IMPACTOS DO TURISMO: UM ESTUDO NA ALDEIA INDÍGENA SÃO FRANCISCO - BAÍA DA TRAIÇÃO / PB

May 23, 2017 | Autor: Fernanda Lima | Categoria: Cultural Studies, Povos Indígenas, Indígenas, Turismo Cultural
Share Embed


Descrição do Produto

Artigo

Impactos do turismo: um estudo na aldeia indígena São Francisco- Baía da Traição/PB. Fernanda de Lima Cândido Elídio Vanzella Adriana Brambilla Faculdade Estácio da Paraíba [email protected]

Resumo A atividade turística pode gerar impactos positivos e negativos nas localidades onde se desenvolve e esses impactos irão refletir nas práticas culturais da comunidade receptora. Neste sentido, o presente artigo teve como objetivo estudar os impactos do turismo em uma aldeia indígena denominada São Francisco. A referida Aldeia fica localizada no município de Baia da Traição, uma região bastante visitada, principalmente pela presença de índios Potiguaras. Para a realização do estudo, adotamos a pesquisa bibliográfica e documental, entrevista e observação. Os resultados mostram que o turismo que se desenvolve na região é organizado pelos próprios habitantes e por isso, de forma geral, os entrevistados consideram que seus modos de vida não foram afetados pela presença dos visitantes. Na verdade, segundo os inquiridos, o turismo funciona como uma renda extra através da venda de artesanato e outros produtos locais e estimula a autoestima local, uma vez que a maioria dos turistas busca vivenciar a cultura indígena, através de um turismo de experiência. Palavras-chave: impactos; turismo; aldeia; São Francisco.

1 Introdução O turismo pode ser compreendido como uma atividade que colabora para o desenvolvimento de uma localidade, como também para a preservação das tradições, favorecendo a criação de empregos e movimentando a economia (OMT, 2001). Mas, esses benefícios só ocorrem quando existe uma preocupação com os impactos ocasionados pelo turismo na localidade onde se desenvolve. Para isso, é necessário que haja o comprometimento de todos os envolvidos, isto é, poder público, iniciativa privada e comunidade, porque se o turismo for desenvolvido de maneira desordenada poderá acarretar em vários danos ao patrimônio e à comunidade receptora (DIAS, 2006). A forma de implantação da atividade turística, em uma comunidade, terá reflexos no futuro e isto justifica o estudo. Nesse contexto, quando se deseja a obtenção de resultados benéficos, tanto imediatos, como em médio e

longo prazos deve-se trabalhar de maneira sustentável, impondo limitações e trabalhando em conjunto com a comunidade. Com isso, o objetivo deste trabalho é analisar os impactos do turismo na aldeia São Francisco, localizada no município de Baía da Traição, Estado da Paraíba. 2 Referencial teórico O turismo pode ser considerado uma atividade que compreende o movimento de pessoas por lugares distintos de seu ambiente natural, em busca de atividades de lazer, proporcionando o encontro do turista com o destino e seu conjunto, ou seja, tudo que colabora para o desenvolvimento da atividade turística (OMT, 2001). O turismo pode ser classificado de acordo com a atividade desenvolvida e pelo espaço onde acontecem as atividades (SANTANA, 2009). A atividade turística estimula a conservação do patrimônio, através de incentivo ao aprendizado de práticas culturais dos

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB, 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

