Introdução ao pensamento de Serge Daney: o cinema como abertura para o mundo

July 16, 2017 | Autor: Consuelo Lins | Categoria: Crítica Cinematográfica
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O CINEMA COMO ABERTURA PARA O MUNDO

Introdução ao pensamento de Serge Daney




Consuelo Lins, Henri Gervaiseau e Andréa França.[1]





"O cinema me contou histórias a partir do seguinte princípio: quanto
tempo falta antes da palavra "fim"? Quais as possibilidades para inventar o
tempo? É isso. Para min, a essência dos grandes filmes é a invenção do
tempo".[2]


Serge Daney não foi apenas um crítico de cinema capaz de
extrair atualidade de filmes bastante diversos em temas e formas, foi
também um atento analista da produção audiovisual veiculada pela TV, capaz
de acolher nos seus escritos os programas jornalísticos, a publicidade, o
video-clip, as séries televisivas, de modo a propor um pensamento sobre a
história do cinema e do mundo. No seu curto período de vida (1944/1992),
este francês apaixonado pelo cinema produziu e publicou um amplo número de
ensaios e críticas de filmes, entrevistas, análises de diferentes programas
televisivos, abordagens incisivas sobre filmes passados na TV, diários de
filmagens e fragmentos de sua própria vida.


O que mais impressiona, dentro desta trajetória, é o modo como o
crítico secreta um sentimento do mundo, um estado da história e do cinema
no mundo que permite estabelecer passagens entre obra e público, cinema e
vida, imaginário coletivo e subjetividade do espectador. Sua leitura
restitui um sentido ativo para o nosso presente, pois trata-se de uma
escuta e de um olhar em extrema sintonia com os múltiplos sinais de
mudanças culturais, políticas e tecnológicas do mundo. O cinema aqui é um
meio, talvez o único, de conectar o espaço público e mundo no cotidiano da
vida.


Daney definia-se, no final da vida, como um cine-filho e como um
mediador, como aquele "que permite a outros se articular a uma experiência
histórica, a cinefilia,e se reconhecer nela (...)." Editor dos Cahiers du
Cinéma ao longo da década de 70, articulista no jornal cotidiano Libération
durante os anos 80 e fundador da revista Trafic em 91, Daney morreu um ano
depois como o mais importante crítico de cinema de um país cuja tradição
nesse campo é das mais sólidas.


Esse artigo pretende introduzir o pensamento desse crítico que
exerceu por quase trinta anos uma verdadeira militância pelo cinema,
refletindo sobre os impasses dessa arte impura, de modo a intensificar um
diálogo entre as diversas mídias. Pensamento que se exprimiu de forma
fragmentada através de incontáveis artigos escritos no dia-a-dia, de notas
preparatórias para artigos, de ensaios - alguns publicados postumamente -,
e de inúmeras entrevistas, a mais longa concedida pouco antes de sua morte
a seu amigo Serge Toubiana, ele também editor dos Cahiers [3]. Diante da
amplitude da tarefa, nosso interesse se limita aqui a alguns momentos
essenciais de sua démarche em relação ao cinema, deixando para mais tarde
as reflexões mais pontuais sobre televisão e informação. De todo modo, aqui
e lá, o ponto de partida poderia ser a idéia que a história do cinema é um
dos raros instrumentos do qual dispomos para nos situarmos no interior das
imagens contemporâneas.


***
"Raramente, tanto quanto com Daney, se terá tido o sentimento tão
forte de ver alguém pensar ao vivo, como um jazzman que, partindo de uma
partitura, escapa dela pouco a pouco para navegar acima do vazio".[4] Esse
"pensamento em ato" encontrou interlocutores de peso ao longo de seu
percurso: além dos grandes cineastas e críticos de seu tempo, dialogou com
sociólogos, semiólogos, psicanalistas, filósofos, historiadores[5]. Com
Jean-Luc Godard, assumidamente sua mais forte influência, a relação foi
constante.[6] Estimulado pelo pensamento e pela obra do cineasta franco-
suiço sobre a história do cinema, Daney imprimiu uma dimensão original à
compreensão das mudanças sofridas pela imagem cinematográfica no pós-guerra
e tornou-se um dos maiores pensadores da trajetória do cinema moderno.


Na introdução do livro La rampe, que reúne artigos escritos nos
Cahiers entre 1970 e 1981, ele observa que "as revistas de cinema na França
tiveram esse privilégio de apresentar melhor do que as outras os delírios
políticos e estéticos desse tempo". Daney não se exclui desse quadro e
afirma que seus artigos desses "áridos anos 70" permitem justamente ao
leitor identificar as transformações de algumas idéias que fizeram a
revista ser bastante parecida com os tempos que corriam.


No início dos anos 80, deixa a revista e começa a trabalhar no jornal
Libération, onde reúne um grupo de pensadores e críticos[7] em torno de um
"serviço imagens". "Sempre tive esse desejo ou esse ideal (...) de fazer
parte de um grupo de egos ou de personalidades fortes e diferentes, ligado
pela mesma crença ou pelo fato de ter os mesmos inimigos.(...) Esse tipo de
idealização, inspirado nos Três mosqueteiros, é o que há de político em
mim. Politico no sentido do sonho de uma aliança entre pessoas
diferentes."[8] É também nessa época que intensifica o diálogo com o
filósofo Gilles Deleuze, que para elaborar seus dois livros em torno do
cinema faz de La rampe e de Ciné-journal referências importantes. É
Deleuze aliás o autor do prefácio desse segundo livro de críticas de Daney,
com os artigos publicados no Libération de 1981 à 1986. Deleuze retoma na
sua obra sobre o cinema certas características da classificação da imagem
cinematográfica esboçada por Daney em La rampe, complexificando-a através
da criação dos conceitos imagem-movimento e imagem-tempo.


