Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

July 5, 2017 | Autor: Deivison Souza Cruz | Categoria: Criminalidade
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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses* Resumo: Inércia ou elevação das taxas de homicídio, com raros decréscimos, tem caracterizado o quadro da segurança pública no estado do Espírito Santo ao longo das últimas três décadas. Mas há pouca relexão sobre o modo como o enquadramento do problema contribui para a manutenção dessa realidade. Analisando dados do SIM-DATASUS (1980-2010) e evolução e peril da população prisional do ES (2000-2010) detecta-se a similaridade entre peril dos encarcerados e das vítimas de homicídio: em ambos os casos são em geral jovens do sexo masculino, com baixa escolaridade e residindo no meio urbano metropolitano. Esse dado empírico é reforçado por forte lastro teórico, sobretudo mudanças macrossociais, fatores estressores no nível micro, comunitário e familiar, concluindo a formação de subculturas da delinquência e processos de rotulagem institucional. Avaliamos que a resposta institucional mostra-se deicitária devido à baixa efetividade dos governos na prevenção e redução da reincidência como estratégia frente a criminalidade. Em função disso, resume-se algumas diretrizes de políticas. E como aponta-se possíveis cenários da criminalidade na presente década, compreendida como um momento de consolidação da criminalidade sistêmica ao qual se enquadra o caso do estado do Espírito Santo e sua Região Metropolitana, em particular.

Deivison Souza Cruz** Introdução ..................................................................................................................................................

2

1.

Mortes e encarceramento...............................................................................................................

2

1.1

Equação social complexa...............................................................................................................

2

1.2.

Escolhendo vítimas e presos..........................................................................................................

5

2.

Mudanças macrossociais e tensões individuais .........................................................................

9

2.1.

Mudanças macrossociais ..............................................................................................................

9

2.2.

Espiral de emoções negativas........................................................................................................ 11

3.

Gangues juvenis e rotulagem institucional.................................................................................. 13

3.1.

Modelos de comportamento.......................................................................................................... 13

3.2.

De iniciante a mestre...................................................................................................................... 14

4.

Prevenção como estratégia............................................................................................................. 16

5.

Considerações inais........................................................................................................................ 20

Referências ................................................................................................................................................. 23

http://goo.gl/Tyfcda

http://goo.gl/SvtP3Y

*Escrito de outubro de 2012 a março de 2013. Agradeço a Emílio Font, coordenador do gabinete da Senadora Ana Rita Esgário (PT-ES) pelo pedido, incentivo e impressão da versão inicial do artigo, na brochura Espírito Santo: Os Desaios do Desenvolvimento, e ao gabinete do deputado estadual Claúdio Vereza (PT-ES) que solicitou uma apresentação. **Mestre em Ciência Política (UFMG) e Cientista Social (UFES). Pesquisador associado ao Núcleo de Estudos e Pesquisas Indiciárias (NEI-UFES). Currículo: http://lattes.cnpq.br/0253781019001331. Contato: (55 27) 8848-3278; e-mail: [email protected]; https://www.facebook.com/deivison.consultoria, twitter @deivisoncruz. Deivison Souza Cruz

1

Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Introdução

I

nércia e elevação das taxas de crimes contra a vida, com raros decréscimos, tem caracterizado o cenário da segurança pública no estado do Espírito Santo ao longo das últimas três décadas (anos 19802010). E o estado tem se destacado de 2000-2010 por forte ao encarceramento como estratégia de segurança pública. Evidentemente, a relação entre esses dois temas levanta questões importantes, aos quais destacam-se: • Qual a variação das taxas de mortes por agressão (homicídios, lesões seguidas de morte e intervenções legais); • Que peris têm preponderado a vítimização de mortes por agressão (homicídios, lesões seguidas de morte e intervenções legais); • Qual a variação e o peril preponderante no aprisionamento; • Qual a relação entre variação do aprisionamento e das taxas de mortalidade; • O que pode explicar a elevação das taxas de mortes por agressão no ES ao longo das últimas décadas; • O que explica a inserção e o vínculo dos jovens do sexo masculino com a delinquência juvenil e como a atuação das instituições de controle social induz esse processo; • Quais os problemas, condições e propostas relacionadas às políticas públicas para redução da delinquência juvenil. Para responder essas perguntas, o texto analisa-se estatísticas de mortes por agressão (SIM-DATASUS de 1980-2010) e algumas estatísticas de encarceramento (2000-2011, dados do Ministério da Justiça). Respondem-se alguns aspectos das variações das taxas masculinas nas últimas décadas, quais os seus signiicados e em qual grupo concentra-se o maior risco às mortes por agressão (homicídios, lesões seguidas de morte e intervenções legais).

O artigo divide-se em quatro partes, na primeira seção discute-se a similaridade entre o peril de mortos por agressão e população carcerária do ES. Os resultados apontam a similaridade em ambos os casos: são em geral jovens do sexo masculino, com baixa escolaridade, preto/pardos e residindo no meio urbano metropolitano. Ainda que de modo inicial, Esse dado empírico é reforçado por forte lastro teórico, sobretudo mudanças macrossociais, fatores estressores no nível micro, comunitário e familiar, formação de subculturas da delinquência e rotulagem institucional. A resposta institucional mostra-se deicitária devido à baixa efetividade do Estado na prevenção, sendo as razões para tanto discutidas na conclusão.

Na segunda seção apontam-se enquadramentos teóricos que, como hipótese, seriam passíveis de ajudar na compreensão da evolução dos indicadores e na inserção criminal no ES. Discutem-se alguns macroprocessos (transformações urbanas) e micro-processos (estressores e criminalidade), mas também, em uma terceira seção, o papel das gangues juvenis e da subcultura da delinquência, bem como a rotulagem como um efeito adverso da política de controle social, no reforço dos vínculos dos jovens com o crime. Na quarta seção discutimos propostas de intervenção passíveis de se converterem em políticas públicas trata-se de compreender alguns fatores relacionados ao que pode melhorar na política de segurança. Embora haja farta bibliograia sobre o que tem ou não efeito na redução da inserção criminal, a diiculdade encontra-se na implantação e avaliação das políticas públicas dedicadas ao problema. Mais do que propostas, mostram-se necessários diagnósticos locais fortemente ancorados pesquisa empírica e embasados em teorias ajustadas ao contexto. Por im, na conclusão apontados possíveis fatores de estruturação da criminalidade de 2010 em diante.

