Inventários de bens como fonte de estudo da vida quotidiana da Época Moderna

September 22, 2017 | Autor: Lígia Camarão | Categoria: Inquisition, Portuguese Inquisition
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Universidade de Lisboa Faculdade de Letras Departamento de História

Inventários de bens como fonte de estudo da vida quotidiana da Época Moderna

Lígia Andreia Camarão Lisboa, 20 de Maio de 2008

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Índice

Breve introdução sobre a Inquisição ……………………………..

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Os inventários de Bens …………………………………………….

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 Tapetes ………………………………………………………

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Móveis ……………………………………………………………...

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 Camas e leitos ……………………………………………….

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 Cadeiras, Mesas, Poltronas e Objectos de Decoração ……

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 Vestuário …………………………………………………….

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 Pratas ………………………………………………………..

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 Ouro …………………………………………………………

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 Outros Bens …………………………………………………

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Conclusão …………………………………………………………..

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Anexo – I (Tabelas) ............................................................................

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Anexo – II (Transcrições dos Inventários de Bens) ................................

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Bibliografia ………………………………………………………...

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«O procedimento da Inquisição em lugar de extirpar o Judaísmo o multiplica. E Fr. Domingos de Santo Tomás, deputado do Santo Oficio, costumava dizer que assim como na Calcetaria havia uma casa onde se fazia moeda, no Rossio havia outra em que se faziam Judeus.»

D. Luís da Cunha, fidalgo português, Instruções Inéditas (C.1735).1

Analisando um pouco a história e origem da inquisição podemos compreender, sem dúvida alguma, que Portugal e Espanha, foram dois países que marcaram de uma forma acentuada a história da inquisição. O negociar2 longo entre os reis de Portugal e a cidade de Roma, obrigou o governo português a mandar retirar de Roma, todos os seus embaixadores. Em 1531, foi nomeado como inquisidor-geral, Frei Diogo da Silva3, mas só em 15364 foram definidas as primeiras características do tribunal da fé e deu-se início à criação das condições para manter esta nova situação. Foi na cerimónia de aceitação da bula, em 1536, realizada em Évora, na presença do rei D. João III e do Bispo de Ceuta que foi autorizada a criação de vários tribunais, por todo o país, sobre as ordens do inquisidor-geral. Iniciou-se assim, a construção de fortíssimas bases que originaram a multiplicação dos vários tribunais da fé que, por sua vez, teve como repercussão um aumento das perseguições efectuadas, as quais se tornavam cada vez mais fortes, espalhando o terror em todo o reino. A perseguição dos hereges tornou-se num dos principais objectivos da Igreja.

«15845, Abril, 30 – Cristãos-Novos de Trás-os-Montes queixam-se ao Rei de que há testemunhas que os caluniam 1

Cf., António José Saraiva, Inquisição e Cristãos-Novos, Porto, Editorial Inova Limitada, 1969, p.9. Iniciado em 1515. 3 Bispo de Ceuta. 4 A bula de 1536. 5 Cf., Isaías Rosa Pereira, A Inqusição em Portugal, séculos XVI-XVII – Período Filipino, Lisboa, Veja, 1993, p.11. 2

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ou ameaçam de os acusar à Inquisição, se não lhes derem o que pretendem. O Rei pede ao Inquisidor-Geral que mande averiguar o caso, para que, sendo verdade, se faça justiça e, sendo falso, se castiguem os culpados.»

Arquivo Nacional da Torre do Tombo Conselho Geral do Santo Oficio Livro n.º 88 (1.ª Parte)

A inquisição portuguesa, tinha características muito particulares, quer quanto à qualidade dos réus que eram perseguidos, quer quanto à maneira como eram investigados e julgados os crimes contra a fé. Toda a criação da fundação do Santo Ofício, tinha como significado para o rei, um reforçar de todo o seu poder régio e subsequente aumento da sua extensão. Alem da criação dos vários tribunais do Santo Ofício espalhados por Portugal, foi ainda criado, em Goa6, um outro que teve a sua autorização7 de criação no ano de 1560. Foram vários os motins arquitectados aos cristãos-novos e aos poucos, os mesmos foram sendo excluídos de inúmeros cargos de elevado grau de importância8. O tribunal da inquisição, começou a sua actividade em Évora, no ano de 1539, sendo então julgados os crimes de: Judaísmo, Magia, Islamismo, Blasfémia, Protestantismo, Pacto com o Demónio, Proposições heréticas. Por estes factos, a inquisição aumentou muito o seu poder. Podemos ainda comentar o papel importante dos regimentos9, pois eram eles que mantinham organizadas as actividades da inquisição e apresentavam os capítulos de tudo o que iria ser aplicado. Concluindo, o período da Inquisição, foi sem dúvida um período de terror, as perseguições pareciam não ter fim e com o tempo tudo se parecia agravar. Eram

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Índia. Cf., Francisco Bethencourt, “A Inquisição”, História Religiosa de Portugal, vol, 2, (Humanismos e Reformas), direcção de Carlos Moreira de Azevedo, coordenação de João Francisco Marques e António Camões Gouveia, Lisboa, 2000, p. 100. 8 Este processo ficou conhecido como, “Limpeza de Sangue”. Cf., Idem Op. Cit, p. 102. 9 Documentos da História – 2, O Ultimo Regimento da Inquisição Portuguesa, Lisboa, Edições Excelsior, 1971, pp. 7 – 127. 7

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inúmeros os réus, sendo os seus bens confiscados e presentes a tribunal. A “limpeza” era geral, onde bastava um simples falso testemunho para originar prisões e punições.

Os inventários de Bens As heresias cometidas levavam a inquisição a averiguar toda a vida do réu assim como todos os seus bens logo, sempre que um réu era preso por determinado crime cometido, todos os seus bens eram confiscados. Assim, tendo-se em conta que os crimes, no tempo da inquisição tendiam a aumentar durante a perseguição aos hereges, também os confiscos de bens se tornaram uma constante. Muitos dos processos crime presentes a tribunal, continham na sua maioria inventários de bens, onde era explicado de forma detalhada todos os tipos de bens que o réu tinha em sua posse. Ao longo dos processos examinados, foram variados os tipos de bens encontrados, sendo que os mais comuns tinham muita tendência a repetirem-se. Assim sendo, propriedades, móveis, vestuário, roupa de casa, objectos de decoração, jóias e pratas, são alguns dos bens presentes nos processos estudados para este trabalho. Durante a época moderna, a casa apresentava-se de uma maneira pouco confortável devido à sua dimensão a nível de espaço, não sendo também um exemplo de privacidade. Era através da casa e dos bens existentes no seu interior, que se podia classificar o tipo de família que ali residia, tanto quanto à sua riqueza quanto ao seu modo de vida. A nível das suas divisões, a casa da era moderna apresentava-se quase sempre com uma só divisão, ao nível do rés-do-chão10, partilhada pela cozinha e pelo quarto onde dormiam, divisão esta onde se podia ainda conviver com todos os membros da família e amigos ou até visitantes e também trabalhar.

Cf., João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 633. 10

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Por vezes, a estrutura da casa poderia apresentar mais que uma divisão principalmente nas zonas de maior aglomerado populacional, apresentando-se muitas vezes as casas ligadas umas às outras, visto que as suas paredes11 não eram muito fortes. Passemos então a uma análise pormenorizada dos vários bens que constam nos processos dos réus presos pela Inquisição de Lisboa e Inquisição de Coimbra. 

Tapetes

Apesar do chão das casas quinhentistas se apresentar quase sempre forrado a ladrilhos12 e por vezes lajes ou azulejos, existiam muitas casas que tinham apenas terra no chão e por conseguinte colocavam-lhe tapetes ou alcatifas em cima. Vinham de Espanha os primeiros tapetes exportados para Portugal mas tal como consta em alguns dos processos analisados para este trabalho, a Ásia Menor e a Índia também haviam começado as suas exportações para Portugal. O réu António Mendes, além de um tapete simples, tinha também na sua posse, uma alcatifa da Índia em seda de valor elevado.

