IMPLICAÇÕES DA RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

June 1, 2017 | Autor: Vera Peroni | Categoria: Private International Law, Public Private Partnerships, Educación, Public Policy
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO DEPARTAMENTO DE ESTUDOS ESPECIALIZADOS

Vera Maria Vidal Peroni

IMPLICAÇÕES DA RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

Porto Alegre 2015

Vera Maria Vidal Peroni

IMPLICAÇÕES DA RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

Tese apresentada à Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para a promoção a Professor Titular da Carreira do Magistério Superior.

Porto Alegre, 2015

AGRADECIMENTOS

Agradeço a tod@s que tornaram possível esta longa caminhada: Ao meu companheiro querido, Cícero Justo, ativamente presente em todos os momentos desta trajetória. Minha família, Lino (meu pai e grande exemplo), Ignês, Rita, Lino José, Ana Paula, João e Silvia, por serem o meu ninho aconchegante, para o qual eu posso sempre retornar após todos os voos... Às minhas orientadoras/amigas/interlocutoras do pós-doutorado, Lisete Arelaro e Fátima Antunes e ao professor Evaldo Vieira, meu eterno orientador.... Meus amigos /interlocutores do grupo de pesquisa Grupo de Pesquisa: Relações entre o Público e o Privado na Educação, do PPGEDU/UFRGS: Otília, Daniela, Alexandre, Raquel, Luciani, Jaqueline, Denise, Jaira, Romir, Lucia, Liane, Fabíola, Maurício, Maria Luiza, Monique, Fátima, Juliana, Greice, Betina, Paula... Aos colegas/ amigos do Núcleo de Políticas e Gestão da Educação, da FACED/UFRGS: Nalú, Naira, Juca, Beatriz, Patrícia, Mariângela, Goreti, pela força cotidiana... Meus amigos e interlocutores do grupo de pesquisa nacional, no qual o tema de pesquisa público privado nasceu e iniciou a caminhar: Theresa, Teise, Regina, Maria Dilnéia, Rosana, Liliene, Dalva, Terezinha, Maria, Silvana, Luciani, Marilda... Aos professores que dispuseram do seu tempo para dialogar sobre as realidades de seus países: Rolando Contreras, Samuel Caravajal, Susana Vior, Tristan MacCowan, Gleen Rikowski, Stephen Ball, Antônio Olmedo, Licínio Lima, Estela Miranda, Almerindo Afonso, Maria Emília Villarinho, Belmiro Cabrito, ... Aos companheiros do Grupo de Investigadores sobre la Formación de Profesores Mercosur – Cono Sur, por a cada ano renovar o sonho de que continuamos lutando por um outro mundo possível na América Latina...

Porque se chamavam homens Também se chamavam sonhos E sonhos não envelhecem (Milton Nascimento, Lô Borges e Márcio Borges Clube da esquina 2)

RESUMO No caso brasileiro, muito lutamos pela democratização com direitos sociais materializados em políticas. Mas, ao mesmo tempo em que avançamos nos direitos conquistados, também foi naturalizado que o Estado não seria mais o principal executor. A política educacional, que historicamente no Brasil teve como parâmetro o mercado estava dando os primeiros passos na construção da democratização da educação e de direitos sociais universais, quando nesse contexto o parâmetro de qualidade vinculado ao mercado foi fortalecido. A relação entre o público e o privado se materializa no Brasil de diversas formas. Ocorre através da participação de redes políticas organizadas de empresários, como Movimento Todos pela Educação, que influencia nas políticas educacionais. Também através de programas educacionais, nos quais o governo apenas repassa alguns recursos para que a sociedade execute, como, por exemplo, na educação de Jovens e Adultos, o Programa Brasil Alfabetizado, na educação infantil, as creches comunitárias e, na educação especial, em que historicamente instituições filantrópicas têm atuado. Ocorre, ainda, pela “venda” de materiais pedagógicos estruturados, que incluem proposta de currículo, metodologia e avaliação. E, também, através das parcerias entre sistemas públicos e instituições do Terceiro Setor, em que a execução das políticas permanecem estatais, mas o privado acaba interferindo no conteúdo da educação pública, tanto no currículo quanto na gestão e organização escolar. Assim sendo, defendemos a tese de que as redefinições no papel do Estado reorganizam as fronteiras entre o público e privado, materializando-se das mais diferentes formas na educação básica pública, e suas modalidades, com profundas implicações no processo de democratização da educação. Palavras-chave:

Parceria Público-privada em Democratização da Educação.

Educação.

Política

Educacional.

___________________________________________________________________________ PERONI, Vera Maria Vidal. Implicações da Relação Público-Privada para a Democratização da Educação. 2015. Tese – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.

ABSTRACT

In Brazil, we have had a long, hard struggle for democratization with social rights materialized in social policies. However, while we have made some progress and conquered rights, we are now seeing a naturalization of the idea that the State should no longer be the main executor of social policy. Educational policy, which, in Brazil, has historically had the market as parameter, was taking the first steps towards the democratization of education and universal social rights, when the parameter of quality connected with the market gained force. The relation between public and private materializes in many ways in Brazil. It occurs through the participation of organized policy networks formed by private corporations, such as the Movimento Todos pela Educação [All for Education Movement], which influences educational policy. It also takes place through educational programs, which the government merely contributes to with funding and lets civil society implement, such as the Programa Brasil Alfabetizado (Literate Brazil), concerned with young people and adult education, the community nurseries in children’s education, and in special education, which has historically been the domain of philanthropic institutions. It also occurs through the “sale” of structured educational materials, which include curricular proposition, methodology and assessment. Furthermore, it happens through partnerships between public education systems and Third Sector organizations, where the execution of public policy remains in in the hands of the State, but the private sector ends up interfering in the content of public education both in the curriculum and in the schools’ management and organization. Therefore, we defend the thesis that the redefinitions of the role of State which reorganize the borders between public and private and are materialized into more different forms in the basic education with implications in the democratization process of education. Keywords: Public-private Partnership in Education. Educational Policy. Democratization of Education.

___________________________________________________________________________ PERONI, Vera Maria Vidal. Implications of the public-private relation for the democratization of basic education in Brazil. 2015. Thesis – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.

LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Sujeitos Individuais e Coletivos e Relações com o Guia de Tecnologias .... Figura 2 – Instituto Ayrton Senna e suas relações .......................................................... Figura 3 – Relações do IAS com instituições empresariais e públicas .......................... Figura 4 – Relações do IAS para a educação formal...................................................... Figura 5 – Relações do IAS para a promoção dos programas de educação complementar .................................................................................................. Figura 6 – Programa Educar para o Século 21............................................................... Figura 7 – Conselho de Governança do Instituto Unibanco e suas relações ................

91 107 108 109 110 121 130

LISTA DE QUADROS E TABELAS Quadro 1 – Pontos principais do Neoliberalismo e da Terceira Via – semelhanças e diferenças ....................................................................................................... Quadro 2 – Linha de tempo – 1981-2010 ......................................................................... Quadro 3 – Guia de Tecnologias Educacionais 2009 e 2011/2012 ................................. Quadro 4 – Conselheiros de Governança do Todos Pela Educação e suas empresas . Quadro 5 – Responsabilidades dos gestores no programa Gestão Nota 10 ................. Quadro 6 – Parcerias do PJF do Instituto Unibanco em 2013 ...................................... Quadro 7 – Quadro comparativo entre Instituto Ayrton Senna e Instituto Unibanco

39 58 90 100 112 132 143

Tabela 1 – Taxa de analfabetismo – 1995-2009 .............................................................. Tabela 2 – Taxa de analfabetismo funcional – 1995-2009 ............................................. Tabela 3 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade, por anos de estudo 2001-2011 .......... Tabela 4 – Taxa de escolarização 5 a 17 anos – 1992-2007 ............................................ Tabela 5 – Taxa de escolarização 7 a 14 anos – 1992-2007 ............................................ Tabela 6 – Taxa Líquida de Escolarização: fundamental e médio – 1980-2000 ..........

83 83 84 84 85 86

LISTA DE SIGLAS ALFASOL – Programa Alfabetização Solidária APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento BM – Banco Mundial CAPG- BA – Convocatoria de Centros Asociados CETEB – Centro de Ensino Tecnológico de Brasília CETEB – Centro de Ensino Tecnológico de Brasília CF – Constituição Federal CG – Conselho de Governança CGDC – Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade CGDC – Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade CNE – Conselho Nacional de Educação CONAE – Conferência Nacional de Educação CONEDs – Congressos Nacionais de Educação CONSED – Conselho Nacional de Secretários de Educação CPP – Centro de Políticas Públicas CREs – Coordenadorias Regionais de Educação EF – Ensino Fundamental EJA – Educação de Jovens e Adultos EM – Ensino Médio FMI – Fundo Monetário Internacional FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação FNDEP – Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública FUNDEB – Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica FUNDEF – Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental GATS – General Agreement on Trade in Services GEEMPA – Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação GEpR – Gestão Escolar para Resultados GPRPPE – Grupo de Pesquisa Relações Público-Privado na Educação IAS – Instituto Ayrton Senna IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa IU – Instituto Unibanco JF – Jovem de futuro LDB – Lei de Diretrizes e Bases Mare – Ministério da Administração e Reforma do Estado MEC – Ministério da Educação MTE – Movimento Todos pela Educação NGP – New Public Management OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico OMC – Organização Mundial do Comércio ONGs – Organizações Não Governamentais ONU – Organização das Nações Unidas OSCIP – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público

9 PAED – Programa de Complementação ao Atendimento Educacional especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência PAR – Plano de Ações Articuladas PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação PDE/PAR – Plano de Desenvolvimento da Educação/Plano de Ações articulada PJF – Projeto Jovem de Futuro PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PPGEDU – Programa de Pós Graduação em Educação PPP – Parcerias Público-Privada PRC – Projeto de Redesenho Curricular ProEMI – Programa Ensino Médio Inovador PRONATEC – Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego RS – Rio Grande do Sul SAE – Secretaria de Assuntos Estratégicos SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão Seduc – Secretaria de Estado da Educação SENNA – Social and Emotional or Non-cognitive Nationwide Assessment SGP – Sistema de Gestão de Projetos SIASI – Sistema Instituto Ayrton Senna de Informação SIMEC – Sistema Integrado de Planejamento, Orçamento e Finanças do Ministério da Educação SMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura SNE – Sistema Nacional de Educação TPE – Movimento Todos pela Educação UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNESCO – Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura USAID – United States Agency for International Development

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................12 1

O CAMINHO TEÓRICO-METODOLÓGICO E A TRAJETÓRIA DE ESTUDOS SOBRE O TEMA.....................................................................................................16

2

REDEFINIÇÕES NO PAPEL DO ESTADO – DIAGNÓSTICO DE QUE O CULPADO PELA CRISE É O ESTADO E O MERCADO COMO PARÂMETRO DE QUALIDADE ....................................................................................................29

2.1 O MERCADO COMO PARÂMETRO DE QUALIDADE ........................................31 3

O PROCESSO DE MERCADIFICAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: SUJEITOS E CONTEÚDO DA PROPOSTA DO PRIVADO PARA O PÚBLICO56

3.1

OS SUJEITOS ..........................................................................................................65

3.2

O MERCADO NA DEFINIÇÃO DO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO .................71

3.3

PRIVATIZAÇÃO ENDÓGENA – O GERENCIALISMO COMO O CONTEÚDO DA PROPOSTA DO PRIVADO NO PÚBLICO ....................................................72

4

MÚLTIPLAS FORMAS DE MATERIALIZAÇÃO DO PRIVADO NO PÚBLICO NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL ...............................................................79

4.1

A OFERTA ..............................................................................................................83

4.2

PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – PDE ............................87

4.3

O GUIA DE TECNOLOGIAS E AS PARCERIAS COM O SETOR PRIVADO..89

4.4

A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ......................92

4.5

A EXECUÇÃO DA OFERTA VIA TERCEIRO SETOR ......................................97

4.6

OS EMPRESÁRIOS NA DIREÇÃO DAS POLÍTICAS EDUCATIVAS: MOVIMENTO TODOS PELA EDUCAÇÃO ........................................................99

4.7

AS PARCERIAS – DIREÇÃO E EXECUÇÃO DAS POLÍTICAS EDUCATIVAS .................................................................................................................................101

5

DOIS EXEMPLOS DO PRIVADO DEFININDO O PÚBLICO ATRAVÉS DE PARCERIAS: INSTITUTO AYRTON SENNA E INSTITUTO UNIBANCO ....102

5.1

INSTITUTO AYRTON SENNA (IAS) ..................................................................102

5.2 OS SUJEITOS ............................................................................................................106 5.3 O CONTEÚDO DA PROPOSTA ...............................................................................110 5.4

PROPOSTAS ATUAIS DO IAS ............................................................................119

5.5

COMPETÊNCIAS SOCIOEMOCIONAIS ............................................................122

5.6

FINANCIAMENTO DO IAS .................................................................................124

5.7

INSTITUTO UNIBANCO ......................................................................................128

5.7.1 Sujeitos ....................................................................................................................130 5.7.2 O Conteúdo da Proposta..........................................................................................135 5.8

FINANCIAMENTO PROEMI/PJF ........................................................................141

11 6

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................145

REFERÊNCIAS ...............................................................................................................151 ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................................166 ANEXO 2 – Orientações para o Planejamento e Execução das ações do Projeto Jovem de Futuro referentes ao recurso financeiro da complementação do Estado .................167 ANEXO 3 – Programa de Aceleração de Aprendizagem .................................................168 Convênio Sapiranga com Instituto Ayrton Senna ............................................................168 ANEXO 4 – EduLab21 - rede multidisciplinar de parceiros como universidades, pesquisadores, fundações e organizações internacionais, proposta pelo Instituto Ayrton Senna ...........................................................................................................180

INTRODUÇÃO A tese, a ser desenvolvida como promoção à classe de Professor Titular, consiste no princípio de que as redefinições no papel do Estado reorganizam as fronteiras entre o público e privado, materializando-se das mais diferentes formas na educação básica pública, e suas modalidades, com profundas implicações no processo de democratização da educação. A perspectiva teórico-metodológica que embasa nossas pesquisas é a de que a relação entre o público e o privado na política educacional é parte constitutiva das mudanças sociais e econômicas; não é , unicamente, uma questão de determinação, mas de relação e processo 1. Desse modo, tanto o Estado quanto a sociedade civil são partes constitutivas do movimento de correlação de forças2 de sujeitos3 situados em um contexto histórico e geográfico4, perpassados por projetos societários distintos. Nesse sentido, não se trata de uma contraposição entre Estado e sociedade civil, pois vivemos em uma sociedade de classes em que dois sujeitos são influenciados por interesses de cunho mercantil. Sociedade civil e Estado são perpassados por interesses mercantis. Assim, em nossas pesquisas, o privado é vinculado ao mercado (PERONI, 2015). E, assim como a sociedade civil e o Estado, a democracia também não é entendida como uma abstração, mas como materialização de direitos e de igualdade social 5 (WOOD, 2003) e “coletivização das decisões” (VIEIRA, 1998), com efetiva participação na elaboração de políticas com base na prática social crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvimento (MÉSZÁROS, 2002). O Estado não é entendido como uma abstração, é construído por sujeitos individuais e coletivos6 em um processo histórico de correlação de forças. Portanto, o foco da análise é a privatização do público, na lógica mercantil, com implicações para a democratização da educação. É importante ressaltar a especificidade brasileira na análise das redefinições do papel do Estado, pois os avanços das lutas por direitos sociais ocorreram no momento pós-ditadura, na

1

Relação em processo na perspectiva de Thompson (1981).

2

Correlação de forças na concepção de Gramsci (1989).

3

Sujeitos individuais ou coletivos na concepção de Thompson (1981).

4

Contexto histórico e geográfico na concepção de Harvey (2008).

5

Sobre a não separação entre o econômico e o político, ver Wood (2003).

6

Sujeitos individuais e coletivos na concepção de Thompson (1981).

13 década de 1980, mesmo período de crise do modelo fordista/keynesiano. Em seu lugar, o capitalismo propunha um conjunto de estratégias para retomar o aumento das taxas de lucro, reduzindo direitos, com graves consequências para a construção da democracia e da efetivação dos direitos sociais, materializados em políticas públicas, dando lugar ao que temos chamado de “naturalização do possível” (PERONI, 2003; 2006; 2013). Assim sendo, se as redefinições no papel do Estado, em âmbito internacional, apresentam importantes implicações para o processo de democratização e a minimização de direitos universais e de qualidade para todos, esse processo é ainda mais problemático em países que viveram ditaduras e estão em um processo recente de luta por direitos materializados em políticas. Ressaltamos que, no Brasil, a garantia do acesso à educação pública foi ampliada, o que consideramos um avanço nesse processo. No entanto, também verificamos a presença cada vez maior do privado mercantil definindo a educação pública. O Estado continua sendo o responsável pelo acesso, e inclusive amplia as vagas públicas, mas o “conteúdo” pedagógico e de gestão da escola é cada vez mais determinado por instituições que introduzem a lógica mercantil, com a justificativa de que, ao agir assim, estão contribuindo para a qualidade da escola pública. Em nossas pesquisas, analisamos as várias formas de relação entre o público e o privado na educação básica. E, mais especificamente, como o privado interfere no público através de parcerias, trazendo uma lógica individualista e competitiva empresarial. A ênfase passa a ser no produto e não mais no processo, o foco passa a ser a gestão e não mais o pedagógico, ocorre a concentração em algumas disciplinas (português e matemática), pois serão avaliadas, a aprendizagem assim passa a ser um produto mensurável. As pesquisas demonstram, ainda, que o processo de privatização do público ocorre tanto na direção quanto na execução das políticas educativas. Na direção, como é o caso Movimento Todos pela Educação, em que os empresários acabam influenciando o governo federal na agenda educacional, inclusive através da venda de produtos via Guia de tecnologias do Plano de Ações Articuladas (PAR), como trataremos no capítulo 4. Na execução direta, que ocorre principalmente para as classes populares, na Educação de Jovens e Adultos, creches, educação especial e educação profissional. Mas também acontece, ao mesmo tempo, na execução e direção, como verificamos nos estudos sobre as parcerias, em que instituições privadas definem o conteúdo da educação e também executam sua proposta através da formação, avaliação do monitoramento, premiação e sanções que permitem um controle de que seu produto será

14 executado, conforme trataremos no capítulo 5. É importante ressaltar que esta tese tem como base as pesquisas desenvolvidas sobre o tema nas últimas duas décadas. Sintetizando, a tese será desenvolvida ao longo de cinco capítulos e tem como principal objetivo analisar o modo pelo qual as redefinições no papel do Estado reorganizam as fronteiras entre o público e privado e materializam-se das mais diferentes formas na educação básica pública, com implicações para o processo de democratização da educação no Brasil. O primeiro capítulo apresenta o referencial teórico-metodológico, tendo como base os seguintes conceitos: sujeitos e relações de Thompson (1981), particular em Lukács (1978) e os conceitos de democracia de Wood (2003), Mészáros (2002) e Vieira (1998). Esse capítulo apresenta também a trajetória de pesquisas sobre o tema redefinições no papel do Estado e mais especificamente as relações entre o público e o privado. O segundo capítulo apresenta elementos que embasam a discussão sobre as redefinições no papel do Estado, baseados em Wood (2001; 2014), Harvey (1989; 1995), Giddens (2001), no sentido de entender como essas redefinições modificam as fronteiras entre o público e o privado neste período particular do capitalismo, com implicações para a democracia. Apresentamos os conceitos de democracia do neoliberalismo e Terceira Via e, em contraposição, retomamos o nosso conceito de democracia, apresentado no primeiro capítulo. Apresentamos um item sobre o neoliberalismo, Terceira Via e terceiro setor, pela importância que tem para o debate que realizamos sobre as justificativas propostas pelos governos para atuarem com o terceiro setor. O terceiro capítulo apresenta um debate acerca do processo de mercadificação da educação pública. Iniciamos apresentando autores que realizam o debate sobre o tema, e que foram os nossos interlocutores no atual projeto de pesquisa, como Ball (2012; 2013), Robertson e Verger (2012), Robertson, Mundy, Verger, Menashy (2012), Lima (2012; 2012a; 2013), Afonso (2013), Vilarinho (2015), Antunes (2015) e Rikowski (2014; 2015). Seguimos ainda com o foco atual do grupo de pesquisa, que são os sujeitos e conteúdo da proposta. Isto é, entendendo que o processo de privatização não é uma abstração, buscamos entender quem são os sujeitos, como estão organizados e com quem se relacionam para realizar sua proposta de influenciar a educação pública. Nessa parte, trazemos um debate sobre a importância da organização dos sujeitos em redes com base nos estudos de Ball e Olmedo (2013), Ball e Junemann (2012), Robertson e Verger (2012) e Rhodes (1996) e apresentamos a nossa concepção de redes como sujeitos e relações com processos societários de classe em disputa e

15 trazemos alguns autores para dialogar com o conteúdo da proposta, ressaltando os debates sobre gerencialismo de Clarke e Newman (2006; 2012). No quarto capítulo, apresentamos como este processo está se materializando no Brasil. As especificidades de um país que saiu de uma ditadura, e estava dando os primeiros passos na conquista por direitos materializados em políticas, quando vivenciou os processos de naturalização da perda de direitos no período de ajuste fiscal e de implementação das estratégias de superação da crise do capital de neoliberalismo, reestruturação produtiva, financeirização e Terceira Via, que redefiniam o papel do Estado como principal garantidor dos direitos sociais materializados em políticas, debate apresentado no segundo capítulo. Assim, verificamos que, se por um lado o Brasil avançou na materialização de direitos em políticas, por outro avançou também no processo de privatização do público, tanto através da execução como direção das políticas educacionais. No quinto capítulo, apresentamos alguns exemplos de nossa pesquisa: a atuação de dois Institutos que possuem abrangência nacional, Instituto Ayrton Senna (IAS) e Instituto Unibanco (IU). Temos o objetivo de mostrar alguns elementos de como ocorrem, na prática, os debates apresentados nos capítulos anteriores, focalizando a análise dos sujeitos e relações e o conteúdo da proposta dos Institutos. A seguir, apresentaremos esta trajetória, assim como o referencial teórico-metodológico que fundamenta nossas análises.

1

O CAMINHO TEÓRICO-METODOLÓGICO E A TRAJETÓRIA DE ESTUDOS SOBRE O TEMA No enfoque teórico-metodológico que embasa esta pesquisa, a política social não é,

simplesmente, determinada pelas mudanças sociais e econômicas, mas é parte constitutiva dessas mudanças. Entende-se que as políticas sociais são parte da materialização do Estado, que, por sua vez, é parte do movimento histórico em um período particular do capitalismo. Nesse sentido, buscamos entender como se materializa a relação entre o público e o privado na educação analisando o objeto de estudo em suas múltiplas relações, como movimento, que se materializa na realidade social com muitas contradições, através de sujeitos com processos societários distintos, em uma relação de classe e não como estruturas estáticas. Ao longo deste capítulo aprofundaremos os desdobramentos dessa concepção. Como a tese trata das implicações do processo de privatização do público para a democratização da educação, iniciaremos tratando da concepção de democracia, tomando por base os trabalhos de Wood (2003), Mészáros (2002) e Vieira (1998; 2007). Para Vieira (1998), “[...] quanto mais coletiva a decisão mais democrática ela é. Qualquer conceito de democracia e há vários deles, importa em grau crescente de coletivização de decisões.” (VIEIRA, 2002, p. 12). Wood (2003) remete para a não-separação entre o econômico e o político e para a relação da democracia com direitos sociais materializados em políticas. E, para Mészáros (2002, p. 1008), “[...] programas e instrumentos de ação sociopolíticos verdadeiramente adequados só podem ser elaborados pela própria prática social crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvimento.”. Enfim, a democracia não é uma abstração, é a materialização de direitos em políticas coletivamente construídas na autocrítica da prática social. Outra questão metodológica importante é que não tratamos o público e o privado apenas como propriedade, mas como projetos societários em relação, permeados por classes sociais em correlações de forças. Nesse sentido, é importante definir que entendemos classe na perspectiva de Thompson, como “uma relação e não uma coisa.” (THOMPSON, 1981, p. 11), “um fenômeno visível apenas no processo” (THOMPSON, 2012, p. 77) e, ainda, que “[...] classe não é esta ou aquela parte da máquina, mas a maneira pela qual a máquina trabalha. ” (THOMPSON, 2012, p. 169). E, ao dialogar com autores dentro da própria concepção teórica marxista, Thompson enfatiza: “Não vejo classe como estrutura ou categoria, mas como algo que ocorre efetivamente

17 (e cuja coerência pode ser demonstrada) nas relações humanas. ” (THOMPSON, 1981, p. 10). Ainda, para o autor: [...] classe não é categoria estática, é uma categoria histórica descritiva de pessoas numa relação no decurso do tempo e das maneiras pelas quais se tornam conscientes das suas relações, como se separam, unem, entram em conflito, formam instituições e transmitem valores de modo classista. Neste sentido, classe é uma formação tão ‘econômica’ quanto ‘cultural’, é impossível favorecer um aspecto em detrimento do outro. (THOMPSON, 2012, p. 260).

Quando analisamos as relações entre o público e o privado, observamos que estas ocorrem via execução ou direção, levando a lógica de mercado para o conteúdo da educação. Desse modo, entendemos que existem projetos societários e de educação em correlação e, assim, concordamos com Thompson (2002, p. 275), quando afirma que classe, no seu sentido heurístico, é inseparável da noção de luta de classes, que é um conceito histórico e que implica processo: Não podemos falar de classes sem que as pessoas, diante de outros grupos, por meio de um processo de luta (o que compreende uma luta em nível cultural) entrem em relação e em oposição sob uma forma classista, ou ainda sem que modifiquem suas relações de classe, herdadas, já existentes.

Ainda conforme Thompson, “[...] a noção de classe traz consigo a noção de relação histórica [...]”, e a “relação precisa estar sempre encarnada em pessoas e fatos reais.” (THOMPSON, 1981, p. 10). Assim, entendemos que esse processo não é uma abstração, é realizado por sujeitos (individuais e coletivos) em relação com um projeto de classe. Também Lukács nos ajuda a caminhar nesta perspectiva de análise, quando enfatiza a importância da relação entre o singular e o universal, com a mediação do particular: “O singular não existe senão em sua relação com o universal. O universal só existe no singular, através do singular.” (LUKÁCS, 1978, p. 109) E o “[...] o movimento do singular ao universal e vice-versa é sempre mediatizado pelo particular, ele é um membro intermediário real, tanto na realidade objetiva quanto no pensamento que a reflete de um modo aproximadamente adequado.” (LUKÁCS, 1978, p. 112). Assim, entendemos o objeto de estudo, a relação entre o público e o privado na educação, como parte de um contexto histórico e geográfico particular, com contradições, e uma história de lutas pela democratização da educação materializada em direitos. Também buscamos essa categoria analítica no sentido de entender as especificidades deste período particular do capitalismo, que conserva questões estruturantes do capitalismo,

18 mas tem especificidades que também o redefinem. Não entendemos que seja um póscapitalismo7, mas um capitalismo com características específicas, particulares, no sentido de que mantém a relação com o universal, e o materializa com as características e correlações de forças do seu tempo histórico. Portanto, entendemos que as fronteiras entre o público e o privado têm se modificado no contexto atual de crise do capitalismo, em que as suas estratégias de superação – neoliberalismo, globalização, reestruturação produtiva e Terceira Via – redefinem o papel do Estado, principalmente para com as políticas sociais. O neoliberalismo e a Terceira Via, atual socialdemocracia, têm o mesmo diagnóstico de que o culpado pela crise atual é o Estado e veem o mercado como parâmetro de qualidade. O papel do Estado para com as políticas sociais é alterado, pois, com esse diagnóstico, as prescrições são racionalizar recursos e esvaziar o poder das instituições, já que instituições públicas são permeáveis às pressões e demandas da população e improdutivas, pela lógica mercadológica. Nessa perspectiva, a responsabilidade pela execução e direção das políticas sociais deve ser repassada para a sociedade. Tanto o neoliberalismo quanto a Terceira Via, por quererem esvaziar as instituições públicas das decisões, trazem implicações para o projeto democrático. O neoliberalismo, porque acredita que a democracia é responsável pelas demandas sociais que provocam a distribuição de rendas através das políticas públicas, ocasionando o déficit fiscal. A Terceira Via, por sua vez, por ter o mesmo diagnóstico de crise do Estado, sua proposta de reformá-lo passa por princípios gerenciais, com a lógica da sociedade civil empreendedora que também deve executar as tarefas do Estado. De alguma forma, as duas teorias propõem o repasse para a sociedade, em alguma medida, da direção e da execução das políticas sociais, o que Rhodes (1996) define como a privatização via direção e execução das políticas educativas. No entanto, é importante ressaltar que, apesar de analisar um período particular do capitalismo, importante relacionar as questões estruturais que permanecem neste período histórico, como a questão central da classe e luta de classes, para a análise das relações entre o público e o privado. Evaldo Vieira apresenta a importância dessas questões para a análise das políticas sociais: “A política econômica e a política social relacionam-se intimamente com a evolução do capitalismo” e “[...] qualquer exame da política econômica e da política social deve fundamentar-se no desenvolvimento contraditório da história” e, nesse sentido, “[...] em nível 7

Sobre este debate ver Harvey (1989).

19 lógico, tal exame mostra as vinculações destas políticas com a acumulação capitalista. Em nível histórico, verifica se consistem em respostas às necessidades sociais, satisfazendo-as ou não.” (VIEIRA, 2007, p. 136). Para Ellen Wood (2006), no capitalismo ocorre a separação entre o econômico e o político, ao “[...] separar o sistema de produção de seus atributos sociais específicos, os economistas político- burgueses são capazes de demonstrar a eternidade e a harmonia das relações sociais.” (WOOD, 2003, p. 29). Wood (2014, p. 18) apresenta algumas contradições internas do sistema: “[...] a separação entre o econômico e o político no capitalismo significa, entre outras coisas, que o poder econômico do capital é capaz de ir muito além do controle de qualquer sistema político militar existente ou concebível.”. No entanto, contraditoriamente, “[...] o poder econômico do capital não pode existir sem o apoio da força extra-econômica; e a força extra-econômica é hoje, tal como antes, oferecida primariamente pelo Estado.” (WOOD, 2014, p. 18), e a autora continua a sua argumentação sobre a importância do Estado para a acumulação do capital, também neste período particular do capitalismo: O capitalismo é por sua própria natureza, um sistema anárquico, em que as ‘leis’ de mercado ameaçam constantemente romper a ordem social. Ainda assim, provavelmente mais do que qualquer outra ordem social, o capitalismo precisa de estabilidade e previsibilidade nas suas organizações sociais. O Estado nação ofereceu isso por meio de uma elaborada estrutura legal e institucional, apoiada pela força coercitiva, para sustentar as relações de propriedades do capitalismo, seu complexo aparelho contratual e suas intrincadas transações financeiras. (WOOD, 2014, p. 26).

Em outro trabalho, Wood (2003) analisa as mudanças na sociedade civil no atual período: ‘Sociedade Civil’ constitui não somente uma relação inteiramente nova entre o ‘público’ e o ‘privado’, mas um reino privado inteiramente novo [...]. Ela gera uma nova divisão do trabalho entre a esfera pública do estado e a esfera privada da propriedade capitalista e do imperativo de mercado, em que a apropriação, exploração e dominação se desligam da autoridade pública e da responsabilidade social – enquanto esses novos poderes privados dependem da sustentação do estado por meio de um poder de imposição mais concentrado do que qualquer outro que tenha existido anteriormente. A sociedade civil deu à propriedade privada e a seus donos do poder de comando sobre as pessoas e sua vida diária, um poder reforçado pelo Estado, mas isento de

20 responsabilidade, que teria feito a inveja de muitos Estados tirânicos do passado. (WOOD, 2003, p. 217-218).

Evaldo Vieira (1998) também comenta acerca da sociedade civil em uma sociedade hegemonizada pelo capital: Quando dizem que a sociedade civil deve se organizar pressupõe-se que a maioria dela se encontra desorganizada, porque uma parte, a classe dirigente ou a chamada elite, se organiza e se reorganiza desde o surgimento do país, mantendo-o no atraso e na inércia, apesar das alegações de fazê-lo contemporâneo do seu modo ou da sua época. (VIEIRA, 1998, p. 13).

Assim sendo, entendemos que o público e o privado perpassam Estado e sociedade civil, a luta, portanto, é para tornar o Estado mais público, democrático e garantidor de direitos e não diluir as suas reponsabilidades ao repassá-las para a sociedade civil. Assim como a sociedade civil, também o Estado está permeado por sujeitos com objetivos antagônicos de classe. Ambos são espaços de correlação de forças e de conquista da hegemonia. Evaldo Vieira, discutindo a democracia, ressalta que Estado Democrático de Direito vai além do Estado de direito, pois traz o “[...] princípio da soberania popular. Este princípio diz que o governo e o Estado necessitam de legitimidade vinda do povo.” (VIEIRA, 2001, p. 13). E ressalta que, para além do voto, a legitimação democrática do Estado passa pelo controle social da administração pública que, para o autor “[...] representa um dos elementos mais importantes da democracia.” (VIEIRA, 2001, p. 13). As parcerias, portanto, ao determinarem o conteúdo da educação, significam um retrocesso em relação à luta pela democratização da educação que envolveu a sociedade brasileira nos anos 1980 para a abertura política, principalmente considerando o nosso histórico nacional de pouca cultura democrática. Concordamos com Wood, quando destaca que o conceito de democracia em uma sociedade sob a hegemonia do capitalismo não pode ser visto em abstrato, pois afinal: “É o capitalismo que torna possível uma forma de democracia em que a igualdade formal de direitos políticos tem efeito mínimo sobre as desigualdades ou sobre as relações de dominação e de exploração em outras esferas.” (WOOD, 2003, p. 193). Portanto, entendemos que as políticas sociais são respostas às lutas sociais, em um processo histórico de correlação de forças, como afirma Evaldo Vieira: Não tem havido, pois, política social desligada dos reclamos populares. Em geral, o Estado acaba assumindo alguns destes reclamos, ao longo de sua existência histórica.

21 Os direitos sociais significam antes de mais nada a consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores. Não significam a consagração de todas as reivindicações populares, e sim a consagração daquilo que é aceitável para o grupo dirigente no momento. (VIEIRA, 2007, p. 144).

Mészáros (2002) também destaca que a reivindicação por políticas sociais neste momento histórico, de minimização de direitos representa uma luta concreta contra o capital: No passado, até algumas décadas atrás, foi possível extrair do capital concessões aparentemente significativas – tais como os relativos ganhos para o movimento socialista (tanto sob a forma de medidas legislativas para a ação da classe trabalhadora como sob a de melhoria gradual do padrão de vida, que mais tarde se mostraram irreversíveis) obtidos por meio de organizações de defesa do trabalho: sindicatos e grupos parlamentares. O capital teve condições de conceder esses ganhos que puderam ser assimilados pelo conjunto do sistema, e integrados a ele, e resultaram em vantagem produtiva para o capital durante o seu processo de auto-expansão. Hoje ao contrário, enfrentar até mesmo questões parciais com alguma esperança de êxito implica a necessidade de desafiar o sistema do capital como tal, pois em nossa época histórica, quando a auto-expansão produtiva já não é mais o meio prontamente disponível de fugir das dificuldades e contradições que se acumulam [...], o sistema de capital global é obrigado a frustrar todas as tentativas de interferência, até mesmo as mais reduzidas, em seus parâmetros estruturais. (MÉSZÁROS, 2002, p. 95).

Seguindo esse mesmo pressuposto, Robertson e Verger (2012) observam que, neste período de grande ofensiva do capital e de várias formas de mercantilização do público, as reponsabilidades pelo direito à educação ficam diluídas: [...] quando a governança está distribuída em vários locais, tanto a governança das PPPs quanto das PPPEs, como ferramenta de gestão do setor da educação, torna-se problemática. Quem é a autoridade relevante? Quem é afetado pelas decisões de vários governos, empresas transnacionais, fundações, agências internacionais e consultores? Quem deve ser procurado para prestar contas? É o discurso gerencial apropriado para a distribuição de um bem público como a educação? A gestão, com foco em resultados e na eficiência, é compatível com a complexidade dos processos educacionais? (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1151).

Também temos apontado esse problema em nossas pesquisas, principalmente porque no caso brasileiro, como é recente o processo de democratização da sociedade, a diluição das responsabilidades é ainda mais danosa para a materialização dos direitos em políticas. Entendemos que este processo traz profundas implicações para o recente processo de construção democrática no Brasil. Vieira (2007) ressalta ainda que, na América Latina, o Estado de direito, ou as democracias formais, estão se instalando em sociedades muito pouco democráticas, o que é um

22 problema, já que “[...] o que garante Estados de direito são sociedades democráticas.” (VIEIRA, 2007, p. 104). No caso dos países latino-americanos e, em particular, do Brasil, o avanço das lutas por direitos sociais aconteceu no momento pós-ditadura, em meados da década de 1980, mesmo período em que entrava em crise o modelo fordista/keynesiano. Em seu lugar, o capitalismo propunha um conjunto de estratégias para retomar o aumento das taxas de lucro, reduzindo direitos, com graves consequências para a construção da democracia e da efetivação dos direitos sociais (PERONI, 2013). O esvaziamento do conteúdo da democracia é evidente, já que se perdeu a discussão das políticas públicas como a materialização de direitos sociais. As lutas e conquistas dos anos 1980, de direitos universais, deram lugar à naturalização do possível, isto é, se um Estado “em crise” não pode executar políticas, repassa para a sociedade civil, que vai focalizar nos mais pobres para evitar o caos social. O Estado apenas repassa parte do financiamento, e avalia a sua alocação (PERONI, 2008a). Robertson e Verger (2012) destaca a influência do setor privado em todas as instâncias da educação. [...] o que frisamos aqui é a maneira pela qual uma determinada concepção de educação está sendo globalizada e gerida, e que, longe de ser um mecanismo para diminuir o liberalismo econômico, aparentemente as PPPEs permitiram seu rápido avanço, dado que o setor privado está agora profundamente enraizado no coração dos serviços públicos educacionais, em todos os níveis, desde a política e a pesquisa até a aprendizagem nas salas de aula. (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1149).

Foi o que constatamos em nossas pesquisas, o privado atuando das mais diferentes formas e em todos os níveis, desde as instâncias de decisão, ministérios, secretarias de educação até a sala de aula, como apresentaremos no decorrer da tese. Ball (2013) ressalta o hibridismo nas análises das relações entre o público e o privado, e reforça a importância de pesquisas com bases empíricas: “A forma particular de hibridismo de governo em qualquer contexto requer mapeamento empírico.” (BALL, 2013, p. 179). Concordamos com Ball quanto à importância de analisar esses movimentos através de pesquisa empírica, sendo assim, pesquisamos no Brasil diferentes formas de relação entre o público e

23 privado na educação básica. A seguir, apresentaremos nossa trajetória de pesquisas sobre o tema. Desde meados da década de 1990, pesquisamos as redefinições do papel do Estado e sua materialização nas políticas públicas de educação. Iniciamos a abordagem desse tema em 1995, com a tese de doutorado8 que estudou as redefinições no papel do Estado e as políticas educacionais dos anos 1990, na qual apontamos que o Estado vinha repassando para a sociedade suas tarefas, esvaziando as instituições públicas de seu poder. O objetivo da pesquisa, portanto, foi a análise de como estaria se materializando, na política educacional, a redefinição do papel do Estado, já que tínhamos como pressuposto o fato de que essa política não seria simplesmente determinada pelas mudanças que estariam ocorrendo na redefinição do papel do Estado, mas seria parte constitutiva dessas mudanças. Verificamos que, no período seguinte, tanto a publicização, entendida no Plano Diretor da Reforma do Estado (BRASIL, 1995) como público-não estatal, também conhecido como Terceiro Setor, quanto a privatização, entendida como lucro e mercado, avançaram no Brasil e, mesmo com as trocas de governo em nível nacional, continuam em processo. Na continuidade dos estudos sobre as redefinições no papel do Estado, o Terceiro Setor passou a ter destaque e, ao nos aprofundarmos teoricamente, fomos relacionando-o à Terceira Via, e assim o incluímos como mais uma estratégia de superação do capitalismo, que inicialmente consistia em globalização, reestruturação produtiva e neoliberalismo. No período 2002-2006, pesquisamos o Programa Dinheiro Direto na Escola, que instituiu a obrigatoriedade para o recebimento dos recursos da criação de Unidades Executoras de direito privado nas escolas públicas. Foi uma pesquisa que foi iniciada no Rio Grande do Sul e ampliou-se para as cinco regiões, com a pesquisa nacional, “O Programa Dinheiro Direto na Escola: uma redefinição do papel do Estado na educação” 9 (PERONI; ADRIÃO, 2007). Verificamos que o “fluxo” do dinheiro, que é público, passa por uma instituição privada (Unidade Executora) para então ser alocado pelo poder público. Continuamos as pesquisas, verificando a parceria entre sistemas públicos e o Terceiro Setor, com a pesquisa nacional “Análise das consequências de parcerias firmadas entre municípios brasileiros e a Fundação Ayrton Senna para a oferta educacional”10 (Ciências

8

A tese foi publicada em livro por Peroni (2003): Política educacional e papel do Estado no Brasil dos anos 90.

9

Projeto nacional coordenado por esta autora e financiado pelo CNPq para a reunião dos grupos de pesquisa das cinco regiões brasileiras. O relatório foi publicado pelo INEP (PERONI; ADRIÃO, 2007).

10

Pesquisa coordenada pela professora Theresa Adrião e a vice-coordenação está sob minha responsabilidade.

24 Humanas/CNPq). Assim, o grupo, que iniciou com a pesquisa sobre o Programa Dinheiro Direto na Escola, já citada, continuou seus estudos sobre a temática público/privado. Escolhemos o Instituto Ayrton Senna (IAS) pela importância da atuação do Instituto nas redes públicas de ensino em todo o País (ADRIÃO; PERONI, 2010). Neste mesmo período foi criado um coletivo de pesquisa, vinculado ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade

Federal do Rio Grande do Sul

(PPGEDU/UFRGS), que participava ativamente de todas as pesquisas nacionais com os estudos de caso do Rio Grande do Sul. O grupo de pesquisa pertence ao Núcleo de Política e Gestão da Educação da UFRGS, e conta com pesquisadores de iniciação científica, mestrado, doutorado, pós-doutorado e pesquisadores que concluíram sua formação e permanecem no grupo. A pesquisa produtividade: “Parcerias entre sistemas públicos e instituições do Terceiro Setor: Brasil, Argentina, Portugal e Inglaterra implicações para a democratização da educação”, foi pensada e realizada por este coletivo, que passou a se chamar “Grupo de pesquisa relações público-privado na educação” (GPRPPE). A pesquisa objetivou estudar a relação entre o público e o privado, através da análise das parcerias entre sistemas públicos e instituições do Terceiro Setor e as consequências para a democratização da educação nos países pesquisados. E buscou ainda entender como países com trajetórias distintas, em termos de papel do Estado na consecução do direito à educação, vivenciam este período particular do capitalismo e as consequentes mudanças na relação entre o público e o privado e a intervenção da lógica do privado na educação pública. Assim, a pesquisa envolveu duas partes complementares: uma de interlocução teórica com os autores internacionais e, a outra, de mapeamento das formas de relação público-privada nas etapas e modalidades na educação básica. A pesquisa nacional foi realizada com fontes primárias, basicamente documentos e páginas na internet das instituições envolvidas. A pesquisa internacional contou com o apoio do Projeto Universal (2010-2012) para a coleta de material e encontros com grupos de pesquisa, principalmente em Portugal e na Inglaterra, pois a coleta de dados na Argentina foi propiciada pelo convênio com a Universidade de Córdoba, aprovado na VIII Convocatoria de Centros Asociados CAPG-BA. Debatemos acerca das redefinições no papel do Estado nas diferentes realidades, o avanço da mercadificação do público e as diversas formas de relação entre o público e o privado. Em cada realidade ocorrem especificidades, mas também semelhanças em relação ao tema da pesquisa. Como instrumento para o diálogo entre os integrantes da pesquisa, tanto do grupo

25 brasileiro quanto entre os pesquisadores dos países que integraram esse projeto, publicamos o livro “Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação”11. A publicação contou com textos de autores argentinos, ingleses e portugueses, apresentando o resultado de seus trabalhos, e autores do grupo brasileiro, mapeando as mais diversas formas de materialização do público e o privado nas etapas e modalidades da educação básica no Brasil, mostrando o quanto ele está presente de diferentes formas, não apenas através de parcerias com instituições com ou sem fins lucrativos, mas também pelo fomento às parcerias ou o conteúdo gerencial de alguns programas e políticas educacionais. Assim, a publicação foi, além de uma forma de interlocução entre os grupos, também uma forma de contribuir com o debate da comunidade acadêmica brasileira, que trata do tema. Na parte brasileira, a pesquisa estudou as diferentes formas de relação entre o público e o privado nas etapas e modalidades da educação básica, cujos focos principais de análise são sinteticamente apresentados abaixo: Na educação infantil, a análise ocorreu principalmente sobre as parcerias dos sistemas públicos com creches comunitárias, conveniadas com o poder público, para a oferta de vagas para crianças de 0 a 5 anos. Desde que as creches foram consideradas parte da educação básica pela Constituição Federal (BRASIL, 1988), e assim saíram da assistência social e vieram para a educação, como parte da reivindicação de pais, educadores e pesquisadores da área, o poder público municipal, que ficou responsável pela oferta dessa etapa da educação básica, buscou como alternativa, em muitos casos, as parcerias com instituições sem fins lucrativos. Principalmente porque, logo após a ampliação do direito, foi contraditoriamente instituído o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF) que, contrariando a ideia de educação básica, priorizava a oferta do ensino fundamental. Muitos municípios, então, recorreram a formas alternativas para a oferta ou simplesmente não expandiram essa etapa de ensino. Como o valor a ser financiado é menor do que com a oferta estatal, dada a sua precariedade, muitos buscaram como alternativa transitória a parceria com creches comunitárias, fazendo a justificativa do possível, mesmo assumindo que havia problemas. No entanto, com a ampliação do Fundo incorporando toda a educação básica, o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), ao invés de fortalecer a educação pública garantindo a oferta de qualidade, abriu a possibilidade de as creches comunitárias também

11

Peroni (2013): Redefinições das Fronteiras entre o Público e o Privado: implicações para a democratização da educação.

