Fugacidade do Homem.docx

May 25, 2017 | Autor: Nicolas Theodoridis | Categoria: History, Philosophy Of Religion, Património Cultural Imaterial
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FUGACIDADE DO HOMEM

No dia 21/05/2016 participei da solenidade de posse na Academia Teresopolitana de Letras, na Casa de Cultura Adolph Bloch, em Teresópolis, região serrana do Rio de Janeiro, Brasil, vindo a assumir a cadeira de número 14. A solenidade, cercada de elementos cerimoniais, legitimou meu ingresso na referida Instituição. Quais as observações e indagações a respeito do evento e de sua relevância na vida, não somente minha, mas do meu convívio para com meus semelhantes e a postura que devemos assumir.
Inicialmente, poderíamos nos indagar das origens e objetivos de uma Academia de Letras. Pois bem, seguindo o modelo Académie Française, fundada em 1635 por Richelieu no reinado de Luís XIII na França, composta por 40 membros, a Academia no Brasil seguiu os mesmos moldes, vindo a ser criada no final do século XIX por intelectuais brasileiros inspirados na matriz francesa.
Fundada em 20 de junho de 1897, tendo em sua presidência Machado de Assis, teve as 40 cadeiras ocupadas por membros efetivos e perpétuos, conhecidos como imortais, pois o cargo é vitalício, expresso pelo lema "Ad Immortaliten" e a sua sucessão somente acontece pela morte do ocupante da cadeira.
Em nossa cidade, a Academia de Letras foi fundada em abril de 1961, estando com 55 anos de existência. O modelo de organização é o mesmo, ou seja, iniciou com 40 membros considerados perpétuos, sendo renovadas as cadeiras com o desligamento decorrentes de morte de seus integrantes.
Cada cadeira tem um patrono específico, referente aos imortais que ocuparam a Academia Brasileira de Letras. No meu caso específico, fui empossado na cadeira de número 14, tendo como patrono da mesma Graça Aranha (1868 – 1931).
O processo seletivo aconteceu por meio de edital propalado na mídia Teresopolitana, atendo a várias prerrogativas. Após análise do currículo, os candidatos considerados aptos comparecem para declamar suas produções culturais diante dos membros e após, em deliberação fechada, decidem qual candidato está à altura de ingressar nos quadros da Instituição.
Na cerimonia de posse, os futuros imortais são devidamente apresentados, cada qual pelo seu padrinho, membros do quadro efetivo da Academia e da qual foram escolhidos pelos candidatos, geralmente por afinidade.
Para o dia tão esperado da posse, após os devidos convites aos familiares e amigos, os postulantes a cadeira são devidamente apresentados ao público, sendo seus currículos declamados para os presentes por meio de seus padrinhos e após a apresentação, convidados ao púlpito para apresentar uma pequena biografia do patrono de sua cadeira, assim como de seu antecessor.
Após esta etapa, dá-se continuidade ao cerimonial com a colocação da vestimenta do fardo da Academia, de cor verde-escura com bordados de ouro que representam os louros, complementados com uma medalha, broche e um pequeno ícone, representativos dos símbolos da Academia Teresopolitana de Letras.
A questão da imortalidade eu vim a entender no transcurso do processo de posse. Ao tomar posse de uma cadeira, acabamos por nos tornar parte da Instituição e, da mesma maneira da qual eu me referi ao patrono e a minha antecessora, quando eu vier a falecer, a referida cadeira virá a ser ocupada por outro postulante, que ao efetuar o discurso de empossamento, virá a se referir ao patrono e ao antigo ocupante, discursando as realizações por minha pessoa efetuadas.
Portanto, meu nome está deste então, registrado nos anais da Academia Teresopolitana, gravado na cadeira que me foi designada, para todas as gerações posteriores. Este é o postulado da imortalidade.
Após todo o cerimonial, a certeza que fica refere-se à responsabilidade inerente ao cargo ocupado, não somente uma representação simbólica, mas um compromisso assumido de propalar a cultura em nossa cidade, levando o nome da Instituição em todas as atividades da qual seus membros venham a participar.
Este é o maior compromisso que elegemos em nossas caminhadas no intuito de levar a cultura e o nome da Instituição em qualquer lugar da qual venhamos a fazer parte.
Esses denominados ritos de passagem comportam elementos que fazem com que o indivíduo assuma determinadas posturas e seja visto de maneira diferenciada pelos componentes do grupamento social.
Reflitamos; inicialmente o homem estabeleceu através do tempo nas sociedades aos quais foi moldado, padrões de comportamento que o identificam frente às normas vigentes.
