“Goa e as Praças do Norte”- Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa

June 5, 2017 | Autor: Marta Rodrigues | Categoria: Cultural Geography, Colonialism, Post-Colonialism, Orientalism, Colonial Discourse
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Universidade do Minho Instituto de Ciências Sociais

Marta Filipa Fernandes Rodrigues

“Goa e as Praças do Norte”- Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa

Tese de Mestrado Geografia – Planeamento e Gestão do Território

Trabalho efectuado sobre a orientação da Professora Doutora Ana Francisca de Azevedo

Novembro 2010

DECLARAÇÃO

Nome : Marta Filipa Fernandes Rodrigues Endereço electrónico: [email protected]

Telemóvel: 911038587

Número do Bilhete de Identidade: 13013314 Título Dissertação: Goa e as Praças do Norte”Norte”- Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa Orientador(es): Professora Doutora Ana Francisca de Azevedo Ano de conclusão: 2011 Designação do Mestrado: Geografia / Especialização Especialização em Planeamento e Gestão do Território

Nos exemplares das teses de doutoramento ou de mestrado ou de outros trabalhos entregues para prestação de provas públicas nas universidades ou outros estabelecimentos de ensino, e dos quais é obrigatoriamente enviado um exemplar para depósito legal na Biblioteca Nacional e, pelo menos outro para a biblioteca da universidade respectiva, deve constar uma das seguintes declarações:

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO PARCIAL DESTA TESE/TRABALHO (indicar, caso tal seja necessário, nº máximo de páginas, ilustrações, gráficos, etc.), APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO,MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE;

Universidade do Minho, / /2011

Assinatura: _______________________________

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AGRADECIMENTOS

A realização de uma dissertação é um acto que por si só abarca muitas responsabilidades, sendo por vezes um caminho longo e penoso a percorrer. Este caminho não o fiz sozinha e foi graças ao apoio e compreensão de pessoas que me são muito queridas e próximas que a realização deste trabalho foi possível. Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à minha orientadora Doutora Ana Francisca de Azevedo, pelo apoio prestado, pela confiança depositada em mim, pela troca de conhecimentos e ideias e acima de tudo pela amizade e carinho com que sempre me tratou. Como me escreveu numa das suas publicações, os nossos estudos são um ponto de encontro que perdurarão. Agradeço aos meus pais pela compreensão dos tempos perdidos, pelas longas ausências e pelo apoio, ânimo e amor incondicional que sempre me deram, acreditando na minha paixão e no meu futuro. Ao meu irmão Vítor, pela paciência e companhia nas horas de estudo e pela compreensão do encargo que este trabalho abarca. À minha prima Rafaela, ao meu amigo Jorge, ao meu amigo Bruno e à minha amiga Raquel o meu muito obrigado pelo constante apoio, ânimo, pelos momentos em que aturaram os meus desabafos e pela companhia ao longo desta jornada. Por último, à minha querida Avó Fernanda que sempre incentivou os netos. A todos, o meu muito obrigado neste passo importante da minha vida académica.

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RESUMO

O colonialismo como prática político-intelectual e construção social tem sido alvo de diversas revisões e críticas na academia. Inseridas num contexto pós-colonial, estas críticas debatem temas como espaço, representações, discursos e práticas coloniais. Com o alargamento do debate às mais variadas áreas do saber, a Geografia Cultural Contemporânea tem tido um papel activo, procurando compreender a produção do conhecimento geográfico português. Num presente eminentemente pós-colonial, procura-se o descodificar da Geografia Colonial Portuguesa, tendo em conta a teoria lusotropicalista de Gilberto Freyre e a teoria orientalista de Edward Said; e compreender qual o seu contributo para a perpetuação do mito do Império Português no Oriente.

ABSTRACT

Colonialism as a political and intellectual practice and social construction has been the subject of several reviews and critiques in the academy. Set in a post- colonial context, these critics discuss topics such as space, representations, discourses and colonial practices. Extending the discussion to the most varied fields of knowledge, the Contemporary Cultural Geography has played an active role, seeking to understand the production of Portuguese geographical knowledge. In a predominantly post – colonial present, we seek to decode the Portuguese Colonial Geography, taking into account the lusotropicalist theory of Gilberto Freyre and the Orientalist theory of Edward Said, and understand their contribution to the perpetuation of the myth of the Portuguese Empire in the East.

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ÍNDICE GERAL

AGRADECIMENTOS ……………………………………………………………….III RESUMO ……………………………………………………………………………..IV ÍNDICE………………………………………………………………………………...V ÍNDICE DE FIGURAS………………………………………………………………...VI I CAPÍTULO – INTRODUÇÃO……………………………………………………….7 1.1 – Enquadramento Geral……………………………………………8 1.2– Metodologia……………………………………………………...10 II CAPÍTULO - GEOGRAFIAS, DISCURSOS E PRÁTICAS PÓS-COLONIAIS…...13 2.1 – Estudos Pós-Coloniais …...……………………………………..14 2.2 – Abordagens Pós-Coloniais em Geografia……………………….22 2.3 – Análise de Textos e Discurso Colonial………………………….27 III CAPÍTULO: GEOGRAFIAS, DISCURSOS E PRÁTICAS PÓS-COLONIAIS EM PORTUGAL………………………………………………………...33 3.1 – Estudos Pós-Coloniais e Geografia em Portugal ..……………. 34 3.2 – Crítica ao Império e Lusotropicalismo………………………...40 IV- GOA E AS PRAÇAS DO NORTE…………………………………………………47 4.1 – Formação da Geografia Colonial Portuguesa…………………..48 4.2 – Raquel Soeiro de Brito e a Geografia Colonial Portuguesa…...54 4.3 – Análise da Obra “Goa e as Praças do Norte”………………….60 4.3.1 – Paisagem e Clima: Sentimentos de Lugar…………………...62 4.3.2 – Espaço e História: Afirmação da Cultura………...………….67 4.3.3 – Diferenciação de Género: A Mulher e o Orientalismo…...….76 4.3.4 – Lusotropicalismo e Mito do Império Português…………......82 V- NOTAS CONCLUSIVAS…………………………………………………………..87 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………………………………90 ANEXOS……...………………………………………………………………………103 v

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INDÍCE DE FIGURAS

Fig. 1- Orlando Ribeiro e Raquel Soeiro de Brito ………………………………58 Fig. 2- Mapa de Henrique Galvão ……………………………………………….59 Fig. 3 – Rebordo de Gates………………………………………………………..63 Fig. 4 – Plataformas do Litoral…………………………………………………...64 Fig. 5 – Fortaleza de Damão ……………………………………………………..65 Fig. 6 – Festa Religiosa Cristã ………………………………………………….. 69 Fig. 7 – Ruínas de Edifícios Goeses…………………………...…………………71 Fig. 8 – Casas Goesas ……………………………………………………………72 Fig. 9 – Casa Moura em Damão …………………………………………………73 Fig. 10 – Casa em Diu …………………………………………………………...74 Fig. 11 – Debulha do Arroz ……………………………………………………...75 Fig. 12 – Mulher Hindu na Act. Agrícola ………………………………………..78 Fig. 13 – Mulheres Hindus na Act. Piscatória……………………………………79 Fig. 14 – O “Outro” Feminino……………………………………………………80 Fig. 15 – Objecto de Desejo Ocidental....………………………………………...81

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I Capítulo: Introdução

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1.1- ENQUADRAMENTO GERAL O presente estudo intitulado ‘Goa e as Praças do Norte – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa’ tem como intuito o aprofundamento das intercepções entre a Geografia Pós-Colonial e a Geografia do Género, inicializado no âmbito do Seminário de Investigação 1 da Licenciatura de Geografia e Planeamento da Universidade do Minho. Ao desenvolver-se neste ponto de confluência, e tendo em conta os actuais debates que associam espaço, discurso, práticas coloniais e questões de género, o principal objectivo do projecto consiste em compreender a produção do conhecimento geográfico português. Por essa mesma razão, entendemos que a escolha da temática da geografia colonial seria a mais acertada, pelo facto de existir uma parca investigação sobre os trabalhos dos geógrafos portugueses nas missões coloniais. Entendido o “colonialismo” como uma prática política e social e uma construção cultural, este constructo será abordado como uma ideologia profundamente marcante tanto para “colonizadores” como para “colonizados”, entendendo-se como determinante na evolução do mundo moderno. Interferindo de forma decisiva no desenvolvimento dos diferentes povos e culturas, a ideia de colonialismo encontra-se actualmente sujeita a uma revisão e crítica acesa. Deste modo, consideramos necessário o alargamento do debate em torno desta ideia às diferentes esferas e campos do saber, tendo a geografia cultural contemporânea tem um papel activo. Centrando a análise na obra de Raquel Soeiro de Brito e atendendo às necessidades objectivas de circunscrição do estudo, dado o carácter formal de dissertação de mestrado, entendemos que a escolha da obra “Goa e as Praças do Norte” (1966) como fonte primária seria a mais adequada, servindo como eixo organizador do conjunto da análise. Não é de todo difícil clarificar a escolha desta obra. “Goa e as Praças do Norte” descreve com pormenor a Índia descolonizada centrando-se nas cidades colonizadas por 1

RODRIGUES, Marta (2008) – “Geografias Pós-Coloniais: Um Estudo Exploratório” – Seminário de Investigação – Universidade do Minho.

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portugueses, desmistifica o pensamento existente sobre o Oriente e mostra (sendo esta na minha opinião a razão mais importante) o trabalho e a vida fascinante de uma Mulher que não tinha medo de ultrapassar fronteiras e abrir portas fechadas para as mulheres da sua época, mostrando o imenso e talentoso trabalho efectuado por uma Geógrafa Portuguesa. Deste modo, o corpus da pesquisa desenvolve-se em torno da análise crítica da obra, procurando respostas para as questões que vão surgindo, à medida que indagamos o seu universo de produção e recepção. Tendo em conta o contexto político e ideológico e as circunstâncias históricas, sociais e culturais de produção da obra, procuram-se os nexos causais que legitimaram as geografias circunstanciais de uma pioneira da geografia portuguesa moderna. É esta a nossa questão de partida, questão que não se esgota neste ponto. Radicando a nossa problemática de estudo na tentativa de compreender as condições de produção de um segmento da geografia colonial portuguesa, os objectivos deste estudo prendem-se com: a) A tentativa de compreensão das forças que operaram a ‘naturalização’ de um discurso e de uma prática geográfica; b) As repercussões desse discurso e dessa prática para a construção de um ‘Portugal Geográfico’; c) O contributo dessas geografias para a consolidação do mito do Império Colonial Português; d) A posição específica desta obra relativamente a constructos conceptuais como o orientalismo e o (luso)tropicalismo, bem como as representações culturais de espaço, lugar e paisagem, natureza e cultura, Eu e Outro.

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1.2 -METODOLOGIA A metodologia de investigação adoptada para a realização deste estudo, assenta essencialmente na análise documental e de conteúdo de diversas fontes. Os documentos consultados, encontram-se divididos em fontes primárias e secundárias, resultando em variados tipos de documentos como textos escritos e textos visuais. Esta diversidade de documentos obriga a uma triangulação das técnicas de análise e de dados, desde a hermenêutica à semiótica da imagem. Na medida em que optamos por uma análise crítica e revisionista, a metodologia adoptada reflectirá uma sensibilidade implicada com os métodos de desconstrução textual. É de salientar o carácter exploratório do estudo na medida de que também este é pioneiro no que respeita à selecção das fontes. No que respeita à consistência interna da tese, sendo este um tema que abarca diferentes momentos, pretende-se criar um discurso situado para que se entenda correctamente a perspectiva adoptada. Deste modo optei pela seguinte estrutura: começarei por discutir algumas problemáticas que considero centrais e seguirei para a análise do discurso geográfico colonial, cingindo-me ao caso português em concreto.

1. A primeira fase da investigação versará sobre o aprofundamento da recolha e revisão bibliográfica, quer ao nível de livros quer de artigos consultados. Nesta primeira fase iniciaremos o corpus de estudo com uma análise das geografias pós-coloniais. Abrangendo a temática dos Estudos Pós-Coloniais e do Pós-colonialismo, pretendo demonstrar como e com que objectivo surgiram. Iniciando com o estado geral das artes, através das teorias de vários críticos pós-coloniais demonstrarei como contribuíram para a compreensão do colonialismo e para a queda de preconceitos existentes. Deste modo as (inter)ligações existentes entre conceitos como orientalismo, tropicalidade e lusotropicalismo para a construção do discurso colonial serão alvo de análise.

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Abordando a temática das geografias pós-coloniais, darei especial atenção ao modo como esta pode contribuir para a desconstrução das metanarrativas previamente designadas pelo mundo ocidental.

2.

A segunda fase de investigação, consistirá na descoberta da Teoria

Lusotropicalista de Gilberto Freyre como arma de propaganda do governo salazarista e a sua contribuição para a mistificação do Império Português. Iniciando o capítulo a criação dos Estudos Pós-Coloniais e das Geografias PósColoniais no contexto académico português, incidirei posteriormente na construção do espaço geográfico português e na ideia de Império Português, e no papel da teoria lusotropical de Gilberto Freyre na política colonial portuguesa, a base para a criação de missões geográficas, com propósito científico e colonial. Neste contexto de renascimento e exaltação do espírito, alma e império português, a criação da Junta de Investigação do Ultramar e do Centro de Geografia do Ultramar centra as suas atenções nos territórios colonizados e retoma-se a construção de Portugal como um lugar mítico, ideologia fulcral para demonstrar ao mundo a colonização diferenciada praticado pelo povo português.

3. Seguidamente centrar-me-ei na análise da obra “Goa e as Praças do Norte”, no conjunto da obra da autora e no contexto da sua produção. Neste sentido, abordarei a formação da geografia colonial portuguesa e a sua importância para a produção do conhecimento geográfico colonial. Com o intuito de à posteriori entender os escritos, os propósitos e os pontos de vista que tem sobre Goa, é necessário conhecer primeiro a mulher por trás da Geógrafa e, por esta mesma razão, parte deste capítulo versa sobre a própria Raquel Soeiro de Brito. A fase final de estudo corresponde à análise da fonte primária, atendendo aos contributos de teorias críticas contemporâneas. Passando à análise crítica de “Goa e as Praças do Norte”, que figura como um estudo dos espaços físicos e humanos das relações portuguesas no Oriente e um dos primeiros estudos da primeira mulher doutorada em Geografia em Portugal, teremos em conta a 11

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contextualização da publicação da obra com o momento político vivido em Portugal por esta altura. Surgindo num período de grande contestação da política colonial portuguesa, tentarei demonstrar através da análise da obra se realmente existia o incutir da teoria lusotropical na academia portuguesa e se este era aplicado.

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II Capítulo: Geografias, Discursos e Práticas Pós-Coloniais

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2.1 – ESTUDOS PÓS-COLONIAIS Emergindo nas últimas décadas do séc. XX como uma problemática académica, “a problemática pós-colonial decorre de uma profunda transformação nas instâncias de produção da subjectividade bem como a de movimentos políticos-intelectuais implicados com a autorização de diferentes posicionalidades” (Pimenta el al, 2007:11). Esta permite a organização de um paradigma comprometido com “a crítica, a exposição, a desconstrução, a contraposição, a transcendência das presenças e dos legados culturais e ideológicos do imperialismo” (Sidaway, 2002:13). O primeiro sentido do termo pós-colonialismo surge como meio de descrever o estado no qual o indivíduo se encontra depois da descolonização formal, consistindo num termo político, legal e histórico que se encontra fortemente contestado e cuja análise é fulcral para o estudo do momento presente. O segundo sentido do termo mostra-se mais específico, encontrando-se principalmente associado aos Estudos Literários. O pós-colonialismo começa a ser visto como um modo de análise teórica, onde a história, a filosofia e a cultura ocidentais são “invadidos” por textos não ocidentais, com o objectivo de desconstruir e desnaturalizar as formas de conhecimento europeu. O terceiro sentido do termo pós-colonialismo encontra-se conectado com a teoria pós-colonial, tendo como tarefa a indignação relativamente ao carácter universal das formulações discursivas produzidas no âmbito do conhecimento ocidental bem como da desconstrução das funções imperialistas desses discursos. Desde a década de 90 que as discussões sobre desenvolvimento alternativo orientam-se para a linguagem e o discurso, pretendendo autores como Michael Watts (2003) através do seu trabalho sobre alternativas e desenvolvimento como a geografia crítica do desenvolvimento deve ser. Concretamente em geografia e de acordo com Michael Watts, enfatiza-se a vertente crítica das abordagens tentando rever-se conceitos e práticas científicas, bem como políticas de desenvolvimento. E é neste quadro que a geografia cultural ganha significado renovado, pelo modo como se ocupa de textos e representações, por propor a revisão de conceitos estruturantes da prática geográfica moderna, nomeadamente a noção de cultura. De acordo com Watts (2003:434) deve consistir numa “geografia capaz de entender as actuais práticas do desenvolvimento (instituições, conhecimentos, profissões, acumulação de riqueza, formas de intervenção do estado, e assim adiante) 14

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em termos culturais (semiótica, representação, discurso) e espaciais (regional, territorial e global)”. Entendida como prática que produz significados, a cultura sempre foi parte do desenvolvimento colonial usando-se a cultura local como forma de construção de um novo tipo de sujeito colonial (Scott, 1995:203). Considerada como um mecanismo passível de tornar o colonialismo estável e ajudar a criar “nativos felizes” (Watts, 2003:435), a cultura era vista como base do projecto moderno da civilização. Estando claramente associadas a movimentos sociais e transformações das práticas culturais dentro e fora da academia, as problemáticas pós-coloniais criaram um debate transdisciplinar cuja preocupação consiste no “desenvolvimento de uma consciência das implicações políticas da construção das narrativas coloniais, interpretações e “histórias”, e nas repercussões para a constituição de um presente póscolonial” (Jacobs, 1996), reforçando a necessidade de vermos “o modo como o ocidente representa o outro não-ocidental” (Corbridge, 1993:95). Contribuindo de alguma forma para o que Stuart Hall denomina de renarrativização e deslocando “a história da modernidade capitalista a partir do centro europeu até às periferias globais dispersas” (1996:250), o desenvolvimento crítico e a criação de alternativas à modernidade conduziu a um clamor crescente no sentido de se ver para além da hegemonia ocidental. Neste sentido, o termo teoria pós-colonial na sua acepção mais imediata, remetenos para o final do colonialismo moderno e para a reorganização das práticas e sistemas de pensamento no séc. XX, sendo uma referência ao fim dos projectos utópicos levados a cabo por países recém-independentes. O pós-colonialismo lida com os efeitos da colonização nas culturas e sociedades (Ashcroft et al, 1998) tendo surgido como uma exigência para dar voz a indivíduos e grupos tidos como subalternos. Como Arif Dirlik (1994:501) afirma, o pós-colonialismo reivindica para si um campo que anteriormente era conhecido como terceiro mundo, tendo como objectivo anular as distinções do tipo centro-periferia e outros binarismos alegadamente enraizados no colonialismo e vistos como frustrantes e embaraçosos, tal como a dicotomia Eu / outro; indígena / colonizador e familiar / estranho; servindo para descrever uma situação posterior ao colonialismo e as condições das sociedades excoloniais. Deste modo, o pós-colonialismo define-se em relação a um conjunto de políticas de desenvolvimento preponderantes e a um conjunto de lutas políticas 15

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específicas, levando ao surgimento de questões como ‘o que foi o colonialismo?’, e ‘quando se tornou o mundo pós-colonial?’. O ataque ao desenvolvimento como uma espécie de modernidade falhada, baseou-se em suposições em torno das grandes instituições de desenvolvimento, apoiando-se na análise discursiva do desenvolvimento económico. Esta prática leva autores como James Ferguson (1990) a sugerir que a implementação dos projectos políticos modernos foi conduzida sem política. Ainda que por vezes tal tipo de argumento possa ser facilmente contestado, este trabalho conduziu a um olhar cultural sobre as instituições e práticas de desenvolvimento e sobre os movimentos de resistência, abrindo novos caminhos para a análise cultural e geográfica. Devemos ter em conta que durante o período de contestação política, as teorias surgidas sobre os auspícios do colonialismo e do imperialismo e as suas formas de resistência têm a sua origem nos indivíduos afectados por lutas de descolonização que, através da sua história, experiência e produção de textos, criaram um corpo de pensamento denominado de Teoria Política Pós-Colonial ou Pós-Imperial2. Talvez por este motivo, a luta por representação e lugares centrais dentro da academia conduzia a situações pós-coloniais entre os académicos locais e os oriundos das ex-colónias. Tendo em conta este exemplo, podemos verificar que a situação pós-colonial não se restringe apenas a lugares mas também às populações que ao viverem situações semelhantes são denominadas de pós-coloniais. Neste caso, falamos do grande problema que afecta as situações pós-coloniais: a crise de representações, o modo incapaz dos sujeitos exporem as suas narrativas e a subalternidade. Estas crises de representações, onde o problema da subalternidade tem necessariamente de ser tomado em conta, são o cerne dos Estudos Pós-Coloniais. Consolidados nos anos 80/90 do séc. XX como estudos de carácter fortemente político e interventivo, emergindo dos Estudos Culturais e partilhando a característica de questionar as fronteiras entre saberes, os Estudos Pós-Coloniais sugerem a produtividade do recurso a ferramentas alheias que proporcionem um modo diferente de visualizar os objectivos moderno. O principal tema de pesquisa incidia sobre: “as relações entre a cultura contemporânea e a sociedade, ou seja, as suas formas culturais, 2

A teoria política pós-colonial centra-se em localizar na sua especificidade histórica a emergência de certas formas de governação, regras de relacionamento e formulações teóricas com o contexto imperialista Euro-Americana.

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instituições e práticas culturais, assim como as suas relações com a sociedade e mudanças sociais” (Escosteguy, 1998:88)3. Vista como um lugar de conhecimento e uma fonte de identidade e tradição, a sociedade incorpora várias instituições que se voltam para as questões de representação e de poder, criando resistência e lutando pelos movimentos sociais e alternativas de desenvolvimento. Inicialmente orientados para a cultura, os Estudos Pós-Coloniais mesmo tendo em conta as representações do sujeito colonizado, pendiam para o estudo das instituições e da cultura do colonizador. Aquilo que importava era pois proceder à descolonização das representações após o processo de descolonização formal e administrativa dos territórios colonizados na modernidade. Considerados trabalhos pioneiros na área, estes estudos ajudaram a compreender e clarificar aspectos relacionados “com o sistema de conhecimento e crenças sobre o mundo dentro do qual os actos de colonização tomaram lugar” (King, 2004:384), procurando expor os mecanismos de opressão que deslocam ou transformam o Outro em sujeito obediente. Numa segunda fase estes estudos, através da influência do pós-estruturalismo e de autores como Louis Althusser, Michel Foucault e Jaques Derrida, conduzem a uma reorientação dos Estudos Culturais que passam a incidir a sua análise sobre a população migrante das ex-colónias e sobre uma nova sociedade multicultural. Por esta altura, com a corrida dos académicos de diáspora influenciados pelo Pan-Africanismo4 para os centros académicos ocidentais, são estabelecidas as condições para a criação dos Estudos Pós-Coloniais, sendo que a sua génese não tem um consenso estabelecido. Para muitos o ponto de partida dos Estudos Pós-Coloniais começou com os Commonwealth Studies nos anos 60; outros apontam a edição de Orientalism (1978) de Edward Said como o início dos Estudos Pós-Coloniais. De carácter fortemente político e interventivo, a principal proposta dos Estudos Pós-Coloniais consiste no seu carácter transversal, perpassando a Teoria Literária, a Filosofia e a Antropologia, criticando os poderes tradicionais e as desigualdades existentes. Deste modo, ao efectuarem uma descolonização cultural, os Estudos PósColoniais pretendem examinar criticamente o cânone literário, muito centrado no poder 3

Escosteguy, Ana Carolina (1998) – “Uma introdução aos Estudos Culturais”. Revista FAMECOS. n. 9, Porto Alegre.

