Hermenêutica Constitucional do STF: Análise dos Princípios de Interpretação Constitucional Utilizados no Julgamento da ADPF 54

May 24, 2017 | Autor: Marina Borba | Categoria: Bioética, Hermenêutica Constitucional
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HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL NO STF: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL UTILIZADOS NO JULGAMENTO DA ADPF 54 Katia Brizola de Oliveira¹; Marina de Neiva Borba². Estudante do curso de direito; e-mail [email protected]¹ Professora da Universidade de Mogi das Cruzes; e-mail [email protected] ² Área de conhecimento: Direito Constitucional Palavras-chave: Aborto; Anencefalia; Princípios; Interpretação; ADPF. INTRODUÇÃO O Supremo Tribunal Federal (STF) tornou-se o centro de grandes julgamentos nos últimos anos. Podem ser citados como hard cases, ou julgamentos difíceis, a questão da constitucionalidade das pesquisas com células-tronco, declarada constitucional em 2008, a antecipação terapêutica do aborto de anencéfalos em 2012, entre outros. Devido às atuais decisões polêmicas do Supremo Tribunal Federal, portanto, tornou-se imperioso analisar os princípios de interpretação constitucional que norteiam esses julgamentos. Uma das polêmicas decisões do STF ocorreu na decisão da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 54, que foi ajuizada em junho de 2003 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde, solicitando a inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 124, 126 e 128 incisos I e II do Código Penal que tipificavam como crime de aborto a interrupção da gravidez de feto anencéfalo. Considerando a ADPF 54, tornou-se, portanto, relevante questionar: quais princípios da interpretação constitucional foram utilizados no julgamento desta ação pelo STF? OBJETIVOS O operador do direito precisa ter conhecimento da realidade social para a criação de uma norma jurídica, afirma Castro (2012, p. 196). Logo, diante de uma nova realidade social, o STF pode ter um papel criativo, atribuindo uma nova interpretação a um determinado texto? Portanto, este estudo tem como objetivo geral investigar os princípios de interpretação Constitucional utilizados no julgamento da ADPF 54 pelo Supremo Tribunal Federal. Tem ainda o objetivo de averiguar o fenômeno do Ativismo Judicial no julgamento. A moderna dogmática jurídica, segundo Barroso (2001, p. 6), já superou a ideia de que “as leis possam ter, sempre e sempre, sentido unívoco, produzindo uma única solução adequada para cada caso”. Dessa forma, a atuação do Direito reside no conjunto de possibilidades interpretativas que o texto da Constituição e das leis oferecem. Atualmente, com a ascensão do pós-positivismo após a segunda guerra mundial, fundado na centralidade dos direitos fundamentais e na reaproximação entre Direito e Ética, desenvolve-se uma nova dogmática da interpretação constitucional (BARROSO, 2013, p. 271). Tornou-se, pois, relevante investigar os princípios de interpretação constitucional que estão sendo utilizados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos chamados hard cases.

METODOLOGIA Trata-se de pesquisa de natureza qualitativa que utilizou a técnica de pesquisa bibliográfica. Para encontrar os descritores desta pesquisa, utilizou-se o Vocabulário Jurídico do Supremo Tribunal Federal (Tesauro) e o vocabulário controlado da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Os descritores encontrados no Tesauro foram: princípio, interpretação, ADPFe mutação constitucional. Foi realizada uma busca no Tesauro dos descritores ativismo judicial e judicialização, mas não se obteve nenhum resultado. No site da BVS, encontraram-se os descritores aborto e anencefalia. Dessa forma, os descritores utilizados à busca de artigos para subsidiar a presente investigação foram: ADPF, interpretação, princípios e aborto. O descritor mutação constitucional não foi utilizado, por ser muito restrito durante a busca de artigos. A partir da escolha dos descritores, procedeceu-se o levantamento de artigos em bancos de dados especializados. RESULTADOS E DISCUSSÃO Em 2012, a ADPF n. 54 julgou procedente, por maioria de votos, o pedido de declaração de inconstitucionalidade da interpretação de que a interrupção da gestação de feto anencéfalo seja crime. Dos votos majoritários, observa-se que apenas os Ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso votaram pela improcedência da Ação. Com base na leitura do inteiro teor do julgamento da ADPF 54, os princípios de interpretação constitucional identificados na fundamentação dos votos dos Ministros do STF foram: proporcionalidade, interpretação conforme a Constituição, concordância prática ou harmonização e o princípio da presunção da constitucionalidade das leis e atos, consoante Tabela 1:. Tabela 1. Princípios de interpretação constitucional utilizados na fundamentação dos votos dos Ministros do STF

