Gauchos e Sertanejos

June 15, 2017 | Autor: A. Echazú Boschem... | Categoria: Latin America (Regional Country Studies), Regional Studies
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Gauchos e sertanejos: uma aproximação histórico - antropológica à
comparação entre tipos sociais de regiões periféricas a dois estados
nacionais 
(Noroeste argentino - Nordeste brasileiro)

Andrea Villagrán – UNSa, Argentina
[email protected]
Ana Gretel Echazú Böschemeier
[email protected]


A abordagem comparativa proposta nesse trabalho visa compreender diferentes
dinâmicas e os processos sociais e lutas de força implicados na construção
de tipos sociais no marco da conformação dos Estados nacionais. A partir da
própria experiência de viagem e estância no nordeste brasileiro, as
autoras, que pertencem à Salta, uma província do Noroeste argentino,
elaboraram uma série de reflexões cruzadas entre as duas realidades em
questão.
Como primeira aproximação, foi necessário revisar a produção acadêmica dos
dois países, Brasil e Argentina, no que faz à reflexão sobre a produção do
pensamento nacional e regional. Existem particularidades que façam do
"nordeste brasileiro" uma região diferençável do restante do Brasil? Quando
e como foi que elas surgiram? Igualmente, existem particularidades que
façam do "noroeste argentino" uma região diferençável do restante da
Argentina? Quando e como foi que elas surgiram? Em consonância, quais são
as representações desses espaços associados à figuras-tipos sociais
particulares?
Segundo diversos estudos Durval Muniz de Albuquerque Júnior (1996) para o
caso do nordeste brasileiro, e outros estudos que focalizam a produção
literária do nordeste argentino, (como Palermo 2002 y Moyano 2007),
existiram processos histórico – sociais particulares que configuraram
políticas espaciais definidas para cada caso, e fizeram com que
determinadas identidades sociais fossem fixadas à terra. Assim, houve
determinadas configurações sociais particulares, referentes a uma certa
"ordem de mundo" da sociedade que foi mudando no transcurso do tempo.
Porém, foram resignificadas e atualizadas (com maiores ou menores mudanças,
mas ainda reconhecíveis) diferentes imagens tipológicas de determinados
sujeitos sociais. A identidade social desses sujeitos era projetada no
espaço, enquanto o espaço projetava sobre eles certa identidade, qualidades
e atributos sociais. Nesse duplo jogo de identidades, as sociais e as do
espaço, é que se reforçaram os estereótipos sobre o Nordeste e o
nordestino, em um caso (Brasil), e o Noroeste e o norteño, em outro
(Argentina).
A construção de tais sujeitos sociais pode se encontrar nos discursos das
elites de cada um dos espaços sociais estudados, espelhadas nas
representações dos "intelectuais" como produtores culturais. Eles
configuram um esquema relativamente fixo e auto – explicativo, que
poderíamos chamar auto consagrativo, que tende a sobre dimensionar alguns
aspectos e a silenciar outros, a delinear categorias classificatórias que
ordenam o social, tipificando-o em grupos hierarquizados. Porém, os atores
sociais, silenciados, obliterados ou invisibilizados nesses tipos
classificatórios são dotados, em outros contextos, de maiores
possibilidades de agência. Através de diversas estratégias discursivas e de
práticas, eles se resignificam a si mesmos e à sua história, positivando
aqueles traços ou atributos que os posicionavam em uma posição de
desigualdade. A continuação serão apresentados os traços que se exaltam nos
dois casos, para fazer, posteriormente, o exercício comparativo.
O caso brasileiro
Quando percorremos essa região chamada de "nordeste brasileiro",
encontramos uma grande diversidade. As grandes cidades de Recife e Salvador
não se parecem com os pequenos povoados como Bom Jesus ou Parelhas; os
assentamentos da costa como Pipa não se parecem com os assentamentos do
interior como o sítio da Boa Vista. Mesmo dentro da cidade de Natal,
existem variações sociais muito claras entre um espaço geográfico como a
zona norte e outro espaço geográfico como a zona sul. Um breve itinerário
de viagem permite enxergar as enormes diferenças ao interior desse espaço
social tão amplo que é chamado de nordeste. Porém, em seu livrinho
introdutório O que e o Nordeste brasileiro?, Carlos Garcia (1984:7) afirma:
"quando se fala em Nordeste, vem imediatamente à lembrança a imagem de uma
região de extrema miséria, sujeita a secas periódicas que dizimam os
rebanhos e frustram as lavouras, provocando o êxodo e a morte por fome ou
sede". Nesse discurso sobre a paisagem, existe outro discurso que lhe
corresponde, e que traça especificidades sobre a cultura e sobre as pessoas
que o habitam. Por uma série de ligações lógicas que esses discursos
convencionais não explicitam, há uma série de significações encadeadas.
Duas delas parecem-nos particularmente interessantes: A primeira é
referente à paisagem: o nordeste é sertão: não é a costa. A segunda é
referente ao tipo social: o sertão é o sertanejo.
Sobre a primeira imagem diremos somente que existem circuitos nos quais
nordeste significa uma coisa muito diferente da seca e do de-sertão, tais
são os circuitos de significados criados e recriados a partir do fenômeno,
relativamente recente, do turismo transnacional (Piscitelli, 1996).
Nordeste, ali, remete a uma série de discursos e práticas fortemente
eurocêntricos que revelam a valorização de uma certa idéia brasilidade, que
remete a uma noção de natureza abundante e estilo de vida a partir das
imagens praias de águas quentes, abundância de comidas, erotismo e vida
fácil, uma imagem que se repete, dissimulando diferenças históricas e
culturais, na grande maioria dos destinos turísticos mundiais considerados
"tropicais" (a pesar das suas diferenças históricas e geográficas, Havaí,
Bali ou Fortaleza significam, nesse contexto, um mesmo espaço utópico).
Porém, o Nordeste cuja especificidade se constitui em relação às outras
regiões do Brasil enfatiza o espaço do interior. Aqui, os cactos, a poeira,
as matas formam parte da paisagem que simbolizou uma demanda que fez
história. Tal demanda foram os pedidos de reconhecimento estatal e de
políticas agrárias específicas elaboradas a partir da década de '20 no
século XX. Assim, na elaboração destes pedidos ao governo nacional, as
elites agrárias (em decadência frente aos grupos cafeteiros do sudeste)
constituíram uma série de significações espacializadas no "poligono de
secas", território geográfico marcado pela falta (ou irregularidade) de
chuvas (Muniz de Albuquerque, 2008). Nesse esquema, são ressaltadas a
pobreza material e a seca é no imaginário aquele elemento perverso que
destrói a relação harmoniosa entre homem e natureza .
