IMPLANTAÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA INFANTIL DE RIBEIRÃO PRETO, SP: RELATO DE EXPERIÊNCIA

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Volume 09, julho a dezembro de 2002

IMPLANTAÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA INFANTIL DE RIBEIRÃO PRETO, SP: RELATO DE EXPERIÊNCIA Daniel Fonseca de Andrade: Mestre em Ciência Ambiental e consultor em Educação Ambiental ([email protected]). Nádia Fontes: Arquiteta e mãe de aluna da escola ([email protected]). Marina L.S. Freitas: Diretora da Comunidade Infantil Ana e Joaquim e Colégio Viktor Frankl ([email protected]). Maria Beatriz R. Gomes: Diretora da Comunidade Infantil Ana e Joaquim e Colégio Viktor Frankl ([email protected]).

Resumo Este trabalho é um relato de experiência de uma fase do processo de implantação da Educação Ambiental na Comunidade Infantil Ana e Joaquim e Colégio Viktor Frankl, no município de Ribeirão Preto, SP, processo que teve início no começo de 2000. Neste trabalho abordaremos o contexto histórico, o método utilizado no processo de implementação, os conteúdos que o fundamentaram e alguns resultados alcançados. Este projeto foi desenvolvido como um trabalho de consultoria particular e seu desenrolar contou com a contribuição de todos os funcionários da escola e também de alguns pais de alunos, entre eles uma mãe, que se tornou co-autora deste trabalho. Palavras-chave: educação ambiental, ensino formal, relato de experiência.

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Introdução Histórico Este projeto de implementação da Educação Ambiental (EA) na Comunidade Infantil Ana e Joaquim e Colégio Viktor Frankl teve início no começo de 2000 a partir da iniciativa de alguns pais de alunos ingressantes que, preocupados com a questão ambiental, indagaram a diretoria da escola sobre seu envolvimento com o tema. Soubese então que a escola já havia desenvolvido alguns projetos em anos anteriores (horta, herbário, mini-zoo, criação de scargot, projeto das flores, reciclagem de papel, identificação da flora e fauna da escola e do entorno, composteira, etc). Soube-se também da disposição e abertura da diretoria em buscar a colaboração de profissionais especializados para o desenvolvimento de tais projetos, sempre que necessário. Finalmente, tomou-se conhecimento do desejo da diretoria em implementar um projeto de separação de material reciclável na escola. Esta conjunção de quase-coincidências foi o impulso que deu início aos contatos com o facilitador através de uma mãe de aluna e como conseqüência a este projeto, processo que se desenrolou ao longo de todo o ano letivo, sendo temporariamente interrompido no início de 2001 devido à mudança de endereço da escola. Caracterização da Escola A Comunidade Infantil Ana e Joaquim e Colégio Viktor Frankl é uma escola particular de Educação Infantil que há dois anos começou a trabalhar também com o Ensino Fundamental de 1ª a 4ª séries. A escola, situada em Ribeirão Preto, SP, existe há nove anos, conta atualmente com vinte e um professores, treze estagiários e atende a duzentos e quarenta alunos, entre um ano e meio e nove anos de idade, e é reconhecida na comunidade pela busca criativa em sua prática pedagógica, pela abertura que promove com a participação de funcionários, pais e alunos em suas decisões e também pela preocupação com a formação de valores nas crianças. No início do ano de 2001 e após oito anos de funcionamento, a escola se viu obrigada a mudar de instalações a fim de atender à demanda crescente e também aos anseios de suas proprietárias, fato que interrompeu temporariamente as reuniões do facilitador do projeto com os profissionais da escola até que a adaptação pudesse ser finalizada. O projeto O planejamento inicial deste projeto levou em consideração alguns pressupostos que julgamos essenciais na preparação de qualquer tipo de projeto de EA em uma escola, e que podem ser verificados em maiores detalhes em Andrade (2000a): 1. Primeira e fundamentalmente, apesar do desejo da diretoria em iniciar um projeto de educação ambiental que enfocasse principalmente a coleta seletiva de lixo, nos preocupamos em propor algo que fosse muito mais amplo e que tanto na prática de implementação quanto no conteúdo contemplasse realmente a EA em todo o seu potencial, ou seja, não a reduzindo apenas a processos mecânicos (por exemplo a coleta seletiva, o acender e o apagar de luzes, o abrir e fechar das torneiras, etc), mas que tivesse como princípios o desenvolvimento de senso crítico e de valores como a democracia, a cooperação, a participação e a geração de autonomia, ou seja, refletisse os próprios princípios que a EA propõe (ver Fórum Internacional de Organizações Não Governamentais e Movimentos Sociais, 1992).

