investir em arte como ato cívico

June 23, 2017 | Autor: Maria Cardoso | Categoria: Arts and Culture, Creative Economy, Cultural Development
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A partir de uma notícia da jornalista Lucinda Canelas, in "O Público" de 27
de Outubro deste ano, acerca da "campanha pública inédita de angariação de
fundos para a aquisição da tela "A Adoração dos Magos" do pintor português
Domingos António Sequeira (1768-1837)" sugiro o seguinte debate de ideias:

...pretende-se adquirir uma pintura de grande escala, reconhecida qualidade
e da autoria de pintor português de referência na arte portuguesa, sendo
que:

- a obra de arte é pertença de um privado, e vai ser adquirida pelo
valor de seiscentos mil euros;
- a campanha é lançada pelo Museu Nacional de Arte Antiga como convite à
participação cívica de todos os portugueses;
- a aquisição em crowdfunding resulta da iniciativa do Museu Nacional de
Arte Antiga, do PÚBLICO, da Direcção-Geral do Património Cultural e do
próprio Governo a par com outros parceiros que credibilizam a ação e o
objetivo da mesma.

Outras evidências: a responsabilização do Estado nesta aquisição não se
pode desvalorizar e estamos perante uma ação que toca vários pontos
delicados das políticas públicas da cultura e da sua intervenção
territorial como predicado da sua governança em prol da defesa e
valorização do património, da qualidade de vida cultural e social do país.

Destaco dos vários depoimentos que a imprensa registou a opinião do Curador
João Fernandes, atualmente a dirigir como adjunto o Museu Reina Sofia em
Madrid, acerca da aquisição de obras de arte para os acervos dos museus:

"É um problema europeu e prende-se com a falta de sensibilidade dos
políticos para a importância de fazer crescer hoje as coleções públicas, o
que as fragiliza, sobretudo quando vemos nascerem museus de iniciativa
privada que são produto de uma grande especulação nos mercados. Os
políticos têm de perceber que a Europa não pode ser só um continente de
ruínas. Bonitas, mas ruínas."

Embora este excerto esteja integrado num contexto maior da notícia ele é
revelador dos conflitos entre o que são hoje na Europa as prioridades de
quem nos governa em termos patrimoniais e culturais e ainda o que estas
políticas de desvalorização da produção artística geram no mundo dos
mercados e para os quais tenho vindo a alertar nos artigos anterior acerca
da venda de obras de arte em leilões internacionais.

Os leilões serão tema de debate em breve porque, reúnem aspetos de
confronto, mas também servem a causa cultural valorizando e mexendo com a
economia da arte....mas vamos ainda refletir: há regulamentação legal e
oficial para suporte das políticas de aquisição de obras de arte dos museus
europeus? Sim existe; existem boas práticas e assertivas iniciativas de
aquisição de obras de arte pelos museus? Sim existem; são as suficientes
e/ou necessárias? Não serão certamente, e disso se dá nota na quantidade de
obras de referência que escapam neste contexto global dos mercados de arte
ao não poder aquisitivo e à ausência de políticas de aquisição dos museus
europeus, e, com maior evidência aos museus nacionais... como tal a
sociedade civil é chamada a participar num dever, maioritariamente, de
Estado. Cada caso é um caso, e resta agora termos a consciência se nestas
iniciativas colocadas à sociedade civil os pressupostos das campanhas são
devidamente analisados e refletidos por quem tem competências técnicas e de
conhecimento sobre a matéria.

Esta campanha para aquisição da Pintura de António Domingos Sequeira que
integra a quadrilogia de obras deste autor de um mesmo ciclo produtivo e de
qualidade equivalente é com certeza uma ato de valor, de mérito para um
país que assim se pode "mobilizar no sentido de adquirir um bem comum: a
arte e o património, que ficam guardados para as novas gerações", dix o
diretor (do MNAA).

Bons augúrios para a arte sempre em vaga...

Maria da Luz Nolasco
Aveiro 30 de outubro de 2015
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