Tornar-se jornalista no Libération resulta em uma grande produção
crítica. O "serviço imagens" implica, ao menos provisoriamente, em um
deslocamento na relação com o cinema, cujo privilégio cultural, até então
presente em sua escrita, desfaz-se. "Estava insatisfeito com o fechamento
cinéfilo puro e duro". Trata-se, nesse momento, de analisar detidamente a
televisão, elogiar, criticar, se manter informado da evolução do vídeo,
enfim "se interessar por todas as imagens"[9]. Le salaire du zappeur e
Devant la recrudescence des vols de sacs à main são os livros que reúnem os
textos escritos nesse período.


O cinema volta a ocupar um lugar central na reflexão de Daney em
1991, quando funda Trafic, ao lado dos críticos Sylvie Pierre, Raymond
Bellour, Patrice Rollet e Jean-Claude Biette. Renuncia à idéia de se
interessar por todas as imagens, não acreditando mais no seu "ecumenismo
alegre". Participa dos quatro primeiros números da revista e escrevendo no
último, publicado no outono seguinte a sua morte, um dos seus artigos mais
interessantes - Le travelling de Kapo - e particularmente elucidativo de
como sua biografia se misturou a uma certa história do cinema[10].


Caminhante, viajante, Daney não passou, como muito de seus amigos e
colegas, da crítica à realização cinematográfica. Tampouco a prática
fotográfica o atraía. Nas suas inúmeras viagens aos quatro cantos do mundo
sempre se satisfez com os cartões postais. China, Japão, Brasil, Vietnan,
India, África negra, norte da África, Camboja ... "O cartão postal, para
mim, foi a imagem, a única imagem possível depois do mapa de geografia.
Sempre enviei a todo mundo, segundo meus amores, minhas amizades e minhas
fidelidades. (...)". "Sinais de vida", "garrafas ao mar". Foi uma espécie
de "cinema bastante autista que fiz com pedaços de papelão, selos variados
e o endereço maternal que jamais mudou em trinta anos. (...) Um dia (...)
compreendi que o único fio que dispunha para estabelecer, ano após ano,
minha cronologia, eram os mil e quinhentos cartões enviados à minha mãe
(...)".[11] Além de serem "provas de sua existência", Daney atribuia na
relação com essas imagens uma dimensão política, uma recusa em fotografar
os pobres acrescentando um olhar ou efeitos estéticos.



O cinema como arte impura



O que é o cinema? Eis a questão que direta ou indiretamente pautou os
escritos de André Bazin nas décadas de 40 e 50, configurando uma atuação em
defesa dessa arte que deu à crítica cinematográfica no pós-guerra uma nova
aura. Daney, cuja importância para a crítica se assemelha a de Bazin,
retoma essa interrogação no início da década 70 nas páginas da revista que
o crítico havia fundado em 1951, os Cahiers du Cinéma. Embora os momentos
político-históricos sejam bastante distintos[12], é à tradição crítica
fundada por Bazin que Daney se filia, seja para deslocar, reelaborar,
refutar, aprofundar ou reatualizar muitos de seus aspectos e dimensões.


A noção do cinema como uma arte radicalmente impura, elaborada por
Bazin para pensar as relações entre imagem cinematográfica, literatura e
teatro, adquire no percurso crítico de Daney um estatuto que extrapola a
questão da imagem propriamente dita. Se ele retoma inicialmente essa noção
para falar das relações do cinema com a televisão e o vídeo, ela torna-se
progressivamente a metáfora por excelência nas suas reflexões sobre outras
dimensões da imagem[13]. A contra-corrente das teorias vanguardistas dos
anos 20 que pregavam a "depuração" do cinema das outras artes, consideradas
intrusas, os escritos de Bazin e Daney revelam uma defesa intransigente da
natureza impura da imagem, aberta não apenas às artes e às tecnologias, mas
à história, ao mundo. Em outros termos, uma recusa do fechamento do cinema
sobre si mesmo. É bem verdade que certos cineastas fizeram a passagem entre
os dois críticos: Roberto Rossellini, Jacques Rivette[14] e particularmente
Jean-Luc Godard, com textos e filmes criados a partir de um novo
agenciamento entre cinema e TV[15] que representa para Daney a própria
aventura de 30 anos do cinema moderno.


A singularidade dessa arte, a sua beleza inesperada, surge portanto
dessa matéria heterogênea aberta ao imponderável da vida e a outras
experiências de mundo para além das nossas. O cinema foi, efetivamente,
para Daney, uma arte da revelação da alteridade e do acesso ao mundo, a
comunicação e a participação de experiências mesmo longínquas, através da
criação de pequenos labirintos temporais inesquecíveis. "O cinema é
invenção do tempo": eis uma idéia central no pensamento do crítico. Tempo
aberto, que se contrata e dilata, acelera ou prolonga, para dar conta das
vias e dos desvios da duração vivida pelos homens. Mais do que de imagens o
cinema se constitui de planos, de blocos de espaço-tempo, cuja beleza,
musical, deve-se à respiração e ao ritmo.


