INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E CONTRATAÇÃO PÚBLICA: uma análise do setor de defesa brasileiro

July 3, 2017 | Autor: Andre Luis Vieira | Categoria: Innovation Policy, Down Payment, Technical risk, Defence Procurement
Share Embed


Descrição do Produto

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro André Luís Vieira Assessor jurídico. Bacharel em Direito. Especialista em Direito Público. Pós-graduado em Direito Ambiental. LLM – Masters of Law em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Mestre em Logística Aplicada. Doutorando em Direito Público pela Universidade de Direito de Coimbra (FDUC) – Portugal.

Não cora o livro de ombrear com o sabre. Nem cora o sabre de chamá-lo irmão. (CASTRO ALVES. Espumas flutuantes. 1870)

Resumo: Este trabalho busca traçar considerações acerca do panorama legal e realidade jurídico-contratual do desenvolvimento industrial e tecnológico gerado pelo setor de defesa no Brasil. Nesse sentido, buscouse no instituto dos contratos públicos o pressuposto lógico-jurídico necessário para traçar o perfil dos mecanismos de fomento à cultura da inovação no seio da Base Industrial de Defesa (BID). Justifica-se, portanto, a escolha do presente tema pela crescente discussão acerca dos recursos públicos destinados à contratação de produtos e sistemas de defesa pelas Forças Armadas, fruto da Estratégia Nacional de Defesa (END), visando garantir ao país o incremento das capacidades tecnocientíficas, ao mesmo tempo em que preserva sua soberania. Palavras-chave: Inovação tecnológica. Desenvolvimento científico e tecnológico. Contratos de interesse da Defesa Nacional. Política de inovação. Risco tecnológico. Antecipação de pagamento. Sumário: I Considerações iniciais – II Considerações sobre inovação tecnológica no Brasil – III Considerações sobre inovação aplicada ao setor de defesa – IV A contratação pública como mecanismo de fomento à inovação na base industrial de defesa – V Especificidades jurídico-procedimentais dos contratos de interesse da Defesa Nacional – VI Considerações finais – Referências

I Considerações iniciais O tema defesa nacional suscita os mais diversos sentidos e alcances conceituais, por sua vez, espalhados por vários campos do conhecimento humano. É lugar-comum em disciplinas de história, geopolítica, sociologia, ciência política e direito, tendo em vista encontrar-se positivado em inúmeras ordens constitucionais. Trata-se, consabido, de argumento convergente com o estudo de outras temáticas proeminentes como soberania e jurisdição internacional.

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

33

André Luís Vieira

De natureza designadamente estratégica para a manutenção do status de nação soberana,1 o sentido intelectivo de defesa nacional também desempenha papel relevante na seara do desenvolvimento socioeconômico, dado seu viés industrial e tecnológico, mesmo quando considerado em tempos de paz.2 Além de servir como suporte ao aparelhamento e mobilização das Forças Armadas para dissuadir ou rechaçar ameaças externas, o setor de defesa pode ser também um dos agentes propulsores do sistema de inovação tecnológica nacional.3 Nesse sentido, a política pública setorial de defesa em vigor no Estado brasi4 leiro prioriza a busca de autonomia tecnológica e a promoção de tecnologias de uso dual (militar e comercial),5 o que sinaliza a clara vocação do setor para confirmar tal premissa. Contudo, esse alinhamento institucional não é particularidade brasileira, ao contrário, trata-se de nítida intenção de aproximar-se dos modelos mais estruturados e internacionalmente consagrados sobre a matéria.6 Sem a preocupação de esgotar os exemplos e as particularidades de tais modelos, ao avaliar as capacidades da alta tecnologia do Estado de Israel,7 verifica-se o importante papel histórico desempenhado pela evolução da tecnologia de

PINTO FERREIRA. Da soberania. Jornal do Commercio, Recife, p. 91-129, 1943. Para efeitos de introdução ao assunto, recomenda-se: HARTLEY, Keith. The economics of defence policy: A new perspective. London; New York: Routledge, 2011. p. 1-29. HOYT, Timothy D. Military industry and Regional Defense Policy. London; New York: Routledge, 2007. p. 1-27. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Desenvolvimento econômico e segurança nacional: Teoria do limite crítico. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1971. p. 121-130. HARTLEY, Keith. Defence economics: Achievements and challenges. In: ANNUAL INTERNATIONAL CONFERENCE ON ECONOMICS AND SECURITY, 10th, 2008. Proceedings... 2008. ZYCHER, Benjamin. Economic effects of reductions in defense outlays. Policy Analysis, n. 706, August 8, 2012. STEHLIK, Daniela; JENNINGS, Gayle; DWYER, Larry. A socio-economic impact study of defence force activity in Central Queensland Australia. The Centre for Social Science Research, Central Queensland University, August 2004. 3 MINISTÉRIO DA DEFESA, MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Concepção estratégica: Ciência, tecnologia e inovação de interesse da Defesa Nacional. Brasília, 2003. p.25-52. 4 OLIVEIRA, Andréa Benetti Carvalho de; SILVA, Caroline Cordeiro Viana e. Política de defesa nacional, estratégia nacional de defesa e doutrina militar de defesa: América do Sul e segurança regional. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (ABRI), 3º, 2011. Proceedings... São Paulo: Instituto de Relações Internacionais – USP. Disponível em: . Acesso em: 28 maio 2015. 5 Também comumente chamadas de spin off, das quais são exemplos internet, GPS, celular, micro-ondas, raio laser. Também pode ocorrer o inverso, ou seja, o spin on, como aplicação militar de uma tecnologia comercial. Cf. MAZZUCATO, Mariana. O Estado empreendedor. São Paulo: Portfólio Penguin, 2014. “[...] O modelo de negócio spin off tornou-se viável e se popularizou no setor de pesquisa tecnológica depois da revolta de 1957 [fundação da empresa Fairchild Semiconductor], ainda assim não teria sido possível sem o envolvimento do Estado e sua atuação como primeiro e principal cliente. Surgiu um novo paradigma que resultou em ideias inovadoras passando dos laboratórios para o mercado em quantidade muito maior”. 6 Cf. HARTLEY, Keith. The economics of defence policy: A new perspective. London; New York: Routledge, 2011. p. 147 e ss., 183 e ss. Ver também HOYT, Timothy D. Military industry and Regional Defense Policy. London; New York: Routledge, 2007. p. 171-186. 7 Um dos modelos de interação, em países em vias de desenvolvimento, entre as indústrias do setor de defesa, centros de pesquisas e geração de inovações tecnológicas mais bem-sucedido é o israelense. Cf. PELED, Dan. Defense R&D and economic growth in Israel: A research agenda. Department of Economics, University of Haifa, January 11, 2001. Também, HOYT, Timothy D. Military industry and Regional Defense Policy. London; New York: Routledge, 2007. p. 67-114.

1 2

34

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

defesa e seus efeitos irradiantes sobre outros setores da economia, particularmente quando tal impacto é analisado de forma sistêmica, levando-se em consideração o fomento ao setor industrial, as políticas de incentivo ao sistema educacional em ciência e engenharia e o nível de formação e capacitação técnica de sua força de trabalho. Tal concepção demonstra que nenhum dos países que se prepara para estágios mais avançados de desenvolvimento prescinde de políticas de defesa bem estruturadas, as quais costumam ter incentivos e orçamentos compatíveis com a importância geopolítica de seus mercados e territórios. Segurança interna e defesa externa adequadas são, naturalmente, necessárias para qualquer pretensão de progresso social e econômico.8 Não é por outra razão que os países desenvolvidos estão sempre na vanguarda tecnológica e na disputa pelo pioneirismo na fronteira das tecnologias de defesa. Tal disputa gera não apenas os efeitos dissuasórios de natureza bélica, mas também exibem externalidades positivas para as economias internas, vez que países que incentivam tal política parecem experimentar um liame virtuoso entre defesa nacional, desenvolvimento socioeconômico e inovação tecnológica.9 Assim, o presente ensaio objetiva ressaltar as oportunidades e os incentivos à inovação tecnológica no setor de defesa, em especial para o desenvolvimento de tecnologias de uso dual, na tentativa de aproximar o Brasil das fronteiras evoluídas do progresso social e tecnológico, oferecendo, para tanto, uma reflexão ajustada sobre o liame lógico-sistêmico existente entre o grau de sofisticação da pesquisa e produção de tecnologia militar, de conteúdo nacional, com o desenvolvimento de outros setores da economia brasileira baseados no desempenho tecnológico. Para isso, mister se faz identificar que o instrumento mais apto para permitir a interação entre a atividade de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novas tecnologias de interesse da defesa, enquanto atividade de pesquisa científica aplicada, com o incremento de capacidades tecnológicas e industriais, é o contrato administrativo. Portanto, a compreensão dessa interação pode fornecer um valioso contributo para as escolhas públicas sobre alocação de recursos

BERGO, Marcio Tadeu Bettega. O pensamento estratégico e o desenvolvimento nacional: uma proposta de projeto para o Brasil. 2. ed. São Paulo: MP, 2008. p. 65-75. 9 Interessante se faz o caso dos EUA, visto que os projetos de interesse da defesa nacional são elaborados sob coordenação e incentivo direto da Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA), agência do governo americano “com um orçamento anual de US$ 3 bilhões (0,5% do orçamento do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, que em 2009 foi de US$ 651 bilhões), que se destaca no financiamento de tecnologias novas para uso militar cuja aplicação transborda para uso comercial”. Um dos resultados imediatos dessa política repousa no fato de que a indústria de defesa norte-americana é sinônimo de tecnologia de ponta e representa uma das maiores expressões que seu poder de império projeta. Cf. ALMEIDA, Mansueto. A política de inovação e a política de defesa: o caso da agência de inovação DARPA nos Estados Unidos, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Radar: tecnologia, produção e comércio exterior, Brasília, n. 1, p. 27-35, abr. 2009. 8

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

35

André Luís Vieira

orçamentários10 no que tange aos custos relacionados com a atividade de P&D, ao escrutinar as nuances jurídico-procedimentais que envolvem os contratos públicos de interesse da Defesa Nacional.

II Considerações sobre inovação tecnológica no Brasil De acordo com o Manual de Oslo,11 inovação é a implementação de um produto novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou ainda um novo método de marketing ou organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas; sendo atividades de inovação as etapas científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais que conduzem, ou visam conduzir, ao incremento de tais produtos. Nesse conjunto de atividades inserem-se as de P&D, embora nem sempre estejam diretamente relacionadas ao desenvolvimento de uma inovação específica.12

Sobre os obstáculos à efetivação das políticas setoriais de defesa mediante restrições orçamentárias, ver: HARTLEY, Keith. The economics of defence policy: A new perspective. London; New York: Routledge, 2011. p. 48-62; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Desenvolvimento econômico e segurança nacional: Teoria do limite crítico. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1971. p. 25-104; AGUIAR, Joaquim. A política de Defesa Nacional: como política pública interdepartamental. Lisboa: Instituto Nacional de Administração, Instituto de Defesa Nacional, 1989. p. 14-48; VIANA, Vitor Rodrigues. Reflexões sobre a Defesa Nacional. In: RODRIGUES, Maria de Lurdes; SILVA, Pedro Adão e (Orgs.). Políticas públicas para a reforma do Estado. Coimbra: Almedina, 2013. p. 345-353. Sobre a alocação de recursos para a concretização de políticas públicas e reserva do possível, recomenda-se: BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no Estado Constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela Administração Pública contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 231-250; OLIVEIRA, Rafael Arruda. O constrangimento orçamental e a vontade da Constituição a realização de políticas públicas na área da saúde. Revista dos Tribunais, v. 908, p. 23 e ss., jun. 2011. Cf. CUNHA, Armando; REZENDE, Fernando. Orçamento e desenvolvimento. In: CAVALCANTI, Bianor Scelza; RUEDIGER, Marco Aurélio; SOBREIRA, Rogério (Orgs.). Desenvolvimento e construção nacional: políticas públicas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005. p. 67. “A redução de incertezas e instabilidades no orçamento federal, as quais levam à adoção do contingenciamento dos créditos orçamentários fixados em lei, requer previsões de caráter plurianual mais seguras. Para isso, é necessário que a definição de prioridades orçamentárias a cada ano seja orientada por uma ótica mais estratégica, derivada das projeções plurianuais das políticas públicas e, portanto, menos sujeita à consideração de questões fortuitas, que tomam muito tempo e desfocam o debate. [...] Para tanto, é também importante que o quadro de referência para as decisões orçamentárias anuais se estabeleça com base em um amplo processo participativo envolvendo a sociedade e os agentes públicos. Nesse processo, a explicitação dos propósitos das políticas públicas, de suas dificuldades e limitações, deverá servir de clara sinalização para a implementação das ações, inibindo desvios quanto aos resultados a serem alcançados”. 11 ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO – OCDE. Manual de Oslo – Diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. 3. ed. 2005. 12 ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO – OCDE. Manual de Oslo – Diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. 3. ed. 2005. p. 55-57. A inovação de que se fala neste estudo é a inovação tecnológica voltada para o setor específico dos produtos de defesa, incluídas aquelas de emprego dual. Além disso, a inovação pode ser incremental (aperfeiçoamento de produtos, processos ou serviços) ou disruptiva (novo produto ou processo). 10

