História, que História?

June 1, 2017 | Autor: Joao Noronha | Categoria: Historiografía
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O exercício proposto aos estudantes foi-o numa perspetiva de consideração de um de dois termos de uma alternativa: um relato de leitura ou uma recensão crítica. A nossa opção incidiu sobre o relato de leitura, razão pela qual, e utilizando metodologia coerente, foram afastados do âmbito do presente trabalho juízos de apreciação crítica dos textos incluídos na obra e das opiniões que os mesmos veiculam. Muito em concordância com a opinião de Luís Reis Torgal no tocante ao circunstancialismo da escrita da História…ou de qualquer escrita, e dos seus juízos críticos sobre a universidade portuguesa do século XXI (que, na opinião do autor deste trabalho, só pecam por defeito), é possível que o relato que aqui se trás possa ter sofrido, inconscientemente, de alguma porosidade com as circunstâncias, designadamente de enquadramento profissional, de quem o escreve.
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História, que História?
de
Luís Reis Torgal

Relato de leitura




Licenciatura em História (1.º Ciclo)
Unidade Curricular: Introdução à Historiografia
Docente: Professora Doutora Maria de Fátima Reis


João Manuel Cardão do Espírito Santo Noronha




Lisboa, 11 de Abril de 2016






Luís, Reis Torgal, História, que História? Notas Críticas de um historiador, 2015, Círculo de Leitores, Col. "Temas e Debates", Lisboa.
Luís Reis Torgal nasceu em Coimbra, em 1942. É Professor Catedrático jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e coordenador de investigação no Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da mesma universidade. Dedica-se à História Contemporânea e, em particular, ao período do Estado Novo. Entre a bibliografia de Luis Reis Torgal inclui-se uma História da História de Portugal (sécs. XIX-XX), em coautoria com José Amado Mendes e Fernando Catroga: [s. l.], [1996], Círculo de Leitores, assim evidenciado o seu interesse pela meta-História.

Introdução
A obra relatada, da autoria de Luís Reis Torgal (doravante, LRT), corresponde a uma coletânea e é encabeçada por uma apresentação, do punho do próprio, na qual narra o percurso que, desde os antigos 6.º e 7.º anos do Liceu o levaria, após a obtenção do Doutoramento em História, às áreas do "[…] Estado Novo, mas também da I República, da História da História e da Universidade, como temas de investigação e de ensino" (p. 15). A apresentação sugere que se trata da recolha de um conjunto de dispersos, organizados em cinco núcleos temáticos [(i) Afinal o que é a História? (pp. 25-51); (ii) A História e a sua "circunstância" (pp. 53-73); (iii) História e ensino (pp. 75-101); (iv) História, ideologia e memória (pp. 101-162); (v) História e intervenção cívica (pp. 163-161); acrescem um texto de epílogo (pp. 183-195), um índice bibliográfico (pp. 199-221) e uma dedicatória (p. 5)], mas não é realmente assim: os textos que integram os diversos núcleos temáticos apresentam continuidades e verificam-se remissões discursivas entre aqueles núcleos.
Tentado surpreender as linhas de força do livro cuja leitura se relata, diremos que são duas: (i) reflexões de meta-História e (ii) intervenção cívica, com vários segmentos.

