INOVAÇÃO E DIFUSÃO: EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DO SETOR CERÂMICO BRASILEIRO A PARTIR DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA EUROPEIA

June 23, 2017 | Autor: G. Grupo de Estud... | Categoria: Inovação, Ceramica, Transferencia de la Tecnología
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO

INOVAÇÃO E DIFUSÃO: EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DO SETOR CERÂMICO BRASILEIRO A PARTIR DA TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA EUROPEIA KEITY KRISTINY VIEIRA ISOPPO1 Resumo: O desenvolvimento tecnológico da indústria cerâmica brasileira ocorreu, entre outros fatores, pela transferência de tecnologia europeia a cada etapa de seu processo produtivo. Identificase diferentes adaptações destas tecnologias nos polos cerâmicos brasileiros da região de Criciúma/SC e da região de Santa Gertrudes/SP. Os segmentos que são destacados como precursores de conhecimento e tecnologia são os colorifícios de Castelón de La Plana na Espanha e as indústrias de bens de capital de Sassuolo na Itália, dos quais alguns possuem filiais no Brasil. As empresas pertencentes a essa cadeia produtiva promovem intercambio de informação e conhecimento tecnológico, o que se constitui como primordial para o desenvolvimento do setor em cada uma dessas regiões.

Palavras-chave: inovação; transferência de tecnologia; setor cerâmico brasileiro. Abstract: The technological development of the Brazilian ceramics industry was mostly made by the transfer of European's technology at every step of its production process. It's possible to identify different versions of these technologies in the Brazilian ceramic in Criciuma region on Santa Catarina's state, aswell in Santa Gertrudes region on state of Sao Paulo. The segments that are highlighted as knowledge and technology precursors are the glazing of La Plana Castelon in Spain and Sassuolo capital goods industries in Italy, which some have units in Brazil. Companies that belongs to this production chain promotes exchange of information and technological knowledge, which is extremely important for the sector’s development of those regions.

Key-words: innovation; technology transfer; brazilian ceramic sector.

1 – Introdução O setor cerâmico brasileiro constituído por mineradoras, colorifícios, indústrias de bens de capital, empresas de manutenção, indústrias cerâmicas e empresas de transportes e logística faz parte da indústria de produtos de minerais não metálicos responsável pela produção de revestimentos cerâmicos, que compõem parte da cadeia produtiva da construção civil fabricante de materiais de construção. Atualmente, o Brasil se insere no mercado internacional como o segundo maior produtor com 903,3 milhões de m2 produzidos (ANFACER, 2014). Este setor possui

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- Acadêmica do programa de pós-graduação em geografia: desenvolvimento regional e urbano da Universidade Federal de Santa Catarina (Brasil) em cotutela com doutorado em desarrollo local y cooperación internacional na Universitat de València (Espanha). É membro do Grupo de estudos em desenvolvimento regional e infraestruturas - GEDRI. E-mail de contato: [email protected]

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a maior parte de sua produção concentrada nas regiões de Santa Gertrudes/SP, Mogi Guaçu/SP, Tijucas/SC e Criciúma/SC. A indústria cerâmica brasileira de capital fundamentalmente nacional gera “cerca de 25 mil postos de trabalho diretos e em torno de 200 mil indiretos, ao longo de sua cadeia” (ANFACER, 2014), constituindo-se como um grande gerador de emprego. Está alinhada ao mercado internacional pela qualidade e design dos produtos exportados, pela diversificação de estratégias competitivas, produtos e processos produtivos adotados por suas empresas e principalmente pela equidade tecnológica em relação aos principais setores cerâmicos estrangeiros. Deste modo, pretende-se verificar como ocorreu a apropriação da tecnologia europeia pelos principais polos cerâmicos brasileiros. A produção mundial deste setor vem crescendo marcada pela concorrência acirrada entre os fabricantes de bens de capital da Itália, competição entre colorifícios que ocorre na Espanha, disputa entre indústrias cerâmicas da Itália, Espanha, China e Brasil que se dá no nível das estratégias competitivas, aprimoramento tecnológico, comercialização e logístico.

