Inovação em Serviços na Indústria Manufatureira: Os Casos Randon e White Martins

July 25, 2017 | Autor: E. Dorion | Categoria: Estrategia, Inovação, Serviços
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Inovação em Serviços na Indústria Manufatureira: Os Casos Randon e White Martins

Área Temática: Empreendedorismo e Inovação AUTORES GIANCARLO DAL BÓ Universidade de Caxias do Sul [email protected] CRISTINE HERMANN NODARI Universidade de Caxias do Sul [email protected] PELAYO MUNHOZ OLEA Universidade de Caxias do Sul [email protected] ERIC DORION Universidade de Caxias do Sul [email protected] Resumo O estudo do processo de inovação em serviços é recente na literatura acadêmica e ainda amplamente controverso. As tentativas de adequação dos avanços já realizados na análise do processo de inovação de produtos ao segmento de serviços têm se mostrado insuficientes para dar conta das especificidades inerentes à própria natureza dos serviços. A crescente representatividade econômica deste setor nas economias desenvolvidas e em desenvolvimento contribuiu para o surgimento de diversas abordagens teóricas ao tema, mas a maioria delas direcionadas às companhias prestadoras de serviços. Quando o objeto de análise é o processo de inovação em serviços no contexto da indústria manufatureira, as lacunas tornam-se ainda mais evidentes. Este artigo, por intermédio de revisão bibliográfica e de entrevistas em profundidade conduzidas junto a gestores de duas grandes indústrias nacionais, pretende contribuir para o preenchimento destas lacunas, representando um esforço de análise no sentido de comparar os modelos de inovação em serviços encontrados na literatura às práticas organizacionais adotadas pelas empresas sob análise, possibilitando a efetivação de um conjunto de inferências relativas à aproximação a um modelo de compreensão do processo de inovação em serviços no âmbito das organizações industriais. Palavras-chave: inovação, serviços, estratégia.

Abstract The study on the service innovation process is rather recent in the academic literature and is still considerably controversial. The attempts to adequate the developments accomplished in the analysis of the product innovation process to the services segment have proved

insufficient to cope with the particular features inherent to the segment’s own nature. The increasing economic representativeness of the service sector in both developing and developed economies has contributed to the appearance of several theoretical approaches on the theme, although most of them have been addressed to the service rendering companies. When the object of analysis is the service innovation process in the manufacturing industry context, the gaps become even more evident. This paper, which makes use of a bibliographic review and in-depth interviews carried out with managers of two important national industries, aims at helping to fill up those gaps, representing an analysis effort to compare the service innovation models found in the literature to the organizational practices adopted by the companies analyzed, enabling the effectiveness of a set of inferences related to the approach of a comprehension model regarding the service innovation process in industrial organizations. Keywords: innovation, services sector, strategy.

Introdução Desde o lançamento da obra Teoria do Desenvolvimento Econômico, de Joseph Schumpeter, em 1934, o tema inovação vem sendo exaustivamente analisado, debatido e teorizado sem que, no entanto, se tenha chegado próximo a um consenso entre os diversos autores a respeito de questões-chave relacionadas às suas dimensões, tipologias, modelos e processos. Até o final da década de 1980 as atenções estiveram voltadas preferencialmente à inovação tecnológica de produtos e processos, com o desenvolvimento de indicadores capazes de mensurar o ritmo e a direção das inovações promovidas por indústrias e países, como o registro de patentes de invenções tecnológicas ou o nível de investimento em atividades de pesquisa e desenvolvimento. No início da década de 1990 outras dimensões da inovação passam a ser objeto de interesse. A segunda edição do Manual de Oslo (OCDE, 1997) acrescenta as dimensões de inovação gerencial ou organizacional, ainda que de forma tímida, uma vez que tanto a caracterização quanto as formas de mediação destas inovações não são claramente estabelecidas. Nesta mesma edição do Manual, também as atividades de marketing, como pesquisa de mercado, design e embalagem, são apontadas como fontes de inovação, muito embora sejam aparentemente descritas como inovações cosméticas ou, quando muito, incrementais, com um nível de relevância para os resultados do negócio inferior às inovações tecnológicas de produtos e processos, salientando que a atividade de marketing somente constitui uma inovação quando é necessária para a implantação de um produto tecnologicamente novo ou aprimorado. Em outras palavras, o Manual de Oslo (OCDE, 1997) sugere que as atividades de marketing suportam as inovações tecnológicas, não sendo elas mesmas a origem de inovações. Um aspecto que parece ter recebido pouca atenção por parte de acadêmicos e pesquisadores, apesar de sua crescente importância econômica, é o da inovação em serviços. Muito embora o conceito de produto não necessariamente exclua a categoria dos serviços, estes apresentam uma série de particularidades que justificariam um tratamento específico, como uma categoria à parte. Não somente os setores identificados eminentemente com a prestação de serviços, como instituições financeiras, educacionais, de telecomunicações e infra-estrutura, mas também o setor industrial tem procurado na inovação em serviços formas de diferenciação capazes de gerar vantagens competitivas sustentáveis em seus mercados, em virtude da capacidade dos serviços em criar valor para os consumidores. Uma das formas pelas quais muitas organizações industriais vêm procurando responder ao aumento da complexidade da demanda tem sido adicionar serviços de pós-venda aos seus bens, em uma tentativa de ampliar o componente de serviços presente em seus produtos finais, com a finalidade principal de complementar a oferta de seus produtos tangíveis com um componente intangível presente nos serviços (CASTELLACCI et al., 2005). Enquanto muitas inovações tecnológicas de produtos e processos, apesar do volume de investimentos em pesquisa e desenvolvimento que consomem, não sejam claramente identificáveis pelos clientes, as inovações em serviços, a despeito de em determinados casos demandarem um volume menor de recursos para serem implementadas, são prontamente percebidas e valorizadas em função das já citadas particularidades dos serviços, que descreveremos em maiores detalhes nas seções subseqüentes.