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Pan-africanismo é um movimento político, filosófico e social que propõe a união de todos os povos de África como forma de potenciar a voz do continente no contexto internacional. Promove a defesa dos direitos do povo africano e da unidade do continente africano no âmbito de um único Estado soberano, para todos os africanos, tanto na África como em diáspora.

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ocidental e eurocêntrico. Como Richard King (2000) demonstra: “os estudos póscoloniais são eurocêntricos, focando-se exclusivamente na Europa e nas suas antigas colónias. Primeiramente nos empreendimentos britânicos e numa extensão mais reduzida nos franceses em África e na Ásia, especialmente na Índia”5. Como formação político-intelectual instalada no contexto académico, os Estudos Pós-Coloniais reconhecidos por Leela Gandhi (1998) como uma nova disciplina dentro do que denomina de “Novas Humanidades”6, debruçam-se sobre a análise de temas e conceitos como a raça, a nação, o império, o feminismo e a cultura de modo que toda a população tenha direito à sua voz. Estas têm como objectivo de investigação o estudo de confrontos entre culturas que se encontrem numa relação de subordinação, ou seja, procuram descobrir “como operam as categorias de classe, género, nação e raça nos grupos sociais que se viram, de alguma forma, reestruturados por regimes coloniais” (Apud Pagano, 2000:158). Deste modo, sobressaem quatro correntes nos Estudos PósColoniais: a corrente nacional ou regional onde as obras literárias de línguas minoritárias são alvo de escrutínio; a distinção entre raça e sexo; a corrente comparatista entre várias literaturas pós-coloniais, onde aspectos históricos, culturais ou linguísticos são analisados pormenorizadamente e a corrente nomadista onde se privilegiam situações híbridas como corpo das literaturas pós-coloniais (Dewulf, 2009:132). Em contexto académico onde se pretende entender a problemática das representações e examinar as noções de sujeito e objecto bem como as relações entre o Eu e o Outro, alguns autores proclamam o surgimento de uma área de estudo ou de uma teoria póscolonial na disputa de um determinado espaço académico, onde o termo pós-colonial é usado como referência a um modo de análise teórica ao invés de um período histórico. Como Eduardo Grüner (2002) afirma, a teoria pós-colonial constitui uma crítica fundamental preocupada com a análise das formas culturais que reflectem ou desafiam as relações de subordinação e domínio entre regiões, etnias e culturas; formas de dominação que surgiram no processo de colonização e persistem na época pós-colonial. Ao procurarem a desconstrução das formas de conhecimento ocidental e as pretensões universais que as acompanham, os teóricos focavam-se essencialmente nos

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Richard King - “Postcolonial America” ,2000, p.3.

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Disciplinas académicas que emergiram da crítica à razão humana e iluminista.

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acontecimentos pós descolonização e nas questões de identidade, representação e hibridismo. Para Homi Bhabha (1994:171) a crítica pós-colonial “testemunha a força desigual e universal da representação social” que está envolvida numa constante competição pelo controlo político e económico no mundo contemporâneo, logo a crítica pós-colonial emerge da experiência colonial. Como o próprio autor argumenta “as perspectivas pós-coloniais emergem do testemunho colonial dos países do terceiro mundo e dos discursos das minorias dentro de divisões geopolíticas de Este e Oeste, Norte e Sul. Eles intervêm nos discursos ideológicos de modernidade que tentam dar uma “normalidade” hegemónica ao desenvolvimento desigual e diferencial, assumindo as questões de identidade, diferença e representação um estatuto intensificado nos Estudos Pós-Coloniais. Sendo o desenvolvimento um processo ou uma autorepresentação da modernidade que se refere aos outros não-desenvolvidos e é indigenizado pelo outro local, os geógrafos começaram a ver o desenvolvimento no terreno como uma espécie de mistura, sincretismo onde o híbrido vê as configurações pós-coloniais como espaços de marginalidade, fronteira e instabilidade para o ocidente. No examinar das relações interculturais em contextos de poder desiguais, os processos de exploração e administração colonial adquirem, na sua cumplicidade com as questões de representação e interacção com o Outro, um carácter de confrontação. Fornecendo a percepção que essas situações influenciam os comportamentos e procurando consciencializar os indivíduos para as suas situações, os teóricos esperam através dos seus estudos abrir caminho para as minorias. A geografia tem um papel crucial neste processo de revisão de textos e discursos de forma a abrir o conhecimento para outras práticas de lugar. Tendo em conta que os “estudos pós-coloniais tentaram analisar e definir as relações entre os colonos ou raças de invasores coloniais e grupos e as raças da primeira-nação e grupos que articulam as novas vozes emergentes da nação depois do colonialismo” (Mishra and Hodges, 2003), o pós-colonialismo como multiplicidade de identidades emergentes que é, encontra-se constantemente preocupado com o poder do discurso e da textualidade, considerando Chris Tiffin (1994) que “a contestação do póscolonialismo é um contexto de representação”. Tendo em conta a desconstrução e desnaturalização dos territórios geopolíticos, é irónico ver como as relações entre os 19

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colonizadores e colonos podem ser apropriadas e manipuladas num momento alegadamente pós-colonial. Formado num processo de discursos de dominação que é o da modernidade radicalizada, o pós-colonialismo é um modo radical de repensar e reformular formas de pensamento e identidades sociais criadas pelo colonialismo e pela dominação ocidental (Prakash, 1997). Derivando de várias teorias, o pós-colonialismo consiste num movimento múltiplo, cujo ponto comum reside no traçar de um local deslocado do mundo, como se ao culturalmente colonizado fosse possível desconstruir a visão do colonizador, a partir do jogo de diferenças e ambiguidades nas relações culturais e de poder existentes. Efectivamente, o pós-colonialismo figurou como uma marca do estatuto geopolítico e cultural nas últimas décadas do séc. XX, tendo sido usado até muito recentemente, para descrever uma condição referente a pessoas, Estados e sociedades que estiveram sobre um processo formal de descolonização. Usado de modo a abranger todas as culturas afectadas pelo processo do moderno imperialismo, o termo pós-colonialismo tornou-se bastante heterogéneo e difuso, sendo impossível descrever de forma conclusiva o que o estudo do pós-colonialismo deve implicar.7 Detendo orientações muito específicas o pós-colonialismo é um movimento cultural aberto à diferença, pluralismo e diálogo cultural. Esta dificuldade, de acordo com Ania Loomba (2005:2) “deve-se em parte à natureza interdisciplinar dos estudos pós-coloniais que podem ir desde a análise literária à pesquisa nos arquivos do governo colonial, da crítica de textos médicos à teoria economicista”. Historicamente

ligados ao pós-colonialismo,

estão

projectos como

o

imperialismo e colonialismo que, usados como termos similares, conotam diferenças. Como Loomba demonstra pode pensar-se no imperialismo e no neo-colonialismo como o “fenómeno que origina nas metrópoles o processo que leva à dominação e ao controlo. O seu resultado ou o que acontece nas colónias como consequência da dominação imperial é o colonialismo ou neo-colonialismo” (2005:12). Por outro lado, “a dominação dos países mais pobres e fracos, pelas nações mais fortes e tecnicamente mais avançadas”, de acordo com Shirin Rai (2000) forma o colonialismo como o conhecemos. Designando de igual modo as medidas políticas pelas quais se estabelece e 7

As definições de pós-colonialismo são inúmeras, não existindo consenso na sua definição. A definição de pós-colonialismo difere de autor para autor, consoante o grupo de estudo em que se insere.

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mantêm o controle, “o termo é geralmente usado quando um sistema formal de dependência é construído por um país sobre as pessoas de uma etnia diferente” (Rai, 2000:189). Este comportamento é exemplificado por David Slater (2003) quando se propõem a especificar os elementos que constituem o euro-americanismo, estando sempre presente a superioridade ocidental sobre os outros e ficando ciente que o pensamento ocidental herdou a noção que “é o lugar distinto do racionalismo económico” (Weber, 1978:480). Também a noção de Foucault sobre a “soberania histórica do pensamento europeu” (1973:376.7) capta a lógica e o espírito de superioridade ocidental. Demonstrando o lado negativo da representação ocidental sobre o outro, Achille Mbembe (2001) encontra na violência colonial as razões desta representatividade: a violência fundadora da soberania colonial que criou o espaço sobre o qual a conquista foi exercida e também o espaço dentro do qual o poder colonial poderia introduzir as suas próprias leis, onde o seu direito supremo foi também a negação suprema dos direitos dos colonizadores; a violência da legitimação onde a língua e os modelos de dominação colonial foram introduzidos como parte de uma missão universalizante para cimentar uma nova autoridade institucional; e uma violência banal e quotidiana de regra cultural, expressa numa “gradual acumulação de numerosos actos e rituais” para que existisse num imaginário cultural que o estado partilhasse com a sociedade como forma de reproduzir o poder colonizador através da complexa rede de relações sociais (2001:25). Definido

como

uma

formação

crítica

político-intelectual8,

centrada

principalmente no impacte do colonialismo e sua contestação nas culturas colonizadoras e colonizadas do passado, na reprodução e transformação das relações coloniais e nas representações e práticas do presente, o pós-colonialismo é uma abordagem que atravessa hoje os diferentes campos do saber. Não obstante, e como advertem Bill Ashcroft et al (1995:2) “o uso crescente e desfocado do termo ‘Pós-Colonial’ nos últimos dez anos para descrever uma variedade surpreendente de práticas culturais, económicas e políticas, significa que há um perigo efectivo do termo perder o seu significado”. Isto porque o fim da era colonial e o facto dos ex-colonos e seus descendentes viverem em “todo o lado”, leva-nos a crer que todo o mundo é póscolonial conduzindo a uma feroz contestação do termo.

8

Definição de Pós-colonialismo no “Dictionary of Human Geography”, pp. 612

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Primeiramente usado depois da 2ª Guerra Mundial, o termo tinha um sentido cronológico, indicando o período posterior à descolonização. Em vez de indicar este período, o termo indica um rescaldo crítico dando ênfase à importância de um período além do colonialismo em vez de um período depois do colonialismo. Como Ashcroft explica “o ‘pós’ no termo refere-se a ‘depois que o colonialismo começou’ em vez de ‘depois que o colonialismo acabou’ “ (1999:15). Este autor observa que “o problema mais intransigente face aos Estudos Pós-coloniais actualmente (ainda) é o desafio da reconstrução das instituições e práticas herdadas por forma a aderirem às demandas dos saberes locais, fazerem uso dos benefícios das práticas locais, e manterem integridade ao nível da auto-representação" (2000: 23). Em concordância com Ashcroft, Derek Gregory (1998) sugere ser possível cair facilmente no pressuposto de que os conhecimentos e práticas geográficas que estão colocados sob os holofotes da crítica pertencem ao passado. Na realidade o que tem sido revelado nos trabalhos efectuados sobre a geografia do colonialismo e do império, é que “as representações dominadoras do "outro" ainda existem no imaginário das culturas ocidentais e geográficas” (Clayton, 2003:363) e que “as atracções fatais de nostalgia colonial (…) estão inscritas, em formas contemporâneas de viagem “ (Gregory, 2001c: 113). São estas representações que o pós-colonialismo conjuntamente com a geografia, pretende desconstruir através da análise, nomeadamente, dos discursos coloniais e de uma tradição de estudos científicos.

2.2– ABORDAGENS PÓS-COLONIAIS EM GEOGRAFIA A junção entre Pós-colonialismo e Geografia cria ocasiões desafiadoras para a análise das espacialidades do discurso colonial, das políticas espaciais de representação e dos efeitos materiais do colonialismo em diferentes espaços. De acordo com Ashcroft et al. (1998) “cada encontro colonial ou ‘zona de contacto’ é diferente, e cada ocasião póscolonial necessita de ser localizada com precisão e analisada pelos seus efeitos recíprocos”. Com a reformulação da Geografia Cultural efectuada sobretudo a partir da década de 80, a relação cultura/política e o modo como esta se manifesta através da paisagem cultural, podendo ser construída ou reconstruída pelos grupos sociais a partir das suas experiências, é recolocada no centro das problemáticas geográficas.

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Efectivamente, o impacte do cultural turn em geografia tem repercussões ao nível da recolocação das problemáticas coloniais. De acordo com Phil Crang (2000) o cultural turn associa-se a: “uma mudança intelectual que trouxe as questões da cultura para o centro dos debates contemporâneos, este turno ou viragem para as políticas culturais, sondou-se na geografia num esforço de revisão de uma longa tradição de pensamento”. Ora tal preocupação com a cultura sondou-se também numa focalização nas culturas do imperialismo e coloniais, movimento que incorporou o processo de revisão dos textos e discursos geográficos e práticas decorrentes. Conduzindo a uma preocupação em relação à posicionalidade do autor, algo que para os geógrafos culturais era apelativo, o estudo do lugar é agora visto como “uma das maiores fontes de posicionamento através da qual os indivíduos se definem, e definem os Outros que não pertencem a esse lugar” (Johnston, 1997:271). Neste processo desafiaram-se várias categorias da geografia cultural convencional, funcionando a reteorização da ideia de cultura como elemento unificador das várias expressões da geografia cultural contemporânea. Nigel Thrift, ao reflectir sobre o progresso do cultural turn, distingue duas competências das abordagens da geografia cultural contemporânea: as competências metodológicas que nos permitem compreender melhor os métodos de “co-produção do mundo” (Latour, 1999); e as competências informadas pela ênfase na “construção dos mundos”, que questionam a fundação dos mitos na cultura ocidental, através da exploração da constituição de diferentes grupos discursivos e respectivas políticas de resistência. Thrift chama a atenção para as competências que nos permitem isolar a dimensão ética como elemento crucial da acção humana, onde as abordagens subjacentes às problemáticas da diferença e da alteridade, têm um compromisso com a questão de género e etnia. Tentando dar visibilidade às questões de diferença, inúmeros estudos mostram como os “desenvolvimentos do pós-colonialismo pela geografia contemporânea convergem para os mais diversos aspectos do transnacionalismo e da globalização explorando as formações discursivas e as manifestações materiais do imperialismo, tanto nas potências colonizadoras como nas colonizadas” (Azevedo; 2008:54).

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Como parte do passado recente, as geografias pós-coloniais expõem as marcas deixadas pelo colonialismo na paisagem e na sociedade, onde as ideias geográficas sobre espaço, lugar, paisagem e localização ajudaram a articular as diferentes experiências de colonialismo. De facto nos últimos dez anos o interesse na relação entre geografia e império, tem sido cada vez maior. Os geógrafos começaram a interessar-se na genealogia imperial da sua disciplina, na espacialidade do colonialismo e império e no modo como as geografias colonialistas e imperialistas devem ser revistas a partir de perspectivas póscoloniais. Criado de modo a capturar os diversos interesses dos geógrafos, o termo “crítica imperial e geografias coloniais” pretende cobrir as suas tentativas de mostrar que a disciplina de geografia e um amplo conjunto de discursos e práticas geográficas, desempenham um papel crítico ou vital no império; o de criticar essas geografias vitais e mover a disciplina para além das convenções; de tratar as ligações entre geografia e império como sintomáticos das relações de poder que subjugam a produção do conhecimento geográfico, e de dar à geografia um lugar no alargamento dos debates póscoloniais sobre colonialismo e dominação ocidental9 (Clayton, 2003:354). O interesse crítico demonstrado sobre a temática do imperialismo e colonialismo, conduziu ao interesse sobre o pós-colonialismo, estando os geógrafos a abraçar e desenvolver perspectivas pós-coloniais com excitação e precaução, por abranger várias áreas de uma nova abordagem e problemática. Tendo conhecimento da existência da diversidade histórica e geográfica do colonialismo para teorizar, devemos construir as nossas teorias com a consciência da responsabilidade incumbida no desenvolvimento de teorias alternativas que permitam a passagem de uma noção de diversidade para uma noção de diferença e heterogeneidade cultural. Donde, ser determinante o papel de geógrafos e geógrafas para a consolidação deste projecto político-intelectual. Apesar da intensa ligação entre a geografia e o pós-colonialismo através da ligação aos Estudos Culturais e apesar do aumento da investigação e ensino geográfico num contexto pós-colonial, apenas nos últimos anos e particularmente na última década é que os geógrafos e as geógrafas começaram a desenvolver um compromisso crítico com os desafios substanciais das políticas e práticas do pós-colonialismo. As argumentações sustentáveis sobre o que deve, ou não, constituir uma geografia ou geografias pós9

Clayton, Daniel in “Critical Imperial and Colonial Geographies”

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coloniais, são ainda parcas. Como Jonathan Crush (1994; 336-337) explica, os objectivos de uma geografia pós-colonial são variados e abrangentes, englobando: “o desenterrar da cumplicidade geográfica com o espaço na dominação colonial; o carácter da representação geográfica no discurso colonial; a desunião do sistema geográfico local da teoria metropolitana e a sua totalização de sistemas de representação; e a recuperação dos espaços ocupados e investidos com o seu significado próprio, pela baixa classe colonial.” Até ao momento, as investigações em geografia pós-colonial, centram-se numa vasta intersecção de temas, como a produção imperial do conhecimento geográfico; a geografia do encontro, conquista e colonização; a geografia da representação colonial, particularmente em relatos escritos de viagens, fotografias, mapas e exposições; a produção do espaço em cidades coloniais e pós-coloniais; os generalizados, sexualizados e racionalizados espaços do colonialismo; o discurso colonial e a pós-colonialidade; as geografias de diáspora e o pensamento transnacional do movimento de pessoas, capitais e comodidades (Blunt and McEwan, 2002)10 . As geografias pós-coloniais delineiam a interface crítica entre o pensamento póscolonial e geográfico, explorando as geografias do discurso e poder colonial, interrogando as produções espaciais coloniais, destabilizando as geografias imaginárias do império e interrompendo a hierarquia das margens e centros coloniais. Dito de outra maneira, “geógrafas e geógrafos encontram-se hoje envolvidos em programas de ‘desnaturalização’ das modernas narrativas espaciais, ampliando a proposta pioneira de Edward Said de recolocação do imaginário geográfico ocidental“11 (Pimenta, J.R.; Sarmento J. ; Azevedo, A. F. , 2008:12). Deste modo as “geografias pós-coloniais põem sob escrutínio textos e discursos assentes sobre uma ontologia e epistemologia que vieram servir para legitimar a expansão do colonialismo europeu e a consolidação de uma economia capitalista mundial”12. De variadas formas, a geografia pós-colonial responde ao argumento crítico de que a grande sofisticação conceptual criou uma elevada ofuscação no que respeita às políticas científicas e que o pós-colonialismo é muito

10

Blunt, A. and McEwan, C. in “Postcolonial Geographies”, 2002.

11

Pimenta, J.R. ; Sarmento J. ; Azevedo, A. F. in Geografias Pós-Coloniais, 2008.

12

Ibide .

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teórico e não está suficientemente enraizado no contexto material (Ahmad, 1992; Dirlik, 1994). Nas geografias pós-coloniais existem pontos ausentes, dois deles dignos de nota13: um dos objectivos das geografias pós-coloniais é localizar a nível textual e a nível físico estas geografias. O terreno físico continua largamente limitado ao imperialismo europeu no séc. XIX e XX e ao seu legado actual, sendo “necessário realizar um vasto trabalho, que investigue não apenas as geografias do colonialismo pré-moderno mas também o exercício do poder colonial por outros impérios localizados, como a Ásia e a América Latina“ (Jones and Phillips, 2001). Mesmo reflectindo a importância significativa da pesquisa cultural e/ou histórica até à data, o trabalho a realizar por parte das geografias económicas e do desenvolvimento é também substancial, de modo a considerar as relações e as tensões entre o pós-colonialismo e o capitalismo global. O que a geografia pós-colonial alcançou até ao momento, reflecte a vitalidade dos estudos pós-coloniais na disciplina de geografia, e a ênfase no espaço por parte dos estudos pós-coloniais noutras disciplinas. Actualmente geógrafos e geógrafas apresentam propostas alternativas orientadas para a reafirmação das geografias da diferença, da desigualdade, da violência e da opressão. A importância das práticas científicas do conhecimento situado é um dos elementos centrais sobre os quais geógrafos e geógrafas se têm debatido para a afirmação do sujeito corporizado da diferença. Neste sentido, o próprio acto de investigação integra a formação e luta política para dar voz aos sujeitos vistos tradicionalmente como subalternos e marginalizados; “(d)ecorrendo de complexas políticas da diferença que tomam lugar num presente pós-colonial, o trabalho de recolocação de subjectividades a que também a Geografia deitou mão, enuncia a urgência de autorização das diferentes vozes no que respeita à codificação das inúmeras dimensões espaciais e a produção de ’outras’ espacialidades.”(Azevedo, 2007:58). Dar visibilidade a outros lugares e paisagens de forma a desmontar as políticas hegemónicas do conhecimento e do poder imperial num período pós-colonial, surge como preocupação central para inúmeros investigadores.

13

De acordo com Blunt e McEwan no livro “Postcolonial Geographies”, 2002; 6.

