Guiné-Bissau, Macau e a China. Muita História, Pouco Desenvolvimento

June 3, 2017 | Autor: I. Carneiro de Sousa | Categoria: Guinea-Bissau, China, china in Africa, Forum de Macau, Macau Forum
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A história do país independente que é hoje a Guiné-Bissau está largamente por fazer. Muitos manuais e livros que se querem de história continuam a insistir – mal e muito fragmentariamente – em sumariar com excessiva brevidade a história do país como uma herança ou legado coloniais portugueses, vazados nessas listas de nomes e datas em que se confundem navegadores com comerciantes, negreiros com lançados, portugueses com outros europeus e até africanos, mais exploração muita para promessas de civilização pouca. Recorde-se que a região litoral em que hoje se encontra a Guiné-Bissau foi sendo identificada e percorrida por várias embarcações portuguesas ainda na década de 1440, vinte anos antes da morte, em 1460, do famoso e muito mitificado infante D. Henrique que poderoso duque de Viseu era, mas de Sagres passou à história que nos impunham sem reticências e quaisquer críticas desde os bancos das antigas escolas primárias. Estas costas africanas haveriam mesmo de receber a atenção de uma crónica célebre, mas polémica, da autoria de Gomes Eanes de Zurara que, intitulada Crónica do Descobrimento e Conquista da Guiné (em versões mais recentes, Crónica dos Feitos da Guiné), é arranjadamente responsável por vazar em exclusividade

lusofonias nº 19 | 18 de Novembro de 2013 Este suplemento é parte integrante do Jornal Tribuna de Macau e não pode ser vendido separadamente

COORDENAÇÃO: Ivo Carneiro de Sousa

TEXTOS: • Crises recenetes e uma longa história por contar • Macau e Guiné-Bissau: um longa história entres escravos e arroz • O Reconhecimento da República Popular da China e a transferência para Taiwan • As relações actuais entre a China e a Guiné-Bissau: pouco comércio, investimento limitado e cooperação generosa • i ka ten problema (não tem problema)

Dia 25 de Novembro: Aquilino Ribeiro: no centenário de O Jardim das Tormentas

APOIO:

Guiné-Bissau: Macau China e a

história, pouco desenvolvimento muita

Guiné-Bissau, Macau ea China: muitas histórias,

que, em 1753, originou nova capitania, mas já em período de progressiva presença francesa na região. Meio século decorrido, também o Reino Unido procurava instalar-se pela Guiné, reivindicando a tutela sobre a ilha de Bolama, o arquipélago dos Bijagós e o litoral de Buba. Apenas tardiamente, em 1870, com a inetermediação diplomática do Presidente dos Estados Unidos, Ulysses Grant, os britânicos desistiram das suas pretensões coloniais sobre Bolama, outras ilhas e costas guineenses. O que obrigou à separação administrativa da Guiné de Cabo Verde, em 1879, pretensão colonial portuguesa consagrada não sem oposição na famosa conferência de Berlim (1884-85), prelúdio do acordo Luso-Francês de 1886 em que foi trocada a anterior tutela Ivo Carneiro de Sousa portuguesa na região de Casamansa pela cedência francesa da região de Cacine, no sul da Guiné-Bissau. Acordo considerado infamante em história do país independente que é hoje a todos os rios africanos eram afluentes do Nilo, Lisboa, criticado pelo republicanismo nascente, Guiné-Bissau está largamente por fazer. Mui- cortando a África de Norte a Sul a partir das suas suscitando mesmo a única intervenção crítica tos manuais e livros que se querem de história fontes nas chamadas montanhas da Lua. Apesar conhecida de Alexandre Herculano durante o continuam a insistir – mal e muito fragmentaria- dos textos e mapas trazidos da Itália por D. Pe- curto período de tempo em que foi deputado às mente – em sumariar com excessiva brevidade dro, testemunhando o influxo de saber oriental, Cortes da monarquia constitucional. Estes acordos, conferências coloniais e afins a história do país como uma herança ou legado colocarem muitas dúvidas à ciência ptolomaica, coloniais portugueses, vazados nessas listas de incluindo a sua crença de que o Índico era um tinham naturalmente muito pouco a ver com as nomes e datas em que se confundem navegado- oceano fechado e as zonas equatoriais inabita- populações locais e o seu efectivo domínio que res com comerciantes, negreiros com lançados, das, a ciência náutica reunida pelo infante D. a fragmentária presença portuguesa pela Guiportugueses com outros europeus e até africa- Henrique continuava tão agarrada ao que se co- né demorou décadas a consolidar política e adnos, mais exploração muita para promessas de nhecia da geografia de Ptolomeu como a vários ministrativamente. As campanhas militares sucederam-se tanto civilização pouca. Recorde-se que a região li- mitos medievais. como os elogiados toral em que hoje se encontra a Guiné-Bissau Em termos mais heróis coloniais da foi sendo identificada e percorrida por várias precisos, felizmen(...) Escravos negros foram propagação da ciembarcações portuguesas ainda na década de te, a crónica oficial vilização ocidental 1440, vinte anos antes da morte, em 1460, do de Zurara esclarece de imediato comprados a como João Teixeira famoso e muito mitificado infante D. Henrique terem sido os rios Pinto e o seu natique poderoso duque de Viseu era, mas de Sa- da Guiné e as ilhas traficantes muçulmanos, vo ajudante Abdul  gres passou à história que nos impunham sem de Cabo Verde os enquanto intérpretes Indjai, seu auxireticências e quaisquer críticas desde os ban- primeiros espaços liar e aliado, logo cos das antigas escolas primárias. Estas costas de frequência ecoe escribas locais foram a seguir revoltado africanas haveriam mesmo de receber a atenção nómica portuguesa e preso, episódio de uma crónica célebre, mas polémica, da au- em busca na costa forçados a trabalhar para as dessas estratégias toria de Gomes Eanes de Zurara que, intitulada ocidental africana aventuras dos tratos lusos. do dividir para reiCrónica do Descobrimento e Conquista da Guiné de ouro, escravos e, nar com que o co(em versões mais recentes, Crónica dos Feitos mais importante ainAlguns régulos locais foram lonialismo europeu da Guiné), é arranjadamente responsável por da, intérpretes alpor toda a África vazar em exclusividade os chamados primeiros fabetizados capazes convertidos ao cristianismo, inventou, manidescobrimentos portugueses na figura tutelar de se exprimirem em firmando alianças com os pulou e excitou do infante D. Henrique, assim marginalizando árabe e nas línguas dramaticamente vários outros protagonistas grupais e individuais de comércio local portugueses com quem divisões e afroncoevos, incluindo o seu malogrado irmão, esse designados na crónitamentos étnicos. infante D. Pedro derrotado na tristemente céle- ca de Zurara por turintermediavam o comércio Tão tarde como em bre batalha de Alfarrobeira, mas responsável por gimãos. Assim, por escravista(...) 1936, a revolta dos trazer para Portugal conhecimentos, geografias 1446, Nuno Tristão, bijagós de Canhae cartografias do Renascimento sem os quais pa- morto em rio guibaque continuava a rece mais difícil organizar as viagens marítimas neense, Álvaro Ferque exigiam ciências e técnicas sérias. A crónica nandes, Diogo Gomes e Cadamosto exploraram ilustrar as dificuldades muitas da efectiva domide Zurara, descontado o exagerado panegírico sistematicamente as regiões costeiras e fluviais nação colonial portuguesa por terras da Guiné. encomendado do infante D. Henrique, descre- da Guiné. Escravos negros foram de imediato Tiveram de se fazer, como convinha, entre 1925 ve pormenorizadamente a chegada de explo- comprados a traficantes muçulmanos, enquan- e 1940, as primeiras obras de fomento primáradores e embarcações portugueses às regiões to intérpretes e escribas locais foram forçados rio com a abertura de algumas estradas, pontes da Senegâmbia na década de 1440, incluindo a a trabalhar para as aventuras dos tratos lusos. e cais no que então se consagrava como Guiné identificação do grande rio Senegal, longo de Alguns régulos locais foram convertidos ao cris- Portuguesa, ao mesmo tempo que se entregava quase 1800km. Um achamento que parece ter tianismo, firmando alianças com os portugueses a maior parte do seu comércio interno e exterexcitado o próprio infante que logo modificou com quem intermediavam o comércio escravis- no, largamente centrado no amendoim, à podea iconografia da sua famosa divisa do “talant ta. Apesar destas aventuras ainda quatrocen- rosa CUF através da Casa Gouveia instalada em de bien faire” com a inclusão de duas vistosas tistas, a instalação lusa em solo da Guiné faz- Bissau. O que obrigou, desde 1941, a sediar por pirâmides. D. Henrique e os servidores da sua -se muito mais tarde em plena monarquia dual aqui a capital da colónia em detrimento de Boopulenta casa ducal, detentora de ricos mono- filipina, no Cacheu, à roda de 1588, por aí se lama. Nove anos mais tarde, em 1950, organizapólios nas pescas, no sal, no sabão e no comér- erguendo uma fortaleza para apoiar o trato de -se um muito precário censo de populações em cio ultramarino, acreditavam que, alcançado o escravos, sendo preciso aguardar por 1630 para constante movimento e normalmente fugidias rio Senegal, estavam abertas as portas para se se organizar uma primeira capitania largamen- de tentativas de controlo demográfico e fiscais. chegar ao Nilo e às especiarias orientais distri- te responsável pela fixação comercial em Farim Apuraram-se então 512.255 residentes, mas buídas a partir do Cairo para as grandes cidades e Ziguinchor, mais a circulação na foz do Casa- apenas 8320 conseguiram chegar à categoria de italianas que, depois, as vendiam mais do que mansa, Geba e Buda. O comércio de escravos civilizados (2273 brancos, 4568 mestiços, 1478 lucrativamente nos vários mercados europeus. permanecia o motivo principal destes esforços, negros e 11 indianos), mas entre os quais 3824 O infante e os seus continuavam a acreditar apoiados a seguir com a edificação de uma for- eram analfabetos (541 brancos, 2311 mestiços e na vetusta geografia ptolomaica ensinando que taleza em Bissau, pelos finais do século XVII 772 negros).

