HF 371 – Estética III

June 1, 2017 | Autor: Vinicius Figueiredo | Categoria: Mimesis, Estética, Roberto Schwarz, Ismail Xavier, Dialética negativa
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HF 371 – Estética III
Prof. Vinicius de Figueiredo
2016/2a semestre (Matutino: 5a-feira. Noturno: 5a-feira)

Ementa:
Estudo das questões da Estética, segundo um tratamento mais aprofundado (questões gerais relativa à Representação, a "Mimesis" literária e sua discussão, a questão do gosto, teorias estéticas do século XX).
Programa
Em seu Sentimento da dialética, Paulo Arantes reconstrói os dois modelos que, em seu entendimento, pautaram a compreensão da modernização no Brasil. De um lado, o dualismo e o amplo arco de variantes que ele admitiu entre nós (Euclides da Cunha, Caio Prado Jr., Cepal, sociologia funcionalista, etc), conforme o qual os problemas da sociedade brasileira decorreriam das dificuldades em suprimir aspectos ligados ao passado colonial, escravocrata, tradicional, patrimonialista, próprios da nossa formação nacional. De outro, a dialética, reunindo autores em sua maioria ligados ao marxismo uspiano dos anos 1960/70 (Antonio Cândido, Fernando E. Novaes, Fernando H. Cardoso, Emília Viotti, Roberto Schwarz, Francisco de Oliveira), conforme a qual os aspectos apontados pela interpretação dualista como responsáveis pelo "atraso" nacional seriam indissociáveis do que há de "moderno" entre nós.
Não é difícil dar-se conta de que a interpretação "dialética" quer sofisticar o esquema "dualista": progresso e segregação sociais, vanguarda e retrocesso, seriam, não etapas sucessivas a serem percorridas linearmente (o acerto dos ponteiros, por assim dizer), mas duas facetas concomitantes, os dois lados de uma mesma moeda - por referência à qual, de resto, poderíamos cifrar as contradições internas ao sistema capitalista mundial, do qual seríamos, não simples arremedo, mas expressão privilegiada. Afinal, o que os intérpretes dualistas enxergavam como contrariedade entre elementos "arcaicos" e "modernos", tributária da posição colonial e dependente da sociedade brasileira, corresponderia, na verdade, à indissociabilidade de elementos desiguais, combinados em um processo social cujas contradições não seriam exclusividade da colônia, mas expressão determinada do dinamismo global da ordem capitalista. A periferia, assim considerada, decantaria a verdade (especialmente violenta) de um único processo reunindo, mas de forma assimétrica, países desenvolvidos e subdesenvolvidos.
Qual a implicação disso para a disciplina HF-371?
P. Arantes, seguindo a conhecida interpretação de Roberto Schwarz, vê na narrativa ficcional de Machado de Assis a formulação mais bem acabada do "sentimento de dialética" característico da nossa experiência. Como diz Roberto, Machado "configura em ato, no plano literário, uma superação das alienações próprias à herança colonial." Já se vê o que apoia essa conclusão: a mimesis, supõe-se aqui, transpõe para a forma literária ou artística as mesmas contradições com que se depara o sociólogo e o historiador na franja do sistema capitalista. Se compreender a singularidade do processo social nacional passa por reconstruir o conjunto de mediações por meio das quais o universal se particulariza entre nós, a literatura e a arte, assim como as ciências humanas e a crítica, podem muito bem desincumbir-se da tarefa. O literato ou o artista encontram-se igualmente aptos a cifrar, no âmbito das soluções formais, os impasses e os conflitos do referente social.
Como se vê, não é somente a alegada presença da "dialética" o que remete à tradição hegeliano-marxista. Como é sabido, a ideia de que conhecimento e poética convergem é, tudo somado, hegeliana. Considerar que a arte é a expressão sensível do intelígivel é supor que, a seu modo, ela também torna equivalentes o real e o racional - a ponto de se poder dizer, se voltarmos ao romance nacional, que a narrativa machadiana contém os elementos que apresentam "o resumo fiel de uma experiência" (a nossa). Não é difícil sopesar a contrapartida dessa orientação: o alcance poético de uma obra estará condicionado ao alcance cognitivo que ela dispõe em relação a nossa posição singular na dinâmica da ordem mundial. Ou seja: caso a obra não reflita, no plano exigente da forma, o "sentimento da dialética" que atravessa nossa consciência cotidiana, ela será "menor" – no mínimo por não cogitar, no âmbito racional, o real de onde extrai sua matéria.
Nossa ideia para o curso é: (1) realizar uma apresentação geral dos pressuspostos da abordagem de Roberto Schwarz, nisso recorrendo também a Paulo Arantes; (2) examinar algumas obras da literatura, das artes visuais e do cinema brasileiros, para "aplicar" o esquema apresentado em (1) e ver no que dá, com especial atenção àquelas poéticas que, numa primeira vista, mais ocultam do que explicitam o conflito social. Será o caso de concluir que elas dispõem de alcance estético menor em relação ao tipo de obra que, no rumo oposto, expõe elementos ligados e irredutíveis entre si, configurando uma anomalia sem horizonte de superação?
Para esse segundo ponto, utilizaremos como fio condutor o livro de Rodrigo Naves, A forma difícil (1996): como veremos, a oposição ali configurada entre "dificuldade de forma" e "forma difícil" corresponde, grosso modo, a essa alternativa entre tomar a mimesis como ocultamento (A.Volpi, J. Guignard e Milton da Costa, dentre outros) ou como explicitação (O. Goeldi, Iberê Camargo, Amilcar de Castro). Também faremos recurso, para apresentar uma abordagem que converge com os resultados de Naves mas por outra via metodológica, treibutária da fenomenologia, do livro de Ronaldo Brito, A experiência crítica (2005). E concluiremos nosso percurso com a discussão dos ensaios de Ismail Xavier sobre o cinema brasileiro da década de 1960, procurando rebater em suas posiçõs críticas os problemas levatados pela modernização, o subdesenvolvimento e a utopia na sociedade brasileira.
Formas de Avaliação
Seminários e trabalho dissertativo no fim do semestre.
Bibliografia principal
ARANTES, Paulo E. Sentimento da dialética. São Paulo: Paz e Terra, 1992.
BRITO, Ronaldo. Experiência crítica. São Paulo: Cosac Naif, 2005.
HEGEL, G.W.F. Estética (vol. 1). Tradução: M. A. Werle e O. Toll. São Paulo: Edusp, 2001.
NAVES, R. A forma difícil. São Paulo: Cia. das Letras, 1996.
SCHWARZ, R. Que horas são? São Paulo: Cia. das Letras, 1989.
XAVIER, I. Alegorias do subdesenvolvimento - cinema novo, tropicalismo, cinema marginal . São Paulo: Editora Brasiliense, 1993.