2 – Indústria cerâmica brasileira: gênese e evolução do processo produtivo Santa Catarina, mais precisamente as regiões de Criciúma/SC e Tijucas/SC, destaca-se como um importante polo cerâmico brasileiro ao lado do polo paulista das regiões de Santa Gertrudes/SP e Mogi Guaçu/SP. A indústria cerâmica catarinense surgiu em 1950 ligada à pequena propriedade. Eram empresas de pequeno porte, de gestão familiar, decorrentes do processo de acumulação oriundo da pequena produção mercantil. Freeman (2008) destaca que nas indústrias antigas as melhorias e mudanças técnicas eram feitas por participantes diretamente ligados ao processo produtivo. Neste período, o conhecimento técnico do italiano Del Priori foi fundamental para o surgimento de muitas cerâmicas da região de Criciúma/SC. Era considerado como o pioneiro da cerâmica, profissional extremamente técnico, trabalhou na ICISA, CESACA, Cerâmica Cocal e Eliane. O processo produtivo dessas cerâmicas era

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quase artesanal. Isso permitia que invenções fossem criadas para adaptar o processo produtivo aos equipamentos existentes. Caracterizavam-se por possuir fornos tipos garrafão, fornos a túnel, prensas manuais, matriz energética movida a lenha. O processo produtivo utilizado era o de biqueima, que consiste que os revestimentos cerâmicos passassem por duas sucessivas queimas. A primeira objetivava cozinhar somente a massa cerâmica, já a segunda era responsável pela queima do esmalte. Após a primeira queima, o produto originário, chamado de “biscoito” é levado à linha de esmaltação para deposição do esmalte cerâmico e aplicação dos efeitos superficiais definidos no design do produto. A tecnologia de esmaltes, corantes e aditivos químicos desde esse período era fornecida pelos colorifícios espanhóis. A fase seguinte é a segunda queima, que pode ser executada em carros-estante ou em fornos a rolo. Eram necessários dois fornos, portanto o layout das fábricas antigas era descontínuo e precisava que os trabalhadores retirassem manualmente os produtos de um forno para dar continuidade ao processo, aumentando o tempo de produção. A Cerâmica Cocal (1954) possuía incialmente a seguinte estrutura: um barracão onde funcionava a produção, outro onde ficavam a oficina e o depósito de insumos e uma casa para o escritório. A fábrica possuía dois recipientes para a mistura de massa; quatro prensas manuais; dois fornos tipo garrafão e dois fornos tipo túnel (ISOPPO, 2009). Produzia-se o azulejo 15x15 cm nas cores branca, azul, verde, amarela e rosa, além de peças complementares. Posteriormente, com a introdução de novas tecnologias surgiria a Cerâmica Eliane. Já a Cecrisa é criada com a tecnologia mais moderna. Dilor Freitas fez várias viagens para a Itália e a Espanha a procura de fornecedores e equipamentos. Para a instalação da Unidade 1 prevaleceu a tecnologia italiana da empresa Sity para os fornos. Eram fornos elétricos de estrutura metálica, menores do que os modelos alemães. Hilário Freitas, como era engenheiro civil, ficou responsável pela implantação desta fábrica. Foi montada uma pequena oficina junto à Cecrisa para fabricar toda a parte de caldeiraria para complementação do equipamento italiano. A partir desta oficina surgiria a Industrial Conventos.

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Até o final da década de 1970 as indústrias cerâmicas catarinenses se caracterizavam:

possuir

mercado

consumidor

predominantemente

nacional;

mudança da matriz energética de fornos a lenha a fornos movidos a eletricidade; tecnologia adotada em máquinas e equipamentos de origem italiana, tendo as empresas Sity e Sacmi como as principais fornecedoras; processo produtivo baseado na biqueima que consistia em duas queimas, a primeira do corpo cerâmico anterior a esmaltação da peça e a segunda logo após este processo. Esta última foi substituída nos anos de 1980 pelo processo de monoqueima onde o corpo cerâmico já esmaltado possuía uma única queima.