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2. Desenvolver uma EA que contemplasse não só as crianças, como normalmente é assumido (Braus, 1995: S-48), mas que se centrasse na formação continuada dos profissionais da escola. Entendemos este como um passo fundamental na institucionalização da educação ambiental em escolas. 3. Desenvolver uma EA que não fosse reduzida apenas ao conteúdo curricular ou ao trabalho em sala, mas que buscasse mudanças na escola como um todo (Greig, Pilke and Selby, 1989:26; Huckle, 1995: 33). 4. Trabalhar a escola não apenas como um agente de mudanças, mas como um agente e um objeto de mudanças (Sterling, 1996: 18), de maneira que ela seja capaz de “praticar aquilo que ela prega” (Huckle, 1995: 33). Com estas perspectivas, iniciamos o projeto que teve como horizonte os seguintes objetivos e metas: Objetivos Os objetivos deste projeto podem ser divididos em dois grupos mas que na realidade se complementam e se confundem. Estes dois grupos referem-se às duas ‘perspectivas’ colocadas acima, ou seja, a escola como agente de mudanças e a escola como objeto de mudanças. Obviamente, os objetivos maiores do projeto assemelham-se aos objetivos maiores da EA, que são de desenvolver senso crítico e como conseqüência catalisar mudança ou formação informada de comportamentos e promover um processo de emancipação entre os envolvidos, que os leve enquanto cidadãos e profissionais a tomar decisões que sejam benéficas ao meio ambiente, entendendo-se como meio ambiente não só o meio natural, mas também o construído, tecnológico e social (histórico, espiritual, cultural, político, econômico, moral, estético, etc) (UNESCOUNEP, 1993: 12). A escola como espaço a ser transformado (objeto de mudanças): Objetivos: • Diminuir dinâmica e progressivamente a colaboração da escola, como instituição, na manutenção de alguns problemas ambientais (consumo de água, de energia, de material, produção de lixo, etc). • Propiciar uma reflexão acerca das mensagens inconscientes que a escola pode passar: Aqui se assume que instituições educacionais em geral têm uma posição de reprodutoras, ainda que inconscientemente, de uma cultura fragmentada e reducionista e predatória ao meio ambiente (Posh, 1997:1), além de alienadas às realidades locais (Sterling, 1996:21). A escola como espaço a ser transformado: ações específicas. • Redução do consumo e da produção de lixo na escola (através da implantação dos três R´s – Reduzir, Reutilizar e Reciclar), de maneira que esta prática não seja apenas desenvolvida pelos alunos, mas que influencie todo o processo de tomada de decisão na escola; • Retomada de alguns projetos desenvolvidos no passado (composteira e horta de plantas medicinais, por exemplo); • Inclusão de conceitos ambientais no currículo (Institucionalização da EA);

