Introdução à Epistemologia

May 28, 2017 | Autor: Rualdo Menegat | Categoria: Epistemology, History of Science, History of Geology, epistemology of geology
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE GEOCIENCIAS PROGRAMA DE PÓS -GRADUAÇAO EM GEOCIÊNCIAS

INTRODUÇÃO À

EPISTEMOLOGIA

© RUALDO MENEGAT [email protected]

Porto Alegre 2014

“[...] a razão só discerne o que ela mesma produz segundo seu projeto [...]” IMMANUEL KANT, 1787 1

1 Kant (1987[1787]), p. 13.

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APRESENTAÇÃO

O entendimento acerca dos pressupostos e características básicas da Ciência, em geral, e da Geologia, em particular, não têm sido motivo de preocupação na prática científica. Isso porque, de um lado, há a hegemonia de mais de quatrocentos anos dos métodos baconianos, os quais afirmam que a Ciência se alicerça em apenas um método científico. Por essa razão, não haveria por que problematizar a metodologia científica. De outro lado, os conceitos da Epistemologia e suas questões centrais, principalmente aquelas introduzidas pela Nova Epistemologia, se apresentam com determinada complexidade, aumentando a dificuldade de apreensão por parte daqueles que fazem ciência. Razão pela qual, passam a ser tratadas como sendo ―de fora da área‖ ou ―extracientíficas‖, e, portanto, não adquirem centralidade na praxiologia científica. Além disso, o próprio sucesso da ciência parece ser também ele uma cortina para obscurecer a reflexão sobre a metodologia científica. Se o resultado está dando certo, então o método para obtê-lo está automaticamente justificado: ―para que discutir se dá certo?‖. Devido a esse triplo bloqueio, a Epistemologia tem sido, via de regra, descartada como uma área importante para a fabricação da ciência, o que seria impensável para os primeiros cientistas do século XVII, como Galileu Galilei, Francis Bacon ou René Descartes, para quem ―fazer a ciência‖ era indissociável de ―pensar a ciência‖. Contudo, nas últimas décadas, a Epistemologia tem interessado de forma crescente, embora ainda tímida, alguns pesquisadores das mais diferentes áreas [ver Para saber mais: Associações de história...]. As razões disso se encontram na profunda mudança que a Ciência vem experimentando desde as últimas quatro décadas. O russo Ylia Prigogine, Prêmio Nobel de Química de 1977, junto com sua colaboradora, Isabelle Stengers, fizeram no livro A nova aliança, um fascinante relato sobre o encanto proporcionado pela ciência newtoniana desde seu surgimento e do completo esgotamento a que já chegou:

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um dos aspectos dessa transformação teórica é o da descoberta dos limites dos conceitos clássicos que implicavam, para os que acreditavam na sua validade universal, a possibilidade de um conhecimento completo do mundo. Pois se os seres oniscientes, como o demônio de Laplace, de Maxwell, o deus de Einstein, abundam ainda hoje nos textos científicos, não há nisso arcaísmo, mas simples ingenuidade ou ―filosofia espontânea do sábio‖. (Prigogine & Stengers, 1991, p. 40)

Para saber mais ASSOCIAÇÕES DE HISTÓRIA E EPISTEMOLOGIA DA CIÊNCIA SBCH – Sociedade Brasileira de História das Ciências: Fundada em São Paulo em 16 de dezembro de 1983, tendo como objetivo ―promover e divulgar estudos sobre a História das Ciências e seus campos afins‖ [ver http://www.sbhc.org.br/]. Ela é filiada à International Union of History and Philosophy of Science – Division of History of Science and Technology (IUHPS/DHST).

AFHIC – Associação de Filosofia e História da Ciência do Cone Sul: Fundada em 05 de maio de 2000, na Argentina, estruturou-se a partir de encontros realizados em 1998 no Brasil e em 2000 na Argentina. Ela tem como objetivo principal ―contribuir para o desenvolvimento do conhecimento da ciência a partir de uma perspectiva tanto filosófica como histórica, especialmente nos países do Cone Sul americano‖. [http://www.afhic.com]

ABFHiB – Associação Brasileira de Filosofia e História da Biologia: Fundada em 17 de agosto de 2006, em São Paulo, por ocasião da realização do IV Encontro de Filosofia e História da Biologia. Tem como objetivo a promoção e divulgação de estudos sobre a filosofia e a história da biologia. [ver http://www.abfhib.org/]

SBHMat – Sociedade Brasileira de História da Matemática, Fundada em 30 de Março de 1999, em Rio Claro (SP) tem como objetivo promover levantamentos, pesquisas e estudos com vistas a divulgar dados, reflexões e informações referentes à História da Matemática [ver http://www.sbhmat.com.br/]

SBHM – Sociedade Brasileira de História da Medicina: Fundada em 21 de novembro de 1997, em São Paulo. Tem como objetivos incentivar o estudo e a pesquisa da história da medicina e propugnar pelo ensino da História da Medicina como requisito básico para a formação integral do médico. [ver http://www.sbhm.org.br/]

INHIGEO – International Commission on the History of Geological Sciences: Comissão Internacional de História das Ciências Geológicas, filiada à União Internacional de Ciências Geológicas (International Union of Geological Sciences), fundada em 1967, possui mais de 250 membros oriundos de 50 países. [ver http://www.inhigeo.org/]

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Essas mudanças são anunciadas na literatura na forma de ―revoluções paradigmáticas‖ e são diagnosticadas muito mais pelos seus aspectos substantivos, isto é, pelo impacto produzido pelas novas teorias, do que pelos aspectos metodológicos. Todavia, as mudanças que ocorreram nas características metodológicas da Ciência são igualmente marcantes e profundas. Entender essas transformações metodológicas passa a ser condição para a prática da ciência bona fide. Para tanto, devemos lançar mão dos preceitos da Epistemologia. Nesta publicação, buscou-se estabelecer os objetos e métodos da Epistemologia em dois sentidos: (i) preliminarmente, aquele situado em algumas das principais tradições epistemológicas do Ocidente, de modo a problematizar a natureza da própria Epistemologia e as diversas portas de acesso ao seu objeto, a Ciência; (ii) em seguida, no sentido da busca de respostas aos três problemas epistemológicos mais significativos coletados nas tradições apontadas, quais sejam: a) Como é possível a certeza do conhecimento? – ou o problema da indução (o problema de Hume); b) Como a ciência se distingue dos demais tipos de conhecimento? – ou o problema da demarcação (ou problema de Kant); c) Como avança a ciência? – ou o problema do progresso científico e a Nova Epistemologia. Tentaremos mostrar como esses problemas estão interligados, pois a solução de um implica em certa solução dos demais. Assim, poderemos ter várias combinações de soluções que nos ajudam a entender algumas das escolas epistemológicas mais conhecidas no âmbito das ciências da Terra, da natureza e da vida, como as de Bacon, Popper, Kuhn e Lakatos. Além disso, esses problemas fundamentais fornecem os elementos para buscar a lógica da descoberta em uma determinada área da Ciência, como, por exemplo, na Geologia, Ecologia ou Biologia. Muito mais do que esgotarmos os problemas contemporâneos colocados pela Nova Epistemologia, procuramos delinear as características gerais da Epistemologia enquanto campo de investigação. Evidentemente que tal caminho já implica em certo tipo de análise. Assumimos o risco, mas, além disto, nosso objetivo maior é o de introduzir essas problematizações no cotidiano da prática científica.

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Agradecemos ao Prof. Dr. Luis Alberto D‘Ávila Fernandes, que abrigou essas inquietações como problema de pesquisa; ao Prof. Dr. Mario Costa Barberena (in memorian) pelo incentivo heurístico; aos meus colegas da primeira turma de pós-graduação na área de Estratigrafia do convênio UFRGS/PETROBRAS por reconhecerem a importância dessas questões para a qualidade da produção científica; e meus colegas do Grupo Interdisciplinar em Filosofia e História das Ciências, que compartilham comigo a construção de um conhecimento interdisciplinar e epistemológico na UFRGS, à Profa. Dra. Ana Maria Mizusaki, pelo incentivo no ensino desse tema.

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SUMÁRIO Para saber mais Associações de história e epistemologia da ciência

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1. A EPISTEMOLOGIA: PONTOS DE PARTIDA E VIAS DE ACESSO

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Para saber mais A palavra ‗epistemologia‘ nos dicionários Epistemologia, teoria do conhecimento, filosofia da ciência e gnosiologia

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1.1 Para além dos conceitos, as tradições investigativas

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Para saber mais É a filosofia alheia à atividade científica?

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1.2. Ciência e devir histórico

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Para saber mais São históricos os critérios de rigor na ciência? A geologia e os três níveis de historicidade

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2. O CENÁRIO EPISTÊMICO: INVENTÁRIO DOS TRÊS PROBLEMAS PRINCIPAIS

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2.1. Como é possível a certeza do conhecimento? - o problema da indução (ou problema de Hume)

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Para saber mais O que é o conhecimento para os pré-socráticos? O mito da caverna Habermas e o agir comunicativo na atualidade O trilema de Fries: dogmatismo vs. ceticismo vs. psicologismo Para saber mais Tipos de ceticismo

2.2. Como a ciência se distingue dos demais tipos de conhecimento? problema da demarcação (ou problema de Kant) Para saber mais O uso de silogismos por Aristóteles A base empírica e a observação como critério de demarcação Para saber mais Método e filosofia da ciência em Galileu Galilei Organon vs. Novum organon A lógica ou a razão das ciências segundo Kant A mente não é cera passiva: o programa de Kant Os juízos sintéticos e a arquitetura da ciência moderna Verificacionismo e significado: o critérios do Círculo de Viena Para saber mais O Círculo de Viena [1926-1936] É a indução um critério de demarcação? Da probabilidade segundo Popper e Watkins Falibilismo e falseacionismo: aprender com os erros Para saber mais

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Xenófanes: tudo é uma teia de suposições Como Galileu foi vencido pelo instrumentalismo Como criticar a noção de juízos sintéticos a priori de Kant?

2.3. Como avança a ciência? - o problema do progresso científico e a Nova Epistemologia O progresso empirista da ciência: linear e acumulativo Para saber mais A indução verdadeira e perfeita por meio das tábuas da descoberta A solução do problema da indução e o método do falseamento A revolução dos paradigmas científicos: os conceitos de Kuhn Para saber mais Há conciliação posível entre Kuhn, Popper e Lakatos? Programas de pesquisa e organização do conhecimento Para saber mais Os pioneiros da epistemologia e os contextos da descoberta e da justificação A tectônica de placas e seu cinturão protetor

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3. REFERÊNCIAS

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ÍNDICE ONOMÁSTICO, TOPONÍMICO E REMISSIVO

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1. A EPISTEMOLOGIA: PONTOS DE PARTIDA E VIAS DE ACESSO A Epistemologia, como disciplina, é um ramo da Filosofia surgido a partir do século XIX em função do próprio triunfo da Ciência como conhecimento de sucesso2. Além disso, por um lado, ela afastou-se cada vez mais da Filosofia, desde Galileu em 1640 e, por outro, complexificou-se de modo crescente, principalmente a partir do final século XIX, mas acentuadamente nas últimas décadas do século XX até nossos dias. Etimologicamente, o vocábulo epistemologia, cuja criação é tão recente quanto a disciplina que designa, significa teoria da ciência (do grego epistêmé – ciência; e logos – que estuda; cf. Ferreira, 2009). Segundo Blanché (1988, p. 9), a palavra epistemologia "não figura nem no Littré, nem no Novo Larousse ilustrado [...]" e "o seu aparecimento nos dicionários franceses data de 1906 [...]." A palavra em português deriva do francês epistemologie e tem seu surgimento nos dicionários brasileiros pelo menos desde o início da década de 40 [ver Para Saber mais: A palavra ‗epistemologia‘ nos dicionários]. Para tão nova disciplina, a Epistemologia já acumulou um incontável número de controvérsias, nos mais diferentes aspectos. A diversidade de conceitos, justamente daquela disciplina cujo objetivo é teorizar sobre um determinado tipo de conhecimento, por exemplo, acabou por constituir-se em paradoxo, pois, nesse caso, a ausência de marcos conceituais mais precisos tem implicado em digressões heterológicas, o que é próprio do ato de conhecer. Por conseguinte, a Epistemologia dificilmente pode ser encarada como una nas tipologias de teorização da ciência. Além disso, seu objeto, a ciência, tem sofrido mudanças conceituais cada vez mais frequentes. Temos, então, um duplo fato para a filosofia considerar: (i) o crescimento da impor-

2 Para Watkins (1990, p. 14) ―Os filósofos usam frequentemente o termo 'conhecimento' como uma palavra-sucesso; mas, neste livro, o termo será usado para denotar certo corpo organizado de saber sem a implicação de estar livre de erro‖.

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Para saber mais A PALAVRA ‘EPISTEMOLOGIA’ NOS DICIONÁRIOS Nos dicionários de Silva (1813), Diccionario contemporaneo da lingua portugueza (1911), Figueiredo (1925), Freire (1941-1942) e Freire (1954) o vocábulo ―epistemologia‖ está ausente. Já em Lima (1951, p. 481) no verbete epistemologia lemos: ―Estudo do grau de certeza do conhecimento científico em seus diversos ramos". Em Silva (1952, p. 570) encontra-se: "do gr. episteme, ciência + logos, tratado. Estudo crítico das várias ciências. Teoria do conhecimento.‖ Para Houaiss (2012), o termo foi introduzido em 1942 e é definido como: ―reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites do conhecimento humano, especialmente nas relações que se estabelecem entre o sujeito indagativo e o objeto inerte, as duas polaridades tradicionais do processo cognitivo; teoria do conhecimento‖ E também: ―estudo dos postulados, conclusões e métodos dos diferentes ramos do saber científico, ou das

teorias e práticas em geral, avaliadas em sua validade cognitiva, ou descritas em suas trajetórias evolutivas, seus paradigmas estruturais ou suas relações com a sociedade e a história; teoria da ciência‖. Há poucos vocábulos oriundos de epistêmé, etimologicamente, ―familiaridade com uma matéria, entendimento, habilidade; conhecimento científico, ciência‖, todos surgidos no século XX: episteme 'ciência', epistêmico, epistemologia, epistemológico, epistemólogo. No Aurélio (2009), podemos ler: ―Conjunto de conhecimentos que têm por objeto o conhecimento científico, visando a explicar os seus condicionamentos (sejam eles técnicos, históricos, ou sociais, sejam lógicos, matemáticos, ou linguísticos), sistematizar as suas relações, esclarecer os seus vínculos, e avaliar os seus resultados e aplicações‖.

tância do conhecimento científico na totalidade do conhecimento, principalmente a partir do século XIX, é um fato extracientífico, que aumenta o interesse para (ii) reconhecer como ocorrem essas mudanças conceituais dentro da própria ciência, sendo um fato intracientífico. Portanto, embora o significado etimológico da palavra epistemologia seja bastante claro, não raro detecta-se na literatura digressões de toda a sorte na delimitação de seus objetos e conceitos que, por razões didáticas e expositivas, os posicionaremos em dois terrenos: primeiro, no terreno das possibilidades conceituais dentro dos referenciais mais propriamente filosóficos, o qual chamaremos de extracientífico; o segundo, no terreno das

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inerências conceituais derivadas da própria praxiologia da ciência, o qual denominaremos de intracientífico. Nessa esquematização, que assumimos, por ora, meramente para fins de reconhecimento de um campo da tensão conceitual na epistemologia (natureza extracientífica vs. intracientífica de sua atividade), podemos denotar que as possibilidades definitórias oriundas do terreno extracientífico são também necessariamente implicadas pelo segundo, intracientífico. De outro modo, qualquer que seja o ponto de partida, não há como resolver o problema sem considerá-lo tanto na dimensão relacionada com os aspectos mais amplos do significado do conhecimento, quanto na dimensão que diz respeito aos aspectos mais específicos do conhecimento científico, sendo necessária uma decisão metodológica. Com efeito, nas variantes conceituais de tipo extracientíficas, lemos na literatura possibilidades que tornam o vocábulo epistemologia sinônimo ora de teoria do conhecimento, ora de filosofia da ciência; ora, ainda, de metaciência e de lógica da ciência, sendo todas elas disciplinas vizinhas à Epistemologia. [ver Para saber mais: Epistemologia, teoria do conhecimento, filosofia da ciência e gnosiologia] Para além de simples controvérsias vocabulares, a origem dessas variantes reside no fato de que a Epistemologia, embora venha tratando, nos últimos decênios, mais especificamente da ciência, ela não tem como desconsiderar as relações dessa investigação com as teorias gerais do conhecimento humano. Resulta disso uma intricada relação concomitantemente vertical e horizontal entre uma determinada investigação particular do conhecimento – a ciência – em relação à totalidade do conhecimento humano. Se, além disso, analisarmos sob o ponto de vista da evolução história desses conceitos e das matrizes filosóficas e ideológicas3 que nela se desenvolveram e desenvolvem, o mosaico de possibilidades inflaciona. Portanto, há posicionamentos de natureza filosófica que orientam os conceitos que, quando não são explicitados, nos autoriza a chamá-los de espontâneos, e

3 Segundo a categorização do empirismo lógico, somente o conhecimento científico possui significado. Dessa forma, a Teoria do Conhecimento somente tem lugar enquanto redução à Epistemologia e, nesse caso, é definida como Ciência da Ciência. Objeções a esse posicionamento serão dadas mais adiante no item sobre o programa epistemológico do Círculo de Viena.

