Gêneros textuais no livro didático

July 6, 2017 | Autor: Raquel Haua | Categoria: Generos Textuais
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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Livro produzido pelo projeto Para ler o digital: reconfiguração do livro na cibercultura - PIBIC/ UFPB Departamento de Mídias Digitais - DEMID / Núcleo de Artes Midiáticas - NAMID Grupo de Pesquisa em Processos e Linguagens Midiáticas - Gmid/ PPGC/UFPB

ROSEANE NICOLAU Gêneros Textuais no Livro Didático de Língua Portuguesa

Coordenador do Projeto: Marcos Nicolau Editoração Digital : Danielle Abreu Capa: Rennam Virginio

N639g

Integrantes do Projeto: Danielle Abreu Ewerton Neves Filipe Almeida Luan Matias Marriett Albuquerque Rennam Virginio

Nicolau, Roseane Gêneros textuais no livro didático de língua portuguesa./Roseane Batista Feitosa Nicolau. - Edição digital - João Pessoa: Editora Ideia, 2012. 202p. ISBN: 978-85-7539-701-5 1. Prática de Ensino. 2. Criatividade 371.315(043)

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João Pessoa - 2012

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Av. Nossa Senhora de Fátima, 1357, Bairro Torre Cep.58.040-380 - João Pessoa, PB www.ideiaeditora.com.br

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A minha mãe (in memoriam), que sempre fez de tudo para eu estudar, indo aos portões dos colégios de madrugada garantir a minha vaga na escola pública; aos meus filhos, Vítor e Lucas, minha riqueza; e, ao meu marido, Marcos, meu companheiro e cúmplice.

“ ... mas quem nos dirá se o caminho seguido não tem mais interesse do que o ponto de chegada?” (Todorov)

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3 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, GÊNEROS TEXTUAIS E LIVRO DIDÁTICO ........................81

SUMÁRIO

Apresentação.......................................................10 1 GÊNEROS: DA REALIDADE HISTÓRICA À REALIDADE DISCURSIVA...............................................22

1.1 Os gêneros na Poética: visão clássica e moderna..........................................................24 1.2 Os gêneros na Retórica: ênfase à natureza verbal do enunciado e a seus princípios constitutivos..........................................38 1.3 Os gêneros na Linguística: estudo dos discursos cotidianos...........................................41 2 DESDOBRAMENTO DA CONCEPÇÃO DE GÊNERO: CLASSIFICAÇÃO E ASPECTOS SÓCIO-HISTÓRICOS .......................................50

2.1 Adam: sequências textuais ..............................................51 2.2.Bronckart: a Linguística e seus aspectos sócio-interacionais .................................................54 2.3 François: gêneros, condições sociais e marcas linguísticas .................................................................58 2.4 Marcuschi: gênero no contexto linguístico................61 2.5 Schneuwly e Dolz: gêneros como instrumento de ensino e progressão didática....................................................................68

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3.1. Parâmetros Curriculares Nacionais: diretrizes para o ensino de língua materna......................81 3.2. Livro Didático: fazer discursivo e ideológico...........92 3.3. Novas concepções de texto e gênero e reformulação do livro didático............................................102 4 ANÁLISE DA COLEÇÃO DIDÁTICA SELECIONADA....... 108

4.1 Organização da coleção didática e apresentação da teoria dos gêneros................................ .108 4.2 Seleção e agrupamento dos Gêneros........................120 4.3 Características e diferenças dos gêneros abordados..........................................................140 4.4 A poesia no agrupamento dos gêneros...................142 4.5 O Gênero como pretexto para o estudo gramatical......................................................143 4.6 A produção oral e escrita e a variante empregada.................................................................146 4.7 A contextualização............................................................154 4.8 A temática presente, a produção e o estudo textual.....................................................................158 CONCLUSÃO.....................................................................177 REFERÊNCIA.....................................................................188 ANEXOS............................................................................196

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Schneuwly, Dolz, Pasquier - vêm adotando a noção de gênero como um instrumento com o qual é possível ampliar a competência textual e discursiva dos alunos. APRESENTAÇÃO

No

nosso

país,

chama-nos

a

atenção,

particularmente, os grupos de pesquisadores liderados por Rojo (1998), Brandão (2000), Marcuschi

Nas décadas de oitenta e noventa do século XX, o

(2000), Meurer (2000) que se voltam para o estudo

processo de ensino e aprendizagem da língua começa

dos gêneros na língua, indicando-os como forma de

a tomar um novo rumo no nosso país, centrando-

melhorar a qualidade do nosso ensino.

se numa visão sócio-interacionista da linguagem,

Vistos dessa maneira, os gêneros permitem

surgiram novos paradigmas. Entre esses paradigmas, o

uma maior abertura e aceitação, na sala de aula, de

de gênero vem sendo apontado como um caminho para

textos que circulam socialmente, além de ser um

a melhoria do ensino de língua, precisamente porque

estímulo ao estudo da língua a partir das muitas

a sua prática pode auxiliar os alunos a perceberem

formas de manifestações orais e escritas.

quem são e onde se encontram no contexto social,

Assim, a competência textual e discursiva do

e mais, como os textos funcionam e como revelam a

aluno é ampliada. Esse passa a compreender, de

cultura atual. Também pode ajudar na compreensão

forma crescente, as práticas discursivas e as relações

de culturas de outras épocas, permitindo que os

sociais associadas ao uso dos diversos gêneros.

alunos sejam capazes de compreender o mundo. E

Familiarizando-se e adquirindo o domínio da

isso é mais que aprender a ler e escrever. Como

participantes

desse

diversidade textual, o aluno participa do exercício

processo,

de uma cidadania consciente.

pesquisadores ligados à Universidade de Genebra Capa

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Essas competências - textual e discursiva eLivre

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podem ser adquiridas no contexto escolar através

fenômeno empiricamente realizado nos discursos

de um trabalho sistemático proporcionado pelo

cotidianos” (2000, p.10).

professor e por material de apoio como o Livro

Os métodos e técnicas que permitem interpretar

Didático (LD) que, nas nossas escolas, tornou-

e compreender um determinado texto não podem

se peça fundamental, chegando a reger todo o

ser simplesmente transportados para outros, pois

conteúdo que será visto pelo aluno. O Livro Didático

cada gênero requer uma abordagem específica. No

auxilia o professor na passagem da transmissão

entanto, ainda hoje, livros didáticos e professores

da forma de língua oral a língua escrita, tendo os

desinformados submetem todos os textos a um

gêneros, de acordo com Dolz e Schneuwly (1996),

único tratamento.

como organizadores do planejamento curricular.

Para que se operem novas transformações na

O conteúdo dos Livros Didáticos que contempla

relação ensino e aprendizagem, faz-se necessário,

o estudo dos gêneros passa a ser a porta para

cada vez mais, um redimensionamento na forma de

outros textos como: programas televisivos, filmes,

trabalhar os gêneros na escola. Hoje, tendo como

músicas, bate-papo, pesquisas; pois o que interessa

base recentes estudos da Linguística Aplicada,

é atribuir significado a partir de um momento e de

vemos que é esse trabalho deve estar centrado na

um contexto, bem como, dar sentido ao estudo e à

caracterização dos diferentes gêneros textuais em

aprendizagem.

seu aspecto formal e discursivo.

O problema, conforme Marcuschi, não é mais a

Brandão (op. cit) afirma que é preciso

ausência da diversidade textual nos Livros Didáticos

redimensionar a forma de se trabalhar a linguagem

ou na sala de aula, e sim, a maneira como está sendo

e o texto, alcançando-se nesse, a sua dimensão

desenvolvido o trabalho com essa diversidade,

discursiva,

que não deve perder de vista a “concepção sócio-

interacionista de linguagem. Nas próprias palavras

interativa da língua” e a noção de texto “enquanto

dessa pesquisadora:

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proposta

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na

concepção

sócio-

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textuais quantas situações sociais, ou seja, que é

Uma abordagem que privilegie a interação não pode estudar o texto de forma indiferenciada, em que, qualquer que seja o texto, vale o mesmo modo de aproximação. Uma abordagem que privilegie a interação deve reconhecer tipos diferentes de textos, com diferentes formas de textualização, visando a diferentes situações de interlocução. (BRANDÃO, 2000, p. 17-18).

praticamente impossível uma classificação de todos os gêneros existentes. Mesmo assim, é conveniente uma classificação que possa organizar o texto no espaço escolar para um melhor estudo e observação dos princípios gerais e específicos estruturadores dos textos. Essa

Por isso, se faz necessário o estudo e o

classificação, na prática do ensino brasileiro, é dada

reconhecimento dos vários gêneros que circulam

pelos PCN (1998).

socialmente e de todas as relações existentes

Foi para analisar de que forma essas propostas

e possíveis no processo discursivo presentes

estão

nesses gêneros, que são, no momento, questão

encaminhadas

por

estudiosos

presente estudo, dividindo-o em quatro partes

ensino.

distintas.

Dolz e Schneuwly (op. cit.), a partir da noção

A primeira parte nos permite conhecer as

de gêneros do discurso bakhtiniana, agrupam

origens e o desenvolvimento da noção e da

os gêneros textuais em cinco ordens: do narrar,

classificação dos gêneros da era clássica ao século

do relatar, do descrever, do argumentar e do

XX, nos estudos literários, retóricos e linguísticos até

prescrever; facilitando, assim, a classificação e a

as concepções de Bakhtin. Nesta parte percebemos

operacionalização didática dos gêneros discursivos

que houve uma mudança de foco: os gêneros eram,

na elaboração de programas, projetos e currículos

praticamente, classificados e estudados no contexto

voltados para o ensino e aprendizagem, embora os

literário e, agora, passaram a ser estudados no

autores estejam cientes de que há tantos gêneros

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sendo

francofônicos e brasileiros que desenvolvemos o

fundamental nos estudos de língua aplicada ao

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âmbito da língua. eLivre

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A parte seguinte contempla os desdobramentos

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estudos da equipe de Genebra (Dolz, Schneuwly,

e usos do termo gênero nos estudos linguísticos,

entre outros).

a partir de Bakhtin até as considerações recentes

A análise verte-se sobre conteúdo, tanto

sobre gêneros como instrumentos de ensino e

teórico quanto prático, exposto na coleção didática,

aprendizagem, apresentadas pela equipe de Genebra.

confrontando-o com as recentes discussões sobre

Nesse contexto percebemos que os gêneros tomam

os gêneros textuais, sem perder de vista o padrão

uma importância linguística e passam a serem vistos

de qualidade a ser atingido pelo LD, uma vez que,

como uma ferramenta no ensino e aprendizagem

esse material é, em algumas localidades do nosso

da língua.

país, a única fonte de consulta e estudo disponível

Na terceira parte encontra-se uma breve

para os alunos e professores.

explanação do encaminhamento dado à teoria

O enfoque central na abordagem da coleção

dos gêneros no ensino e aprendizagem de língua,

didática é o tratamento, a aplicação e a progressão

proposto nas diretrizes dos PCN como um meio de

dos gêneros textuais, bem como, as características

organizar, dinamizar e resgatar as diversas formas de

enunciativas, visando à ampliação da competência

dizer que circulam socialmente. E, ainda nessa parte,

textual-discursiva do aluno. Proposta presente na

destacamos o papel do Livro Didático, o seu fazer

concepção de gênero como instrumento de ensino

discursivo e ideológico, a sua função de divulgação

e aprendizagem, que comunga, primeiramente,

e aplicação de teorias linguísticas; e ainda, como

com a concepção de gênero do discurso de Bakhtin

suporte para o estudo de gêneros variados.

e, depois, com teóricos que desenvolveram a teoria

A quarta e última parte contempla a análise

bakhtiniana no estudo da língua.

de uma coleção didática que aplica a teoria dos

A fim de obter uma visão sistemática e

gêneros nos moldes propostos pelos PCN ao estudo

circunstanciada, passaremos a analisar a posição

da língua e tem como suporte teórico declarado os

da coleção quanto à teoria de base apresentada

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no Manual do Professor e aplicada no Manual

2. A coleção didática desperta o aluno para a

do Aluno, sua organização e progressão, como

riqueza que envolve o uso efetivo da língua e dos

objeto didatizante. Sempre que necessário, serão

gêneros como um patrimônio do qual eles não

transcritas passagens dos manuais com o objetivo de

podem abrir mão?

contextualizar as questões levantadas e observações

3. O fazer discursivo presente na coleção didática

teóricas pertinentes e oportunas.

em análise facilita e contribui para aprendizagem dos

Antes, o estudo dos textos era voltado para

gêneros textuais e sua utilização fora do contexto

uma classificação tipológica. Agora, com o estudo

escolar?

dos gêneros, gerou-se uma mudança de paradigma

4. São abordadas estruturais que caracterizam

que exige uma perspectiva de trabalho voltada

os gêneros apresentados, bem como, seu aspecto

para o uso da língua como atividade cognitiva e

sócio-histórico-cultural?

interativa, uma vez que, quando se fala ou se escreve

5. Esses manuais contribuem para que o aluno

potencializa-se determinadas estruturas de acordo

se torne um produtor de sentido e não apenas uma

com sua intencionalidade, bem como, aspectos

analista de textos?

sociais e históricos. Visualizando esse contexto,

O corpus desta análise constitui-se de quatro

elaboramos algumas questões pontuais que vão

manuais didáticos da coleção Todos os textos: uma

reger nossa pesquisa:

proposta de produção textual a partir de gêneros e

o

1. A coleção didática em análise propõe

projetos (1998), de William Roberto Cereja e Thereza

aprendizado

Cochar Magalhães, publicado pela Editora Atual.

da

linguagem

visando

ao

desenvolvimento da competência discursiva do

A coleção em análise corresponde a um total de

aluno por meio do uso de um número crescente de

517 páginas impressas, incluindo Sumário, Manual

gêneros textuais em favor de uma formação crítica

do Professor e Bibliografia. Esse tipo de coleção

e consciente?

geralmente é adotado por professores que ensinam

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redação e que têm, como meta principal, trabalhar a

equipe de Genebra no que tange a teoria dos gêneros,

leitura e a produção textual.

faz um uso predominantemente formal desses.

O critério de seleção desse corpus deve-se

A partir do LD em análise constata-se que ainda

à presença e à aplicação da teoria dos gêneros,

não há um estudo dos gêneros em sua completude,

que, como já foi dito, vem sendo desenvolvida

uma vez que não se consideraram valores, crenças e

por uma equipe de Genebra e que já se encontra

projetos políticos na construção do significado do texto.

incorporada nos PCN. Essa teoria, apresentada na

Em suma, ainda não se contempla a dimensão

segunda parte dessa pesquisa, tem como proposta

textual-discursiva presente nos múltiplos gêneros

o ensino centrado no uso interativo da língua, uma

existentes hoje, o que seria primordial no ensino,

vez que, os indivíduos quando se comunicam não

para ao desenvolvimento de uma consciência crítica

trocam orações, palavras; mas enunciados que se

que demonstra que a linguagem reflete e refrata as

constituem de recursos formais da língua (gramática

relações sociais.

e léxico) bem como de recursos extralinguísticos (contexto, situação de produção etc).

Com o

estudo dos gêneros textuais, flagra-se a essência dos enunciados, suas inúmeras formas de dizer, a interação e a posição dos interlocutores enquanto cidadãos do mundo. A conclusão dos nossos estudos aponta para o fato de que a teoria dos gêneros começa a penetrar na sala de aula por meio dos Livros Didáticos de forma incipiente. O Livro Didático analisado, mesmo adotando as propostas dos PCN e seguindo as orientações da Capa

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enunciação, é que se começa a pensar nos gêneros fora dos limites da literatura e do enquadramento da Poética: lírico, épico e dramático, e da Retórica Antiga. 1 GÊNEROS: DA REALIDADE HISTÓRICA À

Esta ênfase dada aos gêneros, na atualidade, por

REALIDADE DISCURSIVA

parte da linguística, tem grande importância para os estudos da área, devido à diversidade de textos que circulam no meio social, sobretudo, em tempos atuais

A noção de gênero, tradicionalmente abordado

em que passamos a ver que a linguagem é adquirida

pela teoria literária e pela retórica, hoje, ressurge

através dos gêneros e que o conhecimento desses

sob diferentes óticas em diversas tendências dos

é indispensável para a interpretação e produção de

estudos linguísticos.

textos, contribuindo para a formação de cidadãos

Nesta parte, veremos as mais significativas noções

críticos e participativos.

e classificações dos gêneros desde os antigos - que

Acerca dos estudos dos gêneros na era clássica

nos legaram um expressivo patrimônio cultural – até os

e nas eras subsequentes, convém, observar o

dias de hoje, no contexto do ensino e aprendizagem;

histórico fornecido por teóricos como Wellek e

e, ao mesmo tempo, conheceremos a evolução dessas

Warren (1957), Silva (1973), Todorov (1986), Reboul

noções e classificações por meio dos estudos literários

(1998), Perelmen (1996), bem como, a visão da era

até o advento da Linguística, da Teoria da Enunciação

saussuriana e pós-saussuriana (Brandão, 2000).

e da Teoria dos Gêneros do discurso. Os gêneros foram uma preocupação primeira da Poética e da Retórica. Recentemente, quando a Linguística volta-se para o estudo do texto e da Capa

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1.1 Os gêneros na Poética: visão clássica e moderna

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Esta tripartição platônica foi a primeira referência teórica de classificação dos gêneros que se tem

A teoria dos gêneros, de Platão a Hegel, foi

conhecimento; porém, esta divisão, dada por Platão,

tomada como objeto primordial da Literatura que,

vai ser abolida no seu livro X da República que, de

segundo Bakhtin (2000, p. 280), tratou de estudar e

acordo com Silva (1973, p. 204) ao procurar “captar

classificar o assunto pelo “ângulo artístico-literário

a universalidade e a unicidade da arte, despreza

(...) e não enquanto tipos particulares de enunciados

a arte como poikilia, isto é como multiplicidade e

que se diferenciam dos outros tipos de enunciados,

diversidade”. Na sequência, surge a obra A Poética, de

com os quais têm em comum a natureza verbal (linguística)”.

Aristóteles, que se constitui, “na primeira reflexão

No livro III da República, Platão apresenta

profunda acerca da existência e da caracterização

três grandes divisões da arte poética: o lírico, o

dos gêneros” (Silva, op. cit. p. 204).

épico e o dramático. Na poesia lírica, encontramos

Aristóteles, leitor da obra de Platão, considera

a própria persona do poeta, na revelação e no

dois gêneros: o narrativo (épico) que, na sua

aprofundamento do seu próprio eu, na imposição

concepção, se dá quando o narrador narra em seu

do ritmo, da tonalidade das dimensões desse eu.

próprio nome ou assumindo personalidades; e o

Na poesia épica (ou no romance) o poeta faz as

dramático que ocorre quando os atores representam

suas personagens objetivarem, em discurso direto,

diretamente ação com personagens vivas e atuantes.

coisas e acontecimentos; e, no drama, o poeta

Essa divisão fundamenta-se em elementos relativos

desaparece por trás do elenco de personagens. O

ao conteúdo estabelecido, e, também, em elementos

drama, desde o tempo dos gregos, é considerado

relativos à forma, distinguindo o processo narrativo

uma arte literária mista, por implicar, também, um

usado no poema épico, e o processo dramático

espetáculo.

usado na tragédia. Resumidamente, a divisão dos

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gêneros na visão aristotélica seria fundamentada na

por isso, considerada um “gênero maior”; a comédia

forma, conteúdo e atitudes do poeta. É interessante

apresenta em geral personagens e problemas da

observar que Aristóteles não estudou o gênero lírico

burguesia, sendo, portanto, um “gênero menor”.

de forma ordenada, mas em partes perdidas da sua

Seguindo esses preceitos elaborados por

obra, como assevera Silva (op.cit.).

Aristóteles e por Horácio formulou-se a regra

Horácio, antes da era cristã, reforça os

da unidade de tom, que vem separar ainda mais

preceitos aristotélicos, na sua Epistula ad Pisones,

os gêneros que passam a ser concebidos como:

concebendo os gêneros literários, com sua tradição

“uma espécie de essência eterna, fixa e imutável,

formal, caracterizados por uma “unidade de tom”,

governada por regras específicas e igualmente

mediante um conteúdo específico. Todavia, nesta

imutáveis” (Silva, op.cit. p. 208).

mesma obra, Horácio defende a existência de um

A regra da unidade de tom começa a ser

terceiro gênero: o lírico, presente em obras como

minada pelo aparecimento de novos gêneros, que

as Odes, do próprio Horácio, o Cancioneiro, de

negam os modelos e regras consideradas absolutas.

Petrarca as quais apresentam as reflexões do poeta.

Identificamos isso no Barroco que, além de conceber

A Epístola de Horácio assume uma posição de

o gênero como uma entidade histórica, passível de

destaque na evolução da concepção e classificação

evolução, admite a criação de novos gêneros, bem

de gênero, influenciando, assim, a Poética e a

como sua heterogeneidade.

Retórica dos séculos XVI, XVII e XVIII. Vemos que,

Inicia-se uma época de debate entre antigos

apesar do acréscimo do lírico na classificação dos

e modernos, isto, sobretudo, no século XVI e XVII,

gêneros, não se deixou de se seguir os preceitos

ao se reconhecer uma evolução nos costumes, nas

da concepção clássica de que um gênero se difere

crenças, na organização social. As lições dos clássicos

do outro pela forma, conteúdo e pela hierarquia. A

não representam, para os modernos, preceitos

epopéia seria a expressão eloquente do heroísmo e é,

válidos atemporalmente.