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A escola como agente de mudanças: Objetivos: • Formação de um espaço ambientalmente educativo, onde haja consonância entre o discurso e o que é vivenciado pelos alunos e profissionais da escola e que seja sustentável no tempo (Huckle, 1995: 33); • Geração de curiosidade e iniciativa nos professores com relação aos temas ambientais, para que se tornem professores-pesquisadores (Robottom, 1990, apud Palmer, 1998: 117). A escola como agente de mudanças: ações específicas. • Fornecimento de informações atuais relacionadas à temática ambiental para os profissionais da escola; • Catalisação de reflexão em torno da questão ambiental; • Desenvolvimento nos profissionais da escola de um comprometimento com a questão ambiental; • Discussão e análise dos valores subjacentes aos nossos comportamentos; • Desenvolvimento de habilidades para lidar com questões ambientais/resolução de problemas; • Engajamento dos profissionais da escola nas práticas ambientais desenvolvidas e no processo de reflexão de tais práticas. Metodologia de implementação A metodologia utilizada para o desenvolvimento do processo de implantação da EA na escola se baseou em Andrade (2000a) e em alguns fatos levantados em literatura e que podem ser vistos de forma compilada em Andrade (2000b:24), sendo os principais deles: • A resistência inicial que pode surgir em qualquer dos atores envolvidos por diferentes razões, entre elas o legado deixado por experiências anteriores que não se completaram, ou ainda pela natureza impositiva com a qual projetos anteriores podem ter se desenvolvido (Schermer, 1997); • O fato de projetos não se completarem porque são alicerçados na dependência de um dos atores envolvidos ou de um pequeno grupo, de maneira que quando este grupo se desfaz ou o ator deixa a instituição, o projeto se perde (Robinson, 1996: 35). (Alguns dos projetos anteriormente desenvolvidos na escola não tiveram sustentabilidade temporal exatamente por esta razão); • O fato do projeto não visar o condicionamento dos participantes a novos comportamentos, mas visar novos comportamentos que sejam fruto de um processo informado de mudanças de valores pessoais. Assim, entendemos que o processo deva se estender ao longo do tempo, para que novos conceitos possam ser vagarosamente “digeridos” pelos participantes e novos comportamentos possam surgir paulatinamente, à medida que estes novos valores são construídos. Com base em tais posições, a metodologia utilizada não priorizou exclusivamente ações práticas, mas contemplou um misto de discussões de contextualização da EA - com sua história, seus objetivos, princípios e valores, e discussões de como valores se traduzem em comportamentos - ações práticas pontuais ou “intervenções”, que eram a extensão prática do que era abordado nas reuniões. O projeto teve como espinha dorsal alguns princípios e reflexões acerca da educação levantadas em Freire (1998) e discussões específicas sobre educação ambiental, em seus vários aspectos, abordadas por Palmer (1998), Huckle & Sterling

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(1996) e Brasil/Ministério da Educação e do Desporto (1998), que se somaram às obras que tradicionalmente fundamentam o trabalho realizado na escola, como Frankl (1991) e Garcia-Hoz (1988). Com a finalidade então de se evitar ao máximo aquelas questões responsáveis pela interrupção de projetos anteriores (resistência, dependência em um ator ou grupo de pessoas, o descompasso entre as discussões teóricas e mudanças práticas, etc), o seguinte método foi sugerido: • Reuniões que contemplassem o maior número de profissionais da escola, entre professores, estagiários, diretoria, secretárias, pessoal de limpeza e cozinha, jardineiro e porteiro. Com essa finalidade, reuniões de mesmo conteúdo foram realizadas em dois dias diferentes. A escolha de se trabalhar com todos os funcionários da escola está em consonância com nossa proposta inicial, pois: 1. Possibilita que todos na escola tenham conhecimento do que está acontecendo; 2. Possibilita que todos sejam envolvidos e participem, no sentido de contribuir com o projeto dentro de suas atribuições normais como cidadão e profissional. 3. Possibilita a construção de uma ideologia institucional compartilhada, que é então concretizada através do trabalho dos professores com os alunos. Entendemos esse processo de construção de uma ideologia compartilhada e de sua extensão aos alunos através de diferentes professores como sendo interdisciplinaridade. 4. Diminui o risco de dependência em uma pessoa ou em um grupo de pessoas. 5. Aplica na prática aquilo que é proposto pela EA através de seus princípios, ou seja, valoriza um processo democrático de participação, cooperação e solidariedade, onde todos os envolvidos são proponentes de idéias e, portanto, se sentem co-proprietários do projeto, e conseqüentemente co-responsáveis pelas mudanças que possam vir a ocorrer. • Reuniões ocorrendo inicialmente com freqüência mensal, no sentido de permitir que os assuntos tratados pudessem ser refletidos por todos. Este espaço de tempo permite também que experiências práticas sejam elaboradas e aplicadas pelos professores e outros profissionais da escola, que poderão colocar em discussão estas novas experiências na reunião subseqüente. • A implantação de projetos práticos de maneira informada, ou seja, à medida que as discussões ganhavam um corpo mais sólido, paulatinamente, a partir das possibilidades e da disposição dos profissionais da escola em promovê-los. Neste sentido, as mudanças práticas não foram sugeridas pelos facilitadores, mas sim por aqueles que, motivados, seriam co-responsáveis tanto pela execução da mudança quanto pela manutenção da mesma. Também, decisões relativas à forma de desenvolvimento de um projeto específico, como por quem ser feito, quando ser feito e o quê ser feito, foram tomadas entre os agentes envolvidos com a mudança proposta (um exemplo de atividade desenvolvida na escola com estes parâmetros pode ser visto no anexo, onde tratamos da questão do lixo). • Extensão aos pais: a extensão do projeto aos pais foi feita através das reuniões de Pais e Mestres e dos Grupos de Família promovidos pela instituição, onde a implementação do projeto foi tratada em linhas gerais e através do jornal da escola, onde informações específicas foram abordadas.

