IDENTIFICAÇÃO DO NÍVEL DE MARGENS PLENAS NUMA BACIA PERIURBANA EM MARECHAL CÂNDIDO RONDON, PR

July 4, 2017 | Autor: Oscar Fernandez | Categoria: Fluvial Geomorphology
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XIII Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada Viçosa, Minas Gerais, Brasil – Julho 2009 IDENTIFICAÇÃO DO NÍVEL DE MARGENS PLENAS NUMA BACIA PERIURBANA EM MARECHAL CÂNDIDO RONDON, PR Oscar V. Q. Fernandez Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) - Campus de Marechal Cândido Rondon – Curso de Geografia - Grupo Multidisciplinar de Estudos Ambientais (Gea) E-mail: [email protected] Marcos Alexandre Arndt Geógrafo, mestre em Engenharia Agrícola - Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus de Cascavel – E-mail: [email protected] Resumo O objetivo do trabalho é avaliar a utilização de indicadores morfológicos na identificação do nível de margens plenas na porção superior do córrego Guavirá, que drena parte da área urbana do município de Marechal Cândido Rondon (PR). A cabeceira do córrego Guavirá demarcada neste estudo, possui 10,8 km2, dos quais 42 % é ocupada pela área urbana. No trecho em estudo foi definida uma seção transversal, na qual foram levantados perfis transversais do canal e da planície aluvial. Ao longo de um percurso de 80 m foram levantados perfis longitudinais empregando técnicas topográficas convencionais. Nos perfis longitudinais foram definidas as cotas do leito e do nível de água, assim como as cotas dos seguintes indicadores morfológicos do nível de margens plenas: depósito de barras laterais, nível de escavação, ponto de inflexão da margem e planície aluvial. O nível das cheias mais expressivas foram monitoradas entre 2007 e 2008 com a adoção de uma régua de máximas, construída conforme proposta de Douhi (2004) e Antoneli e Douhi (2005). O trabalho mostra que nesta bacia periurbana, os depósitos de barras laterais e os níveis de escavação não podem ser utilizados como referencia na identificação do nível de margens plenas por serem cobertos dezenas de vezes ao ano. Por outro lado, o ponto de inflexão e a planície aluvial foram encobertas com freqüências superiores compatíveis aos encontrados na literatura. Palavras chave: Nível de margens plenas, Urbanização, cheias. Abstract The objective of the work is to evaluate the use of morphologic indicators in the identification of the level of bankfull in the superior portion of the Guavirá stream, that drains part of the urban area of the city of Marechal Cândido Rondon, Parana State, Brazil. The watershed of Guavirá stream demarcated in this study have 10.8 km2, of which 42% are into of urban area. In the study reach a transversal section was defined, in which transversal profiles of the canal and the alluvial plain had been raised. Throughout a passage of 80 m had been raised longitudinal profiles using conventional topographical techniques. In the longitudinal profiles of the stream bed and the water level had been defined, as well as the following morphologic indicators of the bankfull level: deposit of lateral bars, level of hollowing, point of inflection of the bank edge and alluvial plain. The floods most expressive ones had been monitored between 2007 and 2008 with the adoption of a ruler of principles, constructed as proposal of Douhi (2004) and Antoneli & Douhi (2005). The work show that in this basin, the deposits of lateral bars and the levels of hollowing cannot be used as reference in the identification of the bankfull level for being covered sets of ten of times to the year. On the other hand, the point of inflection and alluvial plain had been flooded with compatible superior frequencies to the found in literature. Key words: Bankfull level, urbanization, flood.

