Intervisão - Intervenção na Empregabilidade de Pessoas com Situações sociais complexas

June 7, 2017 | Autor: Isabel Passarinho | Categoria: Professional Development
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Intervenção na Empregabilidade de Pessoas com Situações Sociais Complexas – Refletir (me) e Fazer perguntas; ou como construímos um trajeto de Intervisão “Como aprender a ler? Num primeiro tempo, dizia João dos Santos, é preciso aprender a «ler» o espaço e o movimento – o que vamos vendo quando nos deslocamos; como mais tarde passaremos os olhos pela folha escrita. Depois, contar o que se viu na deslocação à praia e o que observamos, vivemos e pensamos. Ler o mundo, relatar a experiência – objetiva e subjetiva. (…) «Dar-se a conhecer» ao sujeito e observar era para ele a regra de ouro da entrevista psicoterapêutica (…). Se queremos (…) não apenas desativar resistências e desmobilizar defesas, mas principalmente descobrir potencialidades não reveladas teremos de agir brincando com a experiência e gozando com o conhecimento. «Se não sabe porque é que pergunta?» - interrogava/interrogava-se João dos Santos. Se não sabe, investigue! (…) A melhor resposta, diz quem sabe, é outra pergunta”. In Coimbra de Matos. 2007. Vária. Existo porque fui amado. Climepsi Editores. Coimbra

Índice 

Como foi que se organizou?



As sessões - As paredes pretas da sala do farol de Santa Marta - Na casa das Histórias - Na Pastelaria Ribeiro - Na Esplanada do Cascais Vila - Na Casa de Santa Maria - Na esplanada do Parque Marechal Carmona - No Restaurante 100 Vícios - No Centro de Interpretação Ambiental da Duna da Crismina - No CIAPS em S. Pedro



Como pode ser a Intervisão? - A noção de propósito - A construção da confiança - O desenho das sessões - Liderança partilhada e cooperação - A dimensão auto formativa



Nota Conclusiva

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““O que estamos de facto a fazer?”. Esta questão inicia um processo de compreensão não linear, em que novos insights podem surgir. Espaço em branco é um conceito na literatura que indica o branco entre as linhas que fazem parte do texto; é uma metáfora para a fase de transição entre a ordem e a surpresa que é inerente ao processo de compreensão não-linear. A Intervisão é um método adequado para facilitar estes processos de compreensão não-linear. É uma forma de trabalho em que os pares, numa base mútua, fornecem feedback crítico e apoiante no intuito de melhorarem as suas competências profissionais”. In Van Emmerik. 2012. Espaço em branco, Intervisão e Agência partilhada.

A equipa do Programa de Promoção Agrícola e Ambiental quis partilhar a experiência do 1º ciclo de Intervisão na DPRE. Sem uma história única. Com tantas narrativas quantos os intervenientes. Com pontuações que tocaram cada um/a em especial.

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Como foi que se organizou? O ciclo decorreu de janeiro a agosto de 2014, num total de 09 sessões. Quatro destas sessões foram de dia inteiro e as restantes de meio-dia, num total de aproximadamente 33h de trabalho.1 A calendarização e a definição de espaços foram as primeiras tarefas coletivas. Tomar a decisão de que a Intervisão acontecesse num espaço diferente do espaço corrente de trabalho foi primordial. Os requisitos da escolha foram : i) lugar sossegado que permitisse uma conversa com recato; ii) lugar com boa acessibilidade e a curta distância; iii) lugar sem custos nem processos de autorização complexos. Acautelar um ‘setting’ especial para este trabalho foi decisivo. Porque ao cortar com os estímulos e as arrumações habituais abrimos espaço(s) para nos pensarmos. Outro aspeto fundamental foi a equipa ter expressado a necessidade. Ter feito o pedido. Quando isso acontece provavelmente as pessoas já conversaram sobre o assunto, já garantiram que é seguro partilhar dúvidas e já produziram algum consenso sobre quais as questões que querem aprofundar. Por mais que um pedido desta natureza tenha significados e ambivalências particulares para cada um/a dá um sinal de que existe maturidade profissional suficiente para as exigências do processo. No caso o ‘pedido’ teve muitas camadas. 1

Em qualquer das modalidades todas as pessoas passavam primeiro pelo serviço para assegurar a resolução de assuntos urgentes.