36

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

A construção dogmática do conceito de desenvolvimento econômico,13 explicado à luz do pensamento schumpeteriano, é legitimada pela proeminência de sua vertente tecnológica que aponta para o conteúdo material do termo,14 analisado sistematicamente os comandos insertos nos arts. 218 e 219 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5.10.1988 (CF/88). A despeito de ser utópica a absoluta independência tecnológica de qualquer país, uma das funções do Estado brasileiro é perseguir e incentivar o “desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação” (art. 218 da CF/88), aduzindo-se que tal lógica visa ao atendimento das necessidades do mercado interno, enquanto elemento integrante do “patrimônio nacional” e que “será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País” (art. 219 da CF/88). Para tal desiderato, aponta-se para a existência de políticas de financiamentos, incentivos legais e tributários para fomentar a pesquisa científica e tecnológica, o desenvolvimento e a inovação, além de garantias constitucionais para conferir RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento – antecedentes, significados e consequências. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 407-408. “Seria uma mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre tal estado previamente existente. Tais mudanças e perturbações apareceriam na esfera da vida industrial e comercial, e não na das necessidades dos consumidores de produtos finais. Assim, considerando-se que produzir significa combinar materiais e forças que se encontram no nosso alcance, se essas novas combinações se originam das antigas, com o tempo, por ajuste contínuo mediante pequenas etapas, haveria certamente mudança para Schumpeter, possivelmente crescimento, mas não desenvolvimento como fenômeno novo, conforme o sentido conferido pelo autor. Na medida em que se tratasse deste último caso e em que as mudanças aparecessem descontinuamente, então surgiria o fenômeno caracterizado como desenvolvimento. [...]”. 14 RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento – antecedentes, significados e consequências. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 410-420. “Assim, é de evidenciar que a tecnologia, para Schumpeter, compõe o próprio conceito de desenvolvimento, não se tratando, dessa forma, de um aspecto ou de um elemento do desenvolvimento, mas sim do próprio conceito. [...] A situação de autonomia ou dependência de cada sociedade diante do desafio tecnológico é que determina o seu papel, de sujeito ou objeto, no mercado internacional. Assim, a ciência e a tecnologia muito tem a contribuir para os países em desenvolvimento, até mesmo para se reduzirem as desigualdades sociais e entre países. [...] Noticie-se, neste sentido, a revogação do artigo 171 da CF promovida pela EC 6/95, cujo caput definia estipulativamente empresa brasileira e empresa brasileira de capital nacional, sendo de ressaltar ainda que o §1º do artigo 171 afirmava que a lei poderia, em relação à empresa brasileira de capital nacional, conceder proteção e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento tecnológico nacional, condições e requisitos que estreitavam a sua definição. [...] Diante do texto expresso da norma constitucional, depreende-se que o Estado tem o dever de promover o desenvolvimento científico e tecnológico do País, não podendo, desta feita, pura e simplesmente, desincumbir-se de tal tarefa, ainda que a evolução tecnológica seja empreendida pelas empresas e indivíduos, cabendo também a ele o papel de viabilizar tal processo, utilizando, por exemplo, normas de caráter indutivo que estimulem tal desenvolvimento, bem como mecanismos contemplados nos §§3º a 5º, que atenuam como instrumentos para atingir tal desideratum. [...] Os fundamentos e objetivos da ordem econômica, quais sejam a valorização do trabalho humano, a livre iniciativa e a busca da justiça social, seriam todos eles limites absolutos a qualquer política industrial. Em que pesem tais considerações, que reputamos acertadas, entendemos que teria sido melhor que a Constituição, que foi tão minudente em tantos aspectos, tivesse sido mais específica em relação à política industrial que, por analogia, dessa forma, deverá voltar-se preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros. [...] Ocorre que, a nosso ver, o maior entrave para que isso ocorra consiste no fato de que, a para da crônica inoperância estatal de fomentar diretamente a inovação na empresa (o que faz com que a indústria nacional recorra às inovações já desenvolvidas no exterior, por ser mais interessante), as empresas se encontram descapitalizadas, em fase da excessiva carga tributária (em franca ascendência desde a implantação do Plano Real)”. 13

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

37

André Luís Vieira

exclusividades e privilégios aos autores de criações industriais e intelectuais (art. 5º, incs. XXVII, XXVIII e XXIX da CF/88). Regulamentando os dispositivos constitucionais, o ordenamento jurídico brasileiro disciplinou separadamente as diversas formas de proteção das criações intelectuais15 e das invenções industriais.16 Neste contexto, embora não seja a primeira nem a única norma sobre inovação no Brasil, pois alguns setores específicos se organizaram anteriormente para fomentar a inovação (agropecuária e informática, por exemplo), a Lei nº 10.973, de 2004,17 regulamentada pelo Decreto nº 5.563, de 2005, pela primeira vez disciplinou de forma ampla e genérica os incentivos à inovação e à pesquisa científica no ambiente produtivo, estabelecendo medidas que almejam a capacitação e autonomia tecnológica, além do desenvolvimento industrial do país, pondo tal conteúdo em conformidade com a ordem constitucional.18 A finalidade legal, portanto, é estimular a construção de ambientes especializados e cooperativos para a inovação, mediante alianças, contratos,19 convênios e projetos de parceria entre empresas nacionais, instituições científicas e tecnológicas (ICT),

A Lei do Software, Lei nº 9.609, de 1998, dispõe sobre a proteção de propriedade intelectual de programa de computador, conferindo a mesma proteção prevista na legislação de direitos autorais, a Lei nº 9.610, de 1998. Além disso, existem outras leis específicas para regular, por exemplo, a proteção da propriedade intelectual sobre a topografia dos circuitos integrados, pela Lei nº 11.484, de 2007, a proteção dos cultivares, pela Lei nº 9.456, de 1995, dentre outras criações e formas de proteção realizada pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). 16 Lei de Patentes, Lei nº 9.279, de 1996, regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. “Art. 2º A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante: I - concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade; II - concessão de registro de desenho industrial; III - concessão de registro de marca; IV - repressão às falsas indicações geográficas; e V - repressão à concorrência desleal”. 17 Inspirada na matriz jurídico-política da legislação francesa de inovação, de 1999, a primeira proposta legislativa foi apresentada em 2000, sendo esta arquivada. Um novo projeto foi reapresentado em 2003, fruto da mobilização de diversos setores da comunidade científica brasileira, gerando a Lei de Inovação em vigor. Atualmente, existem esforços concentrados no sentido de se conferir mais efetividade à Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, particularmente exemplificados pelo Projeto de lei nº 2.177, de 2011, e pelo Projeto de lei nº 8.252, de 2014. O primeiro busca estabelecer novas normas, princípios, diretrizes e prioridades para a política nacional em vigor; enquanto, no segundo, pretende-se flexibilizar as hipóteses de contratação pública com o intuito de fomentar a pesquisa e a inovação. 18 COELHO, José Ricardo Roriz. Os limites do crescimento brasileiro. Revista Interesse Nacional, n. 18, p. 29, jul./set. 2012. “Se o Brasil pretende deixar de ser um país de renda mediana, com baixo nível de escolaridade e com um sistema de saúde público distante do ideal, tornando-se uma nação desenvolvida econômica e socialmente nos próximos 15 ou 20 anos, é necessário um projeto nacional ambicioso, que tenha a indústria e os setores portadores de tecnologia como principais vetores de expansão. A manufatura moderna e os serviços informacionais são os setores com maior potencial de gerar desenvolvimento tecnológico e, também, os responsáveis pelos melhores empregos, tanto em termos de salário, quanto em qualidade para o trabalhador. A entrada de milhões de pessoas no mercado de trabalho nos próximos anos exigirá que essas atividades se multipliquem em uma proporção relevante, para que a expansão do PIB brasileiro seja potencializada e se transforme em desenvolvimento”. 19 O Poder Público pode contratar diretamente com dispensa de licitação, nos termos do inc. XIII do art. 24 da Lei Federal de Licitações e Contratos, Lei nº 8.666, de 1994: “Art. 24. É dispensável a licitação: [...] XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos; [...]”. 15

38

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

instituições federais de ensino superior (IFES) e instituições de apoio,20 incluindo redes e projetos internacionais de pesquisa, ações de empreendedorismo, incubadoras e parques tecnológicos, tudo conforme a dicção do art. 2º, incs. V, VI e VII da supracitada Lei de Inovação. Com igualdade de oportunidades às empresas e organizações interessadas, a Lei de Inovação autoriza, mediante remuneração e por prazo determinado, o compartilhamento ou utilização de laboratórios, materiais e instalações das ICTs para incubação de microempresas e empresas de pequeno porte voltadas à inovação tecnológica ou utilização por empresas nacionais e organizações de direito privado, sem fins lucrativos, voltadas para atividades de pesquisa. A legislação ainda permite a participação minoritária da União, por intermédio de suas entidades autorizadas, no capital de empresa privada de propósito específico voltado ao desenvolvimento de projetos científicos e tecnológicos formulados para obtenção de processos ou produtos inovadores, bem como prevê o pagamento de bolsas de estímulo, adicionais e participação nos ganhos econômicos a servidores civis e militares dedicados à pesquisa, além de autorizar o licenciamento temporário de tecnologias para fins de constituição de empresas voltadas à inovação21 (arts. 4º e 5º da Lei de Inovação). As ICTs, a seu turno, podem transferir tecnologias ou licenciar o direito de uso ou de exploração, com exclusividade (mediante publicação de edital que confira amplitude de participação) ou não, devendo ser observado o sigilo quando o objeto envolver interesse da Defesa Nacional.22 No entanto, não poderá ser estabelecida a exclusividade na transferência de tecnologia ou no licenciamento se for reconhecido o relevante interesse público da criação (art. 6º da Lei de Inovação). Assim, com a finalidade de atender às prioridades da política industrial e tecnológica nacional e para o desenvolvimento de produtos e processos inovadores, o art. 19 da Lei de Inovação prevê que as empresas nacionais e as entidades nacionais de Recentemente, o Decreto nº 8.240, de 2014, regulamenta os convênios e os critérios de habilitação de empresas referidos no art. 1-B da Lei nº 8.958, de 1994, com as quais as fundações de apoio podem firmar convênios de educação, ciência, tecnologia e inovação – ECTI, tendo como partícipes instituição federal de ensino superior (IFES) ou demais instituições científicas e tecnológicas (ICTs), fundações de apoio, e empresas públicas ou sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas, visando às finalidades de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, estímulo e fomento à inovação, e apoio a projetos de ensino, pesquisa, extensão e desenvolvimento institucional, com transferência de recursos financeiros e não financeiros, em parceria com entidades privadas, com ou sem fins lucrativos, envolvendo a execução de projetos de interesse recíproco, podendo contar ainda com a participação de organizações sociais, que tenham contrato de gestão firmado com a União, na forma da Lei nº 8.958, de 1994. 21 Conforme a dicção do art. 3º-A, da Lei nº 10.973, de 2004, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), por intermédio da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e as agências oficiais de fomento podem celebrar contratos e convênios, por prazo determinado, com as fundações de apoio a projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos por IFES e ICT. 22 Nos termos da Lei nº 9.279, de 1996: “Art. 75. O pedido de patente originário do Brasil cujo objeto interesse à defesa nacional será processado em caráter sigiloso e não estará sujeito às publicações previstas nesta Lei” (grifos nossos). 20

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

39

André Luís Vieira

direito privado, sem fins lucrativos e vocacionadas para atividades de pesquisa e desenvolvimento podem receber, também com amparo na legislação de regência, recursos financeiros, humanos, materiais ou de infraestrutura da União, das ICTs e das agências de fomento. Os recursos financeiros podem ser concedidos como subvenção econômica (com assunção de contrapartida financeira e não financeira), financiamento direto ou participação societária. Além disso, em conjunto com a legislação prévia, a Lei de Inovação, em seu art. 20, também cuidou dos aspectos relativos à propriedade intelectual, que conferem incentivos e prerrogativas aos partícipes do processo de inovação, sem restringir a circulação dos resultados benéficos para a sociedade, designadamente quando previu que empresas, consórcio de empresas ou entidades nacionais de direito privado, sem fins lucrativos, voltadas para atividades de pesquisa, de reconhecida capacitação tecnológica, podem ser contratadas por órgãos e entidades da Administração Pública para a realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento, em matéria de interesse público, que envolvam risco tecnológico, para solução de problema específico ou obtenção de produto ou processo inovador.23 É inegável, portanto, que a legislação em comento criou relevantes mecanismos de incentivo à inovação, tributando papel relevante ao setor industrial em sinergia com o Poder Público e instituições de ensino e científico-tecnológicas, em que o modelo da triple helix24 é expressão conceitualmente mais estruturada. Entretanto, após completar sua primeira década de vigência, a eficácia da política de inovação ainda requer melhor regulamentação para algumas questões e antídoto contra a burocracia exacerbada e oscilações econômicas e políticas que podem afetar a continuidade do processo inovador, além da indispensável e urgente capacitação de recursos humanos, formação de massa crítica, retenção de talentos e densificação da cultura de inovação.25