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Conteúdo das reuniões Foram realizadas 6 reuniões de aproximadamente 1:30h cada, em dois horários diferentes para contemplar o maior número de profissionais da escola possível, em que os seguintes conteúdos foram trabalhados: • Atividade “Futuros provável e preferível”: atividade de projeção de futuro onde se contrasta as opções prováveis e preferíveis. Atividade sugerida em Hicks, (1994); Em seguida discutiu-se as funções da educação como mantenedora do status quo ou transformadora da sociedade; • Atividade de definição de meio ambiente e educação ambiental: visou trabalhar a idéia do meio ambiente em sua totalidade (natural, construído e social) e da educação ambiental como um processo educacional que considera o meio em sua totalidade, tendo como objetivo a geração de senso crítico e conseqüente mudança de comportamento em benefício do meio ambiente; • Do global ao local: trabalhou-se uma escala partindo-se do global para o local (global, nacional, Ribeirão Preto e bairro onde fica a escola). Para cada uma destas esferas reconheceram-se problemas ambientais e suas conexões. A partir daí discutiu-se as contribuições de cada um de nós para a manutenção destes problemas e para a resolução dos mesmos; • Discussão da formação do pensamento moderno, baseado no texto: “A máquina do mundo Newtoniana”, capítulo dois do livro “O Ponto de Mutação”, de Capra (1999). • Discussão sobre o desenvolvimento infantil, baseada no texto “Vigotsky e Piaget: contribuições para a educação ambiental”, de Castro e Spazziani (1998). • Discussões acerca dos projetos pontuais práticos implementados na escola (questão do lixo, composteira, separação de materiais recicláveis, etc). Desde sua fundação e início de funcionamento, em 1993, a escola realiza duas Etapas de Formação com seus profissionais por ano. Este é um momento onde os fundamentos filosóficos do trabalho na escola são compartilhados, são apresentados temas de interesse comum, são feitos planejamentos e avaliações e. As Etapas de Formação têm uma semana de duração em reuniões de 4 horas. Em Julho de 2000, durante a XVI Etapa de Formação, fizemos uma reunião de 4h com todos os funcionários da escola, na qual discutimos, por meio de atividades, alguns pontos fundamentais e retomamos alguns assuntos tratados em reuniões anteriores. Critério de Avaliação do Projeto Sabemos das dificuldades em se avaliar processos de EA, mas baseado em nossos objetivos desenvolvemos o seguinte critério de avaliação: 1. Geração de comprometimento nos profissionais participantes: Acreditamos que para que um projeto seja sustentável no tempo e independente de ajuda externa, a geração de comprometimento dos profissionais envolvidos faz-se essencial. Como comprometimento entendemos não só a participação dos profissionais durante as reuniões, mas a disposição em participar dos processos práticos e em tornarse de forma crescente, pesquisadores. Faz-se necessário ressaltar que, neste projeto, não buscamos necessariamente o desenvolvimento imediato e efetivo de atividades práticas