Mais do que qualquer outra arte, enfatiza, o cinema soube acolher e
organizar o devir das imagens. Aos dois pólos reputados antagônicos,
Rossellini (plano-sequência) e Eisenstein (montagem), corresponderiam a
mesma preocupação em articular a passagem de um plano a outro, em modular o
tempo, em levar em conta as metamorfoses de uma imagem na outra, de modo a
formular, através de associações de imagens, novos pontos de vistas sobre o
mundo, e, subsequentemente, exprimir novas visões de mundo, novas formas de
pensamento do nosso estar-no-mundo. O recurso a formas variáveis de
distribuição do campo e do extra-campo permitiu criar novos efeitos de
medo, êxtase e frustração, bem como novas relações entre o visto e o
imaginado. Em suma, o plano e o seu extra-campo, o close e sua alternância
com planos gerais, e mais do que tudo, a montagem, foram, para Daney,
alguns dos conceitos que o cinema deu de presente para o século XX.



O cinema como arte do presente



"Tenho essa idéia fixa que o cinema é a arte do presente", repetiu
incansavelmente ao longo de seus escritos. O presente aqui deve ser
entendido em um sentido mais amplo, não apenas o presente instantâneo da
atualidade, mas também o presente da rememoração ou evocação, ou aquele em
que conseguimos discernir a emergência do que está por vir. Um presente
impuro, justamente, que ao ser registrado pela câmera revela o trabalho do
tempo e a coexistência dos fluxos da vida naquele momento.


Daney não acredita, como Bazin, numa possível objetividade da imagem
do mundo registrada pela câmara. Mas em ambos o cinema, testemunho do real,
está inexoravelmente ligado à circunstância da tomada. O operador remaneja
sua visão anterior em função da prova de verdade do instante presente.
Daney vê o cinema como abertura à presença do mundo na imanência do
instante.


No entanto, para Daney, discípulo de Godard, o cinema moderno
realiza, além do testemunho, uma outra vocação que é a de registrar um
presente que já existe mas ainda não é visível para os
contemporâneos."Inventar o que existe é um bom programa que podemos, se
quisermos, chamar cinema. (...) um grande filme (...) só pode registrar o
que começa a existir, ele só pode inventar o que é. O cinema tem
dificuldades de ser uma arte visionária."[16]. Toda uma parte do cinema
moderno dito de ficção transmitiu abalos sísmicos do que se passava em
outro lugar, no mesmo momento, no real. Os filmes de Jacques Tati são
exemplares: inventam realidades e nos dão a ver e a ouvir um presente no
qual já vivemos mas não nos dávamos conta. Antonioni "não inventou os
blocos de cimento, apenas os viu e compreendeu que a partir desse momento,
havia histórias que ele não podia mais contar da mesma maneira: ele
encontrou então Vitti e o casal moderno."[17] La Chinoise (J.L.Godard) é de
1967, mas está inextricavelmente ligado aos acontecimentos de maio de 1968.
São filmes que nos mostram que já vivemos em um outro mundo, atualizando de
uma certa maneira nossa percepção "datada".


Mesmo no seu cotidiano, dizia ter um "gosto" especial pelo presente,
pelo presente em si, que nos faz pensar um dia após o outro. "O presente,
de fato, é o luxo daquele que não tem nada, nada além dos prazeres não
cumuláveis que são a consciência de um novo dia que começa, do sol na pele,
de uma varanda de um bar...".[18] Na verdade, é essa afirmação do
presente, do aqui e agora, do estado atual do mundo que faz com que o
pensamento de Daney identifique linhas de fuga no cenário contemporâneo,
postura que o afasta definitivamente de uma nostalgia do "cinema perdido",
e o faz eleger a melancolia como o estado de sabedoria do momento
presente.. "A melancolia sabe que essa perda é a sombra do
presente"[19]."Como todos os melancólicos, tenho o gosto pelo
presente"[20].


Se há proximidades entre as concepções do cinema de Bazin - "janela
para o mundo" - e de Daney - "abertura para o mundo", há também distâncias.
A definição de Bazin implica tanto uma definição do real tributária da
fenomenologia quanto uma concepção de cinema que valoriza certos
procedimentos em detrimento de outros[21]; a de Daney, forjada a partir de
outros princípios filosóficos, não privilegia à priori uma estética
específica. Tendo iniciado suas críticas no momento em que a representação
fílmica clássica era posta em xeque por todos os lados, a postura
"idealista" (Bazin, mas também Rohmer) foi alvo de duros ataques não
apenas por parte de Daney mas por toda a redação dos Cahiers du Cinéma, que
tinha a psicanálise lacaniana, o marxismo althusseriano e a semiologia,
acrescidos da filosofia de Nietzsche, como pano de fundo da maior parte do
que se escreveu na revista no final dos anos 60 e durante a boa parte da
década de 70.


No entanto, uma "impossível rejeição do bazinismo" em relação ao
rastro de real presente na imagem permeou o pensamento do crítico e, em um
de seus últimos escritos, reafirma essa dimensão da herança baziniana: "Vem
sempre um momento que é necessário, apesar de tudo. (...) ousar crer no que
vê". Não que Daney não identificasse riscos nessa constatação, mas
pragmático pergunta: de que serviria aprender a "ler" o visual e a
"decodificar" as mensagens se a mais indestrutível das convicções não
permanecesse: "ver é apesar de tudo superior a não ver"?



