Imagens e novas tecnologias no ensino de filosofia:relato de uma experiência

May 24, 2017 | Autor: M. Scaldaferro | Categoria: Philosophy, Education, Teaching Philosophy
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IMAGENS E NOVAS TECNOLOGIAS NO ENSINO DE FILOSOFIA: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA

Recebido em: 09/08/2012 Aceito em: 05/11/2012 Publicado em: 15/12/2012 Republicado em: 25/03/2014

Resumo. Nosso artigo discute o papel das imagens e das novas tecnologias da informação e comunicação no ensino de filosofia. Primeiramente o artigo desenvolve uma abordagem teórica, apontando de que modo imagem e tecnologia podem contribuir para o ensino de filosofia. Num segundo momento apresentamos alguns relatos de nossa prática docente no ensino de filosofia utilizando essas ferramentas. Palavras-chaves: Imagem. Tecnologias. NTICs. Blog. Filosofia.

IMAGES AND NEW TECHNOLOGIES IN TEACHING PHILOSOPHY: AN EXPERIENCE REPORT Abstract: Our article discusses the use of images and new information and communication technologies in teaching philosophy. First, the paper develops a theoretical approach, pointing out how image and technology can contribute to the teaching of philosophy. In a second step we present a few reports of our teaching practice in the teaching of philosophy using these tools. Keywords: Image. Technologies. NICTs. Blog. Philosophy

# Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Espírito Santo. Leciona filosofia na rede estadual de ensino. Meus estudos e pesquisas se orientam principalmente por temas na área de Filosofia Política, Ética, Filosofia Social, História Política, Filosofia da História e Epistemologia..

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a história da filosofia Platão foi um dos principais pensadores a pensar o ensino de filosofia a partir do uso de imagens. Vemos isso em uma de suas principais obras, A República. As observações feitas por Platão ainda se mostram muito atuais, no entanto, na sociedade moderna, principalmente com o surgimento da tal “Era da Informação”, vemos uma avanço na reprodução em massa de imagens. As novas tecnologias da informação e comunicação estão permitindo cada vez mais compartilhar de diversas maneiras diferentes tipos de imagens. Se Platão pensou a relação entre imagem e ensino de filosofia, a era da informação nos coloca diante da tarefa de pensar o papel das novas tecnologias na interconexão entre esses dois polos. Nosso artigo pretende num primeiro momento expor as ideias de Platão acerca de uma educação pautada pela imagem, que prepara os indivíduos para o conhecimento filosófico (1). Num segundo momento vamos discutir de que modo as tecnologias da informação e comunicação provocam alterações significativa na relação “imagens” “ensino” (2). A seguir apresentaremos as vantagens que uma dessas novas tecnologias oferece no ensino de filosofia. Trata-se aqui dos “blogs”, que permitem conectar de maneira bastante flexível imagem, fala e escrita, contribuindo de maneira significativa para o ensino de filosofia (3). Depois disso pretendemos apresentar o relato de uma experiência, apontando de que modo essa tecnologia, o blog, tem contribuído para minha prática docente, permitindo um ensino de filosofia pautado no uso de imagens (4). Ao final apresentaremos algumas considerações finais sobre os pontos discutidos (5).

1. O valor das imagens no ensino de filosofia Platão sinalizou na sua obra A república uma estreita relação entre mímesis e paideia. O que Platão chama de mímesis é geralmente traduzido por imitação, no sentido de uma imagem produzida a partir de um modelo. A arte mimética seria o saber inerente ao produtor de imitações. Fariam parte da mimética a pintura, escultura, tragédia, comédia, poesia épica, a música, etc. Paideia é o termo grego utilizado para descrever a educação, a formação dos indivíduos para vida na polis. Em A República, o filósofo grego indicou que a produção de imagens age diretamente sobre a educação. No respectivo diálogo platônico os personagens Sócrates e Gláucon travam uma discussão buscando traçar as principais características de uma cidade ideal. A importância dada às “imagens” na constituição da educação dessa polis ideal é tão grande que em

