Futebol e Cultura

August 6, 2017 | Autor: Ana Lucia Oliveira | Categoria: História do Futebol
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INTRODUÇÃO


"O mundo é um horizonte dos horizontes, toda possibilidade de vida
estão dentro desses horizontes" Joel Martins, In Memorian

Nesta dissertação consta uma série de reflexões baseadas nos
princípios da fenomenologia a respeito do tema que mais gosto, admiro e
acompanho no meu dia-a-dia que é o futebol. Tenho uma verdadeira paixão
pelo esporte bretão e o fato de ter o escolhido como o tema dessa
dissertação se deve à leitura e apreciação do que foi citado acima. Para
mim o futebol, por mais estranho que possa parecer, sempre funcionou como
um horizonte que me revelou vários outros. Com ele aprendi diversas coisas:
geografia, política, psicologia, sociologia, história; e aqui tomo a
liberdade de citar o escritor argelino, prêmio Nobel de literatura Albert
Camus ao falar que tudo que aprendeu sobre a moral dos homens, deve ao
futebol.
O futebol significa muito do que tenho em termos de sonho e
realidade, ou seja, da mesma forma que esse esporte diverte, leva lazer,
paixão e fantasia, ele educa, informa, conscientiza. Trabalha como uma
fonte de conhecimento e prazer. Esse aspecto é o que mais me encanta no
futebol, uma capacidade de ser e poder vir a ser uma série possibilidades
tão distintas.
A finalidade deste trabalho é o de constituir-se em referências para
discussões e reflexões sobre um tema tão apaixonante tanto para mim quanto
para milhões de pessoas no mundo. Contribuir, de alguma forma, para uma
análise da sociedade por intermédio de uma das maiores manifestações
populares.
A presente dissertação se organiza, em seu desenvolvimento, em quatro
partes. Na primeira, faz-se uma exposição pessoal do significado do
futebol. Uma espécie de depoimento mostrando o quanto o esporte marcou a
minha vida e de como está presente nela até hoje.
Na segunda parte, sintetiza-se um apanhado de idéias do que é a
fenomenologia, com um histórico, as principais idéias e seus principais
idealizadores. Com um objetivo mais didático do que de fundamentação.
A terceira parte se apresenta como uma relação entre futebol e
cultura, demonstrando como estão interligados e se influenciando a todo o
momento.
Para ilustrar o que foi apresentado nas partes anteriores, a última
parte se revela num pequeno ensaio lúdico sobre literatura e futebol.
Nas considerações finais, finalmente, busca-se concluir sobre a
importância do esporte na vida das pessoas e na sociedade.
