Na justaposição, que até hoje perdura, entre um tipo de paisagem e um tipo
humano e moral, é que encontramos nossa segunda explicação do Nordeste e a
nordestinidade. Quando revisamos os esquemas de percepção de si próprio dos
sujeitos que nasceram no interior nordestino, observamos que o sertão é o
sertanejo. Na produção discursiva sobre o nordeste, a paisagem e o homem se
confundem. Outra característica central, que refere a concepções de gênero
específicas, é que o nordestino não é representado geralmente como mulher,
mas como homem. Por último, o nordestino não é negro, nem índio, mas
basicamente um mestiço, cujas características brancas são majoritárias.
Aqui, é freqüente a constituição de tipos sociais a partir de tipos
físicos, configurando-se uma sociedade altamente sensível às diferenças
fenotípicas das pessoas e que conta com complexos esquemas de classificação
a partir disso (Maggie e Barcellos Rezende, 2001).
A representação do Nordeste brasileiro exaltou o tipo social do sertanejo.
Ele não representa um grupo, mas uma identidade social individualizada, e,
claramente, imaginada num sentido sociológico. Pois esse tipo sertanejo não
é passível de se achar na realidade concreta, e não remete a nenhum grupo
nem classe social especifico. Na exaltação do sertanejo, houve uma série de
constituições sociais que foram inexistentes, como o conceito de populações
indígenas, consideradas coisa do passado, e de afro descendentes, altamente
invisibilizados.
O tipo sertanejo
O discurso histórico que constrói o tipo sertanejo não deixa de ser um
discurso de tipo naturalista. Identifica o homem com a paisagem, e tende a
apresentar um nordeste masculinizado, corpo da miséria com um claro bias
étnico e de gênero. Em princípio, a exaltação do sertanejo se corresponde
com a negação do negro. Sobre o negro tem poucas referências, e quando elas
se encontram, é representado como "um vaqueiro solitário amigo de seu
patrão e feliz por ser escravo" (Cavignac, 2003). Só desde o trabalho de
Gilberto Freyre é que podemos encontrar uma positivação da história do
negro no Brasil, com forte impacto no imaginário contemporâneo sobre a
composição da sociedade brasileira.
Há uma complexidade por trás daquele tipo sertanejo que as figuras das
elites tentaram cristalizar. Nas classificações raciais do século XIX, o
sertanejo típico era constituído por certos tipos exaltados, outros
desvalorizados e outros, considerados diretamente como perigosos (Cavignac,
2003). Exaltados eram o sertanejo propriamente dito, o caboclo e o
mameluco, mestiços nascidos do cruzamento entre europeus e indígenas. Tipos
mais desvalorizados eram aqueles nascidos do contato entre europeus e
negros, como o brejeiro e o mulato. E os tipos perigosos eram aqueles
gerados a partir da mistura entre negro e índio, como o curiboca, o caboré
e o cabra.
Esse discurso focado nas relações raciais se sobrepõe a outras formas de
classificação sobre o social encontradas no nordeste há fins do século XIX,
compostas por traços físicos, ocupações e idades: vaqueiro, violeiro e
cordelista, por uma parte, cabeça chata, baiano e paraíba, por outra. Sobre
a base de uma série de anúncios de jornais do século XIX, Moritz Schwarcz
(1988) ressaltou tipos correspondentes aos escravos: negro suicida, negro
degenerado, negro fiel. Também está o preto velho. E a ama de leite, figura
essencial que exploraram as elites na suavização de uma ideologia sobre a
escravidão no Brasil (Segato, 1996). Uma série de sensações e emoções
constituíram o horizonte valorativo dessas classificações socialmente
construídas: virilidade, vergonha, infâmia, obrigação e honra.
Em termos de representações corporais, o corpo do sujeito branco
diferenciava-se radicalmente daquele do sujeito negro. Tal divisão de mundo
tinha uma relação específica com a divisão do trabalho estabelecida.
Segundo Freyre, "cada branco de casa-grande ficou com duas mãos esquerdas;
cada negro, com duas mãos direitas" (1989: 429). A mulher negra não tinha
existência diferenciada dentro dessa classificação masculinizada do mundo.
Porém, segundo o mesmo autor, "foram os corpos das negras que construíram,
na arquitetura moral do patriarcalismo brasileiro, o bloco formidável que
defendeu dos ataques dos don-juans a virtude das senhoras brancas" (op cit:
450). Corpo da mulher negra, espaço do indizível. Mas, porém, necessário
para a reprodução dessa ordem social altamente desigual.
A história nordestina tem apresentado um modelo masculino enraizado, onde a
ponta da hierarquia social era ocupada pelo homem – branco – dono de terras
e escravos. Se fizermos uma análise simbólica do modelo de Gilberto Freyre,
em tal sociedade, patriarcal e ordenada sob o modelo da pirâmide, a máxima
visibilidade corresponde-se com o homem branco, enquanto a mínima
visibilidade, com a mulher negra.

"Mulheres – negras" no passado
No sertão nordestino, ter nascido mulher era ser posicionada dentro da
rígida hierarquia do sistema patriarcal, de gradações reconhecidas em tipos
sociais, de determinações segundo cor, gênero e posição de classe. Nesse
contexto, "ser filha de fazendeiro, bem alva, ser herdeira da casa, gado e
terra era o ideal de mulher" (Knox Falci; 1997: 202). A mulher escrava no
sertão, mesmo que invisibilizada, manteve relações sexuais
institucionalizadas dentro de marcos tácitos com o senhor: "muitos
concubinatos, muitos filhos naturais" (op. cit; 275). Tal relação era
possível a partir de certo esquema de poder pré estabelecido. As crianças
produto desses encontros representavam sujeitos sociais que eram
considerados "exceções" dentro das classificações da época. Porém, seu
número era enorme, e não temos razões para não imaginar que tenham se
elaborado estratégias de identificação diversas a partir do fato de
pertencer a uma dessas categorias. Em relação com a mulher escrava e a sua
progênie, os filhos do branco "eram em uma escrava e não com uma escrava. A
mulher escrava era praticamente vista como aquela que guarda a semente, mas
não a co-causadora do nascimento do filho" (ibidem). Assim, no sistema da
escravidão, em que as relações humanas eram facilmente desfeitas devido a
compras, vendas, trocas e matanças, maternidade e condição escrava eram
dois domínios rigidamente separados. A maternidade, no sentido da
construção moderna do conceito, era reservada só as mulheres brancas e de
"família" Nos tempos da escravidão, quem exercia a maternidade era a mulher
branca, considerada a única capaz de transmitir valores e inculcar uma
determinada herança às novas gerações. Em termos de imaginários locais,
poderíamos dizer que enquanto a mulher negra simplesmente procriava, era a
branca quem criava. Porém, apresentava-se um paradoxo, pois ainda depois da
escravidão, era a mulher negra tomou conta dos filhos das mulheres brancas.
A mulher negra entregava a sua energia vital, sua força natural, seus
braços e seu leite, enquanto seus conhecimentos e modos de fazer eram
jogados para o terreno do impensado, das disposições espontâneas. Segundo
Gilberto Freyre, "raro quem não foi amamentado por negra" (1989: 350).
