Id\'s - Cultura e \"movimento\" na construção de identidades culturais

August 15, 2017 | Autor: Rogério Salatini | Categoria: Políticas Públicas, Artes, Antropología, Gestão Cultural
Share Embed


Descrição do Produto

CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC Rogério Salatini de Almeida

ID’S – Cultura e “movimento” na construção de identidades culturais

São Paulo 2014

SUMÁRIO:

1 – INTRODUÇÃO........................................................................3 2 – IDENTIDADE CULTURAL – Uma Construção.....................3 3 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................6

 

2  

1) introdução O documento aprovado em 21 de outubro de 2005, na sessão plenária da 33a Conferência Geral da Unesco1 adotou uma Convenção sobre a Diversidade Cultural que estabelece exceção à cultura com relação às regras do comércio internacional. Pouco tempo antes, em 1o de agosto de 2004, o escritor peruano Mario Vargas Llosa, que viria a receber seis anos mais tarde o prêmio Nobel de literatura, publicava em sua coluna no jornal O Estado De São Paulo o artigo “Razões contra a exceção cultural”, um texto ácido, crítico da proposta de controle estatal sobre a circulação de produtos culturais. Em outro polo, defensor da promoção da diversidade cultural por meio de ações de Estado que promovam o pluriculturalismo, o professor José Marcio Barros apresenta uma visão complexa2 do tema em seu texto “Cultura, diversidade e os desafios do desenvolvimento humano”, publicado em 2008. Ainda são diversos os entendimentos possíveis para a questão, e as ramificações do debate abrangem temas como direitos civis, liberdades individuais, internacionalização das relações, o poder da indústria e do expansionismo cultural e econômico de alguns países, globalização e a preservação da identidade das culturas locais, pra citar apenas alguns. Partindo deste panorama, este texto apresenta reflexões sobre cultura, alteridade, diversidade e a ideia de “movimento” na construção e na preservação das identidades culturais, em tempos de globalização.

2) Identidade Cultural – Uma Construção O debate sobre identidade cultural (e a própria definição de “cultura”) tornou-se pauta obrigatória em diversos segmentos, após a aprovação da Convenção da Unesco para a diversidade cultural, em 2005.                                                                                                                 1

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. o próprio professor escreve no texto citado, o termo se refere ao pensamento do filósofo e sociólogo francês Edgar Morin, que propõe a ‘complexidade’ como um olhar amplo a ser aplicado na observação e compreensão do mundo.  

2  Como

 

3  

Vargas Llosa, em seu artigo de 2004 sobre o tema, apresenta argumentos para a reprovação do que chama exceção cultural, afirmando que o “nacionalismo cultural é a doutrina mais letal para um povo” (LLOSA: 2004). O escritor peruano chega a afirmar, no texto do artigo, que a ideia de uma cultura essencial à identidade de um país “é uma fraude de índole política que, na verdade, tem pouco a ver com a verdadeira cultura e muito, em compensação, com aquele ‘espírito da tribo’ que, segundo Popper, é o grande obstáculo para que se alcance a modernidade 3 ” (LLOSA: 2004). Para o professor e antropólogo José Márcio Barros, a proteção e a promoção da diversidade cultural por meio da implementação de políticas públicas voltadas para o patrimônio cultural é essencial para a preservação de alguns tipos de manifestações que são ricas culturalmente mas que não se sustentam no moderno mercado de bens e produtos culturais, internacionalizado, formado por indústrias cujos objetivos são sobretudo financeiros. A importância da diversidade cultural, para Barros, está sobretudo na relação indissociável entre a cultura e o desenvolvimento humano: “A articulação entre o patrimônio natural e o patrimônio cultural, tanto material quanto imaterial, é outra condição essencial, sem a qual, o desenvolvimento humano não se realizará em sua plenitude” (BARROS: 2008, p. 5) Em A interpretação das culturas, Clifford Geertz afirma o homem tal qual um “animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, e a cultura como estas teias, e a sua análise; portanto, não como uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do significado […]” (GEERTZ: 2008, p. 4). No cerne do senso comum, encontramos entendimentos acerca da construção de identidade cultural, e da própria ideia de cultura, associados à noção de “tradição”, muitas vezes em uma acepção do termo afastada da ideia de “movimento” inerente à “procura do significado”, ou à “construção de uma leitura do significado” da manifestação cultural, presente na antropologia interpretativa de Geertz, que propõe um papel totalmente ativo ao etnógrafo, descrevendo seu trabalho como o de decifrar um universo simbólico “[...] cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e                                                                                                                 3