26 receberem recursos dessa origem. Há uma grande preocupação, já que pesquisas 12 demonstraram a fragilidade e precariedade desse atendimento. Outro fator importante é a ausência de gestão democrática nas instituições, com critérios pouco transparentes na admissão e pagamento dos funcionários, falta de critérios para o ingresso das crianças, ausência de prestação de contas da entidade, assim como relações pouco democráticas dentro das creches com os pais e a comunidade. No ensino fundamental, três subgrupos pesquisaram: o programa do governo federal Plano de Desenvolvimento da Educação/Plano de Ações articulada (PDE/PAR) que fomenta e até financia parcerias do sistema público com instituições do terceiro setor; a compra de sistemas de ensino privados pelos sistemas públicos, interferindo assim no conteúdo e gestão da educação pública; e parcerias entre os sistemas públicos com instituições do terceiro setor, como o Instituto Ayrton, Senna, Alfa e Beto e outro de atuação nacional. No Ensino Médio, estudamos a parceria entre o Instituto Unibanco e escolas de ensino médio. O Unibanco tem uma característica diferente e muito preocupante nesse cenário, ele financia a escola e, assim, muitas escolas públicas acabam aderindo para receber recursos, e desse modo submetendo-se às metas do Instituto, que interfere em toda a escola, desde o conselho escolar até o conteúdo de ensino, já que realizam aplicação de provas e as escolas que não atingirem as metas propostas não recebem as parcelas do financiamento. Questionamos se não é uma “compra da escola pública”, precarizada após o “apagão das políticas educacionais” que ocorreu no Brasil, principalmente na década de 1990. No ensino profissional vinculado ao médio, estudamos principalmente o atual programa, proposto pelo governo federal, Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC) que objetiva, entre outros fins: “[...] expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educação profissional técnica de nível médio e de cursos e programas de formação inicial e continuada, ou qualificação profissional; [...] (BRASIL, PRONATEC, art. 2, 2011) e a expansão envolve a participação de instituições privadas: “Art. 8º O PRONATEC poderá ainda

12

Ver Susin (2005; 2009).

27 ser executado com a participação de entidades privadas sem fins lucrativos, devidamente habilitadas, [...]” (BRASIL, PRONATEC, art. 8, 2011). Mais uma vez, questionamos o repasse de dinheiro público para instituições privadas, além da concepção de trabalho proposta pelo governo federal que, ao repassar também para instituições privadas, abre mão de uma proposta de formação profissional. Na educação especial também ocorre o repasse de recursos públicos para instituições do terceiro setor, através de vários programas como o PDDE, o Programa de Complementação ao Atendimento Educacional especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência (PAED) e também o FUNDEB: “Art. 14. Admitir-se-á, a partir de 1º de janeiro de 2008, para efeito da distribuição dos recursos do FUNDEB, o cômputo das matrículas efetivadas na educação especial oferecida por instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos [...]”. (Alterado pelo D-006.278-2007). Em trabalho anterior, já mencionávamos que o poder público historicamente desresponsabilizou-se da educação especial e, no momento em que se estabelecia de modo a ser a ser entendida como um direito, a nova conjuntura de racionalização de recursos dificultou a implementação com qualidade das políticas de inclusão e restringiu a ampliação de escolas públicas de educação especial. E a prática de repasses de recursos públicos, que já eram destinados às instituições públicas não governamentais, como APAE, Pestalozzi, etc., para a execução de tarefas que seriam do poder público, atualmente é fortalecida pelo movimento em que o Estado diminui a sua atuação na execução de políticas, transferindo-as para a sociedade civil (PERONI, 2009). Na educação de Jovens e adultos, dois programas foram pesquisados: O Programa Alfabetização Solidária (ALFASOL), que teve importância expressiva na simbiose entre o público e o privado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, pois foi o “embrião” do público não-estatal no Brasil, já que era um programa de governo realizado por uma instituição do terceiro setor, presidido pela própria primeira-dama e recebendo dinheiro público para a sua execução. Essa instituição permanece atuante e executando muitos projetos com o governo federal. E o Programa Brasil Alfabetizado, que atua com bolsas e vínculos com instituições do terceiro setor para sua execução, de forma nitidamente precarizada. A pesquisa atual “Implicações da relação público-privada para a democratização da educação básica no Brasil”, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é a continuidade da anterior, aprofundando a análise de como as redefinições no papel do Estado reorganizam as fronteiras entre o público e o privado,

28 materializando-se das mais diferentes formas na educação básica pública, e suas implicações para o processo de democratização da educação no Brasil. E, também, continua a interlocução teórica com pesquisadores, para dialogar sobre instrumentos e conceitos para analisar diferenças e semelhanças entre realidades com trajetórias e correlação de forças específicas e que vivem o mesmo período particular do capitalismo de crise e de diminuição de direitos sociais universais materializados em políticas públicas. Em 2015 foi publicado um segundo livro, dando continuidade e aprofundamento às questões que emergiram, intitulado Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras entre o público e o privado na educação. Esse livro apresenta as duas partes complementares da pesquisa atual: uma de mapeamento das formas de relação público-privado nas etapas e modalidades da educação básica no Brasil e, a outra, de ampliação da interlocução teórica com os autores internacionais, incluindo Argentina, Chile, Portugal, Inglaterra, Quênia e Estados Unidos.

2

REDEFINIÇÕES NO PAPEL DO ESTADO – DIAGNÓSTICO DE QUE O CULPADO PELA CRISE É O ESTADO E O MERCADO COMO PARÂMETRO DE QUALIDADE

Este capítulo apresenta os estudos realizados nas últimas décadas, que continuaram a tese de doutorado acerca das redefinições do papel do Estado, neste período particular do capitalismo e, mais especificamente, como se modificam as fronteiras entre o público e o privado. Com o intuito de melhor entender o porquê dessa redefinição, buscamos as relações entre o diagnóstico de que o Estado é o culpado pela crise e de que o mercado deve, então, ser o padrão de qualidade para a vida em sociedade, e as profundas consequências desse processo para a democratização da sociedade e, em particular, da educação. Em trabalhos anteriores (PERONI, 2003; 2006; 2013a), analisamos as redefinições no papel do Estado13 como parte de mudanças sociais e econômicas deste período particular de crise estrutural do capital14, em que as contradições estão mais acirradas. A natureza da atual crise é importante, pois o seu diagnóstico influencia as estratégias de sua superação, com grandes implicações para as fronteiras entre o público e o privado15. Mészáros (2011) adverte para a importância de adequada avaliação da natureza da crise econômica e social. Para o autor, “[...] a crise do capital que estamos experimentando é uma crise estrutural que tudo abrange.” (MÉSZÁROS, 2011, p. 2). Para Antunes (1999), a crise do Fordismo e do Keynesianismo foi a expressão fenomênica de um quadro crítico mais complexo, de tendência decrescente da taxa de lucros e com o “[...] desencadeamento da sua crise estrutural começava também a desmoronar o mecanismo de regulação que vigorou durante o pós-guerra, em vários países capitalistas avançados, especialmente na Europa.” (ANTUNES, 1999, p. 31). Ainda segundo Antunes: Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do Neoliberalismo, com a privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal, da qual a era Thatcher-Reagan foi expressão mais forte; a isso se seguiu também um intenso processo de reestruturação da produção e o trabalho, com vistas

13 14 15

Esta tese é baseada em estudos da autora (PERONI, 2003; 2005; 2006; 2008; 2009; 2011). Com base em autores como Mészàros (2002), Antunes (1999) e Harvey (1989; 2005). Esta discussão aparece de forma mais aprofundada no meu texto “As relações entre o público e o privado nas políticas educacionais no contexto da Terceira Via” (PERONI, 2013a).

30 a dotar do instrumental necessário para tentar repor patamares de expansão anteriores. (ANTUNES, 1999, p. 31).

O Estado foi chamado historicamente a tentar controlar ou regular as contradições do capital e a relação capital/trabalho. Atualmente, apesar do anunciado Estado mínimo pelo neoliberalismo, ele é chamado a “socorrer” o capital produtivo e financeiro nos momentos de maior crise. E, contraditoriamente, foi e é considerado o “culpado pela crise” pela teoria neoliberal (PERONI, 2013a). Clarke e Newman (2012, p. 375) destacam que, com a crise de 2008, a fé nos mercados ficou abalada. “Os estados entraram como os salvadores de instituições financeiras falidas e tentaram apaziguar mercados assustados e em pânico. [...]. As instituições públicas pareciam com os salvadores em potencial do capitalismo global.”. Mas, no que entendemos ser um processo de correlação de forças, [...] a atitude de negócios como sempre foi rapidamente restaurada com o fracasso da prometida regulação e reforma em se materializar e com a continuação dos piores excessos de atores gerenciais e empresariais empoderados, apesar de considerável descrédito e a raiva do público. (CLARKE; NEWMAN, 2012, p. 375).

Assim como no pós-guerra, suas estratégias foram, principalmente, o fordismo/ keynesianismo, nos países centrais, e o fordismo/Estado desenvolvimentista nos países periféricos. Neste período suas principais estratégias são o neoliberalismo, a reestruturação produtiva, a globalização e a Terceira Via. O capital necessita de uma ideologia 16 para construir a ambiência cultural17 necessária a este período particular do capitalismo, camuflado de pós-capitalismo. Da mesma forma que o fordismo dependia de um sistema geral de regulamentação por parte do Estado, chegando a ser visto menos como um mero sistema de produção em massa do que como um modo de vida total18, também este momento histórico, com suas especificidades no âmbito do modo de

16

O conceito de ideologia utilizado neste trabalho é o proposto por Mészáros (1996, p. 22-23): “[...] a ideologia não é ilusão nem superstição religiosa de indivíduos mal orientados, mas uma forma específica de consciência social, materialmente ancorada e sustentada.”.

17

Por nova ambiência cultural, entendemos a alteração na forma de vida objetiva e subjetiva para produção da subjetividade necessária ao novo período de acumulação.

18

Ver Gramsci (1989), Americanismo e Fordismo.

31 produção, necessita de uma ideologia para que tais particularidades sejam aceitas e incorporadas (PERONI, 2003). Outro pressuposto teórico da análise do processo de redefinição do papel do Estado foi o de que a crise fiscal é parte de um movimento maior de crise do capital, e não a causadora da crise, como foi diagnosticado pelo neoliberalismo e pela Terceira Via (PERONI, 2006; 2009; 2013). O papel do Estado para com as políticas sociais é alterado, pois com esse diagnóstico duas são as prescrições: racionalizar recursos e esvaziar o poder das instituições, já que instituições democráticas são permeáveis às pressões e demandas da população, além de serem consideradas como improdutivas, pela lógica de mercado. Assim, a responsabilidade pela execução das políticas sociais deve ser repassada para a sociedade: para os neoliberais, através da privatização (mercado) e, para a Terceira Via, pelo público não-estatal (sem fins lucrativos) (PERONI, 2013). Contudo, é importante frisar que o Estado mínimo proposto é mínimo apenas para as políticas sociais conquistadas no período de bem-estar social. Na realidade, o Estado é máximo para o capital, porque, conforme analisa David Harvey (1989), o Estado, além de ser chamado a regular as atividades do capital corporativo, no interesse da nação, tem, ainda, de criar um “bom clima de negócios”, para atrair o capital financeiro transnacional e conter (por meios distintos dos controles de câmbio) a fuga de capital para “pastagens” mais verdes e lucrativas (HARVEY, 1989, p. 160). Há ainda, o fato de a acumulação flexível procurar, mais do que o fordismo, o capital financeiro como poder coordenador, o que significa maior possibilidade de crises financeiras e monetárias autônomas. Essas crises fazem com que o Estado acabe intervindo no mercado financeiro. Assim, verifica-se que, mesmo os governos mais comprometidos com a lógica neoliberal não intervencionista, têm sido notáveis interventores a favor do grande capital.

2.1 O MERCADO COMO PARÂMETRO DE QUALIDADE Buchanan

(1984),

teórico

neoliberal,

aponta

as

instituições

democráticas

contemporâneas como irresponsáveis, e o remédio seriam medidas restritivas constitucionais para conter os governos, colocando-se os instrumentos de controle fora das instituições representativas e partindo-se do princípio de que os controles políticos são inferiores ao de mercado. Observamos, nas pesquisas acerca das parcerias entre o público e o privado, que esta

32 tem sido uma justificativa apontada pelas instituições privadas para fazer a parceria, como é o caso do Instituto Ayrton Senna 19, que parte do pressuposto de que a educação pública vai mal e que deve “salvá-la”:

Os programas do Instituto Ayrton Senna são soluções educacionais que ajudam a combater os principais problemas da educação pública do país. E contemplam três grandes áreas: educação formal, educação complementar e educação e tecnologia. [...] Implementados em grande escala com estratégias e metas pré-definidas, os programas recebem acompanhamento e avaliações sistemáticas para alcançar um único objetivo: o sucesso do aluno na escola. (grifo da autora) (Disponível em: . Acesso em: 2 fev. 2014).

É interessante destacar, ainda, que o Instituto trabalha definindo políticas, com a concepção, acompanhamento e avaliação da educação nas redes públicas parceiras. Na justificativa de sua atuação, o Instituto Ayrton Senna aponta problemas na qualidade de ensino público e assume o que seriam tarefas do Estado para com as políticas públicas de educação. Essa perspectiva salvacionista, de que o privado mercantil deve garantir a qualidade da educação pública, não é uma visão isolada de um Instituto, ela está inserida em uma lógica que naturaliza essa participação, pois parte do pressuposto neoliberal de que não é o capitalismo que está em crise, mas o Estado. A estratégia, segundo essa concepção, é reformar o Estado ou diminuir sua atuação. O mercado é que deverá superar as falhas do Estado, portanto, a lógica do mercado deve prevalecer, inclusive no Estado, para que ele possa ser mais eficiente e produtivo. Para o pensamento neoliberal, há uma tensão entre a liberdade individual e a democracia. Conforme Hayek (1983), a maximização da liberdade está em proteger o sistema de mercado como necessário e suficiente para a existência da liberdade. Assim, o mercado deve ser protegido contra o Estado e da tirania das maiorias. Esse autor ainda adverte que, se o Estado é influenciado, ou vulnerável às influências das massas, os dois perigos se fundem. Para essa teoria, o cidadão, através do voto, decide sobre bens que não são seus, gerando conflitos com os proprietários, já que é visto como uma forma de distribuição de renda. Hayek (1983) denuncia que a democracia faz um verdadeiro saque à propriedade alheia. E, como em

19

Sobre o tema parcerias entre sistemas públicos de educação básica e o Instituto Ayrton Senna, ver relatório de pesquisa de Adrião e Peroni (2010).

33 muitos casos não se pode suprimir totalmente a democracia (voto, partidos), o esforço é para esvaziar seu poder. Para Hayek (1983), a democracia ilimitada leva à economia dirigida e está a um passo do totalitarismo. O autor adverte para os perigos da democracia ilimitada: “[...] uma democracia pode empunhar poderes totalitários, e é pelo menos concebível que um governo autoritário pode atuar com base nos princípios liberais. Liberalismo é, portanto, incompatível com democracia ilimitada, [...]” (HAYEK, 1983, p. 143). Outra escola neoliberal, a Teoria da Eleição Pública, conhecida como Public Choice, faz uma análise econômica da política20. O ponto de partida de discussão da Escola é que a economia e a política de um país são inseparáveis. A ideia chave da Public Choice é de que o paradigma da ação humana, em todas as dimensões, passa pela relação de troca, pelo jogo de interesses. Isso é tanto um pressuposto como uma prescrição, no sentido de que a Escola trabalha para que todas as relações tenham a troca como modelo (BUCHANAN et al., 1984). Buchanan (1982, p. 177) compara o mercado à política: “As pessoas e os partidos que buscam representar os interesses dos votantes competem pela aprovação ou o favor, de uma maneira bastante similar aos vendedores de produtos imperfeitamente competitivos de bens e serviços”. O autor critica, aliás o voto e os políticos, por considerar que estes fazem distribuição de renda através das políticas públicas: “Nossa análise dos políticos se centra sobre o conceito de transferências de riqueza realizadas através da legislação [...] quando dizemos ‘transferências de riqueza’ o eleitor pode substituir por questões ou políticas públicas.” (BUCHANAN, 1984, p. 177). No entanto, com base em autores como Harvey (1989), Mészáros (2002), Chesnais (1996), partimos da tese já desenvolvida em trabalhos anteriores (PERONI, 2003; 2006 e PERONI; ADRIÃO, 2005), segundo a qual existe uma crise estrutural do capital e o neoliberalismo, a globalização, a reestruturação produtiva e a Terceira Via são estratégias do capital para a superação de sua crise de diminuição na taxa de lucro, e são essas estratégias que redefinem o papel do Estado. Assim, a crise no Estado seria consequência e não causa, como aponta a teoria neoliberal. Brenner (2008) concorda com a profundidade da crise, e que ela está enraizada na queda das taxas de lucro. O autor destaca, ainda, que a “[...] combinação da fragilidade da

20

O seu principal teórico é James Buchanan, é também conhecida como Escola de Virgínia, pois se constituiu no Instituto Politécnico da Universidade de Virgínia na década de 1950.

34 acumulação de capital com a crise do sistema bancário transformou o presente declínio econômico numa crise de difícil resolução pelo poder político e que potencialmente pode se tornar um desastre.” (BRENNER, 2008, p. 1). Ele enfatiza também que quem está pagando a “conta” da crise são os Estados e os trabalhadores, já que ocorreu o aumento da exploração, com a expansão da jornada de trabalho e diminuição salarial, além do endividamento dos Estados ao financiarem a crise (PERONI, 2013). A globalização, principalmente a financeira, mas também a produtiva, com as mudanças nos mercados mundiais, redefine o papel do Estado, da mesma maneira a reestruturação produtiva, pois alterou em muito os postos de trabalho e as concepções de gestão. Enfim, são mudanças profundas não apenas na produção, mas no modo de vida da sociedade21. Harvey (2010) enfatiza que o papel do Estado na crise atual não é nada mínimo, como propõe a teoria neoliberal. Assinala-se um exemplo dado pelo autor que ilustra bem esse fato: Pouco depois da falência do Lehman, alguns funcionários e banqueiros do tesouro, incluindo o Secretário do Tesouro, que era um ex-presidente da Goldman Sachs e atual diretor executivo da Goldman, surgiram de uma sala de conferências com um documento de três páginas exigindo 700 bilhões de dólares para socorrer o sistema bancário, prenunciando um Armagedom nos mercados. Era como se Wall Street tivesse iniciado um golpe financeiro contra o governo e o povo dos Estados Unidos. Algumas semanas depois, com ressalvas aqui e ali e muita retórica, o Congresso e, em seguida, o presidente George Bush cederam e o recurso foi enviado, sem qualquer controle, para todas as instituições financeiras consideradas ‘grandes demais para falir’ (HARVEY, 2010, p. 12).

Entendemos que essas redefinições no papel do Estado modificam as fronteiras entre o público e o privado e materializam-se das mais variadas formas. Robertson et al. (2012) definem essas formas de relação como PPP (Parcerias Público-Privadas): Ao longo das últimas duas décadas, mudanças significativas na governança dos sistemas de ensino têm sido postas em prática como instituições internacionais, governos, empresas, consultores filantrópicos e promoveram acordos de parceria mais híbridos, envolvendo novas combinações de atores estatais e não estatais envolvidos em um leque de atividades no sector da educação. Estas novas formas de governança da educação, muitas vezes operam em escalas, através de interações entre regional e nacional, governos locais e organizações intergovernamentais, e entre estes e as empresas nacional e transnacional configuradas de lucro, filantropos, ONGs e organizações religiosas. Uma grande variedade de termos já surgiu para capturar estes desenvolvimentos, embora sem dúvida na comunidade internacional é o termo

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Conforme análise de Gramsci (1989) em Americanismo e Fordismo.

35 Parcerias Público-Privadas (PPPs), que foi globalizado e adquiriu status de ícone. (ROBERTSON; MUNDY; VERGER; MENASHY, 2012, p. 1).

Para Robertson et al. (2012), as parcerias possuem uma base comum e um conjunto de ideias programáticas que representam a continuação, e não a moderação, do liberalismo econômico. Seus pontos de referência ideológica são a articulação do neoliberalismo com o neoconservadorismo. No entanto, segundo os autores, com o renascimento das “parcerias” também se articularam mudanças mais amplas na paisagem ideológica e conceitual da governança, em direção a uma “Terceira Via” entre o Estado e o mercado, como a de Blair, em seu “governo para a modernização” no Reino Unido. Essas parcerias foram um corretivo para a presença demasiada do Estado (Keynesianismo), por um lado, e para a ausência dele, por outro (privatização). Ao agir como uma ponte entre cada setor, atuavam como um canal, permitindo o aproveitamento de valores de cada parceiro a serem capitalizados no futuro (ROBERTSON; MUNDY; VERGER; MENASHY, 2012, p. 7). Nossas pesquisas também analisam a relação entre a Terceira Via e o terceiro setor (PERONI; ADRIÃO, 2005; PERONI, 2006; PERONI, 2013a), pois a Terceira Via, atual socialdemocracia, também desloca para o público não estatal a direção e execução das políticas sociais. A proposta é reformar o Estado, mas, como se mantém o diagnóstico de que o Estado é ineficiente, essa reforma deve ter o mercado como parâmetro de qualidade (PERONI, 2006; 2013). Conforme Anthony Giddens (2001a), um dos principais ideólogos dessa política, a Terceira Via “[...] não é uma tentativa de ocupar uma posição moderada entre o socialismo de cima para baixo e a filosofia de livre mercado. Ela se preocupa com a reestruturação das doutrinas social-democráticas para responder à dupla revolução da globalização e da economia do conhecimento.” (GIDDENS, 2001a, p. 166). Em outro momento, o autor define a Terceira Via “[...] no sentido de que é uma tentativa de transcender tanto a socialdemocracia do velho estilo quanto o neoliberalismo.” (GIDDENS, 2001b, p. 36). Destacamos que, na visão de Giddens, há uma naturalização, não há sujeitos no processo de globalização. Não há uma discussão da crise, apenas o Estado deve se adaptar a um mundo de mudanças, como se não fossem estratégias do capital em um processo de correlação de forças (PERONI, 2013a). Conforme Antunes (1999), a discussão sobre a Terceira Via ocorre quando o Novo Trabalhismo se apresenta como uma alternativa ao neoliberalismo de Thatcher e também à antiga socialdemocracia. Segundo o autor, o Novo Trabalhismo “[...] associa a preservação da

36 social democracia a elementos básicos do neoliberalismo.” (ANTUNES, 1999, p. 95). Antunes (1999, p. 99) ressalta ainda que “[...] a Terceira Via acaba configurando-se como a preservação do que é fundamental do neoliberalismo, dando-lhe um frágil verniz social-democrático cada vez menos acentuado.”. A Terceira Via, também chamada de democracia social democratizadora ou esquerda democratizadora, refere-se ao modo como os partidos de centro-esquerda respondem às mudanças, que podem ter muitas diferenças, mas têm como pontos em comum: a reforma do governo e do Estado; o papel regulador do Estado no mercado e na sociedade civil; papel central da sociedade civil, identificada com o empreendedorismo; novo contrato social, vinculando direitos a responsabilidades; redefinição do conceito de igualitarismo, baseado no investimento em habilidades e capacidades individuais; criação de uma economia dinâmica, com parcerias entre o governo e a sociedade civil; a conexão entre políticas sociais e econômicas e o questionamento aos direitos sociais e trabalhistas; Estado de Bem-Estar sustentável com equilíbrio entre direitos e sustentabilidade; políticas ativas para combater o crime; política ecológica; capitalismo responsável, as empresas devem assumir obrigações sociais e deve haver uma regulamentação nacional e internacional para as corporações (GIDDENS, 2007). A questão central da socialdemocracia permanece a mesma, de ser o centro, assumindo posições em alguns momentos mais à esquerda ou à direita, propondo reformas por dentro do capitalismo para fortalecê-lo. Como, para Giddens, as classes sociais não são mais importantes para a análise de um mundo sem inimigos e para além da direita e da esquerda (GIDDENS, 2001b), é possível defender uma cultura cívica, na qual os empresários estariam envolvidos com o bem comum e não apenas com o lucro. Giddens, ao criticar o neoliberalismo, adverte que “[...] há o risco de que as formas mais agressivas de capitalismo dos acionistas destruam as estruturas sociais e cívicas que tornam viável a economia capitalista. Esta é a principal objeção da política da Terceira Via ao fundamentalismo de mercado dos neoliberais.” (GIDDENS, 2001, p. 154). É importante destacar que o conceito de sociedade civil modernizada quer dizer bemsucedida no mercado, já que defende o empreendedorismo. E é a essa parcela da sociedade civil que o Estado deve incentivar para que assuma as políticas sociais, passando a ser um mero financiador: O empreendedorismo civil é qualidade de uma sociedade civil modernizada. Ele é necessário para que os grupos cívicos produzam estratégias criativas e enérgicas para

37 ajudar na lida com problemas sociais. O governo pode oferecer apoio financeiro ou proporcionar outros recursos a tais iniciativas. (GIDDENS, 2007, p. 26).

Entende-se que, nessa perspectiva, os sujeitos são entendidos como filantropos que se responsabilizarão pelos destinos da sociedade, mas não qualquer sociedade, uma vez que prega o empreendedorismo e a concepção de mercado no conteúdo da política (PERONI, 2013a). Destacamos, ainda, a concepção individualista da Terceira Via, cujo objetivo geral “[...] deveria ser ajudar os cidadãos a abrir seu caminho através das mais importantes revoluções do nosso tempo: Globalização, transformações na vida pessoal e nosso relacionamento com a natureza.” (GIDDENS, 2001b, p. 74). Assim, cada sujeito é responsável por individualmente abrir o seu caminho e as transformações vão se dar na esfera pessoal e não societária. Concordamos com Marilena Chauí quando esta critica o tom abstrato do ideário da Terceira Via: A pregação de valores conseguiu a proeza de não falar uma única vez do valor propriamente dito, isto é, do capital e da relação capital-trabalho. Aliás, no vocabulário da Terceira Via, o conceito de trabalho desapareceu, ficando em seu lugar ora o termo ‘emprego’, ora o termo ‘mercado’. (CHAUÍ, 1999, p. 6).

Do mesmo modo, nos alinhamos ao pensamento de Harvey (2008), quando afirma que, no nosso período histórico, as questões das liberdades individuais trouxeram perdas para um projeto societário de justiça social e mais coletivo: [...] os valores ‘liberdade individual’ e ‘justiça social’ não são necessariamente compatíveis. A busca da justiça social pressupõe solidariedades sociais e a propensão a submeter vontades, necessidades e desejos à causa de uma luta mais geral em favor de, por exemplo, igualdade social ou justiça ambiental. (HARVEY, 2008, p. 51).

Verificamos, assim, que o individualismo é uma posição comum ao neoliberalismo e à Terceira Via. Harvey (2008), ao tratar da neoliberalização, que é o balanço da teoria neoliberal na prática, destaca que o mercado regula o bem-estar humano e a competição é o seu mecanismo regulador. Por conseguinte, o sucesso e o fracasso são considerados individuais por meio das virtudes empreendedoras do indivíduo: O sucesso e o fracasso individuais são interpretados em termos de virtudes empreendedoras ou de falhas pessoais (como não investir o suficiente em seu próprio capital humano por meio da educação), em vez de atribuídos a alguma propriedade

38 sistêmica (como as exclusões de classe que se costumam atribuir ao capitalismo). (HARVEY, 2008, p. 76).

Para essa teoria, as classes inferiores pioraram por razões pessoais e culturais, na tarefa de aprimorar o capital humano e a dedicação à educação. Tudo pode ser tratado como mercadoria. A mercadificação presume a existência de direitos de propriedade sobre processos, coisas e relações sociais. É o que o autor chama de “mercadificação de tudo” (HARVEY, 2008, p. 178). Quanto à igualdade social, Giddens (2007) salienta que, “[...] os social-democratas precisam revisar não apenas sua abordagem, mas também seu conceito de igualitarismo [...] não há futuro para o igualitarismo a todo custo, que absorveu por tanto tempo os esquerdistas.” (GIDDENS, 2007, p. 253). O autor defende o conceito de capacidade social, defendendo que a igualdade não se refere apenas a ter acesso aos bens, mas fazer uso efetivo deles. Giddens critica a igualdade social: “Os social-democratas em todos os países precisam sustentar uma base tributária substancial para que as políticas públicas e bem-estar social sejam custeadas e a desigualdade econômica seja mantida sob controle.” (GIDDENS, 2007, p. 264). E propõe construir um novo contrato social, dizendo que “[...] não há direitos sem responsabilidades.” (GIDDENS, 2001a, p. 58). Nesse sentido, o autor defende a filantropia, quando afirma que “[...] incentivos positivos para a filantropia, por exemplo, podem ter um papel tão significativo quanto os impostos diretos sobre a transmissão de riqueza.” (GIDDENS, 2007, p. 266). O autor desenvolve a tese de que existe uma nova cultura política “[...] em resposta à mudança social e econômica. A nova cultura política diverge do modelo tradicional de política de classe.” (GIDDENS, 2001b, p. 48). Em um artigo no qual tratávamos mais especificamente da gestão democrática, elaboramos um quadro síntese para melhor visualizar as diferenças e semelhanças entre as duas propostas, mas não no sentido de minimizar as contradições e todas as mediações necessárias

39 na análise das propostas práticas do neoliberalismo e da Terceira Via. E destacamos ainda que, nas práticas sociais, há um grande hibridismo entre as propostas nos países. Quadro 1 – Pontos principais do Neoliberalismo e da Terceira Via – semelhanças e diferenças Neoliberalismo

Terceira Via

Estado

mínimo

Reforma do Estado Administração gerencial parcerias

Gestão

gerencial

gerencial

Democracia

Totalitária, culpada pela crise, Estado gastou demais atendendo à demanda dos eleitores

Deve ser fortalecida Democratizar a democracia “participação da sociedade na execução das políticas” Parcerias com o terceiro setor

Políticas Sociais Privatização Sujeitos

Individualismo Teoria do capital humano

Individualismo Teoria do capital humano

Fonte: Peroni (2012, p. 21).

Portanto, o diagnóstico é o mesmo, mas algumas estratégias são diferentes e, outras, semelhantes. O neoliberalismo propõe o Estado mínimo, privatizando e tendo o mercado como parâmetro para a gestão pública; a Terceira Via propõe reformar o Estado, argumentando que este é ineficiente; assim, a reforma do Estado terá como parâmetro de qualidade o mercado, por intermédio da administração gerencial, fortalecendo a lógica de mercado no interior da administração pública. Dessa maneira, tanto o neoliberalismo quanto a Terceira Via usam a gestão gerencial como parâmetro para a gestão pública. O individualismo é uma posição comum ao neoliberalismo e à Terceira Via. Para a Terceira Via, cada indivíduo é responsável por abrir o seu caminho, e as transformações ocorrerão na esfera pessoal, e não societária – mesma concepção da teoria do capital humano, que reforça o individualismo e a meritocracia. Neste período particular do capitalismo, o alto grau de desemprego intensificou a exclusão social provocada, principalmente, pela chamada revolução tecnológica. Esse fato teve seus efeitos agravados pela reforma do Estado, que tem provocado uma diminuição nas políticas

40 sociais. E o terceiro setor é chamado a “aliviar os níveis de pobreza”, para se evitar o caos social. O terceiro setor multiplicou-se em um contexto de crise do Estado Providência. Para Harvey (2008), as ONGs vêm preencher o vácuo de direitos deixado pelo Estado, isso “[...] equivale a uma privatização via ONGs. Em alguns casos, isso ajudou a acelerar o afastamento ainda maior do Estado dos benefícios sociais. Assim, as ONGs funcionam como ‘cavalos de troia do neoliberalismo global’”. (HARVEY, 2008, p. 190). A questão da democracia é também ressaltada pelo autor: [...] as ONGs não são organizações inerentemente democráticas. Tendem a ser elitistas, a não dar satisfação a ninguém (a não ser a quem as financia) e, por definição, são distantes daqueles a quem buscam ajudar ou proteger, por mais bem intencionadas e progressistas que possam ser. Costumam esconder sua pauta de interesses e preferem a negociação direta com o Estado e o poder de classe, ou a influência sobre eles costumando antes controlar sua clientela do que representá-la. Alegam e presumem falar em favor daqueles que não podem falar por si mesmos, e até definem os interesses daqueles em cujo nome falam – como se as pessoas não pudessem elas mesmas fazê-lo. (HARVEY, 2008, p. 190-191).

Além de assumir algumas atividades que seriam do Estado, como a promoção ou a manutenção de bem-estar social, o terceiro setor acaba também assumindo um certo poder (econômico/político), principalmente quanto à definição de seu próprio campo de cooperação internacional, no que se refere ao repasse e prestação de contas dos recursos financeiros, diretamente para as agências internacionais, sem a intermediação do Estado, principalmente quando o financiamento ocorre via agências internacionais. O caráter não governamental assumido pelo terceiro setor, que implica não ser submetido ao controle institucional, aponta para questões como: em nome de quem estão operando? Uma vez que, muitas vezes, estão vinculadas diretamente às agências internacionais, a quem prestam contas? Qual é o padrão ético de julgamento? Quem julga suas ações? E, se existe legitimidade, quem a outorga? O terceiro setor, para Montaño (2002), modifica inclusive a questão social. Primeiro, com a transferência da responsabilidade da questão social do Estado para o indivíduo, que a resolverá por meio da autoajuda, ajuda mútua ou, ainda, adquirindo serviços como mercadorias. Segundo, as políticas sociais passam a ser focalizadas, perdendo, assim, seu princípio universalista. Terceiro, com a descentralização administrativa, as políticas tornam-se

41 ainda mais precarizadas, entre outros problemas, porque são transferidas as competências sem os recursos correspondentes e necessários para executá-las. Graccioli e Lucas (2009, p. 116) também problematizam a focalização das políticas e o deslocamento das responsabilidades em sua implementação: Nas últimas décadas, os direitos universais estão sendo atacados e ameaçados, tanto nos países centrais do capitalismo quanto em áreas periféricas nas quais algumas garantias foram conquistadas muitas vezes de forma bastante incipiente e frágil. Enquanto isso, têm sido ampliadas políticas estatais de natureza focalizada, muito diferentes da noção de direito. É nesse processo que o ‘terceiro setor’ se consolida, financiado, em larga escala, por verbas públicas, que se tornaram cada vez mais escassas para problemas estruturais vinculados aos direitos básicos da população.

O terceiro setor é uma das alternativas propostas pela Terceira Via para que o Estado não seja mais o principal executor das políticas sociais, bem como para que o conteúdo mercantil possa, através das parcerias, aprofundar a lógica de mercado nas políticas públicas, “qualificando-as”. É interessante ainda destacar que, enquanto os países que viveram a socialdemocracia discutem a Terceira Via, na América Latina22 o debate sobre o desenvolvimentismo retorna à cena atualmente. Para Castelo Branco (2009, p. 75), [...] o objetivo dos novos-desenvolvimentistas nos parece claro: entrar, como uma espécie de Terceira Via, na disputa pela hegemonia ideo-política para a consolidação de uma estratégia de desenvolvimento alternativa aos modelos em vigência na América do Sul, tanto ao ‘populismo burocrático’, representado por setores arcaicos da esquerda e partidários do socialismo, quanto à ortodoxia convencional, representada por elites rentistas e defensores do neoliberalismo.

O autor ressalta ainda qual é o papel do Estado para os novo-desenvolvimentistas: Em síntese, o Estado deve garantir condições macroeconômicas e salvaguardas jurídicas que reduzam a incerteza do ambiente econômico, propiciando um horizonte mais previsível do cálculo de risco do investimento privado, e aumentando, por sua

22

Ver a tese de Aloízio Mercadante Oliva: As bases do novo desenvolvimentismo no Brasil: análise do governo Lula (2003-2010). Tese defendida na Unicamp, em 2010.

42 vez, a demanda por fatores de produção, o emprego e os ganhos dos trabalhadores. Assim, o Brasil reduzirá a pobreza e a desigualdade social. O projeto novo-desenvolvimentista de intervenção na ‘questão social’, portanto, baseia-se no crescimento econômico e na promoção da equidade social via a igualdade de oportunidades. Esta é, grosso modo, a utopia da intelligentsia novo-desenvolvimentista. (CASTELO BRANCO, 2009, p. 78).

Concorda-se com o autor nas críticas ao novo-desenvolvimentismo, que apresenta o Estado como complementar ao mercado e promotor do bem-estar universal, acima dos distintos interesses das classes sociais. O autor ressalta que é um retorno ao antigo nacionaldesenvolvimentismo, que defendia a conciliação entre capital e trabalho, tendo em vista um abstrato interesse nacional. Para Mattei (2011), o papel do Estado no antigo desenvolvimentismo era o de protagonista e, no novo-desenvolvimentismo, o setor privado é quem deve “[...] disponibilizar recursos e suas capacidades gerenciais a favor dos investimentos produtivos.” (MATTEI, 2011, p. 11). Conforme estudos do autor, esse papel representa a) Ter capacidade para regular a economia, estimulando um mercado forte e um sistema financeiro a serviço do desenvolvimento e não das atividades especulativas, b) fazer a gestão pública com eficiência e responsabilidade perante a sociedade; c) implementar políticas macroeconômicas defensivas e em favor do crescimento; d) adotar políticas que estimulem a competitividade industrial e melhorem a inserção do país no comércio internacional; e) adotar um sistema tributário progressivo, visando reduzir as desigualdades de renda. (MATTEI, 2011, p. 11, grifo da autora).

Destaca-se que o Estado é protagonista, mas nos parâmetros da administração gerencial. O autor conclui avaliando algumas inconsistências nas análises sobre o novo desenvolvimentismo brasileiro, que consideramos muito procedentes, como a ausência de uma discussão conceitual sobre o desenvolvimento e sobre o envolvimento das classes sociais no novo projeto desenvolvimentista, e de uma discussão política mais consistente de como implementar a justiça social em uma sociedade tão desigual. O Brasil é formado por uma sociedade dominada, ainda pelo coronelismo, autoritarismo, pela corrupção e, por fim, pela ausência de uma discussão do cenário global no atual contexto. É interessante observar a semelhança com o ideário da Terceira Via e importante considerar que, enquanto os países que tinham uma correlação de forças mais propícias aos trabalhadores discutiam o Estado de Bem-Estar Social, os latino-americanos viviam ditaduras e o Estado nacional desenvolvimentista. Neste momento, a discussão do novo

43 desenvolvimentismo retoma a proposta de desenvolvimento, mas, mais uma vez, sem muitas conexões com os direitos materializados em políticas sociais (PERONI, 2013). Diante das discussões acerca de neoliberalismo, Terceira Via e neodesenvolvimentismo, e em um contexto histórico recente de abertura política, questiona-se: como fica a democracia nesse projeto? Enquanto para o neoliberalismo a democracia atrapalha o livre andamento do mercado, pois deve atender à demanda dos eleitores para se legitimar, o que provoca o déficit fiscal, para a Terceira Via a democracia deve ser fortalecida. Giddens (2001) argumenta que é preciso democratizar a democracia. Porém, democracia entendida como a sociedade assumindo tarefas que até então eram do Estado e participação como a responsabilização na execução de tarefas. Assim, verificamos uma separação entre o econômico e o político (WOOD, 2003), o esvaziamento da democracia como luta por direitos e das políticas sociais como a materialização de direitos sociais. A seguir, analisaremos as duas teorias enfocando essa discussão. Para a teoria neoliberal, não é o capitalismo que está em crise, mas o Estado. A estratégia, portanto, é reformar o Estado ou diminuir sua atuação para superar a crise. O mercado é quem deverá superar as falhas do Estado, portanto, a lógica do mercado deve prevalecer inclusive no Estado, para que ele possa ser mais eficiente e produtivo. Conforme Moraes (2001, p. 49): O funcionamento da ordem de mercado é visto como um paradigma, um modelo de funcionamento para outras instituições sociais. Assim a pretensão destes analistas [neoliberais] é descobrir quais as regras constitucionais que, no plano das decisões coletivas (não-mercado), mais se aproximam da perfeição exibida por essa ordem (a do mercado). É o que chamam de economia constitucional, uma nova teoria do contrato social, que proporcione uma reconstrução da ordem social e política.

Todas as correntes da teoria neoliberal criticam a democracia. Para Hayek (1984), há uma tensão entre a liberdade individual e a democracia. Conforme o autor, a maximização da liberdade está em proteger o sistema de mercado como necessário e suficiente para a existência da liberdade. Assim, o mercado deve ser protegido contra o Estado e a tirania das maiorias. Ele sublinha que o Estado é influenciado, ou vulnerável às influências das massas. E, assim, o cidadão, por meio do voto, pode decidir sobre bens que não são seus, adquirindo inclusive forma de distribuição de renda. Conforme já foi salientado nesta tese, para Hayek (1984), a

44 democracia faz um verdadeiro saque à propriedade alheia, e deve ser contida, com o esvaziamento das instituições públicas, permeáveis à correlação de forças (PERONI, 2003). Para Reginaldo Moraes, a Public Choice “[...] nasce justamente do estudo da diferença entre estes dois universos (mercado e estado) e da tentativa de conduzir um deles ao modo operativo do outro – tornar as decisões ‘não-mercado’, mais próximas das ‘decisões tipo mercado’.” (MORAES, 2001, p. 56). Os teóricos da Public Choice criticam o excesso de regulamentação e de Estado, pois julgam que essas atividades são onerosas para o conjunto da sociedade e diminuem sua produtividade. Eles defendem que é preciso estabelecer limites constitucionais contra as instituições democráticas vigentes: eliminando o voto, o que é mais difícil, ou restringindo o seu impacto, por meio da privatização e desregulamentação, provocando o desmantelamento do Estado. Diferente da teoria neoliberal, segundo a qual a democracia é prejudicial ao livre andamento do mercado e chega a ser chamada de totalitária (HAYEK, 1984), a proposta da Terceira Via é a democratização da democracia, que pressupõe um Estado democrático que tenha como principais características “[...] descentralização, dupla democratização, renovação da esfera pública-transparência, eficiência administrativa, mecanismos de democracia direta e governo como administrador de riscos.” (GIDDENS, 2001b, p. 87). A democracia, para a Terceira Via, está vinculada a uma moralidade cívica, que está associada a uma visão de sociedade sem o antagonismo de classes sociais ou correlação de forças políticas por diferentes projetos societários: Há o risco de que formas mais agressivas de capitalismo dos acionistas destruam as estruturas sociais e cívicas que tornam viável a economia capitalista. Esta é a principal objeção da política da Terceira Via ao fundamentalismo de mercado dos neoliberais. (GIDDENS, 2001a, p. 154).

Para a Terceira Via, a principal estratégia de retirada do Estado da execução direta das políticas sociais é a parceria público-privada, tanto para a execução das políticas sociais como para o mercado, por meio de uma nova economia mista que propõe “[...] uma nova sinergia entre os setores público e privado, utilizando o dinamismo dos mercados, mas tendo em mente o interesse público.” (GIDDENS, 2001b, p. 109). Giddens (2001) afirma que precisamos radicalizar a democracia, democratizar a democracia e a participação da sociedade civil. Mas o que significam essa democracia e essa participação? Questionamos que concepção é essa de participação, quando a sociedade civil é muito mais chamada a executar tarefas do que a participar na tomadas de decisões e no controle

45 social. E a democratização, seguindo essa lógica, seria apenas para repassar tarefas que deveriam ser do Estado. A sociedade civil acabou se responsabilizando pela execução das políticas sociais em nome da democracia (PERONI, 2012). Neste contexto, persiste a falsa ideia de que a sociedade civil está participando, quando, na realidade, as suas instituições representativas, como sindicatos, movimentos sociais e partidos, estão sendo arrasados como parte da estratégia neoliberal (PERONI, 2006). Wood (2003, p. 217) destaca que [...] a separação entre Estado e sociedade civil no Ocidente certamente gerou as novas formas de liberdade e igualdade, mas também criou novos modos de dominação e coerção. [...] trata-se da privatização do poder público que criou o mundo historicamente novo da ‘sociedade civil’.

