itamar assumpção - beleleu, leleu, eu pronto.pdf

June 1, 2017 | Autor: Yaschi Almeida | Categoria: Literatura brasileira, Canção Popular Brasileira, Mpb, História Da Mpb
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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

PAULA POPE RAMOS YASCHIMIN ROSA DA SILVA DE ALMEIDA

RESENHA DO DISCO “BELELÉU, LELÉU, EU” (1980) DE ITAMAR ASSUMPÇÃO

Seropédica 2016

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 3 2. SOBRE ITAMAR ASSUMPÇÃO ................................................................. 4 3. SOBRE A VANGUARDA PAULISTANA ..................................................... 6 4. RESENHA DO DISCO “BELELÉU, LELÉU, EU” (1980) ............................. 8 5. CONCLUSÃO ........................................................................................... 21 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 22

1. INTRODUÇÃO O presente trabalho é sobre o cantor e compositor Itamar Assumpção, mais concretamente, uma resenha de seu primeiro disco “Beleléu, Leléu, Eu” (1980). Pretende-se, além da resenha do disco, fazer um breve comentário sobre a vida do artista, assim como a vertente cultural Vanguarda Paulista, da qual fez parte. Itamar Assumpção (1949-2003) foi compositor, cantor, instrumentista, arranjador e produtor. Seu LP de estreia foi “Beleléu, Leléu, eu” (1980) produzido em parceria com a banda Isca de Polícia. Trata-se de uma mistura de samba, reggae, funk e rock, uma característica latente de Assumpção. Suas letras carregam uma crítica forte, além de ser pouco comercial. Isto fez com que lhe atribuíssem o título de “artista maldito”. No início da década de 1990, passou a ser acompanhado pelo grupo Orquídeas do Brasil, com o qual lançou dois CDs: “Bicho de sete cabeças” (1993) e “Bicho de sete cabeças vol. 2” (1994). Recebeu prêmios como “Prêmio do Melhor CD do Ano”, entregue pela APCA pelo disco “Ataulfo Alves por Itamar Assumpção – pra sempre agora” (1996). Artistas como Ná Ozzetti, Branca de Neve, Cássia Eller, Monica Salmaso e Zélia Duncan interpretaram muitas de suas músicas. Assumpção fez parte da chamada vanguarda paulistana, formada no Teatro Lira Paulistana, junto de Arrigo Barnabé e da banda Sabor de Veneno. Trata-se de um movimento cultural ocorrido na cidade de São Paulo entre 1979 e 1985. Tinha um aspecto vanguardista tanto quanto um aspecto experimentalista.

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2. SOBRE ITAMAR ASSUMPÇÃO Itamar Assumpção nasceu no dia 13 de setembro de 1949 em Tietê, São Paulo. Mudou-se com a sua família, alguns anos depois, para Paraná, onde aprendeu a tocar violão e passou a dedicar-se a compor. Experimentou uma mistura rica de sons e acabou criando uma linguagem urbana. Viveu à margem da mídia, recusando-se a editar suas músicas e a entrar no que chamavam de sistema mercadológico. “Na Pauliceia Desvairada, ao lado de outros “bruxos” da música, Itamar Assumpção adicionou ao seu “caldeirão de influências” o rock, o samba, o reggae, o funk, o jazz, o pop e o rap; inseriu harmonias e arranjos não convencionais, sonoridades e temas urbanos, performances teatralizadas e transformou todos esses ingredientes em uma proposta inovadora, experimental e demasiadamente impactante, que estava inserida, no início dos anos de 1980, na chamada Vanguarda Paulista.”. (SILVA, 2012, p. 16).

