Integração regional na América do Sul: processos em aberto. Análise de Conjuntura OPSA. , v.7, 2010.

June 29, 2017 | Autor: Miriam Saraiva | Categoria: Brazilian Foreign policy, Regionalismo
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Análise de Conjuntura OPSA | n.7, jul. 2010 |

Análise de Conjuntura | n.7 | jul. 2010

Observatório Político Sul-Americano Instituto de Estudos Sociais e Políticos Universidade do Estado do Rio de Janeiro IESP/UERJ www.opsa.com.br

Integração regional na América do Sul: processos em aberto Análise de Conjuntura (n.7, jul. 2010) ISSN 1809-8924

Miriam Gomes Saraiva Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais – Universidade do Estado do Rio de Janeiro

O cenário atual dos processos de integração na América do Sul não apresenta contornos precisos. As iniciativas em curso mais tradicionais, o Mercosul e a Comunidade Andina (CAN), vão cedendo espaços para modelos mais cooperativos que se afastam das categorias tradicionais de integração econômica orientadas para a integração comercial. Estes processos de integração, por sua vez, não levaram a uma regionalização em termos de interdependência entre os países do continente como um todo nem o comércio intra-regional chegou a mostrar um desempenho significativo. O modelo de economia aberta vem sendo substituído em diversos países sulamericanos por políticas mais próximas ao neodesenvolvimentismo. Por outro lado, desde o 11/Setembro que o governo de George W. Bush abandonou os resquícios de uma política panamericana para a América Latina, enquanto o novo governo de Barack Obama não tem uma política específica orientada para a América do Sul. Os novos governos de caráter anti-liberal eleitos na região atuam no sentido de aprofundar a distância em relação aos Estados Unidos enfraquecendo os laços históricos com o norte. Este novo cenário vem dando lugar a novas experiências no campo da integração/cooperação regional.1 A ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos de nossa América) e a Unasul (União das Nações Sul-Americanas) são iniciativas diferentes entre si e com características próprias. Se a ALBA inclui uma maior institucionalização e uma forte rede de cooperação técnica e financeira com um viés político, a Unasul tem um caráter estritamente intergovernamental e de institucionalidade baixa,

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Aqui se entende integração como ação voluntária de assumir compromissos e áreas de partilhas ou cessões de soberania a partir de um tratado. A cooperação é uma ação conjunta voluntária.

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garantindo a autonomia dos Estados membros em temas extra-regionais. Em termos econômicos, por não ter compromissos próprios de uma experiência de integração econômica, a Unasul pode acomodar diferentes iniciativas subregionais como o Mercosul e a CAN (Comunidade Andina). Em termos estratégicos, recentemente foi criado em seu interior o Conselho Sul-Americano de Defesa por iniciativa do governo brasileiro. Indagações acerca das características e classificações da Unasul e da ALBA são levantadas. São mecanismos de cooperação ou de concertação política? São orientadas para áreas de investimento e cooperação ao desenvolvimento entre os países da região? Em que medida abarcam a dimensão social? São processos orientados para a construção de bens comuns regionais ou são pensados para evitar danos? Qual é o papel da liderança brasileira neste processo? O principal objetivo aqui é identificar a situação atual das abordagens analíticas e das percepções dos atores políticos sobre os processos de integração na região, analisar estes processos e conectá-los com as abordagens e as visões. Em seguida, o artigo examinará o papel que o Brasil vem desempenhando na evolução destes nos últimos anos. Por se tratar de uma conjuntura nova, e em mutação, este artigo não fornece classificações definitivas, nem traz novas abordagens mas sim aponta elementos para reflexão que poderão ser aprofundados em pesquisas posteriores. Para tanto, vai examinar os modelos mais tradicionais e suas lacunas frente às iniciativas mais recentes, assim como algumas abordagens que buscam introduzir algo de novo; as visões de atores políticos da região sobre a integração regional, definidas a partir de alguns elementos comuns; as experiências regionais em curso; e o papel relevante que o Brasil vem exercendo neste novo cenário. Por fim, a conclusão busca apontar as lacunas e idéias principais que marcam o cenário atual.

Os modelos tradicionais de integração econômica e a contribuição de outras abordagens

As iniciativas de articulação regional na América do Sul receberam um impulso singular com a eleição de diversos governos progressistas na região, mas assumindo padrões diferentes do tradicional e mais difíceis de serem analisadas e compreendidas com os modelos analíticos existentes. Quando se pensa em integração regional, a primeira definição mais clássica que vem em mente é a abordagem desenvolvida por Bela Balassa, na passagem para os anos 60 e diante do início dos processos de integração. O objetivo da abordagem era definir e conceituar a integração econômica, assim como sistematizar as formas