Primeiro núcleo temático: Afinal o que é a História? [sistematizado em três divisões; (i) Génese da História; (ii) História como consciência do tempo; (iii) História como saber].
Neste núcleo temático, LRT apresenta uma breve resenha da historiografia portuguesa e do ensino universitário da História (séculos XIX e XX), que insere numa linha narrativa positivista, só quebrada pela "historiografia de oposição". Avançando no tempo, assinala o recrudescimento do interesse pela História nos anos oitenta e noventa do século XX, mas a sua menorização como ciência e questão universitária no início do século XXI, com a Universidade vergada ao um "presentismo avassalador" e ao economicismo. Este mesmo tema, mais centrado e em tom adicionalmente crítico será retomado pelo autor em História e ensino.
Procurando esquematizar o seu pensamento sobre a História, LRT apresenta-a ao leitor como devir não retilíneo, diversamente daquilo em que acreditaram — sob perspetivas diversas — o providencialismo histórico-católico e a historiografia marxista; isso significa, assim, que o atingir de um certo nível civilizacional não constitui garantia de que não existirão retrocessos ["… o processo civilizacional tem recuos e avanços, passando por pontos idênticos, mas estruturalmente diferentes" (p. 37)].
Já no que respeita à História enquanto saber, sobre a natureza do saber histórico, interrogando-se o autor sobe se se deve catalogá-la como arte ou ciência. Acaba por concluir pela natureza científica desse saber, reconhecendo-lhe, todavia, um objeto especial: o homem e a sociedade… "… dificilmente apreendido na sua totalidade, pouco quantificável e nunca experimentável" (p. 41), tratando-se, portanto, de material volúvel. O discurso do autor caminha, pois, no sentido da experimentação dos limites do entendimento do que seja ciência: nenhum conhecimento que tenha o domínio sócio-humano como objeto explicativo pode comparar-se, nas suas possibilidades de demonstração empírica, às denominadas ciências exatas, mas, em função disso, aceitar a menorização, é permitir uma fixação unilateral dos limites da cientificidade; não sendo ciência exata, deve reconhecer-se-lhe esse estatuto, apoiado "… numa atitude epistemológica e metodológica que supõe sobretudo a interrogação" (p. 42).
Intui-se nas reflexões do autor que o seu sentido de objetivismo é o do tratamento rigoroso do objeto analítico, sem conscientes concessões a condicionamentos culturais e ideológicos… de resto, é da natureza do próprio saber histórico, de caráter poliédrico, estar sempre sujeito a revisão, apoiada em outras perspetivas ou outras fontes, sendo de salientar que o autor expressamente legitima múltiplos modos de ser da escrita da História [que, mais adiante, citando Irene Pimental, acaba por qualificar como correntes (p. 164)], desde que não constituam mera narração mas interpretação ativa, o que vale por dizer, com juízo crítico.

Segundo núcleo temático: A História e a sua "circunstância"
Todo este núcleo temático da obra cuja leitura se relata está orientada por um único veio central, que poderia resumir-se na seguinte asserção: o modo de fazer História e a história que se faz são produtos de circunstâncias condicionantes.
A asserção parece chocar-se com as observações que, no escrito anterior, LRT reserva ao seu entendimento da objetividade e do rigor que devem estar presentes no método de um saber de humanidades que se queira cientifico. Não é, todavia, o caso: o que resulta em subjetivismo — no entendimento que fazemos do pensamento do autor — é a consciente contaminação da escrita da História com valorações culturais e ideológicas (em sentido muito amplo) de quem o faz; o seu inverso é rigor… e isso é trabalho científico. Para lá disso, há toda uma entourage presente no historiador, autónoma ou heterónoma (circunstancialismo), que lhe condiciona o ofício: as eventuais modelações filosófico-teóricas geralmente aceites como paradigma numa certa comunidade científica [tome-se o caso, citado pelo autor, da historiografia brasileira da década de oitenta do século XX, ancorada às teorias marxistas, a Rosa Luxemburgo, a Habermas, entre outros; (pp. 55 e 56)], os particularismos do seu país, o tempo político em que escreve História e até circunstâncias de carácter pessoal.
Utilizando exemplos que retira da historiografia portuguesa, brasileira e russa, num período que atravessa a Perestroika (1984-1990), LRT nota como os diversos enquadramentos circunstanciais orientam a metodologia da escrita da História, rematando deste modo «[…] há que considerar que a História é feita em função de diversas "circunstâncias", uma delas será do uso e abuso de teorias filosóficas, muitas vezes transformadas em verdadeiras ideologias, mas também da próprias circunstâncias do lugar e do tempo» (p. 60). Repudia-se, pois, a escrita da História assente em modelações filosófico-teóricas, acolhendo-se antes um rumo metodológico qualificado como circunstancialista, assente no pensamento de Ortega y Gasset e numa consciência dos particularismos da experiência de fazer história, que parece valorizar.
É neste contexto que LRT, tratando já especificamente do espaço, do tempo e do ato de "fazer História" sustenta que a historiografia é condicionado por circunstâncias espácio-temporais, de modelação teórica, de ideologia, política ou outra [por exemplo, de caráter mitológico, como a que surge a propósito do relato de uma entrevista em que refere a conceção sacral do poder imperial japonês e as limitações sentidas à liberdade para fazer História do Japão, por japoneses, no seu país (p. 66)] e, que, nessa medida explicam a História que, num determinado quadrante espácio-temporal se faz ou se fez.
Os fundamentos dessa tese abarcam diversos exemplos de historiografia, a brasileira, a relativa à antiga África colonial portuguesa, a do Estado Novo português, para culminar em interrogações sobre como será a historiografia da Cuba castrista, da União Soviética, enquanto existiu, ou dos países sul-americanos de regimes populistas das últimas décadas.
Numa terceira variável, o autor apresenta-nos a sua perspetiva de que a História que se faz é, também, condicionada por fatores atinentes à envolvência pessoal e profissional do historiador. No plano da vivência profissional avança LRT com uma observação que ― para um leitor familiarizado com a academia ― é clarividente: a formação obtida por aquele que escreve História, inserindo-se em correntes "de escola", é condicionante da História que se escreve, seja no campo da escolha dos objetos seja no das metodologias. E o mesmo pode dizer-se da experiência de vida do historiador, que resulta sempre num filtro da sua mundivisão. Colacionando, entre outros, o seu próprio exemplo de elaboração de uma tese de doutoramento, com um tema do século XIX português, mas que, "[…] não seria a mesma se a tivesse realizada e apresentado antes da revolução dos cravos e de toda a alteração mental que esta provocou" (p. 69), bem como o da tese de doutoramento de Fernand Braudel (O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na Época de Filipe II), que, nas palavras do próprio, teria correspondido a "outro livro" se não tivesse sido escrita durante o cativeiro de guerra.
Um tanto surpreendentemente, no âmbito agora considerado, apresenta o autor a sua perspetiva sobre mistificações tão fortes no imaginário geral (exemplos: "Fátima" e Aristides de Sousa Mendes) que se torna difícil o exercício de verdadeiros juízos histórico-críticos… parece o autor sugerir… em função da resistência de uma ideologia ― poderia talvez dizer-se ― do politicamente correto.
O autor deixa, todavia, um desejo esperançado: não obstante a inelutabilidade dos circunstancialismos condicionadores do fazer da História: em democracia é possível cruzar dados e interpretações diferentes "[…] ultrapassando, embora com dificuldade, mitos e tabus" (p. 73), fazendo da interrogação constante a própria objetividade do ofício; dito de outra forma, a democracia não garante o derrube dos mitos e tabus, mas permite o esforço da desmistificação.