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há a possibilidade de uma abordagem situar-se ou mais próxima da Filosofia e do saber em geral, ou da Ciência e do conhecimento em particular.

Para saber mais

EPISTEMOLOGIA, TEORIA DO CONHECIMENTO, FILOSOFIA DA CIÊNCIA E GNOSIOLOGIA Para o filósofo neozeolandês Rom Harré [1927-...] a epistemologia, uma das quatro divisões da Filosofia, onde se incluem também a Lógica, Epistemologia, Metafísica e Ética, é ―a teoria do conhecimento‖ e, ―na pesquisa epistemológica, estudam-se os modelos aos quais deverá conformar-se o conhecimento genuíno.‖ (Harré, 1988, p. 15) Nesse mesmo livro, esse autor propõe que trata-se de uma tarefa do epistemólogo ―demonstrar como é possível distinguir o conhecimento da crença na verdade e diferençar a certeza da probabilidade.‖ Além disso, ele reconhece a epistemologia como parte da filosofia da ciência: ―Esse estudo é uma parte importante da filosofia da ciência.‖ (Harré, 1988, p. 15) Japiassu (1991, p. 16), utiliza o termo epistemologia global como sendo o estudo do saber globalmente considerado, "quer

sejam 'especulativos' [crenças], quer sejam 'científicos'". Essa expressão, contudo, não foi encontrada em outros autores. O importante epistemólogo e físico argentino Mario Bunge [1917-...] utiliza Filosofia da Ciência e Epistemologia como sinônimos (Bunge, 1980). O filósofo e historiador da ciência italiano Geymonat, premiado no ano de 1985 pela Academia Nazionale dei Lincei, não utiliza o vocábulo ―Epistemologia‖, valendo-se sempre da expressão ―Filosofia da Ciência‖ para designar o mesmo estudo, o qual ―incorporou um setor inteiro (talvez o mais importante desde os tempos da Grécia antiga): o setor gnosiológico‖ (Geymonat, 1985, p. 9). ―Gnosiologia‖ por sua vez é um sinônimo de teoria do conhecimento, porém com menor uso na literatura em geral.

1.1 PARA ALÉM DOS CONCEITOS, AS TRADIÇÕES INVESTIGATIVAS Além disso, as variantes conceituais estão, também, contingenciadas pelas tradições filosóficas e linguísticas dos diversos países nos quais têm sido desenvolvidas. Assim, encontramos na língua inglesa a palavra epistemology com o sentido de ―teoria do conhecimento‖ ou ―gnosiologia‖, opondo-se à filosofia da ciência, a qual teria por objeto os métodos e resultados científicos,

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enquanto aquela o estudo do conhecimento mais geral. A teorização do conhecimento será, então, dependente do conceito que fazemos de ‗conhecimento‘ e, dessa maneira, remete-nos sempre para a esfera geral, sendo as demais, derivadas como modos de encarar o estudo. Essa relação está bem evidenciada na definição do professor David W. Hamlyn [1924-...], que escreveu um dos poucos textos exaustivos sobre a história da Epistemologia, onde podemos ler Epistemologia, ou a teoria do conhecimento, é o ramo da filosofia que diz respeito à natureza e escopo do conhecimento, seus pressupostos e suas bases, e a confiabilidade geral das assertivas do conhecimento. (Hamlyn, 1967, p. 8.)

E, de acordo com a tradição filosófica anglicana, aquele autor acrescenta ainda Um entendimento do conceito de conhecimento é um pré-requisito para aventurar-se em qualquer tentativa de responder outras questões epistemológicas. A maioria dos filósofos teve algo a dizer sobre a natureza do conhecimento, embora muitos consideraram sua natureza como dada. A partir disso originaram-se diversas dificuldades epistemológicas tradicionais. (Hamlyn, 1967, p. 10.)

Para a filosofia de tradição italiana, o termo epistemologia é tido como sinônimo de filosofia da ciência. Em Ugo Viglino (1950), por exemplo, encontramos No uso corrente, entretanto, o significado do temo não é ainda universalmente estabelecido. Para alguns, com senso mais genérico, a epistemologia vem identificada com a lógica (H. Cohen, E. Hurssel, Rabier). [...] Em um sentido restrito e próprio, que é também o mais comum no italiano, epistemologia designa a filosofia da ciência, ou seja, o estudo crítico dos princípios, métodos e resultados da ciência, com o objetivo de estabelecer os fundamentos lógicos e a determinação do valor específico da objetividade em relação ao conhecimento da realidade. Como tal, a epistemologia se divide em geral [...] e especial. (Viglino, 1950, p. 448.)

Na tradição francesa, é onde há os maiores esforços para delimitar a épistémologie como disciplina distinta da teoria do conhecimento e da filosofia da ciência. Desde Lalande, em 1926, podemos ver a epistemologia definida

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com objetos e métodos distintos da gnosiologia ou da filosofia da ciência, quando do estudo do conhecimento científico Esta palavra designa a filosofia das ciências, mas com um sentido mais preciso. [...] essencialmente é o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos resultados das diversas ciências, destinado a determinar sua origem lógica (não psicológica), seu valor e seu alcance objetivo. (Lalande, 1960[1926], p. 293)

Adotaremos aqui uma definição que procura delimitar a epistemologia como disciplina distinta daquelas citadas como sinônimos, embora assumimos que nem sempre as fronteiras entre elas são fixas, situada no contexto intracientífico e enunciada de forma concisa e precisa em Greimas & Courtés (1992): Epistemologia é a análise dos axiomas, das hipóteses e dos procedimentos, e mesmo dos resultados que especificam uma dada ciência: com efeito, ela se propõe como objetivo examinar a organização e o funcionamento das abordagens científicas e apreciar-lhes o valor. Assim concebida, a epistemologia não poderia ser confundida nem com a metodologia nem com a teoria do conhecimento (ou gnosiologia) - às vezes denominada também epistemologia -, que estuda a relação entre sujeito e objeto do ponto de vista filosófico. (Greimas & Courtés, 1992, pp. 152-153)

Filosofia ou Teoria do conhecimento F ILOSOFIA DA CIÊNCIA

(a) (b)

EPISTEMOLOGIA (Metaciência)

(c)

CIÊNCIA

CONHECIMENTO COMUM

Figura

1 – Organograma dos níveis de relação conhecimento comum, ciência e epistemologia.

entre

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Para esclarecer um pouco mais as diferenças tidas como sinonímicas do conceito de epistemologia e áreas correlatas, principalmente de natureza extracientífica, assumiremos que o conjunto de indagações da teoria do conhecimento (ver Figura 1) é o mais abrangente; que a filosofia da ciência é algo mais ampla que a epistemologia, na medida em que relações entre ciência e sociedade, objeto e sujeito, também possam ser estudadas, não constituindo objeto da epistemologia em si; que a metodologia inclui-se no programa das investigações epistemológicas. Finalmente, assumiremos que a metaciência possui um objeto ainda mais particular do que a epistemologia, como, por exemplo, a análise de uma teoria em particular, ou um aspecto técnico de um problema, e ambas apresentam uma maior intimidade com a ciência; donde podemos estabelecer os seguintes níveis de relação apontados na Figura 1, no qual temos em (a) e (b) a epistemologia extracientífica, também chamada de epistemologia externa e, em (c), a epistemologia intracientífica, também denominada de epistemologia interna. Para Blanché (1988, p. 40), "os trabalhos de epistemologia fazem a junção entre esses dois extremos, em uma cadeia sem ruptura, e seria arbitrário querer fixar o ponto em que eles começam e em que acabam." No sentido desse quadro, epistemologia poderá ser lida por alguns como um equivalente ou de metaciência, quando tratar um assunto de modo mais técnico em relação à ciência, colocando-se desse modo como atividade no caminho do próprio cientista, que às vezes o faz sem sabê-lo; ou de Filosofia da Ciência, quando for mais externo e, nesse caso, será um conceito muito mais flexível podendo expandir-se, no limite, até a esfera da teoria do conhecimento enquanto um todo. Blanché (1988, p. 42) qualifica a epistemologia interna como obrigatória, porque "é exigida por problemas que se colocam no interior da ciência", sendo, portanto, um estudo mais preciso e mais técnico em relação à ciência que problematiza; e, a externa, como facultativa porque "é praticada deliberadamente em seguida a uma decisão arbitrária", sendo mais filosófica e, nesse caso, pode estudar qualquer forma de conhecimento. O professor Geymonat (1985, p. 7) aponta os grandes matemáticos, entre eles David Hilbert, Henri Poincaré, e físicos, a exemplo de Albert Einstein, como aqueles que deram importantes contribuições à epistemologia e que os mais importantes filósofos da ciência também são cientistas, como Moritz Schlick, Hans Reicheinbach, Gaston Bachelard, aos quais podemos

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acrescentar Karl R. Popper, Imre Lakatos e Paul Feyerabend entre outros tantos. Entre filósofos importantes que se dedicaram à epistemologia, Geymonat (1985, p. 7) cita Ernst Cassirer. Também é notável a contribuição do filósofo francês e Michel Serres. Dentro desse quadro, poderíamos, ainda, definir como epistemologia específica, quando se refere a uma determinada ciência ou área do conhecimento, como, por exemplo, a epistemologia da geologia, da física, da biologia, da ecologia, etc. E, epistemologia geral, quando trata da ciência enquanto um todo. Alguns autores defendem a ideia de que a epistemologia somente pode ser regional, sendo a epistemologia geral uma coleção daquelas. Evidentemente que se trata, antes de mais nada, de uma concepção filosófica frágil, pois pressupõe a ciência como sendo o conjunto de várias ciências, portanto sempre particulares e não podendo ser una. As diferentes inflexões conceituais derivam, também, do fato de que cada vez mais a epistemologia deixa de ser uma disciplina eminentemente da esfera filosófica, para ser feita pelos próprios cientistas, ou seja, torna-se cada vez mais intracientífica, o que significa abranger novas áreas de investigação. Essa transferência é característica da epistemologia contemporânea e, segundo Blanché (1988) Isto não acontece por efeito de uma moda passageira, mas porque as crises recentes que abalaram as diversas ciências e as revoluções por que tiveram de passar obrigaram aqueles que as praticavam a efetuarem um retorno aos seus princípios e a interrogarem-se sobre os seus fundamentos. (Blanché, 1988, p. 22-23.)

As variantes nas definições epistemológicas, como vimos, resultarão, em última instância das questões que cada autor decide e elege como fulcrais para teorizar a ciência e, assim, a epistemologia pode também tornar possível a crítica ao conhecimento científico. Nesse sentido, podemos então nos perguntar se existem questões capazes de incidir horizontal e verticalmente nos problemas tanto de natureza global do conhecimento (extracientífico), quanto de natureza particular da ciência (intracientífico) e se estas questões podem, ao mesmo tempo, implicar numa metodologia crítica do fazer científico. Essa indagação é respondida por Karl R. Popper (1989[1934]) que, no seu livro A Lógica da Pesquisa Científica, utiliza os termos filosofia da ciência, epistemologia e lógica da ciência de maneira indistinta, como modo de denotar, por um lado, a existência de um centro de preocupações tangível a qualquer uma dessas esferas - sejam elas de natureza mais extracientíficas ou

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intracientíficas -, e, por outro, de demonstrar a amplitude e verticalidade de um problema específico, qual seja: o da demarcação da ciência dos demais tipos de conhecimento. Para Popper (1989[1934], p. 105), [...] o que a Epistemologia deve indagar é antes: como submeter a testes enunciados científicos, considerando suas consequências dedutivas? E que espécie de consequências devemos selecionar para esse objetivo, se elas, por sua vez, hão de ser suscetíveis de teste intersubjetivo?

Na edição de 1972, Popper acrescentou: Presentemente, eu formularia a questão desta maneira: de que modo proceder para melhor criticar nossas teorias (nossas hipóteses, nossas conjecturas), em vez de defendê-las contra a dúvida? É claro que a prova sempre constituiu, no meu entender, parte da Crítica. (Popper,1989[1934/1972], nota *1, p. 105.)

Desse modo, a profusão de sinônimos para a palavra epistemologia embora pareça, muitas vezes, simples variantes do vocabulário, está fundada no fato de que tanto a ciência (objeto da epistemologia), no século XVII, quanto a epistemologia, no século XIX, surgem a partir da filosofia e dela se desligam na medida em que passam a ter seu próprio instrumental de reflexão e conhecimento. Trata-se de uma questão de reconhecer se a epistemologia possui ou não esse instrumental próprio para inquirir a ciência. Se considerarmos a epistemologia como necessária à atividade científica – e disso não podemos ter dúvidas –, a resposta será sim; caso contrário, a epistemologia ainda depende da Filosofia, sem que isso signifique necessariamente um problema. Se os diversos modos da definição de epistemologia, enunciados acima, sugerissem pertinência à exterioridade científica, ou seja, atividade de natureza filosófica antes do que científica, não estaríamos, de certa forma, excluindo-a das próprias necessidades da praxiologia científica? Não poderíamos dizer que a epistemologia é meramente necessidade dos filósofos? E, com isso, simplificar o problema e definir a epistemologia como instrumento de aplicação e não como necessidade intrínseca à prática da boa ciência? Essas questões, embora possam sugerir que os cientistas não precisam da filosofia para a sua atividade de pesquisa, são sumamente importantes para a elucidação da natureza da epistemologia, pois que nos levam não só a

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refutar a sugestão de exterioridade a priori, mas, também, fundamentalmente, a posicioná-la dentro da atividade da ciência.

Para saber mais É A FILOSOFIA ALHEIA À ATIVIDADE CIENTÍFICA? Uma excelente refutação da tese de que a reflexão filosófica se coloca como atividade externa à ciência pode ser encontrada em Gramsci, (1978[1955]). Esse autor começa argumentando que a filosofia não é uma atividade exclusiva de ―filósofos profissionais ou sistemáticos‖ ao demonstrar que todos os homens são, em si, ―filósofos‖. Depois, define os limites e as características dessa ―filosofia espontânea‖ peculiar a ―todo o mundo‖, pois se trata da filosofia que está contida: 1) na própria linguagem; 2) no senso

comum e no bom-senso; 3) em todo o sistema de crenças. (Gramsci, 1978, p. 11.) Em seguida, Gramsci pergunta: ―é preferível ‗pensar‘ sem disso ter consciência crítica ou é preferível elaborar de uma maneira crítica?‖ (Gramsci, 1978, p. 12). Em Althusser (1979[1968]), embora com alguns esquematismos, podemos encontrar uma abordagem mais construída daquilo que denominou de ―filosofia espontânea dos cientistas‖.

Sob esse ponto de vista intracientífico, o estatuto da epistemologia no processo de investigação que a ciência estabelece com seu objeto é assim definido por Greimas & Courtés (1992): O nível epistemológico é uma característica essencial de toda teoria bem formada. Partindo do material (ou linguagem-objeto) estudado (considerado como nível 1), pode-se situar antes de mais nada o plano da descrição (nível 2) que é uma representação metalinguística do nível 1, e o da metodologia (nível 3) que define os conceitos descritivos. É em um plano hierarquicamente superior (nível 4) que se localiza a epistemologia: a ela compete criticar e verificar a solidez do nível metodológico, testando-lhe a coerência e medindo-lhe a adequação relativamente à descrição e avaliar, entre outras coisas, os procedimentos de descrição e de descoberta. (Greimas & Courtés, 1992, p. 152.)

Ou seja, a epistemologia na esfera da ciência avalia a integração de uma estratégia e de uma tática de pesquisa, ao mesmo tempo em que verifica, em função delas, a consistência dos vários procedimentos possíveis e dos resultados obtidos e obteníveis, resultando no organograma da Figura 2, feito

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com base nas definições de Greimas & Courtés (1992) no qual temos, abaixo da linha tracejada, a atividade tida como mais comum na ciência e, acima, a atividade epistemológica.

EPISTEMOLOGIA - NÍVEL 4

METODOLOGIAS - NÍVEL 3

DESCRIÇÃO - NÍVEL 2

OBJETO - NÍVEL 1 Figura 2 – Organograma dos níveis de relação desde o objeto até a epistemologia, segundo Greimas & Courtés (1992).

Compreensão semelhante a essa podemos encontrar na já consagrada obra de John Losee, Introdução Histórica à Filosofia da Ciência, na qual reconheceu a discordância existente sobre "o objeto próprio da sua disciplina" e considera, ainda, que "uma decisão sobre o escopo da Filosofia da Ciência é condição prévia para falar de sua história". Assim, dentre as variantes definitórias possíveis, esse autor prefere a seguinte definição, na qual, embora não se refira ao termo epistemologia, podemos considerá-la como próxima a que tomamos acima: ―a filosofia da ciência é uma criteriologia de segunda ordem‖ (Losee, 1979, p. 12). Para Losee (1979), o filósofo da ciência deve procurar saber: 1) quais características distinguem a indagação científica de outros tipos de indagações; 2) quais procedimentos os cientistas deveriam adotar na investigação da natureza; 3) que condições são necessárias para que um explicação científica seja correta; e, por fim, 4) qual é o estado cognitivo dos princípios e leis da ciência.

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Ao avaliar qual relação a epistemologia possui no fazer científico, Losee (1979, p. 12) refere-se a níveis de análise muito semelhantes ao que apresentamos anteriormente, conforme ilustrados no Quadro 1.