Do cinema clássico ao cinema moderno



Em La rampe, Daney caracteriza o chamado período clássico do cinema
como aquele que produziu a farsa da profundidade desejada. Idade de ouro da
cenografia, triunfo da decupagem analítica da cena, registrada, depois do
advento do cinema falado, em estúdio. Decupagem que explora as diferentes
dimensões do plano e recorta a continuidade espacial para produzir no
espectador o desejo de ver mais e de descobrir o segredo atrás da porta,
para além do quadro imediato da nossa percepção, através do encadeamento
unívoco e ilusório da sucessão de imagens em totalidades orgânicas
poderosas. Sobre essa idéia se baseava o pacto com o espectador. Mesmo se
atrás da porta estivesse o horror, ele seria melhor do que a constatação
fria e desencantada de que não havia nada, nem podia haver porque a imagem
do cinema é plana e sem profundidade, como nos lembrou, mais tarde, o
cinema moderno.


O cinema clássico prometeu ao longo dos seus trinta anos de
existência um suplemento de visão: ver além, ver uma saída, mesmo
improvável, mesmo falsa, com aberturas para respirar e desenlaces para
proteger. Este cinema, segundo Daney, soube fazer o espectador sair da cena
e do filme com o desejo de voltar, para usufruir dos finais felizes e das
falsas saídas. Havia uma grande continuidade entre os filmes, cujo conteúdo
nem sempre contava. A arte de encorajar o espectador a voltar à sala de
cinema parecia ser o único conteúdo que importava. Ao contar estórias, o
cinema clássico americano vendia mercadorias e propagava modos de vida.


É no pós-guerra, na Europa destruída e traumatizada, que surge sobre
novas bases o cinema moderno, humanista e cruel, cuja grande interrogação é
a humanidade do homem, frente à assombrosa revelação da existência dos
campos de concentração. Os modernos, sublinha Daney, nos mostraram um mundo
sobrevivente resgatado por um novo realismo. Nesse cinema, ligado à
história dos homens, capaz de contribuir na reconstrução do pós-guerra, o
crítico acreditou profundamente.


No entanto, Daney enfatiza a relação ambígua do cinema com os
acontecimentos da 2ª Guerra Mundial. Uma crença, portanto, lúcida que viu o
quanto o cinema também era culpado e em que medida teve a ver com o horror:
produziu as propagandas realísticas dos anos 30 e 40, como O Triunfo da
Vontade de Leni Riefensthal, contribuindo com a mentira das grandes
encenações politicas e com o desastre da guerra. "Atrás desse teatro
guerreiro, como seu oposto escondido e sua verdade vergonhosa, havia uma
outra cena que desde então frequenta os imaginários: os campos de
concentração"[22]. Por isso, dizia ser "impossível amar "a arte do século"
sem ver essa arte trabalhando segundo a loucura do século e sendo
trabalhada por ela". Cinema portanto convalescente, que dizia não ao
"humanismo" tagarela e estabelecia os limites de uma humanidade
desnaturada. Não é sem razão que o crítico retoma a noção baziniana de
"crueldade" para pensar o cinema moderno.


O tema da inexistência durante a guerra, e no imediato pós-guerra, de
uma representação cinematográfica dos campos de concentração, diferencia
entretanto os dois criticos[23]. Esta é uma das razões da importância de
Nuit et Brouillard (1955) para Daney. O filme de Alain Resnais é um
decisivo na sua visão do cinema "posterior aos campos" e também na sua vida
de adolescente no pós-guerra: "um choque moral e estético", que marcou
profundamente seu futuro de crítico de cinema. O impacto deste filme se
origina na violenta contração do conceito de humanidade e no radical
deslocamento da concepção do cinema como arte do registro. Como mostrar um
presente carregado de ignomínia, diante do qual a própria arte do cinema
vacila? Questão que será central para Daney e que só pode ser elaborada a
partir de um cinema que soube mostrar o irrepresentável e dizer ao
espectador que a esfera do visível não está mais inteiramente disponível:
"há ausências e buracos, (...) vazios necessários". Eis porque a figura da
elipse adquire tanta importância na narrativa neste novo cinema, como já
apontava Bazin na sua análise de Paisa[24] (R. Rossellini, 1946).


É na verdade a presença da morte no cinema que está em questão,
atestando novamente a filiação, apesar dos deslocamentos e rupturas, de
Daney à Bazin. A morte como o acontecimento por excelência que problematiza
e redimensiona os limites da filmagem (Daney) e da montagem (Bazin) e o que
pode qualificar um travelling como uma questão de moral, assim como também
defenderam Rivette e Godard. O cinema, segundo Daney, pode ensinar uma
lição à primeira vista simples: o mundo existe e torna-se moral na medida
em que não deve ser mostrado de qualquer maneira, idéia que vai ao encontro
da noção baziniana de montagem proibida. Bazin morreu no final dos anos 50
sem ter motivos para modificar sua maneira de acreditar do cinema. Afinal,
não viveu as décadas seguintes, quando a proliferação de imagens, a
banalização do mal e da morte, levou Daney a perder suas esperanças no que
acreditou que o cinema era capaz e a verificar melancolicamente que o mundo
não precisava mais do cinema.