pouco desenvolvimento

A

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II

Segunda-feira, 18 de Novembro de 2013 • LUSOFONIAS

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Crises

recentes e uma longa história por contar

N

estes horizontes cronológicos, a história da Guiné-Bissau estava próxima de se precipitar rapidamente: provavelmente a 19 de Setembro (a data exacta ainda é discutida...) de 1956, o engenheiro que tinha feito o levantamento agrícola da Guiné, Amílcar Cabral, promoveu a conhecida criação do Partido Africano da Independência (PAI), prolegómeno do PAIGC. Goradas quaisquer negociações com o governo colonial em Bissau e Lisboa, a 23 de Janeiro de 1963 com o ataque ao quartel de Tite, no Sul da Guiné, começava para ficar a luta armada. Onze anos de luta de libertação depois, a 24 de Setembro de 1973, em Madina do Boé, o PAIGC declarou unilateralmente a independência da Guiné-Bissau, depois reconhecida por Portugal após a revolução do 25 de Abril de 1974. A história política recente do novo país independente de língua oficial portuguesa é ainda menos recomendável. Desde o famoso movimento reajustador, em 1980, depondo e prendendo o presidente Luís Cabral, dando o poder a um Conselho de Revolução liderado por João Bernardo Nino Vieira, a paz e o desenvolvimernto não chegaram, mas os golpes e contra-golpes sucederam-se a um ritmo impressionante. Em 1983, descobre-se a alegada tentativa de golpe do primeiro-ministro Victor Saúde Maria; segue-se, em 1985, a de Paulo Correia, antigo comandante das forças armadas e ministro da Justiça de Nino Vieira; a ameaça de golpe de João da Costa ocorre em 1993; muitos prelúdios da guerra civil que estala a 7 de Junho de 1998, levando o Presidente Nino a chamar tropas do Senegal e da Guiné-Conacri que deixaram o pior rasto de destruição pelo país. Derrotado Nino Vieira e exilado em Portugal, as eleições que se seguiram trouxeram originalmente ao poder o Partido da Renovação Social (PRS), sendo o seu líder, Kumba Yala, eleito em para Presidente nas eleições gerais de 2000. Em 2003, foi destituído por um novo golpe de estado militar. Depois de um período complicado de transição, em 2004, o PAIGC regressa ao poder e as eleições que tiveram lugar em 2005 trouxeram de volta o antigo presidente Nino Vieira, vencedor do escrutínio como candidato inde-

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pendente. O preciso ano em que o país recebeu a indesejável classificação de primeira nação africana de narco-tráfico pelos EUA que deixaram desde 1999 de ter qualquer representação diplomática em Bissau. Quatro anos de instabilidade depois, em 2009, seguiram-se os assassinatos com algumas horas de intervalo do Chefe de Estado Maior das Forças Armadas, Tagme na Waie, e do Presidente da República Nino Vieira. Por fim, regressado à Presidência e ao governo do país

João Bernardo Nino Vieira em eleições democráticas, o PAIGC volta a ser afastado de forma anti-constitucional do poder por um golpe militar a 12 de Abril de 2012, visando o primeiro-ministro e candidato presidencial Carlos Gomes Júnior. Vive-se agora um período com um Presidente e Governo chamados de transição, mandatados por um ano para organizarem eleições. Um ano já muito exorbitado como a acção destes poderes de transição, nomeando embaixadores, cônsules, altos funcionários e chefias militares ao arrepio de um mínimo de consenso e constitucionalidade. A acção da ONU, da União Africana, e da União Europeia, da comunidade dos países da África Ocidental, a CEDEAO, mais a tímida CPLP não tem sido suficientemente coordenada para resolver uma crise que agora parece beneficiar da sabedoria do antigo Presidente de Timor-Leste e Prémio Nobel da Paz, Dr. Ramos Horta, enquanto enviado especial do secretário-geral das Nações Unidas. A ver vamos se as prometidas eleições, recentemente adiadas, se poderão concretizar nos inícios de 2014. Falta (certamente para melhor...) convocar essa história da