Nas sociedades mais primitivas, existia o ritual de passagem de criança para a fase adulta. Em determinada idade, os adolescentes da aldeia eram submetidos a provas para que pudessem ter aos olhos da comunidade o direito de serem acolhidos como homens. Em várias sociedades indígenas tal aspecto cultural foi durante muito tempo utilizado.
Na Grécia Antiga tal procedimento era também feito com intuito de demonstração do jovem frente à sociedade. A cidade – Estado de Esparta é um exemplo, pois os jovens eram submetidos a duras provas tendo no final que demonstrarem sua capacidade de sobrevivência em ambientes hostis. Roma também assumiu normas que identificavam a passagem do jovem para a fase adulta.
No Egito identificamos claramente o rito de passagem do recém-falecido ao mundo dos mortos. Todo um ritual era efetuado com fins de transpor o caminho e ser aceito para seguir na jornada além-túmulo.
Na Idade Média o que mais chama a atenção é a entrada para as Ordens. Os Templários tinham todo um ritual na qual a pessoa se despia de suas posses materiais e jurava obediência aos preceitos da Ordem.
O casamento ainda é hoje uma das formas mais expressivas de demonstração de justificativa frente à sociedade ao qual se faz parte de um ritual de passagem. A partir daquele momento, a identificação do casal far-se-á para todos. Muitos ainda apregoam o casamento como forma legal de união entre as pessoas. Embora os padrões de comportamento tenham sofrido modificações através do tempo, o casamento ainda é visto como um comprometimento maior.
As religiões, nas sociedades de maneira geral, têm em seus procedimentos, ritos para identificação de determinados postos eclesiásticos. Basta atentar quando da escolha do novo papa.
A conclusão de um curso universitário determina à pessoa a possibilidade de ingresso na vida Profissional. A festa de colação, ao qual se tem a entrega simbólica do diploma assume frente aos olhos da sociedade uma marca ao qual determina o fim de um período para início de outro.
No evento citado no início, tive o privilégio de ser empossado na Academia de Letras, mas, independente disso, o ritual teve como premissa, aos meus olhos, a aquisição de bens imateriais, simbolizada nas ações realizadas no cotidiano, exercidas na cidade de domicílio.
Todos esses rituais assumidos pelo homem no transcorrer das eras teve e têm o intuito de demonstração frente ao sistema social ao qual o homem está imerso. Seja qual for o papel assumido, o que realmente interessa é como reagimos e interagimos em nossas realidades, conosco e com o próximo.
Portanto, a importância que muitos creditam e que outros menosprezam, não está na posse da cadeira, mas nos cabedais imperecíveis que o acompanham, sem mesmo as pessoas se darem conta deste outro tipo de valor.
O ritual em si somente adquire valor identificável quando propicia uma mudança no ambiente psíquico da pessoa, fazendo com que ela se engrandeça e tenha a possibilidade da aplicabilidade desses novos valores, pois ao ser agraciado com o troféu, é como se o indivíduo/empresa, assumisse um compromisso para consigo próprio de continuar a trilhar no caminho e satisfeito com o reconhecimento deste mesmo esforço.
Independente de como a sociedade preconize tais postulados, temos todos dentro de nós o principal elemento de discernimento que é nossa consciência.
Conforme já preconizado por Jesus, que possamos nos rejubilar pelos bens imperecíveis, aqueles que as traças não comem, não cria ferrugem e não se deteriora e não pode ser roubado por ladrões, pois serão somente estes bens que nos acompanharam na transição ao mundo espiritual.
Afinal, o que somos realmente? Nossa constituição, desde o alijamento do ventre materno, é frágil e nos coloca sempre em posição de cuidados recorrentes. Ao menor descuido, o organismo dá vazão a algum elemento exógeno que culmina em transtorno orgânico. No transcorrer de nossas vidas, estamos sempre sitiados de micróbios, vírus, viroses (nome bastante utilizado hoje em dia para identificar qualquer patologia diferente) e outros agentes que submetem ao desequilíbrio nosso frágil soma. Por mais que externamente apresentemos uma compleição forte e saudável, estamos sujeitos a qualquer momento a tombarmos nos proscênios da vida.
O ser humano embora seja o topo da evolução no planeta, tendo desenvolvido no passar dos évos um cabedal de monumentais obras em todos os setores da vida, permanece à mercê dos elementos naturais que infrutiferamente tenta domá-los e que vez ou outras explodem em fúria reclamando seus devidos direitos.
Com isso tudo, ainda por ignorância nos tratamos desigualmente, efetuando distâncias calcadas em desníveis sociais, econômicos, acadêmicos, da coloração da epiderme, entre outros. Quando iremos aprender a nos respeitar e enxergarmos que somos frágeis e que de um momento para outro todas as nossas idiossincrasias desaparecem do mapa da nossa arrogância provendo o devido nivelamento a todos no momento da morte.