1. Mortes e encarceramento 1.1. Equação social complexa De 1980 até 2010 houve um aumento da expectativa de vida da população brasileira, que passou de 62,6 para 74,1 anos, ou seja, um acréscimo de 12,5 anos. A despeito desse otimismo, ao longo das três décadas a taxa de homicídios passou de 11,7 por 100 mil para 26,2 em 2010. Além disso, houve uma redução na idade das vítimas (ver Gráico 1) que, no caso das mulheres, reduziu-se de 30,5 para 29,5 anos no período 1980-1991 e, posteriormente, elevou-se para 32,5 anos até 2011 (+3 anos). Nos homens caiu de 32,5 para 29 (-3,5 anos) anos no período 19801998, elevando-se para 30 até 2011. A elevação lenta das taxas, acompanhada por uma variação igualmnete lenta da idade das vítimas descrendencia hipóteses de uma onda de homicídios. Trata-se de um probema muito mais grave estrutural. Nas últimas três décadas houve quase 35 mil mortes por agressões no ES, sendo quase 20 mil de 2000 a 2010. Pioras lentas e persistentes têm ocorrido ao longo das últimas décadas. Como se sabe, o ES caracteriza-se historicamente por taxas altas de homicídios. Comparativamente aos demais estados, em média encontra-se na terceira posição nas últimas três décadas e em segunda posição de 2000 em diante. E como há muita variação das posições dos demais estados da federação, signiica reconhecer, pelo critério de estabilidade, que o estado do ES é um dos casos mais graves da federação.

Deivison Souza Cruz

2

Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Gráico 1 - Média de idade de vítimas de homicídio (99%), agressões e intervenções legais por sexo no Brasil (1980-2010) Fonte: Sistema de Informações de Mortalidade (SIM-DATASUS) Causas Externas CID9 E55 e E561 (1979-1995); CID10 - X85-Y09 (1996-2010) e Y35-Y36. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS.

100

80

60

40

20

4.3 15.1

120

25.7 4.6 17.1 29.5 30.5 3.0 17.0 30.0 3.7 16.9 4.1 18.2 32.0 3.8 20.0 36.1 5.3 20.8 36.0 4.8 22.5 39.8 6.3 27.8 49.2 6.0 34.1 61.7 6.9 35.3 63.6 7.5 37.5 67.5 6.5 32.0 57.4 7.4 40.9 74.4 7.9 42.8 77.4 8.7 41.7 74.8 9.2 42.8 76.7 9.2 91.1 50.0 11.4 58.4 105.7 9.0 52.5 96.5 7.6 86.8 46.8 8.5 85.5 46.7 9.2 51.2 93.9 8.7 92.9 50.5 8.1 49.4 91.5 8.6 46.9 86.0 10.5 92.7 51.2 10.4 53.6 97.7 10.9 56.4 102.9 12.3 103.3 57.2 9.8 51.0 93.5

Gráico 2 - Média de idade de vítimas de homicídio (99%), agressões e intervenções legais por sexo no ES (1980-2010) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS.

0 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

taxa (100 mil)

Conforme o Gráico 2 (ES), a variação da idade das vítimas no ES difere do cenário nacional (Gráico 1). No caso masculino, caiu a idade média das vítimas entre 33-34 anos em 198083 para 30 anos no início da decada de 1990, estabilizando-se nesse patamar até 2003 e caindo para 29 anos até 2011. Ou seja, -5 anos na idade média das vítimas masculnas nas últimas três décadas. No caso feminino a variabilidade foi maior, porém mantendo certa elevação de 30 para 31 anos em três décadas (1980-2011). Apesar da variabilidade no âmbito local, a tendência de redução da idade média das vítimas masculinas (90% do total das vítimas). Ressalva-se que as taxas triplicaram de 1980-2010 (15,1 para 51 mortes por 100 mil), e mantiveram-se em média em 51,4 no período 2001-2010 (ver Gráico 3). Todavia, esses dados dizem pouco pelo fato de que as taxas gerais para o conjunto da população são menos signiicativas do que para os subgrupos que os compõem. Basta reconhecer que as taxas masculinas são quase o dobro da taxa da população e a prevalência para esse grupo mostra que o mesmo apresenta características especíicas que devem ser consideradas para a sua proteção. Igualmente, os dados mostram que a série histórica masculina apresenta características próprias, com variações distintas da série histórica feminina, cujas taxas são menores ao longo do tempo. Embora todos reconheçam que a criminalidade apresenta causalidades diversas e modos também diversos de prevenção, a resposta governamental mais consistente na última década consistiu no aumento massivo do encarceramento (ver Gráicos 4 e 5). A taxa de encarceramento setuplicou e o número de presos decuplicou no período 1998-2012. A taxa passou de 78,4 para 566.4 por 100 mil (19982012), e triplicou nos período 20032012 (passou de 193,3 para 566,4 por 100 mil). As taxas de encarceramento masculino e feminino triplicaram de 2003 a 2012. Projeções para 2013 e 2014 mostram que a meta é consolidar o encarceramento masculino superior

Feminino

Masculino

Esp. Santo

Gráico 3 - Taxa por 100 mil de mortes por homicídio (99%), agressões e intervenções legais, total e por sexo no ES (1980-2010) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS. Deivison Souza Cruz

3

2. Valores possivelmente sem atualização monetária. Fonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2007-2011) http:// www2.forumseguranca.org.br/node/26

1.197,3

620,3

571,0

84,6

2011

82,1

938,5 65,4

2010

576,5

67,2

2009

490,3

437,5 87,1

2008

428,6

405,9 72,9

2007

102,0

806,9

756,7

667,6 354,9 57,7

613,1 326,2 51,7

2005

2006

315,1

604,5

289,3

38,2

138,7

2002

30,9

121,3

2001

195,5

102,5

2000

28,6

98,9

78,1

1999

400,0

2004

600,0

200,0

559,3

800,0 369,9

Taxa (100 mil)

1000,0

809,6

1200,0

1.017,6

1400,0

Espírito Santo

Masculino

2014

2013

2012

2003

1998

0,0

Feminino

Masculino

15950 17201

15810

1251

2014

14646 1159

2013

12707 1343

11618

2012

870

854

2011

9933

2010

10713 1095

2009

8883

9618

9784 901

722

2007

Espírito Santo

2008

8658

6744 594

2006

7936

6543 432

2005

0

5860 338

2885

2002

2004

2486

2001

3819 309

2063

2000

2003

1800

2000

1999

4000

1400

6000

4128

8000

7338

6198

10000

6975

12000

1998

Número de presos

14000

10803

16000

12472

18000

14790

Gráico 4 - Taxa de aprisionamento total e por sexo no estado do Espírito Santo (1998-2012 e projeções 2013-14). Fonte: Ministério da Justiça. Projeções 2013-14: Secretaria de Justiça-ES. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS.

