Hepatotoxicidade de plantas medicinais. LII. Ação da Infusão de Solanum lycocarpum St. Hil. no rato

June 5, 2017 | Autor: Wilson Cunha | Categoria: Investigação
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ORIGINAL

Hepatotoxicidade de plantas medicinais. LII. Ação da Infusão de Solanum lycocarpum St. Hil. no rato* Hepatotoxicity of medicinal plants. LII. Action of infusion of Solanum lycocarpum St. HIL. in rat

Roberta Scarpel 1 Wilson Roberto da Cunha 2 Ruberval Armando Lopes 3 Marcos Alexandre de Souza 4 Paulo Eduardo V. de Paula Lopes 5 Miguel Angel Sala 6 Simone Cecílio Hallak Regalo 7 Sérgio Olavo Petenusci 8 Graduandos em Biomedicina pela Universidade de Franca (Unifran). 1, 4

* Trabalho de Conclusão de Curso da autora Roberta Scarpel Professor do curso de Biomedicina da Universidade de Franca (Unifran). 3 Professor titular da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/ Universidade de São Paulo (FORP-USP) e assessor de Patologia da Universidade de Franca (Unifran). 5 Geógrafo e docente da Faculdade Bandeirantes – Ribeirão Preto. 6, 8 Professores titulares da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/ Universidade de São Paulo (FORP-USP). 7 Professor Doutor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/ Universidade de São Paulo (FORP-USP). 2

resumo: o presente trabalho teve por objetivo o estudo da hepatotoxicidade de Solanum lycocarpum St. Hil. sob a forma de infusão. Para tal, foram utilizados ratos albinos, variedade Wistar, pesando em média 185 gramas. Durante dez dias, os animais receberam no bebedouro infusão de frutos de lobeira (10 g/litro de água) ad libitum. Após o sacrifício pelo éter, foram colhidos fragmentos de fígado, sendo estes imersos em formol a 10% e deixados a fixar durante 24 horas. Após inclusão em parafina, as peças foram seccionadas com 6 µm de espessura e os cortes corados com hematoxilina e eosina. A estrutura hepática foi analisada ao microscópio de luz e avaliada cariométrica e estereologicamente. Ao exame histopatológico, os cortes mostraram hepatócitos de maior volume, alguns com citoplasma granuloso e vacuolado e outros com maior acidofilia; seus núcleos eram semelhantes aos dos controles, porém mais arredondados, sendo que alguns estavam em lise. Os vasos estavam dilatados e o espaço-porta, desorganizado. Foram observados focos de inflamação crônica entre os hepatócitos e no espaço-porta. Cariometricamente, os núcleos dos hepatócitos mostraram-se semelhantes aos dos controles. Estereologicamente, foi possível observar um grande aumento dos volumes celular e citoplasmático e menor quantidade de células por mm3. Em suma, a infusão de frutos de lobeira provocou alterações significantes no fígado do rato.

Palavras-chave: lobeira; fígado; rato; fitoterápico; histometria.

Abstract: the present work had as objective the study of the hepatotoxicity of Solanum lycocarpum St. Hil. under the infusion form. For this, it was used, albinic rats (Wistar), weigthing about 185 grams. During ten days the animals received in the water an infusion of Solanum lycocarpum (10g/L of water) ad libitum. After the sacrifice through ether, it was collected fragments of the liver, being these ones immersed in formaldehyde in 10% fixing during 24 hours. After inclusion in paraffin the parts were divided with 6µm thickness and the cuts stained with hematoxylin and eosin. The hepatic structure was analyzed at the light microscope and evaluated karyometrically and stereologically. To the histopatological exam, the cuts shown hepatocytes of bigger volume, some with granular cytoplasm and vacuolated and others with bigger acidophile; its nuclei were similar to the control ones, however, more rounded and some were in lysis. The vessels were dilated and the portal space disorganized. It was observed incidence of chronic inflammation between the hepatocytes and in the portal space. Karyometrically, the nuclei of the hepatocytes revealed itself similar to the control ones. Stereologically, it was possible to observe a great increase of cellular volumes and cytoplasmatic and a smaller amount of cells per mm3. Summarizing, the Solanum lycocarpum infusion provoked significant alterations in the liver of the rat.

