Josefine Klougart: Den vind man manglede/O vento que fazia falta — amostra de tradução do dinamarquês

July 28, 2017 | Autor: Luciano Dutra | Categoria: Danish Literature, Translation and literature, Portuguese Language
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den vind man manglede vindurinn, sem aldrei kom o vento que fazia falta

vindurinn, sem aldrei kom smásaga

katrín björk kristinsdóttir þýddi úr dönsku

o vento que fazia falta conto

tradução do dinamarquês

luciano dutra

den vind man manglede novelle

eftir

josefine klougart

reykjavík · mmxv

den vind man manglede – novelle vindurinn, sem aldrei kom – smásaga o vento que fazia falta – conto Josefine Klougart

forfatter · höfundur · autora

5. mars 2015

1. udgave hos sagarana · frumútgáfa á íslensku · edição príncipe em português

Katrín Björk Kristinsdóttir

oversættelse til islandsk · íslensk þýðing · tradução em islandês

Margrét Sveinbjörnsdóttir

korrektur · prófarkalestur · revisão

Ana Carolina Braz | ananas.is omslag · kápuhönnun · capa

Luciano Dutra

design/layout · hönnun/umbrot · projeto gráfico/diagramação oversættelse til portugisisk · portúgölsk þýðing · tradução em português

Arite Fricke

designer af sagaranas logo · hönnuður merkis sagarana · desenho da marca sagarana

Maiola Pro

tegnsæt i bogen · leturgerð í bókinni · tipografia no miolo do livro

Munken Pure 120 g/m2

papir · pappír · papel do miolo

Leturprent

tryk og bogbind · prentun og bókband · impressão e encadernação

978 9935 9212 5 3 isbn

Sagarana editora forlag ehf

óðinsgötu 7 | 101 reykjavík | island · íslandi · islândia [+354] 846 2488 · [email protected] · facebook.com/sagarana Upprunalega gefið út á dönsku sem Den vind man manglede © 2010 Josefine Klougart © 2015 Katrín Björk Kristinsdóttir – íslensk þýðing © 2015 Luciano Dutra – tradução do dinamarquês Bók þessa má ekki afrita með neinum hætti, svo sem ljósmyndun, prentun, hljóðritun eða á annan sambærilegan hátt, að hluta eða í heild, án skriflegs leyfis höfundarréttarhafa, þýðanda og útgefanda. tryket i island · prentuð á íslandi · impresso na islândia udgivet i · gefin út í · publicado em reykjavík unesco litteraturby reykjavík bókmenntaborg unesco reykjavík cidade da literatura da unesco

o vento que fazia falta

eu estava sentada na mesa da cozinha, com as costas totalmente apoiadas no caixilho da janela. Era um final de verão, as janelas tinham ficado abertas por dias a fio e tudo estava fora de ritmo. Tudo parado de uma maneira que não tinha nada que ver com movimento ou ausência de movimento. Tudo arremedava o vento que fazia falta. — Vais vivenciar isso como uma libertação – ele disse. O marco da janela era como um dente solitário, ali, parado, mordendo a imagem daquele jardim inviável, onde as libélulas pendiam de cordões frouxos sobre vasos de lavanda e canteiros de perenes ladeados por aquilégias que afinal haviam sufocado todo o resto. O verão fora impossível esse ano e tudo estava ao avesso. Até mesmo o céu pendia. Eu havia decidido ser mais franca de agora em diante, e tinha dito isso a ele. Eu estava cheia de tanta conversa fiada e decidida chamar as coisas pelo nome. Sem rodeios. Eu tinha usado exatamente essas palavras, e ele sabia que essas mesmas palavras já tinham sido usadas antes naquele mesmo ano. Era assim que tinham me aconselhado a pensar, eu era capaz de escrever qualquer coisa, como alguém havia dito, e também era capaz de engambelar a todos. Só que de fato eu não era capaz de escrever qualquer coisa, disso eu estava ciente. Mas ainda era capaz de engambelar a todos. De fato, havia muito pouco que eu pudesse escrever, apenas o estritamente necessário, e naquela canícula muito pouca coisa era tão necessária quanto a água.

Para aquele homem que agora estava ali parado, sofrendo, na minha cozinha inviável, eu podia, porém, dizer tudo, e praticamente tudo poderia ser verdade e por isso também praticamente dispensável. — Acho que vai ser bom – ele disse — acho que vai ser uma libertação para ti. Fiquei olhando para ele por um bom tempo. — Quero dizer, isso de ser mais franca — ele esclareceu. Ou seja, não era nada difícil persuadi-lo. Ele tinha mesmo uma enorme boa vontade. Notei que ele havia se barbeado, e todos os pelinhos pretos nas bochechas dele lembravam sementinhas de papoula. A cozinha parecia um pouco estranha, pois era a primeira vez que eu a observava ali desde a janela. Ele também parecia estranho. “Que homem mais estranho”, pensei. — Meu falecido marido… – eu disse em voz alta. Ele se encolheu todo, como se eu houvesse jogado algo na direção dele. Tudo estava tão quieto na cozinha. Ele se desencolheu outra vez, lentamente. Olhei para ele como se olha para alguém que se veste para não levantar suspeitas. O corpo dele demonstrava um desassossego que me fez lembrar de um velho amigo, cujo nome, porém, não consegui recordar. Era evidente que ele ansiava por um lugar para morar. Ele carecia de um lar, reparei. “Pobre sujeito sem lar”, pensei antes de dizer: — Você vai voltar a vê-la, né? Eu disse aquilo com gosto, mas não se tratava de dizer algo em voz alta ou de não dizer algo em voz alta. Tratava-se antes daquela minha recente decisão de querer chamar as coisas pelo nome. 28 | o vento que fazia falta