O Conceito de Inovação Para Rogers (1962, p. 23) “inovação é uma idéia, prática ou objeto que seja percebido como novo por um indivíduo ou outra unidade de adoção”. Segundo este autor, para que uma inovação possa ser considerada como tal, não importa o quanto uma idéia seja objetivamente nova, considerando o lapso de tempo decorrido desde a sua descoberta ou primeira utilização, e sim que seja percebida como novidade pelos adotantes, quer sejam indivíduos, organizações e economias. A definição fornecida por Schumpeter (1961) é, ao mesmo tempo, mais específica e mais abrangente, caracterizando que uma inovação, em seu sentido mais amplo, se produz em cinco diferentes formas: 1. A introdução ao mercado de um novo bem, com o qual os consumidores não estejam familiarizados. 2. A introdução de um novo método de produção, baseado em uma descoberta científica, ou ainda uma nova forma de tratar comercialmente um determinado produto. 3. A criação de um novo mercado em determinado país, independentemente de este mercado existir em outro país ou não. 4. A conquista de uma nova fonte de suprimento de matérias-primas ou de produtos semimanufaturados, independentemente desta fonte ser nova ou já existente. 5. A implantação de uma nova estrutura em um mercado como, por exemplo, a criação de uma posição de monopólio. Haustein (1980) define inovação como a capacidade para introduzir novos equipamentos e máquinas, bem como novas soluções organizacionais no processo de produção ou no mercado, enquanto o Manual de Frascati (OCDE, 1981) caracteriza uma inovação como a transformação de uma idéia em um produto vendável novo ou melhorado, ou em um processo operacional, industrial ou comercial, ou em um novo método de serviço social. Pavon e Goodman (1981 apud OLEA, 1999) definem a inovação como o conjunto de atividades inscritas em um determinado período de tempo e lugar, que conduzem à introdução com êxito no mercado e pela primeira vez de uma idéia na forma de novos ou melhores produtos, processos, serviços ou técnicas de gestão e organização. Trata-se de uma das primeiras definições desde o início do estudo do tema em que os serviços são nomeadamente tratados como uma das formas da inovação. Piatier (1987 apud OLEA, 1999) aponta a inovação como uma idéia transformada em qualquer coisa vendável ou utilizável. Já para Dosi (1988, p. 32), [...] a inovação essencialmente está relacionada à descoberta, experimentação, desenvolvimento, imitação e adoção de novos produtos, novos processo de produção e novos arranjos organizacionais.

Ruiz e Mandado (1989) afirmam que a inovação tecnológica compreende todas as etapas científicas, comerciais e financeiras, necessárias para o desenvolvimento e comercialização com êxito de produtos novos ou com melhores características, a utilização comercial de novos ou melhores processos ou equipamentos, ou a introdução ao mercado de novos serviços. Aqui, mais uma vez, a categoria dos serviços aparece mais como uma atividade de apoio, ou sustentação, às inovações tecnológicas de produto e de processo, e não como uma inovação por si própria. O Manual de Oslo (OCDE, 1997) aponta três diferentes tipos de inovação: 1. Inovação de produto: produto tecnologicamente novo é aquele cujas características fundamentais diferem significativamente de todos os produtos previamente produzidos pela empresa.

2. Inovação de processo: refere-se a formas de operação tecnologicamente novas ou substancialmente aprimoradas, obtidas pela introdução de novas tecnologias de produção, assim como de métodos novos ou substancialmente aprimorados de manuseio e entrega de produtos. 3. Inovação organizacional ou gerencial: refere-se a mudanças que ocorrem na estrutura gerencial da empresa, na forma de articulação entre suas diferentes áreas, na especialização dos trabalhadores, no relacionamento com fornecedores e clientes e nas múltiplas técnicas de organização dos processos de negócios. Percebemos aqui que o Manual de Oslo, criado especificamente para fornecer suporte às atividades de inovação dos países-membros da OCDE e fornecer indicadores e métodos de aferição das iniciativas inovadoras, não cita a categoria dos serviços como um dos tipos de inovação. O U.S. Department of Commerce (2002, p. 4) salienta que “por inovação nós entendemos a introdução com sucesso de uma nova ciência ou produto de base tecnológica em um mercado particular”. Ainda neste mesmo documento se define inovação comercial como o resultado da aplicação de técnica ou modelo de negócio para criar um novo ou aprimorado produto, processo ou serviço que seja introduzido com sucesso no mercado. O Massachussets Institute of Technology (MIT), apesar de não apresentar uma definição formal de inovação, sustenta que: [...] os produtos resultantes da invenção tecnológica apresentam como característica o preenchimento de uma função prática. Eles contrastam com os produtos da ciência, teorias e descobertas, que enfatizam um modelo de compreensão da realidade (MIT, 2003, p. 9).

Por esta afirmação, embora os serviços não sejam citados explicitamente, poderíamos considerá-los como uma inovação por preencherem o requisito de destinação a uma função prática, ainda que não sejam necessariamente provenientes de uma invenção tecnológica, de acordo com a definição de tecnologia utilizada. A classificação quanto aos tipos de inovação do Fórum de Inovação da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, identifica quatro diferentes dimensões da inovação (LEITE, 2005): 1. Inovação de produtos e serviços: desenvolvimento e comercialização de produtos ou serviços novos, fundamentados em novas tecnologias e vinculados à satisfação dos clientes. 2. Inovação de processos: desenvolvimento de novos meios de produção ou de novas formas de relacionamento para a prestação de serviços. 3. Inovação de negócios: desenvolvimento de novos negócios que forneçam uma vantagem competitiva sustentável. 4. Inovação em gestão: desenvolvimento de novas estruturas de poder e liderança. A definição estabelecida pelo Fórum já inclui a categoria dos serviços como uma das dimensões da inovação, porém considerando-a como uma extensão da inovação em produtos, ou ainda, considerando os serviços como um gênero de produto. O que queremos demonstrar a seguir é que os serviços possuem especificidades que poderiam elevá-los a uma posição independente, como uma quinta dimensão da inovação. O Conceito de Serviços No que diz respeito à caracterização dos serviços, Lovelock e Wrigth (2002) salientam que um serviço é um ato ou desempenho oferecido por uma parte a outra e que, mesmo que o processo possa estar relacionado com um produto físico, o desempenho é intangível e não