REGINA, Sérgio de; SERAFIM, Alexandre Domingues; GAVIÃO, Lucas Garcia de Moura. Breves considerações a respeito dos mecanismos previstos nas Leis nº 10.973/2004 e nº 12.349/2010 para incentivo da inovação tecnológica. In: REGINA, Sérgio de (Coord.). Parcerias público-privadas de medicamentos (PDPS). Belo Horizonte: Fórum, 2012. 24 Na economia do conhecimento, a inovação resulta de um processo contínuo de experiências que congregam ciência, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento com a participação das universidades, da indústria e do governo. Cf. ETZKOWITZ, Henry. The Triple Helix: University-Industry-Government Innovation in Action. London; New York: Routledge, 2010. p. 8 e ss. 25 ARBIX, Glauco. Como transformar a inovação em grande oportunidade. In: VELLOSO, João Paulo dos Reis (Org.). Rumo ao Brasil desenvolvido. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 260. “A situação é que cada vez mais as pesquisas mostram como o investimento em inovação é capaz de impulsionar, estimular e fazer aumentar o investimento agregado na economia, em expansão, em modernização, em gestão, em exportação, em todos os níveis, e não o contrário. [...] As empresas brasileiras, em que se pesem enormes mudanças, ainda inovam pouco, e cabe ao Poder Público oferecer melhores condições para diminuirmos a desvantagem que temos em vários níveis, desde infraestrutura, desde a situação dos nossos instrumentos de estímulo e apoio à própria inovação, desde o aperfeiçoamento de instrumentos que nós criamos no passado como a subvenção econômica, que passamos a trabalhar com ela a partir da Lei de Inovação de 2004, mas que ainda estamos engatinhando para conseguir definir modelos mais adequados”. 23

40

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

III Considerações sobre inovação aplicada ao setor de defesa A demanda por produtos (bens ou serviços) e sistemas de defesa cada vez mais avançados é premente e requer o incremento de políticas de inovação tecnológica geradoras de evoluções nos setores industriais. Isso explica porque, em termos globais, o setor de defesa ainda detém grandes orçamentos para pesquisa, desenvolvimento e inovação.26 Sucede, porém, que as atuais tecnologias militares contemplam uma gama de materiais, produtos e sistemas que conferem eficiência e precisão, capazes de minimizar danos colaterais e conferir vantagens operacionais em relação às potenciais ameaças à paz e à segurança pública. A extensão da tecnologia de defesa de emprego dual projeta-se em diversos campos do conhecimento, operando acirrada “disputa tecnológica”27 que, apenas para citar algumas inovações, induzem evoluções na robótica, na engenharia satelital e de telecomunicações, na nanotecnologia e biotecnologia, na concepção e aprimoramento de veículos não tripulados, em sistemas de comando e controle e de defesa cibernética.28

SCHMIDT, Flávia de Holanda. Ciência, tecnologia e inovação em defesa: notas sobre o caso do Brasil, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Radar: tecnologia, produção e comércio exterior, Brasília, n. 1, p. 37-50, abr. 2009. Aduz a autora na página 38: “No final do século XX, contudo, o fim da Guerra Fria impôs uma nova realidade ao setor de defesa, com a queda global dos orçamentos dedicados à indústria. Neste sentido, o conceito de self-reliance evoluiu de uma perspectiva que focava a utilização de fontes domésticas para o fornecimento de equipamentos e bens de defesa para uma visão segundo a qual a self-reliance poderia ser atingida pela existência de firmas e centros de pesquisa nacionais com capacidades tecnológicas competitivas na área de defesa. Configurou-se, deste modo, um panorama em que a ênfase mudou de um alto volume de produção de novos sistemas de defesa para a manutenção da superioridade tecnológica por meio de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), essencial para a atualização, o suporte logístico e o controle das armas e da inteligência dos sistemas nelas embarcados. Alguns autores, como Koubi (1999), identificam este movimento como uma ‘disputa qualitativa’ por armas, pois, diante da escolha entre dedicar recursos à produção de armas existentes – o que seria a ‘disputa quantitativa’, segundo o autor – ou direcioná-los à P&D, passou-se então a priorizar a segunda opção”. 27 SCHMIDT, Flávia de Holanda. Ciência, tecnologia e inovação em defesa: notas sobre o caso do Brasil, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Radar: tecnologia, produção e comércio exterior, Brasília, n. 1, p. 37-50, abr. 2009. Na página 40: “Outra característica que pode reforçar esse novo movimento de disputa tecnológica entre países na área de defesa é o fato de que – diferentemente do que ocorre em setores exclusivamente civis, onde um resultado do tipo the winner takes it all (o vencedor leva tudo) em uma disputa setorial pode induzir o competidor em desvantagem a migrar os recursos para outro projeto de P&D –, na área militar, pode haver importantes benefícios para o país perdedor ao fazer o catching up com o líder (Koubi, 1999). No modelo proposto pelo autor, o país em desvantagem nunca cede a posição e abandona a disputa, pelo menos enquanto algum benefício puder ser derivado de um eventual sucesso na obtenção de tecnologias relevantes, independentemente da ordem de chegada entre os países ao final da disputa. A premissa para este arcabouço proposto é justificada por Koubi (1999) pelo fato de que, na atualidade, inovações significativas na tecnologia de armas são potencialmente capazes de induzir modificações radicais na distribuição do poder. Há, assim, um panorama em que a relevância militar dos países se torna cada vez mais uma disputa pela liderança tecnológica na produção de armas e sistemas de armas, em detrimento de uma situação anterior, em que a capacidade industrial de fabricação de uma grande quantidade de armas era sinal de hegemonia. Por um lado, esta complexidade crescente dos produtos de defesa tende a inviabilizar o êxito de estratégias de imitação que, no passado, foram usadas com sucesso por alguns países; concomitantemente, torna economicamente ineficiente para cada país desenvolver todo o espectro de infraestrutura tecnológica necessária ao desenvolvimento inteiramente endógeno de seus produtos de defesa. Por outro lado, é cada vez mais intenso o uso de tecnologias consideradas civis para o desenvolvimento de aplicações militares”. 28 MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro Azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010. p. 41-54. 26

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

41

André Luís Vieira

Isso posto, permanecer alheio a essa realidade de constante mudança tecnológica é pôr em causar qualquer intenção de exercer um protagonismo político-institucional crescente no cenário internacional, o que notadamente é o caso do Brasil por abrigar grandes reservas de recursos naturais estratégicos capazes de atrair a cobiça externa, além de figurar entre as maiores economias do planeta. De acordo com a doutrina da Escola Superior de Guerra,29 o Poder Nacional tem diversas formas de expressão, sendo pertinente destacar que a relevância do papel da inovação perpassa as expressões científica e tecnológica, militar e econômica. Não obstante, a compreensão da importância da inovação para o desenvolvimento nacional e a forte vocação dual do setor de defesa para o seu fomento, noticiada em distintas políticas públicas de setores convergentes ou interdependentes, impõe ao país desafios e apresenta oportunidades para serem trabalhadas em prol de sua autonomia tecnológica em tantos outros setores industriais.30 Os produtos de defesa possuem alto valor agregado e exigem grandes investimentos em P&D. Não obstante, algumas tecnologias de defesa ou de uso dual devem ser escolhidas, desenvolvidas e dominadas, ainda que seja lenta sua maturação e com predominância de investimentos governamentais, visando à almejada autonomia tecnológica.31 ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA. Manual básico. Rio de Janeiro, 2013. p. 47, 83 e 90. v. 2. “A sociedade deve ter atitude de aceitação a mudanças para que os processos de produção se inovem, os produtos se aperfeiçoem e a produtividade aumente. A compra de tecnologia pode ser uma primeira fase do fenômeno, concretizada no aprendizado da operação dos equipamentos, de sua manutenção e até em cópia do original. Todavia, a grande mudança só se inicia quando o Sistema Econômico é capaz de fazer alterações e adaptações nos novos dispositivos, e só adquire ritmo próprio quando o projeta e desenvolve produtos, equipamentos e sistemas tecnológicos avançados. [...] O fator científico-tecnológico, quando presente no nível desejado, valoriza os recursos humanos, propiciando-lhes acesso a melhores salários e atua nas empresas, aumentando-lhes a produtividade e os lucros. [...] O significativo progresso tecnológico e de inovação permitiu que as Forças Armadas dispusessem de novos equipamentos, de organização e de métodos avançados que permitem maior capacidade e eficiência de emprego, e exigem alta qualidade dos recursos humanos responsáveis. [...] Inovação tecnológica significa a solução inédita para um problema ou mesmo um avanço tecnológico, colocada à disposição da sociedade e aceita pelo mercado, resultando em ganho de qualidade e produtividade. A inovação, melhorando a qualidade de bens e serviços, ou diminuindo custos de produção, ou introduzindo novos produtos no mercado, incrementa a competitividade, podendo ser um fator relevante no crescimento econômico e desenvolvimento de um país”. 30 BEZERRA, Carolina Marchiori. Inovações tecnológicas e a complexidade do sistema econômico. São Paulo: Editora UNESP, 2010. “Além disso, parte-se do pressuposto de que a inovação, para a perspectiva evolucionária, caracteriza-se por envolver variedade, complexidade institucional, incerteza e diversidade de opinião dos indivíduos e organizações, que tenderão a formar opiniões diferentes com relação às políticas de P&D. ambientes que exibem inovação apresentam-se, portanto, em um contínuo estado de desequilíbrio, pois o processo de busca realizado pela firma a fim de introduzir inovações de processo e produto pode gerar diferentes reações no mercado. [...]”. 31 AMARANTE, José Carlos Albano do. Indústria Brasileira de Defesa: uma questão de soberania e de autodeterminação. In: PINTO, J. R. de Almeida; ROCHA, A. J. Ramalho; SILVA, R. D. Pinho da (Orgs.). As Forças Armadas e o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Brasília: Ministério da Defesa, Secretaria de Estudos e de Cooperação, 2004. p. 31. “A perseguição do primeiro objetivo poderia dar-se mediante as seguintes ações: aumentar, gradual e constantemente, os recursos humanos e financeiros dedicados à P&D e adquirir material de emprego militar no mercado; estudá-lo nos órgãos de C&T das Forças Armadas; desenvolver novos equipamentos, nos centros tecnológicos militares, para produtos complexos, e, nos órgãos de fabricação, para produtos simples. Paralelamente, modernizar materiais de defesa para aumentar a sua vida útil, incentivando o intercâmbio de empresas nacionais e estrangeiras. É por demais notório que as tecnologias críticas militares possuem elevada capacidade de aplicação em produtos e serviços civis, já que muitas são de uso dual. Essa característica oferece à Nação uma oportunidade única de orientar os esforços de toda a comunidade científico-tecnológica nacional – civil e militar – [...] que é justamente o fortalecimento da base nacional científico-tecnológica e da base nacional industrial. Ambos são tijolos essenciais para a construção de uma sociedade moderna”. 29

42

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

Essas são as típicas tecnologias inovadoras de arrasto, capazes de gerar inovação tecnológica hábil a impulsionar uma base industrial moderna e atualizada.32 A política diretiva para o setor de defesa brasileiro foi pensada para promover sua emancipação tecnológica e para abreviar a dependência de fornecedores externos, os quais não costumam transferir tecnologias sensíveis por evidentes razões estratégicas e econômicas, fruto da lógica utilizada pelos países desenvolvidos em desestimular outros países a adotarem políticas industriais e tecnológicas por eles adotadas, quando em estágio anterior de desenvolvimento.33 Isso explica, em parte, porque a inovação e a proteção dos direitos de propriedade intelectual são relevantes para o setor de defesa, tendo em vista que o acesso, o controle e o domínio de novas tecnologias são formas de expressão da superioridade bélica e respeitabilidade política no cenário internacional, assim como contribuem com a manifestação da soberania econômica decorrente do desenvolvimento científico e tecnológico.34 É nessa perspectiva que à Política de Defesa Nacional (PDN), aprovada pelo Decreto nº 5.484,35 de 2005, coube a finalidade de estabelecer diretrizes, objetivos e orientações estratégicas para a capacitação nacional, com o envolvimento dos setores militar e civil, estabelecendo-se o viés prioritário da inovação para o setor. No mesmo contexto histórico-institucional, a END, aprovada pelo Decreto nº 6.703, de 2008, pretende reorganizar as Forças Armadas e indústria de defesa de forma sistemática, com a finalidade de assegurar a autonomia para as três forças –