DESENVOLVIMENTO



No mundo da bola


Desde a infância, lembro-me de acompanhar os jogos de futebol pela
televisão. E foi daí que surgiu o meu grande fascínio pelo esporte. Quando
pequena, nunca fui a estádio ou assisti partidas em campinhos ou outros
lugares. Também nunca fui praticante do esporte, tentei jogar algumas
vezes, mas não era daquilo que eu gostava. Curtia mesmo era o futebol como
notícia, informação e todo o contexto que estava inserido junto com ele.
Pode parecer que eu gostava devido à televisão, mas eu ouvia as partidas
pelo rádio e não via a hora de chegar terça-feira para comprar a revista
Placar nas bancas e acompanhar todos os detalhes da rodada do fim de
semana.
Todos achavam um pouco estranho todo esse interesse, até eu mesma às
vezes achava exagerado e procurava não deixar transparecer só para os
amigos e pessoal da família. Dosava um pouco, procurava não ser tão
fanática e o próprio futebol com toda a gama de informação que vem junto
com ele fez com que meus interesses se ampliassem. De forma que estudei o
magistério, pensando em seguida fazer a faculdade de jornalismo, que acabou
se transformando em outra paixão.
Conclui a faculdade e logo no ano seguinte apareceu uma oportunidade
para ser comentarista de esporte da rádio Atlântica de Santos. E lá fui eu,
trabalhar no estádio, assistindo as partidas ao vivo da cabine de imprensa
com credencial de comentarista, causando surpresa em porteiros e
radialistas. Enfim chegou o momento em que eu poderia exercer a minha
profissão na área que eu mais gostava.
Contudo as coisas não foram exatamente como imaginei, tive que
trabalhar muito, sem receber salário e ainda suportar um certo ciúme dos
colegas de profissão, que poderia ser chamado também de preconceito. Acabei
abandonando a equipe de esportes e trabalhei ainda como o jornalista por
algum tempo. Hoje atuo na área de educação.
Na realidade, acredito que não consegui continuar trabalhando no meio
do futebol pelo mesmo motivo que não permitiu que eu praticasse o esporte.
O futebol me causa tanta admiração, que não consigo vivê-lo como personagem
integrante, prefiro sim, observá-lo sem participar dele. É algo sagrado,
platônico. Ter que conviver com o esporte como profissão e carregar todas
as responsabilidades que surgiam, não foi bom. Lia o jornal por causa do
comentário que iria fazer durante o jogo e não era mais como antes, que
lia, assistia e ouvia tudo por prazer. Meu objeto de desejo virou obrigação
e transformou-se em algo até enfadonho. Eram tantas as cobranças e
preocupações que já não conseguia mais alcançar a essência do fenômeno que
é o futebol, um esporte no qual o individual e o coletivo se integram e se
opõe a todo instante formando histórias com cenários e contextos do mais
variados.
Hoje sou professora e estudo pedagogia, o que não deixa de ser legal,
pois faço muitas coisas usando o futebol como exemplo e pano de fundo. Nas
minhas aulas uso a tática pra ensinar sintaxe, ilustro explicações com
exemplos de ética e cooperação que busco tirar dos jogos de futebol, os
alunos gostam muito. Utilizo até em trabalhos acadêmicos como este. Como
diz um comentarista da TV: "O futebol é uma benção".


