lda. Distribuidora das máquinas Alfa no Centro e Norte de Portugal, e da menina Lucília Lindim, professora deste curso. À tarde foi aberta uma exposição dos trabalhos executados pelas alunas, que foi visitada por umas centenas de pessoas que admiraram os magníficos trabalhos expostos, alguns atingindo já um elevado grau de perfeição o que revela o bom aproveitamento das alunas. 506

VIII – Colectividades da Freguesia

É de realçar que algumas delas são operárias das fábricas da região e que só puderam frequentar o curso aos serões, dando assim uma magnífica demonstração de boa vontade de se prepararem para o futuro»(772). • Encerramento do 1.º curso de socorristas, que decorreu durante Janeiro de 1970. Cerimónia presidida pelo Dr. Guilhermino Teixeira Ribeiro, delegado do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, levado a efeito pela Missão de Promoção Sócio-Cultural e o Gabinete de Higiene e Segurança no Trabalho, departamentos da Junta de Acção Social, com a colaboração da Cruz Vermelha Portuguesa. Da cobertura noticiosa do evento destaca-se um salão cheio onde o então Presidente de Junta, Amilcar Barreto «…salientou a importância da iniciativa, lembrando a propósito que a existência da Casa do Povo permitiu desenvolver múltiplos aspectos de promoção sócio-cultural, tais como a recente exposição de mecanização agrícola e o curso de formação familiar rural»(773). Na festa, fez-se a entrega de diplomas, cartões e imposição de emblemas a 26 socorristas: D. Alda Maria da Rocha, Duarte das Neves Lopes, Alberto dos Santos Sousa, Arnaldo de Jesus Marques, Carlos Cação da Silva, D. Maria Teresa Ferreira Barroso, Pedro Amaral Martins, D. Maria Fernanda Oliveira Gante, António Domingues da Silva, Manuel de Oliveira Lopes, Francisco Nogueira Gonçalves, José Craveiro Gomes, José Ferreira Morais, Manuel Coelho da Cunha, D. Maria Odete Rocha, D. Maria da Saudade Nogueira, Rolando Lagos Rodrigues, João Lopes da Silva, D. Maria de Lurdes Borges, Manuel Lopes Júnior, Lino Morais Marques, Horácio Marques Neves, Amílcar Ferreira Barroso, António Ventura dos Santos, D. Maria Ventura dos Santos, Alcides Martins da Cunha. A festa encerrou com um beberete seguido de um «acto de variedades» pelo grupo privativo da Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho (FNAT). O CRPS teve grupo amador de teatro e equipas de futebol (foto 159). A ideia de uma Casa do Povo nasceu por esta altura. De facto, e durante o evento atrás mencionado o Dr. Guilhermino Teixeira Ribeiro anunciou a criação, em breve, da Casa do Povo de Souselas, a 2ª dentro do plano por si elaborado da cobertura de todo o distrito por estes organismos (a 1ª seria em S. Martinho da Cortiça). Desenvolvimentos significativos ocorreriam 3 anos depois. Algumas semanas antes da revolução de Abril, mais propriamente a 30 de Maio de 1973 o assunto

«Festa de encerramento do Curso de Corte, Costura e Bordados “Alfa” em Souselas» In Diário de Coimbra, 3 Julho 1962, Ano XXXIII, nº 10.834, P. 11 (773) «Decorreu com brilhantismo o encerramento em Souselas do 1.º curso de socorristas» In Diário de Coimbra, 28/1/1970, P. 4 (772)

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foi focado em reunião do executivo como expressão de uma vontade popular vasta, tendo-se nomeado, inclusivé, uma Comissão Organizadora: «O Presidente deu conhecimento de que é desejo generalizado da população da freguesia de que seja criada a Casa do Povo de Souselas, pelo que indicou para constituirem a Comissão Organizadora os seguintes senhores: Jose Claro Gomes de Almeida, Antonio Craveiro Gomes, Alipio Fernandes da Cruz, respectivamente, Presidente, Secretario e Tesoureiro, todos residentes em Souselas, sendo de salientar a satisfação que em todos notou e a aceitação pronta e decisiva dos cargos acima indicados»(774). Instituída por alvará de 12 de Julho de 1973, a Casa do Povo teve como sede social uma casa alugada, que também serviu de sede, durante alguns anos, tanto da Junta de Freguesia como da Associação Desportiva de Souselas, por autorização da primeira «a título provisório», até que ambas dispusessem de sede própria(775). O espaço foi repartido de forma pacífica até Março de 1980. No entanto, a partir desta data, começam as divergências com o senhorio. A ameaça de despejo, aliada à escalada do preço de arrendamento do imóvel, tornaria inevitável a construção de uma nova sede social para a Casa do Povo. A constituição dos seus corpos directivos demorou algum tempo, tendo-se designado durante o ano de 1974, comissões organizadoras da instituição. Na reunião de assembleia de associados, a 12/01/1975, e sob proposta da delegação de Coimbra da Junta Central das Casas do Povo, aprovou-se por unanimidade a mesa da Assembleia Geral, constituída pelos sócios: Joaquim Carlos Ferreira (de Souselas), Joaquim Soares (de Larçã-Botão) e Francisco Ferreira dos Santos (de Brasfemes)(776). Constituída a Mesa da Assembleia Geral tornou-se prioritária a eleição de Comissão Directiva. Algo que se concretizaria na reunião de 2/02/1975, em votação que elegeu a lista B com 65 votos (contra os 19 votos da lista A). Saíram eleitos: José Fernando Pimenta Mendes (Presidente), Elias de Almeida (Tesoureiro), Marcolino de Carvalho (Vogal), Francisco Ferreira dos Santos (Vogal), Joaquim Pereira Forte (Vogal), Daniel Maria da Cruz e António Carneiro dos Santos Madeira (777). O presidente José Fernando Mendes, alguns meses depois e sob ameaça de demissão, apresentará uma exposição da actividade desenvolvida, pela qual se deduz estar grande parte do trabalho feito e consolidado: «…actividade que visou fundamentalmente a integração dos trabalhadores rurais e pequenos proprietários a serem abrangidos pelo regime de previdência (774) (775) (776) (777)

A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975

Livro de Actas da Comissão Directiva da Casa do Povo de Souselas, Maio 1978-Novembro 1983, Fl. 34 A.C.P.S. - Livro de Actas da Assembleia Geral da Casa do Povo de Souselas, Maio 1974-2011, Fl. 2 Id. Fls. 4-4v.

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VIII – Colectividades da Freguesia

rural nas áreas das freguesias de Souselas Botão e Brasfemes, objectivo aliás conseguido por uma ampla campanha feita pelos elementos da Comissão Directiva nas Sedes das Delegações e lugares que compõem as freguesias». As casas de povo eram, nessa altura, apoiadas pelo regime, que via nelas uma missão social, uma base de promoção e progresso das populações. Assim, foi sem surpresa que um mês antes da revolução dos cravos, o município propôs a cedência gratuita para construção, instalação e funcionamento da sua sede, do «…terreno camarário no sítio do Calvário, freguesia de Souselas, deste concelho, com a área de seis mil duzentos e oitenta e cinco metros quadrados»(778). Uma proposta aprovada por unanimidade, mas que seria colocada em suspenso pela revolução entretanto sucedida. Por esse motivo voltará o processo a reunião municipal no dia 6 de Novembro de 1974, já em tempo democrático, quando estava à frente do município uma Comissão Administrativa presidida por Rui Carrington da Costa. Apreciado o processo, que vinha devidamente informado pela C.A da Junta de Freguesia de Souselas, deliberou-se ceder à Casa do Povo de Souselas o direito de superficie do terreno com algumas condições: pelo prazo de 70 anos e prorrogável, início de construção com limite de dois anos a contar da data de celebração da escritura devendo as obras terminar nos três anos seguintes(779). A escritura da constituição do direito de superficíe foi celebrada a 11 de Outubro de 1975, sendo presidente da Comissão Directiva Casa do Povo de Souselas José Fernando Pimenta Mendes. Segundo as clásulas do contrato uma parte deveria ser cedida, gratuitamente, para funcionamento da sede da JF de Souselas(780). Uma decisão submetida à homologação pelo Governo Civil e despacho do M.A.I. Apesar de autorizada a construção da nova sede da Casa do Povo, tal obra foi sucessivamente adiada, de dois em dois anos, através de prorrogação do prazo pela CMC. A prorrogação deu-se em Dezembro de 1977 e seria justificada pelas «…condições económicas anormais que o País atravessa» motivo pelo qual «…não lhe foi possível dar início às obras de construção do edifício sede daquela casa do povo, dentro do prazo consignado na respectiva escritura»(781) deliberando o município a prorrogação do prazo por mais dois anos. E assim foi sucessivamente prolongado o prazo até aos anos 90. A Casa do Povo de Souselas desenvolveria actividades de promoção social e acções de assistência. Os seus estatutos foram aprovados entre 1975 e 1980. Em Abril de 1983, foi aprovado o novo modelo estatutário e, em 30 de Janeiro

(778) (779) (780) (781)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 258, 1974, Fl. 21v. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 260, 1974-1975, Fl. 51v. A.H.M.C. – Livro de Escrituras, Nº 83, 1975, Fls. 57v.-59. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra Nº 268, 1977-1978, Fls. 45-45v.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

de 1987, tornou-se a associada nº 23 da Associação das Casas do Povo do Distrito de Coimbra. Grande parte das actividades inerentes à Casa do Povo, seria desempenhada pela Secção Sócio Cultural. A Casa do Povo tinha, por esta altura, delegações em Botão, Brasfemes e Marmeleira. Apesar da escassez de meios económicos e financeiros, foi enaltecida a dinamização e reactivação com gente jovem pois «…há longos meses se encontravam completamente paradas». Contudo, as delegações aguentaram-se pouco tempo: a de Brasfemes foi a primeira a ser desactivada, mantendo-se as outras duas, por entre críticas à reduzida actividade. Depois de um progressivo desinteresse associativo e de dificuldades financeiras ao nível, por exemplo, do arrendamento de casa para o seu funcionamento, em 1989 extinguiram-se as delegações da Marmeleira (em Outubro, com actividade transferida para o Centro Social da localidade) e Botão. A Delegação da Marmeleira chegou a compreender, na sua orgânica, uma Secção Cultural e Recreativa fundada a 24-04-1983(782), com regulamento próprio elaborado de acordo com o estabelecido pela Junta Central das Casas do Povo, que iniciou funções na direcção presidida por António José Quinteira Lucas Rosa, a qual tomou posse a 16 de Abril de 1983(783) Esta nova secção, cuja missão principal passava por angariar fundos para a construção da Sede Social da Marmeleira (futuro Centro Social da Marmeleira) veio revitalizar a instituição a qual desde 1982, e devido a problemas judiciais com o senhorio José Ventura Lopes, esteve quase sem movimento. A reabertura da sua biblioteca e exposições de alguns trabalhos manuais foram das primeiras iniciativas da nova secção(784). A Secção Cultural, na prática, substituiu em termos de direcção e organização a própria Delegação agindo e decidindo por ela, de que foram exemplos: a integração do Rancho Folclórico na Casa do Povo e aprovação dos seus componentes na reunião de 23/04/1984, criando assim uma Secção de Folclore com os ensaios a cargo do Sr. Arménio Bernardes Pereira Forte e António Pardal Baptista(785); a organização de “matinés dançantes”; de excursões; apoio à equipa de futebol júnior do Atlético Clube Marmeleirense na época 1984/85 destacando um vogal da direcção para esse fim(786); provas de atletismo, xadrez, ténis de mesa. Teve um grupo de teatro, herdeiro do Grupo Cénico que germinou no CRPM.

Os seus primeiros elementos foram António Oliveira Coelho, Bernardino da Silva, Arcanjo Custódio Marques e António Lopes Pinto. (783) ACSM – Livro de Actas da Delegação da Marmeleira da Casa do Povo de Souselas, 1983-1989, Acta n.º 1, Fl. 2 (782)

ACSM - «Relatório e Contas de 1983» In Relatórios de Contas da Delegação da Casa do Povo de Souselas na Marmeleira, 1974-1989

(784)

ACSM – Livro de Actas da Delegação da Marmeleira da Casa do Povo de Souselas, 1983-1989, Acta n.º 6, Fl. 3v. (786) Id. Fl. 4 (785)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Em 1985 a Secção Sócio-Cultural prestaria um relevante serviço à Marmeleira: perante o desinteresse da Comissão de Festas do S. João na realização da «mais antiga das Festas da Aldeia, decidiu-se por organizar esta tradicional romaria, actualmente celebrada no Cabeço dos Moinhos. Tratou-se de uma jornada de interesse social onde não faltou o pitoresco piquenique e em especial a celebração da Missa Campal, na qual orou e pregou o Rev.º Padre Paulo»(787). Em Outubro de 1989, esta delegação foi extinta, transitando a sua actividade para o Centro Social. Como consta do Relatório e Contas de 1989(788) «esta colectividade deixou a partir de Outubro de 1989 as instalações de que dispunha cuja renda pagava ao Senhorio José Ventura Lopes (...) cabendo à Direcção da Casa do Povo dar a conhecer a quem de de direito se deve ou não extinguir a Delegação». Na reunião da Assembleia Geral de 19/12/1987 percebe-se que a Casa do Povo vivia há muito em situação aflitiva: refere-se a «deserção de muitos sócios (…) deixaram de pagar as suas quotas». Tal facto levou a uma consequência directa e imediata – a diminuição da receita. Com o cenário pintado de negro, a Casa do Povo coloca esperanças em subsídios vindos de organismos oficiais, suficientes «…para custear o equipamento do Rancho Etnográfico da Casa do Povo». Durante alguns anos a Casa do Povo procurou resolver por si a questão da nova sede. Sobre este tema, chegou a ser elaborado de forma graciosa e apresentado na Casa do Povo, em Junho de 1982, pela Direcção Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola, um projecto para o edifício-sede, supervisionado pela Junta Central das Casas do Povo(789), e que mais tarde seria incluído nas obras de sedes de Casas do Povo, comparticipadas pela Direcção Geral do Equipamento Regional e Urbano. A instituição procurou recolher fundos, junto das indústrias da zona, para avançar com a dita construção. Contudo, tal projecto, executado gratuitamente, seria devolvido em Maio de 1986 à Casa do Povo, pelo Centro Regional de Segurança Social de Coimbra (compreendia 5 projectos de arquitectura e igual número de projectos de instalação eléctrica). Em Junho de 1983, foi a construção da sede incluída no Plano Geral de Equipamento Regional e Urbano. Como a Casa do Povo apenas reunia 3 de 4 condições, exceptuando-se a garantia de comparticipar 40% do custo da obra, teve a direcção de assinar uma declaração de compromisso. No entanto, e devido ao desinteresse da Junta Central das Casas do Povo, o assunto esmoreceu. A Casa do Povo ficaria sedeada na nova estrutura polivalente projectada pela Divisão de Estudos e Salvaguarda do Património Arquitectónico da CMC, em

(787) (788) (789)

Id. Fl. 6v. Acta nº 11 Id. Fl. 3v. Organismo extinto pelo decreto-lei, 185/85.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

1987, e durante muito tempo designada como «Centro Social de Souselas». Uma infra-estrutura financiada pelo município e governo, numa superfície que estava na posse da Casa do Povo. Para a concretização das futuras instalações – Sede da Junta de Freguesia, Sede da Casa do Povo, Serviços Médico-Sociais e Serviços Administrativos da Segurança Social – e para que fosse possível «…à Junta de Freguesia fazer o protocolo de direito de ocupação a todas estas instituições», tornou-se necessário que a Casa do Povo fizesse à CMC «…a reversão do direito de superfície do dito terreno», o que foi aprovado em Assembleia Geral de 25/03/1992, dando-se poderes à Direcção para outorgar na referida escritura em 28/04/1992(790). Paralelamente, a Junta de Freguesia e a Direcção da Casa do Povo, fizeram um protocolo de acordo das condições de ocupação das dependências destinadas à sede desta última instituição. O primeiro, a 5 de Outubro de 1992 e, um segundo, a 22 de Agosto de 2009. A Casa do Povo está ali sedeada, paredes meias com a sede da Freguesia de Souselas. O lançamento da primeira pedra da estrutura comum ocorreu a 02/07/1988, embora a Casa do Povo tenha iniciado as suas funções no novo espaço somente em Setembro de 1992. Além de várias salas, a Casa do Povo dispõe de salão polivalente, o qual tem sido cedido ao longo dos anos para múltiplas actividades: reuniões da comissão de moradores, reuniões partidárias, eleições e referendos; reuniões de diversas colectividades; bodas de casamento; almoços e jantares convívio; apoio a refeições a crianças da escola básica de Souselas; bailes, espectáculos musicais; exposições; ATL e festas de natal. Ali se realizaram reuniões da ADAS sobre a co-incineração (Abril 2000); Aniversário da Tuna Souselense; Festival de Folclore da Vila de Souselas (1999, 2000); recepção de entidades religiosas e civis, Comemorações do Dia da Freguesia (2008). Aprovou, por unanimidade e como sócio honorário, a empresa Cimpor (AG, 23/11/1990). No ano 2000, e em consequência de alterações legais, nomeadamente o retirar da tutela às Casas do Povo, procedeu a alteração de estatutos, por escritura de 22 de Maio de 2001, publicada em D.R. nº 171, IIISérie, de 25/07/2001. Em 2003, e para que se pudesse inscrever no INATEL, foi necessário aumentar a redacção dos estatutos. Na sua estrutura orgânica existe uma Secção Sócio-Cultural, com regulamento próprio, aprovado em reunião da direcção de 10/09/1983, onde se integrou o Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas e o Grupo de Musica Tradicional “A Barca dos Castiços”, ambos com regulamento próprio,

A.C.P.S. - Livro de Actas da Assembleia Geral da Casa do Povo de Souselas, Maio 1974-2011, Fl. 2, Id. Fls. 72 e 75

(790)

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VIII – Colectividades da Freguesia

e uma Secção de Ginástica (1992). No seio desta secção criou-se o Rancho Infantil, que actuou pela primeira vez em público, no dia 1 de Julho de 1984, no Festival de Folclore de Souselas. Em 1991, criou-se uma Escola de Música, que tinha como objectivos: o ensino da formação musical, a aprendizagem de instrumentos musicais, auxiliar o Grupo Etnográfico da Casa do Povo a constituir uma tocata, formar uma tuna, preencher os tempos livres dos jovens. Em Março de 2011, aprovou o novo logótipo, tendo como elementos base as cores e o desenho do antigo símbolo do Centro de Recreio Popular de Souselas: a torre da igreja de Souselas (o centro e local mais importante da Vila); a cor verde, representando o vigor, a juventude, a esperança e calma predicados que a instituição deseja praticar; a cor preta, porque significa dignidade. A Casa do Povo tem a sua sede social na Rua Vale S. Pedro Nº 23-C, 3020888 Souselas e vem representando a freguesia em diversos eventos. Possui bar e uma riquíssima biblioteca de cujo acervo constam exemplares de obras raras.

Centro de Apoio Social de Souselas (CASS) Associação Particular de Solidariedade Social sem fins lucrativos constituída em 1992, tendo como objectivos o apoio à 1.ª e 2ª infância, apoio aos jovens, organização de tempos livres e apoio às pessoas idosas. Tem a sua sede na Rua 1º de Maio, N.º 19, 3020, Souselas. No entanto, a sua história começou dois anos antes daquela data, pela mão de 4 homens que ficarão para sempre na história e memória desta instituição: Manuel Queiroz de Oliveira, António Craveiro Gomes, Bernardino Lopes e José Fernando Pimenta Mendes. Este grupo estaria na base do núcleo duro também constituído pelos senhores: Vidal Cadete, José Baptista, Adriano dos Santos, Manuel Baptista, Dr. Francisco Veiga (na época vogal da ARS) e Padre Paulo Ribeiro. Sem menosprezar todos aqueles que iniciaram esta obra, seria injusto não destacar os nomes do Dr. João Manuel Góis Ramalho e do Eng.º Pedroso de Lima que incentivaram e aconselharam com a sua experiência em prosseguir a caminhada e pôr em marcha esta obra. Um acontecimento, de 1990, precipitaria a decisão em criar a instituição, como assinala um dos fundadores, Bernardino Lopes: «A necessidade para criar uma Instituição destas foi a seguinte: o grupo sócio-caritativo que existia na altura em Souselas (…) estava empenhado em resolver o problema de uma senhora que morava na Rua da Fonte, aqui em 513

Freguesia de Souselas – um povo com História

Souselas, senhora essa que andou na prostituição quase toda a vida, não tinha casa, não tinha dinheiro porque chegou a certa altura adoeceu e ninguém lhe ligava (…) vivia sozinha, era doente, estava entrevada na cama, a casa era velha e chovia lá (…) Um dia, estava eu a ajudar o Sr. Manuel Queiróz a fazer blocos e garrafeiras e tive essa conversa com ele, onde disse que era necessário resolver o problema das pessoas que necessitavam de ajuda. E foi aí que surgiu a ideia de criar uma instituição»(791). Uma das primeiras acções deste núcleo duro foi a realização, durante 1991, de reuniões abertas à comunidade por todos os lugares da freguesia, para apresentação do projecto. Em seguida, partiu-se para a elaboração dos estatutos e respectiva escritura, com a colaboração especial do Dr. João Ramalho e Dr. Francisco José Veiga. A escritura foi realizada a 24/06/1992, e os estatutos aprovados a 05/02/1993, constituindo a data oficial de fundação da instituição (publicada no D.R nº 30, IIIª Série, pg. 2399, de 5/02/1993) Feita a escritura, realizou-se a 30/6/1992 a primeira reunião da Comissão Instaladora, constituída pelos sócios fundadores do Centro de Apoio Social de Souselas: Dr. João Manuel Góis Ramalho, Dr. Francisco José Veiga, Júlio Marques, Júlio Delgado Marques, Manuel Queiroz de Oliveira, Raúl Cação da Cunha, Vidal Araújo Cadete, José Fernando Pimenta Mendes, Adriano Dias dos Santos, Padre Paulo Ribeiro, António Pedro Ramalho Gomes, Bernardino Lopes, Joaquim de Oliveira, Manuel Fernandes Baptista e José Lopes Baptista,(792). Nesta reunião constituíram-se os primeiros corpos gerentes: • Mesa da Assembleia-Geral: P.e Paulo Ribeiro (Presidente), José Lopes Baptista (Secretário), Joaquim de Oliveira (2º Secretário); • Comissão Fiscalizadora: Bernardino Lopes (Presidente), Raul Cação da Cunha e Manuel Fernandes Baptista (Secretários); • Comissão Executiva: Gil Pais de Figueiredo (Presidente), José Fernando Pimenta Mendes (Secretário), Adriano Dias dos Santos (Tesoureiro); • Vogais: Dr. Francisco José Veiga, Dr. João Ramalho, António Pedro Ramalho Gomes, Manuel Queiroz de Oliveira, Vidal Araújo Cadete; À primeira comissão executiva se deve a organização das estruturas, ficheiros e outras tarefas de molde a se dar cumprimento às exigências do Centro Regional de Segurança Social a fim de serem concedidos os primeiros subsídios, para as obras de adaptação e compra do terreno onde hoje se encontra a sede e todas as instalações sociais do CASS.

(791) (792)

O Elo, Número 0, Janeiro 2005, CASS, P. 4 ACASS – Livro de Actas da Comissão Instaladora do Centro de Apoio Social de Souselas, 1992, acta nº 1, Fl. 1

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VIII – Colectividades da Freguesia

O primeiro pensamento de todos aqueles que subscreveram a escritura notarial da constituição da sociedade denominada Centro da Apoio Social Souselas foi o de dar a conhecer a toda a população da freguesia os objectivos e necessidade de dar corpo a uma instituição de carácter social. Para o crescimento da instituição, o CASS contou com a colaboração do povo, através da adesão de novos associados, angariação de fundos através de peditórios, donativos particulares e públicos. Inicialmente era intenção da Comissão Instaladora integrar o Centro Social no seio da Casa do Povo, aproveitando as obras de construção do novo edifício, tendo-se ventilado a possibilidade de construir um piso apenas para funcionamento do Centro. Neste espaço funcionaria apenas a creche, em parte do actual edifício da Junta de Freguesia. No entanto, a sede foi sempre no local onde hoje está, na Rua 1º de Maio. Tratava-se de um terreno destinado à expansão da Cimpor e que fora comprado por um empreiteiro, Bernardo Couto. Nele existia uma Casa da Eira que o dito empreiteiro aproveitou para transformar num armazém. O terreno seria comprado pelo CASS(793) e, no lugar do antigo armazém, ergueram-se as primeiras infra-estruturas: o Centro de Convívio e o Centro de Dia, bem como a Sede (fotos 148 a 151). Em Novembro de 1992 foi atribuído um subsídio de 5.000 contos concedido pelo Ministro do Trabalho e Segurança Social para aquisição de um imóvel para as futuras instalações, encarregando-se o Dr. João Ramalho de proceder à elaboração do Contrato de Promessa da Venda com o proprietário Sr. Bernardo Marques Couto. Esta verba seria utilizada nas obras das instalações sociais. No dia 19 de Dezembro de 1992, realizou-se a primeira Assembleia Geral ordinária presidida pelo saudoso padre Paulo Ribeiro e procedeu-se a eleição dos corpos sociais do Centro de Apoio Social de Souselas convocado nos termos do nº 1 do artigo 28º dos estatutos. Aos associados presentes nessa assembleia foi apresentada uma lista única subscrita por todos os elementos da Comissão Instaladora e muitos associados que assim quiseram mostrar vontade em prosseguir com a obra que se tornou realidade. Da lista eleita sairiam os seguintes corpos gerentes: • Assembleia geral – Presidente Dr. João Manuel Góis Ramalho, 1º secretário José Fernando Pimenta Mendes, 2º secretário Padre Paulo Ribeiro • Direcção – Presidente Fernando Esteves Gaudêncio, Secretário Bernardino Lopes, Tesoureiro Adriano Dias dos Santos, Vice-presidente Manuel Queirós de Oliveira, Vogal Gil Celso Pais de Figueiredo Suplentes

Assunto tratado por uma Comissão assim constituída: Gil Figueiredo, Manuel Queiroz de Oliveira e Dr. Francisco Veiga

(793)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

– Joaquim de Oliveira, António Craveiro Gomes, Vidal Araújo Cadete, Delfim Várzeas de Sousa e Francisco Ventura. • Conselho Fiscal- Presidente Dr. Francisco Veiga, Vogais Rogério Marques Carneiro, Júlio Delgado Marques. Suplentes – Manuel Fernandes Batista, Júlio Marques e Manuel Veiga da Fonte. A posse dos corpos sociais verificou-se a 18 de Janeiro de 1993, entrando-se assim na normalidade estatutária dando-se um grande passo em frente na concretização dos objectivos dos seus fundadores. Foi registada como Associação de Solidariedade Social em 15/7/1993 (nº 32/93) e reconhecida como de utilidade pública (Diário da República, III Série, Nº 183 de 6 Agosto de 1993). De acordo com os seus estatutos, tem como objectivos criar equipamentos para o convívio de jovens, Jardim de Infância, Centro de Convívio para Idosos e Apoio Domiciliário. Tem vindo a adquirir património imobiliário para manter o crescimento: em 1999 adquiriu terreno para Centro de Dia e Lar de Idosos, em 2003 nova parcela para expansão de actividades recreativas e culturais bem como a construção de um novo Salão de Actividades. Em 2003 elaborou uma candidatura à Medida 5.6 do POEFDS para a construção e apetrechamento de um edifício para funcionamento das respostas socias de Creche com capacidade para 60 crianças e Centro de Noite com capacidade para 18 clientes. Projecto importante em termos sociais para a freguesia e área envolvente. Permitindo o desenvolvimento da região e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das pessoas inseridas na comunidade, seja de forma directa (pela de novos postos de trabalho, pela formação e qualificações profissionais, …), seja de forma indirecta (pela dinamização da economia local, incremento na procura de bens, aumento do rendimento…). A 31 de Julho de 2007 o Centro assinou o auto de consignação da construção do Centro de Noite e Creche, obra financiada pelo Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social POEFDS (FEDER e PIDAC). A comparticipação financeira privada da obra que foi assumida pelo CASS teve apoio da CIMPOR. Em 2006 o CASS elaborou uma candidatura ao Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais – PARES para a construção de um Lar de Idosos e um Centro de Dia, contemplando também as respostas sociais de Serviço de Apoio Domiciliário e Centro de Convívio a qual foi aprovada, tendo sido assinado o contrato de comparticipação financeira em Março de 2008. O Projecto “APRENDENDO TECLAR” foi desenvolvido no ano 2004 a 2007 no âmbito do Programa Clique Solidário, o qual tinha como objectivos 516

VIII – Colectividades da Freguesia

a aquisição de Competências Básicas em Tecnologias da Informação e da Comunicação através de: • Acções de Natureza Formativa e posterior atribuição do Diploma, (Frequência mínima de 12 horas); • Acções de Natureza não Formativa e posterior atribuição do Diploma, (Frequência de 1 hora); ou • Acesso livre à Internet. Este projecto destinava-se à comunidade em geral, nomeadamente: crianças a partir dos 6 anos de idade, jovens e adultos, sendo o seu acesso gratuito. Entre os anos lectivos 2005-2011, o CASS forneceu as refeições escolares aos alunos do 1.º ciclo do Ensino Básico, sendo diariamente servidas no Salão da Casa do Povo, regulado por protocolo de cooperação entre as duas instituições, o último dos quais tendo por base o Despacho n.º 18897/2009, do Ministério da Educação. A partir do ano lectivo 2011-2012, as refeições passaram a ser asseguradas pela CM Coimbra, através de concurso público, que transferiu essa responsabilidade para a empresa vencedora – Gertal, Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação S.A. Desde o ano lectivo 2008/2009 que o CASS através de Acordo de Colaboração entre a Câmara Municipal de Coimbra e o Agrupamento de Escolas da Pedrulha, assume a função de entidade executora do Projecto das Actividades de Enriquecimento Curricular - AEC nas Escolas do Ensino Básico do 1º. Ciclo de Souselas, Marmeleira, Sargento-Mor, Botão, Larçã, Paço e Torre de Vilela. As actividades desenvolvidas são: Ensino do Inglês, Ensino da Música, Actividade física e desportiva, e Expressões artísticas. O CASS compromete-se a preparar e desenvolver as AEC; a definir os horários e a sua organização em parceria com o Agrupamento; proceder à contratação dos técnicos para assegurar a execução do projecto. As actividades destinam-se a todos os alunos das escolas envolvidas. Possui as seguintes respostas sociais: • Creche (dos 3 meses aos 3 anos). Inicialmente funcionou no edifício polivalente onde se encontra instalada a Junta de Freguesia de Souselas, por protocolo rubricado a 31/12/1993, entre a Junta de Freguesia e o CASS. As obras de adaptação iniciaram-se em Setembro de 1994 e a creche abriu suas portas a 2/11/1994 (794), tendo-se adquirido para

ACASS – Livro de Actas da Direcção do Centro de Apoio Social de Souselas, 1993-2001, acta nº 10, 16/11/1994, Fl. 17

(794)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

transporte de crianças e outros serviços da instituição uma carrinha de 9 lugares. A construção da nova creche através do POEFDS, possibilitou a 24 de Junho de 2009 assinar novo protocolo de cooperação ampliando a capacidade para 60 crianças. • Jardim-de-infância (dos 3 aos 6 anos) iniciou actividade em Outubro de 1996 depois de obras de adaptação de um pré-fabricado onde ainda funcionam as 3 salas. Em 1/9/1997 foi assinado protocolo com a Segurança Social para 60 crianças. O infantário desenvolveu projectos como «Vamos cuidar de nós» (em 1998), vocacionado para as preocupações ambientais, «Vidas com Projecto». • A resposta Social do Centro de Actividades de Tempos Livres foi protocolada com a Segurança Social em 01 Outubro de 1999 para 30 clientes com alimentação. Em Dezembro de 2000 foi assinado a revisão do acordo para mais 28 clientes. Em Dezembro de 2007 foi assinado um novo protocolo de cooperação passando a denominar-se Centro de Actividades de Tempos Livres para Extensões de Horários e Interrupções Lectivas, tendo sido reduzida a capacidade para 40 clientes. Esta mudança ocorreu na sequência das novas orientações curriculares do Ministério da Educação, com a introdução das actividades de enriquecimento curricular nas escolas do 1º. Ciclo em horário não lectivo. • Centro de Convívio (Terceira Idade), a funcionar desde 15 Dezembro de 1993 dando resposta a 25 clientes, permitindo aos clientes usufruírem do convívio/animação e ocupação dos tempos livres. • O Serviço de Apoio Domiciliário, iniciou a sua actividade através do Protocolo assinado em Julho de 1995 para 20 clientes, sendo a última revisão em 19 de Novembro de 2001 contemplando um total de 48 clientes. Esta resposta, funciona de segunda-feira a domingo e visa essencialmente apoiar a população idosa no seu domicílio, na prestação dos serviços de refeições, higiene pessoal, tratamento de roupas e outros a acordar com as clientes/famílias. • Centro de Dia tem protocolo assinado desde o 1/10/1999 para 15 clientes/Idosos. Os clientes poderão usufruir dos serviços de refeições, convívio/ocupação, cuidados de higiene, tratamento de roupas e outros. Esta resposta social funciona nas instalações da Instituição de 2ª. a 6ª.feira em dias úteis. Para além dos serviços atrás referidos, promove ainda o desenvolvimento de serviços de refeições ao domicílio, nos feriados e fins-de-semana. • O CASS implementou, em estreita colaboração com o Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Coimbra, entre os anos de 2000 e 2002, o “Projecto Criança a Sério”, no âmbito do Programa Ser Criança. 518

VIII – Colectividades da Freguesia

Terminado o referido Projecto, e mantendo-se as necessidades de intervenção, propôs-se ao Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra, a continuação do mesmo através da realização de um Acordo Atípico – Centro Comunitário, que teve início em Outubro de 2003 e que se mantem até ao momento. Este Acordo tem como objectivos: • - Atendimento/Acompanhamento Psicossocial Descentralizado, a famílias beneficiárias de Rendimento Social de Inserção e/ou Acão Social das Freguesias de Souselas, Botão, Brasfemes, Torre de Vilela e São Paulo de Frades, com o intuito de diminuir a sua disfuncionalidade, promover a aquisição de competências ao nível pessoal, social e profissional, promover a igualdade de oportunidades e combater a multiplicidade dos modelos de pobreza. Para a concretização deste objectivo, em Novembro de 2010, foram celebrados Protocolos de Cooperação/Colaboração com as seguintes Instituições: Associação de Social Cultural e Recreativa de S. Paulo de Frades, Centro Social Cultural e Recreativo de Botão, Centro de Bem Estar Social de Brasfemes e Obra Social de Torre de Vilela; • - Avaliação e acompanhamento de crianças, jovens e famílias em situação de risco relativamente a: desenvolvimento de padrões de desestruturalização familiar, comportamentos de negligência, violência ou abuso infantil, abandono escolar e de trabalho infantil, comportamentos de pré-delinquência e/ ou marginais, e situações de exclusão social. A concretização destes objectivos será possível através de várias acções em diferentes áreas de intervenção, especificamente: • Sociofamiliar: realização de Atendimento/Acompanhamento Psicossocial Descentralizado, a famílias requerentes de Rendimento Social de Inserção e Acção Social, nas Freguesias de Souselas, Botão, Brasfemes, Torre de Vilela, e São Paulo de Frades, mediante visitas domiciliárias, análise socioeconómica, contratualização, elaboração de propostas de apoio e articulação com outros serviços; • Sócio – Educativa: divulgação de informação relativa a problemáticas identificadas nas diferentes áreas de abrangência, através de discussão de diversas temáticas destinadas a crianças/jovens/idosos/famílias, prevenindo comportamentos de risco; • Psicologia: avaliação, reencaminhamento e articulação com outros serviços; • Avaliação: avaliação das respostas existentes relativamente às necessidades da população alvo e das metodologias e estratégicas de intervenção. • Centro de Noite, com capacidade para 18 clientes, mas com protocolo só para 8 clientes. Inicia funções 15/7/2010, no novo edifício de Creche e Centro de Noite. 519

Freguesia de Souselas – um povo com História

No 2º.Semestre de 2010 foi solicitado ao Centro Distrital de Coimbra transformação do Centro de Noite para Lar de Idosos, o qual mereceu a sua aprovação. A transformação do Centro de Noite em Lar deveu-se ao fato das necessidades dos nossos clientes apontar para um acolhimento de natureza mais permanente, por impossibilidade de permanecerem nas suas residências habituais. Com capacidades para 18 clientes, dividida em 7 quartos duplos e 4 quartos simples. Em Junho de 2012 o CASS solicitou ao GAT/NAI (Segurança Social) proposta de alteração ao projecto inicial da candidatura ao PARES, tendo em vista o de licenciamento/Remodelação da Lar de Idosos/Centro de Dia e Serviço de Apoio Domiciliário, para as capacidades de 19 residentes, 20 cliente em Centro de Dia e 50 clientes no Serviço de Apoio Domiciliário. Este projecto visa integrar/ligar o novo edifício ao equipamento já existente Centro de Noite (aprovada a sua transformação para Estrutura Residencial) e Creche (foto 152). As alterações no edifício existente, são essencialmente no piso -1 e no piso 0 – cozinha, que visam melhorar a sua organização funcional, de modo a que esta responda com plenitude ao número de serviços que a Instituição se propõe realizar e para assegurar toda a actividade da Instituição a nível das refeições. Com a ampliação deste, é criado um espaço para fisioterapia e um corredor de interligação entre o edifício existente e o novo edifício, articulando assim as áreas funcionais. Na zona da creche é proposto desenvolver-se uma “nova” sala de actividades que ficará sob a cobertura da sala da fisioterapia. O edifico novo contemplará as respostas sociais de Lar de Idosos, Centro de Dia, Centro de Convívio e alguns serviços do Apoio Domiciliário, nomeadamente a lavandaria. Estes 2 edifícios totalizam 38 clientes afectos ao Lar de Idosos (18 já existentes + 20 no novo edifício), 20 clientes afectos ao Centro de Dia, 50 clientes para SAD, 25 para Centro de Convívio e 60 crianças em Creche. As alterações nas áreas de serviço beneficiarão o Jardim de Infância e o Centro de Actividades de Tempos Livres. Tem protocolos com as seguintes instituições: Junta de Freguesia de Souselas, Câmara Municipal de Coimbra, Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra, Instituto Educativo de Souselas, Centro Social de Marmeleira, Centro de Saúde de Eiras, Direcção Regional de Educação do Centro, Instituto Superior Miguel Torga, Escola Superior de Educação, APPACDM, Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Emprego de Coimbra. Presta apoio a 160 crianças e jovens, 108 idosos e 80 famílias e possui um quadro de pessoal alargado e diversificado com 54 funcionários: 6 educadoras, 11 ajudantes de acção educativa, 10 ajudantes de acção directa, e 13 auxiliar de 520

VIII – Colectividades da Freguesia

serviços gerais; 3 cozinheiras; 1 directora técnica, 2 técnicas de serviço social, 1 Psicóloga 1 escriturária; 3 animadores sócio-culturais; 2 ajudantes de ocupação e 1 recepcionista. O seu parque automóvel compreende 8 viaturas. Tem actualmente 502 associados. São sócios honorários: José Fernando Pimenta Mendes, Gil Pais de Figueiredo, António Cerveira França Martins, Fernando Gaudêncio, Dr. João Ramalho e Dr. Massano Cardoso. Deverá ser realçado o trabalho abnegado, sério e gratuito de todos os elementos dos corpos sociais da Instituição, com especial destaque para os sócios que constituíram as sucessivas Direcções (órgão executivo) pois que, sem este espírito de solidariedade, sacrifício pessoal e dos seus familiares e responsabilidades pessoais, não teria sido possível elevar a Instituição ao estado actual de desenvolvimento e funcionalidade que já é evidente e que se prepara para aumentar com os projectos em curso. LOGOTIPO DA INSTITUIÇÃO «Temos um menino e um idoso. O que está a preto é o caminho da vida. À medida que a idade vai passando, o caminho vai ficando mais estreito, desaparecendo quando morremos. Daí as nuvens significando o céu. O amarelo significa o sol e quer dizer que quando ele nasce é para todos, para os meninos e para os idosos» Manuel Queiroz In O Elo, Número 0, Janeiro 2005, CASS, P. 5 Nota: o símbolo foi criado graciosamente por António Santiago, funcionário da Litografia Coimbra

Centro Cultural de Sargento-Mór A ideia da criação de um centro cultural no lugar de Sargento-Mór, germinou por volta de 1976/77 no seio da comissão de moradores do lugar, da qual faziam parte entre outros: Fausto Fonseca, Dr.ª Armanda, Vitor Rainho, Vitor Rodrigues e Valdemar Rodrigues. Na ocasião, decidiram fundir numa só colectividade o clube de futebol Sargento Mór Futebol Clube (fundado a 28/8/1981) e a comissão encarregue da construção de um centro cultural. Escolheram como local para a futura construção da sede social um baldio que servia de coradouro, localizado na parte do lugar enquadrado administrativamente na Freguesia de Barcouço, Concelho da Mealhada e Distrito de 521

Freguesia de Souselas – um povo com História

Aveiro. O desejo motivou alguma resistência, dado que existia um grupo de moradores que pretendia construir naquele local o fontenário. O Centro, fundado a 7 de Março de 1985, tem como divisa «CULTURA, RECREIO E OCUPAÇÂO DE TEMPOS LIVRES». Os estatutos foram aprovados em Diário da República de 19/04/1985 (Nº 91, IIIª Série). Para a sua criação, concorreram diversos subsídios, das juntas de freguesia de Souselas e Barcouço, bem como da CMC e Mealhada, que foram aplicados na construção e melhoramento do edifício-sede social composto por dois pisos (rés-do-chão e 1º andar). O edifício-sede (foto 153) foi projectado, em 1978, por José Augusto Varandas Martins da Silva e a construção fez-se na medida das possibilidades: as obras iniciaram-se em 1987, com a construção do rés do chão incluindo uma cave composta por cozinha, forno a lenha, arrumos e instalações sanitárias. Em 1992, arrancou a construção do 1º piso, composto por um salão polivalente, secretaria, palco e vestiários. Em 1994, concluiu-se o 2º piso que ficou destinado a bar, sala de jogos, biblioteca, secretaria, instalações sanitárias e gabinete médico. Em 1995, e apesar de algum alheamento já visível da população, electrificou-se o 1º andar, remodelando-se o salão, bar e anexos(795). Na reunião ordinária da Câmara Municipal da Mealhada, de 8/04/1994, foi aprovado por unanimidade, o pedido de declaração de utilidade pública do CCSM: «A Câmara Municipal é de parecer que o Centro Cultural de SargentoMor (…) ao longo da sua existência tem desenvolvido a promoção cultural, recreativa e a ocupação dos tempos livres dos seus associados e a valorização do lugar de Sargento-Mor. Deste modo, esta Camara Municipal entende que reúne as condições para ser classificada como de utilidade pública administrativa»(796). Em 1997 as obras do 1º andar entraram na fase terminal, com mudança do bar para o 1º andar, rasgando-se uma varanda na fachada. Neste ano elaborou-se novo projecto de edifício, por Jorge Paiva Martins. Ao longo da sua história desenvolveu diversas actividades, tais como: matinés, bailes, torneio de sueca, torneios de xadres e damas, jogos tradicionais, motocross, torneio de matraquilhos, tiro aos pratos, ténis de mesa, futebol não federado e noites de fado(797). Em 1993 estava em embrião a Fanfarra do Centro Cultural (Fanfarra de Majoretes), que funcionou durante algum tempo, mas hoje inactiva.

A.C.C.S.M. – Relatório de Actividades, 1995 A.C.C.S.M. – Cópia da acta da reunião ordinária da CM Mealhada, de 8/04/1994 In Pasta «Documentos anteriores a 2007» (797) A.C.C.S.M. – Livro da Receita e Despesa, 1989-1993; Pasta «Documentos anteriores a 2007» (795) (796)

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VIII – Colectividades da Freguesia

O seu salão de festas tem servido para eventos diversos, tais como: festas de Natal, casamentos, baptizados, e convívios diversos. Por protocolo de cooperação, datado de 13/09/2007, com o Jardim de Infância Dr.ª Odete Isabel parte das suas instalações foram cedidas para ATL. Além de instalações próprias, o CCSJM possui campo de futebol arrendado. Actualmente o CCSJ desenvolve as seguintes actividades: Ginástica, Kempo e Futebol, constituindo neste caso uma secção autónoma do centro cultural, com regulamento próprio datado de 25/03/2008, denominada Sargento-Mor Futebol Clube-Veteranos. No Kempo um dos seus praticantes é campeão mundial; Gonçalo Sousa. Os projectos para o futuro do CCSJM passam pela aquisição de um terreno contíguo à sede para construção de parque infantil e de um polidesportivo, decorrendo na actualidade a negociação do dito imóvel.

Centro Cultural de S. Martinho do Pinheiro Colectividade fundada em 1994 pelos senhores Manuel de Sousa, Alberto Marques, Marco Marques e Osvaldo Simões. De acordo com os seus estatutos (art.º 2.º) tem por objecto o desenvolvimento da actividade no âmbito da Cultura, Recreio e Desporto, para aperfeiçoamento cultural e físico, bem como prosseguir outras actividades de reconhecido interesse comunitário. As suas instalações (foto 154) compreendem uma estrutura antiga e um novo e amplo salão. A estrutura antiga corresponde à 1ª fase das obras, compreendendo uma cozinha (1996), casa do forno (1998), dispensa, casa de banho e arrumos. O novo salão enquadrou-se na candidatura para financiamento ao abrigo do Regulamento Municipal de Apoio ao Associativismo. Está em fase de acabamentos e contou com o apoio da CMC e JF de Souselas, com peditórios entre a população e muitas horas de trabalho e dedicação do povo. Desenvolve, de acordo com os estatutos, actividades culturais, tais como: jogos tradicionais, festas, convívios e futebol.