Segundo a lógica de diferenciação entre a procriação e a criação nas
figuras da mulher negra e da branca, há uma clara preocupação moral em
relação ao possível "abuso" do corpo da negra, em prejuízo dos valores dos
brancos: "imaginem-se os meninos sem mãe, sem madrinha, sem avó, entregues
a mucamas nem sempre capazes de lhes substituir à mãe" (ibidem). Há uma
barreira moral que impede que a diária doação de cuidados das crianças se
transforme em maternidade. Assim, inúmeras crianças cresceram num mundo
dividido em dois, onde o território do preponderantemente afetivo, que
pertencia às mulheres negras e seu mundo, devia ser em determinado momento
deslocado pelo horizonte normativo onde infâmia, vergonha e imoralidade
constituíam-se em freqüentes acusações feitas contra os escravos e
escravas.
A mulher escrava devia ter duas características para ser considerada "apta"
para a tarefa de dar de mamar aos filhos das mulheres das fazendas: ser
limpa e ser forte, segundo anunciam periódicos da época (Moritz Scharcz,
1988). Neste contexto, era valorizado o porte mais do que a beleza.
Mãe preta
A categoria "mãe preta" constitui uma figura específica como tipo social no
contexto brasileiro, e tem uma ancoragem particular na história colonial e
escravagista brasileira, assim como na fundação do mito da convivência
harmoniosa das três raças:

"... Trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava o
sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar, que nos deu de comer,
ela própria amolengando na mão o bolão de comida. Da negra velha que
nos contou as primeiras histórias de bicho de mal-assombrado"
(Freyre, [1952] 1989: 283).
A categoria mãe preta conjuga de maneira única etnicidade e determinações
de gênero. Tal prática, tão próxima da maternidade mas nunca completamente
legitima como ela, era, porém, fortemente apoiada pela ordem social
patriarcal da escravatura e ainda depois da sua abolição. Tal é a situação
que Rita Segato (1996) descreveu como maternidade transferida. Segundo uma
entrevistada, cuja infância transcorreu no sertão nordestino, mãe preta era
uma figura generosa e de corpo forte. Ela mesma tinha nascido no marco de
uma família "branca" que tinha mulheres "negras" trabalhando no interior do
espaço doméstico "as negras eram quase da família" (K; 45 anos).
Determinadas disposições corporais caracterizavam à relação entre os filhos
da casa e essas mulheres: "a negra mimava, acariciava, dava cheiro, fazia
coscas, preparava comida gostosa... sempre cozinhava melhor que a dona de
casa". Em termos de constituição corporal "As mulheres negras são mais
fortes do que as mulheres brancas... elas podem dar à luz mais
facilmente... elas têm muito leite". Enquanto as mulheres negras ocupavam o
espaço da cozinha, as brancas ficavam na sala, administrando e controlando.
Assim, tendiam a criar-se espaços de disfrute legítimos para as negras,
enquanto para as brancas, o sofrimento parecia ser o único sentimento ao
qual elas tinham direito. A respeito da suavidade das relações, da
violência simbólica impressa nesses espaços tão silenciosos, a nossa
entrevistada afirma: "no Seridó, tudo é por baixo".
Em virtude de determinadas mudanças nos modelos médicos, laborais e de
estrutura da família, as mães pretas, ou amas de leite, foram perseguidas.
A sua prática, antes altamente valorizada, passou a ser proibida. Tais
acontecimentos são conseqüência de uma série de processos. Dentre os mais
notáveis, a valorização da amamentação materna na Europa, sobretudo na
Ingleterra e na França (Palmer, 1991) e a fixação biopolitica da díada mãe
– filho como objeto de intervenção da medicina social (Donzelot, 1990).
Apesar da abolição da escravatura no ano 1880 e da instauração das relações
capitalistas no contexto do trabalho doméstico, poderiamos traçar uma linha
de continuidade entre as instituições da ama de leite, depois, da ama
seca, e depois, da empregada doméstica. No contexto etnográfico estudado,
observamos duas questões. Por uma parte, a maioria dessas mulheres se auto
define como negra. Pela outra, uma grande porção delas têm trabalhado em
"casas de família" de classe media, tanto em sítios quanto no contexto
urbano. De fato, tal ocupação, em forma conjunta com o trabalho doméstico
na própria casa e o trabalho no roçado, era a principal ocupação da maioria
dessas mulheres. As percepções sobre o trabalho doméstico são muitas das
vezes ambíguas, percebendo-se em muitos casos aquela ideologia suavizada da
violência das relações entre gênero, classe e "raça" presentes no sertão
nordestino. Essa indistinção entre trabalho e serviços é própria da
persistência de imaginários coloniais, marca das relações servis em vários
regimes coloniais latino americanos.



Corpos que resignificam a história
Nos processos de categorização dos sujeitos a partir do Estado, há, no
decorrer do ultimo trecho do século XX, uma importante mudança de eixo.
Aparecem as políticas de reivindicação étnica baseadas na ressemantização
da idéia de raça. A categoria da auto adscrição influencia profundamente as
disposições a partir das quais os sujeitos constroem a sua identidade.
Assim, há uma distância, com efeitos observáveis nos usos corporais em
contexto etnográfico, entre a idéia de ter nascido negro "coisa que não tem
jeito" (M.F; 50) e de se reivindicar como tal. Raça já não é considerada um
destino, mas um marcador seletivo que opera em determinados contextos. No
contexto em que realizei meu trabalho de campo etnográfico, a comunidade
quilombola da Boa Vista dos Negros (Município Parelhas, Seridó, Rio Grande
do Norte), são claramente as mulheres quem reivindicam o estatuto da
negritude com mais força e clareza. Tais reivindicações são impressas no
espaço do corpo. Os corpos dessas mulheres expressam uma natureza
construída a partir de muitas horas de trabalho e preparação.Nas festas
locais, regionais e estaduais, estão constituindo-se como o estandarte da
"beleza" e da "força" da origem. Tal processo de forte visibilização (é
importante destacar que não estamos discutindo as condições anteriores que
fizeram possível a materialização de tal visualidade) tem entre cinco e dez
anos, e é conseqüente com a aparição das normativas para regulação das
terras quilombolas emitidas pelo governo nacional no ano de 2003[1]. A auto
identificação torna-se uma estratégia de poder. O uso de tranças de linha
sintética no cabelo é uma forte expressão disso. Mulheres entre uma faixa
de 15 e 35 anos as utilizam, porém, podem ser observadas em várias
gerações. Para a sua confecção, se trocam favores, a uma faz na outra.
Muitas mães, por sua vez, fazem nas filhas. Elas afirmam se sentirem mais
"poderosas" com elas.
