Fusões e Aquisições: O caso da Latam e seus impactos na aviação brasileira

June 28, 2017 | Autor: Isis Montenegro | Categoria: Industrial Economics, Mergers & Acquisitions
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

FUSÕES E AQUISIÇÕES: O CASO DA LATAM E SEUS IMPACTOS NA AVIAÇÃO CIVIL BRASILEIRA

ÍSIS CRISTINE MONTENEGRO BARBOSA

ORIENTADOR: ZIONAM ROLIM

Recife Outubro/2014

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

FUSÕES E AQUISIÇÕES: O CASO DA LATAM E SEUS IMPACTOS NA AVIAÇÃO CIVIL BRASILEIRA

ÍSIS CRISTINE MONTENEGRO BARBOSA

Monografia apresentada ao Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco, sob a orientação do professor ZIONAM

ROLIM,

como

requisito

para

obtenção de título de Bacharel em Ciências Econômicas.

Recife Outubro/2014

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe, minha tia, minha avó, a todos aqueles que me apoiaram até aqui e também a mim, que passei pelo 3º e 9º períodos ansiando pelo momento de escrever esta dedicatória. Dedico este trabalho especialmente a minha avó Nita, que não pôde vê-lo concluído.

AGRADECIMENTOS Agradeço a meus pais, em especial a minha mãe, por terem me dado condições para realizar esta conquista. Agradeço a todos os meus familiares e amigos que não duvidaram da minha capacidade de concluir esta tarefa, que por vezes pareceu grande demais. Em especial, agradeço a Emerson, um amigo que sempre esteve disposto a compartilhar as experiências vividas na faculdade e para me estimular até o fim. Agradeço, finalmente, aos professores competentes do curso de Ciências Econômicas, que me proporcionaram conhecimento e experiências que serão lembras sempre. Entre os professores, devo citar o professor Zionam Rolim, sempre disposto a ajudar, Yony Sampaio, Márcia Alcoforado, Maria Fernanda, Marcelo Silva e Fernando Dias, com quem eu tive o prazer de aprender.

RESUMO O objetivo deste trabalho é analisar as características relevantes do processo de fusão das empresas LAN e TAM, processo iniciado em 2010 e finalizado em 2012. O trabalho parte do estudo da teoria econômica, com ênfase nas organizações de mercado oligopolistas, para fundamentar as motivações e consequências da fusão geradora da LATAM. A segunda seção do trabalho trata dos aspectos práticos envolvendo a operação – uma fusão horizontal, amigável e cross-border As vantagens incorridas pela operação e o desempenho da nova empresa são investigados. Por fim, é realizado o estudo dos pareceres dos órgãos de defesa da concorrência do Brasil e Chile, que aprovaram com ressalvas a fusão, com o intuito de determinar a consistência dessa medida comparada ao desempenho do mercado. Palavras chave: LAN, TAM, LATAM, Fusão, Oligopólio, CADE, TDLC, Barreiras à entrada.

ABSTRACT This paper aims to analyze the most relevant characteristics of the merging process between the companies LAN and TAM, started in 2010 and concluded in 2012. The paper starts by the study of economic theory, with special attention to oligopolistic markets, to ground the motivations and consequences of the merge that originated LATAM. The following section address the practical aspects involving the operation – a horizontal, friendly and cross-border merge. Advantages gained through the merge and the performance of the new company are investigated. Finally, it looks upon the decision to approve the merge under certain conditions taken by the antitrust boards in Brazil and Chile, in order to determine the consistency of these measures compared to market’s performance. Tag word: LAN, TAM, LATAM, Merges, Oligopoly, CADE, TDLC, Entry barries.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 7 1.

ESTRUTURAS DE MERCADO ................................................................................. 9

2.

OLIGOPÓLIO .......................................................................................................... 11 2.1

3.

MODELOS DE EQUILÍBRIO NO OLIGOPÓLIO ............................................... 12

2.1.1

Modelo de Cournot ..................................................................................... 13

2.1.2

Modelo de Bertrand .................................................................................... 15

2.1.3

Conluio ....................................................................................................... 16

2.1.4

Barreiras à Entrada..................................................................................... 18

FUSÕES E AQUISIÇÕES ....................................................................................... 25 3.1

CLASSIFICAÇÃO.............................................................................................. 25

3.2

MOTIVAÇÃO ..................................................................................................... 28

3.2.1

Razões da firma adquirente ........................................................................ 28

3.2.2

Razões da firma adquirida .......................................................................... 30

3.3

REGULAÇÃO ANTITRUSTE ............................................................................ 30

3.4

O CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE ......... 33

4.

SETOR AÉREO BRASILEIRO ................................................................................ 35

5.

AS EMPRESAS ...................................................................................................... 41

6.

5.1

TAM LINHAS AÉREAS S.A. ............................................................................. 41

5.2

LAN LINHAS AÉREAS S.A. .............................................................................. 43

LATAM AIRLINES S.A. ........................................................................................... 46 6.1

A FUSÃO .......................................................................................................... 46

6.2

DEFESA DA CONCORRÊNCIA – CADE E TDLC ............................................ 51

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 58

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INTRODUÇÃO Empresas buscando diversificar investimentos ou expandir a participação no mercado podem optar por operações de fusões e aquisições para alcançar seus objetivos. Apesar da complexidade envolvendo uma operação dessa natureza, as vantagens esperadas são bastante atrativas. As Fusões e Aquisições (F&A) são, de modo geral, tratadas conjuntamente, mas existem diferenças significativas entre elas. Uma fusão é a união de duas ou mais empresas para formar uma nova sociedade. Fusões ocorrem, principalmente, entre firmas de porte semelhante. Por outro lado, em uma operação de aquisição, uma empresa, a adquirente, incorpora outras empresas. A firma adquirente mantém sua identidade, enquanto a adquirida é extinta. Os processos de fusão e aquisição são caros e trabalhosos. Entretanto, existe uma compensação dessas dificuldades por meio do aproveitamento de sinergias capazes de melhorar a produtividade das firmas. Economias de escalas operacionais causam redução ou eliminação de custos de produção e de despesas com atividades corporativas e maior eficiência no setor de pesquisa e desenvolvimento, por exemplo. Ganhos na eficiência gerencial, advinda da substituição de administração ineficiente (geralmente presentes na empresa adquirida) melhoram o desempenho econômico e financeiro da nova organização. As fusões também possibilitam maior poder de mercado, pois empresas grandes têm capacidade de negociação aumentada junto a fornecedores,

concorrentes

e

governo.

Avanços

tecnológico,

causados

pela

transferência de tecnologia e conhecimento (know-how) são outras consequências positivas de F&A. Outras razões que motivam a ocorrência de fusões e aquisições entre empresas podem ser citadas. Por exemplo, a viabilização da expansão em curto prazo e diminuição dos prazos de implementação de novas plantas ou produtos no mercado, a diversificação de riscos, a remoção de um concorrente potencial, e a obtenção de patentes ou licenças para comercializar um novo produto. No caso alvo desta dissertação, a fusão das empresas LAN e TAM, esse último motivo apontado recebe destaque, pois, em um mercado altamente regulado como o da aviação comercial, a

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transferência de licenças para operar em determinados trajetos ou aeroportos pode ser muito valiosa. Para companhias aéreas, estratégias de fusões e aquisições são um meio rápido para aumentar a capacidade operacional e viabilidade financeira. As empresas podem ter os custos reduzidos por conta da eliminação de serviços comuns às duas empresas ou pelo compartilhamento de instalações. Os casos recentes da Gol e Varig, Azul e Trip, Gol e Webjet são exemplos de utilização da estratégia de fusões e aquisições empregada por companhias aéreas. Nesse contexto, a empresa brasileira TAM e a chilena LAN fundiram-se para formar uma gigante do setor, a LATAM, maior empresa de aviação comercial da América Latina. Juntas, as empresas passaram a contar com um quadro de mais de 50 mil funcionários, com operações em 22 países. Ao longo deste trabalho são investigadas as características e motivações da fusão das empresas LAN e TAM, bem como o desempenho da nova empresa surgida. Também serão analisados os impactos da fusão para o mercado de aviação civil brasileiro e chileno, através do tratamento dado pelos órgãos regulatórios de defesa à concorrência destes países. O presente trabalho divide-se em quatro seções principais. A primeira delas apresenta em linhas gerais as estruturas de mercado, destacando-se aquela em que as estratégias de fusão e aquisições são mais frequentes: o oligopólio. As principais teorias de determinação do equilíbrio neste cenário concorrencial e a teoria de Barreiras à Entrada são aprofundadas, com o intuito de fundamentar o estudo realizado. A segunda seção estrutura a fundamentação teórica das estratégias de fusão e aquisição, contextualizando-as para a realidade analisada. Em seguida, é realizado o estudo do cenário no qual a operação aconteceu, incluindo um estudo do mercado de aviação civil brasileiro e as empresas envolvidas no processo. As principais características e resultados do ato de concentração são objeto de reflexão da quarta e última seção deste trabalho.

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1. ESTRUTURAS DE MERCADO Mercado pode ser definido como a interação entre as forças de oferta e demanda que resultam em um equilíbrio, no qual os preços e quantidades das mercadorias transacionadas são determinados. Várias características podem afetar a maneira em que essa interação ocorre, como, por exemplo, o poder de mercado possuído pelas firmas, isto é, a capacidade das firmas de alterar individualmente o equilíbrio final. Através da análise das condutas adotadas pelas firmas, diversos padrões de concorrência podem ser caracterizados, sendo os mais notórios o monopólio, a concorrência perfeita, o oligopólio e a concorrência monopolística. Essas organizações apresentam diferenças fundamentais, que se encontram resumidas abaixo: a)

Monopólio: há somente uma firma no mercado e esta tem o poder de

decidir o nível de preços e a quantidade, de forma a maximizar seus lucros. O poder da firma monopolista é limitado apenas pelo comportamento da demanda, que definirá o quanto será consumido dado o preço praticado. As entradas e saídas de concorrentes são gravemente dificultadas.

b)

Concorrência perfeita: ocorre em um mercado no qual existam muitas

firmas ofertando um produto homogêneo. As empresas individualmente não têm relevância para, através de suas escolhas, determinar o preço do mercado. Assim, as firmas escolhem o nível de produto que ofertarão e assumem o preço como dado. Na concorrência perfeita, o lucro será zero.

c)

Oligopólio: um número reduzido de empresas competem entre si, e a

entrada de novas firmas é dificultada. Cada empresa possui relevância suficiente para, com suas ações, interferir no equilíbrio geral do mercado. A maximização dos lucros no oligopólio será condicionada pelo comportamento adotado por todas as firmas.

d)

Concorrência monopolística: caracterizado pela livre entrada e saída das

firmas, em uma concorrência monopolísticas os consumidores percebem os

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produtos como diferentes, mas com alto grau de substituição entre eles. Neste padrão concorrencial, as firmas possuem algum poder de mercado, capaz de explicar pequenas diferenças entre os preços de produtos de uma mesma indústria.