Novos espectadores, novos personagens, novas associações audiovisuais


Daney aprofunda ao longo de seus artigos uma reflexão em relação ao
estatuto do espectador no pós-guerra. Seu olhar não se perde mais na tela
entre o obstáculo e a profundidade de campo, mas lhe é mandado de volta
como uma bala. Na nova cenografia do cinema moderno, a imagem funcionaria
sem profundidade simulada, como superficie, como espelho onde o espectador
capta o seu proprio olhar como o de um intruso, que, virtualmente, pode
sempre ser visto por qualquer personagem presente na cena registrada no
instante em que vira o seu olhar para a câmara. E a pergunta central desta
cenografia torna-se: consigo olhar o que de fato vejo, apreender o
acontecimento que se revela inelutavelmente e de viés diante dos meus olhos
na duração do um só plano?


Haveria então, neste momento, a necessidade de um conhecimento íntimo
dos jogos com a distância, com as formas de composição audio-visuais, para
que o espectador permaneça, em relação ao espetáculo do cinema, um sujeito,
submetido ao desejo e à morte, e uma pessoa moral, um cidadão com direitos
e deveres, que encontra-se sempre em situação, frente a outrem. O filme não
deve manipular nossos interesses de cidadãos em favor dos nossos interesses
de espectadores. A idade moderna do cinema é uma idade ética.


No prefácio a Ciné-Journal, Deleuze capta este movimento no
pensamento de Daney e enfatiza as novas formas de composição e de
associação audio-visuais do cinema moderno. Mudam as relações da imagem com
as palavras, os sons, a musica, em dissimetrias fundamentais do sonoro e do
visual, que iriam dar ao olho um poder de ler a imagem e ao ouvido a
possibilidade de elucidar os menores ruidos. A idade moderna do cinema é o
da pedagogia da percepção.


Para Daney, o que também caracterizou o cinema europeu do pós-guerra,
frente à Hollywood, foi a recusa da psicologia como explicação
globalizante da trajetória dos personagens. Ele lembra que neste cinema o
indivíduo -como por exemplo, a criança de Alemanha Ano Zero, de R.
Rossellini - encontra-se no início e no final da narrativa, mas que o
movimento do filme envolve pessoas em processos e situações e busca
estabelecer o laço com o meio social e a realidade histórica. Uma das
dimensões do personagem do cinema moderno é, para Daney, de ser um espaço
interno de reverberação de redes de relações.



O cinema contemporâneo ou o terceiro estado da imagem



É a partir do que poderíamos chamar de uma verdadeira pedagogia
crítico-analítica da imagem cinematográfica que Daney verifica um terceiro
momento dentro das transformacões históricas, econômicas e estéticas do
cinema. Trata-se de um domínio que é posterior à modernidade - ele não
utiliza o conceito pós-moderno - e que o critico nomeia como cinema da era
da publicidade. Interessa-nos identificar aqui de que modo Daney percebe
uma mudanca na natureza - sempre impura - da imagem cinematográfica
contemporânea, à medida que esta passa a estabelecer relações mais intensas
com a televisão, com o vídeo, com as imagens digitais, com a eletrônica,
etc.


Contrariamente à lógica do senso comum, onde o cinema teria atributos
inventivos, analisáveis, e a TV não faria senão banalizar qualquer
manifestação artística, Daney questiona e recusa estes enunciados
correntes, de modo a tentar extrair vigorosos agenciamentos entre estas
mídias. Godard - "que fez todos os gestos decisivos antes dos outros"[25] -
é novamente a fonte maior de inspiração, no percurso original de articular
cinema e vídeo (Numéro deux/1975, Six foix deux/1976, France tour détour
deux enfants/1977-78), já na primeira metade dos anos 70[26].


Mais uma vez, o estatuto do espectador sofre mudanças radicais. A
tela não tem mais a profundidade do cinema clássico, onde o espectador se
perdia numa imagem idealizada de mundo (=janela para o mundo), nem a
distância real da imagem moderna (=o quadro), onde ele experimentava o
sentimento cruel de não-assistência, mas a possibilidade oferecida a ele de
deslizar lentamente sobre imagens que deslizam, elas também, umas sobre as
outras. Trata-se de um espectador formulado por "informacões fragmentárias
de um mundo des-solidarizado", onde a tela é nada mais do que uma mesa de
informação. A imagem, neste terceiro momento, é marcada não apenas pela
ruptura cada vez maior nas relações do homem com o mundo, mas pela perda do
próprio mundo: as imagens agora remetem a apenas uma, a de meu olho vazio
em contato com a imagem, inserido nela. Não há nada para ver atrás nem no
interior da imagem, senão um fundo indeterminado ou suporte neutro onde
tudo se apresenta e se apaga. São as telas de cinema, de televisão, de
vídeo, de computador, dos jogos eletrônicos.

Nesse sentido, tv e publicidade são sintomas de um estado de
coisas[27] no cinema diagnosticado por Daney de maneirista. Embora Daney
não sistematize academicamente o termo - ambíguo e problemático - utiliza-
se dele para detectar pontos em comum nas obras dos americanos Francis
Coppola, Brian de Palma, Steven Spielberg. Assim é que no início dos anos
80 constata um "estado de espírito" da imagem onde "nada mais acontece aos
humanos, pois é na imagem que tudo acontece"[28], e prossegue, no viés de
um pessimismo apaixonado, na análise desta nova imagem, fornecida não mais
pela câmera, mas fabricada fora dela, em uma pré-visualização videográfica
que sobrequalifica a imagem em detrimento dos atores.