Quadro 1 – Níveis hierárquicos de análise da Filosofia da Ciência e da Ciência segundo Losee (1979).

Nível

Disciplina

2

Filosofia da Ciência

1

Ciência

0

Assunto específico Análise dos procedimentos e a lógica da explicação científica Explicação dos fatos Fatos

Todavia, embora possa afigurar-se que tenhamos exaurido as variantes possíveis no campo de tensão conceitual entre os polos extracientífico (mais próximo da filosofia) e o intracientífico (mais próximo à ciência), devemos, agora, reconhecer que tal configuração ainda não é suficiente e, mesmo se enunciássemos de uma forma mais sofisticada, em termos de linguagens lógicas, por exemplo, tal insuficiência não se alteraria. 1.2. CIÊNCIA E DEVIR HISTÓRICO Com efeito, temos que reconhecer que existe mais um campo de tensão – o da recorrência histórica – sem o qual nosso esboço para definir o objeto e o conceito da epistemologia eivar-se-ia de dinamicidade. Tal recorrência histórica pode operar em três níveis de simultaneidade não desconexos: no da história da própria ciência; no da história do conceito de conhecimento e de ciência; e no da história da humanidade. Uma ciência, enquanto atividade de conhecimento de um objeto particular, opera como retificação de um saber prévio já obtido. Trata-se da historicidade da construção do objeto científico. Para Bachelard,

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o espírito científico é essencialmente uma retificação do saber, um alargamento dos quadros do conhecimento. Julga o seu passado histórico, condenando-o. A sua estrutura é a consciência dos seus erros históricos. Cientificamente, considera-se o verdadeiro como retificação histórica de um longo erro, considera-se a experiência como retificação de uma ilusão comum e inicial. [...] A própria essência da reflexão é compreender que não se tinha compreendido. (Bachelard, 1984, p. 125; grifos meus)

A ciência enquanto empreendimento do conhecimento diferente dos demais se dá em termos de uma busca de um rigor cujos critérios estão circunscritos a uma determinada época histórica e, portanto, sofre transformações no tempo.

Para saber mais SÃO HISTÓRICOS OS CRITÉRIOS DE RIGOR NA CIÊNCIA? Geymonat (1985) caracteriza muito bem o problema do rigor científico. No final do século XVIII, a imagem desse rigor era dada pelo modo como fora construído os Elementos de Euclides. O grande filósofo Espinosa escreveu, nessa época, o livro Ética cuja estrutura é semelhante àquela dos Elementos. Newton seguiu pelo mesmo caminho com seu livro Philosophiae naturalis principia Nathematica.

Geymonat (1985, p. 18) afirma que essa presunção desapareceu no século XIX, com a descoberta das geometrias não-euclidianas. Na época clássica, os atomistas gregos e, depois, Platão, consideravam as ―Formas‖ os únicos objetos do conhecimento (episteme) contrapostos às ―coisas sensíveis‖, objetos da opinião (doxa). (cf. Hamlyn, 1967)

Nesse sentido, a historicidade é a do conceito que temos de ciência e conhecimento, para o que Geymonat pondera [...] se pensarmos que o rigor, ou a procura do rigor, é o que mais caracteriza o discurso científico relativamente aos restantes tipos de discurso, devemos admitir que tal caracterização não constitui algo de meta-histórico. Por outras palavras: nenhuma teoria se pode considerar rigorosa abstratamente; de facto, só merecerá o título de científica relativamente às exigências de rigor aceites em uma determinada época, que podem ser diferentes das admitidas noutra época.

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Aqui está a razão principal do carácter intrinsecamente histórico da ciência, e, portanto, da inaceitabilidade da concepção filosófica de Comte, que [...] considerava a ciência como um absoluto (neutro e atemporal). (Geymonat, 1985, p. 18-19)

E, por fim, a ciência é, antes de tudo, um resultado não apenas de um grupo de homens circunscritos aos seus laboratórios de pesquisa, mas, fundamentalmente, de toda a atividade humana - seus valores, suas possibilidades e suas necessidades - de um dado momento de sua história, a qual pode ser chamada de cultura ou cosmovisão de uma época. São essas três historicidades congruentes que tornam forte o aforismo de Protágoras o homem é a medida de todas as coisas4. Através de uma historicidade assim estabelecida, podemos tornar a ciência uma atividade crítica que se desenvolve no sentido de tornar-se cada vez menos antropomórfica e, assim, em um processo dialético, possa o homem cada vez mais ser reconhecido na sua dimensão humana. [Ver Para saber mais] Para saber mais

A GEOLOGIA E OS TRÊS NÍVEIS DE HISTORICIDADE A geologia é um exemplo peculiar do recobrimento desses três níveis de historicidade. Primeiro, que o descobrimento da América que implicou em um paradigma de mundo esférico, condicionou as diversas hipóteses cosmo-geológicas. John Playfair (1964[1802]), por exemplo, parte da análise de como poderia a Terra terse tornado esférica para conjecturar acerca de prováveis leis. A ideia da esfericidade do planeta tornou possível uma geologia dedutiva. Segundo, a geologia teve de erigir-se

contra a ideia de mundo bíblica, fazendo uma assepsia de toda a contaminação metafísica e teológica e, nesse sentido, a construção do objeto geológico foi distinta em cada momento de sua construção, pois mudavam os valores enquanto um todo. Terceiro, a historicidade da construção do próprio objeto, que, na geologia, comporta-se sempre no sentido de que aquilo que é global em um dado momento, torna-se particular no período seguinte, e assim, sucessivamente.

4 Protágoras (480-410 a.C. apud História do Pensamento, 1987, v. 1, p. 46). Esse pensador grego é considerado o primeiro sofista, e o aforismo completo é "O homem é a medida de todas as coisas, das que são enquanto são e das que não são enquanto não são." Tal ideia demarca aquilo que pertence ao mundo natural daquilo que pertence ao mundo dos homens.

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Nesse sentido, a ciência pode tanto ser estudada no seu aspecto atual, como no seu devir histórico desde o seu surgimento. Um estudo é intemporal e, o outro, temporal. Esse corte acaba aproximando a epistemologia da história da ciência. E de fato, não existe um sem o outro, pois "não há história das ciências que não seja epistemológica, não existe reciprocamente epistemologia que não seja histórica"5. Contemporaneamente, estudos epistemológicos vinculados à história da ciência têm sido os mais amplamente empregados. Os vantajosos aspectos metodológicos envolvidos são assim avaliados por Popper: Se ignorarmos o que outras pessoas pensam ou pensaram no passado, a discussão racional se encerrará, embora cada um de nós possa progredir alegremente, falando consigo mesmo. [...] Não há dúvida de que Deus fala principalmente consigo mesmo, porque não existe quem seja digno de ouvi-lo. (Popper, 1989[1934], p. 537).

Tal ênfase na historicidade dos estudos epistêmicos é derivada, também, da contrapartida às proposições de uma das principais correntes epistemológicas desse século, referenciadas pelo Círculo de Viena (19261936), cuja abordagem epistêmica implicou em uma visão intemporal da ciência, na qual os problemas científicos foram, simplesmente, substituídos por problemas de linguagem e, neste caso, ao invés do método histórico, foi feita uma exaltação da análise lógico-linguística. As possibilidades de acesso à teorização da ciência fornecidas pela interação dos dois campos tensivos, demarcados, por um lado, pela polarização ciência-filosofia e, por outro lado, pela historicidade que recobre o campo anterior, são inúmeras, de modo que não há como discordar de Bachelard quando diz Chegaremos, então, para caracterizar a filosofia das ciências, a um pluralismo filosófico que é o único capaz de informar os elementos tão diversos da experiência e da teoria, tão longe de estarem todos ao mesmo nível de maturidade filosófica. Definiremos a filosofia das ciências como uma filosofia distribuída. (Bachelard, 1984, p. 27)

Tal distribuição nos é exemplificada, hoje, por seis grandes linhas epistemológicas que construíram uma tradição de pesquisa epistêmica ao combinar de algum modo particular os elementos que conferem as amplas possibilidades de inquirição enunciadas. São elas: 5 Encyclopaedia Universalis, v.6, p. 372 apud Blanché (1988) p. 42.

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1) Filosofia das ciências, na qual os pesquisadores mesmos procedem a uma explicação dos elementos filosóficos presentes em sua prática, emergente hoje devido à crise dos fundamentos matemáticos, do formalismo lógico e dos princípios na Física (e.g., Russel, Hilbert, Brouwer, Bohr); 2) Elucidação das proposições científicas como análise formal das suas condições de validação e de verificação ou falsificação (e.g., Russel, Wittgenstein, Carnap, Reichenbach, Quine, Popper); 3) Epistemologias regionais, dadas pela diversificação das ciências, que examinam princípios, métodos e conceitos de uma ciência particular (e.g., Bunge na Física, Jacques Monod na Biologia); 4) Epistemologias históricas, resultantes da diversificação rápida e profunda das ciências em nossa época, precisam responder aos processos de formação e transformação das teorias científicas (e.g., Jean Cavaillès, Alexandre Koyré, Gaston Bachelard, Georges Canguilhem, Paul Feyerabend, Thomas Kuhn, Imre Lakatos); 5) Arqueologia do saber, dada pelo entendimento de que o estudo das ciências do homem autoriza uma melhor compreensão das condições históricas da estruturação do discurso do saber, acarretando também nas implicações genéticas do saber (e.g., Foucault); 6) Epistemologia genética (e.g., Piaget). Para situar uma escolha de uma linha epistemológica, torna-se importante situar como se constituiu e em que consiste a inquirição. As soluções dadas a três grandes questões da epistemologia, quais sejam: (i) como é possível a certeza do conhecimento; (ii) como a ciência se distingue dos demais tipos de conhecimento? e (iii) como avança a ciência? parecem satisfazer os propósitos apontados, como veremos no item 2, a seguir.

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2. O CENÁRIO EPISTÊMICO: INVENTÁRIO DOS TRÊS PROBLEMAS PRINCIPAIS As categorias ou conceitos utilizados pela epistemologia para a análise da ciência são tão plurais quanto as infindáveis incursões que podemos fazer consoante a diversidade de acessos esboçada no item anterior. Em geral, cada autor estabelece as categorias para a pesquisa epistêmica em conformidade com o problema principal que se propõe a resolver. Assim, em Bachelard 6, encontramos categorias como obstáculos epistemológicos, corte epistemológico, vigilância epistemológica. Em Popper, temos a falseabilidade; em Kuhn (1989[1962]), o conceito de paradigma científico; em Lakatos (1982), o conceito de programa de pesquisa; em Blanché (1988), a recorrência histórica, etc. Tais categorias tornam-se completamente desprovidas de sentido se forem definidas fora do contexto no qual emergiram, de modo que se torna mais útil e profícuo conhecermos os problemas que se propuseram a resolver e como foram resolvidos. Três questões são particularmente interessantes para introduzir minimamente o instrumental teórico capaz de dar a noção de como é construído a inquirição epistêmica e, ao mesmo tempo, quais as possibilidades de soluções e como foram resolvidas no devir histórico. São elas: 1) Como é possível a certeza do conhecimento? - o problema do ceticismo e o problema da indução (ou problema de Hume); 2) Como a ciência se distingue dos demais tipos de conhecimento? - o problema da demarcação7 (ou problema de Kant); 3) Como avança a ciência? - o problema do progresso científico. As respostas a essas três questões remonta-nos à filosofia grega e levanos a diferentes modalidades de abordagens filosóficas, conformando um verdadeiro mosaico de multiplicidades. Seria necessário traçarmos todo um desenvolvimento histórico para podermos, sem cair nos simplismos originados 6 O desenvolvimento desses conceitos pode ser encontrado em Bachelard (1984): obstáculo epistemológico; Bachelard (1977): corte epistemológico (cap. VI); a vigilância epistemológica (cap. IV); 7 Para Popper (1987) essa é a principal questão da epistemologia.

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por definições curtas, compreender com profundidade a natureza de tais abordagens. Mesmo assim, indicaremos a importância e consequência de cada uma na praxiologia científica. 2.1. COMO É POSSÍVEL A CERTEZA DO CONHECIMENTO? - O PROBLEMA DA INDUÇÃO (OU PROBLEMA DE HUME) Questionar a certeza do conhecimento que adquirimos parece hoje, com todo o sucesso das teorias científicas contemporâneas, um monstruoso contrassenso. Mas, ao perguntarmos como é possível a certeza do conhecimento, implicitamente perguntamos: é de fato possível conhecer? Em que está fundado aquilo que chamamos de conhecimento? Aonde reside a certeza do conhecimento? Essa dúvida, levantada desde a antiga Grécia por Platão na sua obra Teeteto, pode ser considerada como originadora da epistemologia, no sentido geral de teoria do conhecimento. [Ver Para saber mais] Para saber mais O QUE É O CONHECIMENTO PARA OS PRÉ-SOCRÁTICOS? Brown afirma que na pergunta de Platão "O que é o conhecimento?" não estava implícita a dúvida e, por isso, estava implícita a "infalibidade como um dos critérios pelos quais que se julgam as respostas propostas a sua pergunta" (Brown, 1988, p. 191). Posição diferente é a de Hamlyn que considera que "Quando um filósofo pergunta se algo é possível, a questão deve ser definida contra a consideração de que tal coisa não pode ser possível‖ (Hamlyn, 1967, p. 9). Com efeito, Hamlyn acrescenta que os filósofos pré-socráticos (Tales de Mileto, Anaximandro, Pitágoras, Parmênides, Zenão, Heráclito, Empédocles, entre outros) os primeiros da tradição Ocidental, não

deram atenção a esse problema, pois estavam concentrados com a natureza e a possibilidade de mudanças. Para Hamlyn, tal dúvida surgiu apenas com os Sofistas (Gorgias e outros) no século V a.C., quando a tradição pré-socrática foi criticamente examinada pela primeira vez, e, assim, muitos atributos anteriormente considerados como sendo parte da natureza foram vistos como não sendo, de tal sorte que emerge o problema da antítese entre atributos da natureza e sensações humanas. Foi então que se colocaram perguntas como: nós temos algum conhecimento da natureza tal como ela realmente é?

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Mas é na obra República onde Platão apresenta uma visão sobre as diversas modalidades do conhecimento por meio do esquema da linha dividida8 em dois segmentos (ab, bc). O primeiro segmento ab representa o mundo sensível e, o segundo (bc), o mundo inteligível.

BEM IDEIAS

MUNDO INTELIGÍVEL

OBJETOS MATEMÁTICOS

c e

DIALÉTICA

[noêsis]

CONHECIMENTO MATEMÁTICO [diânoia]

CIÊNCIA episteme

b OBJETOS SENSÍVEIS

MUNDO SENSÍVEL

CRENÇA

[pistis]

d ILUSÃO, CONJECTURA

SOMBRAS

OPINIÃO doxa

a

Figura 3 – Esquema das modalidades de conhecimento dos mundos sensível e inteligível, segundo Platão.

O conhecimento dá-se então pela progressiva passagem das incertezas das aparências (sombras, imagens) e crenças do mundo sensível – opinião (doxa) –, para a perfeição das formas (objetos matemáticos) e das ideias (dialética) do mundo inteligível – ciência (episteme). No cume desse processo está o Bem, como princípio de conhecimento, funcionando como análogo ao Sol ao iluminar o plano material, como pode ser visualizado na Figura 3.

8 Esse esboço foi modificado de Platão, 1987, p. xix e xx, e de História do Pensamento, 1987, v. 1, p. 66.

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É, entretanto, no mito da caverna, na mesma obra, onde Platão dramatiza com toda profundidade o problema do conhecimento e o critério de verdade. [Ver Para saber mais]

Para saber mais

O MITO DA CAVERNA Essa alegoria, que Platão escreveu em sua obra República, Livro VII, 514A/519D, descreve homens que habitam no fundo de uma caverna desde pequenos, presos de tal modo que somente podem olhar para a frente. A luz de um fogo, situado no alto bem atrás deles, projeta na parede que contemplam sombras de artefatos com formas diversas (utensílios, animais, etc.) transportados por homens que caminham ao longo de um muro entre o foco de luz e os aprisionados. ―Para semelhante gente, a verdade consistiria apenas na sombra dos objetos fabricados‖, assevera o narrador Sócrates. Destarte, a situação mudaria radicalmente se um deles fosse libertado. Ao virar a cabeça, primeiro deslumbrar-se-ia com o fogo o que, além de causar-lhe dor, o impediria que visse a ―encenação‖. Mas, ao vê-la, "não te parece que ficaria atrapalhado e imaginaria ser mais verdadeiro tudo o que ele vira até então do que quanto lhe mostravam?", pergunta Sócrates.

A situação agravar-se-ia, sobremaneira, se o homem aprisionado fosse conduzido para fora da caverna e contemplasse a verdadeira realidade. Aos poucos descortinaria o mundo real, percebendo, primeiro, as sombras; depois, as imagens refletidas na água e, por fim, o Sol, fonte de toda luz e da realidade do espaço visível. Assim, quando se lembraria dos seus companheiros de prisão, ―não te parece que se felicitaria pela mudança e lastimaria a sorte deles todos?‖, questiona o narrador. Situação mais paradoxal aconteceria caso esse homem retornasse à caverna. Ao emitir juízos a respeito das sombras, tornar-se-ia motivo de zombaria por parte dos eternos aprisionados e "não diriam estes que o passeio lá por cima lhe estragara a vista e que não valia a pena sequer tentar aquela subida?" E se, mesmo assim, ele tentasse a libertação dos demais, "não lhe tirariam a vida?", sentencia Sócrates. Múltiplas interpretações podem ser tiradas dessa alegoria.

