HISTÓRIA E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS: A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO DO CURSO DE HISTÓRIA DA UFG/REGIONAL CATALÃO E A QUESTÃO ÉTNICO-RACIAL – 1995-2015 (II CONPEEX - UFG REGIONAL CATALÃO)

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Ciências Humanas

Anais · II CONPEEX - Congresso de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura · UFG/RC · 28 a 30/09/2016 · ISSN 2447-4134

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HISTÓRIA E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS: A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO DO CURSO DE HISTÓRIA DA UFG/REGIONAL CATALÃO E A QUESTÃO ÉTNICO-RACIAL – 1995-2015 Silva, Ana Paula Florisbelo da. [email protected] Freitas, Eliane Martins de. [email protected]

INHCS/Universidade Federal de Goiás/Regional Catalão Resumo: Nossos objetivos na pesquisa foram, de um lado, discutir como estão sendo produzidas as monografias do curso de História/UFG/RC que abordam a questão étnico-racial, e, de outro, analisar de que forma, ao longo da história do Curso, essa preocupação de inserir a temática racial na grade curricular e em atividades de pesquisa e extensão aparece. Encontramos 16 monografias, produzidas entre 1995 e 2015, que abarcam o tema e foram selecionadas para análise. Mais do que analisar o conteúdo das monografias e verificar se avançam ou não na questão étnico-racial, buscamos compreender como essa temática vem sendo desenvolvida ao longo da história do Curso; se era uma questão recente, fruto da obrigatoriedade de inserção da História da África e dos Afrodescendentes e Indígenas em seu Projeto Político Pedagógico, ou se, na verdade, é um assunto que já era trabalhado. Do ponto de vista quantitativo, interessava-nos saber a frequência e a quantidade dessas produções, se aumentaram, estabilizaram ou diminuíram após as mudanças no Projeto Político Pedagógico do curso de História da Regional Catalão. A análise foi feita utilizando-se como suporte metodológico a História da Historiografia e verificamos que, embora a representatividade de monografias do curso de História CAC/UFG sobre a questão étnico-racial tenha sido pequena, considerando-se o total de 324 monografias concluídas em 20 anos de produção, e a verificação de que a continuidade anual ininterrupta dessa produção se deu apenas na primeira metade do período analisado, observamos uma melhora no tratamento da questão pelos discentes que escolheram a temática.

Palavras-chave: Relações étnico-raciais. Produção do conhecimento histórico. História da historiografia.

MODALIDADE DE INSCRIÇÃO: PROLICEN – PROGRAMA DE LICENCIATURA

______________________________________________________________________ 1.

INTRODUÇÃO

O curso de História da UFG/Regional Catalão foi criado em 1991, tendo suas primeiras monografias concluídas a partir de 1995, quatro anos depois, quando a primeira turma de História então se formara com dupla habilitação em Bacharelado e Licenciatura, seguindo a diretriz curricular do respectivo Curso de Goiânia. Em 2015, ano de início desta pesquisa, completou-se então 20 anos de produção de monografias do curso com um total de 324 concluídas, e o presente trabalho, tendo em vista a importância da adoção de ações afirmativas nas instituições de ensino superior, teve como proposta analisar, a partir dessa produção monográfica como a questão étnico-racial, em particular aquelas pertinentes às populações negras, é tratada ao longo da história do curso. Interessou-nos investigar como o sancionamento da Lei 10.639/2003 – que obriga estabelecimentos de ensino fundamental e médio a

ministrarem o ensino sobre História e Cultura Afrobrasileira –, e de suas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino das Relações Étnicoraciais e de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, impactou sobre a produção do conhecimento histórico do curso. Este trabalho buscou conhecer e analisar as produções do curso de História da UFG/CAC, reconhecendo que essas produções muito podem nos revelar sobre a trajetória do curso, a relevância da questão étnico-racial para o mesmo e a recepção que a temática teve por parte dos discentes, explicitada nas produções monográficas do curso. 2. METODOLOGIA Metodologicamente utilizamos como suporte as discussões desenvolvidas pelo campo da História