Porém, não são todas as mulheres da comunidade as que usam tranças. Tendo
entrevistado a trinta mulheres da comunidade, percebi que há uma forte
correlação entre uma adscrição subjetiva aos discursos da auto afirmação
étnica e o uso pessoal dessas tranças. Por outra parte, identifiquei às
mulheres que identificam o fato de ser negra com um destino, muitas vezes
ruim que deve, porém, ser aceito com integridade e levado com bom senso.
Tais mulheres apresentam um uso diferente do cabelo. Geralmente amarrado,
ou com tranças grossas feitas do mesmo cabelo.
Se a feminilidade negra constituiu-se historicamente pela capacidade de se
- doar, em termos de corpo sensual, útero reprodutor e leite engendrador, a
partir da emergência dos discursos da reivindicação "racial", a
feminilidade negra se constitui a partir de um uso predominantemente visual
do corpo. Por outra parte, os processos corporais vinculados ao exercício
do cuidado infantil (amamentação, alimentação) perdem o bias racial em
virtude de políticas de igualdade cidadã. O acesso universal aos serviços
de saúde teve um forte impacto nas concepções sobre o corpo e contribuiu a
reorganizar as responsabilidades femininas em torno da figura da mãe
biológica. Amamentação e cuidados maternais se elaboram como normas de
exercício da maternidade responsável em ternos não só sanitários, mas
também sociais. Tais identidades, as tecidas ao redor de uma idéia de
igualdade dos corpos femininos, predominantemente médica, encontram um
ponto de inflexão nas ações afirmativas destas mulheres, centradas na
resignificação de seus papeis sociais a partir da diferença de cor inscrita
em seus corpos e exaltada a partir de procedimentos de embelezamento.
O caso argentino
Anteriormente, assinalamos que um dos objetivos principais deste trabalho é
compreender as diferentes dinâmicas e processos a partir dos quais se
constituem tipos sociais identificatórios do nacional e do regional. No
caso argentino, problematizaremos a figura/tipo do "gaucho", para o qual
mostraremos alguns momentos paradigmáticos na criação de certas formas de
significação social. Em primeiro lugar, vamos nos deter na etapa posterior
à declaração da independência argentina, que se denomina processo de
conformação do Estado Nacional (1810 - 1880). Cenário de edificação, por
parte dos primeiros intelectuais nacionais (ilustrados porteños
principalmente) a matriz imaginária – simbólica que dá sustento ao Estado
como Nação. No marco deste processo, assinalaremos duas instâncias
significativas que demarcam pontos de inflexão na forma de representar e
escrever sobre o passado, de visualizar a "cultura nacional" e aos
habitantes do território argentino.
Em um momento posterior, esboçaremos os traços principais das tipologias e
estereótipos locais, centrando-nos nas categorias do gaucho criadas desde
os intelectuais de elite e seu discurso histórico sobre Salta e a Região
noroeste. Para isso, revisamos algumas escrituras pioneiras de inícios do
século XX e outras mais próximas à contemporaneidade.
Finalmente, apresentamos linhas fundamentais na definição do gaucho, que
realizam gauchos dos setores populares locais, agrupados num tipo de
organização chamada de "fortines gauchos". A fonte sobre a qual se
desenvolve o terceiro apartado são entrevistas realizadas a integrantes
desses fortines. Algumas se levaram a cabo de forma individual e outras em
encontros grupais, desde o ano 2007 até o presente momento. Se
entrevistaram fortines de diferentes localidades da província, alguns deles
na capital e outros em locais mais afastados.
O gaucho no imaginário nacional
A noção de gaucho se encontra intimamente vinculada ao processo de
conformação do Estado Nacional argentino. Os intelectuais que imaginaram a
nação argentina, inspirados e e seduzidos pelos ideais da ilustração
européia, fizeram da mestizagem o mito de origem da argentinidade.
Argentina, "crisol de razas", aberta a "todos los ciudadanos del mundo que
quieran habitar el suelo argentino". A abertura à imigração européia faz
parte do projeto civilizatório dos "ilustrados" argentinos. As elites
criollas, mestiças, conduziram esse processo de invenção do Estado – Nação
sob a base da negação da população nativa, principalmente indígenas e
afrodescendentes, da sua inferiorização e alterização. Esses discursos
interiores podiam revestir a forma de "gauchos vagos", "tribus de
salvajes", "masa amorfa", "desierto" ou "barbarie" para designar essa
população.
Tais imaginários se projetam no espaço, se expressam geograficamente.
Buenos Aires, cidade portuária e aberta, portanto, ao "contacto" e
influência européia, é representada como a materialização dos ideais de
civilização e progresso. Em ela radicam os fundamentos que a consagraram
como capital e centro político. Porém, a definição do centro como tal
envolve lutas de força durante toda a primeira metade do século XIX, onde
os grupos do "interior" e as províncias se opunham à unificação política e
rejeitaram Buenos Aires como centro. Como produto desses enfrentamentos, o
mundo das províncias é apresentado como a encarnação da barbárie, da
selvageria, expressões de atraso e obstáculos ao progresso da nação. Nesse
contexto o gaucho, sua imagem, expressa a mimese paisagem – natural, é a
humanidade "ensilvesida".
No marco desta complexa dinâmica onde os discursos sociais dão existência
àquilo sobre o qual falam, interessa-nos atender à primeira escritura
histórica nacional no marco do processo de construção do Estado nacional,
focalizando sobre as representações sociais e tipologias humanas que
constrói. Os discursos históricos nesse contexto trarão os fundamentos e
representações imaginárias que conformarão a identidade coletiva em termos
de identidade nacional como comunidade imaginada (Anderson, 1997). Assim
também, contribuirá à criação de personagens e referentes civilizadores
tendentes a ocupar o lugar de heróis fundadores da comunidade, dignos de
serem rememorados e monumentalizados enquanto protagonistas da
independência. A reconstrução que se leva à cabo desde esta história, a
oficial, vai demarcando uma imagem do passado como sucessão de grandes
fatos e acontecimentos que têm grandes homens como protagonistas.
Enquanto as idéias ilustradas os grupos intelectuais de Buenos Aires
funcionaram como estímulo do projeto independentista, elas definiram a
forma que adquiriu o primeiro esboço da organização nacional. Elas criaram
os marcos de valoração e orientação da primeira história argentina, sob o
traço do pensamento de Domingo Faustino Sarmiento e Bartolomé Mitre[2],
consagrados posteriormente como os pais fundadores da "história nacional".
Sarmiento, através da dicotomia civilização – barbárie desenhou o mapa
social e político da Argentina de então, enquanto Mitre fixou os parâmetros
de classificação na constituição da "galeria das celebridades argentinas".
Assim, a história centrou-se no acionar dos homens brancos, ilustres e no
engenho individual deles. Nesse relato dominante das origens nacionais, as
mulheres - brancas, negras e indígenas- são absolutamente invisibilizadas.