Essa alegoria aborda os diversos problemas do ato de conhecer. Nela, o mundo aparente é apresentado como uma ilusão, situando-se a verdade para além dela. Mas, ao procurá-la, a linguagem pela qual designamos as coisas mudam na medida em que melhor a conhecemos a ponto de já não mais poder ser entendida pelos que designam as coisas pela aparência das ilusões. O ato de conhecer, implica, na visão platônica, num ato também pedagógico

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que não pode dissociar-se de sua permanente divulgação, sob pena de não ser entendido por aqueles que, aprisionados pelo mundo das aparências na vida comum, não podem buscar a verdade. (Ver Para saber mais)

Para saber mais

HABERMAS E O AGIR COMUNICATIVO NA ATUALIDADE Dentre os pensadores contemporâneos, Jürgen Habermas (1987 [1968]) em seu livro Técnica e ciência como "ideologia" foi quem trabalhou intensamente o problema do abismo entre o mundo social da vida contraposto pelo universo amundano dos fatos. Esse abismo é somente suplantável por uma ação comunicativa entre os agentes de ciência e os agentes sociais, pois ―Os conhecimentos da física atômica tomados em si mesmos permanecem sem consequências para a interpretação do nosso mundo vital – pelo que o abismo entre essas duas culturas é inevitável. Só quando mediante as teorias físicas realizamos fissões

nucleares [...] é que as suas consequências práticas subversivas podem penetrar na consciência literária do mundo vital. - Surgem poesias relativamente a Hiroshima, e não através da elaboração de hipóteses sob a transformação da massa em energia. Essa desproporção das duas culturas é alarmante só porque [...] se perfila verdadeiramente um problema vital da civilização configurada pela ciência: o problema de como se pode hoje efetuar a reflexão sobre a conexão, ainda espontânea, entre progresso técnico e mundo social da vida, e submetê-la aos controles de uma discussão racional‖ (Habermas, 1987, p. 95-96).

Outro pensador grego, o sofista Gorgias, assim apresenta o mesmo problema, segundo Hamlyn de modo mais radical: [...] não haveria tal coisa como a realidade, pois, se houvesse, não poderíamos saber dela, e que mesmo que pudéssemos conhecê-la, não poderíamos comunicar nosso conhecimento acerca dela. (Gorgias [487380 a.C.] apud Hamlyn, 1967.)

O problema da certeza do conhecimento se coloca como uma equação complexa, que tem sido renovada até os dias atuais. Desde Platão, para o qual as ―Formas‖ são os únicos objetos do conhecimento, sendo as coisas sensíveis objetos meramente da opinião9, muitas outras tradições filosóficas abordaram esse problema, recebendo várias modalidades de soluções. Algumas delas, 9 Cf. Hamlyn (1967, p. 10); cf. História do Pensamento (1987, v. 1).

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inclusive, opostas, como a dúvida racionalista do século XVII (Descartes, Leibniz, Spinoza), resolvida pela certeza das ideias claras, e a dúvida do empirismo do século XVII e XVIII (Locke, Berckeley, Hume, Bacon e Mill), resolvida pela certeza da percepção. Tal contraposição deriva de diferentes concepções sobre qual a fonte do conhecimento (apriorista ou perceptivo; analítico ou sintético; esquemas lógicos ou experiência do mundo sensível) e qual é o critério de verdade (a "ideia clara" ou a percepção). Tal polaridade, entretanto, acabou por fundar, de um lado, o dogmatismo, encerrado em esquemas metafísicos sem possibilidade de autorreflexão e crítica; e, de outro, o ceticismo empirista, recusando terminantemente as ideias na explicação dos fatos, como faces de uma mesma moeda. Com efeito, a ideia clara de Descartes ―penso, logo existo‖ (cogito ergo sum) era tida como verdadeira e, portanto, ideias claras semelhantes, também haveriam de ser. A verdade é obtida por um processo do pensamento feito com um método capaz de assegurá-la, pois o mundo exterior não fornece garantias para a certeza do conhecimento. Tal verdade é, então, apriorística e dogmática. De outro lado, Hume

declara que a certeza só pode ser uma crença

pois: O contrário de um fato qualquer é sempre possível [...]. Que o sol não nascerá amanhã é tão inteligível e não implica em mais contradições do que a afirmação que ele nascerá. [...] Portanto, deve ser assunto digno de nossa atenção investigar qual é a natureza desta evidência que nos dá segurança acerca da realidade de uma existência e de um fato que não estão ao alcance do testemunho atual de nossos sentidos ou do registro de nossa memória. (Hume, 1989[1777], p. 77-78.)

Isso torna o ceticismo inevitável, dado que a crença se baseia no hábito e não em bases racionais. Diz ainda Hume Segue-se daqui que todos os raciocínios sobre a causa e o efeito são fundamentados sobre a experiência e que todos os raciocínios da experiência são, por sua vez, fundados na suposição de que o curso da natureza continuará o mesmo, uniformemente. (Hume, 1989[1777], p. 77-78.)

Mas se a origem dessa suposição não pode ser a razão: ―Somente o hábito nos leva a supor o futuro conforme o passado‖. (Hume, 1989[1777], p. 77-78.)

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As ideias (pensamento) são resultados da associação de impressões (percepções do sentido) e só a experiência possui, então, validade para o conhecimento – e não o encadeamento lógico das ideias, na medida em que os fatos não possuem relação de causalidade necessária, mas apenas contingente. Nesse sentido, acreditar na causalidade dos fatos é uma crença determinada pelo hábito ou costume de passar para a impressão uma ideia associada, sendo, portanto, uma impressão da reflexão, resulta em uma abordagem psicológica. Com isso, Hume (1989[1777]) apresenta o importante problema do método indutivo, ao evidenciar que a implicação de um fato a uma causa hoje não fornece nenhuma razão lógica para pressupor que o mesmo fato seja implicado pela mesma causa amanhã, de modo que a única justificativa para a indução é uma crença de que os fenômenos se repetem. No entanto, Hume não forneceu alternativas à indução.

O trilema de Fries: dogmatismo vs. ceticismo vs. psicologismo

Foi Jakob Fries [1773–1843] quem apresentou as três possibilidades de solução do problema da certeza do conhecimento, até então existentes no meio científico e brevemente abordadas acima, na forma de um trilema, chamado por Popper (1989[1934]) de trilema de Fries: 1) Dogmatismo; 2) Ceticismo (regressão infinita); e 3) Psicologismo. Esse trilema foi, segundo Popper, estudado profundamente por Fries, que apontou a solução psicologista como a mais amplamente aceita pela comunidade científica. Popper enuncia do seguinte modo o trilema de Fries: Ensinou ele [Fries] que, se não cabe aceitar dogmaticamente os enunciados da Ciência, devemos ter como justificá-los. Se exigirmos justificação através de argumento que desenvolva razões, no sentido lógico, seremos levados à concepção segundo a qual enunciados só podem ser justificados por enunciados. A exigência de que todos os enunciados devam ser logicamente justificados (a que Fries se refere falando em "predileção por demonstrações") tende, portanto, a conduzir a uma regressão infinita [ceticismo]. Ora, se quisermos evitar o perigo do dogmatismo, ao mesmo tempo que a regressão infinita, aparentemente não restará outro recurso que não o do psicologismo, isto é, a doutrina de acordo com a qual enunciados

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podem encontrar justificação não apenas em enunciados, mas também na experiência perceptual. Diante desse trilema – dogmatismo vs. regressão infinita vs. psicologismo – Fries, e com ele quase todos os epistemologistas que desejavam explicar nosso conhecimento empírico, optaram pelo psicologismo. Na experiência sensória, ensinou ele, encontramos "conhecimento imediato": através desse conhecimento imediato podemos justificar nosso "conhecimento mediato" – conhecimento expresso no simbolismo de alguma linguagem. (Popper, 1989[1934], pp. 99-100)

Entretanto, aceitar as experiências perceptuais como fonte do conhecimento implica necessariamente em aceitar o método indutivista como aquele capaz de transportar o valor de verdade de um enunciado singular (um fato) para um enunciado universal (uma lei, uma generalização). Embora o problema da indução tenha sido apontado desde Hume (1989[1777]) (a conexão entre fatos como vemos hoje, não implica que seja a mesma de amanhã e, nesse sentido, a generalização não tem justificativa lógica a não ser enquanto crença numa suposta regularidade dos fatos), tal método foi utilizado como o único modo de chegar a generalizações verdadeiras durante um grande período da história da ciência. A solução definitiva do trilema de Fries, que nega tanto o dogmatismo como o ceticismo pirrônico [ver Para saber mais] e, além disto, suplanta o problema da indução e do psicologismo, é devida a Karl R. Popper (1989[1934]) em sua conhecida obra Logik der Forschung, na qual é proposto o racionalismo crítico na atividade científica. Tais pressupostos serão vistos no próximo item sobre o problema da demarcação da ciência (o Programa Falseacionista de Popper). Por ora, ficamos com a excelente metáfora de Popper na qual, embora considere que o que conhecemos apenas tangencia a verdade, admite também que podemos de fato conhecer algo e o nível de regressão infinita que aplicamos a esse conhecimento depende de onde queremos chegar A base empírica da ciência objetiva nada tem, portanto, de "absoluto". A ciência repousa em terra firme. A estrutura de suas teorias levanta-se, por assim dizer, num pântano. Assemelha-se a um edifício construído sobre pilares. Os pilares são enterrados no pântano, mas não em qualquer base natural ou dada. Se deixamos de enterrar mais profundamente esses pilares, não o fazemos por termos alcançado terreno firme. Simplesmente nos detemos quando achamos que os

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pilares estão suficientemente assentados para sustentar a estrutura pelo menos por algum tempo. (Popper, 1989[1934], p. 119)

Para saber mais TIPOS DE CETICISMO São diversos os tipos de ceticismo. Um estudo pormenorizado dos argumentos dos céticos e sua refutação fazendo uso de linguagem formalizada e sob um ponto de vista empirista pode ser encontrado na obra de Dancy (1990). Esse autor define três tipos de argumentos céticos: 1) O conhecimento é impossível; ninguém conhece porque ninguém pode conhecer. 2) O ceticismo que leva a uma regressão infinita: a cada resposta, recoloca-se a pergunta "Como é que sabe isso?" 3) Elevam-se os padrões evidenciais tão alto que é impossível conformarse-lhes. Esse cético estigmatiza os outros de crédulos ou facilmente

persuadíveis. Uma compreensão mais interessante do ceticismo científico, porque racionalista crítica, encontra-se em Watkins (1990, p. 13). Fazendo uso de linguagem formalizada, sem, no entanto, deixar de ser bastante acessível, esse autor distingue três ceticismos: 1) O acadêmico, que diz não há senão uma coisa que podemos saber; 2) O ceticismo pirrônico, que diz que nem isso podemos saber; 3) O ceticismo egocêntrico de Hume, que "concede que cada um de nós tem uma boa dose de conhecimento egocêntrico sobre nossas próprias crenças, sentimentos e experiências perceptivas."

2.2. COMO A CIÊNCIA SE DISTINGUE DOS DEMAIS TIPOS DE CONHECIMENTO? - O PROBLEMA DA DEMARCAÇÃO (OU PROBLEMA DE KANT) O problema da demarcação da ciência com a pseudociência e outros tipos de conhecimento, embora continuadamente presente desde as postulações do pensamento clássico, adquiriu uma importância crescente nesse século, passando não apenas a constituir-se numa das principais polêmicas atuais, bem como a ser considerada por muitos cientistas e epistemologistas (e.g., Popper, Lakatos, etc.) como a mais importante questão epistemológica dentre todas. Lakatos (1987) considera que uma solução do problema de Kant, assim denominado por Popper (1989[1934]), pressupõe a superação da pergunta cética e dogmática "como conhecemos?", que cliva toda a história da ciência desde a antiguidade, para uma nova pergunta "como

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corrigimos e melhoramos nossas conjecturas?". Essa nova questão produz uma mudança epistêmica substancial a ponto de Lakatos proclamar que dará muito trabalho aos filósofos durante séculos inteiros; e como viver, atuar, lutar e morrer quando somente contamos com conjecturas dará trabalho mais que suficiente aos futuros filósofos de política e pedagogos.(Lakatos, 1987, p. 24.)

Segundo Losee (1979, p. 190), ―Aristóteles foi o primeiro filósofo da ciência a enfatizar a demarcação entre as interpretações científicas e as interpretações não científicas.‖ [Ver Para saber mais] Para saber mais O USO DE SILOGISMOS POR ARISTÓTELES Para Losee (1979, p. 19), uma das grandes conquistas de Aristóteles foi ―insistir que a validade de um argumento é determinada somente pela relação entre as premissas e a conclusão". Assim, Losee explica que se tornava possível, a partir dos sujeitos e predicados de um conjunto de premissas, a dedução de conclusões fazendo uso de silogismos, desde que tais premissas satisfizessem quatro requisitos extralógicos: a) serem verdadeiras; b) indemonstráveis; c) melhor conhecidas do que a conclusão; e, o mais importante, d) tivessem uma relação causal. Os chamados silogismos do fato não eram considerados satisfatórios, pois, por exemplo, se considerarmos o silogismo: - Todos os ruminantes com cascos bífidos são animais privados de incisivos superiores. - Todos os bois são animais ruminantes com casco bífido. ... Todos os bois são animais privados dos incisivos superiores.

temos como meramente acidental a relação entre a estrutura dos cascos e a da mandíbula, posto que as premissas do silogismo do fato não afirmam a sua causa. De outro modo, temos uma relação causal no chamado silogismo do fato racionado, como por exemplo: - Todos os ruminantes com estômago de quatro câmaras são animais sem os dentes incisivos superiores. - Todos os bois são ruminantes dotados de estômagos de quatro câmaras. ... Todos os bois são animais privados dos incisivos superiores. Losee acrescenta, ainda, que Aristóteles sugeriu, para diferenciar as relações causais das acidentais, "que em uma relação causal o atributo é 1) verdadeiro para todos os casos em que aparece o sujeito, 2) verdadeiro especificamente para o sujeito, e não por ser ele parte de um todo maior, e 3) é 'essencial ao' sujeito." (Losee, 1979, p. 21) Dessa forma, para Aristóteles, "uma ciência tem um gênero distintivo de sujeitos e um conjunto próprio de predicados." (Losee, 1979, p. 21).

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A base empírica e a observação como critério de demarcação Mas é somente a partir do surgimento da ciência moderna com Galileu que a base empírica tem sido enfatizada como o grande critério demarcatório em relação à pura especulação filosófica encetada pelos escolásticos do século XVII, que canonizaram o método aristotélico ao mesmo tempo em que o perverteram ao cortar-lhe justamente a base empírica. Diz-se, a partir de então, que é científico o conhecimento que tem por base a experiência. Mas, em si, isso diz muito pouco. O próprio Galileu desenvolveu suas teorias sem absolutizar os dados ou aquilo que chamamos de experiência. A revolução científica empreendida por Galileu abalou a concepção aristotélica-escolástica ao demonstrar que o edifício puramente lógico e dedutivo desta pode resultar em enganos quando se refere às questões da natureza. [Ver Para saber mais] Para saber mais MÉTODO E FILOSOFIA DA CIÊNCIA EM GALILEU GALILEI Em sua obra O Ensaiador, Galileu (1987 [1623]) dedicou-se a refutar as alegações de um crítico escolástico que afirmava serem as experiências inapropriadas para provar fenômenos da natureza produzidos pelo acaso e que, portanto, deveria prevalecer o depoimento e o testemunho dos poetas filósofos e historiadores, como Aristóteles, mesmo quando se tratasse de ideias tão bizarras como a de supor que o ar seria capaz de derreter projéteis de chumbo e cozinhar ovos. Para Galileu, a experiência é suficiente para refutar qualquer crença, mesmo aquelas das autoridades, pois, diz ele: ―Eu poderia dar muitos exemplos da variedade da natureza em produzir

teorizar e testar pela experiência fazendo uso da matemática, pois ―a filosofia [com o sentido de ciência] encontra-se escrita neste grande livro que continuamente se abre perante nossos olhos (isto é, o universo), que não se pode compreender antes de entender a língua e conhecer os caracteres com os quais está escrito. Ele está escrito em língua matemática, os caracteres são triângulos, circunferências e outras figuras geométricas, sem cujos meios é impossível entender humanamente as palavras; sem eles, nós vagamos perdidos dentro de um obscuro labirinto.‖ (Galileu (1987[1623]), p. 21) Contudo, Galileu não absolutizava a observação e a experiência. Para Losee ele ―adotou o ideal arquimediano da sistematização dedutiva, e também

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seus efeitos de maneira inimaginável para nós, se o sentido e a experiência não nos explicitassem sem, muitas vezes, suprir a nossa incapacidade.‖ (Galileu (1987 [1623]), p. 63.) Galileu defendia seu método de

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aceitou a distinção platônica entre o real e o fenomenal [...]. È luz desta distinção, é natural desenfatizar as discrepâncias entre os teoremas dos sistemas dedutivos e aquilo que é realmente observado‖. (Losee, 1979, p. 70)

A grande crise da ciência contemporânea não é outra senão a crise da base empírica como fonte segura do conhecimento per se. Estão aí as grandes teorias de sucesso, como as de Einstein, Maxwell, Bohr, para citar apenas algumas, que não foram originadas pela clássica ideia de acumular dados originados pela percepção do fato. Afinal, dificilmente podemos pensar que o universo, um átomo ou mesmo uma placa litosférica sejam fenomenologicamente perceptíveis. Qual seria, então, o critério de demarcação? No surgimento da ciência moderna os homens de saber viviam às turras com especulações metafísicas e teológicas, algumas das quais de cunho científico, no sentido que hoje lhe empregamos. A ciência moderna surge das entranhas da própria filosofia e dela teve que se distinguir, diferenciar e demarcar. A questão não se colocava de uma maneira fácil, pois toda uma tradição do pensamento filosófico tinha que ser superada. A famosa obra de Newton, Philosophiae naturalis principia mathematica (Princípios matemáticos da filosofia natural, 1687), por exemplo, ainda não estava de todo desligada da filosofia, como o próprio título indica. O mesmo ocorria com Descartes, em sua obra Principia Philosophiae (1644; Princípios da Filosofia, 2007[1644]). O critério fundamental de demarcação inaugurado nesse período, que propiciou o próprio desenvolvimento da ciência moderna, ao delimitá-la da especulação escolástica então em voga, foi aquele que passou a considerar científico apenas o que fosse originado pela observação direta da natureza. Já não se tratava de tecer os princípios do mundo num sistema hermético e indecifrável, no qual cada um propunha a sua verdade, mas de descrever a natureza tal como ela é. Esses critérios, embora já trabalhados por Galileu, foram estipulados segundo outra tradição filosófica – a empirista – por Francis Baconem sua obra Novum Organum ("Novo Instrumento"), de 1620 [ver Para saber mais]. As noções metafísicas genéricas, a maioria delas originadas no pensamento clássico, como substância, qualidade, ação, paixão, corrupção, elemento, matéria, forma, foram consideradas fantásticas e mal definidas (Aforismo XV,

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Livro I, p. 15), devendo ser suprimidas e dar lugar a características mensuráveis e observáveis tais como peso, maleável, dúctil, volátil, liquefação, solução (Aforismo V, Livro II, p. 96).