MAZZUCATO, Mariana. O Estado empreendedor. São Paulo: Portfólio Penguin, 2014. “[...] o Estado, através de suas inúmeras agências e laboratórios, tem potencial para disseminar novas ideias rapidamente. Também pode ser hábil, usando suas funções reguladoras e sua capacidade de comissionamento e aquisição para formar os mercados e impulsionar o desenvolvimento tecnológico. [...]”. 33 CHANG, Ha-Joon. Chutando a escada: a estratégia do desenvolvimento em perspectiva histórica. São Paulo: Editora UNESP, 2004. p. 51-68. 34 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 35. “Tudo isso autoriza a conclusão de que afirmar a soberania econômica nacional como instrumento para a realização do fim de assegurar a todos existência digna e como objetivo particular a ser alcançado é definir políticas públicas voltadas à viabilização da participação da sociedade nacional, em condições de igualdade, no mercado internacional. Ao contrário do que se tem sustentado, pois, essa afirmação conduz não ao isolamento econômico, porém precisamente àquela viabilização. Essa participação depende da possibilidade local de geração de tecnologia. Daí a razão de discriminações do tipo acima referido serem praticadas mesmo pelos Estados desenvolvidos, em defesa da economia nacional, em nome do princípio da sua soberania”. 35 “O fortalecimento da capacitação do País no campo da defesa é essencial e deve ser obtido com o envolvimento permanente dos setores governamental, industrial e acadêmico, voltados à produção científica e tecnológica e para a inovação. O desenvolvimento da indústria de defesa, incluindo o domínio de tecnologias de uso dual, é fundamental para alcançar o abastecimento seguro e previsível de materiais e serviços de defesa. [...] As políticas e ações definidas pelos diversos setores do Estado brasileiro deverão contribuir para a consecução dos objetivos da Defesa Nacional. Para alcançá-los, devem-se observar as seguintes diretrizes estratégicas: [...] XVII - estimular a pesquisa científica, o desenvolvimento tecnológico e a capacidade de produção de materiais e serviços de interesse para a defesa; XVIII - intensificar o intercâmbio das Forças Armadas entre si e com as universidades, instituições de pesquisa e indústrias, nas áreas de interesse de defesa; XXI - contribuir ativamente para o fortalecimento, a expansão e a consolidação da integração regional com ênfase no desenvolvimento de base industrial de defesa; XXIV - criar novas parcerias com países que possam contribuir para o desenvolvimento de tecnologias de interesse da defesa; [...]”. 32

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

43

André Luís Vieira

Marinha, Exército e Força Aérea. Tal política enfatiza também que sua formulação está umbilicalmente inseparável da estratégia nacional de desenvolvimento, a qual deve guiar-se na direção da capacitação tecnológica autônoma, pois “não é independente quem não tem o domínio das tecnologias sensíveis, tanto para a defesa como para o desenvolvimento”. Apontando como estratégicos e prioritários os setores cibernético, espacial e nuclear, a END tem como um de seus eixos estruturantes a “reorganização da indústria nacional de material de defesa, para assegurar que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas apoie-se em tecnologias sob domínio nacional” e uma de suas diretrizes é “capacitar a indústria nacional de material de defesa para que conquiste autonomia em tecnologias indispensáveis à defesa”, mediante a criação de regimes jurídico, regulatório e tributário próprios, além da preservação do orçamento destinado à continuidade das compras públicas.36 Ao setor estatal de material de defesa foi atribuída a missão de “operar no teto tecnológico, desenvolvendo as tecnologias que as empresas privadas não possam alcançar ou obter, a curto ou médio prazo, de maneira rentável”.37 Além disso, a política em questão igualmente reconhece que o futuro das capacitações tecnológicas nacionais depende tanto da formação de recursos humanos quanto do desenvolvimento do aparato industrial.38 A propósito da Política de Ciência, Tecnologia e Inovação para a Defesa Nacional, a END realça o objetivo de estimular o desenvolvimento tecnocientífico e a inovação de interesse para a defesa, de alto conteúdo tecnológico agregado, com envolvimento de ICT civis e militares, indústria e universidade, para fomentar a vanguarda da pesquisa de materiais, equipamentos e sistemas de emprego dual.39 Para maior reflexão sobre a factibilidade da indústria de defesa brasileira, recomenda-se: DAGNINO, Renato. A indústria de defesa no Governo Lula. São Paulo: Expressão Popular, 2010. p. 119-136 e 151-232. DAGNINO, Renato Peixoto; CAMPOS FILHO, Luiz Alberto Nascimento. Análise sobre a viabilidade de revitalização da Indústria de Defesa brasileira. Brazilian Business Review (BBR), v. 4, n. 3, p. 191-207, set./dez. 2007. 37 O Estado, por intermédio de empresas públicas fabricantes de produtos de defesa, ou por intermédio de entidades contratantes, deve estimular o setor, realizando os investimentos (via subvenção, financiamento direto ou contrato) de maior risco. MAZZUCATO, Mariana. O Estado empreendedor. São Paulo: Portfólio Penguin, 2014. “[...] abordagem proativa do estado para moldar um mercado a fim de impulsionar a inovação. O que se descobre é que, além de ser uma sociedade empreendedora, um lugar onde é culturalmente natural criar e expandir um negócio, os Estados Unidos são também um lugar onde o Estado desempenha um papel empreendedor, fazendo investimentos em áreas radicalmente novas. O Estado forneceu o financiamento em estágios iniciais onde o capital de risco fugiu, ao mesmo tempo em que comissionava no setor privado uma atividade altamente inovadora que não teria acontecido sem políticas públicas com visão e estratégias definidas”. 38 Do texto da exposição de motivos da END, salienta-se: “No esforço de reorganizar a indústria nacional de material de defesa, buscar-se-á parcerias com outros países, com o objetivo de desenvolver a capacitação tecnológica nacional, de modo a reduzir progressivamente a compra de serviços e de produtos acabados no exterior. A esses interlocutores estrangeiros, o Brasil deixará sempre claro que pretende ser parceiro, não cliente ou comprador. O País está mais interessado em parcerias que fortaleçam suas capacitações independentes do que na compra de produtos e serviços acabados. Tais parcerias devem contemplar, em princípio, que parte substancial da pesquisa e da fabricação seja desenvolvida no Brasil e ganharão relevo maior quando forem expressão de associações estratégicas abrangentes”. 39 MINISTÉRIO DA DEFESA. Livro Branco da Defesa Nacional, 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 maio 2015. 36

44

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

IV A contratação pública como mecanismo de fomento à inovação na base industrial de defesa O mercado de defesa é fortemente regulado (inclusive por tratados internacionais), pressupõe longo prazo de maturação do processo de desenvolvimento, exige alta capacitação tecnológica e recursos humanos especializados, além de ser extremamente dependente do orçamento e compras governamentais, tanto quanto das exportações.40 Com efeito, o designado mercado de produtos de defesa está umbilicalmente ligado à possibilidade de realização de negócios públicos, enfatizando-se que os contratos públicos de interesse da Defesa Nacional são o principal instrumento de promoção da indústria de defesa e do reaparelhamento das Forças Armadas. Portanto, as variáveis que compõem a equação posta são caracterizadas por aspectos econômicos, políticos, tecnológicos e jurídicos.41 No ponto, a principal característica econômica do setor de defesa, de natureza concorrencial, é seu arranjo político-estrutural como monopsônio, no qual o comprador é, em regra, exclusivamente o próprio Estado, personificado por suas Forças Armadas, ou instituições de segurança pública, quando aplicáveis ao caso. Tal característica é reforçada pelo alto custo dos equipamentos e serviços, acrescidos pelos indispensáveis custos de operação e manutenção do ciclo de vida útil do material. Noutro giro, a característica política de tais contratos é evidenciada pela projeção de poder da nação produtora dos sistemas de defesa no cenário internacional. Trata-se de forte inferência na percepção abstrata de soberania, quando determinado Estado nacional dispõe de significativa base industrial de defesa (BID), afastando ou mitigando a dependência de governos e fornecedores estrangeiros.42 Já a característica técnica está calcada, basicamente, em equipamento de natureza tecnológica e de alto valor agregado, além de relativa redução na escalabilidade da produção. Neste tópico, outra particular característica que se conjuga com

BRANDÃO, Maurício Pazini. Ciência, tecnologia, inovação e a defesa nacional. Parcerias estratégicas, Brasília, n. 20, pt. 2, p. 838-850, jun. 2005. “Os sistemas de armas empregados em ações de defesa são normalmente produtos de alto valor agregado, de longo prazo de desenvolvimento, de baixa escala de produção e que demandam intensivo uso de tecnologias inovadoras. Além disso, eles requerem tratamento diferenciado quanto à sigilo e exportação, sendo, justamente por estas razões, regulados por tratados internacionais. Assim, eles só podem ser concebidos, desenvolvidos e produzidos por países tecnologicamente avançados, com poder de embargo sobre potenciais interessados nestes produtos. [...] Todas as tecnologias têm características duais, ou seja, de emprego civil e militar. No caso brasileiro, sistemas de armas têm baixa escala produtiva e baixo impacto social imediato na criação de empregos na indústria, devido ao baixo emprego desses sistemas em operações militares. Porém, as capacidades científicas, tecnológicas e inovadoras nacionais podem ser estimuladas e manter-se aquecidas pelo exercício do papel civil que está associado a estas ecologias. Além disso, não podemos ignorar o impacto social que podem ter exportações de sistemas de armas projetados e produzidos no Brasil”. 41 TRYBUS, Martin. European Defence Procurement Law. London: Kluwer Law International, 1999. p. 24-26. 42 DOMBROWSKI, Peter; GHOLZ, Eugene. Buying Military Transformation: Technological Innovation and the Defense Industry. New York: Columbia University Press, 2006. p. 1-15. 40

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

45

André Luís Vieira

a primeira é a diferenciação entre os sistemas off-the-shelf43 e aqueles frutos de contratação específicas para P&D de sistemas e materiais encomendados mediante requisitos técnicos e operacionais, previamente estabelecidos. Em decorrência destas características, exsurge um fenômeno recorrente – e preocupante – na indústria de defesa nacional, um arranjo mercadológico similar ao “efeito captura”,44 no qual as empresas nacionais relevantes ou com potencial valor estratégico no desenvolvimento de tecnologias são controladas por grupos estrangeiros, mediante compra, investimentos diretos ou participações societárias, traduzindo, muitas vezes, a não transferência de tecnologias estrangeiras e a absorção inversa de pesquisas desenvolvidas por cientistas brasileiros. A despeito da vedação contida na Lei nº 12.598,45 de 2012, que estabelece um verdadeiro microssistema de Em tradução aproximada, o termo traz ínsito o sentido de “produto de prateleira com disponibilidade imediata”, embora numa perspectiva de encomenda com requisitos técnicos e operacionais predeterminados. Disponível em: . Acesso em: 22 maio 2015. 44 COELHO, José Ricardo Roriz. Os limites do crescimento brasileiro. Revista Interesse Nacional, n. 18, p. 30, jul./set. 2012. “Dessa forma, as agendas do governo e do setor industrial devem ser condizentes e orientadas para o incremento da competitividade nos setores estratégicos. Se não houver uma articulação em prol do desenvolvimento, serão esses os setores que se perderão na estrutura produtiva nacional, sendo absorvidos pelos concorrentes internacionais. [...]”. Cf. SANTAYANA, Mauro. O cerco à indústria brasileira de defesa. Na contramão da tendência mundial, o Brasil desnacionaliza sua indústria bélica. Jornal do Brasil, 16 ago. 2012. “ESTRATÉGIA DEFINIDA. A estratégia dos Estados Unidos e da Europa Ocidental, com relação ao Brasil, está cada vez mais clara: Impedir o desenvolvimento de tecnologia nacional própria, com a compra de qualquer empresa que procurar desenvolvê-la; associar-se à empresa que não se puder comprar, oferecendo cooperação no desenvolvimento da tecnologia, com o intuito aparente de ajudar o país a queimar etapas. Na verdade, tenta-se impedir qualquer avanço à sua revelia, sem vigilância ou participação; impedir que o dinheiro gasto com o reaparelhamento das Forças Armadas chegue às mãos de empresas sob controle nacional, evitando ainda que esse dinheiro seja investido em avanços de caráter tecnológico que coloquem em risco a hegemonia de suas empresas no mercado brasileiro e no exterior; cooptar, com associações ou contratos de representação e de lobby, pessoal da reserva das forças armadas, principalmente ex-adidos militares brasileiros no exterior, para vender, como uma coisa ideologicamente natural, a associação do Brasil com empresas ocidentais para a produção de armamento, de forma a impedir que a nação recorra a outras opções; impedir a reunião, coordenada, de pequenas empresas brasileiras de grande potencial tecnológico, em grandes consórcios industriais militares de inspiração ou controle público, como os que existem no Ocidente, como a Lockheed Martin, ou a própria EADS; diminuir, via participação na maioria dos contratos, a realização de associação entre empresas brasileiras de defesa de qualquer porte e empresas não ocidentais, como as existentes nos países BRICS. Se não puder impedir a cooperação entre uma empresa brasileira de defesa e uma congênere do BRICS, estar presente acionariamente ou como participante do projeto, do lado brasileiro, para ‘controlar’ essa aproximação; estabelecer, coordenadamente, via supervisão dos métodos de produção e administração, e aplicando baixos índices de conteúdo nacional, um alto grau de dependência da indústria nacional de defesa com relação aos seus ‘parceiros’ e controladores ocidentais. Isto permitirá futura paralisação das linhas de montagem dos armamentos em nosso país, em caso de conflito ou de potencial conflito, entre o Brasil e esses países; [...]”. 45 Em decorrência da Estratégia Nacional de Defesa, a Medida Provisória nº 544, de 2011, posteriormente convertida na Lei nº 12.598, de 2012, estabelece um verdadeiro microssistema de contratação especializada em aquisição e desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa. Além disso, também tratou a referida norma de positivar conceitos importantes, tais como: produtos de defesa, produtos estratégicos de defesa, sistemas de defesa, empresas estratégicas de defesa. A seu turno, a referida lei foi regulamentada pelo Decreto nº 7.970, de 2013, que tratou de positivar mecanismos de fomento à BID. Todavia, vale destacar da exposição de motivos da referida medida provisória a finalidade de fomentar a indústria de defesa: “A END determina a organização da indústria de defesa para que possa ser assegurada ao País autonomia operacional necessária ao exercício das competências atribuídas às Forças Armadas, sob o pressuposto de que a organização, o preparo e o emprego da Marinha, do Exército e da Aeronáutica devem corresponder ao desenvolvimento econômico e tecnológico nacional. É nessa ordem de ideias que a END situa a reorganização da indústria de defesa como um de seus eixos estruturantes, assegurando que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas esteja atrelado ao desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional. 43