Terceiro núcleo temático: História e ensino
Neste núcleo temático, LRT apresenta uma reflexão sobre a substância da Universidade e do dever ser do seu ensino (em particular do ensino da História), embora deixe algumas notas histórico-reflexivas sobre o enquadramento formativo dos docentes dos graus de ensino básico (3.º ciclo) e médio. Na sua ótica e apoiando-se, novamente, em Ortega y Gasset (Missión de la Universidad, 1930), deveria a Universidade constituir, no essencial, um foco de transmissão cultural e de produção científica.
Em particular no que se refere à universidade portuguesa do início do século XXI, LRT mostra-se alinhado ao conjunto de vozes críticas quanto a uma notória mudança de paradigma e às suas nefastas consequências: a subordinação do trabalho universitário (englobando ensino e produção científica) a uma lógica economicista, cuja grelha analítica é puramente quantitativa e formal, com assinaláveis regressões nos padrões culturais daqueles que forma na base (licenciaturas).
Com isto, o "sistema" vai sobrecarregando os docentes com trabalho burocrático, deixando-lhes cada vez menos tempo para as tarefas de investigação e produção científicas (embora o autor não reflita aqui sobre o bem fundado, ou não, da separação das carreiras docente e de investigação, tema que não é pacífico), e produzindo avaliações do seu trabalho em moldes puramente quantitativos (…. quantos relatórios e quantas citações dos seus artigos…), que nada refletem da substância do mesmo.
Com este enquadramento, a que associa o dos resultados do processo de Bolonha, remata o autor o seu escrito com algumas considerações de inevitabilidade: o crescendo de acriticismo entre os alunos portugueses, muito auxiliado por uma enorme facilidade de recurso a meios digitais, criadora da ilusão de tudo está à distância de um "click".
Analisa-se neste núcleo temático o atual estado do ensino da História nos níveis básico e secundário, embora se situe esta particular disciplina no contexto dos próprios graus de ensino, em geral, que o autor acaba por qualificar como situação de desastre.
O texto está muito em linha com o que vem de trás, começando por formular a opinião de que em contextos políticos de forte implantação ideológica, isso tende a refletir-se em orientações de ensino que valorizam os pontos que são caros à ideologia dominante, não sem que, todavia, a final, deixe de sugerir que novas ideologias possam esconder-se por debaixo do desastre em que, no nosso tempo, se transformou o ensino médio… como que a concluir pela inevitabilidade do sentimento social-populista de que o ensino de qualidade é necessariamente privado. Poder-se-ia acrescentar que é da História que quem quer "reconhecimento" social fácil, sempre tendeu a pensar que o podia comprar…
Ainda sobre o ensino básico e médio, estabelece o autor as bases do que seria um bom sistema nesses ciclos: boas sínteses, apoiadas em investigação (no sentido de acompanhamento dos avanços da produção científica) adequada.
Na opinião do autor, que — sabe-se — é compartilhada por vários outros, quer das áreas da investigação científica quer das ciências da pedagogia, o tempo presente é de vitória do excesso de pedagogismo e de burocracia, que constitui barreira a que os docentes desses ciclos façam a desejada investigação e o seu papel de divulgadores.