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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No século XVIII, há um retorno muito forte ao

Inúmeros autores se ocuparam desta matéria,

ideal clássico através das correntes neoclássicas e

sem que, contudo, o problema da classificação dos

árcades, porém o relativismo dos valores estéticos

gêneros fosse resolvido:

aparecia nas obras que despontavam, ou seja, as

Hegel

(apud

Silva,

op.cit.)

reestrutura

a

obras deste século já não possuíam o estatuto de

tripartição platônica: lírica, épica e dramática, através

realizações supremas dos gêneros clássicos.

da relação dialética entre sujeito-objeto: a lírica seria o gênero subjetivo; a épica, o gênero objetivo; e a

Ainda no século XVIII, surge um movimento germânico conhecido como Sturm und Drang que,

dramática, o subjetivo- objetivo.

ditado pela ânsia de liberdade, rebela-se totalmente

Na França, Boileau, segundo Silva ( op.cit),

contra a teoria clássica dos gêneros e das suas regras.

apresenta a seguinte tipologia: a pastoral, a elegia,

Este

movimento

pré-romântico

prega

a

a ode, o epigrama, a sátira, a tragédia, a comédia e

individualidade e a autonomia de cada obra

a épica, porém sem definir a base dessa tipologia,

literária, e considera descabida a partição dentro

apresenta um sistema de gêneros definitivamente

de uma atividade criadora única, condenando,

estabelecido. Lessing, por sua vez, opondo-se a

assim, a existência dos gêneros. Tal atitude não foi

Boileau, (TODOROV, op.cit. p. 36-37), afirma que

aceita de todo pelos românticos, que reconheciam

o sistema dos gêneros é aberto, não pré-existe

a multiplicidade e diversidade dos gêneros, mesmo

necessariamente à obra e que um gênero pode

afirmando o caráter absoluto da arte.

surgir ao mesmo tempo em que uma obra.

Ainda conforme Silva (op. cit.), foram

Para Victor Hugo (Silva, op.cit.), os gêneros estão

estabelecidas novas teorias dos gêneros a partir

associados a estágios por que passa a humanidade:

dos românticos que não se fundamentavam mais

o lírico é a infância, o épico é a fase viril e da luta,

unicamente em elementos externos e formalistas,

o dramático corporifica os tempos modernos,

mas, sim, em elementos intrínsecos e filosóficos.

pintando o homem nas grandezas e nas misérias

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Referências

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da sua humanidade. No drama está a tragédia, a

exemplo nos é dado ainda por Peixoto (1932), que ao

comédia, a ode, a epopéia, havendo uma mistura

fazer um breve passeio na classificação dos gêneros

de gêneros, onde residem a verdade e a beleza, ou

ao longo do tempo, frisou que Os Sertões, de

seja, Victor Hugo descarta a pureza dos gêneros.

Euclides da Cunha não tem classificação precisa na

A mistura de gêneros se revela no teatro e em

Retórica tampouco na Poética. Todavia, atualmente,

outras formas literárias, dificultando ainda mais a

vemos esta obra receber a classificação de livro-

classificação das obras por gênero. Um exemplo

reportagem no contexto jornalístico 1.

apresentado por Silva (op.cit. p. 215) que ilustra essa

Wellek e Warren (op.cit. p. 296-7), ao confrontar

dificuldade é o de Alexandre Herculano que, ciente

a teoria dos gêneros na era clássica e na era

da heterogeneidade dos gêneros, escreve em nota

moderna, nos dizem que há diferenças distintivas,

final de sua obra Eurico, o presbítero : “Sou eu o

nessas teorias, que devem ser observadas.

primeiro que não sei classificar este livro”. Outro

A teoria clássica é normativa e prescritiva embora as suas ‘regras’ não contenham o ridículo autoritarismo que tantas vezes lhe é atribuído. A teoria clássica acredita não só que cada gênero difere dos outros quanto à natureza e ao prestígio, mas também, que os gêneros devem ser mantidos separados, que não deve ser permitida a sua miscigenação É esta a famosa doutrina da ‘pureza dos gêneros’, do ‘genre tranché’”.

exemplo, mais recente, dessa dificuldade de se classificar uma obra por gênero é mencionado em Proença (1955), quando Mário de Andrade classifica Macunaíma, primeiramente, como “história”, e, depois, a chama de “rapsódia”, por apresentar, como as rapsódias musicais, uma variedade de

Já a teoria moderna dos gêneros, cujos

motivos populares. Mas, alguns anos depois, essa

primeiros passos foram dados pelos românticos,

obra concorre como “romance” em um concurso

“é claramente descritiva. Não limita o número

literário. O que não foi contestado pelo autor da

das espécies possíveis e não prescreve regras aos

obra, uma vez que, um romance, no sentido antigo, é visto como vida e façanhas de um herói. Um outro Capa

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1 Ver a obra: Páginas Ampliadas, de Edvaldo Pereira Lima, 1993.

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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autores. Admite que as espécies tradicionais possam

teoria de Brunetière, dependeriam da aproximação

‘misturar-se’ e produzir uma espécie nova (como a

ou do afastamento da obra relativa à essência de

tragicomédia)”.

um gênero e como dependente do lugar ocupado

Poderíamos dizer, então, que os sinais de

pela obra na evolução do mesmo gênero.

modernidade residiam no fato de não se obedecer à

A teoria de Brunetière foi contestada, por sua

separação dos gêneros proposta pelos clássicos. Não

vez, por Croce (1997) que concebe a arte como

há, por parte dos modernos, uma preocupação em

resultado de um conhecimento intuitivo, oposto

distinguir os gêneros, há sim um interesse centrado

ao conhecimento lógico, denominada de “forma

no caráter único de cada gênero, de cada obra.

auroral do conhecimento”. Para Croce, a obra poética

Desta forma, segue a polêmica em torno dos

seria una e indivisível, porque cada expressão é uma

gêneros, despertando a curiosidade de estudiosos

expressão única. Croce não concebe os gêneros

como Brunetière, segundo Silva (op.cit.), crítico e

como entidades existentes e normativas e vê a

professor, que no final do século XIX, influenciado

teoria dos gêneros como uma busca para saber,

pela doutrina clássica e seduzido pela teoria

apenas, se a obra está composta segundo as leis

evolucionista de Darwin, concebe os gêneros como

do poema épico, ou da tragédia, esquecendo-se de

entidades existentes: que nasce, desenvolve-se,

procurar saber se ela (a obra) é expressiva caso seja

envelhece e morre ou se transforma. Para ilustrar,

o que ela exprime. Por outro lado, este autor admite

citamos o exemplo citado por Silva (op.cit. p. 216)

o estudo dos gêneros como instrumento útil para a

da Tragédia francesa que surgiu com o dramaturgo

história literária, cultural e social. Na visão de Croce,

Jodelle, alcança a maturidade com Corneille, entra

a doutrina clássica dos gêneros substitui a conceito

em declínio com Voltaire e desaparece antes do

de beleza, critério legítimo da valoração estética,

nascimento de Victor Hugo.

pelo conceito de subordinação e de obediência a

O valor e a importância da obra, segundo a Capa

Sumário

este ou aquele gênero. Isso, conforme Silva (op.cit.), eLivre

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Referências

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34

não glorifica Croce que impõem uma doutrina não

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

35

Staiger, citado por Silva (op. cit. p.223), mostra

menos radical.

um caminho seguro no estudo dos gêneros ao

Kayser (1968), por sua vez, considera o gênero

condenar uma poética “apriorística e anti-histórica”

como entidade normativa e como critério de valor,

e frisa a necessidade de a Poética se apoiar na

afirmando que o conteúdo, as ideias e o estético de

história, na tradição formal concreta. Ele retoma

uma obra somente poderão ser compreendidos a

a tradicional tripartição de Platão - lírico, épico e

partir da noção de gênero. Para esse autor, o gênero

drama -, reformulando-a e substituindo estas formas

representa uma entidade fechada e abstrata, dentro

substantivas, por conceitos estilísticos de: lírico,

da qual se estabelecem subespécies arbitrárias;

épico, e dramático. Tais termos, até hoje, fazem parte

não reconhece a legitimidade de uma obra que

da ciência literária e representam as possibilidades

não respeite as normas fixadas. Essa visão também

fundamentais da existência humana: existe uma lírica,

é por demais radical, segundo Silva, porque nega

uma épica e uma dramática que se caracterizam

qualquer possibilidade de fundamentar o gênero

respectivamente pela recordação, observação e

literário na realidade da própria obra.

expectativa. Essas características conexionam-se

Para Silva (op.cit. p.222), “cada gênero representa

com a tridimensionalidade do termo existencial: a

um domínio particular da experiência humana”. A

recordação implica o passado, a observação trata do

tragédia e a comédia ocupam-se de elementos e

presente, a expectativa profetiza o futuro.

problemas muito diversos da existência humana.

Lukács (apud Silva, op.cit.) interessa-se pela

Há em cada gênero, uma técnica e uma estilística

problemática dos gêneros e, inspirado na estética

própria, intimamente, conjugadas com a visão

hegeliana, estabelece distinções entre vários gêneros,

própria do mundo, sem que com isso os gêneros

sobretudo, entre o romance e o drama. Para esse crítico,

devam passar a ser compreendidos como entidades

a distinção entre os gêneros deve corresponder a visões

fechadas e incomunicáveis entre si.

diferentes da realidade, o que implica necessariamente

Capa

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36

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37

na diversidade de conteúdo e de forma, bem como de

que lhe são mais próximos do que qualquer outro

fatores de ordem histórico-social.

tipo de discurso literário e exemplifica comparando

Assegura Silva (op.cit), que a realidade concreta

certa poesia lírica à prece. Por fim, esse crítico

da literatura comprova que em nenhuma obra

sugere que seja feita uma Tipologia dos discursos

podem confluir diversos gêneros. O que se verifica é a

e não mais entre textos literários (e não-literários)

predominância de um deles. Os elementos genéricos

separadamente, e propõe, ainda, que a poética ceda

que fundamentam o gênero tanto pertencem ao

o seu lugar para a teoria do Discurso e para a análise

domínio da forma interna - visão específica do

de seus gêneros, pois:

mundo, tom, finalidade etc, - como ao domínio da

... a experiência literária não é senão a parte visível de um iceberg verbal: por baixo encontra-se o domínio subliminar das reações retóricas que a publicidade, os preconceitos sociais e a conversa cotidiana suscitam, essas reações permanecem inacessíveis à literatura enquanto tal, mesmo que esta seja do nível mais popular como no cinema, na televisão ou nas histórias em quadrinhos (op. cit. p. 23).

forma externa - caracteres estruturais estilísticos. As ideias de Silva comungam com a visão de Wellek e Warren (op.cit, p. 293) que concebem o gênero “como um agrupamento de obras literárias, teoricamente baseada tanto na forma exterior (metro e estrutura específicos) como também na forma interior (atitude, tom, finalidade – mais

Isso nos leva a crer que há, como pudemos

grosseiramente, sujeito e público)”.

observar acima, diversas formas de se caracterizar

Todorov (1986), por sua vez, propõe uma

os gêneros, diversas abordagens a respeito desse

moderna Poética, partindo de um conceito de

tema, pontos que convergem e pontos que

gênero literário mais voltado para obras, épocas e

divergem, o que torna inviável uma visão unívoca

práticas sociais. Contesta a existência de um discurso

sobre os gêneros nos estudos feitos até então na

literário homogêneo quando diz que o discurso

Literatura.

qualificado de literário tem parentes não-literários Capa

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39

1.2 Os gêneros na Retórica: ênfase à natureza verbal

cidadãos, preocupa-se apenas com o que é belo ou

do enunciado e a seus princípios constitutivos

feio, e ocorre em lugares, normalmente, públicos para espectadores públicos.

Aristóteles em sua obra A Retórica e teóricos

Contrariamente

aos

debates

políticos

e

dos gêneros de diversas épocas que se inspiraram

judiciários, verdadeiros combates em que se procura

nessa obra reconhecem três tipos de gêneros,

adesão de um auditório, o gênero epidíctico - que

definidos pelos ouvintes, pelas finalidades e

tem como um dos fundadores, Górgias, conhecido

pelas circunstâncias em que são pronunciados:

por sua eloquência - era, na Grécia, uma atração

deliberativo, judiciário e epidíctico. Por que

nas festas em que se reuniam os habitantes de uma

essa tricotomia? Aristóteles responde, na sua

cidade ou de várias cidades-estados.

própria obra, que essa tricotomia se dá devido à

Segundo Perelmen (1996, p. 54), o gênero

existência de três espécies de auditório e é a partir

epidíctico parece pertencer mais à literatura do

da necessidade de adaptar-se a esses auditórios

que a argumentação. Reboul (1998), por sua vez,

que os gêneros são especificados, pois não nos

nos diz que esse gênero lembra mais uma prática

dirigimos da mesma forma a pessoas diferentes,

pedagógica ou religiosa por apresentar um cunho

sobretudo, após analisarmos os papéis que elas

mais de ensinamento, orientação, tal qual ocorre

representam.

nas pregações religiosas.

No gênero deliberativo, o orador se propõe

É interessante observar que as relações e

a atingir o auditório, no caso a assembléia,

delimitações entre os gêneros da Retórica e da

aconselhando o útil, o melhor; no judiciário, o

Poética jamais ficaram claras. A Retórica apresenta

orador acusa ou se defende pleiteando o justo e

limitações desde a sua origem e é conhecida como

tem como auditório o tribunal; e, no epidíctico, trata

uma teoria de produção e não de interpretação,

do elogio ou da repreensão, versa sobre os atos dos

sendo mais normativa que descritiva.

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40

Bahktin (2000, p. 280), ao confrontar os gêneros

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

41

essas pesquisas estiveram sempre divorciadas das

literários com os retóricos, diz que estes dão mais

situações de comunicação verbal.

atenção “à natureza verbal do enunciado e a seus precipícios constitutivos”, como: a relação com

1.3 Os gêneros na Linguística: estudo

o ouvinte, a influência deste sobre o enunciado,

dos discursos cotidianos

a conclusão verbal do enunciado. Porém, “a especificidade dos gêneros retóricos ( jurídicos,

De acordo com Bahktin (2000, p. 281), o

político) encobrem a natureza do enunciado”.

estudo dos gêneros na Linguística se fez a partir

No período latino, segundo Reboul (1998), os

de Saussure e seus seguidores conduziram a

gêneros retóricos se instalaram como disciplinas

definição correta da natureza linguística do

e tiveram como grandes representantes Cícero

enunciado por se limitarem a pôr em evidência a

e Quintiliano cujas obras constituem admiráveis

especificidade dos discursos cotidianos. A teoria

tratados de retórica baseados em suas práticas.

de Saussure privilegia o caráter formal e estrutural

Quintiliano, retomando as ideias de Cícero sobre o

da linguagem, embora reconheça a importância de

campo do ensino retórico, define a retórica como “a

considerações de natureza etimológica, histórica

arte de bem falar”. Porém o “bem” não tem sentido

e política da língua.

só estético, mas também moral.

O estruturalismo aproxima-se da Retórica no

Hoje, longe dos limites dos três gêneros retóricos

que se refere ao seu esforço de analisar e classificar

dos antigos, reconhecemos diversas formas modernas

as formas de fala e tentar tornar inteligível o mundo

de retóricas, tal qual a propaganda e a publicidade.

da linguagem.

Como percebemos, as diversas formas de

Para os estruturalistas, conforme Kuentz (apud

enunciações poéticas e retóricas foram objetos

Brandão, 2000), os gêneros são estruturas abstratas

de estudos e pesquisas durante séculos, mas

(modelos) suscetíveis de investimentos concretos

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42

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43

que resultam em uma obra - realização de uma

literárias, correlacionando a lírica à primeira pessoa

estrutura abstrata. O objetivo dos estruturalistas

do singular do tempo presente; a épica, a terceira

é buscar modelos classificatórios abstratos com

pessoa do tempo passado; além das particularidades

efeitos normativos, não dando, assim, lugar ao

dos gêneros literários como a função poética que

heterogêneo, contextual e histórico.

predomina nesses tipos de gêneros em relação às

Os formalistas russos mostram-se conscientes

outras funções. Segundo Rastier (1989), o processo

das dificuldades de se impor uma classificação

de comunicação apresentado por esse linguista

lógica e firme dos gêneros e, ao mesmo tempo,

não inclui as condições sociais que determinam a

mostram-se atentos à variação dos textos, às

situação de comunicação, sendo, portanto, algo

oposições tipológicas enraizadas historicamente,

que deva ser considerado.

ao propor “... uma abordagem descritiva no estudo

Se classificarmos os textos exclusivamente em

dos gêneros e substituir a classificação lógica por

razão da função da linguagem que predomina em

uma classificação pragmática e utilitária levando

cada um deles, corremos o risco de não distinguirmos

unicamente em conta a distribuição do material nos

nem caracterizarmos devidamente a variedade de

quadros definidos” conforme declara Tomachevski,

textos informativos, literários, apelativos, expressivos

1965 (apud Brandão, op. cit, p. 21).

e argumentativos que circulam na sociedade, uma

O formalista Jakobson (1999) ultrapassa a análise

vez que os textos se configuram em diferentes formas

linguística fixada nas características estruturais ao

para manifestar as mesmas funções da linguagem e

privilegiar os aspectos funcionais de linguagem

os mesmos temas. Não se pode determinar a função

relacionando-os aos fatores constitutivos de todo

da linguagem em um texto sem o conhecimento

processo de comunicação. Esse linguista preocupa-

do tipo de discurso nele presente, e das práticas

se, também, em mostrar a correspondência entre a

sociais da qual ele resultou, isto é, não se concebe

estrutura gramatical fixa da linguagem e as espécies

os gêneros sem seu aspecto social.

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

45

A noção de gênero para Aristóteles e seus

caracterizam por seu conteúdo temático, estilo e

sucessores aplicava-se apenas aos textos de valor

unidades composicionais – dimensões que refletem

social ou literário reconhecido. No decorrer do

a esfera social em que são produzidos e modificados.

século XX, essa noção começou a ser aplicada

Os gêneros do discurso apresentam uma

ao conjunto das produções verbais organizadas,

variedade infinita que vai sendo modificada

escritas ou orais, sobretudo a partir das obras de

e ampliada à medida que a própria esfera se

Bakhtin. Desta forma, qualquer texto observável

desenvolve e fica mais complexa.

pertence a um determinado gênero.

Diante da preocupação e dificuldade dos

Em suas obras, Marxismo e filosofia da

estudiosos da Literatura e da Linguística em

linguagem (1999) e Estética da criação verbal

classificar os gêneros, Bakhtin (2000 p. 281) nos

(2000),

da

diz que: “Não há razão para minimizar a extrema

linguagem de base marxista quando, ao se opor às

heterogeneidade dos gêneros do discurso e a

duas orientações do pensamento vigentes na época,

consequente dificuldade quando se trata de definir

o subjetivismo idealista e o objetivismo abstrato,

o caráter genérico do enunciado”.

Bakhtin

desenvolve

uma

filosofia

expõe a existência do caráter sócio-histórico da linguagem,

considerando

o

enunciado

Diante essa situação, Bakhtin propõe o

como

estudo e a compreensão dos gêneros mediante a

produto de uma interação verbal.

definição destes e sua classificação em “primários”

Para Bakhtin (1999), qualquer enunciado está

e “secundários”.

ligado a uma situação material concreta, bem como a

Os gêneros secundários, segundo Bakhtin,

uma esfera mais ampla que constitui o conjunto das

resultam de uma comunicação cultural mais

condições de vida de uma comunidade linguística.

complexa, geralmente escrita, e mais evoluída,

Cada esfera elabora “tipos relativamente estáveis

composta da absorção e transmutação dos gêneros

de enunciados”, isto é, gêneros do discurso, que se

primários que, por sua vez, apresentam uma relação

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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imediata com as situações nas quais são produzidas.

enunciados (que incluem as obras literárias), estão repletos de palavras dos outros, caracterizadas, em graus variáveis pela alteridade ou pela assimilação, caracterizadas, também em graus variáveis, por um emprego consciente e decalcado”. (2000, p. 313314).

A análise e distinção desses gêneros para Bakhtin são de grande importância para o estudo linguístico de forma geral, por favorecer a compreensão da natureza do enunciado. Nas suas próprias palavras:

O estudo dos gêneros sob a ótica do discurso já havia sido enunciado por Bakhtin/Volochínov

Ignorar a natureza do enunciado e as particularidades de gênero que assinalam a variedade do discurso em qualquer área do estudo linguístico leva ao formalismo e à abstração, desvirtua a historicidade do estudo, enfraquece o vínculo existente entre a língua e a vida. A língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a vida penetra na língua. (idem, 2000, p. 282).

(1999, p. 124) mesmo antes de ser estabelecido na obra Estética da criação verbal (2000), quando esse teórico indicou uma ordem metodológica para o estudo da “língua viva”, que se dá em situações históricas: 1)

Além do aspecto sócio-histórico do gênero,

em que se realizam.

na interação verbal:

2)

As

formas

das

distintas

enunciações, dos atos de fala isolados, das

... a experiência verbal individual do homem toma forma e evolui sob o efeito da interação contínua e permanente com os enunciados individuais do outro. É uma experiência que se pode, em certa medida, definir como um processo de assimilação, mas ou menos criativo, das palavras do outro (e não das palavras da língua). Nosso fala, isto é, nossos

Sumário

As formas e tipos de interação

verbal em ligação com as condições concretas

Bakhtin enfatiza o aspecto dialógico da linguagem

Capa

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

categorias de atos de fala na vida e na criação ideológica que se prestam a uma determinação pela interação verbal. 3)

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A partir daí, o exame das formas

Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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da língua na sua interpretação linguística

resultam, portanto, do uso comunicativo: quando os

habitual.

indivíduos se comunicam, trocam palavras, orações, traçam enunciados, produto de uma enunciação que

Para Furlanetto (1998), no item 1, Bakhtin faz

se constitui com recursos formais da língua (gramática

referência direta aos gêneros como: “formas e tipos

e léxico), e também com recursos extralinguísticos:

de interação verbal” sempre relacionando-os com

as formas de língua e os tipos de enunciados até as

as condições concretas de sua realização verbal e

formas gramaticais (sintaxe). Os gêneros nos fazem

social, o que seria em Bakhtin (2000): “as esferas de

ver a própria essência do enunciado, o “quer-dizer”,

atividades humanas”. Cada esfera elabora seus tipos

o “intuito discursivo”, determinando os limites dos

e formas de enunciados, os gêneros. No item 2, é feita

enunciados, nas trocas de falantes e que, por sua

referência às unidades que classificam os gêneros em

vez, determina, também, a escolha dos gêneros que,

primários e secundários: “categorias de atos de fala na

por serem criados com propósitos comunicativos

vida e na criação ideológica”. E, no terceiro e último

específicos, podem ser agrupados e estudados.

item, é feita a sugestão de se trabalhar, após os itens

Assim, esse autor sugere que se faça o estudo

anteriores, as formas de língua na sua interpretação

da linguagem pelas manifestações materiais nas

linguística habitual, isto é, estrutural.

comunidades por meio dos gêneros. Esses estudos

A teoria dos gêneros, elaborada por Bakhtin

começaram a se concretizar. É o que veremos na

(2000), sugere como ponto de partida o estudo da

parte que segue.

natureza do enunciado nas esferas de comunicação em situações concretas de produção, pois não se pode falar em gêneros, na concepção bahktiniana sem pensar na esfera de atividades em que eles se constituem e atuam. Os gêneros, para Bakhtin, Capa

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alguns desses pesquisadores citados que, como já foi dito, apresentam, como embasamento teórico, a teoria dos gêneros de Bakhtin. É bom não perder de vista, como nos alerta Marcuschi (2000, p.23), que a intenção 2 DESDOBRAMENTO DA CONCEPÇÃO DE

maior de Bakhtin é “balisar uma concepção de gênero

GÊNERO: CLASSIFICAÇÃO E ASPECTOS SÓCIO-

no contexto de uma visão de discurso voltada para

HISTÓRICOS

atividades enunciativas em processos interativos”. Pensando no texto em sua função enunciativa e nos gêneros como ferramenta de ensino

Os desdobramentos teóricos das proposições

aprendizagem,

pesquisadores

franceses

e

bakhtinianas de interacionismo da linguagem e seus

genebrinos mencionados debruçaram-se sobre a

aspectos sócio-históricos, bem como, a concepção

teoria de Bakhtin e classificaram os textos de acordo

de gêneros de discurso encontram, na atualidade,

com suas características sócio-interativas. Alguns

considerável expressão nos estudos desenvolvidos por

chegam a abandonar a noção tradicional de tipo de

franceses e genebrinos, sobretudo, nos trabalhos de

texto em favor da de gêneros.