Apesar de populares nos meios acadêmicos por apresentarem relativa estabilidade quanto ao comportamento dos participantes, o monopólio e a concorrência perfeita não são facilmente observados em uma economia real. A análise dos mercados mostra que os arranjos mais comuns são de oligopólio e de concorrência monopolística. Nesses casos, as firmas possuem algum poder de mercado, porém menor que o do monopólio, e a entrada e saída de concorrentes é dificultada. A maximização de lucros de firmas em situação de monopólio e de concorrência perfeita está sujeita apenas ao comportamento da própria firma no mercado. Em contrapartida, em oligopólios e concorrências monopolísticas, as firmas precisam definir seu posicionamento no mercado levando em consideração os concorrentes. Para estabelecer a condição ótima dessas empresas fez-se necessário o desenvolvimento de modelos que ataquem o problema da interdependência entre as firmas. Tendo em vista que o intuito deste trabalho é analisar estratégias de ganhos operacionais de empresas pertencentes ao setor de aviação, é fundamental a realização de um estudo mais aprofundado dos oligopólios, suas características e estratégias de determinação de preço e quantidade.

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2. OLIGOPÓLIO Os arranjos oligopolistas são extremamente comuns no cenário econômico moderno, ganhando força após a segunda onda da Revolução Industrial, época em que grandes empresas passaram a tomar conta da demanda e a tecnologia de produção atingiu uma complexidade que a tornava inacessível para pequenos produtores. Os meios de produção foram concentrados, a medida que concorrentes ineficientes deixavam o mercado, diminuindo com isso o grau de concorrência do mercado. Uma indústria fortemente concentrada, no entanto, não está necessariamente em condições monopolísticas ou oligopolísticas, caso seus produtos possam ser facilmente substituídos por outros. É a combinação de poucas empresas com a exclusividade da produção de um bem que promove imperfeições no cenário concorrencial de um mercado. Situado entre a concorrência perfeita e o monopólio, o oligopólio é um estrutura de mercado no qual há poucas firmas envolvidas, os produtos podem ser homogêneos (caso de petróleo, alumínio, e de empresas aéreas) ou não (mercado de refrigerantes, tênis esportivos e roupas), e existem barreiras à entrada de competidores. O número de firmas do oligopólio não é precisamente definido, tendo que ser suficientemente pequeno para que as ações de um agente sejam capazes de interferir no equilíbrio geral do mercado, o que implica que a empresa oligopolista precisa levar em consideração as reações dos rivais ao tomar suas próprias decisões. Como posto por McGuigan, Mayer e Harris (2004): (...) o número de empresas é pequeno o suficiente para que as ações de uma empresa individual no setor, envolvendo preço, quantidade produzida, estilo ou qualidade do produto, lançamento de modelos e condições de venda, exerçam um impacto perceptível sobre as vendas das outras empresas do setor.

Ao contrário do monopólio e da concorrência perfeita (situações em que as firmas pouco interferem no mercado, uma por que o lucro é certo e a segunda por que as empresas tomam os preços como dados), no oligopólio as firmas devem adotar um comportamento estratégico, que considere as ações dos seus concorrentes para estipular qual o melhor posicionamento possível no mercado. A interdependência

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existente pode resultar em diversos graus de concorrência e de cooperação entre as empresas oligopolistas. Em um extremo, há a rivalidade intensa, isto é, nenhuma cooperação entre as partes e uma empresa tenta aumentar sua participação no mercado expulsando suas concorrentes. Uma situação intermediária se caracteriza pela cooperação informal ou tácita, na qual as empresas adotam comportamentos semelhantes, no tocante ao tamanho do mercado e estabelecimento de preço de equilíbrio. Em um terceiro cenário existe o acordo formal de conluio entre empresas para que estas possam agir como monopolistas. Apesar de ser a “forma de mercado mais frequente” (LABINI, 1984), os diversos arranjos possíveis de interação das firmas tornam praticamente impossíveis a criação de um modelo singular de análise de estratégia que deve ser adotada nesse mercado. As principais teorias versam sobre a manipulação dos preços ou das quantidades produzidas para chegar ao ótimo do mercado. Outras teorias, por sua vez, avaliam como as barreiras à entrada influenciam o perfil do mercado e, consequentemente, o comportamento que deve ser adotado pelas empresas participantes. A existência de muitas “soluções formalmente corretas (...) gera dificuldades ainda mais graves do que as que teríamos de enfrentar se existissem teorias contraditórias que obrigassem a uma escolha” (LABINI, 1984). Com o intuito de facilitar a análise das condições de equilíbrio de mercado, muitas teorias atacam o problema do duopólio, um caso particular de oligopólio em que existem apenas duas empresas competindo no mercado.

2.1 MODELOS DE EQUILÍBRIO NO OLIGOPÓLIO As inúmeras possibilidades de interação entre as firmas impossibilita a criação de um modelo absoluto de equilíbrio no oligopólio. Os modelos diferenciam-se pelo instrumento de determinação de equilíbrio adotado: o preço ou a quantidade. Há ainda a abordagem de barreiras à entrada, na qual a estrutura do mercado determina o desempenho do mercado. As empresas também podem influenciar o mercado ao assumir uma posição de liderança ou igualdade frente às demais. Os modelos apresentados são o de Cournot, Bertrand, o modelo de definição do equilíbrio por meio de conluio e o modelo de Barreiras à Entrada.

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2.1.1 MODELO DE COURNOT Publicado em 1838, o modelo de Cournot é uma das primeiras e mais conhecidas formas de tentar estabelecer uma estratégia adequada para as firmas em mercado oligopolista. Partindo de simplificações da realidade, o economista francês afirmou que as empresas laçavam mão da escolha do nível de produção ideal como ferramenta para maximização de lucros. Para chegar a esse entendimento, Cournot fez concessões não desprezíveis. A principal delas é o uso do cenário de duopólio para ilustrar a conduta das empresas. Outra simplificação parte da desconsideração à interdependência, significando que cada empresa ignora a ação dos concorrentes e acredita que os outros farão o mesmo. Logo, a escolha da produção baseia-se apenas no perfil de custos próprio. Adicionalmente, há a suposição de que os produtos comercializados são homogêneos e as empresas tomam decisões simultaneamente. Conhecendo a curva de demanda do mercado e a quantidade produzida pelo concorrente, uma empresa seguindo a estratégia definida por Cournot procurará determinar sua produção de forma a complementar a demanda total do mercado e maximizar seus lucros. A empresa assume que a postura do concorrente, caracterizada pela quantidade produzida, não se alterará de um período para o outro. A essência do modelo de Cournot é que, ao decidir quanto produzir, cada empresa considera fixo o nível de produção de sua concorrente (PINDYCK, 1999). E o preço de mercado, prossegue Pindyck (1999), dependerá, pois, da quantidade total produzida por ambas as empresas. Este padrão de ação é continuado até ser atingido o equilíbrio de longo prazo, ponto em que a produção e preço são estáveis. Cada empresa estimou corretamente a fatia da demanda atendida pelo concorrente e nenhuma das empresas possui estímulo parra aumentar ou diminuir a quantidade produzida em busca de elevação dos lucros.

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Apoiado em suposições irrealistas, tal qual a proposição de que as empresas manterão sua produção constante, o modelo de Cournot vê-se enfraquecido ou insuficiente para explicar a realidade observada no mercado. Com o objetivo de complementar o modelo de Cournot, surgiu o modelo de Stackelberg, cuja hipótese principal trata do papel de liderança adotado por uma das empresas no mercado. O modelo de Stackelberg é essencialmente um jogo sequencial, no qual uma firma decide primeiramente a quantidade a ser ofertada. A firma líder, avaliando o perfil de seus custos, anuncia a quantidade produzida. A segunda firma, assumindo um papel de seguidora, observa a produção da concorrente e, só então, calcula a quantidade ótima de produção, aquela que complementa a demanda total do mercado e maximiza os lucros. A decisão das empresas passa a ser uma reação a situação de mercado que lhes é apresenta. Stackelberg conclui que os lucros da empresa líder são comumente maiores que os lucros auferidos em um equilíbrio de Cournot (VARIAN, 2000). A oportunidade de estabelecer os critérios do mercado gera uma vantagem a empresa líder: independentemente do que o concorrente venha a fazer, a produção da primeira será maior. A ação da firma seguidora será sempre condicionada pela conduta da líder e pelas características inerentes ao mercado. Como resumido por Pindyck (1999): Para maximizar os lucros, o concorrente deve tomar por base seu nível anunciado de produção, devendo optar por um índice mais baixo de produção. Se seu concorrente viesse a produzir uma quantidade muito elevada, tal fato ocasionaria uma queda de preço, e as duas empresas teriam prejuízos.

A preocupação com a sobrecarrega do mercado com excesso de oferta atua como um limitador à produção da empresa seguidora. A escolha racional garante que a empresa se contente com a produção que complementa o mercado em favor da maximização dos lucros. A decisão de qual modelo, de Cournot ou de Stackelberg, é o mais apropriado depende das características do setor em questão. Em mercados formados por empresas semelhantes em tamanho e com produtos homogêneos, o modelo de Cournot renderá provavelmente melhores resultados operacionais. Em mercados onde

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existem diferenciações de preços e uma empresa destaca-se das demais, o modelo de liderança de quantidade é o mais realista.

2.1.2 MODELO DE BERTRAND O modelo criado pelo francês Bertrand é centrado na determinação dos preços para o alcance do equilíbrio de mercado. Para tal, foram feitas as mesmas simplificações conhecidas pelo modelo de Cournot: os produtos são homogêneos e o mercado encontra-se em situação de duopólio. Também foi determinado que as empresas agem simultaneamente, impossibilitando a adoção de comportamentos reativos no papel de seguidora. Com seu modelo, Bertrand defendeu que as empresas considerarão como fixo o preço do concorrente, e, de posse destas informações, tomam medidas para maximização dos lucros. Com a validade da hipótese do mercado de produtos homogêneos, os consumidores comprarão do fornecedor que oferece o menor preço. A firma nesta posição tomará toda a demanda do mercado, de modo que, se duas empresas cobrarem preços diferentes, a empresa com menor preço abastecerá todo o mercado e aquela com preço mais alto nada venderá (PINDYCK, 1999). Desejando uma maior participação no total das vendas, as empresas tendem a diminuir seus preços até o menor possível, ponto em que o preço do mercado iguala ao custo marginal de produção do bem, situação análoga a da concorrência perfeita. Se, por outro lado, as empresas estabelecem um preço idêntico, mesmo que este seja superior ao custo marginal da produção, é impossível prever qual a fatia de mercado ocupada por cada firma, tendo-se em vista que os produtos são homogêneos. Esta situação expõe uma falha no modelo de Bertrand, que é incapaz de determinar a produção ótima das firmas. Além disso, evidências empíricas apontam que, em casos de produtos homogêneos, é mais natural que a concorrência ocorra por meio da determinação de quantidade em vez de preços. As incertezas relacionadas ao modelo de Bertrand fazem com que ele não seja largamente aceito como uma análise definitiva de mercado, mas é suficiente como fundamentação para modelos mais avançados, que

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permitem certo grau de diferenciação entre os produtos, um panorama mais próximo à realidade. Em mercados oligopolistas cujos produtos apresentam algum grau de diferenciação, a distribuição do mercado é definida não apenas pelo preço, mas também mediante diferenças subjetivas de design, desempenho, durabilidade e outras características relevantes. Nesse caso, é natural que as empresas concorram por meio da escolha de preços, e não por quantidades. (PINDYCK, 1999). Quando duas empresas vendem um produto diferenciado, a demanda de cada uma será função do próprio preço de venda e do preço de sua concorrente. O equilíbrio será condicionado pelas mesmas premissas anteriormente estabelecidas, quais sejam a escolha simultânea e a tomada do preço da concorrência como um elemento fixo. O mercado estabilizar-se-á em uma situação na qual todas as empresas praticam preços diferentes e, ainda assim, conseguem manter um nível de demanda. É importante ressaltar que os preços não podem ser extremamente divergentes, pois, apesar de diferenciados, os produtos apresentam moderada substituibilidade, o que significa que, diante de preços muito elevados, um consumidor optará pela compra de um produto semelhante com valores mais baixos. A condição pode ser resumida da seguinte maneira: Cada empresário pode ter certa confiança em sua “clientela”: se aumenta o preço, ele não perde todos os compradores; se o diminui, não retira senão uma parte dos compradores dos outros (LABINI, 1984)

Finalmente, em mercados oligopolistas com produtos diferenciados, as firmas auferem lucros maiores que em uma situação de equilíbrio de Bertrand puro.