46

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

contratação especializada em aquisição e desenvolvimento de produtos e sistemas de defesa, tal fenômeno pode continuar representando uma potencial ameaça à soberania e autonomia tecnológica. O Estado brasileiro se depara, portanto, com uma questão de extrema relevância no que diz respeito ao suporte aos processos de aquisições de interesse da defesa nacional, que a cada dia ficam mais exigentes e sofisticados, não somente em relação às exigências de cunho tecnológico, como também jurídico-procedimentais, tendo em perspectiva a própria natureza complexa das aquisições pretendidas, comumente inseridas em projetos de grande envergadura.46 Por isso, vale-se do significado por detrás do termo em inglês acquisition para buscar uma ampliação de alcance e sentido para as contratações de interesse da defesa.47 O referido termo conta com um senso de obtenção, significativamente mais amplo que a terminologia internacionalmente consagrada do procurement, na qual o ato de contratar bens ou serviços, visando ao atendimento de finalidades públicas, é a faceta instrumental inserida no espectro conceitual que exprime a ação de adquirir (aquisição). Desse modo, designadamente no contexto das contratações de interesse da defesa, a lógica contratual encontra-se imersa numa abordagem mais ampla, numa configuração mais alargada da temática contratual pública, representada pelo conjunto de medidas voltadas à obtenção de determinada tecnologia ou conhecimento tecnocientífico, como resultado esperado da agregação de valor inovativo tecnológico às atividades de P&D.48 Assim, a amplitude de significado importa atividades

Para tanto, faz-se necessário capacitar a indústria para que conquiste autonomia em tecnologias indispensáveis à defesa do País. [...] Atente-se para o fato de que os produtos de defesa impulsionam a economia, não se destinam exclusivamente ao emprego bélico e refletem diretamente no desenvolvimento de tecnologias que são aplicadas de maneira dual, ou seja, em benefício das áreas militar e civil. [...] Dessa feita, alinhado ao papel internacional desempenhado pelo Brasil, é preciso reconhecer que o País deve possuir Forças Armadas balanceadas, equilibradas e modernas, com rápida capacidade de mobilização, o que não acontece da noite para o dia. Para tal desiderato, a indústria de defesa brasileira exerce papel fundamental, exigindo legislação moderna que contemple a complexidade e a singularidade da defesa do país”. 46 PRADO, Lucas Navarro; GAMELL, Denis. Regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares no Brasil: oportunidade para desenvolvimento de uma Indústria Nacional de Defesa e parcerias públicoprivadas. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 3, n. 4, p. 135-167, set. 2013/fev. 2014. 47 RODRIGUES, Nuno Cunha. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013. p. 13. “A noção de contratação pública compreende, neste contexto, as aquisições de bens e serviços feitas por entes Estaduais ou infra-estaduais que se revelam necessárias ao cumprimento das suas funções. Note-se que não existe uma noção precisa de contratação pública. Nos EUA, foi utilizada e a expressão ‘aquisição’ (‘acquisition’) pelo Governo Federal e a expressão ‘compras’ (‘purchasing’) servia para designar a NASPO (National Association of State Purchasing Officers) até à recente alteração da denominação social que implicou o abandono da expressão ‘purchasing’ e a sua substituição por ‘contratação’ (‘procurement’). [...]”. No mesmo sentido, tais termos estão definidos no Glossary of Defense Acquisition Acronyms & Terms do Departament of Defense, como: procurement – act of buying goods and services for the government; acquisition – the conceptualization, initiation, design, development, test, contracting, production, deployment, Logistics Support (LS), modification, and disposal of weapons and other systems, supplies, or services (including construction) to satisfy DoD [Department of Defense] needs, intended for use in, or in support of, military missions. 48 WYLIE, Robert; MARKOWSKI, Stefan. Managing the defence value-adding chain: Australian Procurement of over-the-horizon radar. In: MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter; WYLIE, Robert. Defence Procurement and Industry policy: A small country perspective. London; New York: Routledge, 2010. p. 354-370.

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

47

André Luís Vieira

vocacionadas ao planejamento da contratação, à descrição e ao detalhamento dos requisitos técnicos e operacionais pretendidos, à transferência de tecnologia e ao índice de nacionalização da cadeia de fornecedores e suprimentos, às formas de compensação industrial e tecnológicas esperados, aos formatos contratuais de prestação do suporte logístico; além da evidente satisfação do interesse público imediato das necessidades das instituições militares, com o total adimplemento do objeto do contrato principal.49 No ponto, apesar do detalhamento das políticas públicas setoriais que buscam convergir desenvolvimento tecnológico e defesa nacional, por intermédio de processos de obtenção (contratação em amplo sentido), essas apresentam pouca efetividade em sua regulamentação, o que se justifica, principalmente, pela inexistência de um arcabouço jurídico que trate a matéria com a especificidade que lhe é devida. Na prática, o Estado brasileiro dispõe, apesar do suscitado microssistema inaugurado pela Lei nº 12.598/12, de uma legislação anacrônica (Lei nº 8.666, de 1993),50 que abarca de forma genérica os mais diversos aspectos legais que autorizam a atuação do Estado e suas entidades públicas no cumprimento da função contratante.51 Em outro dizer, as aquisições de defesa passaram, muito recentemente, a compor uma agenda própria, o que já pode, per se, ser considerado um grande avanço na direção dos objetivos pretendidos pela política setorial em vigor, contudo tem na generalidade e falta de adequabilidade estrita da norma geral à matéria em comento, aliadas às variações e condicionantes orçamentárias, os seus maiores entraves.52 Por isso, no caso brasileiro, os problemas institucionais existentes nos processos de contratação de interesse da defesa, apesar de não colaborarem no todo com a lógica contratual da obtenção, mantêm em expectativa inúmeras oportunidades a

DEFENSE ACQUISITION UNIVERSITY (DAU). DAU Program Managers Tool Kit. Sixteenth Edition, version 1.0, January 2011. 50 Lei que regulamenta o art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal de 1988, instituindo normas gerais para licitações e contratos da Administração Pública. 51 Cf. GONÇALVES, Pedro Costa. O contrato administrativo: uma instituição do direito administrativo do nosso tempo. Coimbra: Almedina, 2003. p. 36-41. Também, GONÇALVES, Pedro Costa. Reflexões sobre o Estado Regulador e o Estado Contratante. Coimbra: Coimbra Editora, 2013. p. 25-26. 52 No ponto, em comparação com a realidade brasileira, elege-se o caso alemão para bem elucidar as possibilidades de utilização assertiva de uma política intersetorial de defesa, visando ao desenvolvimento econômico e tecnológico. Neste particular, O Estado alemão estruturou o BWB (Bundesamt für Wehrtechnik und Beschaffung), Escritório Federal de Tecnologia e Contratação de Defesa, no âmbito de seu respectivo Ministério da Defesa. Tal entidade é responsável pelos projetos estratégicos de defesa, mesmo os internacionais. Em sua estrutura organizacional existem vários Centros Técnicos (Wehrtechnische Dienstelle – WTD), encarregados da condução da P&D de diferentes tecnologias chaves. Embora as instalações técnicas fossem operadas principalmente em benefício das Forças Armadas da Alemanha, o BWB reconhecia a necessidade de apoiar as nações aliadas, outros governos estrangeiros e as companhias internacionais de defesa, mediante aprovação do governo alemão. Em outubro de 2012, o Ministério da Defesa da Alemanha reorganizou o BWB, criando o Escritório Federal das Forças Armadas alemãs para Equipamentos, Informações Tecnológicas e Apoio em Serviço (Bundesamt für Ausrüstung, Informationstechnik und Nutzung der Bundeswehr – BAAINBw). O papel desse escritório é figurar como um ente de fomento público à indústria alemã, com quem mantém estreitos laços de cooperação, observando-se, contudo, normas muito rígidas e claras sobre a atuação dessas empresas, permanentemente fiscalizadas em seus contratos internos e externos. Disponível em: . Acesso em: 28 maio 2015. 49

48

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

serem identificadas e efetivadas. Por se tratar de vício de origem na elaboração da política setorial em questão, as medidas resolutivas não poderão ser simplórias ou reducionistas, sob pena de desmantelamento ou ineficácia da política pública adotada.53 Entretanto, seja qual for a opção política adotada e sua respectiva modelagem contratual, estas não serão definitivas, haja vista que a dinâmica imposta pelos múltiplos fatores considerados na equação exigirão permanentes adequações jurídico-políticas.

V Especificidades jurídico-procedimentais dos contratos de interesse da Defesa Nacional Consoante o alinhamento lógico-sistêmico da política setorial de defesa com a urgência de políticas de inovação tecnológica voltadas ao desenvolvimento tecnocientífico do país, o Estatuto Federal de Licitações apresenta uma hipótese de dispensa de licitação para contratualização de projetos de interesse da Defesa Nacional, em conformidade com concepção da END. Trata-se, pois, do comando normativo inserto no art. 24, inc. XXVIII, da Lei nº 8.666/93. Dele deflui-se que a obtenção de um sistema ou produto de defesa que se apresente, cumulativamente, com alto teor de complexidade tecnológica, desde que produzido ou prestado no território nacional, assim reconhecido ou atestado mediante parecer de comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão contratante, poderá ser efetivado por via da referida dispensa. Como se pode observar, a concepção dos sistemas e produtos dessa categoria envolve, naturalmente, complexidade tecnológica ligada à seara da Defesa Nacional e, justamente por este motivo, requer, para a sua efetivação, antecipadamente, um parecer exarado por comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão ou entidade pública contratante, com vistas a perquirir, com o rigor técnico necessário, a coexistência cumulativa dos elementos insertos na norma supracitada. Nesse contexto, não obstante a possibilidade de realização de um processo de dispensa tradicional,54 em que a discricionariedade administrativa se legitima mediante motivação pela escolha do fornecedor e pela justificativa do preço praticado (art. 26 da Lei nº 8.666/93),55 a modelagem contratual levada a efeito nos casos de objeto dotado de BAUER, Michael W. et al. Dismantling Public Policy: preferences, strategies, and effects. Oxford: OUP Oxford, 2012. p. 3-56. 54 Sobre contratação direta (dispensa e inexigibilidade de licitação), recomenda-se, entre diversos autores: PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003; JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012; NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública. São Paulo: Dialética, 2003; FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Contratação direta sem licitação. 6. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2006; FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007. 55 Ver REVISTA ZÊNITE DE LICITAÇÕES E CONTRATOS – ILC. Curitiba, n. 89, p. 600, jul. 2001, seção Perguntas e Respostas. “Sobre dispensa de licitação, justificativa do preço e verificação por orçamentos, concluise que ‘a pesquisa de preços no mercado deve ser a mais ampla possível de forma a possibilitar que a Administração possa optar pelo preço mais vantajoso em termos econômicos. Não há legalmente um número mínimo de orçamentos que devem instruir o processo de contratação. Há, sim, uma recomendação dos órgãos de controle em relação ao número mínimo de três orçamentos, que deve ser acatada, sempre que possível’”. 53