1

antepassados, desde artesanatos, comidas, bebidas e danças, pois essas manifestações se fortalecem e ganham vida porque existem turistas que buscam conhecer e interagir com os diferentes modos de vida (DIAS, 2006). Nesse sentido, os agentes culturais são responsáveis pela execução dos fazeres e saberes culturais, estando presente na cultura o objeto de trabalho dos profissionais do turismo (GASTAL, 2000). A cultura pode ser definida como sendo todas as manifestações que venham unir o cotidiano de uma comunidade, sejam costumes, objetos criados, e tudo que envolva a vivência de uma sociedade (FERREIRA; AGUIAR; PINTO, 2012), e é através desses bens culturais que o turismo se desenvolve. Quando se fala em turismo e cultura é imprescindível dizer que não existe cultura criada para que o turista veja, não é um espetáculo no qual se inicia quando os turistas chegam, cultura é a rotina praticada pela comunidade, e que com a chegada dos turistas no local, estes são convidados a interagir com a cultura local (GASTAL, 2000). A cultura não inerte, ela é viva, movimentada e vale salientar que o turismo não é o único responsável por esse processo (OLIVEIRA, 2005). O turismo é dinâmico, ele ocasiona algumas mudanças ou simplesmente adaptações nos espaços para receber os turistas. Se for para receber visitação em massa essa adaptação será mais trabalhosa, e ainda pode aumentar os problemas sociais na comunidade, é importante que o local possua uma boa estrutura e capacidade de suprir as necessidades dos moradores e dos visitantes (DIAS, 2006). A avaliação dos impactos que o turismo venha a provocar depende da forma como ele é desenvolvido, podendo influenciar na perda das características culturais locais, ou constituir uma forma de resgate e manutenção dessas características (BRAMBILLA, 2015). Quando a comunidade é consciente de que o turismo pode trazer benefícios e tem seus modos de vida respeitados, ela passa a enxergar essa atividade com outro olhar, reagindo de forma mais hospitaleira, isso facilita a interação entre os visitantes e os receptores (EUSÉBIO; CARNEIRO, 2012). Porém, o turismo quando não é bem planejado ocasiona problemas na comunidade receptora, como a perda de identidade, em que a população é forçada a mudar sua forma de agir para melhor agradar os visitantes. Assim, ao fazer uso da cultura como meio de desenvolvimento

econômico interno, os costumes, as práticas locais passam a ser vistas apenas sob o aspecto comercial (DIAS, 2006). A produção de artesanato pode perder sua autenticidade se começar a ser produzida em grande escala para atender à demanda turística, deixando de lado todo valor cultural de produzir a própria peça manualmente. De acordo com Souza e Filho (2011), entre os impactos negativos, da atividade turística, estão a perda de tranquilidade da comunidade receptora, de modo que antes havia menos agitação e violência, mudança no ritmo de vida e nos modos de vida. Brambilla (2015) assevera que uma maneira que o turismo pode impactar negativamente em uma comunidade, é promovendo a realização de espetáculos criados exclusivamente para o turista, ferindo a realidade cultural de um povo, enganando os próprios turistas sobre a verdadeira cultura local, mas por outro lado, o turismo pode ser o influenciador da renovação e fortalecimento da cultura e aumentar as oportunidades de emprego e movimentação da economia, bem como incentivar a preservação e a conservação do patrimônio natural (SOUZA; FILHO, 2011). A interação entre a comunidade receptora e o turista é muito relevante, pois ocorre no comércio, na informação turística, nas ruas, festividades e nos monumentos locais, esse contato pode ser breve, ou mais prolongado, satisfatório ou não e com grau de formalidade maior ou menor (EUSÉBIO; CARNEIRO, 2012). O turismo impacta positivamente na preservação cultural de um povo quando implantado em conjunto com a comunidade, gerando benéficos econômicos e estruturais, que muitas vezes são melhorados justamente por conta da atividade turística, surgindo a necessidade de ampliação e melhoramento dos serviços, para melhor atender à comunidade e aos turistas. Antes de analisar os impactos turísticos, é necessário averiguar como a atividade se desenvolve (BRAMBILLA, 2015). A atividade turística proporciona o encontro entre culturas, permite o intercâmbio entre a comunidade receptora e os visitantes, podendo ser um processo bastante positivo, principalmente quando aproveitado de maneira consciente, a fim de descobrir algo novo, diferente, mas sem permitir que possa modificar suas principais vivências (OLIVEIRA, 2005). No caso do turismo em terras indígenas, objeto do presente estudo, existem duas linhas