Quarto núcleo temático: História, Ideologia e memória
Neste escrito, LRT expõe a sua visão sobre o modo como uma certa ambiência ideológica marca um conjunto de objetos culturais com vínculos à História: dos compêndios de História ao cinema de fundo histórico, passando pelo romance histórico, pela toponímia a pela estatuária. Esses objetos expressam leituras do real, sendo que a sucessão de legitimações políticas, através de ruturas, tende a produzir revalorizações ou desvalorizações de regimes políticos e personagens históricas consoante as aproximações e distanciamentos "presentistas". São exemplo disso: (i) na historiografia nacional, as Novas Histórias surgidas após 1974 que abandonaram os fundos nacionalistas da historiografia do Estado Novo, posicionando-se metodologicamente nas correntes de tempo largo e estrutural de matriz francesa; (ii) na toponímia, que, no pós-74, deslegitimou o Estado Novo e a sua principal figura.
Quanto ao primeiro aspeto, o A. retoma aqui algo que já sustentara anteriormente: as circunstâncias em que se escreve a História são condicionadoras da História que se escreve (… melhor dizendo, talvez, da História que se pode escrever).
O texto reflete em particular, com um exemplo sobre o programa de TV "Grandes Portugueses", sobre como a importância histórica de uma figura pode ser vista como o resultado de uma escolha popular… ao sabor de pressões de grupos politicamente orientados e que recorrem ao populismo.
Interessante é também notar o exemplo da deslegitimação política que recorre à destruição ou à recolha da estatuária evocativa de um regime político e, bem assim, a alterações de toponímia; não é exemplo que seja, em Portugal, significativo quanto à estatutária (diversamente do que sucedeu nos países descolonizados por Portugal após 1974), mas muito ao contrário do que sucedeu com a toponímia evocativa do Estado Novo.
O autor admite que também no campo da historiografia propriamente dita (e não apenas nos trabalhos de divulgação) se faz notar a mudança de "legitimidades históricas", cujas linhas evolutivas se apreendem fazendo "História da História" (e recorde-se ser ele o coautor de uma, abrangendo os séculos XIX e XX), ou, dito de outra forma, do modo de a escrever, relativamente a temas-"barómetro", como a Inquisição, a Restauração, o Pombalismo, a Expansão e o 25 de Abril.
No domínio da produção historiográfica do pós-74, LRT reporta o grande incremento historiográfico que o caracteriza, com particular destaque para o domínio da História Contemporânea, o que bem se compreende, atento o facto se tratar de um período de investigação cuja proximidade ao Estado Novo comportava significativas limitações quanto à História que o regime permitia que se fizesse, não obstante o despontar, na sua fase derradeira, de uma historiografia de oposição.
Depois de 1974, libertado o garrote, multiplicaram-se os estudos sobre o Estado Novo, produto do aumento do número de instituições universitárias, dos centros de investigação, do surgimento de várias revistas especializadas, sendo este período igualmente caraterizado pelo acentuar da interdisciplinaridade, que já se vinha notando, em particular com aproximações à Sociologia e à Economia. A grande explicação para tal encontra-a o autor da reorganização dos cursos de História, com a formação, na década de oitenta do século XX, dos mestrados.
O período em questão é ainda marcado pelo surgimento de Coleções de História, Cronologias e Dicionários, grandes sínteses, obras coletivas, de História de Portugal, e algumas Histórias de autor, [Joaquim Veríssimo Serrão (18 volumes) e Oliveira Marques (3 volumes)], com a particularidade de uma obra de síntese — a dirigida por Rui Ramos — ter suscitado uma, inabitual, polémica historiográfica nas páginas de um jornal diário, na qual "[…] no que respeita à Época contemporânea, devido a uma interpretação, ou opinião do autor, que procura sempre a "originalidade" e em que se torna evidente por vezes uma ideologia subliminar" (p. 136) que suscita da parte de LRT um juízo crítico: a ideologia não deveria fazer parte essencial do quadro mental interpretativo do historiador. O juízo é, aliás, retomado adiante, a propósito de "modelos e modas" [p. 142: os investigadores "só têm de cumprir um desígnio — usarem o rigor da investigação historiográfica, no que toca à procura das fontes, à sua interpretação e à escrita da História" (p. 143)].
A finalizar este núcleo temático, LRT formula juízos críticos àquilo que o próprio designa como "Sociedade sem História", ou seja, na sua conceção, um tempo social dominado por padrões de presentismo e de fácil-de-consumir que é, naturalmente, adverso a esforços culturais de profundidade.
Termina o autor as suas reflexões neste núcleo temático com considerações sobre História e Jornalismo, que, sem deixar de assinar os campos próprios em que se movem a historiografia e a escrita jornalística, em particular no domínio da Era Contemporânea, vai verificando o crescente interesse da segunda pelo tempo histórico. A escrita jornalística não adota, todavia, métodos de crítica histórica e, nessa medida, o eventual sucesso editorial das obras pode induzir no público que as lê uma ideias, simplistas ou distorcidas, do objeto da escrita.
O Jornalismo é também apreciado sob a perspetiva de fonte de destaque de obras de História cientificamente menores "… porque são textos mais ou menos sensacionalistas, por si só ou pelo que representam, ao mesmo tempo que se esquecem obras de maior interesse" (p. 154), numa afirmação que é, talvez, das mais discutíveis de todo o livro, na medida em que parece contrapor, subliminarmente, em teros de qualidade, o que se faz na academia portuguesa e fora dela.