Essa análise de Wood encaminha as discussões sobre como, neste período particular do capitalismo, por um lado avançamos na tão batalhada democracia, mas, por outro, há um esvaziamento das políticas sociais, principalmente das políticas sociais como um direito universal. Aumentou, portanto, a separação entre o econômico e o político, historicamente presente no capitalismo (PERONI, 2006). O esvaziamento do conteúdo da democracia e a separação entre o econômico e o político são evidentes. Perdeu-se a discussão das políticas sociais como a materialização de direitos sociais. Por conseguinte, as lutas por direitos universais foram cedendo espaço para a naturalização do possível, aceitando a ideia de que o Estado “em crise” não pode executar políticas, e, por tal motivo, repassa suas execuções para a sociedade civil, especialmente a população em vulnerabilidade, para evitar o caos social, mas permanece no controle por meio da avaliação e parte do financiamento (PERONI, 2009). Robertson e Verger (2012) também apontam questionamentos sobre a democracia no debate acerca da relação entre o público e o privado: “[...] parcerias e redes de regulamentação tendem a reduzir a democracia à negociação no seio da sociedade civil entre atores extremamente desiguais [...]” (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1138). No sentido de nos contrapormos à concepção de democracia do neoliberalismo e da Terceira Via, apresentaremos na sequência um conjunto de argumentos, teoricamente fundamentados, de modo a sustentar nosso posicionamento. Para Vieira “[...] quanto mais coletiva a decisão, mais democrática ela é. Qualquer conceito de democracia e há vários deles, importa em grau crescente de coletivização de decisões.” (VIEIRA, 2002, p. 12). Wood (2003) remete para a não separação entre o econômico e o político e para a relação da democracia com

46 direitos sociais materializados em políticas. Para Mészáros (2002, p. 1008), “[...] programas e instrumentos de ação sociopolíticos verdadeiramente adequados só podem ser elaborados pela própria prática social crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvimento”. Enfim, como já foi mencionado nesta tese, sublinhamos que democracia é a materialização de direitos em políticas coletivamente construídas na autocrítica da prática social. No Brasil, após um longo período de ditadura, os anos 1980 foram marcados por um processo de abertura política, com participação popular e organização da sociedade na luta pelos seus direitos. Nesse contexto, os eixos principais dos movimentos sociais estavam vinculados à democracia, à gestão democrática do Estado através da participação da sociedade nas decisões políticas, enfim, à construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Mas, essa construção encontrou enormes obstáculos, pois o processo de abertura foi pactuado com as forças da ditadura. Conforme OLIVEIRA, RIZEK (2007, p. 22), A Nova República foi pensada como ruptura, mas bem observada ela é a consequência da sociabilidade e do campo de forças longamente gestado desde o golpe militar de 1964, passando pela transformação produtiva e da estrutura social e das novas formas de representação social e política [...]. Seu programa foi a tentativa de criar uma política que fosse a tradução de novos interesses criados pela imensa recuperação capitalista, recuperando as linhas de força entre classe e representação, o que conferia previsibilidade à política.

Nesse sentido, quando estava avançando em alguns passos a participação popular e a luta por direitos sociais, a democracia sofreu o impacto das estratégias do capital para a superação de sua crise: neoliberalismo, globalização e reestruturação produtiva, que já estavam em curso no resto do mundo e vinham em sentido contrário a esse movimento. Observou-se um enorme descompasso entre o processo de abertura democrática em que viviam os países da América Latina e a crise da democracia, no chamado capitalismo metropolitano, em que a ofensiva neoliberal, o processo de reestruturação produtiva e o de globalização já estavam em curso. Assim, não é por acaso que, apesar de termos avançado na materialização de direitos através da legislação, temos a dificuldade de implementá-los: É uma lista bela e conhecida, mas tal Estado de Direito não se realiza apenas com a garantia jurídico-formal desses direitos e liberdades, expressa em documento solene. Quanto a eles, o Estado de Direito determina a sua proteção formalizada e institucionalizada na ordem jurídica e, principalmente, reclama a presença de mecanismos sócio-econômicos dirigidos e planificados com a finalidade de atingir a concretização desses direitos. Muitas razões de Estado têm conduzido a contradições

47 entre a simples declaração dos direitos e liberdades e a sua real efetivação. (VIEIRA, 1998, p. 12).

Nessa época, após tantas manifestações populares pelas Diretas Já, o primeiro governo eleito após a ditadura militar, Collor de Melo, em 1990, tinha como programa a minimização do papel do Estado com as políticas sociais e um longo processo de privatização e mercantilização do público. Mesmo com o impeachment, tal processo não foi estancado e, apesar de o presidente Itamar Franco ter diferenças políticas em relação ao seu sucessor, na prática foi seu governo que fez o Plano Real, que, para minimizar a inflação, atraiu capital especulativo com juros altíssimos, o que provocou problemas para o capital produtivo e um aumento vertiginoso da dívida interna e externa. Fernando Henrique Cardoso, o ministro do Plano Real, que foi eleito presidente da República por dois mandatos, propôs, em 1995, o Projeto de Reforma do Estado, apresentado pelo Ministério da Administração e Reforma do Estado (Mare). De acordo com o documento, a “[...] reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento.” (BRASIL, 1995, p. 12). As políticas sociais, no plano, não foram consideradas atividades exclusivas do Estado e não pertenciam mais ao núcleo estratégico. Sua execução foi descentralizada para a sociedade por meio da privatização, da publicização e da terceirização. Privatização é passagem dos serviços lucrativos para o mercado, terceirização é o processo de transferência para o setor privado de serviços auxiliares ou de apoio e publicização, a ‘transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e científicos que hoje o Estado presta’. (BRESSER-PEREIRA, 1997, p. 7-8).

Bresser-Pereira, intelectual orgânico da Terceira Via, foi o ministro da Reforma do Estado no Brasil, e quando se refere às políticas sociais, aponta que, “[...] essas são atividades competitivas e podem ser controladas não apenas através da administração gerencial, mas também e, principalmente, através do controle social e da constituição de quase-mercados”. (BRESSER-PEREIRA, 1997, p. 8). Verificamos que a passagem da direção e execução das políticas sociais para o público não estatal, principalmente por meio de parcerias, foi intensificada nos governos seguintes, através da proposta de gestão gerencial como podemos verificar, por exemplo, na Carta de Brasília, que apresenta uma proposta de gestão pactuada pelo Ministério do Planejamento e secretários estaduais de Administração (BRASIL, 2009) com os princípios da gestão gerencial,

48 além de outros documentos como “Gestão pública para um país de todos”, Plano de Gestão do Governo Lula, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (BRASIL, 2003). Essa concepção de gestão, que tem princípios no gerencialismo, como trataremos no próximo capítulo, foi aprofundada pelo governo Dilma Rousseff, com a criação, em maio de 2011, da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade (CGDC), presidida por Jorge Gerdau, empresário brasileiro que vem travando uma verdadeira cruzada para que a lógica de mercado seja incorporada na gestão pública brasileira. Assim, a sociedade civil está participando da direção das políticas públicas; mas, questionamos, que sociedade? Estado e sociedade civil não são abstrações, e a questão central permanece sendo a classe social. No exemplo acima, ressaltamos que representantes do empresariado, e não dos movimentos vinculados às lutas sociais, foram chamados para representar a sociedade civil em um conselho que vai definir a gestão das políticas públicas. Outra questão importante é que a gestão não é técnica, mas política, e aparece como técnica nos argumentos do governo e dos empresários sobre qualidade e eficiência com a lógica do mercado na gestão pública (PIRES; PERONI, 2010). No segundo mandato da Presidenta Dilma Rousseff, a proposta de reformar a gestão pública permanece. Por exemplo, no evento do Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração (CONSAD), em 2105, “o ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, defendeu um novo olhar sobre as instituições públicas e uma modernização nas formas de geri-las”23. Segundo o Ministro Mangabeira Unger: Essa reforma precisa, segundo o ministro, organizar carreiras, buscar a eficiência do Estado com choque de gestão, e fomentar um experimentalismo na maneira de atuar do Governo, com ações cooperativas entre a União, os estados e os municípios. (grifo da autora) (Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2015).

Verificamos, pela fala do atual ministro da secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, que a proposta de 1995 de Reforma do Estado, de repasse para a sociedade civil das políticas sociais, permanece: Em relação à qualidade dos serviços públicos, o ministro Mangabeira acredita que para qualificá-los, se tornará cada vez mais importante o Estado organizar, preparar, financiar, coordenar e monitorar a sociedade civil independente para que ela participe da provisão competitiva e experimentalista dos serviços públicos. (Disponível em: 23

Disponível em: . Acesso em: 27 nov. 2015.

49 . Acesso em: 27 nov. 2015).

O então Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Mangabeira Unger, foi também o autor do polêmico documento “Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional” (2015). O documento é apresentado como uma proposta preliminar para discussão, com diretrizes de um projeto nacional de qualificação do ensino básico. O documento divide-se em duas partes, o primeiro, intitulado A Tarefa, esboça o ideário do projeto e, o segundo, “Iniciativas: um elenco de ações em ordem aproximada de implementação” (BRASIL, 2015). A proposta apresenta três pontos de partida: 1. Aproveitar e ultrapassar o exemplo do que deu certo. Nos últimos anos o Brasil viu grande número de experimentos na tentativa de melhorar os resultados do ensino público. Muitos destes experimentos seguiram lógica de eficiência empresarial, valendo-se de práticas como a fixação de metas de desempenho, a continuidade da avaliação, o uso de incentivos e de métodos de cobrança, o acompanhamento e, quando necessário, o afastamento de diretores, a despolitização da escolha de diretores e a individualização do ensino, especialmente para alunos em dificuldade. [...] Temos muito a aprender com a orientação empresarial. Precisamos, contudo, de muito mais do que ela é capaz de oferecer. (BRASIL, 2015, p. 5).

2. Mudar a maneira de ensinar e de aprender. Nesse item, apresenta as competências socioemocionais, proposta pelo Instituto Ayrton Senna: “[...] que permita à massa de alunos, vindos do meio pobre, superar as barreiras précognitivas que os impedem de aceder às capacitações analíticas. Será obra de libertação.” (BRASIL, 2015, p. 6). E, explica mais adiante, as “barreiras pré-cognitivas” relacionando-as às competências socioemocionais, que trataremos em maior profundidade no capítulo 5: A reorientação deve ter três focos: a prioridade dada no currículo a aprofundamento seletivo, a atenção a capacitações analíticas e o enfrentamento das inibições précognitivas (comumente chamadas de socioemocionais) ao domínio das capacitações analíticas. São as capacitações de comportamento, sobretudo as de disciplina e de cooperação. (BRASIL, 2015, p. 10, grifo da autora).

O terceiro foco diz que é preciso “organizar a diversidade para permitir a evolução. Nunca tivemos sistema nacional de ensino. A educação pública no Brasil tem sido

50 simultaneamente desorganizada e uniforme: uniforme no conformismo com a mediocridade.” (BRASIL, 2015, p. 6, grifo da autora). Esta parte, além de ser profundamente desrespeitosa com o processo de ampliação recente da educação básica brasileira, que ocorreu em meio ao ajuste fiscal e sem as condições materiais para que ocorresse com a qualidade desejada, ainda aponta, como uma das propostas, o controle e punição dos diretores de escolas públicas: [...] Os diretores de escolas com desempenho insatisfatório receberiam apoio e orientação. Em último caso, seriam afastados e substituídos. Em ambas as situações, atuariam equipes de reforço, compostos por orientadores indicados pelo Ministério da Educação e das secretarias de educação dos estados. O financiamento viria de recursos discriminados dentro do FNDE. (BRASIL, 2015, p. 9).

São muitos os pontos polêmicos no plano, mas aqui ressaltamos os que melhor materializam, no nosso entendimento, a proposta de relação entre o público e privado, tanto no que envolve a presença do setor privado na direção das políticas, quanto os princípios gerenciais. São eles: a presença do setor privado e dos princípios mercadológicos sendo enaltecidos, como a competição e a premiação; a presença de uma proposta de competências socioemocionais, muito polêmica e pouco debatida, que é a proposta de um Instituto, apresentada em um documento oficial do governo brasileiro; e, ainda, a punição e controle dos diretores em uma proposta completamente contrária ao princípio constitucional da gestão democrática. A democracia, na sociedade capitalista, envolve relações de poder, de classe, e a sua implementação pressupõe um evidente conflito. No caso brasileiro, há um grande obstáculo, pois o processo de construção de uma cultura democrática é ainda recente. Assim, o movimento de “ofensiva do capital” acaba encontrando um solo fértil, e a lógica do produto, em detrimento da lógica democrática, parece ser um novo consenso (PERONI, 2012). Ball fala sobre esse novo consenso, através de novas formas de governança, que, no nosso entendimento, são as redefinições no papel do Estado: Jessop (2002) chama de ‘desestatização’, que envolve ‘redefinir a separação de público-privado, realocar tarefas e rearticular o relacionamento entre organizações e tarefas por meio desta separação’ [...] tarefas e serviços anteriormente realizados pelo Estado estão agora feitos por vários ‘outros’, em vários tipos de relacionamento com ele e com o estado [...] Portanto, novas vozes e interesses são representados no

51 processo político, e novos nós de poder e influência são construídos e fortalecidos. (BALL, 2013, p. 178).

No entanto, Ball (2013a, p. 180) afirma que não há um “[...] esvaziamento do Estado, antes é uma nova forma de poder público, agência e ação social e, na verdade uma nova forma de estado. Ou seja, a realização de fins políticos por diferentes meios.”. “Os estados desempenham um papel importante e cada vez maior na metagovernança.” (JESSOP apud BALL, 2013a, p. 242).” Para Ball (2013a, p. 181): [...] cada vez mais o Estado contrata e monitora, em vez de distribuir serviços diretamente, usando as práticas rotineiras de medida de desempenho, avaliando e direcionando para gerir uma diversidade de fornecedores e formas de fornecimento. Novas formas de poder e autoridade subjetividade são empregadas na formação de esferas governamentais e pessoas governáveis.

No livro The Managerial State, Clarke e Newman (2006) apontam para redefinições no papel do Estado, também ressaltando que não significa que ele tenha diminuído sua atuação, apenas modificado:

O estado tem se retirado em alguns aspectos, seus poderes e aparelhos têm sido expandidos em outros – transferindo responsabilidades, mas simultaneamente criando as capacidades de fiscalização e reforço para garantir que estas responsabilidades estão sendo cumpridas. Isto tem envolvido a dispersão do poder estatal através de uma variedade de locais e espaços. (CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 126).

Segundo os autores, Quando revisitamos nossa análise do estado gerencial – um pouco antes da crise bancária – as consequências do declínio das noções de público e do setor público eram gritantes. O setor público tinha sido sujeitado a processos renovados de fragmentação e mercantilização (o que tínhamos descrito como dispersão) e era menos claro onde e como as difíceis decisões a respeito da alocação de recursos escassos estavam sendo tomadas; de fato, parecia que a distribuição de recursos estava cada vez mais sendo deixada para mecanismos de mercado. O setor público (anteriormente integrado) tinha sido harmoniosamente transformado em uma série de serviços determinados prestados por uma diversidade de organizações, sendo a pergunta de quem deveria prestá-los transformada em uma pergunta técnica, ao invés de embasada em valor ou política. A visão dominante era que haveria pouca ou nenhuma consequência se fossem prestados por uma empresa do setor privado, um órgão voluntário ou do terceiro setor ou uma organização do setor público. E cada vez mais a diferença de cada setor tornava-se nebulosa, na medida em que proliferavam novas formas organizacionais – nas quais os modos de autoridade

52 público e privado e estilos de trabalho estavam desigualmente e imprevisivelmente combinados. (CLARKE; NEWMAN, 2012, p. 370, grifos da autora).

Observamos também em nossas pesquisas que essa análise de Clarke e Newman está muito presente, no sentido de que o material proposto pelas parcerias é padronizado e replicável. Observamos, também, o retorno da histórica separação entre o pensar e o fazer, sendo que as instituições privadas determinam e monitoram e as escolas executam. Ball (2012) aponta que a reforma neoliberal é endógena e exógena, é, ao mesmo tempo, reforma e privatização. “O setor público é substituído e reformado ao mesmo tempo e as duas coisas são conectadas.” (BALL, 2012, p. 15). Para Ball (2012), as redes são uma tática do capital. O neoliberalismo tem se realizado através de processos de quase-mercado, reações entre o público e o privado, organizações públicas empreendedoras e trabalho organizado e voluntário. O autor adverte ainda que o terceiro setor pode ser visto como uma nova governamentalidade do neoliberalismo, e exemplifica através do caso da Inglaterra, onde as reformas do New Labour são a maior base da atual coalisão política conservadora, com mudanças no setor público. O autor ressalta, além disso, que o neoliberalismo trabalha com instituições do setor público e que o Estado é um importante regulador e criador de mercados. Wood (2014) também trata do importante papel do Estado para o capital neste período particular do capitalismo, de financeirização e globalização: “O capital global ainda (na verdade, mais do que nunca) exige uma ordem política, social e legal rigidamente regulada e previsível.” (WOOD, 2014, p. 11). Alguns autores apontam que o estado nacional está em declínio, no entanto, para a autora o “[...] Estado é hoje mais essencial do que nunca para o capital mesmo – ou especialmente – em sua forma global. A forma política da globalização não é um estado global, mas um sistema global de Estados múltiplos.” (WOOD, 2014, p. 18). A autora ainda argumenta que [...] o capitalismo global é o que é não somente por ser global, mas acima de tudo por ser capitalista. Os problemas associados à globalização [...] – não existem simplesmente porque a economia é global, ou porque as empresas globais são incomparavelmente cruéis, nem mesmo por serem excepcionalmente poderosas [...] a globalização é o resultado e não a causa. (WOOD, 2014, p. 18).

Wood ressalta que as empresas globais devem seguir as leis de mercado para sobreviver, e que nem mesmo a mais benigna ou responsável consegue fugir à compulsão do capital; assim,

53 o problema não é uma ou outra empresa ou agência internacional, mas o sistema capitalista em si (WOOD, 2014). A autora traz importante discussão acerca da importância histórica da força extraeconômica no capitalismo “[...] o que torna a dominação de classe, ou o imperialismo, especificamente capitalista, é a preponderância da coerção econômica, que se distingue da coerção ‘extra-econômica’ – política, militar ou judicial – direta.” (WOOD, 2014, p. 17). Ela entende que, neste período particular, de financeirização do capital e globalização econômica: [...] a força extraeconômica é claramente essencial para a manutenção da coerção econômica em si. (opera de forma mais indireta via mercado, mais difícil de ver pois não se dá de forma coercitiva, democracia, voto...) [...] Especialmente nas democracias liberais, com o sufrágio universal e as liberdades civis moderadamente bem estabelecidos, a polícia não é empregada pelo capital, mas representa um Estado que, em princípio, pertence a todos os cidadãos. (WOOD, 2014, p. 17).

A autora aponta que, para as potências imperiais, “[...] os Estados locais mostraram ser uma correia transmissora muito mais útil para os imperativos capitalistas do que os antigos agentes coloniais e colonos que originalmente levavam o mercado capitalista pelo mundo afora”. (WOOD, 2014, p. 29). No entanto, esse processo gera contradições para o capital, já que o capitalismo “[...] não pode viver sem expansão constante”, porém, sempre necessitou do Estado e “[...] o estado-nação continuou sendo um instrumento indispensável – talvez o único instrumento extra-econômico indispensável – do capital global. [...].” (WOOD, 2014, p. 30). Nesse sentido, Wood critica as concepções que apontam para uma “[...] soberania não estatal, que se encontra em toda parte e em parte nenhuma”, pois “[...] essas visões não apenas desprezam algo atual na ordem global, mas também nos deixam impotentes para resistir ao Império do capital.” (WOOD, 2014, p. 18). Nesse aspecto, critica também a concepção de governança global: [...] o capitalismo global vai continuar precisando de uma ordem internacional ajustada aos movimentos do capital; e, de acordo com o futuro possível, essa ordem não será em grande parte oferecida por qualquer espécie de ‘governança global’, mas por um sistema internacional de Estados múltiplos que provavelmente continuará necessitando de um impositor nacional. (WOOD, 2014, p. 13).

A autora salienta ainda que, na sua leitura: Não existe forma concebível de ‘governança global’ capaz de oferecer o tipo de regularidade diária das condições de acumulação de que o capital necessita. [...] A forma política de globalização é, mais uma vez, não um Estado global, mas um

54 sistema global de múltiplos Estados locais, estruturados numa relação complexa de dominação e subordinação. (WOOD, 2014, p. 27-28).

Concordamos com as críticas da autora sobre o conceito de governança global, largamente utilizado por autores que analisam as relações entre o público e o privado. Entendemos que, nesse conceito, as responsabilidades pela execução dos direitos ficam diluídas e ressaltamos a importância do Estado como o principal responsável pelo direito à educação, principalmente em países em que os direitos sociais não estão consolidados e o dever do Estado é ainda mais relevante. Muitos autores têm trazido uma multiplicidade de atores atuando na educação. Nossas pesquisas analisam criticamente o fato de o poder público se retirar da responsabilidade da execução e direção da política educativa. Assim como Wood, destacamos a importância do Estado no processo atual de acumulação do capital, mas também enfatizamos primeiro capítulo deste trabalho que entendemos as políticas sociais como resultados de um processo de correlação de forças, e que lutamos para tornar o Estado mais público, democrático e garantidor de direitos, pois entendemos que as políticas são materialização de direitos e que os direitos materializam a democracia. Todo esse processo ocorre via luta por projetos societários distintos. Nesse contexto, preocupa o fato de a educação passar de uma perspectiva de direito e de responsabilidade e regulação por parte do poder público para um serviço a ser comercializado e regulado internacionalmente. Nesse aspecto, concordamos com a preocupação de Robertson, Mundy, Verger e Menashy (2012) ao pesquisarem o tema: [...] e mais importante para a nossa análise, é o transporte de educação, como em grande parte a nível nacional localizado e regido de serviço público, em uma mercadoria negociável econômico regulado globalmente. Na verdade, o GATS visa a liberalização de todos os tipos de serviços de educação através da modificação (e/ou eliminação) de uma série de regulamentações estaduais, favorecendo o comércio e o investimento estrangeiro no setor da educação. (ROBERTSON; VERGER, 2012, p.104, tradução livre).

Os autores destacam, ainda, que a OMC não interfere apenas no setor privado para regular a educação como um serviço, mas também no setor público24: [...] o GATS é o tratado supranacional que tem sido capaz de exercer maior pressão em favor da transnacionalização da educação. Ela promove a redefinição de territórios e infra-estruturas relacionadas com a produção e consumo de serviços. O sistema de regras do GATS também promove a independência e a convergência entre os 24

Os autores tratam do GATS - General Agreement on Trade in Services, Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços.

55 diferentes sistemas de ensino estaduais, bem como na formação dos marcos regulatórios comuns em várias áreas da política educacional. Isso significa que o papel do Estado e as fronteiras territoriais nacionais diminuíram em algumas áreas uma vez que parte do marco regulatório da educação tornaram-se reterritorializados e fixada em escala global ou supranacional. (ROBERTSON; MUNDY; VERGER; MENASHY, 2012 p. 105, tradução livre).

Outra questão relevante é que mencionamos o Estado como poder público, o que no caso brasileiro ainda está em construção, já que o Estado historicamente teve um caráter privado. Entendemos que, em uma sociedade democrática, as instituições públicas devem atuar em um processo de coletivização das decisões, com espaços de participação que devem ser cada vez mais alargados. O “público”, em oposição ao privado, nesse sentido, está sendo construído em um processo de correlação de forças e está intimamente vinculado com o democrático. Assim, quando analisamos as redefinições do papel do Estado em sua relação com o setor privado, através de nossas pesquisas, questionamos: como atua? financia? controla? se retira? está mais presente? imprime a lógica de mercado através do Estado gerencial? Verificamos, em nossas pesquisas, em relação ao papel do Estado na relação entre o público e o privado – que, no neoliberalismo, seria no sentido de retirar-se da provisão das políticas, através da execução direta ou do financiamento, com a justificativa de racionalizar recursos – que, em muitos casos, o Estado continua financiando os programas, apesar da execução ser privada. No que se refere à direção, observamos, em alguns casos, que o poder público continua sendo o executor, mas a direção e controle passam a ser de instituições privadas, como nos casos do Instituto Ayrton Senna 25 e Instituto Unibanco26. Quanto ao controle, observamos que o Estado, em parte, permanece atuando, principalmente via avaliações, mas também através dos editais de contratação das instituições do Terceiro Setor, que vão executar as políticas educativas. O governo acaba definindo um determinado produto e contrata quem se ajusta a esse perfil, o que também prejudica o processo de democratização. Ao longo dos estudos, diversas questões foram emergindo, tais como: quem são os sujeitos (individuais e coletivos) que atuam no setor privado, como atuam e como se organizam para influenciar em todas as esferas do público, desde o nível internacional, nacional, local até a escola e a sala de aula. Enfim, quem são os sujeitos desse processo e qual é o conteúdo da proposta do privado no público. O próximo capítulo trata destas questões.

25

Sobre a parceria entre Instituto Ayrton Senna e Escolas de Ensino Fundamental, ver Adrião; Peroni (2010).

26

Sobre a parceria entre Instituto Unibanco e Escolas de Ensino Médio, ver Peroni; Caetano (2014).

3

O PROCESSO DE MERCADIFICAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: SUJEITOS E CONTEÚDO DA PROPOSTA DO PRIVADO PARA O PÚBLICO

São várias as formas como o privado tem atuado no setor público. Verificamos na pesquisa o quanto a relação entre o público e o privado é complexa e multifacetada. Entendemos que a mercadificação da educação pública não é uma abstração, mas ocorre via sujeitos e processos. Trata-se de sujeitos individuais e coletivos que estão cada vez mais organizados, em redes do local ao global, com diferentes graus de influência e que falam de diferentes lugares: setor financeiro, organismos internacionais, setor governamental. Algumas instituições têm fins lucrativos e outras não, ou não claramente, mas é importante destacar que entendemos as redes como sujeitos (individuais e coletivos) em relação, com projeto de classe. Robertson (2012), ao tratar da relação entre o público e o privado, denomina esse processo de PPP (parcerias público-privadas), que segundo a autora é [...] um guarda-chuva semântico que pode cobrir fenômenos bastante heterogêneos, que vão desde a prestação de serviços privados, acordos de serviços com base em contrato e tipos menos formais de colaboração e parceria entre o setor privado, organizações filantrópicas privadas e governos, com base na confiança e no compromisso conjunto para o bem comum. (ROBERTSON, 2012, p. 5).

Em outro estudo, Robertson e Verger (2012) destacam que as PPPs são mais do que apenas ferramentas técnicas, envolvem projetos societários, corroborando nossa tese: A globalização das PPPs, como um instrumento de gestão de setores e assuntos educacionais, precisa ser cuidadosamente examinada, ressaltando o cuidado em não entendê-las como ferramentas simplesmente técnicas. Isto elas não são. PPPEs são, fundamentalmente, relações sociais e econômicas (Weihe, 2010), envolvem questões de poder, autoridade, legitimidade, responsabilidade e igualdade, e não apenas mecanismos de opção com base no mercado e em ganhos de eficiência (Jayasuriya, 2008). (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1150).

Robertson e Verger (2012) apresentam um histórico da relação público-privada, iniciando na década de 1970, com a crise do projeto de desenvolvimento capitalista do pósguerra, em que ocorria um casamento entre liberalismo econômico e socialdemocracia. Nos anos 1980 ocorreu a introdução da economia de livre mercado como o modo dominante de organização da vida política e social. E, a partir do Consenso de Washington, as instituições do Estado foram reestruturadas com três objetivos principais: fazer com que o Estado servisse aos interesses dos negócios; remodelar suas operações internas sob a linha dos negócios e reduzir a exposição do governo à pressão política do eleitorado, o que passou a ser

57 chamado de Nova Gestão Pública (NGP). A NGP tem como principais características: metas de desempenho, transferência do gerenciamento para os gestores, especificação de padrões e indicadores, alocação regida por resultados, auditoria e terceirização de uma série de atividades que haviam sido uma parte central do setor público. As mudanças foram implementadas usando o argumento do “interesse nacional”, central para a competitividade econômica global, como um meio de superar a pobreza e a desaceleração econômica, e como base para a construção de economias baseadas no conhecimento (ROBERTSON; VERGER, 2012). Nos anos 1990, Banco Mundial (BM), Fundo Monetário Internacional (FMI), Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e United States Agency for International Development (USAID), desempenharam papéis cada vez mais instrumentais no avanço das ideias do livre mercado como base para o desenvolvimento. Nos países ricos, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) desenvolveu semelhante agenda neoliberal de descentralização, autonomia institucional em oposição a formas burocráticas de organização e introdução da escolha dos pais. No entanto, nos países pobres, sob recomendação do BM, FMI e USAID, a agenda proposta foi a descentralização, a privatização e a cobrança de taxas, o que o que culminou em uma crescente polarização social e aumento nos níveis de desigualdade (ROBERTSON; VERGER, 2012). Nesse contexto, as “parcerias” surgiram no início de 1990, como um promissor mecanismo para minimizar os danos causados por formas anteriores de privatização, ainda que sem abandoná-las. As parcerias permitiram múltiplos enquadramentos, interesses e objetivos. No âmbito europeu, as parcerias foram um corretivo para a presença demasiada do Estado (keynesianismo), por um lado, e a ausência dele, em processos de privatização, por outro. Ao final dos anos de 1990, o sistema das Nações Unidas focou nas parcerias, argumentando que, se os países buscavam alcançar as Metas de Desenvolvimento do Milênio, seriam obrigados a avançar na direção de um novo paradigma de desenvolvimento. As parcerias também foram destacadas nos dez princípios do Pacto Global das Nações Unidas (1999), cuja ênfase é o mercado e o empreendedorismo (ROBERTSON; VERGER, 2012). A conclusão é a de que existe uma indústria especializada que surgiu em torno das PPPEs, que é composta por diferentes sujeitos com orientação pró-mercado: Essa indústria, que de forma crescente exporta globalmente sua expertise, inclui um número crescente de atores privados, de fundações, de empresas especializadas em PPPEs, de firmas globais e locais de consultorias, de bancos, think tanks, de sites especializados, equipes de acompanhamento da mídia e escritórios de advocacia, que

58 cada vez mais atuam como fontes de autoridade com orientação pró-mercado. (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 12).

Uczak (2014) realizou um estudo sobre o PREAL, e abordou o quanto os Organismos Internacionais influenciaram as reformas educativas, na América Latina: O estudo das Declarações e dos Planos de Ação das Cúpulas das Américas mostra como se constroem as agendas educacionais e indicam as medidas necessárias para materializar as propostas. O PREAL foi criado a partir das Cúpulas com objetivo de formar o consenso em torno das reformas imperativas para defesa da atual ordem econômica vigente. Sua organização em forma de rede agrega lideranças da economia, da política e da mídia, representantes de vários países, protagonistas das reformas voltadas para o mercado. (UCZAK, 2014, p. 4).

A autora apresenta uma ‘linha de tempo’ dos programas no período 1981-2010, para situar o PREAL entre outros programas que influenciaram as políticas educativas na América Latina: Quadro 2 – Linha de tempo – 1981-2010 81

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PPE – 1981-2001 EPT – Jomtien – 1990 PROMEDLAC IV – Quito – 1991 PROMEDLAC V – Santiago – 1993 Fórum Mundial de Educação de Dakar – 2000-2015 ODM – 2000-2015 PRELAC – 2002 – 2017 PREAL – 1995 Fonte: Uczak (2014, p. 83).

A autora aponta que os documentos seguem um padrão: Observamos que, em geral, as propostas partem do diagnóstico alarmante de um grave quadro de crise econômica que é evidenciado por dados quantitativos suficientes para convencer a todos da necessidade de intervenção coletiva dos governos, da sociedade civil, dos empresários, de organizações não governamentais e de todos os interessados no tema educação, fomentando a ideia de parcerias entre os setores público e privado. As reformas recomendadas ao mesmo tempo que propõem a descentralização da educação, centralizam o controle e fiscalização nos órgãos estatais. Caracterizam-se pelo cunho gerencialista e trazem no seu interior a necessidade da avaliação educacional para acompanhamento e monitoria das metas estabelecidas, pois consideram que os resultados numéricos da avaliação é que indicam a qualidade,

59 bandeira maior do conjunto de medidas desde a década de 1990. (UCZAK, 2014, p. 83).

Verificamos que os documentos desses programas sempre partem de problemas de qualidade do sistema público, diagnóstico da Public Choice, conforme analisamos no capítulo 2, e que as recomendações são sempre as mesmas, em todos os níveis e escolas de abrangência. Robertson, Mundy, Verger e Menashy (2012) apresentam, ainda, a Organização Mundial do Comércio (OMC) como um sujeito importante nesse processo de privatização do público: Em 1995, a Organização Centro Mundial do Comércio (OMC) foi lançada, juntandose a um conjunto de instituições internacionais com um mandato para governar por mais tempo os assuntos económicos, sociais e políticos a nível mundial. Para os observadores de educação, no entanto, o elemento mais notável desta iniciativa foi a inclusão de todos os níveis de educação, desde os primeiros anos até o ensino superior. (ROBERTSON; MUNDY; VERGER; MENASHY, 2012, p. 104, tradução livre).

Depreendemos que essa situação envolve um processo de mercantilização da educação sem precedentes na história. Rikowski (2014) nos ajuda a entender tal processo, quando apresenta os conceitos de mercantilização, comoditização e capitalização. E, cita Marginson (1997)27, que apresenta a ‘mercantilização’ como uma síntese das tendências dos mercados na educação, composta dos processos sociais e econômicos que fomentam para o desenvolvimento, a intensificação e a força dos mercados na educação e outras áreas da vida social. Ainda citando Marginson (1997), Rikowski (2014, p. 28) apresenta cinco características necessárias para o estabelecimento de um mercado educacional totalmente desenvolvido: 1. Mercados envolvem a produção de commodities (que são compradas e vendidas); 2. Há um campo de produção definido (por exemplo, escolaridade, formação ou ensino superior); 3. Há uma troca monetária entre produtor e consumidor de commodities; 4. Existem relações de concorrência entre os produtores; 5. Há mercado de subjetividades – as atitudes e comportamentos adequados ao mercado de produção, consumo e troca.

Verificamos que o processo de mercantilização envolve tanto a educação como a mercadoria, como destacamos no estudo de Robertson e Verger sobre a OMC, citado acima, e nos estudos de Adrião (2009; 2014) Adrião e Garcia (2014), quanto às atitudes e

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Marginson (1997) Mercados em Educação, p. 5-6, ênfase no original.

60 comportamentos vinculados ao mercado de produção, que temos chamado na nossa pesquisa de conteúdo da educação, e que enfocaremos nos capítulos 3 a 5 da tese. Christian Laval (2004) também apresenta várias formas de mercantilização na educação: – a que destina a escola a fornecer mão de obra adaptada às necessidades da economia; – a intervenção mais direta das empresas na pedagogia, conteúdos escolares, validação das grades curriculares e diplomas, que pretende instituir nas escolas a lógica de mercado; – empresas adotando escolas e interferindo nos seu programa educativo; – publicidade, através do financiamento de artigos escolares com o logo da empresa; – parcerias, como a compra e venda de grades curriculares. Laval (2004) observa, ainda, que esses movimentos geram dois tipos de fenômenos: a escola como mercado (publicidade ou venda de produtos) e a escola como produtora de mercadorias específicas (suportes e conteúdos de ensino). Mais do que privatizar escolas, importa ao mercado interferir na política educacional. Principalmente nos casos dos Institutos Ayrton Senna e Unibanco, verificamos o quanto o conteúdo da educação é monitorado, com metas estabelecidas pelos Institutos, o que Laval chama de “mercadorias específicas”. Concordamos com o autor, quando afirma que: “Embora a escola seja essa instituição especializada na transmissão de saberes, ela participa da educação ‘fato social total’ que engaja todas as dimensões humanas.” (LAVAL, 2004, p. 210). Licínio Lima (2012), ao abordar o tema do mercado na educação, no livro Aprender para ganhar, conhecer para competir, afirma que “[...] a educação, enquanto direito humano, comporta limites normativos, éticos, políticos e morais, que são incompatíveis com fenômenos de adestramento, endoutrinamento ou condicionamento dos seres humanos.” (LIMA, 2012, p. 29). Em outro trabalho, ao conceituar a privatização, Licínio Lima (2013, p. 178-179) expõe que ela pode significar

[...] muitas e diferentes coisas, desde a erosão das responsabilidades estatais em benefício de privados, desregulação, concessão a privados, parcerias, construção de redes nacionais de ensino, já não públicas, mas híbridas ou baseadas em parcerias público-privadas, escolas públicas com estatutos de fundação e regidas pelo direito privado, escolas públicas cuja gestão foi concessionada a privados, financiamento através da captação de alunos e respectivos ‘cheques-ensino’ pagos pelo Estado, interferência crescente no currículo, na prática pedagógica, na avaliação, etc., por

61 parte de instituições privadas, empresas, fundações, organizações nãogovernamentais diversas, ou do chamado ‘terceiro setor’. (LIMA, 2013, p. 178-179).

Almerindo Afonso (2013), no texto Mudanças no Estado-avaliador: comparativismo internacional e teoria da modernização revisitada, também traz importante debate acerca do Estado como avaliador e apresenta três fases desse processo, Estado-avaliador (1ª fase, anos de 1980/1990), Estado-avaliador (2ª fase, final dos anos de 1990 e atuais anos 2000...) e PósEstado-avaliador (antevisão com base em alguns indicadores), sendo que a terceira fase está vinculada a processos de privatização: A terceira fase, que designei de pós-Estado-avaliador, quer justamente acentuar a ideia de que, para muito além das agendas nacionais e dos efeitos externos da globalização sobre os diferentes países, o que está em curso é uma estratégia de exacerbação e diversificação de lógicas neoliberais de transnacionalização da educação, com ênfase na privatização, mercadorização e mercantilização (SANTOS, 2004 apud AFONSO, 2013, p. 280).

Fátima Antunes (2015) alerta para o importante papel do Estado no processo de privatização da educação em Portugal: [...] a privatização da educação é, em Portugal como em outros países e contextos, em boa medida uma obra do Estado e uma política pública (Lima, 1996). Por outro lado, trata-se de um processo polifacetado e prolongado (privatizações), cujas manifestações e debate têm já várias décadas podendo, desde os anos 80, observar-se ritmos e desenvolvimentos diferenciados, em Portugal como em outras latitudes [...] (ANTUNES, 2015, p. 132).

A autora destaca o processo de contratualização, como forma de privatização do público em Portugal. É o que chamamos de execução, o privado assumindo a oferta, com financiamento público: [...] o Estado criou ativamente o espaço privado de provisão, apelando à contratualização da resposta educativa privada com financiamento totalmente público, segundo uma modalidade de parceria público-privado, constituindo uma fórmula de quase-mercado (com os provedores privados a concorrer por contratos de financiamento público) (cf. Le Grand & Bartlett, 1993). (ANTUNES, 2015, p. 131).

Emília Vilarinho (2015, p. 146) aponta que esse processo ocorre via terceiro setor: Em Portugal, tem vindo a ganhar visibilidade crescente a provisão social e educativa privada (nas áreas da infância, terceira idade, saúde), com particular relevo para ‘as formas instituicionalizadas no âmbito do sector designado por ‘solidariedade social’ ou, mais genericamente, por terceiro sector. Apesar da heterogeneidade organizativa, o conjunto das iniciativas designadas de solidariedade é reconhecido como setor de

62 utilidade pública, não estatal e não lucrativo e supostamente avesso aos modos de organização burocrática e do mercado’ (Hespanha et al. 2000: 119). Estas iniciativas são apresentadas como alternativa, mais económica e flexível, da provisão estatal.

A autora apresenta dados sobre como este processo vem ocorrendo, envolvendo ação direta ou apoio do Estado: Três desses desenvolvimentos merecem particular destaque: por um lado, há entidades filantrópicas que adquiriram certo protagonismo mediático em torno quer da sua ação no terreno, quer da sua estratégia de influência na política educativa (de que é ilustrativo o caso da associação EPIS-Empresários pela Inclusão Social); por outro lado, a celebração de um contrato, pelo Estado português, envolvendo o coração do sistema público e as funções centrais de avaliação e certificação no âmbito da educação básica universal, com a aquisição, a uma agência global da Universidade de Cambridge, de exames obrigatórios de inglês e certificação, dirigidos a todos os estudantes do 9º ano; por último, a introdução legal do cheque-ensino. A importância de qualquer destes processos reside na sua novidade no país, no facto de se encontrarem em franco desenvolvimento e de revelarem amplas implicações, em particular o último, pelo seu potencial de mudança da configuração e do sentido do direito à educação e do sistema público que constitucionalmente o realiza. (VILARINHO, 2015, p. 146).

A autora destaca como esse processo tem se dado na educação infantil: A Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar iniciou um novo ciclo de reestruturação deste nível de educação, num quadro de uma conjuntura nacional e transnacional em que são visíveis as crescentes influências dos processos de globalização e transnacionalização, com repercussões nas políticas educativas, e onde as reformas e orientações de índole neoliberal e de caris próximo da Terceira Via revalorizaram (em sentidos vários) os apelos e as medidas direcionadas para uma maior participação do mercado, da sociedade civil e do terceiro sector nas políticas públicas. (VILARINHO, 2015, p. 146).

E analisa as consequências da oferta da educação infantil via parcerias: A forma como a CAF foi implementada no concelho estudado, mobilizando parcerias com a sociedade civil, ampliou o hibridismo desta medida, uma vez que à reconciliação dos interesses e direitos das crianças e das famílias (que legitimaram esta inovação política), a ela juntaram os interesses e lógicas das diferentes entidades parceiras. Verificamos problemas de relacionamento institucional que permitiram interpretações diferentes da medida, com especial impacto nas questões da qualidade, quer de natureza contextual, quer processual, e na promoção da igualdade de oportunidades de acesso das crianças. A ausência de mecanismos de acompanhamento, no que concerne à atribuição das comparticipações familiares, introduz um efeito altamente perverso no sistema. Estas perversidades do sistema exigem uma atenção especial dos líderes políticos. No jardim de infância público, através das parcerias estabelecidas, verificam-se lógicas de quase-mercado, onde,

63 entre outros aspetos, a disputa dos ‘clientes’ começa a ser uma realidade. (VILARINHO, 2015, p. 173).

Em entrevista, Glenn Rikowski (2015) ao tratar do tema da privatização da educação pública, apresenta uma importante análise de questões estruturais do papel da educação no sistema capitalista. Para o autor, há dois tipos de mercadorias, de acordo com Marx: Classe Geral de commodities e a mercadoria força de trabalho. E o autor ainda questiona: o que faz com que uma escola seja uma escola capitalista? O que é a educação capitalista? Aprendizagem capitalista? Ele mesmo responde no sentido de que precisa relacionar essas perguntas à força de trabalho, por um lado e, por outro lado, à classe geral de commodities. As escolas capitalistas se caracterizam por apresentar os diferentes tipos de mercadorias (classe geral e força de trabalho). Para o autor, as escolas são uma forma institucional de produção social da força de trabalho. Existem muitas formas institucionais, há creche, ensino primário, pré-escola etc. Para Rikowski (2015), a força de trabalho é uma mercadoria que nunca é completamente produzida e as escolas são um elemento da produção social da força de trabalho. Quanto à classe geral de mercadorias, o autor ressalta que elas podem ser materiais e imateriais e é importante determinar, com estudos empíricos, o que está sendo mercadorizado: [...] por exemplo, em muitas escolas no país o Fornecimento do Almoço e lanches e limpeza escola por setores privados são mercantilizados; mercantilizada. Nos últimos dez, 15 anos está apenas começando o mesmo ensino está se tornando parte da mercantilização. Portanto, há algumas escolas neste país que são administradas por empresas para gerar lucro, que a educação é mercantilizada. É a educação transformada em mercadoria. A Noção de educação capitalista é um pouco mais difícil... (RIKOWSKI, 2015, entrevista).

Para o autor, a aprendizagem capitalista, em termos de força de trabalho, não ocorre apenas na educação, mas na família, mídia, religião, um vasto leque de instituições, organizações que impactam na produção da força de trabalho. Para ele: Nas sociedades capitalistas, cada vez mais existe algo chamando para a produção social da força de trabalho, o que é parte da luta de classes. [...] O que a produção social da força de trabalho está envolvida é com a transformação da força de trabalho

64 em capital humano, esta é a luta, não só fora, mas dentro de nós mesmos [...] (RIKOWSKI, 2015, entrevista).

Rikowski aponta, inclusive, que existem processos de comodificação da educação, e que é preciso especificar o que está sendo mercadorizado. Ao abordar a entrevista de Rikowski sobre a relação entre o público e o privado na educação, foi possível retomar questões que enfatizamos no primeiro capítulo, como a importância do debate acerca de classe social e luta de classes para entender a relação entre o público e o privado e, também, a questão do particular e a sua relação com o universal na análise do objeto, já que o autor trata de questões estruturais do papel da escola na sociedade capitalista e trata também da necessidade de estudos empíricos para a análise do processo atual de mercantilização. Ratificamos tais afirmações e tratamos do debate teórico, acerca do tema, tanto em nível estrutural da sociedade capitalista quanto em relação a este período particular do capitalismo, tendo, aliás, uma trajetória de pesquisas empíricas sobre o tema. Apresentamos um pouco mais da interessante visão do autor em um texto no qual ele aborda a crise da educação e a crise na educação: [...] é preciso pensar em crise em relação à educação e a economia de uma maneira nova: essas crises não são essencialmente de natureza ‘educacional’ ou ‘econômica’. Um anti - (em vez de pós) perspectiva estruturalista enraizada na luta de classes é um caminho mais avançado a seguir, e nem fundamentalismo (crises na educação) nem idealismo de crise educacional (as crises da educação). (RIKOWSKI, 2014, p. 3).

