Guião breve de tutoria escolar

May 30, 2017 | Autor: Francisco Simões | Categoria: Motivation (Psychology), Mentoring, Tutoring
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GUIÃO DE TUTORIA













INTRODUÇÃO
O guião que se segue é uma estrutura de trabalho e não propriamente um programa. Um programa corresponde a uma organização de estratégias para cumprir um determinado objetivo, normalmente dentro de um prazo estipulado, baseado em pressupostos teóricos e recorrendo a indicadores que permitam avaliar a sua eficácia e a sua eficiência. Para tal pressupõe-se que há um conjunto de sessões que, em sequência, aborda determinadas temáticas com todo o público-alvo. O objetivo da tutoria não envolve, propriamente, a aplicação sequencial de temas em sessões, visto que se pretende individualizar o processo com cada jovem, de acordo com as suas características.
Assim, o documento que se segue é um guião de aplicação de sessões, cujos conteúdos são propostos de forma genérica, sendo depois feitas sugestões de leitura complementares que indicam exemplos de atividades ou oferecem materiais que podem ser usados nos encontros com os jovens.
Há alguns pressupostos de base que enquadram a formulação deste guião:
A tutoria é rígida na estrutura, mas flexível no conteúdo: a rigidez da estrutura significa que a organização das sessões (sessão inicial e sessões seguintes organizadas em abertura, desenvolvimento e encerramento) é seguida por todos os tutores. A flexibilidade nos conteúdos significa que as atividades introduzidas no desenvolvimento das sessões são variáveis de jovem para jovem e de tutor para tutor.
Contexto do programa: o programa é desenvolvido numa escola, o que tem também implicações. Primeiro, os objetivos da tutoria deverão ser explicitados (e reiterados) desde o início. Seguidamente, será importante reforçar que são objetivos congruentes com o contexto, ou seja, deverão ser eminentemente escolares. Finalmente, tal significa que, do ponto de vista de satisfação de necessidades básicas, embora as mesmas devam ser satisfeitas de forma equilibrada, torna-se necessário, em regra, dar um maior enfoque às necessidades de competência dos jovens de modo a garantir o sucesso das intervenções.
Características do público-alvo: considerando os jovens que beneficiam da tutoria, procurou individualizar-se ao máximo a aplicação de conteúdos. Por outro lado, tentou recorrer-se a atividades de cariz metafórico e com apelo visual que facilitem o processamento de informação, dadas as recorrentes limitações cognitivas desta população.
Considerando estes pressupostos, este guião inclui a redefinição dos objetivos, a apresentação da estrutura das sessões e encontros informais e oferece sugestões de leitura complementares que podem ajudar a definir as atividades com cada jovem.

1. OBJETIVOS
Os objetivos da tutoria são:
(1) Favorecer o sucesso escolar de alunos com percursos particularmente desviantes em relação à cultura e normas escolares;
(2) Contribuir para a redução do absentismo e dos problemas disciplinares dos alunos envolvidos na tutoria, sempre que tal seja pertinente.

2. SESSÕES
2.1. DURAÇÃO
45 minutos.

2.2. LOCAL
As sessões poderão ocorrer em sala/gabinete ou, quando se considerar necessário, poderão decorrer em espaço exterior (por necessidade de incrementar a informalidade).