Quinto núcleo temático: História e intervenção cívica
Reflete aqui o autor sobre falta de consciência crítica do nosso tempo, sintetizando aspetos vários de reflexões avançadas anteriormente, embora aqui se inicie com aquilo que parece ser uma apreciação negativa da intervenção pública de certos historiadores, que preferem o discurso histórico ao exercício crítico e aprofundado da História. Interessante é notar o seu discurso sobre a pluralidade historiográfica (Irene Pimentel), a honestidade intelectual que resultaria da sua assunção, mas também que todas as correntes estão legitimadas como historiografia, desde que constituam exercício analítico crítico; concluirá daqui, implicitamente, que não é a filiação nesta ou naquela corrente historiográfica que legitima a superficialidade dos debates.
Continuará, depois, LRT relatando o que chama "o caso dos feriados", na senda do que foi, na legislatura de 2013-2015 (Governo de coligação PSD/CDS), a decisão de eliminar feridos nacionais. Crítico da decisão, o autor explicita que o fenómeno da celebração de centenários e de feriados nacionais é, na essência, republicano e, no caso dos últimos, interpretados como dias sem trabalho, centrados na valorização do descanso semanal do assalariado e com ligações ao movimento operário internacional.
A eliminação dos feriados em causa (em particular os civis) é visto por LRT como renegação da História, sob uma perspetiva economicista, que deve merecer intervenção direta e cívica do historiador, de rejeição, em defesa do fundo histórico de certas realidades, no que está implícita — pensamos — a própria defesa da memória como elemento identitário de um povo.
Terminará o autor este excurso com a sustentação da necessidade de intervenção cívica do historiador em defesa da própria História enquanto ciência.

Reflexões finais: A continuar, que História?
A terminar, o autor, que intencionalmente não abre conclusões sobre o que antecedentemente, apesar de retomar alguns dos pontos em causa, como o atual modelo de avaliação das instituições de produção científica ["… que tem como objetivo quase exclusivo a avaliação da organização formal, e não o mais importante: a avaliação dos conteúdos científicos (p. 185) deixa uma palavra de alento às novas gerações de historiadores… por amor à História.





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