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

2

de pensamento: uma em que os índios são vistos como vítimas da exploração turística e sua cultura tem sido degradada como resultado do turismo e outra em que a dominação Ocidental não tem conseguido atingir completamente as culturas indígenas (FORTUNATO; SILVA, 2011). Os povos indígenas têm visto na atividade turística uma alternativa sustentável de desenvolvimento local empreendida a partir de critérios estabelecidos pelo próprio grupo, o que significa dizer que o desenvolvimento turístico permite ao mesmo tempo a integração e a diferenciação de forma coparticipante, não estando nem separadas nem em sentido inverso (LEAL, 2007). Neste sentido, a pesquisa visou conhecer os impactos turísticos causados na Aldeia São Francisco no município de Baia da Traição-PB. 3 Baía da Traição e Índios Potiguaras na Paraíba: O município de Baía da Traição está localizado no litoral norte da Paraíba, vizinha à cidade de Marcação e de Rio Tinto, e aproximadamente 90 km de João Pessoa, capital paraibana. Destaca-se, ainda, que o município de Baia da Traição possui 13 aldeias e cerca de sete mil habitantes, sendo 95% indígenas. É uma região bastante visitada, principalmente pela presença de índios Potiguaras, em específico na Aldeia de São Francisco, por ser a mais característica em termo e traços físicos indígenas. Os potiguaras são os únicos índios brasileiros que permanecem no mesmo território desde antes do descobrimento do Brasil, pois resistiram às tentativas de conquista de seu território (LODEWIJK, 2016). A Baía da Traição, que os índios chamavam de Acajutibiró, terra de caju azedo (ALVES, 2016), é afamada por ser o berço dos índios potiguaras e foi o primeiro ponto, no hoje território paraibano a ser avistado pelos portugueses. Considerado um dos mais belos litorais do nordeste, se destacam falésias, praias sinuosas, bem como o farol e o forte, local que atraiu franceses, portugueses e holandeses. O nome Baía da Traição associa-se a primeira expedição portuguesa que chegou ao município em 1501. De acordo com Palitot (2005), o nome “traição” é dado pelo fato dos portugueses tentarem se aproximar aos indígenas através de dois mancebos, integrantes da tripulação que trabalham com serviços braçais, que foram

enviados com o prazo de três dias para retornarem, e como isso não aconteceu, no terceiro dia, enviaram mais um para tentar a aproximação. No primeiro momento ele foi recepcionado pelos índios homens, e no segundo momento, pelas mulheres, nesse momento uma indígena amordaça o português e o leva para Aldeia do Forte. Quando os tripulantes das naus tentam reagir, as mulheres se retiram e, os homens potiguaras se direcionam até a praia e começam a flechar os invasores, fazendo com que eles recuem, mas não sem enxergarem uma grande fogueira, na qual os três portugueses estavam sendo assados. Após esse processo eles foram decepados e ingeridos pelos indígenas, num ritual denominado antropofagismo, que era realizado porque acreditavam que estariam incorporando o poder e a força daqueles indivíduos. Desse evento, onde portugueses disseram que os índios potiguaras lhes haviam traído, surge o nome Traição (PALITOT, 2005). A ocupação do território, segundo o autor, foi feito por pescadores e indígenas e a cidade foi emancipada três vezes: a primeira em 1600, a segunda em 1800 e a terceira e definitiva em 1952. Os potiguaras ocupam as terras do litoral norte há mais de 515 anos, sendo a única comunidade indígena brasileira que permanece no mesmo local desde a época das invasões. Calcula-se que havia 100 mil potiguaras, nome colocado pelos índios tabajaras, pois antes eram nomeados Piticachara, os senhores das praias e senhores dos vales, mas como os potiguaras da época gostavam muito de praia, peixe, marisco, camarão e crustáceos em geral, os tabajaras começaram a chamar os piticacharas de potiguara, que significa comedor de camarão, nome que permanece até os dias atuais. A Baía da Traição tem sua economia baseada principalmente no turismo, artesanato e pesca, sendo que os turistas buscam conhecer as historias, artesanato e o cotidiano dos indígenas, ou seja, o turismo na localidade gira em torno da cultura indígena e das belezas naturais. A cultura potiguara é rica com destaque para a dança e a religiosidade, mas, o esporte também está presente nos jogos indígenas, sob a coordenação do Cacique. Esses jogos fortalecem a cultura, a tradição e as políticas educacionais esportivas que entre as modalidades estão o arco e flecha, canoagem no manguezal, no rio ou no mar e simbolização da dança do toré. O toré é