2.1.3 CONLUIO Nas análises anteriores supôs-se uma postura não cooperativa entre as firmas de um mercado. Em consequência, seja tomando decisões centradas pela quantidade ou preço, a empresa consegue arrecadar lucros maiores que os de uma empresa em um mercado estritamente competitivo, mas perde em relação a firmas inseridas em mercados monopolistas. Com o intuito de aumentar os lucros e reduzir o risco inerente

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que enfrentam por causa das interdependências da estrutura do setor (McGUIGAN et al., 2004), as firmas podem optar por estabelecer acordos formais de conluio (ou cartel). Dessa forma, as empresas, dentro da possibilidade do mercado, adotam uma postura de monopolista, aumentando os lucros conquistados no mercado. Importa ressaltar, no entanto, que acordos dessa natureza são, em geral, ilegais, pois comprometem a competitividade do mercado e o bem estar dos consumidores. A primeira vista, um cartel pode ser semelhante a um monopólio puro, mas isso não é necessariamente verdade. As diferenças surgem de dois aspectos importantes, sendo o primeiro deles o fato de que um cartel dificilmente controla todo o mercado, consequentemente, uma análise de comportamento estratégico ainda é necessária. Além disso, ainda que o cartel seja vantajoso para todas, as empresas não são obrigadas a segui-lo e podem optar por enganar seus parceiros com reduções de preço e estratégias de ganho de participação no mercado. Por esses fatores, os cartéis tendem a ser instáveis e pouco duradouros. O equilíbrio de mercado em uma condição de cartel depende de vários fatores como o grau de poder de mercado, qualidades gerenciais e a elasticidade da demanda pelo bem. Se o conselho formado pelos dirigentes do cartel possuir uma compreensão razoável do mercado que está controlando, o cartel será o melhor possível, isto quer dizer, atuar como monopolista e maximizar os lucros de todo setor. Agindo como monopolista, o preço ótimo do mercado será aquele que iguala a receita marginal ao custo marginal, que, neste caso, será a soma da função de custos marginais de todas as firmas. Porém, por mais difícil que seja a determinação e cumprimento do preço de um cartel, o problema central de uma associação deste tipo reside no controle das quantidades produzidas por cada membro. Estabelecer cotas de produção e garantir que estas serão respeitadas é um dos problemas mais difíceis enfrentados pelos conluios. Para serem bem sucedidos, os conluios dependem de uma variedade de fatores, sendo o primeiro deles o número de firmas participantes no mercado. O planejamento de uma coordenação de preços é consideravelmente dificultado em função do número de empresas oligopolistas envolvidas – o maior número de empresas torna mais difícil a

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chegada em um acordo de preço ótimo comum e aumenta a chance de quebra de acordos. Uma questão relacionada é a diferença da estrutura de custos enfrentada pelas empresas. Um número maior de participantes implica diferentes curvas de custo, tornando praticamente impossível a adoção de uma estratégia que seja satisfatória a todos os integrantes. A homogeneidade dos produtos também afeta a viabilidade do cartel. Mercados com produtos heterogêneos, isto é, produtos que apresentam alguma diferenciação de qualidade, concorrem via preço, a demanda por cada um será influenciada pela importância atribuída a essas características particulares. Por outro lado, em mercados com produtos idênticos, o único fator de decisão é o preço, que pode ser facilmente manipulado por um cartel. Finalmente, a estabilidade de um acordo de conluio é prejudicada dada a habilidade das empresas em agirem em segredo. As empresas, determinadas a aumentar seus lucros, podem diminuir preços, estabelecer contratos velados ou produzir além da cota acordada. Os riscos morais associados ao cartel criam a necessidade de retaliações aplicadas às firmas que descumprirem os acordos. Vale reforçar que acordos de cartéis são ilegais, logo ocorrem de maneira velada, bem como as ações de retaliação infligidas pelos participantes às firmas corruptas. A descoberta de conluios acarretam multas e outras correções legais aos envolvidos.

2.1.4 BARREIRAS À ENTRADA Tirando o foco da concentração industrial como determinante da dinâmica do mercado oligopolista, o economista Joe Bain publicou, entre as décadas de 1940 e 1950, trabalhos que posicionavam a dificuldade de novas firmas entrarem nos mercados como elemento decisivo para a dinâmica concorrencial encarada. O principal fator na determinação dos preços e da lucratividade em uma indústria está relacionado à facilidade ou dificuldade que as empresas

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estabelecidas encontram para impedir a entrada de novas empresas. (HASENCLEVER; KUPFER, 2002)

Bain chamou as dificuldades de acesso ao mercado de Barreiras à Entrada e as classificou em dois tipos: as barreiras à entrada estruturais, decorridas exclusivamente da relação preço-custo médio de longo prazo, e as barreiras estratégicas, fruto de comportamentos ativos ou reativos de empresas estabelecidas para impedir empresas entrantes de operarem no mercado. O mercado seria, na visão de Bain, o resultado dos confrontos travados entre as empresas estabelecidas e as entrantes. Firmas estabelecidas e candidatos à entrada são jogadores racionais que calculam suas respectivas chances, comparam forças e entram em um complexo jogo de estratégia (JACQUEMIN, 1987) – as primeiras gozam de vantagens por já estarem inseridas no mercado, obtendo lucros econômicos positivos, enquanto as últimas desejam partilhar dos lucros com a entrada no mercado. A existência de barreiras à entrada possibilita lucros extraordinários no longo prazo, condição impossível em mercados concorrenciais típicos. As barreiras à entrada podem se apresentar de várias formas, algumas das quais serão exploradas a seguir: a)

Economias de escala: as vantagens derivadas da economia de escala

tornam-se uma barreira para empresa entrante no momento em que o nível de produção mínimo é muito alto, até mesmo superior à demanda não atendida do mercado. Se a demanda não atendida é pequena em relação ao tamanho da planta que se faz necessário para a implantação da nova empresa, a exploração do mercado é economicamente inviável. Economias de escala podem surgir como resultado da adoção de tecnologias eficientes, que admitem a queda do custo médio à medida que a produção aumenta.

Estas tecnologias podem ser protegidas por patentes,

acessíveis apenas às firmas estabelecidas. Esforços de publicidade também se revelam mais efetivos quando acontecem em larga escala, prejudicando pequenas firmas.

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Um terceiro fator relevante para a formação de economias de escala baseia-se no poder de negociação detido por firmas maiores junto aos fornecedores. As grandes empresas normalmente têm a capacidade de influenciar não só os preços dos produtos acabados, mas também nos dos fatores produtivos. A existência de um poder de barganha propicia menores custos de matéria prima, e consequentemente, maiores faixas de lucro, coeteris paribus. Segundo Labini (1984), o poder oligopsonístico no mercado dos fatores reforça o mesmo poder oligopolístico no mercado dos produtos. b)

Diferenciação no produto: na competição potencial, isto é, a competição

existente entre empresas estabelecidas e entrantes, a presença de diferenciação do produto pode implicar em barreira à entrada. A lealdade dos consumidores a marcas conhecidas faz com que novos produtos sejam vistos com desconfiança – as empresas precisariam apresentar preços mais baixos ou realizar grandes investimentos em publicidade para quebrar a barreira da fidelidade a um produto antigo e para estimular suas vendas. A barreira por diferenciação de produto é considerada uma das mais fortes dentre as barreiras à entrada na indústria. As firmas participantes conhecem as preferências dos consumidores e podem agir com relativa facilidade, no que tange propaganda e articulações de vendas, para aumentar sua influência. As firmas entrantes, por sua vez, precisam “deslocar preferências consolidadas pelas marcas das empresas estabelecidas” (HASENCLEVER; KUPFER, 2002). Na indústria de bens duráveis, a barreira por diferenciação é alta, pois o aprendizado do consumidor é dificultado pela baixa frequência em que o ato de compra é repetido. Uma maneira de contornar esta barreira é se a nova empresa é relacionada (subsidiária ou integrante de um mesmo conglomerado) a uma empresa estabelecida e tradicional de outro mercado. Neste caso, acontece uma transferência de credibilidade da empresa do mercado original para o novo empreendimento. Os consumidores, habituados com a marca, sentir-se-ão mais confiantes em comprar o novo produto.

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c)

Vantagens absolutas de custos: uma firma detém vantagens absolutas de

custo quando, a qualquer nível de produção, seu custo médio de longo prazo é menor. As vantagens de custos para as empresa estabelecidas surgem por diversos motivos. Um deles é a melhor condição de acesso a fatores de produção mais eficientes, baratos ou melhor localizados em relação à planta produtiva. Outro motivo para as assimetrias de custo é uma imperfeição nos mercados de fatores. O acesso ao capital é dificultado para as firmas entrantes, já que o nível de incerteza associado a elas é consideravelmente superior. Apesar de ser uma barreira estrutural à entrada, as vantagens absolutas de custo podem ser fortalecidas por medidas estratégicas, a exemplo da integração vertical visando maior poder no mercado de insumos. As barreiras à entrada apresentados até agora são considerados estruturais, pois advêm das características do mercado. Além destas, as empresas dominantes podem dispor de barreiras estratégicas a entrada de novas empresas no mercado. d)

Publicidade: investimentos em publicidade fortalecem o conceito de

produto diferenciado do ponto de vista de mercado. Por consequência, um produto distinto passa a ter certo poder de mercado, podendo ser comercializado a um preço superior que seus concorrentes. A publicidade distingue-se em dois tipos opostos quanto aos seus objetivos. Existe, por um lado, a publicidade informativa, que tem o objetivo de informar aos consumidores sobre a existência de um novo produto, locais de compra, etc. Por outro lado, há a publicidade de persuasão, a qual procura convencer o consumidor das qualidades de determinado produto. Empresas entrantes são obrigadas a incorrer em gastos elevados de publicidade informativa para atrair a atenção de potenciais compradores e contornar a preferência de consumidores por marcas conhecidas. As marcas estabelecidas, por sua vez, não necessitam recorrer a ações informativas, mas a publicidade de persuasão, com o intuito de reforçar a marca e as qualidades reconhecidas. A formação de uma marca forte age como um acúmulo de capital por parte das empresas existentes, o que constitui uma vantagem comparativa em relação a firmas potenciais.