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determinado momento do diálogo os interlocutores passam a deliberar sobre que tipo de arte estaria habilitada para introduzir suas imagens na pólis perfeitamente justa. A proposta feita por Sócrates é que ele e Gláucon só devem introduzir na cidade ideal imagens produzidas por “[...] artistas cuja boa natureza habilitou a seguir os vestígios da natureza do belo e do perfeito, a fim de que os jovens, tal como os habitantes de um lugar saudável, tirem proveito de tudo” (PLATÃO, 2007, p. 132). Uma arte que produza imagens do belo deve substituir uma arte produtora de imagens terríveis que impingem no homem o medo, o desregramento, a falta de discernimento. Platão se refere no texto a passagens da Ilíada que apresentam o Hades como um lugar que os homens devem temer, ou que apresentam os deuses e os heróis tendo comportamentos nem um pouco virtuosos. Tais imagens devem ser evitadas visto que toda educação pela mímesis penetra “[...] mais fundo na alma e afectam-na [sic] fortemente” (PLATÃO, 2007, p. 133), de modo que quem se depara o tempo todo com imagens da imperfeição em sua formação (paideia) acaba interiorizando a imperfeição. Esse processo de interiorização da mímesis é possível graças ao mimetismo inerente ao próprio receptor da imagem. Tentemos entender isso. Como já dissemos no início de nosso texto, a palavra mímesis pode ser traduzida tanto por imagem como por imitação. O artista não é um “criador”, mas sim um “imitador” que realiza uma imitação (imagem, cópia) do modelo original. Entretanto, [...] não é só o artista que imita ao produzir sua obra, também o que acolhe a obra, o ouvinte – e em maior medida quão mais jovem for – passa a imitar, em sua vida ordinária, os modelos de ação e discurso que recolhe das obras de arte (RIBEIRO, 2006, p. 114).

Dessa forma é possível afirmarmos que a educação dos guardiões da cidade ideal se dá a partir da imitação e pela imitação. Ou seja, o fato de se imitar as imagens (imitações) produzidas pelos poetas da cidade ideal faz com que o que elas representam se transforme em “[...] hábito e natureza para o corpo, a voz e a inteligência” (PLATÃO, 2007, p. 120). Para Platão “[...] nenhuma forma, cor, ruído, silêncio, textura, cheiro ou sabor é indiferente ou ‘inofensivo’ nesse processo de formação do caráter (êthos)” (RIBEIRO, 2006, p. 114). Isso faz com que nenhuma mímesis seja dissociada de um processo paidêutico. É preciso salientar que Platão pretende substituir a autoridade da poesia pelo conhecimento filosófico. Entretanto, a substituição das imagens da tradição pela filosofia só é possível se antes for inculcado na alma dos

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jovens novas imagens. Platão chega a comparar essas imagens à tinta branca onde se mergulham os tecidos antes deles receberem as outras cores. A tinta branca teria a função de fazer com que as cores se afixassem ao tecido, permitindo que depois de várias lavagens ele não desbotasse. As imagens que substituiriam as velhas imagens do mundo homérico seriam uma espécie de tinta branca que permitiria aos jovens receberem em sua alma o conhecimento filosófico, garantindo que este não se perdesse. Não é então por acaso, que um discurso mais conceitual apareça nos diálogos platônicos convivendo com as alegorias criadas pelo filósofo, tal como o mito da caverna ou o mito de Er. Embora não busquemos em nossas práticas educacionais realizar essa pólis ideal descrita por Platão, não podemos julgar que essas observações do filósofo sejam anacrônicas. A presença de imagens no nosso processo de ensino aprendizagem tem-se mostrado benéfica, trazendo resultados satisfatórios. Platão ao dar ênfase a essa relação entre mímesis e paidéia se mostra mais atual do que nunca. Contudo, em nosso tempo um outro elemento surge para mediar esses dois polos, as tecnologias da informação e comunicação. Hoje não podemos dissociar a reflexão sobre o processo paidêutico da reflexão sobre essas novas tecnologias.