Feminino

Gráico 5 - Número de presos, total e por sexo no estado do Espírito Santo (1998-2012 e projeções 2013-14) Fonte: Ministério da Justiça. Projeções 2013-14: Secretaria de Justiça-ES. 6455 6000 5000 4000 2747

3000 1641 2000

1429

1000

1119

2394

Entorpecentes (S+Q)

Roubo (S+Q)

Homicídio (S+Q)

Est. Desarmamento

dez.12

jun.12

dez.11

jun.11

dez.10

jun.10

dez.09

jun.09

dez.08

jun.08

dez.07

jun.07

dez.06

jun.06

0

dez.05

número de presos

a 1% dessa população, cristalizando o encarceramento em massa como política de segurança. Os gastos com segurança pública no ES crescerem 70% em valores brutos de 2005 a 2010 (elevou-se de R$ 128,19 para R$ 218,71 per capita2). Em grande parte, a elevação dos investimento consistiu em custos de reequiparação da polícia e com o sistema prisional. Se são válidos os axiomas (i) maior investimentos, menos crimes; (ii) maior encarceramento, menos crime, e se houvesse uma (iii) relação sine qua non entre tráico e homicídios, então esses dois crimes teriam recuado. Antes de associar mecanicamente esses dois fatos, observa-se que a redução de 50% de aprisionamento de homícidas em 2008 (Gráico 6) precedeu o recorde das taxas em 2009 (57 por 100 mil) e, em 2011-12, a taxa de homicídios do ES estabilizou-se em 50 por 100 mil, patamar equivalente à média da década de 2000. Somemnte em ins de 2012 houve recuperação no número de presos por homicídio, somando 2394 acusados em dezembro desse ano. O senso comum e o enfoque jornalístico tem apontado que vitimas juvenis de homicídio contam com histórico criminal, sobretudo tráico de drogas, situando nesse vínculo a explicação para as elevadas taxas de mortes por homicídio. Evidências empíricas que suportam esse diagnóstico devem existir, tal como exame toxicológico das vítimas/ agressores e solução de milhares de inquéritos policiais que explicitem a motivações e envolvidos nos crimes. Mas essa conclusão depende ao menos da inalização de mais de 17 mil mortes ocorridas nos anos 2001-2010, ou pesquisa especíica para tanto. Os dados mostram que a elevação do encarceramento de 2005-2012 focou-se no tráico de drogas e contra o patrimônio. Aparentemente essa medida teve efeito modesto na variação

1.334,3

Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Furto (S+Q)

Gráico 6 - Número de presos para os principais crime no estado do Espírito Santo (dez/2005-dez/2012) Fonte: Ministério da Justiça. S+Q= crime simples + qualiicado Deivison Souza Cruz

4

Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Deivison Souza Cruz

6421

5897

6160

6198

5223

2265

2381

jun.12

dez.12

5059 2108

dez.11

5788

5720 1139

jun.11

1597

dez.10

4322

4845

5737

4584 1508

1294

dez.09

jun.10

5047

5724 1142

4263

5804

jun.09

3434

2958

985

dez.08

5929 666

jun.08

2554

5310 766

dez.07

2501

5297 471

jun.07

4775

2167

321

dez.06

4616

2193

327

jun.06

2179

4590

2179 206

dez.05

Número de presos

das taxas de mortes por agressões (homicídios em 99% dos casos). Os 6000 Gráicos 4, 5 e 6, comparando com o 5000 Gráico 3, levantam essa questão com muita propriedade. Além disso, re4000 duções das taxas de homicídio ocor3000 reram em períodos anteriores mesmo com menor investimento dos gover2000 nos. Como observado no Gráico 3, re1000 duções de 10% ocorreram no compara0 tivo entre os anos 1999/1998, de 10,8% de 2000/1999 e de 5% de 2005/2004. Períodos de retração e estabiProvisórios(PC/SP) Fechado Semi Aberto lidade tem sido seguidos por elevação posterior. Uma vez que Gráico 7 - Número de presos por regime de aprisionamento no estaas taxas se mostram refratárias do do Espírito Santo (dez/2005-dez/2012) Fonte: Ministério da Justiça. Obs.:PC=Pol. Cívil; SP=Sist. Prisisional. às inovações na política de segurança pública, o problema consiste na manutenção de de- as mortes não recuaram no período em igual procrescimentos. Dado que se desconhece se níveis atuais porção ao aumento do encarceramento (redução de encontram-se em ponto de descenso ou de saturação, 6 pontos por 100 mil de 2009 para 2010). É preciso é prematuro apontar um cenário otimista. Para re- saber porque isso ocorreu. As taxas de mortes elevarsponder o que leva a redução é preciso compreender am-se mesmo nos anos de maior encarceramento. o que levou as taxas atuais, e atuar nesses fatores. De modo inicial, se a conexão causal entre droOs dados mostram que no período 2003-2012 a gas e homicídios fosse direta, maior aprisionamenelevação do encarceramento priorizou os envolv- to de envolvidos em tráico reduziria os homicídios idos com entorpecentes, crimes contra o patrimô- e, mesmo havendo conexão forte, estaria associada nio (furto e roubo), crimes de armas e homicídios àqueles envolvidos em homicídio qualiicado, e de (Gráico 6). Associação a esses crimes cinco crimes modo fraco aos envolvidos em tráico em geral. A subiu de 75% dos presos em 2005 para 107% destes expectativa que um “choque de ordem” reduziria as 2012. Em 2012, no geral, mais que uma a cada duz- taxas não se realizou. Mostra-se prematuro airmar entas pessoas do ES maiores que 18 anos encon- que a pequena redução para uma média de 50 mortes tram-se cumprindo penas criminais. 1,3% da popu- por 100 mil ocorrida após 2010 deriva unicamente lação masculina encontra-se presa (ver Gráicos 4 e da política de segurança adotada nos últimos anos. 5) e para os jovens do sexo masculino (15-29 anos) Mais adiante, nos Gráicos 10, e comparando 2006 o encarceramento em 2012 ultrapassou a proporção com 2010, é possível perceber que a redução das taxde 1 preso para cada 50 no subgrupo populacional as ocorreu sobretudo na faixas etárias 20-50 anos. A (ver Gráico 15). Embora tenha decaído a proporção medida que elevou-se o encarceramento juvenil masde presos na Policia Cívil e em situação provisória culino de 18-30 anos (Gráico 15), ocorreu também (de 65% em 2005 para 43% em 2012), número deles melhoria dos indicadores economicos e sociais da elevou-se no período (passou de 4590 em 2005 para última década, possível expansão do mercado ilegal 6421 em 2012 (Gráico 7). Mas a rotatividade desses de drogas e redução das desigualdades de gênero. pode revelar uma proporção ainda maior de pessoas Operando em conjunto, tais efeitos tem maior podque com passagens pelo sistema prisional. A rigor, o er explicativo do que um ou outro fator isolado. A Gráico 7 mostra que o número de presos na Policia equação social é mais complexa do que aparenta Civil e em situação provisória nas penintenciárias a primeira vista. De modo mais amplo, possíveis manteve-se elevado mesmo nos anos em que graves certezas dependem que as hipóteses sejam testadas, denúncias de violação aos Direitos Humanos pesar- indo bem além das descrições apontadas nesse texto. am sobre o sistema de justiça do ES. Em resumo, os dados chamam a atenção para 1.2. Escolhendo vítimas e presos o fato que a prioridade dada aos crimes de entorAs principais vítimas de homicídio são aqueles pecentes, patrimônio (furto e roubo) e armas de com menor poder social: jovens do sexo masculino, fogo teve efeito tangencial na variação das taxas pretos e pardos, com baixa escolaridade e residinglobais de mortes por agressões (homicídios, etc.). do nos subúrbios e bairros com alta concentração Comparando-se os Gráicos 3 e 4, conclui-se que de pobreza nos municípios metropolitanos e nas