Centro Cultural de Zouparria do Monte Fundado por escritura lavrada no cartório notarial de Penacova a 11 de Agosto de 1992, sendo publicados os estatutos e a escritura em 523

Freguesia de Souselas – um povo com História

Diário da República desse ano. Os fins do centro foram expressos nos seus estatutos, (Artº 2º): «A associação tem por objecto o desenvolvimento de actividades no âmbito da cultura, recreio e desporto, para aperfeiçoamento cultural e fisíco, bem como prosseguir outras actividades de reconhecido interesse comunitário». Foram membros fundadores e membros da comissão instaladora: Armando Dias Lopes Viana, António dos Santos Rodrigues, Joaquim de Oliveira, Elias Marques Carneiro e Álvaro Lopes(798). Lavrou-se a 1ª acta do centro a 12 de Setembro de 1993 e, a 26/09/1993 reuniu pela primeira vez a Assembleia-Geral, tendo os primeiros corpos gerentes sido eleitos pelos 68 associados, para o biénio 1994/1995, tomando posse a 22/01/1994: • Assembleia Geral: Armando Dias Lopes Viana (Presidente), Alcides Sousa Rodrigues (1º Secretário), Fernando Miguel Oliveira da Silva (2º Secretário) • Direcção: Sérgio da Costa Madeira (Presidente), Mário dos Santos Rodrigues (Vice-Presidente), Jorge Manuel Neto Ferreira (Secretário), António Fernandes (Tesoureiro), Francisco dos Reis Simões (VicePresidente) • Conselho Fiscal: Jorge Manuel Morais Pratas (Presidente), José Duarte Simões (Secretário) e Luis Filipe Cação Rodrigues (Relator). Uma das prioridades da associação foi a construção da sua sede social, tendo o município aprovado o projecto respectivo a 31 de Dezembro de 1992, isentando-se a direcção de todas as taxas de licenciamento da obra, uma vez que foi «…reconhecido especial interesse publico ao empreendimento em causa»(799). Em 1994, arrancou a construção em terreno cedido pela Autarquia, onde então se encontrava o lavadouro ao serviço da população, que teve de ser mudado (foto 155). Os primeiros tempos de vida da colectividade foram de grande entusiasmo, com crescimento assinalável no número de associados, numa tendência que se manteve até princípios do século: 174 em 1996, 208 em 1997, 198 em 1998. 212 (2000), 250 (2002). Contudo, nos tempos recentes o centro cairia para o desinteresse associativo, atingido também por alguma instabilidade diretiva: se nas eleições de 2003 votaram 115 associados, em 2004 foram 19 e, em 2006, 5! A 2 de Outubro de 2000 celebrou-se o Contrato Programa de Desenvolvimento Desportivo, entre a Câmara Municipal de Coimbra e o centro cultural que tinha «…por objectivo a concessão de uma comparticipação financeira ao

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ACCZM – Livro de Actas da Assembleia-Geral, 1993-2009, Fls. 0v.-1v. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 353, P. 286

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VIII – Colectividades da Freguesia

referido centro para conclusão das obras relativas à construção de um Pavilhão Gimnodesportivo, sito na Rua do Lavadouro, no lugar de Zouparria do Monte, Freguesia de Souselas, nomeadamente, no que se refere ao acabamento dos balneários, rebocos interiores e exteriores e trabalhos de pintura»(800). Finalizadas as obras, o Centro Cultural Zouparria do Monte seria inaugurado a 14 de Abril de 2002. A 13 de Abril de 2008, a JF doou o salão polivalente ao Centro Cultural, uma vez que o mesmo estava em seu nome, apesar de construído com o sacrifício das pessoas do lugar (fotos 156 e 157). Recentemente, a direcção composta por Vidal Cadete, tentou revitalizar a vida do Centro Cultural da Zouparria do Monte, adquirindo um terreno para a construção de um parque infantil e parque de estacionamento, sendo aprovada por unanimidade em reunião extraordinária de associados do dia 4/7/2009 (801).

Centro de Recreio Popular Marmeleirense Antes da criação deste clube já existia, na Marmeleira, outro criado nos anos 40 e do qual pouco se sabe; não tinha sede, andou de casa em casa, até se fixar na Casa da Palmeira (pertença de emigrados no Brasil). Entre as actividades que desenvolveu destacava-se o teatro. Colocada a questão do encerramento deste clube, alguns marmeleirenses, onde se destacou José Leopoldino dos Santos, procurou, junto da FNAT evitar o encerramento da colectividade, dando lugar ao aparecimento do CRPM. O CRPM, fundado a 19 de Abril de 1956, esteve filiado na FNAT onde conquistou diversos títulos no futebol (foto 158). Também se filiou no INATEL sob o nº 104, e tinha sede social na Marmeleira. Os seus estatutos foram aprovados a 23 de Maio de 1973, e elaborados pelo seu presidente, Opílio Santos. De acordo com os mesmos(802) procurou desenvolver as seguintes iniciativas: realização de conferências, palestras, cursos de formação, criação de uma biblioteca e museu, divulgação da legislação social, visitas de estudo, organização de festas tradicionais e manifestações folclóricas, desenvolvimento de agrupamentos artísticos, teatro (Grupo Cénico do Centro de Recreio Popular Marmeleirense), cinema e fomento da prática desportiva. Compreendia três categorias de sócios: efectivos, auxiliares e honorários. Tinha como órgãos gerentes: Assembleia-Geral, Direcção e Conselho Fiscal. De acordo com documentação oficial, o CRPM cumpriu todas as

(800) (801) (802)

Id. Nº 400, Pp. 122-123 ACCZM – Livro de Actas da Assembleia-Geral, 1993-2009, Fls. 32v.-34. A.C.S.M. – Estatutos do Centro de Recreio Popular Marmeleirense

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Freguesia de Souselas – um povo com História

obrigações perante as instituições que o tutelavam entre 1965-1975. Tal como acontecia no CRP de Souselas, também nesta colectividade se efectuaram diversos eventos sociais. No final de Setembro de 1962, os jornais locais noticiavam a festa de encerramento do Curso de Corte, Costura e Bordados “Oliva”, que se havia realizado na Marmeleira do Botão a 22 daquele mês, culminando 3 meses de formação (foto 158A): «…a simpática festa não deixou de ser caracterizada pelo seu entusiasmo, alegrias e bairrismo que é apanágio do bom povo da Marmeleira, que sabe receber como poucos os seus convidados. Cerca das 17 horas foi inaugurada a exposição de trabalhos executados pelas alunas que sob a orientação da professora do curso, menina Maria da Graça Vitorino Gomes, primaram em apresentar trabalhos que nos surpreenderam pela sua perfeição, variedade e qualidade»(803). A Sessão Solene foi presidida por um membro da JF de Souselas, ladeado pela D. Leónia Colaço, professora primária na Marmeleira, a que se juntaram o Sr. Alberto Xavier Gama Pereira, delegado da Oliva em Coimbra, José Leopoldino dos Santos e António de Almeida (Presidente da AG do Centro de Recreio Popular Marmeleirense. Usaram da palavra Alberto Xavier da Gama que fez «…considerações sobre as vantagens destes cursos nos meios rurais» e José Leopoldino dos Santos que enfatizou o «…número das alunas, que assim a partir de agora se encontram mais aptas a fazerem face à vida». A festa de encerramento finalizou com a entrega dos diplomas e um lanche regional na casa do Sr. Manuel da Costa Gomes, seguido de baile na sede do CRP. As alterações ocorridas após 1974, com a criação das Casas do Povo e fusões dos CRP, foi retirando vitalidade ao CRPM, levando ao seu declínio. A sua sede seria transferida para a Delegação da Casa do Povo da Marmeleira, com a criação desta na segunda metade da década de 70 do século passado. Tanto o CRP, como a Delegação da Casa do Povo foram, efectivamente, impulsionadoras da construção do Centro Social, como se pode constatar na correspondência trocada entre as instituições, tendo-se criado a comissão Pró-Sede do Centro Social Marmeleirense. As futuras instalações surgiam desenhadas no papel oficial acompanhadas do símbolo respectivo.

«Festa de Encerramento do Curso de Corte, Costura e Bordados Oliva em Marmeleira do Botão» In Diário de Coimbra, 28 Setembro 1962, Ano XXXIII, Nº 10.921

(803)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Contou o C.R.P. M. com o apoio da JF, que a 28 de Março de 1984 envia ofício ao Presidente da C.M.C. pedindo que se reavive o processo para a construção da Sede Social referindo-se, em particular, a campanha eleitoral de 1982 onde se focou a estrada que liga Marmeleira a SM Pinheiro e ao terreno da colectividade. Segundo tal comunicação, a sede era um forte «querer do Povo Marmeleirense» solicitando-se o reavivar do processo a breve trecho pois «…aproxima-se um período do ano, propício para aproveitamento aos fins de semana de mão de obra local, gratuita. Adquiriu já a Colectividade algum material, dispendendo cerca de 200.000$00, tem o apoio de diversas indústrias da zona, cuja colaboração é viável, mediante a apresentação do ambicionado projecto»(804). Porém, em Janeiro de 1985, o desânimo apodera-se do Centro que em ofício enviado à JF se lamenta da «…situação em que se encontra não só o processo de elaboração do progecto da sua “Sede/Social”, mas principalmente do estado em que se encontram os terrenos limítrofes dos destinados à construção»(805). Em oficio Nº 30/88, endereçado à Junta de Freguesia no mês de Julho, o centro dava conta, em documentação anexa, dos esforços desenvolvidos até então: «Decorridos que foram dois anos após o lançamento da primeira pedra na construção do n/ Centro Social, embora a um ritmo pouco regular e lento face a questão de precária situação financeira, apraz-nos informar V. Ex.ªs que o edificio se encontra nesta data em fase da colocação de cobertura. (…) Após concluída a cobertura de tão importante edifício, podemos afirmar que o complexo “SOCIAL” projectado para o rés-do-chão, rapidamente será uma realidade através da angariação de fundos provenientes de actividades Sócio-Culturais e Recreativas já em preparação e a serem apresentadas no salão do 1º piso». Acrescentavam o pedido de ajuda e de uma reunião (proximidade junta-centro) e uma demonstração contabilistica até 1987, com o volume de tijolos, sacos de cimento e mão-de-obra. Acorrerá em auxílio da obra o subsídio da C.M.C. de Junho de 1989 com 300 contos para salas, ginásio e sede(806). Ao longo da sua história o Centro foi importante dinamizador da vida social da freguesia, organizando excursões e passeios a vários locais do país.

(804) (805) (806)

A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). Id. A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 332, P. 238

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Freguesia de Souselas – um povo com História

História Desportiva da Marmeleira: do Sporting Clube Marmeleirense ao Atlético Clube Marmeleirense, passando pelo Centro de Recreio Popular Marmeleirense (807) Até há alguns anos atrás a principal colectividade desportiva da Marmeleira era o Atlético Clube Marmeleirense. Fundado a 1 de Maio de 1976 por Mário Canário, Pardal Baptista e José Figueiredo. Grupo de membros fundadores que reuniu em Assembleia Geral e aprovou os Estatutos, registados em escritura pública na Secretaria Notarial de Coimbra a 30 de Julho e publicação na III Série do Diário da República de 7 de Setembro do mesmo ano de 1976. Teve como principal modalidade, o futebol de 11 (foto 161), cujas origens remontam, pelo menos, à década de 1940, quando os jovens da época jogavam à bola em campos improvisados (em cabeços com algum espaço para a prática desportiva), onde se divertiam aos fins-de-semana. Porém, e a dada altura, alguns jovens Marmeleirenses, sentiram a necessidade de se organizarem de forma mais estruturada, e constituíram uma equipa designada por Sporting Clube Marmeleirense, cujos equipamentos eram réplicas do Sporting Clube de Portugal. Esta equipa teve pouco tempo de vida, terminando a sua actividade em Abril do ano 1956. Os Atletas eram ao mesmo tempo directores e com a vontade que caracteriza uma juventude que luta por ideais decidiram construir um campo onde pudessem praticar futebol. Cheios de coragem, munidos de enxadas, pás e picaretas rumaram ao alto da Ladeira e deram início aos trabalhos do que foi o primeiro Campo da Ladeira. E assim, com balizas improvisadas, feitas de pinho tosco, com os balneários na famosa Presa do Carril, nasceu o gosto pelo futebol organizado na Marmeleira. Aos domingos a população deslocava-se, como que em romaria, para assistir ao espectáculo de “os jovens jogarem à bola”, entretendo-se com os tradicionais tremoços e o vinho da terra que era e ainda é tradição. Em 19 de Abril do ano de 1956 fundou-se, com o apoio da então FNAT, o Centro de Recreio Popular Marmeleirense (CRPM). Uma colectividade criada a pensar no Desporto, Cultura e Recreio, mas vocacionada em primeiro, para a prática do futebol e o atletismo. Na segunda metade da década de 60, o CRPM adquire um terreno, no Cabeço dos Moinhos que serve de primeiro campo de futebol. Passados poucos anos, os responsáveis do Centro de Recreio Popular Marmeleirense, assumiram a responsabilidade de alterar o local do campo de futebol pelas

Texto elaborado com base no documento História Desportiva da Marmeleira, da autoria de José Figueiredo.

(807)

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VIII – Colectividades da Freguesia

dificuldades de acesso e exiguidade do espaço e, com o apoio financeiro da FNAT e a dinâmica do povo da terra, foi construído o actual campo de futebol, ainda hoje conhecido por Campo do Goivo (foto 163). O CRPM dedicar-se-ia à prática do Futebol (sénior e veteranos) e Atletismo, conseguindo alguns títulos regionais. Os valores desportivos e culturais da Marmeleira foram preservados e continuados pelo Atlético Clube Marmeleirense, que após o 25 de Abril/74, com a desorganização da estrutura da então FNAT/INATEL, deu origem à referida fundação do A.C. Marmeleirense. O Atlético Clube Marmeleirense (ACM), participou, ao nível de equipas Séniores, Juniores e Juvenis (foto 162) em diversos Campeonatos Distritais promovidos pela Associação de Futebol de Coimbra, tanto na 3ª, como na 2ª. Divisão. Teve momento alto da sua história com o título de campeão de série da 3ª. Divisão Distrital, na época de 1979/1980, ascendendo nesse ano ao escalão secundário dos distritais da AFC. O Atlético Clube Marmeleirense teve entre 1976 e 1987, uma actividade relevante e regular. Porém, em 1987 ocorreu uma crise directiva e financeira que levou os seus responsáveis a eleger uma Comissão Administrativa que tem sido renovada durante os últimos anos. Hoje, o Atlético está inactivo, estando a Comissão Administrativa a trabalhar no sentido de promover a sua reactivação e regresso à condição e objectivo desejados e para que foi criado, respeitando e dinamizando os ideais dos Homens que em 1 de Maio de 1976 fundaram o ATLÉTICO CLUBE MARMELEIRENSE.

Centro Social de Marmeleira (CSM) Fundado a 20 de Dezembro de 1982, data em que se realizou uma sessão extraordinária da assembleia-geral de associados do Centro de Recreio Popular Marmeleirense, onde germinou a ideia da construção de um Centro Social. De acordo com essa acta(808) a sessão teve uma ordem de trabalhos com três pontos: «1- Análise de uma proposta de um grupo de sócios do CRPM em se iniciar a organizar uma colectividade capaz de se construir um edifício em Marmeleira.

(808)

Cópia da acta na posse do ACSM

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Freguesia de Souselas – um povo com História

2 - Obter do CRPM apoio para que seja possível tal objectivo do Grupo de Sócios. 3 - Aprovação ou não da pretensão do referido grupo». Nesta reunião, em que marcaram presença 74 associados(809), usou da palavra como porta-voz do grupo de sócios, o Sr. António Fernandes de Almeida, que explicou o objectivo do movimento «…se baseia essencialmente em começar a erguer um edifício que servirá de sede á colectividade já em formação e que está denominada Centro Social de Marmeleira, e para o qual pretende que o CRPM dê o seu apoio em termos de terreno para a construção». A assembleia pronunciou-se «totalmente favorável ao objectivo», consolidando os intentos de uma população que se organizou tendo em vista a construção de uma sede social própria, onde pudesse desenvolver actividades culturais e recreativas sem ter de pagar renda. Por entre entusiasmo geral, o presidente da Assembleia Geral propôs a doação para tal fim dos terrenos que a colectividade CRPM possuía «… nomeadamente 510 metros quadrados no lugar de Pinheiro e 4890 metros quadrados no lugar de Vale de Botão», o que foi aprovado por todos os associados presentes. Na mesma ocasião conferiram-se poderes legais para tratarem da doação, aos directores José Prior Lucas e António Pardal Baptista. Na altura, o conjunto de pessoas organizado em comissão designava-se por Grupo Coordenador da Construção do Centro Social e germinou no seio do Centro de Recreio Popular Marmeleirense. Em 23 de Novembro de 1985, teve início a construção de raiz da sua sede a qual ficou concluída em 1990 (fotos 164 e 165). Por escritura de 23 de Abril desse ano, lavrada no 4º Cartório Notarial de Coimbra, constituiu-se uma associação com a designação «CSM – Centro Social da Marmeleira»(810). A Delegação da Casa do Povo, que integraria o futuro Centro Social a partir de 1989, teve como missão nos últimos anos da sua existência a captação de fundos para auxílio às obras daquela construção, designadamente através da Secção Sócio-Cultural. No dia 22/10/1993, realizou-se a pedido do CSM, uma reunião do CRPM. Nesta ocasião, e depois de analisado o problema pelos membros da colectividade recreativa(811), deram-se «plenos poderes ao director António Pardal Baptista para que seja efectuada a doação do terreno sito no lugar do Pinheiro»(812).

Faziam parte da Assembleia Geral do CRPM – João Manuel Pereira Gonçalves, António Pardal Baptista e António Fernandes de Almeida. (810) Diário de Coimbra, nº 20111, 21/11/1990, 2º caderno, Fl. III (811) Membros do CRPM presentes na reunião: José Prior Lucas, Manuel Baptista Borges, Manuel dos Santos Craveiro, Alcides Pardal Baptista e António Pardal Baptista. (812) Cópia da acta na posse do ACSM (809)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Quanto ao terreno no Vale de Botão manteve-se na forma de doação verbal até 9/11/2005, data em que se promoveu escritura de justificação da posse pelo Centro Social, que invocou a aquisição por usucapião(813). Por solicitação à Câmara Municipal de Coimbra (Gabinete de Apoio Tecnico), elaborou-se projecto pelo Departamento, que foi alterado por amigos do centro uma vez que os tecnicos camarários rejeitaram as alterações. Tem como divisa «TRABALHO * CULTURA * RECREIO * DESPORTO» Em 1995, o terreno onde estava implantado o edificio-sede era propriedade do Centro de Recreio Popular Marmeleirense, que doou todo o seu património ao CSM em acta da assembleia geral de associados. Os primeiros estatutos foram aprovados a 23/12/1990, sendo remodelados e aprovados em AG do centro de 12/04/1992, e publicados em DR nº 239, III Série, de 16/10/1992, ocorrendo o registo definitivo como IPSS em DR da República, III Série Nº 88, de 15/04/1993, os quais serviram de base ao registo da constituição da associação de utilidade pública. De acordo com aquela declaração, o CSM tinha como objectivos prioritários (artº 2º): «…promover acções de solidariedade social para os seus associados, nomeadamente ao desenvolver actividades de apoio à infância e juventude, população activa, aos idosos e deficiente, bem como secundariamente desenvolver a promoção cultural, desportiva e recreativa, o convívio social e a cooperação com organismos oficiais e particulares…». Assim, tem procurado atingir 4 objectivos principais: no aspecto social, adquirir equipamento para convívio de jovens e construir Centro de Dia para Idosos; no aspecto cultural, criando escola de música e teatro; desportivamente, procurando a prática de várias modalidades pelos associados; e, do ponto de vista recreativo, realizar cursos didácticos, danças e cantares regionais e jogos tradicionais. Constituiu-se como associação de utilidade pública, com estatutos publicados em Diário da República, III Série, nº 219, de 21 de Setembro de 1995. Tem sede na Rua Rainha Santa, nºs 3 a 5, 3020-792 Souselas e conta com 740 associados. A 12 de Dezembro de 2004 aprovou o regulamento interno, definindo no artº 63º o símbolo da instituição, segundo o qual «caracteriza as raízes Sócio/ Económicas da Aldeia (…) as quais se baseavam na agricultura e pastoreio: 1 – O Astro-Rei, o Sol, em cor dourada, anunciando o romper do dia, tendo no centro um Galo de cor preta, que servia de despertador, anunciando aos trabalhadores do campo o romper da aurora 2 – O céu em cor preta ou cinzenta onde constam em cor amarela as estrelas que compõem a Ursa Maior e a Ursa Menor e Estrela da Manhã (planeta Vènus)

(813)

ACSM – Escritura de Justificação, Notário Sales Leitão.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

3 – Um moinho de vento ladeado com uvas e ramos de oliveira com azeitonas 4 – Um livro aberto com sinais de escrita, símbolo da vontade de aprender outras ciências»(814). Pretendeu criar um recinto desportivo, com campo de futebol e pista para atletismo, no baldio do Alto da Ladeira, tendo pedido à Junta e Assembleia de Freguesia todo o apoio para o efeito em Abril de 1993. Consideravam o Campo do Goivo sem hipótese de rentabilização e designaram o novo projecto como «Estudo e Projecto da Rentabilização de um terreno baldio, situado na Saibeira do Alto da Ladeira». A Junta de Freguesia solicitou ao vereador do Pelouro do Desporto da CM, Engº Jorge Lemos, o desbloqueamento do baldio com apoio do departamento jurídico municipal, em ofício enviado pela JF a 15 de Abril de 1993(815). A construção do edifício sede fez-se aproveitando os poucos recursos existentes e utilizando a força de trabalho que cada associado podia dispor, tendo-se concluído as obras em 1995. No entanto, a legalização dos terrenos hoje propriedade do CSM – terrenos da sede e do Cabeço dos Moinhos - arrastaram-se no tempo, só se efectivando muito depois da conclusão das obras. De facto, a 31 de Janeiro de 1998, em assembleia geral extraordinária, os associados aprovaram por unanimidade a aceitação da doação dos prédios do CRP ao CM, designadamente: o prédio de Vale de Botão e aquele onde estava implantada a sede(816). Contudo, várias dificuldades foram atrasando a concretização da escritura. O projecto do centro seria realizado pelos serviços da C.M.C. A 6 de Fevereiro de 1995, o Presidente da C.M.C. despacha favoravelmente a solicitação do centro para proceder a acabamentos com isenção de taxas; «Considerando o importante alcance social desta infraestrutura colectiva, útil à comunidade que ao longo do tempo tem conseguido reunir os fundos necessários à sua edificação e manutenção; entende que é de deferir o requerido»(817). Neste ano adquiriu-se ainda uma parcela de terreno, a Sul do CSM, para ampliação e onde se previa a instalação de: ATL, Centro de Dia para Idosos e outras actividades. Foi inscrito no INATEL a 01/09/2005 como Centro de Cultura e Desporto, sob o nº 104, antigo número de inscrição do CRP, legitimando o CSM como sucessor do CRPM. As suas instalações foram adaptadas em 2001 – construção de anexos e renovação de sanitários - para funcionamento das valências de ATL e da Pré-Escola, tendo esta funcionado ali entre 2001 e 2003, mediante protocolo com a DREC.

(814) (815) (816) (817)

ACSM – Regulamento Interno A.J.F.S. - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). A.C.S.M. – Livro de Actas da Assembleia Geral do CSM, Dezembro 1994 – Dezembro 2011, Fls. 16v.-17 A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 366, P. 78

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VIII – Colectividades da Freguesia

Actualmente, o CSM tem como grande objectivo a construção de um Centro de Dia para Idosos, a implantar em terreno que possui no Cabeço dos Moinhos, local onde já se construiu um recinto desportivo no âmbito de protocolo de cooperação entre o CSM, a JF e a CMC. Desde 1996 que pratica a modalidade desportiva de futebol sénior e vem procurando dinamizar eventos sociais para os associados (foto 166). Teve pelo final dos anos 90 um rancho folclórico. Em 2010 reorganizou o grupo cénico. Tem procurado adquirir o moinho no cabeço para recuperação. A sua sede localiza-se na Rua Rainha Santa nº 1-9., 3020-792 SouselasMarmeleira. Possui bar e carrinha de 9 lugares.

Grupo Desportivo e Cultural – Marchas Populares de Souselas Tudo começou em 2003, numa conversa de amigos que se juntaram para festejar o Carnaval. Esses mesmos amigos lembraram-se de desfilar pelas ruas de Souselas como uma Marcha Popular e assim aconteceu, todos concordaram e uma vez que não existia nada assim na Vila foi então que nasceram as Marchas. Nesse mesmo ano saíram à rua sem tema, com sete músicos, sendo um deles o autor das músicas que alegraram os marchantes e as pessoas que assistiam ao desfile. Os trajes não eram todos da mesma cor, uma vez que tinha sido tudo tratado repentinamente e não havia condições monetárias para o fazer, tendo sido cada marchante responsável pelo seu próprio traje. Em vez de arcos, deram uso aos balões dos Santos Populares para realizar o desfile. Os únicos a levarem um arco foram as crianças. Como ninguém queria perder o gosto de festejar os Santos Populares, o mesmo grupo de amigos decidiu escolher como tema da marcha no ano seguinte o “Euro”. As cores escolhidas para esse ano foram o verde e o vermelho, sendo as mesmas cores escolhidas para a decoração dos arcos, efetuados com a maior simplicidade. Nos dois primeiros anos de existência, este grupo percorreu um pouco por cada terra perto da vila, para mostrar e dar a conhecer o que acabara de nascer. Foi também durante os primeiros anos de existência, e não menos importante de realçar, que também crianças dançavam, cantavam e desfilavam com a sua marcha. O tema era o mesmo, embora a coreografia fosse diferente. Com o passar do tempo e como era intenção alargar o horizonte, em 2005 foram aceites para participar na noite de S. João na Vila de Febres (Freguesia de Cantanhede), sendo a primeira saída para lá dos arredores da Vila. Foram recebidos com muito carinho, deixando alegria e a amizade como retribuição de cada gesto daquela receção. O tema que abordaram prendeu-se com “As Vindimas – Adega Cooperativa de Souselas”. Os trajes eram de cor preta e 533

Freguesia de Souselas – um povo com História

vermelha, a marcha continha oito arcos das mesmas cores e, além disso, não foram esquecidos nos mesmos os Santos Populares e os cachos de uvas, fruto das vindimas. No decorrer do mês o número quer de marchantes, quer de saídas foi aumentando gradualmente, e prova disso foi o calendário preenchido em diversas localidades nesse mesmo ano. E porque não fazer uma homenagem àquele grande amor vivido e proibido entre D. Pedro e Inês de Castro? Pois é, mais um ano e um grande tema tratado com o maior respeito pela história da cidade. Foi este o tema escolhido no ano seguinte, em que se mantiveram os oito arcos diferentes dos anos anteriores, mais inovados e adequados à temática. A cor dos trajes era, quer para adultos, quer para crianças, azul e dourado. No ano seguinte abordaram “A fonte”, alusiva ao chafariz que se encontra na rua Central de Souselas. As cantarinhas, usadas pelas mulheres, eram metáfora do que acontecia outrora, quando íam à fonte buscar a água e, quem sabe, arranjar o futuro marido ou um simples namorico. Para dar luz ao tema aplicaram no centro da marcha uma fonte, que relembrou aos mais antigos aquilo que se viveu em tempos. Também durante este ano a marcha foi constituída por oito arcos em tons de branco e laranja, sendo utilizadas as mesmas tonalidades para o vestuário dos marchantes. Voltando a falar da bela cidade de Coimbra e tendo em conta que é uma cidade de “sonho” e de “tradição” procuraram, no ano de 2008, tratar as “Guitarras de Coimbra”. Foi, sem dúvida, o auge das marchas quer a nível de vestuário, arcos e marchantes (embora a marcha infantil tenha terminado e parte das crianças tenham passado para a marcha dos adultos). Os vestidos das mulheres eram compridos, em tons de preto e branco e com uma guitarra preta pregada na frente do mesmo; os homens também estavam com os mesmos tons, salientado um lenço preto ao pescoço e uma guitarra. Os arcos eram extraordinários, como nunca as marchas tinham levado para a rua. Voltando para a Vila de Souselas, o tema escolhido em 2010 foi “A Biblioteca”. Os arcos eram em tons de rosa e azul, levando no centro livros e um manjerico. Os mesmos tons foram escolhidos para o vestuário, acrescentado nas saias das mulheres o xadrez e, como acessório, um livro. Cada marchante levava na sua camisa uma letra do alfabeto e um lápis, como acessório. E porque não falar das festividades do mês de Junho? No ano 2011 foi altura de realçar a famosa “Sardinha assada e os Santos Populares”. As cores predominantes foram o cinzento e o amarelo, sendo estas mesmas cores as escolhidas para decorar os arcos. Como a Vila é para o grupo uma flor, então a temática escolhida para tratar em 2012 foi “Souselas em Flor” porque, por muito “cinzenta” que se encontre, 534

VIII – Colectividades da Freguesia

para os Souselenses, será sempre uma Vila em Flor uma vez que nela se mantêm gerações e tradições que são, indiscutivelmente e com orgulho, inerentes (foto 167). Os tons predominantes foram o branco e o lilás em que cada marchante levava como acessório um cesto de flores coloridas. A marcha continuava a ser constituída pelo mesmo número de arcos, sendo este ano de cores, flores e acessórios diferentes, mas mantendo a cor branca como base. Ao longo da sua existência as marchas já andaram um pouco por todo o lado: desde Pombal, Amor (Leiria), Espite (Ourém), S. Silvestre, Pé de Cão, Fala, Sto António dos Olivais, Sta Clara, Ribeira de Frades, Brasfemes, Eiras, Marmeleira, Taveiro, Carapinheira do Campo, S. João do Campo, Febres (Cantanhede), Travanca do Mondego (Penacova), etc. Não podemos deixar de frisar a relevância que tem o dia do festival, em que existe um convívio entre marchas e um breve desfile pelas ruas da Vila para mostrar o brilho de cada marcha a todos os Souselenses. É por tudo isto e muito mais que se orgulham por sair à rua fazendo brilhar o nome de Souselas, a terra, o “berço” que caminha no coração de cada um em cada desfile e em cada localidade que percorrem.

Grupo de Cordas Allegro Em 1995, o mestre Manuel Abreu abandonou a Tuna Souselense onde vinha ensinando música. Por solicitação de alguns pais de crianças de S. Martinho do Pinheiro e de Souselas, cujos filhos estavam já vinculados na aprendizagem de música, o mestre colocou em funcionamento, no ano de 1996, uma Escola de Música, da qual nasceu o conhecido grupo de cordas “Allegro” (que significa andamento musical tocado com alegria). O objectivo principal do grupo (fotos 168 e 169) passava por divulgar a música da terra e sensibilizar os jovens para a aprendizagem de instrumentos de corda como o Bandolim (a referência principal do grupo), Bandola, Cavaquinho e Viola. Este grupo procurou manter as características de uma Tuna, mantendo um instrumental só de cordas e optando numa 1ª fase pela Música Tradicional da Região Centro do País, recorrendo posteriormente também à música ligeira, variada e clássica, nacional e internacional. O grupo é constituído por 11 músicos e o maestro. Tem actuado graciosamente para várias entidades de cultura e recreio em centenas de concertos. Gravou 4 cd’s e fez várias apresentações na televisão portuguesa. 535

Freguesia de Souselas – um povo com História

Grupo Etnográfico de Souselas No seio da secção sócio-cultural e recreativa da Casa do Povo de Souselas, germinou o Grupo Etnográfico de Souselas que tem ali a sua sede e usa como divisa o poema: Oh lugar de Souselas Da Rua Direita à Botica Não sei que amor é o teu Que tanto me mortifica Adeus lugar de Souselas Ao cimo ao fundo não Ao cimo está uma Rosa Ao fundo um Mangericão Fundado a 28 de Janeiro de 1985, por João Oliveira Torres Pardal e Ana Paula Moreira Silva, contando com a coordenação técnica de Isabel Santos. É filiado no INATEL, sócio efectivo da Federação do Folclore Português desde 27 de Agosto de 1988, classificado pelo Gabinete Nacional de Etnografia. A Câmara Municipal de Coimbra, através da Comissão de Análise do Folclore, classificou-o também como Grupo de Interesse Folclórico. Este grupo resultou da transformação de outro existente «…com a finalidade de fazer reviver e preservar os costumes, danças, cantares e recolher todo o património cultural e historiográfico da milenária terra de Souselas»(818). Desde a sua criação, que vem desenvolvendo intensos trabalhos de pesquisa, no campo etno-folclórico da região onde está inserido – a Beira Litoral – procurando como objectivos: recolher todos os elementos possíveis de natureza etnográfica; organizar actividades culturais, como festivais nacionais (I Festival Nacional de Folclore de Souselas, realizado em 1991) e internacionais de folclore, exposições, colóquios, reposições e publicações, intervir na defesa do património cultural da freguesia, divulgar a nível nacional e internacional a identidade cultural da freguesia e região, participar em actividades culturais organizadas por outras entidades, promover o ensino da música. Tem assegurado a reposição de tradições antigas como Cantares de Janeiras, Tradição dos Feijões, Distribuição do Bolo Folar, Jogos Tradicionais e Fogueiras. Do seu aturado trabalho resultou a preservação e divulgação a nível nacional

(818)

A.G.E.S. – Historial do Grupo Etnográfico de Souselas

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VIII – Colectividades da Freguesia

e internacional do Património Cultural Popular Português, em particular, o da Região de Coimbra. Traja, canta e dança, segundo as recolhas efectuadas em Souselas, representando actividades e vida das suas gentes desde o Séc. XIX a meados do Séc. XX (fotos 170 e 171). Neste âmbito, apresenta os seguintes trajes: Domingueiros (lavradores ricos e abastados), Ver a Deus, Noivos, Romeiros, Bairradina, Feirantes, Vendedeiras, Pastores, Moleiro, e Trajes de Trabalho; vindimas, apanha da azeitona, ceifeiros, lavadeira, mulher da lenha, cavador, eiras e zézito. Nas danças predominam as modas de roda, viras, verde-gaios, que se dançavam nos largos da Igreja e Senhor do Terreiro, nas eiras, soalheiros, fogueiras e romarias. Realça-se, em especial, um verde-gaio com características únicas, dançado em colunas(819). Os instrumentos utilizados abrangem um leque diversificado: violino, bandolim, ferrinhos, reco-reco, bombo, pandeireta, acordeons, viola, cavaquinho. Do património do grupo, próprio ou de que é fiel despositário, constam diversas peças originais, recolhidas em Souselas, junto de famílias antigas e com tradições: casaquinha de senhora (que fez parte de traje de noiva, 1840); saias de armur (1880); xailes de barras (1880); xaile de fitas (1920); lenços de seda (1910); lenço branco bordado à mão (1888); xaile de vendedeira (1910); fato preto de homem (1910); camisas brancas de homem (1880); sacos de amêndoas das noivas (1880), chapéus (1920), entre outras peças. A sua actividade é supervisionada, tecnicamente, pela AFERM (Associação de Folclore e Etnografia da Região do Mondego), onde está filiado. Recebeu ao longo da sua história, diversas distinções: Diploma de Honra pela Região de Turismo do Algarve (Setembro de 1992, por ocasião do 16º Festival Nacional de Folclore); a Medalha de Mérito Cultural atribuída pela Câmara Municipal de Coimbra a 3 de Setembro de 2005. Participou em festivais internacionais de folclore em França e Espanha.

Grupo musical A Barca dos Castiços A riqueza do património musico-poético do cancioneiro tradicional português tem vindo a inspirar várias gerações de músicos e compositores, actuantes em diferentes áreas, desde a música erudita, ao jazz, passando pelo poprock. Perspectivando a manutenção e a preservação dessa matriz tradicional, surgem os grupos etnográficos e folclóricos, baseando o seu trabalho de reposição

(819)

Id.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

em trabalhos de recolhas. Por outro lado, surgem grupos que, utilizando as mesmas fontes de informação, ultrapassam a função de reposição, e que, sem essa limitação, concentram os seus esforços criativos e musicais na recriação, em que o património tradicional serve de base a um sem número de experiências, de misturas, mais ou menos puristas. É nesta última corrente que A Barca dos Castiços se insere. A necessidade de alargar os seus horizontes criativos impeliu a tripulação para a criação deste grupo em 2003, nos arredores de Coimbra. Em 2005 houve uma estabilização da formação e de reportório, conseguindo finalmente criar uma imagem sonora que correspondesse aos objectivos dos elementos do grupo. Neste ano também, o grupo ligou-se à Casa do Povo de Souselas, passando a integrar, desde Dezembro de 2007, a secção cultural da dita associação, ligada à divulgação da cultura tradicional potuguesa. Em 2007 ocorre um ponto de viragem, com a participação na final europeia do Concurso Eurofolk’J, em Málaga, Espanha. Em 2008 participa, como grupo convidado, na edição italiana do mesmo concurso. Algumas gravações foram incluídas em colectâneas de música tradicional, uma em Espanha e duas em Itália. O reportório d’A Barca dos Castiços inclui arranjos sobre temas tradicionais portugueses, abrangendo quase todo o território continental. No entanto, não descura a riqueza local e regional do cancioneiro tradicional, apresentando nesse âmbito, temas como Rodízio, dança afandangada dançada em Souselas, o chapéu novo, moda de fogueiras, dançada também em Souselas, e a nível mais regional, menino deus e menino do ó, cantos do ciclo natalicio, balão, meu rico balão e contradança, danças de influência palaciana, com trejeitos de importação, mas que acabaram por ficar incorporadas nas tradições de algumas localidades em redor. O reportório está em permanente actualização, tentando trazer sempre antigas preciosidades da tradição musical portuguesa a ambientes sonoros renovados e a públicos novos. O seu primeiro trabalho discográfico, “Mancha em Terras de Cor” é um registo em que as fusões da música Tradicional Portuguesa com outras sonoridades mais universais tentam reflectir a pluralidade cromática de um pequeno, mas culturalmente diverso país como é Portugal. O trabalho (re)criativo inclui elementos tradicionais, mesclados com elementos da música erudita, do jazz, e também do pop-rock, correntes que fazem parte dos universos pessoais de cada um dos elementos (fotos 172 e 173). Conseguiu-se uma matriz de trabalho própria, criando uma ambiência característica e uma nova forma de experimentar a tradição. A tradição marca o porto de saída, a criatividade é a rota a percorrer… 538

VIII – Colectividades da Freguesia

PERCURSO 2003 • Vila Verde, Figueira da Foz, 5º encontro de Musica Tradicional • Brasfemes, Coimbra, serão cultural do CRAC 2005 • Vilela, Coimbra • Lorvão, Penacova, feira de gastronomia • Chelo, Penacova, aniversário do Grupo Folclorico “as Paliteiras de Chelo” • Penacova, encerramento do “Festitradições dos Povos do Mundo” • Eiras, Coimbra, comemoração do dia da Freguesia • Lousã, noites de Verão do concelho • Pampilhosa, Coimbra, Feira de Artesanato do GEDEPA • Souselas, Coimbra 2006 • Marmeleira, Coimbra • Coimbra, 10º aniversário da Quantunna, Tuna Mista da FCTUC • Praia de Mira, Mira, Contrabaixo Bar 2007 • FNAC Coimbra • Café com Arte, Coimbra • Festas de Eiras, Coimbra • Feira de Artesanato, Mealhada • Festas de Trouxemil, Coimbra • Festas de Meãs do Campo, Montemor-o-Velho • Contrabaixo Bar, Praia de Mira, Mira • Cercal Folk, Cercal, Soure • Festas de Vilela, Coimbra • 97º Aniversário da Tuna Souselense, Souselas, Coimbra • Concurso Eurofolk, Archidona, Málaga, Espanha (3º lugar) • Reunião Anual IMAR, Instituto do Mar, Coimbra 2008 • Mini tourné em Itália, Eurofolk. • Largo da Barrinha, Praia de Mira, Feira Gastronómica, 21h. • Jardim da Sereia, Coimbra, Concurso Eurofolk, 21h. • Souselas Ethnica, I encontro de músicas de tradição, Casa do Povo de Souselas. • Palco Super Interessante, Queima das Fitas de Coimbra 539

Freguesia de Souselas – um povo com História

2009 • Criptopórtico do Museu Machado de Castro, Coimbra, Concerto de pré-apresentação do novo CD, Mancha em Terras de Cor. • Centro Cultural de Chaves, circuito Outonalidades. • Casa da Cultura de Famalicão da Serra, circuito Outonalidades • Feira da Serra de S. Braz de Alportel. • XVIII Feira de Artesanato de Loulé. • Feira Gastronómica, Brasfemes, Coimbra. • FESTAMBO 2009, Praça Mouzinho de Albuquerque, Ourém. 2010 • Programa das Festas, RTP1, Penela • FNAC Leiria: Apresentação de “Mancha em Terras de Cor” • FNAC Fórum Coimbra: Apresentação de “Mancha em Terras de Cor” • Teatro da Cerca de São Bernardo, Coimbra: Lançamento Oficial de “Mancha em Terras de Cor” • Feira de Artesanato da Foz do Douro, Porto • Verão Total, RTP1, Mata do Bussaco • Portugal no Coração, RTP1 • Feira da Cereja, Resende 2011 • Festival Intercéltico de Sendim, Miranda do Douro • Arredas Folk Fest, Tregosa, Barcelos • Sala Arte à Parte, Coimbra Constituição Patrícia Ferreira – voz, bandolim e flauta doce Daniel Crespo – violino, guitarra, cavaquinho, “tin wistle”, gaita-de-foles, voz David Lopes – piano, cavaquinho/guitarrinho de Coimbra, guitarra Diana Guardado – flauta transversal, guitarra, voz Fernando Santos – baixo e voz João Crespo – guitarra, bateria/percussão e voz Sérgio Forte – concertina e percussão Web: www.abarcadoscasticos.com www.myspace.com/abarcadoscasticos www.facebook.com/abarcadoscasticos e-mail: [email protected] Agenciamento: 7 Sons Produções http://www.7sons.com.pt/ Telefone: Arménio Santa (7 Sons): [+351] 912 261 902 540

VIII – Colectividades da Freguesia

Tuna Souselense As tunas surgiram em Portugal a partir de finais do séc. XIX, numa lógica de associativismo, por norma associadas a clubes, associações recreativas, constituindo um espaço privilegiado de sociabilidade, suprindo carências culturais das comunidades locais, criando público e dinamizando espectáculos. A Tuna Souselense formou-se a 16 de Outubro de 1910 (fotos 174 e 176), iniciativa de um grupo de habitantes locais que pretendia criar uma instituição que fomentasse diversas actividades de carácter cultural como teatro, música e futebol. Apareceu num momento particular da história nacional: «A Tuna Souselense surgiu 11 dias depois da implantação da República em Portugal. Num tempo de generalizada euforia, uma vaga de mudança política e social terá mobilizado a população para a acção, um pouco por todo o país. Na sua formação, contaria com um conjunto de cerca de 20 homens, com idades compreendidas entre os 15 e os 60 anos. Na constituição instrumental, destacam-se instrumentos de corda como o bandolim, a viola, a viola baixo, o violino ou o violoncelo, a par com a flauta transversal e o clarinete. A existência de laços familiares entre os elementos foi uma constante. Nos primeiros anos de actividade, o grupo foi composto apenas por homens, todavia, por detrás da instituição, podemos descortinar, na sombra, a presença de mulheres»(820). Contudo, dos tempos fundacionais muito se perdeu: «Nada sobrou de comprovativos documentais: nem estatutos, nem actas, nem arquivo»(821). A família Eliseu liga-se a estes primeiros anos da Tuna: Manuel José Pessoa Eliseu (1907-1978), compõe o hino e, António das Neves Eliseu (1865-1931) desenha e pinta a sua bandeira(822). Manuel Eliseu e Joaquim Pleno foram dois maestros do grupo que o marcaram profundamente. Um trabalho que se integra numa intensa actividade musical, enquanto instrumentistas, compositores e maestros, que desenvolveram durante o séc. XX na região centro do país. Grande parte dos elementos da primeira formação seria analfabeta, embora tivesse conhecimentos musicais. Desempenhava funções profissionais relacionadas com a ferroviária, a agricultura e construção civil. Nestes primeiros tempos terá sido fundamental o apoio material de figuras gratas da terra como Alberto Álvaro Dias Pereira ou Custódio de Azevedo Nazareth.