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específicas, mas sim o desenvolvimento de um comportamento, entre os diferentes profissionais da escola, baseados na práxis, em que haja teorização → implementação prática → avaliação → re-teorização e busca por saídas para os possíveis obstáculos ou dificuldades surgidas → modificações na prática → re-avalização → etc, em uma espiral ascendente sem fim. Para tal, o comprometimento dos profissionais envolvidos é essencial. O comportamento dos profissionais envolvidos foi observado durante as reuniões, no espaço entre reuniões e através de “conversas de corredor” com os próprios. 2. Democratização nos processos de tomada de decisão: Entendemos que um processo que se pretende sustentável deve envolver todos os atores inseridos no contexto, de forma a possibilitar que os próprios proponham as alternativas nas questões que concernem suas realidades. 3. Formulação de projetos específicos: Retomada efetiva de atividades práticas pontuais realizadas no passado e desenvolvimento de outras propostas (como composteira, horta orgânica, questão do lixo, etc), com um formato que as permita sustentáveis no tempo. Esta sustentabilidade é possível na medida em que as atividades práticas sejam estruturadas a partir de forte "embasamento teórico", que passe a ser de "domínio público" da instituição, tornando possíveis a sua aplicabilidade e desenvolvimento independentemente da manutenção de iniciativas isoladas, de uma pessoa ou um grupo de pessoas. 4. Institucionalização da EA: Transformação daquilo que é desenvolvido na prática na escola em conteúdo curricular, de forma que a teoria fomente a continuação da prática e esta, através da práxis, fomente o desenvolvimento de novas teorias. Entendemos que o processo de institucionalização da EA deva ser um processo a longo prazo, que envolva diretamente os professores e que seja uma conseqüência das práticas desenvolvidas. Entendemos que à medida que os conceitos e princípios da EA se tornem progressivamente mais familiares para os profissionais da escola, então que sua institucionalização se torna mais inevitável. Mesmo assim, planejamos a institucionalização da EA na escola como um segundo momento neste processo. Resultados Somos muito otimistas em relação aos resultados apresentados neste ano em que o projeto se desenvolveu. Não só os objetivos traçados inicialmente foram alcançados, como também outros resultados não esperados aconteceram. A participação dos profissionais da escola foi grande, o que despertou uma crescente mobilização que resultou em resultados práticos muito satisfatórios. De forma geral, nossa principal preocupação, que era a de geração de comprometimento e de mudança de comportamento informada foi alcançada: conseguimos causar discussões nos mais diversos setores da escola e também entre eles. Além de discussões, conseguimos provocar mudanças de comportamento no sentido de diminuir a contribuição de cada setor para a manutenção dos problemas ambientais locais. Mais importante do que isso, é que tais mudanças foram fruto de uma tomada de consciência destes profissionais de sua participação em seu meio, e que o processo de mudanças valorizou o conhecimento e a importância de cada um, através de métodos democráticos que respeitam as possibilidades de cada indivíduo e setor da escola. Embora o projeto

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tenha sido temporariamente interrompido, no que concerne às reuniões freqüentes com o facilitador, este início plantou uma semente nos profissionais da escola com relação ao projeto que é refletida na ansiedade demonstrada por vários dos mesmos em retomar o processo o mais rápido possível, após a mudança de endereço. Por isso, acreditamos ser este um grande indício de que a metodologia utilizada por nós tenha conseguido produzir resultados que sejam sustentáveis no tempo, uma preocupação inicial do projeto. Com relação aos resultados pontuais alcançados, faremos breves comentários a seguir: • Desenvolvimento da coleta seletiva: Não só a coleta seletiva foi implantada, seguindo-se aos anseios iniciais da diretoria, mas o foi de uma maneira mais ampliada e informada. O projeto do lixo não foi desenvolvido em cima da mesma, mas de valores e atitudes relacionadas aos processos que geram o lixo. Os 3 R´s foram discutidos, com ênfase na necessidade de se reduzir tanto o consumo da escola como uma consumidora, quanto como reprodutora de uma cultura consumista (mesmo inconscientemente). Esta reflexão se refletiu na prática nos diversos setores da escola, no comportamento de seus profissionais, de vários pais e está sendo incluída no currículo. • Reconhecimento de desperdícios em geral causados na escola: Reflexão quanto ao uso de água, de energia, de materiais em geral (limpeza, secretaria, orgânico, e didático), e sugestões de como se evitar o desperdício, posteriormente colocadas em prática. • Retomada de projetos: - A composteira foi retomada em um processo interessante cuja práxis foi praticada de forma ilustrativa, e já é utilizada como material didático. É também um bom exemplo de integração entre diversos “setores” da escola, como o pessoal da cozinha, o jardineiro e as professoras. - A horta medicinal foi também retomada, é utilizada como material didático com os alunos e é também um bom exemplo de integração entre as professoras e o jardineiro. • Institucionalização da EA: Foi dado início às discussões destes temas de forma institucionalizada no currículo. No ano de 2000, por iniciativa de muitas professoras, tais temas eram tratados com os alunos em sala de aula, mesmo sem estarem institucionalmente “oficializados”. Alguns resultados inesperados alcançados pelo projeto: • Duas professoras participaram, por iniciativa própria, de um curso sobre resíduos sólidos oferecidos pelo SENAC. Como conseqüência a isso uma delas desenvolveu, junto aos seus alunos, uma cartilha sobre reaproveitamento de alimentos e assumiu o desenvolvimento do projeto de coleta seletiva. • No ano de 2001, embora as reuniões tenham sofrido uma pausa, a EA foi introduzida no planejamento escolar em todas as séries. Este processo será visitado com maior ênfase na continuação deste projeto, visando a inserção de uma prática ainda mais refinada no planejamento de 2002. • A escola participou, como convidada, da mesa redonda “Experiências em Educação Ambiental”, durante o II Encontro de Educação Ambiental para a Sustentabilidade, realizado na FFCLRP/USP, divulgando suas experiências.