resulta em propriedade dos fatores de produção. Os mesmos autores afirmam que os serviços são atividades econômicas que criam valor e fornecem benefícios para os clientes. Serviço é uma atividade ou uma série de atividades de natureza mais ou menos intangível que normalmente, mas não necessariamente, ocorre em interações entre consumidores e empregados de serviços, ou sistemas do fornecedor do serviço, que são oferecidos como soluções para os problemas do consumidor, de acordo com Grönroos (1990). A maior parte dos experts nessa área, afirma Quinn et al. (1987) considera que o setor de serviços abrange todas as atividades econômicas cujo produto não é um bem físico ou fabricado; geralmente ele é consumido no momento em que é produzido e fornece um valor agregado em formas (tais como conveniência, diversão, oportunidade, conforto ou saúde) que representam essencialmente interesses intangíveis do seu primeiro comprador. Uma definição precisa de bens e serviços, de acordo com Sasser (1978) deve distinguilos com base em seus atributos. Um bem é um objeto físico tangível ou produto que pode ser criado e transferido; ele tem uma existência através do tempo e, desse modo, pode ser criado e usado posteriormente. Um serviço é intangível e perecível; é uma ocorrência ou processo que é criado e usado simultaneamente ou quase simultaneamente. Embora o consumidor não possa conservar o serviço real após ele ter sido produzido, o efeito do serviço pode ser mantido. No entendimento de Fitzsimmons e Fitzsimmons (2005) um serviço é uma experiência perecível, intangível, desenvolvida para um consumidor que desempenha o papel de coprodutor. Ainda de acordo com o mesmo autor, é difícil determinar a diferença entre um produto e um serviço, pois a compra de um produto é acompanhada de algum serviço de apoio (por exemplo, instalação), e a compra de um serviço muitas vezes inclui mercadorias (por exemplo, alimentos em um restaurante). Cada compra inclui um conjunto de bens e serviços. A administração de serviços é um enfoque organizacional global que faz da qualidade do serviço, tal como sentida pelo cliente, a principal força motriz da empresa para Albrecht (1992). Ele ainda salienta que excelência de serviço significa um nível de qualidade de serviço, comparado ao de seus concorrentes, que é suficientemente elevado, do ponto de vista de seus clientes, para lhe permitir cobrar um preço mais alto pelo serviço oferecido, conquistar uma participação de mercado acima do que seria considerado natural, e/ou obter uma margem de lucro maior do que a de seus concorrentes. A administração de serviços propõe uma nova urgência com respeito à maneira de encarar o cliente. Em um estabelecimento de prestação de serviços, clientes satisfeitos são como ativos. As compras futuras dos clientes possuem um valor presente que faz parte do capital intangível do empreendimento. Esta visão de Fitzsimmons e Fitzsimmons (2005) demonstra que se pode pensar no cliente como um ativo que se valoriza, ou seja, um ativo cujo valor aumenta com o passar do tempo, e isso é realmente o que se verifica quando a satisfação e a lealdade do cliente estão em um processo ascendente. Para Levitt (1973) não existem indústrias de prestação de serviços. Há apenas indústrias nas quais o componente de prestação de serviços é mais ou menos importante do que em outras. Em seu entendimento, fundamentalmente, todos nós prestamos serviços. Principalmente por este motivo é que acreditamos que o componente de serviços, independente do ramo de atividade da organização, é de fundamental importância para as economias, e que o tema da inovação em serviços deveria merecer maiores esforços de compreensão, com o desenvolvimento de modelos e tipologias que pudessem auxiliar os gerentes a estabelecer iniciativas inovadoras na gestão e na prestação dos serviços. Várias são as definições propostas pelos diversos autores que se debruçaram sobre o estudo da administração dos serviços. Embora estas definições apresentem por vezes diferenças significativas, algumas características diferenciadoras dos serviços são comuns a

maioria dos aqui mencionados como, por exemplo, intangibilidade, simultaneidade entre produção e consumo, perecibilidade, participação do consumidor no processo de produção e impossibilidade de conservação do serviço após ele haver sido produzido, sendo que o consumidor pode manter unicamente os efeitos do serviço após o ato do consumo. Inovação em Serviços O conjunto destas características distintivas entre um produto e um serviço configura tanto desafios quanto oportunidades para os gestores em qualquer indústria. Assim como no caso dos produtos tangíveis, os serviços também precisam ser dotados de características que os distingam dos concorrentes. Lovelock e Wright (2002) salientam que, com o aumento da competitividade e do nível de exigências dos clientes, a inovação nos serviços prestados passa a desempenhar um papel cada vez mais importante para o sucesso das organizações. Segundo Fitzsimmons e Fitzsimmons (2005), serviços são idéias e conceitos, enquanto que produtos são objetos. Assim, ao contrário dos produtos, inovações em serviços não são patenteáveis, ou passíveis de proteção contra a concorrência. Por este mesmo motivo, a mensuração das inovações em serviços é um processo radicalmente diferente, uma vez que não se pode medir o nível de investimento em inovações em serviços por meio do registro de patentes, como no caso das inovações tecnológicas de produtos e processos. Outra dificuldade de mensuração, tanto do volume de inovações em serviços quanto da própria dimensão do setor de serviços nas economias é o já citado incremento da dimensão de serviços nas organizações manufatureiras, descrito por Castellacci et al. (2005). De acordo com este autor, isto significa que as companhias manufatureiras estão perseguindo estratégias de marketing que visam complementar seus produtos tangíveis com um componente intangível utilizando as características-chave do serviço arquetípico, tais como intangibilidade, interatividade e intensidade de informação. O problema da mensuração dos serviços torna-se particularmente desafiador quando a tarefa destina-se a apreender e compreender os padrões de inovação. Além da própria dificuldade em definir claramente o que são os serviços, há desafio de conseguir detectar novidades e alterações de qualidade dos serviços. As já tênues fronteiras entre inovações tecnológicas e organizacionais, ou entre inovações de produto e de processo, se tornam ainda mais indefinidas no caso dos serviços (CASTELLACCI et al., 2005). O autor afirma que a típica empresa de serviços inovadora tende a investir menos em Pesquisa e Desenvolvimento do que as companhias de manufatura, mas que este dado, isoladamente, é insuficiente para mensurar o dinamismo destas organizações, uma vez que os esforços em treinamento e marketing usualmente não são incluídos nas estatísticas convencionais. Além do mais, as estatísticas existentes normalmente são baseadas em categorias previamente desenvolvidas para bens tangíveis, que nem sempre são as mais adequadas para descrever as especificidades dos serviços. Johnson et al. (apud Fitzsimmons e Fitzsimmons, 2000) desenvolvem uma classificação dos níveis de inovação em serviços fundamentada na tradicional distinção estabelecida para bens tangíveis, dividida entre inovações radicais e inovações incrementais. No caso dos serviços, as inovações radicais normalmente são orientadas por tecnologias baseadas na tecnologia da informação, enquanto as inovações incrementais estão mais relacionadas com extensões de linha e alterações de estilo, muitas vezes orientadas por novas demandas dos consumidores, o que nos conduz ao tradicional embate teórico entre inovações market-pull e technology-push (GODIN, 2006). Em outros casos, as inovações em serviços respondem a necessidades internas à organização, sobretudo atinentes à padronização de processos e racionalização de custos. Neste aspecto, uma característica que tem marcado a evolução dos serviços nas últimas duas