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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

cidades polo. Ao mesmo tempo, esse segmento é do SIM-DATASUS, as diferenças de proporção entambém o que se encontra desproporcionalmente tre negros e brancos aprisionados e mortos levanno sistema prisional do ES, por crimes de tráico de tam o problema da relação entre viés racial, inserção drogas, contra o patrimônio (furto e roubo), crimes criminal e aprisionamento, e chamam a aenção para previstos no Estatuto do Desarmamento e hom- a relação entre condições socioeconômicas e trataicídios. A similaridade entre peris de vítimas de mento das instituições de controle social e acesso homicídios e população prisional permite airmar à justiça. De outro modo, o problema consiste em que os processos sociais encontram-se vinculados e identiicar a relação entre diferenças socioeconômicas por peril racial, ou seja, como diferenças socioecselecionam suas vítimas. Considerando os dados da população prisional, onômicas por peril étnico/ racial afetam a inserção percebe-se que 90% (anos 2003-2011) são do sexo criminal. Em outra direção, trata-se de compreender masculino e, do total, 60% (sexo masculino) tem como o rótulo racial é uado para diferenciar a atuorigem na região metropolitana. Sozinhos, os presos ação das instituições policiais e de justiça, induzindo de 18-24 anos compõem 39,4% (média 2005-2012) seletividade penal. Quanto à escolaridade, 77,3% dos presos (2005do total do ES e, somado com os de 18 à 29 , aproxi2012) têm, no máximo, oito anos de estudo. Esse mam-se dos 2/3 da população prisional. Igualmente, 90% das vítimas de mortes por agressão (1980- percentual é congruente com a escolaridade declara2010) são do sexo masculino. Considerando idade da das vítimas de mortes por agressões (1980-2010). das vítimas, jovens (15-24 anos) metropolitanos do Entretanto, escolaridade também é uma informação sexo masculino, eles compõem quase 30% do total frequentemente omitida na base do SIM-DATASUS de mortes do ES (1998-2010) e, considerando 15-29 do ES após 1996, cobrindo apenas 15,5% dos casos anos, chegam a 40% das mortes no mesmo período. (1996-2010). Ainda assim, ¾ das vítimas - em média Para o período dezembre/2005 à dezembro2012, e para os casos com informação declarada – tem no presos do sexo masculino preto/pardos somaram máximo oito anos de estudo. Já para o período anteri3/4 em do total de presos do ES. Comparando a pro- or 1980-1995 (com 52% de cobertura da informação), porção racial de presos com a proporção racial da 93,1% tinham, em média, até oito anos de estudo. As taxas de aprisionamento por idade e as taxas população do estado do ES (IBGE 2009), percebe de mortes por agressões na região metropolitana reque negros do sexo masculino são proporcionalmente quase duas vezes mais aprisionados. Eles são forçam esse argumento. Embora não se tenha os da8,5% na população do ES e 17% dos encarcerados. dos para o sistema socioeducativo (até 18 anos), daPardos apresentam igual proporção prisional. En- dos do Ministério da Justiça revela que jovens até 29 quanto os brancos na população são 41,2%, dentre anos compõem mais de 60% do que cumprem pena no ES. Considerando as taxas de mortes, por faixa os presos são menos que 20%. Embora com menor precisão das bases de dados etária para o sexo masculino – que compõem 90% das mortes por agressões-, percebe-se que variam ao londe mortes do SIM-DATASUS, a saliência racial de pardos/ negros converge com à encontrada para as vítimas de mortes por agressões (homicídios, lesão seguida de morte, intervenções legais). Ressalva-se que informação racial é frequentemente omitida nas bases de dados do SIM-DATASUS para o ES, homens pretos/ pardos compõem em média 55% em média do total de vítimas de agressões (2001-2010). Em 2010, com melhoria da informação, a proporção das vítimas de agressões que apresentam conjuntamente essas características subiu para 2/3. Portanto, os dados reforçam que o peril de Gráico 8 - Média de idade de vítimas masculinas de homicídio (99%), gênero, idade, escolaridade e étnico/ agressões e intervenções legais, grupo de cidades ES (1980-2010). racial das vítimas. Fonte: SIM-DATASUS; Nesse sentido, ao que pese as difer- RMGV: Cariaca, Fundão, Guarapari, Serra, Viana, Vitória e Vila enças entre os critérios de identiicação Velha; Cidades polo: Anchieta, Aracruz, Cachoeiro de Itapemirim, racial do IBGE, do sistema prisional e Colatina, Linhares e São Mateus. Deivison Souza Cruz

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Gráico 9 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais na Região Metropolitana da Grande Vitória - ES (1982/1986/1990/1994) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS. 450 400

Taxa (100 mil)

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Gráico 10 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais na Região Metropolitana da Grande Vitória - ES (1998/2002/2006/2010) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS.