Adam (1992), Bronckart (1999), François (1998) Dolz e Schneuwly (1996) e aqui no Brasil, nos trabalhos de

2.1 Adam: sequências textuais

Rojo (1998) Brandão (2000), Meurer (2000) e Carneiro (1997), Marcuschi (2000) e Bezerra (2000), muitos

Adam

(1992),

ao

estudar

a

natureza

desses, voltados para a perspectiva educacional,

composicional heterogênea da linguagem, volta-

gerando novas abordagens no estudo dos textos.

se para as reflexões de Bakhtin (2000), quando este

Neste sentido apontaremos algumas linhas

estende os limites da competência linguísticos dos

teóricas de investigação linguística devolvidas por

sujeitos para além da palavra, da frase, em direção

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aos gêneros - denominados de “sintaxe das grandes

dialogal; podendo, ainda, combina-se, um único

massas verbais”. Os gêneros correspondem a todo o

texto, duas ou mais sequências prototípicas.

fazer discursivo para os quais somos, desde a mais

Esse trabalho de Adam é importante em termos

tenra infância, sensíveis e que, sem sua existência,

didáticos por sugerir uma nova tipologia, roubando

seria impossível a troca verbal.

a cena da tipologia tradicional (narração, descrição e

Sobre essa hipótese bakhtiniana, Adam (op.

dissertação) que se encontra obsoleta e não atende

cit.) desenvolve sua teoria de que as formas mais

mais às condições de estudo de textos da nossa época.

elaboradas e complexas de enunciados (gêneros

Vale salientar, porém, que essa tipologia de Adam

secundários) se fundam sobre um certo número de

(op.cit. p. 06) não leva em conta certos aspectos da

formas elementares (formas prototípicas), Porém,

caracterização como inserção social e histórica, pois

Adam não desenvolve sua teoria em direção ao

essa tem como objetivo teorizar de forma unificada a

campo sócio - linguístico dos gêneros do discurso,

heterogeneidade composicional dos discursos.

e sim em direção “ao mais estritamente linguístico

Após apresentar a teoria de Adam e sua

da textualidade” (Brandão, op.cit. p. 28), refletindo

classificação textual, Brandão (op.cit. p.39) propõe

sobre certas categorias que estão na base de

que o professor atrele essa classificação ao conceito

qualquer composição textual. Desta forma, esse

de gênero bakhtiniano, para “apreender na forma

linguista monta uma tipologia de base, estruturas

de textualização dos gêneros, a sua materialidade

sequenciais prototípicas do texto. Para isso, opera

linguística”, o que caracteriza

com uma definição de texto como objeto composto

diferentes gêneros textuais aos quais os alunos

de sequências.

são expostos no seu cotidiano. Já Bezerra (2000 e

e identifica os

Em sua teoria, Adam propõe a existência de

2001) elege a tipologia de Adam juntamente como

cinco tipos básicos de sequências prototípicas:

o conceito de gênero de Bakhtin para desenvolver

narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa e

análises nos livros didáticos.

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Referências

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54

2. 2 Bronckart: a Linguística e seus aspectos sócio-

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

55

Nesse seu trabalho, Bronckart se propõe, ainda,

interacionais

a abordar as condições de produção dos textos, a problemática da sua classificação e as opções

Bronckart (1999), ao ver a linguagem tanto nos

em que baseia seu funcionamento, analisando a

seus aspectos sociais como interacionais, defende

arquitetura interna dos textos sem perder de vista as

uma versão mais específica do sócio-interacionismo,

suas condições externas de produção. E preconiza,

denominado de interacionismo sócio-discursivo.

também, uma tipologia resultante da análise das

Essa versão apresenta como base teórica, a obra

capacidades e heterogeneidades fundamentais das

de Vygotsky e de Bakhtin. Esse casamento de

manifestações da linguagem.

teorias se deu, sobretudo, porque Vygotsky atribui

Para desenvolver a sua teoria, Bronckart

à linguagem, uma ação, uma atividade social,

reelabora vários conceitos: sob o ponto de vista

porém, considera, apenas, a palavra, como unidade

de que textos são formas de realização empíricas

verbal, não identifica as unidades verbais maiores,

diversas. Como entidade geral, “a noção de texto

os gêneros do discurso, que Bakhtin, por sua vez,

pode ser aplicada a toda e qualquer produção de

visualiza e descreve em sua obra. Essas unidades

linguagem situada, oral ou escrita”.(op.cit. p. 71), não

verbais maiores correspondem, mais claramente,

importando o tamanho do texto, porém considera

às atividades, propriamente ditas, de linguagem

os mecanismos de textualização e enunciativos

e ações verbais como atividades sociais, produtos

destinados a conferir a coerência interna.

da interação social (do uso). Convém lembrar que

Por serem produtos de atividade humana, os textos

são dessas unidades maiores que se constroem

“estão articulados às necessidades, aos interesses e às

os mundos representados, definidos no contexto

condições de funcionamento das formações no seio

das atividades humanas que estão em constante

das quais são produzidos” (Idem, 72).

transformação. Capa

Para Bronckart, o uso verbal é o produto de Sumário

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Referências

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56

interações linguajares. As intenções se concretizam funcionamento de cada tipo de discurso que se realiza a articulação sutil entre parâmetros da comunicação

Bronckart aponta ainda, como outra dificuldade

e parâmetros da referencialização, dotando cada

de classificação dos gêneros, o caráter histórico

unidade linguística de sua significação.

(e adaptativo) das produções textuais: os gêneros

Diante de diversidade de tipos de textos,

desaparecem e reaparecem sob formas diferentes

surge o conceito de gêneros, ou melhor, gêneros

ou surgem novos gêneros, em suma, os gêneros

de texto, em vez de gêneros do discurso, uma vez

estão em “constante movimento”.

que todo texto se inscreve em um conjunto de

O critério que poderia ser mais objetivo na

textos ou gêneros de textos. Devido à sua relação

classificação dos gêneros, para esse pesquisador,

com as atividades humanas, os gêneros textuais são

seria o das “unidades” e das “regras linguísticas

múltiplos e infinitos, gerando diversas classificações,

específicas” que mobilizam os gêneros. Porém

muitas vezes divergentes e parciais.

a aplicação desse critério é comprometida por

A problemática de classificação dos gêneros

um texto pertencente a um mesmo gênero ser

dá-se devido à diversidade de critérios utilizados na

composto por vários segmentos distintos, que por

classificação. Eis alguns enumerados por Bronckart:

sua vez podem ser identificados e estudados com base nas unidades e regras linguísticas.

critérios referentes ao tipo de atividade humana implicada (gêneros literários, científicos, jornalísticos, etc); critérios centrados no efeito comunicativo visado (gêneros épicos, poéticos, líricos, miméticos, etc.); critérios referentes ao tamanho e/ou à natureza do suporte utilizado (romance, novela, artigo de jornal, reportagem, etc.); critérios referentes ao

Sumário

57

conteúdo temático abordado (ficção científica, romance policial, receita de cozinha, etc) (idem, p. 73).

em discurso de diversos tipos. É no quadro do

Capa

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Concluímos, portanto, que, para Bronckart, um gênero não pode ser definido apenas por critérios linguísticos, no entanto, esses critérios podem definir os segmentos que compõem um gênero

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Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

59

e favorece o agrupamento desses. Os segmentos

suas condições de enunciação e por suas condições

que entram na composição de um gênero foram

históricas de aparição. Para François, a noção de

chamados, por Bronckart (idem, p.77), de tipos

gênero é a que mais caracteriza a linguagem e

de discurso porque os gêneros resultam de uma

permite um número aberto de formas de significar.

forma discursiva que apresenta regularidade de

Podemos distinguir, segundo ele, os gêneros

estruturas linguísticas pertencentes ao domínio

por suas condições de enunciação-recepção,

dos tipos. Se, por outro lado, a produção de um

pelo corpus definido formalmente e por suas

texto delimita-se em modelos sociais dos gêneros

modalidades de releitura. Para clarear sua visão,

e dos tipos, ela também se alicerça em decisões

esse pesquisador nos dá, como exemplo, a Bíblia,

relativas que conferem ao texto um estilo próprio,

que apresenta o mesmo corpus formal, porém o

resultando na variação de textos (textos empíricos).

texto não é o mesmo, devido às diversas leituras

Isto, resumidamente, seria uma unidade concreta

feitas em várias épocas.

pertencente a um gênero composta por vários tipos

Há, ainda, segundo François, sistemas de

de discurso e marcadas por decisões do produtor

definição de gêneros, produzidos a partir de certas

em situação de comunicação.

condições sociais, precisas, mais ou menos, pelas marcas linguísticas da formação global do texto

2.3 François: gêneros, condições sociais e marcas

como, por exemplo, a tricotomia: épico, lírico e

linguísticas

dramático. Ao abordar a classificação dos gêneros

François (1999) comunga com outros linguistas

elaborada por vários linguistas, François nos diz que

e teóricos da literatura quando diz que a noção de

essas pecam por duas razões: primeiro, por suporem

gêneros não é clara nem desprovida de polêmica.

que a classificação é o máximo da elucidação e;

Os gêneros, para esse linguista, se definem por

segundo, por pensarem que classificam os gêneros.

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Porém a grande questão das classificações, levantada

ideológicos, fragmentos de discursos que compõem

por François (op.cit. p.108), refere-se às lacunas que

a ideologia do cotidiano.

nelas existem: 2.4 Marcuschi: os gêneros no contexto linguístico

Um texto, classificado em um gênero não se reduz ao que é dito nessa classificação. No interior de cada gênero, pode-se sempre encontrar aspectos da narração, da argumentação, do questionamento... que não facilitam, certamente, a arrumação em classes.

Marcuschi, em suas pesquisas, evidencia a presença marcante da questão dos gêneros textuais nas obras linguísticas nos últimos tempos, sobretudo, relacionada com o ensino de línguas (Schneuwly,

François afirma, também, que uma classificação

Bronckart), uma vez que “o ensino baseado nos

dos gêneros não pode se fundar sobre um só critério.

gêneros promete um aprendizado mais consistente

Fixar os gêneros não deve ser visto como um fim

e adequado” (2000, p. 2).

em si mesmo, mas como colocar em evidência suas

Ao abordar o estudo dos gêneros no contexto

realizações e/ou sua recepções; isto implica levar

linguístico, Marcuschi cita Swales, quando este

em conta o outro, o interlocutor, suas leituras e as

afirma que o termo gênero refere-se a uma categoria

diferentes maneiras que um texto pode agir sobre

distintiva de discursos de qualquer tipo seja falado

ele e que o faz agir.

seja escrito, com ou sem aspirações literárias.

Ao referir-se a teoria dos gêneros em Bakhtin,

A noção de gênero na Linguística, para

precisamente na oposição entre gêneros primários

Marcuschi, é controversa e polêmica, uma vez que

e secundários, François mostra que os gêneros

muitos linguistas não apresentam uma definição

secundários só têm sentido no circuito social que

precisa desse termo nem de termos com o qual ele

os constituem, nas relações da vida cotidiana

se assemelha, como tipo e formas de composição.

dos enunciados religiosos, científicos, políticos, Capa

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Preocupado como a imprecisão do termo eLivre

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gênero e com suas diversas classificações, Marcuschi

as querelas teóricas entre texto e discurso”, sugere

propõe fazer uma revisão das posições mais

gêneros comunicativos, ao considerar os aspectos

proveitosas sobre o tema, bem como, uma nova

sócio-comunicativos.

proposta de tratamento desse. Distinguindo

‘classificação’

Uma outra proposição relevante em Marcuschi de

‘tipologia’,

(idem. p.10) é a classificação conjunta e contínua da

Marcuschi afirma que as tentativas de classificação

produção textual na fala e na escrita, estabelecida, no

conduzem a uma diversidade de tipologia e que a

entanto, a partir da observação de alguns aspectos

única distinção que se evidencia claramente é entre

teóricos e de critérios adequados. O básico seria

a teoria de tipos textuais, consensual entre vários

não perder de vista a “concepção sócio-interativa

linguistas, chegam de 5 a 10 tipos, quase sempre

da língua” e a noção de texto “enquanto fenômeno

de caráter formal e abstrato; e, a investigação dos

empiricamente realizado nos discursos cotidianos”.

gêneros textuais que são agrupamentos por critérios

Quanto à diferença entre tipos textuais e gêneros

os mais diversos, que, ao mesmo tempo em que

textuais, Marcuschi (idem, p. 12-3) diz que os gêneros

classifica os textos, os constituem.

textuais “são fenômenos bastante heterogêneos”;

Com relação à noção de gêneros textuais e

enquanto os tipos textuais “são construtos definidos

gêneros discursivos, Marcuschi (idem, p.7) estabelece

homogeneamente”, porém realizados em eventos

sua visão a respeito de cada um deles: gênero

heterogêneos e abrigados pelos gêneros. Como

textual, aspectos constitutivos de natureza empírica,

exemplo, cita o ‘telefonema’ que, apesar de ser um

seja intrínseco ou extrínseco e gênero discursivo,

evento linguístico claro e definido “sob o ponto

algo realizado na situação discursiva - porém ambas

de vista textual não é homogêneo”, ao envolver

as expressões se equivalem. Esse linguista admite

argumentações, narrações, descrições. Além disso,

preferir a noção de gêneros textuais por questão

Marcuschi, nos diz que a noção de telefonema

de “simetria terminológica”. E, ainda, para “eliminar

enquanto gênero, atualmente, não é mais tão

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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clara assim; há muitos tipos de telefonemas, como:

Marcuschi apresenta, também, em seus escritos,

telefonema fonado, uma mensagem que uma pessoa

propostas de tipologia textual de vários linguistas

envia à outra através de um terceiro; o recado

sem pretensão exaustiva e ciente de que algumas

gravado, memorizado pela secretária eletrônica e

tipologias atuais foram excluídas.

outros tipos mais modernos de telefonemas que se

As tipologias apresentadas foram divididas em:

servem do computador e do celular.

as que os autores voltam-se quase que somente

Por meio das observações de Marcuschi (idem,

para textos escritos; para os que analisam os gêneros

p.15), que se baseia em Bakhtin, percebemos que

textuais; e, por último, os que contemplam a escrita

os gêneros são eventos sócio-historicamente

e a oralidade.

variáveis e que não podemos elaborar uma lista

Ao analisar a concepção de gêneros em Bahktin,

fixa desses eventos sem critérios pré-estabelecidos

Marcuschi diz que o linguista russo não se preocupa

e sem “uma matriz operacionalmente útil para

em classificar ou em estabelecer uma tipologia, mas

algum tipo de objetivo”. Cabe à Linguística dar

sim, em “visualizar uma concepção de gênero no

conta de todos esses eventos sócio-históricos:

contexto discursivo, nas atividades enunciativas em

sejam escritos, sejam orais.

processo”.

Comparando sempre tipos e gêneros, esse

Marcuschi vê os gêneros em Bahktin como

linguista, cita a distinção de Isenberg, entre tipos

resultado de “um uso comunicativo da língua na sua

textuais que são definidos com critérios internos e

realização dialógica” (idem, p.26). A importância

rigorosos, e gêneros textuais, fundados em critérios

do estudo dos gêneros estaria em flagrar “a

externos numerosos. E para distingui-los mais ainda,

própria essência do enunciado... como unidade

diz que “todos os tipos de textos são realizados

de diálogo”. Porém, “os gêneros não são só forma

em um ou outro gênero, mas que os gêneros não

enunciativa expressiva, e sim, um meio de construir

realizam tipos” (idem, p. 22).

o próprio interlocutor” (idem). As particularidades

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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constitutivas resultantes das diversas formas típicas

Marcuschi, também, mostra-se preocupado

de dirigir-se a alguém e as diversas concepções

com a falta de consenso terminológico (tipos de

típicas, destinatários determinam a diversidade

texto, tipo de discursos, gêneros textuais, gêneros

dos gêneros do discurso na visão de Bakhtin

do discurso, classes de texto etc.) e com a falta de

apresentada por Marcuschi.

definições precisas para os termos empregados.

Na sua investigação no que tange aos gêneros

Como proposta para uma possível classificação, esse

textuais, Marcuschi ocupa-se da descrição de

autor propõe que se estabeleçam alguns critérios

rotinas comunicativas em situações sociais (como

como, por exemplo, de natureza linguística: traços

Swales, Bronckart, François). Não há o intuito de

linguísticos, funcionais (objetivos do texto, intenções

se estabelecer uma classificação propriamente

pretendidas etc.) e contextuais (produtores e suas

dita, todavia pode-se chegar a isto, segundo esse

relações, situação de produção, etc.); e, com bases

pesquisador, mediante a construção de matriz de

nestes critérios, sugere que se forme uma matriz de

traços que distribui os eventos analisados.

traços que determinem critérios de agrupamento de

A respeito dessa visão de Marcuschi, podemos

diversas formas dentro de um contínuo mais amplo

dizer que os gêneros constituem-se em um

e em várias ordens tipológicas que se encadeariam

fenômeno heterogêneo e isso é que impede de

no contínuo da produção textual 2.

se estabelecer uma tipologia coerente e unitária.

Esse linguista propõe, também, um novo termo:

Todavia, há gêneros bem-definidos, como a carta

“gêneros comunicativos”, em substituição a “gêneros

do leitor, editorial de jornal, receita de bolo, diário,

textuais”. E justifica, afirmando que os “Textos

bula de remédio, diário que preenchem, até mesmo,

são artefatos ou fenômenos que exorbitam suas

certas condições formais e não apenas sócio-

estruturas e só têm efeito se se situarem em algum

comunicativas, resultando em classificações de

2 Conforme o quadro, presente no trabalho intitulado Gêneros textuais: o que são e como se classificam? p.103.

gêneros por critérios múltiplos. Capa

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contexto comunicativo” (idem, p.64). A partir desta

no sentido vygotskiano do termo e tenta “retirar

justificativa, Marcuschi sugere essa nova expressão,

algumas lições desta concepção para pensar a

considerando-a mais adequada para o estudo dos

ontogênese da linguagem, na qual a dimensão leitura

gêneros no universo linguístico.

/escrita desempenha um papel central”. Porém essa dimensão linguística não foi abordada diretamente

2.5 Schneuwly e Dolz: gêneros como instrumento

por Vygotsky, mas sim, por Bakhtin. Desta forma,

de ensino e progressão didática

reinterpretando Bakhtin na sua distinção de gêneros primários e secundários, Schneuwly diz que os

Schneuwly e Dolz (1996), pesquisadores ligados

gêneros primários instrumentalizam a criação de

à Universidade de Genebra, vem trabalhado a noção

outros gêneros, tornam-se instrumentos de ação,

de Gênero do Discurso bahktiniana, voltada para o

que se complexificam, criando construções novas,

ensino e aprendizagem na produção escrita escolar

mais complexas, os gêneros secundários.

nos países francofônicos. O método desse trabalho

Em síntese, os gêneros secundários apóiam-se

consiste na adoção de procedimentos de leitura,

nos primários em sua elaboração, transformando-os

escrita e reflexões metalinguísticas, em que as

profundamente (Bahktin, 2000 e Schneuwly, 1996).

condições de interlocução são consideradas como

Os gêneros secundários, na visão de Schneuwly,

determinantes para o estudo da língua, colocando,

se definem pelos modos diversificados de referência

assim, os alunos “em situação de produção de

a um contexto, linguisticamente, criado; pelos

linguagem”, que vão além dos procedimentos usuais

modos de desdobramento; por sua gestão eficaz.

em que a língua apresenta-se em uma concepção

Há uma profunda continuidade, conforme nos disse

abstrata, como objeto de estudo em si mesma.