E o autor adverte para os reducionismos de uma visão economicista da crise: Um foco sobre o fundamentalismo da crise (crises na educação) traz consigo todas as questões familiares de determinismo e reducionismo, funcionalismo, ‘imperialismo econômico’, uma política que tem uma tendência a colocar o trabalho de professores e suas lutas, bem como o ativismo estudantil, nos bancos de trás da luta de classes. (RIKOWSKI, 2014, p. 4)

Sua crítica pontua que a visão de crise na educação é uma consequência da crise econômica “No cerne desta ideia é que a crise educacional se coloca fora do sistema de ensino; crise da educação flui e é uma consequência da economia e da crise econômica.” (RIKOWSKI, 2014, p. 4). Para o autor, a luta de classes deve estar no centro das análises: “Minha alternativa seria colocar a luta de classes no cerne da análise da crise da educação. A crise na educação / crise da educação distinção ainda seria mantida, mas mudaria a cor da sua pele.” (RIKOWSKI,

65 2014, p. 43). Retomamos assim a abordagem teórico-metodológica empreendida no primeiro capítulo, de relação entre o público e o privado como classes em relação, e o entendimento do público sempre em relação ao privado, e não isoladamente, ou como uma abstração. Nos próximos itens, apresentaremos os sujeitos e o conteúdo da proposta, dialogando com autores que pesquisam mais diretamente a relação entre o público e o privado, ou que tratam de temas que nos ajudam a entender sobre quem são os sujeitos que decidem sobre o conhecimento e, afinal, que conhecimento é proposto pelo setor privado mercantil para a educação, o que chamamos de conteúdo da proposta.

3.1

OS SUJEITOS Entendemos que as redes se configuram como um importante sujeito28 na definição das

políticas educacionais internacionalmente, principalmente as redes globais. E, que o setor privado mercantil, organizado ou não em redes, não é uma abstração; é formado e operado por sujeitos individuais e coletivos em um projeto de classe, sendo, inclusive parte de uma ofensiva histórica do capital e com especificidades neste período particular do capitalismo. Para Ball (2012), a análise de rede (network analysis), ou rede de governança (network governance) pode ser entendida como um método, uma técnica analítica para investigar estruturas de comunidades de políticas e suas relações sociais; e, também, para representar um conjunto de mudanças reais na forma de governança, tanto nacionalmente quanto internacionalmente. O autor destaca que a rede de governança envolve perda de poder em algumas partes do Estado e ganho em outras. Ball ressalta que, para alguns autores, essa rede constitui uma forma mais democrática de governança (SORENSEN; TORFING, 2007), enquanto, para outros (MARCH; OLSEN, 1989 e SKELCHER, 1998), cria um déficit democrático, pois torna os

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Sujeito individual ou coletivo na concepção de Thompson (1981), de que a história é construída por relações entre sujeitos e não por estruturas, conforme apresentado no primeiro capítulo.

66 processos mais opacos e dispersos, não apenas dilui os limites entre o público e o privado, mas expõe o processo de formulação política como jogo de poder particularista. Ball (2012) adverte para os problemas da análise de redes como forma de descrever as relações de governança. Para ele, há dificuldade em mapear empiricamente as estruturas das relações de poder e questiona: Como medir ao ter acesso, ou calcular recursos diferenciais e capacidades incorporadas nas assimetrias das relações de poder? Como relatar o uso do poder e diferentes interesses e objetos dos participantes? [...]. Como captar mudanças na participação, capacidade de assimetrias ao longo dos tempos? O que as setas significam? (BALL, 2012, p. 8, tradução livre).

Sublinha, ainda que os diagramas são adequados para representar as redes de relações, questionando: “[...] qual é a força dessas relações? Qual é a direção do fluxo? Como as relações e as forças mudam ao longo do tempo?” (BALL, 2012, p. 8, tradução livre). Em outro trabalho, Ball (2013) ressalta que novas vozes são representadas no processo político, “[...] e novos nós de poder e influência são construídos e fortalecidos” (BALL, 2013, p. 177), obscurecendo a separação entre o público, o privado e o terceiro setor que “[...] substitui ou combina burocracia e estruturas e reações administrativas com um sistema de organização repleto de superposições, multiplicidade, ascendência mista e/ou padrões de relação divergentes, mas coexistentes.” (BALL, 2013, p. 178). Destaca, além disso, que alguns atores históricos são potencialmente excluídos, como os sindicatos. Ball ressalta, ainda, que não se trata de um esvaziamento do Estado, mas uma nova forma de Estado. E menciona e que “[...] há um aumento concomitante na falta de transparência da elaboração de políticas.” (BALL, 2013, p. 181). É uma nova forma de “[...] governança estratégica, que é baseada em relações de rede dentro e por meio de novas comunidades políticas, destinadas a gerar nova capacidade de governar e aumentar a legitimidade.” (BALL, 2013, p. 180). Tal condição faz com que as fronteiras entre Estado, economia e sociedade civil sejam desfocadas. O autor destaca que há um hibridismo entre burocracia, mercado e rede. Robertson e Verger (2012) ressaltam a multiplicidade de atores que atuam em todos os níveis da educação e que são desiguais no poder de atuação: Ao longo das últimas duas décadas, mudanças significativas na governança dos sistemas de ensino têm sido postas em prática como instituições internacionais, governos, empresas, consultores filantrópicos e promoveram acordos de parceria mais híbridos, envolvendo novas combinações de atores estatais e não estatais envolvidos em um leque de atividades no sector da educação. Estas novas formas de governança da educação, muitas vezes operam em escalas, através de interações entre regional e

67 nacional, governos locais e organizações intergovernamentais, e entre estes e as empresas nacional ‘parcerias e redes de regulamentação tendem a reduzir a democracia à negociação no seio da sociedade civil entre atores extremamente desiguais [...]’ (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1138).

Ball e Olmedo (2013) destacam o papel da filantropia, historicamente presente na relação entre o público e o privado, nas políticas sociais: “O que há de ‘novo’ na ‘nova filantropia’ é a relação direta entre o ‘doar’ e os ‘resultados’ e o envolvimento direto dos doadores nas ações filantrópicas e nas comunidades de políticas. [...]” (BALL; OLMEDO, 2013, p. 33). Os autores apontam que as mudanças na filantropia tradicional ocorreram em três etapas “[...] da doação paliativa (ou seja, a filantropia tradicional ou a ‘filantropia 1.0’) à filantropia para o desenvolvimento (‘filantropia 2.0’), e, finalmente, à doação ‘rentável’, constituindo aquilo que é chamado de ‘filantropia 3.0’.” (BALL; OLMEDO, 2013, p. 34). Ball e Olmedo (2013) acrescentam que essa terceira etapa da filantropia ocorre através das redes: [...] para entender o trabalho das ‘novas’ organizações filantrópicas e seus ‘parceiros’, precisamos considerá-los não sob uma perspectiva individual, como atores isolados, mas sim como nós interconectados que operam de acordo com lógicas de rede e configuram suas agendas e ligações de formas mutantes e fluídas. (BALL; OLMEDO, 2013, p. 40).

Ball e Junemann (2012) pesquisam como a governança tem sido realizada e por quem. Os autores apresentam a rede como um método para traçar e representar as relações sociais no campo da política e como ferramenta analítica. O conceito redes de políticas é um termo analítico e descritivo que se refere a uma forma de governança que entrelaça mercados interrelacionados e hierarquias. Os autores ressaltam que as fronteiras entre filantropia, negócios e setor público foram movidas e que as mudanças são endógenas e exógenas (dentro e fora do setor público). Tais mudanças ocorrem através da disseminação de valores e práticas de empreendimento, empreendedorismo e transposição do discurso internacional do gerencialismo (nova gestão pública). Nesse contexto, novos valores, modos de ação e formas de autoridade moral crescem, enquanto outras são diminuídas ou derivadas. Observa-se que as diminuídas e derivadas, não por acaso, são os sindicatos, movimentos sociais e instituições vinculadas às classes populares. Os autores afirmam que é importante verificar o que é novo na nova filantropia e salientam a relação com os resultados (giving to outcomes). Um empresário entrevistado pelos

68 autores deixa claro que, se vai dar dinheiro, quer dar para algo que apresente resultados mais efetivos. Outro aspecto da nova filantropia, vinculado aos resultados, é que os financiadores querem ver e mensurar os impactos. Os autores discorrem ainda sobre o venture capitalism, capitalismo de risco, isto é, eles querem ver o retorno, mas aceitam riscos. E, assim, os filantropistas tomam as decisões de onde investir o seu dinheiro, influenciando ou definindo as políticas sociais em geral e, em particular, as educacionais. Os autores chamam a atenção ainda para o fato de a educação ser apenas uma das dimensões do interesse filantrópico. Foi o que se constatou nas redes dos Institutos Unibanco e Ayrton Senna, que serão apresentados no capítulo 5. Conforme Ball e Junemann (2012), o conceito de policy network (redes de políticas) é um termo analítico e descritivo que se refere a uma forma de governança que entrelaça mercados inter-relacionados e hierarquias. Algumas partes do Estado têm menos controle e outras têm mais do que antes (BALL; JUNEMANN, 2012). O Estado pode mudar de parceiros facilmente, uma vez que programas e iniciativas podem ser encerrados, contratos rescindidos e agências fechadas. A filantropia estratégica busca projetos inovadores. Os autores ressaltam que, se o projeto prova a sua eficácia, é apresentado aos governos para ampliá-lo e financiá-lo. Os empresários têm investido em projetos-piloto (BALL; JUNEMANN, 2012). Foi o que verificamos com o Instituto Unibanco: o Programa Jovem de Futuro passou por uma fase piloto, de validação da tecnologia, até se transformar em política pública. Os autores destacam, ainda, os interesses indiretos com a filantropia, como o status e marketing, que chamam de capital simbólico, através de festas, jantares, colunas sociais, prêmios, associando a filantropia à celebridade e ao interesse de acesso a outros campos e redes. Apresentam o exemplo da revista Time, que revelou que a “generosidade é moda de novo” e apresentou uma lista dos filantropos com faixa de arrecadação. Ball e Junemann (2012) acentuam também que a localização na rede é chave para o capital social. As redes são feitas de capital social que pode ser desenvolvido, investido e acumulado e se notabilizam por apresentar um intenso fluxo de ideias e pessoas entre o público e o privado. Os participantes são multifacetados: atores individuais podem ser envolvidos nas

69 redes em uma variedade de modos (significados e tipos de influência). Foi o que se constatou na pesquisa, nas redes do Instituto Unibanco e do Movimento Todos pela Educação. Questionamos as consequências para a democratização da educação, em particular, e dos direitos sociais, em geral, já que as redes não possuem representatividade social e nem compromissos com a justiça social ou com a materialização de direitos. Rhodes (1996), ao analisar o conceito de governança, traz interessante discussão sobre decisão e execução, na participação do privado no público. Para o autor, a Nova Gestão Pública (New Public Management – NPM) é relevante para discussão da governança. Steering (direção, decisão) é central para a gestão pública e, para o autor, é sinônimo de governança. Rhodes assinala que Osborn e Gaebler, no livro Reinventando o Governo, que foi um tipo de “bíblia” da NGP, distinguem: decisões políticas (steering) e execução dos serviços (rowing). A proposta NPM é o governo empreendedor com princípios baseados na lógica de mercado: competição, cliente e resultado. Menos governo (less rowing) na execução de políticas e mais governança (steering) nas decisões políticas. Rhodes (1996) salienta que governança significa uma mudança no significado de governo ou mudança na condição de determinar as regras ou novos métodos pelos quais a sociedade é governada. No caso da Inglaterra, ressalta que as redes se desenvolveram em um contexto de esvaziamento do Estado, da nova gestão pública e da gestão intergovernamental. O autor define governança como redes interorganizacionais auto-organizadas. As redes são apresentadas como complemento de mercado e de governo na alocação de recursos e no exercício de controle e coordenação. Para o autor, são uma mudança na governabilidade, porque tornam-se autônomas e resistem à orientação central. O autor destaca que o termo governança é popular, mas impreciso, e apresenta seis usos para o conceito: 1. Estado mínimo; 2. governança corporativa; 3. Nova Gestão Pública; 4. boa governança; 5. sistema sociocibernético; 6. redes auto-organizadas. E descreve cada um: 1. Governança como Estado mínimo – uso do mercado ou quase mercado na distribuição de serviços públicos. É “aceitável” em face dos cortes de gastos e da tendência de menos governo. 2. Governança corporativa – aplicada igualmente para organizações do setor público ou privado. Clara alocação de regras e responsabilidades no partilhamento de papéis (ecoou na

70 discussão da accountability na nova gestão pública). Influência do setor privado de mercado no setor público. 3. Governança como nova Gestão Pública – New Public Management (NPM) significa: 3.1 Gerencialismo – introdução de métodos do setor privado no setor público: gerenciamento da prática profissional, standards (padrões) e medições da performance, gestão por resultados, preço e proximidade com o cliente. 3.2 Nova economia institucional – introdução da estrutura de incentivos (como competição de mercado) na provisão do serviço público – quase mercado e escolha do cliente. 4. Boa Governança – o Banco Mundial (BM) realiza empréstimos vinculados à boa governança, o que envolve um eficiente serviço público: sistema judicial independente, quadro jurídico para cumprir os contratos, administração responsável dos fundos públicos, auditor público independente, respeito às leis e aos direitos humanos em todos os níveis de governo, imprensa livre. No entanto, a eficiência nos serviços públicos ou a boa governança também encorajam a competição, a privatização de empresas públicas e a descentralização administrativa, aumentando o uso de organizações não-governamentais. Para o autor, a boa governança está relacionada à nova gestão pública e à democracia liberal. 5. Governança como sistema sociocibernético – resultado de padrão ou estrutura que emerge do sistema social. É a interação, a intervenção e o esforço de vários atores. O Paltern (padrão, modelo) não pode ser reduzido a um ator ou grupo em particular, “borrando” as fronteiras entre o público e o privado. 6. Governança como redes auto-organizadas – descreve vários atores independentes envolvidos na execução de serviços (delivering services). Redes se constituem de organizações que necessitam de recursos externos (dinheiro, informação, expertise) para atingir seus objetivos, maximizar sua influência sobre resultados e evitar tornar-se dependente de outros intervenientes do jogo. Para o autor, a governança é sobre gestão de redes, que não é específica do setor público. Redes são formas generalizadas de coordenação social e gestão interorganizacional, são auto-organizadas, autônomas e autogovernáveis (RHODES, 1996). Para Rhodes, as principais características da governança são: interdependência entre organizações, mudança nas fronteiras entre público, privado e setores voluntários; contínua interação entre os membros das redes, causada pela necessidade de troca de recursos e de negociar propósitos partilhados; interações como jogo, baseadas na confiança e reguladas por regras do jogo negociadas e de acordo com os participantes; significativo grau de autonomia perante o Estado, já que as redes não prestam contas ao Estado, são auto-organizadas. Nesse

71 caso, questiona-se: como ocorre o controle social? O autor aponta as redes como uma estrutura de governo entre mercado e Estado, o que remonta ao debate desta tese sobre o público não estatal, ou terceiro setor. Para Rhodes (1996), as redes não são mecanismos de governo ou reduzidas a um novo estilo de gestão do setor público, mas uma mudança para o accountability democrático. A governança como auto-organização em redes é uma mudança para a governabilidade, pois estas são autônomas e resistem à orientação central. Discute-se a concepção de democracia do autor, já que as redes não têm representatividade social. É importante destacar as redes são entendidas como sujeitos (individuais e coletivos) em relação29, com projeto de classe. Ball (2013, p. 181) afirma que os membros das redes incorporam e disseminam “[...] narrativas e soluções empresariais e empreendedoras para problemas sociais e educacionais”, e é o que vamos analisar adiante neste capítulo, como o privado influenciando o conteúdo da educação.

3.2

O MERCADO NA DEFINIÇÃO DO CONTEÚDO DA EDUCAÇÃO

O processo de mercantilização ocorre também com o privado definindo o conteúdo da educação. Observamos em parte o poder público assumindo a lógica do privado na administração pública, através da gestão gerencial e, também, quando abre mão de decidir o conteúdo da educação, repassando a direção para instituições privadas. Nesse caso, a propriedade permanece pública, mas a direção do conteúdo das políticas educativas é repassada para o setor privado. As instituições públicas, se democráticas, são permeáveis à correlação de forças, com processos decisórios em que não se tem previamente o controle do produto. São instituições de propriedade pública, mas se o processo decisório está ausente, já que tudo é previamente definido e monitorado por uma instituição privada e os professores apenas executam tarefas, entendemos que este também é um processo de privatização da educação. Semelhante processo de privatização do público tem consequências para a democratização da educação, pois concordamos com Vieira (1998, p. 12) quando diz que “[...] não há estágio democrático, mas há processo democrático pelo qual a vontade da maioria ou a vontade geral vai assegurando o controle sobre os interesses da administração pública.”. Afirma também: “Quanto mais coletiva a decisão, mais democrática ela é. Qualquer conceito de

29

Sujeitos e relação, na concepção de Thompson (1981).

72 democracia, e há vários deles, importa em grau crescente de coletivização de decisões.” (VIEIRA, 1998, p. 12). No entanto, a coletivização das decisões como parte da construção do processo democrático foi cada vez mais subsumida pelo processo de privatização da educação.

3.3

PRIVATIZAÇÃO ENDÓGENA – O GERENCIALISMO COMO O CONTEÚDO DA PROPOSTA DO PRIVADO NO PÚBLICO

Destacamos no segundo capítulo que, para a teoria neoliberal, todas as relações têm a troca como modelo (BUCHANAN et al., 1984). Essas mudanças ocorrem através da disseminação de valores e práticas de empreendimento, empreendedorismo e transposição do discurso internacional do gerencialismo. Para Clarke e Newman (2012, p. 358): [...] mesmo onde os serviços públicos não foram totalmente privatizados (e muitos permaneceram no setor público), era exigido que tivessem um desempenho como se estivessem em um mercado competitivo. Era exigido que se tornassem semelhantes a negócios e este ethos era visto como personificado na figura do gerente (em oposição ao político, ao profissional ou ao administrador). Isto introduziu novas lógicas de tomada de decisão que privilegiavam economia e eficiência acima de outros valores públicos.

Constatamos a correção da análise de Clarke e Newman através do resultado de nossas pesquisas no sentido de que o material proposto pelas parcerias é padronizado e replicável. Observamos, também, o retorno da histórica separação entre o pensar e o fazer, sendo que as instituições privadas determinam e monitoram e as escolas executam. Os autores apresentam as características do gerencialismo: Ele é linear e orientado para um ‘único objetivo’ através de padronização. Ele é concebido com objetivos e planos ao invés de intenções e julgamentos. É sobre ação ao invés de reflexão. Ele baseia-se em análises (dividindo problemas) ao invés de sínteses. Ele estabelece fronteiras entre ‘política’ e ‘execução’, ‘estratégia’ e ‘implantação’, pensar e agir. Ele oferece um discurso técnico que separa o debate de seus fundamentos políticos, então o debate sobre meios suplanta o debate sobre fins. (CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 148).

Os autores ressaltam que essas características fazem com que o gerencialismo seja instrumental aos objetivos políticos deste período particular do capitalismo, É esta qualidade ‘técnica’ do gerencialismo que o torna atrativo para interesses sociais e políticos diversos. Em particular sua aplicação para resolver os problemas de um ‘obstrutivo’ e antiquado modelo de sistema administrativo burocrático engaja apoios

73 tanto de representantes políticos (prometendo uma implantação mais efetiva de suas políticas) e uma gama de outros pretensos modernizadores (que buscam sistemas de governo mais racionais). (CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 148).

É importante destacarmos que, em nossas pesquisas sobre a relação entre o público e o privado na educação, fica evidente a justificativa da gestão gerencial com princípios técnicos. E, assim, surge a questão da produção e apropriação do conhecimento, mas qual conhecimento? Quem decide o que ensinar e como ensinar? Ball e seu grupo de pesquisa apontam no texto, A constituição da subjetividade docente no Brasil: um contexto global, as consequências desses processos para o trabalho e formação docente: os “Docentes são mobilizados a atender objetivos políticos a fim de alcançar um desempenho educativo e, a longo prazo, favorecer o crescimento econômico e reforçar a competitividade global.” (BALL et al., 2013, p. 10). Os autores discutem acerca da privatização endógena e exógena. A privatização endógena, “[...] envolve a importação de ideias, técnicas e práticas do setor privado a fim de tornar o setor público mais mercadológico e mais parecido com as empresas.” (BALL; YOUDELL, 2008, p. 14). [...] a privatização endógena funciona para produzir novos sentimentos, incentivos e lógicas para os professores. Esses processos demonstram que há efeitos negativos para o profissionalismo docente em termos de perda de autonomia e autoridade, intensificação do trabalho, desqualificação e o rompimento das negociações coletivas pela individuação. (BALL et al., 2013, p. 14).

A privatização exógena está vinculada ao lucro: “[...] envolve a abertura dos serviços da educação pública para a participação do setor privado em bases lucrativas e utilizando o setor privado para planejar, gerenciar ou fornecer partes da educação pública.” (BALL; YOUDELL, 2008, p. 22). Os autores destacam ainda “[...] uma ‘lógica’ que relaciona privatização endógena e exógena, por meio da qual os movimentos e mudanças incorporados na primeira facilitam a última.” (BALL; YOUDELL, 2008, p. 22). E, mais especificamente quanto à formação docentes, os autores afirmam que: Uma outra característica da desprofissionalização e da desqualificação, em termos mundiais, pode ser vista no reducionismo e na ‘racionalização’ dos cursos de formação docente e na abertura para novos tipos de cursos de capacitação, menos acadêmicos e mais flexíveis; por exemplo, ‘Teach for America’ nos EUA, ‘TeachFirst’ na Inglaterra, e mais recentemente ‘Teach for All’, que está apoiando iniciativas no Brasil, Chile, Argentina, Israel, Líbano China, Alemanha, Estônia, Letônia, Lituânia, Bulgária e Austrália. (BALL; JUNEMANN, 2011; KINCHELOE,

74 2009). Essas iniciativas removem muito do conteúdo teórico e crítico da formação docente e visam colocar estudantes recém graduados, os mais bem qualificados, em salas de aula de escolas ‘desafiadoras’ após poucas semanas de treinamento para um compromisso de dois anos. (BALL et al., 2013, p. 16-17).

Os autores destacam ainda para os processos de flexibilização do trabalho docente, que abrangem a desregulação do trabalho docente e o pagamento por desempenho. [...] a desregulação do trabalho docente, com o concomitante crescimento de vários trabalhadores não docentes com baixos salários assumindo responsabilidades em salas de aula. Na Inglaterra, por exemplo, desde a década passada tem havido um grande aumento no número de assistentes de ensino nas escolas, com leis relativas ao trabalho muito flexíveis para a contratação de pessoal. Isso está articulado com as políticas governamentais como forma de liberar o tempo dos professores por meio da transferência de atividades não essenciais para esse pessoal de apoio. (BALL et al., 2013, p. 17).

É o que nossas pesquisas apontam quando a oferta educativa é assumida pelo setor privado, com ou sem fins lucrativos, como é o caso das creches comunitárias, programas de Alfabetização de Jovens e Adultos, que não contratam professores, mas apenas voluntários, ou os professores são contratados com bolsas e não salários, como é o caso do Programa Brasil Alfabetizado. A flexibilização pode igualmente ser vista como a subordinação docente ao pagamento por desempenho, o que é parte de um processo de individualização da privatização e mercadorização em que os professores são postos, em relações competitivas uns com os outros – como já observado acima – e contribui para a desagregação do poder político e coletivo da profissão docente e de seus sindicatos. (KESSLER; PURCELL, 1991). Esse processo tem um efeito de desprofissionalização [...]. (BALL et al., 2013, p. 18).

Nessa perspectiva, concordamos com Licínio Lima quando defende a hipótese de que vivemos um processo de hiperburocratização e que “[...] menos Estado e mais competitividade não significa menor grau de racionalização, ou seja, não afasta, necessariamente, algumas das mais centrais dimensões da burocracia racional.” (LIMA, 2012, p. 141). O autor continua: “[...] ganham protagonismo técnico-racional os objetivos definidos com rigor, a flexibilidade e

75 certeza das tecnologias educacionais, a medição da performance e a rigorosa avaliação de pessoas, conhecimento técnico atualizado e a ação dos peritos [...]” (LIMA, 2012, p. 141-142). Entendemos que a luta do setor privado pela direção da educação é parte de um processo de correlação de forças que envolve a definição do conteúdo da educação de um país:

[...] o currículo nunca é uma simples coleção neutra de saberes, que se manifesta de alguma maneira nos textos e aulas de uma nação. Forma parte sempre de uma tradição seletiva, da seleção de parte de alguém, da visão que um grupo tem do saber legítimo. Se produz a partir de conflitos e tensões e compromissos culturais, políticos e econômicos que organizam e desorganizam um povo. (APPLE, 1995, p. 153).

É o que verificamos em nossas pesquisas: o privado assumindo a direção das políticas educativas e definindo a produção e apropriação do conhecimento, conforme aponta Young (2014, p. 198): Para desenvolver um argumento sobre o que significaria o conceito de currículo, empresto uma ideia de um artigo recente de meu colega David Scott (SCOTT; HARGREAVES, 2014). Seu ponto de partida não é propriamente o currículo, mas o aprendizado como a mais básica atividade humana. O que torna humano o aprendizado humano, diz ele, é o fato de que se trata de uma atividade epistêmica – em outras palavras, tem a ver com a produção de conhecimento.

Outra questão importante é o debate acerca da relação entre o conteúdo da educação e o mundo do trabalho, já que: Nas últimas décadas, com a revolução informacional, o mundo do trabalho sofreu profundas mudanças. Instaurou-se – algo que ainda está em andamento – um novo modelo produtivo, caracterizado pela incorporação cada vez maior da ciência e da tecnologia à produção, pela flexibilidade, pela descentralização, pela necessidade de um giro muito rápido dos produtos e por uma produção voltada para o atendimento de uma demanda mais individualizada. (TONET, 2012, p. 14).

O autor ressalta a relação dessas mudanças com o currículo: [...] o trabalhador precisa aprender a pensar, a resolver problemas novos e imprevistos; precisa ter uma formação polivalente, ou seja, uma formação que lhe permita realizar

76 tarefas diversas e, além disso, a transitar com mais facilidade de um emprego a outro, pois a estabilidade já não faz parte desta nova forma de produção. (TONET, 2012, p. 14).

O autor critica ainda os pressupostos que são naturalizados: de que o caráter mercantil da sociedade é algo que faz parte da sua própria natureza e de que a função essencial da educação é a de preparar os indivíduos para o trabalho. Concordamos com a visão de Goodson (2007), quando diz que o currículo prescritivo não está adequado às mudanças no mundo do trabalho: Na nova era da organização flexível do trabalho, os trabalhadores deparam-se com atribuições inesperadas, além de tarefas em constantes mudanças. [...] os cursos com estudos bem estabelecidos e prescritos, por conseguinte, tornaram-se inadequados para a nova ordem de trabalho flexível. O currículo prescritivo poderia fornecer padrões residuais de reprodução social, mas sua crescente disfuncionalidade econômica põe em questão a sua permanência, em virtude dos interesses econômicos poderosos e às pressões globais. [...] [...] Sendo um ‘planejamento possível’ da aprendizagem, o currículo prescritivo é, então, totalmente inadequado para a ordem flexível do trabalho – nessa análise, ele está condenado e requererá uma substituição rápida por novas formas de organização da aprendizagem. (GOODSON, 2007, p. 248).

Enfim, muitas questões surgem deste debate, como: o conhecimento deve ser instrumental ao projeto econômico da sociedade no sentido da preparação para o trabalho? O currículo proposto pelas instituições privadas, vinculado à lógica do mercado, está de acordo com o conhecimento adequado às mudanças no mundo do trabalho? Ou prepara apenas alguns para atuar em equipe, serem criativos, resolverem problemas, enquanto a maioria permanece com um currículo prescritivo e pouco adequado às mudanças, não apenas no mundo do trabalho, mas na vida societária? Verificamos em nossas pesquisas que, nas escolas públicas que são alvo das parcerias privadas, o currículo proposto é padronizado, replicável, básico e mais apropriado ao período fordista anterior do que ao período atual do capitalismo, de acumulação flexível. Apesar de o discurso ser de que o privado deve definir o conteúdo da educação, por estar associado a uma concepção de qualidade com parâmetros de mercado e projeto de desenvolvimento econômico, necessitando da educação como instrumental à formação da mão de obra adequada, tal proposta não condiz com a realidade que temos constatado em nossas pesquisas. Hypólito (2010, p. 1345) chama a atenção para as implicações desse processo de privatização para a autonomia docente: [...] não há muito espaço para um aumento de autonomia. O que tem ocorrido é que o controle sobre os fins sociais e políticos da educação – as definições sobre currículo e programas, sobre o que e como ensinar – tem sido, cada vez mais, transferido das

77 professoras para o controle dos gestores, dos políticos e dos interesses econômicos mais amplos.

O autor critica a mercantilização do pedagógico e os seus efeitos para a formação: [...] o Estado regulador tem sido eficiente em definir suas políticas educativas e curriculares, submetendo a educação e as escolas ao mercado, tanto em termos de mercantilização dos materiais pedagógicos quanto em termos de métodos de ensinar, com efeitos significativos para a formação docente e para a formação de consumidores – docentes e estudantes –, obtendo sucesso na constituição de identidades docentes coadjuvantes com a agenda neoliberal e conservadora. (HYPÓLITO, 2010, p. 1353).

Nora Krawczyk (2014), no texto Ensino médio: empresários dão as cartas na escola pública, também apresenta uma crítica sobre as propostas educativas das escolas de ensino médio: Essa pseudobusca da eficiência educativa representa o abandono da preocupação com a igualdade em pelo menos duas direções: a primeira é a que estabelece uma cisão entre a inclusão na escola e o direito do cidadão ao conhecimento socialmente construído. O que se quer de uma escola assim pensada, na qual a maioria dos alunos estará o dia todo na instituição, mas pouco vai aprender? Talvez ela seja apenas capaz de conter ‘crianças e adolescentes inquietos’, afastando-os da rua e das drogas. A outra direção de abandono da preocupação com a igualdade se dá ao sepultar o conceito de escola pública como espaço de integração e universalidade, que deveria ser valorizado e requerido por toda a sociedade. Ou seja, assume-se que ela é para os pobres, que está reservada para quem não pode pagar a escola particular. Ir por esse caminho significa derrubar a última possibilidade de confrontar o apartheid social brasileiro; significa renunciar a qualquer tentativa de construir uma sociedade menos injusta e desigual. Ensino médio: empresários dão as cartas na escola pública. (KRAWCZYK, 2014, p. 37).

O trabalho é uma dimensão importante da formação humana, apesar de não ser a única. Por isso, a concepção de trabalho e de mundo do trabalho também está em disputa quando discutimos o conteúdo da educação. Ressaltamos aqui que nem a concepção que o próprio capital propõe está sendo trabalhada como o prometido nas parcerias. Todos esses processos apresentam profundas consequências para o trabalho docente, tanto maior quando o setor privado assume a execução quanto a direção. Na execução da oferta, principalmente através da precarização dos contratos docentes e as péssimas condições de trabalho, em que os professores recebem baixos salários ou bolsas, como verificamos em nossas pesquisas com o Programa Brasil Alfabetizado, as creches comunitárias e programas de educação profissional. Quando o privado assume a direção, a principal consequência é a mercantilização do conteúdo da educação e um enorme desrespeito ao trabalho docente, quando seu material de aula já vem determinado por outrem, como apontamos neste texto com as parcerias dos Institutos com escolas públicas. No caso das parcerias, os Institutos também

78 assumem a formação de professores com conteúdo prescritivo e vinculado ao mercado, como a gestão para resultados, proposta pelo Instituto Unibanco, como veremos no capítulo 5. No próximo capítulo apresentaremos como esse processo de privatização do público está se materializando na educação básica no Brasil.

4

MÚLTIPLAS FORMAS DE MATERIALIZAÇÃO DO PRIVADO NO PÚBLICO NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL

As redefinições no papel do Estado implicam o processo de democratização e a minimização de direitos universais e de qualidade para todos, o que traz consequências para as populações de todo o mundo; no entanto, em países que viveram ditaduras e um processo recente de luta por direitos materializados em políticas, o processo de privatização é ainda mais danoso. No Brasil, o Estado foi, historicamente, vinculado aos interesses privados (FERNANDES, 1987; VIEIRA, 1998; PIRES, 2015; CURY, 2003). Após o último período de ditadura, a partir de meados dos anos 1980, entrou na pauta da sociedade, mesmo que de forma tímida, o processo de democratização, participação, coletivização das decisões, assim como direitos sociais materializados em políticas. Ao mesmo tempo, os processos de neoliberalismo, reestruturação produtiva e financeirização redefiniam o papel do Estado para com as políticas sociais, com um diagnóstico de crise fiscal e redução de custos, conforme analisamos no segundo capítulo. Assim, ocorreram avanços inegáveis no acesso à educação, no entanto, com os “recursos possíveis” e, muitas vezes, em detrimento de salários e condições de trabalho dos profissionais da educação. A ampliação de direitos pela universalização do acesso, inclusão de alunos com necessidades especiais, maior participação na vida escolar não foi seguida de condições materiais com a mesma intensidade das mudanças. Vivemos a contradição de que, ao mesmo tempo em que a privatização do público é cada vez maior, também, em um processo de correlação de forças, estamos avançando lentamente em alguns direitos materializados em políticas educacionais. Trata-se de direitos que foram reivindicados no processo de democratização, nos anos 1980, e materializados em parte na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996, como a gestão democrática da educação, a educação básica entendida como educação infantil, fundamental e média, a gratuidade da educação pública, entre outros. Ao mesmo tempo, nos anos 1990, o Brasil viveu um processo difícil para a democratização, entendida como materialização de direitos em políticas sociais e, também, como a coletivização das decisões, pois, na primeira eleição direta após o período ditatorial, que iniciou em 1964, foi eleito pelo voto direto o presidente Fernando Collor de Mello, que representava assumidamente o projeto neoliberal para o Brasil, com o discurso da modernização e de que o País seria competitivo em nível internacional. Apesar do processo de impeachment que afastou o presidente, ter levado novamente às ruas os movimentos sociais, os governos que

80 o seguiram tinham o ajuste fiscal como meta principal, com sérias consequências para as políticas sociais. Vivemos, então, o que chamamos em nossas pesquisas, de um processo de “naturalização do possível” (PERONI, 2013a), isto é, a população, que mal tinha iniciado a luta por direitos sociais para todos e com qualidade, acaba aceitando políticas focalizadas “para evitar o caos social”, priorizando populações em vulnerabilidade social e nem sempre oferecidas pelo poder público. Entre os principais interlocutores do governo federal, nos anos 1990, estava o Instituto Herbert Levy, que apresentou a sua proposta de educação para o governo brasileiro em 1992. É interessante destacar que a elaboração da proposta contou, já na época, com o apoio do MEC, através da organização do Seminário Ensino Fundamental & Competitividade Empresarial, promovido nos dias 3 e 4 de agosto de 1992. As propostas desse Seminário, enviadas à Secretaria de Ensino Fundamental do MEC, foram implementadas, na íntegra. O Seminário, realizado em parceria entre o Instituto Herbert Levy e o MEC, tinha como objetivo a elaboração de uma proposta para ação do governo. Nesse sentido, o evento gerou um documento que continha um diagnóstico da situação, à época, da escola pública fundamental, concluindo que o problema não seria a evasão, mas a repetência, portanto, ele seria de qualidade não de quantidade. Apresentou, ainda, estudos sobre as reformas educativas do Chile e da Inglaterra, países que, na época, eram paradigmáticos do ideário neoliberal. No caso da Inglaterra, o documento menciona a “[...] mistura de centralização de algumas decisões (financiamento e controle de qualidade) concomitantemente à autonomia da escola e ao enfraquecimento das instâncias intermediárias.” (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 69). Outra característica da Reforma Inglesa, destacada pelo documento, é a de que as decisões sobre o currículo foram centralizadas pelo governo, sendo que o “[...] Ministério da Educação e Ciência passou a ter papel ativo no estabelecimento de diretrizes e orientações curriculares.” (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 69), estando, o currículo, diretamente vinculado à Avaliação: “Os procedimentos de avaliação se destinam a medir os objetivos definidos nos programas de estudo do currículo nacional.” (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 71). A avaliação, por sua vez, está vinculada, diretamente, à competição: “[...] a competição das escolas por uma reputação, possibilitada pela publicação dos resultados da avaliação, se torna um dos pilares dessa nova estratégia.” (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 75). Foi o que verificamos na década de 1990 no Brasil (PERONI, 2003), em que os eixos da educação foram os parâmetros curriculares nacionais, a avaliação institucional30 e o financiamento da educação. 30

Sobre Avaliação ver Werle, 2012; Peroni, 2009; Sousa, 2003; Sousa; Oliveira, 2003.

81 O documento ressalta o financiamento e a avaliação como os pilares dessas reformas: “[...] duas características são marcantes nos dois casos: primeiro, a definição de recursos, dentro de critérios universalistas e explícitos; segundo, a implementação de mecanismos de controle de qualidade.” (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 67): O estabelecimento de um sistema de controle de qualidade (Avaliação Institucional) e o estabelecimento de um mecanismo objetivo e universalista de arrecadação e repasse de recursos mínimos para assegurar os insumos básicos necessários para a operação eficaz e eficiente das escolas, dentro das atuais condições da economia brasileira, cujos recursos permitem, segundo estimativas, alocar 300 dólares por ano nas escolas públicas de primeiro grau. (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 6).

Essas propostas31, conforme pesquisamos, foram acatadas, na íntegra, pelo governo Fernando Henrique Cardoso (PERONI, 2003). Fazia parte, também, a recomendação de que não se esperasse pela LDB, que, na época, estava em debate, para a implementação das ações: Tal matéria deve ser prioritária na futura Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, mas não precisa esperar por ela. Conforme a realidade de cada região, por via de negociação, portarias ou outros instrumentos, o MEC pode tomar decisões firmes e claramente instituídas para a partilha de responsabilidades e para o financiamento da educação. (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 61).

Essa sugestão foi acatada pelo Executivo, que elaborou, ainda em 1995, a proposta de Emenda Constitucional 233, que estabeleceu o Fundef, aprovada como Emenda Constitucional 14/96. Outro item que merece destaque, no documento do Instituto Herbert Levy para a educação, diz respeito à importância da educação para a competitividade empresarial: [...] numa época em que o saber se transformou na mola mestra de todo o processo produtivo, qualquer esforço para melhorar a competitividade nacional tende ao fracasso se a máquina geradora deste saber, que é o sistema educacional, não apresentar uma eficácia compatível com as exigências da nova era. (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 6).

Dessa forma, os empresários propunham participar ativamente da elaboração das políticas educacionais, influenciando mais as políticas do que gerindo diretamente as escolas: [...] os empresários sabem muito bem que não podem cuidar melhor das escolas do que o governo ou ao invés do governo. Esta não é sua responsabilidade, sua missão e muito menos sua intenção. A participação do empresário é, contudo, extremamente

31

OLIVEIRA; CASTRO (1993). Ensino fundamental e competitividade empresarial, ver p. 29 a 40.

82 importante. Além de familiarizá-lo com o trato das questões da educação e da escola, complementa a ação do governo, queimando, em defesa de seus próprios interesses econômicos, etapas do processo de otimização do ensino brasileiro. (grifo nosso) (OLIVEIRA; CASTRO, 1993, p. 6).

Verificamos que a decisão de participar de forma mais contundente na direção e execução das políticas educacionais já havia iniciado naquela época, de forma organizada, pelos empresários, que já propunham participar ativamente da elaboração das políticas educacionais, influenciando mais as políticas do que gerindo diretamente as escolas. Tal processo se intensificou na década seguinte, com a organização do Movimento Todos pela Educação (MTE). Retornaremos ao Movimento Todos pela Educação quando tratarmos, ao longo do capítulo, dos processos de direção e execução de privatização do público, nas etapas da educação básica, que é tema de nossas pesquisas recentes. Destacamos ainda que, nos anos 1990, ocorreu um processo de focalização no ensino fundamental, em detrimento da educação infantil e ensino médio, quebrando assim a ideia de educação básica, que permaneceu apenas na Constituição Federal. Só em 2007, com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), a educação básica retorna em parte à pauta, mas a sua efetivação ocorrerá até 2016, quando o poder público será obrigado a oferecer a educação de 4 a 17 anos para todos (BRASIL, 2009). No entanto, entendemos que a educação básica não será totalmente obrigatória, já que as creches ainda não foram contempladas. No início do capítulo ressaltamos que estamos vivenciando, no Brasil, um processo de avanço no direito à educação, ao mesmo tempo em que avançamos nos processos de privatização. Escolhemos três casos nesse sentido, por julgarmos significativos do avanço da democratização, entendido como a materialização dos direitos em políticas ocorridos no período pós abertura política e incrementado nas duas últimas décadas, são eles: o incremento na oferta da educação básica; o Plano de Desenvolvimento da Educação/Plano de Ações Articuladas e o processo de construção de um Sistema Nacional de Educação. Nos próximos itens, trataremos desses três temas e posteriormente apresentaremos dados da nossa pesquisa sobre os aspectos de privatização da educação que, contraditoriamente, em um processo de correlações de forças, conforme tratamos teoricamente em capítulos anteriores, no Brasil, pelas características de sua recente democratização, ocorreram simultaneamente.

83 4.1

A OFERTA

A oferta foi ampliada para quem historicamente não teve acesso, e essa ampliação ocorreu na escola pública. A seguir, apresentaremos tabelas da série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)32, com dados de analfabetismo, analfabetismo funcional, taxa de escolarização, taxa de escolarização líquida no ensino fundamental e médio, que demonstram que, neste período histórico, de democratização, o acesso à educação ampliou no período, em alguns casos de forma mais expressiva, como no ensino fundamental, que foi priorizado durante a década de 1990. Tabela 1 – Taxa de analfabetismo – 1995-2009 Período 1995 1996 2004 2007 2008 2009

15 anos ou mais 15,6 14,7 11,4 10,2 10 9,7

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

A taxa de analfabetismo diminuiu no período, no entanto, a taxa de analfabetismo funcional, apesar também ter sido reduzida, é expressivamente superior: Tabela 2 – Taxa de analfabetismo funcional – 1995-2009 Período 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

32

Taxa de analfabetismo funcional 27,3 26 24,8 24,4 23,5 22,2 21,7 21

Apresentamos os dados disponíveis até o momento no IBGE, que variam no período de abrangência em cada série histórica a ser apresentada.

84 Período 2009

Taxa de analfabetismo funcional 20,3

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

Tabela 3 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade, por anos de estudo 2001-2011 Sem instrução Período e menos de 1 ano 2001 12,65 2002 11,87 2003 11,53 2004 11,4 2005 10,91 2006 10,24 2007 10,17 2008 10,21 2009 9,68 2011 11,48

1a3 anos

4a7 anos

8 a 10 11 a 14 anos anos

16,51 15,76 14,84 14,53 14,14 13,57 13,39 12,66 12,62 10,49

33,12 32,95 32,16 31,47 31,19 30,8 29,35 28,23 28,06 25,51

15,64 15,72 16,35 16,45 16,36 16,44 16,96 17,21 16,52 17,35

16,95 18,37 19,58 20,46 21,54 22,71 23,49 24,64 25,57 26,96

15 anos ou mais 4,74 4,99 5,24 5,43 5,58 6,05 6,44 6,88 7,4 8,09

Não determinados e sem declaração 0,39 0,35 0,3 0,28 0,27 0,19 -

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

Conforme dados do IBGE, em 2007, a taxa de escolarização era de 86,41% para a população de 5 ou 6 anos, 97,67% de 7 a 14 anos, 98,13% de 7 a 9 anos, 97,41% de 10 a 14 anos e 82,35 % entre 15 e 17 anos. Para melhor visualizarmos como ocorreu em uma série histórica, segue o quadro do IBGE de 1992 a 2007: Tabela 4 – Taxa de escolarização 5 a 17 anos – 1992-2007 Período 1992 1993 1995 1996 1997 1998 1999 2001 2002

5 ou 6 anos 53,91 57,7 63,79 63,77 66,59 69,09 70,96 76,23 77,17

7 a 9 anos 87,53 89,04 90,99 91,76 93,14 95,05 96,22 96,94 97,17

10 a 14 anos 86,03 88,35 89,78 90,97 92,91 94,51 95,4 96,19 96,8

15 a 17 anos 59,67 61,92 66,59 69,47 73,27 76,46 78,51 81,09 81,47

85 Período 2003 2004 2005 2006 2007

5 ou 6 anos 78,69 81,83 82,2 85,29 86,41

7 a 9 anos 97,29 97,61 97,88 98,37 98,13

10 a 14 anos 97,12 96,92 97,17 97,36 97,41

15 a 17 anos 82,36 82,18 81,98 82,5 82,35

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

Apresentaremos, também, a taxa de 7 a 14 anos, pois foram os anos focalizados pelas políticas educacionais no período, através do FUNDEF e demais políticas dessa época: Tabela 5 – Taxa de escolarização 7 a 14 anos – 1992-2007 Período 1992 1993 1995 1996 1997 1998 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

7 a 14 anos 86,59 88,6 90,22 91,26 92,99 94,7 95,69 96,46 96,94 97,19 97,19 97,43 97,73 97,67

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

Através da taxa líquida de escolarização verificamos um aumento na taxa do fundamental e médio ao longo dos 20 anos, de 1980 a 2000, entretanto, ressaltamos a brutal diferença entre as taxas do ensino fundamental e médio. E que ainda tem 2,33% de alunos fora da escola no ensino fundamental.

86 Tabela 6 – Taxa Líquida de Escolarização: fundamental e médio – 1980-2000 Período 1980 1991 1994 1998 1999 2000

Fundamental 80,1 83,8 87,5 95,3 95,4 94,3

Médio 14,3 17,6 20,8 30,8 32,6 33,3

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 1992/2007 séries estatísticas. Disponível em: . Acesso em: 03 out. 2015.