Vazio e deserto. Índios, paisanos e gauchos. Selvagens, bárbaros e
perigosos
A promulgação da constituição (em 1853) para os "ausentes" que fomentará a
imigração européia, tanto como a representação do território argentino como
espaço "deserto" e "vazio" que retrataram Sarmiento e Alberdi são os eixos
de sentido que articulam os discursos e práticas que definem as políticas
deste período. As idéias políticas importadas da Europa, de cunho liberal,
inspiraram a concepção de mundo que a primeira geração de historiadores
argentinos projetou como modelo de país, enquanto serviu como justificativo
para o setor dirigente na promoção do progresso e da civilização.
As imagens do deserto e vazio, trasladadas ao plano político, convergem na
definição de atores sociais negados, um todo homogêneo de população nativa
– indígenas e negros-, existentes nas margens da civilidade, analfabetos,
impossibilitados de exercerem direitos. A "República restritiva" ideada por
Alberdi como "república possível" estabelece a diferença hierarquizante
entre "massas incapazes" e a elite governante.
Essa história trouxe desde a narração um estado da situação que devia de
ser transformado, representando e projetando as noções de atraso sobretudo
no território que se encontrava por fora de Buenos Aires. A escrita
histórica posterior aos ´80, se consolida o liberalismo e o centralismo
promovido pelos ilustrados do "centro" de Buenos Aires, é então escrita
pelos vencedores: "...caudillos y montoneras gauchas representaban el orden
retrógrado y la tiranía de las masas…barbarie que sintetizaba una confusa
mezcla de orden medieval, intolerancia hispánica e inferioridad nativa"
(Svampa 1994:44).
Sarmiento, autor intelectual e mentor de um projeto de Argentina segundo o
molde européio, expressa claramente uma ordem de valorações sociais onde
qualquer outredade possível é inferiorizada. Buenos Aires é o centro
político, e por isso a materialização da ordem, ademais da encarnação dos
desejados ordem, cultura e urbanidade. O "interior", as províncias, todas
as regiões do país, em termos contrastantes e opostos, acabam
materializando a anticivilização, a desordem, a barbárie próprios da
natureza e do campo.
O manto escuro com o qual apresenta essa historiografia o "vazio" e o
"deserto" das províncias, constrói tipo sociais como sujeitos e indivíduos
temíveis, perigosos e ameaçadores para a "ordem política". Então, os homens
de campo, trabalhadores rurais, índios, paisanos e gauchos encarnam a
ausência e o vazio por serem extirpado: suas formas de organização são
exemplo de "caos" e "anarquia".
Svampa propõe que nesse contexto, o gaucho expressa o mito romântico da
barbárie, e vai ser conceituado pelo seu caráter individualista, devido à
sua relação com a liberdade (Svampa 1994: 48). Também será representado
como "vago" e "mal entretenido", de acordo com a sua vida licenciosa
liberada à ingestão desenfreada de álcool e à propensão à delinqüência
(Gori, 1974).
Nesse marco social de pensamento, a célula do desordem no deserto é o
gaucho caudillo. Ele encarna, ao dizer de Svampa, a comunhão entre o
humano, o animal e a paisagem. Nessa imagem e figura simbólica projeta-se
um universo de sentidos negativos. As tipologias elaboradas hierarquizam a
cima: homem culto e civilizado, branco, que respeita as normas sociais, a
ordem, os valores. Por debaixo disso, no estrato inferior do homem crioulo,
mestiço, tosco, camponês, mimetizado com a natureza animal e selvagem.
Em adição, esse tipo humano, "menos evoluído" e próximo da natureza,
objetivado na figura do caudillo, se apresenta como carente de cultura e
educação, sem valores morais nem respeito das normas sociais de
comportamento. O caudillo é representado como homem de ação, força, e não
de idéias, líder natural ou espontâneo, agitador e condutos de "bandidos",
"vagos" e massas amorfas. Por isso, a estampa do mundo de província, da
vida na campinha (tudo o que não é a cidade portuária) não representa mais
do que o atraso e estancamento, uma presença que incomoda e obstaculiza a
difusão dos ideais ilustrados.
A revalorização do gaucho
Porém, outras vozes intelectuais vão delinhando um perfil diferente em
relação com os caudillos e gauchos, contribuindo para sentar os precedentes
para a sua posterior reivindicação e valorização histórica. É nesse
sentido, por exemplo, que o General Güemes, conhecido como general gaucho,
é resignificado desde a escrita de Vélez Sarsfield[3], para quem encarna
valores patrióticos. O autor destaca a sua origem social –enquanto filho de
uma família notável e prestigiada- como aspecto fundamental da sua
positivação aonde transmutará a "caudillo salvador da pátria". Nessa
passagem, Vélez Sarsfield o compara com grandes homens, com Bolivar e San
Martin (Costa e Mosejko, 2000: 114). O autor dotou a Güemes com um tinte
popular, enquanto o comparou com Gervasio Artigas, atribuindo-lhe a
promoção de políticas progressistas, tais como um sistema progressivo de
taxas e medidas de reforma. Assim, ele sustentou que foi Güemes quem mudou
o sentido da palavra gaucho: "de delinqüente para patriota nativo".
Las cartas quillotanas de Juan Bautista Alberdi, del 1852, son un histo en
la histoia argentina. Ellas introducen a la escrita histórica novos
parâmetros e valores desde os quais poderia ser abordado o passado. Los
cuales consisten, principalmente, en la valorização das "tradições
argentinas", "às expressões do interior", da província e dos setores
populares[4]. Promove a revalorização dos gauchos e da tradição espanhola,
ao afirmar que eles são os representantes naturais da identidade argentina
(Alberdi 1853 en Shumway 1993). Essas tradições profundas foram
"redescobertas" em campo, e nesse contexto é que se resgata ao gaucho de
cada região. Os tipos gauchos são classificados de acordo com a regiões
geográficas de pertença, sendo distinguíveis basicamente três: o "gaucho
pampeano", o "gaucho do litoral" e o "gaucho norteño".
Esse empreendimento de recuperação alimenta-se da literatura gauchesca[5] e
de uma corrente denominada criollismo, que retrata o gaucho sob um bias
romântico, em comunhão e harmonia com a paisagem e a natureza. O que antes
fora entendido como obstáculo para o progresso, é hoje entendido como
representação do originário, do espírito do rural, e da comunhão com a
terra ancestral. A resignificação positiva do homem de campo e do mestiço,
contorneiam o retrato da identidade nacional e a sua simbolização na
criação do gaucho patriota como arquétipo. Esse gaucho é transformado em
símbolo e imagem do genuíno espírito argentino, após a sua valoração por
meio da sua colaboração nas lutas pela independência. É nesse sentido que
o uso político do gaucho é manifesto na tentativa de construir uma
identidade conciliatória, que sintetize a mistura entre o sangue originário
e aquele dos conquistadores espanhóis. O gaucho representa o tipo criollo,
e invisibiliza o indígena negando qualquer rastro de negritude possível. O
mito de origem da argentinidade, centrada no tipo mestiço, condensa a
vontade política de branquear os genes e manifesta, assim, o triunfo da
"cultura sobre a natureza", e da "civilização" sobre a "barbárie" e a
"selvageria".