Fenomenologia


Desde Aristóteles até o final da idade média, o caminho para o
conhecimento foi o da análise dialética, ou seja, o raciocínio por dedução
lógica a partir de certos conceitos básicos sobre Deus e o universo. O
método aristotélico foi adotado oficialmente pela Igreja através da obra de
são Tomás de Aquino, dominou o ensino e o estudo da natureza a partir de
conceitos teológicos sobre Deus e o universo. Por exemplo: se Deus existe,
Ele é um ser perfeito e se é um ser perfeito, sua criação das coisas
refletirá a Sua perfeição; conseqüentemente, a órbita dos planetas não pode
ser qualquer uma mas deve ser a mais perfeita possível, que é a forma
circular, e não a elíptica, porque esta última contém desigualdades. Logo,
as estrelas e os planetas situavam-se em esferas perfeitas.
Porém Galileu, com sua luneta, descobre que o dogma das esferas
celestes é pura fantasia. Ele utilizou o método científico, que busca o
conhecimento através da
observação e da experimentação.
Basta o exemplo acima para ilustrar a diferença entre chegar o homem
ao que existe pela via aristotélica dos conceitos e do pensamento
dialético, e chegar ao que existe a partir de si mesmo, pondo-se diante da
realidade, diante do universo, para observar e extrair da natureza as
evidências que puder colher com o uso da razão. Essa nova atitude
naturalista de dúvida, observação, experimentação e estabelecimento de
leis, proposta por Francis Bacon, levou rapidamente o homem a sucessivas
descobertas na astronomia, na química e na física, e ao aperfeiçoamento
sempre crescente da mecânica; e haveria de afetar, também, a filosofia,
através do pensamento de filósofos como Locke e Hume, da corrente empirista
inglesa.
John Locke (1632-1704) combateu o pensamento de Descartes de que
existem algumas idéias que são inatas, o homem as tem no espírito ao
nascer, como, por exemplo, a idéia de perfeição. Locke demonstra que todas
as idéias são registros de impressões sensíveis, ou são derivadas de
combinações entre essas idéias de origem sensível. Portanto, alguma coisa é
enviada pelos objetos e é captada por nossos sentidos na formação das
idéias. Porém o que é isto que nos envia os sinais? Essa coisa que nos
envia sinais, terá ela a forma dos objetos tal qual sentimos pelo tato,
pela vista, ou qualquer outro de nossos sentidos?
David Hume agravou o impasse denunciando que a relação de causa e
efeito é também algo desconhecido, pois nada encontramos entre causa e
efeito senão que a causa é um acidente, e o efeito é um outro acidente que
costumeiramente se segue ao primeiro. Estamos habituados a chamar o
primeiro acidente de causa apenas porque ele sempre acontece antes do
segundo que chamamos de efeito. Portanto, as leis da ciência são, em
princípio, questionáveis. Não podem valer como verdade, embora sejam úteis
enquanto trazem resultados práticos e conduzem a descobertas de novas
relações seqüenciais entre os fatos da observação. As idéias de Locke
abriram caminho para o positivismo, ou seja, o tratamento científico de
todos os fenômenos.
A esta influência da psicologia associativa dos empiristas ingleses
(notadamente Locke) sobre a filosofia se chamou Psicologismo. A filosofia
ficou fora de moda, "reduzida" a uma psicologia científica vinculada ao
positivismo. Os psicologistas entendiam a lógica (domínio da filosofia)
positivamente, como ciência, como uma disciplina definidora dos modos
associativos do pensamento. Os conteúdos da Lógica seriam as regras para
pensar bem.
O filósofo Edmond Husserl enfrenta o Psicologismo e busca restaurar a
filosofia e a "lógica pura". Por exemplo, o principio da contradição.
Segundo os psicologistas, o princípio de contradição seria a
impossibilidade do sistema associativo estar a associar e desassociar ao
mesmo tempo. Significaria que o homem não pode pensar que A é "A" e ao
mesmo tempo pensar que A é "não A".
Husserl opõe-se a isto e diz que o sentido do principio de contradição é
que, se A é "A", não pode ser "não A". O princípio da contradição não se
refere à possibilidade do pensar, mas à verdade daquilo que é pensado. O
principio da contradição, e assim os demais princípios lógicos, têm validez
objetiva, isto é, referem-se a alguma coisa como verdadeira ou não,
independentemente de como a mente pensa ou o pensamento funciona.
Como matemático e lógico, Husserl concebeu a fenomenologia como
método para confrontar o psicologismo na lógica. Pretende que a Filosofia
se liberte do psicologismo, que não seja ciência do mundo físico mas que,
no entanto, utilize a observação e a sistematização, próprias do
positivismo, no estudo de seus objetos ideais. Husserl mais tarde ampliou a
fenomenologia à totalidade do pensamento humano, criando, com o método
fenomenológico, uma "filosofia fenomenológica".
A fenomenologia é, portanto, uma ciência de objetos ideais. É uma
ciência a priori e muito importante, pois tem que haver a filosofia para
dizer se é verdade ou falsidade o que a ciência empírica, ou o cientista,
estão dizendo sobre o mundo físico. Mas, o que são esses objetos idéias aos
quais se aplica a observação, e mesmo a experimentação, segundo Husserl?