Móveis  Camas e Leitos Passando agora para os móveis, sabemos que a cama era um objecto que continuava a ter um papel central na casa. Ao longo dos tempos, a mesma foi sofrendo alterações sucessivas. Desde um simples aglomerado de palha, para a população menos favorecida, até enormes camas compostas por dossel e pequenas colunas, a cama, vinha a ganhar importância dentro da casa. A cama encontrava-se quase sempre ao centro13, pois a necessidade de combater o frio era uma constante. A cama podia ir do mais simples, até ao mais abastado, repleta de pequenos pormenores de decoração.

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Por vezes as paredes eram apenas em madeira, ou até mesmo uma simples cortina a servia de parede. Ladrilhos que eram sobras de tábuas. Cf., João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 636. 12

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Com o passar do tempo o próprio móvel que servia de armação para a cama, passou a ser um móvel de grande importância, composto também por uma cabeceira, rodeada de três arcas onde eram guardados objectos ou apenas serviam de cómoda. Esta designação, aparecia muitas vezes com o nome de leito e este era uma constantes nos inventários de bens dos processos crime, analisados para este trabalho. O leito podia ser construído de vários de tipos de madeira, como por exemplo a nogueira. O leito14 era então o suporte para a cama, que surgiria acompanhado das colchas, adereços e roupas de cama. No processo do réu, António Mendes, constava no seu inventário de bens, um grande leito feito em nogueira. Também no processo crime da ré Natália Rodrigues, constava no seu inventário de bens, um leito pintado de verde. Anrique Pit, tinha na sua posse um catre em ferro, que era um leito pequeno. Por fim, também no processo crime do réu Diogo Vas de Oliveira, constava no seu inventário de bens, um leito de iacalenda do Brasil, com cortinas de linho de valor elevado.2 Entretanto, foram aparecendo outros tipos de cama, designadamente as camas com rodas e as camas com cortinados mais elaborados. Existiam também camas de dossel ou de pavilhão, referindo como exemplo o caso da ré Natália Rodrigues, que tinha um pavilhão de Taffeira da Índia, que era uma espécie de cama com cortinas que caiam no perímetro15 da cama. Assim, o surgimento destas novas características, designadamente o dossel, o pavilhão e as colunas, veio contribuir para dar um aspecto cada vez mais requintado à cama. O interior dos colchões também variava conforme a riqueza do seu proprietário, e poderia ir desde a simples palha, às penas de pouca qualidade ou à lã, sendo certo que quem pudesse dar-se a esse luxo, poderia colocar mais que um colchão na cama. Ao passarmos agora para as roupas de cama reparamos que oscilavam entre as simples cobertas às riquíssimas colchas, elaboradas com os materiais mais luxuosos. Sem dúvida que o enxoval para a cama, mesmo nas casas menos abastadas, era sempre considerado algo de grande importância, pois dava a simbologia ao móvel em si.

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Rafaella Sarti, Casa e Família. Habitar, Comer e Vestir na Europa Moderna, tradução de Isabel Teresa Santos, Lisboa, Estampa, 2001, p. 203. 14 Cf., Bernardo Ferrão, Mobiliário Português: Dos Primórdios ao Maneirismo, volume 4, anexos, Porto, Lello e Irmão, 1990, p.264. 15 Rafaella Sarti, Casa e Família. Habitar, Comer e Vestir na Europa Moderna, tradução de Isabel Teresa Santos, Lisboa, Estampa, 2001, p. 205.

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No âmbito dos processos crime, a ré Natália Rodrigues, tinha na sua posse, um cobertor azul, três colchas novas e oito lençóis, tudo de um bom valor e o réu António Mendes tinha na sua posse, roupa de linho para a cama. Ou seja, para além das camas terem sofrido, ao longo dos anos, grandes mudanças, os seus acessórios também as sofreram. Passando de simples camas de palha com cobertas pobres a grandes camas de dossel ornamentadas com luxuosas colchas e lençóis.



Cadeiras, Mesas, Poltronas e Objectos de Decoração

Desde pinturas riquíssimas de reis, príncipes ou princesas, a jarros, cadeiras de criança, grandes poltronas vindas da Ásia, Índia e das várias zonas da Europa, a mesas todas trabalhadas repletas de ornamentações preciosas, passando por arcas, baús e todo o tipo de peças de decoração, sem dúvida que as casas da era moderna, foram ganhando o gosto pela beleza e pela qualidade que a sociedade tinha para oferecer. Como seria de esperar, as casas dos grandes senhores e figuras importantes da sociedade, encontravam-se repletas dos mais variados artigos de luxo da época. Os interiores das casas rurais diferenciavam bastante dos interiores das casas urbanas. Como seria de esperar os móveis e outras peças de decoração existentes nas casas rurais não eram tão valiosas como nas casas urbanas, onde tudo era mais valioso e requintado16. As cadeiras, continuavam a ter um papel muitíssimo importante nas casas e por conseguinte eram uma peça com algum valor elitista17. A cadeira começou a surgir muito mais enriquecida, quer a nível das madeiras utilizadas quer a nível dos respectivos modelos os quais, eram cada vez mais trabalhados e com motivos mais requintados. Muitos dos inventários de bens que constavam dos processos crime dos réus apresentados neste trabalho, tinham na sua posse, vários tipos de cadeiras e quase sempre em grandes quantidades. 16

Rafaella Sarti, Casa e Família. Habitar, Comer e Vestir na Europa Moderna, tradução de Isabel Teresa Santos, Lisboa, Estampa, 2001, p. 210. 17 Cf., João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 637.

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Podemos pois compreender a grande importância que era dada às cadeiras, visto serem sinónimo de sociabilidade, mostrando assim o interesse do proprietário em receber amigos na sua habitação. A cadeira simbolizava18 ainda uma espécie de hierarquia, não só por quem a usava como também por quem a tinha na sua posse, por exemplo, a cadeira do Rei. Eram então apresentados vários tipos de cadeiras, nomeadamente: a cadeira de espaldar,19 que consta nos inventários de bens do processo de Anrique Pit e que era uma cadeira que tinha a excelência devido à nobreza das pessoas que nela se sentavam. Poderia ou não ter braços sendo que, normalmente se apresentava quase sempre com braços. Além deste tipo de cadeira, existia também a cadeira de campo, de descanso, de meã, de levar, de mãos, de andar, cadeira chã, cadeira quebradiça, cadeira encoirada, cadeira rasa mocha, cadeira rasa, cadeira tamboril, etc. Os tipos de cadeira que iam surgindo ao longo dos tempos eram uma constante sendo que, cada vez mais a cadeira ganhava importância no meio da sociedade moderna. Muitas são as cadeiras sem designação, do tipo que aparecem em todos os inventários de bens, de todos os processos crime que integram este trabalho. Mas sem dúvida, que a cadeira de braços foi sempre a cadeira que, nas casas modernas, marcava o poder do proprietário dentro da sua habitação. Podemos ainda comentar que o cadeirão era sempre maior do que a cadeira da mulher ou de qualquer outro familiar, de condição inferior, ao senhor da casa. Este cadeirão servia quase sempre para receber hóspedes. Visto que a cadeira era um símbolo elitista e também hierárquico, existiam contudo casas onde não havia uma única cadeira, sendo estas as casas mais pobres. Desta forma, só era possível a instalação das pessoas no chão da casa ou em cima da arca da cama, se esta existisse. O numero de cadeiras simbolizava assim o luxo e também mostrava a riqueza do seu proprietário, pois quanto mais elevado fosse o número de cadeiras existentes e o seu tipo, mais rico seria o seu proprietário. Assim sendo, constavam nos inventários de bens dos processos crime aqui referidos, seis cadeiras na posse de Cf., João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 637. 19 Cf., Bernardo Ferrão, Mobiliário Português: Dos Primórdios ao Maneirismo, volume 4, anexos, Porto, Lello e Irmão, 1990, p.249. 18