2. Desenvolvimento tecnológico, reprodução de imagens e ensino formal Em 1936 Walter Benjamin já havia feito observações sobre a crescente participação da tecnologia na reprodução massiva de imagens. Ao comentar sobre a reprodutibilidade técnica das obras de arte, o filósofo alemão afirma: Em sua essência, a obra de arte sempre foi reprodutível. O que os homens faziam sempre podia ser imitado por outros homens. Essa imitação era praticada por discípulos, em seus exercícios, pelos mestres, para a difusão das obras, e finalmente por terceiros, meramente interessados no lucro. Em contraste, a reprodução técnica da obra de arte representa um processo novo, que se vem desenvolvendo na história intermitentemente, através de saltos separados por longos intervalos, mas com intensidade crescente (BENJAMIN, 1985, p. 166). O que chama a atenção de Benjamin nessa época é a fotografia e o cinema, elementos onde se via de forma jamais vista a interrelação entre tecnologia, imagem e reprodução massiva. O que veríamos nas próximas

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décadas seria uma crescente participação das novas tecnologias na reprodução de imagens. Isso ficou ainda mais evidente a partir da década de 70 quando se passou a falar da “Era da Informação”, período histórico marcado pelo surgimento de invenções como o computador pessoal, a rede de computadores, a fibra ótica, o microprocessador. Era de se esperar que com o tempo essa progressiva simbiose entre imagem e novas tecnologias atingisse também os espaços responsáveis pela a educação formal, isto é, as escolas, universidades, centros de ensino. Em 1997 quando publicou seu livro Cibercultura, Pierre Lévy afirmou: “o uso das redes de telecomunicação e dos suportes multimídia interativos vem sendo progressivamente integrado às formas de ensino mais clássicas” (LÉVY, 1999, p. 170). Hoje este é o cenário, e tende a ser cada vez mais, de diversas escolas, a presença das chamadas novas tecnologias de informação e comunicação (NTICs). Vemos dividirem espaço com o giz e os livros as TVs digitais, DVDs, Computadores, Internet, câmeras, etc. Tais tecnologias podem colocar alunos e professores como meros receptores no processo de comunicação. Nesse caso educador e educando se veem na situação de depositários de informações prontas emitidas pelo vídeo e a internet, por exemplo. Entretanto, há a possibilidade do uso dessas tecnologias visando uma ampliação da cidadania. O indivíduo pode adentrar ao processo comunicativo como um produtor e não somente um receptor. Assim, ele se põe na tarefa de se apropriar das novas tecnologias utilizando-as para produzir e recriar informação e conhecimento. O ciberespaço, isto é, a interconexão mundial de computadores, vem permitindo esta “situação de troca generalizada de saberes” (LÉVY, 1999, p.172). No século IV a.C. Platão falou sobre a importância das imagens no desenvolvimento do ensino da filosofia. Com o avanço na criação de ferramentas que permitem um contato cada vez maior com diversas imagens, cabe ao profissional que atua com o ensino de filosofia se apropriar dessas tecnologias. Só pensar e discutir os efeitos do desenvolvimento tecnológico no mundo contemporâneo é insuficiente. É preciso que esse desenvolvimento contribua e participe do ensino, estando presente na sala de aula. O desenvolvimento da autonomia intelectual e ao mesmo tempo o desenvolvimento da aprendizagem em grupo parece ser uma das principais vantagens da utilização dos blogs na educação. O professor aparece nesse processo como um direcionador e facilitador da apreensão dos conteúdos por meio do uso das novas tecnologias. Deste modo, ele precisa não só do domínio do conteúdo da sua disciplina, mas deve se atualizar das novas

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linguagens que surgem com o aparecimento das inovações tecnológicas.