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2.3 – ANÁLISE DE TEXTOS E DISCURSO COLONIAL A análise de texto é estratégia fundamental deste estudo por se entender que cada texto é um espaço de inscrição dos sujeitos, uma arena de representação através da qual se esgrimem diferentes formas de poder e identidade, tendo os trabalhos sobre a produção e representação do espaço colonial e sobre como estes foram construídos ao redor de conceitos diferenciais como classe, género e raça demonstrado o seu impacto nos encontros coloniais. Especificamente na geografia tem existido um interesse crescente na relação entre a geografia e o império, procurando descodificar como a geografia académica trabalhou e tem trabalhado como uma disciplina imperial e como discurso. A escolha de textos coloniais prende-se com a convicção de que estes funcionaram e funcionam como verdadeiros instrumentos de colonização cultural e, mesmo no caso de textos científicos, ou se calhar mais ainda no caso dos textos científicos, estes funcionam como verdadeiros testemunhos de operação das redes de poder, verdade e conhecimento postas em jogo para a moderna legitimação da cultura ocidental. Donde a opção pela análise do discurso colonial em textos geográficos, pelo modo como através deles se operou à naturalização de uma metanarrativa geográfica passível de colocar o sujeito do humanismo como entidade dotada para o controlo, administração e subjugação dos outros. A análise do discurso colonial iniciou-se como uma subdisciplina académica dentro da órbita geral da teoria cultural e literária. Essencial neste processo foi a obra de Edward Said “Orientalismo” (1978) ao transferir a investigação do colonialismo entre os críticos culturais e demonstrando a ligação íntima entre a linguagem e as formas de conhecimento desenvolvidas para o estudo de outras culturas e das histórias e geografias do colonialismo e imperialismo. Para Said, o orientalismo é sobretudo uma disciplina académica: inclui todo o tipo de literatura sobre o Oriente, seja académica, imaginativa ou administrativa, e podendo-se discutir e analisar como instituição vocacionada para opinar sobre o Oriente. Deste modo, o orientalismo é visto como um estilo ocidental de dominação,

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reestruturação e sustentação de autoridade ocidental sobre o Oriente perspectivado como macro-região cultural. Para entender o modo como a cultura europeia conseguiu produzir e controlar o Oriente a nível político, militar e científico, é necessário examinar o Orientalismo como um discurso, onde a cultura e a literatura determinavam a maneira como o Oriente era representado, contribuindo para o estabelecimento de marcos de referência das formas políticas do colonialismo. Ao falar de Orientalismo, aludimos a um projecto políticoideológico presente numa complexa série de ideias, filosofias e sabedorias domesticadas para uso e proveito Europeu. Podemos definir Orientalismo como um elaborado sistema de conhecimento, onde aquele que constitui o Oriente não tem permissão para falar, consistindo deste modo numa relação de poder e dominação cultural onde o Outro oriental é um objecto da fantasia e da construção europeia. A questão sobre como o Ocidente constrói e tem vindo a construir conhecimentos sobre e do Outro, forma a base para a denominada Teoria do Discurso Colonial, onde se examina o modo de desenvolvimento de um tipo discurso usado de para descrever e administrar o território colonial. O discurso científico contribui em grande medida para este projecto. Importa realçar que o conhecimento ocidental do Outro pode ver-se construído como uma parte do sistema total do discurso orientalista, onde não só é possível criar conhecimento mas também a realidade que se descreve. Por esta mesma razão, não existe uma alternativa à construção ocidental do Oriente visto o orientalismo ser um desejo ocidental de governar o Oriente. Para o geógrafo Derek Gregory (1998)14 o Oriente é em si mesmo um conceito orientalista, “é apenas um processo de representação construído (…) que resulta em ‘algo feito’, uma ficção no verdadeiro sentido da palavra” (1998:8). Como forma de fantasia ocidental, cuja relação com a realidade é parcial e ambígua, o discurso orientalista leva a que as obrigações de interesse pelas reais condições do colonialismo possam e sejam postas de parte. Ele é uma poderosa construção geográfica.

14

Gregory in Geographical Imaginations

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O Orientalismo é uma parte integrante do discurso colonial, e este determina uma nova maneira de conceptualizar a interacção do processo cultural, intelectual, económico e político na formação, perpetuação e desconstrução do colonialismo. Tendo como objectivo ampliar o alcance do estudo do colonialismo e examinar a interacção de ideias e instituições, conhecimento e poder, procura oferecer o âmago da análise de epistemologias coloniais e ligá-las à história das instituições coloniais. Assim, é possível traçar conexões entre o dominante e o dominado, as ideias e instituições que potenciam este quadro de relações, permitindo visualizar como o poder é trabalhado e trabalha através da linguagem, cultura e instituições que regulam o nosso quotidiano. A revisão do papel das instituições coloniais é fundamental para se poder apreciar a forma de colonização exercida para com a relação entre poder, verdade e conhecimento. Dentro destas instituições, os ministérios e as universidades são fundamentais para a propagação de uma ideologia. A análise de textos e discursos produzidos por estas instituições permite aceder ao conteúdo dos seus projectos de colonização cultural. Pioneiros na análise do discurso colonial como Franz Fanon abriram portas a este processo de revisão, mas Said surgiu como um marco a partir do qual efectivamente se consolidou um momento de revisão de textos coloniais. Assim “a análise do discurso colonial, forma o modo de questionar as categorias e pressupostos do conhecimento ocidental” (Young, 1990:11) que não nos permitiu conhecer as circunstâncias reais e as culturas que se pressupunha que esse discurso descreveria, analisaria e controlaria. Não obstante, Homi Bhabha foi contra a posição totalizadora do argumento de Said, defendendo que este presumia facilmente uma intenção inequívoca por parte do Ocidente, a de governar sobre o Oriente através de produções discursivas. Ao constituir uma teoria cultural, uma das grandes contribuições de Bhabha consistiu em demonstrar que o discurso colonial, forma mais subdesenvolvida de discurso para o autor, funcionava não só como uma construção instrumental de conhecimento, mas também segundo protocolos ambivalentes da fantasia e do desejo, visto ser articulado em torno de formas estereotipadas de alteridade.

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Para Bhabha as posições discursivas em situações coloniais são fornecidas pelo processo de construção da identidade, cujos principais aspectos são: 1-

existir significa existir para um Outro, ou seja, enquanto construção de identidade do sujeito, o desejo colonial é sempre articulado em relação ao Outro;

2-

(surge) o desejo ambíguo de vingança num espaço relacional marcado pela alteridade e duplicidade, onde o colonizado sonha ocupar o lugar do colono e pretende manter conjuntamente o seu lugar de Outro;

3-

o processo de identificação não se limita a afirmar uma identidade préexistente, também produz uma imagem de identidade acompanhada pela tentativa de transformar o sujeito, de modo a que assuma essa imagem.

Ao destacar o papel da alteridade e da relação como constituintes da identidade, Bhabha não separa a construção da identidade do colonizador da construção de identidade do colono, dando ênfase à análise que tem em conta a identidade híbrida do colono e do colonizador. Surgindo como objecto de estudo e análise dos trabalhos iniciais de Bhabha, o hibridismo ou a hibridização “não é algo que apenas existe por aí, não é algo a ser encontrado num objecto ou em alguma identidade mítica ‘híbrida’ – trata-se de um modo de conhecimento, um processo para entender ou perceber o movimento de trânsito ou de transição ambíguo e tenso que necessariamente acompanha qualquer tipo de transformação social sem a promessa de clausura celebratória, sem

a transcendência

das condições complexas,

conflituantes,

que

acompanham o acto de tradução cultural” (Bhabha, H.K. 2002 (b)). Neste sentido, tais noções surgem como o reverso do tratamento que é dado ao tema da miscigenação. Constituindo a hibridização uma característica da nação póscolonial e um modo de questionar as narrativas da historiografia clássica da nação, salientando o modo como aquelas sempre estiveram ligadas às histórias coloniais. A análise crítica de Bhabha aos textos coloniais, tem como objectivo principal entender o modo como o sujeito colonial era representado ou podia ser representado, focando-se em especial no confronto entre as linguagens usadas para essa mesma 30

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representação e a questão da construção da identidade do sujeito. Ao valorizar o hibridismo como o elemento constituinte da linguagem, Bhabha recusa a tendência de substituir as imagens ‘distorcidas’ do colonizado por formas mais autênticas das previamente retratadas na literatura colonial, procedendo à desconstrução da análise de imagens como modo crítico de abordar o “autêntico” através do conceito de discurso como prática significativa. Neste quadro, o discurso surge como “um processo que postula a significação como uma produção sistémica situada dentro de determinados sistemas e instituições de representação – ideológicos, históricos, estéticos, políticos” (Bhabha, 1984:98). Ao postular os textos como uma produção de significados, assume que estes são construídos numa relação de diferenças no que concerne a outros discursos construídos historicamente. Isto resulta na produção de uma imagem híbrida, contendo traços de vários discursos, fazendo com que a representação do colonizado seja vista como uma prática discursiva. Deste modo, as narrativas do poder colonial e das culturas dominantes são destruídas, contribuindo o hibridismo para o aparecimento do discurso pós-colonial e para as críticas ao imperialismo cultural. No que concerne aos desafios da análise do discurso colonial, críticos como Benita Paray e Aijaz Ahmad chamam à atenção para um certo textualismo e idealismo eurocêntrico na análise do discurso colonial para a qual devemos estar atentos. Tendo as suas objecções pertinência, estas acarretam uma forma de erro categórico que a investigação da construção discursiva do colonialismo não procura substituir ou excluir outras formas de análise, mas contribui para proporcionar um marco significativo a esse outro trabalho, enfatizando que todas as perspectivas sobre o colonialismo dividem e devem operar como um meio discursivo comum, pois a linguagem usada para regular ou analisar o colonialismo não é transparente, inocente ou meramente instrumental (Young, 1998). A crítica pós-colonial pode contemplar a ampla variedade de textos coloniais como algo mais que “evidência”, e enfatizar os modos nos quais o colonialismo não se tratava somente de uma actividade militar ou económica, mas contemplava formas de conhecimento enviesadas pela visão eurocêntrica que, se permanecessem incontestáveis, poderiam continuar a ser as mesmas que usamos para compreender o mesmo colonialismo (Young, 1998). Podemos concluir que a imagem e o conhecimento do 31

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Outro e do Oriente que o Ocidente construiu, deixam em aberto a possibilidade de que todo o conhecimento ocidental moderno seja de uma maneira directa ou indirecta uma forma de discurso colonial. Donde a necessidade de revisão dos textos e discursos emanados do ocidente durante a modernidade.

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III Capítulo: Geografias, Discursos e Práticas Pós-Coloniais em Portugal

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3.1 – ESTUDOS PÓS-COLONIAIS E GEOGRAFIA EM PORTUGAL Na academia portuguesa, os Estudos Pós-Coloniais são uma área em franca expansão, estando o seu estudo implementado nos centros de investigação, em especial nos centros de investigação de Sociologia e Estudos Africanos, porventura pelo colonialismo em África constituir uma área recente da História. Dentro desta temática dos Estudos Africanos e Pós-Coloniais, salientamos o trabalho desenvolvido pelo Centro de Estudos Africanos (CEA) do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), considerado por muitos como uma das maiores promessas dos Estudos Pós-Coloniais em Portugal e comprovada pela avaliação da Fundação da Ciência e Tecnologia que se mostrou: “impressionada com os esforços de pesquisadores para fazer com que a voz indígena da África seja ouvida para além do ruído dos conceitos analíticos eurocêntricos bem como pela incidência de estudiosos africanos no trabalho do Centro” (in Relatório de Avaliação de Financiamento Plurianual de 2007 da Fundação da Ciência e Tecnologia). Pertencendo ao mesmo instituto, é de salientar o Centro de Estudos de Antropologia Social (CEAS) pretendendo contribuir para o desenvolvimento de estudos dentro da temática do colonialismo, apostando nos processos identitários das antigas colónias portuguesas e na análise dos arquivos coloniais em Portugal15. As problemáticas da identidade nacional e da escravatura no continente africano, divulgadas na revista Africana Studia, são tema de estudo no Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto (CEAUP), um dos centros de investigação que tem desenvolvido de forma mais dinâmica os estudos pós-coloniais em Portugal, com a realização de mestrados subordinados à temática dos estudos africanos, a edição electrónica e em papel de livros e artigos, entre outros16. Claramente focado no desenvolvimento dos Estudos Pós-Coloniais em Portugal, o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra liderado pelo sociólogo 15

Dentro dos projectos realizados frisamos “Portugal Pós-Colonial: Abordagem Antropológica de uma comunidade hindu da Grande Lisboa”, “Colonialismo e Comunismo: Da fundação do Partido Comunista Português ao fim da guerra colonial (1921-1974) e “Lógicas Coloniais: Espaço e Sociedade em Goa”.

16

É de destacar o trabalho da investigadora do CEAUP, Ana Frade “A corrupção no Estado Pós-Colonial em África: Duas Visões Literárias” (2007) que analisa a visão literária da corrupção dos estados pós-coloniais de Angola e Moçambique.

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Boaventura Sousa Santos, engloba no Núcleo de Estudos sobre Humanidades, Migrações e Estudos para a Paz (NHUMEP) duas linhas de investigação que confluem para o pós-colonialismo. Debruçado sobre a questão da História, Memória, Diásporas e Pós-colonialismos, este núcleo investiga o contexto onde a memória surge como problemática central, oferecendo os estudos pós-coloniais um quadro teórico que permite a problematização das relações e a conceptualização apropriada nos contextos de diáspora. Na temática Discursos, Identidades e Representações analisam-se os mecanismos de representação e constituição discursiva da identidade, estando as questões de hibridização e lógicas de fronteira no cerne da análise. O CES é o primeiro centro de investigação a abrir um doutoramento na área do Pós-Colonialismo e Cidadania Global, centrando-se na herança colonial e nos desafios pós-coloniais que dela emergem. Neste âmbito Boaventura Sousa Santos tem-se dedicado ao estudo da especificidade do Pós-Colonialismo Português. Analisando e comparando o colonialismo português com o britânico, no estudo “Entre Próspero e Caliban: Colonialismo, Pós-Colonialismo e Inter-Identidades”17, Boaventura Sousa Santos inicia um conjunto de estudos sobre a origem colonial da identidade portuguesa como resultado do colonialismo europeu do séc. XV. Considerado desde sempre como um país semiperiférico, a especificação do colonialismo

português exprime

relações de

hierarquia

entre

os diferentes

colonialismos. No caso português e segundo o autor, a sua especificidade consiste na subalternidade e dependência para com Inglaterra, e na falta de representação do colonizador português sendo que a história colonial foi desde o séc. XVII escrita na língua anglo-saxónica. Por outro lado, também a economia e a política semiperiférica aplicada pelo império português contribuiu para a sua especificidade: com uma prática colonial secular, o império português foi considerado por muitos como um “Império Informal”, rompendo com o seu passado colonial em prol da nação que impunha a norma do sistema mundo. Visto como um Próspero Calibanizado, argumenta o investigador, esta é a especificidade do colonialismo português que conduz ao reconhecimento hegemónico da teoria pós-colonial anglo-saxónica. Procurando entender até que ponto se podem 17

Estudo pode ser consultado na obra “Entre Ser e Estar: Raízes, Percursos e Discursos da Identidade” (2001)- Ramalho, M.Irene e Ribeiro, António Sousa

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considerar aplicáveis os conceitos de Bhabha no pós-colonialismo português, Boaventura Sousa Santos demonstra que ambivalência, hibridismo, miscigenação e cafrealização são partes integrantes do colonialismo português, onde o próprio colono imita e assimila os conhecimentos do colonizado procurando sobreviver. Estas acções, aos olhos dos restantes povos europeus, fazem de Portugal um Caliban tornando a hipótese de uma análise pós-colonial inviável, afirma o sociólogo. Paulo de Medeiros18 reconhece no estudo de Boaventura Sousa Santos uma ligação consistente com a teoria anglo-saxónica: “O próprio título do ensaio ainda mostra um grau de dependência das questões de língua inglesa que só muito recentemente começaram a ser substituídas.” (2007a:2), defendendo a superação dos pontos cegos19 da teoria pós-colonial. Entre os pontos cegos encontra-se o desenvolvimento da teoria pós-colonial num contexto quase exclusivamente anglófono e o âmbito em que é praticada. De modo a que a complexidade das relações coloniais e a sua diversidade geográfica e temporal não sejam ignoradas, Medeiros aposta na interacção entre a teoria pós-colonial e as literaturas lusófonas, criando uma perspectiva comparatista com outras situações pós-coloniais. Para o autor torna-se “imperativo tomar em consideração os vários modos como as condições pós-coloniais afectam as literaturas e sociedades europeias, dando atenção às variantes sócio-históricas assim como culturais e linguísticas (…) “ (Medeiros, 2006:348). John McLeod (2007) revela-se também contra a dominação anglófona dos Estudos Pós-Coloniais e evidencia como a análise do processo colonial em impérios, que não o anglófono, tem tido um trabalho significativo: “Nos últimos anos, porém, um trabalho significativo em estudos póscoloniais apareceram em contextos intelectuais (por exemplo) hispânicos, francófonos e lusófonos. O centro do campo de gravidade está a mudar, de modo que os estudos pós-coloniais estão, no geral, mais alerta para os diferentes impérios europeus e os seus legados, que moldaram o colonialismo europeu e fizeram dele um fenómeno variável – bem como a grande variedade de práticas culturais pós-coloniais em todo o mundo, que surgiram a partir do colonialismo francês, espanhol, português, holandês e (não só) o britânico e 18

Professor de Língua e Cultura Portuguesa da Universidade de Utrecht.

19

Sobre os pontos cegos consultar “Apontamentos para conceptualizar uma Europa Pós-Colonial” in “Portugal não é um país pequeno: contar o “império” na Pós-Colonialidade” – 2006, pp.339-356.

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muitas vezes, mas não exclusivamente, (versões de) línguas europeias transplantadas e convenções artísticas.” (McLeod, 2007:11).20 Deste modo, e devido à génese e à matriz dos Estudos Pós-Coloniais, que não acompanham as várias histórias coloniais, a teoria pós-colonial está impossibilitada de ser aplicada de um modo geral. Tão pouco isto seria desejável. Outra especificidade do pós-colonialismo português encontra-se na diferença imperial. Usada face a outros impérios que impunham a ideia de superioridade e diferença entre os variados colonizadores, “a consolidação e hegemonia das nações da Europa do Norte caminham lado a lado com a construção da diferença imperial e a distinção entre o Norte e o Sul, embutida no discurso cultural em França, na Alemanha e em Inglaterra.” (Mignolo, 2002:158). Tendo como maior consequência o exprimir de relações hierárquicas entre os colonialismos europeus, no caso português a diferença imperial e colonial existente leva a que Portugal seja considerado um império subalterno do Império Britânico. O império visto como Caliban na Europa e como Próspero em Portugal, cria uma dupla consciência que Boaventura Sousa Santos denomina de ‘cultura de fronteira21’ e que configura a identidade do ‘Próspero Calibanizado’. Afirmando que Portugal teve os seus momentos de Próspero, como o reconhecimento dos movimentos de libertação das colónias e sua independência, Boaventura Sousa Santos considera que o pós-colonialismo do espaço lusófono se deve centrar nas fraquezas do Próspero Calibanizado Português, entre elas a fraqueza do colonialismo interno e a fraqueza externa do Próspero onde Portugal foi constituído refém do imperialismo, devendo o Pós-Colonialismo Português, de acordo com Boaventura Sousa Santos, “ser dirigido contra a globalização hegemónica” (2001:78). Concordando com Boaventura Sousa Santos na posição subalterna do colonialismo português, Miguel Vale de Almeida (2008) aponta as razões que nos diferentes tempos coloniais portugueses conduziram a esta posição: ser administrado por um país pequeno e semi-periférico constituindo um centro económico fraco; e ser sustentado por um regime político ditactorial. A fraqueza e o subdesenvolvimento de uma antropologia colonial podem, no ver de Miguel Vale de Almeida, estar relacionados com estes factores e (deste modo) “a 20 21

McLeod, John (2007) in “The Routledge Companion to Postcolonial Studies”, Considerada uma cultura sem conteúdo. Tem apenas forma que consiste na zona fronteiriça.

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análise antropológica dos processos de poder-saber coloniais, a abordagem etnográfica dos terrenos ex-coloniais e a consideração do continuum histórico e da mútua constituição das identidades de colonizadores e colonizados estão apenas no início.” (2002:33). A necessidade da antropologia pós-colonial portuguesa aceitar a especificidade da sua experiência colonial, analisar os processos de formação de identidade nacional nas ex-colónias e ver como as clivagens internas se enraizaram na experiência colonial, resultou numa tendência crescente para fazer uma antropologia do colonialismo e império. As questões do colonialismo nas ex-colónias e o seu presente pós-colonial estão a ser alvo de estudos na antropologia contemporânea, e na geografia são temas que continuam a inspirar e a chamar a atenção dos geógrafos. O pós-colonialismo através dos seus críticos e em especial da tríade pós-colonial, foi uma ajuda para a compreensão do colonialismo em geografia ao oferecer uma crítica radical e produtiva da forma como pensamos e fazemos a geografia. Said ajudou a entender a relação entre os projectos pós-coloniais e as geografias reais e imaginárias, Bhabha foi fulcral na compreensão diferenciada entre o carácter híbrido do colonialismo e Spivak foi essencial na compreensão dos impulsos neo-coloniais da teoria pós-colonial. Iniciando a sua ligação com o pós-colonialismo no início dos anos 90, o envolvimento pós-colonial na geografia compôs-se de uma abordagem “crítica das histórias coloniais” (King, 2003:390), com o intuito de interrogar os arquivos coloniais particulares através da análise do discurso colonial sobre o espaço. Devido ao longo período passado nas ex-colónias, as geografias específicas e experienciadas contêm implicações no modo como esses geógrafos analisam a condição pós-colonial, sendo a preocupação com a atribuição de situações coloniais contemporâneas em estados supostamente pós-coloniais uma das mais recentes temáticas de investigação. Como Jacobs (in King, 2003:390) demonstra “ a política cultural do colonialismo e do pós-colonialismo continuam a ser articulados no presente”. Como Barnett (1995) elucidou, os geógrafos críticos estão ocupados “a agarrar a sua parte de culpa colonial” existindo por parte de muitos geógrafos pós-coloniais uma acção de envolvimento lenta, devido em parte ao medo de se comprometerem com um colonialismo próximo e com as respectivas consequências. 38

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É esta mentalidade que se encontra presente na academia portuguesa, um desprender do passado colonial, das representações do encontro colonial e “do modo como estas estruturam a identidade metropolitana” (Azevedo, A.F.; Pimenta, J.R. ; Sarmento, J. , 2009:17). Como ciência associada à exploração do mundo não-ocidental, há a necessidade de uma geografia pós-colonial que se envolva de modo desafiador com as situações reais e actuais, sem reforçar as hierarquias coloniais. A problemática das geografias pós-coloniais centradas em África é estudada pelo geógrafo e investigador do CEAUP Nuno Costa no artigo “Da barbárie à civilização: representações do espaço africano na propaganda colonial portuguesa do primeiro quartel do séc. XX”22 e pelo geógrafo José Ramiro Pimenta no artigo “Portuguese Colonial Geographical Tradition (1926-1974)” publicado na Revista Africana Studia nº 14 (2010:313-322) do CEAUP. É de salientar o esforço dos Geógrafos Ana Francisca de Azevedo23, José Ramiro Pimento 24 e João Sarmento25 para a incorporação da Geografia Pós-Colonial no contexto académico, patente nos encontros científicos realizados pelo seu grupo de investigações com o intuito de expandir as discussões domésticas a um contexto internacional mais vasto, tendo já sido realizado um encontro internacional26 subordinado ao tema das Geografias Pós-Coloniais. Tentando chamar a atenção para esta problemática, através da obra “Geografias Pós-Coloniais – Ensaios de Geografia Cultural” (2007) pretendem expandir o debate sobre o que é ou poderá vir a ser a Geografia num contexto pós-colonial, através da análise de formas materiais e discursivas de persistência das relações de poder coloniais.

