História como pilar da ciencia econômica

October 16, 2017 | Autor: A. Wagner Basso | Categoria: Relações Internacionais
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Universidade Federal de Santa Catarina
Centro Sócio Econômico
Disciplina: Formação Econômica do Brasil II
Graduanda: Andressa Wagner Basso

HISTÓRIA: O PILAR DETERMINANTE DA CIÊNCIA ECONÔMICA

A ciência econômica, dada sua complexidade e mutabilidade, deve ser analisada e interpretada com base na história. A partir desta, pode-se melhor compreender os ciclos, as tendências e as conjunturas que perpassaram mundialmente, como resultado do curso de eventos que formaram e resultaram na ciência econômica tal qual como conhecemos hoje. O estudo histórico pode ser amplamente explorado com a utilização do método investigativo, através da análise de elementos e acontecimentos que, apesar de fragmentados, interligam-se e possibilitam a compreensão do ambiente geral e do todo histórico.
Karl Marx, no século XIX, já defendia a importância da história em seu livro Contribuição à Crítica da Economia Política. Para o autor, sua análise é fundamental para a compreensão das relações abstratas e suas determinações. Essas relações abstratas seriam, por exemplo, a divisão do trabalho e o valor, que quando fixados levariam ao surgimento de sistemas econômicos, que se elevariam ao Estado, trocas internacionais e mercado mundial. Este seria o método científico correto, em que o concreto é o resultado, pela via do pensamento, das diversas determinações abstratas.
Para o autor, as categorias abstratas modificam-se constantemente, e classificam-se cada qual com singularidades de acordo com o momento histórico em que se encontram. Um aspecto interessante da análise de Marx é o fato de acreditar que o desenvolvimento histórico de um sistema, nação, regime, etc., baseia-se "sobre o fato de a última forma considerar as formas passadas, como jornadas que levam ao seu próprio grau de desenvolvimento, e dado que raramente é capaz de fazer a sua própria crítica". Desta forma, fica evidente que o desenvolvimento da realidade da conjuntura atual só se deu devido ao fato de que contamos com a história para nos guiar.
A autora Ângela Ganem, porém, nota que há tendência para se fazer o que ela chama de "tábula rasa da história", no qual esta é tratada como uma memória, um mero objeto de curiosidade, quando na verdade é instrumento importante do ponto de vista teórico. As análises históricas teriam sido substituídas pelo saber cumulativo e progressivo, utilizando-se sempre dos últimos 10 anos de estudos, o que tornaria a ciência econômica unitária. Porém, é fundamental clarificar que a ciência econômica é pluralista, possui diversas perspectivas teóricas, e é necessário que se apresentem as divergências e contrapontos de suas correntes, que se façam debates e, principalmente, que se compreenda a necessidade da história para que, então, o indivíduo possa expandir seu conhecimento e tornar-se crítico.
Segundo Angela Ganem, "a história na verdade não é apenas um instrumento: ela é a própria matéria do pensamento que, por sua vez, é sempre produto de um pensar sobre a história. O verdadeiro recurso à história, além de não dever se ater aos limites da memória classificatória ou do que se acumulou cientificamente, deveria estar associado à idéia da história como "propositora de hipóteses para o trabalho teórico" (Tolipan e Guimarães, 1982).". Além disso, a autora destaca que o estudo histórico permite que se proponham questões novas, assim como se diferencie o inovador daquilo que já fora proposto e é reinventado, repetido, no decorrer da trajetória humana. Assim, a teoria e o método não possuem o mesmo vigor se forem isentos do acompanhamento da história.
Concordando com Ganem, Aliomar Baleeiro expõe sua igual crença de que a história causa mudanças, porém adentra especificamente no campo estrutural dos Estados. Para Baleeiro, cada país possui características próprias em âmbito de estruturas institucionais, estruturas econômicas, geográficas, materiais e humanas; e todos estão sujeitos às variações históricas por meio de evolução ou revoluções, sendo que as estruturas são mais estáveis, enquanto que o contexto econômico é mais sensível a transições e oscilações cíclicas. Estas flutuações cíclicas seriam "mutações periódicas de diferente natureza e duração" (Baleeiro, 2010), caracterizadas por alta e baixas nos preços. As estruturas para o autor, seriam conceituadas a partir de F. Perroux, segundo o qual seriam "as proporções e relações que caracterizam um conjunto econômico localizado no tempo e no espaço", e podem modificar-se por causas internas ou externas. O estudo das conjunturas econômicas e estruturas tem avançado, e permite-se atualmente a previsão da evolução e desenlace de cada um. Assim, torna-se possível uma intervenção mais eficaz por parte dos Estados em momentos de crise, em que a Política Fiscal, de Crédito, de Moeda, de Câmbio, por exemplo, são as ferramentas indispensáveis para tal.
Considerando-se que os países passam internamente por crises, pode-se concluir que parte destas reflitam-se, em maior ou menor grau dependendo da relevância do mesmo, em âmbito internacional. Desta forma, pode-se fazer uma ponte com a obra de Fernand Braudel, intitulada A Dinâmica do Capitalismo. O autor considera que a história econômica é a história dos homens, modifica-se e evolui lentamente, e foca no estudo dos equilíbrios e desequilíbrios ocorridos ao longo do tempo no sistema econômico internacional, principalmente entre os séculos XV e XVIII.
