INFORMALIDADE NO SETOR TÊXTIL EM GOIÂNIA: responsabilidade civil do Estado

May 23, 2017 | Autor: Jornande Fernando | Categoria: Urban Informality, Responsabilità Civile, Responsabilidade Civil, Informality, Informalidade
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Bacharelando em Direito (UNIVERSO/GO).
Mestre em Direito das Relações Jurídico-empresariais (UNIFRAN/SP). Especialista em Direito Civil (UFG) e em Direito Processual Penal (UFG).


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INFORMALIDADE NO SETOR TÊXTIL EM GOIÂNIA: responsabilidade civil do Estado


Jornande Fernando Jacinto
Orientador: Giulliano Rodrigo Gonçalves e Silva

RESUMO

O presente artigo aborda a questão da informalidade no setor têxtil que, em Goiânia, atingiu dimensões assustadoras, trazendo consequências terríveis, comprometendo a estética, o trânsito e, principalmente, o mercado formal. A feira livre é muito importante, porque além de ser uma manifestação cultural, oportuniza aos pequenos produtores de hortifrúti e artesãos, a comercialização de seus produtos diretamente ao consumidor final. Com o passar dos anos, na cidade de Goiânia, as feiras de produtos artesanais perderam lugar para produtos industrializados, predominantemente, artigos do vestuário. Um dos fatores que favoreceu ao comércio de roupas nas feiras livres foi a oportunidade de evasão fiscal por parte dos empreendedores informalizados, com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador, fugindo, assim, da pesada carga tributária. A responsabilidade civil fica evidenciada na ação do Estado em estabelecer regularmente o comércio de tais produtos nas feiras, bem como sua omissão na fiscalização das mesmas e dos estabelecimentos em torno da feira Hippie, incentivando ainda mais a informalidade que, por meio da concorrência desleal, vem comercializando em larga escala, inclusive no atacado, ferindo de morte o princípio da igualdade, prejudicando drasticamente o mercado formal no setor de confecções.

Palavras-chave: Informalidade, setor têxtil, concorrência desleal, responsabilidade civil do Estado.

INFORMALITY IN THE TEXTILE SECTOR IN GOIÂNIA:
civil responsibility of the State

ABSTRACT

The informality in the textile sector in Goiânia reached frightening dimensions, bringing terrible consequences, compromising aesthetics, traffic and, mainly, the formal market. The free fair is very important, because in addition to being a manifestation of the Brazilian urban culture, it gives the opportunity to the small producers of vegetables and craftsmen, the commercialization of its products directly to the final consumer. Over the years, in the city of Goiânia, handicraft fairs have lost their place to industrialized products, predominantly clothing. One of the factors that favored the free trade in clothes was the opportunity for tax evasion by informalized entrepreneurs, in order to conceal the occurrence of the generating event, thus avoiding the heavy tax burden. The civil responsibility is evidenced in the State's action in regularly establishing the trade of such products in the free markets, as well as their omission in the inspection of the same and the establishments around the Hippie free market, further encouraging the informality that, through unfair competition, Has been marketed on a large scale, including in the wholesale market, and has wounded the principle of equality to death, damaging the formal market in the apparel sector.

Key words: Informality, textile sector, unfair competition, State civil responsibility.

INTRODUÇÃO

A questão em tela não se trata de uma clandestinidade de difícil identificação e combate. A desleal concorrência, ocorre às claras, em espaços públicos, em feiras instituídas e regulamentadas pelo próprio Estado. Ambulantes e artesãos quase não são encontrados nas feiras e camelódromos. O que se encontra, predominantemente, são empresários que comercializam milhões de reais aos milhares de clientes de todo o Brasil, atraídos pelo preço baixo por razões óbvias.
Ao longo dos últimos anos, centenas de estabelecimentos foram fechados e outros tantos encontram-se prestes a seguir o mesmo caminho devido ao endividamento consequente da concorrência desleal. Outro ponto, não menos importante, é em relação à poluição visual e o caos no trânsito, que se relacionam com o Plano Diretor da Cidade de Goiânia.
A redução das empresas formais do setor do vestuário, devido ao aumento da informalidade das feiras abertas, especialmente as Feiras da Lua, a Feira Hippie e camelódromos nas imediações desta, gera consequências macroeconômicas. A diminuição de empregos formais agrava a crise do INSS, além da perda de direitos e garantias dos trabalhadores do setor; É, também, afetada a máquina pública devido a queda na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais, devido à prática dos comerciantes de venderem sem nota fiscal.
Ressalte-se que elusão fiscal é um tipo de sonegação camuflada, como no caso em tela onde o confeccionista sonegador, protegido pelo manto de feirante fornecido pelo próprio Estado, comercializa no atacado, produtos industrializados, em desleal concorrência com o formalizado.
Saber até onde vai a responsabilidade do Estado nessa problemática é de suma importância. Segundo a teoria do risco administrativo, que é a atribuição ao Estado a responsabilidade pelo risco criado por sua atividade administrativa. É sabido que em relação à presente questão motivadora deste estudo não há unanimidade, todavia, vislumbra-se mostrar a relevância por meio de elementos jurídicos e doutrinários, ciente de que o pensamento crítico progride na medida em que se conscientiza acerca do conteúdo posto e dos problemas advindos.
Utilizando o método dedutivo, esse artigo aborda as dificuldades do setor de confecções e consequente migração para a informalidade, especialmente para feiras livres. A conivência do Estado afronta princípios e causam danos aos empreendedores formais. Por fim, aponta-se a responsabilidade civil do Estado.
O objetivo principal deste artigo verte-se à identificação prima facie das consequências da informalidade bem como a responsabilidade civil do Estado, vislumbrando não apenas a reparação do dano, mas especialmente a mudança de conduta do Estado a fim de assegurar o fortalecimento do empreendedorismo formal em harmonia com os princípios do direito.