22

Artigo publicado na Revista Africana Studia n~14, p. 297-311

23

Professora Auxiliar da Licenciatura em Geografia e Planeamento da Universidade do Minho

24

Professor Assistente da Licenciatura em Geografia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto

25

Professor Assistente da Licenciatura em Geografia e Planeamento da Universidade do Minho

26

II International Meeting in Cultural Geography, realizado a 11 Novembro de 2008

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3.2 – CRÍTICA AO IMPÉRIO E LUSOTROPICALISMO A relação existente entre diferentes culturas, sempre foi temática de estudo em vários ramos das ciências sociais. O discurso colonial dos impérios europeus, os nacionalismos e as nações pós-coloniais estudadas centravam-se em casos britânicos ou franceses, sendo que apesar das particularidades geográficas, históricas, ideológicas, culturais e antropológicas que dispõem, o colonialismo e pós-colonialismo do Império Português só foram considerados como um objecto central de estudo, à muito pouco tempo. No caso específico português, muito do trabalho de investigação sobre esta temática tem sido desenvolvido por Manuela Ribeiro Sanches27, investigadora do Centro de Estudos Comparatistas, que na sua obra Portugal Não é um País Pequeno. Contar o "Império" na pós-colonialidade, pretende averiguar a aplicabilidade de teorias surgidas noutros espaços e contextos. Como país explorador, Portugal iniciou o processo de colonização na época dos Descobrimentos (1415 – 1543), através da expansão do Império Português28 por países tão díspares como Angola (1486), Índia (1498) e Brasil (1500), sendo comummente considerado como o primeiro império global, visto a sua soberania ser extensível a um vasto conjunto de territórios repartidos pelos quatro continentes. É neste contexto e inserido no processo de exploração, dominação e interrelacionamento com os indígenas, que fenómenos como a miscigenação e o hibridismo foram analisados. Gilberto Freyre29 afirmava que no século XV, devido ao carácter português de expansão “singularmente simbiótico de união de europeu com trópico” teria surgido uma nova civilização e, “ao lado desse novo tipo de civilização vir-se-ia desenvolvendo um novo tipo de conhecimento ou saber dos trópicos pelo europeu, para o qual se sugere a caracterização de lusotropicologia”(Freyre, 1960:69). 27

Professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Investigadora do Centro de Estudos Comparatistas (CEC/UL)

28

Designação atribuída ao conjunto dos territórios ultramarinos ocupados e administrados por Portugal desde o início do séc. XV até

29

Gilberto Freyre, sociólogo brasileiro que acreditava que a miscigenação entre raças produziria uma mistura mais uniforme e

metade do séc. XX robusta da sociedade. Criador do conceito de Lusotropicalismo, publicou várias obras sobre o tema, dando mais tarde origem à lusotropicologia - uma proposta de ciência que juntava antropologia e ecologia, de modo a estudar o relacionamento entre a cultura europeia e a cultura tropical.

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De acordo com Gilberto Freyre, a miscigenação era comum nas colónias portuguesas e apoiada pela corte, visto ser uma forma de reforçar a população e garantir uma colonização coesa e bem sucedida. Neste sentido, a relevância das teorias de Freyre para a compreensão dos discursos coloniais portugueses é central. Porque representam uma súmula do pensamento colonial moderno e acrescentam-lhe a ideia de originalidade da missão colonial portuguesa. Da união dos portugueses com os povos tropicais, argumenta, surge um novo saber através das práticas de assimilação: assimilação cultural, cujos elementos iriam fundamentar o aparecimento de uma nova civilização. Como Freyre afirma: “(...)

o

que

denominamos

‘civilização

lusotropical’

não

é,

biossocialmente considerada, senão isto: uma cultura e uma ordem social comuns à qual concorrem, pela interpenetração e acomodando-se a umas tantas uniformidades de comportamento do Europeu e do descendente e do continuado do Europeu nos trópicos – uniformidades fixadas pela experiência ou pela experimentação lusitana – homens e grupos de origens étnicas e de procedências culturais diversas” (idem:74). A miscigenação (ou mestiçagem), pode ser entendida como a mistura de seres humanos, de raças diferentes através da co-habitação, do casamento ou da procriação. A mistura de culturas, ou a apropriação de significados e hábitos culturais é denominada de miscigenação cultural. Resulta da aculturação efectuada por um povo colonialista dominante, e designa a fusão racial dos colonizados com os conquistadores. Apesar de acto de miscigenação já existir, aplicando-se “de modo particular em textos literários, históricos e antropológicos, à mistura de espanhóis e portugueses com nativos americanos durante os tempos coloniais, e à formação multiétnica de sociedades nacionais durante o século dezanove e vinte” (Canclini, 2003:278), de um modo geral só a partir do séc. XIX é que o termo começou a ser usado para se referir ao casamento interracial e ao processo de mistura racial. Correspondendo também à preocupação do fim da raça europeia, por parte dos europeus, a ideia de que “a miscigenação representa a derradeira forma de desnacionalização” (Nakai, 2000:68), funcionou como forma de colonização mas, como 41

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veremos, esta ideia não se aplica tão directamente ao “Império do Oriente” o que merecerá consideração. No discurso colonial português e projecto subjacente, surge no séc. XX o lusotropicalismo cujo objectivo passa por tentar chamar a atenção para aculturação mútua entre o autóctone e o colonizador português, e assenta em três pilares base: miscigenação, fusão cultural e ausência de preconceito racial. Neste sentido, predomina a ideia de que quer o progresso quer a cultura são resultado da miscigenação de etnias, memórias e tradições. Como ‘política’, o lusotropicalismo foi amplamente usado pelo povo português e o modo como foi abordado de acordo com a época, ilustra as várias interpretações a que foi sujeito consoante os objectivos que a nação portuguesa procurava alcançar30. Estando comummente associado à presença portuguesa em África, as origens do lusotropicalismo estão profundamente enraizadas na experiência portuguesa no Brasil durante as primeiras décadas do século XX onde, até essa altura, as ideias, tradições e valores culturais europeus tinham sido aceites como as únicas medidas civilizadoras pelas elites brasileiras. O aparecimento do lusotropicalismo está ligado ao surgimento nos anos vinte com o Movimento Modernista no Brasil, e com ele aparece uma literatura sócioantropológica algo revolucionária pelo seu conteúdo, visto enfatizar que o negro era um elemento integrante da e na sociedade brasileira, tendo contribuído para a história e desenvolvimento do Brasil. Durante esta década uma nova geração de artistas e corpo académico causam uma profunda modificação psicológica e intelectual, ao dar relevo e importância aos temas e valores nacionais em detrimento dos valores estrangeiros. É o caso de Gilberto Freyre. Acabado de regressar ao Brasil, depois de ter completado a sua formação nos Estados Unidos da América e fortemente influenciado por Franz Boas para a diferenciação entre raça e cultura, Gilberto Freyre foi considerado o pai desta nova

30

Sobre a apropriação da teoria lusotropicalista pelo Estado novo, consultar o artigo “Gilberto Freyre e o Lusotropicalismo como ideologia do Colonialismo português (1951–1974)” de João Alberto da Costa Pinto in Revista UFG / Junho 2009 / Ano XI nº 6

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escola, tendo convertido o complexo de inferioridade brasileiro e o seu passado multicultural em motivo de orgulho nacional. Em 1933 é publicada a obra Casa Grande & Senzala, onde Freyre valoriza o contributo das culturas dos povos submetidos na formação do Brasil, defendendo que os brasileiros beneficiaram com a mistura de raças que se operou na sociedade patriarcal e esclavagista do período colonial. A obra evidencia a «singular predisposição do português para a colonização híbrida e escravocrata dos trópicos»31, e a especificidade do carácter do colonizador português, nomeadamente a predisposição para a «aventura ultramarina ou tropical»32, para a miscigenação, para a interpenetração de valores e costumes e a «dualidade étnica e de cultura»33 da sua formação. Constituído para muitos como uma teoria sociológica34, o lusotropicalismo desenvolvido pelo sociólogo brasileiro Gilberto Freyre, é uma forma particular de tropicalidade, que destaca um conjunto distinto de relações coloniais, moldadas pela presença portuguesa nos trópicos. De acordo com Freyre “ cedo deixou de ser na cultura um povo exclusivamente europeu para tornar-se a gente luso-tropical que continua a ser e que encontrou nos trópicos zonas naturais e congeniais de expansão, ao motivo económico e ao motivo religioso e político de expansão tendo-se juntado sempre o gosto, ausente noutros europeus expansionistas, de viver, amar, procrear e crear filhos nos trópicos, confraternizando com mulheres, homens e valores tropicais e não apenas explorando os homens, devastando os valores, violando as mulheres das terras conquistadas35». Freyre propõe uma visão do mundo contraditória: os trópicos não seriam periferias tristes e marginais mas um lugar por excelência onde nasce uma civilização diferente e original, e também mais humana – estando estas características mais 31

Gilberto Freyre, Casa Grande & Senzala, Lisboa, Edições Livros do Brasil, [1957], pp. 18 e 21-23.

32

Gilberto Freyre, Um brasileiro em terras portuguesas, Lisboa, Edições Livros do Brasil, [1953], pp. 35-36.

33

Idem.

34

Miguel Vale de Almeida assinala que o lusotropicalismo “nunca se constituiu como uma corrente teórica. Nasceu no meio de uma ensaística culturalista, foi produzido por e reproduziu discursos no campo da identidade, da especificidade e do excepcionalismo tanto no Brasil como em Portugal” (Miguel Vale de Almeida, 1998, 17)

35

Gilberto Freyre, “Em torno de um novo conceito de tropicalismo. Conferência pronunciada na Sala dos Capelos da Universidade de Coimbra, em 24 de Janeiro de 1952”, Coimbra, Coimbra Editora, 1952, s/p.

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enraizadas nos espaços onde os portugueses permaneceram e enalteceram o tropicalismo. Nas décadas de 20 e 30 deu-se início a uma nova consciência brasileira, que implicava o nacionalismo e o orgulho na raça e no país, enquanto Portugal lançava a primeira pedra para a sua regeneração. Nesta altura ambos os países tentavam estabelecer a sua grandeza através do lusotropicalismo, realçando a natureza positiva da mistura racial portuguesa nos trópicos e afirmando a ausência de racismo entre os colonos portugueses. No caso português, a nomeação de António de Oliveira Salazar para Presidente do Conselho de Ministros em 1932 foi o contributo necessário para reacender a busca pelo orgulho nacional e restaurar a auto-confiança portuguesa. Critérios materiais foram rejeitados pelo Presidente do Conselho de Ministros, que implementou critérios como o espírito, temperamento e história de um povo, reavivando a consciência imperial portuguesa de modo a encontrar nas grandes expansões portuguesas a África, o prestígio que não conseguia encontrar no país. A exultação de Gilberto Freyre à vocação tropicalista dos portugueses, chegando mesmo a considerá-la incomparável com a de outros colonizadores, o modo como entende o mundo luso-tropical e o espaço colonial português, leva a que Freyre receba as idiopatias do Governo Português Salazarista. Numa altura em que os impérios coloniais europeus começam a colapsar por pressão da ONU, e Portugal sofre pressões internacionais para ceder a independência às suas colónias, Freyre inicia no verão de 1951 e a convite do Ministro do Ultramar Português Sarmento Rodrigues, uma viagem por terras lusas de modo escrever as suas impressões36: “Do ministro do Ultramar é que me veio o convite para, de volta da França, demorar-me em Portugal; e de Portugal ir ao ultramar português, numa viagem que ele deseja que dure um ano. Seu empenho é que eu percorra o ultramar português com olhos de homem de estudo. Com olhos livremente

36

Sobre as viagens de Freyre às colónias portuguesas e a sua relação com o Estado Salazarista, consultar o artigo de Cristiana Bastos “Tristes trópicos e alegres luso-tropicalismos: das notas de viagem em Lévi-Strauss e Gilberto Freyre” in Análise Social, vol. XXXIII (146-147), 1998 (2.º-3.º), 415-432

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críticos. Que veja da África, do Oriente, das ilhas, os defeitos, e não apenas as virtudes”. [Freyre, 1980:5.] Deste modo, Freyre justifica os motivos de visita às colónias portuguesas e “demarcava-se” de uma possível associação política ao regime salazarista. “O convite recebido por mim do ministro do Ultramar não poderia ser mais nitidamente apolítico. Nem mais nitidamente apolítica poderia ter sido minha resposta a esse convite excepcional, que de início me colocou na situação de homem de estudo a quem se pedia que visse o ultramar português com inteira independência e até com olho sociologicamente clínico”. [Freyre, 1980:11.] Durante a viagem que faz a Goa, Freyre demonstra como ficou impressionado com a similaridade que encontrou na Índia Portuguesa com o Brasil. Na mesma viagem e durante a sua estadia em Goa, Freyre formula o lusotropicalismo como teoria sociológica, apresentando ideias para a criação de uma nova ciência e de uma nova escola – a tropicologia – começando a divulgá-la publicamente: “Creio ter encontrado nesta expressão — «luso-tropical» — a caracterização que me faltava para o complexo de cultura hoje formado pela presença portuguesa em terras tropicais e que tem na identidade de condições tropicais do meio físico e na identidade de formas gerais de cultura — com substâncias de raça e de cultura as mais diversas — suas condições básicas de existência e de expressão. [Freyre, 1980:258-259.]” Em todo o Ultramar, o sociólogo encontrou o mesmo sentimento de lusitanidade, chegando mesmo a concluir no seu livro “Um Brasileiro em Terras Portuguesas”37 que os portugueses que encontrou nas outras colónias manifestaram as mesmas qualidades lusotropicais que os portugueses que colonizaram o Brasil. Apesar de ter ultrapassado várias fases, é nos finais da década de 1950 e no início dos anos 60 que a doutrina lusotropicalista alcança o seu ponto mais alto, ao

37

“Um Brasileiro em Terras Portuguesas” foi escrito por Gilberto Freyre aquando da viagem às colónias portuguesas, a convite do Ministro das Colónias. O livro foi publicado em 1953 no Brasil e faz referência a conferências e discursos proferidos pelo autor quanto a uma possível lusotropicologia.

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transformar-se numa componente da ideologia colonial do Estado Novo Português, numa altura em que o governo salazarista mobilizou um esforço de propaganda colossal para poder justificar como um país com províncias tão extensas que iam do Minho a Timor podiam formar um só território: Portugal. Nesta mesma altura, Salazar multiplica-se em entrevistas à imprensa onde, por conveniência, se refere a Freyre, à multirracialidade e ao prazer pelo contacto com os “outros”, apostando na vulgarização da ideologia Freyriana. Existia

por parte de

Salazar

uma

apropriação

do

lusotropicalismo,

principalmente aquando do agravamento das questões coloniais e do início da Guerra Colonial

(1961),

sendo

expressões

como

«sociedades

luso-tropicais»

ou

«multirracialismo» cada vez mais frequentes no discurso do Presidente do Conselho e dos seus Ministros. Prova destes acontecimentos são os discursos de Salazar na Assembleia Nacional sobre o tema «Portugal e a campanha anticolonialista», onde Oliveira Salazar expõe o seu entendimento sobre o luso-tropicalismo: «Quando a Nação portuguesa se foi (…) estendendo pelos outros continentes, (…) pretendeu imprimir aos povos com quem entrara em contacto conceitos muito diversos dos que mais tarde caracterizaram outras formas de colonização. (…) A ideia de superioridade racial não é nossa; a da fraternidade humana, sim, bem como a da igualdade perante a lei, partindo da igualdade de méritos, como é próprio de sociedades progressivas. Em todos esses territórios a mistura das populações auxiliaria o processo de formação de uma sociedade pluri-racial (…) pode dizer-se que a tarefa estava vingada; a independência e a igualdade dos povos integrados com seus territórios numa unidade nacional». (Salazar, 30 de Novembro de 1960). Neste contexto de celebração de alegada condição de lusotropicalidade e de uma mística imperial, Salazar aposta no reconhecimento geográfico das colónias e na investigação colonial e ultramarina.

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IV Capítulo: “Goa e as Praças do Norte”

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4.1 - FORMAÇÃO DA GEOGRAFIA COLONIAL PORTUGUESA A afirmação da Geografia académica em Portugal acontece com a reorganização do Curso Superior de Letras de Lisboa, institucionalizando-se a Geografia no ensino superior. Importante em todo este processo foi o Professor Francisco Xavier da Silva Telles38, que sendo o primeiro Professor de Geografia em Portugal e membro efectivo da Sociedade de Geografia de Lisboa, introduziu em Portugal o ensino da Geografia Moderna e as tendências científicas da época. Incontornável para o desenvolvimento dos estudos coloniais em Portugal, apresentou nos congressos coloniais a sua visão sobre colonização e administração colonial, enfatizando que nada se tinha feito para efectivar uma prática geográfica das zonas tropicais: “não há altos estudos coloniais em Portugal, embora tenhamos todos os elementos necessários para a sua organização” (Telles, 2004:190), foi o impulso necessário para a criação da Escola Colonial e para a Escolas de Medicina Tropical. No período anterior a este, a Geografia Portuguesa encontrava-se apenas vocacionada para a investigação colonial, tendo sido requerida em 10 de Novembro de 1875 a constituição da Sociedade de Geografia de Lisboa sendo que em Janeiro de 1876 “estava assim a Sociedade de Geografia de Lisboa oficialmente constituída e nas condições iniciais necessárias para enfrentar a obra grandiosa de “estudo, discussão, ensino, investigações e explorações cientificas da geografia nos seus diversos ramos, princípios, relações, descobertas, progressos e aplicações” (Moreno, 1950:9)39. Criada em 17 de Fevereiro de 1876 “uma commissão permanente incumbida de colligir, ordenar e aproveitar, em beneficio da sciencia e da nação, todos os documentos que possam esclarecer a geographia, a historia ethnologica, a archeologia, a anthropologia e as sciencias naturaes em relação ao território portuguez e especialmente às províncias ultramarinas”40 intitulada “Commissão Central Permanente de Geographia”41, esta passou a integrar a Sociedade de Geografia de Lisboa, de modo a 38

Professor Universitário Português (1860-1930), tendo-se distinguido no estudo da Antropologia e da Geografia na temática dos Estudos Coloniais.

39

Mateus Moreno in “Sociedade de Geografia de Lisboa, 1875-1950” Lisboa, 1950

40

Diário do Governo, nº 39, de 19 de Fevereiro

41

Diário do Governo, nº 39, artº 2 de 19 de Fevereiro

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demonstrar que a planificação e execução da intervenção colonial portuguesa era consistente com o enquadramento de mentalidades europeias da época. Havendo a necessidade de produção científica de conhecimento das colónias, foi criada a 19 de Abril de 1883, a Commissão de Cartographia com a finalidade de sistematizar e organizar em todos os domínios do saber os feitos nas colónias. Com a Proclamação da República, Portugal é declarado como corpo impeditivo da civilização e do progresso colonial, tendo a Sociedade de Geografia de Lisboa reagido com uma proposta que versava sobre os conhecimentos coloniais portugueses e incluía na investigação científica o estudo das explorações parcelares, do regime económico, da administração colonial e da política colonial. Em 1936, estando a ditadura salazarista instalada, há uma invocação da mística imperial a uma escala nacional, que conduziu a uma reforma da Administração Ultramarina e do Ministério do Ultramar através do Decreto 26 180 de 7 de Janeiro de 1936, tendo sido a Commissão de Cartographia substituída pela Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais que, com o apoio do governo realizou as Missões Geográficas de Angola, Moçambique, Timor e Guiné, aprofundando assim o estudo da tropicalidade em Portugal. Ocupando-se da Comissão de Cartografia, o art. 12 do mesmo decreto rege o seu futuro, não desvalorizando o seu trabalho: “Não que se negue ou desconheça o importante papel que a Comissão de Cartografia, à qual preside um alto valor42 da nossa terra, tem desempenhado no reconhecimento geográfico das colónias e na determinação das fronteiras do Império. Mas, fixadas estas, como hoje estão, parece conveniente continuar os seus trabalhos noutros sentidos. Aproveitar-se-á a competência dos seus elementos mais experimentados para a continuação dos trabalhos de cartografia, introduzindo-se a colaboração de novos elementos técnicos para inícios de trabalhos em outros campos de investigação colonial” (D.L. 26 180, 1936:12). Termina salientando que:

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Refere-se ao Almirante Gago Coutinho

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“o reconhecimento geográfico das colónias tem de ser acompanhado do seu reconhecimento científico, para o que até agora se tem contado com muito poucos elementos. A essa importante missão se destina a Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais, organismo que vem ampliar a função da antiga Comissão de Cartografia” (idem). Designada como “um órgão de investigação, coordenação e de consulta destinado ao estudo dos problemas relacionados com a geografia política e ao prosseguimento de um plano de investigação científica nas colónias”43, os seus principais objectivos e competências consistiam no estudo dos problemas geográficos das colónias; na orientação dos trabalhos de investigação colonial e respectiva orientação das missões científicas e na recolha e conservação do material recolhido para posterior publicar os resultados dos trabalhos.44 São de salientar como missões de investigação colonial, realizadas entre 19291945 pela Antiga Comissão de Cartografia e pela Junta de Investigações Coloniais, a Missão Hidrográfica de Moçambique, a Missão Geográfica de Moçambique, a Missão Geográfica de Timor (Geologia, Geodesia e Cartografia), a Missão Geográfico de Angola, a Missão Geo-Hidrográfica da Guiné e a Missão Antropológica de Moçambique45. Tendo como objectivo o conhecimento geográfico e humano das colónias, e apoiadas pelo Governo, as missões cingiam-se a temáticas específicas, demonstrando a capacidade científica e de investigação. Com a criação do Centro de Estudos Geográficos de Lisboa em 1943, fundavase o organismo pela investigação científica e pelo apoio ao ensino superior de Geografia onde em 1946, foi dado o grande impulso da geografia colonial portuguesa com a apresentação dos estudos de Orlando Ribeiro sobre a expansão portuguesa. A partir deste momento, as escolas de geografia portuguesas dão início aos trabalhos de geografia colonial com algumas diferenças nos seus programas. Enquanto a Escola de Coimbra incidia esporadicamente sobre os problemas coloniais, a Escola de 43

Decreto nº 26 180, art. 177 de 7 de Janeiro de 1936

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Decreto nº 26 180, art. 177 de 7 de Janeiro de 1936

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Os documentos referentes a cada uma das Missões estão disponíveis no livro “Ocupação Científica do Ultramar Português – Plano Elaborado pela Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais e Parecer do Conselho do Império Colonial” , Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1945

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Lisboa empreendeu um vasto programa de investigação colonial muito em parte devido à orientação do director da escola, Orlando Ribeiro, e ao programa de investigação colonial que tinha criado. Numa altura em que a reorganização política fazia parte da agenda mundial, Portugal viu como necessário o reconhecimento efectivo dos territórios ultramarinos, e tendo em conta a importância crescente que a investigação nas colónias portuguesas ganhou e as lições retiradas das missões, em 1945 por despacho do Decreto 35 395 de 26 de Dezembro, a Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais foi reorganizada de modo “a ampliar o esforço feito no sentido do reconhecimento geográfico das nossas possessões ultramarinas a novos trabalhos de mais completa ocupação científica, sistematizando e organizando o que no campo da geologia, da botânica, da zoologia, da antropologia e da etnografia se vinha fazendo por iniciativa de organismos diversos ou das colónias” (Neves, 1958:18) Deste modo criou-se na Junta das Missões, a 16 de Agosto de 194646, o Centro de Cartografia e Geografia Colonial, posteriormente denominado de Centro de Geografia do Ultramar47, cujas competências se centravam nos estudos de Geodesia, Geografia Física e Humana e Estudos Técnicos e Políticos, conferindo-lhe uma multidisciplinaridade que não era comum à época. Era assim possível demonstrar que a investigação portuguesa se podia equiparar à estrangeira. Tecnicamente, o Centro de Cartografia e Geografia Colonial, tinha como função criar e organizar as missões geográficas, ordenar e coordenar as suas actividades e publicar as cartas geográficas que davam a conhecer o império português. Para que a concretização destes projectos fosse possível, a remodelação do centro por ordem da Portaria 15 568 de 21 de Outubro de 1955 foi fundamental ao providenciar as condições e a doutrina necessária para o desempenho das suas funções de modo a responder de forma rápida e eficaz a todas as exigências de intercâmbio internacional. Esta remodelação conduziu à realização das Missões Geográficas de Angola, Timor, Guiné e Moçambique progredindo na elaboração cartográfica, na impressão de Cartas e do Atlas do Império Colonial Português, sendo esta época considerada por 46