Braudel expõe que o século XV foi marcado principalmente pelos mercados urbanos, onde há progressão dos preços industriais, estagnação dos preços agrícolas e, então, um "nível mínimo da vida econômica". O séc. XVI adquire grande velocidade desenvolvimentista, tem por destaque as feiras internacionais (como as de Frankfurt e Antuérpia); o progresso da superestrutura, os metais preciosos provindos da América, a grande circulação de moeda e crédito, formaram um sistema frágil. Assim, no séc. XVII nota-se uma época de estagnação econômica, quando não de recuo. Há a ascensão de Amsterdam, assim como o retorno à mercadoria e troca de base, o que beneficiava a Holanda e a Bolsa de Amsterdam; as feiras internacionais são postas em menor plano em face da ascensão da Bolsa e da multiplicação de lojas e redes de distribuição na Europa. No século seguinte, observa-se aceleração econômica geral, com ampliação das bolsas e a tentativa de Londres de suplantar Amsterdam, que estaria especializando-se em empréstimos internacionais. As feiras perdem sua importância nos grandes centros, principalmente devido ao crédito fácil e período de trocas, porém continuam a prosperar em regiões marginais da economia europeia, como nos Bálcãs, Polônia e Rússia. Há o surgimento do private Market, uma espécie de "contramercado", já que se opunha ao public Market e ficava fora da regulamentação tradicional mercantil, proporcionando voluptuosos lucros em Londres e Paris principalmente.
É interessante notar que o autor frisa o fato e a economia europeia ser a mais estudada, porém não é a única que deve ser levada em consideração. Após análise da China, Índia e Japão, chega à conclusão de que:
"Em resumo, se a comparamos com as economias do resto do mundo, a economia européia parece ter ficado devendo seu desenvolvimento mais célebre à superioridade de seus instrumentos e de suas instituições: as Bolsas e as diversas formas de crédito. Mas, sem uma única exceção, todos os mecanismos e artifícios da troca se reencontram fora da Europa, desenvolvidos e utilizados em graus diversos, e pode-se aí discernir uma hierarquia: no estágio quase superior, o Japão; talvez a Insulíndia e o Islã; certamente a Índia, com sua rede de crédito desenvolvida pelos mercadores banianos, sua prática de empréstimo de dinheiro às iniciativas arriscadas, seus seguros marítimos; no estágio inferior, habituada a viver voltada para si mesma, a China; e, finalmente, logo abaixo dela, milhares de economias ainda primitivas." (BRAUDEL, 1987)
Braudel faz uma distinção entre capitalismo e economia de mercado. A economia de mercado, entre estes quatro séculos, não parou de expandir-se, e é identificado pela variação dos preços dos mercados do mundo inteiro. Porém esta seria apenas uma designação do que fora mais próximo ao capitalismo, que mesmo tendo surgido no século XX, deixou resquícios no passado que não se descontinuam da atualidade. O capitalismo dependeria do capitalista e do capital, e principalmente, estaria limitado a uma minoria de indivíduos que podem tirar proveito da hierarquia do mundo da mercadoria; a especialização e a divisão de trabalho afetam a sociedade mercantil como um todo, porém mantém-se intacto seu topo. Tanto o capitalismo como a economia de mercado progrediram conjuntamente, presentes desde a Ideia Média até atualmente, e seria então o capitalismo o motor do progresso econômico.
O autor destaca que o Estado moderno teria herdado o capitalismo, e por horas o favorece, por horas o prejudica, e desta forma, "o capitalismo só triunfa quando se identifica com o Estado, quando é o Estado". Assim, é tendencioso "o deslocamento do centro de gravidade da economia mundial por razões econômicas", o que ocasiona mudanças de escala, como ocorreu na mudança do centro do Mediterrâneo para o Norte no século XVI, de Veneza a Amsterdam, para Londres e enfim Nova Iorque. Assim, haveria sempre uma hierarquia e o favorecimento de alguns mediante as trocas. Desta forma, as cidades dominantes seriam os centros comerciais presentes em uma economia mundo, que possui um espaço geográfico dado, com um centro, que sucede-se de tempos em tempos. Braudel, em sua opinião pessoal, acredita que desde a Antiguidade o mundo estaria dividido em zonas econômicas, em várias economias mundos que coexistiam. Também defende que a economia mundo não pode viver sem um centro, passando por sucessivas descentragens e recentragens, e estas aconteceriam mediante crises, lutas e choques, onde os mais fortes sobreviveriam aos desafios e por isso poderiam exercer sua supremacia.
Estabelecendo-se uma relação entre as obras de Karl Marx, Angela Ganem, Aliomar Baleeiro e Fernand Braudel, atenta-se a importância que todos concebem ao materialismo histórico como determinante na compreensão da história econômica, e como disse Braudel, "da história do homem". Não se poderia entender a realidade econômica atual sem considerar os sucessivos ciclos a que a humanidade fora submetida, e a qual está ainda sob ação. O reconhecimento de padrões, aliados às experiências antecedentes, proporciona à ciência maior capacidade de entendimento e atuação frente aos fenômenos econômicos, o que possibilita a maximização da estabilidade do mercado mundial por meio uma conduta mais complacente com as necessidades econômicas preponderantes.







KARL, Marx. Contribuição à crítica da economia política. Tradução de Maria Helena Barreiro Alves; revisão de Carlos Roberto F. Nogueira. São Paulo, Martins Fontes, 1977, p. 224

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