Guiné-Bissau de muito mais longa duração quase completamente por contar. Muito mais influente também nas línguas, culturas, etnicidades persistentes e formas tradicionais de pensar e fazer que as elites políticas tendem a esquecer na sua imbecil sede de poder, privilégios, compadrios, rivalidades, protagonismos. Ao longo do século XIII, a região guineense recebe emigrantes naulu e landurna, oriundos do decadente império Gana. No século seguinte, estes territórios encontravam-se já na órbita de influência do imperador Mandinga do Mali, o “mandimansa” de crónicas e documentos portugueses. Um império cerzindo diversas etnicidades e variadas comunidades, mas escorado em abundante comércio. Assim o reconhecia, em 1594, esse importante Tratado dos Rios da Guiné, da autoria de André de Almada: “estes mercadores... vão por ordem de um imperador negro, a quem todos os negros deste Guiné de que tratamos dão obediência, que se chama o Mandimança, não visto até hoje de nenhum dos nossos. E tanto que nomeiam este nome logo se descobrem todos os negros que o ouvem nomear, tão obedecido é.” Na verdade, nos espaços ao sul da Senegâmbia, a língua e cultura mandingas foram-se historicamente impondo através de migrações, comunicações comerciais e difusão de práticas culturais diversas. Um comércio intercambiando sal, ouro, têxteis e grande quantidade de escravos, o que levou à instalação de comerciantes mandingas ao longo do vale do rio Geba, a seguir nessas outras redes fluviais e ilhas costeiras em que, mais tarde, comerciantes portugueses carregavam escravos e raptavam intérpretes islamizados que se levariam longe até aos tráficos das especiarias do Índico. Legado de um processo de longa duração, o mosaico étnico que ainda é actualmente a Guiné-Bissau aguarda investigações rigorosas cruzando antropologia e história profissionais. A dispersão étnica desvenda influências sahelianas, nomeadamente entre os Fulas, sahelo-sudanesas entre os Mandingas e Jalofos, mesmo culturas sudanesas entre os Padjadingas e os Tandas, para além de um puzzle

local, anterior à expansão mandinga, reunindo Balantas, Manjacos, Beafadas, Felupes e outros grupos menores, praticamente já sem expressão linguística presente. As estatísticas étnicas são difíceis hoje, facilmente manipuláveis e deixaram de se fundar em estudos sérios que, em rigor, pouco se fizeram no período colonial: os Balantas podem representar 27% a 30% da população total da Guiné-Bissau; os Fulas cerca de 20-23%; os Mandingas valem talvez 12-13%; os Manjacos 11-12%; os Papéis 7-10%; os Felupes não mais de 2%, a que se somam muitas outras comunidades étnicas menos expressivas, dos Macanhas aos vários agrupamentos de Bijagós, mesmo assim podendo chegar a 15% da população. Escoradas nestas etnicidades, as religiões locais de forte matriz comunitária e folclórica permanecem maioritárias, mobilizando mais de metade da população, muitas vezes misturando-se com o islamismo que convoca mais de 41% dos guineenses, enquanto os que se declaram católicos ou cristãos de várias profissões se situam entre 5 a 10%, assim embaraçando as teorias do legado colonial português. Que ainda mais se embaraça quando se chega à língua. Apesar de língua oficial e de ensino, o português continua a ser linguagem veicular de uma minoria administrativa e urbana, cerca de 13% da população, enquanto o crioulo (melhor, os vários crioulos...) se foi encostando aos dialectos locais, sendo língua praticamente franca chegando a quase todas as tabancas, nomeadamente entre os jovens que o utilizam como comunicação, canção, recreio, por vezes até rádio, mais recentemente instrumento de redes sociais, blogs e afins. Para uma verdadeira história da Guiné-Bissau falta, assim, quase tudo, incluindo investigações rigorosas sobre as suas funções nesse império marítimo português como bem lhe chamava Charles Boxer. É que as relações das terras e gentes da Guiné chegaram longe através da carreira da Índia até Macau. Paradoxalmente (ou talvez não...) é entre escravos, presídios, exilados e arroz que se descobre documentamente uma demorada relação histórica entre Macau e a Guiné-Bissau.

LUSOFONIAS • Segunda-feira, 18 de Novembro de 2013

III

O

Macau e Guiné-Bissau:

uma longa história entre escravos e arroz

O

s escravos negros das regiões da Guiné foram chegando aos vários enclaves portugueses na Ásia, incluindo a península de Macau por onde se foram instalando lucrativamente muitos portugueses e euroasiáticos entre 1553 e 1557. A testamentaria dos comerciantes mais abastados de Macau, mas também portugueses menos enriquecidos cujos processos de heranças corriam pelo Juízo dos Orfãos, vai descrevendo desde 1590 a generosa presença de muitos escravos designados por cafres, vindos da África Oriental e Ocidental. Gente sem direito, comprada, trocada e herdada como mercadoria, esta escravatura africana em Macau é de difícil caracterização geográfica e étnica. Existe, felizmente (ou infelizmente...) um desses acontecimentos magnos na história da presença portuguesa em Macau em que a informação documental sobre os escravos africanos se torna muita mais precisa: a tentativa de invasão holandesa do enclave, em 1622. Processo, porém, ainda difícil de esclarecer rigorosamente e a pedir investigação criteriosa capaz de cruzar as várias fontes e relatos divergentes do acontecimento. Com efeito, chegaram até nós, pelo menos, quatro versões diferentes do ataque holandês a Macau: os relatos propagados pelos jesuítas, a informação do capitão-geral, as queixas dos grandes comerciantes que dominavam o Leal Senado e o muito detalhado relatório da Companhia Holandesa das Índias Orientais, a célebre VOC que financiou a frustrada investida contra o estabelecimento português no Delta do Rio das Pérolas. Fundada em 1602, primeiro exemplo, segundo Marx, de uma grande empresa capitalista, a VOC era companhia com muitos accionistas e capitais privados, muitas embarcações e abundantes mercenários dos vários cantos da Europa. Estava, por isso, obrigada a relatar com o máximo detalhe investimentos, lucros, actividades comerciais e, naturalmente, sempre que ocorriam, prejuízos. O malogrado ataque a Macau deixou a companhia com perdas significativas, o que implicou relatório pormenorizado, identificando mesmo os responsáveis pela mal sucedida acção. Assim, cruzando as quatro versões actualmente disponíveis, com a excepção do relato pouco verosímil dos jesuítas, todas as outras três referem com diferentes acentos a participação aguerrida de escravos africanos nos combates que, em terra, desbarataram a invasão holandesa. A versão muito detalhada da VOC vai mais longe e atribui a derrota das suas organizadas hostes à ferocidade dos escravos africanos que, embriagados e drogados pelos portugueses, lutavam como animais selvagens, destacando-se na versão holandesa os ferozes fulas da Guiné. Em consequência, nos dois séculos seguintes, as várias milícias privadas da grande burguesia mercantil de Macau passaram a preferir associar escravos guineenses e macondes do Norte de Moçambique na vigilância das suas casas, barcos, viagens marítimas e negócios que se estendiam do Sudeste Asiático ao Oceano Índico. Os