Rui Filipe Duarte Marques – «Republicanismo e a actividade musical amadora em Portugal, na segunda década do século XX – O caso da Tuna Souselense», Colóquio “Música, Discurso e Poder”, Universidade do Minho, 2012. (821) Noémia Maria Barreto M.L. Machado Lopes; José Machado Lopes – Por entre lembranças e para alimento da memória: Nos 100 Anos da Tuna Souselense – 1910/2010, Souselas, 2010, P. 41 (822) Id. Pp. 60 e 67 (820)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Em 1939, a instituição terá sido refundada e legalizada. A 17 de Março constituiu-se uma Sociedade Recreativa e Cultural denominada Tuna Souselense que tinha como principais objectivos a cultura da música, do teatro e dos desportos. O projecto de estatutos foi elaborado por Joaquim Carlos Ferreira, que fazia parte (como Secretário) duma comissão constituída também por Alfredo Augusto dos Santos (Presidente) e Joaquim da Costa (Tesoureiro), que aprovou os ditos estatutos e os submeteu á aprovação das autoridades. Assim, a 22 de Março de 1939, seriam os seus estatutos aprovados e registados no Governo Civil de Coimbra(823). A Tuna manteve-se em actividade até 1944, altura em que divergências entre os seus componentes levaram a uma paragem de 48 anos. De facto, ocorreria uma cisão entre os seus elementos, dando origem a dois conjuntos musicais: Danúbio Azul (o dos “ricos”) e Modestos (o dos “pobres”). No seu seio formou-se, em 1938, o Rancho Infantil Souselense, que se exibiu pela primeira vez em Outubro daquele ano no Largo do Senhor do Terreiro e perante uma assistência entre 2.500 a 3.000 pessoas. Um grupo ensaiado e dirigido por Manuel Eliseu e resultado do esforço de uma «comissão organizadora do Rancho» de que faziam parte José Rodrigues, Manuel dos Santos e Abel Gaudêncio(824). Nunca formalmente extinta, a Tuna Souselense voltaria à actividade nos anos 90 do século findo. A 3/11/1990 reuniriam em Assembleia Geral, na antiga escola primária de Souselas, 26 antigos sócios que batidos por saudade dos velhos tempos, deliberam na ocasião retomar o projecto. A direcção saída desse acto seria presidida por Rolando Lago Rodrigues, coadjuvado por Isabel Maria Carvalho dos Santos (Secretária) e António Serrano Ventura dos Santos (Tesoureiro). Em Junho de 1991, e com novos estatutos em vigor, o Inatel acolhe a Tuna como membro de direito, passando a designar-se como «Centro de Cultura e Desporto Tuna Souselense»(825). A 10 de Maio de 1992 voltou às actuações em público, no âmbito do programa comemorativo do seu 82º aniversário. Actualmente, a Tuna Souselense ministra aulas de aprendizagem de instrumentos e teoria musical direccionadas para os cordofones - base predominante das tunas e que está na origem da existência de um grupo de cavaquinhos. Mas ali também se aprende a tocar outros instrumentos como flautas transversais, de bisel, clarinetes ou concertinas.

Noémia Maria Barreto M.L. Machado Lopes; José Machado Lopes – Por entre lembranças e para alimento da memória: Nos 100 Anos da Tuna Souselense – 1910/2010, Souselas, 2010, Pp 41 e 85 (824) Diário de Coimbra, 30/10/1938 (825) Noémia Maria Barreto M.L. Machado Lopes; José Machado Lopes – Por entre lembranças e para alimento da memória: Nos 100 Anos da Tuna Souselense – 1910/2010, Souselas, 2010, P. 42 (823)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Está instalada na antiga escola primária onde também funcionou a Junta de Freguesia durante algum tempo, ao abrigo de um protocolo de cedência de instalações aprovado pela AF em 27 de Novembro de 1993. Um edifício que remonta a 1959 e cujas duas salas estão ocupadas pela Tuna; o grupo de cavaquinhos (constituído por 15 elementos e dirigidos pelo professor João Vila) e a Tuna propriamente dita (composta por 24 elementos e dirigida pela maestrina Patrícia Ferreira) (fotos 175, 177 e 178). Tal como aconteceu com o Grupo Etnográfico, também recebeu a Medalha de Mérito Cultural atribuída pela Câmara Municipal de Coimbra. Foi a 27 de Outubro de 2008 que o município concedeu a distinção por unanimidade, sob proposta do vereador Dr. Mário Nunes. A medalha seria entregue pelo presidente do município, Dr. Carlos Encarnação, em sessão solene, realizada na Casa do Povo de Souselas, a 12/07/2009. A sua concessão, foi justificada pelo historial apresentado pela entidade no contexto do movimento associativo local e dinâmica cultural que vinha imprimindo no concelho, no país e no estrangeiro. Durante o ano de 2010 decorreu a Festa Comemorativa do centenário, tendo editado um livro retratando a sua história. Filiado no Inatel nº 2211, tem sede na Rua 1º de Maio, 61, 3020 Souselas (na antiga Escola Primária).

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 135 - Adega Cooperativa de Souselas

Foto 136 - Stand da Adega Cooperativa na Feira das Tasquinhas, 2010

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 137 - Escuteiros Agrupamento 1360, Promessas, Buçaco (2011)

Foto 138 - Escuteiros Agrupamento 1360, Montemor (2012)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 139 - Escuteiros Agrupamento 1360, Curso de Guias 2012

Foto 140 - Escola de Karate Shotokan de Souselas (2011)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 141 - Os primórdios do futebol em Souselas, 1.ª metade do Séc. XX

Foto 142 - Equipa campeã distrital da 1.ª divisão da AFC (1974/75)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 143 - Equipa finalista da Taça AFC (1982/83)

Foto 144 - Equipa júnior, vice-campeã distrital da AFC (1981/82)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 145 - Equipa campeã distrital da 2.ª divisão da AFC (1992/93)

Foto 146 - Panorâmica do relvado sintético de Souselas

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 147 - Escolas de formação da ADS

Foto 148 - Foto aérea dos primórdios do Centro de Apoio Social de Souselas (CASS)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 149 - Os timoneiros do CASS (anos 90)

Foto 150 - Acesso ao CASS Foto 151 - Parque infantil do CASS

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 152 - Instalações do Centro de Noite e Creche do CASS

Foto 153 - Centro Cultural de Sargento-Mor (interior)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 154 - O Centro Cultural de São Martinho do Pinheiro (em construção)

Foto 155 - Os primórdios do Pavilhão do Centro Cultural da Zouparria do Monte

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 156 - O pavilhão/sede do Centro Cultural da Zouparria do Monte

Foto 157 - O pavilhão/sede do Centro Cultural da Zouparria do Monte (interior)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 158 - Campeões CRPM (1973-74)

Foto 158A - Curso de Corte, Costura e Bordados Oliva (Setembro de 1962)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 159 - Equipa de futebol do Centro de Recreio Popular de Souselas, Campeonato Cooperativo da FNAT (1972-73)

Foto 160 - Alvará do Centro de Recreio Popular de Souselas (30 de Março de 1951)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 161 - Equipa Sénior do Atlético Clube Marmeleirense (1978/79)

Foto 162 - Equipa de Juvenis do Atlético Clube Marmeleirense, 3.º lugar do campeonato distrital da AFC (1983/84)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 163 - Campo de futebol do Goivo, Marmeleira

Foto 164 - Arranque das obras do Centro Social da Marmeleira

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 165 - Centro Social da Marmeleira

Foto 166 - Dia do Centro Social da Marmeleira (2012)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 167 - Marchas Populares de Souselas (Junho de 2013)

Foto 168 - Grupo de Cordas Allegro (1996)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 169 - Grupo de Cordas Allegro (2010)

Foto 170 - Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas (Março de 1989)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 171 - Grupo Etnográfico de Souselas (2005)

Foto 172 - A Barca dos Castiços (2011)

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 173 - A Barca dos Castiços em concerto

Foto 174 - A Tuna nos seus princípios (1910)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 175 - A Tuna na actualidade

Foto 176 - A bandeira antiga da Tuna

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VIII – Colectividades da Freguesia

Foto 177 - A bandeira actual da Tuna

Foto 178 - A Tuna Souselense no Dia da Freguesia (2011)

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IX PERSONALIDADES

N

António da Cunha e Sousa asceu em Souselas a 6 de Dezembro de 1786, filho de Manuel da Cunha e Rosa Joaquina(826). Matriculou-se em Leis na Universidade de Coimbra em Outubro de 1804 e, em Cânones, em Outubro de 1806, área onde se doutorou em 26 de Julho de 1812. Na Universidade exerceu diversas cadeiras, a primeira das quais foi a de Opositor (1813-1821) e, a última, na qualidade de lente de Sintética de Direito Pátrio entre 1830 e 1834. Ao nível universitário, desempenhou outros cargos como Almotacé da Feira dos Estudantes (1804) e vereador do Corpo da Universidade (1830). Em 1831 apresentou uma petição às justiças do concelho de Souselas, a propósito do pagamento da jugada, alegando ser isento e previligiado: «Diz o Doutor Antonio da Cunha e Souza Lente Cathedratico da Segunda Cadeira Sustetuta de Direito Patrio na Universid.e; que pela Carta de Pavilegios exzentou e hé Proveligado de pagar jugada porque as justiças do conselho de Souzellas de onde o Sup.te hé nattural lha tem lancado contra direito = Pede a vosa Senhoria se digne mandar que as ditas justiças e otras quoaisquer do termo lha não tornem a lancar pena de a pagarem a sua custa (…) registandose esta no livro competente do conc.º »(827). Despachará o concelho a seu favor, em 13 de Janeiro de 1831: «A justiça do conselho fasa termo de que o suplicante não deve pagar Jugada visto o seu bom proviligio e rezisteçe esta nos livros respetivos para constar assim entimem os luvados para que não tornem a creditar semilhante jugada e com pena de a pagarem a sua custa»(828).

Manuel Augusto Rodrigues (Dir. de) – Memoria Professorum Vniuersitatis Conimbrigensis, Vol. II 1772-1937, Arquivo da Universidade de Coimbra, Coimbra, 1992, P. 102 (827) A.H.M.C. - Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, Fl. 72 (828) Id. Fl. 72v. (826)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Jeronymo José Baptista Lopes Parente Nasceu a 27 de Março de 1779, no lugar e freguesia do Barril, filho de José Batista Lopes e de Josefa Maria Sant’Anna, também daí naturais. Veio para Coimbra frequentar estudos, fazendo exame de Latim e Filosofia Racional e Moral, matriculando-se a 6 de Fevereiro de 1796, no 1º ano da Faculdade de Leis. Depois do 3º ano passou para a Faculdade de Cânones onde se formou a 30 de Junho de 1801. Escreveu de forma assídua no jornal O Conimbricense, dando conta dos interesses da Freguesia de Souselas e não só. Em Agosto de 1869, Janeiro de 1872 e Fevereiro de 1873, o dito jornal dedicou-lhe pequenas biografias das quais extraímos os principais dados: • A seguir às invasões francesas exerceu, em Coimbra, o cargo de Juiz dos Tombos. • Decidido a seguir a carreira da magistratura foi Juiz de Fora de Vila Franca do Campo, na ilha de S. Miguel de 1823 a 1828, tendo servido «…muito a contento daquelles povos». • Regressou em 1828 ao Continente, para assumir o cargo de Auditor da Província da Beira Baixa. • Em 1833, foi despachado Juiz de Fora para a Vila da Figueira da Foz, onde revelou toda a sua inteireza e firmeza de carácter. Adepto da causa miguelista foi no entanto e na prática, mais liberal do que muitos que se diziam como tal. Um moderado e sensato nas atitudes, talvez homem de consensos, mais de paz do que de guerra: «Apesar de ser affecto ao governo de D. Miguel, nunca consentiu que se perseguissem os constitucionaes, muitos dos quaes lhe deveram decidida protecção. Não duvidava até affrontar as iras dos exaltados miguelistas, que só respiravam vingança, um dos quaes foi na Figueira o famoso Francisco Moreira Braga, e outro da mesma villa, o commandante do batalhão de caçadores 8, Francisco de Magalhães Peixoto»(829). Nas páginas do “seu” jornal relatou pelo próprio punho, o envolvimento na luta entre miguelistas e constitucionais: «Largas paginas de papel me seriam precisas para historiar os factos que assim o comprovam. Tive de lutar com o general N. de Abreu, com dois governadores, fazendo que Judice respondesse a Conselho de Guerra; e por aviso régio fiz a quarteis fixos o batalhão de Arganil, e o metti em processo criminal. (…) O numero dos culpados politicos na Figueira quando alli entrei, se me não engano, excedia a 120, incluindo algumas mulheres. Á minha chegada ferviam as denuncias, mais feitas aos empregos ou officios, do que aos empregados (…)

(829)

«Singularidade» In O Conimbricense, 31 Agosto 1869, P. 3

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IX – Personalidades

Não prendi culpado nenhum, os que achei presos, ou o governador me entregou, foram sempre bem tratados, e alguns transferidos de uma para outra cadeia; só eram afiançados de sua palavra. Prendi e castiguei muitos pseudo-miguelistas por desordens, e contra elles procedi, e não contra os constitucionaes, porque me não deram para isso a mais leve causa. (…) Declaro que tive sempre em meu auxilio o ministro da Justiça Luiz de Paulla, e intendente geral da policia Belfort, aos quaes contava todos os meus passos. (…) Cumpri o meu dever; não tenho remorsos de consciencia de não fazer justiça aos constitucionaes, nem de trahir o governo do sr. D. Miguel, oppondo-me ao uso do cacete, aos sarcasmos, aos insultos das familias dos implicados, ao saque, e ao roubo, em nome da santa religião, o que a soldadesca e os seus superiores de mim exigiam. Foi esta a razão porque preferi antes a minha demissão do logar, que pedi, do que convir em seu mal»(830). De facto e logo após a sua morte, o desempenho das funções na Figueira foi um facto muito assinalado: «O modo como o sr. Lopes Parente alli se desempenhou dos deveres do seu novo cargo podem ainda hoje attestal-o os habitantes daquella villa (…) procedeu com tal independencia e administrou justiça com tal imparcialidade, que fazia completo contraste com quasi todas as outras auctoridades daquella epocha»(831). Os miguelistas da Figueira designavam-se por “caceteiros” e, insatisfeitos com a actuação de Lopes Parente, intrigaram junto do governo de D. Miguel pelo seu afastamento: «Pela sua parte, porem, o sr. Lopes Parente expunha com franqueza a verdade dos factos, em officios que successivamente dirigia ao ministro das justiças, Luiz de Paula Furtado de Castro e Rio Mendonça, e ao intendente geral da policia, Filippe de Sousa Belfort» ((832)). Ainda em 1833 e desgostoso «da marcha que via seguir na administração publica», pediu a demissão «…que finalmente obteve quando em Agosto daquelle ano veiu a Coimbra apresentar-se a D. Miguel»(833). Abandonada a magistratura recolheu à sua casa de Souselas, onde passou a ocupar-se da administração dos seus bens, tendo desempenhado o cargo de Secretário da Junta de Paróquia de Souselas em 1836 e de Regedor da Paróquia em 1838. • Em 1842 voltou ao activo. Aderindo ao partido progressista, foi eleito em Souselas:

(830) (831) (832) (833)

Jerónimo Lopes Parente - «Um Bom Velho» In O Conimbricense, 11 Setembro 1869, P. 2 «Jeronymo José Baptista Lopes Parente» In O Conimbricense, 4 Fevereiro 1873, P. 1 Id. P. 2 Id.

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Freguesia de Souselas – um povo com História

«…membro da coalisão opposicionista; sendo um dos que poderam vencer a pressão eleitoral do então governador civil de Coimbra, o sr. visconde, hoje Conde da Graciosa». Dirigiu-se em seguida para o Porto, e ahi, com os seus companheiros da opposição, teve a coragem de no collegio eleitoral, reunido no dia 21 de Junho, votar com louvavel independecia, não obstante o terror que então dominava na cidade, que se achava cheia de caceteiros cabralistas» (834) • Em 1846 foi vereador da Câmara Municipal de Coimbra (juntamente com o seu amigo e futuro presidente do município Raimundo Venâncio Rodrigues). Neste ano, associou-se à causa da revolução popular e, a 10 de Junho, seria nomeado Administrador do Concelho de Coimbra. Demitir-se-á do cargo assim que se espalhou a notícia de que o partido a que pertencia queria conspirar para restabelecer o governo de D. Miguel, revelando uma vez mais firmeza de carácter: «O sr. Marquez de Loulé ficou tão afeiçoado ao sr. Lopes Parente, que quando em Janeiro de 1847, depois do desastre de Torres Vedras, saiu desta cidade para o Porto, para onde se dirigiam todas as forças populares, não quis passar sem o visitar pessoalmente em Souzellas»(835). • Em 1847 continuou a combater o partido cabralista, tomando parte em Maio de 1847 na qualidade de Secretário-geral, na oculta coluna «…que de Coimbra e terras proximas, marchasse para a Beira, a fim de coadjuvar o movimento popular dirigido pela Junta do Porto». Depois do convénio de Gramido, deixou o Porto e regressou a Souselas, tendo a 28 de Novembro se apresentado «….na assembleia de Souzellas, com os seus amigos eleitores da opposição; e ahi lavrou um enérgico protesto contra o presidente da mesa eleitoral que por ver a eleição perdida para o partido cabralista, tinha por um futil pretexto deixado de proceder à eleição»(836). • Em 1853, estando o partido regenerador no poder, foi nomeado Administrador do Concelho de Montemor o Velho, cargo que serviu até 1855. No último ano que aqui serviu envolveu-se em discussão acesa com o Presidente da Misericórdia e o Juiz da Confraria do Santissímo Sacramento de Pereira, devido a uma denúncia pública que deles fez em como haviam emprestado dinheiro durante a sua gerência. Ainda neste ano o “seu” jornal de sempre acusa-o de não punir os autores de um roubo feito a barqueiros da serra, factos de que o acusado se defendeu nas páginas do periódico.

(834) (835) (836)

Id. Id. Id.

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IX – Personalidades

Enviou dezenas de cartas para o jornal da sua preferência – O Conimbricense – sendo amigo do director do periódico (Joaquim Martins de Carvalho), que o apelidava nos últimos anos de vida como “Um bom velho” e “o decano dos habitantes deste concelho”. Os assuntos abordados em jornal versavam diversos assuntos, designadamente, os relativos aos negócios públicos, incluindo a crítica ao aumento de impostos sobre a agricultura, em 1871. Ficaram famosos os seus «juizo do ano, com relação a esta freguezia». Aliás, as questões agrícolas chamavam-lhe particular atenção, por a elas estar intimamente ligado (era também agricultor). Assuntos que lhe consumiram imensas páginas nos jornais, quase sempre em tom de crítica: «…morreu todo o milho dos altos, ou temporão, sem deixar palha, nem grão; aquella para gados, este para seus donos para as despezas feitas e a fazer, e para sementes, e pagar seus tributos. Já não tem remedio, pela continua escacez da chuva, e o sol intenso ter sugado o sangue da terra, e seus nascentes (…) Esperemos que a este nosso mal, venha outro maior, os arroladores, e salariados do governo venham medir e espremer as terras, e obrigal-as a dar fructos, queira ou não queira o mesmo Senhor por quem governam os reis da terra. Souzellas se Deus ainda quizer, colhendo o milho que as terras baixas promettem, terá para seus custeio para meio anno (…) Era de nossos reis favorecida, hoje de todos abandonada e espesinhada, e só buscada em occasião de eleições e cobrança de tributos, porque sem agricultura, não podem viver as armas, letras, artes, e commercio. Nenhuma esperança de remedio podem ter os Souzellenses do governo, que mal tem para si e afilhados»(837). Foi um benemérito da instrução escolar na freguesia (tal como grande parte da sua família) e envolveu-se activamente no processo que trouxe para Souselas uma estação de caminho de ferro, sendo dos primeiros a defender a construção da Estrada da Beira: «E tanto melhor será esta estação , se um dia tivermos um deputado ministerial, que consiga fazer-se um ramal de caminho para a Raiva, que é o melhor para communicação com os povos limitrofes, e toda a Beira entre os rios Dão e Mondego, supprindo os defeitos da secca de 5 a 5 mezes d’este rio Mondego, que impede o transito do commercio. Este ramal talvez fosse de pequeno custo ao governo, e que haverá particulares que o queiram, as expropriações serão mui baratas, e muito gratuitas, indo por Botão, Monte Redondo, Figueira, etc»(838).

(837) (838)

Jerónimo Lopes Parente - «Noticias de Souzellas» In O Conimbricense, 15 Julho 1870, P. 3 Jerónimo Lopes Parente - «Caminho de Ferro do Norte» In O Conimbricense, 16 Abril 1864

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Festividades, obras, descrições fisícas da freguesia, estado da agricultura… foram temas que trouxe ao conhecimento. Casado com D. Anna Guiomar de Figueiredo Parente, e dada a sua longevidade, sofreu o desgosto de ver falecer três filhos, uma filha e, por último sua esposa, que vivera 15 anos entrevada. Um dos seus filhos, Luiz Manoel de Figueiredo Parente foi oficial do exército e, em Maio de 1867 nomeado para o ofício de escrivão do juizo de paz do districto de Souselas(839), tendo falecido em Fevereiro de 1871. Lopes Parente chegou a ser designado como «o homem mais velho do concelho de Coimbra». Os últimos meses de vida foram penosos chegando a ser sacramentado nos finais de Janeiro de 1872, dada a gravidade da doença. De facto, à crise que sofrera neste mês sobrevivera de forma quase milagrosa, facto que atribuiu à devoção que tinha por Santo António, embora fosse «religioso sem fanatismo». A propósito da sua doença, sabemos que não se dava com o médico da freguesia, o Dr. Nazareth, valendo-lhe em muitos casos a assistência do médico em quem confiava, o Dr. Inácio. Apesar dos achaques dos últimos anos não perdeu o sentido de humor, continuando sempre a enviar cartas para o jornal de sempre, como a de 12 de Agosto de 1872, onde aludiu à doença de que padecia: «Não fui á missa hontem por causa da minha molestia (…) Aproveito esta occasião de ter tão bom escrivão, porque mui mal posso escrever, e por isso ando em atrazo (…) Sim, senhor, ainda sou vivo com 94 anos de edade; sou, dizem, o decano deste concelho, e não me diria tal, se o governo se tivesse lembrado dar alguma pinguedina do orçamento ao decano, porque então servia para qualquer constituinte. (…) Minha cabeça já não joga bem; os sentidos mui diminutos, mal posso ler, e por isso estou privado do meu regabofe que tenho na leitura do seu jornal, de que muito sempre gostei, por achar-lhe certos tractos da nossa historia, que so o incansavel zelo e gosto que ninguém pode negar a v. ter, e fora achar em papeis velhos, encostados a carunchosas estantes»(840). Acabou os seus dias na casa que possuía em Souselas, vindo a falecer na tarde do dia 31 de Janeiro de 1873, com 94 anos de idade, sendo sepultado na Igreja Matriz. O seu funeral constituiu uma imensa demonstração de consideração e respeito pelo homem, a ele acorrendo «…concurso numerosissimo de pessoas de todas as classes». A sua morte não poderia deixar de ser notícia de primeira página no seu jornal de sempre, que além do currículo de vida, lhe realçou as qualidades humanas:

(839) (840)

Vide O Conimbricense, 14 de Maio 1867, P. 4 Jerónimo Lopes Parente - «Um Bom Velho» In O Conimbricense, 17/8/1872

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IX – Personalidades

«O sr. Lopes Parente era um cavalheiro afavel, e obsequiador atè ao último extremo. A sua casa estava sempre aberta para receber a todos os que a procuravam. Parecia que o seu maior prazer era ver ahi os seus amigos».

Custódio José de Oliveira Nazareth Médico municipal em Souselas (1885) falecido em 1905. Vice-Presidente da Câmara Municipal de Coimbra entre 1866-1867, na presidência de Manoel dos Santos Pereira Jardim. Durante a sua vice-presidencia realizaram-se importantes melhoramentos materiais na freguesia, designadamente ao nível rodoviário. Foi designado pela C.M.C. para resolver com a empresa construtora dos caminhos-de-ferro alguns problemas que surgiram na zona de Souselas, tendo-se envolvido em acesa polémica com o advogado da empresa, Alexandre de Seabra. Benemérito da instrução escolar da freguesia.

Alberto Dias Pereira Nasceu em Souselas a 7 de Agosto de 1891, filho de José Augusto Dias Pereira (farmacêutico, natural de S. João da Pesqueira; foi também professor na escola primária masculina de Souselas em 1894) e de Alexandrina da Encarnação Costa (natural da Freguesia da Sé Nova). Casou com Maria da Costa Falcão Meira, natural de Alpiarça. Frequentou a Escola Normal Superior de Coimbra, matriculando-se em Filosofia a 25 de Outubro de 1907 e Matemática a 7 de Outubro de 1908, obtendo o Grau de Bacharel em Matemática. Mais tarde, concluiu o Curso Superior de Letras em Lisboa(841). Teria 18 a 20 anos quando se envolveu activamente no movimento republicano, marcando presença no comício realizado em Souselas a 30 de Abril de 1911, no âmbito da campanha para as Constituintes. Democrata de formação, fez parte em Coimbra do Grupo de Estudos Democráticos e do Centro de Estudos Democráticos. Belisário Pimenta, nas suas memórias, dúvida inicialmente da sua adesão à Democracia criticando-o de ter sido um dos principais impulsionadores da destruição da Igreja de S. Bento em Coimbra. Ambos fizeram parte de um agrupamento designado por “Amigos de Coimbra” onde se «…discutiram

Manuel Augusto Rodrigues (Dir. de) – Memoria Professorum Vniuersitatis Conimbrigensis, Vol. II 1772-1937, Arquivo da Universidade de Coimbra, Coimbra, 1992, P. 334

(841)

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problemas da cidade, propôs sugestões e tentou evitar mais descalabros e atentados como os que se teem feito. Sem estatutos nem qualquer sanção oficial, apenas pretexto para acalmar um pouco a furia destruidora que se apossou há tempos a gente que governa em relação a Coimbra»(842). Tinha à sua frente Armando Leal Gonçalves e, mais tarde o padre e estudioso da arte Nogueira Gonçalves. A primeira reunião deste grupo realizou-se a 6 de Janeiro de 1955. Souselas deve muito a esta personalidade: Ao nível da educação, envolveu-se directamente na melhoria das condições de ensino na freguesia: em 1918 a Junta de Freguesia lavra em acta um voto de agradecimento pela sua intervenção na concessão governamental de 1.000$00, pois havia «…empregado os seus bons ofícios no pedido feito ao Ex.mo Ministro da Instrucção Publica Barbosa de Magalhães». E, em 1919, lança um novo voto de louvor «de grande reconhecimento», pela inclusão de Souselas na lista das escolas a subsidiar em 1920. A propósito desta matéria dele se disse que «…áctos dêstes enóbrecem quem os pratica e nós devemos orgulhármo-nos de ter na nóssa freguezia um filho a quem tam dignamente a sabe representár»(843). Importa referir que, outro tipo de pedidos e concessões feitas a Souselas tiveram o patrocínio e bons ofícios desta figura junto do governo. Recordese o exemplo do subsídio concedido (4.000$00) para a reparação da estrada camarária dos Fornos a Souselas. No período pós revolução de Abril continuou a contribuir para obras na sua freguesia: em 1976 cedeu o terreno e casa do passal em Souselas para abertura duma estrada e creche. Foi alvo de homenagem com a inauguração do parque infantil, a que deram o seu nome em 7 de Setembro de 1980 (onde o homenageado esteve presente). Na cerimónia foi lida uma pequena biografia pelo vereador Pinto dos Santos, transcrita para a acta da vereação do dia 15 do dito mês, aqui reproduzida: «O Doutor Alberto Dias Pereira que aqui homenageamos por ter doado o terreno para a construção de uma creche em Souzelas, terra da sua naturalidade, doou muito mais a todos nós através das gerações que a sua larga mas não longa vida, tem acompanhado como Amigo, Professor, Homem Público e Cidadão. Como Amigo que posso eu dizer? Não se enaltecem as amizades. Agradecemse e retribuem-se com o melhor de nós. Mas seria injusto não vos contar que a minha amizade para com o Doutor Dias Pereira, resulta da sublimação das

B.G.U.C. – Sala dos Reservados: Manuscrito 3363: Belisário Pimenta – Memórias, Vol. 18, 19541955, Pp. 156-157 (843) A.J.F.S. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, Fl. 14 (842)

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IX – Personalidades

suas virtudes humanas consubstanciada na sua actividade pedagógica que nunca deixou de praticar e desenvolver. Essa amizade reconhecida na Escola onde foi meu professor, já tinha nascido na escola anterior que ajudou a criar com todos os fundadores da primeira República, na Igualdade, na liberdade e na fraternidade.Não só o idealismo. Aqueles homens, quero dizer estes homens que assim pensavam, assim viviam e assim realizavam. Foi essa escola que o Doutor Dias Pereira ajudou a criar, que formou várias gerações preparadas para a nova vida que se iria começar a viver, que lhe concedeu ao mesmo outras também gerações de amigos. Os seus discípulos e os seus amigos sempre lhe ouviram brilhantes lições de Matemática ou de civismo e o seu trato afável sempre exaltou e consolidou a dignidade dos seus interlocutores. Professor há tantos anos conserva todos os amigos em todos os seus discípulos! Ainda é amigo quem há tantos anos foi professor! São muitas gerações. Desculpem a conduta simplista mas lógica: É muita gente para um caso banal. O amigo e o professor são realmente bons! O homem público e o cidadão são íntegros e de completa dedicação à causa pública. Quem quizer saber pormenores, tê-los-á gravados em letra de forma, devidamente descritos e historiados. Não os lembrarei aqui. Desde 1913 a 1936 a sua vida repartiu-se com notável e inteligentíssima actividade entre o ensino e a vida pública, quase sempre localizada em Coimbra onde lecionou no liceu Doutor José Falcão, na Escola Brotero, na Universidade e no Instituto Industrial. Por onde passou deixou bem marcados benefícios quer nos seus alunos e colegas quer nas instituições cuja eficiência passou a ser evidente. O liceu Doutor José Falcão onde foi Reitor eleito pelos professores durante oito anos é bem uma prova da sua dedicada e inteligente actividade a favor do ensino e das relações entre professores e entre professores e alunos. Este cargo foi infelizmente abandonado como é óbvio em 1927. Nessa altura foram com ele a liberdade e a democracia, mas enquanto foi professor nunca os seus discípulos e os seus amigos perderam a esperança. O seu espirito sempre bem vivo e lúcido inundava de confiança e ânimo todos aqueles e eram muitos, que desejavam a liberdade a dignidade e o progresso do povo português. Os seus adversários políticos, respeitavam-no e até o estimavam, mas creio que nunca chegaram a avaliar bem o poder da sua fé e os efeitos do seu permanente e animado combate cívico. Nunca perceberam o valor e a resistência da barreira ideológica que por todo o lado mantinha ou levantava com o seu bem alicerçado idealismo e a sua extraordinária inteligência e eloquência. 577

Freguesia de Souselas – um povo com História

A sua luta sempre travada no plano intelectual e cívico o seu exemplo de resistência indeformável e o seu amor pela liberdade e dignidade humana de que é um alto exemplo levá-lo-iam ao afastamento da sua vida profissional que tanto amava e prestigiava, por aqueles, exactamente, a quem tinha intransigente e eficientemente defendido em anos anteriores, precisamente nas mesmas circunstâncias e pelos mesmos motivos. A memória do homem é curta. Ela depende da duração da sua vida e a gratidão não sobrevive à memória. Não tenho conhecimento de que tenha sido feito a este cidadão a reparação pública, que ele não pede nem nunca pediu, mas que lhe é devida. Como homem, como cidadão desta terra, e como representante da Câmara Municipal de Coimbra entrego-lhe num apertado abraço todo o reconhecimento grato do seu alto exemplo de vida»(844). Dias Pereira foi militante do PRP/PD e desempenhou relevantes funções políticas: Governador Civil de Braga (de Fevereiro de 1916 a Junho de 1919); Deputado por Ponte de Lima (31 de Maio de 1919) e Deputado por Coimbra (Dezembro de 1925). Foi vogal do Conselho Superior de Comércio e Indústria e do Conselho Superior do Ensino Industrial e Comercial (17 Janeiro 1923), e Administrador da Companhia Portuguesa Rádio Marconi (25 Julho de 1925). A partir de 1926 torna-se destacado opositor ao regime. Em 1936, foi afastado da carreira docente por ter participado num jantar de homenagem a Cunha Leal. Faleceu em 1984, no lugar de Alpiarça. Sob proposta do vereador Pinto dos Santos, na já referida sessão de câmara do dia 15 de Setembro de 1980, a municipalidade deliberou exarar um voto de louvor «…pelo seu alto exemplo, pela sua dignidade humana e pelo seu valor como amigo, professor, homem público e cidadão». Sensível a todo o legado de Alberto Dias Pereira, o executivo da freguesia deliberou, em 11 de Novembro de 1996, deliberou à A.F que o seu nome fosse dado a uma das ruas do lugar de Souselas.

José de Almeida Machado Em 1933 foi alvo de uma calorosa homenagem, organizada por pais e alunos, o professor da escola masculina de Souselas, José de Almeida Machado. Um acto sentido, realizado na sua casa e onde foi orador o Sr. Braz Rodrigues «…que pôs em foco as excelsas qualidades de caracter do homenageado (…)

(844)

A.H.M.C. – Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 277, 1980, Fls. 57-58v.

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IX – Personalidades

de toda a gratidão que os habitantes de Souzelas lhe tributavam, pela maneira como soube impor-se à sua consideração, e por tudo quanto tem feito pela causa da instrução, desde que se encontra entre nós». O professor também usou da palavra comovido agradeceu a manifestação de que fora alvo «…terminando por abraçar os seus alunos, que lhe ofereceram lindos ramos de flores aos quais, disse, votava tanta amizade, como se fossem seus filhos»(845).

José Leopoldino dos Santos Natural de Alcobaça ou Marinha Grande. Foi chefe da Estação de Souselas, fixando-se na Marmeleira. Foi homem aberto, progressista e opositor ao regime Salazarista (reviralho). Envolveu-se activamente pela criação do Centro de Recreio Popular Marmeleirense.

Elias Fernandes Emigrante nos EUA, emprestou dinheiro a muita gente, fazendo donativos a pessoas carenciadas. Benemérito e sócio honorário do CRP.

Fernando Cunha Natural da Marmeleira. Médico, com actividade nos anos 50-70 do séc. XX. Figura ligada ao Estado Novo (amigo intimo de Bissaya-Barreto), intercedeu junto das autoridades por muitas pessoas da freguesia, conseguindo nalguns casos nomeações relevantes. A torre sineira da capela ou a escola primária da Marmeleira só avançaram devido à sua interferência junto das autoridades. Esteve em África e no Brasil, onde foi director hospitalar. Construiu casa para clinica junto da estrada de Zouparria-Sargento-Mor. Nunca casou. Faleceu nos anos 80.

Rosalina de Jesus Marques e Álvaro Ferreira A história das personalidades da freguesia não deve cingir-se aqueles que se destacaram apenas por acções de benemerência. De facto, não poderíamos esquecer aqueles que praticaram actos heróicos, como foi o caso destes indivíduos. (845)

«Souselas presta homenagem a um professor» In Diário de Notícias, 1933

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Rosalina de Jesus Marques, natural de Souselas, recebeu a 22 de Dezembro de 1960 o prémio Vale Flôr (846) (“Prémio Jenny de Vale Flôr”). A cerimónia decorreu na sede do Montepio Geral, em Lisboa, contando com a habitual presença do Chefe de Estado. Rosalina, então com 15 anos de idade, recebeu o prémio relativo às raparigas, no valor de 20.000$00, pelo acto heróico que praticou: «A Rosalina de Jesus Marques perante o espanto de duas mulheres que lavavam, com ela, roupa, numa vala próxima, desprezando o risco que afrontava, arrancou à impetuosidade da corrente do Rio Resmungão, caudalosa em consequência das enxurradas da invernia, uma pequena de sete anos que, pouco antes, descuidosa, brincava na margem»(847). Álvaro Ferreira não teve o mesmo reconhecimento que Rosalina. No entanto, sabemos os pormenores de uma história, que sensibilizou o povo da freguesia, e que motivou uma comunicação escrita enviada pela Junta de Freguesia ao Montepio-Geral, datada de 10 de Maio de 1977 dando conta de um acto de salvamento, ocorrido no dia 13 de Fevereiro de 1977, pelas 20.30 m: «…o ceramico António Dias da Silva, de 44 anos de idade, natural desta Freguesia, caíu numa Ribeira desta localidade denominada por Ribeira do Remungão a qual no momento levava uma grande cheia devido ao temporal que se fazia sentir nessa altura. Aos gritos aflitivos do menino Alvaro Ferreira de 9 anos de idade, ocorreu imediatamente em socorro do náufrago o Sr. Antonio Ribeiro Azedo, de 17 anos de idade, natural deste lugar que num acto de coragem, conseguiu salvar o seu semelhante, lançando-se á água arrastando-o para zona segura. Foram testemunhas deste acto de coragem, as seguintes pessoas: José Oliveira Rodrigues João Cação da Cunha Pedro Amaral Martins E ainda o menino Álvaro Ferreira, todos naturais de Souselas»(848). A propósito deste assunto, entrou o Montepio Geral em comunicação com a Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Dra. Maria Judite de Abreu e esta com a Junta de Freguesia de Souselas, por comunicação de 18 de Abril de 1977, para que se mandasse «…lavrar auto do ocorrido, testemunhado por pessoas idóneas que o tenham presenciado, para que o menino, no caso de ser

O prémio Vale Flor pretendia distinguir os actos praticados pelos “pequenos heróis”. Da sua gestão se encarregou o Montepio Geral que o administrava por encargo da Marquesa de Vale Flor, D. Maria do Carmo Pinto. O prémio dividia-se em duas categorias; masculino (Prémio José Luis de Vale Flor – 2º marquês de Vale Flor) e feminino (“Prémio Jenny de Vale Flôr). (847) «Os prémios Vale Flor vão ser entregues nas Festas do Natal» In Correio de Coimbra, 8/12/1960, P. 8 (848) A.J.F.S. - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) (846)

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IX – Personalidades

pobre, seja incluído na lista dos candidatos ao prémio “José Luis de Valle-Flor” – 2º Marquês de Valle-Flor, do corrente ano»(849). Acompanhava a comunicação uma carta da Fundação Valle Flôr, datada de 6 de Abril de 1977, referindo-se ao acto de abnegação do menor. Importa dizer que esta fundação, criada pela marquesa de Valle-Flor, distribuía um prémio anualmente destinado a «…premiar actos de humanidade, sacrifício, honestidade, coragem e abnegação, praticados por menores».

Licínio Neves Abreu Nasceu a 27/09/1943, natural do lugar de Casal da Rosa, Freguesia de S. Paulo de Frades. O pai era agricultor e carreiro de profissão, a mãe doméstica. Casou em Souselas em Julho de 1964, sendo pai de duas filhas. Foi vendedor de automóveis durante mais de 3 décadas, na firma Brinca e Morais, sedeada em Coimbra. Praticou atletismo e andebol em conhecidos clubes da cidade de Coimbra; Santa Clara e Sport Conimbricense. Participou em provas desportivas automobilísticas. Dirigente de diversas instituições, como Associação de Caçadores de Portugal, Associação Desportiva de Souselas, Rancho Infantil de Souselas e, ultimamente, da Tuna Souselense onde leva 10 anos ininterruptos de actividade (acumulado o dirigismo com a de instrumentista). Licínio Abreu tornar-se-ia conhecido pela perícia na arte do Tiro aos Pratos, capacidades que terá herdado de seu pai, exímio na caça aos coelhos e perdizes. Deu os primeiros passos na modalidade nos anos 75/76, tornando-se atleta de alta competição, em fosso olímpico e universal (foto 179). Fez parte de vários clubes nacionais: Clube do Liz (onde juntamente com Vitor Lopes foram os primeiros internacionais); Clube de Caçadores de Matosinhos, onde foi Campeão Regional do Norte, no Fosso Olímpico; Clube de Caçadores do Marco de Canaveses, sagrando-se Campeão Regional do Norte, no Fosso Universal; Clube de Caçadores e Pescadores da Beira (Viseu). A primeira taça foi conquistada no Clube de Caçadores do Centro de Portugal, em Santa Clara, primeiro triunfo de uma carreira excepcional. Foi internacional pelo seu país, conseguindo um palmarés invejável: - Campeão Europeu Tiro aos Pratos, Fosso Universal, V Campeonato da Europa, em Lisboa (geral, por equipas), entre 146 atiradores de 7 países; - Vice-Campeão na Copa do Mundo, Fosso Universal, Fosses-la-ville, Bélgica (20 a 27/07/1989), onde participaram 252 atiradores;

(849)

A.J.F.S. – Correspondência Recebida, 1976-1979 (pasta)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

- 3º Lugar no Match Ibérico de Fosso Olímpico, realizado em Olivença, com 196/200 pratos (que considera como a melhor prestação da sua carreira);- 2º Lugar na Copa da Espanha “Copa del Rey”, com 194/200 pratos, entre 107 atiradores. Licínio Abreu fez uma excelente carreira á custa de algum sacrifício pessoal: sem patrocínios de relevo, sem campo na região para treinar, obrigado a deslocar-se para outras regiões para praticar a sua arte. Como segredo para o sucesso que obteve afirma: «Antes de mais, a concentração. Depois, quando vamos às provas, no momento em que saem os pratos, não podemos estar mal, nem com a família, nem com o mundo. Temos de nos sentir bem». Guarda uma vida recheada de história e estórias para cantar. Registamos as relacionadas com as armas de competição. A primeira espingarda que teve foi uma Pietro Baretti, que utilizou nas primeiras provas locais. Mais tarde, comprou uma Niko, para provas de maior exigência. Em 1982, compraria uma FN Herstal, que encerra curiosa história: adquirida durante o torneio de Vendas Novas, a Garcia Agostinho, que lha emprestara durante a prova. Sem se conhecerem de lado nenhum, Licínio trocaria as 2 espingardas que possuía por aquela que tanto o impressionara, com a particularidade do vendedor não saber que armas o souselense possuía. Uma prova de confiança!

Peter Ferreira Violinista português, residente em Connecticut, emigrante nos EUA desde os 16 anos (foto 180). Nasceu na cidade do Luso, em Angola, onde viviam os seus pais. Quando tinha um ano de idade, a família regressou a Souselas, onde conheceu seu avô Joaquim Carlos Ferreira, violinista da orquestra Danúbio Azul (foto 181), formada por 12 elementos. O avô seria «…fundamental e decisivo na sua opção pela música. Ainda hoje Pedro Ferreira guarda na sua mala do violino uma foto desse avô, que o acompanha para todos os concertos e sessões de trabalho»(850). A sua carreira iniciou-se aos 6 anos de idade, quando os pais o matricularam no Conservatório Regional de Música de Coimbra. Em 1985, a família emigrou para os EUA, e naquele país desenvolveu a sua arte. Estudou música com Cathy Dorn e Mike Macelleti na escola secundária de Danbury, CT, onde se distinguiu pelas capacidades que evidenciava. Foi seleccionado para uma digressão ao Canadá e ganhou o prémio DHS Sénio Orchestra Award.

«Peter Ferreira: violinista português faz carreira na América com os olhos em Portugal…» Mundo Português, nº 123, vol. 11, Agosto, 2004, P. 21

(850)

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IX – Personalidades

Seguiram-se os estudos superiores, com Eric Lewis, Joe Pitchon, James Graseck, entre outros, primeiro na Universidade de Connecticut, depois na mítica Jolliard de Manhattan. Tem actuado a solo e com orquestras sinfónicas, recitais, gravação de música para documentários e anúncios e ensino do violino. Do seu vasto currículo constam participações com orquestras de renome: Queens Symphony Orchestra, a The Fairfield Orchestra, Nutmeg Opera. Foi fundador e primeiro violinista do Dresden String Quartet e membro honorário da Estudantina de Coimbra com quem tocou aquando da deslocação aos EUA. Tocou para o Papa Bento XVI em 2007, acompanhando o coro da Igreja de St. Michael, de Waterbury(851). Pedro Ferreira é casado e pai de três filhos. Considera o violino uma aprendizagem constante: «Eu vivo com o violino e para o violino». Gostaria de continuar a carreira em Portugal. Foi capa da Revista Mundo Português, em Agosto de 2004. Dispõe de site na internet: www.peterferreira.com

Joaquim Carlos Ferreira Nasceu em Souselas a 20 de Abril de 1908, faleceu em Outubro de 1976. Foi dirigente da Tuna Souselense, onde tocou violino, e um dos fundadores da orquestra Danúbio Azul. Homem de fortes convicções políticas, comungando dos princípios políticos da esquerda que se assumia contra o regime de Salazar. Durante 40 anos foi correspondente do Jornal de Noticias e escreveu, também, na Gazeta das Aldeias. Fotógrafo amador, ganhou vários prémios, um deles atribuído pelo jornal “O Século”, com uma foto do chafariz de Souselas (foto da contracapa).

António Dias Cação Nasceu em Souselas a 25 de Novembro de 1902, faleceu em 21 de Maio de 1986. Foi dirigente da Tuna Souselense, onde tocou flauta transversal, e um dos fundadores da Orquestra dos Primos. Apesar de possuir apenas a instrução primária tinha elevado nível cultural. Foi músico, regente de orquestra e tocou em várias orquestras. Foi compositor, autor, ensaiador e encenador de teatro. Deixou um vasto espólio de partituras, algumas tocadas, à época, pelos ranchos folclóricos.

(851)

Id.P. 22

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X FESTIVIDADES, ROMARIAS E FEIRAS

A

1. Festividades s principais festividades da freguesia estão proximamente relacionadas com os templos da freguesia e a sua origem perde-se no tempo. Sabemos, no entanto, que pelos finais do séc. XIX existiam duas festas religiosas organizadas e suportadas nos orçamentos elaborados pelas juntas de paróquia: a de Nossa Senhora da Nazareth (na Capela de Carrimá) e a de S. Sebastião. Neste âmbito, a junta passou a gerir a arrematação das fogaças, as quais, como se pode ler na descrição orçamental para 1892: «…são ornativos em géneros que dão para despezas do culto. Não se tem metido em orçamento por ser muito incerto, e ser costume aplicar-se logo a compra de cera ou de adornos d altares»(852). Neste ano renderiam 2$350. No orçamento para 1893 acrescentaram-se mais alguns pormenores deste costume: «Estas fogaças eram arrematadas por mordomos, que depois aplicavam o produto a despezas do culto; e a junta tomou conta d’ellas ha 2 annos, porque os rendimentos da Fabrica diminuíram, em razão de se aplicarem alguns capitães á construção da Casa da Escola». Outro apoio dado pela junta de paróquia era o fogo-de-artifício para a festa da Ressurreição. Em Souselas temos as festas em honra de Santiago (25 de Julho, de forma intermitente), Nossa Senhora do Rosário, Senhor do Terreiro e Festival Nacional de Folclore (Setembro). A festa em honra de S. Pedro já não se realiza. A festa em honra do padroeiro da freguesia esteve muitos anos sem se fazer. Dizem os vetustos habitantes que era festa muito antiga, a ela acorrendo gente de muitos pontos do país, em especial espanhóis, para assistirem à procissão e visitarem a Igreja e seu orago. 1.1. Em Souselas: Festa a Nossa Senhora do Rosário e Festa ao Sr. do Terreiro A veneração de Nª. Senhora está na alma e coração do povo da freguesia, a quem recorriam nas horas de aflições: Apega-te a Nª. Senhora, tal era a veneração, ou Nª. Senhora te guarde”. Muitas cantigas fazem alusão a Nª. Senhora e louvores à Virgem.