Na monoqueima, são queimados, simultaneamente, o corpo cerâmico que constitui a base, e o esmalte já implementado na peça, em elevadas temperaturas. Esse processo determina maior coesão do esmalte ao corpo cerâmico, atribuindolhe maior resistência à abrasão superficial da peça, além de resistência mecânica e química, e uma baixa absorção de água. Essas propriedades apresentam índices melhores do que a biqueima. A tecnologia empregada no processo de monoqueima – que representa um salto tecnológico em relação à biqueima – possibilita fabricar materiais de elevado conteúdo estético, com excelentes características de resistência, por isso foi adotado por grande parte das indústrias. Já a região produtora de Santa Gertrudes/SP possui uma trajetória completamente diferente, as origens dessas cerâmicas estão ligadas a olarias (telhas e tijolos), fábricas de louças de barro e de louça branca, que surgiram entre o final do século XIX e o início do XX. Eram pequenas fabriquetas que produziam manualmente tijolos, telhas, manilhas, vasos, potes e moringas. São quatro fatores que compuseram as condições para o surgimento dessa indústria em São Paulo: o mercado consumidor; disponibilidade de matéria-prima; força de trabalho imigrante com experiência técnica; a formação de capitais por meio da economia cafeeira. Grande parte das empresas de cerâmica foi constituída por imigrantes ou descendentes de imigrantes portugueses e italianos de origem humilde (experientes na produção de tijolos e telhas). É apenas a partir da década de 1980 que as cerâmicas paulistas migram para a produção de revestimentos, já que até o momento possuíam pouco capital

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para investirem. Os ceramistas diversificaram os produtos de base argilosa, passando a confeccionar tubos e pisos cerâmicos não-esmaltados, de tamanho 30X30 cm”. No entanto, um dos grandes diferenciais desse polo, está ligado a tradição da argila vermelha na produção de pisos. Em comparação, o setor cerâmico catarinense apresentava uma estrutura industrial mais equipada destinada já a produção de azulejos e pisos. O maquinário utilizado neste tipo de processo produtivo, em sua maioria italiano, requeria um capital maior do que o utilizado nas primeiras cerâmicas em São Paulo. A indústria cerâmica catarinense promoveu rapidamente um câmbio tecnológico deixando a produção de caráter artesanal (de mão de obra intensiva e fornos a lenha) para implementar as mesmas inovações tecnológicas utilizadas pelos principais fabricantes europeus. A tecnologia italiana é difundida incialmente no Brasil pelas empresas Sity e Sacmi, através de seus fornos e prensas.

E a

tecnologia espanhola é difundida através de seus colorifícios que proviam a indústria cerâmica brasileria com seus esmaltes e corantes. As empresas estrangeiras já possuíam um nível de profissionalização e internalização de P&D industrial que permitiam a esses setores constante desenvolvimento de inovações tecnológicas. O contato com a tecnologia importada através do manuseio e manutenção fez surgir laboratórios especializados em reparos dentro das próprias cerâmicas. Assim, surgiram empresas produtoras de bens de capitais nacionais, cita-se como exemplo a Industrial Conventos oriunda do Grupo Cecrisa. Processo similar ocorreu com o setor de esmaltação, que também gerou o surgimento de coloríficios nacionais. Todavia, essas empresas nacionais só possuíam capacidade técnica para desenvolver inovações secundárias ou de aperfeiçoamento (FREEMAN, 2008). Nos anos de 1990, todas as cerâmicas da região de Criciúma/SC sofreram um processo de reestruturação empresarial, modernizando ainda mais seu parque fabril,

através

da

adoção

de

tecnologias

avançadas

de

fabricação

e

profissionalização da gestão.