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Era evidente para todos que o programa de acompanhamento e formação já testado com outros públicos em situação de desemprego exigia grandes adaptações com estas pessoas. E isso estava a ser feito. Estava em curso toda uma adaptação de linguagens, de técnicas e de ativação de recursos na rede territorial. Por tentativa e erro. Como é suposto ser. O pedido da equipa à facilitação da intervisão começou por ser «o apoio» para refletir e abordar os problemas complexos (alcoolismo, doença mental, detenções,..) dos participantes no Programa. Ao pedido inicial foram acrescentando a necessidade de «reforçar ferramentas de intervenção», de se «refletirem» no trabalho que faziam e no eco que esse trabalho tinha em cada um/a e na equipa como coletivo, de «ajudar a pensar» sobre a casuística e o processo de intervenção e formação mas também sobre a sua satisfação e perceção da eficácia. Entendo a Intervisão como um processo auto formativo de equipa. No meu posicionamento de elemento que está a facilitar o processo reflexivo entendo que se pode ampliar as possibilidades de compreensão e de escolha mas sobretudo procurei centrar na equipa o processo de capacitação e de tomada de decisão.

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As sessões As paredes pretas da sala do Farol de Santa Marta Recordo a intensidade da 1ª sessão numa tarde de Janeiro. Provavelmente aquela sala também contribui para a exposição de cada elemento da equipa e para a criação de um clima de respeito e confiança. Surgiram dúvidas. Surgiram versões diferentes dos problemas. Partilharam-se medos. Medo de não saber o suficiente, de não ter especialidade no campo onde se estava a intervir. Medo de não ser útil. Falámos de perspetivas. De que provavelmente ninguém conseguiria ser ‘especialista’ de situações tão complexas. Foram partilhados os primeiros três casos que preocupavam os técnicos. 2

O Alfredo é descrito como um homem rustico, com poucas habilitações, pai atento, respeitoso e cumpridor e com percurso laboral na construção civil. A preocupação do técnico é expressa pela falta de competências de comunicação. O Alfredo não fala nem interage com os outros elementos do grupo, nem parece capaz de grande assertividade na procura ativa de emprego – o que pode comprometer a sua integração profissional após o tempo do programa. O Ernesto é cabo-verdiano, competente e responsável no trabalho mas muito fechado sobre a sua vida. Pouco se sabe dele A preocupação é expressa pela consumo excessivo de álcool e pela pouca informação sobre o seu percurso laboral, de vida e de rede familiar e/ou social. O Jaime tem um percurso laboral como funcionário de empresas de segurança mas atualmente não tem um projeto de trabalho. Preocupa o técnico pela dependência (emocional e financeira) da sua mãe. Não consegue encontrar uma hipótese que seja a ‘mola’ para o fazer ‘sair do sofá’ e querer alguma coisa.

Quando se seleciona e se faz a narrativa de um caso num círculo desta natureza já se faz um trabalho reflexivo sobre a situação e sobre as dificuldades que nela se encontram. Depois as perguntas, as hipóteses e/ou as sugestões dos outros criam campos de possibilidades. Pensando em conjunto e apoiando. Mais que não seja as dificuldades foram expressas em voz alta, partilhadas. Existe quem defenda que quando enunciamos um problema, já estamos a caminho da solução. Sobretudo na conceção de que os problemas dos participantes do Programa (que eles colocam aos técnicos) são de ordem diferente dos problemas dos técnicos, que se defrontam com pedidos e situações para as quais não encontram soluções. Às vezes, nem conseguem fazer leituras que caibam nos seus padrões de vida. Às vezes experimentam pensamentos e sentimentos que não encaixam… Levámos mais histórias à casa das Histórias A segunda sessão decorreu em dia inteiro, ainda em Janeiro. A equipa estava mais confiante e tolerante com as diferenças de perspetivas, trouxe mais situações: o José Pedro e o Ilídio. A propósito das descrições destas situações e das dificuldades expressas, refletimos sobre os casos com a dupla intenção de melhorar a intervenção e de identificar possibilidades de adequação para a formação. De tarde, refletimos sobre as situações do Bernardo, do Julião e do Óscar.