Marcuschi (op. cit.) e, ao mesmo tempo, uma ruptura

Schneuwly (1994) compreende os gêneros,

na passagem de um gênero primário para um

primeiramente, como um instrumento psicológico

secundário. Como esclarece Schneuwly (1994, p. 13):

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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resultaria, segundo Schneuwly, em dois efeitos diferentes de aprendizagem: um seria a ampliação da capacidade linguístico-discursiva individual do usuário e, o outro, a ampliação do conhecimento a respeito do

Schneuwly propõe repensar a relação entre tipos

objeto sobre o qual o instrumento é utilizado.

e gêneros, mostrando a utilidade destas noções que

Para ilustrar, o pesquisador genebrino diz

colocam em discussão alguns dos problemas difíceis

que ao usarmos um machado, aprendemos não

de aquisição dos discursos subentendida no contexto

apenas como utilizá-lo cada vez melhor e com

escolar, na produção oral e escrita dos alunos.

intimidade, mas também passamos a conhecer

A pesquisa desse psicólogo e linguista

mais sobre a dureza da madeira. A apropriação dos

centra-se, sobretudo, no desenvolvimento da considerado

o

gêneros como “um processo de instrumentalização,

desenvolvimento

provoca novos conhecimentos e saberes, abre novas

infantil sobre o prisma dos gêneros, no contexto

possibilidades de ações, que sustenta e orienta estas

escolar, acentuadamente entre 9 – 10 anos. Mas, o

ações” (SCHNEUWLY, 1994, p. 3). Desta forma,

desenvolvimento da linguagem se constitui em um

essa apropriação dos gêneros não só amplia a

longo processo de reestruturação do sistema de

competência linguística e discursiva dos alunos,

produção de linguagem durante toda a escolaridade.

mas também, favorece-lhes, no que diz respeito a

Em suas pesquisas, Schneuwly propõe que

sua participação social, como cidadão.

compreendamos o gênero como um instrumento

Os gêneros textuais dos quais fazemos uso,

com o qual é possível exercer uma ação linguística

através de ações linguísticas cotidianas, nos foram

sobre a realidade, por definir o que é dizível, por ser

transmitidos sócio-historicamente. A escolha de

“um plano comunicacional”. Capa

Sumário

71

O uso dos gêneros como um instrumento

... a introdução do novo sistema, a aparição dos gêneros na criança, não é o ponto de chegada, mas o ponto de partida de um longo processo de reestruturação que, a seu fim, produzirá uma revolução nas operações de linguagem.

linguagem,

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

um gênero se faz em função da definição dos eLivre

Autor

Referências

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73

parâmetros de situação que guiam as ações. É

os outros tipos de texto que circulam socialmente.

possível a transformação dos gêneros existentes

O importante nesta classificação, que será mostrada

em outros gêneros, ou mesmo a criação de outros

adiante, é permitir o estudo dos gêneros de forma

gêneros, conforme novas necessidades de interação

organizada e progressiva, contribuindo, como diz

verbal (Schneuwly, Bronckart, François, Marcuschi).

Rojo (1998), para apropriação por parte dos alunos das formas de dizer que circulam socialmente.

Assim, as ações linguísticas são orientadas por um conjunto de fatores que atuam no contexto

Aqui, no Brasil, vêm sendo desenvolvidos

situacional, como: quem são o locutor e o interlocutor?

projetos (Rojo, 1998; Brandão, 2000) que impulsionam

Qual é o objetivo do texto? Que gênero deve ser

e divulgam a adoção desta nova noção de gênero

utilizado para o êxito da comunicação? É preciso ter

para o ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa

o conhecimento, seu controle, condições necessárias

- que já se encontra incorporada nos PCN, com o

para o estabelecimento da ação discursiva.

intuito de discutir e elaborar uma metodologia, um

Aprofundando-nos um pouco mais na pesquisa

programa e uma progressão do ensino de língua

do grupo de Genebra, vemos que estes visualizaram

baseada na perspectiva enunciativa dos Gêneros

os gêneros como um mega-instrumento, com uma

do Discurso e da aplicação dos gêneros como um

configuração estabilizada de vários sub-sistemas

mega-instrumento de ensino e aprendizagem.

semióticos linguísticos e paralinguísticos e, assim,

Com isso, serão prioridade no ensino de Língua

propusera o agrupamento dos gêneros, tendo como

Portuguesa, práticas de linguagem e situações de

base as finalidades sociais legadas ao ensino, bem

comunicação em toda sua complexidade, pois

como, respondendo às necessidades de linguagem

trabalhar o plano do conteúdo, compartilhar

em expressão escrita e oral no domínio da

algumas regras gramaticais comuns não vêm

comunicação. Pois não existe um tipo de texto que

garantindo

possibilite o ensino da leitura e da escrita de todos

produção textual por parte dos nossos alunos.

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eficientemente

Autor

a

compreensão

Referências

e

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

75

Para tanto, uma nova ordem está sendo gerada:

embora com graus diferentes de complexidade, foi

a ordem do Gênero do Discurso que, dentro de

permitido o agrupamento de gêneros.

uma Teoria da Enunciação, impulsionará o ensino-

Eis a classificação da equipe de Genebra:

aprendizagem de língua. O

agrupamento

dos

gêneros

Domínios sociais de comunicação

textuais,

desenvolvido pela equipe de Genebra, resulta de

ASPECTOS TIPOLÓGICOS Capacidades de Linguagem Dominantes

uma análise detalhada e consistente acerca dos gêneros textuais, em si, e de suas propriedades linguístico-discursivas,

bem

como,

de

Cultura literária ficcional

suas

NARRAR

aplicações educacionais e suas transposições didáticas. Trabalhando com os gêneros como

Mimesis da ação através da criação da intriga no domínio do verossímil

organizadores de progressões curriculares, Dolz & Schneuwly (apud Rojo, s.d. p. 3), apontam dois problemas que as aplicações educacionais devem levar em conta: a)

a enorme multiplicidade e variedade

Fábula Lenda Narrativa de aventura Narrativa de ficção científica Narrativa de enigma

Esquete ou história engraçada Crônica literária

escritos; e

Biografia romanceada Romance

a diferença de complexidade de um

Romance histórico

gênero a outro e as transversalidades, em nível

Novela fantástica

de semelhanças, que caracterizam certos gêneros

Conto Paródia

de um mesmo domínio social de comunicação.

Adivinha Piada

Partindo das semelhanças em situação de produção, Capa

Conto maravilhoso Conto de fadas

Narrativa mítica

de gêneros primários e secundários, orais e b)

EXEMPLOS DE GÊNEROS ORAIS E ESCRITOS

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Discussão de problemas sociais controversos Documentação e memorização das ações humanas

RELATAR Representação pelo discurso de experiências vividas, situadas no tempo

Relatos de experiência vivida Relatos de viagem

ARGUMENTAR Sustentação, refutação e negociação de tomadas de posição

Diário íntimo Diário de viagem Testemunho Autobiografia ... Notícia Reportagem Crônica mundana Crítica esportiva ...

Transmissão e construção de saberes

Relatório

EXPOR

Relato histórico

Apresentação textual de diferentes formas dos saberes

Ensaio ou perfil biográfico Biografia Relatório científico Relato de experiências científicas Relatório de pesquisa

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Autor

Textos de opinião Diálogo argumentativo Carta de leitor Carta de reclamação Carta de reclamação Carta de solicitação Deliberação informal Debate regrado Editorial Discurso de defesa (direito) Requerimento Ensaio Resenhas críticas Artigo assinado ... Texto expositivo Conferencia Verbete de enciclopédia Entrevista de especialista Texto explicativo Tomada de notas Resumo de notas Resumo de textos expositivos e explicativos Resenhas ...

Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau Regulação de ações

DESCRIÇÕES DE AÇÕES Regulação mútua de comportamentos por meio da orientação (normativa prescritiva ou descritiva) para a ação

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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b) Agrupamento da ordem do narrar: ligado

Instruções de uso Instruções de montagem Receita culinária Receita médica Bula de remédio Regulamento Regras de jogo Consignas diversas Textos prescritivos e normativos legais ...

ao domínio social da cultura literária ficcional, caracterizado pela mimesis da ação através da criação da intriga, domínio do verossímil. São os contos de fadas, as fábulas, lendas, ficção científica, romances etc. c) Agrupamento da ordem do argumentar: voltado à discussão dos problemas sociais, exige a sustentação, refutação e negociação de tomadas de

Ainda sujeito a modificações e sugestões, o

posição. São os diálogos argumentativos, as cartas

grupo sugeriu cinco agrupamentos, definidos pelo

de reclamação, editorial, ensaios argumentativos etc.

seu domínio social de comunicação, privilegiando determinados aspectos composicionais e temáticos

d) Agrupamento da ordem do expor: voltado

(aspectos tipológicos), como exigiria do enunciador

à transmissão e à construção de saberes, exige

certa capacidade de linguagem dominante (Rojo,

a apresentação textual de diferentes formas dos

1998). São eles:

saberes. São os textos expositivos, conferências, seminários, resenhas, artigos etc.

a) Agrupamento da ordem do relatar: voltado à documentação e memorização, exige uma

e) Agrupamento da ordem do descrever ações

representação pelo discurso de experiências vividas

(segundo Rojo seria do instruir e prescrever): voltado

situadas no tempo. São os diários íntimos, diários

às instruções e prescrições. São bulas, instruções de

de bordo, relatos de experiências vividas, biografias,

uso, instruções de montagem, receitas, regras de

crônicas etc.

jogo, regulamentos etc.

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Na opinião da equipe de Genebra, precisamente de Pasquier & Dolz (1996), todos os agrupamentos devem ser trabalhados em cada uma das séries escolares, variando apenas o grau de profundidade, num processo de ensino-aprendizagem “em espiral”, que consiste

3 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS,

basicamente na retomada, no aprofundamento e na

GÊNEROS TEXTUAIS E LIVRO DIDÁTICO

ampliação de cada gênero de acordo com a série e com o grau de maturidade do aluno.

3.1 Parâmetros Curriculares Nacionais: diretrizes

Visto estes pressupostos teóricos, o nosso

para o ensino de língua materna

próximo passo será observar a incorporação de algumas dessas novas perspectivas do estudo de

Os

PCNs,

documentos

publicados

pelo

língua nos PCN, bem como a participação do Livro

Ministério da Educação e Desporto em 1998, funda-

Didático no processo de ensino e aprendizagem.

se em concepções teóricas relativamente recentes e inovadoras, e representa, segundo Rojo (2000), um avanço nas políticas educacionais brasileiras ao indicar diretrizes curriculares para o Ensino Fundamental de modo a assegurar uma formação básica e não, como era de praxe, apresentar grades de objetivos e conteúdos curriculares pré-fixados. Nos PCN de Língua Portuguesa o avanço se deu na proposta de uma metodologia de enfoque enunciativo-discursivo em que as formas linguísticas não são mais trabalhadas em si mesmas, mas como

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

pertencendo a um sistema sensível ao contexto

Portuguesa propõem a utilização dos gêneros

que se constrói historicamente na interação verbal.

como unidade básica organizadora do currículo

Nesse enfoque:

de Língua Portuguesa, na esfera de circulação escolar respaldado na teoria de Bakhtin/Volochínov

Interagir pela linguagem significa realizar uma atividade discursiva: dizer alguma coisa a alguém, de uma determinada forma, num determinado contexto histórico e em determinada circunstância de interlocução... (PCN, p. 20-21).

(1929/1999) e de Bakhtin (1953/2000), que não é mencionada de forma direta, segundo Rojo (2000), mas é claramente percebida pelas marcas linguísticodiscursivas.

Houve,

desta

forma,

uma

mudança

Os

de

de todos os gêneros é tarefa impossível. Desta forma

do homem em interação que, quando realizada, se

os PCN sugerem que alguns gêneros e textos sejam

manifesta linguisticamente por meio de textos.

priorizados pela escola:

O texto, como resultado de uma “atividade discursiva” está em contínua relação como outros

Os textos a serem selecionados são aqueles que, por sua característica e uso, podem favorecer a reflexão crítica, o exercício de formas de pensamento mais elaboradas e abstratas, bem como a fruição estética dos usos artísticos da linguagem, ou seja, os mais vitais para a plena participação numa sociedade letrada”. (Idem, p. 24).

textos (verbais e não verbais) e se organiza em função de suas intenções comunicativas dentro de um determinado gênero, “tipos relativamente estáveis de enunciados” historicamente determinado. concepções

de

língua, de texto, e de gênero, os PCN de Língua Capa

Sumário

e

dada uma situação de produção; por isso, o estudo

viva”, vista enquanto discurso, decorrente das ações

novas

riqueza

outros gêneros; e, ainda se permitirem permear

sistema abstrato, para uma concepção de “língua

dessas

uma

heterogeneidade, por serem esses permeados por

expressão do pensamento, ou mesmo como um

partir

apresentam

variedade infinita sendo também imensa a sua

concepção de língua que antes era vista como

A

gêneros

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Autor

Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

85

As diretrizes para a organização dos conteúdos

corresponde a restrições de conteúdo e forma

da Língua Portuguesa nos PCN se encontram

decorrentes da escolha dos gêneros e suportes;

distribuídas por dois eixos de práticas de linguagem:

e d) as implicações do contexto de produção de

“as práticas de uso da linguagem e as práticas de

significação que corresponde às representações

reflexão sobre a língua e a linguagem”, conforme o

dos interlocutores, a articulação entre texto e

diagrama seguinte:

contexto no processo de compreensão e as relações intertextuais. Nas práticas de leitura/escuta de textos e de produção de textos orais e escritos, o texto é visto, pelos PCN, como “unidade de ensino e os gêneros textuais como objetos de ensino”, pelo fato de os gêneros permitirem incluir aspectos de ordem

(Fonte: SEF. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto

da enunciação e do discurso, envolvendo todo o

ciclos: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF,1998, p. 35)

complexo processo de produção e compreensão de textos. Conforme Barbosa (2000, p.152):

Os conteúdos para as práticas do USO da linguagem conforme Rojo (2000) são enunciativos e

A noção de gênero permite incorporar “elementos da ordem do social e do histórico” (que aparecem na própria definição da noção); permite considerar a situação de produção de um dado discurso (quem fala, para quem, lugares sociais dos interlocutores, posicionamentos ideológicos, em que situação, em que momento histórico, em que veículo, com que objetivo, finalidade ou intenção, em que registro, etc.); abrange o “conteúdo temático” – o que pode ser dizível em um dado gênero, a

envolvem aspectos que caracterizam o processo de interlocução como: a) historicidade da linguagem e da língua; b)constituição do contexto de produção dos enunciados em leitura/escuta e produção de textos orais e escritos; c) as implicações do contexto de produção na organização dos discursos que Capa

Sumário

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

públicas considerados fundamentais para a efetiva

“construção composicional” – sua forma de dizer, sua organização que não é inventada a cada vez que nos comunicamos, mas que está disponível em circulação social – e seu “estilo verbal” – seleção de recursos disponibilizados pela língua, orientada pela posição enunciativa do produtor do texto.

participação na sociedade:

Já os conteúdos para as práticas do eixo da REFLEXÂO sobre a língua e a linguagem que corresponde à elaboração de ferramentas para a análise da linguagem em situações de interlocução, abrangem aspectos ligados à variação linguística; modalidades, variedades, registros; à organização estrutural dos enunciados; aos processos de construção da significação; ao léxico e a redes semânticas e aos modos de organização dos discursos em diversas situações de interação. Ambas as práticas têm como objetivo favorecer a competência discursiva do sujeito envolvido no processo de ensino e aprendizagem. Os PCN (1998, p. 53) trazem quadros nos quais são apresentados os gêneros que foram agrupados em função da presença desses no circuito de

(Fonte: SEF. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998, p.54)

comunicação, principalmente aqueles das instâncias

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Nas estratégias de práticas de análise linguística destacou-se o reconhecimento dos diferentes gêneros, quanto ao conteúdo temático, construção composicional e ao estilo através do estudo do universo discursivo no qual o gênero textual ou o texto se insere considerando as intenções do enunciador, os interlocutores, os procedimentos narrativos, descritivos, expositivos, argumentativos, e conversacionais bem como a intertextualidade e as marcas linguísticas (Idem, p.59-60). Na perspectiva de um estudo tendo os gêneros como objetos de ensino em relação com os aspectos discursivos e linguísticos nas práticas de recepção e produção de linguagem, devem ser

(Fonte: SEF. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto

planejadas, segundo os PCN, situações didáticas de

ciclos: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF,1998, p. 57)

aprendizagem que visam aos objetivos de ensino, bem como, deve existir uma preocupação com a

Desta forma, em função de sua circulação

elaboração de materiais didáticos que viabilizem a

social, os gêneros foram agrupados em: literários,

implantação dos currículos resultados das diretrizes

de imprensa, publicitários e de divulgação científica.

propostas que sugerem a adoção de Organizações

Não descartam, porém, a possibilidade de que, em

Didáticas Especiais: projetos e módulos didáticos.

função de um projeto escolar ou da necessidade dos

O projeto visa a “um produto final em função

alunos, outras divisões sejam sugeridas e aplicadas.

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do qual todos trabalham e que terá necessariamente eLivre

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destinação, divulgação e circulação internamente

se das características discursivas e linguísticas,

na escola ou fora dela” (Idem, p. 87); ou seja,

dos gêneros estudados” (Idem, p. 88). Criam-se

uma circulação efetiva em revistas, jornais, livros,

condições pedagógicas próprias para a elaboração

panfletos – na escrita, e debates, peças, palestras

de atividades que enfatizam determinados gêneros e

seminários - na oralidade.

suas características, articuladas com as necessidades

Como destaca Rojo (2000), a partir dos próprios

dos alunos e das condições de ensino-aprendizagem.

PCN, há uma série de vantagens na organização

É importante frisar que o planejamento dos módulos

didática por projeto como: disponibilidade do tempo

e a organização de sequências didáticas parte do

de forma flexível, compromisso e engajamento dos

diagnóstico das capacidades iniciais dos alunos.

alunos com atividade e com a própria aprendizagem,

Em resumo e para finalizar, os aspectos aqui

inter-relação entre as práticas de uso da linguagem e

tratados dos PCN propõem a criação de condições

de reflexão sobre ela de forma contextualizada, além

para que o aluno, por meio de atividades de ensino e

do caráter interdisciplinar resultado da interseção

aprendizagem planejadas sob um movimento contínuo

com conteúdos e domínios diversos. Esse tipo de

de uso-reflexão-uso e uma concepção enunciativa-

modalidade didática cria condições favoráveis à

discursiva, alcance uma competência discursiva sob

interação verbal pela modalidade escrita e oral da

um repertório de gêneros que circulam socialmente

linguagem, não as descaracterizando enquanto

e que isso favoreça o “exercício efetivo da cidadania”

objeto de interação social.

e “participação plena no mundo letrado” (PCN, 1998).

O outro tratamento didático sugerido pelos

As atividades de uso-reflexão-uso da língua

PCN de Língua Portuguesa, módulos didáticos,

e a entrada no repertório dos textos que circulam

corresponde a “sequências de atividades, exercícios,

socialmente podem se dar por meio do livro didático

organizados de maneira gradual para permitir que

que se constitui atualmente no material de apoio

os alunos possam, progressivamente, apropriar-

mais utilizado em sala de aula.

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3. 2 Livro didático: fazer discursivo e ideológico

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

inclusive,

compreender

sua

linguagem,

93 seu

funcionamento, e seus efeitos de sentido em sala de Estudos feitos no Brasil, como os de Coracini

aula; mas, ainda são poucos, diante da importância

(1999), Souza (1999), Marcuschi (2001), Soares

desses na educação do nosso país.

(2001) mostram que a análise do Livro Didático

O mercado editorial busca atrair os professores

(LD) se faz necessária, já que estes constituem, em

com o novo e assim novas teorias de ensino e

muitas escolas do nosso país, uma peça importante

aprendizagem são preconizadas nesses livros de

no ensino, o único material escrito que dá acesso ao

consumo nas escolas. Coracini (1999), com relação

conhecimento de mundo e linguístico por parte dos

ao novo no livro didático, parafraseando Foucault,

alunos e dos professores que nele buscam tanto

afirma que “o novo não está no que é dito, mas no

legitimação como apoio para as suas aulas.

acontecimento do seu retorno”. Ou seja, antigas

Segundo Coracini (op. cit. p.34) “ é voz corrente

teorias, com estudos recentes, encontram novos

e antiga que o LD constitui o centro do processo de

rumos, novas vozes. Um bom exemplo ocorre com

ensino- aprendizagem em todos os graus de ensino,

os Gêneros do Discurso de Bakhtin, estudados e

com ênfase no ensino fundamental e médio”.

agrupados pela equipe de Genebra (1994) em função

Complementando com Souza (1999, p. 27): “O

do ensino e aprendizagem de língua e indicados

caráter de autoridade do livro didático encontra

pelos PCNs (1998), a serviço do aparelho ideológico

sua legitimidade na crença de que ele é depositário

escolar que, por sua vez, começa a ser legitimado

de um saber a ser decifrado, pois se supõe que o

pelo LD (CEREJA,1998).

LD contenha uma verdade sacramentada a ser

É interessante observar, como frisou Freitag

transmitida e compartilhada”. Sabemos

trabalhos

mundo, há pesquisa e crítica institucionalizada

relacionados à análise dos LD, que vêm procurando,

sobre o LD, o que resulta em uma melhor qualidade

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que



(1997, p. 23-4), que, enquanto nos países do primeiro inúmeros

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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desse tipo de livro nestes países, no Brasil, durante

do ensino do português na década de setenta, que

muito tempo, a pesquisa nos livros didáticos e sua

se deu devido à democratização do ensino. Essa

crítica limitaram-se a estudos nos cursos de pós-

democratização é entendida no sentido restrito de

graduação, sem merecer a atenção dos que vinham

ampliação do número de escolas e de vagas. Esse

fazendo a política educacional, porém algumas

fator trouxe alterações nas condições de trabalho do

mudanças já são visíveis.

professor que, assoberbado, dispõe de pouco tempo

Segundo Freitag (1997, p. 79) uma das melhores

para preparar suas aulas, exercícios, para definir sua

definições apresentadas para o livro didático foi

metodologia de ensino. Desta forma, houve uma

dada por Fleury ao afirmar ser o livro didático “uma

transferência dessas tarefas para o livro didático.

sugestão e não uma receita”. Ao dizer isso, essa

Ou seja, fatores socioeconômicos e políticos não

pesquisadora, nos leva a pensar na situação do

proporcionaram as condições necessárias para que o

professor do nosso país que, sem incentivo e apoio,

professor, como no início do século quando os livros

fica limitado ao livro didático enquanto receita,

traziam apenas os textos, definisse sua metodologia

desprezando o seu potencial criador e inovador.

de trabalho, exercendo plenamente sua profissão.