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O efeito da publicidade no mercado varia de acordo com a quantidade de empresas existentes, a natureza do produto ofertado e a elasticidade de demanda do mesmo. A publicidade é menor em casos de bem de capital, pois os compradores são, de modo geral, menos influenciáveis e possuem maior conhecimento relativo ao produto. Em mercados de bens de consumo, a publicidade é mais intensa, mas também pode variar em casos de bens de consumo por experiência ou por pesquisa. No primeiro cenário, dado que os consumidores são obrigados a comprar o produto antes de testá-lo, a publicidade é mais acentuada. Os bens de consumo por pesquisa investem menos em publicidade, pois o consumidor poderá atestar a qualidade do produto antes mesmo de efetuar a compra. Produtos com alto grau de inovação tendem a ter maior intensidade de publicidade, em virtude da necessidade de informar aos consumidores as mudanças qualitativas sofridas pelo bem. e)

Pesquisa e desenvolvimento (P&D): um dos principais fatores de

crescimento da economia moderna é a realização progresso tecnológico, seja em benefício de um produto final de maior qualidade, seja em criação de um sistema produtivo mais eficiente. O processo de evolução não se dá de maneira uniforme em todos os setores, nem mesmo dentro de empresas de um mesmo setor, o que interfere na concorrência das empresas de um determinado mercado. Os diferentes ritmos de adoção de inovações pelas firmas acabam por gerar uma barreira à entrada estratégica em favor das companhias que realizam investimentos no setor de P&D. Segundo Schumpeter, as empresas que costumam recorrer mais frequentemente a pesquisas e inovações são as grandes firmas, que gozam de poder sobre o mercado, pois estas têm maiores incentivos ao progresso tecnológico. Além disso, empresas maiores apresentam mais fácil acesso a recursos de financiamento, maior capacidade de absorção de risco e encontram economias de escala associados às atividades de P&D.

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As empresas que realizam P&D são beneficiadas, ainda, pela existência de patentes. Uma empresa, cuja inovação foi patenteada, isto é, registrada para uso exclusivo, garante uma vantagem em relação aos concorrentes, que não têm acesso à nova tecnologia adotada. Às empresas concorrentes, cabe a procura por uma solução alternativa para enfrentar a melhora na qualidade do produto ou processo produtivo menos custoso decorrente das inovações incorporadas à linha de produção. f)

Fusões e aquisições (F&A): uma terceira forma de barreira à entrada

estratégica é a adoção de estratégias de fusão e aquisição por firmas estabelecidas. O principal motivador de uma fusão é a busca por expansão rápida, já que a capacidade produtiva da empresa pode ser rapidamente ampliada, enquanto uma estratégia de crescimento interno tem prazo maior para entrar em operação. Além disso, o aproveitamento de economias de escala torna a ação interessante, do ponto de vista estratégico. Outras vantagens extraídas das F&A dependem do tipo de incorporação executado. Manobras do tipo horizontal, na qual os participantes da fusão integram o mesmo mercado, sendo concorrentes diretos, proporcionam à nova empresa (no caso de fusão) ou à empresa incorporadora (aquisição) um aumento rápido de capacidade produtiva, e um importante crescimento no poder do mercado, causado pela diminuição do número de firmas concorrentes. Já na ocorrência de fusões verticais, isto é, junção de empresas que fazem parte da mesma cadeia produtiva, como, por exemplo, um fornecedor de matéria prima e uma indústria de transformação, a principal vantagem extraída é a redução de custo de produção pela internalização de fontes de matéria prima ou de modais de distribuição. Vale ressaltar que o poder de mercado da empresa também é aumentado, pois esta passa a ter maior controle dos fatores de produção, diminuindo custos e conseguindo uma vantagem que se reflete na margem de lucros. Mais uma vez, os altos investimentos necessários para a concretização de uma fusão tornam a operação proibitiva para empresas entrantes com acesso a

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capital dificultado. Por outro lado, empresas consolidadas em outros mercados dispõem de capital suficiente para a realização de uma fusão ou aquisição, tendo sua entrada a um novo mercado facilitada. Por ser objetivo principal deste trabalho, as características e motivações das fusões e aquisições serão investigadas com maior detalhamento no capítulo seguinte.

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3. FUSÕES E AQUISIÇÕES As operações de fusões e aquisições (F&A) são semelhantes quanto as suas características e intenções, sendo, por vezes, difícil distinguir uma da outra. Por esta razão, são tratadas de forma genérica como fusões. A definição clara dos conceitos de fusão e aquisição, porém, auxiliará na análise do caso proposto neste trabalho. Fusão é a união de duas ou mais firmas para formar outra empresa. A principal característica da fusão é que todos os envolvidos deixam de existir para assumir uma identidade conjunta. Do ponto de vista legal, as sociedades originais se extinguem. A “nova sociedade adquire personalidade jurídica e inicia sua atividade econômica a partir da data da fusão” (FABRETTI, 2005). O processo de fusão é consensual entre os gestores das empresas envolvidas, que devem aprovar a manobra sob o ponto de vista financeiro e/ou estratégico. Já as aquisições, ou incorporações, envolvem a compra de uma firma por outra, chamada incorporadora. A incorporadora passa a suceder a firma alvo da compra em todos os direitos e obrigações associados a ela. A empresa incorporada deixa de existir e seu patrimônio é adicionado ao capital da incorporadora. Uma aquisição pode ser feita de várias maneiras, através de compra de capital (se empresas de capital fechado) ou por meio do mercado aberto, com a compra de ações da companhia a ser adquirida.

3.1 CLASSIFICAÇÃO As operações de F&A podem ser classificadas de diversas maneiras, com destaque a classificação por tipo de atividade econômica praticada pelas empresas participantes. Considera-se o tipo de negócio e em que etapa do processo produtivo a empresa se encontra para classificar as fusões em horizontais, verticais ou conglomerados. a)

Fusão horizontal: as empresas que se fundem operam no mesmo tipo de

negócio, sendo competidoras uma da outra. A fusão, neste caso, geralmente busca uma redução de custos e um aumento da eficiência operacional através

26

da obtenção de economias de escala, além de concentração da participação das empresas no mercado. Normalmente, este aumento de concentração implica uma “subida do preço (...) e tem consequências negativas sobre o bem estar social” (CABRAL, 1994). Por esse motivo, as fusões dessa natureza costumam ser mais severamente reguladas pelos órgãos de defesa da concorrência porque reduzem a competição em uma dada indústria, podendo levar à criação de um monopólio. b)

Fusão vertical: caracteriza-se uma fusão vertical quando as empresas que

se unem estão em etapas diferentes do processo de operação, a exemplo de uma fusão entre uma indústria de transformação e um produtor rural fornecedor da matéria prima. O objetivo neste tipo de operação é a diminuição de custos de transação externos causados pela existência de um mercado imperfeito ou a realização de economias através de operações integradas, como planejamento de estoques e da produção, transporte, etc.. Uma dificuldade das fusões verticais, no entanto, é o aumento de problemas técnicos, financeiros e administrativos encarados pelas empresas. As F&A verticais podem ser backwards, quando uma firma se funde com o fornecedor de insumos produtivos (uma fábrica de móveis adquire uma madeireira, por exemplo), ou forward, adquire-se uma firma que participe do processo de pós-produção (a fábrica de móveis compra a empresa transportadora de seu produto final). Segundo Besanko et al. (2013), a decisão de realizar uma integração vertical é resumida pelo termo make-or-buy (fazer ou comprar). As firmas podem escolher “fazer” a própria matéria-prima ou dominar as formas de venda e distribuição, caracterizando com isso uma integração vertical; ou “comprar” fatores no mercado aberto, enfrentando as mesmas condições de mercado de seus concorrentes. c)

Conglomerados: ocorre quando as empresas que se fundem operam em

negócios distintos. Um conglomerado pode ser entendido como uma empresa que controla um leque de atividades em diversos negócios que requerem

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habilidades

administrativas

diferentes

e

que

realiza

um

processo

de

diversificação basicamente através de aquisições e fusões. Os conglomerados podem ser financeiros ou administrativos. Um conglomerado financeiro é aquele que financia as demais empresas, controlando-as e assumindo os riscos financeiros das diversas atividades. Este tipo de conglomerado conduz geralmente a uma melhor alocação de recursos financeiros dentro da empresa, diminuindo riscos de falência. Já o conglomerado administrativo incorpora as características do conglomerado financeiro, acrescendo a elas o fornecimento de serviços e experiência administrativos, conduzindo, dessa forma, as decisões operacionais das demais empresas. As fusões de conglomerados podem ser divididas nos três tipos característicos: de extensão de produto, ocorrem quando as linhas de produtos das empresas possuem certa relação entre si; de extensão geográfica, envolve empresas cujas operações são conduzidas em mercados com localização geográfica diferente, como por exemplo, uma empresa atua somente no mercado interno e a outra somente no mercado externo; e o conglomerado puro, que são fusões envolvendo empresas que atuam em negócios não relacionados. Relativamente à nacionalidade de origem das empresas envolvidas, as fusões podem ser classificadas em domésticas, quando envolve empresas de um mesmo país; ou uma fusão cross-border, quando ao menos uma das firmas tem sede internacional. Uma terceira classificação possível varia de acordo com o tipo de tratamento gerencial praticado após a junção. A fusão pode ser financeira, o que representa uma forma de diversificação de risco e busca por investimentos mais rentáveis. O segundo tipo são as fusões estratégicas, normalmente observadas quando as empresas atuam em mercados relacionados. A ocorrência das fusões estratégicas tem como objetivo maior o aproveitamento de sinergias produtivas, como compartilhamento de know-how.