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Nome fictício. Todos os nomes utilizados são fictícios para proteger a identidade dos participantes. Os breves apontamentos das suas histórias servem apenas como forma de os introduzir de maneira mais óbvia nesta narrativa.

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As narrativas das histórias ficam cada vez mais ricas de informação, mais complexas. Com mais sentimentos à mistura. Por momentos, poderia imaginar que eram aquelas pessoas que estavam ali também a conversar connosco. Respeitosamente. A pensar em possibilidades. O Bernardo que viveu 4 anos na rua, vive só e não conta com ninguém, é bom trabalhador, pontual e acalenta o sonho de voltar a trabalhar com ar condicionado. Para ele este Programa foi uma reativação da sua inclusão e pertença social. Será que o tempo do PPAA será suficiente para que ele retome a sua vida com dignidade? Eugénio tem quase 40 anos, é doente crónico e já teve um episódio de transtorno mental. Também é um bom trabalhador, cumpridor, retira bem-estar do Programa e leva-o muito a sério. A equipa preocupa-se, entre outros aspetos, com o desajuste entre o feedback do coordenador e a auto perceção do participante. Equacionam-se possibilidades ao nível do emprego protegido após o tempo do programa. Óscar é guineense, oriundo de uma família de elite no país de origem, veio estudar para Portugal. Trabalhou e viveu de forma abastada mas após um incidente crítico perdeu tudo, ficou na pobreza e está impossibilitado de voltar à Guiné. Considera-se em reabilitação e a fé parece ter um papel fundamental neste processo.

São expressas algumas dificuldades de mobilização – como poderá aquela pessoa sentir-se novamente capaz de voltar a lutar por aquilo que quer? Como poderá voltar a acreditar em si? Que sentimentos é que estas situações provocam em nós? Refletimos ainda sobre:  o valor do erro. De que forma as situações em que acontece o reconhecimento do erro, são significantes e potenciadoras de ajustes e melhorias. Para que não volte a acontecer da forma como aconteceu. O que podemos melhorar? A existência do erro é consistente com processos de inovação, onde a intervenção não pode ser inteiramente planeada à partida e onde a abordagem da complexidade (por tentativa e erro) é aconselhável. Na medida em que permite melhores ajustes com maior rapidez, adequando o tempo de reação.  o papel da equipa na interação com os coordenadores de terreno. Quais são os problemas? O que pode ser melhorado? Será que podemos trabalhar melhor o aumento da tolerância à diferença entre o grupo de participantes? Será que pode ser organizado o trabalho de outras formas? Em alguns caos, com maior decomposição de tarefas? Na Pastelaria Ribeiro A terceira sessão (ainda em Janeiro) foi de duas horas e incidiu sobre instrumentos técnico metodológicos. Falámos de algumas situações dos participantes e ponderámos a utilização do historiograma como técnica de registo para as histórias profissionais e de vida. Equacionamos a utilização de alguns instrumentos e técnicas para desbloquear narrativas rigidificadas das histórias dos participantes. Tivemos algumas dificuldades com a escolha do local. O que inicialmente nos pareceu sossegado tornou-se movimentado com a aproximação do período de almoço e não resultou em boa escolha. Em itinerância por um café sossegado e a esplanada do Cascais vila Depois da intensidade do mês de janeiro com 3 sessões, a quarta sessão decorreu em dia inteiro no final de Fevereiro.