3 – Processo produtivo: via seca e via úmida

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A região de Criciúma/SC concentra as maiores e as mais competitivas empresas brasileiras, a Cecrisa de Criciúma/SC, a Eliane de Cocal do Sul/SC e a Portobello de Tijucas/SC. Essas empresas possuem como vantagem competitiva a diferenciação de produtos, destacando os através de design e valorização da marca. Assim, essas indústrias estão posicionadas no mercado focando seus produtos para a classe A. O alto padrão obtido por esses produtos se dá principalmente, entre outros fatores, graças ao processo de fabricação via úmida o que permite um produto de melhor qualidade com alto valor agregado. Isso porque o sistema via úmida produz a massa atomizada, o que permite maior homogeneização das argilas e minerais utilizados na composição da mesma, proporcionando maior resistência mecânica e menor absorção de umidade. Além disso, outras indústrias de médio e pequeno porte têm contribuído para a diversificação de posicionamento de mercado das cerâmicas catarinenses. Algumas empresas investiram no processo produtivo via seca, fabricando produtos de baixo valor agregado e empregando capacidade de produção em grandes escalas. No estado de São Paulo, as empresas da capital e Mogi Guaçú produzem com tecnologia via úmida, enquanto em Santa Gertrudes a tecnologia utilizada pela maioria das empresas é via seca (ANFACER, 2008). O processo via seca funciona sem a adição de água, o que torna o corpo da massa menos homogêneo possibilitando propriedades físicas de resistência e absorção de umidade inferior aos produzidos via úmida. A tipologia do processo produtivo é uma das diferenças entre os dois pólos. As indústrias catarinenses em sua maioria produzem por via úmida e enquanto as cerâmicas paulistas produzem por via seca. No Brasil 72% da produção é realizada por via seca, enquanto somente 28% é produzido por via úmida (ANFACER, 2014). Além do crescimento das indústrias cerâmicas de Santa Gertrudes/SP, vale ressaltar a reconfiguração que vem passando o polo cerâmico de Criciúma/SC após a crise de 2008. É perceptível o dinamismo conquistado pelas cerâmicas de via seca situadas nessa região, o que vem resultando na implantação de novas fábricas, com

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tecnologias e maquinários de última geração, aumentando a capacidade de produção dessas empresas.

4 – A inovação tecnológica em Castellón de La Plana na Espanha e Sassuolo na Itália O sector de revestimentos cerâmicos da Espanha é considerado grande precursor de inovação tecnológica principalmente no setor de colorifícios. Cerca de 90% da indústria cerâmica espanhola está situada entorno no distrito Castellón de la Plana, pertencente a Comunidade

Autônoma de Valência, num raio de

aproximadamente 30 km. Em 2006, esse distrito industrial era composto por aproximadamente 240 empresas, consideradas somente aquelas com ciclo de fabricação completo. (BUDI, 2008) O setor cerâmico espanhol possui origem antiga, foi a partir dos séculos XIV que se iniciou a produção de cerâmica na Comunidade de Valência. No século XV a pressão feita pelos cristãos alterou o importante centro de produção de cerâmica de Málaga para Manises. Neste período os pisos cerâmicos valencianos eram exportados para Veneza, Egito, Siria, Turquia e Itália. Foi a partir na metada do século XIX que a cerâmica consolidou-se enquanto atividade industrial na região de Castellón. A quantidade de cerâmicas cresceu no início do século XX, quando a produção valenciana centrou-se em Manises e Onda, cidades que já possuiam centros de formação desde 1916 e 1925, respectivamente. “Em 1929 Castellón tinha 41 empresas e 143 fornos e representava 71% da produção nacional e Manises tinha 23 empresas e representava 27% da mesma” (ABREU, 2003, p. 39). O mercado espanhol de revestimentos cerâmicos atualmente domina o setor de coloríficios, segmento importante que faz parte da montante dessa cadeia produtiva. Os colorifícios fabricam esmaltes, granilhas, fritas, corantes, serigrafias e as novíssimas tintas inkjet para impressoras digitais, itens necessários para dar acabamento aos pisos e azulejos. Os colorifícios espanhóis detém a melhor tecnologia de fabricação desses itens, além disso, oferecerem desenvolvimento de produto para as indústrias cerâmicas como a criação de protótipos de novos