Portaria nº 11 462

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Portaria 15 568 de 21 de Outubro de 1955

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Marcelo Caetano como “uma página viva da história da investigação colonial portuguesa”48 (I.I.C.T., 1983:134). A reorganização da Junta consistia na sua transformação num organismo aberto sem limite de membros, com dependências nas colónias e destinadas ao estudo e discussão académica dos problemas científicos coloniais. Seria então exequível uma investigação científica mais eficaz, que contribuísse para os progressos da técnica e da política de colonização que nela se entendia dever alicerçar, defendia o documento. As competências da Junta de Investigações Coloniais passaram a centrar-se na orientação de estudos tendo por objectivo “o conhecimento puro do homem e da natureza” (Ibide,:135), com vista à concretização dos propósitos de melhorar as condições económicas e físicas da vida dos indígenas e dos colonos; explorar eficientemente os recursos coloniais e contribuir para o melhor conhecimento do Globo. A promoção de estudos nas colónias e metrópole, a organização de missões no ultramar, a elaboração e publicação de trabalhos científicos e cartas geográficas, tal como o estudo de questões diplomáticas ou de natureza técnica respeitantes aos limites territoriais (sendo esta tarefa uma herança da antiga Comissão de Cartografia), a promoção de centros universitários de estudos coloniais e cursos temporários de modo a expor os resultados obtidos na investigação e a organização do Museu Colonial Português eram também da competência da Junta de Investigações Coloniais. Com base no arquivo de informação científica, foi possível ao Centro ganhar notabilidade nacional e internacional, pois o tratamento de toda a informação conduziu à presença dos representantes do Centro de Geografia do Ultramar em congressos, conferências e cursos. Levou à produção de um Atlas actualizado das Províncias Ultramarinas (1965), à iniciação de um Atlas do Ultramar Português (1971)49, e à criação em 1973 da Revista Garcia de Orta, exclusivamente dedicada à Geografia e denominada de “Série de Geografia”. No que concerne aos temas integrantes da sua acção, a publicação da Colectânea de Memórias Científicas, o estabelecimento de relações com instituições estrangeiras e o intercâmbio de publicações e de material científico foram um marco importante no posicionamento da Geografia Colonial Portuguesa. 48

Marcelo Caetano, em 1945 aquando do seu cargo de Ministro das Colónias

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Ficou incompleto devido à falta de acesso aos dados depois de 1975

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Em 6 de Novembro de 1973, no mandato do Professor Doutor Silva Cunha como Ministro do ultramar, tornou-se pública a última reforma da Junta de Investigações do Ultramar tendo como justificação a cooperação internacional e a interdisciplinaridade da futura investigação: “ a investigação deixou de ser encarada apenas como actividade de indivíduos isolados, circunscrita aos limites de uma disciplina, e passou a ser de preferência um trabalho de equipa e interdisciplinar”50 (D.L.nº583/73, 1973:2106). Considerando os resultados do trabalho conjunto de investigadores orientados para os objectivos, a investigação científica passou a constituir uma actividade profissional, tendo sido necessário assegurar a importação de conhecimento científico e de investigadores estrangeiros através da cooperação internacional. Quase 30 anos depois da instituição e expansão, e em plena guerra colonial a Junta de Investigações Coloniais começou a perder a sua versatilidade como estabelecimento científico polivalente, como demonstra o Decreto de 6 de Novembro de 1973: “Apesar da obra realizada ter atingido volume e qualidades notáveis, verifica-se, desde há bastante tempo, que ao fim de perto de 30 anos de vigência efectiva da maior utilidade, a orgânica da Junta se encontra desajustada, nalguns aspectos, das exigências actuais, e precisa, por isso de remodelação que suscite o revigoramento da actividade deste organismo e o melhor enquadramento desta no contexto do panorama actual da investigação científica” (D.L.nº583/73, 1973:2107). Para que tal fosse possível, organismos como o Arquivo Histórico Ultramarino, o Jardim e Museu Agrícola do Ultramar e o Centro de Estudos Históricos do Ultramar foram integrados na Junta de Investigações Coloniais, constituindo como suas novas atribuições a intensificação da investigação científica, tendo sempre em conta a valorização humana e o conhecimento científico das populações e territórios. A promoção da investigação e sua aplicação às colónias ultramarinas, seria o meio de atingir as novas funções 50

Preâmbulo do Decreto 583/73 de 6 de Novembro de 1973

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No dia 25 de Abril de 1974, com a queda do Governo Salazarista, com a corrida das Províncias Ultramarinas para a independência, o trabalho da Junta deixou de corresponder às expectativas portuguesas da altura, concluindo-se que “A JICU (e com outras designações) criou e proporcionou as condições necessárias para a realização de trabalhos de investigação em Geografia, no âmbito das seguintes missões: Missão de Geografia à Guiné (1947); Missão para o estudo da erupção do Fogo (1951); Missão de Geografia na Índia

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(1955); Missão de Estudos de Geografia Física do Sul de Angola

(1958); Missão de Geografia Física e Humana do Ultramar (1960), além de actividades ligadas a um Agrupamento Científico de Preparação de Geógrafos para o Ultramar (1958) que em Lisboa tiveram por sede o Centro de Estudos Geográficos de Lisboa (criado pelo antigo Instituto de Alta Cultura, em 1943)” (in “Da Commissão de Cartographia (1883) ao Instituto de Investigação Científica Tropical (1983) – 100 Anos de História). Neste sentido foi necessário a criação de um organismo que tivesse a versatilidade própria à cooperação com os países tropicais. Como resultado, do corpo da Junta de Investigações Coloniais, restou somente o esquema teórico que, nos princípios deste conturbado período, serviu de base à continuação da cooperação científica de expressão portuguesa através do Instituto de Investigação Científica Tropical (IICT), único ‘descendente’ da Commissão de Cartographia de 1883.

4.2- RAQUEL SOEIRO DE BRITO E A GEOGRAFIA COLONIAL PORTUGUESA A problemática da investigação colonial foi primeiramente abordada em 1949, no Colóquio da Junta de Investigações Coloniais onde Orlando Ribeiro pôs em causa uma temática “esquecida”: os Problemas da Investigação Colonial em Portugal. Analisando os problemas inerentes à Investigação Colonial Portuguesa, o Professor Orlando Ribeiro considerava que apesar de muitos verem Portugal como pioneiro na investigação colonial nos trópicos, isto não correspondia à verdade, não existindo “entre nós tradição de investigação científica destas matérias” (Ribeiro, 1949:4). Considerando a investigação dos problemas coloniais como um amplo estudo regional e ponto de partida para a contribuição portuguesa no estudo das regiões 51

A Missão de Geografia à Índia será abordado no tema central da presente tese

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tropicais, a crítica do geógrafo prende-se com o domínio da temática africana na investigação colonial e o esquecimento das restantes colónias, argumentando que “não podemos esquecer o valor humano destas colónias, particularmente na Índia, onde se deu, como em Cabo Verde, uma espécie de transfusão de cultura. A Índia e Cabo Verde constituem, de facto, dois casos especiais e do maior interesse na nossa vida colonial” (ibide:14). Para Orlando Ribeiro, estava em causa o próprio desenvolvimento científico do país e “a vantagem de guardarmos para nós e em incluirmos dentro das nossas obrigações e directrizes de trabalho o largo horizonte das curiosidades tropicais” (ibide:14). Somente “uma razão de ordem científica nos aconselha a manter e a desenvolver os nossos estudos dentro deste amplo horizonte de curiosidade das regiões tropicais… É assim que nós trazemos a nossa contribuição para os problemas gerais destas regiões e é assim, também, que fazemos falar uma razão de prestígio nacional” (ibidem:14) Para o governo salazarista vigente, tratava-se realmente de prestígio nacional onde a defesa ideológica, politica e militar do império português é a resposta encontrada num contexto de descolonização pós-guerra. Além de mudanças políticas na Constituição Portuguesa, a nível económico houve um investimento progressivo nas missões científicas geológicas, geográficas e antropológicas, para controlo e vigilância dos territórios bem como para maior exploração dos seus recursos. A necessidade de reconhecimento geográfico e científico das antigas colónias do ultramar, conduziu à criação da Junta de Missões Geográficas e de Investigações Coloniais que, juntamente com o Centro de Geografia do Ultramar, conseguiram direccionar a Geografia Portuguesa na rota da geografia mundial, contribuindo em muito para a expansão da produção do conhecimento geográfico em Portugal. Ainda que o cunho da ideologia colonial se fizesse sentir nos discursos científicos em geral, de forma mais ou menos específica, é nesta fase que assistimos à organização de um corpo científico designado para legitimar um sentido de nação, império e propriedade; a Geografia Colonial. O esforço de adaptação ideológico através da “transmutação de «mística imperial» dos anos 30, centrada na superioridade da raça branca e na missão providencial do homem português, branco e cristão, face às «raças inferiores», para o 55

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discurso

«luso-tropicalista»

sobre

a

especificidade

social

e

culturalmente

miscigenizadora da colonização portuguesa” (Rosas, 1999:13) serviu, através da apropriação da obra de Gilberto Freyre, de doutrina e legitimação cientifica ao regime salazarista dando continuidade à sua politica colonial. Neste sentido o governo português, tentando manter a sua política colonial face às políticas de descolonização internacionais, promoveu um discurso de unidade e desenvolvimento colonial, pretendendo demonstrar os benefícios e a necessidade de manter esta posição política. Havia a necessidade de mostrar ao mundo o império português e durante 30 anos (1945-1974) a actividade geográfica no ultramar foi intensa, promovendo-se estudos geográficos de reconhecimento. A produção de conhecimento geográfico colonial devese em grande parte ao trabalho de uma equipa inovadora chefiada por Orlando Ribeiro e onde figuravam, entre outros, Francisco Tenreiro, Ilídio do Amaral, Mariano Feio, Raquel Soeiro de Brito da Escola de Geografia de Lisboa e Alfredo Fernando Martins e Lucília Dóris Gouveia da Escola de Geografia de Coimbra. Os vários estudos, monografias e artigos que resultaram daqui, foram fulcrais para a construção da imagem moderna do mundo, consolidando o imaginário geográfico ocidental. O processo de reconhecimento geográfico e da política de não-descolonização teve início na Índia Portuguesa onde, e de acordo com Rosas (1999), o “decretar da pluricontinentalidade da «nação una», da manipulação de uma nova «teoria» sobre a originalidade «luso-tropicalista» da colonização portuguesa” (ibide:14) fariam de Goa o que seria o primeiro exemplo de política de não-cedência colonial. Esta originalidade diferenciadora e o facto da Índia ser «a transplantação do Ocidente em terras orientais»52 eram razões mais que suficientes para Salazar não abandonar a colónia indiana, fazendo parte de uma estratégia de resistência nacional. Parte desta estratégia consistia em custear campanhas de propaganda nos media ocidentais, convidá-los a visitar e escrever sobre a Índia Portuguesa e promover visitas de estudo científicas, que de algum modo comprovassem a visão lusotropicalista na Índia. Neste sentido, e em conversa com o Ministro dos Negócios Estrangeiros – Professor Paulo Cunha – surge a Missão de Geografia da Índia pretendendo-se mostrar “ «a que profundidade chegara a acção portuguesa através de quatro séculos de história», proporcionar uma «ampla confirmação» às observações «francamente 52

Oliveira Salazar in “Portugal,Goa e a União Indiana” – Lisboa, SNI , 1956, p.7

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animadoras» de outros geógrafos e sociólogos, o que, «nas actuais circunstâncias» parecia oportuno e de «evidente alcance nacional»” (Ribeiro, 1999:22). Nela participou Raquel Soeiro de Brito considerada por António Hespanha53 “uma grande mulher”, “decidida, animosa e eficaz (…) com uma humaníssima e sedutora maneira de tratar os outros”, Raquel Soeiro de Brito é também uma mulher da ciência geográfica com “fibra de geógrafo, habituado ao variar da paisagem e à resistência do casco das coisas, por sob a mudança dos dias”54. Terá sido, porventura, esta fibra que levou esta mulher portuguesa a aceitar a integração na Missão Geográfica da Índia em 1955 e o vasto leque de trabalhos que esta compreendia. O resultado deste estudo eclodiu com a elaboração da monografia “Estado da Índia”, com a publicação de “Goa em 1956 – Relatório ao Governo” ambos da autoria de Orlando Ribeiro, e com a obra “Goa e as Praças do Norte” da autoria de Raquel Soeiro de Brito. Dentro deste conceito de produção de conhecimento, os Açores são parte integrante de uma geografia da expansão portuguesa, tendo Raquel Soeiro de Brito realizado em 1955 a sua tese de doutoramento, subordinada ao tema “A ilha de São Miguel: estudo geográfico”. Sendo a primeira Doutorada Portuguesa em geografia e fazendo parte do grupo de geógrafos destacados para as missões de levantamento dos territórios ultramarinos, Raquel Soeiro de Brito desenvolveu vários estudos geográficos nas colónias portuguesas, na Índia Portuguesa em 1956; em Macau em 1961 e 1989, aquando da administração portuguesa; em Moçambique em 1961, 1964 e 1969; na Guiné-Bissau em 1962 e em Angola em 1965 e 1968. Como resultado desses estudos redigiu vários artigos e livros, sendo exemplos desse trabalho “A ilha de S. Tomé: Estudos Geográficos” (1955), “Imagens de Macau” (1963) e “Guiné, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe: alguns aspectos da terra e dos Homens” (1966).

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Comissário Geral da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses in “Goa e as Praças do Norte

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Idem

Revisitadas”, 1998. p.7

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Fig.1: O Prof. Doutor Orlando Ribeiro, o Eng.º Frederico Machado e a Doutora Raquel Soeiro de Brito a bordo do "Príncipe" a caminho dos Capelinhos – Setembro de 1957 (Fotografia de Tomás George Conceição Silva). Fonte: Revista da Marinha – Agosto 2007

Desempenhando o seu trabalho fora da Europa pela primeira vez, permaneceu cerca de um ano na Índia Portuguesa (1955-1956), tendo estudado os aspectos físicos e os aspectos humanos em Goa e realizado um trabalho preliminar sobre os modos de vida goeses. Cabia a esta mulher a tarefa do elaborar científico da paisagem do império português no oriente, estruturando um discurso sobre um território físico que, tendo como base um projecto de elevação do prestígio nacional, validasse a política colonial portuguesa vigente. Não podemos esquecer que nesta altura era necessário criar um corpo científico acreditado pela autoridade da ciência moderna, para cada uma das províncias portuguesas, do Minho a Timor.

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Fig. 2: Mapa de Henrique Galvão – 1934 Fonte: Biblioteca Nacional Digital

Portugal demonstrava assim o seu poder imperial, representado no mapa criado por Henrique Galvão, que via os portugueses como uma civilização equilibrada com uma missão histórica. Criando os seus discursos geopolíticos com o propósito de preservar o império colonial, a elaboração de missões às colónias foi fulcral para demonstrar o papel português na moderna construção do mundo. Com a pretensão de “preparar um trabalho desenvolvido acerca da Geografia desses territórios portugueses, preparado em comum segundo as predilecções ou antecedentes científicos de cada um” (Ribeiro, 1999:61) a Orlando Ribeiro, devido ao retorno inesperado a Portugal Continental, não lhe foi possível concluir a Missão Geográfica da Índia. Deste modo, Raquel Soeiro de Brito ficou encarregue da realização das suas tarefas e de completar as destinadas ao Professor Orlando Ribeiro. Deve-se à geógrafa um conciso estudo sobre as colónias portuguesas na Índia, sendo a sua obra mais importante, a abordar esta temática “Goa e as Praças do Norte” (1966), uma geografia sobre Goa, Damão e Diu, que foi premiada com o Prémio Almirante Gago Coutinho da Sociedade de Geografia de Lisboa em 1966. Dada a 59

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limitação de tempo do presente estudo e a extensão do trabalho da autora, optou-se pela escolha desta obra para o início da análise da produção científica desenvolvido pela geógrafa. É de louvar o trabalho que Raquel Soeiro de Brito desenvolveu ao longo dos meses que permaneceu na Índia que lhe permitiu construir a representação científica moderna do território. Neste âmbito construiu um mapa pormenorizado da população, efectuou o levantamento da planta funcional de Margão e tirou milhares de fotografias, que conjuntamente com os cadernos de campo que possuía permitiram “elaborar uma verdadeira monografia que, tendo como núcleo a substância geográfica, se alargará, não raro, pela História, pela Etnografia e pela Sociologia.” (ibide:64). Para muitos autores, este consiste num “verdadeiro clássico da nossa produção científica na sua área, cujas páginas são, além disso, enriquecidas pela constante convocação de emergências históricas, culturais e antropológicas, bem como por excelentes fotografias realizadas pela autora durante o seu trabalho de campo (…)”55 (Moura, 1997:10). Esta obra aborda a jornada geográfica de uma mulher, em certo sentido, fora do seu tempo que tentou testemunhar pela descrição geográfica o conhecimento e cultura de um povo e, aos seus olhos, as diferenças entre os modos de vida ocidentais e orientais num país colonizado. Este trabalho intenso é nosso objecto de estudo, o qual tentaremos perceber, pela sua análise a vários níveis.

4.3 – ANÁLISE DA OBRA “GOA E AS PRAÇAS DO NORTE” As narrativas de viagem de mundos desconhecidos proporcionaram, desde sempre, um grande manancial de informação geográfica, sendo fulcrais para averiguar como o conhecimento dos outros espaços é constituído, pondo a descoberto as relações entre colonialismo e geografia. Goa e as Praças do Norte não é uma narrativa de viagem clássica, é uma narrativa científica da geografia colonial portuguesa. Dando ênfase à análise de contextos institucionais, intelectuais e sociais onde as práticas exploratórias tiveram lugar, a Geografia considera o papel dos viajantes, legitimadores da autoridade científica e símbolo da visão do mundo onde as actividades 55

Vasco Graça Moura – Director do Serviço de Biblioteca e Apoio à Leitura da Fundação Calouste Gulbenkian in “ No Trilho dos

Descobrimentos: Estudos Geográficos”, 1997, p.10

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europeias eram vistas como civilizadoras, indispensáveis para a criação do modo de visualizar o outro. Na obra de Raquel Soeiro de Brito – “Goa e as Praças do Norte” deparamo-nos com a evolução da narrativa de viagem em narrativa científica, servindo deste modo o propósito do Governo Português, cujo principal objectivo consistia no reconhecimento científico e geográfico das colónias portuguesas. Neste contexto de produção de conhecimento, a autora faz uma descrição ampla e pormenorizada dos modos de vida da Índia Portuguesa estruturando a sua obra na história e na descrição dos aspectos físicos e humanos. No início da sua obra, a autora apresenta os termos gerais da Missão Geográfica da Índia, enquanto ponto de partida para o estudo geográfico. Realizada entre Setembro de 1955 e Julho de 1956, a missão foi chefiada por Orlando Ribeiro, tendo a colaboração de Mariano Feio, no que respeita ao levantamento geológico do território, e de Raquel Soeiro de Brito. Sendo um trabalho baseado na observação directa cabia à geógrafa “o estudo dos processos e organização da pesca e arranjo do espaço agrícola, além do levantamento de pormenor de três aldeias de Goa” (Brito, 1966:5). A este propósito a autora lembra que desde o início do estudo (1955) à impressão da obra (1966), poderão existir pequenas diferenças no espaço indiano “mas as estruturas evolucionam lentamente no espaço indiano e é de crer que as transformações nos últimos anos não tenham alterado substancialmente o que foi matéria deste estudo” (ibide:6). Trata-se pois de evocar, desde o início do estudo, a percepção de um “tempo lento”, a ideia de um espaço parado no tempo, ideia aliás vinculada nos tratados orientalistas do início do séc. XX, onde o Ocidente se descreve “como progressivo, no sentido do fazer da história e da transformação do mundo, enquanto que o oriente foi definido (pelos europeus) como estático e intemporal” (Crang, 1998:66). Neste sentido, dois princípios organizadores orientam esta narrativa científica; o sentido de um tempo lento associado ao oriente e a ideia de império mítico português com base espacial no oriente. Definindo o império português no oriente como um “facto sem paralelo tanto na expansão portuguesa como na dos outros povos da Europa” (Brito, 1966:7) devido à abertura a novas culturas e povos sem receios, e à colonização do território indiano como algo sem precedentes e original, a autora vai expondo desde o inicio a sua própria 61

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agenda ideológica através de uma narrativa espacial de base histórica sobre a construção do império português no oriente (ibide:7) onde pretende contribuir para a consolidação de uma Geografia do Império. Neste momento eminentemente pós-colonial surge a questão se essa geografia imperial contribuiu para uma geografia da diferença, para a criação de espaços simbólicos de desigualdade e para a perpetuação da imagem do Outro, ou se realmente fomos uma forma de colonialismo original, “um próspero benevolente e cosmopolita capaz de se aliar a caliban para construir uma realidade nova” (Santos, 2001:54).

4.3.1 – PAISAGEM E CLIMA: OS SENTIMENTOS DE LUGAR Raquel Soeiro de Brito inicia o capítulo “Goa” com a descrição do quadro natural, promovendo a exaltação da natureza regional e contextualizando a obra na escola vidaliana francesa, grande influência da escola de geografia portuguesa. A narrativa apresenta a uma clara divisão entre o meio natural e cultural, dando primazia ao quadro físico da região, como modo de “fixar” o quadro da paisagem retratada, notando-se sobretudo na descrição de Goa, ao longo da qual Raquel Soeiro de Brito vai posteriormente avançando os traços individualizados da paisagem cultural, dando ênfase à inscrição das culturas locais na paisagem. Parece pois pretender-se obter uma legitimação do cultural por natureza, descrevendo a “natureza natural” de modo a legitimar um estado de atraso civilizacional subjacente no texto escrito e visual. Deste modo era possível afirmar o carácter civilizador do império português e justificar a “nossa” capacidade de domesticação mesmo nas mais sofisticadas das antigas civilizações. O estudo das regiões é essencial para a autora, movimentando-se um quadro epistemológico mais lato dentro do qual a geografia regional permitia consolidar a moderna imagem do mundo de pendor eurocêntrico. Baseada em generalizações socialmente construídas, a questão de identidade de lugar na narrativa de viagem é transmitida pela estetização da paisagem. Assumida por Vidal de la Blache, a intimidade entre cultura, paisagem e região (Gregory et al, 2009:634) consolidou um muito específico conhecimento do mundo, organizado de forma a perceber o sentido de lugar. 62

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Desde a sua posição de cientista europeia debruçada sobre as características de um território, a autora vai exprimindo ideias e sentimentos como forma de tornar inteligível a percepção de um espaço que era urgente descodificar para consumo interno. Deste modo, a paisagem apresenta uma “geografia histórica distintiva” (Soja, 1999) que vai permitir que Raquel Soeiro de Brito desenvolva uma narrativa geográfica descritiva onde exprime, através da fisionomia dos lugares, os sentimentos que o lugar lhe impõe: as complexas relações entre o ser humano e o ambiente físico. Observando o espaço goês, a autora denota como “feições mais marcantes da paisagem” (Brito, 1966:13), as plataformas litorais onde encontra “superfícies rígidas”, com “magros arbustos” e zonas “quase completamente estéreis”, a par da acção humana que “cortando e desbastando a mata original para aí colocar culturas alimentares ou lançar o gado a pastar, contribui para a descrição do delgado solo” (ibide:14). A autora constrói o texto geográfico apoiando-se em metáforas que deste modo potenciam ao leitor uma imagem de subdesenvolvimento da Índia, criando uma densa teia de problemas que apenas seriam resolvidos com o acto de domesticação português, adensando deste modo o carácter salvador da missão portuguesa nas colónias. Esta ideia de domesticação encontra-se fortemente ligada às ideias ocidentais de civilização e progresso do ser humano, presente nas práticas políticas coloniais (Gregory et al, 2009).