décadas, aproximadamente, tem sido uma tendência à padronização, normalmente associada aos produtos manufaturados e bastante difícil de implementar na produção de serviços. Nesta categoria podemos citar como exemplos os leitores óticos para controle de estoques ou as centrais de direcionamento automático de chamadas. Apesar de estas inovações serem altamente significativas do ponto de vista dos processos internos das organizações, optou-se neste estudo por direcionar a atenção às inovações em serviços que agreguem valor para o cliente e sejam percebidas por estes como benefícios ou respostas às suas necessidades e desejos, criando assim vantagens competitivas em relação às alternativas concorrentes, não importando o quanto estas inovações contribuem, ao mesmo tempo, para a otimização dos processos internos, como seria o caso do home banking, para ficar apenas em um caso emblemático. Objeto de Estudo e Metodologia Para os propósitos deste estudo realizou-se uma revisão bibliográfica e uma pesquisa qualitativa em duas organizações industriais com sede em Caxias do Sul, na região da serra gaúcha. A pesquisa estruturou-se em torno de entrevistas em profundidade com gestores da área de interesse da pesquisa e análise documental, tanto de material impresso fornecido pelas companhias, quanto de informações constantes nos sites das mesmas. Por intermédio da revisão bibliográfica é que o tema e o problema de pesquisa são fundamentados. Para Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (1999, p. 28) “dois aspectos são tradicionalmente associados à revisão da bibliografia pertinente a um problema de pesquisa: (a) a análise de pesquisas anteriores sobre o mesmo tema e/ou sobre temas correlatos e (b) a discussão do referencial teórico”. As entrevistas, de caráter semi-estruturado, foram conduzidas com o propósito de obter informações iniciais sobre o histórico das companhias e a percepção dos gestores sobre os serviços agregados aos seus produtos principais, bem como o papel desempenhado pela dimensão de serviços na percepção de valor dos clientes e no sucesso dos empreendimentos. Também se buscou compreender o entendimento destes gestores a respeito do processo de inovação em serviços e suas implicações para a obtenção de vantagens competitivas em seus respectivos negócios. A pesquisa qualitativa é a metodologia mais indicada para ampliar a compreensão sobre a natureza geral de um problema (WOLCOTT, 1994). A análise documental foi conduzida objetivando aprofundar as informações obtidas na fase de entrevistas, buscando evidências das hipóteses formuladas a partir dos discursos dos respondentes. Optou-se por utilizar documentos provenientes de diferentes fontes e elaborados por diferentes autores como uma forma de assegurar uma maior abrangência de pontos-de-vista, não limitando o estudo à perspectiva oficial das organizações. A opção por duas empresas industriais, com características eminentemente manufatureiras, também foi uma decisão metodológica, com o intuito deliberado de identificar o papel desempenhado pelos serviços – e, sobretudo, pela inovação em serviços – em segmentos normalmente não identificados por seu dinamismo na prestação dos mesmos. Por último, os serviços identificados como objeto da pesquisa são dirigidos aos clientes ou consumidores, e não se configuram como atividades internas destinadas à padronização de processos, tema que foge aos propósitos da presente análise. As organizações selecionadas foram: a divisão de homecare da White Martins (representante na América Latina da Praxair Inc.) e a Randon Consórcios, pertencente ao Grupo Randon, por atenderem aos requisitos de pesquisa descritos acima e por sua representatividade e relevância no ambiente de negócios considerado.