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António Mendes, duas cadeiras grandes de espaldar e duas pequenas na posse de Anrique Pit e seis cadeiras, na posse de Diogo Vas Oliveira. Falemos ainda de um tipo de assento que seria o tamborete20. O tamborete é uma espécie de banco, sem braços nem espaldar que era designado desta forma, devido à sua forma que fazia lembrar um pequeno tambor. O mesmo banco constava nos inventários de bens dos processos de Anrique Pit (4 tamboretes), e de Diogo Vas de Oliveira (2 tamboretes). As mesas, são outras peças de mobiliário muito constantes nos inventários de bens dos processos crime aqui apresentados as quais, tiveram de ir ganhando um espaço no interior da habitação, dado existir uma chamada «tradição»21 de montar e desmontar a mesa, conforme a sua necessidade de uso. Visto esta prática de desmontar e montar a mesa ser tão frequente, o móvel deveria ser fabricado de modo a dar a maior comodidade possível. Foram vários os tipos de mesa que iam surgindo e todos dependiam do talento do artesão, para os elaborar. Muitas vezes as mesas eram fabricadas de tal maneira, que os seus proprietários conseguiam transportá-las consigo. Desta forma a mesa, deixou de ser um encargo tão caro. O luxo dos tecidos que cobriam as mesas, começaram a ser mais comuns no entanto, à medida que os anos avançavam, eram cada vez mais ricos os tecidos que cobriam as mesas. Sendo assim, consta nos inventários de bens do processo de Diogo Vas Oliveira, um bufete22 de nogueira, que era uma espécie de mesa que servia de aparador ou de mesa de serviço, principalmente nas cozinhas mas também poderia servir como suporte de oratório e de escritório. Eram quase sempre muito simples, desmontáveis e com pernas de cavalete. Só mais tarde iram possuir o modo de abrir idêntico às mesas de abas e cancelas usadas no século XVIII. Os escritórios23, eram também peças de mobiliário utilizadas para guardar papéis e outros documentos para escrever. Era bastante parecido a um contador e a sua

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Tilde Canti, O Móvel no Brasil, Origens, Evolução e Características, Lisboa, Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, Editora Agir, 1999. 21 Veja-se, João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, pp 637-638. 22 Tilde Canti, O Móvel no Brasil, Origens, Evolução e Características, Lisboa, Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, Editora Agir, 1999. 23 Cf., Idem, Op. Cit.

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composição, contava com gavetas e um tampo de abrir. Na sua parte superior, poderia existir ou não com uma arca. Constavam escritórios nos inventários de bens dos processos de Natália Rodrigues (um escritório pequeno), Diogo Vas de Oliveira (um escritório, não sabia de que madeira era), e António Mendes (um escritório de nogueira). Quanto a este tipo de mobiliário, restam-nos as arcas que eram dos modelos mais comuns de móveis desta época. As arcas eram peças que começaram a aparecer de um modo cada vez mais requintado. O trabalho dos artesãos que fabricavam estas peças era cada vez mais elaborado. Tanto as arcas como as arquetas foram sofrendo ao longo dos tempos inúmeras alterações. Na sua maioria, as arcas são quase todas rectangulares e bastante compridas e serviam, sobretudo, para armazenamento dos vários utensílios e por vezes até de alimentos24. Sendo a arca de muito ou pouco valor, sempre manteve a sua função ao longo do tempo, sendo que mais tarde se começaram a utilizar mais os armários. Eram muitos os tipos de arcas existentes, nomeadamente: arca barrada, arca de cabelo, arca de escritório, arca de verga e arca quebradiça. Existiam também as simples caixas que eram uma espécie de arca, cuja coberta se encontrava sem fechadura. E por fim existiam também os cofres que se assemelhavam a uma arca, mas que não possuíam a típica tampa plana existente na arca, mas sim uma tampa acuminada. Devido ao seu tamanho, o cofre25 estava destinado a transportar objectos de maior valor doméstico, dinheiro e até jóias. Consta então no inventário de bens do processo crime de Anrique Pit, duas caixas de pinho e uma de carvalho velhas. No inventário de bens do processo crime Diogo Vas de Oliveira, quatro ou cinco arcas e um caixão, que era uma caixa grande com ferragens e muitas das vezes forrada a couro. No inventário de bens do processo crime de António Mendes, um cofre encourado e arcas de pão e por fim no inventário de bens do processo crime de Natália Rodrigues, um cofre grande e um pequeno encourado e três arcas de castanho. Quanto a móveis, são apenas os acima referidos que constam dos inventários de bens dos processos crime, apresentados neste trabalho.

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Pão. Bernardo Ferrão, Mobiliário Português: Dos Primórdios ao Maneirismo, volume 4, anexos, Porto, Lello e Irmão, 1990, p.254. 25

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Por fim, falemos então dos restantes objectos de decoração da casa, que serviam para a tornar mais rica e também mais acolhedora. Desde os utensílios de estanho a castiçais, colheres, saleiros, quadros e telas, pratos e também barris, muitos destes utensílios eram utilizados para servir a casa nas suas necessidades diárias e muitos deles, também para a deixar mais agradável e bonita. É de constar que muitos destes objectos não se encontravam acessíveis a todas as pessoas, independentemente de alguns não serem de valor muito elevado. Na sua grande maioria, estes objectos e outros que aqui não foram referidos, eram mais usuais e fáceis de encontrar nas habitações urbanas do que nas habitações rurais, tais como outros objectos já acima referidos. Assim e para terminar o excerto sobre os móveis, falemos então dos objectos de decoração, que cada réu tinha na sua posse. Anrique Pit, tinha na sua posse, seis pinturas, sendo cinco a óleo com imagens de santos, e o último de tempera com imagem de um rei, tinha também um oratório com um crucifixo de barro. Natália Rodrigues tinha na sua posse, duas pinturas da Rainha Santa e um de Nossa Senhora, um oratório, um prato de estanho, pratos de mesa, uma bacia de latão e dois tachos de cobre. António Mendes tinha na sua posse, um prato e um jarro de estanho. Diogo Vas de Oliveira, tinha na sua posse dez ou doze cómodas encarnadas. 

Vestuário

Como é do nosso conhecimento, a moda, fosse em que época fosse, esteve sempre marcada pelos vários tipos de vestuário, usado numa determinada altura. Na época moderna, não se passou o contrário, sendo difícil falar de um determinado vestuário que se usaria naquela época, visto que os mesmos variavam, mediante a situação social e financeira em que a pessoa se encontrava. Ao longo dos séculos e até aos dias de hoje, o nosso vestuário tem vindo a marcar, ou pelo menos a estereotipar se somos pessoas abastadas ou não. Sabemos também que os vários tipos de vestuário, não chegaram do mesmo modo e ao mesmo tempo a todos os sítios, assim sendo o «estar na moda»26, não Veja-se, João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 627. 26

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correspondia apenas a um tipo de vestuário usado pela maioria da população. Portugal, tal como hoje em dia, sofreu as influências vindas de outros países da Europa, assim como, nem todos os habitantes das cidades seguiam o mesmo padrão de moda, vindo do exterior, visto que nem todos tinham a mesma posição social. Foi de facto o traje feminino que evoluiu de uma maneira inferior ao traje masculino pois, a mulher quase sempre tapou o seu corpo, enquanto o homem sempre variou bastante as suas vestes, inclusivamente como militar. A peça mais usada pela mulher foi, sem dúvida, a saia que se vestia com uma camisa. Por cima da saia poderia ou não ser colocado um manto que era preso nos ombros. Surgiram apenas mudanças a nível da camisa feminina pois esta, com o passar do tempo, começou a subir até ao pescoço, passando a estar tudo completamente tapado. O homem da era moderna, continuou contudo a usar a camisa, que começou a ser fabricada com tecidos leves e bastante mais curta e estreita. As roupas tinham se ser confeccionadas de modo a garantir uma higiene um pouco mais cuidada, principalmente junto da população mais abastada, visto que o vestuário da população mais pobre não era tão elaborado, o que dificultava manter uma higiene mais cuidada. A nível das mudanças, com o encurtamento dos gibões27, foi dispensável o uso da braguilha, que era uma espécie de bolsa que protegia a zona genital e que se encontrava presa por botões à cintura. O homem usava também um saio muito curto acima das coxas, logo nos primórdios do século e à medida que o tempo avançava, o mesmo ia descendo até aos joelhos. Verificava-se por vezes, a existência de agasalhos, capas e mantos sendo também uma das características do traje masculino, o homem usar quase sempre a cabeça tapada. Os tecidos, eram de grande riqueza, nomeadamente: cetins, damascos, linhos, algodão, sedas, veludos, tafetás e fazendas de lãs. Portugal, não produzia tecidos de tão elevada qualidade. Assim, constavam nos inventários de bens, dos processos crime da inquisição, as seguintes peças de vestuário: Anrique Pit, tinha na sua posse um gibão de mangas curtas e capuz (ferragonho) de pano de lã de cordão muito fino (sargetta), uns

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Cf., Idem, Op. Cit. p. 629.