Soares (2001), ao analisar os Livros didáticos

A democratização do ensino e o povoamento das

de Português (LD de P) com o intuito de identificar

escolas são as justificativas para as transformações

as concepções do professor como leitor nos livros

ocorridas nos manuais de ensino de língua, segundo

didáticos, diz que esses manuais didáticos só

alguns autores, como Ferreira (1971 apud Soares,

passaram a se apresentar por série a partir dos anos

2001, p.70-73), um dos primeiros autores a fornecer

sessenta, houve nessa época também a diminuição

respostas dos exercícios propostos ao professor.

dos textos que chegavam a ocupar dez páginas

Ainda, segundo Soares, os LD de P, após a

dos livros. Além dessas e outras transformações

década de sessenta, começaram a trazer estudos

ocorridas no LD de P, Soares destaca: a didatização

dirigidos de textos e exercícios, os quais os alunos

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por si só completam, resolvem, cabendo ao professor

do nosso país, se dá à parte de critérios heterogêneos

auxiliá-los, quando necessário. E para esse auxilio, o

e exteriores como o aspecto gráfico, a editora e o

professor conta ainda com as respostas no Manual

representante das editoras, pelo Guia do Livro didático,

do professor que além das respostas dos exercícios,

elaborado pela Secretaria de Ensino Fundamental do

oferece um roteiro para as aulas. Desta forma o LD

Ministério da Educação (MEC) ou, ainda, outra indicação

vai assumindo autonomia e independência, cabendo

como a de um amigo. Infelizmente, os professores não

ao professor a subordinação ao conteúdo, método

saem preparados das Universidades para escolher seu

e respostas propostas nesse livro; considerado por

material de apoio, seu “companheiro de trabalho”: o

muitos, um mal necessário.

livro didático. E, há outro despreparo ainda mais visível:

Fleury (apud Freitag, 1997, p. 79) além de definir

o professor absorve o conteúdo dos livros e o repassa

o LD, indicam as suas principais funções, que seriam:

para o aluno de forma acrítica, por ser, para estes, o

a) a de padronizar e delimitar a matéria; b) apresentar

LD, como já foi dito, a última palavra sobre o assunto,

métodos e processos julgados pelos autores como

uma “verdade sacramentada”, o que em muitos casos

eficientes para melhorar os resultados do ensino; e

não o é, haja vista muitos LD apresentarem erros

c) colocar ao alcance de todos, especialmente dos

conceituais, ideias distorcidas e desatualizadas.3 O

alunos, textos verbais e não-verbais de difícil acesso.

LD deve propiciar ao leitor-aluno o contato com o

Acrescentaríamos, não como função, mas

universo textual através de uma linguagem simples e

como elemento básico na elaboração de um LD, um

que atenda à comunidade escolar. Com uma prática

respaldo num saber teórico-científico que garantisse

heterogênea, na medida em que incorpora no seu

eficientemente a prática didática dos professores e

discurso tanto elementos provenientes daquele

a compreensão e produção textual por parte dos

que lhe serve como fonte: a teoria gramatical e/ou

nossos alunos.

3 Ver, exemplos na revista Nova escola ano XVI, n.140, pp.14-20

A escolha de LD, quando é feita pelo professor Capa

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

linguística; quanto daquele que será objeto de análise:

O texto do LD constitui-se a partir da interseção

textos veiculados socialmente - crônicas, notícias,

de dois textos: o científico, resultado das pesquisas

poemas, propagandas, bulas. É, portanto, no limiar

sobre a língua e seu ensino (gramaticais, teorias

entre uma e outra prática discursiva, que se constitui o

linguísticas etc) e do texto que circula por todos

LD. E é no contato com o exterior discursivo do LD, que

os meios sociais ( jornais, revista, livros, cinema,

passamos a compreendê-lo.

teatro, TV etc). Assim, o LD, enquanto uma prática

Os autores que atuam desde a escolha dos temas

heterogênea, incorpora em seu discurso, tanto os

a serem abordados no manual, até a interpretação e

recursos linguísticos daqueles que lhe servem de fonte

análise, buscam a construção e a legitimação de um

– discurso social, também heterogêneo –, quanto

saber postulado pelo LD próprio de uma ideologia

daquele que pretende atingir – discurso científico,

social, com bases em diretrizes formuladas pelo

pedagógico e didático. Existem, portanto, dois níveis

MEC, como as Leis de diretrizes e Bases da Educação

de linguagem expressos: um caracterizado pela

e os Parâmetros Curriculares Nacionais.

objetividade, própria das práticas científicas de um

Chamar a atenção do leitor-aluno, despertando-

modo geral, já que se volta para teorias linguísticas

lhe o interesse e fazendo com que se sinta envolvido

ou para a gramática, e outra, cuja linguagem tende,

pelo assunto em estudo e pelo enfoque a este

em certa medida, para o registro mais coloquial,

dispensado, requer do discurso didático algo mais

demonstrando, até, uma certa subjetividade, o que

que o simples emprego da função referencial da

facilita o acesso do aluno ao texto.

linguagem. Os recursos utilizados nos LD são cada vez

Desta

forma,

o

discurso

científico,

mais diversificados e expressivos: Esses abusam, muitas

compartilhado apenas por aqueles que se voltam

vezes, de cores, imagens e temas apelativos. Desta

para a prática científica, volta-se também para

forma, esquecendo de incorporar conhecimentos

o aluno, sendo o LD, portanto, o veículo que vai

teóricos como afirma Marcuschi (2001b),

permitir que o aluno possa adentrar no universo

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da teoria linguística. É comum nos livros didáticos,

recursos, aqueles que considera mais adequado

o termo técnico ser explicado ou reestruturado

ao conhecimento linguístico de seu público-alvo

permitindo a compreensão do aluno. 4 Neste sentido

distribuído por séries escolares.

os autores dos livros didáticos incorporam ao

Ao escrever para um público juvenil, o autor-

discurso elementos linguísticos e extralinguísticos

editor, portanto, deve formular o seu discurso a partir

referentes à própria linguagem e leitura do aluno,

de elementos condizentes com o que julga ser mais

objetivando assim, a aproximação entre o aluno

apropriado a este, levando em conta fatores como

e o texto didático. É através de um registro mais

idade, grau de escolaridade, e mais especificadamente

coloquial e mais familiar ao universo do aluno,

por região geográfica e, até mesmo, pela faixa

que se percebe o caráter metalinguístico do LD. A

econômica. Percebemos, portanto que, a forma de

explicação, exemplificação, comparação, seleção

transmissão de um conteúdo inclui definitivamente

vocabular e recursos visuais tornam-se elementos

a organização dos níveis linguísticos como um todo,

didatizantes empregados pelos autores no ato de

considerando-se desde o lexical, passando pelo

compor o seu LD, com o intuito de aproximar o

morfológico, sintático, semântico até o textual.

aluno -leitor e facilitar, em certos pontos, o trabalho

Com a finalidade de atingir um público

do professor.

alvo, no caso o aluno, são selecionados recursos

O autor-editor elabora seu discurso tendo

linguísticos, que tornam essas atividades um fazer

como base o contexto discursivo e o interlocutor a

discursivo e não apenas a junção de dois saberes:

quem este se dirige. É da imagem que faz de seu

o científico e o social.

interlocutor que esse utiliza os recursos estéticos

Lajolo, em reportagem à revista Nova escola

disponíveis na língua, selecionando, dentre estes

(Prado, 2001) que apresenta como capa a questão do Livro Didático, nos diz que é preciso criar uma

4 É o que veremos na análise da coleção didática selecionada na Parte 4 desta dissertação.

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cultura de avaliação permanente do LD por parte eLivre

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do professor. O professor deve ver se a abordagem

do contexto escolar, por serem os parâmetros

do LD é negociável com a sua.

recentes. A preferência, quando se vai referir ou

O LD deve ser visto como um meio, nunca

classificar textos era, até então, pelo termo “tipo”,

como um fim, pois o professor que transforma

“forma” e se resume à narração, à descrição e à

esse suporte, esse apoio em fim perde a essência

dissertação (às vezes, à argumentação). Esses

do seu fazer, abandona a seu papel de sujeito na

termos referem-se a aspectos mais externos

sala de aula, escora-se no fazer impresso do LD.

da composição de um texto, enquanto gêneros

Essa prática existe e foi verificada e descrita em

são “exemplares empíricos” de textos como

uma pesquisa feita por Theodoro da Silva nos anos

diálogos, telefonema, bilhete, cartas, panfletos,

90 e publicada no livro A Produção da Leitura na

contos, romances, poemas, relatórios, ensaios

escola – pesquisas e propostas.

etc., constituem-se em “formas textuais realizadas efetivamente” (Marcuschi, 1997, 2000).

3.3 Novas concepções de texto e gênero e

Os PCN consideram o texto como unidade de

reformulação do livro didático

ensino e suas várias formas, os gêneros, no seu sentido empírico, descartando, portanto, outros

Em busca de uma melhor compreensão

tipos e formas de composição tão comuns nos

e classificação da natureza dos textos que

LD.

compõem o universo sócio-cultural do nosso

Todo texto se organiza dentro de determinado gênero em função das intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, as quais geram usos sociais que os determinam. Os gêneros são, portanto, determinados historicamente, constituindo formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura”. (PCN de LP p. 21)

país, os PCN lançam a noção de gêneros como objeto

de

ensino-aprendizagem.

A

palavra

gênero, devido à força histórica, remete-nos de imediato à literatura (gêneros literários). A nova noção de gênero bakhtiniano ainda não faz parte Capa

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esferas sociais de comunicação. A partir dessa Ao referir-se ao trabalho com os gêneros, os PCN

visão é possível organizar o estudo dos gêneros

apresentam uma distribuição por ciclos e em forma de

nos livros didáticos. Sabendo, de antemão que

espiral, sugerida por Pasquier (1996) no seu Decálogo

é difícil o estudo dos gêneros, pois estudá-los

para ensinar a escrever. Apresentam, também, alguns

implica, em suma, considerar a intenção entre

gêneros como referenciais nas práticas de escuta de

interlocutores e a enunciação. Daí a utilização de

textos orais e de leitura de textos escritos e produção

“tipos” nos LD de P. Muitas vezes, ao utilizar os

de textos orais e escritos. (PCN p. 54-57). Quadro

dois termos sem estabelecer uma diferença clara,

presente no início dessa parte.

o livro didático dificulta ainda mais assimilação do

Bezerra (1999) pondera que os PCN deveriam

conceito de gênero no que ele implica. Muitas vezes

precisar melhor o conceito de gênero para se

o que importa saber é a diferença entre narração,

visualizar melhor a sua dimensão, o que contribuiria

descrição, e dissertação. Hoje já sabemos que tal

para um melhor tratamento do texto nos moldes

conhecimento não favorece a uma compreensão

propostos por esse documento.

do texto e/ou produção de boas redações.

As propostas dos PCN começam a colocadas

Kleiman

(1999),

ao

analisar

uma

aula

nos LD; entre elas: o texto como unidade de

centrada no livro didático e outra centrada no

ensino, seleção de textos que circulam no meio

professor, mostra as vantagens da segunda aula,

social e os gêneros como objeto de ensino. Porém,

colocando-a como mais interativa, com resultados

trabalhar com o conceito de gêneros implica

positivos. Mas, será necessário abolir o LD para

voltar-se para o discurso, ou seja, para todas as

termos uma maior interação na sala de aula? E,

formas de enunciado que resultam de uma fusão

consequentemente, um melhor desempenho? Não

entre conteúdo temático, estilo e construção

usando o LD resolveríamos o problema do ensino

composicional que sofre variações conforme as

no nosso país?

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professores

que

se

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demonstram

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olhar dos autores dos livros didáticos e professores

independentes dos LD, formam o seu próprio

para teorias como a da Enunciação, a dos Gêneros.

material ao extrair textos de revistas, livros, jornais.

Essa prática já foi iniciada nos livros didáticos. É

Porém pelas observações feitas por Coracini

o que veremos na próxima parte.

(1999) há pouca inovação na forma de proceder. Por exemplo, nas perguntas feitas nas provas vemos que o livro didático está internalizado no professor. Nos livros didáticos o controle da forma de produção escrita vem sendo o destaque. O que importa é escrever conforme as regras gramaticais, usar adequadamente os articuladores textuais, narrar, descrever, dissertar, pois é isso que será cobrado nos concursos e vestibulares. No entanto, sabemos que não será cobrado apenas isso do aluno durante a sua existência enquanto leitor e produtor de textos. O que foi esquecido ou desprezado na prática de leitura e na prática de produção textual, como: posicionamento, argumentos, isto é, o desempenho discursivo será, certamente, cobrado pela sociedade. O que pode vir a contribuir nesta formação discursiva é o estudo de novas teorias, voltando o Capa

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estratégia de ensino e aprendizagem. A apresentação da estrutura da coleção se desdobra em Unidades organizadas por núcleos temáticos, o que já era comum em coleções didáticas de 4 ANÁLISE DA COLEÇÃO DIDÁTICA

Língua Portuguesa. A unidade contém: uma Abertura,

SELECIONADA

três Capítulos de desenvolvimentos de conteúdo e um capítulo final denominado de Intervalo.

Nesta parte, faremos a análise de textos

Cada momento visa a um objetivo: o de Abertura,

representativos dos gêneros textuais voltados para o

como os autores dizem, tem a finalidade de “aquecer e

estudo da língua portuguesa em conformidade com

estimular” para o trabalho com os capítulos e funciona,

a Teoria dos Gêneros, em uma coleção didática, bem

também, como “elemento organizador de unidade” e

como, suas características, progressão e exercícios a

do tema que será abordado

eles relacionados.

p.4-5).

4.1

5

(Manual do Professor,

Nos Capítulos de desenvolvimento de conteúdo,

Organização da coleção e apresentação da

denominado de Gêneros em foco, são apresentados

teoria dos gêneros

os gêneros que serão trabalhados: bilhete, carta, diário, poema, notícia, entrevista, anedota, crônica,

Na coleção didática Todos os textos: uma

conto, roteiro de vídeo etc.

proposta de produção textual a partir de gêneros

Nesses

e projetos, os autores mostram-se receptivos ao que

capítulos,

Gêneros

em

foco,

sugerem os teóricos da linguagem - Dolz e Schneuwly

percebemos uma mudança com relação a outros

(1996), Rojo (1998), Marcuschi (2000), entre outros -,

5 No Manual do Professor são sugeridas opções didáticas de como

no que diz respeito ao estudo dos gêneros textuais

trabalhar a Abertura como: Leitura das imagens, jogral com os poemas, assistir aos vídeos indicados etc., e as outras partes.

como instrumento de mediação de toda e qualquer Capa

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LD, no que diz respeito à seleção dos textos e

de outros gêneros: peças, júris simulados, produções

sua diversidade. Sua classificação está condizente

de revistas, jornais falados ou escritos, murais,

com a teoria apresentada no manual, que se

pesquisas, mostras e exposições (Exemplos Anexo 3 e

baseia no agrupamento dos gêneros textuais (ou

4), a partir nos temas tratados, porém voltados para

discursivos) em cinco partes: do narrar, do relatar,

os textos extra-coleção, para atividades de pesquisas

do argumentar, do expor e do descrever ações,

e produções individuais ou coletivas dos alunos

proposto pela equipe de Genebra e já apresentada

o que seriam “práticas de linguagem e situações

nessa pesquisa.

de comunicação em toda sua complexidade”

O critério de classificação dos textos para o

(Schneuwly e Dolz, 1996). Promove-se, segundo os

estudo seria o de dar condições para que o aluno

autores da coleção, neste momento, uma revisão e

utilize os gêneros textuais que fazem parte do

aprofundamento dos conteúdos e a verificação da

domínio sócio-cultural em favor de sua cidadania

aprendizagem dos gêneros e de outros aspectos

plena. É essa, a questão primordial desta pesquisa.

linguísticos envolvidos.

O Intervalo, última parte de cada unidade da

Essa proposta está presente nos PCN quando

coleção, apresenta como objetivo, segundo os

esses sugerem que se trabalhe os conteúdos por

autores (Manual do Professor, p. 5), “quebrar” a

sequências didáticas e projetos, definidos em função

sequência do próprio livro, propiciando uma vivência

da capacidade e das experiências necessárias ao aluno,

do conteúdo de forma mais prazerosa, como

como também, que apresente relação com o subjetivo

também, contribuindo para o desenvolvimento de

da aprendizagem e o contato com o mundo exterior.

outras formas de expressão oral e escrita do aluno,

O desenvolvimento linguístico, na idade escolar,

por meio de projetos.

se torna possível graças, sobretudo, ao ensino e

Observamos que no Intervalo os gêneros

a aprendizagem por meio da interação, em que o

trabalhados voltam-se, sobretudo, para a realização

sujeito está implicado numa situação que visa a um

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Referências

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efeito, às construções sociais. Dessa relação com

são elaborados: jornais falados ou escritos, murais,

o meio, o aluno passa a apresentar um domínio

exposições, livros, revistas 6. As práticas do capítulo Intervalo necessitam de

linguístico-discursivo mais amplo capacitando-o a interagir com o mundo em que vive.

um esforço maior do professor que, muitas vezes,

Dolz (1994) considera que o desenvolvimento

não está preparado para tal intento, além disso, ele

da autonomia do aluno é consequência, sobretudo,

precisará de um apoio da escola; por isso, muitas

da mestria (domínio) da linguagem em situações

vezes, essas práticas ficam apenas no papel.

de comunicação ocorridas na interação, em trocas

Na seção dos Capítulos de desenvolvimento

verbais, em atividades de construção conjuntas e

de conteúdos, encontramos exercícios gramaticais:

naturais por meio dos gêneros.

Para escrever com adequação; Para escrever com

A coleção didática propõe a produção de

expressividade: Para escrever com coesão e coerência.

textos orais ou escritos em condições reais de

Nesses exercícios são trabalhadas teorias linguísticas

interação verbal na seção Intervalo, envolvendo

que vêm contribuindo para o conhecimento das

consequentemente, o conhecimento de várias

propriedades do texto como as noções de coesão

disciplinas: história, geografia, ciências, música etc.

e a coerência.

Para Schneuwly (1994; 1996), essas práticas externas,

No Manual do professor, que se encontra

com as quais os alunos devem se confrontar ao longo

anexado no final do LD em análise, é feita uma breve

de sua escolaridade, favorecem o aprendizado da

apreciação da noção de gênero na era clássica,

expressão oral e escrita.

passando pelos trabalhos de Bakhtin até a proposta

Tais práticas, por meio de projetos e sequências

da equipe de Genebra: Dolz, Schneuwly e outros;

didáticas, devolvem-se em um período mais extenso

que, como já foi dito, adotando as perspectivas

que aulas semanais, e devem ser compartilhadas

6 Ver no anexo 3 e 4, nos capítulos da seção Intervalo.

por toda a comunidade escolar. Como resultados, Capa

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Referências

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enunciativas de Bahktin articula-as com os construtos

a sua explicação ou, ainda, numa segunda hipótese,

psicológicos de Vygotsky. Essa equipe direciona a

por acharem os autores-editores que os professores,

teoria dos gêneros para o ensino, como instrumento

devido à sua precária formação, não saberiam tirar

facilitador do processo de ensino aprendizagem

proveito das observações teóricas. Percebemos que,

com o qual é possível exercer uma ação linguística

até bem pouco tempo, não havia uma preocupação

sobre a realidade (Dolz e Schneuwly, 1996).

por parte de uma grande quantidade de autores-

Assim, podemos ver a base teórica sobre a qual foi

editores, em se promover o conhecimento do professor,

formulada a coleção que é a teoria dos gêneros textuais

capacitando-o para um maior domínio da teoria e do

como ferramenta (Schneuwly e Dolz, op.cit.), a serviço

conteúdo do livro, o que, como vamos observar, não

da construção do sujeito e da cidadania, proposta que

ocorre na coleção em análise. Já no próprio título da coleção: Todos os textos:

também se faz presente nos PCN: como um objeto

uma proposta de produção textual a partir de

(PCN, 1998b), para o ensino e aprendizagem. A exposição da teoria adotada em coleções

gêneros e projetos, os autores-editores mostram

didáticas de língua portuguesa não é uma constante.

a base teórica da coleção e delimitam a aplicação

Marcuschi (2001) ao analisar 60 coleções didáticas,

dessa teoria à produção textual e a projetos. E, na

observou que é comum a ausência de indicações

Bibliografia, são apontados livros que formularam a

teóricas, sendo exceção, nas coleções analisadas

teoria dos gêneros no estudo da língua.

por esse pesquisador, a coleção de Soares (1982) e

Portanto, há uma preocupação em deixar claro

de Cócco & Hailer (1994), denominada de ALP.

o pressuposto teórico do qual os autores-editores se

As possíveis causas dessa ausência em tantas

serviram para a elaboração de sua coleção didática.

coleções, segundo Marcuschi, é a impressão de que o

Resta saber como se deu a transposição didática

ensino de língua portuguesa se dá na suposição de que

dessa teoria nessa coleção.

a teoria subjacente é tão óbvia que se torna descabida Capa

Sumário

A Teoria dos Gêneros é apresentada, também, eLivre

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

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para o aluno em vários momentos da coleção como

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

117

confiabilidade e veracidade a teoria defendida.

no manual da 5a série quando é dada a noção de

Desta forma, observamos que a teoria presente

gêneros textuais:

na coleção se revela não só no Manual do Professor, mas também no texto voltado para o aluno. Isso mostra que seus autores são conhecedores e estudiosos de teorias linguísticas modernas e que procuram encaminhar essas teorias para o LD, tornando-as acessíveis ao professor e ao aluno. Pensamos ser essa coleção um exercício de prática da Teoria dos gêneros que ganha espaço, agora no material didático, além de considerar o professor um estudioso, um pesquisador, ao expor a teoria adotada pela coleção. Podemos encontrar ainda no Manual do Professor, presente nessa coleção, orientações e sugestões para

E assim, nessa passagem, de forma direta é

o trabalho em sala de aula, como: plano de curso e

apresentado o conceito de gêneros textuais ao aluno,

estratégias de ensino, o que vem se tomando comum

ao mesmo tempo em que é introduzida a ideia de

nos recentes manuais voltados para o professor 7, que

que o ato de escrever é algo simples do cotidiano de

não encontra mais tempo para planejar suas aulas,

cada um.

ficando essa tarefa para o livro didático. Assim, de acordo com Dallan (Prado, 2001,

O texto do LD, neste momento, incorpora o próprio discurso dos autores-pesquisadores, que assume a

7 Essas sugestões didáticas e metodológicas, como já foi mencionado na Parte 3 deste estudo, se deu devido à democratização do ensino no nosso país e ao povoamento das escolas.

teoria com sua própria voz, atribuindo um caráter de Capa

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Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

p.20), consultora pedagógica da Fundação para o

material de apoio, ou ainda, devido à realidade

Desenvolvimento da Educação de São Paulo, em

existente na escola que não dá condições ao

entrevista: o manual dirigido ao professor deve rever

professor exercer com dignidade sua profissão.

os pontos da matéria que o professor pode dominar,

Neste sentido, o manual dirigido ao professor

para o seu melhor desempenho. Segundo o Guia

poderia

ser

uma

ferramenta

de

formação

do Livro didático esse manual deve corresponder às

pedagógica, porém, muitas vezes, é negligenciado

necessidades reais do professor, capacitando-o para

pelos autores-editores de LD que não mencionam

usar, devidamente, o livro e o instruindo acerca do

a base teórica nem indicam fontes adicionais de

conteúdo que está sendo ensinado. Nunca, como

pesquisa, ficando, apenas, no planejamento básico

única fonte de conhecimento.

de conteúdos presentes no livro 8.