Observamos que, segundo os dados, no ensino fundamental e médio a oferta permanece pública, com 84,26% das matrículas no ensino fundamental (EF) e 86,75% no ensino médio (EM) e, em instituições privadas, há apenas 15,73% no EF e 13,25% no EM. A oferta permanece sendo majoritariamente pública, sendo que a privatização ocorreu no que chamamos de “conteúdo da proposta”, com a lógica mercantil no pedagógico e na organização da escola pública, como apresentaremos a seguir. A luta pela universalização da educação foi acompanhada de um importante debate, com algumas políticas já implantadas sobre as especificidades, como educação indígena, educação do campo; além disso, as questões de gênero e sexualidade foram incorporadas, assim como a luta contra o racismo e a homofobia. Foi criada uma secretaria no Ministério da Educação, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), que apresenta políticas mais específicas para contemplar essas reivindicações. A gestão democrática, duramente conquistada na Constituição Federal de 1988, é parte do processo de aprendizagem da participação e está em disputa com a gestão gerencial 33 ou outras formas de gestão historicamente vinculadas ao mercado. Ela é parte do projeto de construção da democratização da sociedade brasileira. Portanto, a construção do projeto político-pedagógico, a participação em conselhos, a eleição para diretores, a autonomia financeira são processos pedagógicos de aprendizagem da democracia, tanto para a comunidade escolar quanto para a comunidade em geral, porque a participação é um longo processo de construção.

33

Sobre gestão democrática e gestão gerencial, ver Peroni (2012); Paro (2012).

87 A seguir, apresentaremos outro item que, assim como o aumento da oferta da educação básica, também materializa, em parte, o processo de ampliação da esfera pública na educação, mesmo com todas as contradições e limites do PDE/PAR.

4.2

PLANO DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – PDE O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) foi lançado em 2007, pelo Ministério

da Educação, com o objetivo de promover a melhoria da qualidade da educação pública brasileira. Esse Plano contém um Plano de Metas34, em que os estados e municípios elaboram os seus planos de ação PAR (Plano de Ações Articuladas) com base no diagnóstico de suas necessidades35. O Ministério prevê ações de assistência técnica e/ou financeira, que podem ser solicitadas pelos municípios em seus respectivos Planos, além de subações com execução pelo próprio município. São quatro dimensões, que se dividem em indicadores e áreas. A dimensão 1 trata da gestão educacional; a dimensão 2, da Formação de professores e de profissionais de serviço e apoio escolar; a dimensão 3, das Práticas Pedagógicas e Avaliação e, a dimensão 4, da infraestrutura física e recursos pedagógicos. É importante destacar que essas dimensões das questões mais relevantes da educação, como a formação de professores, a prática pedagógica e avaliação, a gestão; enfim, pontos definidores da política educacional do País. O Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007, apresenta o Plano de Metas Compromisso Todos Pela Educação, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e o Plano de Ações Articuladas (PAR). Conforme o Ministério da Educação, o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, “[...] inaugurou um novo regime de colaboração, conciliando a atuação dos entes federados sem lhes ferir a autonomia, envolvendo primordialmente a decisão política, a ação técnica e atendimento da demanda educacional, visando à melhoria dos Indicadores educacionais.” (BRASIL, 2007, online). O Decreto, no seu segundo artigo, apresenta 28 diretrizes, que apontam para a participação da União por participação direta ou incentivo e apoio para a execução por parte

34

Ver Farenzena (2012).

35

Sobre o processo de implantação do PAR/PDE ver Camini (2010; 2014), sobre a responsabilização vinculada ao PDE ver Adrião; Garcia (2008).

88 dos entes federados, citaremos apenas as que tratam diretamente da relação entre o público e o privado que é tema desta tese: I - estabelecer como foco a aprendizagem, apontando resultados concretos a atingir; XXVII - firmar parcerias externas à comunidade escolar, visando a melhoria da infraestrutura da escola ou a promoção de projetos socioculturais e ações educativas; XXVIII - organizar um comitê local do Compromisso, com representantes das associações de empresários, trabalhadores, sociedade civil, Ministério Público, Conselho Tutelar e dirigentes do sistema educacional público, encarregado da mobilização da sociedade e do acompanhamento das metas de evolução do IDEB. (BRASIL, 2007, p. 1, grifos da autora).

Destacamos alguns pontos como a aprendizagem como resultado, na primeira diretriz, assim como o fomento às parcerias privadas e a presença de representantes das associações de empresários no comitê local. A partir da adesão ao Plano de Metas, os estados, os municípios e o Distrito Federal passaram à elaboração de seus respectivos Planos de Ações Articuladas (PAR): “Art. 9º. O PAR é o conjunto articulado de ações, apoiado técnica ou financeiramente pelo Ministério da Educação, que visa o cumprimento das metas do Compromisso e a observância das suas diretrizes.” (BRASIL, 2007, p. 4). O Decreto aponta ainda, no parágrafo segundo do artigo nono, que o ente federado deverá elaborar o plano de Ações Articuladas com base em um diagnóstico, com auxílio de equipe técnica “[...] que identificará as medidas mais apropriadas para a gestão do sistema, com vista à melhoria da qualidade da educação básica” (BRASIL, 2007, p.4). O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) é calculado a partir dos dados sobre rendimento escolar, combinado com o desempenho dos alunos, constantes do censo escolar, com os resultados da Prova Brasil. O Ministério da Educação passou a priorizar os municípios e escolas com os mais baixos índices, o que consideramos um avanço no contexto atual, em que a avaliação era utilizada como instrumento de premiação e competitividade, como ressaltei em trabalho anterior sobre Avaliação: Ao contrário dos outros testes, o IDEB tem se traduzido em um parâmetro para o investimento em escolas e sistemas públicos de educação de acordo com suas necessidades. Resta discutir o conteúdo da intervenção estatal, que ainda tem muito a avançar, principalmente na gestão democrática da educação, tanto no que se refere à proposta de gestão do PDE escola, que ‘tomou emprestada’ do FUNDESCOLA uma concepção gerencial de gestão escolar, quanto no fomento às parcerias com instituições privadas definindo a educação pública, que são grandes problemas a serem enfrentados. Assim, temos um avanço na concepção de avaliação diagnóstica e o poder público como o responsável pela qualidade da educação propondo políticas para solucionar os problemas

89 detectados, mas ainda com limites importantes de serem pontuados, já que esta política está em processo de construção. (PERONI, 2009, p. 296).

As ações do Plano foram inicialmente encaminhadas aos municípios que apresentavam baixo IDEB. Estes, devem elaborar um Plano de Ações Articuladas (PAR) que preveja assistência técnica e financeira da União. Conforme o Decreto no art. 8º “As adesões ao Compromisso nortearão o apoio suplementar e voluntário da União às redes públicas de educação básica dos Municípios, Distrito Federal e Estados. [...]” (BRASIL, 2007, p. 3).

4.3

O GUIA DE TECNOLOGIAS E AS PARCERIAS COM O SETOR PRIVADO O Decreto apresenta o Guia de Tecnologias36, que certifica instituições, inclusive

privadas, para realizarem parcerias com sistemas públicos, o que é objeto de nossa investigação: §4º O Ministério da Educação promoverá, adicionalmente, a pré-qualificação de materiais e tecnologias educacionais que promovam a qualidade da educação básica, os quais serão posteriormente certificados, caso, após avaliação, verifique-se o impacto positivo na evolução do IDEB, onde adotados. (BRASIL, Decreto nº 6.094/2007).

O Guia é um exemplo de influência do setor vinculado ao mercado vendendo tecnologias educacionais que chegam às escolas públicas, através do Plano solicitado pelos municípios em quatro dimensões: gestão educacional; formação de professores e de profissionais de serviço e apoio escolar; Práticas Pedagógicas e Avaliação, infraestrutura física e recursos pedagógicos. Questionamos se a “cesta de produtos” ofertados realmente está de acordo com as necessidades da escola ou se a escola deve se adaptar ao que é oferecido, se quiser alguma forma de ajuda governamental para seus problemas. É importante destacar que tratam das questões mais relevantes da educação, como a formação de professores, a prática pedagógica e avaliação, a gestão; enfim, pontos definidores do currículo em um país no qual o poder público fomenta a parceria com instituições privadas, como podemos observar no quadro abaixo:

36

Entende-se por tecnologia educacional as práticas, métodos ou técnicas de ensino acompanhadas de aparatos, aparelhos ou ferramentas instrumentais, inclusive já em uso por redes ou estabelecimentos de ensino, que apresentem potencial impacto positivo na melhoria da qualidade da educação básica pública, a serem empregadas como mecanismo de apoio aos sistemas de ensino e aos processos de ensino-aprendizagem desenvolvidos em sala de aula.

90 Quadro 3 – Guia de Tecnologias Educacionais 2009 e 2011/2012 Item

1 2 3 4 5 6 7 8

Categoria

Tecnologia desenvolvida pelo MEC 2009 2011 Gestão da Educação 09 11 Ensino Aprendizagem 04 09 Formação dos profissionais da 10 12 educação Educação Inclusiva 06 11 Portais Educacionais 04 05 Diversidade e Educação de 10 17 Jovens e Adultos Educação Infantil TOTAL 43 65

Tecnologia externa ao MEC

Total

2009 06 51 14

2011 07 51 15

2009 15 55 24

2011 18 60 22

01 02 07

01 11 11

07 16 17

12 16 28

91

08 104

134

08 169

Fonte: Rossi; Bernardi; Uczak (2013).

Dentre as categorias do Guia, destacamos o Ensino Aprendizagem, no qual a incidência das tecnologias externas ao MEC é predominante. Sacristan (1998) adverte sobre a importância de quem decide o conteúdo da educação pública “[...] penso que discutir sobre a existência ou ausência de controle sobre o currículo não leva a parte alguma, por que me parece impensável que este controle não exista, dados os estreitos laços que os sistemas escolares mantêm com o sistema social.”. Para o autor, “[...] o problema reside em estabelecer quem realiza o controle e através de que mecanismos.” (SACRISTAN, 1998, p. 97). É interessante destacar que programas muito importantes do Ministério da Educação, como o Curso de Especialização Escola de Gestores, que forma diretores e coordenadores pedagógicos, ou o Programa de Capacitação dos Conselheiros Escolares, dividem o Guia com jornais, kits, lousas, laboratórios e, o que é pior, assessorias privadas de caráter gerencialista, contrariando o princípio constitucional da gestão democrática. Ao ler o Guia transparece a ideia de uma grande cesta de produtos, em que os municípios escolhem de acordo com suas necessidades, não destacando se são programas parte de políticas estratégicas para a formação dos profissionais da educação ou não. Ressaltamos ainda o fortalecimento da relação entre o público e o privado através do Plano via Guia de tecnologias, com a presença de empresários do Movimento Todos pela Educação na venda de tecnologias. Conforme Bernardi, Uczak e Rossi (2015), os mesmos sujeitos do movimento empresarial Todos pela Educação são agentes e interlocutores no setor público, junto ao Ministério da Educação, tornando-se clientes do Estado ao ofertarem produtos

91 no Guia de Tecnologia ou recomendações. Os autores apresentam 37 o conselho de governança e as instituições, conforme a figura 1: Figura 1 – Sujeitos Individuais e Coletivos e Relações com o Guia de Tecnologias

PEJ Prjt Entre Jovens

Acelera Circuito Campeão

GTE Gestão da Educação

Se liga

Jovem de Futuro

Fund. Itaú Social

Instituto Unibanco Inst. Brasil Voluntário

Instituto Ayrton Senna

Antonio Jacinto Matias Wanda Engel Aduan Instituto Gerdau

Pres. Faça Parte

Viviane Senna

Beatriz Johannpeter

Milu Vilella Daniel Feffer Instituto Paulo Montenegro Luiz Paulo Saade Montenegro

Grupo Pão de Açúcar

Danilo Santos de Miranda

Conselho de Governança

Denise Aguiar Alvarez

Suzano Holding SA SESC/SP Div Regional

Dir. Fund. Bradesco

Ana Maria dos S. Diniz Fernão Bracher Itaú - BBA

Luís Norberto Pascoal José Francisco Soares Pres. Grupo D’Paschoal e Fun. Educar D’Paschoal

José Roberto Marinho

José Paulo Soares Martins

Dir. Fund. Roberto Marinho Dir. Inst. Gerdau

Cons. Consultivo INEP e Cons. Tec. INEE

Prg. FC Multicurso Matemática

Prova Brasil Provinha Brasil

LEGENDA

Conselho de Governança Vínculos Institucionais Guia de Tecnologias Tecnologias

Fonte: Bernardi; Uczak; Rossi (2015, p. 65).

Entendemos que o Plano de Desenvolvimento da Educação avança na presença do Estado na execução do direito à educação, pois historicamente a União não esteve presente na educação básica, o que constitui um ganho representativo para a democratização da educação, mas, por outro lado, o Plano tem fomentado as parcerias de instituições privadas com os sistemas públicos de educação, o que é um grande problema para a democratização, já que eles trazem a lógica de mercado para o sistema público através da gestão gerencial, da diminuição

37

Os autores advertem que o quadro apresenta somente a oferta direta de tecnologias. Há ainda uma série de apoios e parcerias entre os sujeitos

92 da autonomia dos professores, do aumento da competição, premiação, enfim, de um projeto de educação antagônico ao construído no período de democratização brasileira.

4.4

A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO

Outro processo que estudamos neste período foi a relação entre o público e o privado no processo de construção do Sistema Nacional de Educação38. Entendemos que esse assunto é relevante, pois em uma sociedade historicamente muito privatizada e com pouca cultura pública, a construção de um Sistema Nacional pode contribuir para a construção do espaço “público” em um processo democrático e participativo, ou pode tornar as políticas

mais

centralizadas e com direção ainda maior do setor privado. É um processo de disputa e de correlação de forças entre o público e o privado, conforme anunciamos desde o início da tese. O Fórum Nacional pela Constituinte (1986), que depois se transformou no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP), já trazia o debate acerca de que Estado e que sociedade precisaríamos construir para uma sociedade democrática39. Não era mais o Estado da ditadura e a pauta, em meados da década de 1980, era a construção de uma sociedade com cultura democrática. Assim, a construção de um Sistema Nacional de Educação, dentro dessa proposta, tinha como questão central o papel do Estado no direito à educação, para superar as desigualdades regionais, a histórica desobrigação da União para com a educação básica, enfim, a ideia de uma educação de qualidade para todos. Uma concepção de Estado, e não apenas de governo, com instituições públicas democráticas e a sociedade civil participando ativamente das decisões acerca da proposta educacional (FERNANDES; BRITO; PERONI, 2012). Essa proposta de construção de sistema não foi acolhida na CF/88 e retorna à pauta em 1996, quando o FNDEP se mobiliza novamente para a elaboração de uma proposta de PNE, que foi construída a partir de dois Congressos Nacionais de Educação (CONEDs), em 1996 e 1997. Em 1998, o chamado PNE - Proposta da Sociedade Brasileira, foi apresentado ao Congresso Nacional, através do Deputado Ivan Valente, como Projeto de Lei nº 4155/98. No entanto, em 1998, o Poder Executivo apresentou o PL nº 4173/98 que, mais uma vez, ignorou a criação do SNE. Os dois projetos estiveram em discussão no Congresso nacional

38

Ver nossas publicações sobre o assunto: Fernandes, Brito e Peroni (2012); Peroni (2013) e Peroni e Flores (2014).

39

Sobre este assunto ver Bollmann (2010).

93 e, em 2001, foi aprovado o PNE, Lei 10.172/01 (2001-2010), que não incorporou a criação de um Sistema Nacional de Educação. É importante ressaltar que o Plano da Sociedade Brasileira foi elaborado por entidades que, desde o processo Constituinte, estavam envolvidas na democratização da educação. Destacamos, também, o esforço de construir coletivamente um PNE e um SNE, o que ocorreu em um momento desfavorável na correlação de forças, com a proposta de educação do então governo Fernando Henrique Cardoso, que já implementava o receituário neoliberal na educação. Assim, não eram um Estado ou uma sociedade abstratos, mas projetos distintos. Quando ressaltamos que a sociedade apresentou uma proposta e o governo apresentou outra proposta de PNE, é preciso retomar, o que já trabalhamos no primeiro capítulo, que há interesses privatistas no Estado e na sociedade civil. Havia uma mobilização de parte da sociedade pela escola pública, e parte da sociedade era interlocutora do governo com propostas de minimização dos direitos. Retomando a proposta de sistema, apresentamos trecho da proposta de SNE debatida no FNDEP e apresentada no Plano elaborado nos CONEDs:

Neste PNE, defende-se a instituição de um Sistema Nacional de Educação para o Brasil, concebido como expressão institucional do esforço organizado, autônomo e permanente do Estado e da sociedade brasileira pela educação, tendo como finalidade precípua a garantia de um padrão unitário de qualidade nas instituições educacionais públicas e privadas em todo o país. Compreende os Sistemas de Educação Federal, Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, bem como outras instituições, públicas ou privadas, prestadoras de serviços de natureza educacional, aqui incluídas as instituições de pesquisa científica e tecnológica, as culturais, as de ensino militar, as que realizam experiências populares de educação, as que desenvolvem ações de formação técnico-profissional e as que oferecem cursos livres. As ações do Sistema Nacional de Educação, eixo central da organização da educação nacional, devem simplificar as estruturas burocráticas, descentralizar os processos de decisão e execução, fortalecer as escolas e as unidades prestadoras de serviços, articular os diferentes níveis e sistemas de ensino, integrar a educação formal e a informal, articular a educação escolar com as ações educativas produzidas no interior dos movimentos populares, valorizar os processos de avaliação institucional. (PNE Proposta da Sociedade Brasileira, 1997, p. 31).

Essa proposta de SNE apresentava um sistema que pensava em uma garantia de padrão de qualidade para as escolas públicas e privadas em todo o País, assim como a articulação de diferentes níveis de ensino e a relação entre a educação escolar com as propostas dos movimentos populares, que eram efervescentes no processo de abertura. O debate era acerca do papel do SNE para articular a educação formal, informal, e um processo de descentralização e

94 controle social com maior autonomia e participação dos sujeitos da educação, questões estratégicas para a construção de uma sociedade mais democrática. Em 2008, a criação de um Sistema Nacional de Educação retorna à pauta. O poder executivo mobilizou a sociedade através de conferências municipais, regionais estaduais, que indicaram delegados para a Conferência Nacional de Educação (CONAE) em 2010. A Conferência contou com delegados e ampla participação, inclusive retomando a participação de entidades vinculadas ao Fórum e outras que surgiram depois, como a Campanha pelo Direito a Educação, com ampla mobilização e envolvimento da sociedade em torno de uma proposta democrática de educação. Sobre o SNE, o documento final da CONAE aponta: [...] a construção de um sistema nacional de educação requer o redimensionamento da ação dos entes federados, garantindo diretrizes educacionais comuns a serem implementadas em todo o território nacional, tendo como perspectiva a superação das desigualdades regionais. Dessa forma, objetiva-se o desenvolvimento de políticas públicas educacionais nacionais universalizáveis, por meio da regulamentação das atribuições específicas de cada ente federado no regime de colaboração e da educação privada pelos órgãos de Estado. [...] O Sistema Nacional de Educação assume, assim, o papel de articulador, normatizador, coordenador e regulamentador do ensino público e privado e financiador dos sistemas de ensino públicos (federal, estadual/DF e municipal), garantindo finalidades, diretrizes e estratégias educacionais comuns, mas mantendo as especificidades próprias de cada um. Em tal sistema, os conselhos nacional, estaduais, do Distrito Federal e municipais, com gestão democrática, são fundamentais para a supervisão e manutenção das finalidades, diretrizes e estratégias comuns. (BRASIL, 2010b, p. 23).

É interessante observar que o período da CONAE foi de 2008 a 2010, mas em 2009, antes da Conferência final, o Sistema Nacional de Educação foi incorporado à Constituição Federal de 1988 pela Emenda Constitucional n. 59/2009, que deu nova redação ao artigo nº 214: Art. 4º O caput do art. 214 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação, acrescido do inciso VI: ‘Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: [...] VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.’ (NR) (BRASIL, Congresso Nacional, EC 59/2009).

Em dezembro de 2010, o Poder Executivo, através do PL nº 8035/10, apresentou uma Proposta de PNE, ignorando pontos importantes do documento final da CONAE.

95 É importante destacar que se tratava de outro momento histórico, diferente da mobilização do FNDEP e dos CONEDs. A proposta de SNE, defendida pelo FNDEP, tinha como instância de deliberação maior o Fórum Nacional de educação, proposta que foi retomada na CONAE. A questão é que a ideia do FNDEP era uma ampla participação na definição de políticas educacionais e que o público deveria definir o privado. Nesse sentido, a proposta do FNDEP vinculava o Sistema Nacional de Educação a um Fórum representativo da sociedade civil que fosse capaz de construir políticas de Estado e não apenas de governo, como podemos ver no trecho abaixo:

Sistema Nacional de Educação, assim configurado, tem como instância máxima de deliberação o Fórum Nacional de Educação, com ampla representação dos setores sociais envolvidos com a educação, responsável pela política nacional de educação e, principalmente, pela definição de diretrizes e prioridades dos planos nacionais de educação e sobre a execução orçamentária para a área. (PNE sociedade Civil, 1997, p. 29).

Portanto, é muito importante estarmos atentos à composição atual do Fórum Nacional de Educação, instituído pela Portaria n° 1.407, de 14 de dezembro de 2010, já que a correlação de forças no momento atual é diferente daquele em que ele foi pensado, ainda durante o período de democratização do País. A sociedade civil, hoje, está organizada pelos empresários com o Movimento Todos pela Educação, Instituto Ayrton Senna, a Fundação Itaú Social, o Instituto Unibanco, entre outros, pautando a sua proposta de educação para o País. E, por outro lado, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e instituições que compunham o FNDEP também foram mobilizados com a sua proposta de educação pública. Assim, entre os principais desafios para a construção do SNE está a relação entre o setor público e o privado e entre e os entes federados, principalmente o papel da União na educação básica, que historicamente esteve praticamente ausente. As questões estão muito conectadas, já que durante muito tempo estados e municípios assumiram a execução da educação básica de forma descentralizada, o que reproduziu as desigualdades regionais, pois estados e municípios com mais recursos financeiros e com quadros capacitados para a elaboração de políticas tinham formas muito diversas de oferta e qualidade do que aqueles sem as mesmas condições. Assim, um dos principais desafios para a criação do SNE é pensar o País como um todo, com políticas públicas de educação que garantam a democratização da educação, tanto na oferta e na qualidade quanto na gestão do processo. Trata-se de um desafio expressivo, pois constitui algo inédito na nossa história, e, por correr o risco de centralizar e desrespeitar o pacto federativo,

96 esse processo necessita ser construído coletivamente e com participação efetiva nos processos decisórios (FERNANDES; BRITO; PERONI, 2012). Enfim, entre tantos pontos importantes da política educacional do período, destacamos apenas três por julgarmos relevantes para o processo de construção do público, em um país de cultura historicamente privada e pouco democrática40. Portanto, ao mesmo tempo em que ocorrem algumas conquistas sociais para a democratização da educação, em um processo de correlação de forças, verifica-se a organização de setores vinculados ao mercado, influenciando as políticas educativas das mais diversas formas. No ensino fundamental e médio a oferta permanece pública e definindo as fronteiras entre o público e o privado com implicações para o processo de democratização. As pesquisas em que analisamos as etapas e modalidades da educação básica não têm a pretensão de mostrar todas aquelas formas, pois são muitas e cada vez mais variadas; desse modo, escolhemos em cada etapa e modalidade a que mais expressa o processo de privatização do público, ou que, de alguma forma, julgamos que é mais significativa. Tivemos a intenção também de demonstrar diferentes processos, em que o setor público repassa a execução ou em que a oferta é pública, mas o privado assume a direção, como nas parcerias. No ensino fundamental e médio a oferta permanece pública. O que foi privatizado nessas etapas do ensino obrigatório foi o que chamamos de “conteúdo da educação”. A privatização ocorre através da parceria ou venda de sistemas privados. Nas nossas pesquisas, destacamos as parcerias que têm atuação nacional e influenciam em escala maior a educação pública no Brasil, como foi o caso do Instituto Ayrton Senna (IAS), no ensino fundamental, e do Instituto Unibanco, no ensino médio. Os Institutos atuam no conteúdo da educação através da formação de professores, do material didático, da rotina das aulas e, também, através do monitoramento das escolas e da atuação do professor, numa relação de controle e cobrança dos resultados. A atuação do setor privado corre cada vez mais na direção das políticas, com o pressuposto de que a qualidade da educação deve ser definida pela lógica de mercado. O financiamento ocorre em parte através do governo federal ou da renúncia de receitas, em que empresas deixam de pagar impostos e doam para esses Institutos. É importante ainda salientar que não há controle público de onde são gastos os recursos das renúncias de receitas41. Os Institutos já sabem que não adianta ter apenas as grandes normas da política e da educação

40

Sobre o histórico da relação entre o público e o privado no Brasil, ver Pires (2015).

41

Sobre o financiamento e controle social das instituições do terceiro setor no Brasil, ver Peroni (2006).

97 e que é preciso influenciar na sala de aula para efetivar a mudança. No próximo capítulo, abordaremos de forma mais detalhada a atuação dos dois Institutos.

4.5

A EXECUÇÃO DA OFERTA VIA TERCEIRO SETOR Na educação infantil, desde que as creches foram consideradas parte da educação básica,

saindo da assistência social e passando para a educação, como parte da reivindicação de pais, educadores e pesquisadores da área, a expansão ocorreu via creches comunitárias. O poder público municipal, que ficou responsável pela oferta desta etapa da educação básica, buscou como alternativa, em muitos casos, as parcerias com instituições sem fins lucrativos. Estudos evidenciam42a fragilidade e precariedade deste atendimento, no que se refere às condições físicas do local, projeto pedagógico, remuneração e formação dos professores e a não gratuidade, com mensalidades43 sendo cobradas inclusive de famílias muito carentes, mesmo recebendo dinheiro público. Outro fator importante é a ausência de gestão democrática nas instituições, com critérios pouco transparentes na admissão e pagamento dos funcionários, assim como nas relações dentro das creches e da instituição mantenedora, dos os pais e da comunidade. E ainda, a admissão dos estudantes não tem critérios transparentes e nem sempre o ensino é gratuito. Normalmente, são instituições para alunos muito pobres, e mesmo uma mensalidade baixa já onera o orçamento das famílias. O que consideramos questionável do ponto de vista do direito à educação, pois no Brasil muito lutamos pela gratuidade da educação pública (FLORES; SUSIN, 2013; SUSIN; MONTANO, 2015). No ensino profissional vinculado ao médio, estudamos principalmente o atual programa proposto pelo governo federal Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), que apresenta, entre seus objetivos, a articulação entre o ensino médio e o profissional. Ressaltamos a participação de instituições privadas na execução do Programa. Questionamos a concepção de trabalho proposta pelo governo federal, que, ao repassar recursos também para instituições privadas para execução do Programa, abre mão de uma proposta de formação profissional. Verificamos também que, ao mesmo tempo, expandiu-se a rede pública de educação profissional, mas não no ritmo necessário, e em paralelo foi feita a ampliação via parcerias, através do PRONATEC (BRASIL, 2011; RODRIGUES; SANTOS, 2013; 2015).

42 43

Ver pesquisas de Susin (2005; 2009). As instituições dizem que são contribuições espontâneas, mas na maioria dos casos estudados eram mesmo que veladamente critério para a admissão e permanência de crianças, conforme relato de pais.

98 Na Educação de Jovens e Adultos pesquisamos o Programa Alfabetização Solidária (ALFASOL) e o Programa Brasil Alfabetizado. O ALFASOL teve importância enorme na simbiose entre o público e o privado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi o “embrião” do público não-estatal no Brasil, por ser um programa de governo realizado por uma instituição do terceiro setor, presidido pela própria primeira-dama e recebendo dinheiro público para a sua execução. Esta instituição permanece atuante e executando muitos projetos com o governo federal. Há ainda, o Programa Brasil Alfabetizado que atua com este público com bolsas para os alfabetizadores e vínculos com instituições do terceiro setor para sua execução. Observamos ainda que os professores muitas vezes são contratados em outro turno com bolsa, recebendo menos do que seu salário, o que também entendemos como uma forma de precarização (BRASIL, 2012; COMERLATO; MORAES, 2013). No que se refere a educação especial, historicamente o poder público desresponsabilizou-se dessa modalidade de ensino. No momento em que estava começando a ser entendida como um direito, a nova conjuntura de racionalização de recursos dificultou a implementação com qualidade das políticas de inclusão e restringiu a ampliação de escolas públicas de educação especial. E a prática de repasses de recursos públicos que já eram destinados às instituições de direito privado, como APAE, Pestalozzi, etc., para a execução de tarefas que seriam do poder público, atualmente fortalecidas pelo movimento em que o Estado retira-se ou diminui a sua atuação na execução de políticas, passando-as para a sociedade civil (BOROWSKY, 2013; PERONI, 2011). Quando a execução ocorre por parte do setor privado, com financiamento público, observamos que, apesar do poder público ter alguma regulação, na prática, muitas vezes não há fiscalização, ou há o entendimento de que é melhor garantir o funcionamento precário do que fechar e deixar a população desassistida. Verificamos que, apesar de uma das justificativas de repassar ao setor privado ser a racionalização de recursos, o poder público, em alguns processos, diminui custos para as populações mais vulneráveis, com as creches, a educação de jovens e adultos, a educação profissional, mas, por outro lado, contrata assessorias e parcerias e compra produtos privados que oneram em muito o orçamento (BITTENCOURT; OLIVEIRA, 2013). Apesar de serem múltiplos editais, formas de terceirização e compra dos mais diversos “produtos”, desde a formação, gestão, aprendizagem, apresentamos aqui a influência dos empresários na direção das políticas educativas e venda de produtos educacionais através do Movimento Todos pela Educação (TPE). O TPE atua influenciando a agenda da política

99 educacional no País, monitorando e avaliando resultados e pressionando diretamente o poder executivo e legislativo para cumprir a sua pauta educacional.

4.6

OS EMPRESÁRIOS NA DIREÇÃO DAS MOVIMENTO TODOS PELA EDUCAÇÃO

POLÍTICAS

EDUCATIVAS:

O Movimento Todos pela Educação (TPE) foi criado em setembro de 2006, e atua influenciando a pauta educacional através de uma relação direta com o Ministério da Educação, e também monitorando e avaliando resultados da agenda da política educacional no país. Pesquisamos o TPE pela sua importância na interlocução com o governo federal para a elaboração de políticas educacionais. Dada a sua importância, esse movimento é, inclusive, citado em um livro de Stephen Ball (2012, p. 29), publicado na Inglaterra, que trata das redes e da relação entre o público e o privado. Tal movimento possui um protagonismo cada vez maior não apenas no Brasil, mas em toda a América Latina. Em setembro de 2011, o TPE organizou um seminário em conjunto com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para a criação da rede latino-americana de organizações da sociedade civil pela educação44: A rede foi lançada na sessão especial do Congresso Internacional: ‘Educação: uma Agenda Urgente’, realizado em Brasília, de 13 a 16 de setembro. O dia de trabalho do Congresso foi organizado pelo Todos Pela Educação em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O evento contou com a participação de autoridades de diferentes países, entre elas, do ministro da Educação, Fernando Haddad. (Disponível em: . Acesso em: 03 nov. 2013).

Ressaltamos o protagonismo da organização de empresários brasileiros no processo de aprofundamento da privatização do público na América Latina e o financiamento do Banco Mundial, que tem como estratégia o aprofundamento das parcerias público-privadas. A seguir, apresentamos os sujeitos que participam do conselho de governança do TPE e as empresas em que atuam. O quadro foi organizado pelos integrantes do subgrupo que trata deste tema no nosso grupo de pesquisa atual.

44

Ver a “Declaração constitutiva da rede latino-americana de organizações da sociedade civil pela educação”.

100 Quadro 4 – Conselheiros de Governança do Todos Pela Educação e suas empresas NOME DO CONSELHEIRO Jorge Gerdau Johannpeter Ana Maria dos Santos Diniz Antonio Jacinto Matias Beatriz Johannpeter Daniel Feffer

EMPRESA QUE REPRESENTA Instituto Gerdau Instituto Grupo Pão de Açúcar Fundação Itaú Social Instituto Gerdau Susano Holding SA e Membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social - Brasil Danilo Santos de Miranda Diretor Regional SESC SP Denise Aguiar Alvarez Diretora Fundação Bradesco Fernão Carlos Botelho Bracher Itaú e Banco BBA Creditanstalt, Ex-presidente do Banco Central José Francisco Soares Conselho Consultivo do INEP e membro do Conselho Técnico do INEE (Instituto Nacional para la Evaluación de la Educación – México José Roberto Marinho Fundação Roberto Marinho- Rede Globo Luiz Norberto Pascoal Grupo D’Pascoal e Fundação Educar D’Pascoal Luiz Paulo Saade Montenegro Instituto Paulo Montenegro Millú Villela Presidente do Instituto Faça Parte e Brasil Voluntário Viviane Senna Instituto Ayrton Senna Wanda Engel Aduan Presidente Instituto Unibanco Fonte: Bernardi; Uczak; Rossi (2015, p. 57).

Os autores ressaltam ainda a atuação a atuação dos empresários vinculados ao TPE, através da venda de tecnologias educacionais no Guia de Tecnologias do governo federal (BERNARDI; UCZAK; ROSSI, 2015). Como já apresentamos em item anterior deste capítulo, o Guia de Tecnologias é oferecido à escola para que decida, de acordo com os problemas diagnosticados no seu Plano. No entanto, questionamos se a “cesta de produtos” ofertados está de fato de acordo com as necessidades da escola ou se ela deve se adaptar ao que é oferecido, se precisar de alguma forma de ajuda governamental para seus problemas. Destacamos que, por um lado, o governo federal, através desse Plano, está presente, como nunca esteve, nas escolas públicas de educação básica de todo o País, sendo relevante para o processo de democratização da educação e também do setor público atuar para a qualidade da educação básica, através de um diagnóstico realizado pela escola e de sua atuação em inúmeros programas das mais diversas áreas. No entanto, por outro lado, há o fomento de parcerias com o setor privado através da venda de produtos para as escolas via Guia de Tecnologias45. Observamos que se trata do conteúdo da educação pública, já que abarca a formação de professores, prática pedagógica e avaliação, gestão escolar; pontos cruciais da educação, que o

45

Sobre a relação entre a venda de tecnologias e o TPE ver Bernardi; Uczak; Rossi (2014).

101 poder público repassa para a direção e execução por instituições privadas, através da venda de produtos. Essa vinculação entre o Movimento Todos pela Educação e os produtos ofertados pelo Guia de Tecnologias nos remete a algumas análises: a vinculação entre o que Ball e Junemann (2012) e Rhodes (1996) têm chamado de steering (direção) e roowing (execução) na análise de redes. Nesse caso, os empresários atuam tanto na direção quanto na execução, pois influenciam fortemente nas políticas nacionais e chegam até a sala de aula com a venda de produtos pedagógicos. É o que Robertson (2012) destaca como a influência do setor privado em todas as instâncias da educação: “[...] as PPPEs permitiram seu rápido avanço, dado que o setor privado está agora profundamente enraizado no coração dos serviços públicos educacionais, em todos os níveis, desde a política e a pesquisa até a aprendizagem nas salas de aula” (ROBERTSON, 2012, p. 1149). Ocorre também o que Ball chama de filantropia 3.0, já que a filantropia está vinculada ao lucro, através da venda de produtos para as escolas e sistemas públicos, mesmo aquelas que se dizem sem fins lucrativos.

4.7

AS PARCERIAS – DIREÇÃO E EXECUÇÃO DAS POLÍTICAS EDUCATIVAS As parcerias também são uma das formas encontradas para chegar diretamente à escola,

à sala de aula, e definir e controlar o que e como será ensinado. Verificamos, nos exemplos trabalhados, que o conteúdo é altamente prescritivo. No próximo capítulo, apresentaremos as parcerias entre Instituto Ayrton Senna (IAS) e escolas de ensino fundamental e o Instituto Unibanco e escolas de ensino médio.

5

DOIS EXEMPLOS DO PRIVADO DEFININDO O PÚBLICO ATRAVÉS DE PARCERIAS: INSTITUTO AYRTON SENNA E INSTITUTO UNIBANCO Neste capítulo, apresentamos dois Institutos que são parte das nossas pesquisas, o

Instituto Ayrton Senna e o Instituto Unibanco, que possuem atuação nacional e interferem cada vez mais em todas as instâncias, seja em âmbito nacional, até nas escolas, passando pelas secretarias de educação. Apresentaremos uma descrição geral de cada Instituto e depois focaremos mais em como materializam os debates do capítulo 3, de quem são os sujeitos e qual é o conteúdo da proposta.

5.1

INSTITUTO AYRTON SENNA (IAS) A parte que segue teve como base a pesquisa nacional Análise das consequências de

parcerias firmadas entre municípios brasileiros e a Fundação Ayrton Senna para a oferta educacional (ADRIÃO; PERONI, 2010), que objetivou captar as especificidades relativas às consequências das parcerias firmadas, entre o IAS e redes públicas de educação básica. Dado o grau de desigualdade e diversidade existente entre os municípios e regiões do Brasil, a pesquisa selecionou um município de cada região para a realização de dez estudos de caso. O grupo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) iniciou a pesquisa, que depois se tornou nacional, e continuou o trabalho de pesquisa mesmo após o seu término . Teses e dissertações foram defendidas sobre o tema (PIRES, 2009; LUMERTZ, 2008; COSTA, 2011; CAETANO, 2013; COMERLATTO, 2013), os pesquisadores participaram ativamente na pesquisa estadual e nacional e alguns integrantes participam do grupo ainda hoje. Pela importância da atuação do Instituto, permanecemos analisando o IAS na pesquisa atual, descrita no primeiro capítulo. O IAS é uma organização não-governamental, sem fins lucrativos, fundada em novembro de 1994, que atua em parceria com sistemas públicos de educação em nível estadual, municipal e nacional. Salientamos que o IAS vem ampliando a sua atuação e, consequentemente, sua importância na definição de políticas educacionais, com participação no Guia de Tecnologias, já abordado no capítulo anterior. Conforme noticiado pelo próprio Instituto: “[...] atualmente os programas Se Liga, Acelera Brasil e Circuito Campeão foram préqualificados pelo Ministério da Educação como ferramentas de apoio aos sistemas públicos de ensino

para

a

promoção

da

qualidade

da

educação.”

. Acesso em: 13 set. 2010).

(Disponível

em:

103 Salientamos, ainda, que o IAS assinou acordo de cooperação técnica com a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), em 2011 O ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), Moreira Franco, assina, nesta quarta-feira (28/9/2011), em São Paulo, acordo de cooperação técnica com o Instituto Ayrton Senna, para realizar, de forma conjunta, projetos e programas de interesse comum, voltados para a educação. [...] O objetivo dos trabalhos conjuntos será subsidiar a Secretaria na formulação de políticas públicas com foco na educação. (Disponível em: . Acesso em: 2 ago. 2012).

Conforme apresentamos no capítulo anterior, a SAE publicou o documento Pátria Educadora (2015) como parte do diagnóstico e proposta vinculado à proposta atual do Instituto sobre as Competências socioemocionais, que abordaremos no decorrer deste item. Ao pesquisarmos sobre os programas do IAS, nos deparamos com uma recomendação do Programa Acelera Brasil na página do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul: Programa Acelera Brasil - Instituto Ayrton Senna Como implementar programas para Regularizar em Redes Estaduais e Municipais de Ensino

o

Fluxo

Escolar

A experiência do Programa Acelera Brasil com a Pedagogia do Sucesso I - Tudo o que o Governador, o Prefeito e o Secretário de Educação precisam saber sobre o fluxo escolar (Disponível em: ).

A rede estadual do RS adotou os programas Se Liga e Acelera Brasil em 2013, conforme notícia na página da secretaria: Programas de correção de fluxo têm formação na Capital Representantes das 27 Coordenadorias Regionais de Educação (CREs) que mantêm turmas de correção de fluxo, por meio dos programas Acelera Brasil e Se Liga, estarão em Porto Alegre na sexta-feira (22) para formação com a Equipe responsável pelos programas na Secretaria de Estado da Educação (Seduc). [...] De acordo com a assessora Luciana Schneider, da Seduc, a expectativa é de que os dois programas estejam em desenvolvimento ao longo do ano. No Acelera Brasil, devem participar 181 escolas, com 213 turmas, reunindo 3.498 alunos. O Se Liga, estará, de acordo com Luciana, em 47 escolas (49 turmas, com um total de 736 alunos). Ambos os programas atendem à defasagem idade/série nos anos iniciais do Ensino Fundamental e são executados na rede em parceria da Seduc com o Instituto Ayrton Senna. A participação das escolas ocorre por adesão, com utilização de material didático-pedagógico específico. (Publicação: 21/02/2013. Disponível em: ).

Em 2014, o Instituto também realizou formação de professores na rede estadual: Se liga e Acelera fazem formação para professores da rede

104 Os projetos Se Liga e Acelera fazem formação para professores de 20 Coordenadorias Regionais de Educação (CREs). [...] Os dois projetos buscam corrigir as distorções entre a idade e a série (ano) que o aluno deveria estar cursando. O Se Liga é voltado para alunos não alfabetizados e o Acelera para estudantes já alfabetizados. A Iniciativa é da Secretaria de Estado da Educação (Seduc), em parceria com o Instituto Ayrton Senna. (Publicação: 14/04/2014. Disponível em: ).

Verificamos que o governo do estado do Rio Grande do Sul, na atual gestão, retornou a parceria com o IAS, que já havia iniciado no governo Yeda Crusius, em 2007, através do Projeto Piloto para Alfabetização proposta a Secretaria Estadual da Educação (Seduc), em parceria com a UNDIME/RS, que contratou três instituições: Instituto Ayrton Senna (SP), Instituto Alfa e Beto (MG), Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação GEEMPA (RS) “[...] visando à construção da matriz de competências e habilidades cognitivas em Leitura/Escrita e Matemática para assegurar sua alfabetização em um ou, no máximo, dois anos letivos, ou seja, aos 6 ou 7 anos de idade”. (Publicação: 14/04/2014. Disponível em: ). O Instituto Ayrton Senna atuou através do Programa Circuito Campeão46. Retornando ao Instituto, destacamos o seu diagnóstico de que a educação pública vai mal; assim, sua missão seria contribuir para superar os problemas do sistema público, partindo do pressuposto de que tem a fórmula para a qualidade e de que, se ela for adotada pelos sistemas, a educação superará os seus problemas: Impulsionados pelo desejo do tricampeão de Fórmula 1 Ayrton Senna, nossa missão é levar educação de qualidade para as redes públicas de ensino no Brasil. Atuamos em parceria com gestores públicos, educadores, pesquisadores e outras organizações para construir soluções concretas para os problemas da educação básica. Nossas propostas se traduzem em políticas e práticas flexíveis que se adaptam a diversos contextos e efetivamente impactam a aprendizagem dos estudantes em grande escala. (Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2015) (grifos da autora).

Verificamos que, a sua missão é “levar a educação de qualidade” ao ensino público. Partindo do pressuposto de que os profissionais da educação não têm competência suficiente e de que basta uma atuação eficiente para resolver os problemas históricos da educação brasileira. E, desse modo, como se fosse o poder público, o Instituto faz diagnóstico e encaminha soluções

46

Ver tese de Raquel Caetano, Relações entre o Público e o Privado: a gestão pedagógica da educação no Programa Circuito Campeão no Instituto Ayrton Senna (2007-2010), que participa do grupo de pesquisa sobre o assunto (CAETANO, 2013).

105 para a educação pública. Destacamos, ainda, que o material é padronizado e replicável, como grifamos acima, se adapta aos diversos contextos. O IAS iniciou com programas complementares no período inverso ao das aulas e, depois, apenas em classes de aceleração, mas passou a influenciar na política educacional como um todo, desde o currículo e a aula até a gestão do sistema e da escola. O Instituto percebeu que, para ter mudanças substantivas, não adiantaria atuar apenas em questões focalizadas, mas na educação como um todo. Portanto, atualmente planeja, monitora e avalia os sistemas públicos. É importante destacar como o público e o privado estavam imbricados desde o início da atuação do Instituto em redes públicas, começando com o Programa Aceleração da Aprendizagem. O Programa foi concebido por João Batista Araújo e Oliveira, secretário executivo do Ministério da Educação e Cultura, no primeiro ano do governo Fernando Henrique Cardoso. Uma instituição do terceiro setor, denominada Centro de Ensino Tecnológico de Brasília (CETEB), executou o Programa com financiamento público. O material didático foi inicialmente desenvolvido em função do convênio com a Fundação Desenvolvimento de São Paulo e contou com o financiamento do Ministério da Educação (PERONI, 2013). Em 1997, o Instituto Ayrton Senna passa a executar o programa em conjunto com o CETEB, iniciando, assim, a atuação do IAS em redes públicas de ensino. A parceria com o CETEB estendeu-se até 2000. Em 2001, o IAS passou a executar o Programa de forma autônoma e expandiu sua atuação com uma sistemática de acompanhamento dos alunos e da gestão escolar através do Programa Escola Campeã, da Rede Acelera. Um dos objetivos apresentados pelo IAS era melhorar a qualidade do ensino fundamental e regularizar seu fluxo, garantindo sucesso na aprendizagem dos alunos. O Programa Escola Campeã concentrou-se em iniciativas que ajudassem a desenvolver, implementar, sistematizar e disseminar metodologias eficientes, visando ao fortalecimento da gestão municipal (ligada às Secretarias Municipais de Educação) e da gestão escolar (voltada às unidades escolares do ensino fundamental municipal). Em 2005, o IAS organiza a Rede Vencer, objetivando gerenciar os sistemas municipais de ensino. A Rede era composta pelos programas: Gestão Nota 10 – presente em toda a rede do ensino fundamental, visava ao gerenciamento das escolas e secretarias para melhoria da qualidade de ensino; Se Liga – alfabetização; Acelera Brasil – regularização do fluxo escolar dos alunos das séries iniciais do ensino fundamental, com defasagem idade-série mínima de

106 dois anos; e Circuito Campeão – gerenciamento da aprendizagem de 1ª a 4ª série do ensino fundamental.