Quando o homem pensa um objeto, por exemplo, "mesa", tem um pensamento
intencional, um pensamento voltado para uma coisa específica que ele
imagina e define, de modo que em sua consciência existe uma mesa,
independentemente de que uma mesa exista ou tenha existido no mundo real
externo. As coisas existem em nossa consciência como "objetos ideais"
perpétuos. Os objetos ideais têm realidade, são entes, contêm um "ser", e
podem ser examinados e classificados.
São como os universais de Platão, que existiam apenas no "mundo
inteligível", fora do alcance do homem, mas que, para Husserl, estão na
mente humana, como fenômenos mentais. Tudo que podemos saber do mundo
resume-se a esses fenômenos, a esses objetos ideais, designados por uma
palavra que representa a sua "significação".
A verdadeira questão para a Fenomenologia não é o mundo que existe,
mas sim o modo como o conhecimento do mundo se dá, se realiza, tem lugar. O
que Husserl chama redução fenomenológica, ou "epoche", é o método pelo qual
tudo que é dado é mudado em um fenômeno que se dá e é conhecido na e pela
consciência. Corresponde à descrição dos atos mentais de um modo que é
livre de teorias e pressuposições, seja a respeito desses atos mesmos ou a
cerca da existência de objetos no mundo que se lhe correspondam. O objeto
não precisa de fato existir.
No seu Psychologie von empirischen Standpunkte ("A Psicologia de um
ponto de vista empírico"), de 1874, Franz Brentano afirma: "Podemos assim
definir os fenômenos psíquicos dizendo que eles são aqueles fenômenos os
quais, precisamente por serem intencionais, contém neles próprios um
objeto". Isto equivale a afirmar, como Husserl, que os objetos dos
fenômenos psíquicos independem da existência de sua réplica exata no mundo
real. A descrição de atos mentais assim envolve a descrição de seus
objetos, mas somente como fenômenos e sem assumir ou afirmar sua
existência.
A construção das idéias que o homem tem em sua mente se faz por
informação dos sentidos, mas não importa para a fenomenologia como o mundo
real afeta os sentidos. Considera que, por influência dos sentidos, existem
várias imagens possíveis de um objeto, porém todas elas significando a
mesma coisa, constituindo a sua essência, ou seja, todas elas redutíveis ao
mesmo significado de mesa, segundo nosso exemplo. Então, todas as imagens
de mesa têm certos componentes que fazem com que cada uma dessas imagens
signifique "mesa". Uma mesa maior, menor, alta ou baixa, vista de cima ou
de baixo, por uma pessoa míope ou por outra daltônica, não importa, terá
sempre aqueles componentes básicos que garantirão a aquele objeto o
significado de mesa.
Dar-se conta da consciência não é suficiente, ao contrário. Os vários
atos da consciência precisam ser conhecidos nas suas essências, suas
estruturas universais e imutáveis. O modo de apreender a essência é o
Wesensschau, a intuição das essências e das estruturas essenciais. De
comum, o homem forma uma multiplicidade de variações do que é dado, e
enquanto mantendo a multiplicidade, o homem focaliza sua atenção naquilo
que permanece imutável na multiplicidade, isto é, a essência é esse algo
idêntico que continuamente se mantém durante o processo de variação.
Husserl, portanto, o chamou invariante. Todas as mesas são redutíveis aos
"essenciais" ou seja, todos os fenômenos, todos os objetos ideais que sejam
"mesa" possuem a "essência" mesa que são os seus invariantes. Os objetos
ideais são essências. A isto Husserl chama "redução eidética".
Os objetos ideais distinguem-se dos reais por um caráter essencial. Os
objetos ideais são para Husserl eternos, ou melhor, intemporais. O ser
ideal,- o objeto ideal -, é intemporal, e o ser real, - do mundo exterior
-, está sujeito ao tempo, existe agora, poderá não existir depois, ou não
ter existido antes. A mesa do nosso exemplo pode estar na sala, neste
momento, mas não existiu no mundo real antes que o marceneiro a fizesse. Um
objeto ideal como o círculo, ou o triângulo, ou a mesa em sua essência,
contêm uma validez que não depende do tempo. Por esta razão os objetos
ideais sao espécies; não possuem o principio de individuação, não são
individualizáveis no tempo Vivências. Vivência (Erlebnis) é todo o ato
psíquico; a fenomenologia, ao envolver o estudo de todas as vivências, tem
que englobar o estudo dos objetos das vivências, porque as vivências são
intencionais e é nelas essencial a referência a um objeto.
O filósofo não precisa duvidar da existência do mundo, como os
idealistas radicais duvidam. O que importa é, antes, a maneira pela qual o
conhecimento do mundo acontece como intuição, o ato pelo qual a pessoa
apreende imediatamente o conhecimento de alguma coisa com que se depara.
Também que é um ato primordialmente dado sobre o qual todo o resto é para
ser fundado. Husserl definiu a fenomenologia em termos de um retorno à
intuição (Anschauung) e a percepção da essência Além do mais, a ênfase de
Husserl sobre a intuição precisa ser entendida como uma refutação de
qualquer abordagem meramente especulativa da filosofia. Sua abordagem é
concreta, trata do fenômeno dos vários modos de consciência.
Portanto o que o filósofo deve examinar é a relação entre a