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possíveis de integração neste campo.2 Nesta classificação, Balassa define quatro principais categorias de integração: a área de livre comércio, a união aduaneira, o mercado comum e a união econômica. Estes modelos de integração econômica vêm servindo há muito tempo como padrões para a classificação e explicação das experiências de integração mais tradicionais da região – a ALALC/depois a ALADI, o Pacto Andino/CAN e o Mercosul. São modelos que, por si, repousam na dimensão econômica e, em suas primeiras etapas, mais propriamente na dimensão comercial. O Grupo do Rio, criado em 1986 e atuando como mecanismo de concertação política, poucas vezes foi objeto de atenção dos estudiosos de integração. Durante os anos 70 e 80, com vistas a definir o modelo e a evolução do processo europeu, desenvolveram-se algumas abordagens que, sem descartar as categorias de Balassa propõem diferentes definições e dinâmicas marcadas pela coexistência das dimensões supranacional (entendida como dimensão que está por em

cima

dos

Estados

membros

e

guarda

uma

lógica

do

coletivo)

e

intergovernamental. A perspectiva neofuncionalista defende que a integração ocorre por ser funcional e eficiente. Em si mesma, traz uma tendência ao aumento progressivo da integração de caráter econômico como um processo acumulativo, marcado pela transferência gradual das lealdades políticas para as instituições supranacionais, até atingir a integração política. Para o intergovernamentalismo liberal as decisões mais importantes em matéria de integração regional explicam-se de acordo com os cálculos dos Estados soberanos atendendo aos atores sociais: os interesses econômicos, o poder relativo e a necessidade de compromissos possíveis. A integração seria vista como uma forma dos Estados gerenciarem a interdependência. De maneira geral, por buscarem definir a lógica particular da integração européia, estas abordagens nunca conseguiram explicar as experiências de integração sul-americanas. Enquanto as experiências de integração sul-americanas limitavam-se mais a áreas de livre comércio, a dimensão supranacional não tinha função nas iniciativas de países da região e a interdependência entre estes países não se configurava, estas abordagens não eram adotadas por seus analistas. Atualmente alguns elementos destas perspectivas começam a ser improvisados em um intento de explicar os novos traços destes processos de integração. Durante a década de 90, as iniciativas de integração regional tomaram novo impulso com os exemplos do renascimento da CAN e da criação do Mercosul. Devido ao fato destas iniciativas serem orientadas basicamente para uma melhor inserção das economias nacionais no sistema econômico internacional, estas ficaram conhecidas como o “regionalismo aberto” ou “novo regionalismo”.

2

Bela Balassa, A procura de uma teoria de integração econômica. In: Miguel S. Wionczek (org.), A integração econômica da América Latina. Rio de Janeiro : Edições Cruzeiro, 1966. p.37-48. 3

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O novo regionalismo assumiu características, vinculadas ao processo de globalização dos anos 90, que atuaram como elementos orientadores de seu funcionamento: medidas orientadas para a obtenção de uma economia de mercado mais aberta; expectativa de articulação entre os países com vistas a construir uma economia de escala que possa competir em melhores condições na economia internacional; e a defesa de regimes democráticos pluralistas ocidentais. O novo regionalismo significou a contraparte do liberalismo nos processos de integração regional e orientou as análises das experiências sul-americanas neste período. Desde o início dos anos 2000, porém, algumas condições básicas de seu funcionamento foram postas em xeque. Por um lado, o modelo de abertura das economias nacionais não mostrou os resultados esperados em diversos países na região e foi coexistindo cada vez mais ou sendo substituído paulatinamente por traços de um modelo orientado para políticas industriais nacionais, próximo do neodesenvolvimentismo. Nestes casos, vis compromissos

próprios

dos

processos

de

a vis o exterior, integração

a

regional

adoção de de

caráter

comercialista foi dando lugar a preferências mais cooperativas. Por outro lado, a idéia de criar uma economia regional de escala nunca chegou a ser implementada devido a agentes econômicos nacionais que colocaram obstáculos e ao caráter defensivo dos processos de integração na região. E por fim, o consenso atingido durante

os

anos

1990

sobre

a

importância

dos

regimes

democráticos

representativos ocidentais sofreu mudanças e perdeu relevância em alguns países da região. Alguns governos têm buscado re-construir os respectivos regimes políticos nacionais a partir de novos padrões de inserção de setores até então marginalizados da política. As explicações tradicionais sobre integração deixaram ainda mais lacunas frente a estas transformações. Com vistas a introduzir novas reflexões sobre o tema Andrés Malamud recupera palavras de Ernst Haas que definem a integração como um processo através do qual os Estados “se mesclam, se confundem e se fundem voluntariamente com seus vizinhos de modo tal que perdem certos atributos fáticos de soberania, ao mesmo tempo que adquirem novas técnicas para resolver conjuntamente seus conflitos”, que ajudam por sua vez a se entender a fronteira entre integração e cooperação entre Estados.3 Ele visa ressaltar a dimensão deliberada e de construção estatal de uma comunidade política deste tipo de iniciativa. E diferenciá-la da governança regional, que corresponderia a “mecanismos através dos quais se regulam