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da Historiografia, por considerarmos as monografias como produção de conhecimento, e também a Teoria da História, importante para esse campo de caráter auto-reflexivo do conhecimento histórico. A Teoria da História permite conhecer os pressupostos que estruturam o conhecimento histórico, e a História da Historiografia a própria historicidade deste. Assim, trabalhar com a produção historiográfica pelo viés da História da Historiografia se difere do tradicional uso desta para a pesquisa histórica que lhe confere o papel de bibliografia, referência na produção de saber - a historiografia torna-se objeto de estudo pela História. Primeiramente, há que se ter claramente a noção da diversidade de concepções teóricas que se irá encontrar nesse tipo de pesquisa, “Pois o pensamento histórico está presente, na diversidade empírica da pesquisa histórica e da historiografia, na forma de concepções extremamente diferenciadas, contraditórias mesmo.” (RÜSEN, 2006, p. 20). Cabe lembrar também, que a historiografia está sujeita a seu próprio tempo, às ideologias, possibilidades, limites e restrições impostos ao historiador pelo espaço que ocupa, pela sociedade na qual vive e pelos instrumentos de conhecimento a ele conferidos podem nos ser demonstrados através de sua obra, sendo possível conhecer o ambiente no qual produziu seu saber historiográfico. “As condições que prefiguram a escrita da história não são apenas condições historiográficas, mas são também ontológicoexistenciais.” (ARAUJO, 2013, p. 41). Para esse autor um dos desafios desse tipo de trabalho “é não se limitar a uma mera descrição desses fenômenos, mas compreender as suas formas de produção e suas lógicas de transformação.” (p. 43). 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para análise das monografias, as separamos em quatro (4) temáticas: Festa em Louvor à Nossa Senhora do Rosário – Congadas, Religiosidade, Memória e Conflitos; Cultura e Religiosidade Negra – Capoeira, Música e Religiões de Matriz Africana; Escravidão no Brasil – Discursos, cidade de Catalão e Estado de Goiás; O Negro na Sociedade - Exclusão social, políticas afirmativas e racismo. 3.1. Festa em Louvor à Nossa Senhora do Rosário - Congadas, Religiosidade, Memória e Conflitos Temática com maior número de monografias aqui analisadas, a Festa do Rosário tem sido objeto

de interesse dos estudos realizados pelos alunos do Curso de História do CAC/UFG, embora percebamos que esse interesse já não é tão recorrente, sendo de 2009 as últimas monografias que trabalham com a festa. Dentre essas monografias, vemos uma predominância do foco em questões culturais e religiosas, trabalhadas pela ótica da História Cultural e com o uso da fonte oral. Todas as monografias, ao tratar de questões religiosas e culturais da festa, observam seu sincretismo, suas transformações e ressignificações ao longo do tempo. Ao fazê-lo, no entanto, alguns perdem de vista a própria historicidade das manifestações culturais e religiosas, que se transformam ao longo do tempo, sujeitas à seletividade e a inovação, não significando exatamente que essas mudanças trazem decadência, descaracterização ou perda de significado para a festividade. Podemos constatar essa situação mais claramente em RIBEIRO (1996). A motivação que levam os fiéis a participarem dessa festividade também é uma inquietação constante (SILVA, 2000; SILVEIRA, 2001; SILVA, 2009). SILVA (2000), ao refletir sobre as motivações que levam os dançadores a participarem dos ternos de congo, percebe que os dançadores mais velhos afirmam fazê-lo pela fé, votos e religiosidade, enquanto os mais novos por empolgação e vaidade, segundo os dançadores mais antigos, que relatam suas memórias com certo saudosismo. SILVA, no entanto, não absorve de seus entrevistados essa visão que pode levar o pesquisador a desconsiderar a historicidade das manifestações culturais e religiosas, se não for questionada. Também percebemos em todas as monografias trabalhos a identificação dessa festividade e, especialmente, das Congadas, como luta pela afirmação e preservação da própria identidade, de resistência à imposição da fé católica, à cultura do branco e de classes sociais dominantes. Cultura popular e cotidiano também são temáticas recorrentes, presentes com maior protagonismo em SILVEIRA (2001) e SILVA (2009). A tensão social presente na sociedade e na festividade é também uma percepção recorrente nas monografias aqui analisadas sobre a Festa do Rosário, o que pode se constatar no trabalho de SILVEIRA (2001), que vê a devoção como uma solução para problemas que não puderam ser resolvidos no plano material, e como agentes políticos, sociais e econômicos interferem para o fato de que a Folia de Reis é praticamente desconhecida na cidade, enquanto a Festa em louvor a Nossa Senhora do Rosário se tornou conhecida e tradicional, sendo utilizada para alavancar o turismo, para projeção da imagem de políticos e pessoas, arrecadação de impostos e obtenção de lucros com o aluguel das ruas do centro da cidade, ao redor da Igreja do Rosário. SILVA (2009) analisa que, embora