28

3.2 MOTIVAÇÃO Os processos de fusão e aquisição são, de modo geral, caros e trabalhosos. Entretanto, existe uma compensação dessas dificuldades por meio da existência de sinergias capazes de melhorar a produtividade das empresas participantes. A análise da motivação das F&A será feita de forma separada. 3.2.1 RAZÕES DA FIRMA ADQUIRENTE Muitos fatores podem motivar a aquisição ou integração de uma empresa, variando de acordo com os objetivos da firma compradora. Alguns desses motivos já foram citados, com maior ou menor detalhamento, mas vale a pena reforça-los: a)

Economias de escala: citada anteriormente, as vantagens de economia de

escala são os ganhos mais aparentes de uma fusão. As economias de escala podem surgir por conta da maior especialização das unidades produtivas, causando uma redução no custo médio de produção. Outro fator positivo é que as fusões permitem uma reorganização da operação das empresas unidas para uma produção em escala eficiente, que responda melhor às demandas do mercado.

b)

Aumento do poder de mercado: fusões serão especialmente rentáveis

quando resultarem em aumento do poder de mercado (GEORGE; JOLL, 1983). A concentração de poder sob uma grande empresa a coloca em posição confortável de liderança e cria a possibilidade de distorções no mercado. Nesse cenário, os riscos de queda no bem estar social são grandes, especialmente do ponto de vista do consumidor, que tem seu excedente prejudicado. As fusões também podem agir para o fortalecimento de barreiras de mercado, de forma a reduzir as chances de competitividade das outras empresas concorrentes ou entrantes.

c)

Complementariedade: ao avaliar uma empresa alvo, a decisão da firma

incorporadora considera os benefícios conquistados ao fim do processo de compra. Um deles é o benefício da complementariedade, alcançado pela

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aquisição de uma empresa que possui alguma competência complementar a da firma adquirente. Há uma melhoria cruzada, na qual a empresa resultante de uma fusão é mais forte e completa que aquelas que a originaram. Apesar de as vantagens de complementariedade poderem ser alcançadas por crescimento interno, as operações de fusão representam uma maneira mais rápida e segura de conquistá-las. Além disso, com crescimento interno, as empresas podem esbarrar com a escassez de recursos técnicos que a impeçam de efetuar melhorias em seu processo produtivo.

d)

Superação de barreiras à entrada: vista especialmente em fusões

diversificadoras, isto é, nos casos em que a empresa não atua no mercado alvo, as barreiras à entrada de novas empresas podem ser rompidas por meio de uma fusão. A firma incorporadora, atuante em um mercado diverso, ao adquirir uma firma estabelecida, passa a dispor de uma fatia do mercado previamente ocupada (KUPFER, 2002), sob a qual as empresas estabelecidas possuem pouco ou nenhum controle. Dado que a capacidade total da indústria não é afetada, fatores como preço e quantidade, instrumentos importantes na manipulação do mercado por firmas estabelecidas, permanecem os mesmos e não podem ser usados como ferramentas de bloqueio a empresas entrantes.

e)

Redução de reações negativas a entrada em novos mercados

internacionais: um mercado em oligopólio é legitimado pela preferência dos consumidores, que rejeitam novos produtos, em sua maioria desconhecidos. Além disso, investimentos em mercados externos constituem uma manobra delicada de crescimento, pois envolvem uma gama de conhecimentos específicos de mercado local, um empecilho para algumas das novas empresas. Como forma de contornar esses dois problemas, as empresas potenciais podem decidir entrar em um novo mercado através de uma já existente, que reúna as vantagens de ser conhecida do público e possua o know-how de como interagir no mercado alvo da fusão.

30

3.2.2 RAZÕES DA FIRMA ADQUIRIDA A explicação de uma fusão do ponto de vista da firma a ser incorporada apoia-se muito menos em busca de melhorias operacionais e muito mais na necessidade do repasse do controle da empresa como forma de impedir prejuízos exagerados. Um grande número de empresas postas a venda sofre com a falta de competitividade e lucratividade – os riscos de falência são altos. A dificuldade em reparar o desempenho perdido, seja por falta de conhecimento ou de recursos financeiros, motiva a oferta da empresa no mercado. Em situações como essa, a firma adquirente deve ter condições de suportar as perdas e estruturar um plano de ação para reverter a ineficiência da empresa adquirida. A venda de uma firma também pode ser motivada por dificuldades gerenciais relativas ao “tamanho péssimo”. As empresas em crescimento encaram etapas críticas, nas quais existem desvantagens técnicas advindas do pequeno porte, ao mesmo tempo em que a estrutura administrativa está defasada em relação ao tamanho grande da empresa. A superação deste estágio requer uma grande “reorganização administrativa e financeira para que se possa ter uma base mais sólida e um crescimento mais sustentável” (GEORGE; JOLL, 1983) Por vezes, a maneira mais fácil de conquistar isso é através da venda da empresa.

3.3 REGULAÇÃO ANTITRUSTE Do ponto de vista social, um mercado em concorrência perfeita é o ideal, pois nem consumidores nem vendedores obtêm lucros extraordinários em detrimento da diminuição do bem estar das demais partes. Entretanto, em uma economia de livre mercado, os agentes estão livres para efetuar ações que desequilibrem o bem estar geral em favor próprio. Como exemplos de condutas anticompetitivas, podem ser numerados os cartéis, fixação de preços de revenda, restrições territoriais, acordos de exclusividade, boicote a negociações, discriminação de preços e vendas casadas. Atitudes como essas prejudicam o estado concorrencial do mercado e uma parcela dos agentes passa a ter lucros econômicos.

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Em defesa da concorrência, faz-se necessário o estado criar medidas restritivas a práticas dessa natureza, isto é, que prejudiquem a igualdade de condições do mercado. Neste âmbito, as leis antitruste (leis de defesa da concorrência) procuram garantir o estabelecimento de um ambiente concorrencial, por meio de promoção de competitividade e eficiência de mercado. A ação dos órgãos de defesa da concorrência dá-se, em geral, de duas maneiras. A primeira delas é a ação punitiva, na qual condutas identificadas como danosas são punidas. Um exemplo deste tipo de postura são as multas e sanções aplicadas a empresas que praticam conluio, comportamento que faz com que as empresas atuem como monopolistas e estabeleçam o preço de mercado superior ao normal. A segunda forma de atuação das leis antitruste tem caráter preventivo contra o surgimento de estruturas de mercado altamente concentradas, que aumentam a probabilidade do uso abusivo de poder. Logo, é realizado o controle preventivo sobre os chamados

atos

de

concentração

(fusões,

aquisições,

joint

ventures,

etc.)

(HASENCLEVER; KUPFER, 2002). É importante destacar que as leis antitruste não tem a intenção de favorecer uma empresa ou agente específico do mercado. O alvo beneficiário dessas políticas é puramente o mercado, mais especificamente, o ambiente concorrencial. A proteção ao processo competitivo gera resultados positivos para toda a sociedade, fruto da maximização do bem estar social obtido pela interação entre vendedores e compradores. A defesa da concorrência “trata-se de um interesse difuso, de quem é titular um grupo indeterminável de pessoas” (HASENCLEVER; KUPFER, 2002). Por outro lado, também cabe aos órgãos julgar se ações, em primeiro momento anticompetitivas podem gerar ganhos de eficiência para o mercado que superam os efeitos negativos. É o caso, por exemplo, de uma fusão vertical, em que, ao mesmo tempo em que há um aumento do poder de mercado concentrado em uma firma, reduz os custos de transação significativamente. Dessa forma, a decisão de aprovação de uma atitude de concentração deve pesar os danos ao mercado em oposição aos

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ganhos de eficiência da estratégia e definir qual delas se sobrepõe. Alguns fatores considerados na análise de aprovação de uma manobra de concentração são detalhados a seguir: a)

Mercado relevante: fator primordial na análise antitruste, já que é em

relação a ele que serão calculados os indicadores de concentração e outras características importantes para a definição de poder de mercado. O “mercado relevante é definido como um locus (produto/região) em que o poder de mercado possa ser exercido” (HASENCLEVER e KUPFER, 2002). A delimitação de mercado relevante é um conceito fluido, variando em termos de área geográfica, elasticidade-preço da demanda, substituibilidade do produto, entre outros.

b)

Poder de mercado: estratégias de ampliação de poder de mercado são

fortemente reguladas. O critério de participação da empresa no mercado (market share) é uma forma básica estima-lo, juntamente com a medida de indicadores de concentração, dentre os quais o índice Herfindahl-Hirschman (HH) é o mais utilizado. Uma última condição de avaliação do poder de mercado é a mensuração das barreiras à entrada de novas firmas, tópico já discutido neste trabalho.

c)

Eficiências: como mencionado, os atos de concentração podem gerar

externalidades positivas para o mercado como um todo. A análise desta característica é decisiva para a aprovação de uma atitude antitruste, já que, se as ineficiências combatidas pela legislação não existem ou são superadas por ganhos generalizados. Algumas condições básicas interferem na análise de eficiência, podendo ser citadas a eficiência diretamente decorrente do ato restritivo julgado e a comprovação de que tais benefícios não seriam conquistados de outra maneira. Como resumido por Hasenclever e Kupfer (2002): Toda e qualquer análise antitruste de ato ou conduta em que se suponha existir algum efeito anticompetitivo real ou potencial encolce, como último passo

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conclusivo, a avaliação dos efeitos líquidos em termos de eficiência do ato ou conduta examinado

3.4 O CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE Um processo de F&A deve estar de acordo com a legislação antitruste que proíbe a união de duas empresas, cujo resultado seja uma drástica redução da concorrência ou a criação de um monopólio. No Brasil, a defesa da livre concorrência é responsabilidade do CADE, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça. Criado em 1962, quando o país ainda era regido por um regime parlamentarista, por quase três décadas o órgão teve ação limitada, em consequência do estrito controle governamental exercido sobre a economia no período. Apenas na década de 1990, quando aconteceu a reestruturação da economia, voltada para o liberalismo econômico e o comércio internacional, o CADE tornou-se uma instituição forte para tomada de decisões relevantes em defesa do bem estar econômico. Foi nesse período que a Lei nº 8.884/94, que ampliava os poderes e delineava a atuação da instituição, foi homologada. Desde então, o CADE é o responsável por orientar, fiscalizar, apurar e reprimir o abuso do poder econômico no Brasil quando este se verifica. (FABRETTI, 2005). Atualmente, a Lei nº 12.529, de 30 de novembro 2011, em substituição à Lei 8.884/94, estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, formado pelo CADE e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. A Lei delimita as atribuições do conselho em termos de julgamentos de atos de concentração e sanções aplicadas

aos

infratores.

Especificamente

sobre

operações

de

aumento

de

concentração (fusões, aquisições, joint ventures), a lei estabelece: Art. 88 – Serão submetidas ao CADE (...) os atos de concentração econômica em que, cumulativamente:

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I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual (...) equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00; e II – pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual (...) equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00

O CADE reconhece ainda que uma firma será dominante no mercado se sua market share for igual ou superior a 20% do total das vendas no mercado relevante, deixando abertura para que este percentual seja modificado em caso de mercados com características muito particulares. Atos de concentração envolvendo firmas dominantes também são objeto de análise da Autarquia. No julgamento do pedido de aprovação do ato de concentração econômica, o tribunal do CADE poderá aprovar a manobra integralmente, rejeitá-la ou aprova-la parcialmente, situação na qual são determinadas restrições à operação da nova firma, como, por exemplo, a venda de ativos que constituam uma atividade empresarial, a alienação do controle societário, o licenciamento de direitos de propriedade intelectual e outras providências necessárias para a eliminação dos efeitos nocivos à ordem econômica.