Em 1978, marca sua estreia nos palcos paulistanos, cidade para onde voltou no ano de 1973, ao lado de Nelson Jacobina e Jorge Mautner. No ano seguinte, apresenta-se com Arrigo Barnabé. O ano de lançamento de seu primeiro disco rendeu-lhe inúmeros frutos para sua carreira: fazia shows, apresentava-se em diversos festivais e programas de televisão, além de receber da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) o Prêmio Revelação Masculina. A partir daí, segue lançando discos e apresentando-se por várias cidades brasileiras pelo Projeto Pixinguinha. Desde os primeiros trabalhos, suas letras apresentavam um cunho urbano, marginal e caótico. De acordo com Silva (2012): “Diziam também que as canções do começo de sua carreira só poderiam ser tocadas e interpretadas por ele próprio, e que nenhuma apresentação jamais se repetiu. ” (p.18). Itamar Assumpção foi um artista único, com um cunho experimental e inovador, visando trazer para a música popular, algo que ainda não tinham visto. Dialogava com a tradição, mas não se prendia a ela. Segundo Falbo (sem data), os jogos cancionais de Itamar passam pelos desencontros da identidade biográfica (Itamar? Nego dito?), assim como expõem a luta pelas produções independentes da década de 1980. Suas letras com ênfase na marginalidade, além de sua personalidade forte e o seu complexo mosaico de estilos podem ter lhe garantido o título de maldito e sua pouca fama nos veículos de massa. Apesar de ser relativamente pouco conhecido pelo grande público, suas músicas foram interpretadas por outros artistas quem notoriamente reconhecidos, como Ney Matogrosso e Zélia Duncan. 4

Segundo Silva (2012) foi através de sua apresentação de músicas repletas de inovações técnicas e temáticas que Itamar Assumpção assumiu uma postura ao mesmo tempo singular e plural dentro da Vanguarda Paulista: “Singular porque foi ‘pioneiro’, único e autoral ao extremo, tanto do ponto de vista da criação como da execução, quebrando uma série de códigos e paradigmas dentro da linguagem musical; e plural porque fez dialogar, por meio da utilização da performance, vários discursos e linguagens artísticas como a música, a poesia e o teatro (...)”. (SILVA, 2012, p. 17).

Silva (2012) compara, ainda, suas músicas à MPB, atribuindo a esta, sem recorrer à um juízo de valor cultural, uma característica de “fácil digestão”, com significados prontos e feita para o consumo. Ao contrário das composições de Itamar, que, por vezes, desconsertavam os ouvidos “menos atentos”. Sua música conduzia seus espectadores a uma situação de confronto numa zona desconhecida. Seus discos constituem obras de referências para a Vanguarda Paulistana, movimento cultural dos anos 1980 e 1970, na qual destacam-se produções independentes e experimentais. Sua discografia corresponde às seguintes obras, parcerias com a banda Iscas de Polícia e o grupo Orquídeas do Brasil: “Beleléu, Leléu, eu” (1980), “Às próprias custas S/A” (1983), “Sampa Midnight – isso não vai ficar assim” (1986), “Intercontinental! Quem diria! Era só o que faltava!!!” (1988), “Bicho de sete cabeças” (1993), “Bicho de sete cabeças vol. 2” (1994), “Bicho de sete cabeças vol. 3” (??), “Ataulfo Alves por Itamar Assumpção – pra sempre agora” (1996), “Pretobrás” (1998), “Isso vai dar repercussão” (1998). Seu último show aconteceu no dia 25 de fevereiro de 2003, acompanhado pela banda Orquídeas do Brasil, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo. Cidade onde faleceu em 12 de junho do mesmo ano, aos 53 anos de idade. Há em São Paulo o Espaço Itamar Assumpção que abriga os acervos sonoros e impressos da música do artista.

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3. SOBRE A VANGUARDA PAULISTANA A vanguarda paulistana foi um dos movimentos culturais mais importantes e intrigantes surgido em São Paulo durante as décadas de 1970 e 1980. No entanto, ele é pouco conhecido, se comparado à Bossa Nova, Tropicalismo e Jovem Guarda. Trata-se de um movimento independente numa época em que as gravadoras ditavam regras no mercado fonográfico brasileiro. Segundo Silva (2012), essa vertente cultural surgiu quando a ditatura militar começava a dar sinais de esgotamento e havia uma geração de criadores, notavelmente pós-tropicalista, que ansiavam por inovações estéticas tão radicais quanto às do Tropicalismo (1967-1968). Esse cenário revelou artistas como: Arrigo Barnabé, a Banda Sabor de Veneno, o Grupo Rumo, Língua de Trapo, Premeditando o Breque, Suzana Salles, Neuza Pinheiro e Itamar Assumpção e sua banda Isca de Polícia. Poucos se lembram desses artistas que se apresentavam, principalmente, no teatro Lira Paulistana. Apesar do nome dessa vertente, seus participantes não se viam como tal. O termo lhes foi designado pelos críticos e mídia da época. De acordo com Bastos (2012), a Vanguarda Paulista não foi de fato um movimento, uma vez que não havia um manifesto ou um traço incontestavelmente comum. Tratava-se de artistas que se apresentavam num mesmo lugar para um público receptivo a novidades. Silva (2012), afirma que havia abordagens e temáticas diferentes, por isso essa vertente cultural não pode ser chamada de movimento. Os artistas que a compunham tinham o desejo comum de romper com as propostas estéticas existentes ou de, ao menos, apresentar novas sonoridades que não eram encontradas na mídia convencional. Quanto à relação da Vanguarda Paulista com o Tropicalismo, Luiz Tatit, (compositor e professor, que pertencia ao Grupo Rumo), no prefácio do livro Tropicália, Alegoria, Alegria, citado em Bastos (2012) afirma que: “O Tropicalismo deixou estilhaços em diversos lugares da cultura brasileira e, à medida que o tempo passa descobrem-se fragmentos que ainda fervilham e geram novos focos de criação de alguma forma tributários daquele final dos anos 60.” (TATIT in FAVARETTO: 2000, p. 11).