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brancos e pessoas de classes altas tenham aderido à festa e às Congadas, o preconceito contra a festividade por sua origem na cultura negra e seu sincretismo religioso prevalece, refletindo a tensão das relações de poder na sociedade. No entanto, parece sugerir que esses conflitos são amenizados ao falar de uma suspensão do cotidiano durante a festa pela união de pessoas de diferentes origens nesse espaço, quando, por outro lado, a festa escancara questões como desigualdades sociais, racimo e exclusão social ao colocar em um mesmo espaço pessoas que permanecem separadas durante o restante do ano. Ao recorrer às obras dos memorialistas da cidade, muitos acabam não questionando suficientemente a forma como estes relatam as origens da festa. REIS (2009) discute a Festa do Rosário na cidade de Goiandira, mas em geral trata das mesmas temáticas como as origens da festividade, suas transformações ao longo do tempo, tensão política, religiosa e social, mais explícita na festividade desse município por conta da expulsão das Congadas da Igreja Católica Apostólica Romana, que só voltaram a ser incorporadas na Igreja na década de 70, porém desvinculando as Congadas do templo central. Embora as Congadas de Catalão tenham passado por situação parecida (perseguição por padres que queriam proibi-la), nenhuma monografia sobre as Congadas na cidade se deteu a esses conflitos. 3.2. Cultura e Religiosidade Negra – Capoeira, Música e Religiões de Matriz Africana Duas monografias trabalham a história da capoeira e seu surgimento na cidade de Catalão: OLIVEIRA (1999) e VAZ (2004). Ambas percorrem trajetórias parecidas, pensando a capoeira como símbolo de resistência negra, desde seu surgimento ainda no período escravocrata até os fins do século XX, quando chega à cidade de Catalão e se populariza. Vaz periodiza a história da capoeira em três momentos distintos: o primeiro seria de uma criminalização desta, que passa a ser perseguida na Primeira República; o segundo seria de legalização, na busca por apoio popular ainda na era Vargas e, por fim, o terceiro momento, de institucionalização desta como esporte brasileiro. Oliveira utiliza conceitos como tradição e cultura para analisar a inserção e institucionalização da capoeira na cidade entendendo que, para se inserir em uma cultura hegemônica, uma outra cultura precisa ser moldada de acordo com a ideologia dominante. Ambas utilizam entrevistas com pioneiros da capoeira na cidade para desvendar seu surgimento em Catalão. Quanto às mudanças pelas quais a capoeira passou ao longo do tempo, Oliveira vê negativamente essa transformação, como uma constante descaracterização e esvaziamento de seu

sentido pelo meio exterior, enquanto Vaz compara uma “antiga” (informal, forma de sobrevivência dos negros) a uma “nova” capoeira (elemento cultural e esportivo). A monografia de GUIMARÃES (2003) fala sobre o rap, mais especificamente sobre o grupo Racionais MC's, entendendo esse ritmo de origem negra como instrumento de crítica social, que se posiciona contra a indústria cultural ao mesmo tempo em que teme sofrer uma apropriação por esta. Destaca a capacidade do rap de revelar e afirmar identidades, de denunciar questões como o racismo, o preconceito e a miséria, sendo assim porta-voz dos excluídos e tornando-se uma cultura de resistência, afirmando que, por mais que a indústria de massa seja poderosa, não consegue controlar plenamente a realidade cultural. BELO (2002) analisa as transformações ocorridas na Umbanda na cidade de Catalão de 1960 (quando surge o primeiro centro umbandista da cidade) a 2002, percebendo a religião como prática social, que influencia a visão de mundo e inserção na sociedade de seus sujeitos, utilizando a fonte oral para a construção do trabalho e pensando especialmente sobre os frequentadores da religião que não se fixam na Umbanda e seguem outros preceitos religiosos, como o catolicismo. Belo chama-nos a atenção ao fato da localização geográfica desses centros no espaço urbano: geralmente se localizam em bairros periféricos, fundos de residências e lotes, sem identificação que permita o reconhecimento do lugar como um local de prática da Umbanda. Identifica que, dos centros visitados da cidade, somente um era predominantemente dirigido a orixás; os demais mesclavam muitos santos e símbolos católicos nos ambientes de culto. Todos esses trabalhos tratam do receio da cultura negra em sofrer um processo de descaracterização ou esvaziamento de sentido, perdendo sua capacidade de se posicionar como espaço de resistência da identidade negra. 3.3. Escravidão no Brasil – Discursos, cidade de Catalão e Estado de Goiás Nesse conjunto de quatro monografias sobre a escravidão, vemos uma predominância de foco sobre a história regional (Goiás) e local (Catalão e região), e em geral boa discussão bibliográfica sobre a escravidão no Brasil, o que nos mostra compreensão desses discentes sobre a historiografia brasileira que trata do assunto. SILVA (1999) A partir do centenário da abolição, comemorado em 1988, faz uma análise de seus discursos impressos, onde diversos segmentos buscaram significações e interpretações desse acontecimento, buscando assim perceber as diferenças entre essas concepções. Os documentos escolhidos são um religioso, mais especificamente