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

3

uma manifestação cultural que invoca em suas letras elementos da natureza do sol e do mar, e em forma de círculo, onde as pessoas buscam formalizar a aproximação com o outro, numa questão de espiritualidade, um fortalecimento cultural e harmônico dentro de uma comunidade indígena, porque é através dele que os indígenas se sentem mais próximos um dos outros e invocam a cosmologia que faz parte da espiritualidade (ALVES, 2016). 4 Materiais e Métodos A metodologia apresenta a construção do processo de investigação, que no entendimento de Gil (2002), é definida como um procedimento racional e sistemático possuindo como objetivo responder aos problemas propostos e Pádua (2002) comunga com esse conceito e acrescenta que as ações realizadas ao longo de seu desenvolvimento sejam efetivamente planejadas, assim é fundamental que sejam estabelecidas as etapas, as ações necessárias e de que maneira serão cumpridas. Brambilla e Vanzella (2014) afirmam que em um sentido mais amplo é possível afirmar que a investigação, como toda atividade que está voltada para a solução de problemas, é o meio de se conseguir, no âmbito da ciência, formar um conhecimento, ou conjunto de conhecimentos, que contribuirão para a compreensão da realidade e na orientação das ações futuras (PÁDUA, 2002). Nesse contexto, este trabalho foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica, documental, que consiste em um levantamento de materiais já produzidos relacionados ao tema (DENCKER, 1998), e visita in loco na Aldeia de São Francisco a fim de conhecer a realidade do objeto de estudo e coletar os dados através de entrevistas e observações. De acordo com Denker (1998) a entrevista pode ser a principal técnica empregada ou estar inclusa no processo de observação. Em geral, nas pesquisas qualitativas, as entrevistas são pouco estruturadas, assemelhando-se a uma conversa. Em complemento às entrevistas, foram realizadas observações, pois fazer pesquisa é observar a realidade. Muitos dados de que o pesquisador necessita, podem ser obtidas pela observação (DENCKER, 1998). 5 Resultados

Conforme explicado na metodologia foram realizadas duas entrevistas: uma com a pajé e a outra com o cacique da Aldeia São Francisco. A pajé, nascida e criada na Aldeia, explica que a língua oficial dos indígenas potiguaras é o tupi guarani, que vem sendo resgatado nas escolas da própria aldeia, com professores indígenas. “O ensino da língua às crianças permite que elas ensinem aos pais e familiares mais idosos, porque a língua estava sendo perdida entre eles e as crianças têm obrigação de aprender as tradições indígenas”. Segundo a entrevistada, os potiguaras possuem ritual próprio para casamento e batismo, celebrados em rituais de fogo, mas que mantém os detalhes de como acontece em sigilo. Os rituais de cura são realizados apenas pela pajé, curando os parentes que ficam doentes. “Por ser a médica da aldeia, ela também ajuda as mulheres no trabalho de parto, sendo que estas são levadas para o hospital apenas em casos de risco, caso contrário o parto é realizado na própria aldeia, e o umbigo das crianças são sanados com saliva e sal queimado”. Ainda no que se refere às tradições, o toré é uma tradição indígena, cujos instrumentos utilizados são produzidos pelos índios e as músicas são cantadas em tupi e em português, e transmite paz, saúde, purificação, libertação e agradecimento, é uma manifestação religiosa indígena. A comida típica dos potiguaras é o peixe assado, na folha da bananeira, debaixo da terra e a bebida é a jurema. O artesanato, confeccionado por crianças e adultos, é composto por colares, brincos, pulseiras, anéis e peças ornamentais como mensageiro dos ventos e filtro dos sonhos. “As peças nunca ficam iguais, pois cada peça surge através de uma inspiração momentânea, é um dom. A pajé relata que quando se mudou de uma casa para outra, a única coisa que levou foi um balaio com sementes e cascas, utilizadas na confecção de peças artesanais e isso demonstra o apreço que se tem pelo artesanato”. A pajé ainda diz que os potiguaras não se sentem discriminados pelos turistas, porque os que visitam a aldeia já possuem um propósito de conhecerem a cultura indígena. De acordo com a inquirida, as visitações trazem benefício econômico e os visitantes não influenciam na perda de cultura, pois para ela, as mudanças que ocorrem são naturais do tempo.