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4. SETOR AÉREO BRASILEIRO O setor de aviação civil brasileiro sofreu inúmeras mudanças desde 1927, ano em que ocorreu o primeiro voo comercial no país. Desde então, o mercado apresenta crescimento sólido e ganhou destaque na economia nacional. Inicialmente, o setor era operado por muitas empresas, geralmente de pequeno e médio porte, e muitas rotas por todo o território nacional. Mais tarde, ocorreu a redução do número de empresas atuantes, permanecendo apenas aquelas melhores posicionadas nacionalmente. O mercado tornou-se cada vez mais concentrado, até que o crescimento da demanda no início dos anos 2000 deu condições a entrada de algumas companhias, sendo a Gol Linhas Aéreas um dos principais exemplos de entrada bem sucedida em um mercado relativamente fechado. Com uma filosofia de menores custos, a empresa encontrou a demanda por voos aquecida por conta do aumento do poder aquisitivo da população brasileira. O sucesso da GOL inspirou outras firmas com a mesma filosofia a entrarem no mercado para disputar a demanda cada vez maior. O transporte aéreo brasileiro subdivide-se em transporte de passageiros, de cargas e de mala postal. A maior parte da receita das empresas de aviação advém do transporte de passageiros, que respondeu por mais de 86,3% de todo o ganho em 2013. Nos últimos anos, o mercado brasileiro de aviação civil apresentou crescimento contínuo, influenciado por diversas variáveis que afetaram diretamente a demanda do setor, entre elas estão o aumento da renda real da população brasileira, o câmbio estável e o aumento da oferta de crédito. Segundo dados informados pela ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil – em 2013, foram transportados no Brasil um total de 92,8 milhões de passageiros, dos quais 94% são referentes a voos domésticos. As receitas agregadas superaram os 28 milhões de reais, um crescimento de 12,9% em relação ao ano anterior.

36

Receita em milhões de R$ 28.400,40 25.162,50 22.457,90 18.918,80 16.934,20

2009

2010

2011

2012

2013 Fonte: Marketline

Gráfico 1 - Receita agregada do setor ao longo dos anos

A oferta por voos acompanhou o movimento positivo. Em apenas 10 anos, entre 2003 e 2013, a oferta por acentos cresceu 167,4% para linhas domésticas, com destaque para as companhias TAM e GOL, que detêm aproximadamente 80% de todas as vagas ofertadas. No mesmo período, o contingente de passageiros apresentou crescimento de 148,3%. A taxa de ocupação dos voos, entretanto, se manteve estável em torno de 70%. A participação de cada empresa no transporte de passageiros em voo domésticos pode ser vista no gráfico a seguir: Participação no transporte de passageiros - 2013 (Voos nacionais) 7% 7% 35% 15%

36% Tam

Gol

Azul

Avianca

Outras Fonte: IBGE

Gráfico 2 – Market share do setor aéreo

37

O maior peso dos custos da indústria de aviação civil tem natureza fixa. Os custos operacionais são muito elevados, por conta principalmente do arrendamento e manutenção de aeronaves, combustíveis e encargos com pessoal. A principal despesa do setor é com combustível, com participação de 32,4% no total de gastos. O preço deste insumo, majoritariamente importado, é sujeito a modificações na cotação do dólar em relação ao real e ao preço do petróleo no mercado internacional. Aumentos no preço do combustível são refletidos na elevação das tarifas aéreas. Ainda assim, na última década, o valor pago pelas passagens caiu consideravelmente. Ao fim de 2013, a tarifa média era de R$ 351,36, 47% inferior aos R$ 655,76 cobrados na metade de 2008. Os motivos para a queda de preços podem ser atribuídos ao aumento da competitividade, mesmo que vagaroso, e a mudança do perfil de companhias aéreas, notadamente as companhias Low Cost (do inglês, baixo custo, estas são empresas que oferecem tarifas mais baixas em consequência de um serviço mais simplificado, básico). Um fator de rigidez dos preços das passagens são os altos encargos cobrados – cerca de 35% do valor total da passagem é imposto. A demanda de passageiros do setor de aviação civil é determinada por uma série de fatores, tais como: renda real da população, preço da passagem, possibilidade de parcelamento, entre outros fatores. A sazonalidade, uma importante característica da demanda, implica que a procura por passagens não apresenta comportamento uniforme ao longo do ano, sendo maior no segundo semestre do ano, em meses de férias escolares, e durante o verão no hemisfério norte, para o caso de viagens internacionais. A principal forma de compra de passagens aéreas é diretamente com a companhia aérea, através de sites on line ou pontos de venda nos aeroportos. Os consumidores são, de modo geral, indiferentes às variações de produtos, com as companhias aéreas de baixo custo competindo diretamente com as tradicionais. A elasticidade de preços é bastante alta, o quer dizer que a decisão dos consumidores depende pesadamente dos preços ofertados. Os custos de mudança de uma companhia para outra são mínimos, o que delega maior poder de negociação aos consumidores. Para combater a volatilidade dos compradores, as empresas adotam um sistema de fidelidade, para que os clientes

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priorizem a compra de passagens com apenas uma companhia em troca de prêmios, como passagens aéreas gratuitas ou serviços diferenciados. As barreiras à entrada no setor aéreo brasileiro são relativamente altas. Uma firma potencial precisa, inicialmente, de um grande aporte de recursos necessários à obtenção de aeronaves, uma dificuldade que não existe para empresas estabelecidas procurando a ampliação do mercado, cuja frota pode ser realocada de maneira mais atrativa. Os canais de vendas também são complicados, dado que novos players devem investir pesadamente no estabelecimento um canal de vendas on line, além de relacionamentos com agências de viagem e outros intermediários. Ademais, é mandatória a aquisição de slots para pouso e decolagem nos aeroportos. Empresas estabelecidas detém o monopólio sobre os slots, caracterizando uma restrição a operação de uma nova concorrente. A escala ideal do mercado igualmente dificulta a entrada de novas firmas, que precisam ser relativamente grandes para obter lucros. A expansão, contudo, não é necessariamente realizada por aumento de frota. Uma opção para o crescimento rápido de oferta de trechos é a participação em alianças ou compartilhamento de voos (code sharing) de companhias operantes em diferentes mercados, proporcionando uma complementação dos serviços de transporte. A regulamentação do mercado forma uma última barreira a entrantes. A adequação às regras impostas pela ANAC, o órgão responsável pelo registro, segurança e infraestrutura de aeroportos, representa um custo elevado para as firmas potenciais. Segundo pesquisas da Marketline, a força dos fatores que influenciam a entrada de novas firmas no mercado pode ser exprimida pelo gráfico, sendo a gradação 0 aquela que representa maior força impeditiva à entrada de novas firmas, e 5 o elemento que facilita o acesso de concorrentes potenciais:

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Fatores que influenciam a entrada de novas firmas Distribuição de mercado 5 Acesso a fornecedores

4 3

Consentimento das firmas estabelecidas

2 1 Importância da escala ótima

0

Crescimento do mercado

Regulamentação

Custos fixos

Baixo custo de mudança

Fonte: Marketline

Gráfico 3 – Força das barreira à entrada

Relativamente à infraestrutura, o Brasil apresenta uma séria defasagem. Os aeroportos são, de modo geral, antigos e pequenos para o nível de uso atual. Frente a grande demanda, os investimentos em modernização e adequação dos aeroportos ganham caráter emergencial. Existem no país 720 aeródromos públicos, dos quais 61 são administrados pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero). A região Sudeste do país é a que concentra o maior número de aeroportos administrados pela Infraero, com total de 18 aeroportos. Em seguida aparecem as regiões Norte e Nordeste, ambas com 15 aeroportos, Sul, com 12, e Cento-Oeste, com 7 aeroportos administrado pela Infraero. Recentemente, foi iniciado um movimento de privatização de grandes aeroportos nacionais, incluindo o aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, o mais importante do país. O objetivo da operação é a disponibilização imediata de recursos necessários a melhorias dos serviços oferecidos nos aeroportos. Contudo, o efeito da transferência para o setor privado ainda não pôde ser sentido ou mensurado.

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As perspectivas para os próximos anos são de crescimento do setor, impulsionado

pelo

crescimento

da

demanda

de

passageiros

(domésticos

e

internacionais), e pelo aquecimento do setor de turismo. Estimativas apontam um aumento de 27,5% no volume de passageiros transportados até o ano de 2018, o que representa um crescimento anual de 5%. Em temos financeiros, a indústria é estimada a movimentar aproximadamente 46.242 milhões de reais até o ano 2018, um aumento anual de 10,2% e acumulado de 62,8% no período.

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5. AS EMPRESAS 5.1 TAM LINHAS AÉREAS S.A. Surgida na década de 1960 como Táxi Aéreo Marília, no interior de São Paulo, a companhia foi formada pela associação de dez pilotos. Na época, o foco da empresa era o transporte de carga e passageiros usando aviões monomotores, cumprindo os trechos entre os estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso. Dez anos após sua fundação, o comandante Rolim Amaro, figura chave para o crescimento da companhia, juntou-se à empresa, inicialmente como sócio minoritário e, um ano depois, como majoritário após a compra de metade das cotas societárias. O crescimento da empresa acompanhou o desenvolvimento do mercado aéreo brasileiro. Em 1986, a TAM realizou a aquisição de outra companhia aérea, a Votec, estratégia que permitiu a rápida instalação da empresa nas regiões Centro-Oeste e Norte do país. Na década seguinte, a companhia começou a operar em todo o território nacional, e, logo em seguida, devido à compra da empresa aérea paraguaia Lapsa, realizar voos internacionais em trechos da América Latina. As décadas seguintes foram marcadas por crescimento estável e aumento da notoriedade da empresa no cenário da aviação nacional e internacional. Alcançando lucros recordes, a TAM adotou uma estratégia de aumento da participação no mercado pela maior oferta de voos e roteiros até então indisponíveis. Para aumentar ainda mais sua malha aérea, a empresa recorre a acordos de compartilhamento de trechos e aeronaves com outras companhias aéreas, o chamado code sharing. Entre os anos de 2010 e 2011, período anterior à concretização da fusão objeto deste estudo, a TAM operava trechos com destino a 45 cidades brasileiras e servia a 89 cidades no total, através de alianças comerciais. À época, além do Brasil, a TAM atuava no Paraguai e nas Ilhas Cayman e contava com uma frota de 132 aeronaves, formada em sua maioria por modelos de médio porte, como o Airbus A330 e o Boeing B767. Em 2011, a companhia, sediada em São Paulo, empregava pouco mais 24 mil pessoas.

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A companhia também conta com uma estratégia de diversificação de operações. Existe um braço da firma dedicado ao transporte de cargas, a TAM Cargo, que utiliza o espaço extra das aeronaves para o transporte de encomendas e cargas. Há ainda a TAM Viagens, uma agência de viagem e turismo que oferta soluções completas para viagens, desde passagens de avião, hotéis e serviços de guia. Na aviação brasileira, desde 2004, a TAM ocupa a posição de liderança entre as companhias, seguida de perto pela Varig. Com declínio e eventual saída da Varig do mercado, a parcela da demanda deixada foi absorvida pela própria TAM e pelo novo player, a Gol. Apesar de consolidada, nota-se a posição de liderança sendo ameaçada pela aproximação gradativa da Gol. Market share histórico - principais players do mercado brasileiro Tam

49%

40%

2007

Gol

50%

46%

42%

2008

44%

40%

41%

2009

37%

35%

2010

2011 Fonte: ANAC

Gráfico 4 - Concorrência TAM e Gol entre 2007 e 2011

Os anos anteriores à fusão foram marcados pelo movimento irregular dos indicadores de lucratividade da TAM, movimento que pode ser atribuído a fatores externos, como variações cambiais, aumento no preço dos combustíveis e crises internacionais; ou internos, como compra de aeronaves e estratégia falha em operações de hedge. No período que compreende os anos de 2007 a 2011, a empresa chegou a registrar prejuízo de R$ 1,36 bilhão para, no período seguinte, obter lucro de R$ 1,22 bilhão de reais.