1 VIA DOLOROSA DO EMPREENDEDOR FORMAL

O empreendedor do ramo de confecções de artigos do vestuário que opta pela formalidade submete-se a um longo e oneroso processo para iniciar e manter sua atividade empresarial. Registrar na Junta Comercial o contrato social, fornecendo o CNPJ obtido anteriormente. Em seguida, deve-se cumprir a inscrição tributária da empresa na Receita Federal, e pedir a inscrição estadual na Secretaria de Fazenda. Só então se poderá ir aos órgãos específicos, como a Prefeitura, os Bombeiros, e outros setores afins para solicitar uma série de licenças, registros e alvarás municipais e estaduais necessários. Finalmente, fazer o registro dos empregados.
E ainda, tem que arcar com as despesas tais como o registro da marca, móveis e equipamentos de informática, "software", fachada do ponto comercial e honorários do contador. Depois de tudo isso, ele deve gerir o negócio em busca do lucro almejado, recolhendo todas as taxas e impostos, porém, quando é vítima de uma inadimplência, perde o investimento feito e ainda sofre o ônus de pagar tributos sobre o valor não recebido. Também é passível das implacáveis visitas dos fiscais do estado, do município, do INMETRO, do Trabalho, do INSS, que sempre encontram uma falha para aplicar pesadas multas. Por outro lado, os feirantes e lojistas da 44 não são submetidos ao mesmo tratamento.
Segundo o presidente do Sindicato das Indústrias de Confecções de Roupas em Geral de Goiânia (Sinroupas), Edílson Borges (2014), Goiânia sempre foi um forte polo de confecções devido sua tradição e localização no centro do país. Porém, o primeiro grande impacto sofrido pelo setor ocorreu com a entrada de produtos estrangeiros, vindos dos países asiáticos, especialmente os chineses. Ocorre que os produtos na China são fabricados por mão de obra muito barata, os produtos chegam ao Brasil quase sem controle, praticamente sem tributação. De acordo com o Fernando Leite (2012), do Jornal Opção, eles afetaram a indústria de calçados, de brinquedos e estão fazendo o mesmo com a indústria têxtil goiana. O segundo grande golpe foi atribuído aos efeitos da crise financeira internacional, levando o setor a perdas em torno de 25% do faturamento. A inércia do Estado em proteger as empresas do ramo de confecção levou boa parte a fechar e migrar para a informalidade. Abaixo, foto de lojas fechadas na Avenida Bernardo Sayão, Goiânia.

O que a priori era uma questão de sobrevivência, tornou-se um novo nicho de negócio espetacular, o empreendedor informal não está sujeito a quase nenhum tributo e por isso vende um produto muito semelhante, pelo preço muito inferior, com lucro muito superior ao do concorrente que trabalha na formalidade.
Na foto abaixo, feira Hippie com mais de quatro mil bancas:
O resultado deste quadro é a segurança para os comerciantes informais e locadores de imóveis na 44, imediações da feira Hippie, que mesmo em meio à crise conseguem manter seus negócios com considerável margem de lucro. Por outro lado, segundo a Associação Comercial e Industrial da Avenida Bernardo Sayão, só nesta avenida, polo de lojas de roupas em Goiânia, já fecharam quase 800 (oitocentas) lojas do total de 2.240 (duas mil, duzentos e quarenta). O poder público assiste a tudo não de braços cruzados, porque ele mesmo dá assistência ao comércio informal de produtos industrializados, quando estabelece as feiras livres e deixa de fiscalizar as mesmas, bem como as lojas entorno da feira Hippie.
Observe-se, que o informal não trabalha às escuras, na clandestinidade, pelo contrário, opera às vistas de todos com situação regularizada pelo Estado. Há pontos de venda em dezenas feiras livres, principalmente na Feira Hippie, a qual, devido à grande demanda de comerciantes, os proprietários de imóveis em sua volta construíram dezenas de galerias com um número aproximado de 8.000 (oito mil) boxes que variam entre 3m² e 15m², alugados por altos preços, de R$1.500,00 a R$10.000,00, e ainda cobrando "luvas" (res sperata) que variam entre R$50.000,00 a R$900.000,00. Isso porque são mais de 200 ônibus por semana trazendo clientes, lojistas e sacoleiras, de toda parte do Brasil atraídos pelo baixo preço da mercadoria feita com know how por quem um dia já foi formal. Conforme informa a Lúcia Monteiro (2014) em reportagem do jornal O Popular.
Mesmo que os dados supracitados não sejam científicos, há evidências que em meio a esse caos, existem pessoas muito poderosas e influentes politicamente que estão fazendo grande fortuna beneficiando-se com essa situação.
Foto de uma das dezenas de galerias entorno da feira Hippie:
Empresários informais possuem pontos de venda em bancas e boxes em Goiânia, e também, filiais em outra cidade, segundo Dayse Freitas (2015) do jornal O Popular, na Feira dos Goianos em Taguatinga-DF, há mais de 10 mil feirantes, sendo 70% deles compostos pelos comerciantes lojistas na região da 44.
Os comerciantes informais comercializam seus produtos com quase nenhuma inadimplência porque não aceitam cheques, só dinheiro e cartão de crédito ou débito. Eles também não pagam a comissão de 10% aos assessores de vendas, que são intermediadores que levam os clientes aos lojistas formais. Enquanto isso, os poucos empreendedores que continuam na formalidade continuam pagando todos os tributos municipais, estaduais e federais concorrendo com produtos chineses e produtos goianienses fabricados e comercializados na informalidade.
Abaixo, foto da feira Hippie:
E ainda, para piorar, os confeccionistas formais enfrentam a terrível crise nacional, provocada pela desastrosa administração dos governos do Lula e da Dilma, ambos do PT, principal partido envolvido no esquema de corrupção que fez um rombo na Petrobras. Enquanto isso, em Goiânia, as ruas adjacentes da feira Hippie tornaram-se uma terra sem lei, sem ordem no trânsito, sem o correto recolhimento de tributos, uma inércia quase total do poder público municipal, estadual e federal, sem nenhuma fiscalização efetiva. Observe-se que não são poucos os envolvidos direta e indiretamente na presente questão. No entanto, tendo em vista a relevância do tema, todo o esforço em busca de soluções faz-se necessário. Abaixo, foto da Rua 44 ao lado da feira Hippie:

2 TRANSGRESSÕES OCORRIDAS

O princípio da igualdade encontra-se positivado no campo do direito tributário no art. 150, II da CF, com a expressa vedação de tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibindo qualquer forma de distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.
Importante destacar a expressão: "contribuintes que se encontrem em situação equivalente", pois se trata do cerne da questão. Se restar comprovado que os comerciantes formais e informais encontram-se em situação equivalente, então será comprovada a ofensa o princípio da igualdade.
Conforme a legislação pertinente a condição de contribuinte do imposto fica configurada pela realização de operação de circulação de mercadoria, com habitualidade e em volume que caracteriza intuito comercial, segundo dispõe o art. 34, caput, e § 2, IV, V, VI, do Regulamento do Código Tributário Estadual:
Art. 34. Contribuinte é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, ainda que a operação e a prestação se iniciem no exterior (Lei nº 11.651/91, art. 44).
§ 2º Considera-se:
IV - industrial, a pessoa natural ou jurídica que exerça atividade que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo;
V - importador, a pessoa natural ou jurídica que importe do exterior mercadoria ou bem;
VI - comerciante, a pessoa natural ou jurídica que pratique, com habitualidade, a intermediação de mercadoria, incluindo como tal, o fornecimento de mercadoria com prestação de serviço sujeito à incidência do ICMS;
Prosseguindo, observe-se que a Portaria n. 1.483/89, art. 3. caput, parágrafo único, item 1, que trata do Cadastro de Contribuintes do Estado, deixa claro que pessoas físicas que pratiquem, em nome próprio ou de terceiros, operações ou prestação sujeitas à tributação do ICMS, são contribuintes, inclusive os vendedores ambulantes e feirantes são citados de forma expressa:
Art. 3º Os contribuintes do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, assim entendidos quaisquer pessoas físicas ou jurídicas de direito público e privado que realizem operações relativas à circulação de mercadorias ou promovam a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, são obrigados a inscrição no Cadastro de Contribuintes do Estado - CCE antes do início de qualquer atividade que constitua fato gerador do referido imposto.
Parágrafo único. Incluem-se entre os obrigados à inscrição:
1. os comerciantes, mesmo que não possuam estabelecimento fixo, como o vendedores ambulantes e os feirantes;
Todavia, é sabido e consabido que os comerciantes informais que atuam nas feiras livres e região da 44, no caso em tela, não pagam os tributos e não se sujeitam às exigências legais pertinentes aos contribuintes.
Antes da previsão deste princípio no artigo 150, II da Constituição Federal, verificamos a sua presença em várias passagens da Constituição, a começar pelo preâmbulo que aponta a igualdade como valor supremo de nossa sociedade, logo após encontramos o princípio da igualdade no artigo 5., caput, da Carta Magna ao dispor que: "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza", o que faz o art. 150, II, é reforçar este princípio maior.
Sabemos que os princípios são norteadores de direção das demais normas que compõem o nosso sistema jurídico, coexistindo sem sobreposição de um em relação a outro. Contudo, o princípio da igualdade, independente das menções expressas no texto constitucional devido sua relevância, é um dos maiores princípios a compor e orientar o nosso sistema jurídico, pois assegura a democracia. Ao falar do princípio da igualdade surge a lembrança da célebre frase de um dos maiores juristas de todos os tempos, Rui Barbosa (2003, p. 19):
A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real.
Neste prisma de Rui Barbosa, percebe-se que a instituição do Simples Nacional que favoreceu as pequenas e microempresas, foi absolutamente compreensível e constitucional, em harmonia com artigo 179 da CRFB/88, com o artigo 970 do CCB e o artigo 18-A, da Lei Complementar n. 123/06, simplificando o recolhimento dos tributos com uma pequena redução dos mesmos, tendo em vista o fortalecimento das empresas que apesar de pequenas, são responsáveis por uma parte significativa no recolhimento de tributos e geração de empregos formais. Não configurando um dano às médias e grandes empresas que possuem poder de compra, alta tecnologia, fácil acesso às linhas de crédito e, consequentemente, alta competitividade.
Contrariando à filosofia do Simples Nacional, na cidade de Goiânia o Estado tem favorecido os empreendedores informais em detrimento das pequenas e microempresas formais, permitindo o enfraquecimento das mesmas, ao regularizar a informalidade da indústria e comércio de artigos do vestuário, fazendo "vistas grossas" para as inúmeras irregularidades como a elusão fiscal que configura o crime de concorrência desleal, nos termos do artigo 195, caput e III da Lei n. 9.279/96:
Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem:
III - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
A doutrina dominante brasileira não utiliza a figura da elusão fiscal, que se diferencia da evasão fiscal pelo fato de se tratar da utilização de negócios jurídicos atípicos ou indiretos desprovidos de causa ou estruturados como simulação ou fraude a lei, com o objetivo de evitar a tributação pertinente ou obtendo uma vantagem fiscal indevida. Essa conduta praticada pelo particular visa evitar o surgimento da obrigação tributária, mediante a utilização de negócios jurídicos lícitos, todavia, com a violação indireta da lei, contornando-a dissimuladamente.
A sonegação fiscal, a inobservância de obrigações previdenciárias ou trabalhistas, o desrespeito às regras que disciplinam o exercício de atividade econômica influenciam diretamente na constituição do preço de venda. Portanto, a sonegação de tributos proporciona uma vantagem competitiva ilicitamente obtida, possibilitando vender seus produtos a um preço inferior ao praticado no mercado. A concorrência desleal entre aquele que cumpre com as suas obrigações tributárias e, que por isso, acaba por vender o seu produto a um preço mais elevado, resulta em um desequilíbrio, inviabilizando a sua permanência no mercado.