AUC – Fundo do Governo Civil: Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 398, 1892-1895, Pasta 1892

(852)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Em Souselas venera-se Nª. Sra. do Rosário, com forte e bonita festa, sempre no primeiro Domingo de Outubro. É o mês do Rosário e a quadra alusiva a Nª. Sra. do Rosário, a Virgem do Rosário. Os pontos altos são a Missa Solene com eloquente sermão, seguida de procissão, com passagem obrigatória pela capela do Senhor do Terreiro e pelo cruzeiro (fotos 182 a 184). À frente da procissão vai a Cruz processional, alçada com tochas, seguindo as imagens de Santos e Santas, com o orago da Igreja, S.Tiago, a abrir a procissão, encerrando a procissão a venerada Nossa Senhora do Rosário. Segue-se a Irmandade de Nª. Sra. do Rosário, que abre com o Guião, seguida do andor com a imagem de Nª. Sra. do Rosário. Depois, o prior debaixo do Palio com o Santíssimo Sacramento, a Filarmónica e por último o restante povo. A Procissão forma duas alas, onde vão os pagadores de promessas e as crianças vestidas de Anjinho, Nª. Sra. da Conceição, Rainha Santa Isabel, Sagrado Coração de Jesus, São Tiago, Nª. Sra. do Rosário, São Pedro, etc. No regresso da procissão à Igreja Matriz, a imagem de Nª. Sra. do Rosário entra de costas, ou seja, virada para o povo, para receber a saudação final, seguida do cântico: «Salvé Rainha Mãe de Deus Rainha de Portugal» A que acompanha uma impressionante “salva de fogo”. Durante o percurso, as ruas têm verdura a enfeitar e as janelas e varandas estão engalanadas com as melhores colchas. Neste trajecto, a procissão tem três pontos altos, a passagem pelo Sr. do Terreiro, o virar do Cruzeiro com monumental salva de fogo, que se repete quando a procissão chega à Ponte de Frades. Neste dia não faltam os foguetes, e a comida é melhorada, sempre com a tradicional chanfana e, por vezes, leitão à Bairrada. A esta festa acorrem pessoas dos arredores, para integrarem a procissão, pagando suas promessas. Lopes Parente descreveu a festividade do chuvoso dia 27 de Outubro de 1872: «…festinha pequena, porem agradavel ao povo; nem melhor podia ser, por ser feita de esmola do povo, tirada por 4 offerecidos mordomos; e Souzellas não está para festas, sobrecarregada de tributos, e falta de generos». Ao amanhecer de Domingo anunciavam-se os festejos: «…uma girandola de dois pequenos foguetes; seguiu-se a indispensavel gaita de folle, com seus dois bombos tocados por fortes pulsos, que com seu rufar faziam estremecer as casas, e acompanhados de rapaziada percorriam a povoação para matarem o bicho! 588

X – Festividades

Á hora marcada, appareceu o mestre Silva com uma pequena parte da sua orchestra, que se compunha de um figle, quatro rebecas e duas flautas»(853). A parte sagrada decorreu na igreja «decentemente armada, seus altares iluminados, com flores…» com sermão seguido de procissão «desalinhada como sempre costuma ser». Outra importante festividade de Souselas realiza-se no 1º Domingo de Agosto. É a festa em honra do Senhor do Terreiro. É a festa dos solteiros, rapazes e raparigas. No passado durava três dias, estando actualmente reduzida a um dia. A cerimónia religiosa consta de missa campal junto ao terreiro da capela. Admite-se que esta festividade tenha 202 anos de existência, tomando por referência a inscrição exterior da capela, que regista o ano 1809. 1.2. Na Marmeleira: Festa a S. Sebastião e Festa à Rainha Santa Na Marmeleira decorrem as seguintes festas: de S. João, ao Senhor da Agonia (romaria, que tratamos adiante), São Sebastião (Janeiro) e as Festas à Rainha Santa (Julho). A festa em honra de S. Sebastião constitui a festa de ano da Marmeleira, com missa e solene procissão, que abre o gaiteiro e a guarda de honra, da Guarda Nacional Republicana, acompanhada da filarmónica. No fim da procissão as imagens dos santos e santas recolhem à igreja, seguindo-se a entrega das imagens na Capela do Sr. da Agonia e no nicho das almas da Rainha Santa Isabel. Assim, é formada nova procissão com os andores do Sr. Agonia, da Sra. das Dores e da Rainha Santa Isabel. A Filarmónica toca a passo acelerado em direcção à Capela do Sr. Agonia, onde ficam as imagens do Sr. da Agonia e da Sra. das Dores, seguindo depois para as alminhas da Rainha Santa Isabel. À 2ª feira decorre o convívio da população, com o tradicional jogo de futebol entre solteiros-casados no Campo do Goivo, seguido de sardinhada. Também na Marmeleira decorre a festa à Rainha Santa Isabel, que decorre em Outubro, sendo mordomos os rapazes e raparigas solteiras. Com procissão do local onde se encontra a imagem até à capela, seguida de solene missa. 1.3. Em S. Martinho do Pinheiro: Festa a N.ª Sra. da Nazaré Em S. Martinho do Pinheiro decorre a festa de Nossa Senhora da Nazaré (15 de Agosto), a festa de ano deste lugar. Compreende missa e solene procissão, que abre o gaiteiro, por vezes com guarda de honra, da Guarda Nacional Republicana, acompanhada pela filarmónica. Festa rija, que recebe ranchos de gentes de toda a Freguesia, onde se comiam os primeiros melões, no arraial da noite, com palco improvisado no Largo da Capela.

(853)

«Festividade» In Conimbricense, 5 Novembro 1872, P. 2

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1.4. Na Zouparria do Monte: Festa de S. Martinho A Zouparria do Monte honra São Martinho (2.º domingo de Novembro). Festa simples, com missa e solene em honra de S. Martinho e arraial que encerra com convívio da população e com o tradicional cortejo do enterramento da festa. O enterro da Festa é um momento de sátira social local: o cortejo abre com um boneco de tamanho adulto, previamente construído e adornado, encabeçando o cortejo um habitante da aldeia preparado para o efeito, que imita o pároco, levando na mão um livro vernáculo. Atrás segue-se a população, com as mulheres em gritaria, como verdadeiras carpideiras. O cortejo dirige-se a uma terra de cultivo, onde foi aberto um buraco/cova, seguindo-se o ritual do enterro do boneco, em que a comissão de festas cessante tenta enterrar a festa enquanto a comissão nomeada para o ano seguinte tenta impedir tal acto, de forma a manter a festa viva. 1.5. Em Sargento Mór: Festa a N.ª Sra. das Preces e Festa a S. Romão No lugar de Sargento Mór a festa de ano é em honra da Senhora das Preces, no mês Janeiro (2ª Quinzena).Compreende missa e solene procissão, que abre o gaiteiro e a guarda de honra, da Guarda Nacional Republicana, acompanhada pela filarmónica. A procissão percorre os principais arruamentos da localidade, do Alto da Pata até á rua do Lagar. Neste lugar também se festeja S. Romão, em Junho. A sua comemoração era variável no calendário. Festas dos rapazes solteiros, com missa, por vezes campal junto à pequena capela de S. Romão, com gaiteiro e arraial.

2. Romarias São a alma do povo, com função religiosa e social. Depois de cumpridas as devoções e votos e pagas as promessas, vinha o convívio com partilha de farnel, a que se seguia o canto e a dança no largo da igreja, da capela ou da ermida. As romarias são os melhores exemplos da festa popular, um acontecimento social e religioso em que a festa profana, designada ”arraial” se sobrepõe à festa religiosa. Mas ao qual também se associava a festa gastronómica, com a ingestão de manjares sempre acompanhados pelo vinho, de preferência tinto. De facto, a romaria tinha a sua solenidade, com a celebração de missa de festa e da eucaristia, com pregação do eloquente sermão, mas a festa profana era sem duvida um dos seus pontos altos. As gentes de Souselas saíam cedo para a romaria, em “rancho”, grupo de pessoas, com as mulheres mais jovens namoradeiras, com o chapelinho de 590

X – Festividades

veludo enfeitado com lenço e flor de papel. As mulheres mais velhas, com a condensa (cesto de verga) onde ia o farnel «almoço e jantar» e xaile de fitas de merino em cima do cesto. Os homens de jaqueta ao ombro, e a imagem do santo em papel no chapéu, por vezes dobrada, fazendo lembrar o formato da capela. Sempre de cajado às costas, onde colocava o garrafão com o vinho, embora por vezes o cajado fosse substituído pelo guarda-chuva (mais valia prevenir que remediar, servia para a chuva e para o sol). No caminho cantava-se o Ei de m’ir. Já no local da romaria cantava-se e dançava-se o Fado mandado, ao desafio (homem e mulher) e dançando às ordens do mandador todos certos, brincar, todos certos ao meio, de roda, uma volta para a direita, outra para esquerda e logo na primeira quadra o cantador cumprimentava os presentes «Boa tarde meus senhores…». 2.1. Romaria do Sr. Agonia Trata-se da única romaria que decorre na Freguesia de Souselas, na localidade da Marmeleira, 10 dias após a 5ª feira da Ascensão. É constituída por parte religiosa, de solene missa, e de parte profana com feira e cantares e dançares. Manda a tradição que a meio da tarde o povo da freguesia se desloque para a Marmeleira. É um momento de convívio, único, entre pessoas de diferentes localidades da freguesia, vêem-se amigos, fala-se do tempo e da agricultura e come-se e bebe numa qualquer tenda de «comes e bebes». Aproveita-se para comprar as primeiras cerejas, mas outra fruta de novidade como as nespras também abundam. Neste dia, é costume as pessoas irem a essa capela pagarem as suas promessas, por norma em géneros alimentares que extraem da terra (foto 185). Outro costume associado a esta romaria é a compra de bolos de cornos e cerejas, pois é nesta altura que surgem os primeiros frutos, vindos dos lados de Sargento-Mor. 2.2. Romaria da Rainha Santa Rainha Santa Isabel, padroeira de Coimbra e amiga dos pobres. Venerada pelo Povo, foi a Santiago de Compostela, por duas vezes, na sua humilde condição de peregrina, sendo muito provável que tenha passado nas terras de Souselas nessa peregrinação, pois por Sargento-Mór passa o Caminho Português de Peregrinação a Santiago de Compostela ou El Caminho de Santiago Portugués, também conhecido por «El Caminho de Central Portugués». Mandava a tradição que o povo fosse à festa da Rainha Santa Isabel, que se realiza em todos os anos pares, pagar as suas promessas e prestar a homenagem 591

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à Rainha Santa Isabel. Levava-se o farnel que era comido no areal do rio Mondego, a meio caminho entre as margens e aí se assistia ao deitar do fogo-de-artifício, cantando e dançando ao som de um toque a modinha preferia das gentes de Souselas, a Laranjinha, e dizia a letra «Aqui se canta, aqui se dança, aqui se joga a laranjinha…» Os festejos iniciam-se no princípio de Julho. Os pontos altos continuam a ser as duas grandes procissões. Na quinta-feira à noite realiza-se a procissão de penitência. À chegada da imagem ao Largo da Portagem é feita uma saudação à Rainha Santa. É o momento mais emotivo das festas. A imagem fica exposta à veneração na Igreja da Graça. A procissão de regresso tem lugar no domingo à tarde. 2.3. Romaria do Senhor da Serra A povoação do Senhor da Serra e o Santuário que lhe deu o nome estão situados na freguesia de Semide, concelho de Miranda do Corvo. Aqui e entre 1653 a 1663 as Monjas de Semide mandaram erguer uma Capela no local onde hoje se situa o Santuário. Esta romaria chegou a ser das mais importantes da região vindo gentes de todo o lado. As gentes de Souselas vinham a pé, mais tarde de autocarro, atravessavam Coimbra, Ceira, rio Ceira, Sr. da Serra. À chegada pagavam suas promessas ao Divino Senhor da Serra, ouvindo Sermão, oferecendo velas ou apenas rezando, com seus fatos de romaria ou amortalhado. Depois, ao meio-dia, reuniam-se o Rancho de romeiros da terra, abriam-se os cestos merendeiros, comia-se com a galinha tostada, as pataniscas e bolo de buraco, acompanhado de vinho tinto, o bolo era designado mata-borrão, pois era molhado/mergulhado no copo de vinho ou no café de xicara. De regresso a casa, nova paragem na Cruz da Serra, que se mantinha florida todo o ano, para acabar com as merendas, pelo meio cantava-se e dançava-se. 2.4. Romaria do Espírito Santo A Romaria do Espírito Santo remonta ao século XIII, chamando-se então Festa do Imperador e celebrava a ligação de Eiras ao Mosteiro de Celas e à Ermida do Espírito Santo. A Santo António dos Olivais afluíam ranchos de romeiros, cumprindo promessas, aproveitando para folgarem em danças, ao som de violas e concertinas. As gentes de Souselas, fizesse chuva ou fizesse sol não ficava em casa. O povo espalhava-se pelas escadarias do antigo mosteiro, à sombra dos pinheiros mansos e das oliveiras, onde comiam os farnéis, que neste dia era melhorado. 592

X – Festividades

No passado, tal como hoje, abundavam as tendas dos feirantes, aproveitava-se para comprar os famosos barros de Carapinhal, caçoilas pretas para a chanfana, pingadeiras de barro vidrado para a cabidela de leitão e para o “picado” e asados e cântaros para a água. As crianças mais novas tinham direito a um brinquedo de madeira (pombinhas, passarinhos, etc..) ou de barro com figuras de animais e um apito, ou ao simples pífaro de barro. Ao fim da tarde, quando se cantava e dançava e o vinho já tinha “subido à cabeça”, ou os ciúmes de namorado, por vezes, acabava tudo à zaragata, não faltando pau e cajado.

3. Feiras As feiras também eram motivo de festa. Onde as pessoas iam para abastecimento ou venda de produtos, encontrando familiares, revendo amigos. Era um ponto de convergência social, de difusão de usos e costumes. A Feira de Santa Luzia, que se realiza todos os dias 5 e 19 de cada mês, destaca-se das demais pela sua origem civil e profana (fotos 186 e 187). De facto, a feira enquadra-se no tipo das grandes feiras e é de origem recente, datando de 5 de Janeiro de 1921. A sua criação ficou a dever-se a um acontecimento ocorrido nos finais de 1920: «…uma epidemia de febre aftosa que levou à proibição de feiras no distrito de Coimbra. A interdição afectou a feira que se realizava na freguesia de Trouxemil, todos os dias 5 de cada mês [Feira de Nossa Senhora das Neves] (…) Impedida a feira de se efectuar, os moradores da vizinha freguesia de Barcouço, a que pertence Santa Luzia, já no distrito de Aveiro, que a interdição não abrangia, resolveram criar uma feira que substituísse a de Trouxemil, mas que, ao invés de durar apenas o tempo da proibição, continuasse a vigorar»(854). A feira seria criada naquele distante dia, no Alto de Santa Luzia, merecendo discurso das autoridades. Na altura um local sem condições, exposto ao vento, mas que tinha algumas vantagens sobre a anterior feira, designadamente o acesso. Segundo o discurso inaugural a primeira feira foi modesta. Daí em diante a tradição enraizou-se, o comércio desenvolveu-se e ainda nesse ano se construiu uma capela, com festa anual no sítio onde se negociavam os bois, sendo um motivo adicional para atrair mais gente. Dali em diante a feira apresentava grande abundância de cereais, legumes, peixe, hortaliças, ferragens, calçado, chapéus…e gado. Fruto do desenvolvimento, estabeleceram-se casas de

Jorge Gaspar – As feiras de gado na Beira Litoral, Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, 1970

(854)

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comidas e bebidas e, em 19 de Fevereiro de 1938 a feira passa a ser quinzenal (5 e 19 de cada mês, tal como agora). Esta alteração daria um novo impulso à feira que deixava de ser mensal e, ao tornar-se quinzenal «mataria» a feira de gado da Pampilhosa, que se realizava a 22 de cada mês, apesar dos esforços feitos pela JF da Pampilhosa que inclusivamente se empenhou na antecipação da feira que passou a realizar-se a 14. Da criação da feira à edificação de uma capela, depressa nasceria uma povoação, tendo-se construído o primeiro prédio no local em 1928, por um emigrante brasileiro recém-chegado a Portugal. A situação geográfica de Santa Luzia impulsionou ainda mais o crescimento da feira e do povoado, pois está localizada junto à Estrada Nacional. Mais tarde, a instalação de uma empresa de camionagem conferiu maior importância ao povoado que aos poucos viu crescer, em volta do núcleo primitivo de habitações, novos espaços comerciais; casas de comidas e bebidas (restauração) e hotelaria. Até aos anos 80 a feira foi sobretudo uma feira de gado bovino, especializada em bois de trabalho, sendo uma das principais (senão a principal) fornecedora de gado para as lavouras da Bairrada. Actualmente ali se comercializa um pouco de tudo; gado (bois, porcos), peixe, ferragens, mobiliário, artigos de mercearia, carne fresca, artigos de vestuário, alfaias agrícolas, artigos de luxo (ouro e relógios), loiças, plantas e sementes e um leque alargado de comes e bebes. Alguns visitantes ou frequentadores da feira passam ali o dia resguardados no farnel. O povo de Souselas também acorria a outras feiras da região envolvente, sendo de destacar: a Feira dos 7 e dos 23 (em Coimbra), para venda e compra de gado (bois, principalmente); a Feira de S. Bartolomeu (também em Coimbra, na Praça Velha), para comprar e vender cebolas; na Praça da Pampilhosa, onde se deslocavam, em especial, as mulheres para venderem produtos agrícolas; e às Feiras de Cantanhede, de Oliveira do Bairro, Miranda do Corvo e Espinheira.

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XI ETNOGRAFIA, FOLCLORE E CULTURA POPULAR

Introdução Etnografia, vocábulo do grego éthnos «Povo» e gráphein «Descrever». É o estudo descritivo das instituições e dos factos da civilização dos diversos povos, ou etnias. O Folclore é a ciência que estuda as tradições populares nas suas mais variadas manifestações. É o conjunto das tradições, lendas ou crenças populares expressas em danças, provérbios, contos ou canções. Folclore, a ciência das tradições e usos populares, constituído pelos costumes e tradições populares transmitidos de geração em geração. Todos os povos possuem suas tradições, crendices e superstições, que se transmitem através de lendas, contos, provérbios, canções, danças, artesanato, jogos, religiosidade, brincadeiras infantis, mitos, idiomas e dialetos característicos, adivinhações, festas e outras atividades culturais que nasceram e se desenvolveram com o povo. A UNESCO declarou que folclore é sinônimo de cultura popular e representa a identidade social de uma comunidade através de suas criações culturais, coletivas ou individuais, e é também uma parte essencial da cultura de cada nação.

1.Linguagem Popular A linguagem popular é a linguagem informal, que não segue padrões rígidos, é a linguagem, falada no quotidiano, associada à simplicidade da utilização linguística em termos lexicais, fonéticos, sintácticos e semânticos. Feita de forma espontânea e com um recurso natural de economia linguística. Em Souselas, falava-se um português quase correcto por influência do designado “português de Coimbra”, não só na pronúncia como também na sintaxe, verificando-se contudo uma troca acentuada do b e v. Segundo Henrique Nazareth (1951), a linguagem das gentes de Souselas não é cantada e o tom ligeiramente lhe empresta uma graça peculiar, agradável de ouvir. O vocabulário é bastante rico, com alguns vocábulos de carácter absolutamente local, quer na forma quer na significação. Citaremos o arcaismo de “nenhures”, hoje ainda em uso por toda a freguesia e de emprego corrente; “prantar” = pôr (em cima) ou plantar; ”asseada” no sentido de limpo, janota, bem vestida; “pândega” = baile, dança (casa de pândega = casa onde se dança ou casa sem governo); “quedo” = quieto (esteja 597

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quedo! = esteja quieto!); “nina” =menina, rapariga (ó nina = ó rapariga chamar à atenção), “nino” =menino, rapaz; “vocemecê”= você, o senhor, a senhora. As interjeições mais comuns são: ”eixe!”, utilizada pelas raparigas em resposta a uma graçola ou comentário que lhe foi dirigido e que possa ser considerado ofensivo, ou a pessoa com que se tem relações cortadas, “cantés!”, com significação de “quem dera!”. São vulgares as formas abreviadas “´nha”, “mê”, “ti” (ex: ´nha mãe = minha mãe; mê pai = meu pai; ti Maria = tia Maria), bem como a substituição do “S” por “L” em “mais” quando se lhe segue o artigo definido (mai-la Teresa = com a Teresa ou mais a Teresa). Na freguesia empregam-se, também, muitas das expressões e frases idiomáticas generalizadas no país, por vezes com pequenas variantes locais, tais como: Adeus minhas encomendas! Ala que se faz tarde! Bate certo! Dar por paus e por pedras Andar de candeias às avessas Estar com grão na asa Nem à mão de Deus padre Por dé-réis de mel coado Ver estrelas ao meio dia Também são vulgares rifões, velhas sentenças inspiradas na faina agrícola, em crenças e na vida caseira de todos os dias: «Toca (ouve-se) o sino de Botão, é sinal de suão (vento quente de sudeste)»; «Toca o sino da Torre (Torre de Vilela) é sinal que chove» «Suão em lua cheia, trinta dias rabeia»; «Vermelho para o mar, aparelha o burro e põe-te a andar»; «Ano de peras, ano de pão»; «Ano de erva, ano de merd…»; «Quem dorme, dorme-lhe a fazenda»; «Lua Nova trovejada, trinta dias é molhada»; «Fevereiro quente traz o diabo no ventre»; «Não rias do mal do teu vizinho, porque o teu já vem a caminho». Existem algumas expressões de pedido de ajuda ao Santo António: «Valha-nos Santo António»; «Que Santo António nos acuda»; «Nem Santo António me vale» 598

XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

1.1. As Saudações Utilizam-se os tradicionais “bons dias”, “boas tardes” e “boas noites”. Contudo, ainda são usadas expressões de antanho, de grande respeito: “salve-o Deus”; “Nosso Senhor lhe dê muito bons dias”; “Deus lhe dê a salvação”. Mas, se o cumprimento é feito parado, o início de conversa segue um ritual de pergunta/resposta: - Como está, passou bem? - Bem, como passou? - Eu bem, muito obrigado. - E vocemecê? Para despedida “Deus lhe dê saúde a si e aos seus”, responde a outra pessoa “igualmente!” ou no caso de conversa entre mulheres “Nossa Senhora os guarde”, nomeadamente quando há familiares ausentes. Antigamente, e após o toque das Trindades, ninguém falava a quem ia à sua vida. Quando a conversa decorre com alguém que não se sabe o nome, pergunta-se “a quem devo a salvação?” ou “a quem devo a graça?”, que significa perguntar o nome da pessoa. 1.2. Quadras populares O meu amor disse que vinha Aquando a lua viesse A Lua já vai Alto E o meu amor não aparece Oh lugar de Souselas Da rua Direita à Botica Não sei que amor é o teu Que tanto me mortifica Adeus ao lugar de Souselas Ao cimo ao fundo não Ao cimo uma rosa Ao fundo um manjericão Eu não canto por cantar Nem por bem cantar o digo Eu canto p´ra espalhar Paixões que trago comigo 599

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Se ouvires cantar ao longo Escuta com atenção É ao som da minha voz Que estremece o teu coração Com os olhos negros cautela São olhos para queimar É chama que tudo queima Não é luz de alumiar Oh amor abala abala Abala e vem-me ver As cartas não valem nada Para mim que não sei ler»

2. Danças, Cantares e Instrumentos O Cancioneiro Popular da Freguesia de Souselas é rico e variado e traduz um registo fiel dos costumes, tradições e alegrias das suas gentes. Cantadas na apanha da azeitona, nas vindimas, nas desfolhadas e descamisadas, aos portais das casas, a caminho e nas romarias, nas igrejas. Os descantes eram cantados em coro, acompanhados por instrumentos tradicionais, jogos de roda ou modas de bailar, dançar de grupos, canções de romaria referentes a ciclos tradicionais culto, por vezes misturando religioso com profano e canções alusivas ao trabalho, as janeiras, as alvissaras e os cantares do folclore religioso. Os instrumentos tradicionais que acompanhavam os folguedos e danças de rua eram: a concertina, o violino, a viola, o bandolim, o cavaquinho com abertura redonda, e a viola-toeira. A precursão e o ritmo eram marcados com instrumentos como os ferrinhos, o reque-reque, o bombo ou em alternativa o pandeiro. O conjunto de músicos ou tocadores era conhecido localmente, como a tocata ou toque. De todos os instrumentos a viola-toeira de Coimbra, pela sua história e importância, merece uma referência especial. Trata-se de uma viola popular de cinco ordens de cordas de “arame”. Descrita em1789 por Paixão Ribeiro, mas já referenciada no séc. XVI por Juan Carlos Amant, que a indica numa “guitarra” desse tempo. Hoje quase desaparecida, mas com grande implantação e uso alargado no último quartel do séc.XIX, antes da imposição da guitarra de Coimbra, era usada prelos estudantes nas serenatas e cantares. Popularizada nas gentes rurais, a acompanhar os seus cantares, fossem festivos ou profanos, amorosos ou de desafio. A viola-toeira 600

XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

conserva o velho encordoamento de cinco ordens, com doze cordas, as três primeiras duplas e as duas ultimas triplas. O toque em Coimbra associa o dedilhado, o ponteado e o rasgado. Peças de elevada beleza, com elementos decorativos de luxo no cravelhal e no tampo. O Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas possui um belíssimo exemplar (foto 188) que mandou reproduzir e tem promovido, ao longo dos anos, o toque e divulgação deste instrumento tradicional do folclore Coimbrão. As festas e romarias eram animadas pelos Gaiteiros, conjunto de três músicos, gaita-de-foles, bombo e caixa. Competia aos Gaiteiros iniciar a festa, atroando os ares com a alvorada, logo ao romper do dia, percorrendo as ruas principais da localidade em festa, animando com a barulheira das suas arruadas. Este modo ainda se mantém, mas com alguns temas musicais diferentes da velha tradição musical da gaita-de-foles. O Gaiteiro ou Zé P’reira era e é acompanhado por mordomos e pelo fogueteiro, que lança fogo aqui e acolá e os mordomos vão de porta em porta recolhendo a esmola (contributo) de cada família para a festa. Tal como ao passado ainda se pára para “beber um copo” e comer uma “bucha”. Em algumas localidades da freguesia (Marmeleira, Sargento-Mor e S. Martinho), os gaiteiros tocavam e ainda tocam na procissão, abrindo a mesma, abordando temas do cancioneiro religioso. De referir que o único Gaiteiro ou Zé P’reira conhecido na Freguesia teria existido na Marmeleira e aparece referenciado por Henrique Nazareth (1951). Outros instrumentos tradicionais são referidos pelos mais antigos, nomeadamente, a flauta bisel e a flauta travessa, ambas ligadas ao ciclo pastoril, feitas de cana e com os furos abertos a fogo, usadas pelos pastores. Aos Domingos e dias de festas o povo juntava-se nos largos das Igrejas e Capelas, eiras e terreiros, onde se falava da vida da terra, da vida alheia, se namoriscava e também se cantava e dançava. Nas danças predominava as modas de roda, viras e verdes-gaios, que eram dançadas no Largo da Igreja, das capelas e do Sr. Terreiro, nas eiras, nos soalheiros, nas fogueiras e romarias. O folclore da freguesia caracteriza-se por danças de influência da região bairradina, gandaresa e vareira, do Norte de Portugal e em menor escala de Coimbra. Esse facto deve-se à sua posição de charneira de transição para a bairrada, para o litoral, o norte e o interior, tendo por isso sofrido fenómenos de aculturação. Ocorrem danças em colunas, traçadas, valseadas e de roda. O vira-roubado e o verde-gaio são dois exemplos da influência do Norte. Os andamentos são fortes e a música alegre e viva. 2.1. Modas de Roda, Viras, Verdegais e outras Vira-roubado e o Verde-gaio eram dançados aos Domingos e dias de festas essencialmente em Souselas, no largo do Sr. do Terreiro. O vira é uma das danças 601

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populares mais antigas, com as suas raízes no Norte de Portugal, Gil Vicente no séc. (XV /XVI) referencia-o na peça Nau d`Amores. Em Souselas dançava-se aos Domingos e dias de festas o Vira Roubado. Cantado ao desafio por homens e mulheres (cantador e cantadeira), sem estribilho como manda a tradição. Baila-se à moda do norte, exemplo claro de influência do folclore do norte de cruz e entre passado de dois pares, que vão sendo substituídos roubados ao longo da dança e onde entra somente quem tem pé leve, tal é o ritmo que é tocado: O vira da minha terra Ai o vira da minha terra Ai não é como o de Alcobaça (bis) Ai não é como o de Alcobaça O de cá é passa e vira O de lá é vira e passa (bis) Meninas virai virai Meninas virai virai Que a mãe do vira morreu (bis) Que a mãe do vira morreu Já não há quem cante o vira Quem vai cantá-lo sou eu (bis) O Verde-gaio de Souselas, com origens nas danças do Norte entre Douro e Minho, dançando em colunas traçadas a dois passos, ditando o Verde-gaio de Coimbra, este dançando de roda, foi considerado pelo professor Dr. Tomas Ribaz, do Gabinete de Folclore e Etnográfico do INATEL, como uma jóia do folclore: As penas do verde-gaio São verdes e amarelas (bis) Não me empurres se não caio Não me tenho nas canelas (bis) Oh verde-gaio Verde-gaio tráz tráz Oh verde-gaio És o meu rapaz (tudo bis) As danças de roda, características da Beira Litoral, eram essencialmente dançadas nas eiras, terrenos e soalheiras, por vezes ao fim do dia de trabalho. 602

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As mais representadas são o Canavial das canas e o Ai se ouvires assobiar – este último cantar e dançar ficou da faina da vindima. 2.2. Danças de Fogueiras Segundo Nelson Correia Borges (1987) as danças marcadas à francesa deram origem às modas obrigadas a mandador, o que se tornou característico na região, nomeadamente nas Fogueiras de S. João. Tal é o caso de uma modinha recolhida em Souselas Não vou lá cima à sala dançada de roda, segundo a marcação ditada pelo mandador. O Pé com pé, O Chapéu novo e o Não vou lá cima à sala eram dançados nas festas dos santos Populares, Santo António, São João e São Pedro à roda da fogueira, ou em “pavilhões” recanto e emoldurado com arcos e mastros, e ornamentado com flores e verdura. O Não vou lá cima à sala era dançado de roda às ordens do mandador, conhecido por Pádua. 2.3. Breve historial dos Ranchos na Freguesia de Souselas Aquando da filiação do Grupo Etnográfico de Souselas, na Federação do Folclore Português, em 1988, elaborou-se um questionário, onde o dito grupo, em resposta, historiou a actividade dos ranchos em Souselas, a partir dos registos materiais e orais conhecidos. Esse documento, importa agora transcrever, dada a sua importância histórica: «1º rancho existente em Souselas data de 1910, agrupamento esse que se formou para comemorar a implantação da República (foto 189). Desconhece-se o nome do rancho, seu fundador assim como o ensaiador, dado que não existe nenhum testemunho vivo e as pessoas mais idosas não se recordam; existe apenas um documento fotográfico. Outra data a realçar, é a de 1920, onde se verificou nova formação; o seu fundador também continua desconhecido, mas o seu ensaiador, chamava-se Sr. [Manuel] Eliseu. Em 1927, continua como ensaiador o Sr. Eliseu, sendo o fundador o Sr. José Rodrigues, mudando o ensaiador – Sr. Manuel Morais. Aqui já se distinguem 2 ranchos: infantil e adultos. Em 1957 surge o Sr. Daniel [Pinto] como ensaiador, mantendo-se o fundador. Chamava-se então “Rancho Folclórico As Camélias de Souselas”, cujo emblema, era uma camélia bordada nas blusas e camisas dos componentes e para o qual foi criada uma bandeira, sendo esta transmitida aos ranchos seguintes (fotos 190 e 191). Este rancho já começa a deslocar-se a alguns pontos do País. Vem a ser dissolvido devido à “ausência obrigatória” para o serviço militar no Ultramar. 603

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Nova data de maior actividade, foi em 1963, cujos fundador e ensaiador se mantém assim como o nome (…) Em 1975 o rancho contínua com o mesmo nome sendo o fundador e ensaiador a Sra. Adelina, estagiária dos Serviços Sociais. (…) Este rancho não registou paragens até aos dias de hoje; há assim uma sucessão de ensaiadores, cujos nomes são: Sr. Daniel Pinto, Sr. Victor Lopes. Deixa de haver fundador para passar a haver uma direcção. O rancho infantil (foto 192) continua até aos dias de hoje, ressurgindo em 1984 o rancho dos adultos, cujo ensaiador continua a ser o Sr. Victor Lopes; pouco tempo depois é ensaiadora do grupo a actual coordenadora técnica, Isabel Santos. Por motivos de vária ordem o ensaiador passa a ser o Sr. Paulo Marques; este permaneceu até Outubro d 1986; de Outubro de 1986 a Janeiro de 1987 data em que a actual coordenadora toma conta do grupo, este foi “socorrido” pelos dois principais componentes do grupo atrás referidos. O grupo etnográfico surgiu, pelo facto de em data muito anterior a Janeiro de 1987, os dois elementos já mencionados iniciarem todo um trabalho moroso de investigação e recolha dos costumes e tradições do povo de Souselas [João Pardal e Ana Paula Moreira]. (…) O Rancho infantil continua, servindo este como escola ao actual Grupo Ernográfico (…) Actualmente, o Grupo Etnográfico de Souselas está devidamente organizado, tendo como tal direcção e estatutos próprios»(855). Os locais onde preferencialmente se dançava em Souselas eram: no Largo da Igreja e em volta do antigo Cruzeiro, junto da Capela do Senhor do Terreiro. Dançava-se e cantava-se ao som da Rebeca, Concertina, Viola e Cavaquinho. Canto e dança que intercalavam a actividade profissional das gentes - na vindima, na ceifa, na apanha da azeitona – e que aparecia em força com a realização das fogueiras e aquando das romarias. Na Marmeleira também existiram dois ranchos folclóricos (foto 193), correspondentes a duas zonas do povoado, a Rua de Cima e a Rua de Baixo (sendo a fronteira a Rua da Oliveirinha), que exprimiam grande rivalidade. O rancho de cima, designava-se “Corações da Mocidade”, e teve como ensaiador o botanense Daniel Pinto. O de baixo tinha como ensaiador Manuel Rama. Em Sargento-Mór, por volta de 1976, estava em actividade o Rancho Folclórico Infantil “Os Ceifeiros”. Por esta altura também existiu um Rancho Folclórico de adultos.

A.G.E.S. – Resposta ao questionário remetido pelo Grupo Etnográfico de Souselas à Federação do Folclore Português, 1988

(855)

604

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3. Os Trajes O traje nasce em perfeita concordância com o meio geográfico onde o homem constrói o seu habitat. Os materiais usados podem ser de origem vegetal (linho, estopa, algodão, palha, etc.) ou de origem animal (lã, seda, pele de ovelha, cabra, bovino, etc.). Em Portugal não existe um traje nacional, a forma de vestir varia de região para região (foto 194). Citando Nelson Correia Borges (1988) o traje é, pois, um dos valores culturais que melhor exprimem a maneira de ser e a arte de um povo, em suma, um dos melhores expoentes da sua individualidade. Na Freguesia de Souselas o traje divide-se por categorias, em natureza da sua função e do estatuto social. Nos trajes de trabalhos temos: cavador, vindima, apanha da azeitona, pastores, moleiros, zézito (moço das casas abastadas, que acompanhava o gado e realizava outras tarefas mais simples), lavadeira, mulher da lenha (ia para Coimbra vender lenha ou ajudar a descarregar as barcas serranas que traziam de Penacova lenha para a cidade), ceifeira e eiras, vendedeiras (tremoceira, vendedeira da feira, vendedeira de “bolos de cornos”), feirantes, festas e romarias (romeiro e romeira), domingar (lavradores ricos e remediados), ver a deus (traje de missa e de quaresma), meia senhora, bairradina. A forma de vestir das gentes de Souselas sofreu várias influências. A influência de Coimbra está espelhada no traje de vendedeira, mulher que se deslocava às feiras e à Praça do Comércio, a Coimbra, para aí vender aquilo que a “terra dava”: hortaliças, feijão, batata, milho, etc. O uso do xaile e a sua forma de colocar, sob o ombro direito e traçado sobre o ombro esquerdo deixando o braço e a mão direita livres, são características do retoque das mulheres de Coimbra. Também o uso da mantilha, no traje de domingar da mulher, chegou de Coimbra. A influência da Bairrada e da Gândara está espelhada no uso, pela mulher, do chapelinho de veludo, com pena, e enfeitado com lenço bordado e flores de papel, no caso dos dias de festa e romaria. O traje de bairradina e das cores vivas e garridas de alguns tecidos e da policromia do vestuário da mulher, também estão presentes. O traje da mulher tinha um elemento fundamental, o chapéu de veludo. chapelinho de veludo de abas coladas à copa e pena, também conhecido por gandarês ou bairradino (foto 196) usava-se na parte Norte da Freguesia, nomeadamente em Sargento-mor. O chapéu de veludo de meia aba com laço de lateral era comum a toda a Freguesia e era usado no trabalho do campo. O chapéu de veludo de meia aba e pena de pavão era usado aos domingos e dias de festa. Quando a mulher ficava viúva retira a pena do chapéu. O lenço era de lã, os cachenés, de sede e de chita de Alcobaça. A mulher colocava o lenço a gosto ou em função da época do ano ou do acto cerimonial. 605

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Poderia ser atado por cima do chapelinho de veludo, preso das abas do chapéu de veludo, atado atrás da nuca e ponta para o lado ou centrada, lenço com nó taras da nuca e as pontas por cima deste, com novo nó. E nos actos cerimoniais, nomeadamente religiosos, tapava toda a cabeça deixando visível o rosto, com envolvência do pescoço atando atrás. 3.1. Descrição de alguns trajes usados pelas nossas gentes a) Traje de ver a Deus Usado pelas mulheres, principalmente, nas cerimónias da semana santa. É constituído; por saia de merino de lã, preta, debruada e enfeitada com fita de veludo; saiote branco com renda; blusa linho com rendas ou de branca ou azul, lenço de seda natural, geralmente do casamento que acompanharia a mulher na mortalha (morte); capoteira (capa) de fazenda de lã debruada a veludo, podendo ter com enfeites de lentejoulas, meias de algodão branco, rendadas, e chinelas de verniz preto. A capoteira é a peça mais elaborada e simbólica deste trajo. b) Traje de Romaria Usado pelas gentes de Souselas quando iam para as romarias. O Traje de Romeiro: chapéu de aba larga preto com o Santo (geralmente o Padroeiro da Festa em que participava) e uma flor; camisa de pano alinhado branco com nervuras no peitilho; calças e colete de virados de burel preto; meias pretas e botas de sola de cordões; meias pretas e faixa de lã preta. É portador de um pau onde transportava um quarto de madeira com vinho. Levava um lampião para alumiar o caminho no regresso. Traje de Romeira: lenço de seda; chapéu de veludo preto; colete preto atado com cordão de seda preto; chambre de riscas de seda creme, com rendas; saia de algodão estampada (vermelho, azul, castanho, verde, creme) com forreta creme e fita de algodão. A mulher com menos posses trajava da seguinte forma cachené de lã preto e verde; blusa azul e branca de gorgorina com rendas; saia de merino mosca preta; avental de popeline cor-de-rosa com renda em toda a volta e saiotes brancos. Na mão leva os chinelos que só calçava no local de romaria. À cabeça leva uma condensa com o farnel, tapada com um pano de linho e suportada por uma rodilha. c) Traje de Noivos Traje usado na cerimónia do casamento e que por vezes acompanhava na morte. A melhor roupa, por vezes era a de casamento, designada por mortalha, acompanhava o defunto na sua última viagem. 606

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Mulher: saia de merino de lã preta, debruada e enfeitada com fita de veludo, casaquinha de merino de lã preta ornada a veludo, saiotes brancos com rendas, blusa de paninho branco com rendas, de punhos, lenço de tule ou cambraia bordado, meias rendadas de algodão branco. Na mão a noiva fazia-se acompanhar de uma saca das amêndoas cor de salmão, bordada com aplicações de flores verdes e cordão de seda vermelho, podendo ter monograma com as inicias do nome da noiva. Brincos de ouro de fuso ou de cabaço, e cordão de ouro com crucifixo ou Nossa Senhora da Conceição. O calçado eram botas pretas. Mais tarde a casaquinha foi substituída por xaile de merino de oito pontas. Homem: calça, jaqueta e colete de borel (tecido de lã preta, camisa de linho, branca, com peitilho pregado e bordada com monograma, com colarinho de bicos, faixa de merino preta, apertada com colchetes, chapéu de aba larga preto, botas pretas, correte de ouro a atravessar o colete. Mais tarde, passou-se a usar casaco de elasticocotina, podendo o colete de ser tecido de lã aos xadrezes, calças de cinta subida e faixa de cetim preta. Botas de couro, pretas. d) Trajes de domingar Homem: Nos lavradores abastados jaqueta, calça e colete de burel; a jaqueta com botões de metal ou a prata e aplicação em cordões de seda ou alamares de prata; camisa de pano alinhado, com aplicação no peito de fustão; chapéu preto de aba larga; bota preta de sola; cinta ou facha de lã preta. Nos lavradores menos abastados a jaqueta e as calças eram de serrobeco e o chapéu de aba larga castanho. Mulher: Lavradora abastada lenço de seda esverdeado; chapéu de veludo preto com pena, xaile Cachemira ou de barras; chambre branco, de casquinha de ovo ou de linho com aplicação de tiras bordadas; saia de armur de algodão forreta e fita de algodão a debruar; saiotes brancos com rendas; colotes brancos com renda; meias brancas e chinelas pretas. Poderia fazer-se acompanhar de chapéu-de-chuva com cabo em marfim. e) Traje de Bairradina Usado pela mulher nas festes e romarias, nomeadamente as mais novas. É constituído por: saia de algodão, blusa de algodão de cor com enfeites, sem ou com avental de cor, com rendas, saiote vermelho de saiote com cor, faixa de cor vermelha ou branca, lenço de lã, chapelinho de veludo de abas coladas à copa, debruado a veludo, com pena preta de pavão e fitas de veludo , lencinho branco bordado e flores de papel (oferta dos namorados para uso no chapéu) meias rendadas de algodão branco, chinelas de verniz preto. 607

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f ) Traje de Feira A feira era um momento, especial, quase mesmo festivo, comprava-se e vendia-se o gado e os produtos que a terra dava. O traje de Feira era mais elaborado o homem usava essencialmente calças e jaqueta de serrobeco, camisa de linho, chapéu de aba larga castanho, bota de couro castanha. Acompanhava-o a corda para prender o gado e o picão. A lavradora abastada usava saia de lã cor de mel, colete do mesmo tecido, debruado ou não a veludo com abotoadores de prata, lenço de seda natural, chapéu de meia aba revirada, ornado com fitas de veludo e penas pretas, meias de algodão branco rendadas e chinelas de verniz pretas, cinta branca de renda. g) Traje de vendedeiras Registavam-se três tipos de vendedeiras a tremoceira, a vendedeira das feiras, onde vendia o que recolhia na terra, couves, feijão, batata, fruta, etc, e a vendedeira dos bolos-de-cornos, que percorria as feiras e romarias. Traje Tremoceira (Traje usado pelas mulheres na venda dos tremoços ao domingo). Os tremoços depois de serem cozidos eram colocados dentro de um saco de serapilheira em água corrente das valas ou ribeiros, de forma ao tremoço perder o amargo.O traje era constituído por saia de chita às flores, avental de riscado azul e branco, saiotes de riscado, faixa azul de lã, chapéu de veludo de meia aba sem pena, debruado a veludo com enfeites de fitas de veludo, rodilha ou sogra de lã, algibeira, chinelas pretas ou tamancos pretos, cachené era azul com ramagens. Açafate para os tremoços, pano de linho lavrado para tapar, medidas, cartuchos de papel pardo. h) Trajes de trabalho do campo Nos trajes de trabalho eram feitos de tecidos simples e baratos como o cotim, o riscado, as chitas o zuarte, o pano-cru, o serrobeco, O calçado era constituído por tamancos ou botas. A cabeça era protegida com chapéu de cotim, carapuça ou chapéu de palha. O lenço era de algodão e faixa de lã.As características do traje variavam ligeiramente conforme a estação do ano e a faina agrícola em causa. O cavador era um homem simples que andava à jorna a cavar a terra ou a plantar a vinha. Usava calças de cotim, arregaçadas para proteger o tecido, ceroulas de riscado, camisa de riscado, camisola de resguardo, lenço tabaqueiro ou suadora, carapuça preta, faixa de lã preta colocada na região da cinta para a evitar rupturas dos tecidos abdominais, tamancos e gabão, que constituía o agasalho. O Gabão é uma peça de vestuário única, de origem ancestral, talvez na Roma antiga, uma mistura de veste monástica e de traje civil medieval, a capa com 608