White Martins: Algo de Novo no Ar A White Martins é a maior empresa de gases industriais e medicinais da América do Sul, presente em nove países do continente, responsável pelo o fornecimento de soluções que exibem inovação, tecnologia e resultados para seus clientes. Sua linha de produtos e serviços é das mais completas do mercado: inclui gases atmosféricos (oxigênio, nitrogênio e argônio), gases de processo (gás carbônico, acetileno, hidrogênio, misturas para soldagem), além de gases especiais e medicinais. A empresa apresenta forte presença em setores que são os pilares da economia nacional, responsáveis por atender grande demanda interna e exportadora: setor metal-mecânico, gás natural, alimentos, bebidas, meio ambiente e segmento de clientes de pequeno consumo; além de ser fornecedora de todos os pólos petroquímicos, uma das maiores parceiras da indústria siderúrgica brasileira e do setor médico-hospitalar. A White Martins foi fundada no ano de 1912, no Rio de Janeiro, com o propósito de fornecer gases industriais para a indústria nacional, apostando principalmente no potencial da soldagem oxiacetilênica no desenvolvimento industrial do País. Durante praticamente todo o Século XX concentrou os seus esforços no fornecimento de gases para corte e solda e de oxigênio hospitalar, além da fabricação de equipamentos para solda e corte, tanques de combustível, colunas e tanques criogênicos. A partir do início do Século XXI, a empresa inicia o processo de desenvolvimento de um novo serviço, voltado para o crescente segmento de homecare. Neste segmento, a White Martins procura aliar suas competências no fornecimento de gases medicinais e equipamentos ao atendimento personalizado de cada cliente que necessita de assistência ou internação domiciliar, por intermédio da criação de uma estrutura especializada na prestação de serviços domiciliares, como orientações de uso e manuseio dos equipamentos e atendimento emergencial. Seguindo a literatura especializada, denominaremos os serviços descritos acima de serviços relacionados ao produto (product-related services). Conforme Gebauer et al. (2008), os serviços relacionados ao produto representam uma categoria específica de serviços oferecidos por empresas de manufatura. Esta definição está em conformidade com as descrições encontradas em inúmeros autores, como Oliva e Kallenberg (2003), Kotler (1994) e Mathieu (2001a, b) com relação a serviços básicos de instalação, serviços de reparo e manutenção e serviços gerais de suporte ao produto. A inovação levada a efeito pela White Martins neste campo pode ser caracterizada segundo a clássica definição de Rogers (1962) já descrita neste estudo, segundo a qual uma inovação pode ser assim entendida desde que seja percebida como novidade por uma determinada unidade de adoção, no caso, a própria White Martins. Tanto o serviço de homecare quanto muitos dos equipamentos que possibilitam sua aplicação já existiam. A inovação consistiu exatamente em acrescentar ao portfolio de produtos da organização uma estrutura destinada especificamente a apoiar esta atividade. Como, de modo geral, a inovação em empresas prestadoras de serviços difere daquela praticada em organizações manufatureiras (JOHNE; STOREY, 1998), a White Martins teve, para o desenvolvimento dos serviços de homecare, de lidar com o desafio de equilibrar-se entre dois diferentes processos de inovação. Enquanto a inovação de produto concentra-se primordialmente nas características dos produtos, a inovação em serviços também envolve mudanças nos sistemas de entrega e nas interfaces com os clientes (JONG et al., 2005). Este desafio foi particularmente importante devido a um fator complicador: o acréscimo, na cultura da organização, de uma orientação business to consumer à orientação business to business tradicional, desenvolvida na empresa desde o seu surgimento. Reconhecidamente, clientes domésticos e clientes organizacionais possuem diferentes

necessidades, critérios de seleção e percepções de valor, o que também influencia a disposição para pagar de cada grupo de clientes (GHEMAWHAT; RIVKIN, 2000). Neste sentido, a inovação promovida pela White Martins com o serviço de homecare, confirma algumas conclusões encontradas na literatura a respeito das principais diferenças encontradas entre os processos de inovação de produtos e de serviços. Gebauer et al (2008) sinalizam que uma estratégia explícita de desenvolvimento de recursos humanos tem uma maior influência para o sucesso de novos serviços do que no caso de novos produtos, o que torna de fundamental importância a concentração de investimentos no desenvolvimento de pessoal de linha de frente e de áreas de apoio à prestação dos serviços. Esta concentração dos investimentos no desenvolvimento dos recursos humanos também é um reflexo do acréscimo da orientação business to consumer anteriormente descrita, uma vez que os entrevistados relataram que algumas especificidades dos clientes domésticos, como maior subjetividade no processo de escolha do prestador de serviço, maior necessidade de orientação em relação ao uso e manutenção dos equipamentos e menor nível geral de conhecimento técnico especializado, demandaram uma série de esforços por parte da organização para treinar e capacitar os funcionários de linha de frente e lidar com estas especificidades. De acordo com as informações obtidas com os gestores da empresa, uma diferença básica entre os processos de inovação de serviços para clientes organizacionais e para clientes domésticos, reside no fato de que, enquanto as inovações de serviços para clientes organizacionais são concebidas concomitantemente com o desenvolvimento do produto, e também lançadas no mercado simultaneamente, as inovações em serviços para clientes domésticos são realizadas em etapas separadas. Primeiramente, o produto é desenvolvido e introduzido no mercado. Posteriormente, a inovação no serviço relacionado ao produto é efetivada, considerando o processo de utilização do produto. Como as necessidades de serviços relacionados ao produto, em geral, apresentam uma maior variação no caso dos clientes domésticos, a oferta dos serviços precisa ser mais personalizada, o que torna o processo de inovação em serviços mais desafiador, menos sistemático e, conseqüentemente, menos sujeito a padronização, fato que também dificulta muitas vezes os ganhos em economias de escala, que normalmente fazem parte dos objetivos buscados no processo de inovação de produtos e processos em organizações manufatureiras. Randon Consórcios: Criando Relacionamentos O grupo Randon S.A. Implementos e Participações teve sua origem na Mecânica Randon, empresa criada em 1949, em Caxias do Sul, pelos irmãos Hercílio e Raul Randon. A Mecânica Randon destinava-se à produção de materiais de ferraria e consertos de motores e máquinas e, alguns anos após, tornou-se uma pequena fábrica de freios a ar. Aos poucos a empresa vai incorporando à sua linha de produtos a fabricação de eixos, terceiros-eixos e semi-reboques. No ano de 1970 a empresa transforma-se em sociedade anônima passando a denominar-se Randon S.A. Indústria de Implementos para o Transporte e no ano seguinte torna-se empresa de capital aberto. Os irmãos Randon continuam sócios majoritários e Raul é eleito diretor-presidente. Nos anos seguintes, através de uma agressiva estratégia de joint ventures, surge a atual Randon, holding mista líder de um conjunto de oito empresas operacionais que, juntas, responderam por um faturamento bruto total de R$ 2,89 bilhões no ano de 2006. A Randon Consórcios é uma destas oito empresas que compõem o Grupo, sendo a organização selecionada para fazer parte deste estudo, em virtude de ter sido constituída a partir de uma inovação em serviços efetuada por sua principal controladora, empresa