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A equipa trouxe 2 formadores externos para podermos conversar em conjunto sobre a última sessão de formação, que foi sentida por eles como difícil; sobretudo devido ao desinteresse manifestado por alguns participantes. Limitei-me a facilitar o debate que foi bastante interessante e frutuoso. Foram tomadas decisões sobre a necessidade de melhorar os diagnósticos individuais e de rever a sequência das formações temáticas. Num segundo momento, já sem os formadores externos, tentámos outro local. Conversámos sobre alguns casos e sobre estratégias a utilizar com a reunião de coordenadores. Começou a inscrever-se em mim um sentimento muito forte de pertença a este grupo. Onde me pareceu condição necessária respeitar a cultura desta equipa e a fluidez de assuntos, as diferentes sensibilidades, a riqueza das partilhas e dos conhecimentos dos colegas. Os silêncios. As frustrações e as alegrias. Se bem que nem sempre tivesse tido um sentimento de ser útil. Ou seja, apesar de defender que o espaço-tempo de intervisão pode servir para «desencravar» situações que parecem sem saída, partilhar e alterar perspetivas, qualificar processos, realizar task force a propósito de alguns assuntos mais complexos e dar contributos para produzir evidências sobre a intervenção, aprendi a respeitar os tempos e ritmos próprios da equipa – e vivenciar isso é uma oportunidade especial. Na Casa de Santa Maria A quinta sessão aconteceu quase um mês depois, em março e foi de dia inteiro. A agenda foi marcada pelo debate sobre o posicionamento dos técnicos, pela intercessão entre serviços com diferentes poderes e entendimentos, pela análise dos conteúdos do trabalho na horta e na floresta e pela relação com a coordenação operacional. Falamos sobre estratégias de atuação com estes clientes internos e sobre a necessidade de dar visibilidade aos resultados de produtividade e de integração dos participantes. Começámos a desenhar um evento de visibilidade positiva para marcar o encerramento do Programa. E falámos também de alguns casos que, a propósito da aproximação do final do Programa, deixavam maiores angústias nos técnicos sobre as suas condições e estratégias de empregabilidade. Foi um dia de trabalho bastante produtivo. Na esplanada do Parque Marechal Carmona A sexta sessão decorreu numa tarde de Abril. A aproximar-se o final do programa para o atual grupo de participantes e o início previsto de um novo ciclo, a agenda da equipa estava centrada (1) na construção de uma narrativa para preparar o fecho do programa, (2) em consolidar as alterações ao modelo de formação, (3) e na gestão do conflito de interesses e perspetivas entre a equipa e a coordenação operacional dos homens que participavam no Programa. Começou a desenhar-se como possibilidade a realização de um documento escrito sobre a riqueza desta intervenção – ao nível dos resultados do trabalho realizado pelos participantes, ao nível dos resultados na sua empregabilidade e inclusão social e também ao nível das aprendizagens da equipa técnica. 6/9