Fig. 3 : Rebordo do Planalto dos Gates Fonte: “Goa e as Praças do Norte” – 1966 63

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Mas as ideias avançadas no texto, tais como a rigidez de superfícies, a magreza dos arbustos ou a esterilidade das “zonas”, vão desenvolvendo o seu trabalho de construção de significados sobre os lugares retratados; “ (u)m traço importante do discurso colonial para a construção ideológica da alteridade é a sua dependência do conceito de “fixidez”. A fixidez, enquanto signo da diferença cultural/histórica/ racial no discurso do colonialismo, constitui um modo paradoxal de representação: conota rigidez e uma ordem imutável, bem como desordem, degeneração e repetição compulsiva” (Bhabha, 2005:143). Subtilmente elas vão organizando a construção da imagem do lugar sob a fachada de uma linguagem neutra e científica. Inventariando e sistematizando, zona litoral, intermédia e rebordo vigoroso, a narrativa progride em julgamentos supostamente legitimados pelo “natural” e à medida que se vai procedendo à antropomorfização das formas físicas vai-se também tornando mais complexo o sentimento de lugar. À senilidade dos relevos contrapõe-se a maturidade dos vales e ainda a juventude das formas, num processo crescente de historicização das formas físicas que aprisiona o meio numa leitura tão situada quanto as teorias geológicas o impunham, à época.

Fig. 4 : Plataformas do litoral Fonte: “Goa e as Praças do Norte” – 1966 64

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De Damão e Diu, a autora passa-nos uma imagem de pobreza onde os solos pouco ocupados constituem territórios exíguos e vazios, onde a ideia de uma relação harmoniosa com a natureza, é fulcral na geografia imaginária ocidental. Esta ideia de vazio e pobreza, perpassada pelas imagens da autora sobre a superfície, conduz a um sentido de passado, de falta de progresso constituindo um artifício para a articulação dos modos de representação colonial.

Fig.5: Vista aérea da Fortaleza de Damão Fonte: “Goa e as Praças do Norte” – 1966

O clima como condicionante da ocupação do solo, condiciona também a vida das populações, cria diferentes formas de sentir e uma narrativa de contrastes descritos de uma forma maravilhosamente pormenorizada no clima gôes: “De um céu coberto por grossas nuvens cor de cinza que se desfazem durante horas seguidas em catadupas de água, passa-se a uma transparência atmosférica quase sem limites, em que os mais pequenos pormenores são avistados com toda a nitidez a muitos quilómetros de distância, e durante meses seguidos não cai nem uma gota” (Brito, 1999:18). 65

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O que a autora recria é um espaço de contraste, onde a natureza contrastante e encantadora, provocando um sentimento ambíguo que surpreende, ameaça e cativa. É o jogo entre a ambivalência e o estereótipo que se desenvolve através do texto, e a sua repetibilidade efectiva a própria estratégia de individuação. Trata-se pois de construir um sujeito colonial através da descrição da paisagem, onde a articulação das formas da diferença se efectiva pela expressão do sentimento de lugar. Nesta mistura de ciência descritiva e sentimentos de lugar, Raquel Soeiro de Brito descreve Goa como deprimente, criando o tempo de monção “uma atmosfera quente e muito carregada de humidade, profundamente desagradável, e para pessoas sensíveis, mesmo doentia.” (ibide:21). Os trópicos deixam de ser exóticos e encantadores, acarretando consigo uma imagem negativa e desagradável atribuindo-selhe a ideia de inferioridade. O clima tropical, onde a contestação do selvagem, do excessivo e do bruto contrasta com o clima temperado, modela a produção do conhecimento e marca a originalidade do clima da região comentando a autora na sua visão essencialista que “se todas as regiões da terra têm o seu clima próprio, em poucos mais ele será tão exclusivamente dominante como nestas” (ibide:20). O mesmo acontece no caso da descrição de Damão, onde a temperatura “monótona e constantemente elevada”, com uma atmosfera anual “extremamente límpida e seca, em que os mais pequenos pormenores de paisagem se recortam, bem longe, num céu azul, contrastando fortemente com o amarelo ressequido do campo” (ibidem:122) cria um ambiente confortante, apenas suplantando pelo tempo de monção onde “paira no ar forte humidade e o céu, ainda há pouco de um azul puro, fica coberto por grossas nuvens cinzentas que caminham lentamente no mar” (ibidem:123). A insistência na tentativa de recriar uma representação de espaço através de relações de oposição permeia este discurso de reconhecimento. Todas estas descrições invocam sensações idênticas, “é um tempo depressivo e sob o qual o menor esforço é assinalado por leve camada de suor, que fica colada ao corpo e provoca quase sempre sensação de mal-estar” (ibidem:123). Esta sensação apenas parece passar em Outubro quando “reinam os tempos mais frescos, secos e radiosos de sol” (ibidem:123), parecendo alegrar e dar ânimo aos dias da autora. A nossa sugestão é de que se efectua a construção de um espaço teórico para afirmação de 66

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uma identidade originária assente em discriminações e contradições sobre um sujeito que se pretendia colocar “no seu lugar”. Como se a duplicidade essencial do asiático, e da Ásia enquanto região cultural, pudessem ser efectivamente comprovadas pelo discurso científico. As narrativas geográficas são em grande medida a expressão da resposta da viajante estrangeira ao lugar que lhe é estranho. E não podemos esquecer de que, de acordo com Said, através da viagem constrói-se um arquivo que se estrutura internamente com base nos escritos que resultam destas experiências. Destes textos resultam uma série de reduções “a viagem, a história, a fábula, o estereótipo, o confronto polémico. Estas são as lentes através das quais o Oriente é experienciado” (Said, 1978). Neste processo, a cientista reage à mudança do ambiente físico através do seu próprio corpo. Ainda que tentando subtraí-lo da narrativa científica o corpo está presente nela, ele fala do sentimento de lugar. Deste modo, o corpo funciona como meio de comunicação das experiências vivenciadas e meio de (res)significação do espaço associado à produção do conhecimento geográfico.

4.3.2- ESPAÇO E HISTÓRIA: AFIRMAÇÃO DA CULTURA A acção humana como modificadora da paisagem é retratada pela autora quando pretende dar a conhecer a organização dos diferentes espaços existentes em Goa, Damão e Diu, prática relacionada com o facto de cada sociedade produzir diferentes espaços, existindo por isso a necessidade de estudar cada um desses espaços peculiares. Nas descrições que Raquel Soeiro de Brito faz, as intersecções ser humano e ambiente físico são inúmeras: “As três faixas em que se divide geograficamente o território … foram afeiçoadas pelos homens e, a pouco e pouco, acabaram por formar três áreas de ocupação bem distintas” (Brito, 1966:55), continuando sempre dentro desta linha de pensamento, onde as regiões naturais têm como objectivo servir uma sociedade e não ser factor determinante dessa sociedade, mas paralelamente se enfatiza o carácter determinante do meio. Esta é mais uma das tensões que percorre toda a obra da autora, a tentativa de fugir a uma força determinante do ambiente físico, afirmando-se igualmente a sua manifesta supremacia. Deste modo o estudo geográfico passa pelo exame combinado de factos humanos e físicos visando a produção de uma especificidade local. As representações de espaço descritas pela autora “onde a presença do homem adquire 67

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maior continuidade e a sua marca na transformação da paisagem é mais profunda” (ibide:56) demonstram como o meio em grande medida se define em função da obra humana que o transforma, enfatizando o papel modelador da sociedade na natureza através dos “modos de vida padronizados funcionalmente” (Livingstone, 1992). A estratégia textual organiza-se de forma a que a paisagem natural se transforme em paisagem cultural. Assim a paisagem natural é vista apenas “como um material bruto a partir do qual as forças produtivas de uma variedade de sistemas sociais engendraram os seus espaços particulares” (Lefebvre, 2000:138). Havendo a necessidade de descodificar os diferentes processos que criam a multiplicidade de espaços, a autora observa: “se a topografia é obra da natureza, ao homem cabe a responsabilidade (…) da esterilização dos planaltos” (Brito, 1966:56). Da organização do espaço goês a autora refere que “a gente pobre de Canará … «atraída pela beleza e feracidade do terreno do Concão» (43, 1,142) ocupou estas terras devolutas” (Brito, 1999:55). A representação do território em Raquel Soeiro de Brito, foca-se muito no uso de termos contrastantes onde a beleza, o exotismo, o medo e o estranho são presença assídua. A autora considera que com a chegada dos portugueses, o impulso ocidental e racional concedeu a Goa “uma carta de privilégios quase igual à de Lisboa” (ibide:96), tornando a cidade apetecível de viver, e valorizando “o seu traçado … lembrava, à primeira vista, o das mais opulentas cidades ibéricas e italianas de então; igrejas monumentais, palácios, casas de acentuado ar aristocrático testemunhavam as riquezas acumuladas” (ibide:97), havendo uma clara inscrição portuguesa e ocidental na paisagem. O uso de termos como ocidental, racional, palácios, riquezas denota a presença de um discurso colonial e nacionalista no texto da autora, que pretende demonstrar a necessidade da permanência portuguesa em Goa e celebra a grandeza do Império. A exaltação do império alarga-se também à dimensão religiosa, pelo que a autora se demora nas descrições dos espaços religiosos, enfatizando a influência católica nas construções arquitectónicas, como são exemplo “a Sé Catedral, o mais vasto de todos os templos de Velha Goa, ostentando uma fachada imponente e simples; o Convento de S. Francisco de Assis «o mais belo modelo de arte religiosa do séc. XVII»” (ibidem:100).

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A distância e proximidade cultural enformam uma vez mais o discurso da autora, colocando os sujeitos numa relação de poder e reconhecimento, a qual não sendo simétrica funciona por oposição. Neste jogo de descentramento simbólico, o contraste e a oposição funcionam como vectores de reconhecimento. A autora encontra a junção de povos que sendo “cristãos; hindus e muçulmanos andam de mistura com aqueles pela estrada a caminho da Sé” (ibidem:116) onde Portugal é encontrado nas “barraquitas de artigos religiosos, de «comes e bebes»; de brinquedos, de bugigangas, de panelas de cobre” concluindo que “ «no ambiente geral da Romaria surpreendem-se aspectos que não se afiguram estranhos a quem conheça a vida tradicional» (61,180) das províncias do continente português” (ibidem:116). Neste contexto, existe uma tentativa de afirmar a identidade e a cultura portuguesa como um factor constante em todas as províncias portuguesas. Consolida-se assim uma geografia do império português que promove a portugalidade, o sentido de união e uma cooperação íntima entre todos os territórios portugueses.

Fig. 6 : Festa Religiosa Cristã Fonte: “Goa e as Praças do Norte” – 1966

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A melhor descrição que Raquel Soeiro de Brito encontra sobre Goa é a de François Pyrard de Laval

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com um pormenor impressionante em relação a cada rua

onde encontrava diferentes centros, como por exemplo, “a Rua Direita ou dos Leilões é (…) onde se encontram todas as espécies de mercadorias da Europa e da Índia (…)” (ibidem:100), demonstrando através da descrição do navegador o carácter cosmopolita dos impérios do oriente. A descrição da paisagem como afirmação da cultura opera-se por forma a que o sujeito dominante esteja estrategicamente situado dentro da narrativa, de tal modo que o processo de subjectivação é elaborado tendo por base o cenário inconsciente do orientalismo. Assim, a autora socorre-se de outras fontes para afirmar o destino frágil do território como é o caso do documento57 escrito pelo Governador D. Frederico Guilherme de Sousa (1780): “Encontrei a cidade de Goa em deplorável estado de conservação58, com ruas inteiras sem casas, alguns quarteirões transformados em plantações de coqueiros, e os outros, de que a maior parte está arruinada, dificilmente poderão ser restaurados devido à pobreza dos seus proprietários. À parte algumas sumptuosas igrejas e conventos, os outros grandes edifícios como palácios e hospitais estão quase todos mais ou menos em mau estado” (ibidem:105). O discurso do Governador é essencial na narrativa da autora, tendo em conta que esta ideia de decadência aquando da não governação portuguesa passa a ideia da fragilidade dos povos não modernos aos olhos ocidentais e, deste modo, fundamenta a doutrina portuguesa de civilização, colocando a civilização indiana como dependente da ajuda do centro metropolitano para evoluir. Em 1955/56 Raquel Soeiro de Brito constata Goa como triste e crua: “Onde se levantava a opulenta cidade, nada mais se vê que denso palmar. Um pouco mais de um século chegou para apagar o traço de seus esplêndidos palácios e inúmeras casas. A ausência de vida e o silêncio impressionante sucederam-se ao movimento de outrora.”

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Navegador Francês conhecido pelas narrativas que escrevia sobre as suas viagens ao Brasil, Maldivas e Índias Orientais Relatório a D.Maria I sobre o estado de Goa Estado de Goa depois da invasão pelos maratas em 1739

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(ibidem:106). Goa encontra-se morta, sendo dado ênfase especial à festa de S. Francisco Xavier, quando “a cidade deserta revive o bulício de outrora” (ibidem:116).

Fig.7 – Ruínas de Edifícios Goeses Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

A ideia perpassada pela autora de tristeza e morte de um lugar, é parte integrante de uma narrativa estratégica, onde os discursos estéticos que inserem as qualidades relacionais dos lugares, transformam a paisagem num símbolo de declínio que contagia o leitor e perpetua a noção de decadência que apenas pode ser suplantada com a influência portuguesa. A influência portuguesa encontra-se inscrita na modelação da paisagem indiana é um dos argumentos centrais da obra, uma paisagem onde figuram “imponentes igrejas, numerosas cruzes e cruzeiros e a abundância de casas caiadas” (ibidem:36-37) de inspiração arquitectónica portuguesa.

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Fig.8: Casas Goesas Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

De acordo com a autora, numa zona onde cristãos e muçulmanos convivem, a similaridade com as zonas ibéricas é comum, devido à proximidade entre culturas e a proximidade continental. A abundância de casas que “não mais saem dos olhos de quem as viu …” (ibidem:126), transporta a autora para outro universo visual que a maravilha, que a encanta e que, ao mesmo tempo, reforça o carácter de expansão e unidade cultural portuguesa. As “paredes decoradas com inúmeras fotografias e grandes espelhos, são rodeadas por cadeiras baixas, mesinhas, arcas, às vezes canapés de palhinha, recordando tantas salinhas de entrada do Alentejo e da Andaluzia (…)” e o “barulho desta sala, ruídos de trabalhos domésticos e conversas misturadas com o riso das mulheres e crianças” (ibidem:142-143) são elementos de caracterização que a autora valoriza devido às semelhanças que encontra com o Ocidente e em especial com a Península Ibérica.

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Fig.9: Casa Moura em Damão Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

Os paralelismos com elementos culturais portugueses são constantemente exaltados, encontrados nas “paredes … profusamente ornamentadas com grandes espelhos, fotografias, imagens religiosas e papeis de cores garridas com formas caprichosas, como tantas vezes se vê nas salinhas de entrada do Alentejo e dos Açores” (ibidem:159) estes fazem parte de uma ideologia nacionalista, presente na política de não descolonização portuguesa. E esta é mais uma maneira de dar visibilidade ao sujeito colonial através de uma forma de substituição e fixação ambígua operada pelo conhecimento oficial do colonialismo. Uma forma de dar visibilidade a instituições e dispositivos de poder como espectáculos de pré-eminência cultural. Mas semelhanças são rapidamente atenuadas por uma geografia de contrastes implícitas na paisagem, onde o estranho é motivo de atenção ao olho ocidental. Ao usar termos como “gritante”, “aberração” e “estranhas” para descrever a arquitectura de Deuca, a autora insere as ideias de exótico e beleza oriental na experiência da visão oriental. 73

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Fig.10: Casa em Diu Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

Este espaço de estranhamento estava implícito na ideia de mentalidade aberrante, imprecisão e atraso que caracterizava o Oriente, como demonstra a autora a aldeia “morria sob o piso do silêncio; e ao cair da noite, as silhuetas dessas casas estranhas e das palmeiras quietas em estampas e a própria deambulação do guarda – único ser humano da aldeia – tinham um ar trágico e irreal” (ibide:127). Ao representar este mundo fantasmagórico, o discurso da autora encontra-se intimamente ligado à noção de vazio e de paragem, insinuando a necessidade de penetração ocidental como solução para os problemas existentes. Assim, com o recurso a estereótipos e à simplificação representa-se uma paisagem imobilizada, fixa, e este jogo de significação de relações psíquicas e sociais é também uma relação de poder e hierarquia. Donde a necessidade de representar um sujeito de origem pura, um sujeito que para ser representado tem que ser construído. A decadência enfatizada pela autora, representa “o resto degradado de uma antiga grandeza” (Said, 2004:273) que, de acordo com Raquel Soeiro de Brito, foi passível de ser superada através da influência de intelectuais portugueses na segunda 74

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metade do séc.XIX. O apogeu intelectual e os saraus literários onde “se sentia mais intensamente um ambiente português, mesmo sem a maioria das pessoas terem vivido em Portugal Continental” (Brito, 1966:109) conduziu à denominação de Margão de “Atenas de Goa”. Para a autora esta é a demonstração da vontade goesa em aprender e da eficácia da colonização portuguesa através da assimilação. Este processo de assimilação por parte dos goeses, é afirmada várias vezes ao longo da obra. A autora encontra semelhanças com as terras portuguesas nos processos agrícolas; “no primeiro caso empregam-se seis a dez bois, ou búfalos, presos a uma estaca central em torno da qual giram, como se usa nos Açores (Ilha do Corvo) e nalgumas aldeias de Trás-os-Montes” (ibidem:68). Também relativamente a Damão, explica, o desenvolvimento das técnicas é muito semelhante às portuguesas, encontrando semelhanças entre “as culturas tradicionais… todas com bons rendimentos, devido principalmente à iniciativa de madeirenses… (ibidem:131). Também em relação às técnicas de irrigação, salienta, “a água era tirada dos poços por meio de noras de madeira movidas por animais, semelhantes às algarvias” (ibidem:131), provando que os hábitos portugueses estão impregnados na terra e na gente.

Fig.11 - Debulha de Arroz Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966 75

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No entanto, para Raquel Soeiro de Brito, o desejo do povo goês de aprender sempre mais, não parece suficiente para acabar com a inércia que os rodeia. Mas esta posição da autora onde a assimilação de cultura é exaltada não é, aos olhos de Orlando Ribeiro, verdade absoluta devido à limitação de influência portuguesa, imposta pela desconfiança dos indianos.

4.3.3 – DIFERENCIAÇÃO DE GÉNERO: A MULHER

E O ORIENTALISMO

A mulher hindu é, no decorrer de toda a obra, ponto central de observação e análise, figurando como corpo representado e descrito pelos olhos da autora. Tema tratado com bastante pormenor, o seu papel é enfatizado pela vivência com a sociedade hindu. O feminino hindu é retratado num contexto cultural distinto do Ocidental, apresentando desta forma diferentes modos de representação. Usando a narrativa histórica da construção da sociedade indiana como ligação para o examinar dos elementos humanos e a observação empírica do real, Raquel Soeiro de Brito depara-se com o novo, o estranho da sociedade hindu em relação à sociedade ocidental: o sistema de castas e a impossibilidade de o interpenetrar. A impossibilidade de interpenetração constrói, para a autora, uma sociedade que ignora o indivíduo em prol da sociedade, criando uma clara relação de hierarquia com base num conjunto de relações sociais que modelam crenças e interferem nas acções da sociedade. As práticas que se desenvolvem neste espaço integram na sua representação o poder, a ideologia e o conhecimento, formando um espaço de subjugação estreitamente associado às relações de poder e à ordem imposta nessa mesma sociedade. Num espaço masculinista, onde o corpo feminino se cinge às regras impostas pela sociedade e pela família, projectam-se identidades de lugar e articulam-se práticas culturais onde o corpo feminino, frágil e silencioso parece “mais sombras do que seres humanos” (Brito, 1966:41). Não obstante, a ênfase na mulher e as descrições detalhadas do mundo feminino, tanto na esfera privada como na esfera pública, denota uma tentativa de ilustrar o carácter semi-animalesco e brutal da organização social hindu. Mais do que uma preocupação com uma compreensão de género, aquilo que sobressai é a preocupação em fornecer uma base para a construção de um povo no 76

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território que é marcadamente inferior, mesmo e sobretudo ao nível da organização social e das relações humanas. Neste contexto, em que as descrições fluem, o papel civilizador do Ocidente enquanto macro-região onde se localiza uma raça superior, é absolutamente imprescindível, no caso concreto, o papel de Portugal como centro do império. A esfera doméstica, onde as mulheres fazem “toda a lida caseira, deslocando-se sem cessar, como sombras silenciosas e vigilantes...”(ibide:46), e os rituais culturais impostos pela sociedade que consideram a mulher invisível e suja remetem-nos para “o espaço que não é visível no enquadramento mas que se pode inferir por aquilo que se torna visível pelo enquadramento” (Lauretis, 1988:26) formando-se deste modo uma diferença de género que determina a hierarquia de poder. Passam grande parte da sua vida em trabalhos constantes e em reclusão, sendo como fantasmas na sociedade indiana, que devem seguir apenas a vontade do homem. De acordo com a autora, o papel da mulher é secundário e ”na vida do dia-a-dia o homem é que põe e dispõe” (Brito, 1966:46), girando toda a vida da mulher indiana em volta do regime patriarcal e masculinista que estabelece a atribuição de papéis na sociedade. Veja-se como exemplo o caso das mulheres indianas viúvas que aquando da morte do marido deveria atirar-se com ele para a pira funerária. Apesar deste ritual ter sido quebrado com a chegada dos portugueses à Índia, a autora continua a ver a condição da mulher com pesar e indignação: “mesmo assim a condição da mulher é muito degradante: não poderá casar e deverá, em sinal de luto, rapar a cabeça completamente, quebrar as manilhas e usar só saris velhos e sem cor” (ibide:50). A Geografia tem dado atenção ao modo patriarcal de produção e reprodução das relações sociais, onde a estigmatização social da mulher estabelece uma variedade de estratégias sociais com a finalidade de controlar o poder feminino. Em todos os espaços que a autora descreve, a presença da mulher é constante, dando a entender que os aspectos que circundam a vida feminina lhe chamam a atenção, principalmente os aspectos laborais. A paisagem goesa, enquanto espaço de diferenciação, inscreve-se como superfície de representação do Outro feminino. Na vida agrícola “a adubação é feita quase só por mulheres” (ibide:67), e “pelo meio-dia, as mulheres levam aos campo o almoço … se há participação de trabalho feminino, as mulheres ficam ajudando até ao cair da noite e ao chegarem a casa ainda 77

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têm que fazer o jantar …; caso contrário, depois do almoço regressam para o trabalho doméstico que nunca falta” (ibidem:68). Quando no arrozal “se faz a monda …, são sempre as mulheres que procedem a este trabalho” (ibidem:68), sendo também as mulheres que “dispõem o estrume, fazem as mondas, ceifam e apanham em pequenos feixes as plantas cortadas” (ibidem:68). Ao demorar-se em descrições deste tipo, Raquel Soeiro de Brito constrói uma imagem da mulher “indígena” que em quanto seria assim tão diferente da mulher portuguesa trabalhadora?