43

Lucro líquido – TAM (em milhões de reais) 2007

2008

2009

2010

2011

128,8

-1.360,0

1.229

637,4

-335,1

5.2 LAN Linhas Aéreas S.A. Criada em 1929, a empresa foi fundada pelo comandante das Forças Aéreas Chilena, Arturo Benitez. Sua primeira razão social era Línea Aeropostal Santiago-Arica, modificada para Linha Aérea Nacional do Chile em 1932, apenas três anos após o início de suas operações. Na década de 40, a companhia realizou seu primeiro voo internacional entre Santiago, no Chile e Buenos Aires, na Argentina. Durante muito tempo seus destinos internacionais foram restritos às Américas - somente em 1970 a companhia passou a voar para países europeus. Após operar durante 60 anos como empresa estatal, em 1989, o Governo do Chile vendeu 51% de seu capital acionário a investidores nacionais e à Scandinavian Airlines System (SAS), começando assim seu processo de privatização. O processo foi finalizado em 1994, quando o restante das ações, incluindo aquelas sob posse do estado, foram compradas pelos controladores da companhia. Com a totalidade de seu capital de origem privada, a LAN deu início a uma importante fase de expansão e internacionalização. Estratégias de aquisições internacionais fizeram com que a empresa apresentasse rápido crescimento na América Latina. Adicionalmente, o nome da companhia foi modificado para LAN Linhas Aéreas S.A., com intuito de desassociar a empresa a um único país e refletir suas operações por todo o continente. Sob seu controle, estão as subsidiárias LAN Airlines, LAN Express, LAN Peru, LAN Ecuador, LAN Argentina, LAN Cargo, LAN Dominicana, entre outras. Atualmente, a empresa LAN Airlines S.A. e filiais operam 118 aviões de passageiros, enquanto a LAN Cargo possui 13 aeronaves de carga. A companhia voa

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para 76 destinos diferentes, em uma frota formada, em sua maioria, por aeronaves Airbus A320 e Boeing 767. Desde 2000, a companhia faz parte da aliança global OneWorld, terceira maior aliança de linhas aéreas do mundo. Esta característica, juntamente com acordos de code sharing, permitiu a oferta de voos para 93 destinos adicionais, uma maneira de melhorar os serviços prestados com custos relativamente baixos. Especificamente no Chile, a LAN detém uma grande parcela do mercado interno. A soma das atividades LAN Linhas Aéreas e LAN Express (empresa centrada apenas a voos domésticos) superou 75% de todo o mercado, em 2011. A Sky Airline, principal concorrente da LAN em seu mercado doméstico responde apenas por 20% do número de passageiros voados. Logo, vê-se que a empresa ocupa uma posição muito forte dentro do cenário chileno, sem ser ameaçada por concorrentes diretos e com poder de mercado suficiente para liderar mudanças de preço que possam gerar barreiras à entrada de novos concorrentes.

Market share histórico - principais players do mercado chileno Lan 80% 74,4%

17,6%

2007

76%

76%

19%

20%

19%

2009

2010

75%

15%

2008

Sky

2011 Fonte: JAC

Gráfico 5 – Concorrência entre LAN e Sky entre 2007 e 2011

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Financeiramente, a empresa manteve-se em lucro no período anterior à fusão. Os valores giram entre 200 milhões de dólares, em 2009, fruto de retração da atividade aérea devido a desastres naturais (mais especificamente, atividades vulcânicas no Chile afetaram o transporte aéreo de toda América Latina); e 420 milhões, valor alcançado em 2010. Lucro líquido – LAN (em milhões de dólares) 2007

2008

2009

2010

2011

308,3

335,7

231,1

419,7

320,2

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6. LATAM AIRLINES S.A. 6.1 A FUSÃO Em agosto de 2010, por meio de um memorando de intenções, as empresas LAN e TAM anunciaram o desejo de se unir, para formar um dos maiores conglomerados aéreos em atuação no mundo. Por se tratar de grandes companhias aéreas, participantes de um setor fortemente regulado, a fusão precisava submeter-se à aprovação de diversos órgãos regulatórios, antes de ser efetivamente concretizada. Além disso, as duas empresas envolvidas, que possuíam operações no mercado aberto, dependiam da aprovação dos acionistas para que a integração pudesse acontecer. Após a declaração de intenções da fusão, o processo precisou ser submetido ao julgamento de órgãos regulatórios brasileiros e chilenos, para assegurar que a manobra não impactaria negativamente no cenário concorrencial do mercado. O período de análise estendeu-se por pouco mais de um ano, tempo para que os processos e apelos fossem registrados e julgados. As decisões de aprovação da fusão pela ANAC (Agência Nacional de Aviação) e pelo TDLC (Tribunal de Defesa da Livre Concorrência, em espanhol) aconteceram em março e setembro de 2011, respectivamente. Da parte do órgão chileno, algumas restrições ao negócio foram impostas. Em 14 de dezembro de 2011, foi a vez de o CADE aprovar, também com restrições, a integração. Uma vez consentida a fusão, foi dado início ao processo de troca de controle das empresas. Para isso, foram criadas duas empresas intermediárias – a Holdco 1 e a TEP Chile – para viabilizar a distribuição das ações ordinárias e preferenciais da TAM Linhas Aéreas. Na primeira etapa da fusão, foi constituída a Holdco 1, que adquiriu 100% das ações ordinárias da TAM. O restante das ações, as preferenciais, foram repassadas integralmente a LAN, que viria a ser posteriormente intitulada LATAM. Já o controle acionário da Holdco 1foi distribuído entre a LAN, dona de 100% das ações preferenciais e 20% das ações ordinárias desta empresa, e a TEP Chile, uma empresa constituída e controlada pela família Amaro, principal acionista da TAM, e que, atualmente, detém 80% das ações ordinárias da Holdco 1.

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A troca de ações aconteceu no mercado aberto, onde a companhia brasileira era negociada. A LATAM Airlines Group S.A., sediada no Chile, passou a atuar como uma holding ao assumir o controle das empresas por meio da compra de ações de ambas (TAM e Holdco 1), em um processo amigável de permuta de ações. Pelo acordo, a TAM deveria realizar uma oferta pública para comprar as ações em circulação da companhia, que deixariam de ser negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Os acionistas da TAM receberam ações da empresa holding, a proporção de 0,9 ação da LATAM por papel trocado. Ao final do processo, a TAM deixaria de ter títulos negociados nas bolsas brasileira e nova-iorquina, enquanto a LATAM passaria a figurar nas bolsas do Brasil, Chile e de Nova York. Para ser bem sucedida, a operação dependeu da adesão de acionistas que deveriam representar, no mínimo, 95% do capital total da TAM. O organograma simplificado da operação encontra-se abaixo:

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A integração da LAN e da TAM, por meio da nova holding constituiu um novo conglomerado de empresas aéreas com atuação no transporte de passageiros e de cargas. O conglomerado é composto por LAN Airlines S.A. e suas filiais no Peru, Argentina, Colômbia e Equador, além da LAN Cargo e suas filiais; e pela TAM S.A. e suas filiais TAM Linhas Aéreas S.A. incluindo suas unidades de negócios, TAM Transportes Aéreos Del Mercosur S.A. - TAM Airlines (Paraguai), TAM Viagens e Multiplus S.A., que passam a oferecer mais serviços aos passageiros e clientes de carga na região e dela para o resto do mundo, oferecendo conectividade para mais destinos que outros grupos de companhias aéreas na América do Sul. A respeito do processo de fusão, o instrumento societário de 22 de junho de 2012, que concretiza a negociação, versa: Produto da Fusão, os acionistas das Sociedades Absorvidas devem receber 0,9 ações da LAN por cada ação das Sociedades Absorvidas (“Relação de Troca”) de que sejam titulares na data de materialização da Fusão. De forma adicional, informa que na assembleia extraordinária de acionistas da LAN foi acordada a alteração da denominação da Sociedade para “LATAM Airlines GroupS.A.”, sem prejuízo de que, além disso, a Sociedade poderá usar indistintamente os nomes de fantasia “LATAM Airlines”, “LATAM Airlines Group”, “LATAM Group”, “LAN Airlines”, “LAN Group” e/ou “LAN”; alteração que será efetivada com a materialização da Fusão. (Sessão extraordinária do Conselho de Administração, LAN Airlines)

Assim, ao fim do processo descrito acima, nasceu a LATAM, uma empresa com valor estimado de 14,5 bilhões de dólares. Seu capital foi distribuído da seguinte maneira: a família Cueto,a controladora da LAN, e demais acionistas, tornaram-se proprietária de 70,6% da nova empresa; a família Amaro, da TAM, e demais acionistas receberam os restantes 29,4%. Portando os títulos de maior empresa aérea da América Latina, segunda maior da América como um todo, e quarta maior companhia mundial do setor, a empresa surgiu com o objetivo de, unindo forças, conseguir maiores vantagens

operacionais

e

estratégicas,

tais

quais

redução

nos

custos,

compartilhamento de voos e fortalecimento da marca. A formação do grande conglomerado está em sincronia com o que previu a Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), que declarou que, dentro de quatro décadas, existirão no mundo apenas 10 a 12 grupos no setor aéreo mundial.

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Imagem 1 - Marca provisória da LATAM em utilização desde a fusão

A expansão das operações da empresa aumentou o itinerário e as opções de voos oferecidos pelas companhias. A nova empresa tem potencial para o transporte de 60,3 milhões de passageiros ao ano, levando-os para aproximadamente 150 destinos localizados em 22 países. O transporte de passageiros e cargas é realizado por 310 aeronaves. A união das operações de carga, realizadas pela LAN Cargo, maior operadora de volumes da América Latina, e a TAM Cargo, dedicada a transporte de encomendas expressas e cargas especiais, reduz consideravelmente os custos de transporte, ao mesmo tempo em que melhora a malha cargueira da LATAM. A capacidade total de carga é ampliada ao serem combinadas as capacidades de ambas as companhias, tanto em aviões de passageiros quanto de volume. Atualmente, a empresa conta com 14 aviões cargueiros, possibilidade de transporte de 1,1 milhão de toneladas para 169 destinos diferentes. Em termos de mão de obra, a fusão não acarretou desligamentos de pessoal. Isso se deu em razão do alto grau de complementariedade das operações das duas companhias originadoras. Apenas no aeroporto de Guarulhos, onde as duas empresas atuam, era passível a uma redução de quadro, no entanto isto não ocorreu devido ao aumento das operações no terminal. O grupo LATAM conta atualmente com 51,6 mil empregados em seu quadro. O relatório publicado pela companhia antecipa sinergias entre US$ 600 milhões e US$ 700 milhões anuais, previstos para ocorrer em até quatro anos após a

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concretização da fusão, ou seja, 2016. Os ganhos por sinergia e seus valores são enumerados abaixo: 

Crescimento das receitas resultantes da combinação das malhas aéreas de LAN e TAM e da adição de novos voos – ente US$225 milhões e US$260 milhões;



Incremento de receitas resultantes do transporte de cargas – entre US$120 milhões e US$ 125 milhões;



Consolidação de programas de passageiros frequentes – entre US$ 15 milhões e US$ 25 milhões;



Redução de custos relacionados à coordenação em aeroportos e compras de fatores produtivos – entre US$ 100 milhões e US$ 135 milhões;



Diminuição de custos resultante da coordenação e do aumento de eficiência das operações de manutenção de aeronaves – entre US$ 20 milhões e US$ 25 milhões;



Redução de custos resultante da convergência de sistemas de tecnologia da informação de TAM e LAN, do aumento de eficiência dos processos combinados de vendas e distribuição – entre US$ 120 milhões e US$ 130 milhões;



Redução de investimentos em compras de motores e outros componentes – aproximadamente US$ 150 milhões.