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Taxa (100 mil)

go do tempo e pelo peril das cidades. A partir desses insights, buscamos compreender a mudança da variação das taxas por faixa etária para o sexo masculino para três grupos de cidades do ES, Região Metropolitana, Municípios Pólo e Demais Municípios. Conforme o Gráico 2, o ES já conta com média de idade das vítimas de homicídio abaixo da média nacional. A redução da idade das vítimas ocorreu principalmente na RMGV e Municípios Pólo. Na Região Metropolitana da Grande Vitória a redução da idade das vitimas masculinas (Gráico 8) ocorre em quase todo o período 1980-2011. Na RMGV, a idade média das vítimas masculinas caíu de 33 anos (19821983) para 27,5 anos em 2011 (-5,5 anos). A partir de 1995, percebe-se redução nos Municípios Pólo, reduzindo-se de 32,5 para 28,5, logo - 4 anos. Nos Demais Municípios esse processo é menos evidente, porém, aponta-se para redução da idade média das vítimas masculinas após 2003. Comparando o fenômeno a partir dos Gráicos de taxas de homicídios por faixa etária ra a Região Metropolitana (Gráicos 9 e 10), as taxas de morte juvenil (15-19 e 20-24 anos) masculina já encontravam-se próximas a 50 por 100 mil em 1982. A partir de então, a taxas cresceram em todas as faixas etárias, mas passaram a concentrar-se nos mais jovens. Em 1994 chegou em 178,5 por 100 mil para a faixa 15-19 anos, passando por 279,4 por 100 mil dentre 20-24 anos e 258,6 para 25-29 anos. Ainda para a Região Metropolitana, de 1998 a 2010 (Gráico 9) a taxa masculina de mortes por agressão elevou-se mais ainda e concentrou-se ainda mais dentre os jovens. Observa-se que ocorrem reduções das taxas em todas as faixas etárias abaixo dos 50 anos, principalmente dentre os com idade nas faixas 20-29 anos. Nesse sentido, a redução das mortes nos anos recentes (10% no comparativo 2011/2010) advém do grupo masculino metropolitano acima de 20 anos de idade. Entretanto, mesmo para o melhor ano, de 2010, a taxa de juvenil (15-19 anos) encon-

1994

Gráico 11 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais nos municípios polo do ES (198286-90-94) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS. Deivison Souza Cruz

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Gráico 12 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais nos municípios polo do ES (1998/2002/2006/2010) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS.

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Gráico 13 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais nos demais municípios do ES (1982/1986/1990/1994) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS. Demais municípios: excluído RMGV e cidades polo do ES. 100 80 60 40 20

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Taxa (100 mil)

tra-se em 378,3 (por 100 mil). Um recorde histórico considerando que supera em quase oito vezes a taxa para o conjunto da população do ES, que ica em 50 mortes por 100 mil, independente de gênero, idade e sexo. As cidades polo do ES passaram por mudanças nos padrões de mortes masculinas. Os Gráicos 11 e 12 revelam que essas cidades mudaram de um padrão rural – com de mortes dispersas ao longo do curso de vida da população masculina -, e se aproximando na última década de um padrão cada vez mais parecido com o metropolitano, em que as taxas elevam-se e tornam-se cada vez mais concentradas nas faixas etárias juvenis. Percebe-se que houve aumento considerável das taxas ao longo das décadas 1980-2000, mas na primeira década analisada (Gráico 11), ocorreu em todas as faixas de modo igualmente proporcional. Para os municípios polo, de meados da década de 1990 e ao longo da década de 2000, as taxas masculinas concentraram-se cada vez mais nos grupos etários juvenis (Gráico 12). De 1998 em diante a distribuição das taxas passa a assumir um peril mais parecido ao metropolitano. As linhas de 1998, 2002 e 2006 mostram que as taxas concentram-se cada vez mais dentre as faixas etárias mais jovens. A linha para o ano de 2010 mostra-se isso de modo evidente. Em 2010, as faixas 15-19 e 20-24 anos aproximaram-se de 200 mortes masculinas por 100 mil. Os dados revelam que essa tendência ocorreu lentamente ao longo dos anos. Nos demais municípios – que compõem as cidades que não são metropolitanas nem polo -, há grande variação nas taxas masculinas por faixa de idade (ver Gráicos 13 e 14), e o crescimento das taxas ocorreu de modo mais lento do que nos municípios polo e Região Metropolitana. A rigor, as taxas mostraram-se em patamares elevados, acima dos 50 por 100 mil habitantes para as faixas acima de 25 anos até 60 anos. Já de 1998 em diante observa-se o início da concentração das taxas entre os jovens. Assim como nas

2010

Gráico 14 - Taxa de mortes masculinas por homicídio (99%), agressões e intervenções legais nos demais municípios do ES (1982/1986/1990/1994) Fonte: SIM-DATASUS. Projeções Populacionais: IBGE/DATASUS. Deivison Souza Cruz

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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

Deivison Souza Cruz

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Taxa (100 mil)

2323,4 cidades polo, o patamar mais elevado 2005,8 para o grupo juvenil tem sido no ano 2000,0 mais recente (2010), que atinge 100 mortes por 100 mil habitantes (15-19 1500,0 1384,1 e 20-24 anos, ver Gráico 14). Trata-se de um recorde histórico, ainda que 1000,0 758,2 metade dos níveis mais recentes dos 667,4 664,2 municípios polo e ¼ dos observados 500,0 532,7 na Região Metropolitana em 2010. 274,1 259,6 150,7 76,3 18,2 Em síntese, ao contrário de disper0,0 sar-se na população, a vítima típica do crime de homicídio é jovem, pretos 18-24 25-29 30-34 35-45 46-60 61 ou+ ou pardo, com baixa escolaridade e da região metropolitana. Não é a socieGráico 15 - Taxa de encarceramento masculino (100 mil hab.) no dade em geral, mas o peril apontado ES por faixa etária(dez/2005-dez/2012) a vítima principal do crime de homFonte: Ministério da Justiça icídio. Quando se trata da população carcerária os dados cobrem apenas os anos mais idade importada - resultante do processo migratório recentes, mas a conclusão é a mesma. Repete-se o do ES nas últimas décadas -, (iii) ou, mais comuperil etário juvenil (ver Gráico 15), negros/ pardos mente a criminalização da pobreza. Há argumentos e com baixa escolaridade com as maiores taxas de também do crime como uma escolha individual raencarceramento. Os últimos governos investiram cional, e quais fatores sociais pouco importam. no encarceramento em massa como solução para a Tais enquadramentos são falsos. Há mais de um segurança pública e é pouco provável que esse quad- século pesquisas provam que fatores sociais diverro mude no médio prazo sem que investimentos em sos explicam a criminalidade. Para diferentes conprevenção sejam realizados. textos culturais, mudanças sociais rápidas elevam as As taxas masculinas de encarceramento crescer- taxas de crime, independente do grupo social/racial am anualmente em média 12,7% de 2003 em diante que passou pelo processo. E estudos contemporâne(ou 4% por semestre a partir de 2005), e as taxas os reconhecem o peso de privação e desigualdade femininas quase o dobro, 17,02% ao ano a partir de como pressões para o crime – e não da pobreza, 2003 (sendo 10,1% por semestre de 2005 à 2012). isoladamente. Resultados apontam que pressões deDe 2005 a 2012 as taxas de encarceramento juve- pendem também do viés institucional. nil masculino de 18-24 anos elevaram-se de 664,2 A hipótese da invariância racial considera que a (menor que 1/100) para 2323,4 (maior que 1/50) mudança social e a baixa efetividade estatal se aspor 100 mil e, para a faixa 25-29 anos, passou de sociam a elevação dos níveis de crime. Isso porque 758,2 para e 2005,8 por 100 mil, respectivamente rápidas mudanças sociais macrossociais geram frag(Gráico 15). Signiica que os governos mantêm sob ilidade institucional e baixa efetividade familiar e incustódia mais que 1 a cada 50 jovens do sexo mas- stituições ao nível de comunidade. É preciso lembrar culino no ES na faixa 18-29 anos. Dados desagrega- que nas últimas três décadas o ES combinou crescidos de origem dos presos para municípios e bairros mento econômico, desigualdade e exclusão social e (RMGV, por ex.) , podem apontar para taxas ainda ausência/baixa efetividade das políticas de prevenção maiores a depender de comunidade e peril racial. criminal; e o resultado dessa equação perversa têm Em resumo, trata-se do encarceramento em massa sido as altas taxas de homicídio. De modo lento, a como política de segurança pública. realidade atual conformou-se ao longo de mais de ¼ de século, tendo socializado uma segunda geração. 2. Mudanças macrossociais e tensões Porém, mais importante que reconhecer o fato, há individuais a necessidade de salvar vitimas potenciais – que são prioritariamente as crianças e os jovens de hoje - por 2.1. Mudanças macrossociais meio da redução da inserção e da deliquência/ reinOs dados descritos tornam necessária alguma cidência, bem como prover políticas de prevenção e interpretação. E uma resposta comum, e evidente- punir os homícidas. Elevadas taxas de homicídio jumente falsa, defenderia para a tendência “natural” venil têm mobilizado o discurso de genocídio da jupara a delinquência e criminalidade (i) dos negros e ventude. Todavia, não é a sociedade, mas os jovens as pardos vis a vis aos brancos, ou a tese da (ii) criminal- vítimas diretas de homicídio. As vítimas diretas são,