Outro propósito do Manual do Professor é

Referindo-se ainda ao Manual do Professor,

indicar novas fontes como: livros, revistas, filmes etc.,

do livro didático em análise, precisamente nas

com os quais cada unidade ou atividade poderia

Sugestões de estratégias para os capítulos, é feita

ser enriquecida, gerando atividades para além das

uma indicação louvável ao professor. Sugere-

que estão nos livros do aluno. Assim, o LD passa a

se a esse que peça para os seus alunos trazerem

considerar o professor e o aluno como estudiosos e

de casa: cartões, convites, cartas, bilhetes antes

pesquisadores da sua língua e cultura.

de iniciar o estudo desses gêneros (manual da 5a

Com essas e outras indicações, o Manual do

série); e em outros manuais, pede-se: livros, diários,

Professor assume um papel importante, auxiliando o

telegramas,

professor que, no nosso país, apresenta, em muitas

notícias reportagens, cartas de leitores etc.

localidades, dificuldades no emprego do material

em

quadrinho,

8 Para um maior aprofundamento nesta questão, sugerimos a leitura da matéria sobre o assunto na revista: Nova Escola, ano XVI, n.140, pp.14-20.

o prepara para devidamente para selecionar seu Sumário

histórias

Esse procedimento, se acatado pelo professor,

didático, devido a uma formação precária, que não

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poemas,

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motiva e introduz o aluno na diversidade textual e no

Tais como: a) corresponder às finalidades sociais

estudo dos gêneros, aproximando-o da realidade, do

legadas ao ensino, respondendo às necessidades

uso efetivo de um gênero, bem como contribuindo

de linguagem em expressão oral e escrita no amplo

para elaboração desses gêneros em estudo a partir

domínio da comunicação, b) retomar certas distinções

das suas características estáveis (estrutura e estilo).

tipológicas presentes em currículos e manuais de

Assim, forma-se a consciência da existência

ensino; c) serem relativamente homogêneos quanto

desses gêneros, cuja escolha pode se dar por

às capacidades de linguagem dominante, implicadas

vários critérios, uma vez que há uma quantidade de

no domínio dos gêneros agrupados.

gêneros variados para definir as diferentes maneiras

Esses linguistas salientam que a originalidade

de se elaborar e construir discursos.

das ideias apresentadas não reside nos agrupamentos

Desta forma, o livro abre um leque de opções

propostos, que são semelhantes a muitos outros como

de leituras e atividades gerenciadas por meio

o de Vigner (1979)9 e, sim, na tentativa de se trabalhar

do conhecimento dos gêneros que circulam

em nível de gêneros, definindo as capacidades de

socialmente, e que, por sua vez, favorece o contato

linguagem globais em relação às tipologias. Os Gêneros abordados na coleção em análise tiveram como critério de classificação para a realização de agrupamentos os domínios sociais

dos alunos com a realidade da qual ele faz parte. 4. 2 Seleção e agrupamento dos gêneros

9 Vigner, no seu livro Lire: du texte au sens, 1979 p. 82 e 83, apresenta uma lista de textos que um indivíduo pode na sua experiência de leitura encontrar e, em seguida, para assegurar uma formação em leitura desses textos agrupa-os em textos do domínio narrativo (reportagem, romance, lembranças, entrevistas...), do domínio descritivo (trechos de romances, de lembranças...), do domínio expressivo (poesias, romances, peças de teatro, ...), do domínio lógico-argumentativo (comunicações cientificas, cursos, editorial, correspondência comercial) , do domínio prescritivo (aviso, classificados, circulares, notas de serviço,...).Essa classificação, para Vigner, asseguraria a boa formação do leitor, e assemelha-se a proposta por Schneuwly e Dolz.

O agrupamento dos gêneros, com o intuito de viabilizar a transposição e a progressão didática na coleção em análise foi retirado da proposta apresentada por Schneuwly e Dolz (1996, pp.1114) que parte de determinados critérios de seleção. Capa

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de comunicação,10 uma vez que os gêneros que

elementos que compõem o gênero histórias em

pertencem a uma mesma esfera de comunicação

quadrinhos, com balões, gestos, indicadores de

apresentam semelhanças em situação de produção

movimentos, onomatopéias, formatos, linguagens

e compartilham aspectos composicionais e até

verbal e não-verbal, elementos que compõem a

temáticos, mas com diferentes graus de complexidade.

narrativa, legenda.

A coleção didática em análise trabalha sobre

Vejamos a história em quadrinhos de Laerte:

esses domínios, organizando-os por séries de ensino e apresentando-as, resumidamente, na coleção, da seguinte forma: a) Agrupados na ordem do narrar: os gêneros que fazem parte do domínio do narrar estão presentes em toda a coleção didática, da 5a à 8ª série. Nesse agrupamento é possível estudar textos que fazem parte da cultura de uma época ou de um país como os apresentados na unidade 2 e 3 do manual da 5ª série, cujos títulos, respectivamente, são: Histórias... Histórias: palavras e imagem e Histórias de hoje e de sempre, entre elas: contos maravilhosos, fantásticos ou atuais; lendas, fábulas, bem como, textos que apresentam sincretismos entre verbal e não verbal como histórias em quadrinhos. Há, na coleção uma proposta de se estudar os ������������������������������������������� Domínios apresentados na Parte 2, p.43-6.

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Tudo isso fornece meios para que o aluno

superficial, não há nenhuma pergunta sobre as

consiga conhecer, formalmente, esse gênero. Mas,

relações humanas, tema da história em quadrinho

esse gênero não é só forma, deveria haver também

em questão, tampouco acerca do sentido que

uma preocupação em se trabalhar as ideias, os

resulta do sincretismo do verbal com o não verbal.

aspectos discursivos que permeiam os quadrinhos

Apesar da mudança de paradigma em direção

ou qualquer outro gênero.

ao estudo dos gêneros, as questões formuladas para

O LD precisa ter essa preocupação, formulando

as narrativas não mudaram, permanecem as mesmas

questões que ultrapassem os aspectos estruturais

no livro didático em análise. Fala-se de personagens,

ou mesmo visíveis e previsíveis dos gêneros, que

tempo-espaço, mas esquece-se de tratar de

alcancem a intencionalidade do autor, indagando:

questões como: relações sociais, que emanam dos

qual a ação que se pretende realizar nessa interação

textos e que contribuem para a formação do aluno.

comunicativa? Qual o efeito de sentido que se pretende

Poderíamos fazer as seguintes perguntas: Por que

estabelecer entre o locutor e o interlocutor? Depois,

os garotos negam que estão namorando? O que

buscar os recursos utilizados na ação linguística,

é o namoro? Podemos afirmar, a partir da leitura

desde as palavras, os elementos conectores, o tipo

dos quadrinhos, que as pessoas com a convivência,

de texto até a seleção das informações. Por sua vez,

chegam a se gostar? Isso já aconteceu com você?

para a compreensão do texto, deve-se perguntar:

O estudo dos gêneros do narrar continua

como o texto foi constituído? Quais os recursos

em outras séries, de maneira mais aprofundada,

linguísticos utilizados? Quais os sentidos que as

formalmente, quando são estudados os elementos

instruções presentes no texto permitem levantar?

que compõem esses gêneros: como o foco narrativo

Se observarmos as questões propostas para a

(manual da 6a), os tipos de discurso: direto e indireto;

história de Laerte, logo após os quadrinhos, veremos

o enredo, o tempo e o espaço (manual da 8a). Essa

que essas questões estão ainda no nível de leitura

prática alinha-se com a sugestão de Pasquier e

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Dolz (1996) que, em seu Decálogo para ensinar

o Relato Pessoal (um episódio importante vivido pelo

a escrever, nos prescreve o estudo dos gêneros

narrador) e o Texto Opinativo. Esse último gênero

narrar, expor, argumentar etc, em todas as séries de

pode também ser enquadrado no gênero expor, que

ensino de maneira gradual e em forma de espiral.

veremos no 4.2.2.3. Os dois primeiros (autobiografia e

Desta maneira, a ordem do narrar aparece em

relato pessoal) assemelham-se aos gêneros do narrar

todos os manuais. Todavia, não podemos esquecer

por apresentarem personagens, tempo e espaço

que, em cada gênero, há propriedades linguístico-

como as narrativas e usarem a técnica da descrição.

discursivas diferentes que devem ser levadas em conta

Porém, o que caracteriza o relato é o fato de o

no estudo do texto, o que significaria ultrapassar seu

protagonista ser o narrador e os verbos e pronomes

aspecto formal e alcançar o nível discursivo de cada

são empregados quase sempre na 1ª pessoa. Tal

gênero em que reside um fazer social.

como podemos constatar no texto do relato pessoal,

b) Agrupados na ordem do relatar: na ordem

sem título, da professora T. Magalhães (anexo 1).

do relatar estão os textos que surgem da lembrança

Alguns textos podem fazer parte de dois

e da recordação de alguém, que pode vir do próprio

agrupamentos. Isso se dá porque não há ainda um

aluno. A ordem do relatar está presente na unidade

estudo que os diferenciem realmente, o que seria

4 da 5a série: Quem sou eu, através dos gêneros:

estabelecer critérios de classificação discursiva,

autobiografia e relato pessoal (5a série), o diário (6a

referentes à situação, às normas e aos tipos de ações

série), a crônica (7ª série) e, indiretamente em outros

realizadas por meio do gênero e aos objetivos e às

textos, como por exemplo, no texto introspectivo O

intenções sócio – culturais daqueles que se comunicam.

primeiro beijo, de Clarice Lispector (8ª série), porém

Visualizando melhor o impasse na classificação

sem referências a essa ordem.

dos

textos

nos

agrupamentos

determinados,

A unidade 4 da 5ª série é toda dedicada à ordem do

apresentamos como exemplo o texto Minhas Férias,

relatar. São apresentados os gêneros Autobiografia,

do manual da 6ª série, p. 4-5 (anexo 2) que é um relato:

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redação escolar e, está sendo estudado como narrativa

não causar dúvidas ou incompreensão, sobretudo,

pessoal. Ou seja, não foi estabelecido, na coleção, a

na sua utilização, levando o aluno a ser um produtor

fronteira entre os gêneros do narrar e do relatar.

dos gêneros trabalhados e não apenas um analista

Isto se dá uma vez que os gêneros misturam-se e se

e classificador desses gêneros.

permutam como afirmaram Bakhtin (2000), François

c) Agrupados na ordem do expor: na ordem do

(2000) e outros. Essa mistura ocorre, sobretudo, com os

expor estão os textos que transmitem e constroem

gêneros secundários, que são resultados de situações

saberes como os textos: Científico, Notícia, Resenha,

mais complexas de enunciação. É o que impede, muitas

Entrevista (6a série), Sinopse de livros e filmes, presentes

vezes, que seja feito um enquadramento de um texto

na abertura das unidades, entre outros. Esses textos

em um único gênero.

enquadram-se na classificação tradicional de textos

Os gêneros da ordem do relatar são estudados

dissertativos e são apresentados, na coleção, ainda

principalmente nas primeiras séries da coleção, ou

na sua visão convencional e estrutural rígida como

seja, 5ª e 6ª série. Na 8ª essa ordem não é abordada

contendo: introdução, desenvolvimento e conclusão.

diretamente. E, na 7ª série, é estudada a Crônica

Percebemos, também, que há uma ênfase no estudo

pessoal e vista em conjunto com outros tipos de

da estrutura textual, bem como ao escrever bem

crônicas como: Crônica-narrativa que se aproxima

(manual da 8ª série, capítulo 2, p.110-115). Essa última

do Conto, a Crônica-comentário que expõe um fato

preocupação (escrever bem) foi destacada na coleção

e o comenta. As diversas classificações da crônica

somente nesse momento, isso nos leva a crer, que essa

exemplificam a dificuldade de se estudar os gêneros

preocupação só deve existir a partir da série em foco.

de forma agrupada. Porém não devemos desprezar

No estudo dos textos da ordem do expor (nas

esse agrupamento, uma vez que esse facilita o estudo

páginas 110 –113) observamos, também, que as

dos gêneros de forma progressiva no ensino, mas

perguntas relativas ao texto são referentes à tese -

devemos trabalhar com esses gêneros de forma a

ideia principal do texto - e as partes que constituem

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o texto dissertativo: a introdução, o desenvolvimento e a conclusão, isto é, a razão da existência do texto é marcada em função das partes que o compõem não se aborda o fazer discursivo que antecede o aspecto formal do texto. Há, também, os próprios textos didáticos produzidos pelos autores-editores do LD que são expositivos e explicativos e visam, sobretudo, levar o aluno a obter um conhecimento sobre um determinado

Há, no entanto, outras formas de se chegar

gênero ou mesmo confrontar tipos textuais como a

a essas definições e distinções. Uma delas seria

dissertação e a argumentação, o que sem dúvida, ajuda

sugerir ao aluno que pesquisassem: o que é uma

na fixação das estruturas particulares dos gêneros

notícia?, suas características, sua finalidade, onde

enquadrados na ordem do expor e do argumentar.

essa se faz presente, antes de estudar o que foi dado ou pesquisado pelos autores do LD. Ou, ainda, no confronto entre a argumentação e a dissertação, pesquisar textos que ilustrem as diferenças e semelhanças entre essas ações textuais. c) Agrupados na ordem do argumentar: o texto argumentativo expressa uma opinião, um ponto de vista com razões, argumentos. Entre os gêneros textuais dessa ordem destacados nos manuais em análise estão as Cartas dos leitores: por meio dessa correspondência, os leitores de revistas e jornais

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dão suas opiniões a respeito de assuntos por eles

elementos como a contra-argumentação, chegando-

destacados (manuais da 5a e 6a séries). Porém, a noção

se até a simulação de um júri (manual de 8ª série,

de argumentação só será dada no manual da 6ª série.

p.98-99 da seção Intervalo: anexo 3).

Nas séries seguintes (7ª e 8ª) é dada uma atenção

d) Agrupado na ordem do descrever ações (ou

maior os gêneros da ordem do argumentar como uma

instruir e prescrever, segundo Rojo, 1998): há textos

extensão dos gêneros expositivos. Realmente, quando

que dão instruções, regulam comportamentos, como:

expomos nossos pensamentos devemos argumentar,

Bulas, Receitas, Regras de jogos manuais (manual da

fazendo, assim, valer a nossa opinião. Este é um dos

7a série, p. 69 a 79), Declaração dos direitos humanos

exercícios propostos na abordagem dos gêneros desse

(7a série, p. 126 - 129). E, outros textos que, por suas

agrupamento na coleção em análise.

características, se enquadram nesse agrupamento;

O estudo da argumentação está relacionado,

são instrutores de tarefas, conforme a seção Agora

diretamente, a temas polêmicos como cidadania

é sua vez e as sugestões, por exemplo: Criação de

(7ª série) e o poder da televisão, a reencarnação,

revista de história em quadrinhos (5ª série, p. 61);

etc (8ª série). Isso mostra que a argumentação está

Como montar uma revista em grupo (6a série, pp. 24

mais presente em texto que suscitam polêmicas e

- 25) e Como montar um livro de crônicas:

divergência de opinião. Isso exige do aluno um grau maior de conhecimento de mundo e maturidade. Há, também, entre os gêneros do argumentar, os orais, como o Debate que promove a discussão de variados pontos de vista (7a série). E outros, escritos, como Carta aberta, de solicitação e de reclamação (7a série) em que se expõem argumentos, para defender um direito. Ou ainda, o estudo desses gêneros destacando-se Capa

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O estudo dos gêneros da ordem do instruir e prescrever ações realiza-se praticamente na 7ª série, ou seja, não foi dada a importância merecida a essa ordem em outras séries na coleção em foco. A presença desses gêneros da ordem do instruir no manual da 7ª série (p.69) é essencial, uma vez que, há muitos textos instrucionais circulando no mundo atual. A leitura compreensiva desses textos é útil e necessária para que se possa proceder corretamente ao se tomar um remédio, montar um computador etc. Seu estudo, na coleção, realizase através da observação da estrutura formal e da linguagem empregada. Na bula abaixo, por exemplo, estuda-se sua composição textual dividida em informações ao pacientes, precauções, reações adversas e psicologia, os destaques presentes que devem chamar a atenção do leitor e a linguagem empregada que deve ser concisa e objetiva, mesmo com termos específicos.

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Como vemos, a proposta presente nos manuais é nova no que diz respeito à classificação textual, ou seja, ela não se restringe à tipologia tricotômica: narração, descrição e dissertação, comumente trabalhada nos manuais didáticos. Esta nova classificação e organização de estudo de textos visam a ampliar o conhecimento e facilitar o domínio dos textos que circulam socialmente. Porém, não podemos dizer que esses tipos textuais

Essa visão apresentada acima é interessante

tradicionais foram abandonados. Ao contrário,

por nos fazer ver que, a descrição colabora para a

essa tipologia está presente nos diversos gêneros

construção de um gênero agrupado em qualquer

textuais e, por isso, seu estudo deve permanece,

ordem, não mostrando a diferença existente entre

sendo que, nos livros em análise, a ênfase é dada

os gêneros. Portanto, o seu estudo não seria o

aos gêneros, mas, ainda, numa perspectiva formal

estudo de um gênero, nem mesmo como fator de

e não discursiva.

agrupamento desses, mas de estruturas que podem

Há, na coleção em foco, uma nova visão para

se repetir em determinados gêneros com mais

a descrição que é tratada como um “recurso”, uma

frequência do que em outros, como, por exemplo,

“técnica” empregada em narrativas como Fábulas,

nos textos da ordem do narrar e do prescrever.

Lendas, História em quadrinhos de forma diversa e

Internalizar os gêneros textuais é saber

até em Classificados (manual da 5a série, p. 36 -39).

se comunicar em diversas situações: narrando,

Observemos a descrição na narrativa, ilustrando

relatando, expondo, argumentando e descrevendo ações. Mesmo mostrando ciência disto, não há,

o que foi dito acima.

ainda, na coleção didática em questão, uma análise Capa

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das situações comunicativas, das práticas sociais

ensino e aprendizagem. Essa descaracterização é,

em que se desenvolve um determinado gênero,

muitas vezes, necessária, mas tanto o LD como os

que concretizam situações. Também não ocorre

professores devem tentar recuperar o contexto e as

uma identificação dos elementos relevantes que

condições de produção que resultaram no gênero.

determinam o fazer discursivo, que nos faça perceber

Por exemplo, os gêneros presentes em um jornal

como eles interagem e suas condições de uso,

devem ser estudados visualizando essa fonte. Se

desenvolvendo o conhecimento necessário para a

assim não fizerem, esses continuarão a realizar o

posterior produção desses mesmos gêneros - o que

que já era feito antes com a tipologia em que se

seria muito mais do que a comunicação verbal no

estudava o texto em função de uma identificação

sentido imanente.

da narração, da descrição e da dissertação. Os

Cabe ao LD mostrar em que contexto um

gêneros também devem ser trabalhados em função

gênero é mais apropriado que outro e quais as

da necessidade de comunicação. Isso ainda não

potencialidades de cada um. O conhecimento da

está sendo praticado pelo LD em foco quando,

situação de comunicação é o ponto de partida para

por exemplo, o livro sugere que seja feita uma

identificação de um gênero.

carta de solicitação, apenas para checar se o aluno

As práticas didáticas de uso-refexão-uso

sabe elaborar esse gênero. Em reais condições de

propostas pelos PCN por meio dos gêneros podem

produção, o texto ganha autenticidade, para isso,

possibilitar a autotomia e desempenho do aluno, o

devem-se criar condições reais de comunicação

que só é possível com a reeleboração contínua de

para o exercício com os gêneros como, por

práticas didáticas de gêneros textuais cada vez mais

exemplo, incentivar os alunos a fazerem cartas para

complexas.

autoridades expressando sua opinião.

Os gêneros no LD, devido à sua didatização,

Vemos que o estudo dos gêneros realizado na

descaracterizam-se por passarem a ser objeto de

coleção em análise não atende às necessidades reais

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de comunicação do aluno. Isso porque a escola vive

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Como podemos ver nessas passagens:

em função de um futuro que desconhecemos, para o qual o aluno deve ser preparado. A análise e a prática de comunicação de forma contextualizada proporcionam ao aluno um maior engajamento no universo textual existente; e isso lhe permitirá produzir, com desempenho, cartas para revistas, reivindicações para prefeitos etc. O ideal seria sempre perguntar: quais gêneros, por exemplo, podem ser estudados para que alguém possa mostrar suas ideias a outro que está perto ou longe? O que os alunos já sabem sobre esses gêneros? Como tornar essas práticas de leitura e escrita mais fundamentais para o cotidiano do aluno? Porém, não há uma preocupação em se 4.3 Características e diferenças dos gêneros

estabelecer diferenças entre os gêneros, tendo como

abordados

estudo, o seu momento de produção, o que determina a sua escolha, a intencionalidade que o gerou, pois,

Cada gênero abordado no LD em estudo apresenta

como sabemos, os gêneros nascem da necessidade de

características formais próprias que são fornecidas,

comunicação, de formas de dizer que se cristalizam.

grosso modo, com o objetivo de que os alunos se

Em alguns momentos do LD em questão,

apropriem dessas características e, assim, diferenciem

devido à grande variedade existente no próprio

os gêneros e os utilizem com desempenho.

gênero, é feita uma classificação, um detalhamento

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maior acerca desses gêneros, como, por exemplo:

poesia da tradição oral, jograis e declamações. Em

a Crônica que, pela diversidade de tipos e forma,

nenhum momento, são colocadas as características da

recebe uma classificação e um estudo a partir dessa

poesia como um gênero que possa ser enquadrado

classificação em vários capítulos (manual 7a série,

numa ordem. Podemos encontrar textos poéticos

p. 41: É possível classificar uma crônica, capítulo 1

em qualquer agrupamento: do narrar, do relatar, do

e capítulos 2 e 3: A crônica de humor e A crônica

expor, do prescrever e do argumentar. É indispensável

argumentativa, pp. 48-52 e 55-59 respectivamente).

para o estudo da poesia, visualizar as intenções que

4. 4

são perpassadas justamente pelo narrar, relatar, expor,

A poesia no agrupamento dos gêneros

prescrever e argumentar. Louvamos aqui o não esquecimento dessa

Dolz e Schneuwly (1996) não enquadram a

forma literário no LD, uma vez que, como nos

poesia em nenhum dos agrupamentos, sugere,

diz Alves (1995 p.13): a poesia é o gênero menos

apenas, o seu estudo à parte. E para esse estudo

privilegiado no fazer pedagógico da sala de aula.

indicam certos estudos e autores 11. A coleção em foco apresenta um estudo exaustivo

4.5

sobre a poesia no manual da 6ª série, na unidade 2 em

gramatical

que são feitas considerações sobre as propriedades do poema: a sonoridade e o ritmo; sobre a intertextualidade

Nos

e a paródia na poesia; e o poema-imagem. Na seção

de

desenvolvimentos

de

com adequação, com expressividade, com coerência

oral e escrita de poemas elaborados pelos alunos, de

e coesão etc, o texto, ainda, é visto como pretexto para o estudo da gramática, cujo valor não é negado

11 Os autores que tratam de forma interessante a poesia, segundo Dolz e Schneuwly são Jolibert, Sraiki e Herbeaux, 1992.

Sumário

Capítulos

conteúdos, precisamente, nas seções: Para escrever

Intervalo, dessa mesma unidade, é sugerida a exposição

Capa

O gênero: como pretexto para o estudo

nesse trabalho, mas que deveria ficar subordinado eLivre

Autor

Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

144

ao uso eficaz e efetivo dos discursos.