Para saber mais

ORGANON VS. NOVUM ORGANON O título da obra de Francis Bacon Novum Organon contrapõe-se ao ‗velho‘ Organon ("Instrumento") escrito por Aristóteles. O Organon ou instrumento aristotélico era um conjunto de regras pelas quais se tornava possível a formulação de proposições sobre alguma coisa sem cair-se nas armadilhas da linguagem, tão praticada pelos sofistas. Tais regras, que hoje denominamos de lógica, colocavam-se como anteriores ao conhecimento, pois, do contrário, poder-se-ia facilmente cair em equívocos. O aristotelismo foi o grande modelo de conhecimento dos escolásticos na Idade Média e contra ele Bacon (1988[1620]) dirigiu suas principais críticas e farpas: "Quanto a nós apoiados na evidência dos fatos, rejeitamos toda a sorte de fantasia ou impostura. E não reputamos de interesse para o que nos ocupa saber-se se o que vai ser descoberto já era conhecido dos antigos ou se está sujeito às vicissitudes das coisas ou às circunstâncias desta ou daquela idade. Tampouco parece digno da preocupação dos homens o saber-se se o Novo Mundo é aquela ilha Atlântida, conhecida dos antigos, ou se foi descoberta agora pela primeira vez. A descoberta das coisas deve ser feita com recurso à luz da natureza e não pelas trevas da Antiguidade." (Bacon, 1988[1620], p. 81) E, para sair do impasse, propõe uma limpeza do intelecto humano ocupado

da verdade, como, mesmo depois de seu pórtico logrado e descerrado, poderão ressurgir como obstáculo à própria instauração das ciências, a não ser que os homens, já precavidos contra eles, se cuidem o mais que possam." (Bacon, 1988[1620], p.20-21) E, para precaver-se: "Só há e só pode haver duas vias para a investigação e para a descoberta da verdade. Uma, que consiste no saltarse das sensações e das coisas particulares aos axiomas mais gerais e, a seguir, descobrirem-se os axiomas intermediários a partir desses princípios e da sua inamovível verdade. Esta é a que ora se segue. A outra, que recolhe os axiomas dos dados e dos sentidos e particulares, ascendendo contínua e gradualmente até alcançar, em último lugar, os princípios de máxima generalidade. Este é o verdadeiro caminho, porém ainda não instaurado." (Bacon, 1988[1620], p. 16) Desse modo: "Resta-nos um único e simples método, para alcançar os nossos intentos: levar os homens aos próprios fatos particulares e às suas séries e ordens, a fim de que eles, por si mesmos, se sintam obrigados a renunciar às suas noções e comecem a habituar-se ao trato direto das coisas." (Bacon, 1988[1620], p. 20.) O intelecto é visto como um altar imaculado: "fundamos no intelecto humano um

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por ídolos e noções falsas: "Os ídolos e noções falsas que ora ocupam o intelecto humano e nele se acham implantados não somente o obstruem a ponto de ser difícil o acesso

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templo santo à imagem do mundo. E por ele nos pautamos. Pois tudo o que é digno de existir é digno de ciência, que é a imagem da realidade." (Bacon, 1988[1620], p. 79, grifos meus.)

Embora os critérios de demarcação parecessem claros, não eram suficientes. A demarcação deu-se basicamente em função de um método – o indutivo – declarado como sendo o verdadeiro e único. Como vimos, Hume (1989[1777]) já havia apontado o problema da indução e, assim, a demarcação entre ciência e não ciência não ficou de todo resolvida. Se, por um lado, a observação em si colocou-se como bom critério de demarcação com a especulação escolástica, por outro, a generalização da observação não se traduzia em método seguro para a certeza do conhecimento e, assim, alcançar a verdade. No entender de alguns, como na posição cética de Hume (1989[1777]), a generalização é uma crença e, neste sentido, nada podemos afirmar com certeza sobre nada. Para Francis Bacon (1988[1620]), a observação leva, pela indução, quase que forçosamente à generalização, mas o argumento de Hume (1989[1777]) é um óbice claro a esse desiderato e não foi considerado por ele e pelos que o seguiram. O método científico ficou sendo sinônimo do paradigma baconiano por um longo período da história da ciência e até hoje é ensinado nas escolas e universidades. Se, para a ciência nascente, segundo o "filósofo da ciência planificada", como Bacon foi chamado por alguns historiadores, concepções a priori deviam ser expurgadas totalmente da atividade científica, tal pressuposto não se sustentou. Foi Kant quem retomou o fio da meada demonstrando que formas espaço-temporais são necessariamente uma característica a priori da experiência. Além disso, introduziu o critério de intersubjetividade na análise de fenômenos ao considerar que tal característica não é subjetiva, mas válida para todos os homens. Resgata a Lógica como necessária aos empreendimentos científicos (ver Para saber mais), bem como o conceito de causalidade dos fenômenos (então "limpados" por Bacon, 1988[1620]) e Hume (1989[1777]) e demarca a Metafísica da Ciência utilizando-se de Galileu como um grande paradigma da ciência.

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Para saber mais

A LÓGICA OU A RAZÃO DAS CIÊNCIAS SEGUNDO KANT Sobre a justificativa da razão nas ciências, nos diz Kant: ―Na medida em que deve haver razão nas ciências, algo tem que ser conhecido nelas a priori, e o conhecimento da razão pode ser referido de dois modos ao seu objeto: ou meramente para determinar este seu conceito (que precisa ser dado alhures) ou também para torná-lo real. O primeiro é conhecimento teórico, o outro, conhecimento prático da razão. Não importa quão grande ou pequeno seja o seu conteúdo, a parte pura de ambos, ou seja, aquela em que a razão determina seu objeto de modo completamente a priori, tem que ser exposta antes sozinha, e aquela que provém de outras fontes não tem de ser mesclada com ela; pois constitui péssima economia gastar cegamente todos os ganhos sem poder distinguir depois, quando ele emperra, qual parte dos rendimentos pode arcar com a despesa e de qual parte tem de cortá-la.‖ (Kant, 1987, p. 12.)

A mente não é cera passiva: o programa de Kant

Através de uma bela metáfora, que posiciona a teoria diante da observação não como um aluno diante do professor, mas como um juiz em um tribunal, critica convincentemente a visão baconiana e inaugura, no entender de Popper, uma das mais importantes questões da ciência: o problema da demarcação, também chamado de problema de Kant. Na ciência, diz Kant [...] acendeu-se uma luz para todos os pesquisadores da natureza. Compreenderam [Galileu, Torricelli e Stahl] que a razão só discerne o que ela mesmo produz segundo seu projeto, que ela tem de ir à frente com princípios dos seus juízos segundo leis constantes e obrigar a natureza a responder às suas perguntas, mas sem ter de deixar-se conduzir somente por ela como se estivesse presa a um laço [crítica explícita a Bacon, para quem a mente deveria ser guiada apenas pela natureza]; pois do contrário observações casuais, feitas sem um plano previamente projetado, não se iterconectariam em uma lei necessária,

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coisa que todavia a razão procura e necessita. (Kant 1987[1787], p. 13, grifos meus.)

Kant comenta, ainda, sobre o papel do investigador diante da natureza. Ao afirmar que ele não deve ser um papel de expectador, mas de quem está julgando a partir dos fatos as perguntas que propõe: A razão tem de ir à natureza tendo em uma das mãos os princípios unicamente segundo os quais os fenômenos concordantes entre si podem valer como leis, e na outra o experimento que ela imaginou segundo aqueles princípios, na verdade para ser instruída pela natureza, não porém na qualidade de um aluno que se deixa ditar tudo o que o professor quer, mas na de um juiz nomeado que obriga as testemunhas a responder às perguntas que lhes propõe. (Kant 1987[1787], p. 13, grifos meus.)

Já na metafísica, segundo Kant (1987[1787], p. 13), a "razão deve ser aluna de si mesma" e, portanto, se trata de um conhecimento isolado e especulativo que ainda não teve sucesso, mas que poderia tê-lo se se utilizasse do método do investigador da natureza, qual seja, "procurar os elementos da razão pura naquilo que pode ser confirmado ou refutado por um experimento" (Kant, 1987[1787], p. 15). Em outras palavras, "testar suas proposições", de modo a obstruir "toda a fonte de erros": eis "a primeira e a mais importante preocupação da Filosofia". Para tanto, utilizou na metafísica o conceito de categorias tal como na ciência utiliza-se o de objetos. Assim, o conhecimento científico distingue-se do metafísico, pois "possui suas fontes a posteriori, ou seja, na experiência" (Kant, 1987[1787], p. 25), enquanto o metafísico se realiza somente a priori. O programa kantiano, reconhecidamente ambicioso, pois pretendia desenvolver uma disciplina na qual se pudesse afirmar "nil actom repuntans, si quid superesset agendum" (Kant 1987[1787], p. 17; ―Reputando nada como feito, se algo restasse para fazer‖), foi um marco no pensamento por declarar que "embora todo o nosso conhecimento comece com a experiência, nem por isso todo ele se origina justamente da experiência", pressupondo uma síntese entre o conhecimento a priori e a posteriori. Assim, Kant soluciona o impasse criado entre o racionalismo idealista e dogmático de Descartes (entre outros), que declarava o apriorismo de todo o conhecimento, de um lado, e o empirismo cético de Hume (1989[1777]), entre outros, que enunciava a impossibilidade de causalidade dos fatos, ou seja, a impossibilidade de conhecimentos a priori, tipo leis universais rigorosas, de outro. Para tanto,

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admitiu existirem dois campos de conhecimentos, os a priori - isto é, independentes da experiência - e os a posteriori - ou seja, derivados da experiência. Porém, os primeiros devem ser criticados pela experiência, de modo a restringir seus erros e limitar suas possibilidades especulativas. Já os segundos (os da experiência), só encontram possibilidade de universalização rigorosa se propostos junto aos juízos a priori. De fato, a ―universalidade empírica é somente uma elevação arbitrária da validade‖, e aqui Kant concorda com Hume (1989[1777]), que chama essa arbitrariedade de crença, na qual nunca saberemos quais são as suas exceções, pois a lei natural é enunciada pela contingência dos fatos e não por que é necessária aos fatos. Do contrário, a universalidade a priori é necessária aos fatos, ou seja, não permite nenhuma exceção, e, se existir, não terá mais o mesmo estatuto, tendo sido, portanto, refutada.

Os juízos sintéticos e a arquitetura da ciência moderna Além disso, em relação ao sujeito e ao predicado de um juízo, Kant (1987[1787], p. 29) denomina de juízos analíticos aqueles que são intrínsecos às coisas, não informam, pois servem para elucidar e analisar o conceito envolvido (diz-se que o predicado está contido no sujeito e, por isso, envolve contradição); e juízos sintéticos aqueles que informam sobre a coisa e ampliam o conceito do sujeito (diz-se que o predicado está fora do sujeito e, portanto, não envolve contradição). Por exemplo, ―todos os corpos são extensos‖ é um juízo analítico na medida em que a extensão é intrínseca ao conceito de corpo; e, ―todos os corpos são pesados‖ é um juízo sintético, pois o predicado acrescenta um atributo ao sujeito para além do mero conceito de corpo. O mesmo se verifica em ―todos os corpos são amarelos‖. Dessa forma, pode-se agora relacionar os campos do conhecimento (a priori ou a posteriori) com o tipo de conexão entre sujeito e predicado (juízo analítico ou sintético). Teremos juízos analíticos a priori, possíveis apenas na metafísica, e a posteriori, sempre impossíveis; e juízos sintéticos a priori (leis naturais, predições, etc., sempre referidos à experiência) e a posteriori (dados, experiência). Nesse sentido, os juízos da experiência são todos sintéticos, mas eles podem ser a priori, pois

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antes de recorrer à experiência, já possuo no conceito todas as condições para o meu juízo, conceito do qual posso extrair o predicado segundo o princípio de contradição e com isso tornar-me ao mesmo tempo consciente da necessidade do juízo, coisa que a experiência nunca me ensinaria. (Kant, 1987[1787], p. 29, grifos meus.)

Kant fornece, assim, a arquitetura do moderno conhecimento científico, originado por Copérnico e Galileu, que admite enunciados universais e causalidades dos fenômenos e, assim, declara a possibilidade de predição empírica (não especulativa, no sentido escolástico), mas ao mesmo tempo, admite que a enunciação de leis universais rigorosas e não contingentes (negadas por Bacon (1988[1620]), que só admitia as contingentes, e por Hume (1989[1777]), que não admitia nenhuma) devem ser sempre submetidas ao teste da experiência. Desse modo, tem-se a síntese entre o dogmatismo e o empirismo cético, resultando no racionalismo crítico, que trabalha com a tríade: analítico (metafísica, conceitos), sintético (experiência) e sintético a priori (leis, princípios, matemática), contraposta à dicotomia Humeana entre relations of ideas e matters of fact (ou de Platão ―mundo das ideias‖ e ―mundo sensível‖).

Verificacionismo e significado: o critérios do Círculo de Viena

O debate sobre a demarcação da ciência, contudo, ganha um novo impulso e enfoque no início do presente século, com as proposições do Círculo de Viena (ver Para saber mais), que renova o programa empirista-baconiano e declara que o significado é o critério para demarcar o conhecimento. Para definir se o conhecimento tem ou não significado, utiliza-se o método do verificacionismo. Nas palavras de Schlick (1988[1936], p. 85) ―o significado de uma proposição é o método de sua verificação‖. Deste modo, todas as proposições que possuem significado ou são analiticamente (lógica e matemática) ou empiricamente verificáveis (ciência). Nesse caso, qualquer outro tipo de proposição será dita não possuir nenhum significado, como, por exemplo, as proposições da metafísica. Assim, um enunciado é significativo se, e somente se, forem indicadas quais as condições e experiências pelas quais ele pode vir a ser verificado e controlado.

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Para saber mais O CÍRCULO DE VIENA [1926-1936] O Círculo de Viena foi formado por Moritz Schlick, seu organizador, em 1926, em Viena. Contou com a participação de Rudolf Carnap, uma das figuras centrais, Otto Neurath, Friedrich Waismann, Edgar Zilsel, Béla von Juhos, Felix Kaufmann, Herbert Feigl, Victor Kraft, Philipp Frank, Karl Menger, Kurt Gödel e Hans Hahn, influenciados pelas ideias de Mach e Russell. Ludwig Wittgenstein, autor do Tractatus Logicophilosophicus, onde interpreta e desenvolve o empirismo britânico, influenciou também profundamente o círculo, fazendo parte de algumas reuniões. Lançaram, em 1929, o manifesto Wissenschaftliche Welrauffaussung, Der Wiener Kreis (―A visão científica do mundo: o Círculo de Viena‖). Interessou-se pelo Círculo de Viena uma série de outros cientistas e filósofos tais como os participantes do grupo de Berlin, Hans Reichenbach, Carl Hempel, dos americanos C.W. Morris, Ernest Nagel, W.V. Quine; dos britânicos Gilbert Ryle, Alfred. J. Ayer; do polonês Alfred Tarski, que muito influenciou o círculo. Publicaram suas formulações na revista Erkenntnis. Com a ascensão do Nazi-fascismo na Alemanha, o círculo dissolveu-se em 1936. Seus membros emigraram para vários países e o positivismo lógico foi absorvido pelo movimento internacional do empirismo lógico.