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de uma publicação da CNBB para comemoração da data, e um do próprio movimento negro, de um grupo que publicou uma revista denominada “Salve 13 de Maio?”. Analisa a revista da CNBB produzida para a Campanha da Fraternidade, com uma linguagem mais simples por ter a finalidade de atingir ampla parcela da população. A revista faz um traçado histórico do negro no Brasil, e Silva identifica alguns problemas na análise como o determinismo econômico e a valorização da cultura negra somente quando relacionada/sincretizada ao cristianismo. Em relação à revista Salve 13 de maio, Silva percebe que o Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-Brasileiros ou GTAAB, responsável pela publicação, está vinculado a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, e analisa então o controle estatal a que este grupo está submetido. Identifica na publicação artigos que veem o escravo como coisa, destituído de vontade. Silva identifica pontos positivos e negativos em cada um desses discursos e vê neles as relações de poder que influenciam suas opiniões e posições, mas deixa apenas para a conclusão as comparações entre as análises das duas historiografias. Perde a objetividade em meio a variedade de temáticas em suas fontes. O trabalho de SILVA (2001) pesquisa a escravidão na região de Catalão, entre 1872 e 1888, quando foi oficialmente abolida. Escolhe autores da História Social para uma discussão teórica sobre a escravidão no país. Critica autores da historiografia tradicional, que teriam enfatizado a questão econômica, vendo a colonização apenas como um processo de expansão da metrópole e os negros como sujeitos passivos na relação senhor/escravo. Silva compreende que as lutas de classe e os conflitos entre senhores e escravos foram fundamentais para transformar a realidade brasileira, contribuindo para o desmantelamento da escravidão. Silva considera algumas situações encontradas na documentação pesquisada como forma de resistência dos escravos, como um contrato de venda de três mães e filhos juntos, fato pouco recorrente, já que escravos eram vendidos, em geral, separadamente. Um ano após a abolição da escravatura, Silva aponta que ainda havia comércio de escravos na região, o que sugere que esta demorou a ser abolida definitivamente na prática, uma configuração jurídica sem resposta imediata para as relações sociais. Silva questiona os documentos que utilizou, observando a situação de exclusão e exploração pela qual o negro passou sem privilegiar a ótica dominante sobre o assunto, presente em suas fontes. Faz um balanço historiográfico sobre o tema, abordando questões como o racismo e a tensão entre o branco e o negro, vinda não só de questões étnico-raciais mas também de classe.