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Considerações finais Embora a metodologia empregada neste projeto tenha sido exaustivamente estudada previamente, reduzindo assim as chances de que o projeto não fosse levado adiante, isto não a torna infalível. Deve ser destacado aqui que um fator que contribuiu de forma considerável para nossos resultados positivos foi a postura ideológica que permeia todo o funcionamento da escola, em uma busca constante pelo desenvolvimento de valores que permitam que, tanto as crianças quanto os profissionais se vejam como atores responsáveis pela produção de um ambiente local com mais qualidade de vida. Este projeto veio apenas direcionar e subsidiar, através de uma perspectiva ambiental, o desenvolvimento de uma idéia que já estava sendo cultivada. O projeto continua em 2001 após as adaptações ao novo prédio, em que a filosofia trabalhada em 2000 será continuada, com a avaliação daquilo que foi realizado, verificação de problemas e possibilidades e idealmente com a proposição de idéias que possam ser inseridas no planejamento escolar do ano de 2002. Bibliografia ANDRADE, D.F. de. Implementação da Educação Ambiental em Escolas: uma reflexão. Rev. eletrônica Mestr. Educ. Ambient., Rio Grande, v.04, out.nov.dez. 2000a. Disponível em: . Acesso em: 25 set. 2001. ANDRADE, D.F. de. Problems and promises in the implementation of the National Policy of Environmental Education in Brazil’s formal education system. 2000b. 97p. Dissertation (Masters in Environmental and Development Education) – Faculty of Humanities and Social Science, South Bank University, London. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. A implantação da Educação ambiental no Brasil. Brasília: Coordenação de Educação Ambiental do Ministério da Educação e do Desporto, 1998. 166p. BRAUS, J. Environmental Education: where we’ve been and where we’re going. BioScience. p.S-45- S-51, 1995. Supplement. CAPRA, F. O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente. 22.ed. São Paulo: Cultrix, 1999. 447p. CASTRO, R.S.; SPAZZIANI, M.L. Vygotsky e Piaget: contribuições para a Educação Ambiental. In: NOAL, F.O.; REIGOTA, M.; BARCELOS, V.H.L. (Orgs.) Tendências da Educação Ambiental Brasileira. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1998. p. 195- 210. FÓRUM INTERNACIONAL DE ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS E MOVIMENTOS SOCIAIS, 1992, Rio de Janeiro. Tratado das ONGs. Rio de Janeiro, 1992.