5.2 OS SUJEITOS Conforme apresentamos no capítulo anterior, um foco importante da nossa atual pesquisa são os sujeitos individuais e coletivos que materializam a lógica do privado na educação. Na perspectiva do que analisamos desde o primeiro capítulo, não entendemos as relações entre o público e o privado como abstrações, assim, este item vai apresentar alguns sujeitos que se relacionam nas propostas educativas do IAS. Nas próximas figuras, Raquel Caetano (2013), que participa do grupo de pesquisa, apresenta visualmente as relações estabelecidas pelo Instituto com empresas e também com o sistema público. A diretoria do Instituto é formada pela família Senna, sendo presidente, desde a fundação, a irmã do piloto, Viviane Senna. É interessante constatar que Viviane participa de comitês e Conselhos públicos e privados, que influenciam a educação pública, como, por exemplo, o Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social, instituído pelo Presidente Luís Inácio Lula da Silva em 13 de fevereiro de 2003; é cofundadora e membro do Comitê Executivo do Compromisso Todos pela Educação, do governo federal, no qual coordena a Comissão Técnica responsável pela definição das metas e orientações técnicas; é cofundadora e membro do Comitê Executivo do Movimento de empresários “Todos pela Educação” e participa do Comitê de Investimento Social do Unibanco, entre outros. A figura abaixo demonstra essas relações:

107 Figura 2 – Instituto Ayrton Senna e suas relações

Fonte: Caetano (2013, p. 99).

Conforme legenda criada pela autora: os conselhos consultivos de grandes empresas são representados na cor rosa; as relações com o Governo Federal e com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), indicados pela cor azul; as relações do IAS com empresários e articulistas no seu Conselho Consultivo, expressos na cor amarela; as empresas que cada conselheiro representa, apontadas na cor verde. Na cor laranja, estão indicados a empresária, a empresa e o movimento “Todos pela Educação”, no qual Viviane Senna participa do Conselho de Governança. Observamos aqui que, além da atuação direta nas escolas, o Instituto, através de sua presidente, influencia a direção das políticas educacionais se valendo da sua atuação em várias outras importantes instituições. É o que podemos observar, também, na próxima figura, que apresenta as relações do IAS tanto com instituições empresarias quanto públicas.

108 Figura 3 – Relações do IAS com instituições empresariais e públicas

UNESCO ORACLE INTEL

MICROSOFT BRASIL TELECON

GRENDENE

SIEMENS COELBA NÍVEA SUZANO

CREDICARD INST. VOTORANTIM

IAS VALE DO RIO DOCE

INST. UNIBANCO CELPE HP

COSERN

BRADESCO LIDE-EDH

Secretarias Municipais

Secretarias Estaduais

INST. VIVO SANTA BÁRBARA ENGENHARIA MEC

Fonte: Caetano (2013, p. 101).

A próxima figura apresenta os programas da rede vencer: Se Liga, Acelera Brasil, Escola Campeã, Fórmula da Vitória e Circuito Campeão. Todos operando nas redes públicas de educação e sua relação com instituições empresariais e públicas.

109 Figura 4 – Relações do IAS para a educação formal

Fonte: Caetano (2013, p. 107).

Conforme Caetano (2010), o IAS tem relações com o Ministério da Educação, secretarias estaduais de educação e com o CONSED, como instituição, assim como diretamente com sistemas municipais, mas também com a UNDIME. Para a execução das suas tecnologias educacionais, o Instituto conta com o apoio de várias empresas, como é possível visualizar na figura acima. Além de atuar mais diretamente no conteúdo pedagógico e na gestão, com os Programas apontados acima, o IAS também atua com programas complementares. E, para a execução desses programas, opera em uma rede de relações com empresas, universidades, outros Institutos, como o Unibanco e governos, conforme podemos observar na figura abaixo:

110 Figura 5 – Relações do IAS para a promoção dos programas de educação complementar

Fonte: Caetano (2013, p. 105).

Verificamos, na figura acima, os programas apresentados pelo Instituto: Escola Conectada, Educação pela Arte, Segundo Tempo, Educação pelo Esporte e Super Ação Jovem e suas redes de relação para implementação. Observamos, inclusive, que os programas são beneficiados pela Lei Rouanet, via Ministério da Cultura. A seguir, o foco será o conteúdo da proposta apresentado pelo Instituto através de seus programas mais relevantes.

5.3 O CONTEÚDO DA PROPOSTA O IAS vincula a aprendizagem à gestão das escolas. Entende que a escola deve possuir uma gestão gerencial, rigidamente monitorada e com atividades padronizadas, através de aulas prontas e uma rotina. O foco deve ser na matemática e língua materna, que são as atividades avaliadas nas provas nacionais, e que a aprendizagem é um produto, que pode ser mensurado através dos resultados das avaliações e metas pré-estabelecidas. Os programas do IAS, seguindo essa lógica, apresentam um material com forte conteúdo prescritivo.

111 Através dos objetivos da Rede Vencer, verificamos algumas concepções de pedagogia, currículo e avaliação do Instituto: (I) Institucionalizar práticas gerenciais no cotidiano escolar que proporcionem a substituição da ‘cultura do fracasso’ pela ‘cultura do sucesso’; (II) Instituir o planejamento da prática pedagógica a partir da avaliação do processo ensino aprendizagem; (III) Capacitar equipes da Secretaria e das unidades escolares para que todos desempenhem suas funções e atribuições com foco em resultados e metas, assumindo as respectivas responsabilidades pelo resultado da aprendizagem de cada um dos alunos; e, (IV) Gerar oportunidade de desenvolvimento profissional para as equipes escolares, de forma a viabilizar a ampliação de conhecimentos, especialmente no campo da leitura, da escrita e da matemática, bases para a aprendizagem de todas as áreas do conhecimento humano. (ADRIÃO; PERONI, 2010, p. 319).

No Programa Circuito Campeão, que trata da alfabetização, os fluxos das aulas são enviados ao IAS, pela coordenadora municipal, desde o primeiro dia de aula até o final do ano letivo, em dezembro, sendo que as escolas devem informar os temas, as habilidades e as competências que serão desenvolvidos em cada dia do ano. O planejamento prévio, denominado no programa de fluxo de aula, é planejado para os 200 dias letivos, antecipadamente. Ao fazer seu planejamento, o professor deve observar os passos do programa Circuito Campeão denominado de rotina. Na acolhida, o aluno deve sempre estar motivado. O segundo passo é a formação do hábito de leitura que dura, no mínimo, 20 minutos e, no máximo, 40 minutos. Todos os dias é preciso trabalhar uma leitura, de várias maneiras: lê-se uma história aos alunos ou eles próprios leem os livros indicados pelo programa, uma vez que os educandos são acompanhados na leitura e na escrita com frequência. Além disso, há um cartaz de livros lidos afixado na sala de aula, sendo também um indicador de resultado (CAETANO, 2013). No programa Gestão Nota Dez, os dados (notas, avaliações, presenças, metas alcançadas) são coletados pelo professor, que faz o acompanhamento individual dos alunos e repassa as informações para a direção. O diretor, por sua vez, faz um relatório consolidado dos dados, analisando-os para verificar se as metas propostas foram alcançadas pelos alunos. Esse material é enviado para a SMEC, que, então, faz outro material consolidado das escolas municipais. O material é enviado ao IAS, através do Sistema Instituto Ayrton Senna de Informação (SIASI), o qual, de acordo com os resultados, manda o material específico. Os dados sobre desempenho, frequência e cumprimento das metas de alunos e professores são repassados mensalmente. Dessa maneira, indicadores de sucesso, diagnósticos da realidade educacional, relatórios de acompanhamento, intervenção e avaliações de processo e de resultado pautam o trabalho técnico realizado. O IAS decide sobre o conteúdo e monitora os

112 resultados e, ainda, conforme verificamos no quadro 5, o Instituto determina as tarefas de cada um no sistema educativo. Quadro 5 – Responsabilidades dos gestores no programa Gestão Nota 10 Adotar o programa como política pública, isto é, como proposta de estruturação da Secretaria de Educação para a prática da equidade e da qualidade da aprendizagem, no estado ou no município. Garantir a adoção dos instrumentos legais necessários à implantação da política educacional definida. Assegurar os recursos humanos, materiais e financeiros compatíveis com o programa e com a política educacional estabelecida. Priorizar os aspectos técnicos em detrimento dos político-partidários. Acompanhar os resultados e o cumprimento das metas definidas pela Secretaria de Educação. Delegar ao Secretário de Educação a execução do programa, dando-lhe a autonomia e o apoio que a função exige. Secretário de Alinhar-se com as determinações do governo/prefeito e assegurar o programa Gestão Nota 10 como ação estrutural da Secretaria de Educação. educação Diagnosticar/conhecer o perfil de atendimento da rede de ensino e dos alunos. Integrar as redes de ensino. Garantir diretores de escola com competência técnica, selecionados por provas, comprometidos com a política da Secretaria de Educação e responsabilizados pelos resultados e alcance das metas. Integrar ações, resultados e práticas dos projetos às demais ações da secretaria. Garantir o cumprimento do mínimo legal de 200 dias letivos/800 horas. Adotar EJA para os maiores de 15 anos. Adotar política de alfabetização para a 1ª série do Ensino Fundamental. Acompanhar o desenvolvimento e os resultados do programa. Coordenador Analisar a implementação da política educacional. do programa Subsidiar as decisões da Secretaria de Educação com os dados relevantes à política Gestão Nota educacional. Atuar ativamente no processo de definição das metas relativas a cada indicador do 10 sucesso educacional. Receber e analisar o consolidado dos dados referentes ao funcionamento e à autonomia de todas as escolas. Gerenciar mensalmente o alcance das metas pelas escolas. Acompanhar o desenvolvimento das ações e analisar os dados consolidados do programa, de forma integrada e articulada com os demais setores/coordenações da Secretaria de Educação. Apoiar, fortalecer e orientar em serviço os superintendentes escolares para o alcance das metas do seu grupo de escolas, com base nas informações por eles levantadas e também na observação direta sobre as escolas. Rever sistematicamente a aplicabilidade das normas e leis educacionais, com vistas à melhoria contínua dos resultados e ao alcance das metas. Garantir a implementação da política educacional definida pela Secretaria de Diretor Educação. Implementar as autonomias administrativa e pedagógica, e a gestão financeira na escola, de acordo com o estabelecimento pela Secretaria de Educação. Responsabilizar-se pelos resultados da escola. Coletar, analisar e consolidar os dados referentes ao funcionamento da escola e repassá-los ao superintendente escolar.

Governador/ Prefeito

113

Superintende nte Escolar

Acompanhar e avaliar a atuação e o resultado do trabalho do coordenador pedagógico da escola e dos professores. Liderar os membros da comunidade escolar no alcance das metas da escola. Trabalhar em conjunto com o superintendente escolar na constante busca da melhoria da qualidade da aprendizagem. Acompanhar a implementação da política educacional municipal/estadual. Ser o elo entre a escola e a Secretaria de Educação no processo de implementação das ações do programa. Acompanhar, nas escolas, sob sua responsabilidade, a implementação das autonomias administrativa e pedagógica, e da gestão financeira. Pactuar com o diretor, no início do ano, as metas da escola, de acordo com as metas definidas pela Secretaria de Educação para a rede de ensino. Responsabilizar-se, conjuntamente com o diretor, pelo cumprimento do calendário escolar, pelos resultados e pelo alcance das metas da escola. Apoiar o diretor na integração e articulação dos projetos desenvolvidos na unidade escolar, tais como: Se Liga, Acelera Brasil, Circuito Campeão e Gestão Nota 10. Gerenciar mensalmente o alcance das metas do grupo de escolas sob sua responsabilidade, por meio das rotinas da Sistemática de Acompanhamento. Avaliar o desempenho e fortalecer a liderança do diretor, assim como capacitá-lo em serviço para atuar de forma integrada com a comunidade escolar.

Fonte: Material distribuído pelo IAS para encontro de formação com os parceiros do Programa Gestão Nota 10 – (COMERLATTO, 2013, p. 134).

No quadro apresentado por Comerlatto (2013), também integrante de nosso grupo de pesquisa, podemos visualizar as tarefas que o IAS determina a todas as instâncias de decisão, desde o secretário de educação, professor, diretor, pais, até o professor. É o que comentamos no capítulo anterior sobre os processos de direção e execução vivenciados nas parcerias, já que o Instituto prescreve e os profissionais da educação executam, inclusive os formuladores de políticas públicas. Comerlatto ressalta, através dos grifos no quadro, o caráter prescritivo adotado pelo IAS: Justifica-se, assim, o porquê de a maioria das ações assumirem caráter passivo, de instrumentalização de uma proposta heterônoma, como se observa pelos verbos que indicam as ações dos responsáveis, tais como: o governador/prefeito deve adotar, garantir, assegurar, priorizar e delegar; o secretário da educação deve alinhar-se, garantir e adotar; o coordenador do Gestão Nota 10 deve subsidiar, gerenciar e apoiar; o diretor deve garantir, implementar, responsabilizar-se, liderar e trabalhar; o superintendente escolar deve pactuar, responsabilizar-se, apoiar, gerenciar e avaliar. (COMERLATTO, 2013, p. 136).

Como já mencionamos, a pesquisa nacional contou com 10 grupos, cada um de um estado brasileiro. Aqui apresentaremos, como exemplo, o município de Sapiranga, no Rio

114 Grande do Sul, por ter sido onde realizamos a pesquisa empírica47. A parceria, nessa rede municipal, iniciou em 1997 e terminou em 2007. Nesse ano, mudou a administração municipal e foi realizada uma consulta na comunidade escolar para decidir sobre a sua continuidade. É importante destacar que apenas após 10 anos a comunidade foi consultada e então decidiu que não desejava essa parceria (PERONI, 2011). A parceria iniciou com o Programa Acelera Brasil, através de uma Lei Municipal que autorizou o Executivo Municipal a firmar convênio com o IAS. Desde o início da parceria, constatamos o total controle estabelecido pelo IAS, como é possível constatar no parágrafo primeiro da Lei, que estabelece o convênio: “O IAS se reserva o direito de fiscalizar o andamento do Projeto realizando auditorias, exames e verificações de cumprimento dos prazos e certificação do alcance das etapas, através de seus representantes devidamente credenciados.” (SAPIRANGA, 1997, p. 2). É possível verificar o conteúdo gerencial da proposta, quando ainda declara que “Os professores e coordenadores integrantes do Programa serão capacitados na pedagogia do sucesso.” (SAPIRANGA, 1997, p. 7). Ou ainda: “O município indicará um profissional de educação, que assumirá a gerência do Programa na localidade.” (SAPIRANGA, 1997, p. 7) (grifos da autora). Em outra Lei Municipal, são estabelecidos os princípios da Gestão Democrática no município, e a Pedagogia do Sucesso está presente, assim como conceitos caros à administração gerencial: I - Igualdade de condições de acesso e permanência na escola; II - compromisso com a promoção de uma educação voltada para a pedagogia do sucesso; III - compromisso com a eficiência de todos os alunos das unidades de ensino; IV - participação dos segmentos da comunidade escolar em entidades e conselhos escolares; V - autonomia das unidades de ensino nas dimensões administrativa, pedagógica e financeira; VI - garantia do padrão de qualidade; VII - transparência e eficiência em todas as etapas do processo da gestão democrática. (SAPIRANGA, 2003, p. 1) (grifos da autora).

Outra Lei Municipal cria a premiação Aluno Nota Dez para estudantes do ensino fundamental e médio nas redes municipais de ensino:

47

Pesquisa Novos contornos da parceria público/privada na Gestão da Escola Pública. Relatório disponível em: . (PERONI, 2011).

115 Art. 1º Fica criada a premiação ‘Aluno Nota Dez’, ao final de cada ano letivo, para os cursos fundamental e médio, das três redes de ensino do Município de Sapiranga. Art. 2º Será selecionado um aluno de cada escola que obtiver no boletim o maior número de nota dez. Art. 4º O Diretor(a) de cada Escola informará ao Poder Legislativo Municipal, no final de cada ano, o aluno nota dez da respectiva escola (SAPIRANGA, 2003a, p. 1).

Observamos que o IAS assume a direção e o controle da política educativa municipal através da legislação, desde o documento que estabelece o convênio. Assim, os termos e instrumentos de gestão ficam incorporados ao município para além do período da parceria. Apesar de a lei ser denominada de gestão democrática, os princípios de gestão incorporam a lógica do gerencialismo, trabalhado no capítulo anterior, com o individualismo através do sucesso pessoal, a premiação, estimulando a competitividade e a incorporação de uma lógica de eficiência mais vinculada ao produto do que aos processos. O monitoramento e controle ocorre via registro dos dados educacionais, que é feito no Sistema Instituto Ayrton Senna de Informação (SIASI). Conforme o IAS: O SIASI registra as informações educacionais dos municípios parceiros por meio da coleta de dados das escolas e da sua consolidação no âmbito das secretarias de educação. O sistema visa a permitir a rápida tomada de decisão a partir de relatórios de análise e de intervenção, visando à melhoria da aprendizagem e o sucesso do aluno. (Disponível em: . Acesso em: 28 out. 2007).

Ainda na página do Instituto, está descrita a abrangência do Sistema de Informação: O SIASI - Gestão de Rede permite o gerenciamento online da estrutura física e acadêmica das redes de ensino, como cadastro e manutenção dos dados das unidades educacionais, dos alunos e dos servidores da rede. O sistema é dividido em três módulos: Rede de Ensino, Servidor e Aluno que permitem o controle e a automatização das rotinas administrativas, como número de unidades e ambientes, matrícula de alunos, acompanhamento da vida profissional dos servidores/funcionários, além de fornecer dados para os processos de tomada de decisão. Conheça alguns recursos do sistema: Controle da Rede Física: permite o controle de todas as unidades funcionais, internas e externas, da rede de ensino bem como o registro de suas características físicas e hierarquias funcionais, e ainda o cadastramento de informações necessárias ao pleno funcionamento das unidades escolares, tais como calendários, cursos, turmas, grades curriculares, dentre outras. Controle Acadêmico: permite o controle da vida acadêmica dos alunos, desde a matrícula até o encerramento de cada período letivo. Disponibiliza ainda recursos que facilitam a operação e o gerenciamento do dia a dia das escolas. Controle de Servidores: permite o controle do quadro de servidores da rede de ensino, possibilitando o registro do histórico da vida funcional do servidor individualmente. Fornece recursos à Secretaria da Educação no sentido de agilizar processos, tais como: cálculo de vagas, movimentações, atribuição de aulas, concurso de remoção automatizado, dentre outros. Serviço Wap: permite consultar frequência e boletim de notas e conceitos dos alunos da rede através de dispositivos móveis.

116 De forma ágil e funcional, a solução amplia o espaço escolar, conectando todos os envolvidos no processo educacional. (Disponível em: . Acesso em: 2 dez. 2015).

Verificamos, ainda, que o município paga uma taxa para inserir os dados nesse sistema e, quando o contrato é encerrado, o município não tem mais acesso aos seus próprios dados. Sobre o SIASI, a coordenadora ressalta como é feito o controle sistemático para que as metas sejam atingidas:

Assim se tem hoje a sala, a série, quantos livros lidos/mês e quantas faltas, e esse acompanhamento temos mensalmente hoje dentro da Rede Vencer, e isso é inserido mensalmente no sistema do SIASI (Sistema de Informação do Instituto Ayrton Senna). Tu tens um raio-x completo das escolas, de tudo que lá acontece, e os indicadores que não estão bem (turma com índice de faltas, turma com baixo nível de leitura, tantos alunos que ainda não escrevem lá nas séries iniciais) de fazer um trabalho mais pontal, mês a mês, de ir conversando, de ir trabalhando em cima desses indicadores, buscando o quê? Atingir a meta no final do ano. Cada escola traçou o seu plano de metas, a secretaria tem o seu, em cima dos resultados do ano anterior, busca-se alcançar esses resultados agora. (Coordenadora do município A, 2006, Entrevista).

No caso estudado, o IAS relaciona o controle de qualidade aos produtos das avaliações e controle rígido do trabalho do professor, mensurável na plataforma virtual do SIASI. Young alerta para o perigo do currículo definido por avaliações: Na minha visão, se o currículo for definido por resultados, competências ou, de forma mais abrangente, avaliações, ele será incapaz de prover acesso ao conhecimento. Entende-se conhecimento como a capacidade de vislumbrar alternativas, seja em literatura, seja em química; não pode nunca ser definido por resultados, habilidades ou avaliações. (YOUNG, 2014, p. 195).

O acompanhamento do trabalho dos professores dá-se por meio de visitas semanais do supervisor e de sua participação em reuniões quinzenais para avaliação, troca de experiências e planejamento, junto com outros professores. Os cursos de capacitação são a distância. Há uma coleta diária de informações sobre a frequência de alunos e professores, de abandono dos alunos, de registro de visitas dos supervisores, de participação dos professores nas reuniões quinzenais e até do número de livros lidos pelos alunos. Esse acompanhamento constante restringe em muito a autonomia do professor. A diretora da escola estudada ressalta a competitividade estimulada entre as escolas e as turmas dentro de uma mesma escola:

[...] tinha que mandar as planilhas e esta competição que gerou não foi legal. Tanto é que depois a SMED parou, era nomeado, era colocado escola tal e a colocação, 1º, 2º, 3º, último lugar, e a gente começou a

117 ficar mal, voltava da reunião, nossa, fiquei em último lugar, e depois tinha as provas, o instituto aplicava as provas, as avaliações externas, para ver em que nível os alunos estavam, a gente aplicava, e depois vinha os resultados das provas, e também tal lugar. (Diretora do município B, 2007, Entrevista).

Algumas conquistas históricas nacionais dos educadores na gestão democrática foram vinculadas pelos professores ao IAS, conforme a secretária de educação do município B:

Uma coisa que eu notei foi que se criam muitos mitos em cima de um convênio e que os professores, e é uma culpa nossa, a gente não vai atrás para ver o que é real e o que não é. Quando a gente falou em romper a parceria, as escolas diziam que elas não poderiam romper, porque aí elas perderiam a questão da autonomia financeira das escolas. E eu dizia, não vocês não vão perder, e as escolas diziam, não, nós vamos. O que aconteceu, quando veio o IAS, foi criado a autonomia financeira, e elas achavam que, ao terminar o convênio, elas perderiam a questão da autonomia financeira, perderiam o convênio do auxílio faculdade, elas atrelaram todos estes pontos ao IAS. (Secretária de Educação município B, Entrevista, 2007).

A professora do município B também adverte que havia uma pressão para os professores seguirem normas, pois eram vinculadas ao financiamento, como se o município recebesse pela parceria e, ao contrário, o município paga para colocar os dados no SIASI e comprar o material:

[...] a gente não sabia o que vinha exatamente do IAS e o que já era uma decisão da própria secretaria de educação, tudo era tratado como uma decisão do IAS, a gente está fazendo isso porque o instituto pediu, a gente tem que fazer porque o instituto investe na escola, a gente tem que fazer porque é uma exigência do instituto para passar verba para a educação, chegando aqui a gente descobriu que nem existia esse investimento do Instituto na rede de ensino municipal. (Professora 1 do município B, Entrevista, 2007).

Quanto à compra do material didático, a coordenadora do município B diz que:

Estes livros, no caso, nos primeiros quatro anos nós recebemos este material do Instituto Ayrton Senna, e depois disso, nós começamos a comprar este material da editora, que é Editora Global, como é um grande número de livros que eles têm que imprimir, enfim... A gente compra por unidade, eu não sei o valor preciso, mas acho que está em torno de R$35,00 ou R$55,00 o KIT. (Coordenadora do município B, Entrevista, 2007).

Outro ponto abordado pela professora foi a avaliação, que era feita pelo próprio IAS. Entendemos que a avaliação era realizada em parte para ter o controle sobre o Programa, mas também pela concepção de que a avaliação é indutora da qualidade e que as pessoas vão se esforçar mais se forem monitoradas o tempo todo. E, ainda, o fato de a avaliação vir pronta do IAS é outro ponto polêmico, já que muito se avançou nos debates acerca da avaliação do processo de aprendizagem e não apenas através de uma prova:

118

[...] a gente tinha, nos meses de abril e setembro, uma avaliação que vinha pronta do instituto, os meus alunos de 1ª série preenchiam 05 páginas de português e 05 páginas de matemática. [...] e em nenhum momento aquele material pedagógico era discutido, ou era debatida alguma alternativa para buscar a melhora que não foi atingida naquela avaliação. (Professora 1 do município B, Entrevista, 2007).

Até mesmo o conteúdo a ser trabalhado em sala de aula é totalmente controlado:

[...] a gente tinha uma lista de conteúdos que a gente tinha que seguir à risca. Então, quando o supervisor entrava na sala, ele olhava qual era o número do dia letivo, qual era o subprojeto e qual era a aula. Então, por exemplo, eu tinha dois dias para trabalhar o Símbolo da Páscoa, mas não interessava se os meus alunos estavam interessados em estudar mais. [...] Os temas já vinham definidos, era obrigado, tu não debatias com o aluno o que ele queria estudar. Tu tinhas que, a partir daquele dia, trabalhar aquela temática e durante aquele período que tinha sido predefinido – e ai de ti se não fizesse certo. (Professora, 2007, Entrevista).

Assim como as avaliações mantêm um controle sobre o trabalho do professor, também as aulas prontas partem de uma concepção de que os professores não são capazes de planejar suas tarefas e, por isso, devem receber tudo pronto, como é explicitado pela própria Viviane Senna, presidente do Instituto: Os materiais são fortemente estruturados, de maneira a assegurar que mesmo um professor inexperiente, ou com preparação insuficiente – como é o caso de muitos professores no Brasil – seja capaz de proporcionar ao aluno um programa de qualidade, com elevado grau de participação dos alunos na sala de aula, na escola e na comunidade. (SENNA, 2000, p. 146).

Como diz Viviane Senna, os conteúdos são “fortemente estruturados”, o que se configura como um retrocesso na autonomia da escola e do professor e, assim, no processo de democratização da educação. Concordamos com a crítica de Young (2014) sobre os professores serem instruídos sobre o que ensinar: Nenhum professor quer soluções da teoria do currículo – no sentido de ‘ser instruído sobre o que ensinar’. Isso é tecnicismo e enfraquece os professores. Contudo, como em qualquer profissão, sem a orientação e os princípios derivados da teoria do currículo, os professores ficariam isolados e perderiam toda autoridade. Em outras palavras, os professores precisam da teoria do currículo para afirmar sua autoridade profissional. (YOUNG, 2014, p. 195).

Verificamos na pesquisa nacional, após o término da parceria nos dez estudos em diferentes estados, que as práticas estabelecidas pelo instituto foram incorporadas tanto nas secretarias de educação como nas escolas. Em alguns casos, inclusive, na legislação do próprio

119 município, conforme demonstramos neste capítulo, com o exemplo do estudo no Rio Grande do Sul48. É possível perceber, através dos estudos de caso, que o IAS influenciou na gestão do Sistema e da escola, modificando o desenho institucional, a legislação, a concepção de gestão, estabelecendo hierarquias e, principalmente, retirando a possibilidade de liberdade de ensino, já que havia controle tanto das metas, quanto das rotinas de todos: Secretário de educação, pessoal da secretaria da escola, coordenador pedagógico, diretor, aluno. Em alguns casos, a parceria acabou, mas a legislação permanece, em outros, as rotinas permanecem nas escolas ou a lógica encontra-se subjacente ao previsto no Projeto Político Pedagógico ou similar. (ADRIÃO; PERONI, 2011, p. 51).

Verificamos no estudo a ausência de preocupação do IAS em estabelecer diálogo com a comunidade escolar. Destacamos que não são mudanças apenas de natureza técnica, mas na gestão, no currículo, nas concepções e objetivos, o que temos chamado, em nossas últimas pesquisas, de “conteúdo da educação”. O título do relatório anual do Instituto em 2012 é Educação de qualidade, da metrópole até a floresta. Com o Instituto Ayrton Senna, redes públicas de ensino ampliam horizontes para crianças e jovens de todos os cantos do Brasil. O material é padronizado, desse modo, o mesmo material é usado para escolas indígenas da região amazônica ou para um município urbano em São Paulo ou Rio Grande do Sul, a mesma concepção padronizada e replicável, que constatamos em nossa pesquisa nacional, que abrangeu dez estados brasileiros com características muito diferentes (ADRIÃO; PERONI, 2010), conforme apresentamos na primeira parte do estudo sobre o IAS. Questionamos o conteúdo dessa proposta, padronizada e replicável, neste período atual do capitalismo, de reestruturação produtiva, que necessita de um trabalhador flexível, que saiba pensar, trabalhar em equipe, exatamente o contrário do material proposto na parceria.

5.4

PROPOSTAS ATUAIS DO IAS

Além de continuar com os programas da Rede Vencer, descritos no item anterior, o IAS está atuando em uma nova proposta, denominada Educação Integral, que tem o foco no que chamamos de conteúdo da proposta: Adotamos um conceito de ‘educação integral’ que ultrapassa a ideia de ‘educação em tempo integral’, na medida em que não se limita à ampliação da jornada escolar, mas pressupõe uma mudança de visão do que seja o papel da escola.

48

Ver também os estudos de Pires (2009).

120 Nessa nova visão, a escola deixa de ser vista como ‘transmissora de conteúdos’ e passa a ser concebida como mediadora no desenvolvimento de competências para a vida. Isso significa que, além de ensinar a ler, escrever e conhecer o conteúdo das disciplinas, a escola deve preparar os alunos para se inserirem plenamente no mundo do trabalho, da cidadania e das relações sociais. (Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2015).

O Instituto pretende atuar em todas as etapas do processo educacional, o que discutimos no capítulo anterior sobre a direção e execução das políticas educativas, determinando o conteúdo da proposta, como constatamos abaixo nas palavras do próprio Instituto: Para que essa educação integral seja possível, conferimos um olhar sistêmico sobre o processo educativo, trabalhando para qualificar a oferta educacional em todas as suas etapas: desde a produção de novos conhecimentos sobre ‘o que’ e ‘como’ ensinar e aprender, passando pelo desenho de modelos pedagógicos, de gestão, tecnologia e avaliação, até a sua operacionalização nas redes de ensino. (Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2015).

Para operacionalizar sua proposta, o IAS apresenta três iniciativas vinculadas à educação integral: A Inovação que é composta pelo eduLab2149, Ideias e Tendências, Estudos e Pesquisas; Soluções Educacionais, composta pelas políticas e práticas na escola, como Ensino Médio, Ensino Fundamental – anos finais, Políticas de Aprendizagem Escolar, Soluções de Avaliação. E, por último, a Articulação composta por Políticas Públicas, Fóruns, Seminários e Parcerias Educacionais. Para Caetano (2015), o IAS redimensionou seu foco de atuação, passando também a atuar no Programa Educação para o século 21, cujo objetivo principal é trabalhar as competências socioemocionais a partir do Paradigma do Desenvolvimento Humano, proposto pelo PNUD e pelo Relatório Delors, organizado pela Unesco. Foi com apoio dos organismos multilaterais, como a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que se passou a produzir conhecimento para apoiar governos e instituições a criarem políticas e práticas voltadas intencionalmente para a promoção dessas competências. Partindo de métodos específicos para esse fim, o IAS estabeleceu relações com diversas instituições para desenvolver o programa Educação para o Século 21.

49

Ver anexo 4.

121 Figura 6 – Programa Educar para o Século 21

Fonte: Elaborado por Caetano (2015, p. 5).

Ainda conforme a autora, o programa Educar para o Século 21 possui três grandes áreas de atuação: a inovação, as soluções educacionais e a articulação, como ficou demonstrado na figura 6. No item “ideias e tendências”, o Instituto propõe Ciência para Educação e as polêmicas Competências socioemocionais50: Formar crianças e jovens para o século 21 requer o desenvolvimento de um conjunto de competências necessárias para aprender, viver, conviver e trabalhar em um mundo cada vez mais complexo. Além das competências relacionadas ao letramento, numeramento e aos diversos conteúdos curriculares, fazem parte desse conjunto as chamadas competências socioemocionais, como responsabilidade, colaboração e curiosidade. (Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2015).

Dada a importância que as competências socioemocionais assumem na proposta do IAS, e as possibilidades que influenciam a política educacional, abordaremos em item separado, abaixo.

50

Sobre o tema competências socioemocionais ver Smolka, Laplane e Magiolino (2015) e carta Aberta da ANPED sobre o assunto. Disponível em: . E a moção do VSEB CEDES contra a mensuração de competências socioemocionais como política pública. Disponível em: .

122

5.5

COMPETÊNCIAS SOCIOEMOCIONAIS O IAS encomendou o estudo, Desenvolvimento socioemocional e aprendizado escolar:

uma proposta de mensuração para apoiar políticas públicas, em parceria com a OCDE e a Secretaria Estadual do Rio de Janeiro, que apresenta o programa de medição socioemocional e foi batizado de SENNA (Social and Emotional or Non-cognitive Nationwide Assessment). É baseado em características socioemocionais sobre a vida das pessoas, agrupando as evidências disponíveis segundo os cinco grandes domínios de personalidade, conhecidos como Big Five: 1. Abertura a novas experiências; 2. Conscienciosidade (ser organizado, esforçado e responsável); 3. Extroversão (definida como a orientação de interesses e energia em direção ao mundo externo e pessoas e coisas); 4. Amabilidade; 5. Estabilidade Emocional ou Neuroticismo (definida como a previsibilidade e consistência de reações emocionais, sem mudanças bruscas de humor). Em entrevista, Viviane Senna diz que estão treinando os professores que participam da fasepiloto da pesquisa para que estimulem seus alunos nas características adequadas ao sucesso escolar. Questionamos como uma psicóloga, que não exerce nenhum cargo público, não é formada em educação, tem tamanho poder para definir o que “acha”, de acordo com a sua formação, ser o melhor para a educação brasileira e com apoio da OCDE? É a presença do que destacamos como os sujeitos individuais e coletivos na direção das políticas educativas. E, da mesma forma o conteúdo da proposta, afinal, além de definir o que deve ser ensinado, ainda deve “formatar” as características socioemocionais,

moldando-as de acordo com o que se julga ser adequado p ara não questionar as contradições da sociedade que se vive. E, além disso tudo, fazem uma avaliação para ter o controle não só do conhecimento, mas também da subjetividade dos estudantes.

Para garantir que todas as crianças e jovens tenham acesso a uma educação de qualidade, que realmente prepare para os desafios que encontrarão ao longo da vida, trabalhamos para promover a ‘educação integral’ nas redes públicas do Brasil, com foco no ensino fundamental e médio. (Disponível em: . Acesso em: 16 nov. 2015).

Como parte da proposta Educação para o Século 21, o IAS reúne uma rede multidisciplinar de parceiros, como universidades, pesquisadores, fundações e organizações internacionais. É importante destacar que, conforme notícia veiculada na sua página, está

123 encaminhando junto ao CNE o PROJETO CNE/UNESCO: o desenvolvimento das habilidades socioemocionais como caminho para a aprendizagem e o sucesso escolar de alunos da educação básica: Neste estudo, a pesquisadora Anita Abed fornece subsídios ao CNE (Conselho Nacional de Educação) para a elaboração de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento das competências socioemocionais nas instituições escolares. A autora ancora a transformação da escola na construção do desenvolvimento integral dos estudantes e explicita caminhos concretos para o professor incluir, com intencionalidade, o desenvolvimento socioemocional na sua prática pedagógica. (Disponível em: . Acesso em: 19 dez. 2015).

E o mais grave é que o estudo subsidiou um parecer que está em tramitação no Conselho Nacional de Educação sobre o papel das competências na educação básica, conforme notícia veiculada pelo Instituto em sua página: [...] o estudo ‘O desenvolvimento das habilidades socioemocionais como caminho para a aprendizagem e o sucesso escolar dos alunos da educação básica’, encomendado pelo Conselho Nacional de Educação para subsidiar um parecer sobre o papel das competências na educação básica. (Disponível em: . Acesso em: 20 nov. 2015).

Além de estar articulado com o Conselho Nacional de Educação, o IAS também imprimiu a ideia de competências socioemocionais no documento da Secretaria de assuntos Estratégicos, Pátria Educadora (2015), que, no item em que discute as mudanças no paradigma curricular e pedagógico do ensino básico, traz o tema A essência da mudança necessária é a substituição progressiva de decoreba enciclopédica por capacitação analítica. A primazia deve caber sempre às capacitações analíticas: interpretação e composição de texto e raciocínio lógico. A reorientação deve ter três focos: a prioridade dada no currículo a aprofundamento seletivo, a atenção a capacitações analíticas e o enfrentamento das inibições précognitivas (comumente chamadas de socioemocionais) ao domínio das capacitações analíticas. São as capacitações de comportamento, sobretudo as de disciplina e de cooperação. (BRASIL, 2015, p. 10, grifo da autora). 3. Capacitações pré-cognitivas Grande parte da massa de alunos pobres no país enfrenta obstáculos que podem parecer intransponíveis em subir a escada das capacitações analíticas. São as inibições, às vezes chamadas socioemocionais, que barram o caminho. [...] Dois conjuntos destas capacitações merecem atenção maior: as de disciplina e as de cooperação. Ambas são indispensáveis para aproveitar o tipo de ensino que aqui se propõe. Disciplina inclui poder de concentração nas tarefas da aprendizagem, e, portanto, determinação de manter rotina de trabalho, habilidade para hierarquizar as tarefas em ordem de importância e de premência, disposição para organizar o tempo e para tratar o futuro como presente, dedicação ao cumprimento dos compromissos e energia para

124 reprimir distrações e tentações. No fundo existencial da disciplina está a aliança entre a ambição e a autoestima. (BRASIL, 2015, p. 14, grifo da autora).

Verificamos que o conteúdo da proposta51, competências sócio emocionais, desenvolvido pelo Instituto Airton Senna é incorporado pelo setor público através de uma secretaria estratégica de governo. Justificamos a incorporação de um item sobre este assunto na tese pela possibilidade de incorporação deste tema à política educacional e finalizamos o item ressaltando que o IAS já está influenciando no Conselho Nacional de Educação, assim como no documento Pátria Educadora, apresentados acima. Destacamos, ainda, que entendemos a ampliação do acesso como direito à educação e, nesse sentido, acesso não apenas à matrícula, mas ao conhecimento. As competências socioemocionais deslocam o foco para características adestradoras, instrumentais à sociedade do capital, desenvolvendo o que Apple (1989) denomina de currículo oculto da escola e, Enguita (1989), de face oculta da escola.

5.6

FINANCIAMENTO DO IAS Apesar de não ser o foco central da pesquisa, a questão do financiamento do IAS é

relevante, pois revela sua rede de relações públicas e privadas, assim como exemplifica o que Ball e Olmedo (2013) denominam filantropia 3.0, a relação entre a doação e o lucro, por isso, apesar das dificuldades enfrentadas para a coleta de dados consistentes, apresentaremos, neste item, o que ao longo das pesquisas conseguimos coletar. Uma das questões importantes, não apenas para o IAS, mas para a relação entre o público e o privado, envolvendo o terceiro setor, é a renúncia de receitas, pois é um recurso que deixa de entrar para os cofres públicos e que seria destinado à educação pública via vinculação de verbas. O IAS recebe volumosas doações, como a que verificamos durante a pesquisa anterior, no Seminário Educação Pública de Qualidade para um Brasil Melhor, no 7º Fórum Empresarial de Comandatuba: Em um momento onde a emoção tomou conta de todos, empresários doaram a quantia de R$ 5.770.000,00 ao Instituto Ayrton Senna e LIDE EDH, em apenas 10 minutos de seminário. Este valor é recorde absoluto entre todas as edições do evento e será utilizado em projetos para a recuperação do ensino público nos quatro cantos do País. 51

Conteúdo da proposta é o termo utilizado nesta etapa da pesquisa para analisar qual é o conteúdo das instituições privadas que influenciam a educação pública.

125 Somente um empresário, que preferiu o anonimato, doou R$ 600 mil (Disponível em: . Acesso em: 15 jul. 2008).

O Instituto realiza inúmeras companhas de doação de recursos. Na sua página há um item que trata apenas de doações. O IAS convence os doadores com o argumento de que todos têm a responsabilidade sobre a qualidade do ensino público, mas também com a teoria do capital humano, de que assim investiremos no futuro das pessoas e no desenvolvimento do País: Ser um doador do Instituto Ayrton Senna é participar de forma ativa para uma melhor educação e formação de nossas crianças e jovens que estão no ensino público. O resultado é pessoas mais capacitadas, com mais oportunidades para ter uma profissão melhor, uma vida melhor e assim construirmos um país mais forte para todos. (Disponível em: . Acesso em: 23 nov. 2015).

E segue apresentando formas de contribuição física e jurídica ao Instituto para que cumpra tão importante tarefa. A pessoa física pode contribuir: 1. Doando dinheiro 2. Adquirindo produtos ou serviços relacionados à causa através de Grandes marcas que são parceiras do Instituto e revertem parte da renda obtida com a comercialização de seus produtos e serviços às nossas soluções educacionais. 3. Doando pontos do cartão de crédito Multiplus, Dotz ou Citi Auto Rewards 4. Nota Fiscal Paulista - os tributos fiscais se transformam em soluções educacionais. 5. Arredondamento de troco - nas suas compras online 6. Adquirindo produtos na Ayrton Senna Shop - canal oficial de vendas online 7. Adquirindo produtos da marca Ayrton Senna 8. Adquirindo produtos Senninha 9. Participando de Campanhas e Eventos como a Maratona de Revezamento Ayrton Senna Racing Day. Ao adquirir o kit do atleta para participar da maratona, contribui com os programas do Instituto Ayrton Senna. (Disponível em: . Acesso em: 23 nov. 2015).

A pessoa jurídica pode contribuir com o IAS 1. Investindo nas soluções educacionais 2. Sendo parceiro de marketing relacionado à causa - O Marketing Relacionado à Causa (MRC) é uma parceria ganha-ganha na qual: os consumidores podem se engajar e apoiar a causa da educação comprando produtos ou serviços de marcas parcerias e as empresas, por meio de um diferencial competitivo, podem aumentar suas vendas e ganhar posição de destaque entre seus concorrentes. 3. Licenciar produtos da marca Ayrton Senna - Muitas empresas, nacionais e internacionais, licenciam a imagem do tricampeão de F1, não só para agregar valor, sofisticação, qualidade e design ao produto ou serviço, mas, também, porque compartilham dos valores defendidos por Ayrton Senna e os princípios de responsabilidade social ao reverterem parte da receita obtida com a venda de produtos ao Instituto Ayrton Senna. 4. Licenciar produtos da marca SENNA - Associar produtos com o icônico e inconfundível ‘S’ de Senna que trazem consigo os valores do tricampeão:

126

5.

6. 7. 8.

determinação, motivação, superação e busca da perfeição. Confira nossos produtos: http://www.ayrtonsennashop.com.br/static/senna_collection Licenciar produtos da marca Senninha. Ligar a marca ao personagem Senninha representa uma oportunidade diferenciada para empresas que acreditam em um futuro melhor para as novas gerações e ao sucesso e maior credibilidade de seus produtos ou serviços, contribuindo ainda com o Instituto Ayrton Senna. Patrocinar eventos - Ayrton Senna Racing Day Realizar exposições Prestar serviço à causa do Instituto - Empresas parceiras doam parte do tempo de seus profissionais e a sua expertise para ajudar o Instituto a realizar a sua missão em favor da educação pública do País (Disponível em: . Acesso em: 23 nov. 2015).

Observamos, nos itens destacados, claramente a relação entre o doar e o lucro, apresentado no terceiro capítulo, através da filantropia 3.0: “[...] o que há de ‘novo’ na ‘nova filantropia’ é a relação direta entre o ‘doar’ e os ‘resultados’ e o envolvimento direto dos doadores nas ações filantrópicas e nas comunidades de políticas. [...]” (BALL; OLMEDO, 2013, p. 33). A justificativa apresentada pelo IAS para as empresas doarem ao Instituto ou estabelecerem parcerias é o marketing ou a renúncia de receitas. Na pesquisa nacional, alguns estudos de caso apontam para os altos custos do Programa para o município: Quanto ao financiamento do programa, Cáceres apontou custos levados pela ‘terceirização’ da manutenção do SIASI a uma empresa de consultoria credenciada pelo IAS (COSTA, 2010). Nos demais municípios, o custo da parceria era relativamente pequeno, em torno de R$ 5.000, 00 ao ano, em 2009. Há informações relativas à assunção pelo município das despesas com reuniões e deslocamentos da equipe do município para São Paulo, sede do IAS ou das despesas do assessor do IAS quando este se deslocava para a realização de visitas in loco. (ADRIÃO, PERONI, 2011, p. 50).