O gaucho sob o olhar regional
A figura do gaucho recebeu um tratamento particular pelos discursos das
élites intelectuais da região. Porém, tal significação não clausura os
sentidos que no decurso histórico ela vai adquirir. Assim, os primeiros
relatos históricos de Salta, em contraste com o olhar dominante de Buenos
Aires que inferiorizava as figuras do interior do país, orientaram-se a
consagrar o prócer local da Independência, General Martín Miguel de Guemes,
o "herói gaucho".
Bernardo Frías (1866 – 1930), reconhecido como pai da história local,
através da sua escrita deu curso à glorificação desta figura. Com isso, ele
inaugura um modo de fazer história que mantém certa vigência na atualidade.
Ele se caracteriza por um deslizamento entre as categorias
analiticas/classificatórias e das categorias nativas/auto
representacionais: Frias escreve inscrito no universo significativo do
grupo dominante local. Assim, em sua reconstrução do passado traça um mapa
da composição da sociedade saltenha, construindo tipologias sociais
atravessadas por valorações raciais e morais. Ele retrata à sociedade
focalizando-se sobre a "classe superior", grupo que, segundo ele entende,
recebeu a herança nobre, patrícia e fidalga dos conquistadores espanhóis.
Na sua obra, Historia del General Martín Miguel de Güemes y de la Provincia
de Salta (1902), o autor produz a identificação recíproca que conjuga a
história da província à presença e atuação do herói gaucho, encarnando ele
o protótipo do autêntico ser saltenho: o gaucho decente.
Dentre os outros tipos sociais construídos por Frías, encontram-se o índio,
o negro e o mulato, a quem ele refere para destacar a superioridade racial
do criollo e do mestiço frente a eles. Aqui, o índio representa o
"selvagem", "encarnação da antiga raça cobriza americana", é o "dono das
fronteiras". A sua projeção espacial é a llanura chaqueña e a região de
montanha. Na fala de Frías, a selvageria faz deles gente que não conhece o
trabalho e serve para semear o temor.
O negro materializa a possibilidade de que aconteçam misturas
degenerativas, que acabem por produzir sujeitos com "todos os vícios
sociais". Os negros aparecem disseminados na "turba", eles são uma massa,
mas a diferença dos índios, seu local é a cidade. Eles conformam a "plebe
urbana", a "classe inferior", dos "pobres diabos". Frias resgata a
negritude, impregnada de valores negativos. Os negros têm inclinação
incurável para o licor, são "holgazanes" e "pendencieros". Aludindo às Leis
de Índias e sobre a base de valorizações de tipo racial e fenotípica,
define aos mulatos como a mistura resultante de "mães negras escravas com
homens decentes" – note-se aqui o bias de gênero instituído na
classificação, na qual as mulheres são negras e os homens são brancos. Eles
representariam traços de tipo africano por conta de suas "facciones toscas
y gruesas y el cabello lanudo". Aos negros e aos mulatos, dentro da
radiografia da sociedade saltenha que Frias compõe, correspondem-lhes os
"ofícios viles" e o "serviço doméstico". As mulheres negras escravas
somente são mencionadas com relação ao espaço que ocupam dentro da casa: a
cozinha.
Diferenciando-se do índio, o gaucho adquire uma significação particular e
status superior, imagem fundada na literatura do poeta saltenho Juan Carlos
Dávalos (1998 – 1959). "El gaucho es la primera, la más antigua, la más
eficaz adaptación del europeo a la naturaleza indígena, y por eso resulta
cronológicamente el primer argentino (...) es una raza…" (Dávalos 1928:
18). E Güemes possui tais qualidades, representando ao "gaucho hidalgo" é
dizer, ao senhor ou gaucho cholo. Esse ultimo, no esquema elaborado por
Frías, provém do grupo de "gente decente", que teria entre os seus
ancestrais personagens da nobreza espanhola e da nobreza peruana (as duas
de sangue real, sem mistura alguma com as "razas viles" de negros e
índios). Seus traços fundamentais seriam conformados por "honrados
sentimientos y caballerescas virtudes", junto com a pose de grandes
extensões de terras nos campos do norte, o qual faria deles "senhores
patrões das estâncias rurais".
O outro tipo de gaucho referido por Frías é o Gaucho colono. Esse tipo de
gauchos é composto por camponeses de Salta, peões rurais, empregados e
"capataces" dos grandes senhores. Frias os define pelo seu caráter pacifico
e ao mesmo tempo altivo. Afirma que ainda quando eles poderiam ser pobres
de dinheiro e faculdades, eram ricos em mérito, com diversas destrezas e
habilidades, homens rústicos, fortes para a dor, ginetes invencíveis para
cavalgar no monte. Destaca a sua aptidão para a subordinação, pois eles
tinham sido criados sob as máximas da ordem, da obediência e do trabalho.
Diz Frias, "su virtud es la sujeción moral y social al poderoso". Eses
gauchos teriam sido uma parte muito ativa nas glorias e triunfos da
América, e a tendência às ações independentistas seria uma condição natural
daqueles que aderiram à causa independentista do "gaucho Güemes".
Gauchos Pobres – Gauchos sim terra
À diferença da imagem estereotipada e localizada em valorações raciais,
naturalistas, onde o homem se finde com a paisagem em que são elaborados os
escritos locais, a representação do gaucho sobre a qual se constroem os
autodenominados "fortines de gaucho" fundam-se sobre outros critérios e
parâmetros de valoração.
Poderiamos dizer que os fortines são organizações de "gauchos pobres" e
"gauchos sem terra", e funcionam como espaços de encontro e identificação
dos "gauchos". Em termos históricos, a noção de fortín remete às
organizações de montoneras gauchas, que teriam sido o modo de organização
dos combates durante as primeiras décadas do século XIX, nas guerras pela
independência nacional. As montoneras eram "tropas irregulares", é dizer,
milícias sem formação militar, integradas pela população rural (índios,
gauchos e negros). Estima-se que a atuação destas organizações foi
determinante na consecução do triunfo, sobre o exército espanhol, para
liberar a "fronteira norte da pátria", a zona que limita com Peru, e que
essas tropas irregulares tiveram como "lider" e "condutor" ao general
Martín Miguel de Güemes.

Atualmente, existem na província de Salta mais de 100 fortines gauchos,
entre aqueles da capital e outras localidades departamentais (Salta está
dividida políticamente em 23 departamentos). O numero de membros, ou
sócios, dos fortines, é variável: ele oscila entre 10 e 50 pessoas. Essas
agrupações cumprem diferentes funções, e os membros se congregam nelas por
diferentes motivos, mas principalmente porque compartem e valorizam as
"tradições" gauchas, as "destrezas camperas" e os costumes vinculados ao
modo de vida rural, às atividades relacionadas com gado e com cavalos
(entre as atividades organizadas por eles podem ser destacadas as marcadas,
pialadas e capadas, todas elas vinculadas à manipulação da fazenda).