Fig.12: Mulher Hindu na actividade agrícola Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

A autora vai elaborando assim o seu ponto de vista sobre a subjugação da mulher também no que respeita à faina. Na pesca o papel da mulher e das filhas é fundamental, quer seja na apanha como na venda do peixe. Na pesca de água doce, a apanha e venda na praia de moluscos é realizado apenas por mulheres e crianças “curvadas, ágeis e silenciosas” (ibidem:87) como invisíveis aos olhos. A insistência nestes adjectivos, prende-se na incapacidade da própria autora de aceder ao mundo feminino retratado, pela condição de estrangeira e pela formação social.

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Algumas mulheres, tinham mais sorte que outras vendendo o peixe “no mercado da cidade, sem nunca saírem para as aldeias, ao contrário do que acontece com as mulheres de pescadores que trabalham longe de um centro importante.” (ibidem:110). Na pesca de alto mar, a mulher desempenha um papel central onde “além da venda de peixe pelas aldeias e no mercado da cidade, ajudam os homens a fazer e a consertar redes” (ibidem:164-165). Apesar de todo o trabalho que fazem e do quão duro pode ser, a mulher é sempre inferior ao homem, recebendo um salário muito baixa, mas continuando resignada à sua condição. E o que dizer então das potenciais similaridades com o centro do império? Porque não se aborda este aspecto?

Fig.13: Mulheres Indianas na actividade piscatória Fonte: “Goa e as Praças do Norte” - 1966

A mulher enquanto corpo e presença evoca a atenção da autora. As mulheres “com agilidade, elegância e garradice” (ibidem:170) aquando da sua ida ao poço, fixam os olhos de Raquel Soeiro de Brito. É notável o modo como a autora efectua no texto o jogo da fantasia e desejo ocidental sendo ela própria mulher. A relação com o novo, o

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estranho, sonda-se numa mimetização do discurso masculinista orientado para a descrição do elemento feminino. É uma noção diferente das mulheres no poço a que a autora está acostumada, como a própria relata: “o caminho faz-se em silêncio, umas atrás das outras, raramente a par …” (ibidem:170). Seria desejo da autora mostrar que esta visão não era comum principalmente para quem vivia em Portugal onde o trabalho de ir buscar água ou lavar a roupa no tanque continha sempre muito barulho, muitas conversas e muitas cantigas? E continua “entre elas aos olhos inacostumados do Ocidental, parece estabelecer-se uma surda competição: cada uma pretende ser mais airosa, mais etérea, do que a que a antecede” (ibidem:170). Said reconhece características dicotómicas entre o ocidente e o oriente, referindo-se ao oriente como feminino, dócil e exótico aos olhos do ocidente dominador. Ser feminino era ser inferior mas também ser portador de uma profunda fragilidade. Esta representação estereotipada do Oriente é presenciada e descrita pela autora em Gogolá, onde exprime de um modo mais intenso o seu sentido de estranheza, o seu olhar orientalista, neste caso sobre o outro feminino pois não se revê naquela imagem.

Fig.14: O “Outro” Feminino Fonte: “Goa e as Praças do Norte - 1966 80

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O desejo e fantasia, que animam as geografias imaginárias e cedem ao lugar uma poética particular, denotam-se nas palavras da autora quando esta descreve as mulheres: “todos aqueles corpos pequenos e franzinos, graciosamente envoltos em longos saris de cor lisa e suave ou, em contraste com estes, totalmente cheios de desenhos policoloridos, lembram, sem querer, afinado corpo de baile num palco gigantesco” (Brito, 1966:170), correspondendo este carácter feminino do oriente a um lugar de satisfação visual do colonizador ocidental.

Fig.15: Objecto de desejo ocidental Fonte: “Goa e as Praças do Norte - 1966

Em todos os aspectos de caracterização da mulher, as comparações entre a mulher indiana e a mulher que a autora reconhece do mundo ocidental são inquestionáveis, dando-nos a representação do corpo uma perspectiva da sociedade em

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que vivem, funcionando como processo de naturalização da diferença. A mulher indiana não tem voz para contestar o que lhe é imposto como correcto e certo pela sociedade e limita-se a obedecer, havendo uma negação da mulher como sujeito. Não tem a liberdade que a autora encontra em si mesma, nem o poder de pensar e agir por si própria. Existe um conjunto de diferenciações que mostram pesar, dor, indignação pela mulher indiana que é vigilante e vigiada, é um fantasma, o outro feminino e subjugado presa num enredo de representação imperial do Eu e do Outro onde as posições sociais do sujeito são construídas por meio de discursos de corpo e lugar, desejo e sexualidade.

4.3.4 – LUSOTROPICALISMO E O MITO DO IMPÉRIO PORTUGUÊS Ao longo da análise de “Goa e as Praças do Norte” é notório o comprometimento de Raquel Soeiro de Brito com a teoria lusotropicalista de Gilberto Freyre. Efectivamente nas suas descrições geográficas, a autora enfatiza de forma bastante recorrente as afinidades no espaço tropical com a cultura portuguesa. E se isto acontece relativamente às descrições do ambiente físico tal dimensão ideológica é ainda mais sentida no que respeita às descrições culturais deste território. De acordo com a teoria lusotropicalista, a originalidade da colonização portuguesa assenta no modo como os portugueses lidaram com os problemas existentes: zonas despovoadas, dificuldades climáticas e o mais importante o contacto com gentes e culturas desconhecidas, “os outros selvagens” aos olhos da Europa ocidental. Para Raquel Soeiro de Brito, de modo a poder assegurar a continuidade do povo português nas colónias “ (…) só dois caminhos haviam a seguir: o da assimilação, cuja base assentava num ardente proselitismo religioso, e o da mestiçagem.” (Brito, 1966:174), opção que Gilberto Freyre defende e assume na sua teoria lusotropicalista para assegurar a continuidade do povo português. Como povo unificador, o português procurava o bom de cada lugar e levava à sua difusão pelas colónias, assimilando ele próprio outras culturas e saberes. É um dos primeiros factores de inovação na expansão portuguesa: a aceitação de novos mundos, de coisas novas e exóticas. Deste modo, a não imposição dos mesmos métodos em todas as colónias, a adaptação dos elementos consoante o lugar, o tropicalismo e a miscigenação racial e cultural são os factores «que mais importa realçar na expansão 82

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portuguesa» por “«contribuir para organizar o mundo sob a égide da civilização moderna «(59, 86)” (ibidem:175). Com a conquista de Goa em 1510 pelos portugueses, a expansão na Índia é feita de modo bastante diferente das restantes colónias portuguesas e “a colonização revestiuse assim de um aspecto impar” (ibidem::7), onde impera a tolerância religiosa para com os Hindus, de modo a que a cidade prosperasse. Este aspecto impar da colonização portuguesa é algo que Gilberto Freyre sempre defendeu na teoria lusotropicalista: “Uma vez que as expressões 'integração', 'assimilação', 'submissão' foram assim qualificados, o que vemos no sistema Português de relações com grupos não-europeus e as culturas não-europeias, apesar de raros casos de sujeição

bruta dos não-europeus pelo Português...a tendência mais

característica do sistema tem sido no sentido de integração59.” Na Índia, e mais especificamente em Goa, as características da expansão portuguesa “comercio marítimo e expansão do cristianismo; criação ou aproveitamento de uma cultura de subsistência, a par com culturas de especulação; escassez numérica de ocupantes, «convidando» à mestiçagem, assimilação e escravatura” (ibidem:176) foram usados no seu expoente máximo, criando “ a maior e mais brilhante de todas as cidades tropicais fundadas pelos portugueses” (ibidem:176). Apesar de algumas discordâncias a que faremos alusão seguidamente, também Orlando Ribeiro sublinha que o contacto profundo com os portugueses e posteriormente com todo o ocidente, “imprimem à fisionomia geográfica de Goa um matiz especial, tanto mais estranho quanto nada, na ocupação agrária do solo, a distingue dos outros lugares dos Concão.” (Ribeiro,1960, p.179). No mesmo período, Pierre Gourou classifica Goa de “duplo tesouro de civilizações” onde a originalidade se encontra na forma como foi possível manter as instituições locais, o assimilar profundo de elementos cristianizados pelas altas classes goesas e a pratica quase nula de mestiçagem. Neste sentido, o lusotropicalismo sucedeu através de “ «uma transfusão de usos, sentimentos, de modos de ser e de viver» (59,181)” (Brito, 1966:176) assimilados pelo goês que “em muitos traços da sua formação portuguesa recebeu (…) o espírito da aventura, a coragem de deixar a aldeia 59

Freyre, The Portuguese and the Tropics, p.276.

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para garantir a prosperidade de sua casa e a ambição de acabar nela os dias em que a miséria o ronde” (ibidem:33). É desde logo notório como a autora tenta pôr diversas teorias ao serviço da sua própria visão, ainda que comprometendo a própria coerência do diálogo inter-textual. Na perspectiva da autora, as práticas culturais portuguesas são adquiridas culturalmente e mais sentidas nas castas superiores, nas esferas públicas ou privadas em que a autora se inseria existia um claro beber da cultura portuguesa, dando-lhe a sensação de estar num território ou ambiente tipicamente português: “Quantas e quantas vezes, ao entrar numa casa de brâmanes cristãos ou chardós se tem a sensação nítida de estar numa casa dos Açores, de Cabo Verde, de São Tomé ou do Brasil, para não falar já das cidadezinhas da província portuguesa” (ibidem:35). E esta sensação prolonga-se “… vai desde o estilo da casa ao seu mobiliário, aos livros que se encontram nas estantes (…) ao trajar, à maneira de comer, ao jeito delicado e silencioso de as senhoras abandonarem a sala de jantar após a refeição (…) (ibidem:35). Trata-se também de afirmar a formação social dos processos de assimilação analisados. De igual modo, Freyre faz a mesma comparação aquando da sua viagem à Índia: “Continuo impressionado com as semelhanças da Índia Portuguesa com o Brasil. Ou do Brasil com a Índia Portuguesa, desde que, daqui, assimilou o português muito valor oriental, hoje dissolvido no complexo brasileiro de cultura: uma cultura luso-tropical tanto quanto a da Índia”. [Freyre, 1980:258259.] Orlando Ribeiro discorda desta posição, tendo relatado que Goa “apareceu aos meus olhos como a terra menos portuguesa de todas as que vira até então” (Ribeiro, 1999:64) devendo-se em especial ao “desconhecimento geral da nossa língua, a persistência de uma sociedade estranha e indiferente, quando não hostil, à nossa presença, a limitação da nossa influência…” (ibide:65). Ou seja, Orlando Ribeiro discorda das posições de Raquel Soeiro de Brito e Freyre, relativamente a esta questão. Factor chave na demonstração de uma teoria lusotropicalista válida na Índia Portuguesa, consiste no surgimento de uma nova casta denominada por mestiços, como a autora demonstra “Se uns conservam o tipo branco puro, outros revelam, no bronzeado da pele e nos cabelos negros e corredios, inegáveis traços de mistura de sangue” (Brito, 1966:36). Este fenómeno de miscigenação representa para Freyre “ao 84

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mesmo tempo que um elemento de integração, um elemento de diferenciação e por consequência de criação, de iniciativa e de originalidade60” (Freyre, 1940:51). Não obstante, Orlando Ribeiro, no seu relatório ao governo sobre Goa em 1956, relata que apenas “através das bailadeiras, que possuem a profissão de mulheres públicas e a indignidade social que anda geralmente ligada a ela, e através das viúvas, constrangidas à perpetuidade do seu estado pela religião hindu” (Ribeiro, 1960:12) os portugueses encontraram “maneira de se mestiçarem e de se introduzirem portanto, por esta brecha, na sociedade que os repudia” (Idem:12) onde a entrada a estranhos não era natural nem permitido. Também nas descrições de Damão, os paralelismos com Portugal através da maneira de ser das pessoas e o modo como as casas estão ordenadas são imensos. A percentagem de cristãos é mais pequena que em Goa devido à diferença na cristianização, de acordo com a autora lenta e voluntária. Já nas descrições de Diu, as marcas portuguesas na população são poucas, porque segundo Raquel Soeiro de Brito a sua influência foi fraca, quase nula, mas na paisagem respirasse “ o ar familiar” (Brito, 1966:75) de um português no sul. Não devido à influência portuguesa em Diu mas devido à influência muçulmana em Portugal e Diu, sendo a assimilação portuguesa inexistente, argumenta. Assim, ao longo de toda a obra analisada Raquel Soeiro de Brito mostra que força da civilização que no Oriente se deparou com os portugueses … (funciona como) um sério obstáculo para a aplicação dos processos de abrir outras terras ao convívio da Europa e de nelas implantar uma paisagem humana fortemente influenciada pelos novos valores por eles introduzidos.” (ibide:183) Aquilo que a autora pretende reforçar através das suas descrições geográficas é que apesar de terem encontrado uma civilização que foi forte obstáculo aos progressos europeus e a novos valores, Raquel Soeiro de Brito considera que, no geral, a marca portuguesa é forte, e a assimilação e lusotropicalismo criaram “um alto grau de fusão cultural” (ibide:183) sendo sempre possível encontrar paralelismos com Portugal e revelando “«a maneira inteiramente diferente da colonização dos povos latinos em comparação com a dos estados nórdicos»” (Krebs, Norbert in Brito, 1961:5). 60

Gilberto Freyre – “O Mundo que o Português criou”, 1940, p.51

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Deste modo vai-se tornando cada vez mais explícito, ao longo da análise da obra, a implicação da autora com um projecto colonial mais vasto dentro do qual “a cultura eurocêntrica codificava e observava inexoravelmente tudo acerca do nãoeuropeu ou do mundo presumivelmente periférico de um modo particularmente detalhado e exaustivo, por forma a não deixar nenhum item por descrever, nenhuma cultura por estudar” (Said, 1989:6 - cit. in Thomas). Trata-se pois de construir um processo representacional em que se articulam centro e periferias num discurso que vai buscar “coerência” ao conceito de mundo lusotropical que contribuía para a perpetuação de um poder imperial de diferentes modos imaginativos e práticos.

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V Capítulo: Notas Conclusivas

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A produção do conhecimento colonial português, encontra-se neste momento em estudo e revisão na academia portuguesa, debatendo-se questões como espaço, género e discursos. Os estudos existentes sobre esta temática, desenvolvem-se numa perspectiva pós-colonial que num contexto académico pretende entender a problemática das representações espaciais do discurso colonial. Isto conduziu a uma interacção entre Geografia e Pós-Colonialismo e à criação e desenvolvimento das Geografia PósColoniais. Existindo um enorme empenho por parte dos geógrafos no assumir de um compromisso com as teorias e práticas pós-coloniais, a constituição de uma geografia pós-colonial não é passível de descrição. O tratamento de conceitos e práticas geográficas em contexto pós-colonial, orienta-se para o acto generativo de inúmeras geografias que, mesmo quando desenvolvidas em contextos oficiais e académicos não poderão restringir-se à ideia de uma geografia geral, única e universal. É necessário que esta meta-geografia seja questionada, mostrando novas identidades culturais e criando novos espaços geográficos. Centrando a nossa análise crítica na geografia colonial portuguesa, verificamos que a ascensão da mesma teve como base de sustentação a teoria Freyriana do lusotropicalismo. Numa época de redefinições territoriais, a teoria lusotropicalista centrada na originalidade e diferença da expansão portuguesa, constitui a componente necessária para justificar a grandeza do império português e o colonialismo praticado, visto como não civilizado pelos restantes países europeus. Neste contexto, a criação da Junta de Missões Geográficas e de Investigações Coloniais e de grupos de estudos na Universidade de Lisboa, foram fulcrais para o conhecimento colonial. Actualmente são as obras que saíram destas missões que são alvo de estudo, por diversas áreas das Ciências Sociais. No caso da Geografia, a análise crítica das obras coloniais é cada vez mais necessária para a desconstrução das representações de lugar e para a desmistificação do pensamento ocidental existente sobre o outro. 88

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Na obra de Raquel Soeiro de Brito – “Goa e as Praças Do Norte”, a narrativa científica demonstra claramente a representação de lugar, sendo a paisagem e a sua descrição factores importantes para a autora. Conduzindo-nos ao espaço português desconhecido para muitos, as relações entre colonialismo e geografia são expostas através da relação cultural que, no caso da Índia Portuguesa, deixou marcas enraizadas. De facto, esta ideia que a autora passa ao longo da sua obra, é parte integrante de uma política imperial que necessitava de mostrar ao mundo a sua importância como povo civilizador. A assimilação e mestiçagem são conceitos e actos que a autora pretende provar, mas que podemos comprovar que não perpassaram como a autora demonstra. Factores como uma sociedade fechada, hierarquizada por castas e indiferente à influência portuguesa, deitam por terra a teoria lusotropical aplicada na Índia. O desejo de dominar o outro, prática ocidental vigente à época, é claramente representado na obra. A dominação pela cultura é descrito pela autora, comprovando-se um olhar orientalista da autora. A teoria orientalista é muito presente na obra, encontrando-se no discurso da autora a visão ocidental e masculinista sobre o outro oriental, referindo-se não ao ‘Outro’ masculino e subjugado mas tendo em especial atenção o ‘Outro Feminino” subjugado e exótico, fonte de desejo e fantasia. Vigentes na época em que a missão geográfica à Índia foi realizada, estes actos e teorias encontram-se muito presentes em obras produzidas no período colonial, sendo agora alvo de escrutínio na academia portuguesa, de modo a desmontar e compreender as políticas do poder imperial num período pós-colonial.

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Mestrado em Geografia – Planeamento e Gestão do Território

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



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WYLIE, John (2007) – Landscape - Oxon, Routledge

2- LEGISLAÇÃO •

Decreto-Lei nº16:878 de 24 de Maio de 1929 – Diário do Governo nº 116, 1ª Série



Portaria nº 7:379 de 13 de Julho de 1932 – Diário do Governo nº 162 , 1ª Série



Decreto–Lei nº 26:180 de 7 de Janeiro de 1936 – Diário do Governo nº 5, 1ª Série



Decreto-Lei nº 27:494 de 26 de Janeiro de 1937 – Diário do Governo nº 21 – 1ª Série



Decreto-Lei nº 26:842 de 28 de Julho de 1936 – Diário do Governo nº 175, 1ª Série



Decreto-Lei nº 26:888 de 14 de Agosto de 1936 – Diário do Governo nº 190, 1ª Série



Decreto-Lei nº 30:319 de 18 de Março de 1940 – Diário do Governo nº 64, 1ª Série



Decreto-Lei nº 31:194 de 27 de Março de 1941 – Diário do Governo nº 71, 1ª Série



Decreto-Lei nº 32:021 de 18 de Maio de 1942 – Diário do Governo nº 114, 1ª Série



Decreto-Lei nº 33:609 de 14 de Abril de 1944 – Diário do Governo nº 78, 1ª Série Mestrado em Geografia – Planeamento e Gestão do Território

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Decreto-Lei nº 33:613 de 17 de Abril de 1944 – Diário do Governo nº 80, 1ª Série



Decreto-Lei nº 34:478 de 3 de Abril de 1945 – Diário do Governo nº 70, 1ª Série



Decreto-Lei nº 35:395 de 26 de Dezembro de 1945 – Diário do Governo nº 287, 1ª Série



Portaria nº 11:462 de 16 de Agosto de 1946 – Diário do Governo nº 184, 1ª Série



Despacho de 13 de Outubro de 1955 – Diário do Governo nº 245, 2ª Série



Portaria nº 15 568 de 21 de Outubro de 1955 – Diário do Governo nº 229 , 1ª Série



Decreto-Lei nº 583/73 de 6 de Novembro de 1973 – Diário da República nº 259, 1ª Série

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Anexos

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I.