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mangas e capuz, usada durante toda a Idade Média, é sem dúvida o elemento mais emblemático deste traje. Trata-se de uma capa ampla e rodada, descendo até aos tornozelos, com farta romeira ou cabeção curto e recortado, mangas largas e capuz em bico. É aberto à frente de alto-a-baixo, aconchegado ao pescoço por um colchete terminando por uma cadeia, ou por um alamar, ambos em metal, raras vezes de prata, no caso do uso por um lavrador abastado. De cor preta feito de burel ou de cor castanha, se feito de serrobeco. Acompanhava-o o enxadão ou o alvião e a cabaça com o vinho. i) Traje de Vindimas No homem: carapuça de lã preta ou chapéu de cotim, calças e colete com ou sem virados, em serrobeco castanho ou de cotim; camisa de riscado com peitilho cinzento, vermelho e azul, faixa de lã preta; lenço tabaqueiro ou suadoiro vermelho; botas de cabedal com cordões e rastos de sola. Faz-se acompanhar de um poceiro. Na mulher: cachené de lã azul, verde, castanho e amarelo; chapéu de veludo preto sem penas; chambre de tubralco azul com flores brancas; um saiote de flanela e outro de popeline; saia de castorina azul-escuro com forreta grená e fita de algodão preta a debruar; avental de chita vermelha, azul e branco; colotes; faixa de lã preta; algibeira e tamancas pretas, acompanhava o cesto de verga, feito de verga de salgueiro, tal como os poceiros. j) Traje da apanha da azeitona Homem (varejador): carapuça de lã preta; colete e calças de serrobeco; camisa de riscado em flanela verde, castanho e vermelho com peitilho; lenço. Levava consigo as varas de tamanhos distintos em função de varejar, a oliveira, a partir do chão ou em cima desta, serrote e panais de serapilheira. Acompanhava o buzio para dar ordens ao pessoal de início de trabalhos, paragens para almoço e merenda, e fim da jornada. Mulher: saia de riscado, blusa de chita, manguitos para proteger as blusa e os braços saiote de algodão de cor, avental de riscado, faixa de lã preta, lenço de algodão, xaile traçado de agasalho, chapéu de veludo meia aba e tamancos. Acompanhava o cesto verga que transportava o farnel e servia para a apanha da azeitona. l) Traje de Ceifeira Traje usado pelas mulheres nas ceifas era constituído por saia de vermelha, blusa de algodão, avental de riscado, saiotes de riscado, faixa de corda que alteava a saia e onde colocava a chave da casa, lenço de lã, cachené, chapéu de palha de aba larga, tamancos, foicinho e cabaça da água 609

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m) Traje das Crianças Rapaz. calças ou calções de zuarte, por vezes remendado, chapéu ou boné de cotim; camisa de riscado; tamancos ou botas. O brinquedo era o arco de ferro e por vezes fisgas. Rapariga: vestido e avental de gregorina, tamanquinhas. Tranças apanhadas em cima ou caídas, com lacinhos. O brinquedo era a boneca de trapos. 3.2. Adornos dos trajes a) Os xailes O xaile é elemento de indumentário importante no traje da mulher. Chegou à Europa no séc. XVIII, trazido da região de Caxemira na India. Mais tarde passaram a ser fabricados na Europa, Alemanha, França e Inglaterra, de lã de cabra, lã merina, de seda e algodão. Os xailes teriam chegado a Portugal na mesma altura, pela mão dos marinheiros. Inicialmente artigo de luxo viu o seu uso generalizado nos fins do séc XIX início do séc. XX. Peça transversal ao traje, veio substituir outras peças de agasalho, como a capoteira e o mantéu usadas pelas mulheres de Souselas. Havia os xailes de cachemira, chinês, de barras, de orvalho, e de oito pontas (foto 195). De formato geométrico é dobrado de sorte e fica de três pontas. Colocado aos ombros, pode ficar caído pelos ombros e de pontas soltas, por vezes atado em volta da cintura para melhor proteger do frio, ou então traçado, como as tricanas. O xaile estava sempre presente na vida mulher. O seu uso dignificava a mulher e por vezes na pobreza permitia “esconder as misérias”. O xaile aconchegava o recém-nascido, resguardava do frio e da chuva. No luto cobria o corpo da mulher e era tingido de preto e por vezes servia de mortalha. Na herança era a peça que passava de mãe para filha. Acompanhava a mulher nos trabalhos, pois permitia ter os braços libertos para as diferentes tarefas. Nos domingos, dias santos e festa era a peça de adorno. b) Ourivesaria Portugal possui uma ourivesaria rica e um gosto especial pelo ouro. As peças de ourivesaria para além de adorno pessoal são também a definição de personalidade dentro de cada uma das classes. Os vestígios, no Norte de Portugal, das explorações ouriferas vêm do período pré e pró-história estando a sua actividade documentada no território Português desde os finais do III 610

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Milénio A.C.. Através da arqueologia chegaram-nos muitos artefactos: dialemas, brincos, anéis, braceletes, espirais anelares, peitoris em forma de lúnula, alfinetes de cabelo e pequenas pérolas de colares. O povo tem uma tradição vincada no uso de objectos e ouro, apesar da Freguesia estar distante dos centros produtores da ourivesaria, Gondomar e Povoa do Lanhoso, está perto dos grandes distribuidores, os ourives da região da Gândara (Cantanhede e Mira), por isso se explica que o traje da mulher e do homem de Souselas serem adornados com objectos de ouro. O ouro para além da fracção de decoração do corpo, tinha um elemento significado simbólico social e religioso (no uso das peças como elementos religiosos, como cruzes e relicários). As peças de ouro eram usadas como complemento do traje, essencialmente nos períodos festivos e em períodos de rituais de iniciação como a comunhão. Quando a menina nascia eram furadas as orelhas, ainda em tenra idade, com uma agulha de costura e colocado um fio de linha para impedir o fecho do orifício, mandava a tradição local, que que por altura do baptizado o padrinho oferecia as arrecadas. Se fosse rapaz competia ao padrinho oferecer no baptizado um fio de ouro de barbela. Aliás, o uso de arrecadas deveria ser tão enraizado nas mulheres da freguesia que Rocha Madail (1941) no seu livro Alguns Aspectos do Trajo na Beira Litoral, fala nas arrecadas usadas pelas mulheres de Sargento-Mor. Ao longo da vida as mulheres iam amealhando algum dinheiro para aos poucos comprarem. O ouro funcionava como seguro para os períodos aflitivos de crise, quando era necessário recorrer à penhora, com dizia o Povo vão-se os anéis ficam os dedos. Aquando da morte da matriarca ou patriarca da família, dividia-se o ouro nas partilhas, o cordão ficava para a filha mais velha e a corrente do relógio ficava para o filho mais velho. O restante ouro era repartido em partes iguais, podendo haver direito a “tornas”, forma de compensação. As peças mais comuns e usadas pelas gentes da Freguesia eram: Mulher: brincos - Arrecadas –de tipo mediterrânico redondos e largos, com uma lúnula central solta, com pedras de cor falsas, com fio em agulha para enfiar nas orelhas; Brincos de Fuso, por vezes com aplicação de filigrana e com pedras ou esmalte; Brincos “á Rainha”; Brincos de Cabaço (foto 197); Argolas, argola de uma andala. Nos fios, cordão de três voltas (variando a grossura da malha em função da capacidade económica) de argolas fechadas em pinça onde se pendurava as libras ou imitações; Colares de contas de filigrana; Cremalheiras – colar de malha em rede ovalizada guarnecido de pequenas peças de ouro, os espelhos e cujas as portas terminadas em bordas se cruzavam era parte interior donde pende um grande e vistoso medalhão O Florão. 611

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Como pendentes, Cruz de Malta com filigrana de ouros e com incrustações de esmalte, o esmalte poderia ser branco, azul e verde; Crucifixo- trabalhado com aplicações de filigrana, Laça – com rosas e ao formato de “Coração Invertido; Nossa Sra. da Conceição - Imagem de esmalte, dentro de um caixilho em ouro (foto 198); Alfinete de mulher – Geralmente de filigrana, por ser mais barato. No homem: corrente de ouro para o relógio de bolso (foto 199), por vezes com um medalhão central. A corrente de ouro, bem como os adornos de prata com os alamares da jaqueta, eram usados pelos lavradores ricos nos trajes de domingo. Os lavradores remediados usavam uma corrente de prata.

4. Costumes e tradições Souselas é uma terra antiga, que pelo seu secular povoamento lhe confere uma riqueza cultural enorme, nomeadamente de costumes e tradições. Muito se perdeu com o passar dos anos e dos séculos, mas felizmente através do trabalho do Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas foi possível recolher parte do património cultural. Iremos fazer referência a alguns costumes das gentes de Souselas, estando eles divididos costumes de natureza profana e religiosa. 4.1. Religiosos a) Do Natal até aos Reis, o ciclo dos doze dias O Natal é uma das mais importantes festas do ano litúrgico. Na missa do galo, ocorria um particular acto de solidariedade entre o povo de Souselas: «Todas as crianças da aldeia levavam para a missa nessa noite, roupa, ovos, enchido, milho, broa, galinhas, etc. que depositavam junto ao altar; no fim da missa, era tudo distribuído pelas crianças da aldeia e por vezes alguns lavradores mais abastados compravam aquilo que os filhos tinham levado e esse dinheiro revertia a favor dos pobres». No dia de Natal, havia um canto religioso em adoração ao Menino Jesus; “Louvado Sejas”. Cantava-se enquanto o Senhor Padre dava a beijar o Menino Jesus, no fim da missa, sendo repetido no dia de Ano Novo e no Dia de Reis: Os Homens diziam: Bendito Louvado Sejas O Menino Deus Nascido E as mulheres: Mais o ventre que o trouxe Nove meses escondido 612

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Contudo, no ciclo de Natal existem aspectos não cristãos, pagãos. Segundo Luís Chaves, em Folclore Religioso (1944), são essencialmente agrícolas e solares: os primeiros referentes à estação, com festas agrárias e familiares de celebração romana, os segundos, alusivos a Mitra, o deus Solar, que do Irão entrou em Roma, espalhando-se pelo Império. Com o solstício de Inverno começa o ano agrícola. O cantar das Janeiras (Cantar dos Reis) tem uma raiz pagã, recuperada pelo cristianismo. O mês de Janeiro foi instituído pelo rei Numa Pompilo que governou Roma, em honra do Deus Jano (do latim janua — porta, entrada). José Leite de Vasconcelos considera que as “Janeiras” estão relacionadas com as estreias romanas, que constavam de dávidas em frutos, mel e outros. Armando Lucena em Arte popular — usos e costumes portugueses considera que as Janeiras têm a sua origem nas “saturnais”, festividades em honra do deus Saturno realizadas entre 12 e 24 de Dezembro. Estas festividades caracterizavam-se pelo desaparecimento das distinções sociais, em que os escravos tomavam o lugar dos senhores, saindo-se pelas ruas em danças e cantorias (esta permissividade e libertinagem lembram mais o nosso entrudo). De facto, tudo indica a dádiva, a oferenda e o sacrifício dedicado à divindade terão sido transferidos parta o ofertório dedicado ao Deus Menino pelos Reis Magos. Tendo o ritual sido transposto mais tarde para o Povo de onde resultou o costume do Cantar dos Reis. Em Souselas, depois da consoada («consuada»), com a reunião da família, bacalhau com batatas, couves e uma cabeça de nabo, regado com azeite seguindo-se as filhoses, broinhas e a prova da jeropiga do ano, o povo juntava-se no adro da Igreja Matriz onde já ardia uma fogueira, com um grande cepo, e à meia-noite, com o nascer do menino dobravam os sinos e cantava-se o bendito, que também era cantado na missa de Natal durante a adoração do menino. Bendito: Bendito louvado sela BIS Homens O Menino de Deus nascido Mais o ventre que o trouxe BIS Mulheres Nove meses escondido Ó meu Menino Jesus BIS Q’ é da tua cabeleira Ficou em Santa Clara BIS No regaço de urna Freira 613

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Bendito louvado seja BIS Homens O Menino de Deus nascido Mais o ventre que o trouxe BIS Mulheres Nove meses escondido Noite de Natal (lenda religiosa) Pela noite de Natal Noite de tanta alegria Caminhando vai José Caminhando vai Maria Ambos os dois p’ra Belém Mais de noite que de dia; E chegaram a Belém, Já toda a gente dormia. Porteiro abri a porta Porteiro da portaria A porta não quis abrir A gente que não conhecia. Dilatem-se aí senhores Até que rompa o dia Não encontrando pousada Foram para uma estrebaria. S. José foi buscar lume, Porque a noite estava fria; E do céu veio uma estrela Que todo o mundo alumia Quando S. José voltou, Já viu a Virgem Maria, Com o Deus Menino nos braços Que no seu véu envolvia. E veio um Anjo do Céu Cantando - Avé Maria E Deus-Padre perguntou Como ficara Maria 614

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A Maria ficou boa Lá em uma estrebaria Entre um boi e uma mula E S. José por companhia Glória seja a Deus-Padre E a Jesus Cristo também Glória seja ao Espírito-Santo Para todo o sempre. Amen. O cantar das janeiras em Souselas é um costume enraizado na memória do Povo. Um momento oportuno para conseguir alguns bens alimentares, nomeadamente das casas senhoriais e dos lavradores abastados; tudo o que era dado para a saca de retalhos, morcela, chouriço, farinheira, nozes, castanhas, maças, pêras, por vezes uma moeda, vinho, jeropiga, broinhas, fi1hoses (etc.) era bem-vindo, pois para as famílias mais carenciadas poderia ser uma reserva de alimentos que ajudaria a passar os dias difíceis do Inverno que estava à porta. Em Souselas, e segundo as recolhas do Grupo Etnográfico da Casa do Povo, as crianças mais pequenas pediam os Reis durante todo o “Dia de Reis”, aliás, ainda hoje assim acontece, com grupos de crianças a irem de casa a casa, de porta a porta, com a sua saca, no passado de retalhos ou na falta dela o taleigo do milho para moer, utilizando a mesma expressão dos seus bisavós “dê-nos os Reis “. Aos mais velhos competia percorrer a localidade de noite, em grupos devidamente organizados, protegidos do frio pelas jaquetas, jalecas e gabões de borel ou sarrobeco (na falta destas peças de vestuário servia uma manta de retalhos), tendo como guia umas candeia ou um lampião, para os mais afortunados. Cantava-se de porta a porta, por vezes com viola toeira, cavaquinho, violino e bandolim, raramente ao som da concertina. A precursão era feita com pandeireta e ferrinhos. Na nossa região não abundavam as melodias de janeiras, contudo, era fértil em quadras. Em algumas circunstâncias tocava-se a mesma melodia toda a noite, variando as quadras, ao gosto de cada grupo e em função do momento vivido, sucesso ou insucesso em determinada casa e do tratamento dado pelos donos da mesma. Assim, e de entrada no balcão da casa, cantava-se: Inda agora aqui cheguei Logo pus o pé na escada Logo meu coração disse Aqui mora gente honrada 615

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Seguia-se o pedido: Ó senhora que lá está dentro Assentada num esteirão Deite a mão ao seu fumeiro E dê p ‘ra cá um salpicão Se a demora era longa, seguia-se: Se nos quiserem dar esmola Não nos esteja a demorar E de noite faz escuro Temos caminho p ‘ra andar Se a porta fosse aberta: Viva lã meu senhor Fita verde no Chapéu Quando vai p‘ra a igreja Parece um anjo do céu Para despedida: Vamos dar a despedida Por cima do laranjal Viva a senhora e o senhor Vivam todos em geral Ou então Quem diremos nós que viva Na folhinha do papel Adeus senhores desta casa Até ao ano se Deus quiser Se não fossem bem sucedidos Esta casa cheira a unto Mora aqui algum defunto Furricão furricão Que esta casa caia ao chão 616

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No fim da noite dividiam-se as dádivas, para na noite seguinte e após o chamamento do búzio se voltava à rua. (todos) Ainda agora aqui cheguei Logo pus o pé na escada Logo o meu coração disse Aqui mora gente honrada (homens) Oh! Senhora que lá. está dentro Assentado num esteirão Deite a mão ao seu fumeiro E dê p’ra cá um salpicão (mulheres) Ou o salpicão é grosso Ou a faca não quer cortar Faça-lhe ferrum fum fum Na borda do alguidar (pausa) (homens) Nós vimos de Trás os Montes Da terra dos bons pastores Vimos dar as boas festas A casa destes senhores (mulheres) Se nos querem dar esmola Não nos esteja a demorar É noite faz escuro Temos caminho p’ra andar (pausa) 617

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(homens) Viva lá minha senhora Raminho de salsa crua Debaixo da sua cama Nasce o sol, põe-se a lua Viva lá meu senhor Fita verde no chapéu Quando vai p’ra igreja Parece um anjo do céu (pausa) (homens) Esta casa está caiada Por dentro e por fora não Aos senhores que nela moram Deus lhes dê a salvação (todos) Vamos dar a despedida Por cima do laranjal Viva o senhor ou a senhora Vivam todos em geral (FIM)

Janeiras (vivas) (todos) As janeiras não se cantam Nem aos reis, nem aos coroados Mas nós vimo-las cantar Por ser anos melhorados 618

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(homens) Viva á senhor António Deus lhe dê muita alegria Viva também sua esposa Mais a bela companhia (música) (mulheres) Vimos dar as boas festas Nós também alegre vimos Mandem-nos o que puderem Bem sabeis p’ra quem pedimos (homens) Viva a senhora Maria Raminho de rosmaninho No meio de sua casa Parece mesmo um anjinho (música) (mulheres) Viva o senhor José Raminho de perfeição Quando está à sai janela Parece um manjericão (todos) Também viva, p’ra que viva Os compadres e parentes Vivam todos os da casa E mais os que estão ausentes (musica) 619

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(todos) Ora venha se há-de vir Venha com desembaraço Aqui está à sua porta O nosso moço do saco (todos) Ora venha se há-de vir Não nos esteja a delatar Que somos de muito longe Temos muito que andar b) Dia de Nª. Sra. das Candeias (venerada a 2 de Fevereiro) Mandava a tradição local que na noite de véspera se colocassem nos peitoris das janelas candeias de azeite acesas, para que Nª. Senhora desse um bom ano de azeite. Sobre este dia, diz o povo: Se no dia da Nª. Sra. das Candeias, o dia estiver a rir, está o Inverno para vir, se estiver a chorar, está o Inverno a passar. c) Quaresma e Páscoa Durante a Quaresma, o calendário religioso era totalmente cumprido e ai daquele que tivesse a ousadia de quebrar esse ritual. Por exemplo não se comia carne às Sextas-feiras, excepto se fosse paga a bula, hoje contributo penitencial, e não se participava ou fazia qualquer festa. Em Quarta-feira de Trevas, ou Quarta-Feira de Cinzas as imagens da Igreja eram tapadas com panos roxos e os sinos deixavam de tocar. Durante a missa era colocado, pelo padre, na cabeça dos presentes cinza de lenha queimada. No Domingo de Ramos acorre a Souselas gente dos quatro cantos da freguesia, para fazerem parte da Procissão dos Ramos (fotos 200 e 201). Incorpora e atrai gente de toda a freguesia, e faz-se da Capela do Senhor do Terreiro para a Igreja Matriz: os mais pequenos trazem uma cruz, feita de cana, pau de loureiro e verga, com os mais diversos feitios e enfeites, ou um simples arco em cana e verga, enfeitada com rosmaninho, alecrim e flores, adornadas com laranjas, bolachas, e guloseimas; os pequenos que não trazem cruz, seguram um ramo de loureiro ou uma palma, também enfeitado com laranjas, bolachas e rebuçados. Os homens empunham um ramo de oliveira e, as mulheres e raparigas levam um ramo com alecrim, rosmaninho, flores, folha de oliveira e loureiro. 620

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A tradicional procissão de ramos abre com cruz processional e, quando chega à igreja matriz, os portões são abertos após três pancadas com a cruz. O Dia de Páscoa era data muito importante no calendário religioso. Á missa de Páscoa, celebrada em Souselas, seguia-se a procissão da Ressureição. Manda a tradição deitar uma salva de fogo a Santos, para anunciar a ressurreição de Cristo. A Visita Pascal ou Compasso (foto 202) ainda se mantém realizando-se ao Domingo. Antigamente realizava-se ao Domingo, na sede da freguesia e, na Segunda Feira da Páscoa nas restantes povoações. O Senhor é dado a beijar de porta em porta; dia em que muitas famílias e amigos se reuniam pois era costume beijar o Senhor também na casa de parentes e amigos ou até em casa de familiares das outras terras vizinhas. Era um momento particularmente significativo: As pessoas recebiam o Senhor, enfeitando as entradas das casas e as ruas com rosmaninho, alecrim, cangorças, abróteas; depois, o Senhor era recebido no compartimento da casa que servia por vezes de sala e de cozinha; as pessoas que tinham um crucifixo colocavam-no em cima da mesa, com um pequeno vaso enfeitado de flores, ao lado uma laranja com uma moeda, não faltando na mesa os tradicionais bolos de Páscoa, arroz doce, vinho e geropiga e o respectivo folar para o Senhor Padre, que consistia em bens alimentares. No Domingo, a visita Pascal terminava na localidade mais afastada, o Pisão dos Canaviais, com um jantar de galo assado no forno da lenha. Conta-se que certo ano, ao atravessar o rio Resmungão, já de noite, o sacristão deixou cair o crucifixo ao rio, obrigando-o, no dia seguinte, a voltar ao local para recolher o mesmo, pois seguia-se a visita pascal na Zouparria do Monte. Nesta altura, era obrigatória a confissão, a que chamavam desobriga. d) Quinta-Feira de Ascensão A Ascensão era festejada pelo povo, sobretudo de tarde. Trata-se de um rito religioso com uma certa feição pagã, traduzida na Festa de Espiga, Quinta-feira da Espiga, ou o Dia da Espiga. Era tal a tradição, que até a escola encerrava actividade, para os alunos recolherem a Espiga, nomeadamente as meninas. A “Espiga” era recolhida no monte e nos campos. Trata-se de um ramo constituído por: uma ponta de oliveira, uma ponta de videira já com cacho em formação, três espigas de trigo, uma papoila e uma flor. Guardava-se religiosamente em casa de um ano para o outro. E assim dizia o povo, por vezes cantando na rua: Se os passarinhos soubessem Quando era dia de ascensão Nem comiam, nem dormiam Nem punham o biquinho no chão 621

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Outro dito popular diz: Chuva em dia de Ascensão, ano de pão Era tal a tradição e devoção ao Divino Espírito Santo, que nesse dia havia missa. À tarde as raparigas recolhiam flores silvestres que colocavam em açafate pequeno (de flores), que iam depositar no altar da Igreja em honra do Santíssimo Sacramento, finalizando o ritual cantando o Canto Ergo. Quando o padre procedia à bênção dos presentes, percorrendo toda a igreja com o Santíssimo Sacramento, as flores eram lançadas por cima, e cantava-se o Canto Ergo e o Bendito: Bendito louvado seja O Santíssimo Sacramento e) O cantar das “ALMAS” ou amentar das almas Durante o mês de Novembro, reunia-se um grupo de rapazes que, enquanto o sino tocava as almas, iam para os cabeços em volta da povoação e por um funil, funcionando como um megafone, entoavam a cântico: Se dormis cristãos, Acordai e rezai Pelas almas dos vossos irmãos Seguia-se uma série de Padres-nossos, por alma dos mortos da povoação. Quem estava dentro de casa, à lareira, ouvia no mais profundo silencia e respeito. f ) Toques dos sinos O toque dos sinos regulava a vida da freguesia, costume e tradição que entrou em desuso. Em meados dos anos 50 do séc. passado, segundo Henrique Nazareth, os sinos da Igreja Matriz tocavam de forma regular: Matinas, quando nasce o sol; Meio Dia, ao meio dia solar; Trindades, ao pôr do Sol – três séries de três badaladas espaçadas e depois um repique seguido de outra série de três badaladas, tudo feito no sino grande. A qualquer destes toques paravam os trabalhos, os homens descobriam-se (tirava o chapéu, boné ou carapuça) e os mais piedosos rezavam uma oração. Estes eram os toques diários a que se juntavam outros, ainda em uso: • Dobre ou toque a finados - tocam os dois sinos um a bordado e outro acompanhando. Se o falecido é uma mulher o toque repete-se uma vez, se for um homem, duas vezes. Se for uma criança, um “anjinho”, não há dobre do sino grande, apenas repique do sino pequeno; • Baptizados e casamentos – repiques contínuos de sino pequeno; • Saída e entrada de procissão - repiques contínuos de sino pequeno; 622

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• Toque para a missa dominical – toca três vezes, três toques a dobrado com o sino grande, a seguir a matinas, uma hora e meia hora antes da missa, com repique um quarto hora antes de se iniciar a missa, este ultimo toque é designado por “entrada”; • Toque às almas – executado todas as noites durante o mês de Novembro cerca das nove horas. Dobre do sino seguido de nove badaladas muito espaçadas, tocadas no sino grande e finalmente duas badaladas seguidas, no pequeno; • Toque a fogo e a rebate – só o sino grande em acelerado. g) Orações Oração do deitar; trata-se de uma oração invocatória da Graça do Espírito Santo: Com Deus me deito Com Deus me levanto (alevanto) Com a Graça do divino Espírito Santo Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ámen Padre-nosso pequenino: Padre-nosso pequenino Nosso senhor é padrinho Que me pôs a mão na testa O diabo não impeça Nem de noite nem de dia Nem à hora do meio-dia Já os anjos cantam, cantam Já o Senhor vai para a Cruz Para sempre à mão de Jesus. Ámen! Salvé rainha Salvé rainha pequenina Cravo do amor Rosa divina Mãe do Senhor Dai-nos luz, entendimento Para receber O Santíssimo Sacramento Ámen 623

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h) Pedir os Santórios No dia de Todos-os-Santos, 1 de Novembro, é costume em todas as localidades da freguesia as crianças andarem de porta em porta a pedir os santórios (“dê-me os santórios”) organizadas em grupo. Acompanhadas de uma saca de retalhos corriam todas as casas da localidade pedindo os santórios. Geralmente recebiam nozes, castanhas, raramente dinheiro. No fim todas as dádivas eram divididas pelo grupo. Ainda hoje os mais novos pedem os santórios. i) Novenas As novenas eram utilizadas para pagar promessa por graça recebida. Era tradição na Freguesia que as novenas fossem á Rainha Santa Isabel, ao Santo Amaro, ao S. Tomé em Barcouço, e na capela do Loreto, para onde se deslocava um rancho de homens e mulheres em igual número. O ritual consistia num conjunto de orações, nomeadamente “Pais-Nossos, “Avés-marias” e “Glóriasao-Pai”. No fim da novena era tradição que a pessoa que a mandou rezar distribuisse pelos presentes tremoços, vinho e jeropiga. 4.2. Costumes Profanos a) Os Feijões Tradição de Sexta-feira Santa, reposta a 14 de Abril de 1986 pelo Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, depois de mais de 20 anos de interrupção (fotos 203 a 209). Reúne pelo menos 3 gerações a cada ano que passa. Antes do toque das 12h00 as crianças desta freguesia aproximavam-se dos portões da quinta da familia Nazaré munidas de tachos e pratos de alumínio e uma colher. Ao aproximarem-se batiam com a colher no tacho reclamando: «queremos sopa, queremos sopa». Ao soarem as 12 badaladas os portões abriam-se e as crianças entravam ordeiramente sendo recebidas pelo senhor da casa, iniciando o ritual dos feijões com rezas ao Pai Nosso e Avé Maria. Seguia-se o almoço constituído pela sopa e broa. Após o almoço as crianças recebiam amêndoas. Contou com a participação dos bisnetos do benfeitor, Henrique Nazaré e Maria Luisa, que regressaram de Lisboa tendo aberto as portas partilhando a refeição. No final do almoço a iniciativa termina com a reza de um Pai-Nosso. Henrique de Queiroz Nazareth herdou a tradição dos antepassados e mantém-na viva. Um costume de tal forma enraizado nas gentes de Souselas que durante a II Guerra Mundial (conta-se), devido à escassez de azeite, o Bispo de Coimbra autorizou que para temperar a sopa fosse usado toucinho e gordura de porco, prática interdita, em situação normal, por se tratar de um dos dias mais importantes no calendário religioso, Sexta-feira Santa. 624

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b) Oferta do Bolo Folar A oferta do bolo folar remonta ao casal José Pereira e Maria Alexandrina, pais do Dr. Alberto Dias Pereira, que no Domingo de Pascoela ofereciam um bolo, conhecido por Folar. À tarde, as crianças juntavam-se junto à Casa do Paçal. As criadas desciam a escadaria, existente junto ao adro da Igreja, com os açafates cheios de bolos que eram distribuídos pela família Dias Pereira. Esta tradição tem sido recuperada pelo Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, decorrendo no adro da igreja, à saída da missa (fotos 210 e 211). c) As fogueiras Ao longo do Séc. XX, as fogueiras de Souselas gozaram de grande fama pela região, dado que na freguesia existiam muitos músicos, que facilmente se juntavam e promoviam o canto e a dança de rapazes e raparigas. Os principais locais de realização das fogueiras eram, em Souselas, o Largo da Igreja e junto ao Cruzeiro, tornando-se emblemático o largo, todo ornamentado com verdura, cana-da-índia, flores da época, cascatas e, onde não raro, preparava-se um pavilhão. Na Marmeleira as fogueiras decorriam no Largo dos Maleiros, hoje Largo da Capela, para os habitantes da rua de Baixo e, no Largo das Alminhas, para os habitantes da rua de Cima. Em Sargento-Mór as fogueiras eram realizadas no Largo de Carrimá e, em S. Martinho do Pinheiro no Largo da Capela de Nossa Senhora da Nazaré. d) Ritual de casamento: deitar amêndoas e flores Ritual antigo. Sempre que alguém se casa, as mulheres e raparigas deitam amêndoas e flores aos noivos, logo que saem da igreja. Prepara-se um prato com flores variadas e arroz (este para “dar sorte”) e deitam-nas sobre os noivos dirigindo-lhes palavras. O cortejo de casamento passa pelas ruas em direcção à casa da noiva, sempre acompanhado de uma pessoa que deita amêndoas. Já em casa da noiva deitam amêndoas em cima de todos os presentes, com novos e velhos a tentarem apanhar o maior número possível. e) A Matança do Porco Matar o porco é motivo de festa e alegria, sinónimo de abundância de carne nos meses seguintes. Nesse dia reúne-se a família e todos ajudam no ritual: o Matador concentra-se para o ritual, uns seguram no animal, outros avançam com os preparativos para o desmanche e aproveitamento de todos os elementos que o porco oferece. 625

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Os homens seguram e chamuscam (com agulha de pinheiro e carqueja), raspam e levam o porco. As mulheres aproveitam o sangue do animal que vertem para alguidares, e que servirá para fazer o enchido (linguiças, morcelas e farinheiras) e o sarrabulho. O animal, já morto, é pendurado e limpo, sendo-lhe retirados os intestinos (“as tripas”) que são lavados no rio e aproveitados para fazer o enchido. Em seguida, retiram-se as diversas partes do corpo do animal, designadamente as banhas e a ferçura (ou fessura) – fígado, pulmões, coração, pâncreas e esófago. Concluída a matança do porco, há lugar a almoço e jantar, modo de pagar o serviço ao matador. Por norma serve-se batatas cozidas com bacalhau e sarrabulho. f ) Venda de tremoços e do bolo de cornos Tradição que se mantém viva em Souselas, com a particularidade de ser feita pelos descendentes da família que sempre os vendeu, e que vivem na zona da Azenha. A venda fazia-se ao Domingo, no fim da missa, de porta em porta, sendo os tremoços transportados em pequeno açafate. De S. Martinho do Pinheiro vinham as vendedeiras de bolos de cornos. g) Jogos tradicionais Os jogos tradicionais estão relacionados com a vida quotidiana das populações, sendo um meio de convivência e de distracção. Os seus temas baseavam-se nos trabalhos diários e variam segundo as estações do ano, as colheitas, romarias, feiras e festas religiosas. Os locais mais utilizados para a sua realização eram o adro da igreja e das capelas e o recreio da escola. Havia jogos destinados a adultos (o pau ensebado; a malha, o arco, a corda, o cântaro) e outros para jovens (a macaca, o lenço ou lencinho, o pião, a cabra-cega, a corrida de saco, estátua; andas, o talo bilharda, o botão, a berlinda). A rapaziada costumava jogar o Par ou Pernão no dia de Natal, findas as cerimónias na Igreja e o almoço em família. O jogo disputava-se entre um rapaz e uma rapariga e, para jogar, eram necessários pinhões. Ele colocava os pinhões no bolso do casaco, ela no avental. Com uma das mãos retirava-se uma mão cheia de pinhões e, de punho fechado perguntava-se; «Par ou pernão?». Se o opositor acertava entregava-se os pinhões que se tinham na mão mas, caso não acertasse, recebia do outro o mesmo número de pinhões. E o jogo decorria até que um dos jogadores perdesse todos os pinhões. Pelo Carnaval dava-se alguma liberdade. Novos e velhos vestiam-se de “entrudo”, mascarados de cara tapada, por vezes satirizando algumas personagens locais. Frequente era a realização do Jogo da Caçoilinha. Para este jogo utilizavam-se utensílios de barro preferencialmente deteriorados, como caçoilas, cântaros, 626

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potes, caçoilas, panelas e tachos. Rapazes e raparigas dispunham-se numa roda, atirando pelo ar o utensílio que estava em jogo, de uns para os outros. Aquele que o não agarrasse e deixasse partir, tinha de fugir de imediato, para não levar com os cacos que os outros logo tentavam atirar-lhe, tendo obrigação de colocar em jogo uma peça de jogo. A brincadeira só terminava quando todos os utensílios reunidos para aquele fim estivessem esgotados. No final, os jogadores sujavam as faces uns dos outros, com as mãos enfarruscadas. Os cacos sobrantes eram atirados para dentro das casas, terraços e quintais. Um jogo ou divertimento, tipicamente carnavalesco eram, as pulhas. Realizado preferencialmente pelo cair da noite. Um reduzido número de rapazes e homens organizavam-se em dois grupos e dirigiam-se para os morros mais elevados nos arredores da povoação: Em Souselas usavam a Serra da Brasfemes, Cabeço da Azenha, Almoinhas e Lâmbaro, na Marmeleira usavam o Cabeço dos Moinhos e o Alto da Ladeira. Munidos de grandes funis de vinho, e em uníssono, gritavam graças alusivas a factos relacionados com as pessoas da comunidade, revelando segredos e escândalos locais, colocando a reputação de homens e mulheres em causa. A pulha era lançada por meio de um diálogo, entre grupos localizados em pontos diferentes, nestes termos: • Ó companheiro! • Que é? • Sabes que aconteceu com fulano (identificavam a pessoa)? • Não! Que foi? • Olha! E seguia-se o esmiuçar da vida da pessoa. Entretanto os grupos iam mudando de localização para não serem apanhados, pelos visados, pois não raras vezes deu tiro de zagalote. o povo, esse ouvia atrás da janela a “pulha” e no dia seguinte ninguém se atrevia a identificar os deitadores de pulhas. O número reduzido de participantes, tinha como objectivo manter o segredo no anonimato anos fora, consoante a gravidade das acusações “pulhadas” e por outro lado permitir uma mais ágil e rápida fuga, em caso de perseguição, chegando-se a dividir para se voltarem a reunir em local previamente combinado. as pulhas tinham os seus apetrechos próprios, para além do funil com um bocal, também era levado um bacamarte, já que durante as pulhas mandavam-se fochagos para intimidar potenciais perseguidores. Durante as pulhas de vez em quando gritava-se: Companheiro da esquerda fogo! Saia fogo! Depois mandavam o companheiro da direita de onde saía fogo também. Na prática, era quase sempre a mesma pessoa, tendo como objectivo confundir quem ouvia para que ficasse na dúvida se seriam dois ou mais elementos. 627

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Por vezes, havia um grupo que ficava em local estratégico para informar de eventuais perseguidores, através de sinal previamente combinado. Apesar do funil distorcer a voz, o deitador de pulhas tentava disfarçava ainda mais para não ser reconhecido. Também durante o período do Carnaval fazia-se o Serrar da Velha. Á noite, os rapazes juntavam-se e munidos de um serrote e cortiça iam “Serrar a Velha”. Deslocavam-se para junto da porta de alguém com idade, previamente seleccionado, que tinha preferência por alguns dos filhos ou sobrinhos, caso não tivesse filhos, para aí fazerem alguma sátira. Estabeleciam um diálogo, nos seguintes termos: - Ó velha(o) a quem vais deixar os teus bens? E seguia-se uma serradela na cortiça. - Vais deixar ao Manel? E alguém do grupo respondia. - Então e a Maria, não é herdeira? Seguia-se nova serradela, e novo diálogo: - Ó velha(o) olha que vais para o inferno. E nova serradela. Por vezes, a provocação só terminava, quando era atirada urina para cima dos intervenientes. Neste período era ainda comum o jogo dos cacos: juntar restos de vasilhas de barro partidas, pedras e outros objetos e sempre que encontravam uma porta aberta atiravam para dentro de casa, seguindo-se fuga. Quanto ao jogo do cântaro, consistia em percorrer uma determinada distância, transportando um cântaro de barro, com água, à cabeça, sem apoio de mãos só com rodilha. Vencia o primeiro que chegasse à meta. Jogo típico de festas e praticado por mulheres. O Pau ensebado consistia em colocar um bacalhau no cimo de um mastro, geralmente com 7 metros, bem ensebado, ganhará o bacalhau o concorrente que ao subir ao mastro conseguir ir lá ao cimo buscá-lo. Jogo característico de festas e praticado por homens. O Jogo da corda necessitava de duas equipeis com igual número de elementos, que puxavam o adversário por uma corda (25 m) obrigando-o a pisar uma determinada marca, normalmente feita no chão. As equipas, colocam-se em coluna uma frente da outra e cada uma delas a cerca de 2 metros da marca. A meio da corda põe-se uma marca (lenço atado). Vence a equipa que obrigar o primeiro jogador da outra a pisar a marca do chão. A Corrida de Sacos era individual. Cada concorrente veste um saco de serapilheira, que lhe limita o uso dos pés e das pernas, é estabelecido um percurso que tem de ser percorrido, com ponte de partida e chegada. O concorrente 628

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que cortar primeiro a meta, linha de chegada, será o primeiro classificado e assim sucessivamente. Jogo muito usado antigamente nas festas da Freguesia. Uma palavra para a Contra-Dança. Organizava-se um toque e formava-se um rancho que dançava ao som de marchas. O traje não seguia um rigor especial, podendo as mulheres trajar de homem. Cantava-se e dançava-se no domingo e na terça-feira de Carnaval. Nos jogos de todo o ano figura a Malha ou Finto (Fito). Jogado aos Domingos à tarde pelos homens no Largo da Igreja ou junto à capela do Senhor do Terreiro e em outros terreiros dos lugares da Freguesia. Era um jogo muito popular. Cada equipa será constituída por dois parceiros (ou mais ou menos). As malhas poderão ser de madeira ou de pedra. Os fintos (ou mecos) serão de madeira, ferro ou pedra, com cerca de 20 cm altura. A distância entre os fintos será de 25 ou de 15 passos de metro. A zona de lançamento é marcada lateralmente os fintos, à frente da qual os jogadores não podem atirar as malhas, se ao lançar a malha pisar o risco de lançamento, perderá essa malha que será considerada nula e não será repetida. Os adversários a jogar, lançam alternadamente as duas malhas que cada um tem, procurando derrubar o finto da outra cabeceira e deixar a malha o mais próximo possível dele. Sempre que o finto é derrubado são contados 3 pontos. Depois das quatro malhas jogadas, a que ficar mais próximo do finto ganha um ponto, sendo o parceiro do jogador cujo malha ganhou o ponto, a fazer agora o 1º e 3º lançamentos. O jogo termina aos 30 pontos para a equipa que primeiro concluir este número ganha a partida, a equipa que vencer o número de jogos acordado. A Bilharda ou jogo do talo. Temos duas variantes, com três ou dois jogadores: a) O jogo do talo compreendia a participação de 3 jogadores. Dois possuíam um pau comprido (entre 60 cm a 100), o outro, um pequeno pau (talo), com cerca de um palmo de comprimento e aguçado nas pontas para poder saltar. Na terra abriam-se duas pequenas covas, distanciadas entre si cerca de 10/20 metros e o jogo principiava: «Os dois jogadores com os paus maiores colocavam cada um na sua cova e o jogador com o talo punha-se numa das covas e atirava para a outra de maneira a dificultar o acerto do outro jogador no talo. O jogador possuidor do talo, tentava introduzi-lo na cova e o que defendia a cova tentava desviá-lo para o mais longe possível. Quando o jogador que estava a atirar com o talo, o introduzisse na cova, passava ele a defender a cova, pegando no respectivo pau e saindo para atirar o talo ao jogador que estava na cova». b) O jogo é jogado com dois concorrentes, um pau de tamanho maior, um pau mais pequeno, e uma roda desenhada no chão. Um dos concorrentes o pau grande e vai para dentro da roda. O outro, que está a uma distância marcada, atira a bilharda para o que está dentro da roda; este procura acertar com o pau grande na bilharda de maneira que esta vá parar o mais longe possível da 629

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roda; em seguida a distância a distância que vai da bilharda à roda é medida em passos ou com o pau grande. A berlinda ou bugalho: Eram usados no jogo bugalhos de carvalhos ou berlindes. Podia ser jogado com uma só cova ou com várias covas que o jogador teria que percorrer antes de poder matar. «Matar» era o acto de jogar o berlinde contra o do parceiro ou parceiros o que dá lugar em caso de acertar, ganhar o jogo. A partir de local marcado no chão os jogadores atiram o berlinde para a cova principal, o que ficar mais perto da cova é o jogador que tem direito a iniciar o jogo e assim sucessivamente. Este jogo revela destreza de mãos e percepção das distâncias, o berlinde é colocado à frente da unha do dedo polegar ou do médio consoante o jogador melhor se ajeitar, dedo esse que vai servir de alavanca, para impulsionar o berlinde ou para a cova ou contra berlinde do adversário. O jogador só pode continuar o jogo depois de meter o berlinde dentro da cova principal e de percorrer as outras consoante tenha sido estipulado. O jogador só pode continuar a “matar” os outros se acertar no berlinde do primeiro. O jogo termina quando tiver morto todos os berlindes em jogo. Jogo típico do recreio das escolas. h) Queima do Judas A Queima do Judas era feita no Sábado de manhã que antecede o Domingo de Páscoa, no Sábado de Aleluia. Trata-se de uma festa profana, com origem no imaginário cristão, segundo o qual Judas entregou Jesus à morte, tornando-se num traidor. Esta tradição tem em carácter simbólico de expiação dos males e de purificação. Era feita com o boneco, O Judas, de palha, vestido de roupas velhas, onde se colocava, por vezes, “bombas” de foguetes. O boneco era atado às grades do adro da Igreja de Souselas, e incendiado, para alegria e aplauso do povo. Este ritual tinha uma componente artística de representação. Por vezes aproximava-se da sátira social em que o boneco poderia representar uma personalidade local. Após a queima, os sinos voltavam a tocar “Aleluia, Aleluia”. Ia-se à igreja, onde o padre fazia a distribuição da água santa que se guardava junto ao ramo de alecrim ou palma que havia benzido no Domingo de Ramos. i) O trigo da sorte Era costume a meio da Quaresma semear-se trigo num recipiente, ficando o mesmo protegido das geadas. No dia de Ramos retirava-se um pouco desse trigo, já germinado, e colocava-se num pequeno vaso, para enfeitar a casa até ao domingo de Páscoa, isto para prever boas colheitas. 630

XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

j) A distribuição do prato de arroz doce. Ritual de casamento, com o prato de arroz doce a ser entregue pelas famílias dos noivos. Ia-se de porta em porta, com uma ou mais canastras, e a devolução do prato era acompanhada de uma prenda. l) As Maias Os meses de Maio e Junho e Dezembro são os que mais salientam as práticas embebidas de ligação às forças da natureza e da mãe fecunda. As Maias recebem o nome do mês, são comemoradas e divinizadas, atribuindo-lhes poderes e significados e efeitos próprios dos deuses. Segundo alguns estudiosos, a Maia era uma boneca de palha de centeio, em torno do qual havia danças toda a noite do primeiro dia de Maio. Ainda segundo outros, o nome do mês de Maio terá tido origem em Maia, mãe de Mercúrio, e a ele está ligado o costume de enfeitar as janelas com flores amarelas. Com as celebrações das Maias é a fecundidade da terra que surge em força, aroma e cor, após um longo Inverno, saindo de uma letargia profunda, para uma ressurreição festiva. Todos estes rituais pagãos estavam ligados ao rito da fertilidade para com o novo ciclo da natureza, à celebração da Primavera ou ao início de um novo ano agrícola. O 1º de Maio é o Dia das Maias. Na noite de 30 de Abril para 1 de Maio colocam-se giestas em flor, ou até mesmo coroas feitas de ramos de giestas, conjuntamente com outras flores e enfeites coloridos, sob diversas formas, em portas e janelas e noutros locais. Trata-se da necessidade de desencadear formas efectivas de protecção e de esconjuro a opor à insegurança da vida e à omnipresente ameaça do mal, para o «Maio», o «Carrapato» ou o «Burro» não entrarem. O «Maio» ou o «Burro» são entidades nocivas, cujo malefício se pretende conjurar com uma oposição de flores ou a manducação de certas espécies. m) O Magusto O S. Martinho é comemorado no dia 11 Novembro, em homenagem a Martinho soldado romano que viria a seguir a vida eclesiástica e a ser santificado. Comem-se as primeiras castanhas do ano, acompanhadas de vinho novo. O Magusto é uma festa popular, grupos de amigos e famílias juntam-se à volta de uma fogueira onde se assam as castanhas para comer, bebe-se a jeropiga, água-pé ou vinho novo, fazem-se brincadeiras, as pessoas enfarruscam-se com as cinzas, cantam-se cantigas. Leite de Vasconcelos considerava o magusto como o vestígio dum antigo sacrifício em honra dos mortos. Em Souselas o termo «magusto» também é referido por “castanhada” e manda a tradição que a Confraria ou Irmandade 631

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da Nossa Senhora do Rosário organize, para os Irmãos, a sua castanhada, com convocatória afixada no Largo da Igreja. Existe, ainda, um conjunto de provérbios de S. Martinho e castanhas: - Em dia de S. Martinho abre-se (fura-se) o pipo e prova-se o vinho - Em dia de S. Martinho atesta e abatoca o teu vinho. - No dia de S. Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho. - No dia de S. Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho. - Pelo S. Martinho castanhas assadas, pão e vinho. - O Veräo de S. Martinho são três dias e mais um bocadinho. - Assenta-lhe que nem uma castanha. - Castanha bichosa, castanha amargosa. - Castanha quente só com aguardente, comida com água fria causa «azedia». - Estalar (ou quebrar) a castanha na boca. - O ouriço abriu, a castanha caiu. n) O Acordo Nazareth de Sousa refere, em 1951, ter dúvidas sobre a existência de um costume praticado entre os lavradores a que chamavam «Acordo». Tal prática tratava-se de «…uma combinação mútua pela qual no caso de qualquer acidente ou morte de um dos animais de trabalho, todos os lavradores dividiam entre si o prejuízo»(856).