As implicações de tal critério de demarcação foram de grande impacto para a concepção científica desenvolvida por todo o século XX. Primeiro porque trouxe para a análise filosófico-científica a questão da linguagem, a partir da qual problemas podem ser resolvidos na medida em que se pode empregar uma linguagem rigorosa.10 Daí seguiu-se toda uma formulação reducionista pela qual os "problemas da ciência" passaram a ser "problemas matemáticos", os problemas matemáticos, problemas de lógica e, esses, de linguagem. A proposição do verificacionismo era a de conferir ao indutivismo uma linguagem lógica e, com isso, renovar seu programa à luz da complexidade que as teorias vinham alcançando no início do século, principalmente a teoria da relatividade e a teoria quântica. Ao mesmo tempo em que se declaravam indutivistas, propunham uma formalização das teorias de tal sorte que as observações fossem traduzidas em termos de protocolos observacionais que garantissem a verificação e, assim, o critério de significado seria dado apenas pela empiria.

10 Cf. Meotti (1984), que faz um extenso balanço crítico do empirismo lógico.

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Segundo, porque muitos mitos e obstáculos epistemológicos originaramse desse programa de "expurgar" toda a metafísica da ciência. O principal deles foi a crença de que todas ciências poderiam ser, de alguma maneira, redutíveis à física e essa, por sua vez, à matemática e, a matemática à lógica e, a lógica, à linguagem. A boa ciência seria aquela cujo grau de formalização de seus enunciados fosse elevado. O problema central dessa teleologia reducionista foi substituir os "problemas da ciência" por "problemas de linguagem". O programa do positivismo lógico, entretanto, malogrou. Em Oliva (1990) encontramos uma contundente crítica ao verificacionismo ao ser buscada uma racionalidade epistemológica que o justifique: Só capturamos plenamente o alcance epistemológico da verificabilidade se nos damos conta de que no fundo equivale a deslocar o princípio do Empirismo para a esfera da linguagem. Enquanto o princípio do Empirismo sustenta que todo conhecimento autêntico promana da experiência, o da verificabilidade estatui que o material sensível (atual ou potencial) representa a única fonte de significação para os enunciados que, de uma ou de outra maneira, debruçam-se sobre 'enredos fatuais'.

Dessa maneira, Oliva (1990) sustenta que o princípio da Verificabilidade radicaliza o do Empirismo, pois identifica o domínio do discurso cognitivamente significante com o do conhecimento potencial, ou seja, tirante os enunciados tautológicos e os contraditórios, só concede importe cognitivo a enunciados passíveis de teste evidencial empírico. (Oliva, 1990, p. 44.)

Para Popper, tal revés do verificacionismo deriva do fato de que, ao ser mantida a lógica indutivista, não há como cumprir o prometido, ou seja, demarcar a ciência da pseudociência e da metafísica. (ver Para saber mais) Para saber mais

É A INDUÇÃO UM CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO? Popper afirma que a indução não é um método suficiente para demarcar a ciência da não ciência: ―Pois a principal razão por que os epistemologistas de tendências empiricistas propendem para o ‗método de indução‘ está, aparentemente, em acreditarem que só tal método pode oferecer um critério adequado de demarcação. Isso se aplica, de maneira especial, aos empiristas que seguem

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a bandeira do ‗Positivismo‘.‖ ―Os velhos positivistas só desejavam admitir como científicos os conceitos (ou noções, ou ideias) que, como diziam, 'derivassem da experiência', ou seja, os conceitos que acreditavam ser logicamente redutíveis a elementos da experiência sensorial, tais como sensações (ou dados sensoriais), impressões, percepções, lembranças visuais auditivas, e assim por diante.‖ ―Os positivistas modernos têm a condição de ver mais claramente que a Ciência não é um sistema de conceitos, mas, antes, um sistema de enunciados. Nesses termos, desejam admitir como científicos, ou legítimos, tão-somente os enunciados redutíveis a enunciados elementares (ou ‗atômicos‘) da experiência - a ‗juízos da percepção‘, ou ‗proposições atômicas‘, ou ‗sentenças protocolares‘ (e que mais?). Claro está que o critério implícito de demarcação é idêntico à exigência de uma Lógica Indutiva.‖ Popper (1989[1934], p. 35-36.)

O verificacionismo implica em que proposições universais simples do tipo "Todos os metais são condutores" sejam caracterizadas como sem significado, pois é impossível verificá-la completamente. Se tal enunciado fosse, por exemplo, verificado nos continentes do hemisfério sul para o cobre, a prata e o ouro, faltariam todo o hemisfério norte e, ainda, os dois polos. Mas, se nesses locais também fosse verificado, haveria de averiguar-se nos planetas internos Mercúrio, Vênus e Marte. E assim por diante para cada um dos metais (ferro, chumbo, etc.). A solução a esse problema da impossibilidade de verificar completamente um enunciado universal foi dada pelos positivistas lógicos em termos de um probabilismo da verificação. Dir-se-ia, então, que um enunciado universal como "Todos os metais são condutores" possui uma probabilidade de 80% de ser verdadeiro, o que também não soluciona o problema. É um interessante exemplo de Popper que põe termo à ilusão probabilista. Se considerarmos um enunciado do tipo "A probabilidade deste dado exibir o número cinco no próximo lance é 1:6" teremos, em caso de uma falha do dado em exibir o número cinco em seis lances, a impossibilidade de corrigir o enunciado. E, se considerarmos agora que em cem lances o número cinco ainda não venha a ser exibido, dir-se-á que há algo de errado com o dado, e não com o enunciado. (ver Para saber mais)

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Para saber mais

DA PROBABILIDADE SEGUNDO POPPER E WATKINS Popper (1989[1934], capítulo VIII, pp. 160-236), estabelece dois problemas sobre a probabilidade: 1) o problema epistemológico da decisibilidade (probabilidade das hipóteses), que declara que um enunciado probabilístico não é falseável nem verificável; 2) o problema matemático da teoria da probabilidade (qual o conceito de probabilidade), para o qual propõe fundamentos novos para o cálculo da probabilidade, estabelecidos na forma de uma "axiomatização da teoria da probabilidade", feita a partir de uma crítica a dois postulados de von Mises (o axioma da convergência e o axioma da aleatoriedade). Uma abordagem dos aspectos epistemológicos da probabilidade de hipóteses encontra-se também em Watkins, (1990, p. 13-27), onde é refutada a tese do empirismo cético pela qual o probabilismo coloca-se como uma estratégia da sustentação do problema de Hume. Com efeito, lemos em Watkins: ―Para o ceticismo pirrónico, o mapa do conhecimento empírico é muito simples: só mostra um oceano não diferenciado de incerteza. Para o ceticismo de Hume, o mapa mostra um oceano de incerteza com uma pequena ilha de certeza no meio; esta ilha contém, para qualquer pessoa X no instante t, o conhecimento egocêntrico de X em t sobre as suas próprias experiências perceptivas, etc. Para o probabilismo, o oceano na vizinhança da ilha diferencia-se por linhas fechadas representando graus de probabilidade, uma linha próxima da costa representando um alto grau de probabilidade e a linha exterior representando uma probabilidade de um meio [...].‖ (Watkins, 1990, p. 17-18.)

No que tange ao problema da decisibilidade desses enunciados, Popper escreve: Independentemente da maneira pela qual possamos definir o conceito de probabilidade [...], os enunciados de probabilidade não serão falseáveis. As hipóteses de probabilidade não afastam nada que seja observável; estimativas de probabilidade não podem contradizer nem ser contraditadas por um enunciado básico; não podem ser contraditadas por uma conjunção de qualquer número finito de

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enunciados básicos e, portanto, não podem ser contraditadas por qualquer número finito de observações. (Popper 1989, pp. 208-209)

Falibilismo e falseacionismo: aprender com os erros Em alternativa a esse malogro derivado essencialmente da tradicional busca da estrutura do conhecimento na qual são contrapostos numa balança o ceticismo empirista e o racionalismo clássico - no século XVII/XVIII - e o positivismo lógico (ou empirismo lógico) e a metafísica - no século XIX/XX Popper (1989[1934], p. 549) apresenta uma terceira abordagem: a tese do falibilismo científico, ou seja, ―nosso conhecimento é fruto de um conjecturar criticamente; é uma rede de hipóteses; é uma teia de suposições.‖ Para saber mais XENÓFANES: TUDO É UMA TEIA DE SUPOSIÇÕES Popper acrescenta a seguir: ―Essa conclusão tornou-se clara, para mim, quando percebi que minha concepção da teoria do conhecimento, formulada em 1934, já havia sido considerada por Xenófanes, 2.500 anos antes de mim.‖ (Popper, 1989[1934], p. 549). Com efeito, escreveu Xenófanes [ca. 570 a.C. — 460 a.C]: No início, os deuses não revelaram tudo aos mortais;\ com o correr do tempo, todavia, procurando, encontramos o melhor.\ Verdades indubitáveis, o homem não alcança; e nenhum virá a alcançá-las,\ acerca dos deuses e das coisas a que me refiro.\ E se alguém viesse a proclamar a Verdade, em toda a sua perfeição,\ ele próprio não saberia disso: tudo é uma teia de suposições. (Xenófanes apud Popper, 1989[1934], p. 549). Xenófanes foi, também, a primeira pessoa que utilizou os fósseis para dar suporte a uma teoria da história da Terra.

Na tese do falibilismo científico é desmontada não só o movimento pendular entre os pólos tradicionais do otimismo da teoria (e ceticismo da observação) e do otimismo da observação (e ceticismo da teoria), origem de todo o dogmatismo e autoritarismo do conhecimento; mas também são resgatadas as tradições revolucionárias de Galileu e de Kant, com o que podemos estabelecer o racionalismo crítico.

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Para saber mais

COMO GALILEU FOI VENCIDO PELO INSTRUMENTALISMO Popper (1982) mostra como a revolucionária ciência de Galileu foi vencida pelo empirismo instrumentalista de Berkeley, adotado pela maioria dos físicos teóricos: "Berkeley [...] estava convencido de que a teoria [da gravitação de Newton] não representava mais do que uma 'hipótese matemática', ou seja, um instrumento conveniente para calcular e prever fenômenos ou aparências; não podia ser considerada uma descrição verdadeira da realidade." (Popper, 1982, p. 126) Em seguida, Popper acrescenta: "Poucos dos cientistas que aceitaram a visão instrumentalista do cardeal Belarmino e do bispo Berkeley percebem que adotaram uma teoria filosófica. Todavia não percebem que romperam com a tradição de Galileu. Pelo contrário, muitos acreditam ter mantido a filosofia à distância; em todo caso, a maioria sequer demonstra interesse no assunto." (Popper, 1982, p. 127-128) Sobre o resgate de Kant feito por Popper (1982, ver Seção 7 Crítica e Cosmologia de Kant), na qual podemos ler um dos mais significativos tributos feitos ao grande filósofo: "Assumindo um ponto de vista mais abrangente, para avaliar o papel histórico de Kant, podemos compará-lo com Sócrates. Ambos foram acusados de subverter a religião oficial e de corromper o espírito dos jovens. Os dois contestaram essa acusação, defendendo a liberdade de pensamento. Para eles liberdade significava algo mais do que a simples ausência de coação - era um modo de viver." (Popper, 1982, p. 210)

Dessa forma, Popper sintetiza uma teoria da razão e da experiência numa única tese, na qual tanto os argumentos racionais quanto nossas observações possuem um papel modesto, mas importante: aqueles, ao ensejarem a crítica as nossas tentativas de resolver os problemas; estas, ao ajudar-nos a identificar erros. Enfim: podemos aprender com os erros que cometemos. Para saber mais

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COMO CRITICAR A NOÇÃO DE JUÍZOS SINTÉTICOS A PRIORI DE KANT? Popper (1982) nos mostra que não fez uma mera "unificação" do método de Galileu com os critérios de Kant, mas uma verdadeira síntese. Ao promovêla, Popper estabelece uma diferença com Kant que acreditava existirem juízos sintéticos a priori verdadeiros, como as leis de Newton. Com efeito, na obra Princípios Metafísicos da Ciência da Natureza, Kant estabelece os juízos a priori do que chamou de ciência genuína, ou seja, aquela que "trata seu objeto segundo princípios a priori [...] cuja certeza é apodítica", que era distinta da ciência imprópria "que trata seu objeto [...] de acordo com a lei da experiência" (Kant, 1990[1786], p. 14). Popper (1982, p. 121 e ss.) esclareceu que Kant assim pensava porque não conheceu a teoria da relatividade que derrubou a teoria newtoniana e, por isso, não podemos pensar que existam juízos a priori verdadeiros. Para Popper, esses juízos a priori são conjecturas que devem ser falseadas pela experiência, para serem considerados científicos. E, aqui, reside o encontro com o método galilaico. Embora Galileu tenha enunciado a necessidade de contrapor a teoria à experiência, ele possuía uma visão dúbia sobre isso, como aponta Losee (1979, p. 67). Popper estabelece uma função precisa para a relação teoria (a priori) e observação (a posteriori), de modo que a crítica em ambas é possível, tornando-as, portanto, modestas.

Tal possibilidade deveu-se à solução dada ao problema de Hume. Popper acredita em tê-lo resolvido na medida em que atacou outro problema, no qual aquele estava contido: o da demarcação da ciência da pseudociência (metafísica). Como critério de demarcação, Popper contrapõe ao indutivismo e ao verificacionismo sua tese da falsificabilidade [falsifiability], segundo a qual uma teoria pode ser refutada dedutivamente com base na experiência de modo negativo. Ou seja, não podemos ter certeza, com base na experiência, em afirmar que uma teoria ou enunciado universal é verdadeiro, mas podemos seguramente ter certeza quando ele é falso. Assim, um enunciado universal do tipo Todos os corvos são pretos, como exemplifica Popper ao utilizar uma velha proposição de Aristóteles, pode ser refutado por um enunciado singular do tipo Há um corvo branco. Estabelece-se a colisão entre a teoria (universal) e a experiência (singular), podendo-se refutar com certeza a teoria, quando sua negação - o enunciado Há um corvo branco - existir. De modo contrário, se não for confirmado o enunciado Há um corvo branco, então não podemos ter certeza que o

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enunciado universal seja verdadeiro. Dizemos, apenas, que tal enunciado universal foi corroborado. Dessa forma, argumentou Popper, as teorias podem ser refutadas pelo conjunto de seus falseadores potenciais, chamados de base empírica. E, aquelas teorias impossíveis de serem falseadas, isto é, não possuem falseadores (base empírica), não são científicas, pois não colidem com a realidade por nada dizerem em relação a ela. As teorias possuirão, então, tanto mais conteúdo empírico - dizem algo a respeito da realidade -, quanto mais facilmente forem falseáveis. As teorias são, essencialmente, proibições e quanto mais proibirem, tanto mais poderão colidir com a realidade. Por isso um critério de demarcação com base na indução é defeituoso, pois a generalização a partir das observações não só não pode transportar logicamente a verdade desde o particular até o universal, bem como a pretensa generalização alcançada não colide necessariamente com a realidade, pois podem ser verificadas em qualquer instante. Generalizações do tipo "Todos os dias chove" são facilmente verificadas, pois em algum lugar do planeta, podemos constatar que choveu. A indução, segundo Popper, colocava-se não apenas enquanto um método de fazer a ciência, mas também de demarcá-la defeituosamente. 2.3. COMO AVANÇA A CIÊNCIA? - O PROBLEMA DO PROGRESSO CIENTÍFICO E A NOVA EPISTEMOLOGIA Estabelecidos os problemas de como podemos ter a certeza do conhecimento e como a ciência se demarca da não ciência, podemos tratar agora de um problema que tem assumido cada vez mais relevância nas digressões epistêmicas da atualidade11: como avança a ciência? Como progride o conhecimento científico? A notoriedade de tal interrogação é derivada de uma antinomia crescente entre aqueles que consideram os elementos intracientíficos como decisivos para o progresso científico, de um lado (cf. Popper, Lakatos, etc.), e aqueles que atribuem esse avanço primordialmente como resultado de fatores extracientíficos (cf. Kuhn, Feyerabend, etc.), de outro.

11 Ver Lakatos & Musgrave (1979), onde são relacionadas as principais antinomias sobre o tema na atualidade desenvolvidas no colóquio Internacional de Filosofia da Ciência, realizado em Londres em 1965; também em Harré (1976), onde são coligidos os textos dos participantes da conferência promovida pela Herbert Spencer lectures em 1973, em Oxford.

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Para desenvolver essa questão, faremos referências a três posições diferentes. A primeira delas, ainda muito forte no meio científico contemporâneo, remonta à tradição baconiana e à Royal Society de mais de três séculos, é a concepção empirista segundo a qual o avanço do conhecimento dá-se como resultado do simples acúmulo de fatos. As duas posições seguintes, profundamente discordantes dessa, mas também bastante polarizadas, são: a do racionalismo crítico, que atribui o progresso do conhecimento como consequência da permanente correção dos erros; e a sociológica-irracionalista, que estipula que o desenvolvimento se dá por grandes revoluções do paradigma vigente. Desse modo, as diferentes concepções podem ser estabelecidas, em última análise, de acordo com a posição assumida frente a fatores como: a) o critério de demarcação entre a ciência e a não ciência; b) a concepção de continuidade ou descontinuidade do desenvolvimento das teorias científicas; e c) a preponderância de fatores extra- ou intracientíficos na mutação das teorias científicas. Um quadro resumindo as três posições diante dos fatores assinalados pode, então, ser estabelecido como ilustrado abaixo.