2.2. A PRIMEIRA SESSÃO
A primeira sessão deverá envolver os seguintes pontos:
Avaliação de expectativas: devem ser analisadas com pormenor as expectativas do jovem em relação aos encontros a realizar, de modo a reforçá-las ou a corrigi-las.
Explicitação dos objetivos: deverá ser clarificado que os objetivos do acompanhamento se centram nas questões escolares. Contudo, deve ser também explicitado que o papel de tutor poderá envolver a gestão de fatores externos à escola e que afetam a concretização dos objetivos escolares do programa e a regularidade e tipo de encontros.
Estabelecimento da metáfora: no sentido de organizar a relação em torno das representações do próprio jovem, a primeira sessão deve ser favorecer o estabelecimento de uma linha de tempo e da sua capacidade de projeção temporal futura. De modo a favorecer esses objetivos, é sugerido que o jovem se imagine no final do ano letivo e que explique o que gostaria que estivesse a acontecer na sua vida nessa altura. Neste ponto, deverão ser explorados os resultados obtidos na escola e também todas as implicações dos mesmos (na escola, em casa, etc.), bem como a diferença entre a situação atual e o plano desejado, de modo a criar alguma ambivalência que possa ser aproveitada de modo positivo. Seguidamente, sugere-se que o jovem imagine que para chegar a esse ponto terá de fazer uma viagem. Pede-se, igualmente, que o jovem defina o meio de transporte em que pretende fazer a viagem e estabelece-se uma rota dividida pelas semanas de atendimento/sessões.
Especulação: É explorado com o jovem o que é que hipoteticamente pode fazer para concretizar o que gostaria que acontecesse no final do ano ou, talvez mais útil, poderá ser feito uma recolha de exemplos de comportamentos/atitudes/acontecimentos de outros anos letivos ou já do presente ano letivo que contribuíram para esse pressuposto. É muito provável que, neste ponto, o jovem desvalorize ou não se recorde desse tipo de exemplos. Nesse caso, o tutor deverá recorrer à informação escolar, bem como a grelha de recursos já preenchida para elencar exemplos de aspetos positivos identificados no caso e que poderão ser rentabilizados. O tutor poderá dar, também, um exemplo de um caso de sucesso que tenha já acompanhado no seu trabalho de tutoria. É importante que isso seja feito, no sentido de instilar esperança e sentido de compromisso no jovem. Dando esse exemplo, o tutor explica, igualmente, que tipo de ações desenvolveu para ajudar esse jovem, no caso relatado.
Compromisso: quer o tutor, quer o jovem, no final da sessão, deverão concretizar "o que fica combinado" de parte a parte, ou seja, o que é o jovem pode e sabe fazer para concretizar o seu desejo, no final do ano letivo e o que é o tutor se disponibiliza a fazer nesse sentido. É relembrada a data do próximo encontro e pede-se que o jovem indique uma atividade que necessitaria de desenvolver com a ajuda do tutor (e.g. organização de um mapa dos testes).

2.3. ESTRUTURA DAS SESSÕES SEGUINTES
A estrutura das sessões deve ser previsível sem ser necessariamente repetitiva ou monótona. Aquilo que se pretende é que os jovens percebam que existe uma base relacional segura. Sugere-se que os encontros sejam organizados em três momentos essenciais: abertura, desenvolvimento e encerramento. Sugere-se que os momentos de abertura e encerramento sejam os que correspondem a uma maior ritualização, de modo a aumentar o sentido de previsibilidade da sessão. As atividades a realizar durante a fase de desenvolvimento da sessão devem ser flexíveis em função da necessidade de cada caso.