3

Citação de Ernst Haas, ‘The study of regional integration: reflections on the joy and anguish of pretheorizing`, in L.N.Lindberg e S.A.Scheingold (eds.), Regional Integration: theory and research. Cambridge, Harvard University Press, p.6, por Andrés Malamud, Conceptos, teorías y debates sobre la integración regional – trabalho apresentado no V Congreso Latinoamericano de Ciencia Política (ALACIP), Buenos Aires, 28-30/jul./2010. 4

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as novas comunidades”. Destaca também a importância de se aprofundar as reflexões sobre o regionalismo multi-nível, como fenômeno pouco frequente que conduz ao convívio entre diferentes experiências de integração regional e que pode produzir impasses entre as instituições próprias destas iniciativas e as sociedades nacionais. Sean Burges, por sua vez, defende que os ganhos dos processos de integração econômica na região anunciados pelas lideranças políticas não correspondem a avanços em termos reais.4 Ele demonstra através de dados empíricos que não existem incentivos econômicos ou demandas domésticas no interior dos Estados da região suficientes para um êxito neste campo. Aponta, porém a possibilidade destes processos receberem impulsos de outro tipo, como vantagens nas áreas de segurança e de energia. Destaca também a importância que o Brasil exerça o papel de paymaster absorvendo os custos da integração e provendo o coletivo de bens públicos necessário para o sucesso de um processo de integração. Outros autores buscam explicar a conjuntura atual dos processos de integração na América do Sul a partir das idéias, ou combinando idéias com interesses.5 Nestas análises, as idéias seriam recursos de poder utilizados por “atores interessados”; o instrumento em lutas políticas que ajudaria certos atores a alcançarem certos objetivos. Desde esta perspectiva, que tipo de percepções sobre a integração regional podem ser identificadas nos atores políticos e econômicos da região? Estas idéias se baseiam nas concepções antigas de Balassa ou nas contribuições de outras abordagens explicativas? Como o novo cenário é percebido e quais as expectativas de seus atores? Visões sobre a integração6

Desde a dimensão política, as visões sobre os processos de integração na América do Sul são muito variadas. Grosso modo, podem ser agrupadas como segue: A primeira visão, que se estruturou no início dos anos 1990, tem como base o pensamento liberal-ortodoxo tanto no campo da economia quanto na dimensão política.7

4

Sean Burges, ‘Bounded by the reality of trade: practical limits to a South American region`, Cambridge Review of International Affairs vol.18 n.3. Outubro/2005, p.437-454. 5 Ver, por exemplo, J. Briceño Ruiz e Miriam G. Saraiva, Las diferentes percepciones sobre la construcción del Mercosur en Argentina, Brasil y Venezuela. Foro Internacional vol.L n. 1(199), México, Colegio de México, 2010. p.35-62, e Tullo Vigevani,, Gustavo de M. Favaron, Haroldo Ramanzini Jr e Rodrigo A. Correia, O papel da integração regional para o Brasil: universalismo, soberania e percepção das elites. Revista Brasileira de Política Internacional Ano 51 n.1. 2008, p.5-27. 6 Esta parte contem fragmentos do artigo de J. Briceño Ruiz e Miriam G. Saraiva mencionado acima. 7 Andrés Malamud. e Pablo Castro, em “Are Regional Blocs leading from nation states to global governance? A skeptical vision from Latin America”. Iberoamericana. Nordic Journal of Latin American 5

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Em termos estritamente econômicos, esta visão defende a abertura indiscriminada da economia, e sugere o desenvolvimento de um menor número de setores produtivos mas que detenham maiores vantagens comparativas e possam ter melhor inserção da economia nacional no mercado internacional. Dá preferência a áreas de livre comércio em detrimento de uniões aduaneiras por identificar as últimas como um obstáculo para as negociações com diferentes parceiros na arena internacional. Neste caso, os acordos comerciais são julgados pelas suas criações e desvios de comércio, e o quanto o acordo favorece uma maior abertura das economias de seus Estados membros frente ao exterior. Em termos políticos, a visão liberal dá preferência a manter com outros países da região relações basicamente econômicas e busca aproximar-se dos Estados Unidos neste campo. O apoio norte-americano para temas de segurança e defesa também aparece como relevante para este grupo. Esta visão foi forte especialmente no Chile, que optou por uma estratégia de projeção individual na economia internacional. Um segundo grupo orienta-se no campo econômico para modelos mais heterodoxos

que

preferem

políticas

estatais

destinadas

a

promover

o

desenvolvimento industrial com enfoques setoriais. Este grupo abarca, porém, interpretações mais variadas no campo econômico e visões diferentes no campo político. Como elemento comum apóiam uma integração regional, mas com diferentes matizes. Nos marcos dos blocos econômicos existentes na região e a partir da perspectiva comercialista, ao contrário dos liberais, os heterodoxos mostraram preferências para uma união aduaneira que daria aos países membros acesso preferencial aos mercados do bloco e fortaleceria a posição destes países nas negociações internacionais. No caso do Mercosul, onde existe uma diferença marcante entre os respectivos parques industriais de seus países membros, os heterodoxos na Argentina