Key words: Solanum lycocarpum; liver; rat; phytotherapic; histometry.

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INTRODUÇÃO Solanum lycocarpum St. Hil., família Solanaceae, conhecida como lobeira, fruto-de-lobo, capoeira-branca, berinjela-do-mato, jurubebão, baba-de-boi, loba, jurubeba-de-boi, etc., é um arbusto grande ou árvore pequena de 3 a 5 m de altura, com copa arredondada e aberta, com espinhos grandes nos ramos, nativa do Brasil em áreas de cerrado. Suas folhas são simples, alternas, coriáceas, branco-tomentosas na face inferior, de margens lobadas, de 16 a 28 cm de comprimento. Os seus frutos são bagas globosas verdes, lisas, de 8 a 13 cm de diâmetro, contendo polpa carnosa com muitas sementes. Multiplica-se por sementes, mas é capaz de rebrotar a partir das raízes quando cortadas, o que a torna uma planta daninha persistente em áreas de cerrado (CARIBÉ; CAMPOS, 1977; LORENZI; ABREU MATOS, 2002). O lobo-guará do cerrado ingere uma dieta alimentar com cerca de 50% de frutos da lobeira, sendo estes frutos utilizados pela população no preparo de doces e geléias. São empregados, também, na medicina popular por sua ação diurética, calmante, antiespasmódica, antiofídica e antiepilética. O chá das folhas (decocção) é indicado contra afecções das vias urinárias, cólicas abdominais e renais, espasmos e epilepsia. (CARIBÉ; CAMPOS, 1977). O amido dos frutos é empregado no tratamento do diabetes, sendo que sua eficácia foi comprovada após testes em humanos (GR ASSELLI, 2001). Verrugas são eliminadas após aplicação externa do suco dos frutos da lobeira (MORS; RIZZINI; PEREIRA, 2000). Os frutos assados e quentes são indicados em aplicação direta sobre órgãos atrofiados para a sua reconstituição; o chá de suas folhas por decocção em uso interno é indicado contra hemorróidas (CARIBÉ; CAMPOS, 1977). O pó obtido do fruto da lobeira é utilizado comumente como agente hipoglicemiante pela população de Caratinga-MG (SÁ et al., 2000). O objetivo do presente trabalho é verificar a hepatotoxicidade da infusão dos frutos da lobeira em ratos. MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizados 10 ratos Wistar machos, pesando 185 g em média, os quais receberam no bebedouro a infusão de frutos da lobeira, na concentração de 10 g/litro de água ad libitum, durante 10 dias, após o Investigação – Revista Científica da Universidade de Franca