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calções velhos e um gibão28, que era uma espécie de camisa que ia desde o pescoço até à cintura e que era de seu próprio uso. António Mendes, tinha na sua posse, vestidos de seda de sua mulher, uma vasquinha de cetim preta que era uma saia com muitas pregas, roupas de linho, uma saia de veludo preto e um saiote de em tecido de seda, encorpado e com cordões (gorgoram). Natália Rodrigues, tinha na sua posse, um vestido perpétuano verde todo acabado, uma saia e um gibão, um saio de em tecido de seda, encorpado e com cordões (gorgorião), uma saia de mel cochado, um manto de cochonilho, uma saia roxa de Londres e roupa de linho. Diogo Vas de Oliveira tinha na sua posse, roupa branca de serviço, uma peça de tafetá branco envolta num pano de linho. Uma peça de tela e três pulseiras, duas de tela e uma de damasco (seda de lavores).

 Pratas «Na velha e boa casa portuguesa a prata existia, em tanta e tal abundância e variedade de peças, que é verdadeiramente aliciante abordar este tema.»29. Através desta frase, podemos constatar que a prata era uma constante presença nas casas portuguesas da era moderna. A prata era uma espécie de reserva de capital, e família abastada que se prezasse, tinha inúmeras peças em prata no interior da sua habitação. Peças essas que iriam desde utensílios de cozinha a simples peças de decoração. Estas peças, mostravam assim, a quem entrasse na casa que os seus proprietários, eram pessoas de uma certa hierarquia social e por conseguinte bastante abastadas. Salvas, colheres e taças, são hoje as peças mais antigas30 da prataria civil que são conhecidas nos nossos dias. Muitas das peças desapareciam em guerras e pilhagens e hoje em dia, não temos o total conhecimento de todas as peças existentes. As mesas reais e da alta burguesia, estavam enriquecidas com inúmeras peças em prata de uso comum entre os seus membros. A prata estava apenas presente nas casas ricas, pois nas casas pobres não se encontrava peça alguma de prata, estando em seu lugar o barro e a madeira.

Veja-se, João Carlos Oliveira, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, p. 629. 29 Ourivesaria do Norte de Portugal, “A Prata da Casa” de Maria Emília Amaral Teixiera, Porto, Associação Regional de Protecção do Património Cultural e Natural, 1984, p. 225. 30 Peças que remontam ao século XV. 28

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A nível do regular uso das inúmeras peças de prata, temos como mais usuais a colher e a salva de prata, que nem mesmo quando chegaram a Portugal as porcelanas coloridas vindas do Oriente, perderam a sua importância. Quando se começa a usar o garfo individual, também em prata, este utensílio ganha a sua importância passando assim, igualmente com a colher, a ocupar um papel importante nas casas abastadas. A bacia que muita das vezes se acompanhava pelo gomil, era outra peça presente nas casas mais ricas, mas não de carácter tão comum como a salva. Por fim, restam-nos ainda inúmeras peças em prata que vão desde os espelhos com moldura em prata, aos restantes tachos e chapas, castiçais, candelabros, fivelas dos sapatos dos fidalgos, as abotoaduras das fardas dos fidalgos e também as decorações das carruagens. Estes são apenas alguns exemplos das muitas peças em prata existentes na altura. Nos inventários de bens dos processos crime aqui apresentados, constavam: Anrique Pit tinha em sua posse, um saleiro de prata, um jarro e dois pratos em prata. António Mendes tinha em sua posse, um copo, uma salva e meia dúzia de colheres em prata. 

Ouro

Se a prata aparecia apenas em casas abastadas, o ouro aparecia apenas em casas muitíssimo ricas e não com a mesma facilidade com que a prata aparecia. As peças em ouro, eram sempre peças muito valiosas e que mostravam à restante população a riqueza do seu proprietário e/ou da sua família. Nos inventários de bens que constam nos processos crime analisados para este trabalho, foram pouquíssimas as peças que apareceram, verificando-se apenas a existência de três anéis de ouro, no processo de António Mendes, que valeriam cerca de três mil reis naquela altura. O ouro poderia ainda, servir como uma espécie de reserva para o seu proprietário e família, se algo porventura corresse mal e toda a sua riqueza entrasse em declínio. Ou seja, tanto as peças em ouro, como as peças em prata, serviam como uma mais valia, caso algo corresse mal.

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Outros Bens

Outros bens que constavam nos inventários de bens dos processos crime analisados para este trabalho, foram as propriedades, os bens alimentares e também o próprio dinheiro. A nível de propriedades, era comum na época, entre proprietários ricos, terem na sua posse inúmeras propriedades, tais como lojas, vinhas, casas, animais, alqueires31 de cereais, almudes de vinho em cuba, que eram vasos onde se recolhia o vinho que caía do fundo do lagar. Estes réus também tinham em sua posse, grandes quantidades de dinheiro. Estes bens serviam essencialmente para manter um nível de vida bastante elevado, mantendo desta forma uma riqueza pessoal muitíssimo mais abastada perante o resto da população. Desta forma, os réus conseguiam comercializar, já que muitos tinham bens alimentares e vinhos na sua posse, podiam arrendar as casas e lojas e até mesmo manter um negócio. Tudo isto dependia do poder monetário de cada um e se tinha ou não possibilidade de investir, para obter mais riqueza e viver no meio do luxo. Sendo assim analisemos os inventários de bens que constam nos processos crime escolhidos para este trabalho, para sabermos os restantes bens que cada réu tinha na sua posse. António Mendes, tinha na sua posse uma mula, arrabeis de asa pão, setenta almudes de vinho em cuba, não se sabe quantos alqueires de trigo, um prato e um jarro em estanho e também algum azeite. Anrique Pit tinha apenas cento e sessenta ou cento e setenta mil reis. Diogo Vas de Oliveira, tinha na sua posse, casas, lojas, rendas, três almudes de azeite, trinta alqueires de milho e um saco de trigo, sessenta ou setenta mil reis em dinheiro, dinheiro na gaveta de um bufete, dinheiro na gaveta de um caixão que estava na loja e cento e quatro sacos de trigo e centeio, que tinha trazido de uma caravela onde é mestre Domingos Manso. Natália Rodrigues tinha na sua posse, uma armação de rede, um olival de chamão e outro olival que está até ao pinheiro da Seara e duas casas que estão na freguesia de São Pedro.

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Antiga medida de capacidade variável de cereais, que corresponde mais ou menos a 13 litros.

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Conclusão

Este trabalho teve por base uma análise pormenorizada de todos os bens existentes na posse dos réus aqui apresentados, podendo concluir-se o seguinte:  Através dos bens penhorados pode-se caracterizar e identificar o tipo de indivíduo que os possuía sob vários aspectos, nomeadamente, quanto à sua riqueza (ouro, pratas, jóias, dinheiro, etc), se tinha estudos, local onde vivia - campo ou cidade, profissão bem como, qual a sua classe social e se era pessoa bem relacionada na sociedade, entre outros;  Pode-se ainda, de uma forma subtil, observar as várias transformações sofridas pelos objectos, tanto de uso pessoal como de uso geral ao longo desta época, quer a nível de qualidade quer a nível de beleza dos mesmos; bem como  O despertar para a necessidade de aliar a qualidade dos tecidos, das tapeçarias, das roupas de cama, ao bem-estar físico e à moda, para as classes mais altas da sociedade;

Assim e para melhor compreensão, encontram-se em anexo, todas as transcrições dos processos crime estudados para este trabalho.

Embora existissem muitos outros processos para além de muitos outros bens que não foram analisados, pretendendo-se com este trabalho apenas fazer uma análise generalizada dos bens mais comuns entre as populações da Época Moderna e que constam dos processos analisados.