Outra questão importante é a transparência de onde são investidos os recursos, já que, ao estabelecerem as parcerias, os sistemas públicos pagam para colocar no SIASI os dados, pagam pelo material, isto é, não está claro onde exatamente o instituto investe os recursos recebidos. Em consulta ao Tribunal, constatei que, se as dificuldades de controle do repasse público para as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) são grandes, dado o volume de dados, a fiscalização da renúncia de receitas é ainda maior. Existe apenas um setor do TCU em Brasília, a Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag), que analisa essas contas, mas apenas alguns casos são escolhidos para uma avaliação mais ampla com equipes multidisciplinares [...] (PERONI, 2006a, p. 128).

Em outro artigo com Pires, que estudou esse tema na parceria com município do RS (PIRES, 2008), apontamos que, com relação ao financiamento, se trata de “[...] um caso de

127 ‘financiamento-público de prestação privada de serviços’, ou seja, o poder público financia a aplicação de uma metodologia privada, para a promoção da educação pública.” (PIRES; PERONI, 2010, p. 66, grifo do autor). Caetano, em pesquisa atual sobre o IAS, apresenta recente parceria no estado do Rio de Janeiro, onde tem preferencialmente atuado no último período: No caso do estado do Rio de Janeiro, a parceria com empresas do mercado foram firmadas para financiar a aplicação do programa ‘Solução Educacional para o Ensino Médio’ que, além da Seeduc-RJ e do IAS, tem a parceria da P&G 52 e Citi Foundation53 (INSTITUTO AYRTON SENNA, 2015). O foco desse programa está na formação continuada dos professores pelo IAS. (CAETANO, 2013, p. 12).

Montaño (2002) adverte que ocorre a transferência de fundos públicos, já que o terceiro setor, em geral, não possui condições de autofinanciamento. Conforme o autor, “[...] esta transferência é chamada, ideologicamente, de ‘parceria’ entre o Estado e a sociedade civil, com o Estado supostamente contribuindo, financeira e legalmente, para propiciar a participação da sociedade civil.” (MONTAÑO, 2002, p. 199). O IAS atua com escolas de ensino fundamental, a seguir apresentaremos o exemplo de outra parceria, que ocorre com escolas de ensino médio, através do caso do Instituto Unibanco. Ao apontarmos algumas implicações da parceria do IAS com sistemas públicos, para a democratização da educação, destacamos que, através do SIASI, o IAS monitora a rede pública, determina em que deve melhorar, influencia na gestão da escola, e as redes públicas pagam por esse monitoramento. Ocorre, dessa forma, a diminuição da autonomia do professor que, entre outros fatores, fica minimizada desde quando recebe o material pronto para utilizar em cada dia na sala de aula e tem um supervisor que verifica se está tudo correto, até a lógica da premiação por desempenho, que estabelece valores como o da competitividade entre alunos, professores e escolas, como se a premiação dos mais capazes induzisse a qualidade via competição. A outra questão são as metas estabelecidas, que passam a dar mais ênfase ao produto final e não ao processo e à coletivização das decisões, que seriam pedagógicas, para a construção democrática. 52

A Procter & Gamble é uma empresa global que reúne um conglomerado de subempresas, produzindo alimentos, produtos de higiene e limpeza, dentre outros. Detém mais de 380 marcas por todo mundo.

53

A CitiFoundation está ligada ao CitiBank e opera com atendimento bancário; a Credicard oferece cartões de crédito; a Corretora de Seguros e a Credicard Soluções de Crédito provêm crédito pessoal às classes C e D. Por meio da Fundação Citi investe em projetos sociais nas seguintes áreas: educação financeira, reforço ao ensino básico e profissionalizante, empreendedorismo, desenvolvimento sustentável de comunidades, meio ambiente e cultura. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2015.

128

5.7

INSTITUTO UNIBANCO54

Em 2007, o Instituto concebeu e implantou o Projeto Jovem de Futuro (PJF), de forma experimental. O Instituto Unibanco foi criado em 1982, inicialmente para promover as ações e os investimentos sociais do banco55 e expandiu sua atuação na educação formal em 2003. O Instituto tinha como objetivo que suas tecnologias se transformassem em políticas públicas, por isso, em 2007, concebeu e implantou o Projeto Jovem de Futuro (PJF), que atuou em escolas de ensino médio, de forma experimental, em três escolas paulistanas. No ano seguinte, aplicou o projeto-piloto em 20 instituições de ensino de Minas Gerais e 25 do Rio Grande do Sul. Já em 2009, o projeto se expandiu para mais 41 escolas do estado de São Paulo (CAETANO; PERONI, 2015). Em 2011, as unidades participantes da fase experimental tornaram-se as primeiras a cumprir todo o ciclo do Ensino Médio sob a ação do Jovem de Futuro e deram subsídio para a validação do projeto e para sua aplicação em larga escala, em parceria com o Programa Ensino Médio Inovador, do Ministério da Educação, Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência (SAE) e cinco Secretarias Estaduais de Educação, como política pública estadual de ensino no Ceará, em Goiás, no Mato Grosso do Sul, no Pará e no Piauí, cujo objetivo, segundo o Instituto, é a melhoria do Ensino Médio público. Em 2011, o PJF teve sua tecnologia validada e ampliada para a aplicação em larga escala, em parceria com o Ministério da Educação, no Programa Ensino Médio Inovador (PROEMI). A parceria passou a se chamar ProEMI/JF. É interessante observar que, assim como o IAS, também a SAE celebrou acordo de cooperação técnica com o Unibanco, isto é, a Secretaria de Assuntos estratégicos da Presidência da República assina acordo diretamente com essas instituições privadas para influenciarem nas políticas educacionais: O Instituto Unibanco e a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) firmam no dia 29 de agosto, às 11h, o acordo de Cooperação Técnica para o desenvolvimento de estudos, projetos, pesquisas e avaliações em conjunto. O 54

Esta parte do texto, que analisa a parceria do Instituto Unibanco com escolas de ensino médio, é parte da pesquisa atual descrita no primeiro capítulo. Além de coordenar a pesquisa, sou responsável, com Raquel Caetano, pela parte que estuda o caso Instituto Unibanco.

55

Em 2008 formou o conglomerado Itaú Unibanco.

129 foco das ações que serão desenvolvidas por meio do acordo será a área de educação, com ênfase nos jovens do Ensino Médio público. (Disponível em: publicado em 24/08/2011. Acesso em: 2 ago. 2012).

Por outro lado, o PROEMI foi um programa governamental construído em um processo de correlação de forças por uma concepção de currículo diferente da que vinha se desenvolvendo no País, vinculada às habilidades e competências. O Programa Ensino Médio Inovador foi criado “[...] com vistas a apoiar e fortalecer o desenvolvimento de propostas curriculares inovadoras nas escolas do ensino médio não profissional.” (BRASIL, 2009, Portaria 971/09 art. 1). O documento apresenta uma definição de currículo que embasa sua proposta: O currículo, em todas suas dimensões e ações, deverá ser elaborado de forma a garantir o direito à aprendizagem e ao desenvolvimento dos estudantes por meio de ações e atividades que contemplem, nessa perspectiva de integração curricular, a abordagem de conhecimentos, o desenvolvimento de experiências e a promoção de atitudes que se materializam na formação humana integral, gerando a reflexão crítica e a autonomia dos estudantes. (BRASIL, 2009, p. 8-9).

Verificamos ainda que o PROEMI tem o objetivo de fomentar metodologias emancipadoras e dar condições para que sistemas públicos e escolas construam propostas curriculares democraticamente debatidas. Conforme o documento orientador do PROEMI: “A construção do Projeto de Redesenho Curricular (PRC) deverá ocorrer de forma coletiva e participativa contemplando ações que correspondam à realidade da escola e dos estudantes.” (BRASIL, 2014, p. 14). No entanto, o próprio governo federal, que possibilitou a construção de uma política participativa e democrática de currículo para o ensino médio, fez convênio com o Instituto Unibanco, abrindo a possibilidade para que os sistemas estaduais, que são responsáveis pelo ensino médio no país, fizessem parcerias para a implantação do PROEMI. Assim, no lugar de uma construção democrática e coletiva na escola, a proposta curricular deveria ser feita através de um padronizado sistema de gestão e avaliação que, na concepção do Instituto Unibanco, seria o caminho para qualificar a aprendizagem dos alunos (PERONI, 2015). Para o Jovem de Futuro, uma gestão eficiente, participativa e com foco nos resultados positivos de aprendizagem pode influenciar de maneira decisiva a qualidade da educação oferecida pela escola. Nessa perspectiva, além de incentivar o redesenho curricular das escolas, com orientação e recursos financeiros direcionados pelo MEC, o ProEMI/JF também busca fortalecer a gestão escolar, com foco na melhoria dos resultados de ensino. (INSTITUTO UNIBANCO, 2013, p. 11, Ensino Médio Inovador e Jovem de Futuro, set./2013).

130

Como vimos, a proposta do PROEMI tem o foco no currículo, enquanto o Instituto Unibanco, através do Programa Jovem de Futuro, apresenta uma proposta mais vinculada à gestão da escola como indutora da aprendizagem dos alunos.

5.7.1 Sujeitos

Conforme analisamos no terceiro capítulo, o foco da nossa pesquisa atual são os sujeitos e conteúdo da proposta, assim, ao pesquisarmos o Instituto Unibanco (IU), nos detemos também em conhecer quem são os sujeitos que participam do conselho de governança, de que instituição participam e que relações estabelecem com outras redes de influência no setor empresarial e público. É o que apresentaremos neste item do capítulo. Abaixo, estão organizados em uma figura para melhor visualizar alguns membros do Conselho de Governança e de onde falam, isto é, as empresas e instituições em que atuam ou atuaram. Figura 7 – Conselho de Governança do Instituto Unibanco e suas relações

Fundação OSESP

IFRS Foudation

Consultor Intern. Itaú Unibanco

Itau Unibanco Holding

FOI Thompson Reuter

INSPER ALCOA

PRESIDENTE PEDRO MOREIRA SALLES

Cambuhy Investimentos

VICE-PRESIDENTE PEDRO MALAN

BUNGE

TOTVS

CONSELHO FISCAL

Sec.Assist Soc. e DH do RJ

Pitágoras Sec.Exec. Min.Assist.Social

SUPERINT.EXECUT. RICARDO HENRIQUES

Membro da UNESCO e BIRD

Todos pela Educação CLAUDIO HADDAD

VEJA

Itau Social

Todos pela Educação

Assessor BNDES

RICARDO PAES DE BARROS.

Todos pela Educação

BOVESPA

IBMEC

Todos pela Educação

SAE

TOMAS ZINNER

CEBRI FIPP ANNER

Ethos

FEBRABAN

Faculdade Veris

GRUPO ABRIL TOMAS SOUTO C. NETO.

Fund.Roberto Marinho

Educação Compromisso SP

INSPER

Coord.Desenv. Humano do RJ Instituto Natura

Positivo

Cons. e negociador divida externa

ANTONIO MATIAS

Akatu

CLAUDIO MOURA CASTRO

Pesquisador IPEA

Diretor. Banco Mundial

Diretor do BIRD E ONU

Temasek Internacional CONSELHO DE GOVERNANÇA ITAÚ-UNIBANCO

Sec.Nacional de Educ.Cont-SECAD MEC

Pres.Banco Central

Souza Cruz

Mills Energia Falconi Consultores Associados

Ministro da Fazenda

EDP Energia

Junior Achievement The Natura Conservancy

MARCOS LISBOA

Todos pela Educação INSPER

Fonte: Relatório Unibanco/Jovem de Futuro, 2013 (CAETANO; PERONI, 2015, p. 100).

131 Destacamos, dentre os principais locais de atuação dos membros do conselho de governança (CG): a própria instituição financeira Itaú/Unibanco, governo, instituições privadas educacionais, do Terceiro Setor, organizações internacionais e outras instituições. Alguns ocupam cargos importantes na Instituição Financeira Unibanco, sendo pessoas que têm princípios e práticas empresariais e não têm expertise na área educacional. No entanto, influenciam a política educacional brasileira. A pergunta que se coloca é “O que está subjacente a este interesse pela educação?”. Observamos, também, a relação entre o governo federal e o Instituto, através da presença de Ricardo Henriques, que foi secretário da SECAD/MEC (2004-2007) e é, atualmente, o superintendente do Conselho de Governança, assim como Ricardo Paes de Barros, que foi, até 2015, subsecretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, e ocupou cargo de conselheiro no Conselho de Governança do Instituto e, atualmente, atua no Insper56 (Instituto de Ensino e Pesquisa), onde atualmente coordena o Núcleo de Pesquisa em Ciências para Educação, que integra a Cátedra Instituto Ayrton Senna (CAETANO; PERONI, 2015). Salientamos também a presença de representantes de instituições Privadas de caráter empresarial, como o conselheiro Claudio de Moura Castro, presidente do Conselho Consultivo da Faculdade Pitágoras e assessor especial da presidência do grupo Positivo, bem como Claudio Luiz da Silva Haddad, ex-presidente do Insper e presidente do Conselho do Grupo Ibmec S.A., entidade mantenedora das Faculdades Ibmec Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília e das Faculdades Veris, além de Marcos de Barros Lisboa, atual presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do governo Lula. É forte o vínculo do Instituto Unibanco com o Movimento Todos pela Educação (TPE), sendo que, de sete conselheiros, cinco participam do TPE. A seguir, apresentamos um quadro dos parceiros do Instituto, formas de atuação e instituições e sujeitos que a representam:

56

O Insper é uma instituição sem fins lucrativos de ensino superior e pesquisa, reconhecida como referência em Administração, Economia, Direito e Engenharia. Recentemente criou o Centro de Políticas Públicas, cuja área de pesquisa é a educação, e se organiza através de um Núcleo de Pesquisa em Ciências para a Educação, coordenado por Ricardo Paes de Barros, ligado à Cátedra do Instituto Ayrton Senna e ao Núcleo Ciência para a Infância, segundo o site .

132 Quadro 6 – Parcerias do PJF do Instituto Unibanco em 2013 PARCEIROS

FORMA DE ATUAÇÃO

Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação Ricardo Paes de Barros

Guia de Tecnologias Educacionais Ensino Médio Inovador Avaliação em Larga Escala

Todos pela Educação

Todos pela Educação

14º Prêmio Gestão Escolar

Educação Financeira

Rede de Pesquisadores Jovem de Futuro

RELAÇÕES/SUJEITOS INDIVIDUAIS E/OU COLETIVOS

Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República Educação em Debate: por um Fundação Maria Cecília Souto salto de qualidade na Vidigal (FMCSV) Educação Básica em que o Centro de Estudos e Pesquisas em Instituto Unibanco Educação, Cultura e Ação coordenou a produção dos Comunitária (Cenpec) artigos sobre Ensino Médio, que compõem o terceiro capítulo - Proposta para um Ensino Médio compatível com o século 21. Observatório do PNE em que Capes, Cenpec, Comunidade foi destinado o Educativa CEDAC, Fundação Itaú acompanhamento da meta 3, Social, Fundação Lemann, única que aborda o Ensino Fundação Maria Cecília Souto Médio: “Universalizar, até Vidigal, Fundação Roberto 2016, o atendimento escolar Marinho/Canal Futura, Fundação para toda a população de 15 a Santillana, Fundação Victor 17 anos e elevar, até o final Civita, Instituto Avisa Lá, Instituto do período de vigência deste Ayrton Senna, Instituto Natura, PNE, a taxa líquida de Instituto Paulo Montenegro, matrículas no Ensino Médio Instituto Rodrigo Mendes, Ipea, para 85%.”. Mais Diferenças, SBPC, UNESCO, Unicef Apoio do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. O Prêmio Gestão Escolar é CONSED e Centro de Estudos e um reconhecimento a Pesquisas em Educação, Cultura e projetos inovadores e gestões Ação Comunitária (Cenpec) competentes na educação básica do ensino público brasileiro. Projeto de Educação Ministério da Educação e da Financeira para escolas de Associação de Educação Ensino Médio. Alguns dos Financeira do Brasil (AEF– Brasil) conteúdos utilizados foram desenvolvidos pelo Instituto Unibanco. Por meio da Rede de Duas dissertações sobre o Pesquisadores, o Instituto Programa Jovem de Futuro reuniu e incentivou um grupo produzidas na FGV de renomados economistas a

133 pesquisarem as bases de dados do Jovem de Futuro. Educação Compromisso de A iniciativa da Secretaria São Paulo Estadual de Educação de São Paulo estabelece um pacto com a sociedade em prol da educação. Entre suas principais metas, o programa pretende fazer com que a rede estadual paulista figure entre os 25 melhores sistemas de educação do mundo nas medições internacionais, além de posicionar a carreira de professor entre as dez mais desejadas do Estado. Pacto pela Educação no O Pacto pela Educação do Pará Pará é um esforço integrado entre governo, sociedade Educação Quilombola do civil, iniciativa privada e Pará organismos internacionais, liderado pelo Governo do Estado do Pará, com o objetivo de aumentar em pelo menos 30% o Ideb do estado em todos os níveis até 2017. Instituto Rodrigo Mendes O Instituto Rodrigo Mendes (IRM) é uma organização de referência por seu trabalho voltado para a inclusão de crianças e jovens com deficiência, ao desenvolver programas de formação, visando colaborar para que a escola pública seja capaz de acolher toda e qualquer pessoa. GEEKIE Games Em parceria com o Instituto Unibanco e outras organizações, o Geekie lançou o projeto Geekie Games: O desafio do Enem. O objetivo dessa plataforma é apoiar o estudante na preparação para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em 2013, os estudantes das escolas do ProEMI/JF foram convidados para utilizar a plataforma em seus estudos. Cenários Transformadores No segundo semestre de da Sociedade Civil 2013, o Instituto Reos, em Brasileira 2023 parceria com outras

McKinsey & Company, Fundação Lehmann Parceiros da Educação, Instituto Natura Fundação Itaú Social, Fundação Vitor Civita Governo do Estado de São Paulo

Instituto Natura, Fundação Vale, BID Fundação Telefônica, Fundação Itaú Social, Instituto Itaú BBA Instituto Synergos que mantém duas redes globais: a Senior Fellows e a Global Philanthropists Circle

Ministério da Educação, Fundação Itaú Social, Fundação Futebol Clube de Barcelona, Bauducco, Kopenhagen, Fundação Roberto Marinho, IBM, Fundação Telefônica, Instituto C&A, Instituto Camargo Correa, Instituto Península, J.B.Morgan, Mattos Filho, Microsoft, SOAP, TAM, Tilibra, Faber Castells Portal G1 Fundação Telefônica Vivo Instituto Natura Secretarias de Educação da Bahia, Ceará e Rio de Janeiro

O Instituto Reos ou Reos Partners é uma organização internacional dedicada a apoiar e construir

134 instituições, reuniu diversos representantes de organizações da sociedade civil, movimentos sociais, governo, empresas, universidades, mídias e coletivos de jovens para construir cenários sobre o futuro da sociedade civil organizada no Brasil.

capacidade para ações inovadoras e colaborativas em sistemas sociais complexos. É uma associação sem fins lucrativos, fundada em julho de 2013. Trabalha tanto local como globalmente, atuando em parceria com a Reos, empresa social com escritórios em Cambridge (Massachusetts), Haia, Johannesburgo, Melbourne, Oxford, São Francisco, São Paulo e Sydney.

Fonte: Relatório Unibanco/Jovem de Futuro, 2013. Elaborado por Raquel Caetano (2015).

Para Henriques, a iniciativa do ProEMI/JF se configura em um exemplo de que é possível instituir um arranjo institucional virtuoso de cooperação entre o setor público, responsável pela política educacional, e o investimento social privado, para a construção de um espaço público, não estritamente governamental: “Trata-se de uma experiência concreta, que revela a possibilidade de geração de bens públicos a partir de esforços de complementaridade referentes às responsabilidades compartilhadas entre governos, sociedade civil e setor privado.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 7). Conforme Ricardo Paes de Barros57, membro do Conselho do Instituto Unibanco e exsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República: “O Jovem de Futuro é uma tecnologia social de interesse público desenvolvida pelo setor privado (grifos nossos) com vistas a aprimorar o funcionamento de qualquer escola pública que contemple o ensino médio.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 22). Para ele, a “[...] parceria com o MEC representa o reconhecimento federal da efetividade da estratégia JF e, daí, vem a relevância do setor privado para a melhoria da qualidade da educação pública no país.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 22). Ricardo Paes de Barros é também responsável pela avaliação dos resultados obtidos pelo Projeto através da avaliação de impacto nas escolas participantes (CAETANO; PERONI, 2015).

57

Entre 2011 e 2015, foi subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (governo Dilma Rousseff). É professor titular da Cátedra Instituto Ayrton Senna no Insper e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Ciências para Educação do Centro de Políticas Públicas – CPP.

5.7.2 O Conteúdo da Proposta

O Programa Jovem de Futuro parte do diagnóstico de que o problema está na gestão da escola, considerada ineficiente e ineficaz, e propõe a Gestão Escolar para Resultados (GEpR), que adota sistemas de informação voltados para o monitoramento, controle e avaliação e a utilização de programas de comunicação para garantir ampla adesão da comunidade às ações da escola, com objetivos orientados para os resultados na aprendizagem (Disponível em: . Acesso em: 21 maio 2014). O PJF parte do princípio de que modificando a gestão da escola de ensino médio, os problemas de evasão, reprovação, o chamado fracasso escolar, sejam resolvidos. Para isso, se utiliza de programas padronizados para os diferentes estados do País e um forte controle e monitoramento dos resultados, como já vem sendo pesquisado em outros programas, como o caso do Instituto Ayrton Senna. A proposta de gestão do Programa é a Gestão Escolar para Resultados (GEpR) que engloba a integração de diferentes processos e ferramentas de gestão escolar, bem como a mobilização de recursos humanos, a articulação de recursos técnicos, materiais e financeiros, a divisão de responsabilidades, a adoção de sistemas de informação voltados para o monitoramento, controle e avaliação e a utilização de programas de comunicação para garantir ampla adesão da comunidade às ações da escola, sempre tendo em vista a conquista de melhores resultados na aprendizagem dos alunos. (Disponível em: . Acesso em: 21 maio 2014).

O conceito de GEpR parte do pressuposto de que qualquer organização, principalmente aquelas voltadas para o interesse público, deve ter uma qualificação técnica e social da gestão (INSTITUTO UNIBANCO, O Plano em ação, 2014, p. 4, grifo da autora). O Instituto entende que a gestão da escola não tem especificidades e que pode adotar a perspectiva de gestão de “qualquer organização”. Conforme documento do IU A prática da Gestão para resultados (GpR) não é nova e tem origem no ideário do economista Peter Drucker (1909-2005), que propôs sistemas de Administração por Objetivos, aplicados ao setor privado e em políticas públicas, a partir dos anos 1960. Essas teorias foram adaptadas a múltiplas necessidades, porém muitas vezes com implicações equivocadas, pois focavam excessivamente no processo, como um meio de integrar ferramentas utilizadas no processo de gestão, com vistas à melhoria dos resultados – principal fator a servir de referência a essa modalidade de ação. (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 15).

136 O documento afirma ainda que esse “[...] movimento altera a forma de lidar com a gestão de recursos humanos, materiais e financeiros, fomentando uma nova cultura organizacional.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 15). O que o IU pretende é muito mais do que os objetivos explícitos de melhora na aprendizagem e evasão, pretende uma mudança profunda na organização social escolar, com base em princípios da administração de empresas e sua transposição para a escola, descaracterizando completamente o princípio constitucional da gestão democrática. Outra questão interessante é que o subtítulo que trata da gestão escolar para resultados, nesse documento, diz que: “O GpR, quando adequadamente implementado, conduz a escola à conquista de suas metas.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 14). Assim sendo, se o resultado não for o esperado, é porque a escola não implantou bem o “receituário”, sendo assim responsabilizada pelo fracasso nas metas. A gestão focada em resultados é efetivada na escola através da construção de um Plano de Ação, “[...] a partir de atividades de planejamento, execução, monitoramento e avaliação que compõem um processo cíclico, retroalimentado e contínuo. Por isso, aqui denominado ‘Circuito de Gestão’.” (INSTITUTO UNIBANCO, O Plano em Ação, 2014, p. 10). Ainda conforme o documento que orienta o Plano de Ação, o Circuito de Gestão é baseado nas seguintes ações contínuas: PLANEJAR - Diagnosticar necessidades escolares • Definir objetivos e metas • Determinar estratégias para alcançar os objetivos, compondo um Plano de Ação, com cronograma, orçamento e responsáveis • Adaptar e/ou replanejar ações do plano, caso necessário EXECUTAR - Mobilizar a comunidade escolar para as ações • Propiciar e facilitar as condições para as atividades • Executar as ações conforme cronograma • Registrar as execuções física e financeira das ações • Implementar ações corretivas em função dos resultados obtidos MONITORAR - Acompanhar e monitorar a execução das ações • Analisar como a execução do plano está inserida na rotina escolar • Analisar o desempenho de toda a equipe escolar • Verificar se os objetivos estão sendo alcançados • Verificar se a execução ocorreu como planejado AVALIAR - Analisar e avaliar a execução do Plano • Verificar se os objetivos foram alcançados • Aprender com o processo e aprimorar os processos seguintes (Comunidade de Aprendizagem) • Sistematizar e ampliar os processos que tiveram sucesso. (INSTITUTO UNIBANCO, 2014, p. 14).

O documento ressalta, ainda, que “[...] o ponto inicial e primordial é a elaboração de um diagnóstico de qualidade.” (INSTITUTO UNIBANCO, 2014, p. 15). Entendemos que um processo de gestão democrática não pode prescindir de um ótimo diagnóstico da realidade, assim como planejar, executar, monitorar e avaliar são princípios básicos da administração. As questões centrais que queremos destacar são os objetivos pretendidos, o grau de coletivização

137 das decisões e o foco no processo ou apenas nos resultados. A proposta de gestão do IU é a gestão para resultados, que tem o foco no produto e um produto específico, previamente determinado pelo Instituto. Além dos instrumentos de avaliação serem vinculados ao controle de metas relacionados à premiação e competitividade, baseado em princípios do gerencialismo, analisados em capítulo anterior. As escolas recebem capacitação e assessoria técnica para planejar, executar, acompanhar e avaliar uma proposta de melhoria de seus resultados e R$ 100/aluno/ano para financiar as ações estratégicas previstas nesse plano. Conforme material da secretaria regional de desenvolvimento da educação de Sobral – CE: VANTAGENS PARA AS ESCOLAS QUE ADERIREM: Recebem apoio técnico e financeiro no valor de R$ 100,00 ano-aluno para um período de três anos; Capacitação de um grupo de gestão para a criação de um Plano de Melhoria de Qualidade e assessoria técnica para planejar, executar, acompanhar e avaliar proposta de melhoria de seus resultados. (Disponível em: . Acesso em: 14 set. 2015).

O relatório coordenado pelo professor Jorge Ribeiro58 também destaca esse ponto, questionando qual foi o motivo pelo qual as escolas aderiram ao programa e, pelas entrevistas realizadas, a questão financeira apareceu em todas as respostas, enquanto o conteúdo da gestão gerencial não foi levantado, o que representa que as escolas se submetem ao conteúdo para ter recursos materiais para realizar suas tarefas com mais dignidade. Segue o relatório, que reproduzimos na íntegra pela sua importância: Possivelmente, a perspectiva de obter os recursos disponíveis pelo projeto tenha sido o grande motivador para as escolas aceitarem o PJF/IU. Alguns representantes das escolas entrevistadas indicam a importância dos recursos para adesão ao projeto. Quando referiam os motivos que levaram à adesão ao PJF/IU, ouviu-se nas escolas relatos como os que seguem: - ‘Uma oportunidade de reestruturar a escola pública em uma vila com grande risco social propondo uma inovação em todas as partes da escola, financeiro, pedagógico e a oportunidade de capacitação’ (Gestão, 16, p. 33/51). - ‘Equipe diretiva visualizou a possibilidade de melhorar a escola’ (Gestão, 05, p. 33/51). - ‘Pela verba anunciada’ (Gestão, 13, p. 33/51). - ‘Equipe diretiva visualizou possibilidade de melhorar a escola’ (Gestão, 07, p. 33/51). - ‘Questão financeira, necessidade básica de reforma, alternativa viável’ (Gestão, 28, p. 34/51). 58

Termo de Cooperação 16883/2012 PROEMI MEC/SEB/DCEI/CGEM – FNDE - UFRGS Coordenação Prof. Dr. Jorge Alberto Rosa Ribeiro. Avaliação da Implementação de projetos no Ensino Médio: O Caso Unibanco Etapa 1 – Projeto Jovem de Futuro – MG e RS

138 Os relatos acima indicam que, diante da realidade de sucateamento das escolas públicas, que atinge inclusive o EM, a promessa de investimento de R$ 100 por aluno/ano foi o principal motivador para adesão ao PJF/IU. Destaque-se que não foi registrado nenhum comentário, por parte dos entrevistados, sugerindo que a adesão tenha se dado pela perspectiva de construir um novo modelo de gestão – gestão de resultados – que é o ponto de partida na proposta do Projeto Jovem de Futuro. (RIBEIRO, 2014, p. 104).

Já enfatizávamos esta questão em trabalhos anteriores, de que o Instituto Unibanco apresenta uma peculiaridade sem dúvida preocupante, ele financia a escola e, assim, muitas escolas públicas acabam aderindo para receber recursos. Terminam por submeter-se às suas metas, o que interfere em toda instituição, desde o conselho escolar até o conteúdo de ensino, já que aplicam provas e as escolas que não atingirem as metas propostas não recebem as parcelas do financiamento. Questionamos se não é uma “compra da escola pública”, precarizada após a falta de investimentos em políticas educacionais que ocorreu no Brasil, principalmente na década de 1990. Conforme documento do Instituto, são resultados esperados: a) dos alunos: R1 – Alunos com competências e habilidades em Língua Portuguesa e Matemática desenvolvidas. R2 – Alunos com alto índice de frequência; b) dos professores: R3 – Professores com alto índice de frequência. R4 – Práticas pedagógicas melhoradas; c) da gestão: R5 – Gestão escolar para resultados. R6 – Infraestrutura da escola melhorada. O Plano de Ação é elaborado para garantir os resultados esperados. No entanto, se a escola não os atingir, sofre sanções financeiras, conforme consta no material de formação do Instituto: na primeira queda, o aporte financeiro reduz a 50%, na segunda, reduz 25% e, na terceira, é o final do ciclo. A premiação por desempenho é entendida como incentivo, bem dentro da lógica mercantil. Em escolas carentes de tudo, professores com baixíssimos salários e alunos em condição social precária, o Instituto acaba entrando com a sua proposta pedagógica e de gestão sem grandes resistências. Questionamos se não é uma forma de compra de políticas e princípios educacionais privatizando a escola pública? Para controlar as ações do projeto Jovem de Futuro, o Instituto Unibanco desenvolveu uma Plataforma online de gestão de projetos das escolas e formação a distância. Atualmente, é composta pelo Sistema de Gestão de Projetos (SGP) e pelo Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA). É um sistema de controle muito parecido com o SIASI, do Instituto Ayrton Senna (PERONI; CAETANO, 2014).

139 Destacamos, ainda, que o PJF se utiliza de programas padronizados para os diferentes estados do País e um forte controle e monitoramento dos resultados, como já vem sendo pesquisado em outros programas, como o caso do Instituto Ayrton Senna. No Manual de pré-implantação (INSTITUTO UNIBANCO, 2012), destacamos a constituição da equipe na secretaria de educação. A equipe executora é constituída por funcionários da secretaria, ou devem ser contratados pelo poder público para executar tarefas dos PJF nas escolas. Estão previstos como funcionários: o Coordenador Proemi/PJF tem como função: fazer a gestão da equipe, a gestão de parceiros contratados, a aprovação do Plano das escolas e é ainda responsável pela execução do projeto nas escolas. O supervisor é responsável por grupos de 10 escolas. Ele apoia a elaboração e execução do Plano, faz o acompanhamento e controle das atividades, realiza reunião com o grupo gestor e faz visitas às escolas. O técnico de apoio à gestão faz encontros de monitoramento com as escolas e a avaliação das prestações de contas. Destacamos, além disso, que os funcionários são pagos pela secretaria de educação, mas é o Instituto Unibanco que determina suas funções. Assim, a separação entre elaboração e execução não ocorre apenas nas escolas, mas também nas secretarias de educação, com profissionais que seriam os responsáveis pela elaboração das políticas educativas. É interessante observar que o IU determina o que fazer a distância (por controle remoto) uma vez que não acompanha a realidade em que está atuando nem mesmo através de funcionários próprios. Conforme o manual de pré-implantação (INSTITUTO UNIBANCO, 2012), é ainda tarefa da Secretaria de educação a busca de parceiros para avaliações. O Parceiro de Avaliação é uma empresa que faz e aplica as avaliações e as oficinas devolutivas, que são a apresentação e interpretação de resultados para os professores e a orientação de ações pedagógicas, para a melhoria dos alunos nas escolas. (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 16).

E, mesmo que o poder público local já tenha construído seu sistema de avaliação, deve estar de acordo com as determinações no Instituto: Caso sua Secretaria já possua um sistema de avaliação próprio, verifique se está de acordo com as exigências solicitadas pelo ProEMI/PJF/IU. (INSTITUTO UNIBANCO, 2012, p. 16).

O Instituto repassa a responsabilidade para que o setor público contrate, de forma terceirizada, a avaliação institucional, através de edital (inclusive no manual encontram-se pormenores do edital) e o instituto fica na direção, estabelecendo seu conteúdo para o público

140 e monitorando cada passo com pessoas que passam a responder ao Instituto, apesar de serem financiadas pelo governo. Outro documento importante do IU é o manual de implantação, que apresenta objetivos a serem conquistados pelas escolas, tais como: • Fomentar a melhoria do clima escolar no que se refere ao respeito, à solidariedade, à disciplina e à diminuição da violência; • Oferecer condições para a melhoria da formação e das condições de trabalho dos profissionais da escola; • Promover uma cultura de avaliação como instrumento de aperfeiçoamento do processo de ensinoaprendizagem; • Apoiar a gestão participativa e guiada por resultados; • Contribuir para a melhoria do ambiente físico escolar com relação a instalações e equipamentos. (INSTITUTO UNIBANCO, Manual de implementação, 2012, p. 7).

E são definidas metas a serem atingidas pelas escolas que desenvolvem o Projeto: Reduzir em 40% os índices médios de evasão/abandono escolar do Ensino Médio em três anos. Aumentar a média de rendimento da escola em um desvio padrão (25 pontos) na escala SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) e diminuir o percentual de alunos com proficiência abaixo do recomendável nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática das escolas públicas de Ensino Médio participantes do Projeto, no período de três anos. (INSTITUTO UNIBANCO, Manual de implementação, 2012, p. 7).

Outro ponto de destaque do Programa é a formação de professores e gestores na gestão por resultados. É obrigatória a participação em um curso de 120 horas durante os três anos do projeto. Na escola, participam o diretor, o coordenador pedagógico e um professor e, na secretaria de educação, participam supervisores e técnicos responsáveis por acompanhar as escolas, profissionais que são o centro das decisões na definição e execução das políticas educacionais. Destacamos, ainda, que o conselho escolar, um dos importantes pilares da gestão democrática, perde importância, já que é constituído outro conselho gestor na escola vinculada ao projeto. Conforme documento do Unibanco a “[...] função do Grupo Gestor é, em conjunto com o diretor da escola, planejar e coordenar a elaboração do Plano de Ação, implementar e executar o ProEMI/JF, tomando as decisões necessárias para garantir o seu sucesso.”. (INSTITUTO UNIBANCO, Manual de implementação, 2012, p. 8). Ainda conforme o material da Secretaria Regional de Desenvolvimento da Educação de Sobral – CE, o grupo gestor é composto pelos seguintes membros: diretor da escola-membro nato; coordenador do projeto; representantes dos professores; representantes dos alunos e representantes dos pais. E aponta qual deve ser o perfil dos integrantes do conselho gestor:

141

1. diretor – membro nato; 2. coordenador do projeto - coordenador escolar que identifique-se com o protagonismo juvenil; 3. representante dos professores professor que exerce certa liderança; 4. representante de alunos - preferencialmente, deve ser um dos membros do grêmio estudantil e esteja cursando o 1º ano, com perfil de articulador; 5. representantes dos pais - poderá ser o representante de pais do conselho escolar ou um pai presente na escola. (Disponível em: . Acesso em: 14 set. 2015).

Sublinhamos mais uma vez, que, o conselho escolar, um dos importantes pilares da gestão democrática, perde importância, já que é formado outro conselho na escola vinculado ao projeto. Questionamos, dessa forma, os princípios constitucionais de gestão democrática e liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, dentro dessa proposta de parceria, principalmente em um país que não possui um histórico de cultura democrática e deu passos importantes no período recente pós-ditadura. Ao dar os primeiros passos nesse sentido, os sujeitos, individuais e coletivos, vinculados ao mercado, se articularam para uma grande ofensiva para barrar esse projeto e imprimir novamente a lógica de mercado na educação, como historicamente ocorreu neste país.

5.8

FINANCIAMENTO PROEMI/PJF Diferente do IAS, que apresenta muitas formas de doação de pessoas física ou jurídica,

o IU não apresenta muitos dados de financiamento, apenas que: Para viabilizar suas ações, o Instituto é mantido por um fundo endowment (doação), criado exclusivamente para financiar suas atividades, que garante independência e permite a definição de objetivos estratégicos e metas de longo prazo. (Disponível em: . Acesso em: 2 nov. 2015).

Não aponta como funciona o fundo. No entanto, encontramos uma forma de repasse público para o Instituto pela parceria PROEMI/PJF, no site do estado de Mato Grosso do Sul: A Secretaria de Estado de Educação (SED) formou uma parceria com o Instituto Unibanco para implantar nas escolas estaduais o Projeto Jovem de Futuro, tecnologia de Gestão Escolar para Resultados que mobiliza estudantes, professores e famílias para garantir que os alunos do ensino médio público entrem, tenham um bom desempenho e concluam essa fase escolar, garantindo melhores oportunidades de vida e profissão. Entre 2012 e 2014, 85 mil estudantes de 299 escolas estaduais de ensino médio de Mato Grosso do Sul serão beneficiados pela transferência do Jovem de Futuro para a gestão do governo local. O Estado assumirá o Projeto na forma de política pública para o ensino médio. O Estado e o Instituto Unibanco serão

142 responsáveis pelas formações e pelo apoio técnico e o Ministério da Educação (MEC) é parceiro nesse processo por meio do repasse de recursos diretamente às escolas. (Publicado em 6 nov. 2011. Disponível em: . Acesso em: 5 maio 2015).

Através de material disponível na internet, da CREDE de Sobral, vinculada à Secretaria de Educação do Ceará, é possível ter mais algumas informações sobre o repasse de recursos públicos, via FNDE, para a implementação do PJF59: O recurso financeiro da complementação do Estado para as escolas estaduais que aderiram ao Projeto Jovem de Futuro deve ser usado, prioritariamente, para o financiamento das metodologias do Instituto Unibanco, cujas ações não são financiadas com recursos do Programa Ensino Médio Inovador. (Disponível em: ).

Enfim, o poder público está efetivamente vinculado e submetido à direção de Instituições privadas, através do financiamento direto, da compra de tecnologias ou materiais, de renúncias de receitas, de trocas de poder e favores entre as próprias empresas, e, o que é pior, definindo o conteúdo da educação pública, como verificamos com os institutos Ayrton Senna e Unibanco. É interessante destacar, ainda, que os Institutos estudados trabalham definindo políticas, com a concepção, acompanhamento e avaliação da educação nas redes públicas parceiras. Na justificativa de sua atuação, apresentam problemas na qualidade de ensino e assumem o que seriam tarefas do Estado para com as políticas públicas de educação. As metodologias empregadas são padronizadas e replicáveis, ao contrário das propostas de reestruturação produtiva, do próprio capital, que propõem a formação de um trabalhador criativo, que responda rapidamente às demandas com capacidade de raciocínio e trabalho em equipe. No quadro a seguir, fizemos um exercício para ver as semelhanças e especificidades dos Institutos estudados. Enaltecemos o fato de que é possível constatar um mesmo padrão entre eles:

59

Documento na íntegra no anexo 2 e disponível em: . Acesso em: 20 nov. 2015.

Quadro 7 – Quadro comparativo entre Instituto Ayrton Senna e Instituto Unibanco IAS Gestão para o Sucesso SIASI Padronizado e replicável Um coordenador responsável na secretaria e outro na escola, do quadro funcional, mas formado pelo Instituto e responsável por monitorar o alcance das metas propostas Estratégias premiação Estratégias competitividade Convênios com sistemas Secretaria de Assuntos públicos estratégicos da Presidência da República (SAE), Ministério da Educação, Secretarias Estaduais e Municipais Ano que iniciou 1994 Ano que iniciou atuar em 1997 redes públicas Participa do Movimento sim Todos pela educação Abrangência nacional Etapa da educação básica Historicamente ensino em que atua fundamental e atualmente está realizando um projetopiloto no RJ para atuação no Ensino Médio Proposta de gestão Sistema de Monitoramento Material Equipe

IU Gestão para resultados SGP Padronizado e replicável Um coordenador responsável na secretaria e outro na escola, do quadro funcional, mas formado pelo Instituto e responsável por monitorar o alcance das metas propostas premiação competitividade Secretaria de Assuntos estratégicos da Presidência da República (SAE), Ministério da Educação, Secretarias Estaduais e Municipais 1982 2007 sim nacional Ensino Médio

Fonte: Elaboração da autora.

O quadro pretende fazer uma síntese do que trabalhamos no capítulo e visualizar pontos que vimos em separado em cada Instituto, mas que são comuns ao trabalho dos dois. Destacamos ainda que o governo federal investe em um programa de diagnóstico e monitoramento, o SIMEC, vinculado ao Plano de desenvolvimento da educação e, ao mesmo tempo, financia programas com sistemas de monitoramento, como o SIASI do IAS e o SGP, do IU, o que provoca uma sobrecarga de trabalho para a equipe gestora da escola, com excesso de preenchimento de planilhas, com um aumento do processo de burocratização que, em discurso, as entidades privadas criticam. É uma das incoerências encontradas nos processos de parceria tanto do IU quanto do IAS. Enfim, o estudo das duas parcerias fomentou questões como: quais são as consequências da presença do privado dando a direção das políticas públicas em nível de sistema e escola para

144 a democratização da educação, sendo que os Institutos determinam como e o que será ensinado, e monitoram todos os passos do município, retirando parte de sua autonomia? Como fica a gestão democrática, a participação dos segmentos escolares nas definições pedagógicas das políticas educacionais? O que leva o sistema público a procurar esse tipo de parceria? O controle social e a coletivização das decisões, tão importantes para a construção da democracia no país, acabam cedendo lugar ao controle externo de instituições privadas, que determinam o conteúdo das políticas públicas de educação, desde o âmbito da legislação e da organização do sistema educacional até as práticas escolares cotidianas. O IAS define o que deve ser feito, desde o Secretário de Educação até os professores e alunos. Questionamos o que significa o sistema público abrir mão de suas prerrogativas de ofertar educação pública de qualidade e comprar um produto pronto, partindo do currículo escolar – já que as aulas vêm programadas e os professores não podem modificá-las – e indo até a gestão escolar (monitorada por um agente externo), o que transformaria os sujeitos responsáveis pela educação em burocratas que apenas preenchem muitos papéis. Isso, inclusive, contraria o princípio constitucional da gestão democrática e a Lei de Diretrizes e Bases que, no art. 14, determina a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. No art. 15, determina-se que “[...] os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.” (BRASIL, 1996). Concordamos com Laval (2004) quando ele argumenta que a lógica privada no público é mais do que uma questão técnica, não modifica apenas a organização da escola, mas os seus meios e fins: “[...] o que está em jogo não é tanto o desaparecimento da burocracia, mas uma nova etapa no controle do poder de gestão o qual deve penetrar mais na definição dos conteúdos e das relações pedagógicas.” (LAVAL, 2004, p. 191). Laval (2004), analisando a avaliação como indutora da qualidade e da competitividade, adverte que a “[...] instauração do quase-mercado reforça a segregação”, pois “[...] o estabelecimento melhora se já possui capital social entre a população que escolariza.” (LAVAL, 2004, p. 172). Dale (1994, p. 128) reforça este argumento: “[...] as escolas em uma situação de mercado competitivo, são susceptíveis de competir não apenas para poder aceitar algumas categorias de alunos, mas também para rejeitar outras.”

6

CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta tese, procurou-se analisar a presença crescente de sujeitos com a lógica de

mercado na direção e/ou execução das políticas sociais, imprimindo tal lógica nas políticas públicas, determinando o conteúdo da educação. Esses sujeitos estão cada vez mais organizados em redes, do local ao global, integradas por sujeitos individuais e/ou coletivos, com diferentes graus de influência e que falam de diferentes lugares: setor financeiro, organismos internacionais, setor governamental. Algumas instituições possuem fins lucrativos e outras não, ou não claramente. Nossas pesquisas demonstram que, no Brasil, o processo de privatização do público ocorre tanto através da direção como da execução, ou de ambas, conforme analisamos no quarto capítulo. No processo de direção, pesquisamos o Movimento Todos pela Educação, em que os empresários acabam influenciando o governo federal, tanto na agenda educacional quanto na venda de produtos educativos60, e a assessoria do grupo internacional McKinsey & Company ao governo federal61. No processo de privatização via execução, pesquisamos a expansão da oferta via Terceiro Setor nas creches comunitárias62, nos Programas de Educação de Jovens e Adultos, como o Brasil Alfabetizado63, e de Educação profissional, como o PRONATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego)64. E quando ocorre via execução e direção, verificamos nos estudos sobre as parcerias, em que instituições privadas definem o conteúdo da educação e também executam sua proposta através da formação, da avaliação do monitoramento, premiação e sanções que permitem um controle de que seu produto será executado. As parcerias analisadas na pesquisa ocorreram com escolas do ensino fundamental e médio, onde a expansão ocorreu pelo setor público, mas sem as condições materiais adequadas, pois ocorreu em períodos de ajuste fiscal e, também, com a naturalização do possível. As avaliações constataram o óbvio, isto é, problemas de qualidade e, ao invés de proporcionar políticas públicas para elevá-la, buscaram o setor privado para trazer “pacotes de qualidade” para a educação básica. O setor privado, com base no diagnóstico neoliberal de que

60

Sobre a relação entre o Movimento Todos pela Educação e a venda de produtos educacionais no Guia de Tecnologias, ver o texto do grupo de pesquisa que trata deste assunto: Bernardi; Uczak; Rossi (2014, 2015); e, sobre a presença do setor privado em geral no Guia de Tecnologias, ver Rossi; Bernardi; Uczak (2013).