IV

escravos da Guiné aparecem ainda documentados noutro acontecimento excepcional que abalou a harmonia do enclave português: em 1786, ocorre uma revolta violenta de escravos que sacudiu a cidade e ocupou uma das suas embarcações. Os escravos seriam atacados e presos já en plena fuga marítima por navios militares chineses, entregues às autoridades de Macau que os julgaram e condenaram com severidade. A documentação oficial disponível acusa escravos da Guiné e de Timor de terem incitado a rebelião. Estes motins sobretudo de escravos africanos contra escravos de diferentes proveniências, de escravos contra chineses instalados ou em circulação por Macau eram frequentes, fonte de preocupação, embaraços e insegurança. Em resultado, os escravos africanos vindos da Guiné e de Moçambique eram os mais caros tanto como temidos e procurados na protecção da cidade cristã de Macau e dos seus poderosos senadores. As relações históricas entre Macau e a Guiné-Bissau alimentam-se depois, desde as primeiras décadas do século XIX, com movimentos de pessoas de sentido contrário: chineses presos em Macau, condenados ao exílio em presídios guineenses. Os primeiros três chineses de Macau presos por crimes de ofensas corporais enviados para a Guiné documentam-se em 1822, depois encontrando-se notícias mais regulares. Algumas com impacto económico na Guiné. Assim, o Anuário da Guiné Portuguesa, do ano de 1948, conta pormenorizadamente a introdução do cultivo e comercialização do arroz na Guiné por dois chineses presos em Macau. Chamados Alassam e Catcham, chegaram ao porto de Bolama vindos de Macau em 1902, presos e exilados, acusados de homicídio e (quase se adivinhava...) jogo clandestino. Os dois andaram depois pelos matos de Tombali, fixaram-se em Catió, começaram a cultivar arroz e rapidamente a vendê-lo nos mercados de Bolama e Bissau. O envio destes chineses indesejáveis em Macau para as colónias portuguesas era processo recorrente e geral. Chegou mesmo a suscitar reflexões mercantilistas sobre a utilidade do seu uso no fomento agrícola e industrial colonial. Figura poderosa e dominante das duas primeiras décadas do século XIX macaense, o muito conservador ouvidor Manuel de Arriaga chegou a escrever sobre as vantagens de introduzir a plantação de ópio na Guiné e em São Tomé. O seu dedicado amigo e apoiante, o coronel de artilharia José Aquino de Guimarães e Freitas, antigo governador de Minas Gerais e reformador militar das esparsas tropas macaenses, deixou-nos na sua Memória sobre o território, impressa em Coimbra, em 1828, um conjunto de propostas para o desenvolvimento comercial de todas as colónias portuguesas que, através de uma companhia sediada em Macau, incluía a Guiné, propondo-se a introdução e exploração do algodão em terras guineenses para que pudesse vender-se nos mercados da Ásia e, com a intermediação de Macau, nos mercados chineses. Um veradadeiro Fórum de Macau com quase dois séculos de avanço.

Segunda-feira, 18 de Novembro de 2013 • LUSOFONIAS

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eve somar-se a estas ainda pouco estudadas relações históricas entre Macau e a Guiné-Bissau, essas outras comunicações solidárias que se foram estabelecendo cedo entre a República Popular da China e o movimento de libertação anti-colonial da Guiné e Cabo Verde. Assim, o PAIGC encontrou desde a sua fundação na República Popular da China apoio importante antes ainda do início da luta armada de libertação, em 1963. Na verdade, em Agosto de 1960, Amílcar Cabral visitou oficialmente a RPC liderando uma delegação do PAIGC em que se identificavam também Luciano Ndao, Richard Turpin e Dauda Bangurá. Reconhecido e apoiado pelo Partido Comunista chinês, vários militantes do PAIGC receberam treino militar em Pequim e Nanquim, incluindo o futuro Presidente Nino Vieira. Por isso, a RPC estabeleceu relações diplomáticas com a Guiné-Bissau ainda a 15 de Março de 1974, antes ainda da revolu-

ção do 25 de Abr português da inde China passou, de alguns programas novo país soberan ção do Estádio Na Bissau e da Estaç nologia Cereal, pa algumas equipas d créditos. Esta cooperaçã muito limitada, uma viragem na p governo guineens responsáveis chin 1990, a Guiné-Bis lecimento de rela Taiwan (o cheque Imediatamente, a cancelou as relaç a cooperação e aj sua Embaixada e r A cooperação

As

relações actuais pouco comércio, inv A

pesar dos muitos riscos políticos, económicos e sociais que infelizmente o presente da Guiné-Bissau, a China tem p ampliar a sua relação comercial e, sobretudo, a expressão qua e qualitativa da sua cooperação num período em que, após anti-constitucional de 2012, depondo um governo democrati eleito, o país africano de língua oficial portuguesa cavou ai fundo o seu isolamento internacional e sentiu a pressão asfixi bretudo dos EUA, na identificação e captura dos principais r veis que, nas forças armadas e no estado, precipitaram o terr plataforma giratória do narco-tráfico. A detenção pelos EUA d chefe da Marinha da Guiné-Bissau, Bubo Na Tchuto, no início deste ano em águas internacionais é mesmo mais do que u Uma situação que, ao contrário do que muitas vezes se insinu cupa também a China que experimentou problema semelha atrás em Myanmar, logo colaborando no desenvolvimento da s de narco-tráficos que ameaçavam as suas próprias fronteiras. Seja como for, os volumes dos intercâmbios comerciais b entre a China e a Guiné-Bissau são ainda, desde 2003, tão como extremamente favoráveis às exportações da RPC. Assim, ano, o comércio bilateral chegava a inexpressivos 1,2 milhõe lares, descendo em 2004 para pouco mais de 600 mil, descen mais em 2005 para 579 mil e, em 2006, para 568 mil, subind mente em 2007 para 745 mil, saltando significativamente em 2 muito escassos 2,4 milhes de dólares. Em 2010, as relações co bilaterais continuavam ainda mais do que limitadas: as exp da Guiné-Bissau para a China valeram 3.438.284 de dólares ( total), enquanto as importações representaram o triplo cheg 9.415.767 de dólares. Em 2011, o comércio bilateral foi apr mente de 17 milhões de dólares americanos, com exportações no valor de 13 milhões de dólares americanos e as importaçõe né a ficarem-se por 4 milhões. Tendência alargada no ano pas 2012, quando o comércio bilateral se situou em cerca de 22,5 de dólares, mas com as exportações guineenses a ficarem-se co mais de 1,5 milhões. Em termos gerais, a China exporta p mente cereais, manufacturas têxteis, motores, veículos de du e produtos mecánicos e eléctricos, importando quase exclusi castanha de caju, apesar de ter isentado 442 produtos agríc neenses de taxas de exportação. Interesses e volumes comerci

lusofo

O Reconhecimento

ril e do reconhecimento ependência guineense. A imediato, a concretizar s de cooperação com o no, ajudando na edificaacional, do Hospital de ção de Extensão da Tecara além de ter enviado de médicos e concedido