É importante assinalar que a década de 80 será marcada, dentro da
crítica, por um retorno à questão do maneirismo na imagem. Os Cahiers du
Cinéma retomam essa discussão para falar do "cinéma de l'après"[29], ou
seja, cinema posterior à modernidade dos anos 60 e 70. Em um dos artigos da
série intitulada Le cinéma à l'heure du maniérisme Alain Bergala é
taxativo: "Tornou-se indispensável colocar a questão do maneirismo para
compreender o que está se passando com o cinema desde o início dos anos 80"
[30]. A necessidade de compreensão deste momento conduz Bergala e outros
críticos dos Cahiers, todos contemporâneos de Daney, a uma volta à origem
histórica da noção de maneirismo na pintura. O que os mobiliza é o
sentimento, que crêem comum tanto a pintores do século XVI quanto a
cineastas dos anos 80, de terem chegado tarde demais, depois de um ciclo da
história da arte ter terminado e uma certa perfeição atingida pelos mestres
que os precederam[31]. Segundo os Cahiers, a situação maneirista é uma
grande confusão de estilos e modelos: no limite cada cineasta pode escolher
que mestre do passado e que momento do cinema quer retomar. Para o pior e
para o melhor. Um grande maneirista, para Daney, "é alguém que trabalha
pacientemente uma certa anamorfose e que conhece intimamente a imagem, o
rosto do qual ele partiu."[32]

O cinema seria então uma grande reserva de formas, motivos e mitos,
difundida pela televisão e, neste sentido, bem de acordo com a afirmação de
Daney para este momento da imagem: o cinema tem daqui para frente o próprio
cinema como pano de fundo. A cenografia é a da "visita-guiada" em um museu,
onde os diferentes sistemas de ilusão podem funcionar lado a lado. Convém
destacar, entretanto, que Daney não se permite aderir aos propalados e
fáceis discursos do "fim" do cinema, do fim da história ou da crise do
roteiro, tão apregoados nesta época "onde tudo já foi feito". Se para uma
certa crítica, Wim Wenders foi a consciência pesada de que tudo já havia
sido realizado, para Daney, Wenders foi "o homem que negociou da forma mais
honesta possível esta passagem para um mundo desinvestido de afeto" (grifo
nosso).[33]

O crítico sabe perfeitamente que o problema não é apenas de excesso
de tecnologia, de formas e de mitos, pois é o próprio modo de conceber a
imagem cinematográfica que está em questão. Trata-se de um momento de
passagem. Controlada e domesticada por estes novos dispositivos tecno-
sociais (vídeo, computador, tv), esta imagem se sofistica ao mesmo tempo
que perde sua potência suplementar, de invenção e estranhamento. De fato, a
noção de manierismo aplicada ao campo do cinema, embora pouco trabalhada
por Daney, tem o mérito de interrogar sobre o estatuto da imagem na
contemporaneidade.

Através desta noção, Daney detecta um sistema de controle técnico,
imediato e perfeito da imagem (o olho profissional da eficiência
televisiva) e, simultaneamente, um sentido de combate a este sistema, à
medida que o cinema estabelece relações com outros dispositivos
tecnológicos e se reinventa, se reformula. O terceiro estado da imagem
condiciona e é condicionado pela técnica, de modo a encaminhar a
transformação do mundo no sentido de um vasto estúdio cinematográfico. Se o
mundo se pôs a fazer um cinema de mau gosto (os embustes da mídia, da
política, da economia), cabe ao cinema inventar e nos presentear com um
pouco de mundo, com um pouco de possível.



O individualismo e o cinema contemporâneo



O outro, o indivíduo, as relações humanas, o mundo: o cinema para
Daney é uma maneira de estar no mundo, de se transformar no e para o mundo.
No entanto, identifica uma desertificação do mundo no início dos anos 80,
condicionada e condicionante da legitimação primeiro cultural e depois
estética da publicidade. O filme publicitário torna-se um gênero e o ganha-
pão de uma nova geração de cineastas[34], cujas engrenagens plásticas se
alimentam desta nova estética aliada à aplicação propagandística para
tratar os grandes temas.


Radicalmente crítico desta linha hegemônica do cinema francês dos
anos 80, Daney tenta identificar em alguns filmes como A Imensidão Azul
(1987), de Luc Besson, elementos que permitissem a ele pensar o estado do
mundo. O cinema de hoje substituiu as esferas da sociedade, do grupo ou da
nação, presentes no cinema de outrora, pelo indivíduo sozinho. A sedução
passaria agora por verdadeiros "seres de síntese" formulados pelo
individualismo democrático de massa. E o grande assunto deste cinema seria
a desproporção entre o homem e seu meio-ambiente, a perda de uma medida
comum, o abandono de toda esperança de nos servirmos dos outros para nos
situarmos no mundo.


Para Daney, o corpo publicitário na sua codificação atual seria
inapto a toda conexão humana e no entanto seria necessário encontrar-lhe
uma história, a da sua autolegitimação. Qual a origem dos corpos de sonho?
"Os corpos dos homens, mulheres e crianças dos spots publicitários são
desligados do social e liberados das histórias comuns: flutuam no éter sem
história. Por isso a necessidade da invenção da gênese deles." Como bem
detecta Daney, é um novo indivíduo do tempo que surge com esses filmes a
exigir um mito fundador de um mundo onde tudo que é privado aflora à
superfície e torna-se público, espetacularizado. Trata-se de um fechamento
do indivíduo sobre ele mesmo legitimado pela operação mitológica.