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que foram sacrificados e imediatamente colheu-se o fígado, o qual foi fixado em solução de formol a 10% durante 24 horas. Os cortes histológicos, de 6 µm de espessura, foram corados por hematoxilina e eosina. Para a análise cariométrica do fígado, os cortes foram focalizados ao microscópio óptico Nikon, com objetiva de imersão (100x), munido de uma câmera clara Nikon. Os núcleos foram projetados sobre papel (1000x), e as imagens nucleares obtidas dos hepatócitos foram contornadas com lápis e os diâmetros maior e menor dessas imagens foram medidos com uma escala milimetrada. Uma vez determinados os eixos maior (D) e menor (d), foram estimados os seguintes parâmetros cariométricos (SALA et al., 1994): a) Diâmetro médio: M = (D.d)½ b) Relação D/d. c) Perímetro: P = (π / 2).[ 1,5 . (D+d) – M] d) Área: A= (π / 4) . M 2 e) Volume: V = (π / 6) . M 3 f) Relação V/A g) Coeficiente de forma: F=4.π. A/P2 h) Índice de contorno: I= P/A½ i) Excentricidade: E= [(D+d). (D-d)]½ / D O volume relativo de hepatócitos e sinusóides foi calculado pela técnica de Chalkley (1943), empregando-se uma grade de 100 pontos: Vv= (Ph + Ps) / P t onde Ph são os pontos contados sobre os hepatócitos, Ps são os pontos sobre os sinusóides e P t são os pontos totais. Com o emprego de técnicas estereológicas foram estimados os seguintes parâmetros, de acordo com Sala; Lopes; Matheus (1992): volumes citoplasmático e celular dos hepatócitos, a relação N/C e a densidade numérica dessas células (número de hepatócitos por mm3), utilizando-se uma grade de 100 pontos. Para a análise estatística dos dados foi utilizado o teste não-paramétrico de Mann-Whitney. RESULTADOS Os fígados dos ratos sob ação da lobeira mostraram-se histologicamente com vasos dilatados e congestos; hepatócitos de maior volume, alguns com v. 6

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citoplasma granuloso e vacuolado e outros são mais acidófilos, com núcleos grandes e alguns em lise; além de espaço-portas desorganizados. Foram observados focos de inflamação crônica entre os hepatócitos e no espaço-porta (Figura 1).

Figura 1 - Aspecto histológico do fígado de rato tratado com lobeira. Notar hepatócitos volumosos, granulares e vacuolados. HE (900×).

Cariometricamente, observou-se que não houve diferenças significativas para os diâmetros maior (7,25 e 7,29 µm, respectivamente para o animal controle e o tratado com lobeira), menor (5,90 e 6,72 µm) e médio (6,25 e 6,99 µm), para o perímetro (20,72 e 16,85 µm), área (34,14 e 38,37 µm2) e volume (154,88 e 170,77 µm3). Os núcleos apresentaram modificação na forma, já que os valores eram estatisticamente diferentes para excentricidade (0,53 e 0,40*), coeficiente de forma (0,98 e 1,00*) e índice de contorno (3,58 e 2,72 *), sendo pois mais arredondados. Eram significantemente maiores os valores para os volumes citoplasmático (1880,01 e 6534,56* µm 3) e celular (2034,89 e 6705,33* µm 3 ), e menores para a relação N/C (0,077 e 0,030) e para a densidade numérica (494535,4 e 164522,9*/ mm3) dos hepatócitos dos ratos tratados (* p < 0,01). DISCUSSÃO Não há referência na literatura sobre as contra-indicações, os efeitos colaterais, seu uso durante a gestação e lactação, precauções, interações e superdosagem. Em um estudo hematológico utilizando Solanum lycocarpum St. Hil. em ratos, Moreti et al. (2004) observaram um quadro de leucocitose, eosinofilia, neutrofilia e linfopenia. Investigação – Revista Científica da Universidade de Franca