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

49

André Luís Vieira

complexidade tecnológica no interesse da Defesa Nacional vem privilegiar a realização de um chamamento público, de cunho editalício, com vista a conferir ampla transparência,56 em atendimento aos preceitos jurídico-constitucionais57 afetos à pretensa contratação. O referido chamamento, devidamente publicitado em veículo informativo oficial, intenta conferir amplitude de participação aos interessados no certame. A lógica esboçada por detrás dessa medida é solicitar ao mercado informações técnicas e financeiras que melhor amparem a tomada de decisão acerca dos requisitos técnicos e operacionais que serão exigidos do objeto da futura contratação. Este raciocínio vem emprestado de metodologia contratual internacionalmente consagrada e amplamente aceita pela indústria de defesa.58 Nesse particular, é fácil inferir que a intenção da Administração Pública interessada reside em levar a efeito o fiel cumprimento ao mandamento legal insculpido no art. 26, parágrafo único, inc. III da Lei de Licitações, qual seja, conferir total transparência à justificativa do preço praticado no contratado.59 MIRAGEM, Bruno. A nova administração pública e o direito administrativo. São Paulo: RT, 2011. p. 51. “A transparência visa a dissipar o mistério que envolve a administração, de modo a permitir a compreensão da lógica que comanda a atuação administrativa. Neste sentido, a transparência se associa, de modo inseparável, à diretriz de máximo acesso à informação por parte dos cidadãos sobre questões da Administração. [...] A exceção é a restrição, que justamente por isso deverá ser amplamente justificada, temporária (diretamente relacionado à justificativa da restrição) e específica, ‘quando imprescindível à segurança da Sociedade e do Estado’, nos exatos termos do art. 5º, XXXIII, da Constituição Federal”. 57 MIRAGEM, Bruno. A nova administração pública e o direito administrativo. São Paulo: RT, 2011. p. 38. “[...] Neste particular, cumpre à Administração Pública observar, primeiramente, os princípios constitucionais que a informam, não estabelecendo preferências indevidas (em respeito à impessoalidade), ou destoantes da lei (legalidade), assim como o dever de guardar padrões éticos nas escolhas que realize (moralidade), assegurar o amplo acesso às informações relativas aos critérios adotados (publicidade), e observar os procedimentos que lhes permita atingir os melhores resultados com os meios disponíveis (eficiência). Da mesma forma, cumpre reconhecer ao Estado-Administração, como efeito do princípio constitucional da eficiência, a existência de um dever de planejamento, que se projeta tanto no tocante ao dever de planejar, quando no de que este planejamento seja eficiente, o que não implica atendimento integral a determinada demanda, mas a otimização dos recursos em face dos resultados alcançados, o máximo de resultado com os meios disponíveis. [...]”. 58 Cf. TRYBUS, Martin. European Defence Procurement Law. London: Kluwer Law International, 1999. p. 37-44; POLLPETER, Kevin. Getting to Innovation assessing China’s Defense Research, Development, and Acquisition System. Institute on Global Conflict and Cooperation, 2014. 59 Ver TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 1.157/2013, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler. DOU, 21 maio 2013. “Em inspeção realizada pelo TCU, a Unidade Técnica detectou indícios de irregularidade consistente em aparente direcionamento de contratação de determinada empresa por dispensa de licitação, com base em situação emergencial. No caso, restou apurado que ‘em 22 processos de dispensa de licitação, de um total de 65, a definição da empresa contratada teria ocorrido anteriormente à apresentação das propostas apresentadas para a orçamentação do objeto’. Analisando a situação, o Relator, divergindo da Unidade Técnica, entendeu que, por se tratar contratação direta na qual se defere ao agente público a possibilidade de escolha discricionária da contratada que melhor atenda à necessidade da Administração, não se pode exigir que a escolha recaia sobre a proposta de menor valor, daí por que não haveria qualquer irregularidade na juntada ao processo de outras propostas de preço após a escolha da contratada, apenas com a finalidade de evidenciar a compatibilidade dos preços da proposta escolhida com aqueles praticados no mercado. Nesse sentido, voto proferido pelo Relator nos seguintes termos: ‘11. É certo que a situação motivadora da contratação direta deve ser devidamente evidenciada, a escolha da contratada deve ser justificada e os preços praticados devem ser os de mercado, sempre de acordo com o disposto nos incisos I, II e III do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/1993. 12. Nessa linha, a existência de outras propostas de preços, além daquela contratada, possui por objetivo justificar o preço a ser contratado. Não há que falar, como aponta a unidade técnica, na realização de um procedimento de disputa para se averiguar a proposta mais vantajosa. Caso assim fosse, não se estaria falando de dispensa de licitação, mas de licitação propriamente dita. [...] Considerando que a regularidade dos preços praticados restou confirmada por outros elementos constantes nos autos, a existência das propostas de preços assumiu um caráter apenas secundário no processo de dispensa. Em outras palavras, mesmo se inexistissem essas propostas, essas contratações diretas poderiam ser consideradas lícitas em relação ao preço praticado’” (grifos nossos). No mesmo sentido: Acórdão nº 406/2011, Plenário. 56

50

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

Como decorrência, tal metodologia restará concretizada diante da realização do referido chamamento composto por um pedido de informações (RFI – Request for Information), visando subsidiar a composição do cronograma de orçamento estimado e a elaboração do instrumento convocatório, particularmente no que atenta aos requisitos de caráter técnico.60 Contudo, cumpre enfatizar que o pedido de informação, embora de natureza editalícia, não tem o condão de se vincular à Administração Pública, pois se converte em medida preambular à tomada de decisão administrativa de conduzir ou não a pretensa contratação. Trata-se de etapa ainda pertencente à fase processual de planejamento da contratação (fase interna), configurando-se apenas um mecanismo de diálogo institucional entre o órgão contratante e os atores do mercado. Pois bem, a etapa seguinte reside em valer-se dos dados colhidos nas respostas apresentadas pelas empresas, para subsidiar o processo de tomada de decisão sobre a contratação. Dessa forma, proceder-se-á à implementação da etapa posterior, que inaugura a fase externa da licitação, com o pedido de proposta ou oferta (RFP – Request for Proposal) e a consequente escolha do fornecedor em face dos documentos de habilitação e da proposta mais vantajosa para a Administração, sendo esta analisada de acordo com os critérios técnicos previamente estabelecidos e mediante parecer a ser exarado por comissão especialmente designada com a finalidade de realizar tal seleção. Dito de outra forma, tal procedimentalização confere ao processo de escolha do fornecedor uma expressiva isonomia e transparência, imprimindo, assim, a necessária legitimidade e segurança jurídica pertinente à fase de negociação61 do contrato, sem o risco de se ignorar os interesses centrais em jogo. O raciocínio esposado confere ao pedido de oferta, igualmente de natureza editalícia, o condão de vincular a Administração Pública ao conteúdo jurídico do pedido formulado, bem como impor observância às empresas pelas respostas apresentadas, vez que estas serão as condicionantes geradoras da estrutura e das cláusulas contratuais.62

MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter. Challenges of defence procurement. In: MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter. Defence and Peace Economics, 1998. 61 Sobre os fundamentos da negociação contratual, recomenda-se: SOUSA, Luís Verde de. A negociação nos procedimentos de adjudicação: Uma análise do Código de Contratos Públicos. Coimbra: Almedina, 2010. p. 13-72. Ver também FISCHER, Roger; SHAPIRO, Daniel. Além da razão: a força da emoção na solução de conflitos. Rio de Janeiro: Imago, 2009. p. 17-27. 62 MIRAGEM, Bruno. A nova administração pública e o direito administrativo. São Paulo: RT, 2011. p. 62. “São instrumentos da governança no setor público a procedimentalização e a contratualização. A procedimentalização remete à institucionalização da processualidade administrativa de modo que a adequada ponderação dos interesses relativos a dado processo de tomada de decisão, seja considerado para efeito de um resultado conforme o interesse público. Já a contratualização ‘traduz juridicamente a abordagem contratualistas e consensual da ação pública’ [Jacques Chevallier], o que significa afinal, que a construção das decisões não se manifesta exclusivamente como expressão de poder, mas pela formação de acordos e consensos específicos mediante exaustivos processos de negociação em vista dos interesses envolvidos. [...]”. 60

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

51

André Luís Vieira

Nesse cotejo, visando, mais uma vez, conferir a maior legalidade e legitimidade possíveis à pretensa contratação, o pedido de proposta deve confirmar, de forma sistêmica, a força normativa que conforma o microssistema de contratações de interesse da defesa (Lei nº 12.598/12), designadamente em seu art. 2º, inc. IV, ao dispor que somente poderão participar do processo empresas ou consórcios que atendam, conjuntamente, aos seguintes requisitos: a) ter no país a sede, a sua administração e o estabelecimento industrial, equiparado a industrial ou prestador de serviço; b) dispor, no país, de comprovado conhecimento científico ou tecnológico próprio ou complementado por acordos de parceria com instituição científica e tecnológica; c) assegurar, em seus atos constitutivos ou nos atos de seu controlador direto ou indireto, que o conjunto de sócios ou acionistas e grupos de sócios ou acionistas estrangeiros não possam exercer em cada assembleia geral número de votos superior a 2/3 (dois terços) do total de votos que puderem ser exercidos pelos acionistas brasileiros presentes; e d) assegurar a continuidade produtiva no país. Trata-se, portanto, do uso do poder de compra do Estado na tentativa de indução de comportamento do mercado alinhado à lógica promocional da política setorial legalmente adotada.63 Como se pode depreender da argumentação esposada, a escolha da melhor proposta é resultado de um conjunto multifacetado de elementos de ordem técnica, econômica e jurídica. Em tais procedimentos, a comissão designada deve realizar uma espécie de avaliação geral dos fornecedores e das propostas, antes de ditar a escolha da Administração contratante. Isso porque em processos de contratação dessa dimensão e especificidade (tecnologias de defesa), há inúmeros casos de propostas que privilegiam certos aspectos técnicos em detrimento de outros. Assim, não se trata de eleger a melhor dentre as propostas apresentadas, mas de escolher e contratar aquela mais completa a ser executada pelo o fornecedor que se mostrar mais apto tecnicamente à concretização da escolha, razão pela qual se pode julgar necessário estabelecer uma segunda rodada de negociação do contrato. Nesse ponto, a técnica utilizada é a da referida comissão organizar uma lista reduzida (short list) de proponentes com as melhores ofertas, pontuadas por critérios técnicos, e negociar, simultaneamente, com vistas a alcançar a melhor condição técnica desejada, pelo menor custo possível. De acordo essa técnica de escolha, o órgão contratante deve ajustar as propostas técnicas e de compensação tecnológica e industrial ao interesse público. Todavia, vencidas as incursões sobre o alcance dos arts. 24, inc. XXVIII e 26, da Lei nº 8.666/93, exsurge como particularidade, e não exclusividade, dos contratos

SQUEFF, Flávia de Holanda Schmidt. O poder de compras governamental como instrumento de desenvolvimento tecnológico: Análise do caso brasileiro. Brasília; Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2014. p. 9-24.

63

52

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

de interesse da defesa nacional, a possibilidade de inserção de cláusula contratual de antecipação total ou parcial de pagamento.64 Trata-se, pois, de hipótese em que, com vistas ao desenvolvimento de uma solução tão somente voltada ao atendimento dos interesses da Administração contratante, a empresa contratada demonstra a necessidade de aquisição de insumos a serem utilizados na efetivação da fase inicial do projeto, a exigir vultoso dispêndio de recursos financeiros. Sobre o assunto, a legislação de regência da matéria, notadamente as previsões contidas no art. 40, inc. XIV, alínea “d” da Lei nº 8.666/93, e no art. 38 do Decreto Federal nº 93872, de 1986, registra, sem nenhum esforço exegético, que o pagamento antecipado se constitui em excepcionalidade no tocante à operacionalização dos procedimentos afetos à satisfação dos encargos financeiros pela Administração, decorrentes de obrigações firmadas em ajustes.65 Nessa esteira, percebe-se de plano que a excepcionalidade em questão exibe condicionantes essenciais à sua concretização, quais sejam: a) justificativa apresentada pela empresa contratada; b) previsão em edital e contrato; c) apresentação de garantias legais pela beneficiada da antecipação do pagamento; e d) autorização discricionária emitida pela autoridade máxima da Administração contratante.