e nos

países

menores

sugerem

maior coordenação de políticas

macroeconômicas no interior do bloco junto com a introdução de uma agenda industrializante. Isto significaria uma integração estratégica de recursos que assegurasse o desenvolvimento dos setores produtivos, junto com a incorporação à agenda do bloco da questão distributiva e de acesso às oportunidades. O fim das assimetrias entendidas como diferenças nas políticas de incentivos para a industrialização seria um passo importante. Trata-se de uma visão pragmática, que defende um modelo que produza benefícios econômicos para o país e onde a institucionalização será bem vinda somente na medida em que aumente sua

and Caribbean Studies vol.37 n.1, 2007, fazem um bom balanço das visões sobre integração existentes na região, classificando-as entre liberais, realistas e progressistas. 6

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eficácia

neste

campo.

Têm

maior

preocupação

com

o

fortalecimento

de

procedimentos técnicos e com a integração funcional. As percepções brasileiras têm características específicas, próprias do tipo de inserção histórica do Brasil na região, assim como do crescimento econômico e da projeção externa que o país vem experimentando desde meados dos anos 1990. A primeira visão, que se situa entre os heterodoxos e os liberais, é mais favorável a uma liberalização condicionada (que não abre mão da política industrializante adotada no período desenvolvimentista). Esta identifica uma integração na América do Sul como um espaço para diminuir os impactos e o próprio ritmo de uma abertura para o exterior, e, em relação ao Mercosul, oscilou nos últimos anos entre, nos piores momentos, a defesa com pouco vigor do retorno a uma área de livre comércio e, em momentos mais favoráveis, a aceitação de uma união aduaneira incompleta. Com a eleição de Lula da Silva este grupo teve sua influência reduzida. Em

termos

político-diplomáticos,

este

grupo

encontrou

identidade

principalmente nos marcos dos institucionalistas pragmáticos do Itamaraty, que se caracterizaram por dar maior importância ao apoio do Brasil aos regimes internacionais em vigência. No que diz respeito à institucionalidade do Mercosul, esta visão aproxima-se dos pragmáticos na Argentina: a institucionalização só será bem vinda na medida em que potencialize a capacidade do bloco de produzir benefícios no campo econômico. Os brasileiros desenvolvimentistas –de corte mais propriamente heterodoxobuscam a integração econômica como mecanismo de acesso a mercados externos e de projeção das empresas nacionais, assim como um canal de projeção e fortalecimento nas negociações econômicas internacionais. Sua maior identidade na esfera diplomática dá-se com a corrente autonomista, que defende uma projeção mais autônoma e ativa do Brasil na política internacional e que busca um papel de liderança brasileira assertiva na América do Sul. Percebem a integração sulamericana sob a liderança brasileira como prioridade e consideram importante a ampliação do Mercosul. No entanto, a base do regionalismo aberto do Mercosul e seu caráter mais comercialista são criticados por este grupo. O “desenvolvimento” é apontado como matriz para um processo regional de integração. O maior destaque é dado à possibilidade

de

implementar

projetos

brasileiros

de

desenvolvimento

de

infraestrutura e projeção industrial. Dentre os novos governos anti-liberais eleitos após o ano 2000, vem se estruturando uma visão neodesenvolvimentista, de caráter também heterodoxo, que busca estabelecer uma política industrial mais ativa orientada para a estruturação de um parque industrial nacional. O reflexo desta estratégia

7

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econômica no processo de integração navegou entre duas alternativas. Por um lado, colocou uma expectativa do estabelecimento de um tipo de articulação econômica com o Brasil, que viria acompanhada de um aumento de eficiência no processo de integração de infraestrutura. Mas, por outro lado, o modelo econômico nacionalista e neodesenvolvimentista junto com o pouco avanço no sentido de organizar políticas para lidar com as assimetrias frente à projeção brasileira deu argumentos a outro grupo no interior desta corrente que se preocupa com a dimensão excessiva da economia brasileira, e defende o estabelecimento de mecanismos defensivos no campo econômico frente ao vizinho maior. Esta corrente prioriza um modelo mais cooperativo que integracionista que evite compromissos econômicos de longo prazo vis a vis o exterior. Esta visão tem mais espaços em países como a Argentina, que podem atuar como países barganhadores ou desafiantes externos no cenário regional.8 A visão progressista, por sua vez orienta-se para a dimensão política.9 O processo de integração, neste caso, tem uma perspectiva de longo prazo de caráter estratégico vis a vis terceiros Estados. Este grupo entende que o processo de integração fortaleceria a posição da América do Sul no concerto de nações. Propõe um processo de integração cuja base seja uma identidade comum no qual a ênfase estaria na participação da sociedade civil e no fortalecimento da parte institucional. Sem se perfilar ao neofuncionalismo e desde outro ponto de vista, vê a institucionalização como um incentivo para a integração. Sua origem está em acadêmicos e lideranças políticas ligadas a partidos progressistas com um histórico de atuação internacionalista. Uma visão diferente –a bolivariana- vem desenvolvendo-se no interior da Venezuela no decorrer da década. Por definição, a Venezuela é um país também caribenho, o que faz com que esta visão tenha uma concepção diferente da América do Sul. Estes pensadores mostram preferência por criar um tipo de Confederação Latino-Americana, que teria um conteúdo majoritariamente político. A partir de 2004 torna-se clara a percepção da integração por este grupo como instrumento anti-liberal e anti-norte-americano, junto da idéia de aprofundar o “processo revolucionário” em suas dimensões tanto interna quanto externa. Esta perspectiva defende a dimensão política com vistas a criar um bloco de poder que assegure aos países sul-americanos maior poder e autonomia nos cenários globais.