Ele enxergava o meu apartamento como a reconstrução do lar que juntos tivemos um dia. Um lar cenográfico. A iluminação no ambiente o deixava dez anos mais novo. “Como estou velha”, pensei. Estou velha demais para ficar sentada na mesa da cozinha conversando tão tarde da noite. — Sim – ele respondeu — vou voltar a vê-la. “Quem dorme na minha cama come no meu prato”, ele pensou, parecendo exausto. Um fogo exaurido onde ainda resta algo. Recolho na minha direção as pernas emprestadas, como quem reboca um barco na praia usando um enorme sistema de roldanas. Fechei os olhos, sabendo que ele iria salvar a garrafa de azeite de oliva e o moinho de sal. Ele fica tão transtornado quando alguma coisa vira, desproporcionalmente transtornado. — Desculpa — eu disse sem erguer os olhos. — Desculpar o quê? – ele perguntou, nitidamente confuso. — Por eu quase derrubar essas coisas – fui obrigada a responder. — Não aconteceu nada – ele retrucou. — É, não aconteceu nada – eu disse e olhei para ele. É claro que ele queria continuar rapidamente, para que as palavras não começassem a inchar. Não, não aconteceu nada. Aquilo não tinha por quê significar nada além disso. — Suponho que isso não tenha nada a ver com raposas. Eu disse isso tão baixinho que ele sequer ouviu, apenas registrou aquilo como algo particular. Que de alguma forma algo havia acontecido e ele não tinha sido convidado. E compensou aquilo pensando que também tinha algo só josefine klougart | 29

seu, ou seja, o fato de eu tampouco ter acesso à namorada dele. Os olhos dele pendiam do rosto desfigurado como adornos dos ramos das sobrancelhas, balançando para lá e para cá com estardalhaço. — Preciso te ver – ele dissera no telefone. E ali estava ele de novo. “Tenho medo de te esquecer”, ele escrevera, e ali estava ele de novo comigo, da mesma forma. Vai até lá, arrastado por um cabo, verão afora. Comecei a esquecer a visita dele já ali na cozinha. “É tão fácil para mim estragar tudo isso para ti”, pensei. — No mais, fiz umas alterações no meu romance – ele disse, para mudar de assunto – Ou melhor, no meu texto – ele corrigiu, tarde demais. Sorri, e aquele sorriso não tinha nada a ver nem com amor nem com desamor. A exaustão era impressionante. Procuramos alguma explicação, e acho que ambos repetimos aquilo cada um para si, que não havia acontecido nada, dando porém continuidade às suposições. Meu palpite cada vez mais é que de fato algo havia acontecido, que algo acontece o tempo todo, apesar de silenciosamente. Suponho que isso tenha a ver com aquele tipo de homem. Ou melhor. Suponho que isso tenha a ver com sendas completamente atrofiadas. Suponho que isso tenha a ver com marés altas e gasolina em reservatórios verdes. Suponho que isso tenha a ver com aplausos em pé e afobados. Suponho que isso tenha a ver com raposas e com a forma com que elas aprenderam a sobreviver nas cidades. Suponho que isso tenha a ver com crianças pequenas e seus pais ausentes. Suponho que isso tenha a ver com o teu sorriso sem dentes. Suponho que isso tenha a ver com crianças 30 | o vento que fazia falta

e mães e ondas. Suponho que isso tenha a ver com um determinado serrote. Suponho que isso tenha a ver com mães e crianças e com os anseios mordazes por tranquilidade das crianças doutras mães. Suponho que isso tenha a ver com tranquilidade. Suponho que isso tenha a ver com a tranquilidade do fluxo das marés altas. Suponho que isso tenha a ver com a tranquilidade das raposas. Suponho que isso tenha a ver com raposas nas quedas d’água. Suponho que isso tenha a ver com o adeus nas quedas d’água. Suponho que isso tenha a ver com o efeito calmante das quedas d’água nas mães das crianças. Suponho que isso tenha a ver com quedas d’água nas marés. Com quedas d’água como o sorriso sem dentes das marés. Suponho que isso tenha a ver com crianças hipertrofiadas e marés hipertrofiadas e anseios por marés hipertrofiadas. Suponho que isso tenha a ver com raposas e desdentados e crianças. Caro Jakob. Estou aqui numa cafeteria escrevendo sobre uma mulher que se encontra com a nova namorada do seu ex-namorado. A tua namorada acabou de entrar na cafeteria e se sentou a três meses da minha. Queres que eu mande tuas lembranças a ela? Enviado/recebido em 07/08/10 às 16h32 Caro Martin. Sou forçada a cancelar o nosso encontro, estou no café Bang & Jensen escrevendo e a namorada do Jakob acabou de chegar. Vou ter que ficar mais um pouco para fins de pesquisa. Conto com a tua compreensão. Abs. Josefine. Enviado/recebido em 07/08/10 às 16h36

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