Em Bastos (2012), há uma passagem em que Gilberto Gil fala, em depoimento para o song book Pretobrás, da possível relação entre o Tropicalismo e a Vanguarda Paulista e de Itamar Assumpção: “Em Itamar havia uma certa... uma máscara, digamos assim, um kabuki, o anjo torto. Uma oscilação entre o querer ser popular, de trabalhar com a

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canção ligeira que faz sucesso na rádio e é querido da dona de casa, e o não querer. E ela acabava escondendo outros aspectos, como a vontade de ser ouvido. O Tropicalismo expôs claramente isso, constituiu espaço onde essas dimensões dialogavam, onde havia todas essas polarizações, fácil-difícil, comercial-hermético. O que acho que eles (referindo-se a Arrigo e Itamar) conseguiram foi partir de certos elementos embrionários de experimentalismo da Tropicália e seguir em diante. Formaram uma mater, uma matriz ampla de trabalho. ” (GIL apud ASSUMPÇÃO: 2006, vol. 2, p. 23).

Bastos (2012) aponta que apesar das diferenças estéticas entre os membros da Vanguarda Paulista, o que lhes tirava o caráter de unidade, havia a preocupação com o novo, em alcançar a inovação de alguma maneira. Os vanguardistas se preocupavam em utilizar o texto na música de maneira diferenciada, dando importância às letras e à performance. É justamente a preocupação da estética de ruptura que aproxima a Vanguarda Paulista do Tropicalismo. O marco inicial da Vanguarda Paulista, que tinha abrigo constante no teatro Lira Paulistana, foi o lançamento de “Clara Crocodilo” (1980) de Arrigo Barnabé. Seu som era completamente alternativo e causou estranhamento aos ouvidos mais ingênuos da época. Itamar seguia a mesma linha de Arrigo: buscavam fazer um som experimental, utilizando instrumentos inusitados e harmonias sem apelo comercial. Como consequência disso, Assumpção foi marginalizado pela mídia, grande parte por não conseguirem compreender o que ele pretendia com suas músicas. O que o legou ao quase esquecimento dos dias atuais, especialmente entre as gerações mais novas. Apesar “exclusão” de Itamar pela mídia, suas letras são brilhantes e carregam fortes críticas à sociedade. Muitos artistas da Vanguarda não obtiveram reconhecimento na época, uma vez que não tinham o apoio das grandes gravadoras e, portanto, permaneciam à margem do som mais comum que tocava nas rádios.

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4. RESENHA DO DISCO “BELELÉU, LELÉU, EU” (1980)