Foi a publicidade televisiva, afirma Daney, que nos habituou a ver
apenas um personagem, um corpo por vez, extraído do seu meio ambiente. Para
Daney a publicidade tornou-se no mundo contemporâneo um verdadeiro vírus
cujo objetivo maior é de suspender o movimento para extrair do fluxo das
imagens apenas uma que simbolize o filme todo e não tenha devir. O
congelamento da imagem representa deste modo a própria essência da
publicidade, que é de imobilizar o consumidor frente à imagem emblemática
(image de marque) do produto. Ao mesmo tempo, produz uma imagem fixa do
outro, retirada do domínio da vida, repleto de imagens passageiras,
instantâneas, contraditórias e complexas, que possuem um devir.


No entanto, o cinema apresenta, mesmo dentro do cenário atual, outras
potencialidades, ligadas a um prosseguimento possível de uma tradição
cinematográfica, onde o conceito de informação, da "função-tv", é elaborado
de múltiplas maneiras. Cineastas como Lang, Rosselini, Welles, Godard
formalizam e fazem pensar respectivamente as idéias de vigilância, de
atualidade, de desprogramação, de escolha obrigatória e indiferente. Se no
mundo contemporâneo a imagem tende a perder a sua dimensão de testemunho do
mundo, este outro cinema pode ser testemunho das imagens do mundo, ser a
caixa de ressonância simbólica do resto das imagens, ser a "consciência da
televisão" [35].


***


Em La Défaite de La Pensée (Critique)[36], Daney secreta uma breve
história da crítica cinematográfica e pergunta a si mesmo, num estado de
urgência solitária, por quê parou de fazer críticas, visto que "escrevia o
que queria em um jornal ´espontaneamente` cinéfilo". Trata-se neste momento
de reavaliar sua trajetória pessoal, repensar a necessidade do cinema na
vida das pessoas e seu prolongamento na publicidade, na TV, na informação,
pois o "indivíduo moderno vive numa sociedade de ´sobre-escolhas` e o
cinema é apenas uma das escolhas possíveis".


Passeur, assim se definia nos últimos anos de sua vida; ora, é
sintomaticamente num estado de passagem, de imagem em movimento que o
crítico percebia a si mesmo e a seu próprio trabalho. O fascínio que a
imagem cinematográfica exerceu em sua vida engendrou uma escrita a tal
ponto identificada com o suporte da tela, que não é exagero dizer que cada
crítica-ensaio de Daney restitui um fragmento de imagem, uma sensação, a
atmosfera mental de certo diretor. Segundo ele, o sentido da crítica de
cinema é poder iniciar um diálogo público com o diretor do filme, "escrever-
lhe uma carta aberta".


No entanto, constatava, pessimista, que "o cinema não provoca mais
debates, deixa poucas marcas e mesmo os cinéfilos dedicam a ele mais uma
fidelidade desencantada do que uma paixão". Com extrema perspicácia,
diagnosticou uma mudança radical na função da crítica nos últimos tempos: o
crítico que informava sobre viajantes como Godard, Cassavetes, Bergman foi
substituído por uma espécie de advogado dos interesses do público. "São
juízes, a quem se pede que represente a ignorância do espectador diante do
cineasta e de legitimá-la. Criam o guia do consumidor, o que leva
rapidamente ao conformismo."


Um guia de consumo. Corre-se o risco de ser este o papel da crítica
de cinema, segundo Daney, na contemporaneidade. As engrenagens
publicitárias e mercadológicas atuam e reconfiguram sem cessar o espaço da
crítica, de modo que sua função se orientaria hoje pelos interesses de
consumo do público médio, pelo valor mercadológico do filme. Se no passado
o cinema foi uma gigantesca máquina de consciência social, este "social" é
hoje consumido e, como tal, parcela de um mercado de infinitas escolhas.


Interessa portanto repensar a natureza da crítica para não cairmos em
armadilhas conformistas. Considerar uma nova concepção que englobe, ao
mesmo tempo, aspectos tecnológicos, informáticos, sociais, mercadológicos e
estéticos da imagem. A "arte de acompanhar" (o cinema e o mundo) precisa
interagir com as novas experiências audiovisuais e com o mercado emergente
das novas Tvs. Trata-se de uma nova lógica, enfim. Lógica, aliás,
habilmente sinalizada por Daney.