2.3.1. ABERTURA
A abertura pode estabelecer-se como um ritual de encontro que desbloqueia o início da conversação e que permite fazer um balanço do período entre sessões. São sugeridas as seguintes hipóteses de atividade inicial:
Ases e duques – de um baralho de cartas são escolhidas duas cartas, um ás e um duque (ou simplesmente projetam-se as imagens em Powerpoint, num computador). Pede-se que o jovem mencione qual foi o seu trunfo na escola no período que mediou entre os encontros. A ideia é identificar recursos, competências, comportamentos ou acontecimentos (aparentemente aleatórios) que podem ter contribuído para reforçar a concretização dos objetivos do programa. Os mesmos deverão ser registados de forma visual (cartaz, apresentação media, etc.) no âmbito da metáfora de viagem estabelecida na primeira sessão. Sessão após sessão, este exercício de abertura vai sendo registado na linha de tempo da metáfora que possa ir revelando a evolução ou a não-evolução e favorecer a discussão.
Imagem – em alternativa ao exercício Ases e Duques pode ser pedido que o jovem classifique a semana anterior de acordo com uma imagem, fazendo-se uma exploração semelhante à sugerida no ponto 1.
Título de um livro ou de um filme - em alternativa ao exercício Ases e Duques pode ser pedido que o jovem classifique a quinzena anterior de acordo dando-lhe um título como se fosse um livro ou um filme e fazendo-se uma exploração semelhante à sugerida no ponto 1.
É importante que qualquer que seja a variação do exercício de abertura da sessão, tutor e jovem especifiquem barreiras, mas também contributos para a concretização do objetivo relativamente ao final do ano letivo.
Tempo: 10 minutos
2.3.2. DESENVOLVIMENTO
Em função do explorado na abertura da sessão, o tutor explora de que maneira os trunfos poderão ser repetidos no período subsequente, ou seja, na quinzena seguinte, de modo a criar as condições de repetição de sucesso. Seguidamente, o tutor poderá pegar nas barreiras encontradas e propor atividades que possam compensar as dificuldades colocadas pelo jovem. Em contraponto, poderá ser o próprio tutorando a solicitar que sejam realizadas algumas atividades na sessão para responder a essas barreiras. As mesmas deverão assentar em dois princípios teóricos: (a) identificação do estado motivacional do jovem e sua reavaliação permanente; (b) apoio/suporte às necessidades de competência, relação e/ou autonomia do jovem, consoante as necessidades que este coloque, dando alguma primazia ao sentido de competência/eficácia, pelo facto do programa decorrer em meio escolar. Nesse sentido, as atividades poderão implicar:
Suporte para a competência: apoio ao nível do estudo: os programas de tutoria/tutoria que envolvem atividades concretas de apoio ao método de estudo são aqueles que costumam produzir melhores resultados. De acordo com as necessidades do jovem, podem ser orientadas atividades de apoio a aspetos como: (a) organização de tempo; (b) organização de mapa de testes; (c) estratégias de resposta a testes; (d) memorização; (e) organização de cadernos e resumos, etc..
Suporte para a relação: análise e reformulação de aspetos comunicacionais e relacionais sempre que as barreiras identificadas sejam desta natureza. As mesmas deverão ser debatidas e reenquadradas de acordo com os princípios da entrevista motivacional.
Suporte para a autonomia: monitorização comportamental, a qual significa que progressivamente, aspetos associados a desvio comportamental tais como absentismo e problemas disciplinares deverão ser discutidos partindo de um registo de maior controlo/monitorização para uma abordagem mais centrada na autonomia. Tal pode envolver um contínuo que vai do controlo estrito e prescrição de soluções até ao feedback informativo (consultar Anexo I).
Tempo: 30 minutos.

2.3.3. ENCERRAMENTO
O encerramento corresponde sempre à discussão de uma questão: O que é que foi mais importante para ti? ou O que é que fica combinado até ao nosso próximo encontro?
Neste momento, é muito importante que fique assente o que é que o jovem fará até ao próximo encontro, mas também deve ser expresso o que é o tutor fará entre sessões. A reciprocidade, ou seja, a disponibilidade do tutor para executar ações acaba por ser o fio condutor que une as sessões, dando continuidade ao processo entre as mesmas. No final da sessão, é assinado e carimbado o passaporte.
Tempo: 5 minutos


3.ENCONTROS INFORMAIS
Os encontros informais decorrem de forma aleatória ou intencional nos espaços comuns da escola. Podem ter uma duração variável e objetivos variados como a obtenção de feedback sobre objetivos gizados entre sessões por tutor e jovem.