“Beleléu, Leléu, eu” é o disco de estréia de Itamar Assumpção. Foi produzido pelo Wilson Soto, o “Gordo”. Lançado pelo Lira Paulistana, selo que lançou trabalhos produzidos pelos artistas da Vanguarda e que pertencia ao teatro homônimo em torno do qual esses artistas circulavam. Lançado em 1980, com a Isca de Polícia como banda, o Lp é contemporâneo de outro álbum significativo da “vanguarda”, o Clara Crocodilo, de Arrigo Barnabé, quem foi amigo e parceiro de Itamar, além de, como ele, ser paranaense. As marcantes linhas de baixo, a mistura dos diversos rítmicos e influências, e a unidade de sentido, entre outras coisas, são marcas inovadoras que Itamar Assumpção nesse disco e, também, em seus outros trabalhos. Beleleleu, Leléu, eu conta uma história: a do Benedito João dos Santos Silva Beleléu, Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé”, personagem de Itamar, e seu bando Isca de Polícia. Das treze faixas, Itamar é compositor de doze (duas dessas parcerias com Older Brigo e Marcio Werneck) e uma é parceira de Luiz Rondo, Neusa Freitas e Arrigo Barnabé. Itamar Assumpção é um dos artistas mais importantes do Brasil se levarmos em conta a importância de sua música para a cultura popular brasileira, além de toda a inovação que foi capaz de introduzir nos padrões estéticos relativos à composição de canções. Ao longo de sua carreira, misturou elementos de ritmos como reggae, rock, funk e samba. No seu primeiro disco, “Beleléu, Leléu, eu”, seu estilo já o distinguia dos demais artistas da época. Seu som baseava-se na sobreposição de diversos padrões rítmicos e linhas melódicas, com letras irreverentes. Apesar deste álbum ter mais de 3 décadas de existência, Itamar e sua criação foram tão percursores que o disco consegue ser moderno e coerente com o novo século. Em parceria com a banda Isca de Polícia – criada pelo próprio Itamar para acompanhá-lo nos seus discos e shows –, fugindo do convencional, Itamar dá caminho para uma nova linhagem a música nacional, surgindo o disco mais magnifico e ousado da carreira do músico.

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Como uma crônica, o álbum mistura ficção com realidade, emergindo do cotidiano, tendo como personagem principal “Benedito João dos Santos Silva Beléleu, vulgo Nego Dito” (letra da vinheta do disco), um malandro paulistano acompanhado de seu bando – representado pela banda – e, a quem Beléleu “deseja desconsertar a fisionomia” (letra da música Luzia), Luzia, sua mulher. O álbum tem por base uma narrativa cuja história se desenrola pelas 13 faixas e Itamar é quem assume o papel do narrador. Com músicas acima da linha do baixo, o LP era dividido em Lado A e B – o que era comum com os LP’s. Inicia com a primeira faixa denominada Vinheta I, onde é feita a apresentação do personagem que tem sua história desenvolvida nas canções (Benedito João do Santos Silva Beléleu/ vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé). Esta vinheta de abertura tem como compositor, arranjador e músico Itamar Assumpção. A partir desta apresentação, segue o disco com a faixa Luzia. Onde acontece um diálogo entre Beléleu e Luzia. Luzia, com a voz feminina de Mari, não concorda com as opiniões de Beléleu sobre o futebol da seleção brasileira, levando para o lado pessoal, questionando se ele, um malandro tão inteligente, não seria capaz de perceber este erro. E, além disso, deixando claro que não suporta mais o jeito que Beléleu a trata. Segue trecho da música: Olha aqui, Beleleú! Tá limpo coisíssima nenhuma meu, Não tô mais afins de curtir a tua e nem ficar tomando na cara, Essa de ficar na de que o Brasil não tem ponta direita, O Brasil não tem isso, o Brasil não tem aquilo, Que black navalha é você, Beleléu? Tá mais é parecendo Chamariz de turista e isca de polícia, onde tá tua malícia Meu, onde tá tua malícia...

Em sequência, Beléleu fica irritado com o pouco caso que é dado a sua opinião por Luzia, ameaçando de agredi-la, algo que parece rotineiro levando em consideração como Luzia é representada na canção com a fala (Não tô mais afim de curtir a tua nem ficar tomando na cara). Segue trecho da música: Deixa de conversa mole Luzia Deixa de conversa mole Deixa de conversa mole Luzia

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Deixa de conversa mole Porque senão eu vou desconsertar a sua fisionomia Porque senão eu vou desconsertar

Em seguida, Beléleu culpa sua parceira por sua atitude esdrúxula. Dizendo que se ela não falasse demais, perturbando suas ideias, a harmonia deles seria mantida. E que se ela não parar com o falatório, mesmo que isso lhe traga uma fama de covarde, que bate em mulher, ela baterá nela. Você quer harmonia mas que harmonia é essa Luzia Só me enche o saco (só chia só chia) Você quer harmonia mas que harmonia Só me enche o saco (só chia só chia) Me obriga à mais cruel solução Desço pro porão da vil covardia, mas te meto a mão