Quando um empresário, informal ou não, atua a partir de uma prática irregular, em desleal concorrência com os demais, este não só prejudica todos os outros empresários que exploram o mesmo ramo, como também toda a sociedade. A concorrência desleal, pode ser classificada em duas categorias: a concorrência desleal específica e a genérica. A concorrência desleal específica é aquela tipificada como crime, positivada na Lei n. 9.279/96, em seu artigo 195. Já a concorrência desleal genérica, não é tipificada como crime, e encontra-se positivada no artigo 209 da mesma lei. Conforme entendimento de Coelho (2011, p. 210), o qual aduz que:
a concorrência desleal específica se viabiliza por meios inidôneos mais facilmente delineados (isto é, a violação de segredo da empresa e a indução do consumidor em erro). Já em relação a genérica, é mais difícil precisar os meios concorrenciais ilícitos. São exemplos de concorrência desleal genérica o desrespeito ao direito do consumidor (inobservância do padrão legal de qualidade, por exemplo) e a sonegação de tributos. Nesses dois casos, os meios inidôneos – sintetizados pela noção de desrespeito ao direito vigente – permitem ao empresário desleal praticar preço mais baixo que os concorrentes cumpridores da lei e, em consequência subtrair-lhes consumidores.
No que tange à repressão, em se tratando da concorrência desleal específica, pode-se haver tanto a repressão penal, cuja pena está disposta no artigo 195 da Lei 9.279/96, como a repressão civil, ensejadora de reparação por perdas e danos. Enquanto que, com relação à genérica, mesmo não sendo crime, é garantido o direito de haver perdas e danos, nos termos do artigo 209, Lei 9.279/96:
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.
Dispõe, também, o artigo 36 da Lei 12.529/2011, em seu inciso III, que constitui infração a ordem econômica, o aumento arbitrário dos lucros. Nesse caso, a concorrência desleal provém do abuso do poder econômico de quem ilicitamente vende seus produtos por um preço baixo, obtido por meio da sonegação dos tributos que são de sua responsabilidade, ou seja, pela prática de evasão fiscal que fere a ordem econômica e o mercado em geral, levando em conta a elevada carga tributária existente em Goiânia.
Ressalte-se que o artigo 170, IV, da CRFB/88 nomeou a concorrência como um dos princípios que regem a ordem econômica, na mesma forma que o artigo 173, § 4, da CRFB/88 determina que o Estado somente poderá intervir na liberdade de atuação dos particulares, desde que estes se utilizem a liberdade em práticas desleais colocando em risco a existência da concorrência no mercado, através da dominação de mercados, eliminação da concorrência e aumento arbitrário dos lucros, como se vê no caso do mercado informal na indústria e comércio de artigos do vestuário na cidade de Goiânia.
Dessa forma, é dever do Estado proteger o mercado de uma concorrência desleal exercida por empresários informais, perante seus concorrentes formais, que inicialmente buscava a sobrevivência, mas agora domina o mercado por meio do aumento arbitrário de lucros através da sonegação tributária. Com base nestes preceitos, surge a Lei n. 12.529/11, conhecida como Lei Antitruste, que regulamenta o direito de concorrência no Brasil e combate todas as formas de concorrência desleal, inclusive a que decorre da sonegação tributária.
A concorrência desleal, é definida pelo Decreto Lei n. 7.903/45, como a prática que tem por sua finalidade impedir a existência de concorrência entre empresas, ou seja, a concorrência desleal é um meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, a clientela de outrem. Portanto, essa prática implica na violação do direito de outra empresa ou agente econômico, que atua no mesmo mercado.
Destaca-se que independentemente da capacidade financeira ou técnica do agente, ele será enquadrado dentro dos dispositivos da lei como agente da infração da ordem econômica. Desde que, este atue no mercado.
Além da legitimidade do Ministério Público, são competentes todos os prejudicados, podendo pleitear a interrupção da prática do ato que lhe causa prejuízo, bem como indenização por eventuais perdas e danos sofridos, conforme nos termos do artigo 47 da Lei 12.529/11.
O Princípio da eficiência expresso nos incisos do artigo 170 da Constituição Federal, elenca vários subprincípios, quais sejam: a propriedade privada; função social da propriedade; livre concorrência; defesa do consumidor; redução das desigualdades sociais; dentre outros. Cabe ao Estado o dever de tutela de um mercado competitivo de maneira que o interesse comum seja priorizado. Contudo, certamente, haverá agente econômico que se destaca no mercado de maneira lícita, sem causar prejuízo para sociedade, preconizando o interesse comum. Sendo assim, é natural certa dominação de mercado sobre o concorrente, porém, tolerável quando dentro da licitude.
Entende-se que o poder econômico deve ser exercido priorizando a função social de servir ao desenvolvimento e à justiça social. Cada pessoa é livre para empreender suas atividades comerciais, sem a interferência do Estado. Ocorre que esta liberdade deve ser regulamentada, ou seja, uma liberdade não absoluta, mas limitada para que o desenvolvimento da empresa se proceda priorizando sempre a justiça social.
A Carta Magna, ao prever em seu artigo 37 sobre os princípios que regem a administração pública, destaca o princípio da moralidade, pois os demais, estão intimamente ligados a este. Por isso, o governo que não administrar através do princípio da moralidade perde a autoridade para exigir dos administrados o cumprimento da lei. Segundo Martins (1998, p. 18), o governo que descumprir a lei não tem credibilidade para exigir cumprimento da lei por parte de seus cidadãos, e esta lei deve ser, ética e justa. Portanto, o governo não deve ser partícipe ou conivente com o crime, como no caso em tela, e sim, combatê-lo.
A concorrência desleal tratada no presente artigo é aquela em que um agente econômico age de forma ilícita, independente dos motivos que o levaram a tal, e descumpre com as suas obrigações de cidadão, infringindo a lei. A sonegação tributária praticada pelos informais do setor têxtil traz consequências econômicas e sociais. Segundo Martins (1998, p. 9):
A evasão fiscal, forma de concorrência desleal e atitude condenável fere o concorrente e fere o contribuinte, que paga corretamente seus impostos, assim como retira recursos a serem destinados ao atendimento, pelo Estado, das necessidades da população carente.
Veremos adiante, a respeito da responsabilidade civil do Estado pela omissão da fiscalização dos empresários informais que descumprem com as suas obrigações tributárias, e pela ação de regularizá-los indevidamente, ferindo princípios supracitados.