eminentemente manufatureira que preenche os requisitos de análise determinados para esta pesquisa. A empresa foi fundada no ano de 1987 e seu propósito inicial era administrar grupos de consórcio como uma nova alternativa de vendas dos implementos rodoviários fabricados pela Randon Implementos. Tratava-se inicialmente de um serviço prestado exclusivamente aos clientes da Randon Implementos, como forma de facilitar a aquisição dos produtos pertencentes a sua linha. A partir de 1993, a Randon Consórcios iniciou a expansão de suas atividades para diferentes segmentos. Inicialmente a empresa lançou um projeto-piloto de consórcio de veículos destinado aos funcionários das empresas do grupo. Com o sucesso desta iniciativa, o projeto foi ampliado para pessoas físicas e jurídicas para aquisição de automóveis, ônibus, máquinas agrícolas, imóveis e terrenos, proporcionando crescimento constante em faturamento e número de clientes. Mais recentemente, a empresa introduziu mais duas inovações em seus serviços: a Racon Consórcio Inteligente, destinada a empresas que desejem oferecer a seus clientes uma alternativa de parcelamento na aquisição de bens, e a Racon Franquias, com o objetivo de formar uma rede cada vez mais sólida na comercialização de cotas de consórcio de imóveis em todo o brasil. Tanto a gestão da rede de franquias quanto a administração do parcelamento das compras efetuadas pelos clientes das empresas associadas a Racon Consórcio Inteligente são totalmente de responsabilidade da Randon Consórcios. A inovação em serviços concebida pela Randon tomou a forma de uma nova empresa, tornando-se esta uma organização eminentemente prestadora de serviços. Enquanto a White Martins enfrenta o desafio de equilibrar os esforços em desenvolvimento de novos produtos e de novos serviços, a Randon Consórcios pode concentrar o foco somente no segundo processo, reduzindo assim os conflitos inerentes a mudanças de cultura de sua matriz manufatureira, afeita a um processo específico de concepção de produtos, desenho de processos e relacionamento com clientes. A inovação em serviços representada pela fundação da Racon (Randon Consórcios) surgiu de uma necessidade percebida pelo Grupo Randon de criar valor para seus clientes, além do produto físico, ao mesmo tempo em que respondia por uma estratégia corporativa de ampliar o volume de vendas, via penetração de mercado, adicionando uma alternativa de pagamento suficientemente atrativa ao mercado, valendo-se da solidez econômico-financeira do Grupo. O processo inicial de inovação em serviços no Grupo Randon era, a exemplo de outras organizações de serviços industriais, cujos clientes são outras organizações, radicalmente diferente do processo de inovação em organizações que atendem ao consumidor final, porque, enquanto nestas últimas o foco principal do processo está em criar valor para uma base ampla de consumidores, com vistas à padronização dos serviços e pouca participação dos consumidores no projeto dos serviços, as organizações de serviços industriais, para DeJong e Vermeulen (2003) precisam lidar com clientes que apresentam diferentes processos de escolha e decisão, além de demandas extremamente complexas. Conforme Yanamandram e White (2006) os provedores de serviços industriais devem personalizar suas ofertas de serviços de acordo com as necessidades individuais dos clientes (organizacionais). O desenvolvimento ou aprimoramento dos serviços industriais devem, em maior grau do que no caso de serviços para consumidores finais, concentrar esforços no desenvolvimento de interações e relacionamentos com os clientes, além de demandarem um maior envolvimento com fornecedores e especialistas em processos de desenvolvimento e implementação dos serviços (PANESAR; MARKESET, 2008). A inovação seguinte, conforme já mencionado, foi a ampliação do serviço também para pessoas físicas, na aquisição de bens de consumo – automóveis, imóveis – tornando

necessária a adequação de todos os processos para um perfil de atendimento radicalmente diferente daquele praticado tradicionalmente pelas demais empresas do grupo. Os relacionamentos business to business e business to consumer possuem naturezas diferentes, conforme afirmam diversos autores, como Grönroos (1990), Gumesson (1997) e Parvatyiar e Sheth (1998). Em face destes diferenciais, a Randon Consórcios promoveu uma série de mudanças organizacionais, desde a reestruturação da área de Recursos Humanos, com a adoção de diferentes critérios para recrutamento, seleção, desenvolvimento e remuneração, até a própria estrutura hierárquica, com uma quantidade menor de níveis em relação aos outros empreendimentos do grupo, facilitando o processo de comunicação e concedendo maior autonomia aos colaboradores que tem contato direto com os clientes. A Randon Consórcios foi a primeira empresa do Grupo Randon a adotar os modelos de Gestão do Conhecimento e de Gestão por Competências, justamente por considerá-los mais adequados para dar suporte ao modelo de negócios da empresa. Como a organização, no segmento de serviços, atua mais próxima do consumidor final, inclusive com a participação ativa deste no processo de “produção” e entrega do serviço, a qualidade das interações entre os colaboradores do prestador de serviço e os consumidores é determinante para a percepção da qualidade do serviço, como ressalta Grönroos (2000). Assim, enquanto a Gestão do Conhecimento serve de base para a geração de idéias que darão origem às inovações em serviços e para o desenvolvimento e manutenção dos relacionamentos, a Gestão por Competências reconhece e premia as iniciativas destinadas a criar e transferir valor para o consumidor, servindo também para medir e eliminar – ou reduzir – os gaps de competência que poderiam ser percebidos pelos consumidores como redutores deste valor. A última inovação incorporada ao portfolio de serviços da Randon Consórcios foi o sistema de franquias, destinado a ampliar a base de clientes do negócio de consórcios do Grupo Randon e que também contribui tanto para o fortalecimento da marca quanto para a difusão das inovações para outras regiões e mercados. Para Rogers (1983), a difusão das inovações é importante, pois determina tanto a direção quanto a velocidade de adoção de inovações e, uma vez que inovações em serviços não são passíveis de proteção por patentes, a única forma de uma organização assegurar o domínio sob estas inovações é por meio de um rápido e eficaz processo de difusão. Análise e Interpretação dos Resultados As inovações em serviços empreendidas pelas organizações analisadas, apesar da diferentes abordagens e finalidades, apresentam alguns aspectos comuns no que se refere ao processo de inovação, tanto quando comparados os processos utilizados nas duas organizações quanto com os processos descritos na literatura especializada. Por exemplo, para Cumming (1998) e Ahmed (1998), o processo de inovação compreende as fases de geração de idéias, desenvolvimento das idéias em um conceito utilizável e, finalmente, da aplicação com sucesso dos conceitos desenvolvidos. Já Edvardsson, Haglund e Mattsson (1995) e Edvardsson e Olsson (1996) identificam as fases de idéia, formação do projeto, design e implementação. No entendimento destes últimos autores, estas quatro fases se sobrepõem umas às outras e raramente podem ser claramente identificadas. Uma importante constatação feita durante o processo de entrevistas com os gestores de ambas as organizações também vem ao encontro das principais considerações efetuadas por pesquisadores da área da inovação em serviços, que afirmam que, na maioria dos casos estudados, as inovações em serviços são menos dependentes das inovações tecnológicas do