ANEXO I - ESTRATÉGIAS DE MONITORIZAÇÃO COMPORTAMENTAL
Controlo
Estratégias do tutor destinadas a influenciar decisões e comportamentos do jovem, com recurso a contingências de carácter comportamental tais como reforços, punições ou monitorização (e.g. observação do registo de faltas) (Markland et al., 2005)
Prescrição
Estratégias usadas pelo tutor no intuito de influenciar uma tomada de decisão ou uma mudança comportamental com base na prescrição de soluções, com recurso a aconselhamento ou à emissão de opiniões pessoais.
Modelo de referência
Situações em o tutor procura modelar o comportamento dos jovens indiretamente, através da comunicação de exemplos de situações semelhantes e das decisões que adotou.
Feedback informativo
Ações em que o tutor procura ajudar o jovem a desenvolver um racional/contexto significativo para envolver-se numa determinada ação ou mudança comportamental, através da disponibilização de informação relevante (e.g. informação sobre cursos profissionais) (Markland et al. 2005) ou de exemplos.
Oportunidades
Ações em que o tutor disponibiliza oportunidades para que o tutorando exerça competências de escolha/decisão ou de livre participação numa determinada ação (e.g. através de questionamento/descoberta guiada procurar que o jovem defina estratégias para gerir o absentismo) (Markland et al., 2005)



4.LEITURAS RECOMENDADAS
Deci, E. L., & Ryan, R. M. (2008). Self-determination theory: A macrotheory of human motivation, development, and health. Canadian Psychology, 49(3), 182-185.
Garrick, M. (2010). Planning a school-based tutoring program. Lessons Learned, 1(4) 1-4.
Markland, D., Ryan, R. M., Tobin, J. V., & Rollnick, S. (2005). Motivational interviewing and self-determination theory. Journal of Social and Clinical Psychology, 24(6), 811-831.
Simões, F., & Alarcão, M. (2009). Ser tutor e fazer tutoria em meio escolar: Pistas para a intervenção. Lisboa: Ministério da Educação.





Neste ponto, será importante combinar/esclarecer com o jovem o nível de informação partilhada com diretores de turma e pais. Em princípio, não se exige o grau de confidencialidade inerente a uma relação terapêutica, mas sugere-se um princípio de comunicação ao jovem da necessidade de contacto com professores e pais e discussão da sua pertinência e viabilidade com o próprio jovem.
Alternativamente, e caso o tutor ache o final do ano letivo um prazo muito dilatado, poderá optar-se por propor o final do período letivo, sobretudo nos casos em que o tutor considere a capacidade de projeção temporal do jovem mais limitada.
O que gostaria e não o que acha que vai ser (prevenção de expectativas negativas que tenham algum peso de profecia).
Em alternativa à metáfora da viagem, pode pedir-se ao jovem que especifique a que imagem corresponde o final do ano que antecipa. Caso opte por uma imagem, pede-se que a mesma seja decomposta em partes para que depois as diferentes partes possam ir sendo adicionadas ao longo dos encontros (por ex. se a imagem for um jardim, o mesmo poderá ter flores, pedras, arbustos, árvores, etc., etc.). No fundo, cada um dos elementos é identificado e pode ir sendo adicionado consoante o percurso de modo a construir uma imagem final.

Este tipo de atividades, muito concretas e instrumentais é dos aspetos mais valorizados pelos jovens nestes programas, além de que são momentos de trabalho partilhados que permitem colaboração. Portanto, embora seja um apoio muito instrumental e menos sócioemocional, tem uma importância relevante neste tipo de programas.
Como material de apoio, sugere-se o recurso a um manual de apoio ao método de estudo. Sugere-se, igualmente, que o mesmo seja policopiado e deixado no gabinete de atendimento, de modo a poder ser utilizado sempre que necessário.
Em Alarcão e Simões (2009) há um conjunto de pistas para gerir as resistências motivacionais ao desempenho escolar, as quais poderão ser úteis (pp. 42-72).
Um passaporte é uma espécie de caderneta onde são inscritas as competências, recursos, soluções ou acontecimentos que contribuíram para a concretização do objetivo desejado para o final do ano letivo. É um documento que serve como síntese das sessões e que está disponível na sala. Pode ser um documento de partilha de informação com diretores de turma e pais, nomeadamente para identificação das estratégias que estão a ser desenvolvidas para que sejam reforçadas pelos mesmos.


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