3 DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO

A responsabilidade civil do Estado depende de uma conduta estatal, seja ela ativa ou passiva, mas que dela gere um evento danoso a um terceiro. Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 1007), ao tratar de determinada modalidade de responsabilidade civil do Estado, ensina que:
O fundamento da responsabilidade estatal é garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes de atos ou efeitos lesivos, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos. De conseguinte, seu fundamento é o princípio da igualdade, noção básica do Estado de Direito.
Em relação aos danos sofridos pelo setor formal do ramo de confecções devido à informalidade. No que diz respeito à responsabilidade civil do Estado no projeto em tela, há três pontos importantes a serem considerados. Primeiramente, identificar se o ato do Estado é comissivo, omissivo ou ambos.
Caso seja identificado como comissivo, é pacífico na doutrina e jurisprudência o entendimento a respeito da objetividade da responsabilidade civil do Estado, deste prisma o nexo de causalidade fica claramente estabelecido. Se não restar comprovado o ato comissivo, surge o segundo ponto: a questão da responsabilidade civil do Estado no caso de omissão, se deve ser considerada como objetiva ou subjetiva.
A hipótese de ser subjetiva arremete-nos ao terceiro ponto: evidenciar a culpa do Estado. Em última análise, uma vez comprovada a culpa, fica em qualquer hipótese estabelecido o nexo de causalidade e atribuída a responsabilidade civil do Estado. Por fim, faz-se necessário verificar se há excludentes da responsabilidade estatal na presente questão.
Para a configuração da responsabilidade objetiva do Estado, é necessário identificar três elementos: ação ou omissão do agente estatal; dano causado ao administrado; nexo causal entre a atuação do Estado e esse dano. Portanto, prescinde-se da verificação da culpa.
Um ponto que merece destaque é que, diferentemente da responsabilidade fundada na culpa, a responsabilidade objetiva também incide sobre atos lícitos. Não há dúvidas que a Administração Pública atua balizada no princípio da legalidade. Mesmo atuando nos limites legais, o Estado pode causar danos ao particular, passíveis de indenização. Daí a importância da doutrina objetiva da responsabilidade civil do Estado. Em suma, houve uma migração da responsabilidade baseada na culpa para a responsabilidade fundada no dano.
O fundamento da responsabilidade objetiva é o princípio da solidariedade social. Nas palavras de Maria Sylvia Zanella di Pietro (2000, p. 504):
Quando uma pessoa sofre um ônus maior que o suportado pelos demais, rompe-se o equilíbrio que necessariamente deve haver entre os encargos sociais, para restabelecer esse equilíbrio, o Estado deve indenizar o prejudicado, utilizando recursos públicos.
De acordo com Caio Tácito (1959, p. 567): "tratando-se de um benefício à coletividade, desde que o ato administrativo lícito atenda ao interesse geral, o pagamento da indenização redistribui o encargo, que, de outro modo, seria apenas suportado pelo titular do direito".
Celso Antônio Bandeira de Mello (1997, p. 608) divide os fundamentos da responsabilidade objetiva de acordo com o ato que provocou o prejuízo ao particular. O fundamento para a responsabilidade por atos ilícitos é o princípio da legalidade, uma vez que o Estado não pode atuar fora dos limites legais. Assim, o Estado deve responder pelos danos decorrentes de sua atuação ilegal. Enquanto que a responsabilidade por ato lícito provém do princípio da isonomia, ou seja:
O fundamento da responsabilidade estatal é garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes de atos ou efeitos lesivos, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos.
Leon Duguit (apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. 1997, p. 132), o precursor da teoria do risco administrativo, dizia que: "a responsabilidade do Estado assemelha-se a um seguro social suportado pela caixa coletiva, em proveito de quem sofre um prejuízo causado pelo funcionamento do serviço público".
José Cretella Júnior (1970, p. 69) manifesta-se de forma semelhante:
A teoria do risco, baseada no seguro e no equilíbrio econômico, envolvendo a ideia de justiça distributiva, considera o Estado como uma extraordinária companhia de seguros, cujos segurados são os contribuintes que cooperam para a formação de um patrimônio coletivo.
A atividade do Estado, cada dia maior, pressupõe um risco que deve ser corrido, mas que é inerente ao exercício daquela atividade. O risco, no caso, é o que se verifica em qualquer empresa de proporções gigantescas, caracterizando-se por ser integral. O risco pressupõe o dano. O dano implica indenização.
Uma teoria que merece ser mencionada é a da Culpa da Administração, onde a palavra culpa corresponde à falha do serviço público. O professor Yussef Said Cahali (1996, p. 33.) explica a teoria:
A teoria da culpa administrativa e a pretensa teoria conciliatória do acidente administrativo ou da irregularidade do funcionamento do serviço público guardam resquícios da teoria civilística da responsabilidade do Estado; o que as caracteriza é a transposição da noção de culpa para o terreno publicístico, identificando na falta anônima do serviço a causa do dano reparável.
O que caracteriza a teoria publicística é a despersonalização da culpa, transformando-a, pelo anonimato do agente, em falha da máquina administrativa.
Sérgio Cavalieri Filho (2002, p. 184) contribui da seguinte forma:
De acordo com essa nova concepção, a culpa anônima ou falta do serviço público, geradora de responsabilidade do Estado, não está necessariamente ligada à ideia de falta de algum agente determinado, sendo dispensável a prova de que funcionários nominalmente especificados tenham incorrido em culpa. Basta que fique constatado um mau agenciador geral, anônimo, impessoal, na defeituosa condução do serviço, à qual o dano possa ser imputado.
Essa teoria, de origem francesa, visa justificar a responsabilidade estatal como acidente administrativo, ela é dividida em três possibilidades, conforme o ensino de João Franncisco Sauwen Filho (2001, p. 68), baseado em Paul Duez:
a) Quando o serviço público não funciona ou não existe, havendo o dever estatal de que ele funcionasse e existisse;
b) Quando ocorre mau funcionamento do serviço público;
c) Quando o serviço funciona com atraso.
Destarte, uma vez verificado qualquer um desses acidentes administrativos, que causam um dano ao particular, haverá o dever de indenizar.
Celso Antônio Bandeira de Mello (1997, p. 611), inspirado em Oswaldo Aranha Bandeira de Mello contraria a regra da responsabilidade objetiva, defendendo que a omissão do Estado deve ser tratada no âmbito da responsabilidade subjetiva. Todavia, o autor pretende atender as regras do Estado Democrático de Direito, independentemente da disposição constitucional. Assim ele ensina:
Sob a luz dos princípios inerentes ao Estado de Direito – prescindindo-se, pois, de disposições particulares porventura estabelecidas nos Direitos Positivos Constitucionais. Nestas hipóteses, pode-se dizer que não há causação direta e imediata do dano por parte do Estado, mas seu comportamento ativo entra, de modo mediato, porém decisivo, na linha de causação.
Joana Carolina Lins Pereira (1999, p. 36) coaduna dizendo que a responsabilidade decorrente da omissão estatal deve ser subjetiva, entretanto, inclui um novo critério a ser analisado a cada caso: o princípio da proporcionalidade. Assim a autora manifesta-se:
E quando poderíamos atribuir à omissão estatal a pecha de ato ilícito, quando estaria caracterizada a culpabilidade? Quando a omissão estatal representar descumprimento de lei; quando a conduta do Estado, deixando de atender o mandamento legal, importar dano a alguém.
É imprescindível, no entanto, que a obrigação possa ser razoavelmente exigida no Estado. É dizer, não podemos condená-lo a pagar indenização pela ocorrência de dano que não poderia razoavelmente impedir. O Estado não é onipresente, não se pode exigir do mesmo uma atuação materialmente impossível.
A autora prossegue em seu raciocínio com o seguinte exemplo:
É fisicamente impossível – e razoavelmente inexigível – por exemplo, imaginar que possa haver policiamento em cada trecho das cidades, imaginar que possa haver recrutas aptos a combater o crime a toda hora e em qualquer lugar. Sistema policial nenhum do mundo possui um efetivo capaz de tal proeza.