que as inovações em produtos (COOPER; DE BRENTANI, 1991; STOREY; EASINGWOOD, 1993). Nos dois casos, as inovações, apesar de suportadas pela tecnologia da informação, não foram originadas por estas tecnologias, mas antes nasceram da identificação de oportunidades de mercado (no caso do serviço de homecare da White Martins) e de demandas de consumidores atuais e potenciais no caso do Grupo Randon. Assim, as inovações foram geradas internamente e não, como é o caso para muitos bens de consumo, externamente, como conseqüência de inovações tecnológicas. Para a White Martins, o produto físico ainda é um componente importante do processo de inovação, uma vez que representa um pré-requisito para a prestação do serviço. Todo o atendimento de homecare passa pelo fornecimento de produtos (gases medicinais, cilindros e equipamentos biomédicos), sendo estes determinantes para que os serviços de projeto de redes, instalação e manutenção sejam prestados. Enquanto estes serviços descritos são parte integrante dos produtos, ou seja, os benefícios oriundos dos produtos não podem ser auferidos sem o pacote de serviços que os acompanham, o serviço de assistência domiciliar e todo o desenvolvimento da estrutura que possibilita a prestação deste é que representa de fato uma inovação para a organização. O grande desafio enfrentado pela White Martins foi a remodelação de uma estrutura originalmente concebida para atender o mercado business to business para que atingisse níveis adequados de eficiência e rentabilidade no relacionamento business to consumer. As especificidades deste mercado tornaram necessário o desenvolvimento de estruturas de desenvolvimento, comercialização, distribuição, instalação, manutenção e assistência completamente inovadoras para a cultura dominante na organização. As escalas de produção, volumes de vendas, critérios de segmentação e formas de relacionamento com os clientes, entre outros fatores, apresentam profundas diferenças quando comparados os mercados de consumidores industriais e de consumidores domésticos. As estruturas necessárias para atender de forma adequada, com lucro, cada um destes diferentes mercados, requerem abordagens muitas vezes conflitantes, exigindo da organização a capacidade de empreender esforços em direções distintas e a analisar detalhadamente a alocação de recursos para cada um dos mercados, bem como a desenvolver indicadores de eficiência e satisfação específicos para cada perfil de clientes. O Grupo Randon, ao fundar a Randon Consórcios, promoveu uma inovação em serviços de natureza bastante diversa daquela normalmente encontrada em organizações industriais que, de modo geral, são direcionadas aos serviços de instalação, reparos e manutenção de equipamentos industriais e que são, portanto, serviços relacionados ao produto, ou seja, serviços que garantem a continuidade de funcionamento dos produtos físicos fornecidos e a manutenção dos benefícios por eles proporcionados. No caso específico da criação da Randon Consórcios, o processo de inovação adotado não esteve direcionado ao desenvolvimento de um pacote de serviços agregado aos produtos físicos especificamente, mas sim à facilitação do processo de aquisição dos produtos fabricados pelo Grupo. O que na maioria das organizações industriais ocorre por meio do estabelecimento de uma política comercial, para o Grupo Randon tomou a forma de um novo negócio. Embora existam, no meio empresarial, casos semelhantes a este, não encontramos na literatura estudos aprofundados sobre um exemplo análogo ao do Grupo Randon, no qual o desenvolvimento de uma inovação em serviços dá origem a uma inovação em negócio, fato que reforça a relevância da presente análise. Enquanto inovações em negócios sejam uma constante na trajetória, sobretudo recente, do Grupo Randon, todas elas tiveram origem em um processo de diversificação das atividades para outras categorias de produto não relacionadas ao core business da organização. Já no

