Justiça Restaurativa no Brasil: para onde vamos, o que queremos?

July 19, 2017 | Autor: Daniel Achutti | Categoria: Restorative Justice, Justiça Restaurativa
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A Justiça Restaurativa no Brasil: para onde vamos, o que queremos? 05 de janeiro de 2015 | Redação Jornal Estado de Direito

Publicado na 44ª edição do Jornal Estado de Direito. Daniel Achutti Advogado. Doutor em Ciências Criminais pela PUCRS.

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Professor do PPG em Direito do Unilasalle.             Com a implementação dos juizados especiais criminais (Lei n. 9.099/1995), esperava­se introduzir no Brasil um sistema informal e menos punitivo de controle penal, que permitisse tanto o desafogamento das varas criminais quanto a atribuição de uma maior autonomia às partes para a resolução  dos  seus  conflitos  (de  menor  potencial  ofensivo).  Os  efeitos  desejados,  contudo,  não foram  alcançados:  as  varas  criminais  continuaram  congestionadas  e  não  houve  um  aumento  de satisfação das partes quanto à forma como os seus conflitos passaram a ser administrados.             Na esteira de Salo de Carvalho, pode­se afirmar que a cultura jurídica brasileira apresenta marcantes traços inquisitivos, e tal característica acaba por impedir os atores jurídicos de perceber que, no fundo, as suas práticas cotidianas apenas colaboram para a manutenção de um agir cuja finalidade  principal,  como  não  poderia  deixar  de  ser,  é  o  encarceramento  de  pessoas.  Nesse sentido, talvez a dificuldade maior para se alcançar os objetivos propostos pelas reformas penais de cunho não repressivo – a exemplo dos juizados especiais – não esteja na lei, mas na cultura jurídica que move e sustenta a estrutura da justiça criminal brasileira. O crescimento exponencial das taxas de  encarceramento  no  Brasil  não  pode  ser  considerado  um  fenômeno  social  desassociado  dessa

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cultura  –  legalista,  punitivista  e,  para  lembrar  novamente  as  lições  de  Salo,  nitidamente carcerocêntrica.                         Desde  tal  perspectiva,  é  forçoso  reconhecer  que  qualquer  reforma  penal  que  pretenda instituir  uma  alteração  substancial  na  forma  como  se  administram  os  conflitos  criminais  no  país deverá  partir,  sobretudo,  de  uma  proposta  que  abarque  uma  nova  cultura,  com  novos  marcos teóricos  e  modos  de  operacionalização  das  suas  propostas.  Como  lecionava  Louk  Hulsman,  o abandono  da  linguagem  criminalizante  do  direito  penal  e  de  toda  a  carga  negativa  que  a acompanha  pode  ser,  quiçá,  o  primeiro  passo  em  direção  a  algo  radicalmente  distinto  do  direito penal.

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                        A  justiça  restaurativa,  nesse  contexto,  ocupa  lugar  de  destaque.  Em  grande  medida,  os primeiros trabalhos sobre justiça restaurativa (segunda metade da década de 1970) refletiram uma insatisfação  crescente  com  o  sistema  de  justiça  criminal  tradicional,  apresentado  desde  um panorama  sombrio  e  ineficaz,  que  justificaria  a  adoção  de  um  novo  modelo  de  administração  de conflitos.  Paralelamente,  o  abolicionismo  penal,  oriundo  da  criminologia  crítica  dos  anos  1970  e 1980,  apontava  para  a  necessidade  de  abolir  o  sistema  de  justiça  criminal  e  substituí­lo  por  um modelo deliberativo de administração de conflitos, que priorizasse os danos causados pelo conflito à mera atribuição da culpa penal.                         Caracterizada  por  não  apresentar  vencedores  nem  perdedores,  como  refere  Vincenzo Ruggiero, na qual a satisfação das necessidades básicas das partes aparece em primeiro lugar – sem descuidar, naturalmente, dos direitos fundamentais – busca­se proporcionar aos envolvidos um ambiente  adequado  para  a  construção  coletiva  de  uma  decisão  que  contemple  os  interesses  de todos. O modelo verticalizado da justiça criminal, em que o Estado aparece como figura principal e estabelece,  ao  final,  a  responsabilidade  dos  culpados,  cede  lugar  a  um  modelo  horizontal,  sem hierarquias e classificações antecipadas de fatos e sanções, de modo a reduzir a importância dos atores  jurídicos  e  a  atribuir  às  partes  o  papel  de  proprietários  do  conflito,  tal  como  advogava  Nils Christie desde o final dos anos 1970.

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