INTRODUÇÃO A geometria dos canais fluviais é resultado do confronto entre as forças oriundas do fluxo das descargas liquida e sólida fornecidas pela bacia hidrográfica e as geradas pela resistência à erosão dos materiais que constituem o leito e as margens. A atuação destas forças opostas gera complexos processos de formação de canais. Apesar da complexidade dos processos, padrões fluviais podem ser identificados e classificados através de variáveis morfológicos e hidráulicos (Leopold, 1994). A descarga liquida pode ser considerada um dos principais fatores no dimensionamento do canal fluvial. Observações sugerem que as dimensões físicas dos canais são produtos de uma categoria de vazão que é muito efetiva no transporte de sedimentos. Esta vazão teórica é denominada de descarga dominante (“dominant discharge”). Esta descarga se mantida constante ao longo de um período de tempo, produziria as mesmas características morfológicas que são geradas por uma ampla variedade de descargas que ocorre continuamente nos cursos de água. O conceito de descarga dominante, profundamente enraizado na geomorfologia fluvial e na engenharia hidráulica (Pickup e Warner, 1976), foi discutido por Benson e Thomas (1966), Inglis (1968), Ackers e Charlton (1970), Pickup e Rieger (1979), Andrews (1980), Carling (1988) entre outros. Os pesquisadores adotaram vários critérios para representar na prática o conceito da descarga dominante. De acordo com Pickup e Warner (1976), a descarga dominante pode ser materializada por três categorias de descargas: descarga efetiva, descarga com determinado intervalo de recorrência e descarga de margens plenas. A descarga de margens plenas é definida como a descarga líquida que preenche o canal ao nível da planície de inundação ativa (Wolman e Leopold, 1957). Esta planície é definida como uma superfície plana adjacente ao canal fluvial, modelada pela ação erosiva ou deposicional do fluxo das cheias e inundada pelo menos uma vez a cada dois anos. Williams (1978) por sua vez define a descarga de margens plenas como a vazão que preenche o canal até atingir o topo da margem. O nível de margens plenas demarca o limite entre os processos fluviais que modelam o canal e os que constroem a planície de inundação. INDICADORES MORFOLÓGICOS DO NÍVEL DE MARGENS PLENAS. Para definir o nível de margens plenas numa seção transversal, é necessária a identificação da atual superfície deposicional. Na maioria dos casos, esta superfície é de difícil detecção. Por esse motivo, foram propostos numerosos critérios para encontrar uma superfície equivalente. Os critérios foram agrupados em três categorias por Williams (1978): critérios baseados na identificação de superfícies deposicionais, em características botânicas ou sedimentológicas e nas características morfológicas do canal. Fernandez (2003) comenta e ilustra os critérios definidos por Williams (1978). A figura 1 mostra alguns dos critérios mais empregados na definição do nível de margens plenas em locais onde a planície aluvial não esteja bem definida. O patamar deposicional inclui depósitos arenosos de barras laterais. Em estudos realizados nas regiões Oeste e Sudoeste do Paraná, em rios com área de drenagem entre 1.000 e 12.000 km2 (Fernandez e Bortoluzzi, 2008), esta feição se mostrou confiável. A linha de escavação constitui uma feição erosiva côncava linear presente na fase

do barranco. O ponto de inflexão indica a cota na qual a área da seção transversal do canal começa a aumenta. O topo da margem e o nível da planície aluvial são feições que podem ser confundidos. Na definição da primeira feição é levado em conta apenas o aspecto topográfico, sem observar se a superfície é de origem residual, erosiva ou deposicional, enquanto que a segunda representa um depósito aluvial formado por processos atuais de sedimentação.