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Anexo - I Doc. 1 – Tabela Geral de Confiscos de Bens

Réu

Tapetes Móveis Vestuário Pratas Ouro Outros Bens

۞

António Mendes Anrique Pit Diogo Vas de

۞

۞

۞ ۞ ۞

۞

۞

۞

۞

۞

۞

۞

۞

۞

۞

Oliveira Natália Rodrigues

Doc. 2 – Tabela pormenorizada dos Confiscos de Bens Réu António Mendes

Bens

Valor

 Uma salva de prata 

Um copo de prata



Meia

dúzia



Não se sabe o valor

de

colheres em prata 

Três anéis de ouro



3 000 réis



Uma

da



20 000 réis

meio



Não se sabe o valor

alcatifa

Índia de seda 

Aguosa

de

coro 

Um tapete



Não sabe o valor



Cinquenta arrabeis



50 000 réis

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de asa pão 

Uma mula



10 ou 12 000 réis



Setenta almudes de



15 ou 16 000 reis

vinho em cuba 

Trigo



Não se sabe o valor



Um escritório de



4 000 réis

nogueira 

Seis cadeiras



3 000 réis



Um cofre



Não se sabe o valor

encourado e arcas de pão 

Roupa de linho



Não se sabe o valor



Prato e jarro em



Não se sabe o valor



Não se sabe o valor



Não se sabe o valor

estanho 

Um leito grande de de nogueira



Vestidos de seda, uma vasquinha de cetim preta, uma saia de veludo preta, um saiote de gorgoram

Anrique Pit



Dinheiro



160 ou 170 000 réis



Um jarro e um



Pesariam sete mil e

saleiro de prata

tantos arráteis



Dois pratos de prata



8 000 e tantos réis



Duas cadeiras de



Não se sabe o valor

espaldar grandes e duas pequenas 

Quatro tamboretes



Não se sabe o valor



Duas caixas velhas



Não se sabe o valor

de pinho e uma de carvalho.

22



Seis pinturas, cinco



Não se sabe o valor



Não se sabe o valor

a óleo e um de tempera 

Um oratório com um

crucifixo em

barro 

Um catre em ferro



Não se sabe o valor



Uma rompetta



Não se sabe o valor



Um ferraganho de



Não se sabe o valor

sargeta

Diogo Vas Oliveira



Calções velhos



Não se sabe o valor



Um gibão



Não se sabe o valor



Casas



20 000 reis



Lojas



2 000 cruzados e pouco mais e uma não se sabe o valor



Quatro

ou

cinco



Não se sabe o valor



Podereia valer 10

arcas de ter a roupa 

Um

leito

de

iacalenda do Brasil com

cortinas

000 réis

de

linho 

Um escritório que



5 000 réis



Valia dois

não sabe qual o tipo de madeira 

Um

bufete

de

nogueira 

Seis cadeiras



Não se sabe o valor



Dois tamboretes de



7 000 reis



Não se sabe o valor

moscavia 

Roupa branca de serviço

23



de



Não se sabe o valor

Trinta alqueires de



Não se sabe o valor

Três

almudes

azeite 

milho e um saco de trigo 

Dinheiro



60 ou 70 000 réis



Um caixão



Não se sabe o valor



Cento



Não se sabe o valor



Não se sabe o valor



130

e

quatro

sacos de trigo e centeio 

Três pulseiras, duas de tela e uma de Damasco azul



Uma peça de tafetá branco envolta em

1

140

000

couados

pano de linho 

Uma peça de tela



Não se sabe o valor



Dez

doze



Não se sabe o valor

de



60 000 réis

Outro olival perto



30 000 réis



60 000 réis



6 000 réis



1 000 réis



1 500 réis



5 000 reis

ou

cómodas Natália Rodrigues



Um

olival

chamão 

do

Pinheiro

da

casas

na

Seara 

Duas

freguesia de São Pedro 

Uma armação de rede



Um cobertor azul



Um

pavilhão

de

Taffeira da Índia 

Três colchas novas

24



Oito lençóis



Cada um 1 000 réis



Um

verde



2 000 réis

escritório



1 500 réis

Duas pinturas da



10 000 réis



Não se sabe o valor



6 000 réis



6 000 réis

de



3 000 réis

roxa



3 000 réis

de



2 000 réis

Um cofre grande



3 000 réis



1 500 réis



1 500 réis



1 500 réis

leito

pintado 

Um pequeno



Rainha

Santa

outro

de

e

Nossa

Senhora

com

oratório 

Um vestido verde acabado



Uma saia e um gibão



Um

saio

gorgorião

de

e

uma

saia de mel cochado 

Um

manto

cochomilho 

Uma

saia

vinda de Londres 

Três

arcas

castanho 

encourado

e

um

pequeno 

Um prato e gairo de estanho e pratos de mesa



Uma bacia de latam e dois tachos de cobre



Roupa de linho

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Anexo - II (Transcrições dos inventários de bens)

Apêndice Documental 1619, Abril, 30, Lisboa – Inventário de Bens de Anrique Pit, mercador de trigo, preso pelo Santo Ofício, acusado de luteranismo. Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Lisboa, proc. 12387.

Inventário

/fol. 3/ Aos trinta dias do mês de Abril de mil e seiscentos dezanoue annos em Lisboa nos Estaos na casa do despacho da Sancta Inquisiçam estando ahy em audiência de pella manha o Senhor licenceado Rus Francisco? Dessa manha Inquisidor mandou vir perante sy per pedir audiencia a Anrique Pitt contheudo neste processo e sendo presente para em tudo dizer verdade e ter segredo lhe foy dado Juramento dos sanctos Evangelhos em que pos sua mão sobre carguo do qual o metteo de assy a faser. – Perguntado que bens tem de raiz e moueis que peças de ouro ou prata que dividas lhe devem ou elle deve a outras pessoas e perque obriguacois, e que aucois tem e em que estado disse que ele não tem bens nenhuns de raiz y nem nesta terra nem na sua e que em sua casa quando o prenderão tinham em dinheiro cento e sessenta ou cento e setenta mil reis e hum jarro e hum salleiro de prata que pesariam desoito mil arreteis , e assy mais dous prattos /fol. 3v/ de pratta que estavam empenhados em oito mil tantos reis que lhe empenhou hum criado de hum conde não sabe como se chama mas que tudo constara de um papel que entregou ao secretario quando entrou neste carcere – E de moueis tinha duas cadeiras de espaldar grandes, e duas pequenas e quatro tamboretes, e duas caixas de pinho e huma de carualho velhas, – e tinha seis paineis cinco de oleo e um de tempera e os cinco eram de sanctos, e hum deles hera de hum Rei, hum oratório com hum Cruesfixo de barro E hum catre de pau ferro – e hum ferragonho de sargetta e outro de pano tuzado, e huma rompetta e calçois velhos e um gibam de seu uso. –

26

?

?

Acórdão os Inquisidores

/fol. 61/ Accordam os Inquisidores, Ordinario e Deputados da Inquisição etc que vistos estes autos culpas e confissoes de Henrrique Pith natural da cidade de Amburg em Alemanha, de idade de uinte seis annos, filho de Conrrado Pith e de sua molher Anna moradores na ditta Cidade, solteiro, mercador de trigo morador nesta de Lisboa, Reo prezo que presente esta porque se mostra que sendo christão baptizado e filho de pays hereges e ensinado per elles nos erros da malditta seita dos Lutheranos, em que uiueo per alguns annos tendo crença nelles, e continuando nas loretas delles fazendo seus ritos e cerimonias, e ouuindo suas predicas e uindo despois a esta ditta Cidade, e sendo nella sufficientemente instruído per certa pesoa de Letras e Religião, e por outras pias e catholicas, nas cousas de nossa Santa Fé Catholica, allumiado pello spirito santo se conuerteu a ditta santa Fé e a abraçou crendo e uiuendo nellas continuando nas Igreias e ouuindo missa e pensarão regalias de festa, rezando as nações, tomando os sacramentos e fazendo as mais obras de bom e uerdadeiro christão, e, Perseuerando nisso per espaço de onze annos que residio nesta Cidade. E sendo crioado despois da ditta instrução a [lacuna no documento] sempre tudo o que cre e ensina a Santa Madre Igreia de Roma Elle o fez pello contrario e tornando para sua Pátria, esquecido de sua obrigação e da constância com que deuia conservar a pureza nossa Santa Fé Catholica que confessou e sendo ensinado pelo ditto seu Pais, se apartou della, e se passou [lacuna no documento] Seita dos Lutheranos, e per espaço de seis meses continuou em suas Igreias e ouuindo suas missas /f. 61v/ e predicas e se confessou e comungou ao modo dos dittos Hereges e contou com ellesas orações em Cinoga em como costumam fazer, e comia carne nos dias prohibidos, e não cria que auia purgatório nem na obediencia diuida ao Sumo Pontífice, nem se encomendava a Virgem nossa senhora nem dos Santos. E tornando a esta Cidade nella comeo carne algumas uezes nos dittos dias, e não reiumava nos deiei um e rezaua as orações de que usam os Lutheranos per obseruancia da ditta seita. E achandosse em companhia de pesoas Catholicas disse que não havia Pappa despoisque huma molher o fora E tudo o que os Pappas faziam, era nullo, e que