COELHO, José Ricardo Roriz. Os limites do crescimento brasileiro. Revista Interesse Nacional, n. 18, p. 29, jul./set. 2012. “As empresas brasileiras se defrontam com um dos mais elevados custos de capital do mundo – muito superior ao verificado em países que competem com o Brasil no mercado internacional. Esses ônus se devem à taxa de juros básica e aos spreads bancários e repercutem diretamente no curso dos produtos industriais nacionais, comprometendo sua competitividade no mercado interno e internacional. Estima-se que 7,5% do preço dos produtos industriais decorram do pagamento de juros referentes apenas ao capital de giro. Ou seja, sem contar os custos com juros do endividamento para investimento fixo”. 65 TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 1.614/2013, 1ª Câmara, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU, 3 abr. 2013. “Ao apreciar recurso de reconsideração interposto por gestor público apenado com a multa do art. 58 da Lei nº 8.443/92 em razão de pagamentos antecipados em contratos, o TCU reiterou seu entendimento sobre a matéria, manifestando-se nos seguintes termos: ‘De fato, a Lei nº 8.666/93 e o Decreto nº 93.872/86 admitem o pagamento antecipado, desde que previsto no edital de licitação ou nos instrumentos formais de adjudicação direta e mediante as indispensáveis cautelas ou garantias, como demonstra a transcrição do art. 38 do Decreto: Art. 38. Não será permitido o pagamento antecipado de fornecimento de materiais, execução de obra, ou prestação de serviço, inclusive de utilidade pública, admitindo-se, todavia, mediante as indispensáveis cautelas ou garantias, o pagamento de parcela contratual na vigência do respectivo contrato, convênio, acordo ou ajuste, segundo a forma de pagamento nele estabelecida, prevista no edital de licitação ou nos instrumentos formais de adjudicação direta. [...] A jurisprudência do TCU também é firme no sentido de admitir o pagamento antecipado apenas em condições excepcionais, contratualmente previstas, sendo necessárias ainda garantias que assegurem o pleno cumprimento do objeto’. Constatando a inexistência de previsão em edital e contrato, bem como de garantias ao atendimento do objeto, o TCU manteve a penalidade aplicada ao gestor”. Precedentes mencionados na decisão: acórdãos nºs 109/2002, do Plenário; 51/2002, 193/2002 e 696/2003, todos da 1ª Câmara; 1.146/2003 e 918/2005, ambos da 2ª Câmara. No mesmo sentido, ainda, acórdãos nºs 817/2005, Plenário e 1.442/2003, 1ª Câmara, ambos do TCU. Ver também: TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 3.460/2006, 1ª Câmara, rel. Min. Augusto Nardes. DOU, 6 dez. 2006. “[...] 9.2.1. evite, nos pagamentos referentes a contratos de obras públicas que prevêem o pagamento parcelado de acordo com a execução dos serviços, a prática do pagamento adiantado de serviços em desacordo com o cronograma físico-financeiro, que, para ser efetuado, deverá ter previsão no termo de contrato respectivo e proporcionar algum benefício para a administração, tal como o desconto previsto no art. 40, inciso XIV, alínea ‘d’, da Lei nº 8.666/1993”. 64

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

53

André Luís Vieira

Com fulcro nas condições acima elencadas, observa-se de imediato que seu atendimento pretende conferir equilíbrio econômico e financeiro ao contrato, fruto de um delongado processo de escolha pública e cuja finalidade maior é não exigir esforços desnecessários ao contratado. Note-se que não se está considerando hipótese eventual de meros gastos iniciais, estes devem ser suportados pelo contratante como atendimento ao critério de capacidade financeira exigível dos fornecedores em todas as espécies de contratação pública. O que se está a considerar é o dispêndio de vultosos recursos financeiros em fase inicial do projeto, que pode vir a incapacitar a contratada de prosseguir na consecução das etapas contratuais subsequentes.66 Admitir-se isso é criar um risco extracontratual inviabilizador de um setor privado competitivo e engajado na concretização dos objetivos das políticas nacionais. Nessa mesma senda, o incentivo a um setor privado dinâmico exige do Estado contratante o tratamento de outra espécie de temeridade, o risco tecnológico.67 Esta modalidade pertence designadamente à seara tecnocientífica do objeto da obtenção, na qual representa um dos principais fatores a serem considerados na aquisição de novas tecnologias. Esse risco contém a incerteza intrínseca em toda a atividade de P&D, de que esta pode não alcançar os resultados esperados. Por essa razão, a implantação de metodologias de avaliação e o gerenciamento de risco, nomeadamente aos projetos lastreados em contratos públicos, implicam redução de custos excessivos e mitigação do desperdício de gastos públicos.68 Nesse aspecto, o que se propõe é MARTINS, Licínio Lopes. O equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo: algumas reflexões. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, mar./ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 25 maio 2015. “Enquanto princípios gerais de Direito Administrativo eles são fonte de Direito – de Direito Administrativo –, conformando toda a atividade administrativa e, consequentemente, toda a atividade contratual administrativa, seja em termos formais/procedimentais, seja em termos substantivos. O mesmo é dizer, seja na fase pré-procedimental, seja na de execução dos contratos. Numa palavra, os princípios gerais de Direito Administrativo devem ser observados em toda a conformação procedimental e substantiva dos contratos administrativos e, portanto, também na modelação ou no modo da distribuição dos riscos e das respetivas consequências jurídico-econômicas em virtude da sua eventual ocorrência e do modo como esta sucede (causas, âmbito, extensão, etc.). No contrato administrativo materializam-se dois valores fundamentais – a estabilidade objetiva e a estabilidade subjetiva, partindo-se da premissa que o contrato administrativo também é um meio de os sujeitos (privados) que se dispõem a colaborar com a Administração realizarem os seus interesses pessoais, societários, empresariais, económicos, etc. E a justa realização destes interesses constitui não apenas a garantia da estabilidade do sujeito privado, mas também uma garantia da estabilidade objetiva do contrato e, portanto, da prossecução do interesse público por virtude do qual o mesmo foi celebrado. Ou seja, a justa satisfação dos interesses contratuais do co-contratante da Administração constitui uma caução da boa execução do objeto contratual e, portanto, da estável e contínua prossecução do fim que justificou a celebração do contrato. E isto é assim em todos os contratos, mas especialmente naqueles que associam em termos duradouros os particulares à prossecução de tarefas administrativas”. 67 Cf. ELIASSON, Gunnar. Advanced Public Procurement as Industrial Policy: the Aircraft Industry as a Technical University. New York; Heidelberg; London: Springer, 2010. p. 240 e ss. Ver, também, DEFENSE ACQUISITION UNIVERSITY (DAU). DAU Program Managers Tool Kit. Sixteenth Edition, version 1.0, January 2011. p. 89-102; DEFENSE ACQUISITION UNIVERSITY (DAU). Introduction to Defense Acquisition Management. Fort Belvoir; Virginia, 2010. p. 42. 68 DIAS, Acires et al. Metodologia para análise de risco: mitigação de perda de SF6 em disjuntores. Florianópolis: [s.n.], 2011. p. 73-89. 66

54

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

uma convergência estratégica e institucional da política pública vigente, efetivada por intermédio dos procedimentos jurídico-contratuais, da mudança da cultura organizacional de tolerância ao risco, bem como avaliação ampla e de gerenciamento rigoroso dos riscos envolvidos, objetivando a melhor consecução possível do objeto da P&D.69 Note-se que, novamente, o tópico versa sobre particularidade não exclusiva dos contratos de interesse da defesa que visam à obtenção de capacidades tecnológicas específicas ou desenvolvimento de tecnologias duais. É neste ponto que a contratação de projetos que vislumbram inovação tecnológica, aplicada à seara da defesa, exige decisões sobre a aquisição que afiram o grau de maturidade da tecnologia considerada e a viabilidade e risco assumido pelo projeto, bem como a relação benefício-custo acerca das capacidades tecnocientíficas a serem obtidas. Isso porque tais projetos envolvem diferentes configurações metodológicas no planejamento de metas e aferição resultados, pois, em regra, congregam diferentes áreas da engenharia e integram pesquisas aplicadas de diversos matizes. Portanto, a correta identificação dos riscos tecnológicos – apontados como a principal causa de atrasos nos cronogramas e aumento de custos (custos blow-out) –, colabora, sobremaneira, com a efetividade e assertividade das práticas contratuais na gestão dos projetos dessa natureza.70 Destarte, configurado o risco tecnológico, os contratos públicos que o assumem devem valer-se do comando inserto no art. 20 da Lei de Inovação (Lei nº 10.973/2004), por sua vez regulamentado pelo art. 21 do Decreto nº 5.563/2005, com as alterações introduzidas pelo Decreto nº 7.539, de 2011, para legitimar sua mitigação. Nada obstante, o §3º do art. 20 da referida lei, a seu turno replicado no bojo do §5º do decreto regulamentador, contém equívoco conceitual grave ao dispor que “o pagamento decorrente da contratação prevista no caput será efetuado proporcionalmente ao resultado obtido nas atividades de pesquisa e desenvolvimento pactuadas”. Isso porque, se a atividade contratada invoca, assumidamente, o risco tecnológico, não se pode condicionar o pagamento em função dos resultados alcançados, visto que é exatamente sobre estes que incide a álea de risco.71 Desse modo, tal qual ocorre com o risco extracontratual produzido pela hipótese de inadmissibilidade do pagamento antecipado, a condição de pagamento em função dos resultados alcançados imporia ao contratado a assunção do risco tecnológico, ao passo que a melhor intelecção da norma legal é a avocação dessa álea para a

PATANAKUL, Peerasit. Program Risk Management: how is it done in major defense programs. Project Management Institute, 2008. p. 9. 70 AUSTRALIAN GOVERNMENT. Department of Defence, Technical Risk Assessment Handbook, version 1.1, 2010. p. 1-32. 71 SAAVEDRA, Giovani Agostini. Direitos fundamentais: direito privado e inovação. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012. p. 28 e ss. Ver também: NEGRI, João Alberto de. Avançar ou avançar na política de inovação. In: BARBOSA, Nelson et al. Indústria e desenvolvimento produtivo no Brasil. São Paulo: Elsevier, 2015. p. 359-376. 69

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

55

André Luís Vieira

entidade pública contratante, justamente para não inviabilizar a continuidade da atividade empresarial privada.72 Quiçá por essa razão, o Estado brasileiro, compreendendo a incongruência do dispositivo legal, por meio do Decreto nº 7.539, de 2011, ao alterar a regulamentação legal proposta pelo art. 21 do Decreto nº 5.563, de 2005, tratou de corrigir tal imprecisão normativa ao ponderar, nos novos §6º, §7º e §8º introduzidos no indigitado artigo, que o risco tecnológico pode ser assumido pela administração contratante. Para que essa assunção se configure lícita, há a necessidade de se proceder a perícias técnicas e financeiras, visando esclarecer se ocorreu de fato o referido risco como consequência direta do processo de P&D ou se o evento se deu por incapacidade técnica e organizacional da contratada (§7º). Uma vez verificada a ocorrência da álea como consequência possível da atividade de P&D, o pagamento das fases contratuais pode ser realizado mediante o cronograma físico-financeiro disposto no corpo do ajuste (§6º), encerrando-o. Todavia, pode, ainda, a administração interessada autorizar a prorrogação do contrato consoante o interesse público tutelado, almejando a solução de problema técnico específico ou a continuidade do processo de obtenção de produto ou tecnologia inovadora (§8º).

VI Considerações finais A questão não é trivial e somente poderá ser adequadamente abordada por intermédio de políticas públicas setoriais convergentes, capazes de demonstrar o grau de cooperação que estas podem propor ao incremento das capacidades científicas e tecnológicas da indústria brasileira, enquanto etapa do processo permanente de desenvolvimento socioeconômico. Um país que não tem e capacidade industrial e tecnológica necessária a produzir e atualizar seus produtos e sistemas de defesa, dentro de seu próprio território, conforme suas aspirações político-estratégicas, mantém sua autonomia atrelada às condições impostas pelos interesses de fornecedores que, em última análise, são longa manus de Estados estrangeiros detentores de tecnologias mais avançadas. As tecnologias de defesa são consideradas tecnologias de arrasto, portanto, mais do que absorvedor e destinatário de inovação, o setor de defesa de um país, com a estatura estratégica do Brasil, pode e deve ser uma das principais vias de incentivo das atividades de P&D e de fomento do desenvolvimento industrial, científico e tecnológico nacional. Na esteira dos comandos dos arts. 218 e 219 da Constituição Federal, os quais orientam o Estado brasileiro a promover a autonomia, a capacitação e o desenvolvimento

Cf. FERRARI, Roberto. Empreendedorismo para computação: criando negócios de tecnologia. São Paulo: Elsevier, 2009. p. 116 e ss.; CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO. Revista Brasileira de Tecnologia, v. 15, p. 26-28, 1984.