8

A definição de país barganhador vem dartigo de David Myers, Threat perception and strategic responses of regional hegemons: A conceptual overview, in D.Myers (org.), Regional Hegemons: Threat perceptions and strategic responses. San Francisco, Westview Press, 1991. As outras classificações do autor são: o Estado aspirante à hegemonia, os Estados dependentes e os Estados desafiadores externos. 9 A classificação como progressista desta visão foi introduzida no artigo de Malamud e Castro, citado anteriormente. 8

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Neste caso, a dimensão econômica da integração vem subordinada à dimensão

política

e

é

criticada

por

ser

considerada

uma

expressão

do

“neoliberalismo selvagem” identificado como responsável por um incremento da dependência regional. Para esta visão, a integração pode se afastar da dimensão econômica e comercial e centrar-se nos aspectos políticos, ideológicos e militares. Este seria o início da denominada “integração bolivariana”, que busca promover a eqüidade, a igualdade, a lealdade e a unidade de propósitos. Estas idéias encontraram ecos também na Bolívia e no Equador.

Cenário atual

Atualmente existem 3 iniciativas de integração/cooperação na América do Sul –Mercosul, CAN, Unasul- junto com outras que incluem países de toda a América Latina. Dentre as últimas, a ALBA é importante de ser vista por condensar uma das visões atuais sobre integração regional. O Grupo do Rio e a Comunidade de Estados da América Latina e Caribe (Celac), por representarem mecanismos de concertação política com institucionalidade muito baixa não serão incluídas na análise. A Comunidade Andina atualmente está bastante desarticulada. Criada em 1993 a partir de um reordenamento do Pacto Andino, a CAM conseguiu consolidar uma área de livre comércio entre seus países membros somente em 2006. Neste mesmo ano, porém, em função da ascensão de governos de esquerda no Brasil, Argentina e Uruguai e da decisão do Peru e da Colômbia de negociar um tratado bilateral de livre comércio com os Estados Unidos, a Venezuela solicitou de saída do bloco e endereçou seu pedido de entrada como membro pleno no Mercosul trazendo uma baixa ao grupo. Originalmente, a previsão da institucionalidade da CAN previa a formação de uma dimensão supranacional através do Parlamento Andino mas, na prática, mantém-se até hoje como uma iniciativa intergovernamental. A predominância nos governos da Colômbia e do Peru da visão liberal obstacularizou a formação de uma união aduaneira (prevista no tratado de formação) e deu lugar a uma área de livre comércio entrecortada por tratados de livre comércio bilaterais dos dois países com os Estados Unidos. As negociações com a União Européia para a assinatura de um acordo de livre comércio estão empacadas. Bolívia e Equador, por sua vez, optaram pela visão bolivariana e fazem parte também da ALBA. E os quatro países são associados ao Mercosul. Os problemas do regionalismo multi-nível neste caso se fazem presentes e não tem um país que assuma internamente o papel de paymaster.

9

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O Mercosul é uma união aduaneira incompleta de caráter estritamente intergovernamental. Criado em 1991, a percepção predominante entre os analistas de temas regionais é que as expectativas de evolução iniciais não se concretizaram. Durante sua primeira década, o convívio de uma visão entre a heterodoxia e o liberalismo tanto no Brasil (com os institucionalistas pragmáticos) quanto na Argentina (com o convívio entre os liberais e os heterodoxos pragmáticos nos quadros do governo), o bloco avançou nas áreas aonde produzia maiores ganhos econômicos

–o

comércio

intrabloco-

e

com

baixa

institucionalidade.