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as bullas da Santa cruzada eram causas clérigo E que os Pappas não tinham poder de conceder indulgencias, e zombava de alguns milagres que a Igreia tem e uenera partaes e não cria nelles. O que tudo uisto com o mais que dos autos resulta declaram que o Reo se apartou de nossa Santa Feé, e foi herege e encorreo em sentença de Escomunhão maior, e confiscação de todos seus bens applicados para o fisco E Camara Real e nos mais penas em direito contra os semelhantes estabellecidas. E porem uisto como usando de milhor conselho confessou logo suas culpas pedindo perdão dellas e misericórdia com sinaes e mostras de arrependimento, e o mais que dos autos consta e por outras considerações que no caso se tiueram, recebem o Reo Henrrique Pith a reconciliação e união da Santa Madre Igreia como podem, e lhe mandam /fol.62/ que ua á Igreia de S. Domingos, e nella ouça sua sentença e faça abiuração em forma e terá seu habito penitencial que lhe será tirado, despois de acabado o auto que com elle se fizer e comprira as mais penitencias spirituaes que lhe forem impostas, e será instruído nas cousas de nossa Santa Fé Catholica. e absolto da ditta escomunham em que encorreo.

Ruj Fernandez de Saldanha

Pero da Silva

Pero da Silva

Manuel de Lucena

Antonio Correa

Joze da costa

28

Auto de Entrega

/fol. 6/ Aos seis dias do mês de Junho de mil e seiscentos e sinquoenta e outo annos em Coimbra nas portas dos Cárceres da Santa Inquisição e sendo ahi o familiar Manoel Machado desta cidade entregou prezo a Diogo Vaz de Oliveira christão-nouo mercador natural de Villa Flor e moradorna cidade do Porto a Manoel Quaresma Alcaide dos dittos cárceres e sendo buscado na forma do regimento se lhe acharam quatro mil cento e dés reis em dinheiro que se entregaram ao Thezoreiro Bento de Gouuea para se carregarem no titulo do prezo e porque o ditto prezo e se obrigou a dar conta de lhe assinou aqui comigo Nottário Pedro Jaraqua de Vasconçellos que o escreui.

Pedro Jaraqua de Vasconcelos

Manoel Quaresma

29

Apêndice Documental 1658, Julho, 16, Coimbra – Inventário de Bens de Diogo Vas de Oliveira, mercador, preso pelo Santo Ofício, acusado de judaísmo. Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Coimbra, proc. 754.

Inventário

/fol. 100/ Aos desaceis dias do mês de Julho de mil e seicentos e sincoenta e outo annos em Coimbra na casa do Oratório uelho da Santa Inquisição estando ahi o senhor Inquisidor Pero Borges Tauares em audiência da tarde mandou uir perante si a Diogo Vas de Oliueira, Reo preso contheudo nestes autos e sendo prezente lhe foi dado o juramento dos Santos Euangelhos em que pos a mão sob cargo do qual lhe foi mandado dizer uerdade e ter segredo o que elle prometeu cumprir. Perguntado que bens de rais tem de que estaua de posse ao tempo de sua prizao de ualese são de morgado capella prazo em uidas ou fatcorim ou tem outro algum em cargo que bens moueis tinha direitos ou aucões contra algumas pessoas; ou ellas contra elle que diuidas lhe deuem ou esta deuendo, que conhicimentos letras ou outros papeis tinha em seu poder ou alheo. Dice que de bens de rais não tinha mais que humas casas em que uiuia na cidade do Porto a Ponte de São Domingos que são de dous sobrados com seu quintal ainda que piquena e parten de huma banda com Joana da Silua tendeira uiuua não sabe de quem /Fol. 100v/ E de outra com casas de Manoel de Rezende da mesma cidade e são foreiros ao Padre Luís Aluares da mesma cidade em uinte mil reis e hu direito Senhorio dellas tem mais outro foro de sinco mil reis a huma viuua cujo nome lhe não lembra agora e ao Conuento de São Domingos da mesma cidade Nouecentos e quarenta reis e poderão ualer hábitos os foros duzentos mil reis.

Moueis

E que tinha huma lógia de seuegaria nas mesmas casas em uiuia que consta de retroles, retalhos de uelludo, rabetes, (?), botons, tafetás, meãs de seda, bonbazinas, e 30

baetas, e não sabe em particular a quantidade de cada huma das dittas cousas, e tudo constara do Liuro e borraderes que estauão no escritorio e lhe parece que tudo podia ualer dous mil cruzados pouco mais ou menos. Tinha mais em outra lógia por baixo das cangostas que allugou a Isabel da Silua mil e tantos maços de uelorios não se lembra ao certo quantos são e trezentos feixes de faias pera bainhas de espadas e quatro sacos de lam que cada huma dellas tera quatro arrobas e mea, e duas quaixas de asucar branco que são de Manoel Rodrigues Saraiua de Vizeu ao Vellorios e foi a /fol. 101/ São de João de Bernardo Armeiro de Astradam em Olanda, e não pertincia mais a elle declarante que a Comissão. E que na mesma Lógia estão mais algumas caixas de asucar moscauado não sabe quantos as quais são de Vasco Fernandes Campos da mesma cidade do Porto e mais humas sacas de lam que se acharão na ditta Lógia não sabe quantos e tem a marca do mesmo. E que tinha hum escritorio não sabe de que pau e ualeria sinco mil reis e hum bufete de nogueira que ualeria dous tem mais seis cadeiras e dous tamboretes de moscouia que ualerao sete mil reis. E que tinha mais quatro ou sinco arcas de ter roupa ia uzadas não sabe o que ualerão. E que tinha mais hum leito de iacalenda do Brazil com suas quartinas de Linho que podera ualer des mil reis. E que tinha Roupa branca de seruiço (?) guardo mas não poderá dar rezão disso porque estaua tudo em poder de sua mulher e ella poderá dizer o que era, e tudo se acharia em sua casa. E que em huma talha tinha tres almudes de azeite. E em huma tinha trinta alqueires de milho e hum saco de trigo. /fol. 101v/ E que tinha no ditto escritorio sessenta ou setenta mil reis em dinheiro não sabe ao certo a quantia. E que tambem tinha mais dinheiro em a gaueta de hum bufete e não sabe quanto poderá ser. E que outro si tinha mais dinheiro na gaueta do caixão que estaua na Lógia e não sabe o que he mas entende que síria pouca quantia. E que tinha embarcado em huma caravella de que he mestre Domingos Manso de cal quais cento e quatro sacos de trigo e centeyo com marqua de hum S.E.L o qual pao era de Francisco de São Laio Senhor de Villa Flor e nada pertincia a elle declarante. 31

E que outro si tinha em sua casa tres poseiras, duas de tella e huma de Damasco azul as quais são de João Rodrigues Gomes de Lisboa mercador os quais remeteu a elle declarante pera que lhes uendece e com ellas des ou doze comadas de tiltilho encarnada. E que outro si tinha em huma das dittas arcas huma pessa de tafeta branco enuolta en hum pano de Linho a qual he de João Lopes Henriques mercador de Villa Flor (?) a elle declarante pera que lha /fol. 102/ uendeu e lhe parece que a ditta pessa terá cento e trinta ou quarenta couados. E que outro si tem em outra das dittas arcas huma pessa de teua que he de Simão Duarte mercador morador em Lisboa na rua do Borão.