ASSUNÇÃO (2006) tenta compreender a contribuição da escravatura para o estado de Goiás e o destino dos escravos no período quando a produção aurífera, principal meio de utilização de mão de obra escrava, entrou em decadência (entre 1800 e 1850). Assunção afirma que grande importação de escravos para trabalharem na mineração se deu, declinando na década de 50 do século XVIII e sofrendo processo reverso no fim do século e início do XIX, quando há exportação da mão de obra para outras regiões. A alta taxa de mortalidade, a fuga e o baixo número de nascimentos também contribuíam para a redução do número de negros na província. A população negra livre crescia, ao passo que o número de escravos declinava. Representando quase metade da população na província no início do século, os escravos passaram para apenas 7% da população em 1872. Assunção coloca o negro como sujeito histórico, no entanto, parece abrandar a situação de dificuldades do negro a partir da decadência aurífera de Goiás e o remanejamento de seu trabalho para outras áreas, como a agricultura. Investigando documentos oitocentistas da cidade de Catalão do período de 1861 a 1865, especialmente contratos de compra e venda de escravos, SENA (2011) busca descobrir as relações entre os escravos e seus senhores, valores, comportamentos e atitudes atrelados, esclarecendo a inserção destes na sociedade e seus laços de identidade. Sena constata que a população rural de Catalão e região prevalecia sobre a população urbana pouco numerosa, fato comprovado pela comparação dos impostos rurais e urbanos. Em 1863, Catalão só tinha menos escravos que a capital da província. A partir dos documentos que analisa constata o sentimento de pertencimento dos sujeitos sobre seus escravos, considerados como objetos e desprovidos do domínio da própria vontade, e busca compreender as relações entre senhores e escravizados que os documentos analisados podem revelar. Seu objetivo principal acaba sendo prejudicado pela natureza formal dos documentos escolhidos, no caso contratos de compra, venda e hipoteca de escravos, cartas e alforria e escrituras de doação. 3.4. O Negro na Sociedade - Exclusão social, políticas afirmativas e racismo PENA (1997) pesquisa sobre o Clube Treze de Maio de Catalão, criado na década de 40 por pessoas que, seja por sua posição social, financeira e/ou étnica não podiam frequentar o Clube Recreativo e Atlético Catalano. O eixo de sua discussão é a tensão existente entre esses dois grupos sociais, ou seja, aqueles que frequentavam o CRAC e aqueles que pertenciam ao Clube Treze de Maio.

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Pena percebe os conflitos em torno do Clube Treze de Maio como não só de ordem étnico-racial, mas também de classe, criando assim seus membros essa forma de agremiação em resposta ao CRAC, clube que selecionava seus membros de acordo com sua posição social e criando uma política interna diferente deste. Demonstra entendimento de que o racismo tem estreita ligação com as questões de classe. A monografia de PAULA (2011) tem como fonte a peça de Nelson Rodrigues Anjo Negro, e como objetivo mostrar o racismo na sociedade contemporânea da estréia da peça, na década de 40. Contextualizando a obra em seu tempo, ditadura varguista, afirma que, apesar de ter temáticas como traição, racismo, ódio e assassinato, ela foi censurada apenas por ter um negro no papel de protagonista. Paula situa três conceitos chave para interpretar a obra de Rodrigues: racismo, preconceito racial e discriminação racial. No entanto, vemos mais dados e discussão bibliográfica sobre o pós-abolição, por exemplo, do que sobre meados do século XX no Brasil, recorte da monografia. BARRETO (2013) parte da problemática de que, de uma militância crítica em relação ao capitalismo e ao Estado, o movimento negro e outros movimentos sociais passaram a ver o Estado como instrumento de desenvolvimento econômico que possibilitasse sua inserção no mercado capitalista, principalmente após o início do governo do Partido dos Trabalhadores (PT). Tendo isso em vista, busca uma discussão acerca da trajetória das políticas afirmativas no Brasil (que surgiram para defender e garantir benefícios à população negra e outras discriminadas) e o posicionamento dos movimentos sociais, especialmente o negro, perante a criação e viabilização dessas políticas. O Estatuto da Igualdade Racial foi escolhido como fonte. Barreto traz à tona a discussão sobre as questões étnico-raciais, percebendo os conflitos sociais que se pautam na cor como elemento de perpetuação do preconceito, instrumento de poder de uma sociedade racista, ressaltando a importância da atuação política do movimento negro para transformação da sociedade. Nessa temática vemos uma maior discussão conceitual que nos outros grupos de monografias, o que enriquece essas análises. Percebemos algumas contradições como, por exemplo, em relação às origens do racismo, tanto em Pena quanto em Barreto, e na utilização dos conceitos ao longo dos textos. Nessas monografias questões como racismo, preconceito, relações étnico-raciais e suas implicações sociais são eixos principais das discussões.