Os resultados da LATAM desde seu surgimento têm sido dúbios. Em 2012, a empresa obteve lucro operacional de US$ 91,4 milhões, um valor baixo devido às despesas de restruturação das duas companhias. Já o ano de 2013, o desempenho da LATAM foi mais forte, registrando lucro operacional de US$ 643,9 milhões. Uma explicação para o resultado fraco no primeiro ano são os custos relacionados a renovação da frota, que planeja reduzir o número de aeronaves em funcionamento, substituindo as menos eficientes por modelos mais adequados ao mercado. Outro fator são os altos aportes de capital em favor da TAM, medida que impediu que a empresa ficasse com patrimônio líquido negativo.

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Apesar de formalmente concretizada, alguns passos continuam pendentes para a consolidação da LATAM. A unificação da marca, por exemplo, está prevista para ocorrer ainda este ano, enquanto a integração dos terminais de atendimento e sistema de vendas deve ocorrer apenas em 2016. Na prática, tendo em vista a distribuição do controle acionário da LATAM, largamente concentrado nas mãos dos chilenos, a operação trata-se, na realidade, de uma aquisição. O grupo brasileiro entra como sócio minoritário da LATAM, ocupando cargos dentro da estrutura organizacional de caráter figurativo e não executivo. A distribuição das ações da empresa TAM demonstra a posição assumida pela chilena, que detém 100% das ações preferenciais, mas apenas 20% das ações ordinárias da empresa. Essa partilha apresenta-se simplesmente como uma forma de contornar as restrições brasileiras a realização de cabotagem (voos domésticos) por empresas estrangeiras, impostas pela Lei 7.565, de 19 de dezembro de 1986. Firmas internacionais que se proponham a entrar no mercado de aviação civil brasileiro, precisam recorrer a fusões, nas quais é permitida a aquisição de uma parcela máxima estabelecida (limitada a 20% do capital votante) do controle de uma empresa nacional, exatamente o que pode ser testemunhado no caso da fusão LATAM. Em adição, o acordo entre a LAN e a TAM prevê que, em caso de modificações na legislação referente a empresas aéreas que permitam o aumento da parcela de capital votante detido por estrangeiros, a família Amaro se comprometeu a vender parte proporcional de seu capital, de forma que os executivos da LAN possuam controle máximo permitido no escopo legal.

6.2 DEFESA DA CONCORRÊNCIA – CADE E TDLC O desejo de fusão das empresas aéreas precisou ser analisado à luz das regras antitruste vigentes nos países envolvidos, é dizer, Brasil e Chile. Baseando-se nos critérios de análise de ações de concentração, como estudo do mercado relevante, do poder de mercado e das eficiências geradas, coube ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e ao Tribunal de Defesa da Livre Concorrência – TDLC julgar a validade do acordo.

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O primeiro a publicar seu parecer foi o chileno TDLC, em setembro de 2011. O tribunal decidiu, por maioria dos votos, aprovar a fusão das empresas sujeitas a restrições. A principal delas envolveu as operações no aeroporto de Guarulhos, SP – o tribunal determinou que a empresa abrisse mão de 4 pares de slots (direito a uso do aeroporto em horário estabelecido) diários, em horários de grande movimentação, em favor de companhias aéreas que desejem iniciar a rota Santiago – São Paulo, onde a LATAM teria grande poder de monopólio sobre as concorrentes. Também foi proibido o aumento da oferta de assentos em voos disponibilizados em horário próximo ao praticado pelo slots abdicados. No tocante aos consumidores, determinou-se que as recompensas dos Programas de Passageiro Frequente das empresas fossem válidas a ambas as companhias e foi vedado o aumento de preço sem justificativa nas rotas Santiago – São Paulo e Santiago – Rio de Janeiro. Ademais, o Tribunal julgou necessária a renúncia de uma das alianças mundiais, das quais as empresas faziam parte, ficando a cargo das firmas decidirem à escolhida. Entre os fatores que pesaram contra a aprovação da fusão, segundo o TDLC, podem ser citados a capacidade da empresa em criar e reforçar barreiras à entrada de novas firmas, a fortificação de um duopólio regional que facilita a ação coordenada, caracterizando um conluio, de acordo com o órgão. As empresas falharam, ainda, em demonstrar que os benefícios advindos da fusão poderiam ser revertidos aos consumidores em forma de redução de preços e melhora na oferta de voos. A decisão do CADE, por sua vez, aconteceu em dezembro do mesmo ano, 2011. Em consonância com a deliberação do tribunal chileno, o Conselho aprovou, por unanimidade, a integração das empresas, estipulando algumas restrições a serem cumpridas. Em linhas gerais, o Conselho julgou que os ganhos de eficiência mercadológica superam as possíveis falhas de mercado criadas, entre elas a elevação de barreiras à entrada e o poder de mercado. O órgão antitruste detectou que a criação da LATAM acarretou uma grande concentração de mercado na rota Guarulhos (São Paulo) – Santiago (Chile), onde a nova companhia dominaria mais de 80% do transporte de passageiros. Para combater o monopólio, foi determinada a cessão de 2

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pares de slots da companhia nesta rota específica, em horários comercialmente atrativos, para permitir a efetiva concorrência de outras companhias. De forma análoga ao TDLC, o CADE exigiu que a LATAM integrasse apenas uma aliança global de milhagens. A decisão entre a One World, da qual a LAN era participante desde 2000, e a Star Alliance, na qual a TAM havia entrado em 2010, deveria ser feita pela própria LATAM.

Imagem 2 - Decisões do TDLC e CADE exigiram a eleição de uma das alianças globais

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A justificativa para este critério justifica-se pelo grande poder de mercado possibilitado pela integração com outras companhias aéreas internacionais. De modo geral, a participação em alianças distintas agregaria um grande número de rotas para a nova companhia, que poderia praticar manipulação de preços em vários mercados ou trechos menos competitivos. Diante deste cenário, a LATAM escolheu permanecer integrada a OneWorld, aliança com a qual vínculo era mais duradouro. Quanto ao setor de cargas, o CADE considerou que a fusão não geraria alterações de grande porte no mercado de transportes de cargas e, por isso, não foram feitas exigências restritivas nesta modalidade de operação. Nota-se que o julgamento do CADE foi consideravelmente mais brando que aquele executado pelo TDLC. As decisões provaram-se redundantes e obsoletas. A adequação das operações da nova companhia foram realizadas em concordância com as imposições mais rígidas constantes no parecer chileno.

55

CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando, em agosto de 2010, as empresas LAN e TAM anunciaram o desejo de fusão, as atenções dos órgãos regulatórios, da imprensa e da população se voltaram para o setor aéreo. A junção de duas empresas ocupando a posição de liderança em seus respectivos mercados levantou questionamentos pertinentes em casos de fusões e aquisições: a livre concorrência será preservada? quais os motivos que levaram a decisão de união? a nova empresa possuirá poder para influenciar o mercado no tocante a preços ou quantidades ofertadas? Este trabalho objetivou responder algumas dessas perguntas, ao analisar o caso LATAM, em face da teoria econômica aplicadas às operações de Fusão e Aquisição. As características fundamentais da operação são de uma fusão horizontal amigável e cross-border. Isso quer dizer que houve a integração de duas firmas operantes do mesmo setor, as quais deixaram de existir para o surgimento de uma terceira, com nova identidade, a LATAM. Por amigável entende-se que as partes estavam de acordo com o novo arranjo e que a permuta de ações ocorreu através de um leilão público. Além disso, as empresas envolvidas possuem nacionalidade distinta, caracterizando uma fusão cross-border. Em relação aos participantes, de um lado há a LAN, uma gigante aérea da América Latina. Baseada no Chile, onde detém aproximadamente 80% do mercado de aviação civil, a empresa opera nos principais países do continente por meio de subsidiárias. A importância da companhia tem sido reforçada por importantes investimentos em expansão das atividades, que garantem o bom posicionamento dela no mercado. A situação financeira da empresa é positiva, com registros de lucros nos anos anteriores a fusão. A busca de expansão nas atividades no território brasileiro e a adaptação às leis que regem as atividades de cabotagem foram, provavelmente, os maiores motivadores para a negociação aqui descrita. No outro polo encontra-se a TAM, empresa brasileira líder no mercado de aviação nacional. Apesar de sua força interna e organização estrutural sólida, a empresa registrou prejuízos em períodos anteriores à fusão. O resultado negativo pode

56

ter sido a principal razão para a fusão. Em busca de aproveitamento de sinergias para redução de custos e aportes de capital possíveis pela união à LAN, a TAM espera ter seus resultados negativos revertidos. Com a decisão, as companhias pretenderam aproveitar sinergias entre as atividades da LAN e da TAM, ampliando a oferta de voos e horários aos clientes e, consequentemente, favorecendo a dinâmica do setor de transportes aéreos como um todo. Ademais, a integração das operações das duas empresas visa alcançar otimização de receitas e redução de custos nos campos financeiro, operacional e tributário. A aquisição certamente cria uma empresa com excessivo poder de mercado. No entanto, por possuírem operações complementares em países distintos, os níveis de concentração do mercado não foram elevados. A nova empresa goza de uma melhor articulação

organizacional,

redução

de

custos

por

economias

de

escala

e

aproveitamento de sinergias, como o compartilhamento de voos. O julgamento da operação por parte dos órgãos de defesa da concorrência – o Conselho Administrativo de Defesa Econômica e o Tribunal de Defesa da Livre Concorrência – em favor da materialização da fusão, é uma evidência de que os ganhos pretendidos superam a ampliação do poder de mercado usufruído pela LATAM. Apesar do aval, restrições foram impostas para garantir a preservação da competitividade. As principais ressalvas tratam da venda de slots aeroportuários no aeroporto de Guarulhos-SP, especificamente para a operação da rota São Paulo – Santiago, onde a empresa seria responsável por 80% do total de passageiros transportados; e da escolha de apenas uma aliança de milhagem, programas de coordenação entre companhias aéreas internacionais para compartilhamento de voos e programas de passageiros frequentes, entre aquelas das quais LAN e TAM participavam. Apesar das vantagens pretendidas, vale observar que o rendimento da empresa LATAM apresentou resultados instáveis nos anos seguintes à fusão. Isso, logicamente, é fortemente explicado pela própria fusão, uma operação custosa que demandou a

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realocação de recursos dentro da firma na tentativa de consolidar a junção e fortalecer as empresas geradoras da LATAM.

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