Luzia, para Beléleu fala tanta besteira que chega a ser como sua mãe, que desdenhava dele, dizendo que ele era só mais um bandido, desdenhando de sua inteligência. Chega de conversa mole, Luzia Chega de conversa mole Eu sei que tua mãe já dizia, é mais um Malandro talvez ladrão Já não chega a sogra e agora a cria, que decepção

Mas quando ele for importante, ela que não venha. Neste trecho, Beléleu ainda retoma o seu anseio pela taça de tetra campeão mundial ao Brasil. Na época em que este disco foi lançado, ainda era recente uma das derrotas da seleção brasileira que mais chocou os brasileiros – a copa de 1978 na argentina. Onde os brasileiros questionavam a veracidade do título argentino, e tinham vontade de conquistar esse quarto título mundial pela honra da nação. Você nem vai ter o prêmio de consolação Quando eu pintar, trazer a taça de tetracampeão E uma foto no jornal Chega pra lá Luzia, ainda vou desfilar

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Tetracampeão Luzia, porta estandarte

Por fim, a música finaliza com a súplica “Chega de conversa/ lero, lero, lero, lero, lero.” A canção Luzia foi composta por Itamar, interpretada por ele e Maria Alice Souto, arranjada por Itamar e Paulo Barnabé, e os músicos foram: Itamar no baixo, percussão e guitarra, Luis Lopes no piano, Luiz. A. Rondó na guitarra, Paulo Barnabé também na percussão e guitarra e os vocais cm Eliana Ignácio, Maria Alice Souto e Wilson Souto Júnior. Em sequência, tem a terceira faixa do LP, Fon fin fan fin fun é uma criativa junção de vários elementos musicais, realçando o lirismo da letra junto a suavidade da interpretação de Mari. O título é uma onomatopeia, que representa uma reprodução aproximada de sons naturais. Fon fin fan fin fun conota ao som que Luzia faz ao soluçar durante à noite preocupada com o seu Beléleu. Mostrando a angústia, pois, seguindo a ideia de uma narrativa, percebe-se que Beléleu foi para rua e, mesmo com a chegada da madrugada, ainda não retornou. Durante sua noite angustiante, tudo faz lembrar Beléleu, até mesmo as estrelas e a lua, uma típica sensação de uma pessoa apaixonada com saudade. Música Fon fin fan fin fun: Fon fin fan fin fun Machucando a noite Noite de verão, verão solidão, ai Fon fin fan fin fun Lá dentro do meu coração

O galo cantou, já é madrugada Sereno molhou cada flor da estrada Lua clareou as pedras no chão Rompe um fole triste nesta noite de verão Quem eu quero bem, tão longe está e noite vem Vem negra cheia de estrelas e um farto luar

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Brilha prateia meu rosto Me faz relembrar

Daquelas noites tão lindas, tão cheias de amor Vem, vem matar minha dor Fon fin fan fin fun

Composta por Itamar em parceria com Older Brigo e interpretada por Maria Alice Souto. Arranjo também de Itamar e Paulo Barnabé, com Itamar no baixo, violão, acordeon, bateria e percussão, Luis Lopes no piano e Paulo Barnabé no acordeon e percussão. A quarta música do álbum é Fico Louco. Esta parte da narrativa se passa no mesmo momento em que Luiza chora com saudades de Beléleu, o malandro está a vagar pelas ruas e, também, pensa em Luzia. Arrependido por ter sido mal e rude sem pensar, é acometido por sentimentos de arrependimento que o fazem sofrer e conscientizam de que esta atitude também faz Luiza sofrer. Fico louco, faço cara de mau, falo o que me vem na cabeça Não digo que com tudo isso eu fique legal Espero que você não se esqueça (...) Fico louco, xingo, quebro o pau, só você me faz a cabeça A gente sofre tanto, vive muito mal Espero que você não se esqueça

No fundo, Beléleu demonstra agradar-se da ideia de Luiza ser como ele, um malandro e aceitar vivenciar a rua com ele e como ele. Espero ver você curtindo o reggae deste rock comigo Grite forte, dê um jeito, cante, permaneça comigo Espero ouvir você dizer que gosta de viver em perigo Considerando que eu não seja nada mais além de bandido Fico louco, faço pelo sinal, me atiro ao chão de ponta cabeça Me chamam de maluco, etc e tal, espero que você não se esqueça Eu quero andar nas ruas da cidade agarrado contigo