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

4

O segundo entrevistado foi o cacique da Aldeia São Francisco há 14 anos, tendo entre suas funções aplicar as regras na Aldeia, solucionar conflitos, estabelecer punições, deliberar guerra, organizar as caçadas, entre outras atividades que de modo geral estejam ligadas à organização da Aldeia. De acordo com o cacique, a língua oficial dos potiguaras é o tupi que passou um longo tempo esquecida, mas agora vem sendo resgatada através da escola local, abrangendo desde as crianças até os anciões da aldeia. Entre os principais rituais da Aldeia podem ser citados: o toré, um ritual de dança, que segundo o entrevistado, para os potiguaras, significa resistência, amadurecimento, força, proteção e sabedoria, e por isso só pode ser dançado mediante autorização do cacique. Os rituais de cura pedem a participação dos anciões, e, na ausência desses, o cacique é o substituto. O batismo das crianças é realizado com todos os participantes trajados a caráter, recebendo a consagração das plantas medicinais e seguido do ritual sagrado. As músicas dos rituais podem ser cantadas em português e em tupí. Os instrumentos utilizados nos rituais são produzidos pelos índios, sendo os principais, segundo o entrevistado, o bombo (zabumba), maracá, (chocalho confeccionado com cabaça seca e sem miolo, em seu interior são colocados sementes ou pedras, para que emitam um som que marque a pisada na dança do toré) e flauta (feita de bambu). O cocar também produzido por eles simboliza a arte, cultura indígena, tradição e hierarquia do povo. “O cocar do homem sempre será maior que o da mulher. São feitos de penas consagradas e servem, também, para rezar os parentes quando estão doentes; cada um tem o seu cocar e não podem usar o de outra pessoa”. Ainda de acordo com o entrevistado, “as pinturas simbolizam a comunidade através da pintura em forma de colmeia de abelha, como também de linhas horizontais no rosto, representando o garapirá que significa pássaro grande. No braço eles pintam o camarão, símbolo dos potiguaras. As pinturas são diferenciadas de outras tribos, sempre serão diferentes os traços e a forma de pintar”. No contexto do turismo, o fluxo na aldeia é muito maior no Dia do Índio, comemorado no mês de abril, e nos jogos indígenas que concentram cerca de mil e quatrocentos índios para participação. Ao

contrário da pajé, o cacique considera que os potiguaras, algumas vezes, se sentem descriminados porque alguns turistas não respeitam os modos de vida dos índios atuais e por serem vistos como algo exótico, “pois alguns visitantes acham que o índio deve andar nu, não pode ter telefone celular, carro, casa de alvenaria ou andar na cidade e que o uso de plantas medicinais é droga”. Apesar disso, segundo o cacique, os índios não vêem o turismo como uma ameaça para a aldeia, pois afirmam que o turismo quem faz são eles, e os visitantes que procuram são diferenciados. Os produtos que oferecem para o turista são o artesanato, a dança e a gastronomia típica. Nesse contexto, o cacique acredita que a aldeia possui boas condições para receber turistas, mas caberia uma organização e planejamento com apoio governamental. “O turismo pode ajudar no resgate e preservação das tradições indígenas, mas no momento não estão aproveitando ou valorizando todo o potencial da aldeia, pois falta um bom planejamento”. 6 Discussão O turismo indígena pode ser impactado, muitas vezes, de forma negativa quando explorado massivamente e sem qualquer participação da população local. Neste caso, pode resultar em perda da cultura local com a imposição dos modos de vida dos visitantes, ou ainda, trazendo consequências negativas como a perda valorização das tradições, a baixa autoestima e o ressentimento ao serem vistos como um atrativo turístico exótico. Ao mesmo tempo, o turismo em aldeias indígenas se planejado e desenvolvido pelos e para os habitantes locais pode ser um instrumento dinamizador da economia local e um forte incentivo às práticas culturais dos índios. No caso da Aldeia São Francisco é possível perceber que, de acordo com os entrevistados, o turismo é desenvolvido pelos próprios índios que não modificaram seu modo de viver em prol do turismo. Na verdade, os inquiridos consideram que o turismo colabora com a venda do artesanato que sempre foi produzido pelos índios, funcionado como uma renda extra que lhes assegura a sobrevivência. Para o cacique alguns turistas ainda os veem como exóticos e esperam encontrar uma forma de vida típica da época do descobrimento. Esta

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

5

situação, segundo o entrevistado, gera certo constrangimento para os nativos. De acordo com os entrevistados, o que falta, na aldeia em estudo, é o apoio governamental para que possam desenvolver o turismo. Este apoio seria principalmente através de um planejamento com a comunidade local para que pudessem usufruir melhor dos benefícios da atividade turística. 7 Conclusões O estudo sobre os impactos do turismo na Aldeia São Francisco mostrou que a atividade turística pode ser benéfica ou prejudicial à localidade, dependendo principalmente da forma como é implantada. Com base na literatura pesquisada, nas entrevistas e na observação, foi possível entender que o turismo na Aldeia traz de forma geral benefícios à população indígena