145

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

A questão proposta não alcança a realidade

Um exemplo da ocorrência do uso do texto

discursiva ocorrida no seio social por ser trabalhada

meramente gramatical é a Tira de Quino (6a série,

apenas

p.90) que foi utilizada na coleção para demonstrar a

desassociado do contexto.

no

seu

aspecto

formal,

gramatical,

utilização dos pronomes demonstrativos. Se olharmos

Sabemos que o texto de Quino é ideológico,

com mais atenção para o contexto (não trabalhado

mostra um posicionamento do idealizador do texto

nas questões que se dirigem a esse texto), veremos

que se “veste” de meninas para expor suas ideias.

que há uma leitura da situação do país, no caso a

Portanto perde-se uma boa oportunidade para se

Argentina, que está “cercada por ladrões” (sentido

estudar esse texto focalizando o seu contexto, sua

possível), ou seja, candidatos à presidência. Essa

historicidade e a utilização desse gênero para tal

leitura permitiria ao aluno a percepção de que essas

intento. Esse tipo de estudo não permite ao aluno

marcas linguísticas, no caso o uso do demonstrativo,

a percepção de que esses aspectos extralinguísticos

são importantes para a eficiência da construção do

são importantes para a eficácia da construção do

gênero que revela uma posição discursiva.

gênero que reveste uma posição discursiva. Nos manuais dos LD voltados para o professor, é comum uma descrição pormenorizada dos conteúdos gramaticais que devem ser vistos. No entanto, as atividades de expressão oral e escrita são sugeridas de forma superficial, como se produzir textos fosse um saber que a escola deve, apenas, encorajar, pois, nessa concepção, o ato de produzir textos nasce e se desenvolve de maneira espontânea em qualquer um, sem que seja necessário ensiná-la sistematicamente.

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Referências

146

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

4.6 A produção escrita e oral e a variante empregada

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

147

gêneros e seu estudo numa progressão curricular, há exigências de valores pedagógicos:

Já no Manual do Professor da coleção em análise,

. O aluno deve produzir textos para um público

são propostas práticas para o aprimoramento da

determinado, e usar de sua criatividade e clareza

escrita por meio da reflexão sobre o texto do próprio

para tornar o texto atraente.

aluno. Isso seria ensinar, sistematicamente, a produzir

. A leitura e a pesquisa surgem como pré-

textos coesos e coerentes. Porém, é preciso que os

requisitos básicos para a elaboração de textos reais

autores dessa coleção definam parâmetros mais claros

e autênticos. Se a atividade for a elaboração de

no Manual do aluno, para intervir adequadamente na

um jornal, por exemplo, deve-se antes conhecer as

produção em sala de aula, proporcionando assim, um

partes que compõem esse meio de comunicação,

melhor aproveitamento. Devem elaborar, inclusive,

sua linguagem etc.

atividades de escrita e de fala em situações variadas

. A interdisciplinaridade e a interação de

e complexas que favoreçam, nos alunos, um maior

conteúdos de disciplinas deve ocorrer.

domínio dos gêneros e das situações de comunicação

. O trabalho deve ser feito, também, em equipe,

que lhes correspondem.

o que favorece a interação entre alunos e também

Nesse Manual do Professor, são sugeridos procedimentos desenvolvimento

didáticos da

que

competência,

visam

entre alunos e professores.

ao

. Determinadas práticas de sala de aula passam

sobretudo,

a fazer sentido, como a reescritura de textos, uma

escrita do aluno, como: Espaço de criação, que

vez que os textos serão publicados.

consiste em um espaço de leitura e de produção

A aprendizagem por meio de projetos, tendo

de textos; Projetos, que consistem em criar situações

como ponto de partida o estudo dos gêneros, é

reais de comunicação, de interação.Para essa

mais dinâmica e interessante, além de conduzir o

prática, baseando-se em leituras feitas sobre os Capa

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

148

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

149

aluno a uma visão intensa de todo uma formação

aula, de se trabalhar também com textos orais. Esses

de conhecimento. O LD pode gerar um ensino

textos orais trabalhados na coleção compõem um

sistemático de aprender a escrever, por meio de

continuum, segundo Marcuschi (2001), extremamente

um trabalho progressivo e adaptado ao ritmo de

heterogêneo de ações verbais que, também, se

aprendizagem do aluno. Esse trabalho sistemático,

enquadra em gêneros, porém intermediários, por

no entanto, só poderá alcançar o êxito desejado,

serem advindos de textos escritos. Por exemplo,

se o professor conhecer a teoria trabalhada e agir

quando, em sala de aula, simula-se um telejornal,

como mediador dessa teoria, descobrindo formas

o texto (dos apresentadores, dos repórteres etc) já

de implementa-la, tendo o LD como um apoio para

foram previamente organizados por escrito.Apesar

a realização dessa prática.

da presença desses gêneros orais, não há, na coleção,

Ainda não é dado o devido tratamento

um estudo profícuo sobre os gêneros orais no qual

à oralidade nessa coleção didática. A atenção

possa ser vista toda a sua complexidade.

desses livros é voltada quase totalmente para

O tratamento dispensado à linguagem depende

a escrita. Algo comum nos LD em geral, é o que

essencialmente do faixa etária à qual o livro se dirige.

argumenta Marcuschi (2001, p.24-32) que, a partir

A inserção de elementos atrativos, um léxico mais

dessa preocupação, elabora sugestões para um

próximo ao cotidiano do leitor-aluno, a utilização de

trabalho com a língua falada em sala de aula e

frases de efeito: “Agora é sua vez”, “Fique plugado!”,

uma classificação conjunta e contínua da produção

“Fique ligado! Pesquise!”, “Fique ligado! Escreva!” são

textual na fala e na escrita.

algumas das estratégias linguísticas que, emergindo

A presença mais acentuada na coleção em

com maior ou menor frequência e intensidade, e

análise de gêneros orais se dá no manual da 8ª série

de acordo com a série, têm por finalidade prender

com: Debate, Júri simulado e Jornal falado que se

a atenção do aluno, trazendo-o para o interior do

concretizam através da necessidade, em sala de

texto em questão.

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Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

151

Chamar a atenção do leitor-aluno, despertando-

também, do contexto discursivo em que este se inscreve,

lhe o interesse e fazendo com que se sinta envolvido

da seleção de um gênero textual e, essencialmente, da

pelo assunto apresentado e pelo enfoque dispensado,

faixa etária a qual este se dirige. A partir da imagem

requer do discurso didático algo mais que o simples

que faz do aluno e dos valores sociais aos quais estão

emprego da função referencial da linguagem.

associados, os editores-autores selecionam os temas,

Assim sendo, os gêneros expressivos e apelativos:

aspectos linguísticos e recursos que consideram mais

conversação, textos em quadrinhos, diálogos curtos,

relevantes para o aluno.

frases de efeito; recursos visuais, como a foto de

As estratégias discursivas da ordem do expor, como:

um telegrama (6a série), e outros diversos tipos de

explicação, exemplificação, comparação, metáfora,

gêneros textuais e não textuais desempenham papel

nomeação, seleção vocabular e recursos visuais, são

fundamental na composição linguística e discursiva

elementos didatizantes empregados pelo editores-

do LD, além de instruir, prescrever e expor, ou

autores no ato de compor o seu LD, com o intuito de

seja, retomar, indicar e transcrever conhecimentos

aproximar o alunos-leitores do discurso do LD.

acumulados pela humanidade.

Desta forma, o modo como o autor elabora seu

Assim sendo, o texto do LD estaria localizado

discurso didático, condizente e coerente com o que

num continuum entre a tradição escrita e a oral,

julga mais apropriado ao público-alvo, forma o todo

o registro formal e o informal, a objetividade e a

discursivo presente no livro didático.

subjetividade, o verbal e o não-verbal, que se

O LD em análise, enquanto produto a ser

imbricam de maneira complexa, numa tessitura

comercialmente veiculado, assume um formato

intercalada de estruturas, aparentemente simples

atraente. Isto não pode ser desconsiderado, pois,

por meio da seleção e aplicação dos gêneros textuais.

muitas vezes, o LD é o único livro que a criança tem

Portanto, o fazer discursivo, elaborado pelos

em casa. Para tanto, os autores do LD utilizam-se

editores-autores da coleção didática, depende,

de recursos linguísticos e gêneros diversificados

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

152

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

153

(metalinguagem, narratividade, títulos sugestivos,

ozônio, por exemplo; e da exemplificação13, recursos

resumos) e extralinguísticos (recursos visuais – fotos,

com o propósito de tornar mais compreensível a Teoria

desenhos, tabelas, gráficos, esquemas) capazes de

dos Gêneros, no caso, o gênero textual em estudo14.

despertar o interesse do leitor-aluno e favorecer o

Isso ocorre também no decorrer do LD em análise

estudo não só dos gêneros textuais, mas suscitar ao

nos capítulos Gêneros em foco, em que a definição e a

estudo dos gêneros não-textuais.

caracterização de cada gênero são feitas. Por exemplo:

Algumas páginas da coleção em análise

a definição do Bilhete como um gênero textual muito

assemelham-se, no aspecto gráfico, a revistas

simple que possui um vocativo; o assunto, em poucas

(sobretudo nas páginas de abertura das unidades e

palavras; e a assinatura (manual da 5ª série, p.7).

na seção Intervalo). Vemos isto como algo positivo,

E, além da estrutura e características do Gênero

uma vez que o jovem, embalado pelas tendências

em foco, um modelo, como o do convite que segue:

modernas, prefere ler mais revistas a livros, ver mais imagens que textos. Na medida em que o discurso do LD se dirige ao público leigo no assunto que vai ser tratado, a didatização se apresenta como uma de suas características essenciais. O LD tende a trabalhar a linguagem de forma acessível, tornando compreensível à terminologia própria do jargão científico. Para tanto,

13

faz uso de recursos metalinguísticos (ou parafrásicos) como da definição

12

14 Ver mais detalhes sobre esses elementos didatizantes no artigo de Ana Paula Leibruder: O discurso de divulgação científica. In: BRANDÃO, Helena Nagamine. (2000) Gêneros do discurso na escola. V.5. São Paulo: Cortez, p.241-6.

utilizada para a explicação de

termos científicos pouco conhecidos: camada de 12

Ver o convite na página que segue.

Rever a definição de gênero textual na página 78.

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

154

É, portanto, a partir desses recursos didatizantes

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

155

tanto na forma como no conteúdo refletem e

no LD que é concretizada a explicação do gênero

refratam a realidade social vivida ou percebida”.

textual em foco, como também, é feita a aproximação

Caso não seja possível expor o contexto sócio-

do leitor-aluno à temática abordada. Através deste

histórico de todos os gêneros e de sua formação

mecanismo linguístico, a voz do editor-autor é

textual, uma vez que, como disse Bronckart (1999),

substituída pela voz dos objetos e ideias tratadas

eles estão em “constante movimento”, desaparecem

pelo texto, as quais passam a falar por si só.

e reaparecem sob formas diversas, devemos buscar alguns dados históricos e sociais a fim de

4. 7 A contextualização

contextualizar o gênero na análise, facilitando a sua compreensão e produção, uma vez que essa é a

Apesar de apresentar os gêneros e destacar

função primeira do estudo dos gêneros na língua.

suas características gerais, o LD, em questão, não

No LD em questão há ensaio de contextualização

incorpora seus elementos de ordem social e histórica

em exercícios de produção textual, o que pode

- o que, segundo Bakhtin, faz parte da própria noção

facilitar a apropriação do gênero trabalhado nesse

de gênero -, bem como, o processo de interação

exercício. Conforme o que segue:

de produção: quem fala, para quem fala, os lugares

“Antes de recriar um diálogo, escrever um parágrafo contando como as personagens se encontram, em que lugares estão, etc.” (Manual de 5ª série, p.50).

sociais desses interlocutores, seus posicionamentos ideológicos, o canal utilizado, seus objetivos e sua intencionalidade, o que caracteriza o enfoque sóciohistórico bakhtiniano de gênero. Não podemos

Há, no entanto, momentos de estudo de textos

estudar um gênero isolado de seu contexto sócio-

em que não é identificada a situação intertextual,

histórico-cultural de circulação. Segundo Barbosa

para que se possa situar melhor o enunciado:

(2000, p.149-74), parafraseando Bakhtin “os gêneros Capa

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

157

(lugar mencionado no texto) que parece ser um lugar fictício. Constatamos, portanto, que, no LD em análise, há textos selecionados para um estudo meramente tipológico sem uma preocupação em estabelecer a sua função ou suas relações discursivas. O estudo dos gêneros, no contexto linguístico, sua recepção e assimilação, resultam da expansão dos

procedimentos

básicos

aprendidos

nas

séries anteriores e, também, da exploração da funcionalidade dos elementos constitutivos dos gêneros estudados e sua relação com seu contexto de criação. Isso deve ser considerado por qualquer LD que adote a Teoria dos Gêneros. O problema, como já foi dito em um outro Nos quesitos elencados para o texto acima,

momento, não é mais a ausência da diversidade

há apenas uma preocupação: estabelecer os

textual no LD, mas como está sendo desenvolvido o

elementos internos que compõem a narrativa: fatos,

trabalho com essa diversidade, sua progressão e, se

personagens, tempo e espaço, a relação de causa

esse trabalho pode gerar efeitos positivos tais como:

e efeito. Elementos que dizem respeito a aspectos

levar o aluno a uma reflexão crítica sobre o texto

tipológicos próprios da narrativa.

e a uma explanação ou construção de um sentido.

As indicações citadas entre parênteses sobre

E não, apenas, verificar a presença e características

o extrato não são suficientes para situarmos o

de um gênero, seu aspecto formal, com práticas

texto num determinado gênero, tampouco “Clichy”

de reconhecimento e identificação. Isto é o que

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

158

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

159

constatamos na maioria das questões elaboradas

é a das diferenças físicas entre meninos e meninas:

para o estudo dos textos no LD em análise.

Diferentes mas iguais ( p.54-5). Por meio dessa

Se o estudo do texto leva em consideração

temática é estabelecida a diferença entre o texto

as marcas linguísticas, o locutor e o receptor, os

metalinguístico (um verbete), literário (uma história)

conhecimentos desses e o momento de interação, o

e científico (um artigo) todos tratando da diferença

estudo dos gêneros ganha uma maior dinamicidade

entre meninos e meninas.

o que é próprio da linguagem.

As temáticas no LD em foco são selecionadas e organizadas visualizando a formação do indivíduo,

4.8 A temática presente, a produção e o estudo

portanto, é comum falar sobre: a poluição (5ª série,

textual

p.24-7), A violência (6ª série, p.93-6), Adolescência (7ª série, Unidade 2, p.36-61) Ser jovem (8ª série,

Se levarmos em consideração o processo

unidade 1, p.2-35) sobre a cidadania (7ª série,

linguístico-discursivo de elaboração de um gênero,

unidade 4, p.98-129), a questão do consumo (7ª

veremos que há variedades de abordagem de um

série, unidade 3, p.62-97), Valores sociais (8ª série,

mesmo tema por meio dos gêneros. Podemos

unidade 2, p.36-65), A televisão (8ª série, unidade

vivenciar um tema por meio de um romance, de uma

3, p.66- 99), exclusão social, conflitos de gerações,

peça, de um filme, de uma história em quadrinhos,

globalização, entre outros temas.

o necessário é saber se servir dos gêneros para tal

Isto é, há uma constância de temas sociais

intento. Um enunciado, um texto, um determinado

ou do interesse da faixa etária dos alunos a quem

gênero estarão sempre atrelados a um tema e é em

se destina a coleção, além de envolver contextos

função de um tema determinado em cada unidade

culturais e sociais diversificados por meio de variados

do LD que se trabalha os gêneros.

gêneros, o que favorece a interdisciplinaridade. Como exemplo, o texto A camada de ozônio e uma

Na unidade 3 da 6ª série a temática abordada Capa

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

161

imagem do buraco na camada de ozônio visto por

discursivas, propiciam um engajamento do aluno ao

satélite (na seção Agora é a sua vez, p.59, 6a série)

tema proposto, e consequentemente, a formação de

que podem ser trabalhados conjuntamente com o

um ponto de vista por parte desses, contribuindo

professor de ciências. Os PCN (1998, p.31-2) sugerem

também para sua formação discursiva.

esses trabalhos e enfatizam a responsabilidade de

Quando se trata da produção textual, o caráter

todas as disciplinas em ensinar por meio de textos

inovador e motivador da abordagem dos temas e da

presentes no convívio social do aluno.

explanação dos gêneros não se manifestam com a

O trabalho com a temática é progressivo. Há

mesma intensidade. A grande maioria das atividades

temas que são retomados nas séries seguintes,

de redação no LD em questão tende a apresentar

por meio de outros gêneros. Como por exemplo:

condições de produção artificiais, dirigidas ao

a temática da adolescência nos gêneros Conto e

professor ou a exposição em murais, ou seja, ainda

Crônica, agrupados na ordem do narrar: O primeiro

não são planejadas ações alternativas nos capítulos

beijo, de Clarice Lispector (7ª série) e na série seguinte

para a socialização efetiva dos textos redigidos

(8ª) A Morcega, de Walcyr Carrasco.

pelos alunos fora do contexto escolar. Apenas, na

Os

textos

selecionados

são

de

seção Intervalo, há propostas de criação textual em

autores

representativos da literatura nacional e internacional,

condições mais espontâneas (anexo 3 e 4).

como, Lígia Fagundes Telles, Luis Fernando Veríssimo,

Os alunos devem ser motivados, quando

Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Mário

exercitarem a redação, a visualizarem uma situação

Quintana, Esopo, os irmãos Grimm, Edgar Allan

real de produção ou até a produzirem em função de

Poe, Mordillo, Quino, e periódicos de circulação

uma situação real. Como exemplo: redigir Cartas para

nacional, como, Folha de São Paulo, Veja, Pais &

revistas reais, em circulação, expressando suas opiniões

Teens, Atrevida, Superinteressante. Esses textos,

sobre as matérias, reivindicar seus direitos através de

por serem exercícios constantes de diversidades

carta de solicitação, de reclamação a representantes

Capa

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Referências

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162

do povo: vereadores, deputados, senadores.

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

163

uma forma própria que se pode aprender a usar na

No uso da produção oral, a coleção em análise

escrita e na oralidade. Como destaca Meurer (2000),

restringe-se a situações na sala de aula ou na

a cultura de um país é visualizada pelos gêneros

escolar, sendo mais um instrumento da disciplina na

textuais produzidos pelo seu povo, sendo, portanto,

checagem da leitura dos temas e aspectos linguísticos

no momento, questão fundamental nos estudos de

abordados do que objeto de estudo a ser sistemática

língua, no que diz respeito a todas as suas etapas:

e explicitamente abordado para o exercício pleno no

compreensão, interpretação e produção textual.

meio social em situações significativas.

O estudo dos textos no LD de Português,

Os textos que circulam socialmente, conforme

segundo a teoria dos gêneros, não pode ser mais

Carneiro (1997), cumprem um papel “modalizador”,

visto como pretexto para tratar de questões morais

isto é, funcionam como modelo, a partir dos

ou meramente gramaticais. Este deve ser visto,

quais os alunos vão se familiarizando com as

antes de tudo, como um aparato que contribui para

características discursivas dos diferentes gêneros;

a formação de leitores capazes de reconhecer as

porém a prática desses gêneros deve ser o máximo

sutilezas, as particularidades, os sentidos que dele

possível significativa. Para tanto, é necessário um

podem ser tirados, como também a extensão e a

estudo sistemático: conhecimentos prévios sobre o

profundidade das construções nele presente.

assunto e sobre o gênero e, em seguida, práticas

Os textos da coleção em análise, em geral, não

que ultrapassem o contexto escolar.

foram escritos pelos editores-autores do manual, e

Quando são contadas histórias para crianças que

sim, por outros autores que os redigiram como um

ainda não sabem ler e escrever, convencionalmente,

objetivo, uma intencionalidade, uma funcionalidade.

ensina-se a elas como são organizados, na escrita,

No livro didático, esses textos foram selecionados

os gêneros.

para um estudo de compreensão, de assimilação de

Todo texto pertence a determinado gênero, com Capa

Sumário

um gênero, um estudo linguístico. Tal fato gera uma eLivre

Autor

Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

164

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

165

confusão quando se agrupam determinados textos,

e construção de instrumentos para que o aluno

uma vez que, deve-se preservar a intenção do autor,

amplie a sua competência linguístico–discursiva.

causa maior da existência do texto.