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Vivendo em pleno vapor, felicidade contigo

Por fim, na construção do arranjo, após o último verso “ vivendo em pleno vapor, felicidade contigo” e depois repetindo os 2 primeiros versos “ Fico louco, faço cara de mau, falo o que me vem na cabeça/ não digo que com tudo isso eu fique legal/ Espero que você não se esqueça” dando a ideia de que o personagem pede perdão a luzia. Composta somente por Itamar, arranjo dele com Paulo Barabé. Os músicos são Compostos por Itamar no baixo, guitarra e percussão, Luiz Lopez no piano, Rondó na guitarra, Paulo Barnabé na bateria e percussão e vocais com Eliana Ignácio, Mari e Wilson Souto (gordo). A próxima canção, chamada Aranha é uma construção inteiramente metafórica. Segundo Bastos (2012) ‘(...) Embora conste no encarte original do LP o nome de Itamar como coautor da canção, segundo Arrigo, Itamar apenas a quis gravar porque gostava da composição. Arrigo compôs a linha de baixo e Rondó a melodia sobre o poema de Neusa. (...)”.(SILVA, 2012, P.100).

Destrinchando a canção percebe-se uma designação de significação entre as grades de uma cadeia com as teias de uma aranha, ambos são capazes de aprisionar suas presas. Em uma as presas são do Estado, noutra as presas são da aranha. “Nessa teia cadeia de prata” teia é onde as aranhas aprisionam, e cadeia é onde os homens aprisionam. “Vai aranha emaranhar/ Vem pra essa teia/ Vem pratear virar prata”, pode ser entendido como vai cadeira emaranha (emaranhado pode remeter a grande quantidade de pessoas misturadas na cadeira), vem pra essa cela, vem fazer quantidade no prata da cela. Segue a música: Aranha - vem dançar Nessa teia cadeia de prata Vai aranha emaranhar Vem pra essa teia Vem pratear vira prata Na teia aranha Sou aranha de prata Sou cadeia que mata

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Interpretada por Itamar e Mari, com os musicistas Paulo Barnabé na percussão e bateria, Rondó na guitarra, Luis Lopes no piano, Itamar continua no baixo e percussão. Arranjo também, assim como as anteriores, são de Itamar e Paulo Barnabé. Se eu fiz tudo, a sexta música do disco, finaliza o lado A do LP. Nesta canção, Beléleu coloca em questão que tudo que fez até então foi para fazer Luzia feliz, fez o que estava e o que não estava ao seu alcance no intuito de manter a felicidade prometida nas canções que se passaram na narrativa. Pulou de cabeça nessa história e, por fim, deu nesta situação. E agora que ele está na prisão, como vai ficar a felicidade? Música de Márcio Werneck Muniz, com arranjo de Itamar e Barnabé que são responsáveis pela percussão e baixo; bateria e percussão, teclado de Luis Lopes e Rondó na guitarra. Se eu fiz tudo Se eu fiz tudo que fiz Foi pensando em fazer você feliz Eu dei o pulo que dei e nem podia dar Mas você não quis Não quis só porque você sabe tudo o que quer Ou é porque você não sabe Pulei de cabeça nessa coisa, coisa, coisa Entreguei meu sangue e meu plasma Plasma, plasma, plasma Mas você não quis porque sabe Ou é porque não sabe Que a coisa é muito louca Sangue, plasma, corpo, alma e de cabeça

Foi o pulo que eu dei Pra fazer você feliz Dei de mim tudo que sei Mesmo assim você não quis Ser feliz

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Virando o LP para o lado B, tinha novamente a primeira vinheta cuja função era marcar que o álbum ainda narrava a história de Beléleu, leléu, eu. As vinhetas organizavam o disco, costurando-os. E neste caso, também, mostrar a chegada de Beléleu, pois, em seguida, a música Baby, começava com uma voz feminina tomando um susto, representando a ideia de que Luzia se assustou com Beléleu novamente nas ruas. Baby, uma das músicas mais fortes do disco, é a representação do que movia Itamar, o reggae. Após o susto, Beléleu, todo conquistador, diz “Baby, não se assuste/ Hoje o tempo é de terror/ Nosso céu ainda chora/ Nos telhados da cidade/ E nossa amizade a tudo resiste”, dá a ideia de que Beléleu, mesmo com a alegria da sua saída, ainda percebe as mazelas das ruas, os tempos ainda são ruins. Apesar de Beléleu não falar diretamente Luzia, percebe-se que a narrativa travada com ela pois o nosso céu ainda é de chumbo, fazendo analogia com a música Fon fin fan fin fun, onde Luzia lembra do céu estrelado que eram parte dos momentos dela e do malandro. Baby não se assuste Hoje o tempo é de terror Nosso céu ainda chora Nos telhados da cidade E nossa amizade a tudo resiste Baby nada existe Resguardando nossa vida Duvido que me chamem Pra sentar naquela mesa E a grande família já não tão grande

