GOVERNO DILMA, PT E ESQUERDAS
Descrição do Produto
23/09/2015
:: Le Monde Diplomatique Brasil ::
Imprimir página « Voltar
POLÍTICA
Governo Dilma, PT e esquerda As esquerdas precisam fortalecer a unidade, construir novos espaços de debate e atuação para a construção de um desenvolvimento popular, democrático, inclusivo e soberano por Assinado por vários autores
Foto:mst.org.br Movimentos sociais lançam Frente de Esquera em Belo Horizonte Com apenas nove meses do seu segundo e último mantado, o governo da presidenta Dilma Rousseff, eleita pelo Partido dos Trabalhadores, esgotou sua capacidade de transformação. O governo não consegue pautar nenhuma agenda. A palavra de ordem é ajuste fiscal – ou melhor, o novo ajuste do ajuste. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, agradece, assim como o seu expatrão Luis Carlos Trabuco, presidente do Banco Bradesco, e como o seu colega de ministério Nelson Barbosa – que faz muito jogo de cena mas defende um superávit primário de 2%[1] e nos bastidores luta por uma reforma da previdência que retira direitos. A crise econômica e política se aprofunda e não há sinais de reversão dessa situação deletéria. A economia entrou em recessão, o desemprego aumentou e o investimento desmoronou. O PIB deverá retrairse 2,55% em 2015 e 0,6% em 2016, segundo pesquisa Focus divulgada pelo Banco Central. Situação esta que deverá piorar muito com as novas rodadas de ajuste fiscal. No plano político a situação consegue ser ainda pior, uma vez que (i) o Planalto não consegue articular suabase parlamentar no Congresso Nacional; (ii) o PT desmoralizase diante dos avanços da operação “Lava Jato” e colapsa diante de sua incapacidade de reconstruir um projeto popular para a Nação; e (iii) há extrema desconfiança dos setores dominantes, da população em geral e de parte expressiva da esquerda (inclusive dentro do PT) com Dilma Rousseff e com os rumos do Partido dos Trabalhadores. A presidenta gira como um biruta de aeroporto – que indica a direção que os ventos (dominantes)sopram – ao sabor dos conselhos de seus ministros que supostamente parecem emitir opiniões econômicas divergentes. Isso não é verdade. Os ministros da área econômica (Fazenda e Planejamento) convergem no que diz respeito ao ajuste fiscal e à reforma da previdência. Não existe hoje uma disputa verdadeira entre projetos econômicos (ou modelos de desenvolvimento)distintos (liberais x neodesenvolvimentistas), mas sim uma dominância inconteste do bloco no http://www.diplomatique.org.br/print.php?tipo=ac&id=3146
1/3
23/09/2015
:: Le Monde Diplomatique Brasil ::
poder na condução da política macroeconômica (representados por Levy) e um ministro do Planejamento que busca se firmar também como representante dos setores dominantes. A disputa é particularizada e anda longe da questão de projetos alternativos. Isso ficou explícito na condução do projeto de lei orçamentário de 2016. Em 31 de agosto, o governo envia ao Congresso Nacional o orçamento de 2016 com uma estimativa de déficit de R$ 30,5 bilhões, ideia defendida pelo ministro do Planejamento Nelson Barbosa para reforçar sua posição, no âmbito de sua disputa particularizada. Estratégia política de grande inabilidade. O Parlamento reage e o ministro Levy se sente desprestigiado e ameaça pedir demissão. Em reunião com a Presidenta no dia 2 de agosto, Luis Carlos Trabuco sai em defesa de seu ex funcionário e de seus lucros – o Bradesco obteve lucro líquido contábil de R$ 4,473 bilhões no segundo trimestre de 2015, maior de sua história. A Presidenta gira na direção de Levy, Trabuco e dos setores dominantes com medo dofantasma do impeachment (promovido pelos setores reacionários). Esse espectro que ronda Dilma servirá como instrumento de pressão do bloco no poder e de seus representantes para que o governo avance na direção de novos ajustes e de reformas estruturais neoliberais (reforma da previdência, flexibilização do mercado de trabalho/terceirização, redução de direitos trabalhista, etc.) conforme proposto pela Agenda Brasil e pelos economistas do PSDB (em artigo denominado Desequilíbrio econômico é estrutural e exige correções mais duras)[2]. Para eles, os entraves ao crescimento são fruto das políticas de ganhos reais do salário, da ampliação das políticas de proteção e dos gastos públicos com as políticas universalizantes (saúde e educação). O impeachment não é mais necessário para o bloco no poder (talvez importante apenas para os partidos de oposição no âmbito da cena política), pois o golpe branco foi estabelecido. A presidenta está acuada e assim permanecerá ao