Aparecida Vendramel (2000, p. 94), defendendo a tese contrária, afirma que a responsabilidade do Estado é objetiva, mesmo se for no caso de sua omissão. Destaca o caráter ilícito da omissão do Estado, que tem o dever de agir. Deste modo, para evitar a ocorrência de omissões ilegais por parte dos agentes estatais, nosso ordenamento cria instrumentos como o habeas data, o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Por ser uma conduta contrária à lei, a omissão gera responsabilidade estatal. Deste modo a autora Aparecida Vendramel (2000, p. 94) refuta a ideia de Celso Antônio, ao assegurar:
Responsabilizar-se o Estado por danos decorrentes de sua omissão não significa responsabilizá-lo 'por nada', 'por um não ato', significa sim responsabilizá-lo por um comportamento contrário ao direito, portanto, ato ilícito, por infringência ao princípio da legalidade.
Uma vez mais, explica seu entendimento:
Partindo para uma interpretação lógico-jurídica da norma que responsabiliza o Estado por danos advindos do comportamento de seus agentes – omissivos ou comissivos – extraímos o significado de omissão, caracterizando-se como 'tomada de posição'. Toma-se posição para agir ou para não agir, inclusive na diuturnidade da vida. Se omissão é 'tomada de posição', então omissão é conduta, é ação e, embora ação negativa, de ação se trata".
A autora sustenta que adotar a teoria subjetiva com objetivo de embasar a responsabilidade do Estado por omissão, contraria a Carta Maior, pois a norma não excepcionou a responsabilidade em casos de omissão estatal, desse modo, não caberia ao intérprete fazê-lo. Além do mais, a teoria da falta do serviço representaria um recuo e a negliência do serviço seria uma omissão ilícita, por ser uma ofensa ao art. 175 da Constituição Federal.
O professor Yussef Said Cahali coaduna com a corrente que atribui a responsabilidade do Estado como objetiva. A análise da omissão estatal cinge a constatação da conduta legalmente exigível pela Administração. O autor destaca que, o conceito de exigibilidade do ato estatal é bastante flexível e o subjetivismo nesta análise induz alguns autores ao exame das hipóteses da perspectiva da responsabilidade subjetiva do Estado, com indagação necessária do elemento culpa ou dolo".
Na jurisprudência, temos o STJ divergindo do STF:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. QUEDA DE ÁRVORE. DANO EM VEÍCULO ESTACIONADO NA VIA PÚBLICA. NOTIFICAÇÃO DA PREFEITURA ACERCA DO RISCO. INÉRCIA. NEGLIGÊNCIA ADMINISTRATIVA COMPROVADA. DEVER DE INDENIZAR MANTIDO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ARESTOS CONFRONTADOS. 1. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de ser subjetiva a responsabilidade civil do Estado nas hipóteses de omissão, devendo ser demonstrada a presença concomitante do dano, da negligência administrativa e do nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do Poder Público. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, conquanto a Corte a quo tenha acenado com a responsabilidade objetiva do Estado, restaram assentados no acórdão os pressupostos da responsabilidade subjetiva, inclusive a conduta culposa, traduzida na negligência do Poder Público, pois mesmo cientificado do risco de queda da árvore três meses antes, manteve-se inerte. 3. O conhecimento da divergência jurisprudencial pressupõe demonstração, mediante a realização do devido cotejo analítico, da existência de similitude das circunstâncias fáticas e do direito aplicado nos acórdãos recorrido e paradigmas, nos moldes dos arts. 541 do CPC e 255 do RISTJ. 4. Recurso especial conhecido em parte e não provido. (STJ, 2. Turma, RE n. 1.230.155 – PR – 2011/0002730-3, Relatora Ministra ELIANA CALMON, julgado em 05/09/2013, Publicado em Dje 17-9-2013).
Pelo que se observa, a jurisprudência do STF firmou-se no entendimento que as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6. da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público.
Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Responsabilidade objetiva prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal abrange também os atos omissivos do Poder Público. Precedentes. 3. Impossibilidade de reexame do conjunto fático-probatório. Enunciado 279 da Súmula do STF. 4. Ausência de argumentos suficientes para infirmar a decisão recorrida. 5. Agravo regimental a que se nega provimento (STF, 2. Turma, RE n. 677283 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Dje-89, de 17-4-2012).
Estamos longe de um consenso a objetividade da responsabilidade do Estado quando se trata de omissão. A abordagem dessa discussão é aparentemente desnecessária para resultados práticos em relação ao tema abordado haja vista que na pior das hipóteses o Estado deve ser responsabilizado pelo dano causado pela culpa evidente, porém, faz-se necessária para coadunar com a elucidação da questão.