Figura 1: Critérios morfológicos empregados na identificação do nível de margens plenas (Modificada de McCandless; Everett, 2002). OBJETIVOS E CARACTERÍSTICAS DA ÁREA DE ESTUDO O objetivo do trabalho é avaliar a utilização de indicadores morfológicos na identificação do nível de margens plenas na porção superior do córrego Guavirá, que drena parte da área urbana do município de Marechal Cândido Rondon, extremo oeste do Paraná. A cabeceira do córrego Guavirá demarcada neste estudo, possui 10,8 km2, dos quais 42 % é ocupada pela área urbana. A área de estudo esta inserida no terceiro planalto paranaense onde afloram rochas basálticas de idade mesozóica (Nardy et al., 2002). O relevo do município é caracterizado por terrenos ondulados e escarpados, com altitude máxima de 420 m. Os interflúvios são estreitos e os vales apresentam-se entalhados, principalmente nas cabeceiras. Os solos, de textura argilosa, são constituídos por latossolo vermelho férrico, nitossolo vermelho e neossolo litólico (Moresco e Cunha, 2003). O clima da região é do tipo Cfa (classificação climática de Köppen), subtropical, úmido, mesotérmico, com precipitação média anual de 1.600 a 1.700 mm (IAPAR, 1994). LEVANTAMENTOS DE CAMPO No trecho em estudo foi definida uma seção transversal, na qual foram levantados perfis transversais do canal e da planície aluvial adotando a técnica usada por Fernandez et al. (2001). Ao longo de um percurso de 80 m (distância equivalente a 20 vezes a largura do canal) foram levantados perfis longitudinais empregando técnicas topográficas convencionais. Nos perfis longitudinais foram definidas as cotas do leito e do nível de água, assim como as cotas dos seguintes indicadores morfológicos do nível de margens plena: depósito de barras laterais, nível de escavação, ponto de inflexão da margem e planície aluvial.

O nível das cheias mais expressivas foram monitoradas com a adoção de uma régua de máximas, construída conforme a proposta de Douhi (2004) e Antoneli e Douhi (2005). A régua mede a cota máxima das enchentes com o auxílio de pequenos receptáculos formados por segmentos de mangueira de 2 cm de comprimento e 1 cm de diâmetro, fixados em posição oblíqua numa régua graduada. Cada receptáculo acumula água da enchente, indicando assim o nível máximo alcançado pela crescida. Para proteger a régua, esta é colocada num tubo de PVC com 10 cm de diâmetro, o qual é instalado numas das margens do córrego (Coordenadas geográficas: 24º 31’ 44” S e 54º 03’ 48” W) (Figura 2)

Figura 2: Réguas de máximas (à direita) instaladas no córrego Guavirá. Vista à montante.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Entre 2007 e 2008 foram monitorados 35 eventos de cheias, que superaram a base da régua de máximas, implantada na cota 96,0 m (Figuras 3 e 4). As cotas médias dos depósitos de barras laterais e do nível de escavação estão situadas somente em alguns decímetros acima no nível de base do córrego (Figura 5). Por essa razão, ambos os níveis foram inundados pelas cheias mais expressivas monitoradas no período de estudo. A cota média dos depósitos de barras laterais foi inundada pelos 35 eventos de cheia registrados e o nível de escavação por 33 eventos (Figura 3). Esta constatação nós permite afirmar que os níveis citados

acima não podem ser considerados referencias para a demarcação do nível de margens plenas. Assim, estas feições estão associadas a enchentes menos expressivas e por tanto mais freqüentes. Por outro lado, o ponto de inflexão e o nível da planície aluvial foram recobertos 15 e 8 vezes respectivamente (Figura 3), resultando numa média anual de 7,5 e 4 recobrimentos. Estas freqüências constituem valores exorbitantes em relação proposta por Wolman e Leopold (1957) para definir a planície aluvial ativa, usada como referencia na demarcação do nível de margens plenas. Segundo os autores, a planície aluvial ativa é inundada pelo menos duas vezes num período de três anos.

Figura 3: Cotas das cheias monitoradas no córrego Guavirá (a seção Diering) no período 2007-2008. No gráfico são representados os níveis de dois indicadores morfológicos usados para definir o nível de margens plenas.

Figura 4: Posicionamento dos indicadores morfológicos na seção transversal Diering no córrego Guavirá em Marechal C. Rondon, PR.