Em termos gerais, os fortines estão integrados por homens, e mesmo que
possa participar a família e outros parentes, é um espaço principalmente
associado à masculinidade, "hombria", fortaleza, etc. Seus membros são,
majoritariamente, gauchos pobres, que vivem ainda no "campo" (são
pastajeros, arrenderos, puesteros, peões), ou que migraram para as cidades
na procura de emprego, e ainda que já não moram no campo, mantém viva a
memória das suas tradições "camperas". Eles se auto denominam, em alguns
casos, como gauchos sin tierras.
Em seus relatos, quando definem e explicam o que significa para eles ser
gaucho, deslizam-se por diferentes matrizes explicativas. Por uma parte,
referem à sua condição e origem rural, o que envolve um conhecimento sobre
a forma de vida no campo e sobre as atividades de subsistência. Sobre essa
base, eles se consideram gauchos a partir da possessão de um saber-fazer,
um conhecimento prático: "Gaucho es el que sabe montar, pialar, capar,
ordeñar, enlazar, etc.",
Por outra parte, gaucho é aquele que sabe fazer as coisas do campo, que
pode fazer os laços, as vainas para as facas, colocar a cadeira para montar
um cavalo, curar aos animais, etc. em relação com essa matriz, eles
consideram que há gauchos de fantasia, que são aqueles que usam a
vestimenta do gaucho mas que não sabem fazer nada. Esta valoração de si
próprio como gauchos verdadeiros e a desqualificação dos outros sobre a
base do reconhecimento é, talvez, a única possibilidade para eles de se
sentirem poderosos. Aqui, o seu saber é o seu poder. Historicamente, de
acordo com as configurações sociais que tiveram lugar em Salta, onde a
estrutura de propriedade da terra caracterizou-se fundamentalmente pela sua
concentração em latifúndios,os camponeses estiveram submetidos a diferentes
formas de sujeição e subordinação extra-econômicas para poder aceder a uma
parcela de terra onde criarem aos seus animais.
A representação do gaucho de fantasia é, em certo sentido, uma metáfora
para representar ao patrão da fazenda, ao dono da terra, aquele que não tem
o saber, mas tem o poder, econômico e também político. Dadas as formas de
distribuição do poder na sociedade saltenha a inícios do século XX, os
proprietários da terra têm sido também os dirigentes políticos,
configurando os "grupos oligárquicos" que os estudos históricos chamaram de
"aristocracias provinciais" ou "elites provinciais". Esses grupos se
conformaram como tais também a partir das representações sobre si próprios
que construíram, por meio de intelectuais e porta-vozes autorizados, como
"gente superior" racial e moralmente, e como aqueles que foram escolhidos
para levar diante a condução da sociedade, os "nascidos para governar".
Outra matriz, pela qual o fato de "ser gaucho" desliza-se, é a da
identificação: "somos gauchos porque nos gusta", atravessada por outro
componente, "somos gauchos porque lo llevamos en la sangre" e "porque lo
sentimos desde adentro". Para muitos, esse ser gaucho é inexplicável, e não
pode ser definido porque se sente desde muito dentro de si próprio, desde o
mais fundo.
Um terceiro recorrido que fazem os relatos ao se referir ao "ser gaucho" é
aquele que se concentra sobre a atitude. O ser gaucho corresponde-se com um
jeito de ser e de se relacionar com os outros, e envolve a predisposição ao
gesto solidário. Gaucho é aquele que faz gauchadas, é dizer, quem
compartilha, ajuda e tende a sua mão para quem o necessita. Isto significa
anular todo tipo de egoísmo, se doar e dar aos outros.
Comentários às convergências entre os dois casos
À modo de comentários finais do esboço comparativo que ensaiamos nas
páginas precedentes, gostaríamos de nos deter naqueles pontos de encontro
que habilitam uma reflexão por meio do diálogo dos processos de construção
de imaginários a respeito do Nordeste brasileiro e do Noroeste argentino.

Anteriormente, observamos como a representação sobre ambas as duas regiões
expressa carências, no caso brasileiro o Nordeste é tido como o corpo da
miséria, é dizer, de pobreza material. No caso argentino, o Noroeste
conforma-se como o espaço do vazio, da ausência de modernidade e de
civilização, é a região do atraso. Porém, nos dois casos há uma exaltação,
compreendida por versões revisionistas da história tanto como por
folcloristas nacionais, que ponderam os valores simbólicos destas regiões
as quais, ao mesmo tempo que são excluídas dos processos de modernização
econômica dos países aos quais elas pertencem, são elevadas como berço da
nacionalidade em termos de manutenção de certa cultura e tradições locais.
Para isso, há uma resignificação de alguns tipos sociais historicamente
marginalizados, como acontece no caso das mulheres-negras. Porém, para o
caso do noroeste argentino, a imagem de gaucho que é recuperada é aquela
estetereotipada,, construída pelos discursos de élite, dissimulando desta
forma as tensões e desigualdades, a dimensão conflictiva, que se evidencia
ao reconhecer a existência de "gauchos pobres e sem terra".
As elites regionais, ainda quando se propusessem elaborar esquemas
interpretativos que contestassem as visões centradas nas grandes capitais
(Buenos Aires, para o caso argentino; São Paulo, para o caso brasileiro)
reproduziram no interior de seus espaços regionais as desigualdades
sociais, cristalizando-as e projetando-as em categorias de alterização e
inferiorização.
No caso do nordeste brasileiro, as desigualdades étnicas, raciais e de
gênero ficam diluídas em uma noção ampla, ambígua e "imaterial" de
sertanejo, síntese da vontade política de projetar um tipo ideal que,
paradoxalmente, inclui e, ao mesmo tempo, nega e omite a diversidade e a
desigualdade. No caso argentino, de forma similar, o ideal civilizatório da
construção de uma nação europeizante fez uso do recurso da mestiçagem. A
exaltação do gaucho como o tipo representativo da cultura nacional
materializa a intenção de demarcar um novo origem à identidade argentina,
elaborando um mito fundador, sobre a negação e invisibilização das
populações existentes em seu território. O novo sujeito da identificação
nacional –o gaucho mestiço e criollo – fusiona em si mesmo o encontro entre
os nativos e os colonizadores, apagando, nessa operação, as marcas das
relações de escravidão, exploração, dominação e extermínio que as
atravessam.