Resultado extremamente relevante para ser discutido e destacado é a utilização dos princípios de interpretação constitucional para a fundamentação dessa decisão judicial por todos os Ministros da STF, corroborando a teoria neoconstitucionalista do surgimento de uma nova hermenêutica jurídica, especialmente fundada no pós-positivismo jurídico, cuja ascensão se deu após a 2ª Grande Guerra.

Ademais, dos princípios de interpretação constitucional citados nos votos, verificou-se que a maioria dos Ministros fundamentou suas decisões no princípio da Interpretação conforme à Constituição e no princípio da Proporcionalidade, segundo Tabela 2: Tabela 2. Princípios de interpretação constitucional utilizados na fundamentação dos votos dos Ministros do STF

A utilização preponderante desses dois princípios pode ser explicada por dois fatores. Primeiramente, a interpretação conforme à Constituição, além de ser um princípio da hermenêutica constitucional, também é uma técnica de controle de constitucionalidade. Assim, como o pedido principal da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental foi uma declaração de inconstitucionalidade, consequentemente, os Ministros recorreram a esse princípio em decorrência da sua dupla finalidade. Já o princípio da proporcionalidade também foi amplamente suscitado nas fundamentações dos Ministros por ser a técnica utilizada para solucionar os casos de colisão de direitos fundamentais, tal como existente na situação em tela, em que o direito à vida do feto anencéfalo contrapõe-se ao direito à integridade física e psicológica da gestante. CONCLUSÃO Após uma visão analítica, observa-se que a maioria dos Ministros se baseou no princípio da proporcionalidade, no que se refere à vida do feto e os direitos da gestante, tendo como base os direitos da mulher conquistados atualmente. Insta salientar que a Corte acompanhou as mudanças e conquistas atuais nacionais e internacionais da mulher, tornando-se palpável o direito à escolha da gestante do feto anencéfalo em uma sociedade religiosa, machista e tradicional. No que se refere à interpretação da Constituição, ocorreu a aplicação da Mutação Constitucional em alterar o significado do direito à vida na Constituição Federal, em decorrência da tecnologia aplicada no início da gestação, permitindo o descobrimento da anencefalia, apesar das divergentes correntes apresentadas nas audiências públicas. Desta

forma, o direito à vida do feto anencéfalo na Constituição Federal poderá ser limitado em ponderação aos demais direitos da gestante. Quanto à interferência Judiciária nos demais poderes, observa-se que há indiretamente a interferência no Legislativo, pela falta de lei ordinária que permite o aborto do feto anencéfalo. O ativismo judicial está presente no Supremo Tribunal Federal, conforme o hard case apresentado. Ocorre, porém, que se o Judiciário aplicasse a auto-contenção judicial no caso apresentado por motivo de silêncio do Legislativo, as mulheres grávidas de fetos anencéfalos seriam a minoria em uma sociedade machista e tradicional, não permitindo a estas a diminuição de um sofrimento incontestável. Desta forma, apesar da interferência do Supremo Tribunal Federal em outros Poderes, observa-se que o objetivo deste julgamento pela maioria dos Ministros foi de proteger a minoria, permitindo à gestante o direito de escolha, além de lhe garantir a dignidade em uma situação tão degradante. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROSO, Luis Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, ano I, vol. 1, n. 6, p. 1-33, set. 2001. _____. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013. CASTRO, Maria Daniella Binato, ET AL. Curso de constitucional: normatividade jurídica. 1. ed. Rio de Janeiro: EMERJ, 2012. AGRADECIMENTOS Agradeço à orientadora Marina de Neiva Borba. Agradeço ao Programa Voluntário de Iniciação Científica e a Universidade Mogi das Cruzes pela oportunidade de aprender e desenvolver o projeto de pesquisa.

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