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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

com maior frequência, homens jovens pobres pretos/ pardos, com baixa escolaridade e residentes nos bairros podres metropolitanos e cidades polo. Bairros de maior saliência desse problema apresentam déicit ou baixa qualidade das políticas públicas. A menor comoção frente ao fatos decorre menos da maior frequência com que isso ocorre (saturação), e mais pela interpretação corrente do menor valor da vida dessas pessoas. Embora qualquer resposta precisa dependa de pesquisa social ou investigação de milhares de crimes, ao se aceitar a tese de que a inserção criminal aumenta a probabilidade de vitimação de homicídio - ao invéz do fatalismo e naturalidade frente ao problema -, a pergunta desloca-se para os fatores que explicam a inserção criminal e a permanência desses jovens no crime, e se são vitimas de pares igualmente inseridos em crime e delinquência, vinganças ou ações de extermínio. A ênfase para a pesquisa cientiica precisa conectar as causalidades sociais macro e microssociais de modo a orientar políticas de prevenção e coerção capazes de reduzir os níveis de crime. O fato a ser reconhecido é que taxas de mortes por agressão no estado ES são historicamente elevadas. É um equivoco airmar que se devem unicamente ao crescimento do tráico de drogas na última década. Em uma hipótese contrafactual, se toda a elevação da última década se devesse apenas ao tráico de drogas, o impacto histórico seria no máximo 25% maior que na década de 1990 (40 por 100 mil na década de 1990 versus 50 por 100 mil anual – década de 2000). Ainda que dinâmicas do tráico de drogas resultem em homicídio, o debate mais efetivo relaciona-se às causalidades que explicam a inserção e mantém os vínculos de crianças e jovens com a delinquência (incluindo tráico de drogas) e os impactos das instituições de controle social na internalização de rótulos desviantes. Além disso, com milhares de inquéritos não concluídos, parca pesquisa social local e políticas governamentais de prevenção raras, recentes ou pouco avaliadas -, é certamente difícil que

haja redução consistente de homicídios no médio prazo (quatro anos seguidos). Apontamos aqui, com alguma certeza, para a similaridade entre o peril das vítimas de agressões (1980-2010, 99% homicídios) e dados agregados da população prisional do ES (2005-2011). Essa similaridade não credencia a tese de que jovens com as características listadas sejam todos delinquentes ou mesmo que todos os envolvidos com entorpecentes sejam homicidas. Cabe compreender como as mudanças sociais no âmbito da família e comunidade resultam em pressões para o crime. No caso macrossocial, a Escola Sociológica de Chicago(Cruz, 2011) foi a primeira em formalizar, como teoria, que transformações socioeconômicas – como o conjunto de migração rural-urbano, crescimento econômico e populacional e expansão dos valores de mercado – são acompanhados de aumento de desigualdade e segregação sócio-espacial. Rápidas mudanças socioeconômicas geram mudanças culturais, comportamentais e desorganização social ao nível de comunidade, sinalizando para pressões diversas para o crime e delinquência. A socialização adversa implica na diiculdade das famílias e escola orientarem normativa as novas gerações. Tais processos complexos ocorreram conjuntamente na região metropolitana do ES nas últimas décadas, cristalizando uma dinâmica em que crianças e jovens são expostos e aliciados diariamente para o delito. Nas últimas décadas muito se tem falado do chamado “enfraquecimento moral da família”, mas o fato é que foi acompanhado da menor eiciência do Estado. Não se trata de culpar um ou outro, ambas as instituições envolveram-se no mesmo processo (ver Teoria da Anomia Institucional). Governos e famílias comportaram-se de modo atabalhoado frente à necessidade de orientação normativa das novas gerações. Baixa assistência social, concentração de pobreza, habitações precárias, fracasso escolar, ineiciência policial e da justiça emergem como problemas conjuntos na provisão de recursos sociais e da ordem pública nos bairros pobres. Mais recentemente, o processo de expansão da