A

desvalorização cambial de 1999 interrompeu este processo por introduzir nas relações comerciais um fator de desequilíbrio entre os dois principais parceiros – a difícil equação entre câmbio e exportações. A partir da crise argentina de 2001 e, sobretudo, depois das eleições de Lula e Néstor Kirchner o equilíbrio político nos dois países foi modificado. Nos dois casos, o convívio entre os heterodoxos tanto pragmáticos quanto progressistas foi estabelecido em detrimento dos liberais, embora com diferenças entre si. O governo de Lula reflete a coexistência das correntes autonomista/pródesenvolvimentismo e progressistas. Esta combinação articula, por um lado, a visão autonomista formulada basicamente no Itamaraty que percebe a integração sul-americana sob a liderança brasileira como objetivo e, para tanto, prioriza uma ampliação do Mercosul através da entrada de novos Estados ou da formação da Unasul. Sua prioridade não é o comércio, mas sim o desenvolvimento. A provável entrada da Venezuela como membro pleno atende a esta perspectiva. Este grupo busca manter um equilíbrio econômico no interior do Mercosul que favoreça os projetos brasileiros de desenvolvimento de infraestrutura e projeção industrial. Por outro lado, os progressistas são favoráveis ao aprofundamento do processo de integração em termos políticos e sociais. Na Argentina, Kirchner adotou uma estratégia neodesenvolvimentista de caráter heterodoxo, buscando estabelecer uma política industrial mais ativa orientada para a recomposição do parque industrial. Esta estratégia recolocou a expectativa do estabelecimento de uma coordenação de políticas macroeconômicas e cambiais com o Brasil. Mas o fracasso desta expectativa cedeu lugar a preocupações com a dimensão da economia brasileira, e ao estabelecimento de mecanismos defensivos e de comércio administrado. Os progressistas conseguiram, nos dois casos, ter influência sobre as dimensões institucional e societal do Mercosul. A entrada em vigor do Protocolo de Olivos e a formação do Parlamento são resultantes desta perspectiva. Na dimensão intersocietal o nível de integração atingido em parte dentro do Mercosul -sobretudo

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entre Brasil e Argentina- é significativo. A cooperação entre diferentes ministérios em setores como educação, cultura, energia e agricultura cresceu nos últimos anos. O processo ainda inconcluso de admissão da Venezuela como membro pleno do bloco atendeu a formuladores argentinos preocupados com o peso crescente da liderança brasileira, aos autonomistas que buscam a ampliação do bloco, e aos progressistas de defendem maior aproximação com os governo anti-liberais da região. Mas empacou, sobretudo, nos limites da visão bolivariana que tinha expectativas de reformular o caráter econômico do Mercosul. Em termos propriamente econômicos, a área de livre comércio e a tarifa externa comum vêm sendo perfuradas e os investimentos no bloco vêm deixando de ser atrativos para agentes econômicos. Mas, de qualquer forma, a idéia da união aduaneira incompleta segue, e os demais países latinos da região são associados ao bloco em termos comerciais. A dimensão supranacional não está ainda contemplada – apesar da criação do Parlasul- e o Brasil, vem, progressivamente, ocupando em parte o papel de paymaster no bloco através da criação do Focem. A ALBA surgiu como alternativa à Área de Livre Comércio proposta pelos Estados Unidos para a região, e busca atender à visão bolivariana mencionada. Seu caráter é prioritariamente político e sua proposta é de formar uma identidade entre países que partilham ideais políticos e estratégias de desenvolvimento econômico, prioritariamente anti-liberais. Em função do perfil também caribenho da Venezuela, seu arco de ação orienta-se para América Latina e Caribe, e não apenas para a América do Sul. Seu processo de institucionalização começa em 2004 e atualmente possui uma institucionalidade própria. Tem como órgãos o Conselho de Presidentes, o Conselho de Chanceleres, uma coordenação permanente que administra os projetos e comissões setoriais. O Banco da ALBA também é importante de se destacar. Sua operacionalização se dá através de tratados de comércio entre seus países membros, junto com empresas estatais mistas (as grannacionais) e projetos coletivos orientados para os países de menos recursos financeiros e técnicos. Estes projetos incluem a troca de bens e serviços, o aproveitamento de vantagens comparativas

preexistentes,

convênios

para

facilitação

de

pagamentos

e

transferência tecnológica. Esta diplomacia baseia-se em recursos provenientes do petróleo venezuelano e na ação clara da Venezuela como paymaster, junto com um papel central também de Cuba que entra com contribuições nas áreas de saúde e educação. Através do discurso da solidariedade e de benefícios concretos para os países menores, cria um núcleo em torno do projeto de socialismo venezuelano. Dentre os sul-americanos, fazem parte da ALBA também a Bolívia e o Equador. Dentro das definições tradicionais, não se enquadra em nenhuma das classificações

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de

Balassa

de

etapas

da

integração

econômica,

e

tem

um

caráter

intergovernamental, não incluindo uma dimensão supranacional. É importante destacar seu modelo cooperativo e um tipo de integração –no sentido da formação de