72

56

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

tecnológico, a Lei de Inovação (Lei nº 10.974/03), que embora tenha instituído mecanismos sinérgicos e ambientes colaborativos entre governo, universidades, centros de pesquisa e empresas, com o objetivo de estimular e proteger as inovações tecnológicas no setor produtivo, carece de aperfeiçoamento e efetividade. O setor de defesa, igualmente, contempla diversas oportunidades e políticas de incentivo à inovação, estampadas na Política de Defesa Nacional e Estratégia Nacional de Defesa, das quais derivou a Lei nº 12.598, de 2012, que estabeleceu disposições específicas para aquisições e desenvolvimento de produtos e sistemas de defesa, além de criar regime tributário especial para empresas estratégicas. As encomendas de produtos e sistemas dotados de alto valor tecnológico agregado geram ambiente institucional e produtivo favorável às atividades de P&D, além de múltiplas possibilidades de tecnologias duais. Portanto, a finalidade da norma é prestigiar a cultura da inovação no Brasil, além de estimular a agregação de conteúdo tecnocientífico nacional e a transferência de tecnologia estrangeira. Da mesma forma, foram criadas diversas restrições ao ingresso de empresas estrangeiras no universo das empresas estratégicas de defesa, bem como foram estipuladas opções e prerrogativas para o Poder Público gerenciar o mercado de defesa. Nesse aspecto, a construção de uma sólida modelagem contratual de interesse da defesa figura entre as medidas imprescindíveis para o êxito da empreitada inovadora no referido mercado. Cabe ressaltar, entretanto, as dificuldades inerentes à modelagem jurídica dos contratos dessa natureza, por envolverem, entre outras especificidades, cláusulas de antecipação de pagamento, risco tecnológico e propriedade intelectual. Em apertada síntese, a lógica contratual esposada é baseada na capacidade negocial da entidade contratante acerca da conformação dos termos contratuais, em função da melhor relação benefício-custo apontada entre as características técnicas desejadas, mediante a escolha pública em perseguir ou não soberania tecnológica, e o preço justo e razoável a ser praticado (best value). Tudo isso procedimentalizado pela aclamação do princípio da transparência, vez que, podendo dispensar a licitação, a administração opta, com muito mais razão, por eleger o fornecedor mediante um conjunto predeterminado de requisitos técnicos mandatórios e desejáveis. Trata-se de atender ao interesse público primário, tendo em vista a máxima “quem pode mais, pode menos”.

Abstract: This paper intent to make considerations about the legal landscape and contractual reality of industrial and technological development generated by the defense sector in Brazil. In this sense, try to find the public procurement institution of logical and legal assumption for to profile the support mechanisms to the culture of innovation within the Defense Industrial Base. It is justifiable, therefore, the choice of this theme, due to the growing discussion of public resources for defense products and systems contracts for the armed forces, by the National Defense Strategy in order to ensure the country for increase in technical and scientific capabilities while preserving their sovereignty.

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

57

André Luís Vieira

Keywords: Technological innovation. Scientific and technological development. Defence Procurement. Innovation policy. Technical risk. Down payment.

Referências AGUIAR, Joaquim. A política de Defesa Nacional: como política pública interdepartamental. Lisboa: Instituto Nacional de Administração, Instituto de Defesa Nacional, 1989. ALMEIDA, Mansueto. A política de inovação e a política de defesa: o caso da agência de inovação DARPA nos Estados Unidos, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Radar: tecnologia, produção e comércio exterior, Brasília, n. 1, p. 27-35, abr. 2009. AMARANTE, José Carlos Albano do. Indústria Brasileira de Defesa: uma questão de soberania e de autodeterminação. In: PINTO, J. R. de Almeida; ROCHA, A. J. Ramalho; SILVA, R. D. Pinho da (Orgs.). As Forças Armadas e o desenvolvimento científico e tecnológico do país. Brasília: Ministério da Defesa, Secretaria de Estudos e de Cooperação, 2004. ARBIX, Glauco. Como transformar a inovação em grande oportunidade. In: VELLOSO, João Paulo dos Reis (Org.). Rumo ao Brasil desenvolvido. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. AUSTRALIAN GOVERNMENT. Department of Defence, Technical Risk Assessment Handbook, version 1.1, 2010. BAUER, Michael W. et al. Dismantling Public Policy: preferences, strategies, and effects. Oxford: OUP Oxford, 2012. BERGO, Marcio Tadeu Bettega. O pensamento estratégico e o desenvolvimento nacional: uma proposta de projeto para o Brasil. 2. ed. São Paulo: MP, 2008. BEZERRA, Carolina Marchiori. Inovações tecnológicas e a complexidade do sistema econômico. São Paulo: Editora UNESP, 2010. BRANDÃO, Maurício Pazini. Ciência, tecnologia, inovação e a defesa nacional. Parcerias estratégicas, Brasília, n. 20, pt. 2, p. 838-850, jun. 2005. BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no Estado Constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela Administração Pública contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. BUNDESAMT FÜR AUSRÜSTUNG, INFORMATIONSTECHNIK UND NUTZUNG DER BUNDESWEHR – BAAINBw. Disponível em: . Acesso em: 28 maio 2015. CHANG, Ha-Joon. Chutando a escada: a estratégia do desenvolvimento em perspectiva histórica. São Paulo: Editora UNESP, 2004. COELHO, José Ricardo Roriz. Os limites do crescimento brasileiro. Revista Interesse Nacional, n. 18, p. 29, jul./set. 2012. CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO. Revista Brasileira de Tecnologia, v. 15, p. 26-28, 1984. CUNHA, Armando; REZENDE, Fernando. Orçamento e desenvolvimento. In: CAVALCANTI, Bianor Scelza; RUEDIGER, Marco Aurélio; SOBREIRA, Rogério (Orgs.). Desenvolvimento e construção nacional: políticas públicas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005. DAGNINO, Renato Peixoto; CAMPOS FILHO, Luiz Alberto Nascimento. Análise sobre a viabilidade de revitalização da Indústria de Defesa brasileira. Brazilian Business Review (BBR), v. 4, n. 3, p. 191-207, set./dez. 2007. DAGNINO, Renato. A indústria de defesa no Governo Lula. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

58

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

DEFENSE ACQUISITION UNIVERSITY (DAU). DAU Program Managers Tool Kit. Sixteenth Edition, version 1.0, January 2011. DEFENSE ACQUISITION UNIVERSITY (DAU). Introduction to Defense Acquisition Management. Fort Belvoir; Virginia, 2012. DIAS, Acires et al. Metodologia para análise de risco: mitigação de perda de SF6 em disjuntores. Florianópolis: [s.n.], 2011. DOMBROWSKI, Peter; GHOLZ, Eugene. Buying Military Transformation: Technological Innovation and the Defense Industry. New York: Columbia University Press, 2006. ELIASSON, Gunnar. Advanced Public Procurement as Industrial Policy: the Aircraft Industry as a Technical University. New York; Heidelberg; London: Springer, 2010. ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA. Manual básico. Rio de Janeiro, 2013. v. 2. ETZKOWITZ, Henry. The Triple Helix: University-Industry-Government Innovation in Action. London; New York: Routledge, 2010. FERRARI, Roberto. Empreendedorismo para computação: criando negócios de tecnologia. São Paulo: Elsevier, 2009. FISCHER, Roger; SHAPIRO, Daniel. Além da razão: a força da emoção na solução de conflitos. Rio de Janeiro: Imago, 2009. GONÇALVES, Pedro Costa. Reflexões sobre o Estado Regulador e o Estado Contratante. Coimbra: Coimbra Editora, 2013. GONÇALVES, Pedro Costa. O contrato administrativo: uma instituição do direito administrativo do nosso tempo. Coimbra: Almedina, 2003. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2004. HARTLEY, Keith. Defence economics: Achievements and challenges, working paper. In: ANNUAL INTERNATIONAL CONFERENCE ON ECONOMICS AND SECURITY, 10th, 2008. Proceedings... 2008. HARTLEY, Keith. The economics of defence policy: A new perspective. London; New York: Routledge, 2011. HOYT, Timothy D. Military industry and Regional Defense Policy. London; New York: Routledge, 2007. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter. Challenges of defence procurement. In: MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter. Defence and Peace Economics, 1998. MARKOWSKI, Stefan; HALL, Peter; WYLIE, Robert. Defence Procurement and Industry policy: A small country perspective. London; New York: Routledge, 2010. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Desenvolvimento econômico e segurança nacional: Teoria do limite crítico. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1971. MARTINS, Licínio Lopes. O equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo: algumas reflexões. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, mar./ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 25 maio 2015. MAZZUCATO, Mariana. O Estado empreendedor. São Paulo: Portfólio Penguin, 2014. MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro Azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010. MINISTÉRIO DA DEFESA, MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Concepção estratégica: Ciência, tecnologia e inovação de interesse da Defesa Nacional. Brasília, 2003.

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

59

André Luís Vieira

MINISTÉRIO DA DEFESA. Livro Branco da Defesa Nacional, 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 maio 2015. MIRAGEM, Bruno. A nova administração pública e o direito administrativo. São Paulo: RT, 2011. NEGRI, João Alberto de. Avançar ou avançar na política de inovação. In: BARBOSA, Nelson et al. Indústria e desenvolvimento produtivo no Brasil. São Paulo: Elsevier, 2015. NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública. São Paulo: Dialética, 2003. OLIVEIRA, Andréa Benetti Carvalho de; SILVA, Caroline Cordeiro Viana e. Política de defesa nacional, estratégia nacional de defesa e doutrina militar de defesa: América do Sul e segurança regional. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (ABRI), 3º, 2011. Proceedings... São Paulo: Instituto de Relações Internacionais – USP. Disponível em: . Acesso em: 28 maio 2015. OLIVEIRA, Rafael Arruda. O constrangimento orçamental e a vontade da Constituição a realização de políticas públicas na área da saúde. Revista dos Tribunais, v. 908, p. 23 e ss., jun. 2011. ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO – OCDE. Manual de Oslo – Diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. 3. ed. 2005. PATANAKUL, Peerasit. Program Risk Management: how is it done in major defense programs. Project Management Institute, 2008. PELED, Dan. Defense R&D and economic growth in Israel: A research agenda. Department of Economics, University of Haifa, January 11, 2001. PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. PINTO FERREIRA. Da soberania. Jornal do Commercio, Recife, p. 91-129, 1943. POLLPETER, Kevin. Getting to Innovation assessing China’s Defense Research, Development, and Acquisition System. Institute on Global Conflict and Cooperation, 2014. PRADO, Lucas Navarro; GAMELL, Denis. Regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares no Brasil: oportunidade para desenvolvimento de uma Indústria Nacional de Defesa e parcerias público-privadas. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 3, n. 4, p. 135-167, set. 2013/fev. 2014. REGINA, Sérgio de; SERAFIM, Alexandre Domingues; GAVIÃO, Lucas Garcia de Moura. Breves considerações a respeito dos mecanismos previstos nas Leis nº 10.973/2004 e nº 12.349/2010 para incentivo da inovação tecnológica. In: REGINA, Sérgio de (Coord.). Parcerias público-privadas de medicamentos (PDPS). Belo Horizonte: Fórum, 2012. REVISTA ZÊNITE DE LICITAÇÕES E CONTRATOS – ILC. Curitiba, n. 89, p. 600, jul. 2001, seção Perguntas e Respostas. RISTER, Carla Abrantkoski. Direito ao desenvolvimento – antecedentes, significados e consequências. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. RODRIGUES, Nuno Cunha. A contratação pública como instrumento de política econômica. Coimbra: Almedina, 2013. SAAVEDRA, Giovani Agostini. Direitos fundamentais: direito privado e inovação. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012. SANTAYANA, Mauro. O cerco à indústria brasileira de defesa. Na contramão da tendência mundial, o Brasil desnacionaliza sua indústria bélica. Jornal do Brasil, 16 ago. 2012.

60

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro

SCHMIDT, Flávia de Holanda. Ciência, tecnologia e inovação em defesa: notas sobre o caso do Brasil, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Radar: tecnologia, produção e comércio exterior, Brasília, n. 1, abr. 2009. SOUSA, Luís Verde de. A negociação nos procedimentos de adjudicação: Uma análise do Código de Contratos Públicos. Coimbra: Almedina, 2010. SQUEFF, Flávia de Holanda Schmidt. O poder de compras governamental como instrumento de desenvolvimento tecnológico: Análise do caso brasileiro. Brasília; Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2014. STEHLIK, Daniela; JENNINGS, Gayle; DWYER, Larry. A socio-economic impact study of defence force activity in Central Queensland Australia. The Centre for Social Science Research, Central Queensland University, August 2004. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 1.157/2013, Plenário, rel. Min. Benjamin Zymler. DOU, 21 maio 2013. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 1.614/2013, 1ª Câmara, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues. DOU, 3 abr. 2013. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – TCU. Acórdão nº 3.460/2006, 1ª Câmara, rel. Min. Augusto Nardes. DOU 6 dez. 2006. TRYBUS, Martin. European Defence Procurement Law. London: Kluwer Law International, 1999. VIANA, Vitor Rodrigues. Reflexões sobre a Defesa Nacional. In: RODRIGUES, Maria de Lurdes; SILVA, Pedro Adão e (Orgs.). Políticas públicas para a reforma do Estado. Coimbra: Almedina, 2013. ZYCHER, Benjamin. Economic effects of reductions in defense outlays. Policy Analysis, n. 706, August 8, 2012.

Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): VIEIRA, André Luís. Inovação tecnológica e contratação pública: uma análise do setor de defesa brasileiro. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015.

Recebido em: 15.06.2015 Aprovado em: 20.06.2015

R. de Contratos Públicos – RCP | Belo Horizonte, ano 4, n. 7, p. 33-61, mar./ago. 2015

61

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.