consciência e o Ser, e, ao fazê-lo, ele precisa se conscientizar de que, do
ponto de vista da epistemologia, do conhecimento, o Ser somente é acessível
a ele como um correlato do ato de consciência. Ele tem que prestar
cuidadosa atenção ao que ocorre nesses atos. Alguns fenomenologistas também
salientam a necessidade de se estudar os modos pelos quais o fenômeno
aparece na consciência intencional (direcionada ao objeto) do homem. No
entanto, a fenomenologia não restringe seus dados à faixa das experiências
sensíveis mas admite, em igualdade de termos, dados não sensíveis
(categoriais) como as relações de valor, desde que se apresentem
intuitivamente. Conseqüentemente, a fenomenologia não rejeita os
universais.
Para os fenomenologistas, a função da linguagem, das palavras não é
nomear tudo que nós vemos ou ouvimos, mas salientar os padrões recorrentes
em nossa experiência. Identificam nossos dados dos sentidos atuais como
sendo do mesmo grupo ou tipo que outros que já tenhamos registrado antes.
Uma palavra, então, descreve, não uma única experiência, mas um grupo ou um
tipo de experiências; a palavra "mesa" descreve todos os vários dados dos
sentidos que nós consultamos normalmente quanto às aparências ou às
sensações de "mesa". Assim, tudo que o homem pensa, quer, ama ou teme, é
intencional, isto é, refere-se a um desses universais (que são significados
e, como tais, são fenômenos da consciência). E por sua vez, o conjunto dos
fenômenos, o conjunto das significações, tem um significado maior, que
abrangem todos os outros, é o que a palavra "Mundo" significa. O movimento
fenomenológico, que começou então a tomar forma, difundido principalmente
através dos 11 volumes de sua publicação Jahrbuch für Philosophie und
phänomenologische Forschung (1913-30), do qual Husserl foi o principal
editor. Influiu não somente sobre filósofos mas também sobre psicólogos e
sociólogos. Os existencialistas que o seguiram, principalmente Martin
Heidegger, Jean-Paul Sartre, e Maurice Merleau-Ponty, se intitularam
fenomenologistas.
Heidegger, dedicou a Husserl sua obra fundamental, Sein und Zeit
(1927; "O Ser e o Tempo"). Foi seu discípulo mas logo surgiram diferenças
entre ele e o mestre. Discutir e absorver os trabalhos de importantes
filósofos na história da metafísica era, para Heidegger, uma tarefa
indispensável, enquanto Husserl repetidamente enfatizou a importância de um
começo radicalmente novo e, com poucas exceções (entre elas Descartes,
Locke, Hume, e Kant), queria excluir, por entre parênteses, a história da
filosofia.
Sartre segue estritamente o pensamento de Husserl na análise da
consciência em seus primeiros trabalhos, L'Imagination (1936) e
L'Imaginaire: Psychologie phénoménologique de l'imagination (1940), nos
quais faz a distinção entre a intencionalidade de Husserl.
Merleau-Ponty, outro importante representante do Existencialismo na
França, foi ao mesmo tempo o mais importante fenomenologista francês. Suas
obras, La Estruturem du comportement (1942) e Phénoménologie de la
perception (1945), foram os mais originais desenvolvimentos e aplicações
posteriores da fenomenologia produzidos na França.
O mais original e dinâmico dos primeiros associados de Husserl, no
entanto, foi Max Scheler, que havia integrado o grupo de Munique quem
realizou seu principal trabalho fenomenológico com respeito a problemas do
valor e da obrigação. Ampliou a idéia de intuição, colocando, ao lado de
uma intuição intelectual, outra de caracter emocional, fundamento da
apreensão do valor.
De grande importância foi o impacto da fenomenologia na psicologia, na
qual Franz Brentano e o alemão Carl Stumpf haviam preparado o terreno, e na
qual o psicólogo americano William James, a escola de Würzburg, e os
psicólogos da Gestalt haviam trabalhado ao longo de linhas paralelas.
Mas a fenomenologia deu provavelmente sua maior contribuição no campo da
psiquiatria, no qual o alemão German Karl Jaspers, um destacado
existencialista contemporâneo, ressaltou a importância da investigação
fenomenológica da experiência subjetiva de um paciente. Jaspers foi seguido
pelo suíço Ludwig Binswanger e vários outros, inclusive Ronald David Laing
na Inglaterra, na psiquiatria existencial da linha filosófica ateia de
Sartre; Viktor Frankl, com sua teoria da logotherapia, na Áustria e,
pioneiramente, Halley Bessa, no Brasil, ambos da linha do existencialismo
cristão de Gabriel Marcel.
Dentro da filosofia os críticos da fenomenologia são principalmente os
existencialistas, que em muitos respeitos são fenomenologistas, mas que
consideram a existência humana imprópria para análise e descrição
fenomenalógica, porque isto significa tentar objetivar o não objetivável.
Na psicologia, a objeção que se levanta é contra a possibilidade de se
viver com o paciente sua própria visão do mundo, de sua situação e de si
mesmo. É impossível ter o terapeuta uma intuição desses aspectos
inteiramente livre do seu próprio eu, do seu próprio pensar. É duvidoso
que, na intuição humana, os fatos da consciência pudessem se dar tão
imediatamente de modo a evitar introduzirem-se ao mesmo tempo certas
interpretações.