Pero Borges Aluares

Diogo Vas de Oliueira

32

Acordão os Inquisidores

/fol. 224/ Acórdão so Inquisidores Ordinário e Deputados da Santa Inquisição que uistos estes autos culpas e confissões de Diogo Vas de Oliueira (?) mercador natural de Villa Flor e morador na cidade do Porto Reo preso nestes contheudo E os urgentes indícios que delles E da proua da Justiça Autora contra elle resultam de não auer seita inteira E uerdadeira confissão de suas culpas, E como tendo nases com caridade amoestado quizesse confessar E declarar toda a uerdade, E quem foi o uerdadeiro Autor de seus erros. As mais pessoas que sabe andarem agardadas da fee E terem crença na Ley de Moyses e todas as seremonias que fés per guarda della o Reo uzando de mão (?) te agora o não quis fazer. Mandão que antes de outro despacho o Reo Diogo Vas de Oliueira Seia posto a depoemento conforme ao Asento que neste seu processo se tem tomado, onde será perguntado pellas dittas Demesuições para que manifeste a uerdade para saluação de sua alma E das mãos pessoas que sabe andarem apartadas da fee o que assim mandão periuizo de juinado E por elle confessado.

Alexandre da Silua

Manoel di Sousa

33

Apêndice Documental 1624, Março, 15, Coimbra – Inventário de Bens de Natália Rodrigues, presa pelo Santo Oficio, acusada de judaísmo. Lisboa, A.N.T.T, Inquisição de Coimbra, proc. 4925.

Inventário /fol. 1/ Aos quinze dias do mês de Março de mil e seiscentos e uinte quatro annos em Coimbra na casa do oratório da Santa Inquisição estando ahi o senhor Deputado Pêro de Beça de Faria per comissão dos senhores Inquisidores e de licença do (?), senhor Inquisidor geral em Audiência da tarde mandou uir perante si Natália Rodrigues desta cidade presa nestes Cárceres e sendo presente pera em tudo dizer uerdade lhe foi dado iuramento dos Santos Euangelhos em que pos a mão e sob cargo delle prometeu dizella. – e lhe foi mandado que sob cargo do dito iuramento declarasse os bens de rais e mouens que possuía ao tempo de sua prizão que auções tinha que pertencessem, que diuidas lhe deuiam ou ella declarante deuia. E logo declarou o seguinte.

Rais Hum Olliual de chamão a cheira que uallera sessenta mil reis. Outro Olliual que esta ao pinheiro de Seara que uallera trinta mil reis. Duas casas que estão na freguesia de São Pedro que uallem ambas sessenta mil reis. E que não tem mais rais.

/fol. 1v/ Mouens

Huma armassão de rede que ualeria seis mil reis. Hum cobertor azul já usado que uallera mil reis Hum pauilhao de Taffeira da Índia que uallia mil e quinhentos reis Tres colchas nouas que ualleriao sinco mil reis

34

Outo lanções que ualeria cada hum mil reis Hum leito uerde pintado que uallia dous mil reis Hum escritorio pequeno que uallia mil e quinhentos reis Dous paineis da Rainha Santa hum e outro de nossa Senhora da Censam e com hum oratorio mais que ualeria dez cruzados Hum uestido perpetuano uerde todo acabado, (?), saia e gibam que uale seis mil reis. Hum sahio de gorgorião; e huma sahia de mel cochado que uale seis mil reis. Hum manteo de cochonilho que uale tres mil reis. Huma sahia rouxa de Londres que uale tres mil reis.

Meudezas

Tres arquas de castanho que ualerão dous mil reis /fol. 2/ Hum cofre grande encourado e outro pequeno que ualem dous mil reis. Hum prato e gairo de estanho e pratos de meza que podia ualler mil e quinhentos reis. Huma bacia de Lata,m e dous tachos de cobre que ualem mil e quinhentos reis. A roupa de linho que tinha ualeria mil e quinhentos Reis.

(?)

António Montesão

35

Acordão os Inquisidores

/fol./ Acórdão os Inquisidores Ordinario e Deputados da Santa Inquisição que uistos estes autos a saber libello e poua da justiça Autor, contrariedade e defeza de Natália Rodrigues que tem parte de cristam noua casada com João Fernandes Guterres, cristão uelho, natural e moradora nesta Cidade Ré presa que presente está, per que se mostra que sendo cristã bautisada obrigada a ter, e crer o que tem, cre, e ensina a Santa Madre Igreja de Roma, ella o fez pello contrario, e depois do ultimo perdão geral se apartou de nossa Santa fé catholica, e se passou a Ley de Moisés crendo e esperado saluarse nella, e não na fé de Christo nosso Senhor em o quoal não cria nem tinha por uerdadeiro desse Messias promettido uestindo na Ley e só cria em Deos dos ceos como judia, guardando os sabbados de trabalho uestindo nelles comisas Lauadas, a limpando os candieiros com azeite limpo e torcidas nouas, e sejurando as segundas e quintas feiras não comendo nem /fol. v/ bebendo se não a noite cousas que não eram de carne e não comia carne de porco, lebre, coelho nem peixe sem escama, o que fazia quoando podia sem ser sentida, e comunicando estes hereticos erros com pessoas de sua nação apartadas da fé. Pellas quoais culpas sendo a Ré presa pello santo officio e amoestada com muita charidade as quisesse confessar pera soluação de sua alma, e se uzar com ella de misericórdia, disse que nunqua comettera erro algum contra a nossa santa fé, e que sempre fora boa e catholica christa Pello que o Promotor do santo officio ueo com libello criminal accusatorio, contra, ella, o qual lhe foi recebido e o contestou por negação, e ueo com sua defesa que lhe foi recebido e sendo amoestado com charidade, confessasse suas culpas pera saluação de sua alma, e auetida do perigoso estado em que estaua, disse que não tinha que confessar perseuesado sempre em sua contumácia como ate ai tinha feito. Pello que foi dado lugar à poua e sendo ratificados os testemunhos da justiça ns forma de direitov /fol./ e stylo do santo officio lhe foi feito publicação delles, a que ueo com suas contraditas, dos quoais algumas lhe foraom recebidas e seu feito se processou até final conclusão, sendo sempre neste tempo a Ré amoestada com muita charidade abrfisse os olhos da alma confessando suas culpas e reconhecendo seus erros descubrindo as pessoas que sabia andarem apartadas da fé, pera solução de sua alma, e sendo ultimamente chamada a mesa do santo officio lhe foi feito a saber que seu processo fora uisto por pessoas doutas e tementes a deor, e pella proua que contra ella

36

hauia constaua estar conuencida no crime de heresia e apostasia, e que por tal estaua [lacuna no documento], e sendo outra ues amoestada dessencarregasse sua consciencia pera que com ella se pudesse usar da misericordia que a Santa Nadre Igreja concede aos que uerdadeiramente se conuertem a ella. Pedio mesa para confessar suas culpas e confessou que depois do ultimo perdão geral ensinado por pessoas de sua nação se apritara de nossas santa fé catholica e se pesava a Lei de Moises crendo e esperando saluarsse nella, e não na fé de Christo nosso senhor, e no quoal não cria nem tinha por uerdadeiro Deos e Messias promettido na lei, e só cria em Deos dos ceos como iudia, e a elle /fol. v/ se encomendaua com a oração do Padre, nosso (?) obseruauaa da dita lei guardaua os sabbados de trabalho uestindo nelles camisas lauadas, e que não confessaua estas cousas a seus confessores por as não ter por peccado nem crer na confissão nem nos mais sacramentos da Igreja os quoais tomaua e fasi os mais achos de cristão so por comprimeto do mundo e por a não (?) por iudca, e que comunicava etes heresias erros com pessoas de sua nação apartadas da fé e perseueraua nelles ti fazer sua confissão na mesa dos santo officio.