uma

rede

que

perpassa

áreas

não-econômicas-

que,

embora

inclua

compromissos para o futuro, não prevê partilha de soberania. A Unasul tem um perfil diferente das outras três iniciativas e se aproxima mais de um instrumento de governança regional que dos padrões clássicos de integração. Em 2000, o presidente Cardoso organizou uma primeira reunião em Brasília com os governantes da região com vistas à formação de uma comunidade sul-americana. A partir da eleição de Lula, a diplomacia brasileira concentrou esforços mais diretos na sua institucionalização (formalizada em 2004). A I Reunião dos Chefes de Estado e Governo dos países da CASA, em 2005, estabeleceu como agenda prioritária as assimetrias entre seus países membros, e foram tratados temas como o diálogo político; a integração física; meio ambiente; integração energética; mecanismos financeiros sul-americanos; promoção da coesão social. Isto demonstra seu perfil cooperativo que congrega iniciativas de cooperação técnica e financeira com países da região, assim como uma atuação importante no campo político. Em 2008 a CASA evoluiu para Unasul, que tem um caráter estritamente intergovernamental e de institucionalidade limitada. Conta, de forma semelhante à ALBA, com o Conselho de Chefes de Estado e Governo, Conselho de Chanceleres, Conselho de Delegados e uma secretaria geral, junto com alguns conselhos setoriais. Em termos econômicos, por não ter compromissos de uma experiência de integração regional específica nem se enquadrar em nenhuma das classificações de integração econômica, pode acomodar diferentes iniciativas subregionais como o Mercosul, a CAN e mesmo a ALBA. Nos

últimos

anos

a

Unasul

vem,

progressivamente,

unificando

comportamentos dos países da região. Vem desempenhando um papel importante frente às situações de crise no continente; seja de política doméstica (como no caso da Bolívia) ou de relações de fronteira (como no caso de Venezuela e Colômbia). A criação do Conselho de Defesa Sul-Americano em seu interior, por iniciativa do governo brasileiro, tem contribuído para maior aproximação entre os países da região no campo militar, assim como colocou o Brasil no centro da agenda de segurança regional.10 Vis a vis outros continentes, a Unasul já é reconhecida como canal de diálogo com a região por outros atores. Já existem dois diálogos interregionais

10

Sobre este tem ver Mónica Hirst, ‘A presença do Brasil nos novos tempos da agenda inter-americana`, Análise de Conjuntura n.5, maio/2009. Disponível em http://observatorio.iesp.uerj.br/analises.php. 12

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estruturados em seus marcos –América do Sul-África e América do Sul-países árabes- e, no caso da União Européia, já existe um reconhecimento por parte de formuladores europeus da importância de se estabelecer um diálogo UE-Unasul.11 Pode ser considerada, então, uma novidade, com um perfil diferente das outras iniciativas, que acomoda diferenças e que pode dar uma contribuição importante para a consolidação de um governança regional.

Papel da liderança brasileira

Dentro deste cenário incerto, e que abre perspectivas para um novo ordenamento, o Brasil vem desempenhando um papel relevante no sentido da integração/governança

regional.

Sean

Burges

observava,

em

2005,

que

o

regionalismo sul-americano precisaria de um líder que exercesse o papel do paymaster.12 A diplomacia brasileira vem assumindo progressivamente este papel e, sobretudo, orientando seu comportamento para a formação de consensos entre diferentes. No entanto, prioriza, de forma não-explícita, a construção de uma governança regional em detrimento de concepções mais tradicionais do que se entende por integração. Na política externa do governo de Lula um ordenamento da América do Sul sob a liderança brasileira passou a ser considerada prioridade política, e seria possível enquadrá-la em termos de idéias, em uma articulação entre os aqui identificados

como

autonomistas

desenvolvimentistas

e

os

progressistas.

A

aproximação com os países vizinhos é percebida como o caminho para melhor inserção internacional, mas que possibilita a realização do potencial brasileiro e a formação de um bloco capaz de exercer maior influência internacional. Com este objetivo, a diplomacia brasileira deu um novo peso à construção de uma liderança brasileira na região com padrões calcados no reforço do multilateralismo. Atualizou os princípios da não intervenção na forma da “não-indiferença” e incluiu em sua agenda um projeto de construção de uma liderança regional articulando os processos de cooperação e integração regional às perspectivas e ao impulso do desenvolvimento brasileiro.13

11

Esta possibilidade vem sendo debatida por acadêmicos e foi examinada por diplomatas espanhóis durante a presidência da Espanha. 12 Sean Burges, 2005 – obra citada anteriormente. 13 A “não-indiferença”, ressaltada por Celso Política Externa do Governo Lula: os dois primeiros anos. Análise de Conjuntura, Observatório de Política Sul-Americana, 04/mar./2005. Disponível em http://observatorio.iesp.uerj.br/analises.php Acesso em 29/out./2010, representa uma articulação entre a não-intervenção e relativo nível de ingerência em questões políticas de outros países aproximando-se de padrões normativos mais gerais vigentes na atual ordem internacional.

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Análise de Conjuntura | n.7 | jul. 2010

Para os pensadores autonomistas e desenvolvimentistas, a aproximação com os países da região abre novas perspectivas para a projeção das indústrias brasileiras na medida em que estas possam ocupar espaços vazios decorrentes das limitações das indústrias dos países vizinhos. A Estratégia Nacional de Defesa (que incentivou a criação do Conselho Sul-Americano de Defesa) do governo de Lula tem uma clara orientação para o desenvolvimento da indústria nacional na área de defesa. Em termos gerais, a diplomacia de Lula introduziu no leque das iniciativas externas brasileiras uma estrutura complexa de cooperação com países da região dando prioridade à cooperação técnica e financeira e ao bilateralismo. Os investimentos na região e financiamento de obras de infraestrutura têm crescido e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) começou a dar financiamentos para estas obras, alavancadas pela IIRSA e com vistas a desenvolver

uma

infraestrutura

regional.