Figura 5: Variação longitudinal do leito e da lâmina de água, além dos indicadores do nível de margens plenas à montante e jusante da seção transversal de referencia (Data: 05/04/2008). CONCLUSÕES O trabalho mostra que numa bacia periurbana, os depósitos de barras laterais e os níveis de escavação não podem ser utilizados como referencia na identificação do nível de margens plenas. Por outro lado, o ponto de inflexão e a planície aluvial foram encobertas com maior freqüência em comparação com os valores encontrados na literatura para rios de climas temperados. Este fato pode ser causado devido à transformação de uma bacia agrícola em uma urbana ou pode constituir um fenômeno natural em rios tropicais.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ackers, P.; Charlton, F.G. (1970) Meander geometry arising from varying flows. Journal of Hydrology, 11: 230-252. Andrews, E.D. (1980) Effective and bankfull discharges of streams in the Yampa River Basin, Colorado and Wyoming. Journal of Hydrology, 46: 311-330. Antoneli, V.; Douhi, N. (2005) Método para estimar vazões máximas em pequenas bacias hidrográficas sem dados históricos. In: Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada, 11, USP, São Paulo, setembro de 2005, p. 734-740. Benson, M.A.; Thomas, D.M. (1966) A definition of dominant discharge. Bulletin of the International Association of Scientific Hydrology, 11: 76-80. Carling, P. (1988) The concept of dominant discharge applied to two gravel-bed streams in relation to channel stability thresholds. Earth Surface Processes and Landforms, 13: 355-367.

Douhi, N. (2004) Análise das condições físico-ocupacionais e suas implicações no comportamento hídrico da bacia hidrográfica do Rio Xaxim, Prudentópolis (PR). Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Maringá - UEM. Fernandez, O.V.Q. (2003) Determinação do nível e da descarga de margem plena em cursos fluviais. Boletim de Geografia, Universidade Estadual de Maringá, 21 (1): 97-109. Fernandez, O.V.Q.; Rebelatto, G.; Sander, C. (2001) Análise quantitativa de seções transversais em pequenos canais fluviais. Revista Brasileira de Geomorfologia, 2 (1): 85-92. Fernandez, O.V.Q. e Bortoluzzi, L.N. (2008) Magnitude e freqüência das descargas dominantes em rios das regiões Oeste e Sudoeste do Paraná. Anais do VII Simpósio Nacional de Geomorfologia, Belo Horizonte, cd-rom. IAPAR - Fundação Instituto Agronômico do Paraná (1994) Cartas climáticas básicas do Estado do Paraná, Curitiba (PR), 49 p. Inglis, C.C. (1968) Discussion of systematic evaluation of river regime. Proceeding of the American Society of Civil Engineers, Journal of the Waterways Harbour Division, 94: 109-114. McCandless, T.L.; Everett, R.A. (2002) Maryland stream survey: Bankfull discharge and channel characteristics of streams in the Piedmont hydrologic region. U.S. Fish & Wildlife Service Chesapeake Bay Field Office. Annapolis, MD. 175 p. Moresco, M.D.; Cunha, J.E. (2003) Solo e relevo as implicações dessa relação com os processos erosivos. In: Jornada Científica da Unioeste, 2, Campus de Toledo. Anais..cd-rom.. Nardy, A.J.R.; Oliveira, M.A.F.; Betancourt, R.H.S.; Verdugo, D.R.H.; Machado, F.B. (2002) Geologia e estratigrafia da Formação Serra Geral. Geociências (Unesp, São Paulo): 21: 15-32. Pickup, G.; Warner, R.F. (1976) Effects of hydrologic regime on magnitude and frequency of dominant discharge. Journal of Hydrology, 29: 51-75. Pickup, G.; Rieger, W.A. (1979) A conceptual model of the relationship between channel characteristics and discharge. Earth Surface Processes, 4: 37-42. Williams, G.P. (1978) Bank-full discharge of rivers. Water Resources Research, 14 (6): 1141-1153. Wolman, M.G. e Leopold, L.B. (1957) River flood plains: some observation on their formation. Profissional Paper, United Stated Geological Survey, 282, p. 87-109.

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