3. O espaço virtual: conectando ensino, imagem e tecnologia Quando o educador coloca em sua prática educacional as NTICs visando à formação de produtores de conhecimento, e não só receptores de informação, ele “favorece ao mesmo tempo as aprendizagens personalizadas e a aprendizagem coletiva em rede” (LÉVY, 1999, p. 158). Nesse processo os blogs aparecem como ferramentas formidáveis. Partindo dessa visão de que o blog possibilitaria aos meus alunos se colocarem na condição de produtores de conhecimento e ao mesmo tempo compartilharem seus trabalhos em rede, contribuindo para o aprendizado de outros indivíduos, decidi criar o blog “Filosofia na Escola” (www.filosofianaescola.com.br). Tal espaço virtual é uma ferramenta capaz de realizar uma interatividade de diversas mídias, possibilitando juntar a fala, a escrita e a imagem com extrema flexibilidade. Com a criação do blog, se tornou mais proveitoso o uso de imagens para direcionar o meu trabalho docente, seja por meio dos quadrinhos, vídeos, pinturas, etc. Isso pode ser visto com uma série de atividades que desenvolvi com meus alunos do ensino médio. Um das atividades foi desenvolvida quando eu trabalhava com os alunos o conteúdo “Mito e Filosofia”. Os alunos do 1º ano do ensino médio criaram histórias em quadrinhos a partir da leitura de diversos mitos. Para ver as HQs criadas pelos alunos clique aqui. A interatividade entre tecnologia, imagem e ensino também pode ser observada na produção do minidocumentário: “A fé que vem da África”. O trabalho é resultado dos seminários sobre “As religiões e o sagrado”, realizados também com os alunos do 1º ano. O vídeo pode ser assistido clicando aqui. É preciso observar que nosso trabalho parte do pressuposto platônico de que as imagens preparam a “alma” do indivíduo para adentrar ao estudo do conhecimento filosófico. Sendo assim, tais atividades serviram como preparação para uma abordagem da filosofia a partir de sua história. A primeira atividade contribuiu para compreendermos as diferenças entre os discursos dos poetas Homero e Hesíodo em relação aos pré-socráticos. A segunda atividade foi uma preparação para o estudo de textos do Mircea Eliade presentes no livro O sagrado e o profano, possibilitando assim, um estudo dos conceitos de espaço sagrado e espaço profano, símbolo, ritual etc. Uma das atividades que apresentaram os resultados mais satisfatórios foi o projeto “Cine Filosofia”, feito com os alunos do 3º ano. Com essa

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atividade foi possível uma plena conexão entre tecnologias (vídeo, blog), imagens (filme) e filosofia. Nos seminários os alunos ficaram incumbidos de analisar filmes clássicos, realizando uma leitura destes a partir dos conceitos trabalhados no conteúdo “Liberdade e Determinismo”. Além de analisar cenas do filme, os alunos produziram textos de extrema qualidade sobre as películas que depois foram apresentados para a turma. Para entender como esse trabalho foi realizado, acho pertinente apresentar o roteiro de desenvolvimento dele.