Deivison Souza Cruz

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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

criminalidade para o campo – identiicado a partir da mudança peril etário das vítimas masculinas de agressão – signiica a convergência de dinâmicas sociais urbanas no meio rural, sobretudo nas cidades pólo. Isso signiica que, mantido o cenário atual, a consolidação das taxas metropolitanas em patamares elevados será cada vez mais acompanhada do crescimento de homicídios nas cidades polo e demais municípios do ES. Por im, percebe-se que o estágio incubado de mudanças nos municípios rurais tem implicado na elevação - ainda que em intensidade menor que nos municípios metropolitanos e cidades polo - de suas taxas juvenis de homicídio. A maior complexidade e crescimento dos problemas sociais urbanos das décadas de 1980 e 1990 mostrou-se paralela a retração na capacidade de planejamento dos governos estaduais, bem como de coordenação entre os governos federal e municipal. Tais problemas não foram sanados na última década e atual. Concentração de pobreza, degradação física, domicílios subnormais(coabitação, aluguéis e déicit de infraestrutura), mobilidade residencial, cotidiano de negócios ilegais fazem parte do histórico dos bairros que contam hoje com maior número de homicídios. É provável que a lista dos bairros ou comunidades com maior número de homicídios nessa década seja semelhante comparada às décadas passadas. As respostas aos desaios de uma ordem social urbana foram protelados, cristalizando uma sociabilidade baseada em conlitos. O sentimento de desordem e retenção de criminosos em bairros pobres deve-se ao império da delinquência juvenil como um padrão das relações sociais e de vizinhanças (Burgess, 1926; Shaw; McKay, 1942), mas também por crimes de honra (vingança, homicídio passional) e motivos fúteis. A respeito dos jovens, desorganização social(Sampson; Groves, 1989) é deinida pela baixa capacidade das comunidades e famílias em exercerem de modo eicaz o controle social sobre crianças e jovens, dirigindo a conformidade desses para os valores e normas convencionais (focada no retorno a longo prazo do estudo e trabalho).

2.2. Espiral de emoções negativas As descrições explicam como mudanças sociais no nível macro se relacionam com o aumento do numero de crimes e possíveis impactos relacionados aos governos, comunidades e famílias. Se na década de 1980 a geração adulta dessa década vivenciou a criminalidade associada ao atrito das estruturas de sociabilidade rural frente as novas demandas do meio urbano metropolitano, a geração mais jovem foi socializada também em meio a esse conlito, mas também com as novas tensões sociais decorrentes da socialização adversa que compõe o cotidiano urbano, vide os efeitos da desigualdade, concentração de pobreza e expansão dos desejos de consumo. Falta compreender, quais as tensões que criam pressões para o crime, fazendo com que jovens, principalmente, considerarem a transgressão como alternativa. Para responder essa questão mobilizamos a Teoria Geral da Tensão (GST – General Strain heory). Formulada pelo sociólogo Robert Agnew (1992, 1999, 2001), essa teoria vincula o crime às tensões individualmente vivenciadas (estressores), que são resultantes tanto de socialização e interações adversas quanto de fatores conjunturais. Por uma série de fatores, se os indivíduos não sabem lidar com as tensões, então o crime será uma resposta provável. Em diversos estudos empíricos resultados apontaram que o crime é uma resposta provável quando (i) há percepção de incapacidade de alcançar, por meios legítimos, metas socialmente desejáveis; (ii) pela perda de estímulos positivamente valorizados e (iii) pela presença real ou prevista de estímulos negativos. Agnew destaca que crime associa-se ao stress e raiva, afetando mais os homens pelo fato destes projetarem sobre os outros sua condição adversa. As tensões sofridas pelo indivíduo levam ao crime quando (a) as tensões são vistas como injustas; (b) são elevadas em magnitude; (c) as tensões são recentes/ centrais e, (c) associadas ao baixo controle social (d) terminam por criar pressões para o crime. Há situações de degradação - objetiva e subjetiva –

Deivison Souza Cruz

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Juventude, criminalidade e aprisionamento no estado do Espírito Santo: alguns dados e hipóteses

do indivíduo, e se as pessoas não se sentem tratados como consideram serem tratadas, então uma resposta criminal torna-se provável. Estressores relacionam-se ao que Agnew compreende como “domínios de vida” – que são os ambientes/ situações – envolvem a dimensão (a) individual (comportamental), (b) familiar, (c) escolar e (d) do trabalho. Destacam-se como dimensões que elevam chance de resposta criminal o nível baixo Dimensões

de autocontrole (individual); (ii) práticas parentais inapropriadas, relações conjugais degradadas e não casamento (casamento); (iii) experiências escolares negativas (escola); (iv) Associação com pares delinquentes (redes de amigos/ bairro-comunidade) e (vi) desemprego/ trabalhos degradados (trabalho) (ver Agnew, 2004, p. 40–64). Ao longo de seus artigos, Agnew lista diversas variáveis/estressores elevam a probabilidade de resposta criminal:

Dimensões e extressores na Teoria Geral da Tensão Variáveis (descrição)

I - Impossibilidade de atingir metas socialmente desejáveis

• Suporte social e educação: visão negativa da escola, desistência e abandono de metas educacionais; baixa autonomia juvenil; déicit de apoio social; crenças desviantes (extremismo, racismo e subculturas da delinquência); • Renda e desigualdade: altos níveis de desemprego juvenil; endividamento, redução e insatisfação de renda; sofrimento psíquico decorrente de privação relativa e desigualdade; • Degradação comunitária: infraestrutura urbana precária e baixa efetividade política.

II - Perda de estímulos positivos

• Suporte parental: atenção parental ausente, rejeição ou ruptura parental, cuidado infantil inadequado, negligência e baixa supervisão, sentimento persistente de injustiça.

• Tensão intra-familiar/ comunitária: conlito persistente, pais envolvidos com crime, agressões físicas ou psicológicas na família, escola, trabalho e comunidade; III - Presença real ou • Histórico de eventos negativos: eventos na família, baixa autoconiança individual e agreprevista de estímulos gada (comunidade, escola e trabalho); negativos • Baixo status social: sentimento de discriminação social/racial; concentração de pobreza e altos níveis de incivilidades ao nível de comunidade; I- Metas bloqueadas; II - perda de estímulos positivos e III estímulos negativos

• Abuso infantil, vitimização prévia e uso/tráico de drogas; • Moradia: famílias sem teto e precariedade de moradia (coabitação, baixa infra-estrutura); • Trabalho: trabalho precário, mal pago, sem qualiicação ou valorização. • Pobreza: individual e geograicamente concentrada;

I-Metas bloqueadas e • Preparo prévio familiar inadequado para o ambiente escolar, baixo apoio social e preII - perda de estímu- cariedade de políticas públicas, desemprego persistente (individual e comunitário) los positivos • Histórico de agressão física/psicológica na escola família, durante a infância e adolescência; • Masculinidade vinculada ao confronto, visão positiva de amigos delinqüentes. • Pares: pertencimento/proximidade com amigos delinqüentes ou gangues; Fonte: Agnew, 1992, 1999, 2001, 2004; Agnew et al., 2002.

I- Metas bloqueadas e III - estímulos negativos

Socialização e sociabilidade adversa no âmbito familiar, escolar, comunidade e trabalho sobrepõem estressores que, operando simultaneamente, de modo continuo, cumulativo e não linear, impactam na diiculdade das pessoas – sobretudo jovens – em lidarem com as situações adversas que envolvem privações matérias, emocionais e afetivas. Estressores criam uma teia de emoções negativas, e essas emoções são um traço comum a uma série de crimes e deliquência (uso/tráico de drogas, agressões, furtos e roubos, etc.). A teoria considera que na maior parte dos crimes, e sobretudo na delinquência, as pessoas agem motivadas por condições adversas que as tornam míopes frente as consequências do atos praticados.