Baby baby baby Baby baby baby Baby baby baby Baby baby baby

Baby nao se assuste

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A cidade é iluminada E sob o nosso céu de chumbo As pessoas se disfarçam de carne e osso De velho e de moço

Baby baby baby Baby baby baby Baby baby baby Baby baby baby

A faixa Embalos, a sucessora de Baby, tem um vocal interessante. Itamar trouxe vocais que não são só vocais, mas que possuem uma teatralidade sempre presente. Os vocais compõem a narrativa, tanto quanto a voz, sendo não somente vozes de fundo, mas possuem significação na construção do sentido da canção e da narrativa do álbum. Isto é perceptível em todo álbum e em toda carreira artística de Itamar, mas essencialmente nesta faixa, essa inovação de Itamar é fundamental na construção. Beléleu, ainda perdido ao sair das teias de prata, sem quem ampará-lo, sem rumo. Andou por toda São Paulo, procurando sossego a qualquer preço que lhe custasse, pagando até com a própria vida. Porém, percebe que é assim que funciona a vida. Se tem problema, mas o mundo gira e gira assim com todo mundo. Embalos: Girei esse tempo todo Batendo de porta em porta À procura de um abrigo Um apego um horizonte

Tentando de cabo a rabo São Paulo de ponta à ponta Na batalha de sossego Alívio ou mesmo a morte

Eu giro no embalo do sábado à noite E a fila que não tem mais fim Revela pra mim Que o mundo gira assim

Que o mundo todo gira

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Que o mundo todo gira assim Que o mundo todo gira Que o mundo todo gira assim Que o mundo todo

A nega música é o encontro de sua nega, alguém para ampará-lo, mas é, também, a música “nega” (do verbo negar) o tipo de canção popular com o qual o mundo acerca dos rádios estava acostumado a ouvir. Relata, além disso, a chegada da pessoa amada de Beléleu, quando ele menos esperava. Nega é a representação do amor esperado por Beléleu e a representação da negação feita por Itamar de agradar o principal veículo midiático da época. Nega Música: Quando você menos espera ela chega Fazendo do teu coração O que bem ela fizer Nem venha querendo você se espantar Não, não, não, não, não Nem venha querendo você se espantar Não, não, não, não, não

Quando você menos espera ela toca O fundo do teu coração Assim como uma mulher Nem venha querendo você se espantar Não, não, não, não, não

Nesta próxima música, Beijo na boca, Beléleu percebe que aquele seu amor verdadeiro, explicitado na faixa anterior a esta, não é tão verdadeiro da outra parte. Sua nega procura apenas uns beijos, ao contrário da procura dele. A sua nega, que antes era o ponto referencial de felicidade, mostrara-se superficial, querendo apenas, como diz o nome da música, beijo na boca. Então, ele diz para ela e para si mesmo, que não irá contentar-se com apenas algo momentâneo, sem compromisso com a paixão que lhe completava. 17

Beijo na boca: Tudo que eu podia fazer eu já fiz No entanto você nem se toca Ainda diz que a vida não é nada mais Que um beijo na boca

Olha baby não devo mais insistir Na verdade você é mais louca Porque tudo não vai pra você mais além De um beijo na boca

Ora ora meu bem não é sempre que o amor Se resume num ponto de vista E por isso baby eu não vou mais me iludir Com seu beijo na boca Ou seu beijo de Judas