4. Relato de uma experiência. Primeiramente busquei ao longo das aulas caracterizar alguns tipos de determinismo. Para isso apresentei as seguintes questões aos alunos: - O que determina nossa forma de agir e pensar? -  Nossa constituição biológica? -   A cultura e os costumes? -   A nossa época? -   Nossa situação econômica? -   Divindades? -   A raça? A partir das respostas dadas pelos alunos a essas questões pude começar a esclarecer os diversos tipos de determinismo: a) determinismo mitológico/ teológico; b) determinismo biológico (genético); c) determinismo geográfico; d) determinismo histórico; e) determinismo racial. Par ver alguns slides que utilizei nas aulas expositivas clique aqui. Em seguida procurei problematizar com os alunos a questão da imputabilidade. O problema da imputabilidade (responsabilidade) foi abordado aqui a partir do confronto com determinismo radical, que afirma que o livre arbítrio é uma ilusão. A questão a ser discutida é a seguinte: Como podemos nos considerar responsáveis por nossas ações se somos completamente determinados? A questão pode ser abordada também desde a perspectiva do determinismo teológico. Nesse caso o problema seria abordado do seguinte modo: Se Deus é responsável pelo destino dos homens, sabendo tudo o que vai acontecer com eles, como eu posso ser responsável pelos meus atos? Como é possível conciliar predestinação e livre-arbítrio? Depois da discussão em torno desses problemas os alunos desenvolveram a primeira atividade para exercitar a capacidade de escrever sobre o tema. Eles resolveram em sala de aula a seguinte questão discursiva:

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QUESTÃO (Vest-UFRJ) Uma das questões importantes que ocuparam a filosofia ocidental desde seu surgimento diz respeito às nossas decisões e ações. De um lado, alguns filósofos sustentaram que todos os acontecimentos do mundo, inclusive as nossas decisões por realizar ou não uma ação, são inteiramente determinados por leis da natureza diante das quais a vontade humana nada pode. Essa posição é muitas vezes chamada de determinismo. De outro lado, outros filósofos rejeitaram essa concepção determinista por a considerarem incompatível com a tese de que a liberdade é um traço característico das decisões humanas, defendendo que, por sermos livres, está sempre em nosso poder, isto é, sob o poder da nossa vontade, a decisão por realizar ou não uma ação. Considerando que uma decisão imputável é aquela que pode ser legitimamente atribuída a alguém como seu autor responsável, isto é, alguém capaz de responder por ela, identifique qual das duas doutrinas, a do determinismo ou a da liberdade, tais como acima descritas, é mais compatível com o princípio da imputabilidade. Justifique sua resposta.

Uma segunda atividade a ser desenvolvida é a discussão de vídeos que tratam sobre o tema Liberdade e determinismo Sugiro aqui dois vídeos disponíveis no meu blog.  Os vídeos são trechos dos filmes Waking Life e Laranja mecânica. Para assisti-los clique aqui. Depois dessa apresentação teórica do tema e o desenvolvimento das duas atividades os alunos já estão em condições de desenvolver o seminário que seria a terceira e principal atividade. Os alunos devem formar grupos de até seis integrantes e a partir do tema “liberdade e determinismo” eles desenvolverão textos analisando filmes clássicos. Essas análises serão apresentadas também para a turma durante as aulas.  Para realizar as análises dos filmes os grupos devem se orientar pelas seguintes questões: - Que tipo de determinismo está presente no filme? O que influencia o comportamento dos personagens? (economia, cultura, o meio, a religião, a disposição genética, a época, Deus, deuses). - Existem personagens que não conseguem escapar das determinações (impostas pela cultura, economia, o meio a época, etc)? Quais? Por que o grupo afirma isto? - Existem personagens que se voltam contra as determinações impostas? Quem são eles? Quais momentos do filme justificam essa análise do grupo? - O filme mostra um confronto entre o indivíduo e as determinações? Em qual cena do filme podemos ver esse confronto?

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- O que predomina no final do filme: As determinações são mais poderosas do que os indivíduos? Ou os indivíduos conseguem se sobrepor às determinações impostas a eles? Nos seminários que realizei com os meus alunos os seguintes filmes foram sugeridos para o desenvolvimento do trabalho: 1984, Abril despedaçado, Admirável mundo novo, A guerra do fogo, Gattaca, Fúria de Titãs, Cidade de Deus, Laranja mecânica, Última parada 174. O desenvolvimento dessas atividades introduzirão os alunos ao tema liberdade e determinismo. Deste modo eles poderão acompanhar de maneira mais perspicaz o estudo de textos clássicos sobre o tema (Agostinho, La Mettrie, Descartes, Sartre, Marx). Ou seja, essas atividades são um trabalho de introdução a um tema que deverá se desdobrar depois na leitura dos clássicos da história da filosofia. Até porque o ensino de filosofia não deve se desvincular de sua história.