ão solidária, mas ainda seria interrompida por política internacional do se que chocou fundo os neses: a 26 de Maio de ssau anunciou o estabeações diplomáticas com e parecia compensar...). a 31 de Maio, a China ções diplomáticas, toda juda ao país, fechando a retirando cooperantes. e apoios vindos de Tai-

da República Popular da China e a transferência para Taiwan

pé encontram-se por estudar e desfibrar, tendo-se mesmo tornado tema ocultado num país que hoje procura ampliar as relações económicas e comerciais com a China, parceiro mais do que indispensável do desenvolvimento africano. Sabe-se que Taiwan enviou também equipas sanitárias e técnicos agrícolas para a Guiné-Bissau, libertando algumas verbas de que se desconhece o volume. Durou oito anos. A 23 de Abril de 1998, a Guiné-Bissau resolveu restabelecer as relações diplomáticas com a RPC, cortando definitivamente com Taiwan que, nesse preciso ano, perdeu o seu mais significativo apoio no continente africano: o Presidente democraticamente eleito da África do Sul, Nelson Mandela, decidiu inaugurar relações diplomáticas com a República Popular da China. Nos anos seguintes, a maior parte dos países africanos que ainda apoiava Taiwan foi-se passando para o mais abrigado e promissor lado da RPC.

Depois do corte do Senegal com Taipé, em 2005, actualmente apenas quatro países africanos continuam a manter relações diplomáticas com Taiwan, incluindo São Tomé e Príncipe, assim impedindo a sua integração no Fórum de Macau. A partir da fundação deste nosso Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua oficial portuguesa, recentemente saído de Macau com sucesso e, espera-se, renovado vigor da sua IV Conferência Ministerial, as relações comerciais bilaterais entre a Guiné-Bissau têm vindo timidamente a melhorar, acompanhadas de alguns investimentos, várias promessas de apoio ainda por concretizar e uma generosa cooperação concorrendo para a edificação de alguns dos mais importantes edifícios governamentais e públicos do país. Um processo a procurar seguidamente captar nas suas cifras e significados principais apoiado na assinatura de vários

acordos de cooperação, visitas mútuas de responsáveis estatais e o reconhecimento fundamental pela Guiné-Bissau, em Julho de 2006, do princípio de uma só China, no preciso ano em que o antigo Presidente Nino Vieira participava em Pequim no decisivo Fórum China-África (FOCAC).

s entre a China e a Guiné-Bissau: vestimento limitado e cooperação generosa

e pautam procurado antitativa s o golpe icamente inda mais iante, soresponsáritório em do antigo o de Abril um aviso. ua, preoante anos supressão . bilaterais limitados , naquele es de dóndo ainda do ligeira2009 para omerciais portações (3.70% do gando aos roximadas chinesas es da Guissado, em 5 milhões por pouprincipaluas rodas ivamente colas guiiais ainda

onias

muito marginais, conquanto exista naturalmente interesse da RPC nas anunciadas (na verdade, desde o período colonial) ricas reservas de petróleo na zona marítima exclusiva da Guiné-Bissau, longe de rigorosamente identificadas e, muito menos, materializadas. Muito mais concreta é a presença da frota pesqueira chinesa nas águas ricas da Guiné-Bissau: em 2006, o governo guineense foi o primeiro a assinar com a RPC um acordo de pesca em águas profundas abrindo a porta da sua Zona Económica Exclusiva aos actuais 20 barcos chineses da poderosa China Fisheries Corporation. Com este modelo de comércio muito limitado e desigual, a cooperação chinesa na Guiné-Bissau não funciona exclusivamente como suporte comercial, expressando sincera ajuda. Um pouco mais de 100 estudantes guineenses beneficiaram de bolsas para frequentarem universidades chinesas; 13 cooperantes médicos continuam activos no país afri-

cano; 15 técnicos agrícolas chineses procuram desenvolver em Bafatá, Oio e Cabu o cultivo de arroz híbrido, a que se devem somar várias outras ajudas na doação de medicamentos, equipamentos, arroz no volume de 2000 toneladas ou mesmo, em 2005, 1,2 milhões de dólares para ajudar o governo de Bissau a receber a cimeira da CPLP. No entanto, como noutros países africanos, incluindo os de oficial expressão portuguesa, a cooperação chinesa na Guiné-Bissau sobressai pela construção de edificíos e estruturas mais do que necessárias. Assim, a RPC ergueu em Bissau o grande palácio da Assembleia Nacional Popular, o palácio governamental, reabilitou também o palácio presidencial muito destruído durante a guerra civil, recuperou e ampliou o Hospital regional de Canchungo, construiu residências para os ex-combatentes, ofereceu uma Escola de Amizade Sino-Guineense e voltou a reabilitar o Estádio Nacional de Bissau erguido ainda durante os primeiros anos de independência. Em contraste, a presença de firmas chinesas é limitada a umas cinco dezenas de lojas de retalho, muitas com ligações a Portugal. Mais expressivos têm sido os esforços de investimento da GeoCapital, com sede em Macau, sobretudo com a aquisição do guineense Banco da África Ocidental. O que se espera poder constituir exemplo para outros investimentos macaenses. LUSOFONIAS • Segunda-feira, 18 de Novembro de 2013

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i ka ten problema (não

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uando se percorre a Guiné-Bissau e se fala com os cidadãos comuns, é frequente ouvir-se, apesar da muita pobreza, dos problemas graves e de um desenvolvimento continuadamente adiado, a expressão largamente partilhada: i ka ten problema. Em alguns casos, sobretudo em Bissau e noutras cidades, pode mesmo encontrar-se alguém capaz de se expressar razoavelmente em lusa linguagem para nos dizer “que no tempo dos portugueses estava-se melhor”. No entanto, significativamente, nunca encontrei rigorosamente um único destes guineenses que quisesse voltar a ser português ou a ver o seu país orgulhosamente independente a regressar ao domínio de Portugal. Têm razão, mais ainda quando insistem no “não tem problema”. Ao contrário do que muitas vezes se diz e escreve, a Guiné-Bissau não é nem um país pequeno, nem muito menos pobre (em rigor, a esmagadora maioria das pessoas é que são pobres...), apesar de se encontrar nas piores classificações em todos os índices internacionais de desenvolvimento: possui uma generosa rede hidrográfica, extraordinária cobertura vegetal, potenciais 90 milhões de hectares aráveis, recursos pesqueiros importantes, gente generosa e disposta a trabalhar. Sendo ainda de recordar que a Guiné-Bissau é maior em território do que a Bélgica, pelo que, em rigor, os países como as pessoas não se medem aos palmos O legado económico colonial português foi dos piores: limitada rede viária, unindo três ou quatro centros mais ou menos urbanos, mas negligenciando o acesso ao interior, limitando muito o escoamento das produções agrícolas; um sistema de monopólio comercial em que se dizia ser a Guiné uma quinta da CUF, para a qual eram obrigados a vender os produtores locais; industrialização e introdução de tecnologias não houve, descontada essa única fábrica de cerveja que vendia para as tropas portuguesas; uma administraçãoo assente maioritariamente em funcionários de Cabo Verde que saíram do país logo após a independência; uma taxa de analfabetismo acima dos 95%, mortalidade infantil enorme, problemas sanitários recorrentes, mais do que escassos falantes de português o que ampliava a falta de quadros e técnicos. O Estado independente não melhorou a economia e a qualidade de vida dos guineenses. A nacionalização sistemática das empresas comerciais portuguesas não encontrou meios financeiros e gente preparada para as gerir, pelo