Futebol e Cultura


Mais de um século depois de sua implantação e da 17ª edição de um dos
maiores eventos esportivo do planeta: a Copa do Mundo, o futebol, enfim,
começa a ser reconhecido como uma peça básica da cultura do nosso país. É
uma paixão nacional e um fenômeno único no mundo, chegando a FIFA a ter
mais paises afiliados (204) do que a ONU, que conta com 190 membros. Chega
até ser infantil falar do fascínio que o futebol exerce no brasileiro.
Percebemos, diariamente, as pessoas comentarem os mais diversos assuntos,
mas com a freqüência com que se fala e se discute o futebol, seja a
escalação de Romário o joelho de Ronaldinho, a rodada do fim de semana,
nenhum outro assunto merece tanto destaque como o esporte da bola. Talvez
por esse motivo é que a mania nacional foi menosprezada pelas elites, por
intelectuais e até mesmo por aqueles que não gostam e não entendem do
esporte e passaram a classificá-lo como algo de segunda categoria, coisa de
quem não tem mais o que fazer do que ficar olhando 22 homens correndo
atrás de uma bola.
Para o sociólogo Hugo Lovisolo, o tratamento do futebol pelas ciências
sociais passou por transformações significativas nos últimos vinte anos.
Segundo ele explica, até a década de 80 "dominava uma perspectiva crítica,
influenciada pelo marxismo e também pela Escola de Frankfurt que, trocando
em miúdos, considerava o futebol uma variante do ópio dos povos, uma
poderosa força de alienação dos dominados, de distanciamento, portanto, de
seus verdadeiros interesse emancipatórios. Domina hoje um a interpretação
oposta: o futebol, e de regra geral o esporte, tornou-se escola de
aprendizado da igualdade e da justiça, de identidade e expressão nacional
ou regional, de integração nacional e por aí adiante."
Para Lovisolo, o grande responsável por essa mudança foi o também
antropólogo Roberto DaMatta. "Os trabalhos excitantes de DaMatta abriram
as comportas para a mudança no tratamento e nos preparou para aceitarmos a
influência de Nobert Elias, e de seu grupo de colaboradores, que colocou o
esporte dentro do processo civilizador, destacando sua importância na
dinâmica e controle das emoções, no seio de mudanças gerais dos padrões de
relacionamento, das configurações da sociedade. O enfoque antropológico e
histórico passou a ser mais representativo".
Mesmo com essa mudança, o interesse em se discutir o tema ainda é
mínimo. Muito se fala sobre futebol, mas pouco se fala do futebol, como um
fator, que no Brasil ultrapassou a fronteira do esporte e passou a ser uma
manifestação cultural com uma história que necessita ser estudada,
conhecida e divulgada. Pouco se fala nas suas raízes e qual foi o processo
que o transformou nesta mania, nesta, às vezes, quase obsessão. O curioso é
que no princípio o futebol surgiu como esporte de classe média e alta,
importado da Europa e praticado em clubes de elite. Bastou cair no gosto do
povo, para que torcessem o nariz para ele.
O futebol modifica hábitos, linguagem, comportamento. Durante a Copa,
os brasileiros tornam-se verdadeiros artistas plásticos populares, com a
missão de produzir instalações de rua para incentivar a seleção. O
patriotismo brota nos brasileiros. O poder que o futebol exerce foi por
muito tempo ignorado e pouco questionado pelos intelectuais e por aqueles
que deveriam pensar o Brasil. Mas os políticos, principalmente os
populistas, nunca deram as costas para o fenômeno e souberam aproveitar a
característica do esporte como elemento de mobilização das massas. Getúlio
Vargas não tardou em usar o futebol na propagação de idéias
desenvolvimentista.
As vitórias nas Copas de 58 e 62, acentuaram a difusão do conceito de
que o Brasil era o país do futuro. A conquista da Copa de 70 no México foi
explorada pelo regime militar, foi usada para mostrar uma a ideologia e
esconder outra. Essa usurpação política do fascínio causado pelo futebol
talvez tenha ocorrido devido ao desprezo com que foi tratado pela elite
pensante brasileira.
Na arte no cinema e na literatura o tratamento não foi diferente, as
manifestações artísticas que usaram o futebol como tema são muito raras.
está mudando com a chegada da democracia, transpareceu a importância do
esporte como manifestação popular e possibilitou a aproximação e a
apropriação do futebol pela cultura e vice-versa. Nos dias de hoje podemos
visitar uma exposição no principal museu de arte de São Paulo, o MASP,
intitulada: "Pelé. A arte do Rei". O que demonstra que os tempos são
outros. Vivemos sob a égide da globalização, que tem fome de mercado, de
ídolos para mídia e de consumo. Nada como uma paixão para alimentar tudo
isso.