O que tudo uisto com o mais que dos autos consta

declaravão a Ré Natália Rodrigues por herege e Apostada de nossas santa Fé catholica e que como tal encorreo em sentença de excomunhão maior e confiscação de todos seus bens applicados ao fisco e camara real e nas mais penas em direito contra os semelhantes estabelecidas. E porem uisto como usando ella de melhor conselho confessou suas culpas na mesa dos santo officio pedindo dellas perdão e misericordia com mostras sinais de aurependimento, se assi he que de uerdadeiro coração, Recebem a Ré Natlália /fol./ Rodrigues ao grémio e união das Santa Madre Igreja como pede, e mandão que abuse publicamente, seiis heresias erros em forma e em pera e penintencia delles lhe assumão carcere e habito penintencial perpetuo sem remissão, sem quoal sem remissão, na quoal, será introido saluação de sua alma, que mandão que da sentença de excomunhão maior em que (?) será absolluta (lacuna no documento] .

Pêro da Silva

Sebastão César

Pêro de beca de Faria

Joam de Borba (?)

Francisco Caudozo (?)

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Auto de Entrega

/fol.2/ Em os 28 de Março de 1620 veyo prezo da Inquisição de Coimbra aos cárceres desta de Lisboa António Mendes contheudo nestes autos, E se entregou ahy Eytor Feixa alcyde delles, E sendo buscado na forma do regimento lhe não foi achado cousa alguma contra elle, e de como o alcayde se ouue por entregue do ditto Igrejo, fiz este termo, que ambos assinamos. Lisboa, dia, mês, E anno, ve suprea.

Eitor Leixos

Jacom Rodriguez

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Apêndice Documental 1610, Julho, 16, Coimbra – Inventário de Bens de António Mendes, mercador, preso pelo Santo Oficio, acusado de judaísmo. Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Lisboa, proc. 13016.

Inventário

/fol./Aos deseseis dias do mês de Julho de mil e seiscentos e dês [sic] e desouto annos em Coimbra na caza do Oratoreo da Santa Inquisisão estando ahi o senhor Simão Barreto de Meneses Inquisidor, em audiencia de poda(?) manham mandou uir perante si António Mendes Cristão nouo morador na cidade de Lamego, e sendo prezente per ai en tudo en tudo dizer uerdade lhe foi dado juramento dos santos Euangelhos em que pos a mão, a sob cargo de ai prometeo dizer uerdade. – Perguntado que bens tinha assi moueis como de rais que direitos e auçoes e se deuia alguma coussa ou lhe deuiam. – Disse que não tinha bens alguns de rais: E que de moueis tinha en caza o seguinte. Huma salua, e hum copo de prata meã dúzia de colheres também de prata e não sabe o que as dittas pessas podiam ualer tres anéis douro, que ualeriam tres mil reis e que não tinha mais peça alguma de ouro nem de prata. – Huma alcatifa da Índia de seda, que lhe custou vinte mil reis, e aguosa era ia de meio coro, e não sabe o que podia ualer. – Hum tapete e não sabe o que podia ualer. Sincoenta arrabeis de asa pão que ualerisam sincoenta mil reis. /fol. v/Huma mulla que ualleria dez ou doze mil reis. – Setenta almudes de uinho en cuba do que ualeriam quinze ou deseseis mil reis. – Trigo não sabe quantos algueires com mesmo algum azeite, não se lembra quanto. Hum escritório de nogeira que ualeria quatro mil reis. Seis cadeiras que ualleriam tres mil reis Hum cofre encourado, e algumas arcas de pao não lhe lembra quantas nem sabe o que podiam ualer. –

39

E que tinha de roupa de linho assi de mero como de cama, e estanho prato jarro, com demais necessário pêra seuero do que tudo não sabe, o numero nem o preço por serem cousas que estauam per conta de sua molher. Hum Leito grande pao de nogeira e não sabe o que podia ualer. – Vestidos de seda de sua molher de que ella daria rezao, porque elle de darante senão lembra mais que de huma vasquinha de setim preta, e huma saiia de ueludo preto, e hum saiote gorgoram: E que não sabe que tenha direito ou aução pera dinheiro ou fazenda alguma.

Simão Barreto de Meneses

António Mendes

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Acordão os Inquisidores

/fol./Accordão os Inquisidores, Ordinário, e Deputados da Santa Inquisição que vistos estes autos, e culpas de António Mendes Christão nouo mercador natural de Trancoso, e morador em Lamego Reo preso, que presente está, e os urgentes indicios, que resultão da proua da Justiça de elle Reo depois do ultimo perdão geral andar appartado da nossa Santa fee Catholica, e ter crença na Ley de Moyses, e por obseruancia della ás sestas feiras a noite a limpaua os candeeiros pondolhe torcidas nouas, e azeite limpo, e jejuaua em segundas, e quintas feiras não comendo senão á noite cousas, que não erao de carne, e não comia Lamprea, nem cassão, e rezaua os salmos de Dauid sem gloria Patri /fol. v/ dizendo que não era necessário rezar per contas, e que Christo nosso Senhor fora criado de Elias, e que todos os que descubriao as pessoas viuiao na Ley de Moyses perdião suas almas: o que tudo visto, e a proua da Justiça não ser pera mor condennação, e outras considerações, que no caso se teverão, mandão que o Reo António Mendes vaá ao auto da feé com huma vela accesa na mão na forma costumada, e nelle ouça sua sentença, e faça abuiração de vehementi suspeito na feé, e por tal o declarão, e terá carcere a arbítrio, em o qual será instruído nas cousas da feé necessárias pera saluação de sua alma, e comprirá as mais penas, e penitencias spirituaes, que lhe dossem impostas.

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I Bibliografia

Fontes manuscritas Inventário de Bens de Diogo Vas de Oliveira, 1658, Julho, 16, Coimbra – Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Coimbra, proc. 754 Inventário de Bens de Natália Rodrigues, 1624, Março, 15, Coimbra – Lisboa, A.N.T.T, Inquisição de Coimbra, proc. 4925.

Inventário de Bens de António Mendes, 1610, Julho, 16, Coimbra – Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Lisboa, proc. 13016.

Inventário de Bens de Anrique Pit, 1619, Abril, 30, Lisboa – Lisboa, A.N.T.T., Inquisição de Lisboa, proc. 12387.

II Bibliografia de Referência

BRAGA, Isabel M. R. Mendes Drumond, BRAGA, Paulo Drumond, “As jóias de D. Pedro e D. Maria, Príncipes do Brasil, em 1765: Cor, Brilho e Exotismo na Corte”, Rumos e Escrita da História. Estudos em Homenagem a A. A. Marques de Almeida, coordenação de Maria de Fátima Reis, Lisboa, Colibri, 2007, pp. 287-309.

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BETHENCOURT, Francisco, “A Inquisição”, História Religiosa de Portugal, vol, 2, (Humanismos e Reformas), direcção de Carlos Moreira de Azevedo, coordenação de João Francisco Marques e António Camões Gouveia, Lisboa, 2000.

OLIVEIRA, João Carlos, “A Casa”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, pp. 633-639.

PEREIRA, Maria João Lourenço, “ O Vestuário”, Portugal do Renascimento à Crise Dinástica, coordenação de João José Alves Dias, (=Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, vol. 5), Lisboa, Presença, 1998, pp. 627-633.

Bibliografia Geral

Obras especificas:

CANTI, Tilde, O Móvel no Brasil, Origens, Evolução e Características, Lisboa, Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, Editora Agir, 1999.

FERRÃO, Bernardo, Mobiliário Português: Dos Primórdios ao Maneirismo, volume 4, anexos, Porto, Lello e Irmão, 1990. Ourivesaria do Norte de Portugal, “A Prata da Casa” de Maria Emília Amaral Teixiera, Porto, Associação Regional de Protecção do Património Cultural e Natural, 1984, pp. 225-235.

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SARTI, Rafaella, Casa e Família. Habitar, Comer e Vestir na Europa Moderna, tradução de Isabel Teresa Santos, Lisboa, Estampa, 2001.

Obras Gerais: Documentos da História – 2, O Ultimo Regimento da Inquisição Portuguesa, Lisboa, Edições Excelsior, 1971.

PEREIRA, Isaías Rosa, A Inqusição em Portugal, séculos XVI-XVII – Período Filipino, Lisboa, Veja, 1993.

SARAIVA, António José, Inquisição e Cristãos-Novos, Porto, Editorial Inova Limitada, 1969.

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