LEGISLAÇÃO • ANEXO 1: Criação da Missão Hidrográfica de Moçambique Decreto-Lei nº 16:878 de 24 de Maio de 1929

Fonte: Diário do Governo nº 116, 1ª Série • ANEXO 2: Criação da Missão Geográfica de Moçambique Portaria nº 7:379 de 13 de Julho de 1932

Fonte: Diário do Governo nº 162, 1ª Série

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• ANEXO 3:Reorganização do Ministério das Colónias e Criação da Junta das Missões Geográficas e Investigações Coloniais Decreto–Lei nº 26:180 de 7 de Janeiro de 1936

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Fonte: Diário do Governo nº 5, 1ª Série

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• ANEXO 4: Missão Botânica a Angola Decreto-Lei nº 27:494 de 26 de Janeiro de 1937

Fonte: Diário do Governo nº 21 – 1ª Série • ANEXO 5: Missão Etnográfica e Antropológica de Moçambique Decreto 26 842 de 28 Julho de 1936

Fonte: Diário do Governo nº 175, 1ª Série

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• ANEXO 6: Missão Hidrográfica de Angola Decreto-Lei nº 26:888 de 14 de Agosto de 1936

Fonte: Diário do Governo nº 190, 1ª Série • ANEXO 7: Missão Geográfica de Timor

Fonte: AGÊNCIA GERAL DAS COLÓNIAS (1945) – Ocupação científica do Ultramar – Plano elaborado pela Junta de Missões Geográficas e Investigações Coloniais e Parecer do Conselho do Conselho do Império Colonial - Lisboa: Agência Geral das Colónias

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• ANEXO 8: Comissão de Estudos Geológicos de Timor Decreto-Lei nº 30:319 de 18 de Março de 1940

Fonte: Diário do Governo nº 64, 1ª Série • ANEXO 9: Missão Geográfico de Angola Decreto-Lei nº 31:194 de 27 de Março de 1941

Fonte: Diário do Governo nº 71, 1ª Série

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• ANEXO 10: Missão Botânica de Moçambique Decreto-Lei nº 32:021 de 18 de Maio de 1942

Fonte: Diário do Governo nº 114, 1ª Série



ANEXO 11: Missão Zoológica da Guiné Decreto-Lei nº 33:613 de 17 de Abril de 1944

Fonte: Diário do Governo nº 80, 1ª Série

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• ANEXO 12: Missão Antropológica de Moçambique Decreto-Lei nº 34:478 de 3 de Abril de 1945

Fonte: Diário do Governo nº 70, 1ª Série

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• ANEXO 13:Reorganização da Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais Decreto-Lei nº 35:395 de 26 de Dezembro de 1945, nº 287- 1ª Série

Fonte: NEVES, Manuel M. (1958) – Colectânea de Legislação - Junta de Investigações do Ultramar 1945-1958 - Lisboa

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• ANEXO 14: Criação do Centro de Estudos de Cartografia e Geografia Colonial Portaria nº 11:462 de 16 de Agosto de 1946

Fonte: Diário do Governo nº 184, 1ª Série

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• ANEXO 15:Modificações inseridas no Centro de Estudos de Cartografia e Geografia Colonial Portaria nº 15 568 de 21 de Outubro de 1955

Fonte: Diário do Governo nº 229, 1ª Série

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• ANEXO 16:Reforma da Junta de Investigações do Ultramar para a cooperação internacional e interdisciplinaridade da investigação Decreto-Lei nº 583/73 de 6 de Novembro de 1973

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Fonte: Diário da República nº 259, 1ª Série

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ANEXO 17 Discursos de Salazar sobre a temática «Portugal e a campanha anticolonialista», onde Oliveira Salazar expõe o seu entendimento sobre o luso-tropicalismo: «Quando a Nação portuguesa se foi estruturando e estendendo pelos outros continentes, em geral por espaços livres ou desaproveitados, levou consigo e pretendeu imprimir aos povos com quem entrara em contacto conceitos muito diversos dos que mais tarde caracterizaram outras formas de colonização. Às populações que não tinham alcançado a noção de pátria, ofereceu-lhes uma; aos que se dispersavam e desentendiam em seus dialectos, punha-lhes ao alcance uma forma superior de expressão - a língua; aos que se degladiavam em mortíferas lutas, assegurava a paz, os estádios inferiores da pobreza iriam sendo progressivamente vencidos pela própria ordem e pela organização da economia, sem desarticular a sua forma peculiar de vida. A ideia de superioridade racial não é nossa; a da fraternidade humana, sim, bem como a da igualdade perante a lei, partindo da igualdade de méritos, como é próprio de sociedades progressivas. Em todos esses territórios a mistura das populações auxiliaria o processo de formação de uma sociedade pluri-racial mas o mais importante, o verdadeiramente essencial estava no espírito de convivência familiar com os elementos locais; nas possibilidades reconhecidas de acesso à vida económica e social; nos princípios de uma cultura mais avançada e de uma moral superior que mesmo quando violada, era a regra do comportamento público e privado. Se através destes meios, de acção forçosamente lenta, conseguia formar-se uma comunidade com certo grau de coesão, pode dizer-se que a tarefa estava vingada; a independência e a igualdade dos povos integrados com seus territórios numa unidade nacional». (Salazar, 30 de Novembro de 1960).

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ANEXO 18 Missões de investigação realizadas entre 1929-1945 pela Antiga Comissão de Cartografia e pela Junta de Investigações Coloniais: 1º. Missão Hidrográfica de Moçambique – Decreto 16 878 de 24 de Maio de 1929 2º. Missão Geográfica de Moçambique – Portaria 7 379 de 13 de Julho de 1932 3º. Missão Etnográfica e Antropológica de Moçambique – Decreto 26 842 de 28 Julho de 1936 4º. Missão Hidrográfica de Angola – Decreto 26 888 de 14 de Agosto de 1936 5º. Missão Botânica a Angola – Decreto 27 494 de 26 de Janeiro de 1937 6º. Missão Geográfica de Timor (Geologia, Geodesia e Cartografia) – Decreto 28 087 de 16 de Outubro de 1937 7º. Comissão de Estudos Geológicos de Timor – Decreto 30 319 de 18 Maio de 1940 8º. Missão Geográfico de Angola – Decreto 31 194 de 27 Março de 1941 9º. Missão Botânica de Moçambique – Decreto 32 021 de 18 de Março de 1942 10º. Missão Geo-Hidrográfica da Guiné – Decreto 33 609 de 14 de Abril de 1944 11º. Missão Zoológica da Guiné – Decreto 33 613 de 17 de Abril de 1944 12º. Missão Antropológica de Moçambique – Decreto 34 478 de 3 de Abril de 1945 Mestrado em Geografia – Planeamento e Gestão do Território

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa • ANEXO 19: Objectivos e competências da Junta das Missões Geográficas e de

Investigações Coloniais: 1º. “Estudar os problemas relativos aos serviços geográficos nas colónias e bem assim os de astronomia, geodesia, hidrografia e meteorologia coloniais; 2º. Estudar as questões de ordem diplomática ou de natureza respeitantes aos limites territoriais e às fronteiras das colónias e outros assuntos de carácter internacional que caibam no âmbito da geografia política; 3º. Fazer a leitura, exame e apreciação de todas as publicações coloniais e geográficas, nacionais ou estrangeiras, e de outros elementos de consulta que venham ao seu conhecimento, como mapas, descrições e notícias geográficas ou de outras que possam relacionar-se com os interesses portugueses ou contribuir para o reconhecimento científico das colónias; 4º. Orientar e promover trabalhos de investigação científica colonial, elaborando o respectivo programa para as diferentes colónias e recorrendo, quando necessário, às bases científicas já organizadas na metrópole ou promovendo

a organização destas, se isso for

indispensável; 5º. Organizar, segundo o programa estabelecido, missões científicas às colónias, indicando quem as deve compor e promovendo que sejam dotadas com o material necessário; 6º. Recolher e conservar o material científico coligido pelas missões ou promover que lhe seja dado o destino que for mais conveniente; 7º. Orientar, promover e subsidiar na metrópole, depois do regresso das missões científicas, os indispensáveis trabalhos de gabinete e as publicações respectivas.”1

1

Decreto nº 26 180, artº 177 de 7 de Janeiro de 1936

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ANEXO 20

Raquel Soeiro de Brito: Vida e Obra Geográfica •

1925 – Nasce Maria Raquel Viegas Soeiro de Brito



1955 - Doutor em Geografia pela Universidade de Lisboa (1ª mulher Doutorada em Portugal)



1960/66 - Professora Associada no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Tecnológica de Lisboa



1966/67 - Professora Catedrática no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Tecnológica de Lisboa



1974/76 – Professora Catedrática e Presidente da Comissão Directiva do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Tecnológica de Lisboa



1976/96 - Professora Catedrática e Vogal na Comissão Instaladora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa



1977/80 – Fundadora e Coordenadora do Departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa



1980/81- Professora convidada da Universidade de Limoges e de Paris (Nanterre)



1980/96 – Fundadora e Coordenadora do Departamento de Geografia e Planeamento Regional da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa



1993- Criou o Centro de Estudos de Geografia e Planeamento Regional e o Instituto de Dinâmica do Espaço da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas de Universidade Nova de Lisboa



1993/96 – Responsável pela criação do Mestrado em Geografia e Planeamento Regional: Gestão do Território da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas de Universidade Nova de Lisboa

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Actualmente - Vice-Presidente da Academia da Marinha



Desempenhou a função de Vice-Directora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas de Universidade Nova de Lisboa, em diversos períodos.



Professora Conferencista em várias universidades estrangeiras

Actividades Científicas • Docência • Missões de Estudo nos Ex-territórios Ultramarinos • Participação activa em reuniões científicas nacionais e internacionais • Participação e direcção de vários Programas Comunitários de Investigação • Publicação de Trabalhos Científicos em revistas nacionais e estrangeiras • Publicação de vários livros sobre a Temática de Geografia Humana e Regional • Direcção de várias teses de mestrado e doutoramento em Universidades Portuguesas, Francesas e Espanholas

Direcção de Dissertações •

1993

- “A Modernização da Agricultura em Portugal: um novo desafio para os agricultores de Coruche”, Tese de Doutoramento de Ana Maria Viegas Firmino



2007

- “Gestores do Território: Estudo de Inserção do Geógrafo nas Actividades de Planeamento e Gestão do Espaço”, Tese de Mestrado de José Manuel Rodrigues Lúcio

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Conferências •

16 de Setembro de 1992: IV Colóquio de Geografia- “A Península Ibérica, um espaço em transformação”, onde presidiu à abertura do tema “Ruralidades”



24 a 26 de Outubro de 2001: VII Simpósio de História Marítima – “Fernão de Magalhães e a sua viagem ao Pacífico- Antecedentes e Consequentes” na Academia da Marinha, onde participou como vogal



19 a 23 de Novembro de 2001: Curso breve de Geografia de Portugal, intutulada “Portugal de ontem, de hoje e de amanhã” na Biblioteca Municipal de Faro António Ramos Rosa



28 de Julho de 2004: Marcou presença na Casa de Goa para uma “Conversa de Balcão”



21 de Setembro de 2004: Sessão Cultural na Academia da Marinha subordinada ao tema “A participação da Armada Portuguesa nas diversas relações com o Norte de África (séculos XVIII e XIX)”, tendo presidido à Mesa



8 a 12 de Novembro de 2004: Curso breve de “Geografia de Portugal” na Biblioteca Municipal da Batalha



3 de Outubro de 2006: Presidiu à Mesa da Comunicação “A Batalha Naval do Estreito de Malaca de 1606 e as operações subsequentes – um rosário de interrogações”, na Academia da Marinha



17 de Outubro de 2006: 9º Exposição de Artes Plásticas - “O Mar e Motivos Marítimos” na Academia da Marinha, onde presidiu à cerimónia de abertura



26 Outubro de 2006: Coordenação da conferência “Zona costeira portuguesadesafios de ordenamento e gestão” na Academia da Marinha



6 de Março de 2007: Presidiu a Sessão “A entrega da praça de Tânger e suas consequências”, na Accademia da Marinha



17 a 20 de Outubro de 2007: III Semana Cultural – “O Homem e o Mar” na Casa dos Açores do Quebeque

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



29 de Outubro de 2007: Palestra sobre a Erupção do Vulcão dos Capelinhos, na Casa dos Açores do Estado do Rio Grande do Sul



14 a 16 de Dezembro de 2007: Colóquio “Sociedade, Cultura e Risco: Da Memória dos Capelinhos à Crise Sísmica de 1998” na Ilha do Faial, onde proferiu a Conferência de Abertura



28 a 30 de Março de 2008: VI Jornadas Culturais da Gândara – “Homenagem aos Homens do Mar e da Praia de Mira”, Presidente de Mesa das Jornadas



10 de Julho de 2008: 10º Exposição de Artes Plásticas- “O Mar e Motivos Marítimos” na Academia da Marinha



23 a 25 de Outubro de 2008: III Encontro Cultural Açoriano – “Angra do Heroísmo: Património Mundial- ontem, hoje e sempre” na Casa dos Açores do Rio de Janeiro. Proferiu a Sessão Evocativa do Cinquentário da Erupção do Vulcão dos Capelinhos



28 de Outubro de 2008: Palestra subordinada ao tema “Vulcão dos Capelinhos : Açores/Portugal: 50 anos” ; Auditório da Reitoria da Universidade Federal de Santa Catarina

Distinções •

1964 – Comendadora da Ordem do Marechal Pessoa (Brasil)



1966- Prémio Internacional Gago Coutinho (Sociedade de Geografia de Lisboa)



1974 – Officier des Palmes Académiques (França)



1982 - Membro de Honra da Sociedade de Geografia de Paris



1987 – Membro Efectivo da Academia da Marinha



1998 - Grande Oficial da Ordem de Sant’Iago da Espada



2006 – Condecorada com a Cruz Naval de 1ª Classe

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ANEXO 21

Publicações de Raquel Soeiro de Brito



1948 − “O Soajo: notas geográficas acerca de uma aldeia do Minho Alto”, Lisboa



1950 − “Les vallées de fracture dans le modelé granitique portugais” (em colaboração com Mariano Feio), Lisbonne



1951 − “Migration pastorales et agricoles dans les montagnes du Minho” in XVI Congrès International de Géographie, p.80-82, Lisbonne − “Um pequeno porto de pesca no Algarve: Albufeira” in XVI Congrès International de Géographie, p.232-244, Lisbonne



1953 − “Uma aldeia da montanha do Minho – o Soajo: estudo de Geografia Humana”, Revista da Faculdade de Letras, 18; 1-3, Lisboa: p.88-132



1955 − “A Ilha de São Miguel: estudo geográfico” in Centro de Estudos Geográficos, Lisboa − “A Ilha de São Tomé: estudo geográfico”, Lisboa



1956 − “Notas para o estudo dos modos de vida em Goa” in Garcia de Orta – número especial: p.183-202

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



1957 − “Notícias do inquérito das aldeias de Goa” in Garcia de Orta vol.5, nº4: p.659-669 − “Notice d’une enquête sur les villages du territoire de Goa” in Actas do 3º Congresso PIOSA, Tananarive



1958 − “A pesca em Palheiros de Mira: resumo”, Coimbra − “Primeira notícia da erupção dos Capelinhos, na Ilha do Faial” (em colaboração com Orlando Ribeiro), Lisboa: Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais



1959 − “Pescadores da Ponta do Caju. Aspectos da contribuição dos portugueses e espanhóis para o desenvolvimento da pesca na Guanabara” (em colaboração com Lísia Maria Cavalcanti Bernandes), in III Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros, Lisboa, I p.5-27



1960 − “Agricultores e pescadores portugueses na cidade do Rio de Janeiro (estudo comparativo)” in Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, Colecção “Estudos, Ensaios e Documentos”, vol.71 − “Notícias do Inquérito das aldeias de Goa: resumo”, Coimbra − “Palheiros de Mira”, pref. de Orlando Ribeiro, Lisboa: Centro de Estudos Geográfico



1961 − “A Terra e a Gente na Índia Portuguesa”, in Colóquio sobre Problemas Humanos nas Regiões Tropicais – Estudos de Ciências Políticas e Sociais, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, vol.51, p.85-105

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



1963 − “Imagens de Macau”, Lisboa: Agência Geral do Ultramar − “Mapas das Províncias Ultramarinas Portuguesas”, in Garcia de Orta, vol.11, nº1: p.139 − “Relatório da adjunta da missão: campanha de 1963”, Lisboa: Missão de Geografia Física e Humana do Ultramar



1964 − “Aspectos gerais de Geografia Física em Angola”, in Angola: curso de extensão universitária: ano lectivo de 1963-1964. Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, p.11-13



1965 − “Aspectos Geográficos de Moçambique”, in Moçambique: curso de extensão universitária: ano lectivo de 1964-1965. Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, p.11-34 − “Aspectos da vida marítima em Macau”, in Geographica 1 (1): p.60-79 − “Geographica: revista da Sociedade de Geografia de Lisboa” – Direcção de Raquel Soeiro de Brito, Lisboa: Sociedade de Geografia de Lisboa



1966 − “A Ilha de São Tomé vista por um Geógrafo” in 21 de Dezembro: nº único comemorativo do 495º aniversário do descobrimento da ilha de S. Tomé: p.69-72 − “Francisco Tenreiro”, in Estudos Políticos e Sociais, vol.4, nº1 Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, p.5-11 − “Goa e as Praças do Norte”, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar − “Guiné, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe: alguns aspectos da terra e dos Homens”, in Cabo Verde, Guiné e São Tomé e Príncipe, Curso de Extensão Universitária: ano lectivo de 1965-1966. Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina, p.13-46

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa

− “Transformações agro-económicas na comuna de Blanzat” , in Geographica 6 (Ano II): p.18-33



1967 − “A ilha do Príncipe”, in Geographica 10 (Ano III): p.3-21



1968 − “Achegas para a geografia de Macau” in Colóquios sobre as províncias do Oriente, Centro de Estudos Políticos e Sociais. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, p.25-48 − “Primórdios

da

colonização

portuguesa

no

Atlântico

(estudo

comparativo)”, in Geographica 14 (Ano IV): p.2-25



1969 − “Imigrantes na vida rural brasileira”, in Geographica 17 (Ano V): p.3-23 − “Relatório da campanha de trabalhos de 1969 da Missão de Geografia Física e Humana do Ultramar”, Lisboa



1970 −

“Estudo Regional da aglomeração de EindHoven”, in Geographica 23 (Ano VI): p.3-31

− “Ilha de Moçambique”, in Geographica 21 (Ano VI): p.2-21 − “L’ocupation du sol dans l’Est de l’île de Timor” in Actas do 5º Colóquio Europeu de Estudos da Însulíndia − “Missão de geografia física e humana do Ultramar” , S.l. : S.n.. - 24 p. − “Nótula acerca dos povos pastores e agro-pastores do distrito de Moçâmedes”, in Finisterra V, nº9: p.69-83



1971 − “Missão de geografia física e humana do Ultramar : Campanha de 1971” , S.l. : S.n.. - 24 p.

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa

− “Ocupação do solo no Timor português”, in Geographica 27 (Ano VII): p.2-29 − “São Tomé e Princípe: esboço de um estudo regional”, in Geographica 25 (Ano VII): p.3-27



1972 − “Acerca de algumas regiões geográficas de Portugal” in Problemas do Espaço Português, Estudos de Ciências Políticas e Sociais. Lisboa: Junta de Investigação do Ultramar − “Aspectos Gerais de Timor”, Lisboa (dactilografado)



1974 − “Açores”, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian “Madeira”, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian



− “Nótula acerca dos povos pastores e agro-pastores do distrito de Moçâmedes”, Lisboa − “Portugal Continental”, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian



1976 − “Lisboa: esboço geográfico”, Boletim da Junta Distrital de Lisboa, nº82: Lisboa



1977 − “Acerca da colonização das Terras Altas de Huíla (Angola)”, in Finisterra XII (24): p.298- 309



1978 − “Portugal, a terra e o Homem: Portugal Continental”, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



1981 − “Palheiros de Mira: formação e declínio de um aglomerado de pescadores”; pref. de Orlando Ribeiro. Lisboa: Centro de Estudos Geográfico, 2ªEdição



1983 − “Geografia Urbana” de Jacqueline Beaujeu-Garnier, Tradução de Raquel Soeiro de Brito (em colaboração com Mª do Céu Gomes e Mª João Queiroz), Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian



1986 “Curtorim – Uma aldeia cristã de Goa”, in Actas do 4º Seminário



Internacional de História Indo-Portuguesa, Lisboa − “Estudos em Homenagem a Mariano Feio”, Lisboa − “Notícias de uma aldeia hindu de Goa – Marcaim” in Estudos de Homenagem a Mariano Feio, Lisboa



1987 − “I Seminário Internacional: Área Metropolitana de Lisboa. Que Futuro?”, Departamento de Geografia e Planeamento Regional da FCSH-UNL / INICJNICT / FCG, Lisboa − “Geografia Humana: Teorias e suas aplicações” de M.G. Bradford e W.A. Kent, tradução do Departamento de Geografia e Planeamento Regional da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa com supervisão de Raquel Soeiro de Brito e Paula Bordalo Lema; 1ºedição. Lisboa, Gradiva



1988 − “Países, povos e continentes: lexicoteca”, adaptação e revisão de Raquel Soeiro de Brito, tradução de António Pinto Ribeiro e Artur Guerra. Lisboa : Círculo de Leitores Mestrado em Geografia – Planeamento e Gestão do Território

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa

− “Países, povos e continentes: Europa (sem a URSS), Próximo Oriente e Norte de África”, adaptação e revisão de Raquel Soeiro de Brito; tradução de António Pinto Ribeiro e Artur Guerra. Lisboa : Círculo de Leitores



1989 − “Países, povos e continentes: Portugal”, coordenação de Raquel Soeiro de Brito, textos de Maria Manuela Aguiar et al. Lisboa: Círculo de Leitores. − “Países, povos e continentes: URSS e Ásia, Oceânia, Àrtico e Antártico, os mares”, adaptação e revisão de Raquel Soeiro de Brito; tradução de Geminiano Franco. Lisboa: Círculo de Leitores



1991 − “Didáctica de Geografia” (em colaboração com Mª de Lourdes Poeira). Lisboa, Universidade Aberta



1992 − “História de Portugal” (em colaboração com vários autores); 1ªedição, Lisboa: Círculo de Leitores − “Trinta anos de estudo de geografia nos territórios do ex-ultramar português (1944-1974)”, in Inforgeo: Ambiente e Território nº4: p.71-94



1993 − “História de Portugal” (em colaboração com vários autores); Reimpressão, Lisboa: Estampa



1994 - “Como vi Goa em Meados do Século XX”, in Conferência no Instituto Menezes de Bragança – Goa (dactilografado) -

“Goa: ontem e hoje”, in“Indo-portuguesmente” da revista Oceanos No.19/20: p. 174-180 ; Revista Trimestral da CNCDP, Lisboa

-

“Portugal: perfil geográfico” (em colaboração com António Camões Gouveia et al), Lisboa: Estampa Mestrado em Geografia – Planeamento e Gestão do Território

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa



1995 − “O meio e os homens nas províncias do Norte– Notícia comparativa dos territórios de Goa, Damão e Diu em meados do século XX”, in Mare Liberum nº9: p.59-82, Actas do 7º Seminário Internacional de História IndoPortuguesa



1997 − “Áreas Metropolitanas: Funções e Organizações”, in Colóquio “A Política das Cidades”, Conselho Económico e Social, Lisboa: p.191-230 − “Geografia Urbana” de Jacqueline Beaujeu-Garnier, Tradução de Raquel Soeiro de Brito. 2ºedição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian − “Territórios da África Ocidental: Guiné, cruzamento de culturas”, in Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses − “No trilho dos descobrimentos: estudos geográficos”, Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses − “Portugal: perfil geográfico” (em colaboração com António Camões Gouveia et al), Lisboa: Estampa. Reimpressão



1998 − “Goa e as Praças do Norte revisitadas”, Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses − “Países, povos e continentes: África (a sul do Sara): América”; adaptação e revisão de Raquel Soeiro de Brito, Lisboa: Círculo de Leitores



2000 − “Nordeste alentejano em mudança”, Lisboa: Inapa − “Os meios ‘naturais’ do Globo” de Jean Demangeot. Tradução de F. Ribeira Martins, H.Nogueira Santo; coordenação e revisão de Raquel Soeiro de Brito. 7ªedição rev. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian

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“Goa e as Praças do Norte” – Análise Crítica de uma obra e de um percurso no âmbito da Geografia Colonial Portuguesa





2001 -

“In Memorium de Mariano Feio”, GeoInova nº4, p.5-6

-

“Um percurso de Geografia”, GeoInova nº4, p.13-24

2002 − “História de Portugal: lexicultural” (colaboração com vários autores). Lisboa



2003 − “Pinhal interior do Sul e o regresso dos emigrantes (1975-2001”) de Fernando Ribeiro Martins, orientado por Raquel Soeiro de Brito e Mª José Roxo, Lisboa



2004 − “São Miguel – a ilha verde: estudo geográfico (1950-2000)”, 2ªedição actualizada; Ponta Delgada: Fábrica de Tabaco Micaelense



2005 − “Atlas de Portugal”, coordenação científica e fotografias de Raquel Soeiro de Brito (em colaboração com outros autores). 1ªedição, Lisboa, Instituto Geográfico do Exército −

“De Cabo Verde a São Tomé”, introdução de Raquel Soeiro de Brito et al; Universidade Aberta

− “Outro Mundo Novo Vimos”, textos de Raquel Soeiro de Brito el al;



2008 − “António Machado Guerreiro”, in Finisterra, XLIII nº86, p.119-120

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