Bibliografia secundária:
CEVASCO, M. E. "Ainda a formação", in: L. A. Alves (org.), A formação em perspectiva – Ensaios de literatura, cultura e sociedade. Rio de Janeiro: Beco do Azogue, 2014, pp. 431-473.
FIGUEIREDO, V. "O destino problemático de nossa modernidade estética", in: "Preto no branco", vol. zero, Curitiba, 2006.
VASCONCELOS, S. "Roberto Scwarz, um leitor radical de Machado", in: L. A. Alves (org.), A formação em perspectiva – Ensaios de literatura, cultura e sociedade. Rio de Janeiro: Beco do Azogue, 2014, pp. 533-549.
Plano das aulas
Apresentação do curso
Discussão de Sentimento da dialética, de P. Arantes
Debate do ensaio de R. Schwarz sobre Osvaldo de Andrade (in: Que horas são?)
Discussão da introdução de R. Naves, A forma difícil.
Seminário: Guignard
Seminário: A. Volpi
Ronaldo Brito, Experiência crítica.
Ismail Xavier, Alegorias do subdesenvolvimento - cinema novo, tropicalismo, cinema marginal .
Exibição e debate de Terra em transe, de Glauber Rocha (1968)
Exibição e debate de Matou a família e foi ao cinema, de Julio Bressane (1969);
Exibição e debate de Bang Bang, Andrea Tonacci (1970);
Intersecções, alternativas de leitura.
Intersecções, alternativas de leitura.
Discussão dos trabalhos
Conclusão

Com as contribuições de autores como Fernando Novaes e Fernando H. Cardoso, comenta Paulo Arantes, a dualidade pôde finalmente ser "passada à limpo na língua da contradição: os termos que a compõem não se encontram mais justapostos porém 'contraditoriamente relacionados'" (P. Arantes, Sentimento da dialética, p. 66).
R. Schwarz, "A viravolta machadiana", in: "Mais", Folha de São Paulo, 23/05/2004 (pp. 9-11, p. 9).
Eis, concisamente, o principal legado de R. Schwarz: "foi ele quem nos ensinou como entender Machado não só dá o movimento da sociedade brasileira como esclarece o funcionamento do centro" (Maria E. Cevasco, "Ainda a formação", in: L. A. Alves (org.), A formação em perspectiva – Ensaios de literatura, cultura e sociedade. Rio de Janeiro: Beco do Azogue, 2014, pp. 431-473, p. 451).
"[...] a própria aparência é essencial para a essência; a verdade nada seria se não se tornasse aparente" (G.W.F. Hegel, Estética (vol. 1). São Paulo: Edusp, 2001, p. 33).
R. Schwarz, "A viravolta machadiana", op. cit., p. 9.


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