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FRANKL, V.E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. 2.ed. Petrópolis, Vozes, 1991. 136p. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 25.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. 184p. GARCIA-HOZ, V. Educacion personalizada. 7.ed. Bogotá, Quinto Centenário, 1988. 348p. GREIG, S.; PIKE, G; SELBY, D. Greenprints for changing schools. London: WWF & Kogan Page, 1989. 176p. HICKS, D. Educating for the future: a practical classroom guide. Surrey, WWF U.K., 1994. HUCKLE, J. Towards a whole school policy on environmental education. In:________. Reaching out: education for sustainability. London: WWF, 1995. session 11, p. 1-11. HUCKLE, J.; STERLING, S. Education for sustainability. London: Earthscan, 1996. 236p. PALMER, J. Environmental Education in the 21st century: theory, practice and promise. London: Routledge, 1998. 284p. POSH, P. Curriculum change and school development. MSc/Pg.Dip. Environmental and development education Unit 7 Reader: Education for Sustainability: Experiences of Change Through Education, London, p. 13- 20, 1997. / Delivered to European Conference on Educational Research, Bath, 1995. ROBINSON, M. NGOs and rural poverty alleviation: implications for scaling up. In: EDWARDS, M.; HULME, D. (Eds). Making a difference: NGOs and development in a changing world. London: Earthscan, 1996. chap. 2, p. 28- 39. SCHERMER, A. Planned Assisted Institutionalisation of Environmental Education. MSc/Pg.Dip. Environmental and development education Unit 7 Reader: Education for Sustainability: Experiences of Change Through Education, London, p. 1997. / Paper delivered to ATEE Conference, 19, Prague, 1994. STERLING, S. Education in Change. In: HUCKLE, J.; STERLING, S. Education for sustainability. London: Earthscan, 1996. chap. 2, p. 18 – 39. UNESCO-UNEP. An idea whose time had come. In: ________ Changing minds – earthwise. UNESCO-UNEP, 1993. p. 9-13. Anexo Exemplo prático de atividade pontual desenvolvida tendo a metodologia proposta como embasamento: lixo.

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É muito comum que projetos relacionados à separação de lixo sejam os primeiros a serem pensados quando se está planejando a implementação da EA em uma instituição. No entanto, é muito comum também que estes projetos não sejam levados adiante por uma série de fatores, ou ainda que aconteçam de forma extremamente condicionante. Por esta razão, quando nos propomos trabalhar a questão do lixo, a prática da separação não foi feita até que um longo processo de fundamentação para a implantação deste projeto pontual fosse realizado. Este processo de fundamentação contou também com toda a equipe da escola e envolveu: • Processo de discussão com relação ao lixo, nosso conceito de lixo, um pouco de sua história na história da sociedade ocidental, valores que fazem com que a produção de lixo em nossa sociedade aumente com o tempo (consumismo e desperdício), a “linha de produção do lixo”, a relação entre lixo e miséria, etc; • Informações com relação ao lixo, em âmbito global, nacional e local (cidade de Ribeirão Preto); • Problemas decorrentes à produção e disposição de lixo (ambientais, de saúde, estratégicos na cidade); • Nossa contribuição para a manutenção do problema; A partir deste ponto, exercícios foram promovidos no sentido de se reconhecer o lixo que era produzido na escola, e o lixo predominante produzido por diferentes seções dentro da mesma (na secretaria, na sala de aula, na cozinha, etc). Assim, cada setor pôde discutir sua contribuição para a manutenção do problema e as modificações que podiam ser feitas para se reduzir tal contribuição. Desta forma, cada seção pensava o problema e as soluções para o mesmo dentro de suas realidades e possibilidades de implementação da mudança. Consequentemente, sugestões surgiram e foram então estendidas aos demais, e as conexões necessárias foram estabelecidas. A partir de então, mudanças práticas passaram a acontecer, baseadas nos 3R´s (é importante ressaltar que, embora a execução das mudanças práticas tivessem responsáveis, a discussão em torno da mudança e as sugestões dadas envolviam a todos). • O repensar da posição da escola na sociedade como uma consumidora, e sua responsabilidade como tal e como exemplo em sua comunidade; • Redução da produção de lixo nos diversos setores, com diminuição do desperdício através do reaproveitamento; • Instalação da coleta seletiva na escola, que se tornou um ponto de coleta seletiva na comunidade, contemplando não apenas o material produzido na escola, mas também nas casas dos alunos e profissionais da mesma. O papel passou a ser doado para catadores locais e os outros materiais passaram a ser doados para uma instituição local que trabalha com crianças e adolescentes em situação de risco (vale ressaltar que uma equipe da escola visitou a instituição, para conhecerem o destino do material separado na escola e a seriedade do trabalho com o qual estavam contribuindo). • Desenvolvimento de uma composteira com a finalidade de reaproveitar o lixo orgânico gerado na escola (que serve refeições aos alunos). • Apresentação do trabalho na Feira de Ciências, em setembro de 2001, pelos alunos da 2ª série do Ensino Fundamental.

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