Quadro 2 – Escolas epistemológicas, critérios de demarcação, concepção de progresso e fatores de mudança da ciência.

Escola

Critério de Demarcação

Progresso da Ciência

Fator de mudança

BACON

Observação- Indutivismo

Contínuo

Intracientífico

POPPER

FalseabilidadeDedutivismo

Contínuo

Intracientífico

KUHN

Não indutivista

Descontínuo

Extracientífico

O progresso empirista da ciência: linear e acumulativo

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A concepção empirista de progresso científico, baseada no método indutivo, foi melhor enunciada por Francis Bacon (1988[1620]), na sua obra Novum Organum. Segundo tais preceitos, o avanço da ciência é feito pela mera acumulação dos fatos que, algum dia, resultarão em uma possível generalização. O cientista nesse processo é, em geral, visto como um mero descritor e catalogador de dados. Para Bacon (1988[1620]), a complexidade da natureza estaria ao alcance de qualquer um, caso os sentidos ficassem livres para ler as evidências claras, expurgando da mente todas "noções" e "controvérsias" tidas como "coisas malsãs" (Bacon 1988[1620], Aforismo X, p. 14). Na obra de Bacon (1988[1620]), antecede aos aforismos do "verdadeiro método de interpretação da natureza", uma série de recomendações que deveriam ser cumpridas antes de aplicá-lo, para que se obtivesse o sucesso desejado. Bacon (1988[1620]) considerou que se fazia necessário uma "espécie de expiação e purgação da mente" (Aforismo LXIX, p. 38). E, se assim procedido, o progresso da ciência seria simplesmente colossal, como profetizou com grande jactância o aforismo CXII do formulador das tábuas da descoberta: [...] se houvesse entre nós alguém pronto a responder às interrogações incitadas pela natureza, em poucos anos seria realizado o descobrimento de todas as causas e o estabelecimento de todas as ciências. (Bacon 1988[1620], Aforismo , p. 73)

Para o historiador da ciência Paolo Rossi, e grande estudioso de Francis Bacon12, Essa concepção de ciência – que encontra expressão pela primeira vez, num plano ―filosófico‖, na obra de Francis Bacon – tem um papel decisivo e determinante na formação da ideia de progresso, visto que implica: a) a convicção de que o saber científico é algo que aumenta e cresce, isto é, age através de um processo para o qual sucessivamente contribuem as gerações de estudiosos; b) a convicção de que esse processo nunca está 'completo' em qualquer momento ou etapa sua, isto é, que não necessite acréscimos, revisões ou integrações ulteriores;

12 Ver o extenso estudo de Paolo Rossi (2006), Fancis Bacon, da magia à ciência.

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c) enfim, a convicção de que se tenha de alguma forma uma única tradição científica, isto é, de que a ciência não se apresenta como um conjunto de teorias contrapostas e de ismos, mas como um processo em que os desenvolvimentos mais revolucionários 'salvam' o núcleo essencial adquirido pelas gerações anteriores, apresentando-se como teorias mais gerais que incluem as teorias 'velhas' como seus casos particulares. (Rossi, 1989, p. 64)

O progresso científico, em Bacon (1988[1620]), dava-se de modo inevitável, uma vez aplicado o método indutivo tal qual prescreviam as três Tábuas da descoberta e as 27 Prerogativis Instantiarum (Instâncias Prerrogativas ou Dignidades). Tal certeza tinha como base o entendimento de que a observação e a indução levavam, apoditicamente, à verdade e ao progresso: "A natureza não se domina, senão obedecendo-lhe." (Aforismo CXXIX, p. 88) Como tanto o objeto quanto o método de descoberta eram verdadeiros per se, temos, por conseguinte, uma concepção linear e contínua do progresso científico, sendo os erros imputados a má aplicação do indutivismo perfeito e à especulação escolástica. (ver Para saber mais) Para saber mais A INDUÇÃO VERDADEIRA E PERFEITA POR MEIO DAS TÁBUAS DA DESCOBERTA O método indutivo verdadeiro de Bacon (1988[1620]) era bastante complexo e foi descrito por 52 Aforismos no Livro Segundo de sua obra Novum Organum. As três tábuas da descoberta que foram previstas para "isolar" a observação pura das tentativas do intelecto em conspurcá-las eram: 1) Tábua da essência e da presença, que consistia numa "citação perante o intelecto de todas as instâncias conhecidas que concordam com uma mesma natureza, mesmo que se encontrem em matérias dessemelhantes. E essa coleção deve ser feita historicamente [cfme. nota de rodapé, "tem o sentido de: à medida que os fatos vão aparecendo, em oposição a qualquer antecipação ou especulação"], sem especulações prematuras ou qualquer requinte demasiado." (p. 103); 2) Tábua de desvio (ou declinação) ou de ausência em fenômenos próximos, na qual "devem ser anotados os casos semelhantes, em que a natureza ou fenômeno objeto não aparece" (cf. nota 53, p. 105); e 3) Tábuas de graus ou de comparação, onde são registrados os casos em que a natureza ou fenômeno objeto apresentam variações de intensidade (cfme. aforismo XIII, p. 115). As vinte e sete instâncias prerrogativas tinham o papel de auxiliar a

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"indução verdadeira e perfeita". As tábuas de Francis Bacon tinham a pretensão de vencer o ruído do sentido das palavras, pois: "O silogismo consta de proposições, as proposições de palavras, as palavras são o signo das noções. Pelo que, se as próprias noções (que constituem a base dos fatos) são confusas e temerariamente abstraídas das coisas, nada que delas depende pode pretender solidez. Aqui está por que a única esperança radica na verdadeira indução." (Bacon, 1988[1620], p. 15)

A solução do problema da indução e o método do falseamento Lakatos (1987), entretanto, chama a atenção para o fato de que O credo indutivista dos séculos XVII e XVIII desempenhou um papel muito importante e progressivo. Foi a grande fonte de energia (lebenslüge) da jovem ciência especulativa na obscura idade prépopperiana da ilustração, quando se depreciava a mera conjectura, uma refutação era um solecismo, e estabelecer uma fonte autorizada de verdade era uma questão de sobre vivência. (Lakatos, 1987, p. 23; grifos do original.)

Tal crença indutivista deveu-se à suposição de que era plenamente possível retransmitir a verdade para cima, desde um enunciado básico (observacional) até a cúspide de uma teoria (axioma), de modo que se a observação fosse verdadeira, o axioma também sê-lo-ia (cf. Lakatos, 1987, p. 21). A refutação dessa crença efetivada por Popper foi assim reconhecida em seu livro Objective Knowledge: ―Julgo haver resolvido importante problema filosófico: o problema da indução.‖ (Popper, 1975, p. 13.) E, por problema tradicional da indução, Popper assim o formulou naquela mesma obra: ―Qual é a justificativa para a crença de que o futuro será (amplamente) como o passado? Ou, talvez, qual á a justificativa para as inferências indutivas?‖ (Popper, 1975, p. 14) A refutação desse problema implicou em uma mudança epistêmica decisiva, assim declarada por Lakatos (1987)

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A destruição empirista definitiva do indutivismo foi realizada, paradoxalmente, por um filósofo que levou a revolução epistemológica para além do empirismo: Popper. Ele mostrou, em sua crítica à versão probabilística da teoria da inferência indutiva, que não pode haver nem sequer uma transferência parcial do significado e verdade para cima. (Lakatos, 1987p. 23; grifos meus em negrito)

Além disso, Lakatos destaca que Popper conseguiu esclarecer que os enunciados básicos que se referem aos fatos não são a verdade definitiva e também podem (e devem) ser criticados: E depois [Popper] mostrou que as injeções de significado e do valor de verdade no nível da base estão longe de ser triviais; que não existem termos ―empíricos‖, mas sim apenas termos ―teóricos‖, e que não existe nada definitivo no valor de verdade dos enunciados básicos, restaurando assim a antiga crítica da experiência sensível. (Lakatos, 1987p. 23; grifos meus em negrito; do original, em itálico)

A base dessa transformação epistêmica de fundo está assentada na tese do falibilismo crítico. Por meio da decisão pelo método do falseamento de uma teoria pode-se criticá-la de modo permanente, e isso graças a maneira que pode ser estabelecida de ao manipular a teoria e a experiência. Ao mesmo tempo em que admite enunciados universais derivados unicamente dos axiomas, admite também a formulação de enunciados básicos derivados da observação. Dependendo da ciência, pode-se escolher, inclusive, qual a melhor maneira de introduzir enunciados: se no topo ou na base de uma teoria. Mas há uma questão condicional: o método do falseamento é o único que possibilita que o fluxo lógico importante seja feito da base para o topo, pois somente a falsidade de um enunciado pode ser retransmitida para cima (cf. Lakatos, 1987, p. 48). A verdade não pode ser retransmitida para cima, como no indutivismo (ou verificacionismo). É isso o que permite a crítica das teorias: o fato delas se manterem ou não com os falseamentos que lhe são propostos. Esse critério não é uma verdade das tábuas, mas antes disso, uma decisão metodológica que tomamos ao fazermos ciência. Como enuncia Popper (1989[1934]): Coloca-se de início uma regra suprema, que serve como uma espécie de norma para decidir a propósito das demais regras e que é, por isso, uma regra de tipo superior. É a regra que afirma que as demais regras do processo científico devem ser elaboradas de maneira a não proteger

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contra o falseamento qualquer enunciado científico. (Popper, 1989[1934], p. 56; grifos meus)

Como esclareceu meridianamente Lakatos (1987), O falibilismo crítico de Popper considera seriamente a regressão infinita nas provas e definições, não se realiza nenhuma ilusão acerca de sua ‗interrupção‘, aceita a crítica cética de toda introdução de verdade infalível. Em sua abordagem, não há qualquer fundamento do conhecimento, nem na cúspide, nem na base das teorias, porém pode haver introduções de verdades tentativas (feitas na base, ou seja, por meio de enunciados básicos, observações) e introduções de significado tentativas em qualquer ponto (i.e., por meio de enunciados universais, axiomas e leis). Uma ‗teoria empirista‘ é falsa ou conjectural. Uma ‗teoria popperiana‘ somente pode ser conjectural. Nunca sabemos, apenas conjecturamos. (Lakatos, 1987, p. 23-24; grifos em itálico do original; tradução minha.)

Nesse sentido, está implícito, em uma concepção de progresso científico, a compreensão de como se dá o avanço do conhecimento e de como a ciência se demarca da não ciência. Para Popper (1982), a ciência é um "procedimento cuja racionalidade consiste no fato de que aprendemos a partir de nossos erros" (p. 247), portanto, de forma contínua. Tal posição não implica num progresso irracional, pelo contrário, implica que a ciência tenha critérios claros de racionalidade, pois, para Popper (1982), ela "origina-se em problemas, não em observações; estas, no entanto, especialmente se forem inesperadas, podem suscitar um problema, quando entram em conflito com nossas expectativas e teorias." (Popper, 1982, p. 248; grifos meus)

A revolução dos paradigmas científicos: os conceitos de Kuhn

Kuhn apresentou, em 1962, no seu livro The Structure of Scientific Revolutions, uma ideia que cresceu muito nos meios acadêmicos para expressar o modo como as ciências progridem: a revolução dos paradigmas científicos (Kuhn, 1989[1962]). Embora tal expressão indique com clareza que as ciências mudam, às vezes, de forma drástica e descontínua ('revoluções'), não é patente na tese kuhniana como acontecem tais transformações. De certo modo, entra-se numa circularidade ao apontar-se

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que as ciências mudam porque os paradigmas mudam e, no sentido inverso, os paradigmas mudam porque as ciências mudam. Na verdade, Kuhn enunciou seu conceito de paradigma tendo como ponto de partida a sociologia: ―paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham" (Kuhn, 1989[1962], p. 219). Desse modo, ficam evidentes os fortes elementos extracientíficos dessa concepção. Mas podemos perguntar: O que é aquilo que uma comunidade partilha? – Um paradigma! – responderia com destreza Kuhn (1989[1962]). E, assim, adia-se a explicação de como é possível que ocorra uma "revolução científica". Kuhn utilizou, ainda, as definições de ciência normal, para referir quando "a pesquisa científica normal está dirigida para a articulação daqueles fenômenos e teorias já fornecidos pelo paradigma" (Kuhn, 1989[1962], p. 45); e de ciência revolucionária, quando o velho paradigma é derrubado e um novo paradigma está em curso. Dessa forma, Kuhn não fornece nenhum elemento para compararmos efetivamente as diferenças entre a ciência normal e a ciência revolucionária, de modo que somente podemos falar de uma revolução científica a posteriori, ou seja, em um contexto histórico. Kuhn (1989[1962]), juntamente com Feyerabend (1989), apresentam a tese da incomensurabilidade entre teorias como forma de contornar esse problema. Assim, não poderíamos comparar o paradigma antigo com o novo porque eles se referem a coisas diferentes e são construídos de maneiras diferentes. Esse modo de abordar a questão do progresso da ciência e da própria ciência por parte de Kuhn (1989[1962]) e, em parte, também por Feyerabend (1989), foi motivo de longos e acalorados debates. Lakatos (1979) proferiu severas críticas ao entendimento kuhniano, pois enquanto que para Popper ―a mudança científica é racional ou, pelo menos, pode ser racionalmente reconstruída e cai no domínio da lógica da descoberta‖ (Lakatos, 1979, p. 112), para Kuhn, a mudança de um paradigma para outro é uma espécie de ―mudança religiosa‖, pois se trata de ―uma conversão mística, que não é, nem pode ser, governada por regras da razão e cai totalmente no reino da psicologia (social) da descoberta.‖ (Lakatos, 1979, p. 112.) Ou seja, se para Popper a ciência é ―revolução permanente‖, sendo ―a crítica o cerne do empreendimento científico‖, para Kuhn, ―a revolução é excepcional e, na verdade, extracientífica, e a crítica, em épocas 'normais', é maldição‖. (Lakatos, 1979, p. 111.)

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Considerado o aspecto sociológico que envolve a concepção de Kuhn (1989), temos que as revoluções somente podem ser definidas a posteriori, o que leva tal suposição para o irracionalismo. Também, de outro modo, ao pressupor que a ciência normal é a vigência pura e simples de um paradigma e que quando ocorre uma revolução há uma mudança por inteiro tanto dos conceitos da base empírica quanto dos conceitos da teoria, implica necessariamente numa mudança do tipo 'golpe global' cujos exemplos da história não foram evidenciados por Kuhn (1989[1962]). É claro que, após a declaração de uma teoria global, a base empírica tende a ser redefinida para refutar tal tese. Ocorre que esse processo é de longo curso e via de regra acaba transformando a própria teoria inicial. Assim, se é correto por um lado falarmos em revolução científica sob o ponto de vista do significado de uma mudança, por outro, tais mudanças não ocorrem sob o ponto de vista estabelecido por Kuhn (1989[1962]). (ver Para saber mais)

Para saber mais HÁ CONCILIAÇÃO POSÍVEL ENTRE KUHN, POPPER E LAKATOS? Na obra Estructura y dinâmica de teorías do importante filósofo da ciência Wolfgang Stegmüller (1983, p. 20 e ss.), encontramos uma proposta de conciliação da polêmica Kuhn-Popper-Lakatos. Essa proposta pode ser sumariada nos seguintes termos: a) Kuhn somente expressou o aspecto sociológico e psicológico de uma nova concepção na filosofia da ciência, o que induz que seus conceitos têm relevância apenas para a história da ciência; b) Sneed dispõe de uma base conceitual sobre a qual é possível formularse os aspectos lógicos de algumas das ideias novas de Kuhn; c) é possível, com isso, eliminar os exageros kuhnianos e fazer desaparecer uma fissura irracional que tem sido motivo da polêmica; d) com a ajuda do método da reconstrução racional de Lakatos podem revelar-se as origens das diferenças de opinião e pode proporcionar-se uma clarificação. O objetivo de Stegmüller é propor um novo procedimento para análise das estruturas das teorias científicas, proporcionar instrumentos conceituais necessários para a análise da dinâmica de teorias e para a reconstrução lógica dos conceitos de "ciência normal" e "revoluções científicas" de Kuhn. Além disso, ele discute o relativismo epistemológico e o irracionalismo kuhnianos. Sustenta que Kuhn desenvolveu uma nova concepção de filosofia da ciência. Alicerça sua tese na defesa da polaridade KuhnFeyerabend (historicistas) versus Popper-Lakatos (logicistas), com base na formulação de Sneed sobre The logical structure of mathematical physics.