5. Crendices e Superstições Os povos sempre tiveram as suas crendices e superstições, moldando hábitos e costumes, e acentuando características psicológicas. Souselas não foi excepção e, apesar da influência da sociedade contemporânea, mantêm-se algumas que convém realçar. a) A mulher grávida Sempre que uma mulher engravidava era tratada com especial atenção, satisfazendo-lhe todos os desejos, especialmente os alimentares, para que a criança nascesse sem defeitos: um prato de arroz doce, bolo de buracão, uma tigela de marmelada, frutos secos, uma garrafa de jeropiga, etc. O parto era em casa e acompanhado pela parteira – a última em Souselas foi a ti Vera.

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 28

(856)

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As vizinhas encarregavam-se das lides domésticas e, se a mãe tivesse dificuldades na amamentação, logo apareciam outras mulheres que se prontificavam a dar o peito ao menino, a que se chamava “esmola de leite”, sem que nenhuma recebesse algum pagamento por isso. Mas, se o fizesse, seria “mal olhada” por outras atraindo desgraça para o seu próprio filho. Os filhos eram criados pelos instintos das mães, se morressem eram anjinhos e iam para o céu, se se criassem, o seu destino seria o que tivesse que ser. Se a mulher desse à luz gémeos rapazes, ficaria com poder para curar entorses, distensões e maus gestos, bastando colocar o pé sobre a parte afectada do doente. Qualquer mãe que saísse de casa à noite, com filho pequenino ao colo, deveria levar no seio um bocadinho de pão, pois de contrário, a criança corria o risco de apanhar um “ar mau”. Duas mulheres que amamentam seus filhos, não podem beber pela mesma vasilha, pois se o fizessem, a primeira tiraria o leite à segunda. b) Talhar o ar Um processo considerado como o mais eficaz de curar os doentes. Colocavam o doentinho à porta de casa e diziam: «se trazes ar ou areijo para trás das costas os despejo» e deitam para trás das costas, a água contida numa tigela, especialmente usada para esse fim. Este ritual fazia-se por volta do meio-dia ou ao entardecer, quando soam as badaladas das Trindades. Para que se alcancem os resultados esperados, o processo tem de repetir-se durante 9 meses e em nove dias seguidos. Por fim, aplicam à criança defumadouros de alecrim, “palhas-alho”, brasas e sal, queimadas numa telha, sobre a qual o menino é passado nove vezes, enquanto que os presentes rezam nove Padre-Nossos. c) Quebrante O quebrante detecta-se pela forte dor de cabeça e mal estar, que é interpretado como “mau olhado”. Para combater o feitiço, deita-se num prato com fundo branco água e azeite que se deixa cair gota a gota, pronunciando as palavras adequadas. Se o azeite não espalhar é porque não “deitaram quebrante” e é uma dor de cabeça normal. Mas, se o azeite atingir a água e se espalhar é porque alguém, “deitou o quebrante” a essa pessoa. Para combater o mal, existem vários métodos, sendo comum pronunciarem-se as palavras: Três te puseram Três te tirarão S. Pedro, S. Paulo e S. João Ao mesmo tempo, vai-se deixando cair azeite no prato com água até não espalhar. Por fim, deita-se o conteúdo do prato em água corrente. 633

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d) Ter sete filhos varões Se um casal tivesse sete filhos varões era motivo de grande preocupação. Acredita-se que o mais novo, ao atingir os 21 anos, se transformaria em lobisomem, e força alguma impediria o seu destino. Teria de percorrer todas as noites sete freguesias. Nessa ocasião, perdia a forma humana e assumia a de um cavalo, burro ou cão e, por onde passasse, fazia grande ruído. Para se libertar da triste sina, seria necessário que uma pessoa conhecida lhe espetasse uma agulha na cauda até fazer sangue. Nesse instante, cessaria o feitiço e o lobisomem desapareceria para sempre. Em seu lugar ficaria um homem nu, com as roupas no cimo da árvore mais alta, onde ninguém as poderia encontrar. e) Medicina Popular Compreende a cura de certas doenças por processos arcaicos e manuais e que se transmitiram de pais para filhos. É exemplo o curar os Quebrões, um problema de pele que se diz causado por um bicho. Utilizam palha de alho seco moída, azeite e vai ao lume até se formar uma papa que é aplicada na zona infectada. Também se utilizam diferentes tipos de chá para a cura de doenças diversas: tília, erva-cidreira, folha de oliveira, flor de funcho, malva, laranjeira, casca de cebola, xarope de cenoura, limão e laranja. f ) A meteorologia popular Presume-se pelo vento que soprar à meia-noite, no dia da Senhora das Candeias (2 de Fevereiro), o vento dominante durante o resto do ano. Avaliase pelo vento do Dia de São Miguel (29 de Setembro), o estado do Inverno que se aproxima, assim como se infere da direcção observada à uma hora da tarde do Dia da Senhora da Ascensão, qual o vento estival de predomínio. O Adagiário ligado ao vento: – De Espanha nem bom vento nem bom casamento. – Quem semeia ventos colhe tempestades. – Palavras, leva-as o vento. – Água e vento são meio sustento. – Vento de Ramos, vento todo o ano. – Mulher, vento e ventura, são de pouca dura. – O que o vento traz, o vento leva. – Vento Sul, água no paul. – Vento Norte, três dias rabia. – O vento faz girar o catavento, mas a torre não. – Vento de leste, não há nada que não creste. 634

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– Vento de Março, chuva de Abril, fazem o Maio florir. – Vento de suão molha no Inverno e seca no Verão. – Vento Norte rijão, chuva na mão. – Vento suão farta o chão. – Vermelho para o mar aparelha o burro e ponte andar.

6. Lendas a) A Origem de Souselas A lenda da origem de Souselas foi recolhida pelo Grupo Etnográfico em 1988: «Há muitos, muitos anos, tanto que a data já se apagou da memória do povo, existiram em Souselas 2 familias, uma a dos Sousas e outra de mulheres em que vigorava o matriarcado. Por outro lado, alguns rapazes dos Sousas pretendiam casar com raparigas da outra família, mas havia ao mesmo tempo, um problema de terras (propriedades) entre as duas famílias; contudo, o principal problema, é que ambas as pretendiam dominar toda a aldeia. Então, gerou-se um grande conflito entre as duas e, em consequência, o povo dividiu-se; uns apoiavam os Sousas e os outros a outra família. Havia então de um lado os Sousas e, do outro, as Elas (constituídas pelas mulheres). Por fim, houve um entendimento entre os Sousas e as Elas, dando origem ao nome de Souselas» b) A origem do nome do Rio Resmungão Relatava Vergilio Correia nas suas Notas de Arqueologia em 1940: «Diz a lenda que quando algum monge do mosteiro de Lorvão tinha comportamento indevido, era colocado de castigo, para cumprir a sua penitência, em terras de Souselas, onde hoje se situa a Quinta do Resmungão (ou Remungão). Quando o povo lá passava dizia: «lá está o frade resmungão. Daqui ficou o nome para aquele sitio…». De facto e segundo as informações paroquiais de 1721 a Quinta do «Remungão» era administrada pelas religiosas de Lorvão. João Pardal e Paula Moreira, também referiram a lenda em trabalho de 1988: «Junto ao rio, perto de Lagares, existe uma quinta que pertenceu ao mosteiro de Lorvão, que possui Capela». Diz o povo que os frades do Mosteiro eram enviados para a quinta de castigo. Quando povo passava dizia - lá está o frade resmungão. E assim, com o passar dos tempos, o rio passou a chamar-se Rio Resmungão. c) A Moura Encantada do Buraco da Moira As mouras encantadas de espíritos e seres fantásticos, com poderes sobrenaturais, são dos temas mais comuns das lendas e superstições populares. Leite de 635

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Vasconcelos afirma: «são seres obrigados por oculta força sobrenatural a viverem em certo estado de sítio como que entorpecidos ou adormecidos, enquanto determinada circunstancia lhes não quebrar o encanto». Segundo antigos relatos populares, as mouras encantadas são almas de donzelas que foram deixadas a guardar tesouros que os mouros esconderam antes de partir. São guardiãs dos locais de passagem para o interior da terra, os locais “limite”, onde se acreditava que o sobrenatural podia manifestar-se. Aparecem junto de nascentes, fontes, pontes, rios, poços, cavernas, antigas construções, velhos castelos ou tesouros escondidos. A sua origem tem várias explicações. Uma poderá remontar à época do domínio árabe (mouro), na Península Ibérica. Em Portugal, o domínio árabe inicia-se no ano de 711 e terminou em 1249, quando D. Afonso III conquistou definitivamente o Algarve. Mas, para outros autores, a lenda das mouras terá a sua origem em tempos pré-romanos. As mouras encantadas apresentam várias características que se encontram presentes na Banshee das lendas Irlandesas. Na mitologia Basca os Mairu (mouros) são os gigantes que construíram os dólmenes e os cromeleques. Na Sardenha podemos encontrar os domus das Janas (casa das fadas). Leite de Vasconcelos levantou a hipótese de as mouras encantadas poderem ter assimilado as características de divindades locais, como ninfas e espíritos da natureza. Na Península Ibérica as lendas de mouras encantadas encontram-se, também, na mitologia Galega e Asturiana. Na tradição oral portuguesa, as Janas são outra variante de donzelas encantadas. Especula-se que o termo moura (moira) possa derivar da palavra grega “moira”, que literalmente significa “destino” e da deusa Moira, originária da mitologia Grega. Também se considera como possível origem, a palavra latina “maurus”, “obscuro”, nome dado aos nativos da Mauritânia. Outra corrente indica que a origem poderá advir das palavras celtas “mori” que significa mar ou “mori-morwen” que designa sereia, provavelmente relacionadas também com as ondinas ou as ninfas, os espíritos sub-humanos que habitavam nos rios e nos cursos de água. Uma outra possibilidade, também de origem celta, é “mahra” e “mahr”, que significa espírito. O Buraco da Moura é uma gruta de origem calcária, com estalactites e estalagmites que existe no sopé da Serra da Brasfemes, junto às Fontes. Relatava Vergilio Correia, nas suas Notas de Arqueologia de 1940: «Fala o povo de Covas da Moura, nas Fontes, no Remungão, perto do Vilarinho, no Pisão de Barcouço (…) Das de Fontes, visitei, uma, a de baixo, é uma espécie de corredor inflectindo à direita e terminando logo; outra, a de cima, é comprida, cheia de ramificações, com stalactites pendendo ou tapando o solo. Nada se pode averiguar de espólios, porque as camadas endurecidas das concreções calcáreas o não consentem». 636

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No caso de Souselas existem duas versões da lenda do Buraco da Moira (moura), ambas representantes dos romances populares. 1ª Versão «Reza o povo que nas noites de grande luar, quem passe pelo sopé da Serra da Brasfemes, no sito do Buraco da Moira, verá uma linda mulher toda vestida de branco que lhe pedirá que ao fazer a próxima fornada de fornada de brôa de milho lhe leve uma brôa para quebrar o encantamento» (Henrique Nazareth, 1951). Como até hoje ninguém levou a broa, a lenda continua. 2ª Versão «Quando os cristãos reconquistaram a Península Ibérica aos mouros, quando foi reconquistada Coimbra e sua região, estes fugiram, mas, uma moura, que estava apaixonada pela beleza da paisagem, onde só ali se sentia feliz, ficou para trás, para não ser morta pelos soldados cristãos, refugiou-se na gruta do “Buraco da Moura”. Diz a lenda que ela ainda lá está à espera que o seu príncipe encantado a vá buscar, levando para isso uma brôa para quebrar o encantamento» (Pardal, J & Moreira, 1988).

7. Alcunhas Dos Tombos datados do séc. XVIII colhemos as seguintes alcunhas: • Souselas: o vilão de Enxofães, o mariano, mole, gorgoleiro, o soldado, finete, “mao cabello”, o alentejano, a padeira, “a emgeitada”, o Cardadeiro, Tecelão. • Marmeleira: o ausente, o preto, o velho, pouquinho, calsão, Mallegiozo, Maligno, Matallão, Bimbo, Gancho, Marmelleiro, Marinheira, Buticaria, pisca, o neto. • Carrimá: bicho. • S. Martinho do Pinheiro: mallegiozo, soldado. • Zouparria do Monte: o barbado,o manco. Dos livros dos diversos concelhos, relativos ao séc. XIX, surgem alcunhas e apelidos curiosos: Manaia, Agulha, Marmamela e Marmamelo, Direito, Bicho, Cação, Peça, Matouto, Direito, Sarrano, Gata. Nazareth de Souza, em 1951, identificou mais algumas alcunhas: Viras, Taveiro, Saluti, Cão, Chupa-Torçidas, Caçoilo. Em diversas fontes colhemos apelidos de famílias que na maioria dos casos se mantêm na actualidade: Silva, Sousa, Coelho, Finete, Lopes, Marques, Cunha, Cardoso, Barroso, Dias, Gomes, Carrana, Santos, Alfaiate, Pinto, Costa, Alvares, Alves, Madeira e Santos Madeira, Maleiro, Murta, Carimão, Carneiro, Louro, Ramalho, Henriques, Simões, Ventura, Martins, Pisco, Gato. 637

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8. Gastronomia A gastronomia e culinária de Souselas integram-se na região de Coimbra, Bairrada e Província da Beira-Litoral, donde recebe influências diversas. Os processos culinários mais comuns são os cozidos e os refugados. A base da alimentação era sopa de feijão com hortaliça, batata e carne de porco, tirada da salgadeira, como «conduto». Sendo comum, para as famílias menos abastadas, a sardinha. O bacalhau e a carne de cabra ou carneiro também entravam na alimentação, sendo as duas últimas para os dias de festa. A broa ou pão de milho era fundamental estava presente em todas as refeições. Raramente arroz e pão de trigo e só mais tarde chegaram as massas. Os temperos eram o sal, o azeite e o vinagre. Por vezes algumas ervas aromáticas, locais: ouregos, louro, entre outros. Aliás, ainda hoje de uso comum. As azeitonas acompanhavam sempre a refeição e sempre temperadas com serpol, planta aromática característica dos calcários. A azeitona era conservada em pote de barro, retalhada, com rodelas de limão ou laranja, coentros ou serpol (ouregos) e louro. As gorduras mais usadas eram o azeite (de origem vegetal) e o toucinho (de origem animal – porco), colocado na sopa, no cozido e por vezes comido cru, com um naco de broa. A banha de porco era usada na conservação dos chouriços e em alguns temperos. A fruta dependia da época do ano, na vindima uva, no Natal uvas brancas passadas, guardadas das vindimas. Nozes no natal. Figos em Setembro, tanto para as pessoas como para os animais, tal era a abundância. Maçãs, ameixas, peras, pêssegos, laranjas, cerejas damascos e dióspiros, completavam a restante fruta. Cultivavam-se árvores de fruto em pomares, vinhas e nos limites de propriedade. Os marmeleiros eram e são comuns nos limites de propriedade e nos taludes de caminhos. No Outono apanhavam-se os marmelos e fabricava-se marmelada. Das abóboras fazia-se doce de abóbora. As bebidas eram constituídas por vinho tinto e café de cevada. O vinho branco e a jeropiga ficam para as ocasiões mais festivas. A aguardente, para aquecer no inverno. Durante muitos anos os trabalhadores do campo cumpriam três refeições diárias: - De manhã e antes de sair para o trabalho tomavam o «almoço», composto de umas sardinhas com um bocado de bacalhau e broa; • Ao meio-dia e após o toque do sino, servia-se o «jantar» constituído por sopa de feijão com hortaliça onde esfarelavam a broa, acompanhada de um prato sólido, de peixe ou carne; • Ao final da tarde, após as trindades comia-se a ceia, composta do resto da sopa do jantar e um pouco de carne de porco. 638

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Durante o Verão, quando a vida no campo se prolongava até mais tarde, havia lugar à «merenda» entre o jantar e a ceia, tomada no local de trabalho e que compreendia broa, azeitonas, sardinha ou bacalhau(857). O vinho acompanhava todas as refeições e era bebido tanto por homens como por mulheres. Por vezes faziam as sopas de “cavalo cansado”, que consistia em colocar numa tigela broa esfarinhada. Ao nível das carnes os pratos tradicionais têm por base as cabras e os porcos; da cabra vem a chanfana, prato obrigatório em festas e bodas; do porco vem o sarrabulho, feito com diversas partes da carne de porco, incluindo fígado e sangue cosido, acompanhado de batatas cosidas. Bastante apreciado é também o leitão, afinal «a glória dos assados nacionais». Na matança do porco fazia-se o “Serrabulho”: confecionado com fígado e sangue do porco, cozidos, pedaços de febras e costeletas, tudo frito em azeite, louro, alho e pimenta. Nos dias de festa o “galo corado” e a “xanfana” (chanfana), a rainha das carnes das festas não faltava. Trata-se de carne de cabra velha, marinada em vinho, temperada com colorau, alho, cebola, etc. que é assada em caçoila de barro preto, no forno da lenha. Durante a cozedura da broa era costume fazer a “torta”. Dentro da massa da broa era colocada sardinha, cebola e salsa, para depois ser cozida no forno da brôa. Nos dias de Festa era e é feita a “brôa mimosa” ou “brôa doce”. Trata-se de Broa de milho e trigo (mistura) temperada com erva-doce. Ao nível do peixe é muito apreciado o bacalhau à lagareiro. Em termos de doçaria temos: o doce de abóbora, as Broinhas de Natal, Filhós, de abóbora, Broa doce, Arroz doce, Rabanadas e Bolo de cornos.

9. Instrumentos e tecnologia rural São típicos da freguesia as enxadas e enxadões; «Souselas caracteriza-se por enxadas com garganta em que o espigão de ligação excede mais de 2cm de comprimento, tratando-se de uma variedade a nível nacional exclusiva destas terras, por se tratar de uma enxada com a metade frontal da lâmina contida em dois bicos triangulares, que apresentavam uma lâmina pesada por vezes com uma crista piramidal longa e preparada para trabalhar terrenos duros»(858).

Henrique de Queiroz Nazareth de Souza – Monografia da Freguesia de Souzelas, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1951, P. 34 (858) João Pardal; Daniel Crespo; João Crespo; Albino Crespo; Vasco Gonçalves; Joaquim Gonçalves – Apontamentos da Nossa Terra, Grupo Etnográfico da Casa do Povo de Souselas, Setembro, 1997, P. 10 (857)

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Também existem enxadas e alviões mais robustos que as enxadas utilizados em trabalhos menos violentos como cavas da plantação de bacelos e nas cavas das vinhas Para além destas especificidades, encontram-se descritos pelo grupo etnográfico um conjunto de utensílios agrícolas principais e auxliares: foicinho, crivo, malho, encinho de madeira e de prego, cestos e poceiros de verga, panais e sacos de linhagem, ceiras, cântaros de barro e de lata, canastras, açafates, baldes de madeira, cabaço, cordas, piões, pá, vassoura, cestas de alqueire, cajado, manta, agulhão e celha, lampião.

10. Artesanato De assinalar a existência de: cestaria em verga, tanoaria e bordados e rendas.

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Foto 179 - Licínio Abreu, vice-campeão da Copa do Mundo, Fosso Universal, Bélgica (1989)

Foto 180 - Peter Ferreira

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Foto 181 - A Orquestra Danúbio Azul

Foto 182 - Procissão a Nossa Senhora do Rosário (2011)

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Foto 183 - Procissão a Nossa Senhora do Rosário pelas ruas de Souselas (2011)

Foto 184 - Procissão a Nossa Senhora do Rosário pelas ruas de Souselas (2011)

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Foto 185 - Romaria ao Senhor da Agonia, Marmeleira (Junho de 2013)

Foto 186 - Feira de Santa Luzia (Agosto 2013)

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Foto 187 - Feira de Santa Luzia (Agosto 2013)

Foto 188 - Tocador de Viola Toeira

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Foto 189 - Rancho das Camélias (1910)

Foto 190 - Rancho Folclórico As Camélias de Souselas (meados do Séc. XX)

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Foto 191 - Bandeiras do Rancho das Camélias da Mocidade

Foto 192 - Rancho Folclórico Infantil de Souselas (meados do Séc. XX)

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Foto 193 - Rancho Folclórico da Marmeleira

Foto 194 - Uma família de Souselas (princípios do Séc. XX)

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Foto 195 - Xailes de orvalho, barras e cachemira ou chinês

Foto 196 - Chapelinho de veludo bairradino

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 197 - Brincos de cabaço, arrecadas, brincos de chapa, crucifixos e medalha com N.ª Senhora da Conceição

Foto 198 - Pulseira, cordão de 3 voltas com libra e alfinete de mulher

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XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

Foto 199 - Relógio de bolso com corrente de prata e corrente de ouro para colete (Séc. XIX)

Foto 200 - Procissão de Ramos (2012)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 201 - Procissão de Ramos (2012)

Foto 202 - Compasso ou visita pascal (2012)

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XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

Foto 203 - A Tradição dos Feijões: a casa da família Nazareth

Foto 204 - A Tradição dos Feijões: a sopa que coze

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 205 - A Tradição dos Feijões: abrem-se os portões da casa e o povo entra (2009)

Foto 206 - A Tradição dos Feijões: discurso do Eng. Nazareth em torno do caldeirão da sopa (2009)

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XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

Foto 207 - A Tradição dos Feijões: oferta da broa

Foto 208 - A Tradição dos Feijões: serve-se a sopa

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Foto 209 - A Tradição dos Feijões: convívio durante a sopa

Foto 210 - O típico Folar de Souselas

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XI – Etnografia, Folclore e Cultura Popular

Foto 211 - Oferta do Bolo folar (2008)

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LISTA BIBLIOGRÁFICA

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Bibliografia

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Bibliografia

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FONTES MANUSCRITAS

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- Livro do registo das collações do Bispado de Coimbra, 1528-1568 - Livro do registo das collações do Bispado de Coimbra, 1589-1593 - Livro de registo dos títulos das colações e confirmações das Igrejas do Bispado de Coimbra, Nº 129 (s/n) - Livro de registo dos títulos das colações e confirmações das Igrejas do Bispado de Coimbra, Nº 130 (s/n); Livro XVII do Registo das Collaçõens - Colações de Souselas (cx); - Cópia dos Documentos Latinos – Parte II (322 Fls) - Informações Paroquiais, 1721, Souselas - Tombo da Marmeleira, Souselas e S. Martinho do Pinheiro, 1722, 312 Fls - Capelas - Cx. XII, Nº 33, Cx. XIX, Nº 3 - Documentos diversos (cx 2) - Indice dos Acordos do Cabido - Reportório breve dos prazos da Sé, 1481 (382 Fls.) CÂMARA ECLESIÁSTICA

- Registo dos benefícios das Igrejas do Bispado de Coimbra, 1630 - Livro 6º das escrituras da Igreja de S. Cristóvão, 1650 (320 Fls.) - Livro das Fazendas da Igreja de S. Cristóvão em Casal Comba e Souselas, 1689 (101 Fls.) - Caixa documentação variada (7-1-5): Doc. Nºs 46, 59 Fundo da Mitra Episcopal de Coimbra: - Censuais e registos de receitas de foros e rendas, 1402, Livº nº 122, (46 Fls) REGISTOS PAROQUIAIS

Souselas – Livro Misto de Baptismos, Casamentos e Óbitos, 1628-1769; Livro Misto de Baptismos, Casamentos e Óbitos 1748-1805; Livro Misto de Baptismos, Casamentos e Óbitos1783-1858; Livro de Baptismos, 1849-1859; Livro de Baptismos, 1860; Livro de Baptismos, 1861; Livro de Baptismos, 1862

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Freguesia de Souselas – um povo com História

PRÓPRIOS NACIONAIS MOSTEIRO DE LORVÃO

- Nº 5 – Tombo de Souselas, 1705, 550 Fls. - Nº 7 – Tombo de Larçã, Paço e Marmeleira, 1706, 329 Fls. Casa de Aveiro: - Livro dos próprios da Casa de Aveiro nesta cidade de Coimbra, 1734-1791 (996 Fls). Convento de Santa Ana: - Nº 39 - Livro de Cartas de Arrematação, Dotes, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1388-1797 - Nº 41 - Livro de Cartas de Arrematação, Emprazamentos, Sentenças, e outros títulos da cidade de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1551-1801 - Nº 42 - Livro de Cartas de Compras, Sentenças, Arrendamentos, Doações, Inventários e outros títulos do Distrito de Coimbra, de que é senhorio o Convento de Santa Ana de Coimbra, 1564-1800 - Nº 89-A - Inventário de foros suprimidos no concelho de Coimbra, do extinto convento, 1886-1889 FUNDO DOCUMENTAL UNIVERSITÁRIO

- Tombo do prazo da Marmeleira, 1589-1819, 73 Fls. FUNDO DA PROVEDORIA DE COIMBRA

- Livro das Comendas Colectadas nesta Comarca de Coimbra pela Provedoria, 1810-1819 - Livro de Lançamentos da Décima das Comendas da Comarca de Coimbra, 1811-1818 (26 Fls) - Livro de Lançamento das Comendas situadas na Comarca de Coimbra a cargo da Provedoria, 1817-1828 (78 Fls) CONGREGAÇÕES RELIGIOSAS

- Igreja de Santiago – Tombo dos Casais do Campo, Trouxemil, Carrima, Marmeleira e Rios Frios, 1718 - Igreja de S. Cristóvão - Tombo de Souselas, Ançã, Cioga e Quimbres, 1724, 328 Fls. - Igreja de S. Salvador - Tombo do Casal da Marmeleira, 1807 GOVERNO CIVIL DE COIMBRA

- Livro de Registo de diplomas de professores de instrucção primária, 1841-1861, Nº 156 (293 Fls); 1861-1881, Nº 158 (134 Fls) - Livro da descrição das cadeiras de instrucção primária do sexo masculino no distrito, Nº 171 Nº 172; «Matricula dos Professores d’instrucção primaria do concelho de Coimbra»(35 Fls), Nº 174, - Movimento dos professores e professoras, Nº 175; Nº 176 - Documentos relativos a obras nos cemitérios, 1851-1856, (Cx.12); 1862-1880 (Cx. 13); 18901920, Cx. 14

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Fontes Manuscritas

- Documentos relativos a epidemias, Cx. 1 - Inventário de bens de Juntas de Paróquia e Freguesias, 1886-1911 (cx) - Livro de posse aos Mestres e Mestras de ensino primário no Distrito, 1836 - Actas das Juntas de Paróquia de Souselas (cópias): Cx. 322 (1890); Cx. 323 (1891), Cx. 326 (1896-1898); Cx. 327, Cx. 328 (1899-1900), Cx. 330 (1902), Cx. 331 (1903), Cx. 332 (1904-1908) - Livro de Registo dos Regedores, 1881-1915; 1896-1933 - Livro de Termos de juramento a Regedores, 1910-1915; 1915-1919 - Livro de diplomas de regedores de paroquia e outros alvarás, 1852-1858 - Livro de Registo de Alvarás de Regedores, 1874-1887 - Livro de termos de juramento a empregados dos caminhos-de-ferro (1903-1920), 100 Fls - Mapas de Emigração, 1891-1936, cx. 138 - Processos de Licenças para estabelecimentos industriais, 1903-1916, cx. 45, Pasta 1908 - Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 393, 1863-1869; cx. 394, 1870-1876; cx. 395, 1886-1889; cx. 395, 1886-1889; cx. 396, 1888-1889; cx. 397, 18901891; cx. 398, 1892-1895, cx. 399, 1896-1897, cx. 400, 1898-1899; cx. 401, 1900-1902; cx. 402, 1903-1904, cx. 403, 1905-1906;cx. 404, 1907-1908; cx. 405, 1910-1928 Fundo das Invasões Francesas Colecção Belisário Pimenta, Doc. Nº 84 - «Relação dos assassinatos, roubos inçendios, e atrocidades cometidas no Arciprestado de Mortagoa desde o dia vinte e hum de Setembro de mil outocentos e des, athe o dia quatro de Outubro pelo Exercito doz Fracezes comandado pelo gem.al Maçena feitas pelo arcipreste Joaquim Lebre Teixeira, 5 Junho 1811» Fundo da Assembleia Distrital de Coimbra - Livro de actas das sessões da Comissão Distrital de Coimbra, 1908-1913, nº 12, 200 Fls. BIBLIOTECA GERAL DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA (B.G.U.C.) Sala dos Reservados – Manuscrito 3363: Memórias de Belisario Pimenta, Vol. 9º, 1910-1911, 371 Pp.; Vol. 18, 1954-1955, 313 Pp. ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL DE COIMBRA (A.H.M.C.) - CIDADE DE COIMBRA Tombo dos bens, propriedades, rendas, heranças e mais coisas da Cidade de Coimbra, 1678 (142 Fls.) - CIDADE DE COIMBRA Tombo dos bens, propriedades, rendas, heranças e mais coisas da Cidade de Coimbra, 1768 (234 Fls.)] - Inventário dos prazos da Câmara Municipal do Concelho de Coimbra, 1875 (106 Fls.) - Registo da Legislação, Tomo 4º - Registo, Tomo XIII - Licenças e Juramentos, 1785-1788 (179 Fls), 1805-1807 (199 Fls) - Livro dos Juramentos das Justiças dos concelhos do termo: 1719-1723 (140 Fls); 1723-1728 (S/n); 1723 e 1734 (144 Fls.); 1728-1732 (86 Fls); 1742-1750 (127 Fls); 1748-1754 (249 Fls); 1755-1757 (200 Fls); 1776 (28 Fls numeradas); 1777 (90 Fls); 1780-1782 (179 Fls

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Freguesia de Souselas – um povo com História

1783-1785 (142 Fls); 1786-1789 (428 Fls) 1790 (98 Fls); 1791 (103 Fls), 1792 (108 Fls); 1793 (100 Fls); 1794 (99 Fls); 1795 (100 Fls); 1796 (S/N); 1797 (100 Fls); 1799 (71 Fls); 1800 (67 Fls); 1801-1802 (207 Fls); (48 fls. numeradas); 1804 (49 Fls numeradas); 1805-1807 (200 Fls); 1807-1812 (391 Fls); 1814 (126 Fls); 1815 (130 Fls); 1829 (S/n) - Livro de Pautas das Justiças do Termo da Cidade de Coimbra, 1748-1754 - Livro das pautas das justiças dos concelhos do termo de Coimbra: 1814 (S/n), 1817 (S/fls) - Livro das Vereações, 1533, Nº 6; Livro de Vereações da Câmara Municipal de Coimbra, 16441648 (141 Fls) - Livro de Actas das Sessões da Câmara Municipal de Coimbra: 1861-1863, Nº 87; 1866-1868, Nº 89;1870-1873, Nº 91; Nº 102, (1888-1890); N.º 150 (1941); Nº 212 (1962-1963) Nº 213, 1963, Nº 243, 1969; Nº 145, 1936-1937; Nº 244, 1969; Nº 245, 1969-1970; Nº 248, 1971; Nº 250, 1972; Nº 251 (1972); Nº 253; Nº 254; Nº 255, Nº 258 (1974); Nº 260 (1974-1975); Nº 264 (1976); Nº 265 (1976); 270 (1978); Nº 274 (1979-1980); Nº 277 (1980); Nº 283 (1981); Nº 294, 1983; Nº 297; Nº 307, 1985; Nº 310, 19851986; Nº 313, 1986; Nº 323; Nº 324; Nº 327, 1988; Nº 329; Nº 331; Nº 332, Nº 333, 1989; Nº 334, 1989;Nº 337, 1990; Nº 344; Nº 346; Nº 347; Nº 350; Nº 353;Nº 366; Nº 381; Nº 386; Nº 390; Nº 391; Nº 392; Nº 395, Nº 396; Nº 398, º 399, Nº 400; Nº 401; Nº 404; Nº 406; Nº 408, Nº 409, Nº 413, Nº 416 - Actas da Comissão de Arredondamento das Freguesias, 1862-1865, 28 Fls. - Estradas Municipais – Antuzede-Sargento-Mór, 1869; Antuzede- Sargento-Mór, 1872; Souselas, 1874 - Livro de Notas da Câmara Municipal de Coimbra, nº 20, 1830-1844 (395 Fls) - Livro de Autos de Arrematação da Câmara Municipal de Coimbra, 1877-1878 (100 Fls.) - Livro de Escrituras, Nº 51, 1947-1950, (100 Fls.) - Livro de Escrituras, Nº 53, 1952-1953, 100 Fls.) - Livro de Escrituras, Nº 57, 1957-1958 (100 Fls) - Livro de Escrituras, Nº 58, 1958, (100 Fls.) - Livro de Escrituras, Nº 66, 1962-1963 (100 Fls) - Livro de Escrituras, Nº 71, 1966; Nº 83 (1975) - Livro de Foros da Câmara Municipal de Coimbra, 1862-1897 (161 Fls). - Diversos Maço III, Doc. Nº 13 - Diversos Maço IV, Doc. N.º 19 - Livro de Actas do Conselho Municipal, 1937-1949, 100 Fls. - Copiador de correspondência expedida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1937 - Copiador de correspondência recebida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1936 (142 Fls.); Copiador de correspondência expedida pela Comissão de administração dos bens da Igreja pertencentes ao Estado, 1912-1937 (121 Fls.) - Mapas das Obras Municipais, 1851-1877 - Juradias, 1739-1791 - Finta da Levada dos Presos, 1597-1623 - Registo Militar: N.º I, 1764; Nº II, 1764-1781 - Eleições Militares: Nº I, 1626-1707; N.º II, 1707-1770, N.º III, 1771-1794, N.º IV, 17941806, N.º V, 1805-1814, N.º VI, 1814-1834

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Fontes Manuscritas

CONCELHO E PARÓQUIA DE SOUSELAS

- Livro das Decimas da Freguesia de Souselas, 1827 - Livro das eleições das justiças do Concelho de Souselas, 1823-1834, (19 Fls.) - Livro de Coimas e Audiencias do Concelho de Souselas, (124 Fls) - Livro das eleições das justiças do Concelho de Souselas, 1823-1834 - Livro de receita e despeza da Junta de Parochia da freguezia de Souzellas (1 fl.) - Livro das Actas das eleições da Câmara Municipal na Assembleia Eleitoral da Paróquia de Souzellas, 1855, Fls. 10 - Livro do Recenseamento Eleitoral de Souselas, 1836 (48 Fls.) CONCELHO DA ZOUPARRIA DO MONTE

- Livro das Coimas da Zouparria do Monte, 1834-1835 (106 Fls). ARQUIVO DA JUNTA DE FREGUESIA DE SOUSELAS (A.J.F.S.) - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1917-1926, 48 Fls. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1926-1938, 50 Fls. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1938-1950, 50 Fls. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1958-1967, 50 Fls. - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1967-1975 (S/N) - Livro de Actas da Junta de Freguesia de Souselas, 1994-2008 (100 Fls) - Livro de Actas da Assembleia de Freguesia de Souselas, 1977-1983 - Livro de Actas da Assembleia de Freguesia de Souselas, 1992-1999, 99 Fls - Livro de Actas da Comissão de Moradores de Souselas, 1975-1976, 45 Fls. - Pasta Colectividades da Freguesia - «Acta da Assembleia Geral de Moradores do lugar de Marmeleira do Botão» - «Necessidades mais urgentes na Freguesia de Souselas», 1974 - Correspondência Diversa (diversas pastas sem designação). - Correspondência Recebida, 1976-1979 (pasta) - Correspondência Recebida, 1980 (pasta) - Correspondência Recebida, 1981 (pasta) - Correspondência Expedida, 1977-1983 (pasta) - Correspondência Recebida e Expedida (apenas de e para a Câmara Municipal de Coimbra), 1986-1990 - «Documentos Construção da Sede, Polidesportivo e Capela de Sargento Mór» (pasta) - «Infantário de Souselas», pasta (6 cadernos) ARQUIVO PAROQUIAL DE SOUSELAS (A.P.S.) - «Casa Paroquial – Documentação» (processo) - «Inventário das propriedades e oliveiras das confrarias», 1868-1870

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Freguesia de Souselas – um povo com História

ARQUIVO DA CASA DO POVO DE SOUSELAS (A.C.P.S.) - Livro de Actas da Comissão Directiva da Casa do Povo de Souselas, Maio 1978-Novembro 1983 - Livro de Actas da Direcção da Casa do Povo de Souselas, Dezembro 1983-Maio 1999 - Livro de Actas da Assembleia Geral da Casa do Povo de Souselas, Maio 1974-2011 - Actas da Direcção da Casa do Povo de Souselas (pasta), Junho 2007-Maio 2010 ARQUIVO DO GRUPO ETNOGRÁFICO DE SOUSELAS (A.G.E.S.) - Historial do Grupo Etnográfico de Souselas - Resposta ao questionário remetido pelo Grupo Etnográfico de Souselas à Federação do Folclore Português, 1988 ARQUIVO DA ASSOCIAÇÃO DESPORTIVA DE SOUSELAS (ADS) -Livro de Actas da Assembleia Geral da Associação Desportiva de Souselas, Outubro 1975-Dezembro 1989 - Livro de Actas da Assembleia Geral da Associação Desportiva de Souselas, Fevereiro 1990-2011 ARQUIVO DO CENTRO DE APOIO SOCIAL DE SOUSELAS (ACASS) - Livro de Actas da Comissão Instaladora do Centro de Apoio Social de Souselas, 1992 - Livro de Actas da Direcção do Centro de Apoio Social de Souselas, 1993-2001 ARQUIVO DO CENTRO CULTURAL DE SARGENTO-MOR (ACCSM) - Relatório de Actividades, 1995 - Livro de Actas da Direcção, 2007-2011 - Livro da Receita e Despesa, 1989-1993 - Pasta «Documentos anteriores a 2007» ARQUIVO DO CENTRO CULTURAL ZOUPARRIA DO MONTE (ACCZM) - Livro de Actas da Assembleia Geral, 1993-2009, 35 Fls. numeradas ARQUIVO DO CENTRO SOCIAL DE MARMELEIRA (ACSM) - Estatutos do Centro de Recreio Popular Marmeleirense - Relatórios de Contas da Delegação da Casa do Povo de Souselas na Marmeleira, 1974-1989 - Regulamento Interno, 2004 - Livro de Actas da Assembleia Geral do CSM, Dezembro 1994 – Dezembro 2011, 150 fls.

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ANEXOS (Tabelas e Documentos)

Tabela 1 – Monteiros nomeados para as Matas de Lagares e Botão (sécs. XV-XVI)(1) Data Nome Mata Observações Até 25/09/1441 Lourenço Afonso Lagares e Botão Aposentou-se 25/09/1441 Álvaro Afonso Lagares e Botão Morador em Brasfemes Id. Álvaro Afonso da Torre Id. Id. 27/09/1441 Estêvão Pires Id. Id. 1/10/1441 Rodrigo Anes Id. 10/10/1441 Gonçalo Esteves Id. 11/10/1441 João de Pena 12/10/1441 João Lourenço 13/10/1441 Afonso Anes Moreiro Id. Souselas 25/10/1441 João Lourenço Id. Id. João Bartolomeu Id. 26/09/1442 Afonso Anes Id. 1/10/1442 Gil Pires Id. 8/11/1442 Martim Pires Id. Id. Vasco Lourenço Id. Id. Pedro Afonso Id. 12/11/1442 Pedro Vasques Id. 20/10/1443 João Afonso Sobrinho Id. 28/9/1445 Afonso Domingues Id. Souselas Id. Rodrigo Anes Id. 6/3/1450 João de Monte Redondo Id. 16/6/1450 João Anes Id. Id. Fagunde Anes Id. Id. João Fernandes Id. Id. Vasco Afonso Id. Id. Pedro Anes Id. 22/10/1450 Pedro Garcia Id. 30/5/1451 Afonso Alvares Id. 6/6/1451 Fernão Rodrigues Id. 29/5/1452 Martim Vaz Id.

Fonte: História Florestal, Aquícola e Cinegética: Vol. II, 1439-1481, Lisboa, 1982, Pp. 34, 37, 38, 39, 44, 45, 50, 54, 74, 75, 80, 81, 85, 91, 93, 94, 95, 99, 122, 138, 139, 158, 191; História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. III, 1481-1493, Lisboa, 1982, Pp. 61,64 História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. IV, 1495-1521, Lisboa, 1983, Pp. 26, 282 História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. V, Fasc. I (1521-1527) 1495-1521, Lisboa, 1988, Pp. 127, 128, 131, 132, 134 História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. V, Fasc. II (1528-1564)), Lisboa, 1990, Pp. 61, 89, 90, 148, 150, 163 História Florestal, Aquícola e Cinegética, Vol. VI (1553-1583), Lisboa, 1993, P. 107

(1)

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Data 2/10/1452 Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. 3/10/1452 Id. 6/10/1452 16/10/1452 12/10/1453 15/10/1453 11/8/1458 5/7/1459 16/8/1464 23/8/1464 21/9/1464 28/9/1464 1/10/1464 16/8/1468 9/10/1469 8/3/1473 Id. Id. Id. Id. Id. Id. 4/10/1473 6/1/1484 5/3/1484 23/2/1486 4/5/1496 20/3/1520 20/12/1526 Id. 8/2/1527 Id.

Nome Martim Pires Álvaro Afonso Vasco Martins Vasco Lourenço Rodrigo Anes Estêvão Anes Estêvão Pires Pedro Anes Alvaro Anes Pedro Afonso Pedro Vaz João Afonso Afonso Eanes Lourenço Pires Pedro Álvares João Aires João Fernandes João Vasques Afonso Anes João Alvares Vasco Pires Pedro Gonçalves Estêvão Vicente Afonso Alvares Fernando Afonso Vasco Pires Lopo Rodrigues Goncalo Fernandes Pedro Vaz Dinis Geraldes Pedro Afonso Luis Eanes João Alvares Afonso Alvares João Alvares Pedro Eanes João Vasques Vasco Afonso Pedro Fernandes Fernando Álvares

Mata Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Mata Lagares

28/3/1527 29/7/1527 Id.

Fernando Anes Gonçalo Anes Alvaro Lopes

Id. Id. Id.

Carta de confirmação Id. Morador em Coimbra Carta confirmação, Morador em Coimbra Morador em Coimbra Id. Id.

13/10/1529 Id.

Rodrigo Alvares Vasco Afonso

Id. Id.

Carta de aposentação

Mata Lagares Id. Id. Id.

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Observações

Carta aposentação Id.

Carta de confirmação Id.

Anexos

Data 2/5/1531 Id.

Nome Fernando Anes Goncalo Afonso

Id. 7/6/1531 13/2/1539

Pero Fernandes Francisco Lourenço João Pires

Mata Id. Mata Lagares e Botão Id. Mata Lagares Id.

15/3/1539

João Afonso

Id.

Id.

João Alvares

Id.

Id. 19/4/1542 Id. 21/3/1545

Francisco Anes Pedro Alvares Luís Anes Pedro Anes

Id. Id. Id. Id.

8/5/1545 21/10/1578

Martinho Anes Antonio Roiz

Id. Botão e Lagares

Observações Morador em Eiras

Morador em Eiras Morador no termo de Ançã Carta de monteiro e guarda; Morador em Ançã Carta de monteiro e guarda Id.