Levando-se em conta a questão quantitativa, vemos que o número de monografias que abordam, direta ou indiretamente, a questão étnico-racial permaneceu uniforme, e nunca ultrapassou a quantidade de duas monografias por ano, nos dez (10) primeiros anos da produção monográfica do curso de História. Até 2004, percebemos uma produção contínua sobre a temática, à exceção do ano de 1998 que não teve nenhuma monografia. Esse conjunto é marcado pela predominância da Festa do Rosário como objeto de pesquisa e certas limitações teóricas e práticas de alguns discentes, que compreendemos fazer parte das primeiras turmas formadas, embora muitas monografias já se destaquem por sua qualidade e compreensão, sendo capaz de estabelecer questões e respondê-las satisfatoriamente. A partir de 2004, percebemos uma interrupção na produção monográfica, nos anos de 2005, 2007, 2008, 2010, 2012, 2014 e 2015 não foram produzidas monografias que contemplassem a questão étnico-racial. Duas das três monografias produzidas que tratam diretamente da questão étnico-racial estão neste período, Paula (2011) e Barreto (2012). Estas monografias diferenciam-se das demais, pois são as que mais diretamente tratam a questão dos negros, respectivamente o racismo e as políticas de ações afirmativas acerca dos negros no Brasil. Embora a questão étnico-racial esteja pouco representada nas monografias do curso de História da UFG/CAC, considerando-se o número total de 324 monografias já produzidas em 20 anos de curso, percebemos qualidade nesses trabalhos, assim como entendimento de questões como a escravidão, as lutas de classe, os conflitos e tensões sociais. Há limitações a serem trabalhadas, como a predominância de certos enfoques e recortes, mas podemos constatar que questões como de contextualização histórica e utilização de conceitos muito avançaram, demonstrando melhora no aprendizado desses discentes que escolheram trabalhar questões acerca do negro. REFERÊNCIAS ARAUJO, Valdei Lopes de. Sobre o lugar da história da historiografia como disciplina autônoma. Revista Locus, Juiz de Fora, v. 12, nº 1, 2006, p. 79-94. Disponível em: < locus.ufjf.emnuvens.com.br/locus/article/download/ 2668/2090 >. Acesso em: 14/07/2016. ASSUNÇÃO, Roberta da Silveira Fonseca. A escravidão em Goiás no século XIX: historiografia e características. CAC/UFG: 2006. BARRETO, Paulo Duarte. A questão das políticas de ações afirmativas acerca dos negros no Brasil. CAC/UFG: 2013.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

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BELO, Ana Paula. O culto à Umbanda em Catalão. CAC/UFG: 2002. GUIMARÃES, Celestino Neto. Cultura e política na música brasileira: o protesto dos Racionais Mc’s. UFG/CAC: 2003. MALERBA, Jurandir (Org.). A história escrita: Teoria e História da historiografia. São Paulo: Contexto, 2006.

SENA, Fabíola Rodrigues de. A Escravidão em Catalão do século XIX: 1861 a 1865. CAC/UFG, 2011. SILVA, Celeste Rosa. A Construção da Festa do Rosário – a Lembrança e a Tradição. CAC/UFG, 2000. SILVA, Cleuber Aparecido da. Centenário da Abolição: Discursos Impressos. CAC/UFG, 1999.

OLIVEIRA, Lúcia Silva de. Capoeira e Catalão: 15 anos de uma breve história institucionalizada de culto ao corpo e outra motivações. CAC/UFG, 1999.

SILVA, Maria Magdalena da. Pesquisa, documentação e perspectiva de abordagem sobre o trabalho escravo: Catalão e região (18721888). CAC/UFG, 2001.

PAULA, Janaína Nayara de. O racismo contra o negro na sociedade brasileira na obra de Nelson Rodrigues “Anjo Negro”. CAC/UFG: 2011.

SILVA, Rosalina Jociele Aparecida de Jesus. A congada e seu impacto sobre a festa de Nossa Senhora do Rosário (2001-2007). CAC/UFG, 2009.

PENA, Ruth Gonçalves. Clube “treze de Maio” – a criação de uma alternativa de lazer. UFG/CAC, 1997. REIS, Geraldo José dos. A Festa de Nossa Senhora do Rosário e as congadas em Goiandira –GO. CAC/UFG, 2009. RIBEIRO, Ornésia Lopes. A congada: Ritual ou Espetáculo? CAC/UFG, 1996. RÜSEN, Jorn. Razão Histórica. Brasília: editora UnB, 2001.

SILVEIRA, Marleni de Freitas da. A Congada e a Folia de Reis em Catalão – GO: Suas representações e seus sujeitos. CAC/UFG: 2001. VAZ, Janaína Machado. Transformação e prática da capoeira em Catalão (1990 – 2000). CAC/UFG: 2004. RESPONSABILIDADE AUTORAL As autoras são as únicas responsáveis pelo conteúdo deste trabalho.

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