Na próxima vinheta, denominada no LP como Vinheta Radiofônica, é uma notícia de rádio, falando sobre o personagem Beléleu e seu bando, ou melhor dizendo sua banda Isca de Polícia. Essa notícia traz os componentes como suspeitos de algo fora da lei dando o nome de cada um, mostrando as verdadeiras identidades dos bandidos cúmplices de Beléleu e músicos da banda. Após a apresentação de cada um – o que não faremos aqui, devido a nomeação dos participantes no fim da análise de cada faixa – introduz a vinheta do início, e, neste momento se inicia a próxima música. Nego Dito, a última faixa do álbum e uma das mais importantes e conhecidas da carreira de Assumpção, possui uma certa distância satírica entre Itamar e Beléleu. Uma das músicas mais latentes sobre o movimento da negritude e o racismo, mesmo que implicitamente, da época, narra as características do personagem Beléleu. Fixando a ideia que foi passada durante toda a narrativa presente no álbum, mostra um homem capaz de tudo para conquistar o que quer, e que se orgulha de ser quem é. Benedito, representando a infância católica no Tietê, com o Santo Benedito. João dos Santos Silvas, nomes comuns no Brasil, representando a simplicidade e a 18

representação de vários personagens em um só. Beléleu, cujo personagem é uma representação dos ideais do seu idealizador, Itamar. Vulgo Nego Dito, Nego Dito Cascavé, representando o Nego “Maldito da MPB”. Nego Dito: Meu nome é Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Eu me invoco eu brigo Eu faço e aconteço Eu boto pra correr Eu mato a cobra e mostro o pau Pra provar pra quem quiser ver e comprovar Me chamo Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Tenho o sangue quente Não uso pente meu cabelo é ruim Fui nascido em Tietê Pra provar pra quem quiser ver e comprovar Me chamo Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Não gosto de gente Nem transo parente Eu fui parido assim Apaguei um no Paraná, pá, pá, pá, pá Meu nome é Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Quando tô de lua Me mando pra rua pra poder arrumar Destranco a porta a pontapé Pra provar pra quem quiser ver e comprovar

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Me chamo Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Se tô tiririca Tomos umas e outras pra baratinar Arranco o rabo do satã Pra provar pra quem quiser ver e comprovar Me chamo Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Se chamá polícia Eu viro uma onça Eu quero matar A boca espuma de ódio Pra provar pra quem quiser ver e comprovar Me chamo Benedito João dos Santos Silva Beleléu Vulgo Nego Dito, Nego Dito cascavé

Se chamá polícia Eu vou cortar tua cara Vou retalhá-la com navalha

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5. CONCLUSÃO Neste trabalho ocorreu a análise de uma das obras de Itamar Assumpção – Beléleu, Léleu, eu (1980). Nesta análise, foi exposto as figuras de linguagem e expressões utilizadas por Assumpção na construção do álbum cuja narrativa é característica que se manifesta a cada faixa. Itamar assumpção (1949-2003), foi um dos grandes mestres da vanguarda paulistana. Esse seu primeiro álbum, produzido por Wilson Soto, o “Gordo”, foi o que se pode chamar de ponto de partida para a trajetória da vanguarda. Apesar de não ter obtido reconhecimento, como muitos outros artistas da vanguarda, por ser pouco comercial, Itamar e Beléleu tem grande influência na música popular brasileira. Artistas renomados da cultura nacional interpretaram muitas de suas músicas.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASTOS, Maria Clara. Processos de compreensão e expressão na obra de Itamar Assumpção. 2012. 234 f. Dissertação (Mestrado em Artes) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. DISCOS do Brasil. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. FALBO, Conrado. Muitos Itamares a navegar. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. FERREIRA, Tiago. Grandes álbuns #30: Itamar Assumpção & banda Isca de Polícia – Beleléu, Leléu, eu (1980). [2011]. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. ITAMAR Assumpção. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. OASKI, David. Pérolas que o tempo esqueceu: vanguarda paulista. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. RICARDO, Cassiano. Biografia de Itamar Assumpção. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. RODRIGUES, André Rocha. A cidade da Vanguarda Paulista. Revista Urutágua, Maringá, Paraná, n. 21, 2010. Disponível em: . Acesso em: 19 de junho de 2016. SILVA, Rita de Cássia Cruz. Singular e plural: os vários “eus” de Beleléu: uma análise da performance como linguagem nos primeiros discos de Itamar Assumpção. 2012. 241 f. Dissertação (Mestrado em Literatura) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: < http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8156/tde.../2012_RitaDeCassiaDaCruzSi lva.pdf>. Acesso em: 19 de junho de 2016.

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