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modelos. Por isso os coloríficos espanhóis são considerados os melhores do mundo. Alguns como Esmalglass, Endeka Ceramics, Fritta, Torrecid e Vidres possuem filiais no Brasil. Outro grande importante país produtor mundial é a Itália. Sua indústria cerâmica desenvolveu-se “na região da Emília-Romagna, especialmente nas provínvias de Módena e Régio-Emília, em torno da pequena cidade de Sassuolo, tendo como precursora a indústria de faiança2, conhecida desde o Século XIII”. (FABRE, 1999, p. 88) Devido a essa tradição histórica, é considerado o mais respeitável produtor cerâmico do mundo, não por possuir a maior quantidade de produção, mas por ser atualmente o precursor de design e de desenvolvimento de tecnologia para fabricação de revestimentos cerâmicos. Seus produtos apresentam design arrojado graças a constante inovação de máquinas e equipamentos no processo produtivo. Isso possibilita ao produto um padrão de qualidade mais apurado. Fabricantes de bens de capital tais como Siti e Sacmi, estão entre os principais fornecedores mundiais de máquinas e equipamentos para a produção de revestimentos cerâmicos. Isso faz com que sua tecnologia seja importada por outros países mediante a aquisição de equipamentos. Assim o mercado italiano é considerado como o predecessor de moda e tendências no setor, seus produtos são considerados tendências para o cenário mundial.

5 – Considerações Finais A indústria cerâmica brasileira é caracterizada pela presença marcante da pequena produção mercantil no desenvolvimento de sua gênese. A pequena produção mercantil foi de grande importância tanto na formação socioespacial nas 2

Os ceramistas continuaram a trabalhar com velhos sistemas etruscos e gregos, ainda durante os séculos obscuros da Idade Média. No início do Renascimento, havia produtos manufaturados em Gubbio, Volterra, Faenza, Deruto e Montelupo. Em todas estas cidades, desenvolveram-se indústrias bem distintas, cada qual com estilo e técnica própria: os sistemas de cozimento, de esmaltar, a composição dos vernizes, tudo era mantido em rigoroso segredo. Basta lembrar, entre os ceramistas italianos, Luca e Andrea Della Robbia, que souberam criar baixo-relevos de terracota vidrada e pintada, que se veem em quase toda parte, nas paredes das vilas e dos castelos da Itália Central. A escola de Faenza ganhou tanta celebridade que deu seu nome a todos os objetos de cerâmica que, da Itália, se difundiam pela Europa: daí o nome faiança em português, e o faience, lembrando o nome da cidade Romana. (ANFACER, História da cerâmica. Disponível em: www.anfacer.org.br Acessado em 19 de outubro de 2008).

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as regiões de Santa de Gertrudes/SP quanto na de Criciúma/SC, promovendo determinantes que propiciaram a criação das vantagens competitivas peculiares a cada uma das regiões estudadas. A pequena produção possibilitou a ascensão de capitais locais, a existência de mão de obra especializada, um mercado consumidor interno, esses fatores combinados com os aspectos físicos de cada uma dessas regiões, cada qual com um tipo específico de argila e posição geográfica, possibilitaram o surgimento do setor ceramista nessas duas regiões. Cabe ressaltar que a concentração geográfica das indústrias cerâmicas é um fato muito característico deste setor cerâmico. A indústria cerâmica catarinense inserida em uma região mais dinâmica, cujos processos de acumulação foram mais fortes possibilitou a existência de empreendedores mais capitalizados capazes de se inserirem diretamente no processo de fabricação de azulejos, que requer um alto capital de investimento. Apesar de sua gênese ser mais antiga, as condições diferenciadas da região Santa Gertrudes/SP não permitiram a mesma inserção, as indústrias cerâmicas fabricantes de pisos nesta região são oriundas das cerâmicas ligadas à produção de telhas e tijolos, que apenas em 1980 transferiram-se para a produção de revestimentos. Nesta mesma perspectiva, o processo de consolidação e expansão dessas duas regiões produtoras foi distinto. Deste modo, as empresas adotaram diversas estratégias competitivas, vale destacar a principal delas que consiste no posicionamento de mercado dessas empresas. As indústrias cerâmicas catarinenses após perderem a concorrência por capacitação de produção a preços baixos para as indústrias paulistas que se inseriram nos anos de 1980 como fortes concorrentes, adotaram como principal estratégia competitiva a diferenciação de produtos. Para isso adotaram técnicas de design de produtos, rigoroso padrão de qualidade, novas tecnologias e fortes estratégias de marketing, obtendo um produto de alto valor agregado. Já as indústrias cerâmicas paulistas continuaram investindo na capacitação de produção a preços baixos, onde a ordem vigente é grandes volumes de vendas, alta produtividade e redução de custos o que requereu a adoção de novos maquinários e entre outras estratégias competitivas.