61

Sobre assessoria da McKinsey & Company ao governo federal, ver Bittencourt; Oliveira (2013).

62

Sobre creches comunitárias, ver Susin (2009) e Flores; Susin (2013).

63

Sobre o Programa Brasil Alfabetizado, ver o texto do grupo de pesquisa que trata deste assunto: Comerlatto; Moraes (2013).

64

Sobre o PRONATEC, ver o texto do grupo de pesquisa que trata deste assunto: Rodrigues; Santos (2013).

146 a crise é do Estado e não do capital, e que o privado deve ser o parâmetro de qualidade, pressiona o poder público para assumir politicamente a direção e execução das políticas, o que temos chamado de “conteúdo da proposta”. Este é outro ponto polêmico da relação entre o público e o democrático: não basta ser público para ser democrático. Quando o governo compra um produto educacional através de editais com recursos vultuosos, ocorre o contrário do que tratamos no início da tese da democratização como coletivização das decisões, e se fortalece a ideia neoliberal de retirar o poder das instituições públicas, por serem permeáveis à correlação de forças. As instituições públicas, se são democráticas, são o espaço da correlação de forças e o produto final, em um processo verdadeiramente democrático, não pode ser definido a priori. Essa é uma questão importante, pois o público não deve ser apenas o governamental, mas o público estatal como espaço democrático com parâmetros de justiça social. No início da tese, destacamos que não tratamos em nossas pesquisas de Estado e sociedade civil em abstrato, mas em um período particular do capitalismo, com correções de forças entre sujeitos históricos com projetos societários distintos. É importante retomar essa questão para frisar que, quando falamos de privado, estamos tratando do setor vinculado à lógica de mercado, com ou sem fins lucrativos, que atua na educação. A outra questão é a importância do Estado como o principal responsável pelo direito à educação. Muitos autores têm trazido uma multiplicidade de atores atuando na educação. Nossas pesquisas analisam criticamente o fato de o poder público se retirar da responsabilidade da execução e direção da política educativa. Neste caso, quando falamos em poder público, destacamos que não se restringe ao governo, pois entendemos que, em uma sociedade democrática, as instituições públicas atuam em um processo de coletivização das decisões com espaços que devem ser cada vez mais alargados de participação. Sublinhamos, também, a especificidade vivida no Brasil e em outros países latinoamericanos, de estar saindo de ditaduras e iniciando a sua luta por direitos materializados em políticas sociais, quando outros países já viviam as estratégias de superação da crise e sua restrição de direitos. Assim, vive-se um período de avanço das políticas educacionais, com perspectivas de universalização da educação básica até 2016, gestão democrática, inclusão e outras questões vinculadas ao direito à educação com qualidade, em parte como resultado da correlação de forças e dos reclames populares (VIEIRA, 2007), mas também pela necessidade de legitimidade por parte do Estado.

147 Como se enfatizou no início da tese, entende-se que as mudanças nas fronteiras entre o público e o privado ocorrem como parte de um contexto de crise, em que as estratégias de superação globalização, neoliberalismo e reestruturação produtiva, Terceira Via, redefinem o papel do Estado. As teorias que afirmam que a crise está no Estado, como neoliberalismo e Terceira Via, trazem implicações para as políticas sociais, pois transferem do poder público para o mercado parte da coordenação societária, e não apenas a execução, mas também a direção das políticas. O que permanece no âmbito do Estado acaba sofrendo a lógica gerencial, com características da nova gestão pública, que trazem princípios do mercado para a gestão pública. Em países que, como o Brasil, estão iniciando o processo de construção da democracia, a privatização da educação pública traz consequências importantes, não apenas para a efetivação do direito à educação, que ainda não é uma realidade para todos, mas também acerca do conteúdo da educação, que tem o mercado como parâmetro de qualidade. O Brasil não tem um histórico democrático e a privatização do público é uma realidade “naturalizada” em nossa cultura. No entanto, no período pós-ditadura, em um processo de correlação de forças com essa lógica historicamente instaurada, no período de democratização, iniciou-se um movimento de repensar o público, o Estado, com a participação efetiva da sociedade. E entende-se que a participação envolve um longo aprendizado que ocorre na experiência65. A participação é fundamental para o avanço da democracia; portanto, quando se criticam as entidades privadas definindo ou executando as políticas públicas, estamos, em parte, apontando: – para as instituições com interesses mercantis no processo de direção, que trazem a lógica de mercado, com perdas para a concepção de democracia, como coletivização das decisões, na definição de políticas (VIEIRA, 1998); – para a perda da responsabilidade do Estado no processo de execução como a responsável pelas políticas universais e pela perda para a concepção de democracia como direitos sociais, materializados em políticas universais (para todos e com qualidade), a democracia como igualdade social materializada em políticas públicas. Com base nos conceitos do início da tese, de que o Estado, assim como o capital, é entendido como relação ou processo em um movimento de sujeitos em correlação de forças de classes sociais e projetos societários distintos, percebem-se as redes como sujeitos em relação com objetivos de classe. No caso desta tese, analisamos como a lógica mercantil tem participado ativamente da direção e execução das políticas sociais. E como a presença desses sujeitos, que 65

Experiência, conforme Thompson (1981).

148 passam a influenciar fortemente as políticas sociais, deixa as responsabilidades ficarem cada vez mais diluídas quanto aos direitos materializados em políticas sociais. O processo de mercantilização ocorre também com o setor privado definindo o conteúdo da educação. Nesse caso, observamos o poder público assumindo a lógica do privado na administração pública, em parte através da gestão gerencial e também quando abdica de decidir o conteúdo da educação, repassando a direção para instituições privadas. Esse diagnóstico parte do argumento neoliberal (BUCHANAN et al., 1984), que aponta as instituições democráticas contemporâneas como irresponsáveis, sendo a solução adotar medidas restritivas constitucionais para conter os governos, colocando-se os instrumentos de controle social fora das instituições representativas e partindo-se do princípio de que os controles políticos são inferiores aos de mercado e que o privado é o único detentor do padrão de qualidade a ser implementado nas instituições públicas, para que sejam mais eficientes e produtivas. A propriedade permanece pública, no entanto, a direção do conteúdo das políticas educativas é repassada para instituições privadas. Essas instituições acabam assumindo a gestão, o currículo, a organização e a rotina escolar e também fazem o monitoramento, o controle e avaliam se estão atingindo os resultados que elas mesmas propuseram com o conteúdo das políticas. As escolas são instituições públicas permeáveis à correlação de forças – se democráticas – onde não se têm previamente o controle do produto. São instituições de propriedade pública, mas se o processo decisório está ausente, já que tudo é previamente definido e monitorado por uma instituição privada e os professores apenas executam tarefas, entendemos que também ali ocorre um processo de privatização da educação. Com a retirada das decisões do público, a instituição pública não é “vendida”, no sentido da perda da propriedade, mas esvaziada como o espaço público decisório, minimizando esse seu papel, mesmo em uma democracia. Questionamos: quem define a educação, quem dirige e com base em que parâmetros? Entendemos que existem projetos societários em disputa. Assim, mesmo quando a oferta permanece pública, há implicações para um projeto societário democrático se a direção das políticas é realizada por instituições que tenham como parâmetro os pressupostos de mercado, principalmente em países com processos tão recentes de construção democrática. Ressaltamos que a lógica mercantil tem participado ativamente da direção e execução das políticas educacionais, deixando as responsabilidades cada vez mais diluídas quanto aos

149 direitos materializados em políticas sociais, e também esvaziando das instituições públicas o poder decisório, com graves consequências para o processo de democratização. Vivenciamos um misto de ampliação de direitos, principalmente na oferta educacional, no entanto, em um processo de correlação de forças políticas e econômicas, o setor privado pressiona para assumir a direção das políticas educacionais que considera mais adequadas, instrumentais, a este período particular do capitalismo, mas também querem avançar no que Ball e Olmedo (2014) chamam de filantropia 3,0, isto é, visando o lucro. No Brasil, vivenciamos um processo de ajuste fiscal no período em que houve a ampliação da educação básica sem o financiamento necessário. Neste período, ainda, com a expansão do ensino fundamental em detrimento de outras etapas ou modalidades da educação básica. O próprio ensino fundamental expandiu com os recursos disponíveis, sem o financiamento necessário, tanto para condições materiais das escolas quanto salário de professores. Houve assim a naturalização da precarização em todas as etapas e modalidades, e cada vez mais o repasse da execução ou direção para instituições privadas com ou sem fins lucrativos, mas que imprimem a lógica mercantil na educação. Quanto ao papel do Estado, muitas questões nos acompanham, afinal, como atua? financia? controla? se retira? está mais presente? Imprime a lógica de mercado através do Estado gerencial? Verificamos em nossas pesquisas que o papel do Estado na relação entre o público e o privado, que inicialmente seria o de retirar-se da provisão das políticas, através da execução direta ou do financiamento, se mantém no sentido de financiador dos programas, apesar da execução ser privada. No que se refere à direção, observamos em alguns casos que o poder público continua o executor, mas a direção e controle passam a ser de instituições privadas, como nos casos brasileiros do Instituto Ayrton Senna e Instituto Unibanco. Historicamente, o privado foi parâmetro de organização da escola pública. No Fordismo, através da hierarquia, divisão social do trabalho, especialização e formas de controle como a supervisão escolar. Nosso país viveu um processo recente de democratização e lutamos por outra forma de organização da escola, com princípios democráticos, e criticamos a teoria do capital humano e concepções gerenciais de organização da escola. Hoje, esses valores são retomados nas parcerias dos Institutos Unibanco e Ayrton Senna, que concentram seu foco nos resultados e uma política de controle e intimidação através da premiação e sanções. Outra questão importante é que o mercado justifica a sua atuação no público para formar um sujeito instrumental à reestruturação produtiva, e um projeto de desenvolvimento competitivo em nível internacional, no entanto, as parcerias atuam com produtos padronizados

150 e replicáveis, no sentido de igual para todos, o que é considerado em nossas pesquisas como um retrocesso. Enfim, a educação sempre esteve vinculada ao capital, mas lutamos, neste período de democratização, para avançar no sentido de uma proposta democrática e realmente pública de educação. Educação entendida como processo societário de formação humana. Nesse aspecto, consideramos a lógica de mercado na educação um retrocesso. É um processo de correlação de forças que não ocorre por acaso e que está cada vez mais dando direção para a política pública. Lutamos por processos democráticos e de justiça social na educação e, quanto mais avançamos neste caminho, mais o capital se organiza para retomar o seu papel na educação. Retomamos a ideia de que são distintos projetos societários de classe em relação.

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Entrevistas THOMAS, Cláudio Augusto. Secretário Substituto/Diretor Técnico do Tribunal de Contas da União em Porto Alegre. [Entrevista]. Porto Alegre, 2006. Entrevista concedida a Vera Maria Vidal Peroni e Juliana Selau Lumertz em 23 de jun. 2006, no Tribunal de Contas da União. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

LOUZADA, José Ricardo Tavares. Assessor Técnico do Tribunal de Contas da União em Porto Alegre. [Entrevista]. Porto Alegre, 2006. Entrevista concedida a Vera Maria Vidal Peroni e Juliana Selau Lumertz em 23 de jun. 2006, no Tribunal de Contas da União. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

Secretária de Educação do município B. [Entrevista]. 2007. Entrevista concedida a Juliana Lumertz e Daniela Dinis em 11 de setembro de 2007, na Secretaria Municipal de Educação. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

Professora do município B. [Entrevista]. 2007. Entrevista concedida a Juliana Lumertz e Daniela Dinis em 11 de setembro de 2007, na Secretaria Municipal de Educação. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

165

Coordenadora Pedagógica do município B. [Entrevista]. 2007. Entrevista concedida a Vera Maria Vidal Peroni; Daniela Diniz Dahm; Daniela de Oliveira Pires, em 1 de agosto de 2007, na Secretaria Municipal de Educação. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

Coordenadora Pedagógica do município A. [Entrevista]. 2006. Entrevista concedida a Vera Maria Vidal Peroni; Juliana Selau Lumertz, em 30 de maio de 2006, na Secretaria Municipal de Educação. Arquivos de Pesquisa, Porto Alegre.

RIKOWSKY, Gleen. [Entrevista]. 29 de maio 2015, no Instituto de educação da University College London. Arquivos de Pesquisa.

ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Estamos realizando uma pesquisa intitulada “Implicações da relação público privada para a democratização da educação básica” para analisar as implicações da relação públicoprivada para a democratização da educação. A pesquisa tem como objetivos: 1. analisar as mais variadas formas de relação entre o público e o privado nas etapas e modalidades da educação básica brasileira, 2. analisar as vinculações em redes e o conteúdo da proposta das formas de materialização do público e o privado, em continuidade e aprofundando ao que os grupos já estavam mapeando na educação básica brasileira. 3) dialogar com a produção internacional acerca do tema público e privado. 4) aprofundar a discussão teórica acerca do conceito e análise de redes globais em educação. 5) mapear as redes globais que influenciam as políticas de educação básica no Brasil e através de que instituições atuam. A pesquisadora responsável por esta pesquisa é a Professora Vera Maria Vidal Peroni (Faculdade de Educação) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que se compromete a esclarecer qualquer dúvida ou necessidade de esclarecimento que eventualmente o participante venha a ter no momento da pesquisa ou posteriormente através dos telefones (051) 3308.3103, do e mail [email protected]. E pessoalmente, no Núcleo de Estudos de Políticas e Gestão da Educação/ Faculdade de Educação, situado na Faculdade de Educação, rua Paulo Gama, s/n - Prédio 12201- Porto Alegre/RS - CEP 9004060. Após ter sido devidamente informado de todos os aspectos desta pesquisa e ter esclarecido todas as minhas dúvidas, eu ....................................................... autorizo a realização do estudo na instituição acima referida ( ) sim ( ) não Em caso positivo: concordo com a identificação da instituição nos relatórios da pesquisa e publicações associadas

( ) sim ( ) não

Concordo com a identificação de meu nome nos relatórios da pesquisa e publicações associadas - ( ) sim ( ) não ________________ ,__________de ______. ______________________________ Assinatura da/o Entrevistado

_______________________________Assinatura do Pesquisador

ANEXO 2 – Orientações para o Planejamento e Execução das ações do Projeto Jovem de Futuro referentes ao recurso financeiro da complementação do Estado

O recurso financeiro da complementação do Estado para as escolas estaduais que aderiram ao Projeto Jovem de Futuro deve usado, prioritariamente, para o financiamento das metodologias do Instituto Unibanco, cujas ações não são financiadas com recursos do Programa Ensino Médio Inovador, a saber:  

Monitoria; Entre Jovens;

Uma vez garantidas as metodologias supracitadas, a escola poderá planejar ações relacionadas às práticas pedagógicas indicadas no plano de ação ProEMI/PJF, na perspectiva do alcance dos resultados do Projeto, tais como:  Oficinas/Palestras;  Aulas de campo;  Capacitações;  Contratação de serviço de fornecimento de alimentação, transporte e hospedagem;  Realização de eventos de natureza científica, artística, cultural e esportiva;  Aquisição de equipamentos e mobiliários para dar suporte às ações planejadas. Ressaltamos que na execução das ações, a escola poderá contratar serviço de pessoa física e/ou jurídica, observando o que estabelecem os seguintes documentos: Lei Estadual Nº ------- da Monitoria e Tutoria de ----- de ------ de 2012 (aguardando publicação em D.O.); Lei do FUNDEB Nº 11.494, de 20 de junho de 2007; Portaria do Ministério da Fazenda/STN Nº 448, de 13 de setembro de 2002; Portaria Interministerial/MP/MF/MCT Nº 127, de 29 de maio de 2008 e Instrução Normativa Conjunta SECON/SEFAZ/SEPLAN Nº 01/2005. Segue anexa planilha com os valores de cada escola. Equipe Executora do ProEMI/PJF SEDUC –Ce Disponível em: .

ANEXO 3 – Programa de Aceleração de Aprendizagem Convênio Sapiranga com Instituto Ayrton Senna

LEI MUNICIPAL Nº 2.328, DE 20/06/1997 Autoriza o Executivo Municipal firmar Convênio com o Instituto Ayrton Senna, para implantação do Programa de Aceleração de Aprendizagem.

RENATO DELMAR MOLLING, Prefeito Municipal de Sapiranga, Estado do Rio Grande do Sul, no uso de suas atribuições legais Faço saber que a Câmara Municipal de Vereadores, aprovou e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º Fica o Executivo Municipal autorizado a celebrar Convênio denominado "Programa de Aceleração de Aprendizagem" com o Instituto Ayrton Senna, nos termos do Instrumento anexo, que faz parte integrante da presente Lei, como se nela inserido estivesse. Art. 2º As despesas decorrentes da execução da presente Lei, correrão por conta de dotação orçamentária própria da Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário. Art. 4º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação. GABINETE DO PREFEITO MUNICIPAL DE SAPIRANGA, aos 20 dias do mês de junho de 1997. CONVÊNIO INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONVÊNIO QUE ENTRE SI, FAZEM, DE UM LADO, PREFEITURA MUNICIPAL DE SAPIRANGA E, DE OUTRO LADO, INSTITUTO AYRTON SENNA PREFEITURA MUNICIPAL DE SAPIRANGA (RS), neste ato representada pelo Sr. Prefeito, Sr. Renato Delmar Molling, brasileiro, casado, funcionário público, portador da Carteira de Identidade RG nº 1.013.824.436 - SSP/RS e inscrito no CPF/MF sob o nº 320.912.060-91, doravante denominada PREFEITURA; e INSTITUTO AYRTON SENNA, associação civil de caráter filantrópico, sem finalidades lucrativas, com sede na Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, na Rua Dr Olavo Egídio, nº 287, 10º andar, inscrita no CGC/MF sob o nº 00.328.072/0001-62, doravante denominado IAS, neste ato devidamente representado por sua Diretora-Presidente, Sra. Viviane Senna Lalli, brasileira, viúva, psicóloga, portadora da Carteira de Identidade RG nº 7.538.713-X e inscrita no CPF/MF sob o nº 077.538.178-09 e por seu Diretor, sem designação

169 específica, Sr. Fabio da Silva Machado, brasileiro, casado, engenheiro, portador da Carteira de Identidade RG nº 4.662.254 e inscrito no CPF/MF sob o nº 724.325.518-34, resolvem celebrar o presente Convênio, mediante as cláusulas e condições seguintes: CLÁUSULA PRIMEIRA – OBJETO O presente Convênio tem por objeto, o comprometimento das Partes para a execução integral de Projeto intitulado "Programa de Aceleração de Aprendizagem", conforme descrito e caracterizado no Anexo I que, rubricado pelas partes passa a integrar o presente, visando minimizar o problema da defasagem idade/série nas escolas da Rede Municipal, com previsão para seu completo desenvolvimento no período máximo de 04 (quatro) anos, a contar de janeiro de 1997, doravante designado simplesmente "PROJETO". CLÁUSULA SEGUNDA – PROJETO A execução do PROJETO pela PREFEITURA obedecerá os parâmetros constantes do Anexo I e as orientações que vierem a ser fornecidas pelo CENTRO DE ENSINO TECNOLÓGICO DE BRASÍLIA - CETEB, unidade de ensino da Fundação de Ensino Secundário, criada pela Portaria nº 764, de 04 de novembro de 1965, editada pelo Presidente da Fundação do Ensino Secundário, com sede em SGAS Quadra 910 - Conjunto D - Asa Sul, na Cidade de Brasília, Distrito Federal, inscrito no CGC/MF sob o nº 34.170.472/0004-57, contratado pelo IAS para assessorar a PREFEITURA e o IAS na execução do PROJETO. Parágrafo Primeiro - O IAS se reserva o direito de fiscalizar o andamento do PROJETO realizando auditorias, exames e verificações de cumprimento dos prazos e certificação do alcance das etapas, através de seus representantes devidamente credenciados. CLÁUSULA TERCEIRA - RESPONSABILIDADE DA PREFEITURA A PREFEITURA se obriga a executar o PROJETO, objeto deste Convênio, com estrita observância das especificações nele constantes, dando ao mesmo a finalidade declarada, utilizando-se dos recursos que lhe forem disponibilizados pelo CETEB na consecução dos objetivos descritos e caracterizados no Anexo II, atendendo às orientações e solicitações do CETEB e do IAS, sob pena de ser caracterizada infração grave ao presente Convênio CLÁUSULA QUARTA - OBRIGAÇÕES DA PREFEITURA São obrigações da PREFEITURA: a) assumir inteira e total responsabilidade pela execução do PROJETO, cumprindo os prazos e obedecendo as etapas do mesmo, observadas as disposições contidas no Anexo I; b) b) assumir, como assumido tem, inteira responsabilidade, por todos os encargos, ônus, alvarás, licenças e autorizações de toda natureza que se tornarem exigíveis para a execução integral do PROJETO; c) assumir por si, seus empregados ou terceiros contratados, inteira responsabilidade por quaisquer reclamações, pleitos, autuações, ações de qualquer natureza e exigências públicas ou privadas, judiciais ou extrajudiciais que tenham base ou fundamento a realização do PROJETO em seu município; d) indenizar o IAS por eventuais prejuízos que este vier a sofrer na hipótese de Controvérsias de natureza trabalhista causadas por seus empregados, servidores concursados, coordenadores, prepostos ou prestadores de serviço, ou de pessoas envolvidas com o PROJETO;

170 c)

d)

e)

f)

g)

h)

i)

j) k)

l)

e) responsabilizar-se pelo pagamento de todos os impostos, taxas e contribuições, fiscais, previdenciárias, trabalhistas, acidentes de trabalho ou parafiscais, que incidam ou venham a incidir sobre o presente Convênio, devendo exibir toda documentação comprobatória do cumprimento dessas obrigações, quando exigido pelo IAS e/ou quaisquer terceiros; f) efetuar o pagamento de todos os salários dos coordenadores municipais envolvidos na execução do PROJETO, bem como garantir o envolvimento dos professores no PROJETO; g) assumir inteira e total responsabilidade pela captação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, necessários para complementação do PROJETO se e quando os recursos financeiros fornecidos pelo CETEB forem insuficientes; h) indicar um coordenador municipal, devidamente qualificado e preparado para o desenvolvimento do PROJETO, que é estritamente educacional, na pessoa de quem deverá ser centralizado o fornecimento de todas as informações de caráter técnico relativo ao desenvolvimento do PROJETO, em nível local; i) fornecer todos os dados o informações solicitadas, referentes nos desenvolvimentos do PROJETO no Município, com veracidade, no prazo improrrogável de 15 (quinze) dias a contar da solicitação por escrito, pelo IAS e/ou pelo CETEB; j) oferecer ao coordenador indicado as condições necessárias ao desempenho de suas funções, garantindo-lhe dedicação exclusiva ao PROJETO, conferindo-lhe autoridade para tratar com diretores, técnicos, professores e comunidade todos os assuntos relacionados à execução integral do PROJETO, garantindo-lhe a presença em todos os eventos promovidos pelo IAS e pelo CETEB, relacionados ao PROJETO, previstos no Anexo I deste Instrumento; k) fornecer os recursos materiais e humanos para a completa execução do PROJETO, na forma que os mesmos vierem a ser solicitados pelo coordenador, em concordância com a Proposta Pedagógica formulada, cuja íntegra, rubricada pelas partes, passa a integrar este Instrumento como Anexo II; l) discutir e apoiar as iniciativas voltadas para o sucesso do PROJETO no Município; m) divulgar a filosofia do PROJETO junto aos demais professores da rede municipal de ensino, criando canais de participação e de compromissos com as direções das escolas envolvidas na execução integral do PROJETO; e, n) atender a todas as determinações e orientações emitidas pelo IAS e pelo CETEB, na condução da execução do PROJETO.

CLÁUSULA QUINTA – DIVULGAÇÃO m) As partes se obrigam a fazer a divulgação do PROJETO, objeto deste Convênio descrito na cláusula Primeira, quer através de entrevistas, quer através de programas televisivos, inclusive "outdoors", placa indicativa do apoio financeiro, sempre com a citação de todos os envolvidos, quais sejam, entre outros, PREFEITURA e IAS, e de acordo com a estratégia de marketing adotada de comum acordo entre os mesmos. n) Parágrafo único. É terminantemente proibida a utilização do nome e/ou da imagem do piloto Ayrton Senna da Silva em qualquer material

171 publicitário para a divulgação dos projetos da PREFEITURA, a qualquer título, exceto se aprovado pelo IAS por escrito. CLÁUSULA SEXTA – PRAZO o) O prazo do presente Convênio é de 1 (hum) ano, a contar de 01/02/97, podendo ser renovado por iguais períodos desde que as partes acordem os novos termos e condições que regerão o mesmo. CLÁUSULA SÉTIMA – INADIMPLEMENTO p) A inobservância ou atraso injustificado no cumprimento das obrigações aqui assumidas caracterizará, de pleno direito, o inadimplemento contratual e acarretará a rescisão do presente Convênio, independentemente de qualquer aviso ou interpelação Se o inadimplemento for da PREFEITURA, esta incorrerá em (i) perdas e danos a serem apurados; e (ji) interrupção imediata da execução do PROJETO, com a suspensão dos serviços de consultoria, supervisão e assessoria prestados pelo CETEB e IAS. CLÁUSULA OITAVA - LIMITES DO CONTRATO q) Fica expressamente estipulado que não se estabelece qualquer relação de emprego entre o IAS, os funcionários da PREFEITURA e o PROJETO beneficiado por este Convênio A PREFEITURA se compromete a apresentar, quando solicitada pelo IAS, toda e qualquer documentação referente aos encargos trabalhistas incidentes na execução do PROJETO. r) Parágrafo único. Fica assumido que, por força deste Convênio, não se estabelece entre o IAS e a PREFEITURA nenhum vínculo jurídico que não seja o definido na cláusula Primeira. CLÁUSULA NONA - DISPOSIÇÕES GERAIS s) Todas as comunicações entre as partes deverão ser feitas por escrito e enviadas aos endereços indicados no preâmbulo deste Instrumento, reputando-se efetuadas na data de seu recebimento. t) A aceitação, por qualquer das partes, do não cumprimento, pela outra, das cláusulas ou condições deste Contrato, a qualquer tempo, será interpretada como mera liberalidade, não implicando, portanto, na renúncia do direito de exigir o cumprimento das obrigações aqui contidas. u) O presente Contrato constitui o acordo integral entre as partes, prevalecendo sobre qualquer outro documento anteriormente firmado por estas e não poderá ser alterado ou modificado em nenhuma de suas cláusulas ou condições, salvo mediante acordo por escrito, assinado por ambas as partes. v) Este Contrato obriga as partes, seus herdeiros e sucessores, não podendo ser cedido, total ou parcialmente, por nenhuma das partes sem o consentimento expresso da outra. w) Fica assumido que, por força deste Convênio, não se estabelece entre o IAS e a PREFEITURA nenhum vínculo jurídico que não seja o definido nas cláusulas Primeira e Segunda deste Instrumento.

172

173 CLÁUSULA DÉCIMA – FORO x) Fica eleito o foro da Comarca de São Paulo, Estado de São Paulo, para dirimir ou decidir as dúvidas decorrentes do presente Convênio, com exclusão de qualquer outro, por mais privilegiado que seja. y) E, por estarem de acordo, firmam as partes este Convênio, depois de lido e achado conforme, em 02 (duas) vias de igual teor e forma, na presença das testemunhas abaixo. z) São Paulo, 01 de fevereiro de 1997. aa) _____________________________________ p. PREFEITURA DE SAPIRANGA bb) Renato Delmar Molling cc) _____________________________________ p. INSTITUTO AYRTON SENNA dd) Viviane Senna Lalli Fabio da Silva Machado ee) Testemunhas: 1 ___________________________________ ff) Nome: Andreia Fatima Bartolo de Carvalho gg) RG: 16407172 hh) 2____________________________________ Nome: RG:

PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DA APRENDIZAGEM. Por quê? O problema - Mais de 41% dos alunos da 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental estão com uma defasagem idade-série de, no mínimo, dois anos (MEC Sinopse Estatística Educação Fundamental - Censo Educacional de 1994). - A ineficiência do sistema escolar, gerada sobretudo pela repetência, custa ao país mais de dois bilhões de reais por ano. - O maior custo da repetência, no entanto, são os danos irreparáveis à auto-estima do aluno e os estigmas de atrasado, repetente, incapaz. O quê? O Programa O Programa de Aceleração da Aprendizagem constitui-se em uma decisão política que visa à correção do fluxo escolar, pela redução da distorção idade-série, em quatro anos. Ano 1 - desenvolvimento do Programa em 10 escolas. Ano 2 - disseminação do Programa em escala a ser determinada em cada município. Ano 3 - universalização do Programa no município. Ano 4 - atendimento a eventuais alunos e retorno dos professores às classes regulares. Para quem? Clientela-alvo

174 - Alunos da primeira a terceira série do Ensino Fundamental, com mais de dois anos de defasagem idade-série. Para quê? resultados esperados - Erradicação gradativa da cultura da repetência, com a implementação da pedagogia do sucesso. - Correção do fluxo escolar, mediante a redução significativa da defasagem idade-série. - Redução do índice de alunos retidos nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental. - Ampliação do número de vagas para novos alunos. Como? O funcionamento - O Programa de Aceleração da Aprendizagem será desenvolvido, em quatro anos, para a rede escolar do município, e em um ano, para cada aluno, em particular. - O aluno, ao final do programa, poderá ser promovido para 4ª ou 5ª série do Ensino Fundamental, dependendo do rendimento. - As escolas integrarão voluntariamente o Programa, podendo propor outra alternativa para solução do problema. - O município indicará um profissional de educação, que assumirá a gerência do Programa na localidade. - Os professores, ao final dos quatros anos, retornarão às classes regulares do Ensino Fundamental, preparados na metodologia. - Os municípios integrantes do Programa formarão uma rede de articulação para troca de experiências e de informações. - Os municípios integrantes do Programa de Aceleração da Aprendizagem receberão apoio do Instituto Ayrton Senna. De que forma? O assessoramento. - Os professores e coordenadores integrantes do Programa serão capacitados na pedagogia do sucesso. - O desenvolvimento do Programa, no município, será acompanhado e avaliado periodicamente por professores especializados. - O aluno será avaliado, pelo professor, no processo, pelas suas realizações e, ao final do Programa, por instituição externa, em função de parâmetros nacionais. - Os resultados do Programa serão amplamente divulgados junto à comunidade e a autoridades da área educacional. PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DE APRENDIZAGEM PLANEJAMENTO/ CRONOGRAMA DAS AÇÕES ANO 1 Período Ord Atividades Previsto Inclusão do Programa de Aceleração da Aprendizagem no novembro/deze 01 Plano Municipal da Gestão 1997 - 2000, como prioridade do mbro - 96 prefeito Escolha do gerente do Programa de Aceleração da 02 janeiro - 97 Aprendizagem no município Encaminhamento ao CETEB/ Instituto Ayrton Senna: - nome 03 e dados pessoais do gerente do Programa no município; - dados 13/01/97 da distorção idade-série no município (quadro II), após

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levantamento por escola (quadro I); - calendário escolar de 1997 no município; - plano de ação do município na área educacional Encaminhamento do gerente do Programa no município para 20 a 24/01/97 participar de curso de capacitação Análise da situação educacional do município, referente à 27 a 31/01/97 distorção idade-série, com os diretores das escolas Seleção das dez escolas para operacionalização do Programa 03 a 14/02/97 de Aceleração da Aprendizagem em 1997 Divulgação para a comunidade escolar (diretores, professores, alunos, pais, servidores, etc) do Programa de Aceleração da 03 a 14/02/97 Aprendizagem Organização das classes de Aceleração da Aprendizagem nas 17 a 21/2/97 escolas selecionadas Seleção dos professores para assumirem as classes de 17 a 21/2/97 Aceleração da Aprendizagem Treinamento de professores 24 a 28/2/97 Início das atividades com os alunos 1997 Realização de reuniões mensais com o gerente e professor 1997 Participação do gerente em reuniões bimestrais 1997 Fornecimento regular de informações sobre o 1997 desenvolvimento do Programa, no município Participação do Prefeito e Secretário Municipal de Educação 1997 em reuniões de avaliação do Programa Planejamento das ações de 1998 1997

ANEXO II Proposta Pedagógica de Aceleração da Aprendizagem no Ensino Fundamental SUMÁRIO I – APRESENTAÇÃO II – JUSTIFICATIVA III – OBJETIVOS IV - FUNDAMENTAÇÃO LEGAL V – ABRANGÊNCIA VI - FUNDAMENTAÇÃO PEDAGÓGICA VII - ABORDAGEM METODOLÓGICA VIII - MATRIZ DOS CONTEÚDOS/ HABILIDADES IX - MATERIAL DIDÁTICOX - RECURSOS HUMANOS XI - CAPACITAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS XII – AVALIAÇÃO I - APRESENTAÇÃO Alerta quanto à gravidade dos problemas que afetam o atendimento educacional na Rede Pública Municipal de Ensino e preocupada com a sua solução, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos, a Prefeitura Municipal de Rio Branco adota uma proposta de intervenção na realidade, visando corrigir a distorção idade-série que se apresenta como um dos elementos dificultadores do cumprimento do preceito constitucional do direito de

176 todos à educação. A Proposta Pedagógica, que ora se apresenta, configura-se como uma ação específica, destinada a corrigir a situação de defasagem idade-série e comprometida com a qualidade final do produto, expressa em termos de prosseguimento de estudos e de aprendizagens significativas. Caracteriza-se, ainda, por responder aos imperativos dos novos tempos, em termos do desenvolvimento de competências cognitivas básicas e da construção da auto-estima do aluno, bem como por regularizar, em quatro anos, o fluxo dos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental. II - JUSTIFICATIVA A defasagem idade-série que se acumula ao longo dos anos constitui, dentre outros, um desafio para a educação brasileira, uma vez que interfere de forma acentuada na eficiência do ensino público. Segundo dados da Sinopse Estatística - Educação Fundamental - Censo Educacional/94 - MEC - 40% (quarenta por cento), ou seja mais de 10 (dez) milhões de crianças matriculadas em escolas de 1º grau, em todo o Brasil, apresentam uma distorção idade-série superior a dois anos. Os custos deste problema, em termos econômicos, representam imensos gastos que poderiam ser melhor aplicados e direcionados para o aprimoramento do Ensino Fundamental no País: Ponderada a gravidade desse problema, observa-se que o Município, a sociedade e o cidadão arcam com as conseqüências políticas, econômicas e sociais dessa defasagem idade-série tão expressiva, uma vez que a mesma impede o acesso de novos alunos ao sistema público de ensino, acarreta o desperdício de recursos públicos, considerandose a relação custo-benefício, e provoca o desprestígio da escola pública. Constata-se, ainda, que os efeitos mais diretos e acentuados recaem sobre as famílias e sobre os alunos, que vêem frustradas suas expectativas em relação ao sucesso escolar e bloqueadas as perspectivas de integração social plena e de inserção no mercado formal de trabalho, além de sofrerem a violência imposta à auto-estima. Tendo em vista o quadro educacional assim configurado, a Prefeitura Municipal de Rio Branco formulou a presente proposta pedagógica, em caráter experimental, com perspectivas de consolidação e de expansão, considerados os resultados alcançados. III – OBJETIVOS Geral Melhorar a eficiência e a eficácia do ensino público municipal, mediante a regularização do fluxo escolar dos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental. Específicos - Desenvolver alternativa pedagógica de aceleração da aprendizagem, fundamentada em aprendizagens significativas, a partir do Currículo Básico, e no fortalecimento da auto-estima do aluno. - Promover o aluno, ao final do ano letivo, para a série em que apresente condições de prosseguimento regular de estudos. IV - FUNDAMENTAÇÃO LEGALA Prefeitura Municipal de Rio Branco - AC, em sua proposição, respalda-se na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, no capítulo referente à Educação Básica, essencialmente em seu artigo 24, inciso V, alínea "b" que possibilita a "aceleração de estudos para alunos com atraso escolar".A ratificar o respaldo legal que viabiliza a presente Proposta Pedagógica de Aceleração da Aprendizagem, preceitua o artigo 23 da referida Lei que "A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de período de estudos, grupos nãoseriados com base na idade, na competência e em outros critérios ou por forma de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar".Ressalta-se, ainda, o artigo 24, que trata da organização da educação básica, nos níveis fundamentais e médio, na alínea "c" de seu inciso II, que possibilita a classificação para qualquer série ou etapa do ensino fundamental "independente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que define o grau de desenvolvimento e experiência do candidato".Considerando a legislação educacional, cabe ao órgão executor da Educação no Município apresentar a proposta de atendimento específico aos alunos que se encontram na situação de defasagem escolar, a qual

177 se configura na presente experiência pedagógica, e submetê-la ao egrégio Conselho Estadual de Educação, para a competente apreciação. A Proposta Pedagógica de Aceleração da Aprendizagem no Ensino Fundamental deverá ter, no período de 1997, o caráter de experiência pedagógica e, mediante os resultados obtidos, ser referendada pelo egrégio Conselho Estadual de Educação para expansão, a partir de 1998, em toda a rede pública municipal de ensino, constituindo-se, assim, em mais uma alternativa pedagógica do sistema público de ensino. V – ABRANGÊNCIA A Proposta Pedagógica de Aceleração da Aprendizagem no Ensino Fundamental, em sua fase experimental, abrangerá alunos das três primeiras séries, de dez classes das escolas públicas municipais. VI - FUNDAMENTAÇÃO PEDAGÓGICAA Escola, como instância de formação da cidadania, assume sua função social ao garantir a todos o direito constitucional à educação fundamental. Ao propiciar o desenvolvimento das competências cognitivas básicas e favorecer aprendizagens significativas, atua tanto na dimensão pessoal quanto social. Na Escola, concentram-se muitas das expectativas de vivência da cidadania plena e da construção de uma sociedade mais justa. Essa Escola eficiente configura-se pela conjugação do compromisso político de todos os seus agentes, desde servidores, professores, diretores até a mais alta autoridade educacional constituída, com a competência técnica comprovada pelo sucesso do aluno, no percurso temporal legalmente estabelecido. A entrada tardia, a repetência sucessiva e a evasão continuada, consubstanciadas nos índices elevados da defasagem idade-série, evidenciam a urgência em se repensar a Escola, hoje, institucionalizada, em decorrência das graves conseqüências sociais dessas práticas freqüentes no sistema público do ensino brasileiro. Repensar a Escola pressupõe o redimensionamento de sua filosofia educacional que deve fazer da crença na capacidade humana para aprender e do desenvolvimento da auto-estima do aluno os seus alicerces básicos Dessa forma, o clima organizacional da Escola possibilitará a substituição da pedagogia da repetência pela pedagogia do sucesso. VII - ABORDAGEM METODOLÓGICAA presente proposta pedagógica baseia-se na pedagogia do sucesso, cuja hipótese central consiste no pressuposto de que os alunos com acentuada defasagem idade-série são capazes de dominar, com mais rapidez, os conteúdos básicos do currículo, desde que ensinados adequadamente e os alunos, colocados num ambiente motivador que lhes permita acumular sucessos de forma progressiva e, assim, desenvolver adequadamente a auto-estima. Essa abordagem metodológica pautar-se-á nas seguintes diretrizes de ação: - as experiências, interesses e necessidades dos alunos constituir-se-ão pontos referenciais de partida da ação docente, uma vez que a maturidade cronológica deve ser considerada no contexto do desenvolvimento intelectual e social do ser humano; - o planejamento sistemático das atividades, o acompanhamento constante do desempenho do aluno, o feedback imediato e retomadas necessárias, oportunas e adequadas conduzirão à otimização do tempo pedagógico; - o aprender fazendo, caracterizado pelo trabalho por atividades, a partir de projetos, temas instigadores, eventos estimuladores, etc consistirá na dinâmica de sala de aula e Norteará o planejamento didático; - as atividades de ensinoaprendizagem englobarão, de forma graduada e progressiva, os conteúdos programáticos estabelecidos nas diferentes áreas do conhecimento, constantes do currículo oficial; - o tratamento interdisciplinar e contextualizado dos conteúdos programáticos, inerente a cada atividade, tornar-se-á suporte para o desenvolvimento de habilidades cognitivas básicas; - as habilidades de reconhecer, associar, classificar, analisar, deduzir, generalizar, sintetizar, aplicar e transferir conhecimentos, dentre outras, desenvolver-se-ão mediante o estudo crítico dos conteúdos programáticos e a realização das atividades programadas; - as aprendizagens significativas e as condições evidenciadas de prosseguimento seguro de estudos constituir-se-

178 ão em critérios de avaliação de progresso do aluno. O professor, nessa abordagem metodológica, exercerá o papel de animador de grupos, articulador das ações educativas e promotor de aprendizagens significativas, conduzindo, assim, todos os alunos ao sucesso. A ele, portanto, caberá: - identificar interesses e necessidades dos alunos, visando ao planejamento conjunto das atividades; - estimular e garantir a participação de todos os alunos em todas as atividades, distribuindo tarefas segundo potencialidades, se for o caso; - selecionar previamente material necessário às atividades planejadas para o dia; - preparar a exposição teórica dos conteúdos, quando necessário; - sistematizar, com os alunos, as informações trabalhadas em cada atividade, em consonância com o currículo estabelecido; - elaborar exercícios de fixação dos conteúdos desenvolvidos a partir de atividades, sempre que necessário; - orientar os alunos na execução das tarefas em sala de aula; - orientar as tarefas a serem cumpridas pelos alunos fora da sala de aula, com vistas ao desenvolvimento das atividades; - observar o desempenho de cada aluno, em termos de sociabilidade, comunicação oral e escrita, domínio dos conceitos trabalhados; - possibilitar a exposição oral e/ou escrita dos trabalhos produzidos; - programar atividades de recuperação para os alunos que necessitarem; - registrar, sistematicamente, o desempenho dos alunos nas atividades; - elaborar e aplicar instrumentos de avaliação, em consonância com as atividades desenvolvidas. Nessa perspectiva, o desempenho e progresso escolar do aluno, deverão ser acompanhados e avaliados em termos de: - iniciativa; - habilidade de trabalho em grupo; - comunicação oral e escrita; - participação, responsabilidade, comprometimento; - capacidade de análise e síntese; - consistência de argumentação; - criatividade; - aplicação de conceitos trabalhados; - domínio de conteúdo. VIII - CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS Desenvolver-se-ão, na presente proposta pedagógica, os conteúdos programáticos adotados na Rede Municipal de Ensino, cotejados com os conteúdos selecionados nacionalmente para o Sistema de Avaliação do Ensino Básico (SAEB - MEC). Os conteúdos programáticos estão organizados por áreas de ensino e por habilidades, conforme matriz anexa. IX - RECURSOS DIDÁTICOS A Proposta Pedagógica de Aceleração da Aprendizagem no Ensino Fundamental será desenvolvida a partir de material didático específico, destinado a alunos e professores. O material didático do professor compõe-se de um Manual, com orientações referentes à Proposta e às atividades didáticas, e uma Caixa de Material Complementar, contendo os recursos adicionais indicados no material do aluno, além de livros de literatura infanto-juvenil. O material do aluno compõe-se de sete instrumentos, denominados Módulo Introdutório e

179 Projetos I, II, III, IV, V, e VI, que abordam os conteúdos programáticos das séries iniciais do Ensino Fundamental, no enfoque metodológico da Proposta. Este material foi testado, em 1996, nos Estados de Minas Gerais, Paraná, Maranhão e Mato Grosso, em 150 classes das redes públicas estaduais, tendo sido considerado adequado à filosofia da Proposta, frente à receptividade de alunos e professores X - RECURSOS HUMANOS A Proposta Pedagógica de Aceleração de estudos no Ensino Fundamental estará sob a responsabilidade do seguinte quadro de profissionais: - Professores regentes, habilitados em nível de 2º Grau Magistério ou 3º Grau, integrantes do quadro de pessoal da Secretaria Municipal da Educação, para atuação direta em sala de aula. - Equipe técnica das escolas, constituída por diretores, supervisores e orientadores habilitados em nível de 2º Grau Magistério ou 3º Grau, integrantes do quadro de pessoal da Secretaria Municipal da Educação, para orientação aos professores e acompanhamento local. - Equipe técnica da Secretaria Municipal de Educação, constituída por professores e pedagogos, habilitados em nível de 3º Grau para implantação, acompanhamento e avaliação da Proposta. - Consultores técnico-pedagógicos, para assessoramento à Secretaria Municipal de Educação.

Disponível em: . Acesso em: 20 out. 2015.

ANEXO 4 – EduLab21 - rede multidisciplinar de parceiros como universidades, pesquisadores, fundações e organizações internacionais, proposta pelo Instituto Ayrton Senna

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