caso em questão, a inovação em serviços foi fundamentada em processo de aprofundamento no relacionamento com os clientes organizacionais atuais e potenciais dos produtos desenvolvidos pelo Grupo. Foi este modelo adotado desde o primeiro momento, de criação de uma nova organização voltada exclusivamente para a prestação de serviços, que posteriormente possibilitou a introdução de mais uma série de inovações em serviços, como a ampliação das atividades para a prestação do mesmo serviço também para pessoas físicas, a inclusão do serviço de administração de consórcios para terceiros, como fabricantes de máquinas agrícolas, montadoras de automóveis e incorporadoras de imóveis, bem como a mais recente iniciativa, a difusão dos serviços da marca Randon Consórcios por meio do processo de franquias. Dentre as inferências que podem ser feitas a partir das informações obtidas com os gestores da Randon Consórcios, algumas apontam na direção de que a estratégia de crescimento adotada pelo Grupo Randon, alicerçada no desenvolvimento de alianças estratégicas e suportada por práticas consolidadas de marketing de relacionamento, desempenharam um papel importante no modelo de inovação que deu origem à Randon Consórcios. Como a análise do processo de formação de estratégias do Grupo Randon situa-se além do escopo pretendido por este estudo, fica a sugestão para análises futuras o tema do papel desempenhado pelo planejamento estratégico no desenvolvimento de modelos de processos de inovação, sejam eles de produtos e serviços, processos, de gestão ou de negócios. Considerações Finais O processo de inovação em serviços ainda representa um campo de estudos não devidamente explorado na literatura concernente à inovação. Enquanto o processo de inovação de produtos e, sobretudo, a inovação tecnológica, têm sido objetos de análise desde, pelo menos, o início da década de 1930, a inovação em serviços somente passou a fazer parte dos interesses de acadêmicos, como vimos, a partir de meados da década de 1980. A crescente representatividade do setor de serviços nas economias desenvolvidas e em desenvolvimento requer abordagens específicas que traduzam de forma mais adequada as especificidades deste segmento que, se considerados não só os provedores de serviços reconhecidos como tais, mas também os aspectos de serviços encontrados internamente nas organizações industriais, representa a quase totalidade de todo o valor criado nas sociedades contemporâneas. O estudo da inovação em serviços no interior de organizações prestadoras de serviços já produziu alguns avanços significativos na compreensão deste processo, embora ainda reste um longo caminho a ser trilhado. Já a inovação em serviços no contexto da indústria manufatureira ainda carece de contribuições nas principais áreas do conhecimento, principalmente a Economia e a Administração. A literatura relativa à Administração de Serviços, bem como a abordagem do Marketing de Relacionamento, parece fornecer importantes pontos de partida para a análise da inovação no âmbito dos serviços em organizações industriais, uma vez que, tanto uma quanto outra, trouxe significativos aportes teóricos para a compreensão, seja das especificidades características dos serviços em relação aos bens embalados, seja na percepção da natureza relacional da prestação de serviços, aspectos estes que foram mencionados em toda a extensão deste artigo. Acreditamos que os casos analisados reforçam estas considerações. Nas duas organizações, conforme procuramos demonstrar, os principais desafios enfrentados para a

promoção das inovações a que fizemos referência, estiveram relacionados à adequada compreensão do caráter singular dos serviços por parte de estruturas desenhadas originalmente para a manufatura, assim como com a assunção de um novo paradigma relacionado à criação e desenvolvimento de relacionamentos com os clientes em uma perspectiva de longo prazo. Este artigo, ainda que não pretenda, seja por razões de escopo ou de abrangência, constituir-se em uma abordagem capaz de conciliar as teorias da inovação propostas para produtos físicos e para serviços considerando todas as suas especificidades, inscreve-se no rol dos esforços intelectuais empreendidos para a redução das lacunas verificadas no atual estado da arte da literatura de inovação. Referências Bibliográficas AHMED, P. K. Culture and climate for innovation. European Journal of Innovation Management, v. 1, n. 1, 1998. ALBRECHT, K. Revolução em Serviços. São Paulo: Pioneira, 1992. ALVES-MAZZOTTI, A. J.; GEWANDSZNAJDER, F. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 1999. BERTOLINI, M., BEVILACQUA, M., BRAGLIA, M.; FROSOLINI, M. An analytical method for maintenance outsourcing service selection. International Journal of Quality & Reliability Management, v. 21, n. 7, 2004. CASTELLACCI, F.; GRODAL, S.; MENDONÇA, S.; WIBE, M. Advances and challenges in innovation studies. Journal of Economic Issues, v. 39, n.1, March 2005. CUMMING, B. S. Innovation overview and future challenges. European Journal of Innovation Management, v. 1, n. 1, 1998. COOPER, R.; DE BRENTANI, U. New industrial financial services: what distinguishes the winners. Journal of Product Innovation Management, v. 8, p. 281-299, 1991. DE JONG, P. J. J.; VERMEULEN, A. M. P. Organizing successful new service development: a literature review. Management Decision, v. 41, n. 9, 2003. DE JONG, J.; BRUINS, A.; DOLFSMA, W.; MEIJAARD, J. Innovation in service firms explored: what, how and why? Literature Review, EJM Business and Research Policy: Zoetermeer, 2005. DOSI, G . The nature of innovative process. In: G DOSI, C.; FREEMAN, R.; NELSON, G.; SILVERBERG; SOETE, L. (eds.). Technical change and economic theory. Londres-Nova York: Printer Publishers, 1988. EDVARDSSON, B., OLSSON, J. Key concepts in new service development. Services Industrial Journal, v. 16, n. 2, 1996. EDVARDSSON, B.; HAGLUND, L.; MATTSSON, J. Analysis, planning, improvisation and control in the development of new service. International Journal of Service Industry Management, v. 6, n. 2, 1995. FTZSIMMONS, J. A.; FITZSIMMONS, M. J. Administração de serviços: operações, estratégia e tecnologia da informação. 4.ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. GEBAUER, H.; KREMPL, R.; FLEISCH, E.; FRIEDLI, T. Innovation of product-related services. Managing Service Quality, v. 18, n. 4, p. 387-404, 2008. GHEMAWAT, P.; RIVKIN, J. W. Criando vantagem competitiva. In: GHEMAWAT, P. A estratégia e o cenário dos negócios: textos e casos. Porto Alegre: Bookman, 2000. GODIN, B. The linear model of innovation: the historical construction of an analytical framework. Science, Technology & Human Values, v. 31, n. 6, Nov., 2006. GRÖNROOS, C. Service Management and Marketing. Lexington: Lexington Books, 1990. GRÖNROOS, C. Service Management and Marketing, 2. ed. London: John Wiley, 2000.

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