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No presente trabalho, foi possível observar, no fígado, hepatócitos volumosos e com citoplasma vacuolar. O espaço-porta estava desorganizado e foram observados focos de inflamação crônica entre os hepatócitos e no espaço-porta. Alguns trabalhos realizados mostraram a influência do fruto da lobeira no desenvolvimento embrionário, relacionada aos efeitos tóxicos da planta no período de implantação do blastocisto (PETERS et al., 1997) e seu potencial teratogênico no período organogênico do rato (GUERRA et al., 1997); não havendo efeito tóxico na mãe e a prenhez foi mantida. Estudando a toxicidade da lobeira no sistema reprodutivo de ratos e camundongos machos, Sá et al. (2000) observaram que seus resultados sugeriram um efeito tóxico da planta no sistema reprodutivo do camundongo, com possível atividade antiandrogênica; entretanto, não era aparente a atividade antifertilidade no rato nas dosagens por eles empregadas. Com a finalidade de avaliar a atividade antimicrobiana do extrato hidroalcoólico de lobeira, Scarpel et al. (2004) utilizaram cepas padrão de Escherichia coli, Pseudomonas aeruginosa, Micrococcus luteus, Enterococcus faecalis, Staphylococcus aureus e Candida albicans, verificando que o extrato mostrou-se ativo somente contra Candida albicans. CONCLUSÃO Nas condições desta pesquisa, a lobeira provocou no fígado de rato um quadro de congestão vascular, com hepatócitos volumosos de citoplasma vacuolar (compatível com alteração hidrópica). O espaço-porta estava desorganizado e foram observados focos de inflamação crônica entre os hepatócitos e no espaço-porta. AGRADECIMENTOS À Universidade de Franca pelo financiamento deste trabalho. REFERÊNCIAS CARIBÉ, J.; CAMPOS, J. M. Plantas que ajudam o homem. 5. ed. São Paulo: Cultrix/ Pensamento, 1977. CHALKLEY, H. W. Method for the quantitative morphologic analysis of tissues. J. Nat. Cancer Inst., v. 4, n. 1, p. 47-53, 1943. v. 6

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GR ASSELLI, C. S. M. Uso do amido de fr utos de lobeira (Solanum lycocarpum St. Hil.) por indivíduos diabéticos: relato de casos. Rev. Bras. Nutr. Clin., v. 16, p. 34-37, 2001. GUERR A, M. A.; REIS, J. E. P.; OLIVEIR A, L. E. G.; PETERS, V. M. Avaliação do potencial teratogênico do fruto da lobeira (Solanum grandiflorum), administrado no período de organogênese do rato. Boletim do Centro de Biologia da Reprodução, UFJF, v. 16, p. 52-56, 1997. LORENZI, H.; ABREU MATOS, F. J. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. Nova Odessa, SP: Instituto Plantarum, 2002.

SÁ, R. C. S.; VIREQUE, A. A.; REIS, J. E. P.; GUERRA, M. O. Evaluation of the toxicity of Solanum lycocarpum in the reproductive system of male mice and rats. J. Ethnopharmacol, v. 73, n. 1-2, p. 283–287, 2000. SALA, M. A.; KOMESU, M. C.; LOPES, R. A.; MAIA CAMPOS, G. Karyometric study of basal cell carcinoma. Braz Dental J., v. 5, n. 1, p. 11–14, 1994. SALA, M. A.; LOPES, R. A.; MATHEUS, M. Método morfométrico para análisis cuantitativo de los tejidos. Determinación de los parámetros normales para los hepatocitos de rata. Rev. Fac. Med. Zaragoza, v. 32, n. 1, p. 39–44, 1992.

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SCARPEL, R.; CUNHA, W. R.; LOPES, R. A.; MARTINS, C. H. G.; ALVES, E. G. Avaliação da atividade antimicrobiana do extrato hidroalcoólico de Solanum lycocarpum (lobeira). In: Jornada de Biomedicina, 8., 2004, Franca. Anais... Franca: Universidade de Franca, 2004, p. 8. Endereço para correspondência

MORS, W. B.; RIZZINI, C. T., PEREIRA, N. A. Medicinal Plants of Brazil. Algonac, Michigan: Reference Publication Inc., 2000.

Prof. Dr. Ruberval Armando Lopes (autor responsável) Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/ Universidade de São Paulo (FORP/USP).

PETERS, V. M.; REIS, J. E. P.; OLIVEIRA, L. E. G.; GUER-

Avenida do Café, s/n

RA, M. O. Avaliação do potencial tóxico do fruto da lo-

Bairro Monte Alegre - Ribeirão Preto - SP

beira (Solanum grandiflorum), administrado no período

CEP: 14040-904

de implantação do blastocisto de rato. Boletim do Centro

Telefone: (16) 3630-2062

de Biologia da Reprodução, UFJF, v. 16, p. 47–51, 1997.

E-mail: [email protected]

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