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[1] Artigo publicado na Cinemais. Revista de Cinema e outras questões
audiovisuais, Rio de Janeiro, v. 15, p. 171-192, 1999.
[2] Les Cahiers à spirales, Les Inrockuptibles mars/avril 1992, pg 84.
[3] Entrevista editada no livro Pérsevérance, POL, Paris, 1994.
[4] Thierry Jousse, Les Cahiers du cinéma nº 458, julho/agosto 1992, Sur
Serge Daney, pg 73.
[5] Ao assumir a redação dos Cahiers em 1974, período posterior aos anos
maoistas, Daney imprime uma abertura à linha editorial da revista que se
traduz em entrevistas ou artigos de Michel Foucault, Jacques Rancière, Marc
Ferro e Gilles Deleuze, além de manter as intervenções mais habituais de
Christian Metz e Roland Barthes.
[6] Na manhã seguinte a sua morte, Godard escreve no Libération (14/15 de
junho de 1992 - pg 27) um pequeno artigo: "Voilà. Le dialogue est fini.
L'échange est terminée entre le réel et nous, le passeur ayant passé." Ao
lado de críticos como Elie Faure, André Malraux, André Bazin, Godard cita
Daney e afirma; "Ce que la France seule a su donner au monde sans exiger
de récompense."
[7] Paul Virilio, Daniel Sibony, Pierre Legendre, Jean Louis Schefer, Jean
Paul Fargier e Louis Skorecki.
[8] Persévérance, pgs 147-148.
[9] Idem, pg 158.
[10] Le travelling du Kapo, reproduzido em Persévérance, pgs 15-39.
[11] Idem, pg 72.
[12] André Bazin (1918/1958); Serge Daney (1944/1992).
[13] E também da sua relação pessoal com o cinema: " (...) Comme le cinéma.
Que j´aime parce qu'il m´a permis de vivre avec tout ce qui n'est pas moi,
toutes ces choses impures qui me faisaient un peu peur: les mondanités, les
stars, le fric, le monde des grands qui m'a toujours terrorisé." Les
Cahiers à spirales, in Les Inrockuptibles, pg 84.
[14] Dois textos de Rivette marcam profundamente Daney: De l'abjection,
onde o crítico mostra como um travelling pode ser abjeto moralmente e
Lettre sur Rossellini, , onde diz ter descoberto que a TV também é uma
linguagem. Ambos foram publicados nos Cahiers du Cinéma.
[15] . Daney usa a expressão incesto cine /TV. Ver Le salaire du zappeur,
Ransay Poche/Cinéma, Paris, 1988, pg 249-250.
[16] Devant la Recrudescence des vols de sacs à main, Aléas Editeur, Lyon,
pgs 16 e 126.
[17] Idem, pg 127.
[18] Persévérance, pg 89.
[19] Devant la Recrudescence des vols de sacs à main, pg 136.
[20] Persévérance, pg 89.
[21] Para Bazin, os limites da tela são um recorte com apenas parte da
realidade filmada (=janela) sugerindo a presença do espaço que se estende
para fora da tela Esta tese, associada a uma concepção de real e da
percepção humana tributárias da fenomenologia faz o crítico eleger o plano-
sequência e a profundidade de campo como procedimentos mais aptos a captar
a realidade do mundo e revelar a continuidade verdadeira do real e sua
ambiguidade intrínseca.
[22]La rampe, Cahiers du cinéma/Gallimard, 1983, pg 174.
[23] Mais uma vez, entre Bazin e Daney, há Godard. Desde do inicio dos
anos sessenta, em diversas entrevistas, Godard levantou esta questão,
posteriormente retomada na sua série de vídeos e de livros sobre a história
do cinema. Para Godard "o esquecimento do extermínio faz parte do
extermínio". Ver Jean-Luc Godard: Histoire (s) du cinéma – 1 – Toutes les
histoires / une histoire seule, Gallimard /Gaumont, Paris, 1998 , pg 109.
[24] Ver André Bazin: O realismo cinematográfico e a escola italiana da
Liberação, in: André Bazin: O cinema, Ensaios, Brasiliense, SP, 1985. Para
uma análise da noção baziniana de elipse, ver o excelente artigo de Fernão
Ramos: A imagem câmera: alguns aspectos estruturais, in: Cinemais nº 5,
maio-junho 1998, pgs 179-203.
[25] L'exercice a été profitable, Monsieur, Pol, Paris, 1993, pg 296.
[26] A partir de 1974, Godard começa a trabalhar com o vídeo, criando uma
pequena empresa (Sonimage) em Grenoble, na qual trabalha como um artesão.
"Descobri que há outras técnicas além do 35 mm (super 8, 16 mm, vídeo) que
podem ser exploradas de forma pouco dispendiosa, sem no entanto opô-las ao
cinema, mas ligá-las a ele." Godard,
[27] Ou nas palavras de Daney, "a publicidade é a matriz estética, a
televisão o lugar da aplicação em massa dessa estética." Persévérance, pg
164.
[28] Cinejournal, Cahiers du Cinéma, 1998, p.125.
[29] Les Cahiers du cinéma nº 360-61, verão 1994.
[30] Les Cahiers du Cinéma nº 370, abril 1985, pgs 11/38.
[31] No caso da pintura, mestres como Michelangelo ou Rafael. O maneirismo
de Pontormo ou Parmigianino constituindo como uma das respostas possíveis,
ao lado do Academismo e o Barroco. No caso do cinema, tanto os mestres do
cinema clássico quanto do cinema moderno.
[32] Devant la Recrudescence des vols de sacs à main, pg 126.
[33] Idem, pg 147
[34] Nesse momento, Daney se refere particularmente aos cineastas franceses
(Jean-Luc Besson, Jean-Jacques Annaud) embora inclua Spielberg na lista.
[35] O cineasta brasileiro que mais se aproxima desta tradição é, para
nós, Jorge Furtado. No curta O dia em que Dorival encarou a guarda
encontramos uma brilhante associação entre imagens classicas da história do
cinema e o imaginário individual de cada um dos soldados que buscam
controlar o preso; outros curtas como Esta não é a sua Vida ou Ilha das
Flores partem dos proprios clichés da imagem televisiva para elaborar uma
reflexão sobre o nosso estar no mundo.
[36] L'exercice a été profitable, Monsieur, pg 285/296.
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