Seleção literária-Craques do gol de letra



Se pudéssemos imaginar uma seleção com grandes craques da literatura,
que, de alguma forma bateram bola com as histórias e as paixões do esporte
bretão, a escalação, não obedecendo a estilos e nem qualidade literária,
poderia ser a seguinte:
No gol, o prêmio Nobel de Literatura, escritor Albert Camus, que era
goleiro nos tempos de criança na Argélia. Disse que tudo que aprendeu sobre
a moral dos homens, deve ao futebol.O "Estrangeiro" Camus foi escalado,
pois o Brasil nunca teve grandes destaques nesta posição mesmo.
A camisa 2 vai para outro estrangeiro, o escritor peruano Mário Vargas
Llosa, um apaixonado pela arte da bola. Apesar de atuar em uma faixa
restrita do campo como a lateral direita, tem liberdade para apoiar, na
mesma proporção com que escreve sobre o aspecto democrático do esporte: "O
futebol é o ideal da sociedade perfeita: poucas regras, simples que
garantem a liberdade e a igualdade dentro de campo, com a garantia do
espaço para a competência individual".
A zaga está bem representada. De um lado pelo escritor gaúcho Luís
Fernando Veríssimo, que dentre as suas obras figuram "A Eterna Privação do
Zagueiro Absoluto" e "Ed Mort e o Seqüestro do Zagueiro Central", quem sabe
inspirado no maior zagueiro do mundo, o chileno Figueroa, que brilhou nos
gramados pelo clube de coração do escritor, o Internacional de Porto
Alegre. Mario Filho é o outro destaque da defesa. Irmão de Nelson Rodrigues
e flamenguista que daria seu nome ao estádio do Maracanã, escreveu O Negro
no Futebol Brasileiro, tinha como um de seus heróis o zagueiro Domingos da
Guia. Era um escritor e jornalista devotado a sua paixão: o futebol.
A "enciclopédia" do jornalismo brasileiro, o escritor e jornalista
Armando Nogueira "vai na" lateral esquerda. A propósito do singelo poema
que criou para o mais literário dos jogadores, Nilton Santos o melhor
lateral esquerdo do mundo. Literalmente conhecido como a Enciclopédia do
Futebol. "Tu, em campo, parecia tantos, e no entanto, que encanto! Eras um
só: Nilton Santos".
O poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto é capitão e cabeça-de-
área, por ter sido jogador e, segundo seu irmão Virgínio Cabral de Melo,
ter um estilo (de jogo) parecido com o do Dunga, capitão da seleção do
tetra em 94. Soube como nenhum outro tornar o futebol um objeto digno de
poesia, "Ademir da Guia" e "O Torcedor do América F.C.
Outro poeta, o mineiro Carlos Drummond de Andrade, atua na meia-
direita, posição que exige jogador habilíssimo como os seus versos com
compromisso entre o verso livre e a metrificação. Atacante comprometido
com o eterno dilema entre criar e se dedicar à bem menos glamurosa função
da marcação. Drummond adjetivou a bola de "cobiçada esfera", o atacante de
"belicoso" ao mesmo tempo em que se confessa incapaz de compreender o
futebol na crônica "Os Mistérios da Bola".
A camisa 10, em homenagem a Pelé, fica com o escritor santista José
Roberto Torero, torcedor doente do Santos F.C. Completaria o meio campo da
seleção. Ele é um dos roteiristas do filme "Uma História de Futebol", que
narra a história do menino Pelé em Bauru, e escreveu alguns livros sobre a
história do Santos.
Na ponta direita, o escritor Ruy Castro, como um bom ponta que joga
aberto e sem medo, lançou bibliografia sobre o maior ponta direita do
futebol mundial, Mané Garrincha. Com o livro "A Estrela Solitária", Castro
demonstrou que é possível editar grandes obras sobre a maior paixão
nacional.
O centroavante deste time de craques das entrelinhas é Nelson
Rodrigues, ninguém mais do que ele esteve à frente de todos, escrevendo
sobre futebol. Sempre foi artilheiro onde atuou, com uma imensurável
quantidade de crônicas, de contos e peças de teatro, marcou no futebol e
na literatura brasileira.
Na ponta esquerda, bem aberto e responsável pela cobrança de
escanteios, o escritor José Lins do Rego, escritor e torcedor doente do
Flamengo. Costumava dizer que intelectual brasileiro não sabia bater
escanteio, referindo-se repulsa que os escritores têm pelo esporte. O
autor de "Menino do Engenho" escrevia sobre o esporte, mas não com a mesma
engenhosidade dos seus romances sobre o ciclo do açúcar. Amigos afirmam que
ele pouco entendia de futebol.
O técnico deste time só pode ser o jornalista João Saldanha, o "João
sem Medo", que foi o responsável pela formação da seleção brasileira
tricampeã no México. Seleção da qual foi técnico até ser substituído por
Zagallo.
O esquema tático é o 4-3-3, talvez não o mais eficiente, mas o que
como faz a literatura, é o esquema que mais nos fez sonhar.