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tem problema)

que a maior parte afundou-se depressa. Alguns investimentos industriais exagerados não assentaram em mão-de-obra preparada e capitais suficientes para adquirir matérias-primas, pelo que naufragaram também rápido. O desenvolvimento agrícola foi esquecido, tornou-se menos diversificado, agora praticamente assentando na produção dominante da castanha de caju, uma espécie de monocultura sujeita a jogos comerciais monopolistas. O sistema fiscal não foi organizado, obrigando o país a viver nos primeiros anos de independência de constantes emissões

de moeda cada vez mais desvalorizada com que se pagavam os funcionários públicos e se multiplicava a inflação. Muitos investigadores e observadores da história recente da Guiné-Bissau encontraram naquelas disfunções económicas com dramáticos efeitos sociais as causas para o golpe de estado de 1980, o famoso movimento de reajustamento dirigido por Nino Vieira. Contudo, o chamado Programa de Ajustamento Estrutural que se lhe seguiu ao longo da década de 1980 piorou ainda mais a economia guineense ao cruzar desmedidamente abertura de mercados, austeridade, liberalização num país praticamente sem mercado interno e uma mais do que limitada classe empresarial, capitalização escassa e volumes gigantescos de economia informal. Incapaz de continuar a suportar a situação económica-financeira de crise com sucessivas emissões de moeda, em 1997, a Guiné-Bissau aderiu à União Económica e Monetária da África Ocidental (UEMOA), adoptando como moeda o franco CFA, assim procurando maior integração regional que frutos concretos ainda não rendeu nem poderia render face à desorganização estatal, marasmo

económico, pobreza muita e Estado de Direito mais do que pouco: a taxa de mortalidade infantil de 130 por mil é das piores do mundo, a esperança de vida queda-se pelos 49 anos e o PIB per capita situa-se em miseráveis 200 dólares anuais. Por isso, agora, desde 28 de Setembro escola e aulas não há na Guiné-Bissau: os professores continuam em greve à espera que alguém lhes pague os devidos ordenados. A situação política não ajuda com a sua adiada transição. O primeiro-ministro deposto no golpe de 2012, Carlos Gomes Jr., anunciou a sua candidatura às eleições presidenciais, sendo mais do que provável o regresso habitual do PAIGC ao poder presidencial e governamental. Pedir-se-á (fica mal a um estrangeiro exigir, conquanto, como se sabe, os organismos internacionais o façam...), então, juízo e contenção, unidade e inclusão, mobilizando competências mais do que as habituais clientelas partidárias. Mas pede-se, principalmente, um novo modelo de desenvolvimento assentando nas potencialidades locais, agrícolas, agro-industriais e pesqueiras, nas oportunidades abertas pela aceleração do processo de globalização, decididamente comprometido com o bem-estar social. As eleições por si só não são condição de desenvolvimento, conquanto sejam exigência de direito e constitucionalidade. E é precisamente aqui na preparação de um novo modelo de desenvolvilmento sustentado que o Fórum de Macau parece poder ser especialmente actuante, preparando técnicos, oferecendo formação, ajudando a organizar projectos e contribuindo para uma mais qualificada cooperação e investimentos da República Popular da China na Guiné-Bissau. Macau tem condições de desenvolver esta intermediação, sendo suficiente destacar o exemplo da Associação dos Guineenses da RAEM reunindo gente preparada, qualificada e para os quais não existem tensões políticas, ambições desmedidas e marginalizações partidárias. Um exemplo em que se ilustra que os guineenses podem administrar um aeroporto, ser excelentes advogados, técnicos qualificados, gente trabalhadora, realizadora, solidária e feliz. Exemplo a imitar e fonte de inspiração para todos aqueles que ainda sonham com uma Guiné-Bisau livre e democrática, desenvolvida e, finalmente, apoiada por este mundo cada vez mais exigente e global.

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A poesia do pensamento de Agostinho Neto

Publica

textos de estudo e opinião sobre a diversidade cultural das Lusofonias

na arquitectura da Nação Literária Angolana

Ideias A M. J. Aires dos Reis*

“(...) A relação de forças é tambem estrutural, devendo nós atentar no espaço formado pela totalidade dos universos nacionais como um incomensurável universo de competição generalizada. Qualquer escritor representativo de um espaço nacional é fortemente delimitado pelo lugar que ele próprio ocupa na estrutura mundial, com a qual aliás se defronta, enquanto estrutura de poder, no momento em que se dá a ler. No entanto, malgrado a proclamações e as aparências que se lhes imprimem, os espaços nacionais, mesmo quando se digladiam, não são iguais (...)”

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s nações são entidades recentes, susceptíveis de serem estudadas, estando distantes de ultimar a sua evolução. Quando colocamos a questão da sua existência, seja ela literária ou não, emergem logo duas formulações: a que a encara na sua unicidade, e a que a encara na sua irrelevância, por força da globalização das trocas comerciais, globalização essa que faz emergir no mundo configurações inovadoras em termos políticos, económicos e culturais. Quer dizer, quando falamos de nações, ou escolhemos uma série de casos particulares – e neste caso somos forçados a contemplá-las de forma justaposta, em unidades separadas e cerradas, sem relação entre elas, sem histórias comuns, soberanas e auto-suficientes –, ou postulamos que a nação é uma unidade de medida perimétrica, uma espécie de antigualha conceptual que não deve ser levada a sério. Se adoptarmos esta ultima acepção, estaríamos libertos de entraves antiquadas, que nos confinam a fronteiras nacionais, aliás cada vez mais obsoletas, sendo-nos reconhecidos verdadeira cidadania global. Existe, no entanto, uma terceira forma de colocar a questão, fintando as duas perspectivas que parecem simétricas: é possível recusar a oposição entre o nacional e o internacional, como termos de uma escolha exclusiva. Mais do que decidir entre o quadro nacional e o panorama global, proponho observar os fenómenos literários (que é o que aqui nos interessa) à escala nacional, mas a partir do «promontorio» mundial, se quiser fazer uso de uma metáfora cara a Fernand Braudel (BRAUDEL, s/d.: 9). Estou em crer que, por esta via, se compreenderá melhor os fenómenos nacionalistas e literários, ainda que as produções possam ser inseparavelmente nacionais e internacionais. Além disso, mais do que definir a nação e o nacionalismo como entidades concretas, tente-se, por hipótese – esta palavra é relevante –, caracterizá-los, antes de tudo, como formas de crença numa sociedade, esta mesma como forma suprema de identificação. Marcel Mauss mostra, aliás, que tal crença nacional é simultaneamente interna e externa à nação. Mauss designa-a «crédit national», sublinhando que é um sistema circular: «l’ ensemble des citoyens d’un Etat», escreve, «forme une unité où l’on a la même croyance dans la mesure où ils ont confiance dans cette unité» (MAUSS, 1969: 590). Entender a nação como crença colectiva parece estar na base do engendramento da poesia do pensamento de Agostinho Neto. A ser assim, leiamos Sagrada Esperança como tese da criação de uma nação, a partir da sua percepção como «artefacto