A finalidade do texto no livro didático não é a

Bezerra (2000, p.40) demonstra o tratamento

mesma do autor do texto. O LD de Português em análise

que vem sendo dado ao texto no LD de Português e

mesmo com boas propostas de trabalho com o texto,

expõe que não há uma preocupação em se estabelecer

ainda vê este como um meio de trabalhar a língua e

diferenças tipológicas claras. Como por exemplo,

seus aspectos. Porém, não podemos perder de vista a

a Carta pessoal e comercial que são estudadas

intencionalidade do texto, seu contexto sócio-histórico.

estruturalmente, no entanto, não há nenhuma alusão

A seleção dos textos para o livro didático em

a sua tipologia, quanto a ser narrativa, descritiva; e, a

análise foi feita em função da temática, dos gêneros

carta de opinião, ser de caráter argumentativo. Ou,

selecionados, em função da teoria dos gêneros voltada

ainda, que a Fábula, Lenda, Conto não são formas

para o ensino; mas também, em função de abordagem

variadas da narrativa, levando o aluno a pensar que há

de determinadas teorias linguísticas para um estudo

quatros variedades de textos: Fábula, Lenda, Conto e

meramente gramatical. Cada texto selecionado da

narrativa. No LD em análise observamos que há essa

seção Gêneros em foco prima por um objetivo próprio

preocupação ao trazer uma classificação determinada

que seria o estudo de textos existentes na diversidade

por meio de traços tipológicos constituída pelo

linguística, dentro de uma temática e enquadrado

agrupamento dos gêneros da equipe de Genebra.

dentro da proposta teoria de base.

Porém, há momentos em que não se distingue,

O

claramente, tipos de gêneros.

livro

didático

mostrou-se

preocupado

em trazer uma grande quantidade de textos,

A leitura de textos escritos, entre outras práticas,

menos gramática formalmente trabalhada e mais

deve ser vista como uma atividade discursiva que

discurso

gera, por meio da análise e da reflexão, a expansão

explorando a diversidade de gêneros existente. Há

Capa

Sumário

eLivre

pessoal

Autor

(entrevistas

e

depoimentos)

Referências

166

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

167

essa preocupação na coleção em análise quando

títulos foram retirados do manual da 6a série). Ou,

observamos a presença de depoimentos jovens

ainda, a partir de aspectos tipológicos e estruturais

e adultos (6a séries, p.95 e 8a série, p.34,68 e 77);

sobre os quais foram agrupados, conforme já foram

debates (7a série, p.107: princípios básicos para a

agrupados por Dolz e Schneuwly (1996), em forma

realização de um bom debate) e projetos com júri

de narrar, relatar, argumentar, expor e descrever

simulado (8a série, p.98 e 99); entrevistas (6a série,

ações como: O texto narrativo e o ponto de vista, O

p.82 e 83). O que não seria ainda o ideal, uma vez

texto científico; O texto argumentativo (manual de

que esse estudo e prática restringem-se quase

6a série), que se estende às outras séries de forma

totalmente, no LD em análise, ao contexto escolar.

mais específica e aprofundada. O texto narrativo: tipos de discurso e A crônica argumentativa, A carta

Se levarmos em consideração o processo um

argumentativa de solicitação e de Reclamação

agrupamento, veremos que há uma variedade de

(manual de 7a série) e A narrativa: o enredo (I e II), A

marcas, que devem ser reconhecidas, o que facilita

narrativa: o tempo e o espaço e O texto argumentativo:

a caracterização dos gêneros e sua assimilação. Há

razões e conclusão; o texto argumentativo: o senso

estudos referentes dos gêneros em que é considerado

comum e o texto argumentativo: a informatividade

o seu processo discursivo

(manual da 8a série).

linguístico-discursivo

de

elaboração

15

de

e que favorecem a

assimilação de outros traços na caracterização dos

Nas questões elaboradas para o estudo de

gêneros por esse viés.

textos, observamos que há uma mistura do conceito

A cada unidade-capítulo do LD em análise é dado

de gênero com o de tipo de texto. Como na pergunta

um título que se enquadra com os gêneros textuais

dirigida a dois textos de Luis Fernando Veríssimo

que serão abordados. Por exemplo: O telegrama, O

Minhas Férias, do livro O nariz e outras crônicas e Lar

diário, O poema, A notícia, A reportagem (todos esses

desfeito, da Comédias da vida privada 16. No estudo

15

Ver estudos de Brandão, 2000 e Meurer, 2000. Capa

Sumário

16 Ver esses textos, na íntegra, nos anexos 2 e 5.

eLivre

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Referências

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

168

Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

169

do primeiro texto, Minhas férias (anexo 2) que se

textos como sendo narrativos, eles se concretizam

encontra no manual da 6a série, precisamente na

em formas diferentes – gêneros – que possuem

questão 2, encontramos o seguinte enunciado:

diferenças específicas.

“O texto recebe o título de ‘Minhas férias’. Pela

No segundo texto, O lar desfeito, (anexo 5),

história que narra, ele se assemelha a um tipo de

temos:

texto feito na escola, solicitado pelos professores. a) “Esse texto conta uma história.

Que tipo de texto é esse?”.

A que gênero ele pertence?” (manual da 7a série. P.6)

Ora, a resposta esperada e cabível seria: uma redação escolar, porém se pensarmos no conceito de

A resposta poderia ser uma ‘crônica narrativa’

tipo; a resposta seria: ‘uma narrativa das férias’. Enquanto

que tem por eixo uma história, em que se narra uma

na de gênero textual seria: uma redação escolar.

situação vivida por uma família.

Aprofundando um pouco mais, se pensarmos na intenção do autor do texto, na necessidade que

A crônica, conforme está dito na coleção na p.

gerou esse texto, poderíamos classificá-lo como

41 na 7ª série, foi um gênero que nasceu no jornal e

uma crônica em forma de redação escolar, uma vez

se caracteriza por apresentar os fatos do cotidiano

que os gêneros se permeiam e se permutam. Essa

de forma artística e pessoal. Um outro indício que nos leva a classificar Lar

é a dinâmica dos gêneros que imitam a própria

desfeito com uma crônica é o próprio título do livro:

dinâmica da língua, como disse Bakhtin (2000). Essa narrativa em estudo se organiza de forma

Comédias da vida privada, de onde foi coletado o

diferente da fábula, do conto, isto é, cada gênero

texto. No entanto, a resposta esperada - e que consta

possui diferenças entre si. Como nos diz Barbosa

no livro do professor - é: “Ao gênero narrativo”. O

& Santos (s/d,) não podemos ensinar narrativa em

conceito de gênero textual trabalhado no manual

geral, porque, embora possamos classificar vários

de 5a série - já exposto por nós - não condiz como

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o de tipologia textual, que seria como o gênero se

por exemplo, trabalhados na 5a série são o bilhete,

manifesta - narração, descrição e dissertação. Fica,

cartão, postal, carta pessoal; na série seguinte,

portanto, um impasse: O que vem a ser gênero na

outras correspondências que apresentam num grau

coleção? Desta forma, percebemos que o conceito

maior de dificuldade: o telegrama, a carta do leitor E,

de gênero não está bem definido na prática. É

assim, sucessivamente, na 7a série: a carta aberta, de

necessário, portanto, um aprofundamento para

solicitação e de reclamação e na 8a série: o editorial,

resultar numa melhor compreensão e assimilação

que seria uma carta do editor de uma revista ou

por parte dos leitores – professores e alunos - do

qualquer outro periódico.

material didático.

Poderia fazer parte desta lista ainda as

Sabemos que o gênero é o resultado de uma

apresentações de livros, feitas, às vezes, pelo

situação social representada por uma organização

próprio autor do livro para que se conheça a sua

típica e textual e com funções próprias e, que há,

abordagem. Mas, como o livro não se propõe a um

ainda, uma infinidade de gêneros que precisam ser

estudo exaustivo de um determinado tipo de gênero

reconhecidos para serem trabalhados, sobretudo os

textual, é compreensível esta ausência.

gêneros orais.

Apesar da evolução, no que diz respeito à

O estudo de cada gênero textual, na coleção em

variação dos gêneros, ainda persiste a ideia de que

análise, é feito de forma progressiva e diversificada;

a modalidade narração existe separadamente da

proposição colocada por Pasquier & Dolz (1996),

argumentação. Não podemos dizer que um texto é

que consiste, basicamente, na retomada, no

exclusivamente narrativo, pois não há exclusividade,

aprofundamento e na ampliação de cada gênero de

o que há é um aspecto tipológico que predomina

acordo com a série e com o grau de maturidade do

no texto, que pode ser a narração, a exposição, a

aluno, o que seria uma complexificação dos gêneros

dissertação – em que a argumentação se faz mais

a cada série escolar. Os gêneros correspondências,

presente. Conforme perspectiva da Semântica

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Argumentativa17, a argumentação se faz presente

Como atesta Rojo (1998), há muitos gêneros

em qualquer texto, seja narrativo, expositivo, etc.

presentes em coleção didáticas que, ainda, não

Vemos textos narrativos como Fábulas, Parábolas

foram devidamente estudados, do ponto de vista

e discursos pessoais usados para persuadir e

de sua marcas linguístico-discursivas interna e

convencer.

externas. Essa pesquisadora, ao se debruçar sobre

Falta, porém, um estudo da construção do

alguns gêneros do agrupamento do relatar como:

sentido que permeia cada texto, para não cairmos

Diário íntimo, de viagem, Biografia, e Relato histórico,

outra vez numa classificação fechada e apenas

tem realizado por meio do estudo de aspectos

formal. Um bom exemplo acontece no texto O lar

enunciativos e linguísticos uma análise mais

desfeito (anexo 5) em que podemos observar que,

detalhada e consistente desses gêneros, destacando

por ser o texto uma narração, todas as questões

diferenças entre eles, em termos linguísticos, de

voltam-se para as características tipológicas da

procedimentos coesivos, enunciativos e discursivos.

narração e esquece-se de que a narração é uma

A atividade discursiva se desenvolve em

das maneiras de que podemos nos servir para levar

interação constante, percebemos isso ao explicitar

um determinado público a perceber a situação da

a situação material, indicando a presença dos

família na atualidade, à medida que é narrada a

interlocutores em situação, os lugares imediatos da

relação entre os membros da família.

situação e ao momento definido. Todas essas marcas

As análises textuais presentes nessa coleção

linguístico-discursivas compõem a enunciação, o

didática não se constituem em análises consistentes

discurso.

sobre os gêneros textuais e sobre suas propriedades

No LD em análise os gêneros textuais ainda

linguístico-discursivas externas.

não são bem definidos. As diferenças apresentadas não são suficientes para diferenciar os gêneros de

17 Sugerimos, para ampliar as informações acerca desse assunto, a leitura de obras que tratam da argumentação, como dos seguintes autores Perelman,1996; Anscombre e Ducrot, 1976.

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um mesmo agrupamento. Como, por exemplo, as eLivre

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características do Diário:

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Tais características são insuficientes para que o aluno produza textos nesses gêneros com um grau maior de unidade e com coerência. Há uma infinidade de fatores que compõem a enunciação e que contribuem para a formação do gênero no seu aspecto formal. Alguns gêneros assemelham-se a outros que fazem parte, por sua vez, de outros agrupamentos. Dada essa proximidade, Marcuschi (2000) nos diz que os gêneros formam um continuum, e isso impede a classificação (ou agrupamento) dos gêneros sem que se estabeleçam critérios.19 Isso ocorre com o Relato Pessoal que faz parte do agrupamento do

Essas por serem gerais, não se diferenciam das

relatar e a Crônica que pode fazer parte do narrar e

características da Autobiografia18, que são relatos,

do expor, uma vez que o personagem, às vezes, é o

impressões, fatos vividos pelo autor, ditados por suas

próprio narrador.

lembranças guardadas na memória, que apresenta

Existe uma quantidade de gêneros diferentes

uma estrutura livre e que pode conter narrativas e

para se referir as diferentes maneiras de se preparar

descrições de pessoas, cenas e paisagens (manual

e se constituir discursos; mas, para o estudo desses,

da 5ª série, p.92). Ora, o que foi estabelecido como

se faz necessário o reconhecimento das marcas

característica do Diário pode ser estabelecido

linguístico-discursivas que os diferenciam.

também para a Autobiografia.

19 Ver essa preocupação com a classificação dos gêneros também em Meurer (2000).

18 Ver essas características na página 95 desta analise.

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As atividades, através dos gêneros, para surtir o efeito desejado, devem ser mais de que uma técnica de exposição de características devem ser significativas, fruto de uma necessidade emergente. CONCLUSÃO

As reflexões que se seguem são frutos de uma análise que, embora breve, busca apontar caminhos para que o professor possa fazer um melhor uso do Livro Didático analisando-o como mediador no processo de ensino e aprendizagem, e tendo-o como um apoio questionável, porém necessário, devido à situação atual da educação que impede que o professor elabore o seu próprio material didático. Apresentamos, a seguir, algumas considerações finais desta última parte, partindo das questões que regeram a pesquisa. A partir do título e da proposta apresentada, observamos que a coleção didática analisada voltase, essencialmente, para o estudo dos gêneros. Seus autores-editores tiveram como pressupostos teóricos os estudos dos gêneros centrados no ensino Capa

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e aprendizagem, expostos por Schneuwly (1994),

real. Na prática, vemos à reprodução de padrões

Dolz e Schneuwly (1996) e adotada pelos PCN, que

esquemáticos de estudo e produção de textos

propõem um trabalho com a diversidade de gêneros

partindo, agora, dos aspectos estruturais dos

como fonte de conhecimento e aprofundamento

gêneros.

linguístico-discursivo.

Há, no manual, poucas oportunidades

No entanto, a abordagem textual em toda

de se colocar o fazer discursivo por meio de

a coleção volta-se, quase que exclusivamente,

uma situação real de comunicação, de uso

para a definição de gênero a que pertence cada

efetivo. O comum é uma prática de um discurso

texto. Fica evidente que o texto continua sendo

ainda padronizado e descontextualizado, já

um pretexto, agora, para o estudo dos gêneros

que não há uma comunidade discursiva real

no seu aspecto estrutural e composicional

com fins estabelecidos, mas sim, situações

(características principais), bem como, para

determinadas pelo LD. Essa prática pode não

ilustrar o estudo de aspectos textuais e aspectos

contribuir plenamente para o desenvolvimento

relativos ao código e à gramática como: coesão

da competência textual-discursiva do aluno. Vale

e coerência textual, palavras de referências,

salientar, no entanto, que no momento da coleção

relações semânticas, vocabulário. Isto é, esta

designado de Intervalo, ocorre um ensaio do que

coleção didática, mesmo mostrando propostas

seria o estudo dos gêneros direcionado para a

inovadoras, não consegue, ainda, alcançar a

construção de um fazer discursivo real que exige

dimensão textual-discursiva que pressupõe a

uma formação crítica e participativa.

concepção da linguagem, presente na teoria

Voltar-se para análise dos gêneros é voltar-

dos gêneros, como um lugar de interação, em

se para uma situação social que apresenta uma

que sujeitos constroem um fazer discursivo fruto

organização típica e com função própria que devem

de uma necessidade de comunicação natural e

ser descobertas e estudadas. Assim sendo, se faz

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necessário, em cada texto estudado, o resgate da

grupo de Genebra e de elementos didatizantes que

situação original do texto que seria: o seu contexto,

são empregados pelo editor-autor no ato de compor

os seus locutores e interlocutores e seu momento

o LD, com o intuito de aproximar o aluno-leitor. De

histórico-social. Prática não identificada na coleção

certa forma, esse fazer discursivo, presente no LD

em análise.

em foco, facilita e contribui para o conhecimento

Durante o estudo dos gêneros textuais, não

de alguns gêneros que, se estudado em situações

foi levado em conta o conhecimento prévio do

mais próximas do real, do seu uso efetivo traria

professor e do aluno quanto às características

resultados mais positivos para a utilização desses

formais dos gêneros. A critério de sugestão,

foram do contexto escolar.

deveria ser dada oportunidade ao aluno de

Os gêneros no LD analisado são estudados

construir um saber sobre um determinado

de forma distante do indivíduo falante, isolado

gênero, partindo de seu conhecimento e de

do seu momento sócio-histórico-cultural. Alguns

pesquisas feitas por ele. Assim, esse descobriria

gêneros regionais não foram considerados como:

outras características de cada gênero destacado

na literatura: o Cordel, as Lendas locais. Na música:

para o estudo, além das destacadas no LD, como:

o Frevo, o Forró, gêneros musicais representantes

quando são utilizados, se ainda são utilizados no

da cultura do Nordeste, talvez porque o LD, ainda

atual contexto social ou se já foram alterados ou

não se abriu para a pluralidade dos discursos e

substituídos por outros etc., o que contribuiria

cultura que há em nosso país, o que permitiria

para que o aluno visse a riqueza que envolve o

um maior estudo das variantes linguísticas e

uso efetivo dos gêneros num âmbito mais amplo,

culturais.

além dos limites escolares.

O ensino de língua, por meio dos gêneros,

O fazer discursivo presente na coleção em

busca

análise se organiza a partir da teoria dos gêneros do Capa

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o

desenvolvimento

da

competência

discursiva do aluno, capacitando-o a compreender eLivre

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e produzir textos nas mais diferentes situações

Para alcançar esses aspectos discursivos o LD

de comunicação. O LD em análise, indiretamente,

em análise deveria deixar de perguntar: o que o autor

desperta o aluno para a diversidade de gêneros

disse nesse texto ou nesse trecho? Ou ainda: esse

existentes e para importância do conhecimento

texto pode ser considerado uma narrativa? E passar

desses.

a questionar: a partir de sua constituição, em quais

No que diz respeito ao estudo dos gêneros no

condições de produção esse texto foi realizado?

aspecto sócio-histórico-cultural, a coleção deixa a

quais os sentidos que as instruções presentes no

desejar. Há, uma ênfase no reconhecimento dos

texto permitem levantar? Entre outras.

gêneros; porém, mais importante do que esse

Desta forma, o LD passaria a exercitar, na prática,

reconhecimento e sua classificação, é a utilização

a teoria dos gêneros na perspectiva bakhtiniana

desses para o bom desempenho e êxito na

e trabalhada por linguistas aplicados em prol da

comunicação. Portanto, o estudo dos gêneros não

qualidade do ensino e aprendizagem da língua.

deve ter um fim em si mesmo, deve ser visto como

Chegamos a um final provisório de nossas buscas,

um instrumento que favoreça o crescimento de um

indagações e inquietações; porém, como pergunta

saber-fazer textual-discursivo em diversas situações

Todorov: “.... quem nos dirá se o caminho seguido não

de interação verbal, como um instrumento com o

tem mais interesse do que o ponto de chegada?”

qual é possível exercer uma ação linguística sobre

Por isso, convidamos autores de livros didáticos,

a realidade. Assim, o estudo dos gêneros ampliaria

professores e estudiosos da língua em geral a aceitar

a competência linguística e discursiva dos alunos

essa provocação em debater e rediscutir o papel do

- que seria na prática: saber conhecer um gênero

livro didático enquanto regente e interlocutor na

não só por meio de seus aspectos linguísticas e

sala de aula, sobretudo, no Ensino Fundamental,

textuais, mas também por aspectos discursivos, o

bem como, o papel da teoria dos gêneros que serviu

que engloba o social e o histórico.

de suporte para esse trabalho e que ganhou corpo

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no livro didático analisado.

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apontaram para a importância do gênero como

No decorrer dessa investigação, abordamos

organizador das ações de linguagens possíveis e

teorias que se propunham a estabelecer um conceito

como instrumento eficaz no ensino e aprendizagem

e uma classificação dos gêneros na literatura e na

da língua, ideia encampada pelos PCN.

linguística. Na

literatura,

Percebemos, na nossa pesquisa, que há uma foram

sugeridas

diversas

unanimidade na aprovação do estudo dos gêneros

classificações e foram dadas várias definições

no âmbito linguístico e uma preocupação por parte

para os gêneros, conforme a época e a corrente

de todos os linguistas aplicados, em se estabelecer,

literária, muitas delas elaboradas para o estudo

com êxito, a transposição da teoria dos gêneros

de um número restrito de gêneros de valor social

para o ensino.

reconhecido ou exclusivo da literatura. Com o

Essas colocações são visíveis nos trabalhos

advento da modernidade e, consequentemente,

desenvolvidos

pela

equipe

de

Genebra

que

surgimento de uma gama imensa de gêneros

organizou os gêneros em conformidade com os

de circulação social, houve a necessidade de se

domínios sociais de comunicação e trabalham

ampliar o campo de visão dos gêneros. A partir de

com a progressão e a aplicação didática desses no

ampliação desse campo de visão propagado por

contexto escolar.

Bakhtin, Todorov e outros, inicia-se o estudo dos

O nosso estudo, além de divulgar essas novas

gêneros como as formas de dizer que circulam

visões e estudos sobre os gêneros, procuram

socialmente.

contemplar a aplicação e o encaminhamento dado a

O estudo dos gêneros na linguística, aqui

esses numa coleção didática, que apresenta e aplica

apresentado, deu-se, sobretudo, em Bakhtin e

a Teoria dos gêneros.

nas pesquisas mais recentes feitas por estudiosos

Por meio da observação dos estudos dos

franceses, genebrinos e brasileiros. Essas pesquisas

gêneros presentes nessa coleção em análise,

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concluímos que a abordagem dada centra-se mais

Esse procedimento aproxima o Livro Didático

na estrutura interna e visível do gênero: linguística,

do verdadeiro papel da Escola: a vivência, por parte

classificatória e formal. Não é feito um estudo

dos alunos, de uma educação que almeja um mundo

profícuo, de aspectos externos, como por exemplo:

mais participativo e mais promissor.

da situação de comunicação, da interação verbal que concretizou o gênero, o que contribuiria, muito mais, para identificação dos gêneros e para sua apropriação. Como pudemos constatar, a coleção dá um grande passo ao introduzir o estudo dos gêneros, mas a abordagem restrita a aspectos formais nos estudos do texto não garante o domínio textualdiscursivo do aluno e sua autonomia na utilização consciente dos gêneros. Reafirmamos, portanto, a nossa constatação de que o LD pode vir a ser um colaborador na formação crítica dos alunos quando provoca questionamentos

mais

pertinentes

com

a

concepção de gênero e práticas sociais mais próximas da realidade; e, assim, este material de apoio passa a contribuir para a formação de cidadãos aptos a exercerem um papel social bem mais efetivo. Capa

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eLivre

Autor

Referências

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Gêneros textuais - Roseane Batista Feitosa Nicolau

partir de gêneros e projetos. 5ª a 8ª série. São Paulo: Atual

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