CONCLUSÃO



A idéia de fenômeno aplicada ao futebol se justifica na explicação da
filósofa Marilena Chauí a respeito dos fenômenos e essências no livro
Convite a Filosofia, onde ela esclarece que além das coisas materiais,
naturais e ideais, também são fenômenos as coisas criadas pela ação e pela
prática humana. Em outras palavras, os resultados da vida e da ação humana
– aquilo que chamamos de Cultura – são fenômenos, isto é, significações ou
essências que aparecem à consciência e que são constituídas pela própria
consciência. Desta forma o futebol pode ser considerado a manifestação de
um fenômeno e assim ser analisado como objeto de pesquisa.
Nesta dissertação, procurei relatar a minha paixão pelo futebol,
ressaltando que ela é conseqüência, não só do gostar propriamente dito, de
um simples interesse ou hobby, mas também do fato de ser o futebol muito
mais do que um esporte, ser uma manifestação cultural. A visão de que
futebol é algo alienado e superficial é equivocada e mostra que através
dele ou de qualquer fenômeno que nos instigue o interesse, a imaginação
pode sim nos revelar uma série de novos horizontes. Ter um interesse
segmentado, por mais restrito que possa parecer, não é algo limitado que
lhe impeça de conhecer e ampliar os nossos horizontes. Entendo que é apenas
um ponto de partida. Usei o exemplo da literatura para ilustrar o quanto um
assunto que pose ser considerado banal, consegue ser poesia, arte,
história, enfim, ser um horizonte dos horizontes.




























BIBLIOGRAFIA




CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 4ª Edição. São Paulo: Ática, 1995.


ULZETE, Celso. O livro de Ouro do Futebol. São Paulo: Ediouro, 2002.


COBRA, Rubem Q. - Fenomenologia. Cobra Pages. Brasília, 2001.
Disponível em: < http:www.cobra.pages.com.br>
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