longo de seu mandato. A segunda rodada mais profunda da agenda neoliberal no Brasil provavelmente será implementada por uma Presidenta considerada de esquerda. Isso aumentará ainda mais a tensão existente entre os movimentos sociais e o governo Dilma e o PT. O transformismo do PT não tem mais retorno. A aliança entre a cúpula partidária e o bloco no poder do capitalismo brasileiro na década de 2000 foi matando gradualmente o partido como instrumento de um sonho coletivo e popular. A última convenção do partido realizada em junho de 2015, em Salvador, colocou uma “pá de cal” para alguns poucos que ainda acreditavam na possibilidade de refundação. O debacle do PT como partido, no sentido gramsciano, é claro e agora a sua desmoralização terá impactos fortíssimos para a esquerda, pois, “queiramos ou não, os governos Lula e Dilma, assim como o PT, são vistos como socialistas, antiliberais e corruptos”[3]. O medo venceu a esperança. O projeto lulista – entendido como um modelo socioeconômico de desenvolvimento de centroesquerda que buscou a coalizões de interesses entre a burguesia e o movimento sindical e popular – acabou. É inegável que o lulismo proporcionou, por um lado, a retirada de milhares de pessoas da condição de pobreza extrema – os subalternos historicamente excluídos no capitalismo brasileiro; e, por outro, gerou rentabilidade para os capitalistas nunca antes visto na história desse país[4]. As atuais condições históricas (cenário externo desfavorável, operação Lava Jato, extrema desconfiança das elites com o PT, dificuldade em mobilizar a base do PT em prol do ajuste fiscal, a fúria da classe média tradicional com a redução do seu poder de consumo e com a proximidade física da “ralé”) não permitem mais esse tipo de pactuação. Nesse contexto socioeconômico, os movimentos sindicais, sociais e populares do campo da esquerda (MTL, MST, MTST, UNE, CUT e integrantes do Psol, do PT do PCdoB)precisarão lutar com todas suas forças para manter as conquistas sociais recentes e a própria Constituição cidadã promulgada em 1988 diante da ofensiva das forças conservadoras. As esquerdas precisam fortalecer a unidade, construir novos espaços de debate e atuação para a construção de um desenvolvimento popular, democrático, inclusivo e soberano. A Frente de Esquerda, criada recentemente, pode funcionar como essa unidade de luta, mas como bem afirma Guilherme Boulos, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores SemTeto, ela não pode ser instrumentalizada para defender um governo acuado que pretende avançar no ajuste fiscal e sobre os direitos trabalhistas e sociais ou para articular apenas um projeto eleitoral para 2018. Essa Frente de Esquerda precisa unificar o campo progressista, a partir de sua diversidade, construindo capacidades de dialogar com a população e oferecendolhe saídas pela via da esquerda para a construção de uma democracia econômica para a sociedade brasileira. A esperança precisa vencer o medo. Autores deste texto Eduardo Costa Pinto, Alexis Saludjian e Isabela Nogueira são professores do IE/UFRJ; Carlos Schonerwald é professor do CCJE/UFRJ; Grasiela Baruco é professora da UFRRJ; José Paulo Guedes Pinto é professor do Bacharelado de Relações http://www.diplomatique.org.br/print.php?tipo=ac&id=3146
2/3
23/09/2015
:: Le Monde Diplomatique Brasil ::
Internacionais na UFABC; e Paulo Balanco é professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFBA. Todos são membros do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA). Assinado por vários autores
Vários autores
[1]Ver BARBOSA, N. O Desafio Macroeconômico de 201518. Texto preparado para o 10º Fórum de Economia da Escola de Economia de São Paulo (EESP/FGV), 15 e 16 de setembro de 2014. [2]ALEMEIDA, M. & LISBOAS. M. & PESSOA, S.Desequilíbrio econômico éestrutural e exige correçõesmais duras. Folha de São Paulo (Ilustríssima), 19/07/2015. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2015/07/1657046 desequilibrioeconomicoeestruturaleexigecorrecoesmaisduras.shtml [3]Luiz Filgueiras, Notas para a análise de conjuntura (18/08/2015) [4]Entre 19972002 e 20032010, as taxas de rentabilidades médias sobre os patrimônios líquidos (%) dos maiores grupos/conglomerados financeiros, da indústria de transformação (453 maiores empresas industriais) e das cinco maiores empreiteiras cresceram de 12,4% para 18,8%, de 4,7% para 18,1% e de 10,2% para 12%, respectivamente
Palavras chave: Governos, debate, esquerda, economia, Brasil, marxismo, oposição
http://www.diplomatique.org.br/print.php?tipo=ac&id=3146
3/3
Lihat lebih banyak...
Comentários