cultural». Instalemo-nos então na implicação mais visível deste gesto de leitura, que é reconhecer que, na Sagrada Esperança, ocorre o gesto fundacional da literatura angolana: o da construção da sua arqueologia, para a equipar de ferramentas necessérias que a coloquem no terreno de lutas simbólicas. Há, portanto, na poética de Sagrada Esperança o pensamento subjacente de que só o tempo outorga a uma nação a força e o poder necessários para que ela possa ser ela própria. Este pensamento estratégico resulta de uma equação simples: o capital cultural de uma nação engendra-se sobretudo no tempo arquivado, transformado em recursos. Agostinho Neto terá feito deste capital temporal (concebido a partir de passado preservado), transformado em riqueza específica, uma das duas condições de legitimação de uma nação: Lá vai ele/o homem/com os olhos no chão./Vê-se-lhe o dorso sob a camisa rota/e carrega o pesado fardo/ da ignorância e do temor./Não grita seus anseios/no receio de perturbar um mundo/que o ofusca/com o falso brilho dos seus ouropéis./Contudo/já foi senhor/foi sábio/ antes das leis de Kepler/foi destemido/ antes dos motores de explosão./É dos seus dias de glória/que tenho saudade/Saudade de mim […]? (Neto, 1974: 63) O RITMO CONSTRUTIVO DO NOVO O facto de as nações serem engendradas na base da sua antiguidade é prova da luta que as contrapõem à antiguidade como facto ou como construção. É por isso, aliás, que elas se tornam imediatamente objectos de disputa, de rivalidades. A finalidade será só uma: o desígnio de delas fruir. A antiguidade (como a modernidade) é obviamente uma noção relativa. Uma identidade não se pode proclamar ou mesmo reclamar “arcaica” a não ser em relação a outras entidades que se afirmam da mesma forma. Em termos históricos Ocidentais, a antiguidade de um grupo aristocrático deduz-se a partir de uma estimação (fantasmática, mas fundada numa crença partilhada) da sua filiação com os Gregos e os Romanos, por conseguinte da pertença directa a uma genealogia antiga e nobre. De acordo com os dados da história, Herder, inspirando-se em James Macpherson (1736-1796), terá promovido, a partir do século XVIII, uma nova forma de medir o tempo na contenda internacional. No seu sistema de concepção inédito, será sempre a construção social do CONTINUA NA PÁGINA SEGUINTE > LUSOFONIAS • Segunda-feira, 18 de Novembro de 2013

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< CONTINUADO DA PÁGINA ANTERIOR

tempo a medida de todas as coisas. Esta construção surge, aliás, sob forma de contestação do status quo, isto é, do carácter unívoco da linearidade histórica que conduziria a Antiguidade grega e latina até nós. Através do pensamento herderiano, o paradigma passou a estar depositado nos povos, que passaram a estar munidos de ferramentas para “provar” que podem concorrer com os aristocratas na “produção” (vale dizer, na “construção”) tanto da sua Antiguidade como da sua epopeia, outra face de engendrar a sua nobreza e a sua legitimidade. Agostinho Neto diria no poema «Saudação» que «[aquela era] a hora de juntos marcharmos/corajosamente/para o mundo de todos/os homens». Esse mundo seria o da tradição que a nação haveria de fazer germinar. Clama-se nestes versos por ferramentas iguais que arquitectem a existência de uma nação na sua diferença constitutiva. Quando Neto escreve, no poema «Um aniversário» que «No mundo/a Coreia ensanguentada às mãos dos homens», quando dá conta de «fuzilamentos na Grécia e greves na Itália/o apartheid na África/e a azáfama nas fábricas atómicas para matar/em massa matar cada vez mais homens» encobre a asserção programática de que o que forja uma nação não é uma essência, nem um traço preexistente que será a confirmação da entidade nacional. É a relação de forças entre territórios e espaços (“Coreia”, “Grécia”, “Itália” e “África”, por exemplo) que pelejam entre si e que, apostando em diferenciar-se, engendram as suas existências. Dito de outro modo, «[…] no mundo constrói-se/no mundo constrói-se/E o nosso formado em Medicina/construirá também». Ou seja a contenda para a “construção”, enquanto contenda para o reconhecimento da diferença produz identidade. No paradigma nacionalista subjacente a esta poética, nação não é entendida como essência, nem como uma singularidade inalienável, mas como relação. Eis a razão da inexistência de características estritamente nacionais nas literaturas nacionais. Não existe pois uma definição per se de uma literatura nacional que dependa da sua essência autárcica. Estes argumentos devem, no entanto, ser encarados no seu duplo sentido, porquanto existe, nesse jogo de oposição e de concertação, uma relação de forças directa e uma indirecta. Por um lado, todo o nacionalismo literário tira grande partido da sua autodefinição, perante o seu concorrente directo (no caso da literatura angolana, trata-se da equação Angola-Portugal). Terá sido neste sentido que Hagen Schulze, pensando na Europa do século XIX, releva que «l’affirmation de soi par réaction contre un ennemi abhorré» é um dos grandes mecanismos de formação das identidades nacionais (Schulze, 1996: 130). Aliás, Schulze vai mais longe, afirmando que «la guerre n’est pas à l’origine de la nation mais bien solvente son catalyseur». Com efeito, depois da sua concepção, acrescenta o estudioso, a provocação mútua entre os vizinhos e a hostilidade permanente foram, para as nações europeias, «uma forma de se encontrarem» (ibid., 133). Por outro lado, a rivalidade, sendo estrutural, depende de relações de forças objectivas entre protagonistas. Para ilustrar o primeiro tipo de rivalidade, tomemos como exemplo a literatura angolana, em geral. Parece impossível compreender a sua periodologia fundacional sem ter em linha de conta a relação de rivalidade explícita dos seus escritores com os escritores portugueses, na sua vontade de revindicar uma independência (e, logo, uma auto-suficiência) literária relativamente ao que era, para eles, o inatingível poderio literário português. Terá sido exactamente