Para o caso do Noroeste argentino, as elites intelectuais e dirigentes se
proclamaram a si mesmas como "classe superior" e "gente decente", por meio
da construção de alteridades internas inferiorizadas, tais como "negros
holgazanes" ou "índios selvagens". A representação de sujeitos inferiores,
justificada num discurso racista, esteve acompanhada da aplicação de juízos
morais, os inferiores eram, ademais, depositários de todos os vícios e
degenerações sociais. No caso nordestino, isso foi explícito na
inferiorização do negro e do indígena, ainda a partir do discurso das três
raças instituído a partir de Gilberto Freyre. A mestiçagem, assim, é um
processo que existe, mas um processo que nunca cessa de ter, como
contraponto, uma diferenciação e clara delimitação entre as chamadas três
raças. Assim, a idéia atual não é que as três raças misturaram-se em um
passado remoto, e deram origem ao mestiçagem como nova chave de
interpretação das diferenças. Muito pelo contrário, neste imaginário
nacional as raças encontram-se fortemente diferenciadas entre si, e o
pertencimento subjetivo a elas é reforçado pelas atuais políticas de
reconhecimento de direitos diferenciais. O paradoxo de tais iniciativas é
que elas, ao mesmo tempo que tentam combater o racismo, reproduzem as
categorias de cunho racista com as quais a sociedade define brancos, negros
e índios como tipos ideais. O peso de tais categorias, impostas desde a
pedagogia escolar, as visões folclóricas, os programas de políticas
públicas e a mídia, é resignificado nas subjetividades dos sujeitos, os
quais podem contestar ou bem fazer uso dos atributos que podem ser postos
em cena a partir da ascrição a tais identidades. Elas, que no momento atual
são altamente marginalizadas e altamente visibilizadas, apresentam a
expressão das contradições das lógicas dos discursos de elite sobre as
vivências dos sujeitos sociais, e a situacionalidade impressa em cada uma
destas identidades sociais.
Nos discursos dominantes das duas regiões, são exaltadas as figuras
masculinas e mestiças. Dentro do contexto destas sociedades, hierarquizadas
e organizadas em torno da autoridade masculina, eles aparecem como o
aspecto mais visível. No âmbito do público, da vida política, o espaço é
masculino por excelência, enquanto o doméstico é o âmbito de domínio da
mulher branca. Elas organizam as tarefas, enquanto são as mulheres negras
as que as executam. No caso do Noroeste argentino, das configurações da
estância rural deriva a figura da criada, mulher que pudendo ser indígena,
mestiça ou negra, mantinha uma relação servil com o patrão e a dona de
casa. a criada, mesmo que não se encontrasse dentro de um regime de
escravatura propriamente dito, era reconhecida como parte das poses dos
patrões. Eles podiam exercer poder sobre seus corpos. Não só através de
castigos físicos e extração da força de trabalho, mas também das relações
sexuais cujo fruto eram os hijos ilegítimos dos senhores.
Finalmente, podemos dizer que, perpassando as estratégias de saber-poder
dos discursos regionais e de construção de tipos sociais na elaboração do
pensamento nacional dos dois países, é desde as representações que têm
sobre si mesmos os sujeitos sociais marginalizados que podem tais discursos
serem contestados. As auto imágenes podem ter a capacidade de empoderar os
sujeitos, habilitado-os para o exercício progressivo de direitos: à
diferença, à expressão, à decisão sobre suas próprias auto imagens a partir
de políticas de representação fixadas localmente. Tal é o caso dos membros
dos fortines gauchos de Salta e das mulheres da Boa Vista dos Negros no
Seridó. No caso dos primeiros, a valoração do autoconhecimento e do saber-
fazer lhes permite enunciar estratégias de sublimação de relações
históricas de dominação por parte dos senhores gauchos, dos patrões de
estância. A metáfora do gaucho de fantasia é um recurso que dinamiza esse
processo de autopositivação. No caso das mulheres negras da Boa Vista, elas
empoderam-se desde o exercício da alteridade a partir do próprio corpo e da
exaltação de uma beleza naturalizada na figura da mulher negra, elaborando,
em fim, discursos que discutam idéias de beleza hegemônica traçadas a
partir dos imaginários da branquitude ainda pouco explorados, mas
persistentes, da sociedade brasileira.
Tanto em um como em outro caso, os atores sociais marginalizados
revalorizam as suas práticas na generosidade, na doação, nas atitudes
solidárias. Tais códigos não estão isentos, porém, de conflito com outras
arenas da vida social. Assim, as identidades marginalizadas que têm sido
exaltadas por discursos reivindicatórios ou pelas políticas diferenciais
deverão guardar para si o poder de se nomear a si mesmas e de mudar de
nomeação, se for necessário, fugindo das estratégias de naturalização da
alteridade que pouco contribuem, de fato, para a manutenção de uma
sociedade mais justa.

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-----------------------
[1] O decreto 488-7, 20-11-2003 regula o procedimento para a identificação,
reconhecimento, delimitação e titulação da terras por comunidades
remanescentes de quilombos.
[2] Domingo Faustino Sarmiento (1811 – 1888), nas suas ações como
político, pedagogo, escritor, docente, jornalista, estadista e militar
argentino, fez da educação e da promoção da educação o motor do seu
projeto de "civilização" e progresso da Argentina. Escreveu pioneiros
ensaios onde elaborou um modelo dual de mundo: por una parte, o pólo da
civilização e pela outra, aquele da barbárie. Desempenhou cargos como
Governador da província de San Juan, presidente da Nação (entre 1868 e
1874) e como Ministro do interior.
Bartolomé Mitre (1821-1906) da mesma forma que Sarmiento foi reconhecido
como político, militar, historiador, homem de letras, estadista e
jornalista. Ocupou cargos como governador da Província de Buenos Aires e
foi Presidente da Nação Argentina entre 1862 e 1868. Seus escritos
históricos são valorizados como a primeira História Oficial Nacional. Seu
estilo, reivindicatório das glorias de Buenos Aires, a sua concentração em
grandes figuras heroicas e de inspiração fortemente eurocêntrica, tem
originado uma escola histórica denominada mitrista.


[3] Dalmacio Vélez Sarsfield - Córdoba (Argentina) 1800 - 1875. Foi
advogado e político argentino, autor do Código Civil de Argentina de 1869,
a maior parte do cual ainda continua em vigência. Nestes estudos
históricos, Vélez elabora uma nova perspectiva para interpretar o passado
argentino, iniciando un movimento revisionista que aponta ao reconhecimento
e "resgate" das figuras do interior do país que tinham sido invisibilizadas
pela história escrita desde Buenos Aires e os ilustrados portenhos.
[4] Difundió-se, entre outros escritos, em um panfleto chamado La república
argentina 37 años después de la revolución de Mayo (III 229-242. Alberdi
1847. En Shumway 1993:196).
[5] Dentre a literatura gauchesca pode-se destacar ao Martín Fierro de José
Hernández. A primeira parte da obra apareceu em 1872 e a segunda (La vuelta
de Martín Fierro), em 1879. No personagem de Martín Fierro, Hernández
apresentou um gaucho idealizado, que representava todos os gauchos,
descrevendo a sua forma de vida, de se expressar e de pensar. A narrativa
gauchesca começa a ser desenvolvida a finais do século XIX e durante a
primeira década do século XX alcançou popularidade, propiciada pelo clima
festivo do centenário da Independência Nacional (1910).
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