Poder-se-ia incluir neste caso, o princípio da responsabilidade civil objetiva do Estado perante terceiros, em face dos danos causados, nos termos do art. 37, § 6. da Lei Maior, pois foi o próprio Estado que estabeleceu regularmente os feirantes ferindo frontalmente o princípio da igualdade e outros relatados neste artigo. Ressalte-se que a isenção que se refere o Artigo 1. parágrafo único, do Decreto Lei 486/69 é para atividade de natureza artesanal, sendo notório que apesar de o nome conter a palavra "hippie" a feira é, quase na sua totalidade, de produtos industrializados de artigos do vestuário.
Art 1º Todo comerciante é obrigado a seguir ordem uniforme de escrituração, mecanizada ou não, utilizando os livros e papéis adequados, cujo número e espécie ficam a seu critério.
Parágrafo único. Fica dispensado desta obrigação o pequeno comerciante, tal como definido em regulamento, à vista dos seguintes elementos, considerados isoladamente ou em conjunto.
a) natureza artesanal da atividade;
A responsabilidade civil está prevista artigos 927, 186 e 187 do Código Civil:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
O dano pode ser notadamente visto nas centenas de lojas fechadas e outras tantas endividadas.
No aspecto da omissão do Estado, ainda que adotemos a responsabilidade subjetiva, restou comprovado neste artigo, a culpa do poder público ao permitir a concorrência desleal pela falta de fiscalização do segmento não clandestino, mas informal, da indústria e comércio de artigos do vestuário nas feiras livres e imediações da feira Hippie. Tendo o Estado o dever de regulamentar e fiscalizar os feirantes e comerciantes na região da 44, não o faz. A sua omissão, ineficiência e despreparo administrativo no cumprimento de suas obrigações no âmbito municipal, estadual e federal, provocam um dano a ser reparado. Não se trata de uma faculdade, mas sim, de um dever a cumprir. Cabe ao Estado responder nas esferas civil, penal e administrativa, por sua omissão e ineficiência ao permitir o que não é permitido, ao tolerar o intolerável.
Nexo causal, na presente questão, é o que vincula o Estado ao dano, sendo requisito necessário para estabelecer a responsabilidade e consequentemente obrigação de indenizar. Como destaca Sérgio Cavalieri Filho (2004, p. 66): "o nexo causal é um elemento referencial entre a conduta e o resultado. É através dele que poderemos concluir quem foi o causador do dano."
Ressalte-se que sem essa relação, ela não existiria ou seria abrandada se não fosse a causa única do dano. Há circunstâncias em que inexiste a responsabilidade do Estado, quais sejam: força maior, caso fortuito e culpa exclusiva da vítima ou de terceiro; pois nessas ocasiões não há relação de causalidade entre o dano ao particular e a conduta comissiva ou omissiva do poder público.
Observe-se que se o Estado não der causa ao dano ou não for o único responsável, sua responsabilidade será ilidida ou atenuada. Todavia, cabe ao Estado demonstrar as causas de exclusão da responsabilidade. Assim, é invertido o ônus da prova. Verifica-se, claramente, que não há, portanto, nenhuma excludente de ilicitude no caso em tela.
Aplica-se no presente caso as considerações estabelecidas no evento danoso e na ação e omissão imputável ao Estado. Portanto, é de fácil constatação a omissão do Estado e a atuação defeituosa do serviço público ou dos órgãos estatais. Existe, portanto, responsabilidade civil, uma vez que os danos são claros e evidentes.


CONCLUSÃO

A pretensão desse artigo científico não é a corporificação de uma ferramenta causadora da transformação da atual realidade no setor têxtil em Goiânia. Assim como não se buscou esgotar o tema com as linhas aqui desenvolvidas. A intenção é que essa ideia sirva de inspiração e a melhor conscientização do poder público, administrativo e do judiciário a fim de estabelecer a justiça e o respeito aos princípios norteadores do nosso Estado de direito.
Por outro lado, há o anseio de que seja reconhecida a relevância e a pertinência da abordagem, de modo a justificar não apenas a continuidade da pesquisa aqui iniciada, mas primordialmente seu desenvolvimento em uma ótica mais aprofundada, mais estruturada, a partir dos elementos principais aqui apresentados, a informalidade no setor têxtil em Goiânia: responsabilidade civil do Estado.
Certamente, a constatação do objetivo apresentado depende diretamente da compreensão e interpretação do presente tema. A situação requer um senso de urgência para interromper o processo de destruição do setor formal das confecções de Goiânia, com terríveis consequências no âmbito econômico, social e cultural.

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