Começa a ser muito notória a satisfação da equipa e o auto reconhecimento pelo trabalho realizado. Combinámos começar a escrever sobre a experiência de intervisão. No Restaurante 100 Vícios A sétima sessão decorreu num dia inteiro, embora a equipa tenha estado de manhã na esplanada do Museu Paula Rego e seguido para almoço e restante tarde no restaurante do centro de Cascais. À medida que o processo avançava a equipa ia colocando na sua agenda mais questões do projeto de intervenção como (1) Regulamentos, normas e procedimentos, (2) as sugestões para a última formação temática, (3) a exposição final, fecho do Programa e início de novo Programa e (4) a formação dos coordenadores. Pelo meio a reflexão sobre determinado participante considerado «o mais estranho entre os estranhos», considerações sobre a profecia Auto confirmatória e os preditores de violência – com estas pessoas «é tudo muito», como dizia uma colega. E o sentimento de «não-saber», da dificuldade em traduzir o Programa para a grande equipa do serviço, da dificuldade em nomear o que se vive e o que se sente neste tipo de trabalho técnico muito próximo das pessoas, de lidar continuamente com muitas diferenças, de experienciar zonas de desconforto muito orgânico. Foram partilhados os primeiros esboços das narrativas individuais sobre o processo reflexivo da intervisão. No Centro de interpretação Ambiental da Duna da Crismina A oitava sessão decorreu numa tarde de Junho num clima de equipa de algum malestar e frustração. Os sentimentos vividos, de diferentes formas, pelos elementos da equipa cruzavam-se com as suas diferentes fases de vida. O eminente fecho de programa para os primeiros participantes e o planeamento da segunda edição competiam com os sentimentos de perda pelo final da intervenção com aqueles participantes. Excesso de incertezas sobre prioridades. Turbulências. Desmotivação e sentimentos de perda de controlo. Sobreposição de tempos. Pôr em comum estes assuntos e sentimentos foi importante para que a equipa pudesse tomar as decisões que se impunham. No CIAPS em S. Pedro A nona sessão aconteceu numa tarde do final de Agosto com o primeiro ciclo do programa já finalizado. Apaziguados os mal estares, a equipa estava mais distanciada e capaz de se pôr em perspetiva. Da partilha realizada destaca-se a reflexão feita sobre o processo de supervisão, a importância da sua continuidade e a passagem à equipa do serviço.

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Como pode ser a Intervisão? Acho que não partimos para as coisas de mãos vazias. No meu caso levava ‘na mala’ alguns conhecimentos, umas quantas experiências, outras tantas convicções e dúvidas. Sobretudo levava muito gosto por estes processos que, na minha cabeça, só fazem sentido se forem aprendentes para todos os envolvidos. Levava também a ideia pré-concebida de que fosse o que fosse que fizéssemos daquele tempo-espaço seria necessariamente uma construção coletiva. Na verdade levava um puzzle de outras referências - das Comunidades de Práticas (conceito bastante caro aos Assistentes Sociais e a outros Interventores Sociais), aos Círculos de Aprendizagem (mais ligados à Gestão e à Psicologia) e às Rodas de Conversa (de inspiração Freiriana). De partida, a intervisão estava entendida como uma metodologia focada nas situações de auto aprendizagem de equipa – equipa essa que se corresponsabiliza pelo seu próprio desenvolvimento (individual e coletivo), pela resolução dos problemas, por melhorar os processos de comunicação e qualificar continuamente o seu processo de trabalho e o resultado da intervenção com os participantes nos projetos e ações que leva a cabo. No entanto, estas palavras dizem verdadeiramente pouco sobre ‘como se faz’ e ‘como se sente’ cada um/a naquilo que faz. Como participantes desta experiência de intervisão desenvolvemos um repertório de experiências, histórias e ferramentas, que nos qualificam para enfrentar situações sociais complexas com maior segurança, perceção de eficácia e possibilidade de inovação. Por mais que o vivenciado seja dificilmente traduzido em palavras e que as estruturas das narrativas escritas sejam diferentes das que pontuam as interações entre as pessoas, parece importante mencionar alguns aspetos. Sabendo que a ‘receita’ do fazer não resulta da soma simples desses aspetos; nem provavelmente resulta de receita nenhuma.  A noção de propósito Parece importante produzir um sentido negociado para o que se está a fazer, já que nada é imposto externamente. Cada membro da equipa de intervisão precisa de ter um entendimento sobre o compromisso compartilhado e identificar ‘ganhos’ subjetivos, preferencialmente com impactos positivos na intervenção e no seu sentimento de bem-estar e autoeficácia. As trocas informativas entrelaçam-se com as redes de relações, assegurando que o tempo reservado para a Intervisão «faz sentido», por mais que no imediato possa parecer, num sentido mais instrumental, pouco útil. Foi também um espaço no tempo onde foi possível abrandar o ritmo e expressar intuições morais e constrangimentos de leitura e de ação.  A construção da confiança Sendo fundamental é, como sabemos, um processo lento. Vive de nos darmos a conhecer e de irmos conhecendo um pouco mais do outro. Vive de dosear certezas, 8/9