5. Considerações finais Sabemos que existem diferentes contextos em que estão inseridas as escolas no Brasil. Além disso, nas escolas públicas estão presentes inúmeros problemas: falta de materiais didáticos e recursos tecnológicos, falta de estrutura física, violência contra os professores, assédio moral por parte de funcionários despreparados que ocupam cargos de chefia, desinteresse do alunos, dentre outros problemas. As experiências e ideias aqui relatadas não são um método universal que pretende indicar os “passos para uma aula perfeita”. Hoje é muito comum esse tipo de discurso, e a grande maioria dos materiais destinados ao “ensino de filosofia” tem esse caráter de “o que deve ser feito”. Quase sempre tais materiais são produzidos por pessoas que não tem contato com o ensino médio há anos. Enquanto se discute o “que devemos fazer” para uma aula ser perfeita, poucas experiências docentes são compartilhadas. Nosso artigo pode ser considerado um convite ao abandono dessa postura que nos coloca mais como burocratas do que como professores. No clássico filme A vida de Brian dos ingleses do Monty Python há um grupo de rebeldes que se reúnem constantemente para planejar a revolução. Em uma das cenas do filme, uma das rebeldes chega avisando que um membro do movimento (Brian) estava sendo capturado para ser executado. O líder do movimento sugere então que eles marquem uma reunião e que um dos

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rebeldes seja responsável por fazer a “ata”. Esta cômica imagem lembra como estão se desenvolvendo as discussões sobre o ensino de filosofia no Brasil: muitas atas, muitas reuniões, elaboração de métodos por parte de indivíduos que não lecionam, muitas lamentações de como a ditadura militar foi um empecilho ao desenvolvimento do ensino de filosofia. Tal como o metafísico olha o contingente e transitório como inferior ao universal, os “especialistas” em criar métodos de ensino olham com ojeriza as práticas docentes. Não queremos aqui reproduzir o bordão dos reducionistas e preguiçosos: “na prática a teoria é outra”. O docente que desmerece o momento teórico, principalmente o que leciona filosofia, está dando um tiro no próprio pé. Com nosso artigo apontamos que nossos pressupostos teóricos podem sim servir de orientação para elaboração e desenvolvimento de algumas de nossas práticas docentes. Mas compartilhar nossas práticas parece contribuir mais para a troca de experiências do que compartilhar somente nossos pressupostos teóricos. O desenvolvimento de práticas alternativas e que atraiam o estudante para o estudo da filosofia não é algo simples. O momento teórico aparece como uma bússola que dá a direção, o momento da prática docente seria a construção do caminho. Para construir esse caminho é necessário certa disposição e instantes de criatividade. E como sabemos, para ser criativo não há fórmulas nem métodos. Além do mais, nem sempre é possível ser criativo o tempo todo. Daí a importância em compartilhar o que estamos fazendo em sala de aula, criando uma rede de aprendizagem coletiva. Se nossas experiências com o uso de imagens e tecnologias puderem contribuir para outros professores se sentirem estimulados a compartilhar suas práticas, criando debates em torno do que estamos fazendo hoje com o ensino de filosofia, talvez possamos contribuir de forma efetiva para a consolidação da disciplina na educação básica.

Referências BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: ________. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985. LÉVY, P. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 1999 PLATÃO. A república. 10.ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2007. RIBEIRO, L. F. B. Arte no pensamento de Platão. In: SEMINÁRIOS

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INTERNACIONAIS MUSEU VALE DO RIO DOCE – ARTE NO PENSAMENTO, 2006, Vila Velha. Anais... Vila Velha: [s.n.], 2006

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