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As outras mudanças no setor cerâmico brasileiro foram geradas pelo processo de terceirização, ocorrido nos anos de 1990, tais como a horizontalização deste setor resultando no surgimento de mineradoras de pequeno e médio porte, instalação de empresas produtoras de bens de capital e colorifícios estrangeiros além do surgimento de empresas nacionais nestes dois últimos segmentos. O processo de terceirização ocorreu no setor cerâmico assim como em outros segmentos industriais brasileiros. Fato que já havia acontecido também no centro do sistema capitalista nos 1970, o que possibilitou a eficiência dos colorifícios e empresas de bens de capital italianas e espanholas, que neste momento se instalam nas em Santa Catarina e São Paulo. Destaca-se que o desenvolvimento tecnológico no setor de revestimentos cerâmicos brasileiro tenha ocorrido através da apropriação de tecnologia europeia por meio da compra de máquinas e equipamentos e de insumos de alto teor tecnológico como é o caso daqueles produzidos pelos colorifícios. A região de Castelón de La Plana na Espanha possui os melhores colorifícios do mundo, já a região de Sassuolo na Itália estão as melhoras indústrias de máquinas e equipamentos para o setor cerâmico. Juntas essas regiões dominam o setor criando inovações tecnológicas

para as indústrias

cerâmicas gerando uma

certa

dependência das mesmas em relação a evolução tecnológica. As indústrias cerâmicas brasileiras adaptaram essas tecnologias as características das regiões produtoras de Santa Catarina e São Paulo. A reestruturação produtiva do setor permitiu a transferência de tecnologia de máquinas, equipamentos e suprimentos europeus, para pequenas e médias indústrias através da instalação dessas empresas no Brasil. Anteriormente apenas com as grandes indústrias cerâmicas que possuíam capital para trazer a tecnologia europeia ao Brasil. A diferenciação entre os distintos processos produtivos adotados no Brasil, suas principais etapas e os principais tipos de produtos expõem a evolução tecnológica deste setor e estão relacionadas com as principais estratégias competitivas adotadas pelas indústrias cerâmicas catarinenses e paulistas.

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A consolidação de uma tecnologia nacional na construção de máquinas e equipamentos voltados ao setor cerâmico passa pela superação das tecnologias europeias, fato que vem encontrando muitas dificuldades.

Referências Bibliográficas ABREU, Yolanda Vieira de. Estudo comparativo da eficiência energética da indústria da cerâmica via úmida no Brasil e na Espanha. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2003. ANFACER. O Mercado Mundial. Disponível em: Acessado em: 11 dez. 2014. BUDI, Vicenti. El distrito de la cerâmica de Castellón. In.: SOLER, Vicent. Colección Mediterráneo Económico: "Los distritos industriales". N. 13. Edita: CAJAMAR. CHESNAIS, François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996. FREEMAN, Christopher; SOETE, Luc. A economia da inovação industrial. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2008. ISOPPO, Keity Kristiny Vieira.

Gênese e evolução da indústria cerâmica na

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