A

cooperação

técnica

tem

sido

implementada em setores como os de Educação, Agricultura, Ciência e Tecnologia e Saúde. Estas iniciativas contribuem para o avanço da articulação com os países vizinhos

em

áreas

não-comerciais,

que

não

vinham

mostrando

resultados

significativos, e reforçam o processo de regionalização do continente. A atuação brasileira nesta área, porém, tem convivido com algumas tensões. Sentimentos nacionalistas nos marcos dos processos internos de mudança em alguns países vizinhos vêm desafiando a posição brasileira e reivindicando concessões no campo econômico. A cobrança de que o Brasil cumpra plenamente o papel financeiro do paymaster é forte, ao mesmo tempo em que a liderança brasileira é contestada em dimensões extra-regionais.14 Como resposta, o governo brasileiro tem dado passos importantes em termos domésticos no sentido de maior articulação política em torno do projeto de liderança na região, que se reflete na formação de uma coalizão mais favorável à disposição brasileira de arcar com alguns custos da integração sul-americana. O debate tornou-se público e já existe uma associação entre a liderança brasileira e seus custos por parte de membros das agências de governo. Pensadores da visão progressista tiveram influência neste comportamento vendo a cooperação como elemento positivo, incentivando os esforços de construção de uma identidade sulamericana e orientando no sentido de maior aproximação com os países cujos governos são identificados também como progressistas. 14

Em ‘Leadership without followers: the contested case for Brazilian power status’, in E.de R. Matins e M.G.Saraiva (eds.), Brasil-União EUropéia-América do SUl. Anos 2010-2020. Rio de Janeiro, Fundação Konrad Adenauer, 2009, p.126-149, Andrés Malamud aponta para reações contrárias dos países da região materializadas em negativas frente a candidaturas brasileiras para cargos eletivos em organizações internacionais. O autor tem buscado identificar qual é o papel da liderança na construção e manutenção de organizações regionais multi-nível. 14

Análise de Conjuntura | n.7 | jul. 2010

Para implementar este projeto, a estratégia de consolidação da CASA teve um papel importante. A partir da eleição de Lula, a diplomacia brasileira concentrou esforços mais diretos na sua institucionalização. Sua passagem para Unasul foi resultante de pleitos do governo venezuelano articulados com a disposição política do governo de Lula. Atualmente, a organização vem sendo seu principal canal de ação multilateral. Trata-se de um mecanismo que ressalta a dimensão política da política brasileira para a região e através do qual a diplomacia brasileira vem atuando com vistas a construir consenso entre os países vizinhos frente a situações difíceis, e buscando sempre ocupar o papel principal em seu interior.

À guisa de conclusão

À guisa de conclusão, seria interessante destacar, em primeiro lugar, o papel que a Unasul vem exercendo atualmente na região. Tem tido um desempenho agregador

e tem contribuído para a solução de situações de crise que, sem um

marco institucional consolidado, poderiam ter resultados prejudiciais ao continente. A UNASUR não representa um tipo de integração econômica (campo no qual a interdependência existente entre os países é ainda pequena) mas tem aberto caminhos para uma articulação político-estratégica importante. A Unasul como mecanismos de formação de consensos tem podido acomodar visões diferentes sobre integração, experiências de integração econômica, países individuais e um projeto de formação de identidade com a ALBA. O governo brasileiro, com vistas a construir uma liderança na região, tem dado um incentivo político importante para o funcionamento da Unasul. Ao mesmo tempo, vem atuando em diferentes áreas de cooperação aprofundando o processo de regionalização no continente. Assim, embora não tenha um perfil tradicional de processo de integração, este movimento de articulação e cooperação entre os países da região tem um paymaster. Na prática, a construção de uma governança regional necessita de um ou dois países que trabalhem neste sentido para ter êxito. Os processos de integração da década de 1990 repousavam então em expectativas de que iriam se desenvolver seguindo as etapas de integração econômica sugerida por Balassa e, mais adiante, iriam incorporar uma dimensão supranacional.

No

entanto,

assumiram

diferentes

percepções políticas que se consolidaram

na

formatos

região na

baseados

em

década de 2000,

incorporando outras dimensões e prioridades. É colocada, então, a questão conceitual, que atualmente está em aberto. O convívio entre diferentes visões da integração e diferentes iniciativas –de caráter político ou econômico- que em muitos casos se sobrepõem ressalta a importância

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para se pensar em termos de um regionalismo multi-nível. Por outro lado, a articulação entre os países da região em diferentes dimensões como a energética, de infraestrutura, de educação, ciência e tecnologia, e outras aponta para a necessidade de se formular novos modelos explicativos da integração regional que dêem conta da atual conjuntura sul-americana.

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