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Assim, diz Stegmüller: ―Dado que uma teoria no sentido de Kuhn não é um sistema de enunciados, mas sim um instrumento conceitual relativamente complicado, se depreende que o modo de uso de uma teoria que caracteriza o cientista normal não se dá pela perseverança dogmática em determinados pressupostos e convicções, mas pela utilização deste ‗instrumento conceitual‘ para resolver determinados problemas.‖ (Stegmüller, 1983, p. 10; tradução minha)

Programas de pesquisa e organização do conhecimento Lakatos (1979) tem utilizado com maior propriedade o conceito de programa de pesquisa, de natureza intracientífica, em vez da noção sóciopsicológica de "paradigma", mais atinente ao contexto da justificação. (ver Para saber mais) Para saber mais OS PIONEIROS DA EPISTEMOLOGIA E OS CONTEXTOS DA DESCOBERTA E DA JUSTIFICAÇÃO Os conceitos ―contexto da descoberta‖ e ―contexto da justificação‖ foram introduzidos pelo inglês John Herschel [1792-1871] a partir de ―cuidadosas análises dos progressos recentes da física, química, astronomia e geologia.‖ (Losee, 1979, p. 129) e muito influenciaram William Whewell [1794-1866], John Stuart Mill [1806-1873], Charles Darwin [1809-1882] e outros. Outro contemporâneo de Herschel, o inglês William Whewell, professor de mineralogia, foi pioneiro na caracterização morfológica do progresso científico e introduziu uma metodologia da pesquisa histórica na qual "a recuperação do passado necessariamente envolve atos de síntese por parte do historiador" (Losee, 1979, p. 133), subvertendo a ideia prevalecente de que a história da ciência é um "mero depósito de exemplos que podem ser citados para ilustrar pontos particulares do método científico" (Losee, 1979, p. 133). Por isso, Whewell, que obteve o reconhecimento de Lyell, entre outros, como ―autoridade sobre a nomenclatura científica‖ (Losee, 1979, p. 128), é considerado um introdutor da análise histórico-crítica do método científico (cf. Blanché, 1988, p. 45 e ss.), lançando as pedras fundamentais da Epistemologia. Desse modo, não é presunção afirmar que a epistemologia nasce com a geologia e, em ambas, está presente o problema do tempo, cuja solução permitiu derrubar mitos muito fortes: no caso da epistemologia, o mito

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da acumulação dos conhecimentos e o mito de que o método na ciência não tem história; no caso da geologia, o mito de que a Terra era muito recente.

O Programa de Pesquisa de Lakatos [...] consiste em regras metodológicas; algumas nos dizem quais são os caminhos de pesquisa que devem ser evitados (heurística negativa), outras nos dizem quais são os caminhos que devem ser palmilhados (heurística positiva). A própria ciência como um todo pode ser considerada um imenso programa de pesquisa com a suprema regra heurística de Popper: ―arquitetar conjecturas que tenham maior conteúdo empírico do que as predecessoras‖. (Lakatos, 1979, p. 162.)

Além disso, Lakatos procura uma morfologia mais precisa da análise de como progride a ciência, pois, como ele mesmo assinala, ―os epistemólogos foram lentos em perceber o aparecimento do conhecimento altamente organizado, e o papel decisivo desempenhado pelos padrões específicos dessa organização‖ (Lakatos, 1987, p. 19). Dessa forma, para tal autor, qualquer programa de pesquisa possui um "núcleo", isto é, conjunto de leis, axiomas e pressupostos principais. A heurística negativa tem a função de proibir que o modus tollens13 (Ver Para saber mais) seja dirigido para o ―núcleo‖ do programa, pois, do contrário, nenhum programa poderia ser desenvolvido e, diante da primeira refutação, seria de imediato abandonado, resultando numa posição chamada de ―falseacionismo ingênuo‖.

Para saber mais O QUE É O MODUS TOLLENS? Modus tollens é definido em Brody (1967, p. 69) como: "um argumento com a forma ‗se A então B; não-B, portanto, não-A‘. Alguns autores usam esse termo para designar a regra de inferência que permite argumentos com essa forma.‖ Em Kant (1992[1800], p. 125), encontramos as seguintes definições: ―A forma de conexão nos juízos hipotéticos é dupla: a que põe (modus

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ponens) e a que tira (modus tollens). 1) se a razão (antecedens) é verdadeira, então o consequente (consequens) determinado por ele é também verdadeiro. Tal é o modus pones. 2) se o consequente (consequens) é falso, então a razão (antecedens) também é falsa. Tal é o modus tollens.‖

O núcleo de um programa de pesquisa é protegido por um "cinturão protetor" (formado por um conjunto de hipóteses, cadeia de modelos), dado pela heurística positiva que redirige o modus tollens para o mesmo. O ―cinturão protetor‖ suportará, então, os impactos dos testes, sendo reajustado ou mesmo refutado, de modo que o núcleo resulte fortalecido. De outro modo, ensinou-nos Lakatos: A heurística negativa especifica o "núcleo" do programa, que é "irrefutável" por decisão metodológica dos seus protagonistas; a heurística positiva consiste num conjunto parcialmente articulado de sugestões ou palpites sobre como mudar ou desenvolver as "variantes refutáveis" do programa de pesquisa, e sobre como modificar e sofisticar o cinto de proteção "refutável". (Lakatos, 1979, p. 165)

Para saber mais

A TECTÔNICA DE PLACAS E SEU CINTURÃO PROTETOR Um excelente exemplo da relação entre o núcleo heurístico e seu cinturão protetor pode ser dado pela teoria da Tectônica de Placas. A crescente sofisticação do conceito de placa litosférica implicou apenas em uma refutação da hipótese de ‗placa rígida‘, sendo que o núcleo da Teoria foi mantido intacto, resultando em seu fortalecimento. Assim, as proposições de Lakatos são elucidativas para tornar mais preciso quando um programa inteiro é refutado e quando apenas seu "cinturão protetor" é reajustado, sob pena de estarmos constantemente dizendo que a teoria ―mudou‖ porque certo aspecto seu foi substituído.

Por meio dessa dialética entre a heurística positiva e a negativa de um programa de pesquisa, Lakatos indica que se pode, também, apurar melhor a própria reconstrução histórico-crítica das teorias e da ciência: Ao redigir o estudo de um caso histórico deve-se, creio eu, adotar o seguinte procedimento: (1) faz-se uma reconstrução racional; (2) tenta-

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se cotejar essa reconstrução racional com a história real e criticar tanto a reconstrução racional por falta de historicidade quanto a história real por falta de racionalidade. Dessa maneira, todo o estudo histórico deve ser precedido de um estudo heurístico: a história da ciência sem a filosofia da ciência é cega. (Lakatos, 1979, p. 169, grifos meus.)

Assim, a partir dos debates entre Popper, Lakatos e Kuhn, entre outros, define-se o contexto da assim chamada Nova Epistemologia, no qual não apenas as questões metodológicas, mas também os contextos sociais, econômicos e culturais são considerados para entender a natureza do conhecimento científico.

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ÍNDICE ONOMÁSTICO, TOPONÍMICO E REMISSIVO Academia Nazionale dei Lincei ............... 12 Alemanha ............................................. 46 Althusser, Louis ............................... 19, 69 Anaximandro ........................................ 28 antecedens ........................................... 67 Aristóteles ....................... 7, 37, 38, 40, 54 aristotelismo ......................................... 40 arqueologia do saber ............................. 26 Associação Brasileira de Filosofia e História da Biologia ............................. 4 Associação de Filosofia e História da Ciência do Cone Sul ............................ 4 Atlântida .............................................. 40 átomo ................................................... 39 autoritarismo do conhecimento ............. 52 axioma científico . 15, 40, 50, 59, 60, 61, 66 Ayer, Alfred J. ....................................... 46 Bachelard, Gaston ......... 16, 22, 25, 26, 69 Bacon, Francis .......3, 5, 32, 40, 41, 42, 43, 45, 56, 57, 58, 69, 72 Barberena, Mario Costa .......................... 6 base empírica ............ 7, 35, 38, 39, 54, 63 Belarmino, cardeal ................................ 52 Berckeley, bispo .................................... 32 Blanché, Robert ....9, 16, 17, 24, 27, 65, 69 Bunge, Mario. ............................ 12, 25, 69 Canguilhem, Georges ............................ 25 Carnap, Rudolf ................................ 25, 46 Cassirer, Ernst. .................................... 17 Cavaillès, Jean ...................................... 25 certeza, da percepção ............................ 32 do conhecimento .......... 5, 7, 10, 26, 32, 34, 41, 55 ceticismo .. 7, 27, 32, 33, 34, 35, 50, 51, 52 ciência moderna .................... 8, 38, 39, 45 ciência normal ........................... 62, 63, 64 ciência revolucionária ........................... 62 ciência, crise da .................................... 39 cinturão protetor, de um programa .....8, 67 Círculo de Viena .................... 8, 12, 24, 46 concepção aristotélica-escolástica ......... 38 concepção empirista ........................ 55, 56 conjecturas .................... 18, 36, 37, 53, 66 consequens ........................................... 67

contexto da justificação ......................... 65 crença12, 29, 32, 33, 35, 38, 41, 44, 47, 59 critério de demarcação ...... 7, 8, 38, 39, 41, 47, 54, 56 critério de verdade ...........................30, 32 Darwin, Charles .................................... 65 decisibilidade ........................................ 50 demarcação da ciência ... 18, 35, 36, 46, 54 Descartes, René. .................... 3, 32, 39, 44 descrição .............................................. 20 dialética ..................................... 29, 68, 70 digressão heterológica ............................. 9 dogmatismo ......... 7, 32, 33, 34, 35, 45, 52 Einstein, Albert ............................ 4, 16, 39 Empédocles .......................................... 28 empirismo lógico .................. 12, 46, 47, 51 enunciado singular ..........................35, 54 enunciado universal ................... 35, 49, 54 epistêmico ................................... 7, 10, 26 epistemologia, específica ....................... 17 externa ............................................ 16 genética ........................................... 26 geral ................................................ 17 global ............................................... 12 interna ............................................. 16 contemporânea ................................. 17 da geologia ....................................... 17 epistemólogo ....................................10, 12 epistemology .............................. 13, 69, 71 erkenntnis ............................................. 46 escolástica ................................. 39, 41, 58 ética ................................................12, 22 experiência perceptual .......................... 34 experimento .....................................43, 44 extracientífico ................ 11, 17, 21, 55, 62 falibilismo científico .........................51, 52 falseabilidade ........................................ 27 falseacionismo ingênuo ......................... 66 falseador potencial ................................ 54 falseamento, método do .... 8, 59, 60, 61, 71 falsificabilidade ..................................... 54 fato, extracientífico ................................ 10 intracientífico ................................... 10 Fernandes, Luis Alberto D‘Ávila ............... 6

67 Feyerabend, Paul 16, 25, 55, 62, 63, 64, 69 filosofia, da ciência.... 7, 11, 12, 13, 14, 15, 6, 18, 20, 55, 64, 68, 70, 71 distribuída ....................................... 25 de tradição anglicana ....................... 14 de tradição italiana .......................... 14 espontânea .............................. 4, 19, 69 de tradição francesa .......................... 14 física atômica........................................ 31 formalismo lógico .................................. 25 Foucault. Michel. .................................. 26 Fries, Jakob .......................................... 34 Fries, trilema de ..................... 7, 33, 34, 35 Galilei, Galileu ... 3, 7, 8, 38, 40, 42, 43, 45, 52, 53, 70 generalização ....................... 35, 41, 54, 56 geologia ....................................... 7, 23, 65 Geymonat, Ludovico ..... 12, 16, 17, 22, 23, 70, 71 gnosiologia....................... 7, 11, 13, 14, 15 Gorgias ...................................... 28, 31, 32 Gramsci, Antonio ............................. 19, 70 Grécia.............................................. 12, 28 Habermas, Jürgen ....................... 7, 31, 70 hábito ................................................... 33 Hamlyn, David W. ................................. 13 Harré, Rom ........................................... 12 Heráclito ............................................... 28 Herschel, John ..................................... 65 heurística, ................................. 66, 67, 68 negativa ...................................... 66, 67 positiva .................................. 66, 67, 68 Hilbert, David. ...................................... 16 Hiroshima............................................. 31 história da ciência24, 35, 36, 42, 64, 65, 68 história da Terra .............................. 51, 72 Hume, David32, 33, 35, 41, 42, 44, 45, 50, 70 Hume, problema de ...... 5, 7, 27, 28, 50, 54 ideal arquimediano ............................... 38 imagem, da realidade ............................ 40 do mundo ........................................ 40 incomensurabilidade, entre teorias ........ 62 indagação científica .............................. 21 infalibidade ........................................... 28 instância prerrogativa ........................... 58 International Commission on the History of Geological Sciences (INHIGEO) ........................................... 4 intracientífico ................ 11, 15, 17, 19, 21 juízo, hipotético .................................... 67 a priori ........................................ 44, 53 analítico ........................................... 45 da percepção .................................... 48 sintético .................................. 8, 45, 53

Kant, Immanuel ...................................... 2 Kant, problema de .............. 5, 7, 27, 36, 43 Koyré, ALexandre .................................. 25 Kuhn, Thomas ...... 6, 8, 25, 27, 55, 62, 63, 64, 68, 70 Lakatos, Imre ...6, 8, 16, 25, 27, 36, 37, 55, 59, 61, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 70, 71 Laplace, demônio de ................................ 4 lei, da ciência ........................................ 21 da experiência ................................... 53 universal ......................................44, 45 Leibniz, Gottfried W.. ............................ 32 linguagem ..... 19, 24, 31, 34, 35, 40, 47, 48 Locke, John .......................................... 32 lógica da ciência ...............................11, 18 Londres ..................................... 55, 70, 71 Losee, John .......................................... 20 Lyell, Charles ........................................ 65 Marte .................................................... 49 Maxwell, James C. ............................ 4, 39 Mercúrio ............................................... 49 metaciência .....................................11, 16 metafísica .... 23, 39, 40, 43, 45, 46, 47, 48, 51, 54 meta-histórico ....................................... 23 método, científico ......................... 3, 41, 65 do verificacionismo ........................... 46 indutivo ................................ 33, 56, 58 metodologia ......... 3, 15, 16, 17, 19, 65, 71 Mill, John Stuart ..............................32, 65 mito da caverna ................................ 7, 30 Mizusaki, Ana Maria ............................... 6 modus ponens ....................................... 67 modus tollens ...................................66, 67 Monod, Jacques .................................... 25 mundo inteligível .................................. 29 mundo sensível .......................... 29, 32, 46 Nazi-fascismo ........................................ 46 Newton, Isaac. ..................... 22, 39, 52, 53 Nova Epistemologia .......... 3, 5, 6, 8, 55, 68 Novo Mundo ......................................... 40 objeto geológico ..................................... 23 obstáculo epistemológico ..................27, 47 paradigma .......... 8, 10, 23, 27, 41, 42, 55, 62, 63, 65 Parmênides ........................................... 28 percepção ........................................33, 48 Piaget, Jean. ......................................... 26 Pitágoras .............................................. 28 placa litosférica ................................39, 67 Platão ................ 22, 28, 29, 30, 32, 46, 71 Playfair, John ....................................... 23 Poincaré, Henri. .................................... 16 polarização ciência-filosofia ................... 25

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Popper, Karl ..... 5, 8, 16, 17, 18, 24, 25, 27, 34, 35, 36, 43, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 59, 60, 61, 63, 64, 66, 68, 71 positivismo lógico ....................... 46, 48, 51 praxiologia científica .............. 3, 11, 18, 27

Prigogine, Ylia ...........................................3 probabilidade ................... 8, 12, 49, 50, 51 probabilismo da verificação ................... 49 problema da indução .... 5, 7, 8, 27, 28, 35, 41, 59 programa, de pesquisa ... 27, 65, 66, 67, 68 falseacionista ................................... 35 kantiano .......................................... 44 progresso científico ..... 5, 8, 27, 55, 56, 58, 61, 65 Protágoras ............................................ 23 protocolo observacional ......................... 47 pseudociência ............................ 36, 48, 54 psicologia, da descoberta....................... 63 psicologismo ......................................7, 34 Quine, Willard ................................. 25, 46 racionalidade ............................. 48, 61, 68 racionalismo crítico .............. 35, 46, 52, 55 recorrência histórica ........................ 21, 27 regressão infinita ............................. 34, 35 Reichenbach, Hans .................... 16, 25, 46 representação metalinguística ............... 19 República, de Platão ......................... 29, 30 requisito extralógico .............................. 37 revolução científica .... 8, 38, 60, 62, 63, 70 Rossi, Paolo ..................................... 57, 72 Russel, Bertrand. .................................. 25 Schlick, Moritz. ..................................... 16 Serres, Michel ....................................... 17 silogismo ......................................... 37, 58

68 Sneed, Joseph D. .................................. 64 Sociedade Brasileira de História da Matemática ......................................... 4 Sociedade Brasileira de História da Medicina ............................................. 4 Sociedade Brasileira de História das Ciências .............................................. 4 sociologia .............................................. 62 Sócrates...........................................30, 52 Sofistas ................................................. 28 Spinoza, Baruch ................................... 32 Stegmüller, Wolfgang .......................64, 72 Stengers, Isabelle .................................... 3 tábuas da descoberta ................... 8, 57, 58 Tales de Mileto ...................................... 28 Tarski, Alfred ........................................ 46 tática de pesquisa ................................. 20 Tectônica de Placas ............................... 67 Teeteto, de Platão .................................. 28 teoremas dos sistemas dedutivos ........... 38 teoria, ........ 7, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 19, 23, 25, 28, 43, 47, 50, 51, 52, 53, 54, 59, 60, 63, 67 da ciência..................................... 9, 10 do conhecimento .. 7, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 28, 51 empirista.......................................... 61 popperiana ....................................... 61 tradição, Ocidental ................................ 28 epistemológica .................................... 5 Vênus ................................................... 49 Whewell, William ................................... 65 Wittgenstein, Ludwig ........................25, 46 Xenófanes ......................................... 8, 51 Zenão ................................................... 28

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