Morador na Ventosa, termo Coimbra Morador no Freixo

Tabela 2 – Indíce dos 24 Cabeças de Casal e respectivos inquilinos segundo o Tombo de Souselas, 1705 Cabeça: Antonio Simois (o novo) e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA M.ª Francisca Amaral , viúva Souselas Escolastica de Barros, viúva Souselas Dr. Supriano da Costa e mulher Souselas João Nugr.ª e mulher Souselas Manoel Fernandez Carracena e mulher Vilela Antonio Fernandez, sapateiro, e mulher Cidade de Coimbra Maria Roiz, viuva (mãe do cabeça de casal) Ribeiro Dr. P.º Roiz de Almeida (reconhecido à revelia) Cidade de Coimbra Manoel da Cunha, ferreiro, e mulher Souselas Francisco Nugueira da Costa, e mulher Vila de Ançã Cabeça: Bras Denis e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA M.ª Fernandez, “abalthezara”, viúva Souselas Manoel Fernandez Violante, viúvo Souselas Izabel da Cunha, viúva Vilela Manoel Fernandez, sapateiro e mulher Brasfemes Antonia Gomes, viúva Cidade de Coimbra Thereza de Jezus, viúva do Capitão João da Costa Fornos Padre Luis Pereira da Cunha Cidade de Coimbra D. Marianna da Costa, viúva Cidade de Coimbra

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Cabeça: Antonio Fernandez Gorgoleiro e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Francisco Marques Souselas Antonio da Cunha e mulher Torre A Irmandade das Almas da Igreja de Brasfemes Brasfemes Dr. Diogo Ribeiro da Crus (reconhecido à revelia) Coimbra Padre Manoel Pires Pinto Outeiro do Botão M.ª orfã (reconhecido pelo curador, Dr. Supriano da Costa) Ribeiro Cabeça: Manoel da Cunha Branco e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Manoel da Cunha Murto e mulher Souselas Manoel Fernandez, pedreiro Souselas Martinho Pires Cordeiro Coimbra M.ª do Sepulcaro, solteira Recolhida em Lorvão Manoel Correia e mulher (reconhecido à revelia) Cidade de Coimbra Cabeça: Manoel Dias, lavrador, e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Izabel de Souza, solteira Souselas Cosme Dias de Campos e mulher (reconhecido através Vila Nova de Monsarros de procurador) Manoel Alves Ramos e mulher Vila de Botão Padre Hyeronimo Martins Cura na Igreja da Pampilhosa Marianna da Costa, “a emgeitada”, solteira Vila de Botão Licenciado Antonio Castanho e mulher Cidade de Coimbra Luis Alves, “o soldado”, solteiro Vila de Botão Anna Francisca, viuva Zouparria do Monte João Alves e mulher (reconhecido à revelia) Dianteiro Cabeça: Paschoal Luis e mulher Anna da Murta, de Souselas INQUILINOS MORADA João Ribeiro e mulher Souselas Manoel de Souza Manso e mulher Souselas Mathias Fernandez e mulher Souselas Padre Manoel da Cunha Manso Souselas Domingos Fernandez Carneiro e mulher Vila Verde Cabeça: Antonio Rodrigues Lisboa, e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA João Roiz, “mao cabello” e mulher Souselas Domingos Francisco Cativo, viúvo Souselas Padre Francisco Ribeiro da Crus Vilela Confraria do Senhor da Igreja da Torre Torre Dr. Bras Ferreira e mulher (reconhecido à revelia) Casal Comba Capitão-mor Francisco da Costa Cardozo e mulher Cioga Cabeça: Jozeph de Souza Molle e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Madalegna da Cunha, viúva Souselas Manoel da Cunha, solteiro, maior de 25 anos Souselas Manoel de Souza Molle e mulher (é pai do cabeça) Souselas Manoel Fernandez Parente e mulher Souselas Jozeph Fernandez, viúvo Souselas

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Anexos

Cabeça: Luis Marques e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA João de Souza, alfaiate, e mulher Souselas Antonio Simois Finete, solteiro Souselas Francisco Simois e mulher Souselas João da Silva Ganboa, viuvo (reconhecido à revelia) Coimbra Ilena Antonia, viúva Souselas Benta M.ª de Souza, viúva Brasfemes Padre Antonio Marques (reconhecido à revelia) Coimbra Cabeça: Manoel Duarte e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Maria Francisca, viúva de António da Cunha, ferreiro Souselas Maria da Cunha Ferreira, solteira Souselas Manoel Soares e mulher Souselas Irmandade de S. Sebastião da Igreja de Souselas Souselas Confraria de Nª Sr.ª do Rozario da Igreja de Souselas Souselas Mathias Marques e mulher Souselas Cabeça: Francisco da Cunha e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Maria Nugr.ª, viúva Souselas Antonio de Almeida, alfaiate, e mulher Souselas Manoel Gomes e mulher Brasfemes Manoel Roiz de Souza e mulher Brasfemes Cabeça: Antonio Simois Mariano e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Margarida da Costa, viúva Souselas Padre Manoel do Amaral e Cunha Vigário de Souselas Diogo Fernandez Rebello e mulher Souselas Izabel Simois, viúva Torre Marianna Lopes, viúva Vilela Manoel Lopes Salgado e mulher Adémia de Cima Cabeça: Diogo Matheus, viúvo, da Marmeleira INQUILINOS MORADA Padre João da Costa (filho do cabeça de casal) Marmeleira Padre Manoel Matheus de Souza Souselas Manoel Simois, boticario, viúvo Marmeleira João da Cunha e mulher Souselas Paullo de Oliveira e mulher Lagares Manoel Fernandez e mulher Marmeleira Gregorio Francisco e mulher Marmeleira Cabeça: Ursulla Francisca,viúva, de Souselas INQUILINOS MORADA Manoel Francisco Marianno e mulher Souselas Orfãos de M.ª Francisca Souselas Mordomos da Confraria do Senhor da Igreja de Souselas Souselas Antonio Francisco e mulher Torre Anna da Costa, viúva Torre Manoel Goncalvez Ribeiro

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Freguesia de Souselas – um povo com História

Cabeça: Manoel Ribeiro e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA Bento Correia, barbeiro, e mulher Souselas Manoel Fernandez Parente o novo, viúvo Souselas Estevão João, viúvo Souselas Anna Francisca, viúva (irmã do cabeça) Souselas Antonio Gonsalves e mulher Ribeiro Antonio Simois Moio e mulher Ribeiro Manoel Ribeiro e mulher Vilela Maria Pinta, viúva Vila de Botão Bernardo de Freitas, alfaiate, e mulher (reconhecido à Cidade de Coimbra revelia) Maria Fernandez Balthezar, solteira Souselas Francisco Marques e mulher Souselas Domingos Fernandez, viúvo (irmão do cabeça) Borbolga Cabeça: Antonio da Cunha, pedreiro, e mulher, de Souselas INQUILINOS MORADA João Roiz Couseiro e mulher Souselas Manoel Lopes, cardador Souselas Francisca Marques, solteira Souselas Manoel Couseiro e mulher Souselas Ignacia da Silva, viúva Souselas Domingos Francisco “o vilão de Emxufens”, e mulher Enxofães João Roiz Gabão e mulher Torre Antonio Lopes e mulher Torre Antonio Bernardes, viúvo Lagares Manoel Simois Grada e mulher Vilela Cabeça: Manoel Roiz e mulher, do Pizão do Canavial INQUILINOS MORADA Manoel Roiz o novo, e mulher Souselas João Roiz e mulher Pizão do Canavial Manoel Simois Lagares Pedro Simois de Bastos Lagares Izabel Jorge, viúva Canetas Antonio da Costa e mulher Brasfemes Padre João Carneiro Canetas Ilegna Antunes, viúva Canetas Anna da Conceição, viúva Lagares Cabeça: Antonio Simois Zarquo, moleiro, da Azenha INQUILINOS MORADA Luis de Oliveira, pintor, e mulher Azenha M.ª da Murta, solteira Azenha Padre Manoel de Avellar (reconhece por procurador) Coimbra Manoel Roiz e mulher Coimbra Luis Roiz e mulher Vila de Botão

682

Anexos

Cabeça: Domingos Francisco e mulher, de S. Martinho do Pinheiro INQUILINOS MORADA João de Agante e mulher Zouparria do Monte Antonio Jorge (como tutor de seus sobrinhos) Rios Frios Domingos Fernandez e mulher S. Martinho do Pinheiro Manoel Fernandez Barrozo e mulher S. Martinho do Pinheiro Antonio Goncalvez, solteiro Cidade de Coimbra Domingos Fernandez, ferreiro, viúvo Vilela M.ª Francisca “a neta”, viúva Trouxemil Antonia, solteira, maior de 20 anos Zouparria João Ferreira, o novo Rios Frios Simão da Costa, solteiro Trouxemil Vitorio da Costa Serveira e mulher (reconhecido por Vila de Ançã procurador) Cabeça: Capitão Mor Antonio Simois de Torres Pereira, e mulher, da Torre Não existiam inquilinos deste casal. Tratava-se essencialmente de uma propriedade que António Pereira tinha e possuía na forma de prazo; «humas azenhas que estam no simo deste lugar de Souzellas aonde chamão as moendas» Cabeça: Manoel Alvarez, da Marmeleira INQUILINOS MORADA Domingos da Costa e mulher Marmeleira Manoel Gil, solteiro Marmeleira Jozeph Francisco e mulher Marmeleira Gabriel Barreto e mulher Marmeleira Jozeph de Agante, viúvo Marmeleira Manoel Simois o velho e mulher Marmeleira Domingos Simois e mulher Barcouço Mel. Francisco, “o neto” e mulher Marmeleira Cabeça: Jozeph Ribeiro e mulher da Marmeleira INQUILINOS MORADA João Ribeiro e mulher Ribeiro Domingos Roiz e mulher Marmeleira Manoel Bernardes e mulher Outeiro de Botão Manoel Gomes Zaburro e mulher Vila de Botão Jozeph de Brito, viúvo Vila de Botão Dr. Manoel Cordeiro de Siabra, solteiro Vila de Botão Manoel Esteves e mulher Larçã Anna da Cunha, viúva Vila de Botão Cabeça: Francisco de Souza Marques, Souselas INQUILINOS MORADA Manoel Dias, pedreiro, e mulher Souselas Manoel de Souza Marques (irmão do cabeça que reco- Lisboa nhece como seu procurador) Maria Roiz, viúva Vila de Botão Cabeça: Antonio Fernandez, viúvo, do Ribeiro INQUILINOS MORADA Manoel Duarte e mulher Torre João Velho e mulher Torre Mel Simois Vimieiro, e mulher (é irmão do cabeça) Vilela

683

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 3 – Inventário dos foros suprimidos no Concelho de Coimbra, relativos ao extinto Convento de Santana, 1886-1889(2) Enfiteutas (todos da Marmeleira) Bens 1 - Francisco Cadete - terra que foi vinha no sitio do Valbom -terreno de vinha no sitio do Cidral 2 – José da Costa - terra que foi vinha no sitio da Cruz - terra no sitio do Chão da Fonte - uma terra em pousio com 2 tanchoeiras no sitio do Pousio Largo 3 – António da Costa - terra que já foi vinha em Valle de Cavallos - terra no sítio da Fonte - terra no sítio da Sobreira - pousio com 2 oliveira no sítio da Sobreira 4 – António dos Santos Moura - terra no sítio da Ladeira da Pedrulha - terra no sítio dos Carrapiteiros - pousio com 2 oliveiras no sítio da Sobreira 5 – João Cavaco - pousio no sítio da Barroca da Peça - terra de vinha no sítio da Ribeira da Pedrulha 6 – Manuel Cavaco - terra que já foi vinha no sítio das Bragas - terra no sítio das Goivas - pousio no sítio da Sabreira 7 – José Cavaco - terra no sítio da Goiva - terra que já foi vinha no sítio de Valbom - pousio com 3 oliveiras no sítio da Sabreira 8 – Rosa Cavaco - terra que já foi vinha no sítio das Bragas - terra no sítio da Matinhas - pousio com 2 oliveiras no sítio da Sabreira 9 – António Ventura - terra no sítio da Goiva - terra no sítio do Pinheiro - terra no sítio das Bragas - terra no sítio da Ribeira da Pedrulha - pousio no sitio de Valle de Cavallos - pousio no sitio da Relva - pousio com 6 oliveiras no sitio dos Carrapiteiros - pousio com 3 oliveiras no sitio dos Carrapiteiros - pousio no mesmo sitio - pousio com 12 oliveiras no sitio das Sabreiras - terra no sítio da Lavegada 10 – Manuel Ventura - terra no sítio da Fonte - terra no sítio da Lavegada - terra na Rigueira da Pedrulha - pousio no sitio dos Carrapiteiros - pousio com 4 oliveiras no mesmo sitio - outro pousio no mesmo sitio - pousio com 13 tanchas de oliveira no sítio das Sabreiras - pousio com 6 tanchas no sítio do Pousio Largo

(2)

A.U.C. – Fundo dos Próprios Nacionais: Convento de Santa Ana, Lº Nº 89-A, Fls. 54v.-61]

684

Anexos

Tabela 4 – Justiças do Concelho de Souselas, 1719-1829(3) Ano Juiz Procurador Escrivão 1719 Manoel Fernandez Francisco Simois Manoel Ribeiro 1720 Jeronimo Lopes João de Oliveira Manoel Ribeiro 1721 Manoel Fernandez Domingos de Souza Manoel Ribeiro 1722 Antonio Simoins (ou Sebastião Soares Manoel Ribeiro Jozeph Duarte 1723 Manoel da Murta Jozeph Fernandez Bento da Cunha Nogueira 1724 Antonio Simois Jeronimo Lopes Antonio da Cunha 1725 Manoel Correia Manoel Fernandez Antonio da Cunha 1726 Joze Fernandez monico Antonio da Cunha Joze Gomes 1727 Antonio Roiz Antonio Simois Antonio Bandeira 1728 Mathias Marques Joze Fernandez Amaro Lourenco da Cunha 1729 Manoel Pyres Jozeph Fernandez Antonio da Murta 1730 João Bautista Manoel Correia Antonio Bandeira 1731 Bartolo G.ez Antonio Roiz Jozeph Correa 1732 Francisco Duarte Manoel Fernandez Antonio da Murta 1733 Francisco Simois Manoel Pyres Jozeph Duarte 1734 Manoel da Cunha Berttolo gomes Antonio da Cunha 1742 Paulino da Costa Manoel de Almeida João Simois Jozé Gomes 1743 Bertholo da Cunha - Manoel Roiz gorgoleiro (“seu lugar foi Jozeph Correia por que tinha crime) - Jozeph Correia 1744 Antonio da Murta João Simoens Jozé Duarte 1745 Antonio de Souza Antonio Simois Andre da Cunha 1746 Bernardo Monis de Souza Francisco Simoes Joam Simois 1747 Jacinto Marques Bartholomeu da Manoel Roiz Cunha 1748 (1) Manoel Correia da Paulino da Costa Jozé Correa Azenha 1749 André Francisco Jozé da Silva Vittorino Jozé 1750 Manoel Soarez Jozé da Costa Id. 1751 Manoel Lopez Manoel Francisco dos Antonio da Costa Santos 1752 Manoel da Murta Agostinho da Cunha Antonio da Murta

Esta tabela e as duas que se seguem foram elaboradas com base nos dados extraídos dos Livro dos Juramentos das Justiças dos concelhos do termo: 1719-1723 (140 Fls); 1723-1728 (S/n); 1723 e 1734 (144 Fls.); 1728-1732 (86 Fls); 1742-1750 (127 Fls); 1748-1754 (249 Fls); 1755-1757 (200 Fls); 1776 (28 Fls numeradas); 1777 (90 Fls); 1780-1782 (179 Fls 1783-1785 (142 Fls); 1786-1789 (428 Fls) 1790 (98 Fls); 1791 (103 Fls), 1792 (108 Fls); 1793 (100 Fls); 1794 (99 Fls); 1795 (100 Fls); 1796 (S/N); 1797 (100 Fls); 1799 (71 Fls); 1800 (67 Fls); 1801-1802 (207 Fls); (48 fls. numeradas); 1804 (49 Fls numeradas); 1805-1807 (200 Fls); 1807-1812 (391 Fls); 1814 (126 Fls); 1815 (130 Fls); 1829 (S/n); Livro das pautas das justiças dos concelhos do termo de Coimbra: 1814 (S/n), 1817 (S/fls); Livro das eleições das justiças do Concelho de Souselas, 1823-1834

(3)

685

Freguesia de Souselas – um povo com História

Ano 1753

Juiz Antonio Correa

1754 1755

1789 1790 1791 1792 1793

Antonio Francisco Manoel da Cunha Carpenteiro Joze da Costa Manoel Lopez Louro Antonio Duarte Manoel Duarte Antonio Francisco da Murta (inquamo?) Antonio da Cunha Manoel Francisco da Murta Antonio Ferreira Manoel Lourenço Joze da vinha ramelcho(?) Antonio Alves Domingos Fernandes Vitorino Simoens Joze da Cunha Ramelcho (ou Ramalho) Manoel Simoins Manoel Lopes Botelho Joze de Souza Joze Lopes Adrião das Neves

1794 1795 1796 1797 1799

Joam Ferreira Jozé Gomes Joao(?) Francisco Cunha Antonio da Murta Joze Rodrigues

1800 1801 1802 1803 1804 1805 1806

? Domingos Simois - Joaquim Simois - Manoel Rodrigues da Igreja Manoel da Costa Tores Joze Roiz Antonio dos Santos Manoel Roiz

1807

Joze da Murta

1756 1757 1776 1777 1780 1781 1782 1783 1784 1785 1786 1787 1788

Procurador Manoel Domingos Golpalho Calisto dos Santos Manoel Soarez

Escrivão Antonio da Costa

Bertholo da Cunha Manoel Correya Lucas de Souza Francisco da Murta

Joao da Cunha - Vitorino Jozé (absoluto) - Manoel Rodrigues oleiro Vitorino Jozé João da Cunha Joze da Costa Soarez Antonio Fernandez

Thomas Ferreira Simão Lopes

Manoel Duarte Andre da Cunha

João Lopes Antonio Soares Simão Lopes Manoel da Cunha Joaquim Joze Manoel Lopes Joze de Campos

Manoel da Cunha Manoel da Cunha Joze da Costa Soarez Id. Joze da Costa Soarez Id. Id.

Siman da Costa Joze dos Santos Joaquim Simoens Antonio da Murta Manoel da Costa Pires (?) Manoel Simois Antonio Duarte Manoel Duarte Agulha Joze de Souza - Antonio Duarte - Manoel Joze ? Manoel Simois - Manoel Lourenço - Manoel Marques - Manoel Duarte Manoel Lourenço Manoel Marques Novo Joze da Costa Torres - Antonio… - Antonio da Cunha Adrião das Neves

Id. Id. Id. Id. Id.

686

Id. Id. Id. Id. Id. ? Joze da Costa Soares Id. Id. Id. Id.

- Bento de Lemos - Joaquim da Costa Soares

Anexos

Ano 1808 1809 1810 1811 1812 1813 1814 1815

1816 1817 1829

Ano 1719 1720 1721 1722 1723 1724 1725 1726 1727 1728 1729 1730 1731

(4)

Juiz Antonio Francisco de Murta Sebastiam Lopes Joze da Costa

Joze Lopes Manoel da Cunha Manaia Joao da Costa - Manoel Simois - Joaquim Simoens - Adrião das Neves - Antonio dos Santos Antonio Joze sereigero Manoel Simois Alfaate

Procurador Bernd.º Simoes

Escrivão Joaquim da Costa Soares

Joze Gomes novo Manoel de Almeida Joaquim Joze

Id.

Joaquim Ferreira Joaquim Antonio

- Bento de Lemos - Joze de Souza Theotonio Soares Cardozo Bento de Lemos

Manoel Fernandes - Joze Duarte Agulha - Adrião Lopes - Joaquim Gomes - Joaquim Antunes - Joaquim Joze de Oliveira Manoel Simois Joao de Souza Manoel da Silva

Joaquim da Costa Soares - Bento Simoes - Joze de Souza - Theotonio Soares Cardozo - Joze Lopes - Manoel Correia Joze Rodrigues Valente Manoel da Costa Tores Manoel Correia

Tabela 5 – Justiças do Concelho da Marmeleira, 1719-1829(4) Juiz Procurador Escrivão Manoel Francisco Andre Francisco Antonio Francisco Lindo Matalão Manoel Francisco o novo Domingos Fernandez Manoel Fernandez Barreto Crestina Domingos Lopes Manoel Simois Domingos Fernandez Manoel Simois Manoel Fernandez Domingos Fernandez Mariano Manoel Fernandez calçem Manoel Simois Andre Francisco Jozeph Simois Antonio Francisco Andre Francisco Domingos Fernandez Agostinho Lopes Andre Francisco Joam da Costa Manoel Fernandez Crisóstomo da Cunha Mariano Domingos Fernandez Manoel Fernandez Domingos Fernandez Matagozo (?) Mathias Chrestina João Francisco Barrette João Fernandez Manoel Fernandez Calsam Tecellam Domingos Roiz Joao da Cruz Manoel Fernandez Antonio Lopes Manoel Simoes Binba João Solteiro Manoel Fernandes ? ? Mathias o novo

Id.

687

Freguesia de Souselas – um povo com História

Ano 1732

Juiz Manoel Simois Ramalho

1733

Mathias Francisco

1734 1742 1743 1744 1745 1746 1747 1748 (1)

Jozeph Francisco Barrette Antonio Simons Manoel Francisco Calção Manoel dagante ? Domingos Gomes Agostinho Fernandez Antonio Correa

1749 1750

Sebastião Simois Manoel Simois Serodio

1751 1752 1753

Manoel Duarte Antonio Francisco o novo Joao Simoens Louro

1754 1755

Jozé Fernandez da Fonte Antonio Lopez doz Santos

1756 1757

Sylvestre Roiz Manoel Jozé do Cabesso

1776 1777 1780 1781 1782 1783 1784 1785 1786 1787 1788 1789 1790

Joao dos Santos Joze Francisco Louro Adriam Fernandes Manoel Lopes Botelho Manoel Roiz Theotonio Duarte (?) Manoel Barreto (?) Adrião Simoins Serodio Adrião Simois Binbo Joao Simoins Luis Duarte Manoel Simois - Antonio Lopes dos Reis (faleceu) - Manoel Denis Domingos dos Reis Andre Correa (?) Theotonio dagante Luis Duarte

1791 1792

Procurador Escrivão Jozeph Francisco Andre Francisco Barrete João Francisco Ferreiro Domingos Fernandez Cristina Antonio Lopes Antonio Fernandez Calção Agostinho Lopes Joam Simois Antonio Lopes João Simoens Bento Francisco Luis Francisco ? ? Manoel Simois Luis Francisco Joam da Costa Antonio Francisco Reis Antonio Francisco Joze Fernandez Teselão do Cabesso João Simois Binbo Luis Francisco Manoel Dagante Manoel Solteiro enteado de Manoel Reis Francisco Manoel Jozé Antonio Fernandez Reis Luis Francisco Joao Simoens Agostinho Fernandez Joze Fernandez do Cabesso Sebastiao Simoens Manoel Jozé de Agante - Adriam Francisco Manoel Solteiro f.º de (absoluto) Agostinho Lopez - Manoel Francisco (absoluto por velho) - Antonio Denis João Semois Manoel frd.º João Fernandez dos Jozé Fernandez do Cabeço Reys Pascoal Joze Domingos Soares Manoel Lopes Botelho Domingos da Costa Luis Alves Adriam Jozé Joze Marques Joam Joze Theotonio Lopes João dos Santos Joze Simois (?) Joam Soares (?) Adrião Fernandes (?) Domingos Paes da Costa Manoel Roiz das Neves Manoel Lopes Manoel Simois Theotonio Lopes Joze ventura Joam Joze Francisco Theotonio dagante Adriam Joze João Antonio Elias Joze Pinto Antonio Francisco Domingos Paes da Costa

688

Manoel da Costa Adrião Simois Binbo

Anexos

Ano 1793

Juiz Joam Soares

1794 1795 1796 1797 1799

Joaquim Lopes Sebastiam Francisco Manoel da Costa Joam Fernandez Joam Simois

1800 1801 1802 1803

Francisco Roiz Manoel Pereira Sebastiam da Costa Joam Rama

1804

Joaquim dos Santos

1805

Manoel Joze

1806 1807 1808 1809 1810 1811 1812 1813 1814 1815 1816 1817 1829

Procurador Adrião (?) Simões Binbo Manoel de Almeida Bernardo Simois Manoel Rodrigues Manoel Lopez - Manoel Francisco Maleiro - Manoel Joze Sebastiam Francisco Joaquim Lopes Manoel Canetas - Domingos Simois - Joze da Cunha - João Simois João Prior

Francisco Rodrigues Manoel Joze Ventura Manoel Francisco Manoel Francisco Correa Teotonio Simoes Manoel Sapateiro Joze… Bernardo Joze Manoel Pereira Joao Antonio Fernandes João Rebelo Adrião Francisco Antonio dos Reis Domingos Dinis ? Joao Prior ? - Antonio Joze da Cunha - Sebastião Fogueteiro - Joze dos Reis - Manoel da Cunha - Theotonio da Costa - Joaquim Joze - Joze dos Reis - Sebastiam dos Reis - Joao Francisco Rebelo - Adrião Loredio(?) Manoel da Costa Antonio Ferreira Antonio Maleiro Manoel Almeida Manoel de Almeida Antonio Francisco Malleiro

Escrivão Domingos Paes da Costa Adrião Joze Joam Antonio Joaquim Fernandez Domingos Paes da Costa Adrião Binbo Joam Joze Antonio Adriam Joze Adrião Binbo - Antonio Pinto - Adrião Francisco Prior Adriam Joze Adrião Francisco Prior Adrião Binbo Antonio dos Reis Joam Anthonio Adrião Simois Binbo Joaquim Lopes dos Reis Antonio Rama Adrião Binbo Joam Antonio Joze Antonio dos Reis Joze dos Reis Joao Fernandez Antonio Jozé Joaquim

Tabela 6 – Justiças do Concelho da Zouparria do Monte, 1719-1829(5) Ano Juiz Procurador Escrivão 1719 Domingos Fernandez Pascoal Francisco Manoel Ribeiro 1720 Domingos Franc.º João Roiz Manoel Ribeiro 1721 Leandro Pereira Domingos Francisco Manoel Ribeiro 1722 Antonio da Cunha (de S. Andre Fernandez (de Manoel Ribeiro Martinho) Carrima)

(5)

Id.

689

Freguesia de Souselas – um povo com História

Ano 1723 1724 1725 1726 1727 1728 1729 1730 1731 1732 1733 1734 1742 1743 1744 1745 1746

Juiz Antonio Fernandez (de Sam Martinho) Andre Ferreira (?) Manoel Fernandez Domingos Fernandez Manoel Fernandez Carrimá Sebastiao Roiz João Roiz Joze Francisco Bicho Manoel Simoens Zomparria Ignacio Fernandez Leandro Pereira Francisco Simonis Manoel Simoens Antonio Pereira Manoel Simoens Barrozo Manoel Glz Manoel Fernandez Barbado Manoel Francisco Barrete

Procurador Jozeph Fernandez

Escrivão Manoel Ribeiro

Manoel Simois Joam Roiz Leandro Pereira Antonio Fernandez Guerra Andre Fernandez João Correa Sabastião Roiz Manoel Fernandez

Manoel Ribeiro Manoel Carneiro Joam de Agante Manoel Carneiro

Manoel Simois Antonio Fernandez Manoel Simois Ignacio Fernandez Manoel Nogueira Jozé Fernandez Joam Simois Antonio Fernandez Barrozo 1747 Manoel Fernandez Gerra 1748 (1) Manoel Francisco Carimá Manoel Francisco cardadeiro 1749 Antonio Duarte Manoel Fernandez Soldado 1750 Manoel da Silva Manoel Nugeira 1751 Domingos Simoens Ignaçio Fernandez 1752 Manoel da Silva Manoel Francisco Carimá 1753 Luis Fernandez Manoel da Cunha 1754 Manoel Lopez Antonio Pereira 1755 Antonio Francisco Manoel Simoes Barrozo 1756 Theotonio dos Santoz Domingos Simois 1757 1776 1777 1780 1781 1782 1783

Theotonio Simoens

Joao de Agante Manoel Carneiro ? Joao de Agante Joachim da Murta João de Agante Manoel Carneiro Manoel Carneyro Joachim da Murta Antonio da Costa Joahcim da Murta Manoel Carneiro Antonio da Costa Jorge Francisco Antonio da Costa Jorge Francisco Manoel Carneiro Jorge Francisco Jorge Francisco Id. Theotonio Solteiro - Theotonio Simois (escuso) - Jorge Francisco Jozé Carneyro

Antonio Duarte Agulha Manoel Francisco o novo Domingos Simoens (?) Antonio Madeira dos (?) Santos Joam durate Francisco Fernandez Sebastião Madeira Antonio Joze Correa Antonio Fernandez Manoel Francisco novo Manoel Pereira Manoel Roiz Costa Manoel Gonsalves Antonio Joze Rois Alexandre Joze Sebastião Madeira Domingos Simonis Manoel Alves Theotonio Gonsalves

690

Anexos

Ano 1784 1785 1786 1787

Juiz Manoel Francisco o novo (?) Manoel Simoins Joze Fernandes Manoel Fernandes

1788 1789

Joaquim Francisco Joan Duarte

1790 1791 1792

Sebastião Fernandes Alexander Joze Joaquim Francisco

1793 1794 1795

Domingos Simoes Theotonio Simeons Joaquim Joze de Oliveira

1796 1797 1799

Antonio Roiz Joze Paula Francisco dos Santos

1801 1802

Domingos Simoens Joaquim Joze de Oliveira

1803

-Antonio Simois -Francisco dos Santos

1804 1805

- Joze Duarte Agulha - Joze Fernandez - Manoel Roiz Sebastião Fernandes

1806 1807

Izidorio Joze de Souza Joaquim Antonio

1808

Manoel Fernandes Bicho

1809 1810 1811 1812

Manoel Gomes Joze Doarte ? Antonio Gonsalves de Souza Manoel Simois Luis Corr.ª da Fonc.ª

1834 1835

Procurador Manoel Fernandez Bicho Vithorino Roiz Sebastião Madeira João Francisco da Costa Joaquim de Oliveira Andre… Joam Francisco Francisco Fernandes Manoel Fernandes Bicho Agostinho Fernandes ? Sebastiam Fernandez Solteiro Adrião Lopez Joaquim Antonio - Francisco Fernandes - Antonio Soares Cardozo Joaquim Antunes Manoel Fernandez Bicho - Joze Duarte Agulha - Adrião Francisco Sapateiro Sebastiam Lopes Joze Fernandez dos Santos - Joze Fernandes Barrozo - Manoel Gomes Adriam Simoens Teotonio Fernandez Theotonio Cardozo Soares Manoel Lopes Louro Adrião Lopes Theotonio Fernandes Manoel Fernandez Bicho Joze Lopes Sarano Manoel Lopes Vianna

691

Escrivão Antonio Carneiro (?) Theotonio Gonsalves Theotonio Simoens Theotonio Gonsalvez Sebastião Madeira Manoel Francisco Carriman Sebastião Madeira Manoel Lopes Antonio Carneiro Joze Correa Theotonio Gonsalves Manoel Francisco Joze Carvalho Theotonio Gonsalves Id. Manoel Francisco Carrima Joze Correa Sebastiao Madeira Manoel Francisco Carima Antonio Carneiro Joze Carv.º Manoel Francisco Carimau Joze Correa Antonio Carneiro Id. Id. Manoel Lopes Manoel dos Santos João Maria dos Santos Fonceca

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 7 – Lançamento das Coimas do Concelho da Zouparria do Monte, 1834-1835(6) Anno de 1834 1º Semestre Souzellas Infractor Coima/Infracção Pena Molher de João Palheiro Vista nos pinhais do coimeiros 50 Molher de Franc.º direito Id. 50 Mulher de Tiotonio Pisquero Id. 50 filhos de Manoel direito por hir ao matto ao d.º conc.º 100 Roza gata molher de Manoel Alfaiate por andar nos pinaes do conc.º 50 Rita Murta por andar nos d.ºs pinais 50 Molher de João Palheiro vista nos m.m.ºs pinhais de Manoel Gomes 50 envirando estrume (dia 9 Fev) Joze Claro de o acoimar hum burro e duas ovelhas que achou na sua estrada de Carrima de Joze Fernandes Mulher de João Palheiro e seo jenrro vistos ambos andar roubando os pinhais do 100 dito conc.º O Baxarel Dr.º Jeronimo Joze Batista das cabecas de gado de João Veigas que achou 500 dentro das suas vinhas junto ao d.º lugar da Zoup.ª sendo test.as o seo criado e Joze Manaia (14 Março) Joze Rodrigues acoima como tes- hum jimento e duas ovelhas vistos na vinha da 200 temunlha da Fazenda acoimada da dita a fazer perda (dia 24 Março) Mariana Siabra de Carrima Ant.º Fernandes de Carrima huma bacora vista na novid.e pella m.em test.ª na testada de Joze Rodrigues Zoup.ª Joaquina Nogeira seu porco visto no quintal do Alfaiate 50 Joze Madr.ª gado visto na novid.e de Ant.º Bixo 200 Perpetua Maria pello sebado andar no coimeiro (15 Fev) 50 Ant.º Bixo pello sebado na novidade de Adrião Franc,º da Marm.ª (15 Fev.) Villela Franc.º Cachuxo hum carro de estrume pela terra dentro da 500 quinta do juis (dia 11 Fev) Anno de 1834 2º Semestre Zouparria Infractor Coima/Infracção Pena João de Souza bois na novidade 100 Manoel Correia sevado visto na novedade 50 Manoel Roiz gorgoleiro Id. 50 Manoel Soares Cardozo sevado visto no milho de Joze Madr.ª do Sargt.º mor 50 Joze madeira gado visto na novidade do coimeiro 100 Jozefa da Crus pelo sevado 50 Francisco Lopes pelo seu sevado visto na novidade 50

(6)

Dados extraídos do Livro das Coimas da Zouparria do Monte,1834-1835, Fls. 1-4, 7v.-11.

692

Anexos

João da Costa Mariana do luis viuva Domingos pinto Francisco Soares Manoel da Costa Antonio Rama Thiotonio Carneiro Manoel Roiz Joze Frz. novo Manoel Soares palhasa Manoel Carneiro Joze de Souza Cosme Dias P.e Manoel pinto Manoel alfaate

Luis Cor.ª João de Souza M.el Coreia Mel Roiz Mel Soares Mel Simois Ant.º Simois Franc.º Lopes Joze Lopes Ant.º Fernandes Joze Madr.ª Jozefa … Joze Jeronimo Agostinho Dias Joaq.m Carneiro Maria m. Joaq.m Madr.ª Ant.º Carimão Mel dos Stºs Madeira Jz.ª Bel. Da Crus Mel da Costa Mel Roiz Mel Carneiro

Sam Mart.º pelo seu gado vista no pinhal a furtar lanha pelo mesmo juis pelo seu guado em huma vinha de Antonio dos Santos vista p.r Luis Coreia da Fonceca Pelo guado na novidade Canetas pelo seu sevado pelo seu guado pelo seu guado Sarg.to Mor pelo seu guado Id. Id. Id. Souzellas pelo seu guado Id. Marmeleira pelo seu guado Id. Ano 1835 1º Semestre Zouparria pelos seos bois i galo na novidade seos bois na novid.e seo sevado na novidade seo sevado na novidade seo gado na novidade Id. Id. Id. Id. Id. Sargt.º Mor seo gimento na novidade seo gado na novidade Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id. Id.

693

50 100 125 50 50 100 200 100 50 50 150 100 100 150 50

? 150 50 50 50 100 50 50 100 50 100 50 50 50 100 50 50 50 50 100 50 100 100

Freguesia de Souselas – um povo com História

Mel Gomes Joze Fernandes João costa Antonio Sarana Iz.ª Bel. Sarana Mel Lopes Maria Cordoeira …Soares Thareza… Mel Lopes Mel. Fr.ª Ant. Fernandes Joao Roiz Joaqina viuva Joze Roiz Cosme Dias Joze de Souza Mel. Callistro Mel Franc.º Bernarda pinta Joze joaq.m Ant.º grilo Adrião franc.º Sebastião Franc.º Manoel Roiz (Sargento Mor) Mel Callistro (Souselas)

Data

São martinho seo gado na novidade Id. Id. seo sevado na novidade seo gado na novidade Id. Id. Id. seo sevado na novidade seo gado na novida Id. Id. Id. Id. Id. Souzelas pelo seo gado Id. Id. Marmelleira seo gado no comselho Id. Id. Id. Id. Id. Coumas de fora pelo seo gado no conselho ?

100 50 100 50 50 100 50 150 50 100 50 100 50 50 50 100 100 100 100 100 50 50 50 50 500 100

Tabela 8 – Elementos da Junta de Paróquia, 1868-1914(7) Presidente Vogais Tesoureiro Secretário

1868-1870 Manuel Gomes Pereira

- Manoel Carlos - Joaquim Marques

1870-1871 Id.

- Francisco Rodrigues - Manuel Carlos

Manoel Joaquim Marques

Dados extraídos de AUC - Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra: cx. 393 1863-1869; cx. 394, 1870-1876; cx. 395, 1886-1889; cx. 396, 1888-1889; cx. 397, 1890-1891; cx. 398, 1892-1895, cx. 399, 1896-1897; cx. 400 1898-1899; cx. 401, 1900-1902; cx. 402, 1903-1904; cx. 403, 1905-1906, cx. 404, 1907-1908; cx. 405, 1910-1928

(7)

694

Anexos

Data 1872-

Presidente Id.

Vogais

Secretário

António Gomes

1874-1877 Augusto Cesar Henriques

-Manoel da Costa Oliveira - Francisco José da Silva

1878-1880 - Joaquim Carlos d’Oliveira Nazareth - Manoel Nogueira (VP)

- Joaquim - Francisco Ferreira - Manoel Francisco Carneiro

1881-

Tesoureiro

- Joaquim Carlos d’Oliveira Nazareth - Manoel Francisco Carneiro (VP)

1886-1887 Joaquim Carlos d’Oliveira Nazareth

- Manoel Joaquim Marques -Manoel da Costa Oliveira - Manoel Ventura

- José Augusto Aires Castello Branco - António Gomes

1888-1889 - Manoel da Costa Oliveira - António Simões Morgado (VP)

-António Quinteiro -Joaquim dos Santos Madeira Manoel de Sousa Callisto

José Augusto Aires Castº Branco

1889-1890 - António Quinteiro - António Simões Morgado

-Manuel da Costa Oliveira -Joaquim dos Santos Semião -Manuel de Sousa Callisto

1891-1892 - Luis Borges - António dos - Joaquim Duarte Sanctos Madeira (VP) - Francisco Fernandes da Cunha - Joaquim Maria Baptista 1893 – 1895

- António Maria - Joao Soares dos Santos Mello Branco - José Fernandes da Cunha

695

Joaquim dos Santos Torres

- António Gomes - Joaquim Soares

José Lopes Mathias

Augusto Marques

Freguesia de Souselas – um povo com História

Data Presidente 1896-1897 - António Maria dos Santos (falece pelo final de 1897)

1898-1899 - José Gomes das Neves Ribeiro - Francisco dos Santos Madeira (VP) 1899-1901 - João Domingos Arede - António Ferreira da Rocha Branco - José Pinto Machado 1901-1903 José Pinto Machado

Vogais - Francisco dos Santos Madeira - António Quinteiro - Manoel de Souza Callisto - Joze de Aguiar -José d’Aguiar - Francisco dos Santos Madeira - Manoel Francisco Carneiro - Jose de Sousa Lucas - Manoel da Silva - António da Cunha Manaia - Manuel Joaquim Marques - José de Sousa Lucas

1909-

1911

1914-?

Legenda: VP – Vice Presidente

696

Secretário

António Quinteiro

Manoel de Sousa Calisto

Manoel Joaquim Marques

José de Sousa Lucas

- Manuel Francisco Carneiro (1903)

- Manuel Francisco Carneiro - António da Cunha Manaia (1903)

1904-1907 José Pinto Machado 1908

-José de Aguiar -Manuel da Silva -Luis Parente José Pinto - António Machado Carvalho - José dos Santos Agulha - Manuel da Silva Luis Parente Id. - Joaquim Rodrigues - António Simões Morais Joaquim Lopes - António Ventura de Campos - António Maleiro - Alvaro Marques Moreira - Alfredo Augusto - António dos Santos Maleiro - Joaquim Ventura Rocha (VP)

Tesoureiro

António Simões Joaquim Gonçalves

- José Francisco Carneiro - Manoel de Sousa Callisto

António Simões - Francisco de d’Almeida (recon- Souza Callisto duzido) (reconduzido) Id.

Anexos

Ano 1853 1855 1868-1874 1874-1877 1877-1879 1879-1881 1881-1885 1885-1886 1886 1886-1892 1892-1897 1897-1900 1900-1904 1904-1906 1906 1906-1907 1907-1910 1910 1910-1911 1912-1913 1913-1915 1915-1918 1919-1921 1921-1922 1922-1923 1923-1924 1924 1926-1929 1932-1934 1934

Tabela 9 – Regedores da freguesia de Souselas, 1853-1934(8) Regedor efectivo Ano Regedor Substituto António Francisco Carneiro Manoel Soares Cadete Francisco Jose da Silva Theotonio Nogueira Alexandre Jorge dos Santos 1877-1879 Manoel Nogueira Francisco José da Silva 1879-1881 Joaquim Dias Pisco 1881 Manoel Joaquim Marques Joaquim dos Santos Torres 1882-1886 Luiz Borges Manuel Francisco Carneiro 1886 António Gomes Manoel Nogueira 1886-1890 António Pereira Joaquim José Nogueira 1890-1897 José de Sousa Lucas José Moraes 1897-1900 José Ferreira Junior José Nogueira 1900-1904 José dos Sanctos Agulha Joaquim Gonçalves 1904-1906 António Ventura Campos José Ferr.ª 1906 Francisco Cação Joaquim Gonçalves 1906-1910 Francisco de Sousa Marques António Ventura Campos 1910 - António Carvalho - Joaquim Gonçalves Martinho Marques Moreira 1911-1915 António Carvalho Manuel dos Reis Pato Joaquim Gonçalves Constantino Carvalho António Ventura de Campos Joaquim Ventura da Rocha 1915-1918 António da Cunha Manaia Joaquim Grilo Ferreira 1918-1919 Manuel de Souza Marques Joaquim Prior d’Almeida 1919-1921 António Maleiro Joaquim Grilo Ferreira 1921-1922 Joaquim Marques Moreira Adriano Julio 1922-1932 António Matura(?) Joaquim Grilo Ferreira 1932-1934 Domingos Francisco Rama Adriano Julio 1934 José Jorge dos Santos Alvaro Marques Pereira 1934-? Domingos Francisco Rama - Domingos Francisco Rama - José de Sousa Calisto José Jorge dos Santos Manuel S. Henriques José de Sousa Calisto

1934-1939 1940-1947 19481958(?) 1959Francisco Morais Silvestre 1966…

(8) Fonte: Livro de Registo dos Regedores, 1881-1915; 1896-1933; Livro de Termos de juramento a Regedores, 1910-1915; 1915-1919; Livro de diplomas de regedores de paroquia e outros alvarás, 1852-1858; Livro de Registo de Alvarás de Regedores, 1874-1887; Orçamentos das Juntas de Paróquia do Concelho de Coimbra, cx. 394, 1870-1876; cx. 395, 1886-1889; cx.396, 1888-1889; Anuários Comerciais de Portugal, 1935-1968

697

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 10 – Recenseamento Eleitoral de Souselas, 1836 (moradas e ocupações dos cidadãos)(9) Nome Morada Ocupação A Adrião Costa Souzellas Trabalhador Adrião Francisco Marmeleira Id. Adrião Lopes S. Martinho Id. Adrião Serodio Marmeleira Labrador Agostinho Diaz Sarg.to Mor Taverneiro Antonio Bimbo Marmeleira Trabalhador Rd.º D.r Antonio Borges Souzellas Antonio da Costa Pizão dos Canaviaes Lavrador Antonio da Costa Souzelas Trabalhador Antonio da Costa Grillo Marmeleira Lavrador Dr. Ant.º da Cunha e Souza Souzellas Proprietário Antonio Duarte Agulha Souzellas Lavrador Antonio Françisco Souzellas Trabalhador Id. Zouparria Id. Antonio Francisco Lopes Marmeleira Id. Antonio Francisco Romão Sarg.tº Mor Proprietário Ant.º Fer.ª Constantino Marmeleira Lavrador Ant.º Fer.ª Toledo Id. Trabalhador Antonio Fer.ª Velho Id. Id. Antonio Fernandes Id. Id. Id. Carromá Id. Antonio Fernandes Bicho Zouparria Id. Antonio Joze Marmeleira Id. Antonio Joze Joaquim Id. Alfaiate Antonio Lopes Id. Lavrador Antonio Maleiro Id. Trabalhador Antonio Marques Souzellas Carpinteiro Antonio Martins Azanha Mendigo Antonio da Murta Coelho Souzellas Trabalhador Antonio dos Sanctos Id. Id. Antonio Simões da Costa Zouparria Id. Antonio Rodrigues Id. Id. Antonio Ventura Marmeleira Id. B Bento Cação Souzellas Trabalhador Bernardo Joze Marmeleira Id. Bento de Lemos Souzellas Barbeiro C Cosme Dias Souzellas Lavrador

(9)

Dados extraídos do Livro do Recenseamento Eleitoral de Souselas, 1836, Fls. 2-5v.