Mario Vargas Llosa se refere à Karl Raimund Popper (Viena, 28 de Julho de 1902 — Londres, 17 de Setembro de 1994), filosofo austríaco, naturalizado britânico.

 

4  

comentários tendenciosos, escrito não com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamento modelado” (GEERTZ: 2008, p. 7). O crítico pós-colonialista indiano Homi K. Bhabha introduz o conceito polêmico de “hibridismo” para refletir sobre identidade cultural em sociedades colonizadas. Em O local da cultura, Bhabha, ao citar Lyotard4, aborda o pulso do tempo na narrativa da tradição, e discute o modelo ocidental de preservação de conteúdos: A tradição é aquilo que diz respeito ao tempo, não ao conteúdo. Por outro lado, o que o Ocidente deseja da autonomia, da invenção, da novidade, da autodeterminação é o oposto – esquecer o tempo e preservar, acumular conteúdos; transformá-los no que chamamos história e pensar que ela progride porque acumula (LYOTARD apud BHABHA: 1998, p. 93). Desse modo, podemos concluir que o debate acerca da proteção e promoção da diversidade cultural carece ainda de mais contribuições, no sentido de identificarmos em que medida os movimentos naturais de transformação das culturas e as liberdades individuais podem ser equacionados aos interesses de preservação dos patrimônios culturais dos países, e ao desenvolvimento humano. Como bem argumenta o professor José Márcio Barros, é inegável a necessidade “de uma educação para a diversidade, entendida menos como uma atitude de respeito passivo e mais uma forma de estar no mundo, onde a articulação das diferenças se configura como pré-requisito ao desenvolvimento humano” (BARROS: 2008, p. 6). No entanto, há que se cuidar para que a intervenção do Estado nos processos culturais não se dê em uma lógica ufanista, capaz de reproduzir em escala nacional a hegemonia global da qual a Convenção da Unesco de 2005 visa proteger as culturas locais. Levar em conta a ação do tempo sobre as identidade culturais, como sugere Bhabha, garante o alcance à modernidade ao qual o escritor Mario Vargas Llosa se refere.

                                                                                                                4

 

Jean-François Lyotard (1924-1998), filósofo francês e importante pensador da pós-modernidade.

5  

Referências Bibliográficas: BARROS, J. M. Cultura, diversidade e os desafios do desenvolvimento humano. In: Diversidade cultural: Da proteção à promoção. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. Disponível em: http://xa.yimg.com/kq/groups/16563361/284422603/name/culturadiversidade-e-os-desafios-do-desenvolvimento-humano-jmbarros.pdf. Acesso em 23/08/2014. BHABHA, Homi K. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998. BRANT, Leonardo. Dimensões e perspectivas da diversidade cultural no Brasil. In: Diversidade cultural: globalização e culturas locais: dimensões, efeitos e perspectivas. São Paulo: Instituto Pensarte, 2005. GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. 1a ed., 13ª reimp. Rio de Janeiro: LTC, 2008. LLOSA, Mario Vargas. Razões contra a exceção cultural. In: O Estado De São Paulo. 1o de agosto de 2004. Caderno 2, D14, p. 150. MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2a ed. São Paulo: Cortez; Brasília: UNESCO, 2000.   SAID, Edward W. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. SOUZA, Lynn Mario Trindade Menezes de. Hibridismo e Tradução Cultural em Bhabha. In: Margens da Cultura: Mestiçagens, hibridismo e outras misturas. São Paulo: Boitempo, 2004, p. 113-133.

 

6  

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.