Mesmo com todo desenvolvimento tecnológico que marcou a centúria passada, ainda vivemos imersos na cegueira de uma superioridade que ao menor lufar dos ventos desvanece ao luar das ilusões.
A devida extrapolação tem como premissa basilar a determinadas situações que a vida nos constrange. Estes acontecimentos servem de material de reflexão interna e para tanto, o escrever é uma excelente ferramenta que possibilita o extravasar dos sentimentos e ideias.
Comecemos. Inicialmente, ao voltar o olhar para trás, de minha trajetória de vida nesta encarnação, paro e me pergunto o porquê de determinadas situações aos quais ficamos expostos e, querendo ou não, tornamo-nos partícipes do mesmo.
Desde cedo, acalentei o desejo de enveredar pela via acadêmica, mas vários percalços retardaram meu desiderato. Sempre fui uma pessoa estudiosa, leitor ávido e com amplo espectro de interesses, não me fixando em uma coisa somente.
Após muito retardo, consegui retornar ao meio acadêmico, dando continuidade os projetos anteriores, mas desta vez com perspectivas reais de um objeto de trabalho, que me possibilita exatamente o adentrar em outros vários redutos, mas conforme colocado na assertiva inicial, mais uma vez, vejo meus objetivos cortados, ou pelo menos, adiados por situações das quais acabo envolvido.
Entendamos. No meio acadêmico, cada pesquisador tem sua área de interesse, que com o passar do tempo, vai cada vez mais se verticalizando. Portanto, na história, acabamos nos especializado em determinadas áreas de estudo e aprofundando tais pesquisas. Quem, como eu, tem interesse em história das religiões, acaba descortinando em seu objeto de predileção, pesquisas que giram ao seu redor.
Mas, o que pude observar é que, embora eu fosse levado ao tema de estudo como forma de propagação das ideias das quais acredito, outros o utilizam somente como forma de análise e desconstrução.
Tornando mais claro o que quero dizer, vou me apropriar das palavras do teólogo Huberto Rohden (1893 – 1981), que no livro "A mensagem Viva do Cristo", pg. 17, se utiliza da seguinte assertiva: "O homem profano só se interessa pelo corpo do Evangelho, procurando analisar, anatomizar, viviccionar palavra por palavra, matando a alma transcendente da mensagem, lembrando um cientista que analisa em laboratório uma flor, destruindo-a. Analisar é a palavra grega para dissolver; quem apenas analisa, dissolve, mata a vida da mensagem divina. Mas quem, em vez de ser ego-pensante, permite ser (cosmo) espírito-pensante, esse absorve os fluidos divinos da revelação do Cristo, assimilando intuitivamente a alma da letra".
O que ele quis dizer é que os acadêmicos, em sua grande maioria, como cientistas sociais, não estão preocupados com a essência e sim, em analisar a letra, sendo, portanto, estudiosos da religião simplesmente, sem maiores considerações.
Paulo de Tarso ao escrever em I Coríntios 8, 1-3, postula que "o conhecimento traz orgulho, mas o amor edifica. Quem pensa conhecer alguma coisa, ainda não conhece como deveria. Mas quem ama a Deus, este é conhecido por Deus". Em outras palavras, abstrair pelo conhecimento, intelecto, é completamente diferente de compreender pelas vias do espírito genuinamente.
Com isso, observei in loco tal proposição ao ser arrolado em determinada situação ao qual acabei sendo, digamos, cúmplice. Sem fazer papel de vítima, ninguém pode e tem o direito de saber o que vai do coração de qualquer pessoa, vindo com isso, a se tornar artífice como juiz e querer ser mediador do certo e do errado.
Aquele que não tem pecado, que atire a primeira pedra. Não foi este um dos principais ensinamentos do Mestre da Galileia? Como que alguém pode querer ser o detentor da verdade absoluta? Daí segue outras proposições ao verificar o que acontece na Academia, em que, os chamados bens imaginários, fazem mais mal ao homem do que achamos; as riquezas esvaziam o coração; as honras fazem-no inchar; os prazeres o fazem oco. Em tudo isso segue a vaidade e o orgulho do ser que se acha maior do que o outro pelas titulações da Terra.
As lições que apreendo do acontecido são que para conviver no meio da qual escolhi, tenho que ser "simples como a pomba, mas prudente como as serpentes" (Mt. 10:16), pois pisamos em ninhos de vaidade, neste caso a intelectual e com certeza, o referido corte, me foi um aviso para não ter a soberba de querer ser mais ou melhor do que ninguém.
Que possamos então acalentar uma melhor compreensão entre nós e convivermos respeitando nossas diferenças, sabedores que de um momento para outro podemos estar nos despedindo do cenário terrestre.



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