arrogâncias e humildades. Vive de desmontar medos e de nos permitirmos desaprender e aprender uns com os outros - em paridade. Com e contra as nossas experiências. As normas implícitas que têm guiado a interação entre os participantes são o respeito, uma aproximação aberta e flexível ao pensamento (convergente e divergente), uma responsabilidade individual e coletiva, sigilo e reciprocidade. Um desafio superado foi a nossa aliança. No papel de facilitadora, eu era um elemento estranho à equipa e recente no serviço. Precisei de ser aceite, construir uma zona de interseção, um «nós» sem me fundir com eles. Porque a intervisão também vive da divergência, do cruzamento de outras perspetivas pelo menos mais distanciadas.  O desenho das sessões Funcionámos quase sempre sem agenda prévia. Eu levava alguns desafios na manga. Umas vezes usava, outras não. Porque no momento não achava adequado. Trabalhávamos com o que o grupo trazia no aqui e agora. Com muitos sentires. Às vezes com silêncios ou com debates de equipa que não careciam do elemento mais distante. Esta fluidez não era isenta de estrutura, pelo que foram usadas amiúde técnicas para promover a circularidade e a clarificação da informação. Se formos procurar inspiração no modelo dos Círculos de Aprendizagem damos conta de ‘quatro passos’ no desenho das sessões: i) a reflexão; ii) a aprendizagem; iii) o planeamento e IV) a ação. Para além das particularidades de estilo e da cultura de cada grupo concreto estes passos, embora presentes no caso, não foram sequenciais. Mas nunca estivemos perto do que em gíria se designa por ‘conversa de café’. De fato a seriedade no propósito e o objeto das sessões permitiu um contexto de partilha e reflexão a uma operacionalização que não esqueceu a eficácia, num clima informal e descontraído. Um aspeto muito importante nesta experiência foi o cuidado do registo das sessões, assegurado pela coordenadora.  Liderança partilhada e cooperação Nos contextos de aprendizagem colaborativa a experiência de intervisão/círculo de aprendizagem pode ser uma interessante estrutura de otimização do trabalho de equipa. “A intervisão é um lugar para procurar um novo equilíbrio entre o privado e o pessoal, um lugar para experimentar e refletir sobre novos comportamentos. No processo de partilha com os outros aprendemos mais sobre nós mesmos e mais sobre os outros. Ao mesmo tempo, reconhecemos que outros pontos de vista são possíveis”. Anne Heppe

O objetivo é o de construir, partilhar e expressar um conhecimento construído através de processos de diálogo e de reflexão profunda em torno de assuntos ou problemas que a todos dizem respeito – reflete-se o agir na sua complexidade. A liderança democrata e transformacional está relacionada com os perfis dos elementos do grupo (coordenação incluída) e com a maturidade que cada um/a evidência, também nos processos de influência reciproca, de execução e de tomada de decisões. 9/9

Learning Circle Model of Distributed Leadership and Cognition Nota Conclusiva Esta é uma história por camadas. E esta é a minha narrativa de reflexão sobre um processo concreto de Intervisão, como metodologia dinâmica, não formal, participativa, fundamentada na experiência dos participantes e incentivadora de novas aprendizagens. Este foi um processo que compreendeu também um conjunto de técnicas de trabalho de grupo facilitadoras da expressão e da criatividade e que permitem desenvolver a autoconfiança a partir da integração das experiências refletidas – constitui uma metodologia sustentável, desenhada à medida das necessidades do grupo e que reforça os seus fatores protetores e as possibilidades de aprendizagem continuada. A Intervisão pode ser um recurso das equipas e das organizações que se querem aprendentes e qualificantes. Para mim, tem sido uma construção constante, um desafio e um prazer.

Isabel Passarinho Fevereiro 2015

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