698

Anexos

Nome Domingos Antonio Domingos Diniz Francisco Alves Françisco da Cunha Françisco Diniz Françisco Duarte Agulha Francisco Lé Françisco Lopes Françisco Martins Francisco Prior Rd.º Françisco Rodrigues Françisco Simoens Françisco Simoens Direito Francisco da Silva Françisco da Silva João Borges João Sapateiro João Cavaco João Duarte Peça João Françisco João Maleiro João Rebello João da Silva João Simoens Joaquim Antonio Joaq.m Bicho Joaq.m Cação Joaquim Sapateiro Joaq.m Correa Baptista Joaquim Carneiro Joaq.m da Costa Grilo Joaq.m da Cunha Manaia Joaq.m Françisco Joaquim Fer.ª Joaq.m Fer.ª Novo Joaq.m Gomes Joaquim Gomes Novo Joaquim Joze da Murta B.el Joaq.m Joze de Souza Joaq.m Joze de Souza Joaq.m Joze de Souza Joaquim Lopes Joaquim Marques

Morada D Marmeleira Id. F Souzellas Zouparria Marmeleira Souzellas Id. Zouparria Souzellas Marmeleira Id. Sargento=Mor Souzellas Id. Pizão dos Canaviaes J Marmeleira Id. Id. Id. Id. Id. Id. Souzellas Id. Azanha Zouparria Souzellas Marmeleira Souzellas Sarg.tº=Mor Marmeleira Souzellas Marmeleira Souzellas Id. Id. Id. Id. Souzellas Lagares Sousellas Marmeleira Souzellas

699

Ocupação Lavrador Id. Trabalhador Id. Lavrador Trabalhador Cortador Trabalhador Sapateiro Lavrador ? Trabalhador Id. Lavrador Trabalhador Juiz Elleito Trabalhador Id. Id. Id. Id. Labrador Id. Trabalhador Id. Id. Id. Id. Id. Lavrador Trabalhador Id. Id. Id. Id. Lavrador Trabalhador Id. Proprietário Lavrador Id. Id. Trabalhador

Freguesia de Souselas – um povo com História

Nome Joaquim Nogueira Joaquim Nogueira Joaquim d’Oliveira Joaq.m d’Oliveira Joaq.m Prior Joaq.m dos Sanctos Madeira Joaq.m de Souza Marques Joaq.m dos Sanctos Mattos Joaq.m de Souza Joaq.m de Souza Novo Joaq.m Torres B.el Jeronimo J.e Baptista Joze Correa Joze da Costa Joze Fer.ª Joze Fernd.es Joze Francisco Cação Joze Francisco Carrumão Joze Francisco Netto Joze Joaquim Rd.º Joze Joaquim Pereira Joze Joaquim dos S.tos Jozé Lopes José Lopes Rd.º Joze Lúcio de Figueiredo Joze Maria dos S.tos Joze da Murta Coelho Joze dos Reis Joze Roiz Joze Roiz Novo Joze Simoens Joze de Souza Joze Soares Joze Soares Cardozo Joze Ventura Izidoro da Cunha Lourenço Ribeiro Luciano Manoel Luis Correa da Fonçeca Manoel d’Almeida Manoel Cavaco

Morada Id. Marmeleira Zouparria Souzellas Marmeleira Sargtº=Mor Souzellas Id. Marmeleira Id. Souzellas Id. Id. Marmeleira Id. Id. Souzellas Sargt.º=Mor Marmeleira Sousellas Marmeleira Id. Id. Sousellas Id. Id. Id. Marmeleira Id. Souzellas Marmeleira Souzellas Marmeleira Souzellas Marmeleira Souzellas L Souzellas Id. Zouparria M Marmeleira Id.

700

Ocupação Id. Taberneiro Alfaiate Lavrador Id. Trabalhador Id. Carpinteiro Trabalhador Id. Id. Proprietário Trabalhador Id. Id. Lavrador Trabalhador Id. Id. Id. Alfaiate Trabalhador Lavrador Trabalhador Id. Id. Id. Id. Id. Proprietário Trabalhador Id. Id. Lavrador Lavrador Proprietário Id. Trabalhador Id.

Anexos

Nome Manoel Correa Manoel Correa Manoel da Costa Manoel da Cunha Manaia Manoel Dias Manoel Direito Manoel Direito Novo Manoel Fernd.es Barrozo Manoel Fernd.es Gabriel Manoel Francisco Netto Dr. Manoel Joaq.m da Silva Manoel Joze Alfaiate Manoel Joze Manoel Lopes Manoel Marques Manoel d’Oliveira Manoel Prior Manoel Quiaios Manoel Roiz Manoel Roiz dos S.tos Manoel dos Sanctos Manoel Simoens Manoel Simoens Manoel Suares Cardozo Manoel Ventura Merçiano da Costa Pedro Roiz Sebastião Fernd.es Sebastião Françisco Sebastião Gomes Sebastião Joze Joaquim Sebastião Rama Sebastião dos Reis Thiotonio d’Almeida Thiotonio Correa Thiotonio Duarte Agulha Thiotonio Serodio Thiotonio Suares Thiotonio Soares Cardozo Thiotonio Joaq.m Pr.ª

Morada Souzellas Zouparria Canetas Souzellas Marmeleira Souzellas Id. Id. Marmeleira Id. Souzellas Marmeleira Id. Souzellas Id. Id. Marmeleira Id. Zouparria Souzellas Sargt.º Mor Zouparria Souzellas Zouparria Marmeleira Sargt.º Mor P Souzellas S Souzellas Marmeleira Souzellas Marmeleira Id. Id. T Marmeleira Souzellas Id. Marmeleira Id. Souzellas Id.

701

Ocupação Id. Lavrador Id. Id. Lavrador Trabalhador Id. Id. Paneleiro Proprietário Id. Trabalhador Id. Id. Id. Lavrador Trabalhador Id. Id. Proprietário Lavrador Trabalhador Id. Lavrador Trabalhador Id. Id. Id. Lavrador Id. Id. Trabalhador Id. Id. Lavrador Trabalhador Lavrador Trabalhador Lavrador Id.

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 11 – Executivos da Junta de Freguesia de Souselas, 1918-1974(10) Data Presidente Secretário Tesoureiro 1918(Setembro- Francisco de Souza Francisco Fernandes Joaquim Marques Dezembro) C.A Marques da Cunha 1919 (até Abril) Id. Id. Id. C.A 1919 – C.A José Augusto de António Dias Madeira Manoel Fernandes da Campos Cunha 1926-1946? Armando Augusto de José Morais Souza Almeida 1943/44 Joaquim Ferreira 1946-1950 António Denis José Parente de José Simões Neves Almeida 1953 Joaquim Ferreira 1957-1959 Adriano dos Santos Manuel Marques Manuel Fernandes dos Silva Santos 1960-1963 Luiz António Duarte José da Costa Sousa José Fernando Pimenta Prazeres Pais Calisto Mendes 1964-1967 - António de Cerveira José Gomes Claro de Manuel Prior de Almeida Almeida França Martins (até Maio 1967) - Amílcar Barreto Rajado (posse em Agosto 1967) 1968-1971 Amílcar Barreto João Monteiro António de Almeida Rajado Magalhães Id. 1972-1975 - Amílcar Barreto Id. (até Fevereiro 1973 e volta a assumir em Março de Rajado (falece a 1974 com a morte do PJ e 12/3/1974) subida de António Madeira - Assume a presidência a Presidente Interino) interinamente António - António dos Santos dos Santos Madeira Madeira (Maio 1973) Tabela 12 – Executivos da Junta de Freguesia de Souselas, 1977-2008 Data Presidente Secretário Tesoureiro 1977 João Manuel Pereira ? António Pardal Batista 1979 Gonçalves 1980-1982 Adelino Dias Cordeiro Manuel dos Santos José Prior Lucas 1983-1985 José Monteiro da Cunha José Lopes da Silva José Prior Lucas 1986-1990 Delfim Várzeas de Sousa Eurico de Sousa Ribeiro ? Ribeiro dos Santos 1990-1993 Id. Eurico de Sousa Ribeiro Bernardino António Almeida (a partir de Junho de 1993

(10)

Fonte: livros de actas da Junta de Freguesia de Souselas

702

Anexos

Data Presidente Secretário 1994-2001 José Martins Figueiredo - Fausto Dias Nogueira (falece em Janeiro 2000) - Fernando Rui Dias Sequeira (a partir Fevereiro 2000) 2002-2005 Id. Fernando Rui Dias Sequeira 2005-2013 João Oliveira Torres Jorge Manuel Morais Pardal Pratas

Tesoureiro Fernando Manuel Simões Madeira

Fernando Manuel Simões Madeira Fernando Lopes Morais

Tabela 13 – Inventários dos bens da Igreja Matriz de Souselas sob administração da Junta de Paróquia, 1894(11)

Capitulo 1º = Igreja

Contem cinco altares, cujos nomes e pertenças são como se segue 1º Altar-mór Tem uma banqueta de páu dourado; pertence-lhe um frontal de damasco branco em meio uso; um rôxo e outro branco e rôxo, ambos em máu estado, e quatro toalhas. Na parte posteriôr, fechando o throno, há um retabulo a oleo que representa o Martyrio de S. Thiago Maiór, Orago desta Egreja; e ao lado deste retabulo, da parte do Evangelho uma Imagem do mesmo Santo, e da parte da Epistola, uma da Senhora da Conceição, ambas em esculptura 2º Altar do Senhor Jesus Contem uma Imagem de Jesus Crucificado, outra de S. Francisco e outra de S. Miguel, e uma banqueta de pau dourado. Pertencem-lhe duas toalhas. Junto deste altar, ao lado do Evangelho está outra Imagem, em ponto pequeno, da Senhora da Conceição 3º Altar do Santissimo Fica n’uma capella lateral. Contem o Sacrario, com chave de prata: uma banqueta de páu dourado; pertencem-lhe trez toalhas, um frontal de damasco incarnado, e dois de damasco branco e incarnado, um dos quaes já velho. Tem uma alampada de metal amarello já muito deteriorada 4º - Altar da Senhora do Rosario Tem uma Imagem da Senhora, outra de S. Antonio; uma banqueta de páu dourado e uma alampada pequena de metal amarello. Pertencem-lhe duas toalhas 5º Altar de S. Sebastião Tem a Imagem do Santo, uma banqueta de pau dourado, uma alampada pequena de metal amarello, e pertencem-lhe doze toalhas. Á Imagem pertencem duas bandas incarnadas, sendo uma velha de sêda lisa e outra, em bom uso, de setim bordado a prata e ouro

Capitulo 2º = Vasos Sagrados Bens Observações Um calice com patena e colher, tudo de prata lisa Pesa 500 grammas Uma custodia de prata lavrada com resplendor dourado Pesa 1690 gr Um relicario pequeno, de prata lisa, de levar o Sagrado Viatico aos Pesa 107 gr enfermos

(11)

A.U.C. – Fundo Governo Civil: Inventário de bens de Juntas de Paróquia e Freguesias, 1886-1911 (cx)

703

Freguesia de Souselas – um povo com História

Capitulo 3º = Paramentos Bens Dois pontificais, um de damasco branco e incarnado e outro, de damasco branco e vêrde, à excepção da casula, com a respectiva estola e manipulo, que é toda de damasco verde Uma casula com manipulo e estola de damasco incarnado Uma dita…roxo Uma dita…de damasco branco e incarnado Uma dita… Uma dita sem manipulo e estola de damasco branco Uma capa d’asperges, de damasco branco Uma dita… Uma dita de panno roxo Uma dita preta Um veu d’hombros, de damasco branco e incarnado Um dito branco Trez alvas de linho com os respectivos amitos; trez cordões em máu estado

Observações Meio uso Bom uso Id. Id. Já velha Mau estado Quási nova Já velha Tambem já velha Ainda bem conservada Em meio uso Já velho

Capitulo 4º = Alfaias e utensilios Bens Uma crus processional de metal amarello prateado Outra dita do mesmo metal

Observações

Que era da Irmandade de S. Sebastião Duas mangas de damasco, em bom estado, sendo uma branca, outra Em bom estado rôxa, desta cruz Dois pares de cereaes: um de páu, outro d’estanho com haste de pau Dois guiões de damasco incarnado com cruzes de metal amarello Já usado de S. Sebastião Um pallio de sêda incarnada Meio uso Quatro lanternas Muito velhas e deterioradas Thuribulo e navêta de metal amarello, prateado Uma umbella de damasco branco Já muito usada Dezesseis opas de panno incarnado Algumas em mau estado Uma caldeirinha de metal amarello Um Santo Sudário Já velho Um panno de pulpito novo de damasco branco bordado a retroz de cores Um Arco Cruzeiro de damasco incarnado Com pouco uso Um panno de porta verde Já muito velho Um missal Em meio uso Um missal antigo Duas bolsas de corporaes: uma branca bordada a ouro e outra branca e incarnada Seis corporaes com as respectivas pallas Dois veus de caluc(?) brancos Um novo e outro usado Dois ditos incarnados Id.

704

Anexos

Capitulo 4º = Alfaias e utensilios Bens Observações Um veu roxo e outro verde Mau estado Umas galhetas de vidro; uma campainha Quatro casticaes e cruz, tudo d’estanho Quatro tocheiras Já muito velhas Uma cadeira parochial Em bom estado Quatro andôres: -um da Senhora do Rozario e outro da Senhora da Conceição - dois do S. Antonio e S. Sebastião Já antigos Uma gargantilha, com estrella, d’ouro 21,5 gr Uma solitaria com estrella, d’ouro 13,6 gr Objectos pertencentes a Senhora do Rozario (note-se que a maioria é ouro) Um cordão d’ouro, com cruz 20,2 gr Outro dito 19,3 Um par de brincos d’ouro 8,8 Um rosario d’ouro (com cordão de retroz e borlas fingidas) e cruz 14 gr Um fio de 45 contas d’ouro (com cordas de retroz) 10 gr Um manto de serim verde bordado a ouro Um vestido e cinto de seda branca, bordado a ouro e uma corôa de prata Um manto azul fervête, bordado a retroz, da Senhora da Conceição Um vestido de setim branco, da mesma senhora Uma corôa de prata pequena, da mesma senhora

Capitulo 5º = Bens de raiz Resumem-se na posse de quarenta oliveiras, cujs sitios e limites estão lançados nesta acta

Capitulo 6º = Inscripções, titulos de divida, e fóros Como Administradora de extinctas confrarias, outróra erectas nesta Egreja, anda a junta de posse das seguintes Inscripções Uma do valor nominal d’um conto de reis Quatro de 100.000 reis Trez certificados de 50.000 rs cada um Inscripções que eram da Irmandade de S. Sebastião Uma de 100.000 rs Dois certificados de 50.000 rs cada Titulos de Divida – 7 Fóros – uma escriptura, uma conciliação e um titulo

705

Freguesia de Souselas – um povo com História

Tabela 14 – Rol das pessoas crismadas na Igreja de Santiago de Souselas pelo Bispo D. Miguel de Anunciação em Junho de 1748(12) Mulheres SOUSELAS Maria mulher de Joze da Costa Antonia molher de M.el da Murta Mariana filha de An.to Fran.cº Maria molher de João da Cunha Izabel f.ª do mesmo Michaela f.ª de M.el da Cunha Thereza f.ª do mesmo Feleciana molher de M.el Rodrigues Maria molher de João Fran.cº do Pizão Silveria f.ª do mesmo Maria molher de M.el Lopes Izabel f.ª de Joze Duarte Ritta f.ª do mesmo Anna f.ª do mesmo Maria molher de Joze da Silva Barbara f.ª de M.el da Cunha Jozepha S.ª f.ª de An.t.º de Almeyda Rozaria f.ª de Joze Correa Bernarda f.ª de M.el Carvalho Joanna f.ª do mesmo Maria f.ª do mesmo Jozepha f.ª de Bras Luis Thereza molher de An.t.º da Costa Izabel molher de João Simoes Joanna f.ª de M.el da Cunha Thereza f.ª do mesmo Chatarina f.ª do mesmo Maria f.ª do mesmo Maria molher de Joze Lopes Izabel f.ª de Fran.cº Duarte Maria f.ª de João Baptista Anna f.ª do mesmo Joanna molher de Andre da Cunha Roza f.ª de M.el Fran.cº dos S.tºs Antonia molher de A. da Cunha Maria f.ª de M.el da Cunha Mariana f.ª de Andre Goncalves Luiza molher de Fran.cº Simoes Roza molher de Victorino Joze Roza f.ª do mesmo Ignes f.ª de Joze Gomes Plipe Jozepha f.ª do mesmo Jozepha f.ª do mesmo Maria f.ª do mesmo Thereza f.ª do mesmo Maria f.ª do mesmo Izabel f.ª do mesmo Maria f.ª de M.el Marques Antonia molher de Paulino da Costa Luiza f.ª de M.el Rodrigues Sebastiana molher de M.el Frr.ª Maria f.ª de M.el Baptista Bernarda f.ª do mesmo Joanna f.ª de João da Murta Maria molher de Calisto dos S.tos Chatarina f.ª de M.el Lourenco Luiza molher de Andre Fran.cº Mariana f.ª de João de Souza Maria f.ª de An.tº de Souza Roza f.ª de M.el Dias Joanna f.ª do mesmo Bernarda molher de M.el Baptista Joanna molher de Bartolomeu da Cunha Marta molher de M.el Correa Azenha Izabel f.ª do mesmo Anna da Conceicão molher de P.º Simoes Thereza f.ª de An.to Duarte Maria f.ª de M.el Soares Maria f.ª do mesmo Maria molher de An.tº Fran.cº Mariana f.ª do mesmo AZENHA Jozepha f.ª de M.el Simoens Maria f.ª de Mathias de Souza Brizida molher de Jacinto Marques Marmeleira

(12)

Dados extraídos de: AUC – Fundo dos Registos Paroquiais, Souselas: Livro de Mistos, 1748-1805, Fls. 1-4v.

706

Anexos

Maria molher de Pedro Goncalves Joachina f.ª de An.tº Ribr.º Filizarda f.ª do mesmo Catharina molher de M.el Duarte Bernarda f.ª do mesmo Luiza f.ª do mesmo Ritta molher de M.el da Cunha MARMELEIRA Maria f.ª de An.tº Fern.des Maria molher de M.el Duarthe Hellena molher de João Fran.cº Maria molher de Joze Fern.des Silveria f.ª de Chrizostomo da Cunha Brizida f.ª do mesmo Thereza f.ª de M.el Fern.des Preto Antonia f.ª de João da Costa Domingas molher de M.el Simoes Roza f.ª do mesmo Jozepha f.ª de M.el Simoes Preto Maria mulher de M.el Fern.des Mariana mulher de An.tº Simoes Luiza molher de M.el Soares Dionizia f.ª do mesmo Maria f.ª de M.el Simoes Bimbo Joachina f.ª de An.tº Correa Helena molher de João Fran.cº S. MARTINHO E SARGENTO MOR Luiza f.ª de M.el Fern.des Soldado Rozaria f.ª de An.tº fern.des Barrozo Dionizia molher de M.el da Silva (?) Agueda f.ª do mesmo Maria molher de An.tº Pereira Maria f.ª de Domingos… Helena molher de M.el Fern.des Velho Maria molher de M.el Simoes Anna f.ª do mesmo Thereza f.ª de M.el Simoes Brizida molher de João Simoes Barrozo Thereza molher de M.el da Silva LAGARES Bernarda f.ª de M.el Luis Izabel f.ª do mesmo Jozefa f.ª do mesmo

Bernarda molher de Adrião Fran.cº Izabel molher de M.el Fern.des calça Ignacia f.ª de M.el Mathias Maria molher de M.º Fran.cº Maleiro Maria f.ª do mesmo Violante molher de João Simoes Luiza molher de M.el Fern.des Alentejano ZOUPARRIA Anna molher de Sebastião Fran.cº Violante f.ª do mesmo Angelica f.ª do mesmo Maria molher de M.el Goncalves Brizida f.ª do mesmo Roza molher de Ant.º Duarthe Antonia molher de Domingos Simoes Jozepha f.ª de Joze Fern.des Manco Maria f.ª de João de Agante Maria f.ª de João Simoes Prior Especioza modada em M.ª f.ª do mesmo Jozepha f.ª do mesmo BRASFEMES Sebastiana f.ª de Jacinto Gomes MURTEDE Jozepha f.ª de Fran.cº Fern.des Sebastiana f.ª de An.t.º de Moraes S. FAGUNDO Jozepha f.ª de M.el de Campos Barcouço / Quinta Branca Izabel f.ª de D.ºs Fran.cº Ramalhete CARRIMA Jozepha f.ª de Jorge Fran.cº Roza f.ª do mesmo Izabel f.ª do mesmo Sabastiana molher de Joze Fern.des Luiza molher de M.el Fran.cº Cardadeiro Brizida f.ª do mesmo Angelica f.ª do mesmo Maria molher de M.el Fern.des Guerra Joanna f.ª do mesmo Izabel molher de M.el da Cunha Anna f.ª do mesmo Maria f.ª do mesmo Nota: «Foi Madrinha das molheres Maria q. hera Especioza f.ª de João de Agante da Zouparria»

Bernarda molher de Dionizio Agante

707

Freguesia de Souselas – um povo com História

Homens SOUSELAS Manoel Soares João f.º de M.ª Correa João f.º de Joze Gomes Joze f.º de M.ª da Cunha João da Cunha Manoel da Cunha Manoel Pires Manoel f.º do mesmo Calixto dos S.tºs Andre Francisco Manoel f.º de M.el Franc.º dos S.tºs Manoel da Murta Assensso Joze Antonio f.º de João da Murta Manoel de Souza Joze Lopes Antonio Simoes Bernardo de Souza Manoel Rodrigues Gorgoleiro Manoel Correa Manoel f.º do mesmo Antonio f.º do mesmo Pedro Goncalves MARMELEIRA Raymundo f.º de M.el da Cunha Adrião Fran.cº Bernardo f.º de João Baptista Agostinho Fern.des Bernardo f.º de Franc.º Simoes Finete Joze seu irmão Christovão f.º do mesmo Antonio Joze Antonio da Costa Leandro f.º de Joze Fran.cº Barrete Bartolomeu f.º de M.el da Cunha João Simoes Matheus f.º de Mathias Marques Joze Fran.cº Rey Joze da Silva João Simoes Louro Francisco Fern.des Sebastião Simoes Manoel f.º do mesmo Bento Fran.cº Manoel Carvalho Matheus Franc.º Antonio de Souza Antonio Correa Bernardo f.º do mesmo Bernardo da Silva Joze f.º de Joze Correa Jozeph f.º do mesmo Lourenco da Cunha Manoel Franc.º Maleiro Domingos Macedo(?) f.º de Miguel Rodrigues Antonio f.º do mesmo Antonio Francisco Manoel Franc.º Calcão Joze f.º de M.el Frr.ª João f.º do mesmo Thomas f.º do mesmo Joze Fern.des Tecelão Joze da Costa João f.º do mesmo Manoel Doarthe Antonio Franc.º Manoel f.º do mesmo Manoel Franc.º dos St.ºs Joze f.º do mesmo Domingos f.º de An.tº Fern.des Augostinho da Cunha Manoel f.º de M.el Simoes Ramalho Antonio f.º de An.tº Goncalves Manoel Franc.º soltr.º Salvador f.º do mesmo Antonio Simoes Manoel f.º de M.el Fern.des Antonio f.º de Ag.º Lopes Antonio f.º de An.t.º Bras do Matouto Joze f.º do mesmo Manoel Baptista Domingos Gomes

708

Anexos

Adrião f.º de João Simoes João f.º do mesmo Joze Gomes Phelipe crismouse em Figueira Lucas f.º do mesmo Victorino Joze Paulino da Costa Manoel Lopes Antonio f.º de Joze Correa Manoel Marques f.º de M.el Simoes AZENDA Ant.º de Souza f.º de Mathias de Souza Manoel f.º do mesmo Joze f.º do mesmo Manoel de Almeida Joze f.º do mesmo Lourenso f.º do mesmo Joze criado Antonio f.º de An.to fern.des João Simoes Manoel f.º de M.el Simoes Barrozo Manoel f.º de An.to Simoes Barrozo Antoinio f.º de M.el Fern.des Soldado Antonio f.º de Ignacio Fern.des CARRIMA Manoel Fran.cº Manoel da Cunha Joze Fern.des Bicho Adrião f.º do mesmo Sebastião f.º do mesmo Antonio f.º de Jorge Franc.º Manoel Fern.des Guerra

Bernardo Alves Manoel f.º de Ag.º Lopes Manoel Soares Manoel Simoes Gregorio f.º do mesmo Adrião f.º de M.el Fern.des Joachim f.º de An.t.º Fern.des João f.º do mesmo Bernardo f.º de Luis Franc.º S. MARTINHO E SARGENTO MÓR Antonio Pr.ª João f.º de M.el da Silva Joze f.º de M.ª Franc.ª Manoel Carnr.º Joze f.º do mesmo LOGO DE DEUS Manoel f.º de Ignatio Lopes ESPINHO Manoel f.º de Marcelino Rey CARVALHO Thomas f.º de Feleciana S.ª TREZOI Bernardo f.º de D.ºs Lourenso MATA Joze f.º de João Simoes Q.TA BRANCA DE BARCOUSO Domingos Francisco Ramalhete Veríssimo f.º de João Senhorio MATA DE PENIS Manoel f.º de Ant.º Denis Nota: «Foi padrinho dos Homens o P.e M.el da Costa da Freg.ª de Brasfemeas»

Matheus f.º do mesmo Agostinho f.º de Fern.des Andre(?) ZOUPARRIA Antonio Duarthe Manoel da Cunha Sebastião Fran.cº Bento f.º do mesmo Antonio f.º do mesmo João f.º do mesmo Manoel Goncalves Antonio f.º do mesmo

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Theotonio f.º do mesmo Joze da Cunha Theotonio da Cunha João Simoes Prior Theotonio f.º do mesmo Joze f.º de M.el Nogueira Theotonio f.º de Joze Franc.º dos S.tos Antonio f.º de Joze Fern.des Manco Joze f.º do mesmo Francisco f.º do mesmo Luis f.º do mesmo BOTÃO Joze f.º de Joze Franc.º João f.º de M.el da Cunha do Outr.º Antonio Bern.dº do laranjal PAMPILHOSA Joze Ferreira Manoel Alves do canedo Joze Henriques LUZO Manoel f.º de Ventura Simoes

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DOCUMENTOS

Documentos

DOCUMENTO A - Testamento sobre S. Tiago de Souzelas, 28 Junho 937 Fonte: Portugaliae Monumenta Historica, Vol. I, Diplomata et Chartae, Doc. Nº 44, 1867

Em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo. Este é a série de testamento que queremos fazer com justiça, para os meus filhos, o presbítero em exercício e o abade André Teodorico, e ainda para os teus irmãos. Vos legámos conscientemente, com conselho íntegro e comum consenso, fazer pequena carta de Testamento, assim como fizemos de toda a nossa Herança e Propriedade. Desde as primeiras casas de pedra até tudo o resto do interior: ouro, prata, utensílios; todo o género de metais; panos sírios de linho e de lã; madeiras, vasilhas; leitos e cadeiras; mesas; alimentos e vinho; vinhas e hortas; terras cultas e incultas. Ainda tudo o que vier a usar da herança, por todos, neste século. Tudo vos concedemos integralmente depois da nossa morte em remédio da nossa alma. Retiro daqui o domínio da Igreja de São Tiago, naquela nossa vila de Souzelas, com seu serviço e seus utensílios. Referida atrás pela parte os sobrinhos e ainda para os meus netos que da sucessão serão preservados aquelas coisas na Igreja. Acrescentamos aqui também se aquela igreja vier a ser acabada com 60 passais* à volta, que a sirvam fielmente, a favor da nossa alma. Se pois a nossa própria vizinhança tivesse distanciado da igreja pelo ministério, seja esta a igreja; e todas as nossas coisas e quanto vier a existir até à nossa morte, com auxílio de Deus possamos aumentar. Em seguida, pela parte do Santo Mosteiro, vos atribuímos a confirmação. Para que seja em remédio da alma mais aflita, guarde o próprio grupo e do fundador da nossa própria igreja. Assim se alguém, depois da vossa parte do vosso Santo Mosteiro, quiser agir depois ou fizer em nome de Deus, não o possa. Em primeiro lugar, seja excomungado, pela igreja separado de Deus; com Judas traidor seja condenado. No fim, não receberá a comunhão. E ainda as perdas das leis seculares sejam lançadas por terra. Diante do juiz, pagará tudo de si daquilo que vier a adquirir, quatro (4) vezes mais; para vós haverá perda, perpetuamente. Realizada a escritura do Testamento no dia 28 de Junho, no ano de 937. Nós, já referidos, nesta pequena carta realizada, assinamos. Eu assino. E eu, o presbítero, em exercício confirmo; Eu, André, confirmo com minha mão. Elias test; Teodesindo test. ; Atanagildo test.; Mohepe test.; Habzzaada test.; Zalama test.; Farache; test. ; Futuro Presbítero, test. Digno presbítero, test. ; Presbítero Estêvão test.; Presbítero João test.; Presbítero Vicente, test. ; Abade Abozaaac conf.; Abade Teodorico conf. ; Presbítero Flores test. ; Moysen e até indigno presbítero test. Passal – antiga medida agrária. Equivale a 18 palmos (1 palmo = 22 cm); 1 passal equivale a 3 metros e 96 cm (3,96m)

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DOCUMENTO B - Testamento de Salas e da vila de Albiaster (Fornos), 9 Janeiro 973 Fonte: Portugaliae Monumenta Historica, Vol. I, Diplomata et Chartae, Doc. Nº 106, 1867

Em nome da Santa e individua Trindade. Eu, Samaritana, com fardo pesado dos meus pecados, na fé e fidelidade pelos méritos dos santos, nem sempre em desespero lanço-vos, presbítero Pedro, que, assim, na minha presença consciente, temo muitas vezes pela minha falta criminal, afim de que seja finalmente ganho pelo Senhor a reconciliar através de vós. E porque está escrito – fazei promessas ao Senhor vosso Deus, e cumpri-as – Job, por isso também com coração ofendido, aspirando à virtude divina para que, sobre alguma dignidade, possuímos o conjunto, temendo pela multidão. Eu, a referida Samaritana, tirei o testamento de concessão, fizeram assim como fizeram, e fiz a partir desta parte, em memória ao presbítero Pedro, de toda a minha herança, de quanto agora tenho ou venha aumentar sucessivamente e ainda poderei publicar até à minha morte. Esta é a vila de Fornos com terras cultas e incultas, vinhas, pomares; e vila de Salas com terras cultas e incultas, vinhas, pomares, a casa e todas as coisas no interior das casas que para uso possui. Aqui são os limites delas: sobre aquele rio de Fornos e continuai por aquela lomba daquele monte, do modo que se estende entre Crexemiris* e Salas* e atravesse aquela via que avança até Marmeleira, segui sempre naquela via da Vimeneira e continuai através de São Martinho de Paliares e ainda pelo lugar de Lombo; segui sempre naquele rio de Fornos. Concedo-te tudo aquilo que acima refiro, para que na tua vida, em tudo te seja destinado. Depois da tua morte, permaneça simultaneamente o direito ao mosteiro Louvernense (de Lourvão), com teus bens segundo testamento; e, depois pela parte do próprio testado ao mosteiro, que seja no ornamento da própria basílica: sobre luzes de altares e ainda esmolas dos pobres. Se alguém aparecer pois, que acredito minimamente e temo sem dúvida também que algum homem vier ou vir contra este facto para usurpar de início o que pertence aos senhores, seja excomungado por todos os cristãos e com Judas Traidor seja lançado para a pena perpétua; Aquilo que terá sido ousado tomar, leve quatro (4) vezes mais. Após com parte do poder que então terá ouro por um talento. E este meu testemunho em tudo obtenha completamente, assino. Feita carta de testamento, fechando em bem fazer a 9 de Janeiro, no ano de 973. Eu, Samaritana, nesta carta de testamento que quis fazer, assino. Ao que acredita convertido test.; Fazbona test. ; Mota..f test.; Lúcio Test.; Melic Flores test.; Ermorigu test.; Maladon Test.; Elias test. ; Gomar test.; Abade Zoleiman test. Irmão Zaadoon test.; Presbítero Placentius ; Presbítero Auriol ; Presbítero Lazaro ; presbítero Vicente; Presbítero Salude ; Carlon test. ; Lúcio presbítero ; Zuleiman test.; Joab test. Aqui Flores test.; Lone aqui com brilho; Marco test.; Abaiube test.; Aqui Iaquinto test.; presbítero Abzicri test.; Nezeron test. *

Herdades de Crexemiris e de Salas

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DOCUMENTO 1 - Relatório técnico apresentado pelo Vereador Viriato Namora em sessão de câmara de 9 de Fevereiro de 1973 (transcrição parcial) Fonte: Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 253, Fls. 41-42v.

«Devem ser adoptadas todas as medidas possíveis para reduzirem ao mínimo os inconvenientes da laboração, que resultem da emissão de quaisquer elementos insalubres, perigosos ou incómodos, tais como poeiras, fumos, gases, vapores, ruídos e trepidações, águas residuais e outros. «Em relação à emissão de poeiras e fumos para a atmosfera devem aplicar-se técnicas que tenham em vista reduzir ao mínimo os pontos de emissão de poeiras que devem ser equipados com sistemas de despoeiramento eficaz adequados às suas condições e às características granulométricas das poeiras a captar, ficando os possíveis pontos de fuga em depressão» «4.1. – Os gases emanados do forno não devem conter, em regime normal, mais de 0,1 gramas de poeiras por Nm3. As instalações de despoeiramento dos gases emanados do forno devem ser construídas de modo que estes gases não contenham mais de 0,1 g/Nm3 quando o seu débito corresponde ao funcionamento do forno a 120% da sua capacidade nominal» «4.2 – O teor em poeiras dos gases emanados do forno não deve em caso algum ultrapassar um valor igual a 1g/Nm3» «4.4 – O teor em poeiras de outros gases emitidos além dos gases emanados do forno não deve ultrapassar 0,150 g/Nm3» «4.5 – A concentração máxima em poeiras admissíveis ao nível do solo para além dos limites de terreno da fábrica deve ser inferior ou igual a 0,06/Nm3» «4.6 – Os parques de armazenagem e os aparelhos de manutenção devem ser construídos e utilizados de modo a evitar os levantamentos de poeiras susceptíveis de incomodar as vizinhanças» «4.9 – As quantidades de poeiras emitidas pela chaminé destinada a evacuar os gases emanados do forno devem ser controlados continuamente. Pare este fim devem prever-se na chaminé dispositivos obturáveis, comodamente acessíveis» «4.10 – A empresa deve efectuar também medições das poeiras depositadas nas vizinhanças da fábrica, por meio de aparelhos cujo tipo, número e implantação serão determinados pelas entidades fiscalizadoras» «4.12 – O estabelecimento deve ser instalado e explorado de modo que o seu funcionamento não origine incómodos para a vizinhança por ruídos ou trepidações» 715

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DOCUMENTO 2 – Condicionamentos impostos pela Câmara Municipal de Coimbra à instalação da fábrica de cimento da empresa Cinorte, no seguimento da aprovação do seu projecto de construção, por maioria de votos, na sessão de 11 Maio 1973 Fonte: Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 254, Fls. 70-70v.

«Assim a Câmara deliberou, por maioria de votos, concordar com a proposta apresentada, pelo Exm.º Presidente aprovando o projecto da construção, em Souselas, da fábrica de cimento da empresa Cinorte, desde que se observem os seguintes condicionamentos: A empresa compromete-se, durante a laboração da sua fábrica de Souselas a não execeder os índices de detritos poluidores, expelidos para o exterior, impostos pela Direcção Geral dos Serviços Industriais e confirmados pela Delegação de Saúde. A empresa compromete-se a fazer o tratamento de efluentes segundo a determinação dos Serviços Oficiais competentes. A empresa compromete-se a estabelecer cortinas de vegetação quando a Câmara Municipal de Coimbra verificar a sua necessidade e onde seja tecnicamente aconselhável. A empresa compromete-se a manter a sua sede no concelho de Coimbra, enquanto durar a laboração da sua fábrica de cimento de Souselas. A empresa compromete-se a enviar [Fl. 70v.] mensalmente os resultados dos registos diários dos aparelhos indicadores de poluição. O não cumprimento destes condicionamentos implicará a actuação da Câmara Municipal no sentido duma imediata suspensão da laboração da fábrica»

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DOCUMENTO 3 – O vereador João Pardal apresenta um documento técnico e científico rebatendo os argumentos do Ministério do Ambiente na base da decisão de implementar a co-incineração em Souselas. Fonte: Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 390, P.28-29

«1º “Localização estratégica de Souselas e Maceira no corredor de resíduos industriais perigosos de Sines/Braga”. Completamente falso, pois a maioria dos RIP, são produzidos na zona envolvente a Lisboa e margem Sul do Tejo até Sines, os restantes e em menor quantidade são produzidos no Norte e no grande Porto. Como não existe cadastro nacional de resíduos, e a casa está a ser construída pelo telhado, só assim se justifica tão grande falha. Ao afastar da capital, evitou o risco de acidente numa zona de elevada densidade populacional, Tudo foi equacionado como se os cidadãos do centro do país fossem feitos de outra massa. [P.29] (…) 2.º “Fácil acessibilidade”. Falso, ao escolher estas duas cimenteiras, viola o disposto no EIA que recomenda, que se evite o atravessamento e aglomerados urbanos com o transporte de RIP. Convém lembrar que estas duas cimenteiras são as mais afastadas da estação de tratamento do Barreiro, aumentando assim os riscos de acidente. 3. º “Locais com má qualidade ambiental/Requalificação ambiental” Não se faz requalificação ambiental, com incineração de RIP. (…) As cimenteiras queimam por ano resíduos industriais na ordem dos 200 mil toneladas onde se contam cinzas de pirite, da Quimigal, cinzas volantes, grenalhagem da decapagem da Lisnave, pneus, etc. Filtros de mangas, são um falso argumento para a requalificação, os mesmos, destinam-se à retenção de partículas e não à retenção dos gases onde se situam as substâncias mais perigosas para a saúde humana e meio ambiente. Diga-se em abono da verdade que já deveriam estar instalados há muitos anos, e não a troco de mera chantagem a propósito dos resíduos. (…) Os filtros de mangas serão aplicados somente ao forno que irá incinerar (…) Pergunta-se, então e as outras duas linhas (1 e 2)? Sendo certo que a linha dois é a pior em termos de poluição (…) 4º -”Tecnologia obsoleta” (…) a fábrica de Souselas é mais recente do que a de Alhandra. O forno 3 de Souselas escolhido, para co-incineração, foi o último a ser construído já na década de oitenta, por esta ordem de ideias deveria ser o mais avançado tecnicamente, afinal não é! 5º - “Experiência de seis meses, se funcionar mal pára” Isto mostra a genealidade da Sr.ª Ministra, primeiro porque já tinha concluído que o processo era mau para o Parque Natural da Arrábida o que motivou a 717

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exclusão do Outão. Os Humanos, esses podem servir de cobaias num laboratório vivo e depois logo se vê! Pretende assim sujeitar as pessoas a uma mistura de substâncias perigosas, sem primeiro medir os efeitos e as consequências, se o processo correr mal, tal como retrata a história das cimenteiras, manda parar! Se acontecer algo de errado, não há nada a fazer porque as populações já foram expostas à contaminação e a sua saúde poderá estar irremediavelmente afectada. Que irresponsabilidade! (…) 6º - “Colocação de monitores nas Juntas de Freguesia” A Junta de Freguesia de Souselas encontra-se fora do quadrante dos ventos dominantes e protegida pela orografia, quando muito poderá ser afectada nos ventos de leste, à população de Souselas, freguesias situadas a norte e Coimbra, pouco valerá este monitor (…) 7 º “Contrapartidas” Ao falar de reabilitações urbanísticas e paisagísticas, é o assumir o mau comportamento ao longo de 25 anos da cimenteira, querendo o Estado substituir-se ao verdadeiro culpado da situação degradante da população de Souselas, que é a cimenteira local. Não haveria o direito legitimo dessa requalificação, sem ser a troco da incineração de RIP? O povo de Coimbra não pode vender a sua alma a um processo cheio de incertezas, e que poderá colocar em risco a saúde das pessoas. Por esquecimento a Sr.ª Ministra não falou, nas contrapartidas para as cimenteiras, como os lucros que irão ter com incineração, o pagamento é feito à tonelada, a juntar a isso terão poupanças nos combustíveis e em matéria prima. Conclui-se assim que é uma troca injusta por um bem tão precioso como a saúde das pessoas. Pela irregularidade do processo, pelas lacunas do EIA e pelo perigo que o mesmo representa para Coimbra CO-INCINERAÇÃO NÃO. Sra. Mnistra não ofenda a inteligência de Coimbra»

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DOCUMENTO 4 – Documento compromisso apresentado pelo PrimeiroMinistro à delegação que com ele reuniu em Janeiro de 1999 e intitulado “As Cimenteiras e a Co-incineração de Resíduos Industriais”. Fonte: Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 390, Pp. 34-36

[P. 34] 1.«…pôr fim, no espaço de um ano em todos os fornos de Souselas e Maceira e no ano seguinte nas fábricas de Alhandra e Outão, ao flagelo ambiental das poeiras de cimento (…) determinando a instalação de filtros de mangas eficazes em todas as unidades e em todos os fornos, com um custo estimado superior a 4 milhões de contos». 2. «…tendo em vista a requalificação ambiental das localidades em que se situam cimenteiras, serão criados “Gabinetes Técnicos para a Requalificação” (GTR) cuja missão será inventariar as áreas, tarefas e modos de intervenção, a integrar posteriormente num Plano de Acção para a requalificação». 3. «…o Governo encomendará a um arquitecto urbanista qualificado, um Projecto Orientador de Requalificação Urbanística, que servirá de elemento estratégico essencial para todo o processo» [P.35] 4. «…o Governo destinará as verbas adequadas para cobertura dos custos inerentes, acertando com as Autarquias em causa a forma concreta de proceder em cada situação» 5. «…Tudo isso permitirá obter, a curto prazo, uma efectiva recuperação de adequada qualidade de vida a quem mora nas localidades das cimenteiras, eliminar o citado passivo ambiental e compensar (da forma possível) os cidadãos pelos distúrbios sofridos ao longo dos anos» 6. Propõe para restaurar a «confiança dos cidadãos no funcionamento regular e respeitador do ambiente das cimenteiras»: 7. Criação de uma «Comissão Cientifica de Controlo e Fiscalização Ambiental das Cimenteiras, integrada por 6 especialistas reputados das áreas da medicina, qualidade do ar e química (…) caberá proceder à definição, acompanhamento de montagem e aferição de funcionamento de todo o sistema de monitorização ambiental das cimenteiras» 8. Constituição junto de cada município de uma «Comissão de Acompanhamento Local integrada por representantes da Câmara Municipal, da Junta de Freguesia, de organizações locais ambientalistas ou cívicas interessadas no problema e quaisquer outras entidades concelhias que invoquem legítimo interesse em integrar a Comissão». O objectivo era o controlo e fiscalização ambiental pois era «…possível recolher e comparar dados de antes da instalação dos filtros de mangas e após instalação desses filtros (…) Findo 719

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esse período, a Comissão pronunciar-se-á sobre os dados obtidos e a eficiência dos mecanismos instalados (…) No final deste processo, que se estima em 3 meses, após a conclusão da instalação dos filtros de mangas, a Comissão de Controlo e Fiscalização Ambiental das Cimenteiras dará um parecer circunstanciado e conclusivo sobre a utilização de vários tipos de resíduos industriais que poderão vir a ser co-incinerados nas cimenteiras, definindo igualmente eventuais condicionantes. No caso de o parecer ser em algum ponto negativo, a licença de co-incineração à unidade industrial em causa contemplará essa ou essas excepções». [P.36] «Caberá às Comissões acima referidas e à Comissão de Avaliação do Impacte Ambiental promover um amplo programa de informação pública local, organizando debates com especialistas, audições, visitas de trabalho, etc. (…) Resultará, no mínimo, um País menos poluído, mais consciente dos seus problemas e possibilidades, mais solidário e atento. Acabará o drama das poeiras das cimenteiras e serão requalificadas as zonas e localidades circundantes das suas fábricas. No máximo, será resolvido igualmente o grave problema dos Resíduos Industriais Perigosos, que hoje não conhecem outro destino senão serem vertidos em rios e ribeiras, enterrados em fossas ou queimados ao ar livre».

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DOCUMENTO 5 – Primeira deliberação do executivo municipal de Coimbra, eleito para 2002-2005, retirado da acta Nº 1, 21/01/2002, realizada em Souselas Fonte: Livro de Actas da Câmara Municipal de Coimbra, Nº 408, Pp. 5-8

«Considerando que a Convenção de Estocolmo veio demonstrar que a co-incineração constitui uma grave ameaça à saúde pública; Considerando que a perigosidade de muitos poluentes potencialmente emitidos pela co-incineração está bem estabelecida cientificamente; Considerando que a contaminação por esses poluentes é irreversível, o que impõe uma decidida aplicação do principio da precaução; A Câmara Municipal de Coimbra, reunida em Souselas a 21 de Janeiro de 2002, decide: 1 – Reafirmar a sua total oposição à co-incineração, em Souselas ou em qualquer outra cimenteira; 2 – Afirmar que a tecnologia actual oferece uma grande variedade de processos alternativos de tratamento de lixo tóxico, que não estavam disponíveis quando há alguns anos muitos dos países mais desenvolvidos optaram pela co-incineração e pelas incineradoras dedicadas, mas que agora nos oferecem a possibilidade de evitar a queima de lixo tóxico; 3 – Manifestar a intenção de usar de forma multifacetada todos os meios políticos e jurídicos ao seu alcance para levar o Governo Português a abandonar o processo de co-incineração; 4 – Declarar a sua intenção de colaborar com todas as estruturas da sociedade civil que têm protagonizado a luta contra a co-incineração, particularmente a Universidade de Coimbra e aquelas que estão reunidas na Comissão de Luta contra a co-incineração, além de outras sediadas fora do concelho de Coimbra; 5 – Colaborar com a Câmara Municipal de Setúbal na tarefa comum de evitar ao país os riscos da co-incineração; 6 – Reiterar a absoluta necessidade da realização de um referendo local que permita a participação democrática dos munícipes de Coimbra como suporte das deliberações e a emitir no uso das competências próprias da Câmara Municipal; 7 – Denunciar vigorosamente o incompreensível atraso da efectivação do estudo epidemiológico à população de Souselas, atraso esse inteiramente assacável ao governo e estruturas regionais de saúde; 8 – Declarar que, de acordo com os poderes de avaliação atribuídos pela Lei 149/99 de 3 de Setembro, e porque o procedimento da maioria dos membros da CCI demonstrou incumprimento da Lei, ausência de imparcialidade, comportamento ofensivo e insultuoso, a Câmara Municipal de Coimbra perdeu a confiança nessa Comissão e não é favorável à continuação do seu mandato; 9 – Denunciar os seguintes vícios de procedimento da Comissão (…)» 721

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