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por isso que, desde o início, a obra de Agostinho Neto aparece-nos marcada por uma clara determinação de conceber território. Esta lucidez programática presentifica-se em cada verso de Sagrada Esperanca, sendo exemplar no verso com que termina o poema «À reconquista»: «Vamos com toda a Humanidade/conquistar o nosso mundo e a nossa Paz». Mas, sabemo-lo, a concorrência entre nações não se resume a lutas entre vizinhos, entre irmãos desavindos que se conhecem. A relação de forças é tambem estrutural, devendo nós atentar no espaço formado pela totalidade dos universos nacionais como um incomensurável universo de competição generalizada. Qualquer escritor representativo de um espaço nacional é fortemente delimitado pelo lugar que ele próprio ocupa na estrutura mundial, com a qual aliás se defronta, enquanto estrutura de poder, no momento em que se dá a ler. No entanto, malgrado a proclamações e as aparências que se lhes imprimem, os espaços nacionais, mesmo quando se digladiam, não são iguais. A rivalidade generalizada entre eles é produto evidente de desigualdades reais existentes, entre eles, porquanto «são desiguais em tamanho, em poder, na riqueza, na civilização e na idade», insiste Marcel Mauss (ibidem). Ora, em numerosos universos nacionais, a crença nacionalista é, de facto, extremamente forte, reinando neles a convicção colectiva de que a identidade nacional é portadora de uma parte essencial da identidade colectiva e individual, sendo receptáculo de uma forma de honradez colectiva, em que cada protagonista se torna simultaneamente responsável. Nesta perspectiva, a literatura “nacional” torna-se um dos terrenos centrais de uma revindicação de existência nacional, na sua significação e na sua história. Terá sido exactamente isso que Neto assume quando, num poema de 1950, intitulado «Novo Rumo», escreve: «O destino/é a própria História/o Início/a Concordância/Somos o ritmo construtivo/do Novo/ na alta noite/dos caminhos sem nome?» (Neto, 1987: 42) Qualquer povo deseja ter os seus homens de negócios, os seus professores, os seus jornais e a sua arte. No que concerne a literatura, uma das formas de restaurar uma certa forma de igualdade passa por forjar instrumentos críticos distintos, o que Neto designa «ritmo construtivo/do Novo». Será com esses instrumentos que se torna possível aceder à universalidade, pois a desigualdade entre literatura, longe de ser uma questão de valor, que se aclarará por si, é um facto estrutural. Pense-se em nomes como Kafka, Joyce, Beckett para convalidar estes argumentos. Pense-se no próprio Agostinho Neto, quando declara que «a cultura [angolana] não [deverá ficar] encerrada em Angola» (Neto, ibid.: 18). Aliás, Kafka terá sido o primeiro teórico desta questão. Num texto datado de 25 de Dezembro de 1911, estabelece uma distinção entre literaturas de «pequenas comunidades» e as de «grandes nações» (große Literaturen). Terá sido a partir do conhecimento que possuía sobre o carácter “minoritário” das literaturas checas e yiddish que Kafka esboçará a sua teoria de desigualdade entre as literaturas das nações. Para Kafka, o critério é claramente um critério exterior à literatura: as literaturas menores seriam espaços em que se pode estabelecer um nexo entre as lutas nacionalistas e lutas literárias, ou seja, são espaços em que a literatura colide com a política. Na obra A Renúncia Impossível, já citada, a forma dominante assenta na ideia de uma enunciação que descobre a sua consciência da clivagem entre o outro (europeu, arrogante) e o eu, que clama ironicamente por reconhecimento: «nunca houve negros!/A África foi construída só por vós […]» (Neto, ibid.: 60). A meu ver, estes versos, profundamente irónicos, configuram a assinatura de toda a retórica da poesia do pensamento de Agostinho Neto: a

assinatura de uma alegoria nacionalista. A formulação de Neto é de várias maneiras um passo em direcção de uma declaração de combate, na medida em que assume na sua escrita a ideia de movimento colectivo; na medida em que a sua retórica acomoda a necessidade de reconhecimento simultaneamente político e literário; e ainda na medida em que reconhece um processo descortinável na tese de que «Nunca houve descobrimentos» e que «A África foi criada com o mundo» (Neto, op. cit.:61). Podemos agora discutir várias formas de percepção do que Neto quererá dizer com a tese de que a África fora «criada com o mundo». Trata-se de uma formulação de filiação da literatura na política, e consequentemente uma declaração de “guerra”, em favor de um reconhecimento de existência. A nação torna-se, assim, central na sua poesia e nevrálgica no seu pensamento. Kafka terá usado a distinção entre as grandes (tinha em mente a Alemanha) e as pequenas literaturas; T.S. Eliot terá preferido a designação incisória entre literaturas «amadurecidas» e «não-amadurecidas» (ELIOT, 1945); Marcel Mauss oporá as «nações jovens» a «nações antigas» (MAUSS, op. cit.); Deleuze e Guattari proporão a distinção entre o que chamam literaturas «menores» e «maiores» (DELEUZE et al., 1975); Jameson, por sua vez, avança com os termos de literaturas do Terceiro mundo e as de Primeiro (JAMESON, 1986); Franco Moretti, retomando uma tipologia cara a Immanuel Wallerstein, opta por operar a clivagem entre literaturas do centro, da periferia e as da «semi-periferia», Casanova avança com a distinção entre literaturas combativas e literaturas pacificadas do ponto de vista da revindicação nacionalista (CASANOVA, 2011). É importante, a terminar este movimento em redor de concepções de literatura, anotar a proximidade possível entre as formulações de Casanova com as de poética explícita de Agostinho Neto. Com efeito, no seu discurso de 10 de Dezembro de 1975, sobre a cultura nacional, Neto terá declarado explicitamente que «a luta pela libertação nacional não pode desligar-se da luta pela imposição, pelo reconhecimento de uma cultura peculiar do nosso povo» (NETO, 1980: 17). Ou seja, de todos os envelopes ideológicos onde se concretiza a nação, a mais corpórea é, para Neto, a cultura. Mas esta radicação na cultura não contradiz a tensão em direcção a um funcionamento que dela se liberta: a ideia de espírito comum. A apologia dos bens espirituais de Angola são, na poesia de Neto, um lugar onde uma estratégia joga a aplicação do seu projecto literário, pois os fundamentos da nação que se quer engendrar radicam nesses bens suprapessoais, nessas instituições que deflectem da vontade comum e, enfim, nessa tradição cultural comum. *Académico e ensaísta.

BIBLIOGRAFIA BRAUDEL, Fernand. Le Temps du monde. Civilisation materielle et capitalisme. Paris: Armand Colin, t. 3, 1993. CASANOVA, Pascale. Des litteratures combatives. Paris: Ed. Raisons D’Agir, 2011. DELEUZE, Giles et alia., Kafka. Pour une literature mineur. Paris: Minuit, 1975. ELIOT, T.S. What is a Classic? London: Faber & Faber, 1945. JAMESON, Fredric, Third-World Literature in the Era of Multinational Capitalism?, New Political Science, 15, 1986. KAFKA, Franz, «Journaux», in Oeuvres completes, Claude David (ed.). Paris: Gallimard, t. III, 1984. MAUSS, Marcel. «La Nation et l’Internationalisme», in Oeuvres. Paris: Minuit, 1969, III. SCHULZE, Hagen. Etat et nation dans l’histoire de l’Europe. Paris: Seuil, 1996. NETO, Agostinho. Sagrada Esperança. Lisboa: Sá da Costa, 1974. NETO, Agostinho. Ainda o Meu Sonho. Lisboa: Ed. 70 para a União dos Escritores Angolano, 1980. NETO, Agostinho. A Renúncia Impossível. Lisboa: IN-CM, 1987.

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