uma vez que contribui para a geração de renda principalmente através da venda do artesanato. Um dos aspectos mais perceptíveis é que a atividade turística na localidade é desenvolvida pelos índios sem a imposição de outros grupos externos que poderiam descaracterizar a cultura potiguara. As mudanças que ocorreram no modo de vida da aldeia em estudo não foram devido ao turismo, mas sim, pelo passar do tempo, como explicaram os entrevistados. Os visitantes, em sua maioria, buscam o contato com os habitantes da aldeia de forma a vivenciarem sua cultura, contribuindo para a autoestima dos índios ao verem suas tradições valorizadas. Sendo assim, os entrevistados consideram o turismo como uma alternativa sustentável desde que haja o apoio do governo na organização da atividade.

Referências ALVES, A. Entrevista realizada por Fernanda Cândido Lima em 10/08/2016. Aldeia São Francisco, Baia da Traição, Paraíba, 2016. BRAMBILLA, A. Cultura e Enoturismo: Um Estudo na Região Demarcada do Douro. Portugal: Editora NEA, 2015. BRAMBILLA, A.; VANZELLA, E. Os guias de turismo da cidade de João Pessoa/PB: Uma pesquisa sobre o domínio de idiomas. Tourism and Hospitality International Journal, 3(1), 12-29. 2014. DENCKER, A. F. M. Métodos e técnicas de pesquisa em turismo. São Paulo: Futura, 1998. DIAS, R. Turismo e patrimônio Cultural – recursos que acompanham o crescimento das cidades. São Paulo: Saraiva, 2006. EUSÉBIO C.; CARNEIRO, M. J. Impactos socioculturais do turismo em destinos urbanos. Aveiro: Revista Portuguesa de Estudos Regionais, nº 30, 2º quadrimestre, 2012. FERREIRA, L.; AGUIAR, L.; PINTO, J.R. Turismo cultural, itinerários turísticos e impactos nos destinos. CULTUR- Revista de Cultura e Turismo, 2012. FORTUNATO, R.A.; SILVA, L.S. Os significados do turismo comunitário indígena sob a perspectiva do desenvolvimento local: o caso da reserva de desenvolvimento sustentável do tupé (AM). CULTURRevista de Cultura e Turismo, ano 05. nº 02, 2011 GASTAL, S. Turismo: 9 propostas para um saber-fazer. Porto Alegre: Edipucrs, 2000. GIL, A. C. Como Elaborar um Projeto de Pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. LEAL. R.E.S. O turismo desenvolvido em territórios indígenas sob o ponto de vista antropológico Rosana Eduardo da Silva Leal. Caderno Virtual de Turismo. Vol. 7, n° 3, 2007. LODEWIJK, H. Índios do Brasil na República dos Países Baixos: as representações de Antônio Paraupaba para os Estados Gerais em 1654 e 1656. Revista de História, Brasil, n. 154, p. 37-69, june 2006. ISSN 2316-9141. Disponível em: . Acesso em: 09 out. 2016. OLIVEIRA, A. C. A atividade turística e seus efeitos à população local: um paradoxo. Caderno Virtual de Turismo, v. 5, nº, 2. 2005. OMT. Introdução ao Turismo. São Paulo: Roca, 2001. PÁDUA, M. T. J. Unidades de Conservação: Muito mais do que Atos de Criação e Planos de Manejo. In: MILANO; M. S. (Org.) Unidades de Conservação Atualidades e Tendências Curitiba: Fundação O Boticário de Proteção á Natureza, 2002. PALITOT, E.M. Parecer antropológico DSEI potiguara. João Pessoa; 2005. SANTANA, A. Antropologia do turismo: analogias, encontros e relações. São Paulo: Aleph, 2009. Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

6

SOUZA, G. M. R.; FILHO, N. A. Quadros Vieira. Impactos socioculturais do turismo em comunidades insulares: um estudo de caso no arquipélago de Fernando de Noronha-PE. Revista Acadêmica Observatório de Inovação do Turismo. v.6, nº. 4, 2011.

Revista Mangaio Acadêmico, v. 1, n. 2, jul/dez, 2016. Edição Especial – Anais da II Jornada Acadêmica Estácio, João Pessoa, PB. 27 e 28 de outubro de 2016, Faculdades Estácio da Paraíba e Estácio de João Pessoa.

7

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.