Agnew sintetiza o mecanismo causal nos termos de que o stress engendra uma espiral de emoções negativas, e as emoções negativas elevam a raiva que, por sua vez, (a) reduz/anula o sentimento de culpa. Isso porque a pessoa com raiva (a1) avalia que a injustiça sofrida justiica uma resposta criminal. (a2) Ela passa a ver o crime sob uma perspectiva favorável. A raiva também (b) impede a cognição de opções não criminais – pois a pessoa passa a (b1) ignorar informações que levam a respostas alternativas, (b2) a raiva reduz reduz os custos reais e percebidos do crime. Por im, (c) a raiva energiza o indivíduo para a ação – pois, apesar da situação adversa, a raiva (c1) eleva a sensação de poder e controle, traduzindo (c2) o desejo de compensação ao contexto adverso por meio de retaliação e vingança.

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3. Gangues e rotulagem institucional 3.1. Modelos de comportamento Tensões sociais explicam provável resposta criminal individual. Mas o crime, sobretudo delinquência juvenil, envolve jovens em grupos. Envolvimento de jovens com transgressão emerge do envolvimento, desde a infância, em atividades não monitoradas por adultos ou responsáveis, consistindo no não exercício dos jovens em atividades e referencias com os modelos convencionais de comportamento. Os grupos de delinquentes juvenis emergem dos laços que vão da infância à juventude na vizinhança que, a partir de certo momento, estruturam normas, valores e modelos de comportamento que se opõe às normas convencionais. Para muitos jovens do sexo masculino que vivenciam cotidiano adverso de recursos escassos (afetivo, materiais e ausência de metas elevadas de sucesso por vias convencionais) - em comunidades com o baixo preparo prévio para a escola - o fracasso escolar reduz as vias convencionais de sucesso no mercado de trabalho. A porta da saída da escola é a mesma que abre para o comportamento desviante. A delinquência reduz as oportunidades legítimas por meios convencionais, compondo um processo lento e cotidiano em que emergem os padrões de recompensa, reconhecimento, poder, respeito, dinheiro, acesso a mulheres e status ligados ao crime. Esses simbolos materiais e imateriais não dependem de grandes investimentos em escolaridade ou habilidades obtidas via treinamento formal. Na verdade, a própria inserção na delinquência é condicionada pelo abandono e fracasso escolar anterior qu bloqueando o sucesso econômico convencional posterior. Comunidades com alta concentração de desvantagens estruturais (fragilidade econômica, familiar e baixa efetividade de políticas públicas) muitos jovens desejam formar sua própria gangue (galera, turma, “bonde”) ou adentrar nos grupos existentes. A integração ao consumo apresenta componentes de status, pois as mesmas metas e símbolos de status via consumo induzidos e bloqueados pelas vias

convencionais. Além disso, ação criminal compreende altas doses de desespero, e uma via alternativa para adquirir recursos materiais e simbólicos que dão signiicado e proveem inserção e reconhecimento social. Valores e opiniões favoráveis ao crime e a prática de crime mostram-se inter-relacionados. Mas há mediações importantes, sobretudo a precariedade das condições de vida em bairros suburbanos degradados. A concentração geográica de pobreza, abandono escolar e estigmatização funcionam como indutores dos vínculos dos jovens com as gangues e criminalidade posterior. Matza et. ali (Matza; Sykes, 1961; Matza; Berkeley Un., 1964; Matza, 1969) identiicam três aspectos para a relação entre subcultura do crime, gangues juvenis e práticas de delitos: (i) quando valores, normas, metas, símbolos e rituais de delinquência elevam a coesão do grupo (normas criminais induzem coesão); (ii) quando a delinquência orienta-se pelos valores e normas direcionadas ao delito (normas criminais induzem infrações), e (iii) quando a condição de delinquência é reconhecida (auto-reconhecimento). Os valores comuns orientam a transgressão e coesão, reforçando-se mutuamente. Schwartz (1987) identiica sete características que identiicam as gangues juvenis: (i) por selecionarem seus membros; (ii) pelo caráter informal das regras, normas e valores; (iii) pela oposição aos valores e normas convencionais; (iv) no tempo dedicado a atividades sem supervisão, monitoramento ou orientação de iguras convencionais de autoridades (pais professores, orientadores, etc.); (vi) pela importância do delito na conformação do status intragrupo e na competição entre grupos; (vi) pela oposição aos adultos e autoridades convencionais (professores, policia, etc.) e outros grupos juvenis e

Filme Cidade de Deus (2002) - Direção Fernando Meirelles

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(vii) pelo caráter territorial de suas atividades (geralmente o bairro ou local de encontro). Lista-se como práticas de gangues o uso pesado de álcool, precocidade e promiscuidade sexual, uso/ tráico de drogas, tabagismo, vandalismo, agressões, pichações, pequenos furtos e roubos. Em sua maior parte são transgressões leves subnotiicadas. Com o tempo, todavia, induzem maior dano que agressores isolados. A reincidência eleva-se em função dos vínculos pessoais e coniança mútua necessária à execução de furtos, roubos e tráico de drogas. E periculosidade decorre do acesso a armas de fogo, vinganças e direção perigosa (crimes de trânsito). Ao nível de comunidade, a adaptação ao crime é identiicada por Anderson (1999) pela proeminência do código de rua, deinida por regras de antecipação/ preempção de comportamento agressivo como um meio para evitar agressões reais e potenciais ao nível de comunidade. Essa condição decorreria do isolamento e menor mobilidade ascendente de seus membros (segregação socioeconômica e racial). Comunidades com maior número de vitimas de homicídio contam também com desvantagens estruturais – concentração geográica de pobreza, desemprego, segregação, alienação, desesperança e discriminação -, níveis mais altos índices de crimes (agressão e gangues juvenis) e maior taxa de indivíduos encarcerados. A condição de abandono reduz a crença nos valores normativos convencionais, bem como a crença na Lei, na polícia, tribunais e políticas públicas. A corrosão normativa – em que crianças e jovens são submetidos a preceitos de desconsideração às pessoas em geral – catalisa valores favoráveis ao crime, fazendo com que a delinquência constitua parte da norma comunitária (Anderson, 1999, p. 323; Sampson; Wilson, 1995; Wilson, 1990). A fragilidade de meios para reagir (baixo capital social e político) faz com que as opções dos residentes sejam (a) se calar, (b) se deixarem vitimar ou (c) reagir de modo agressivo. Cada família passa então resguardar a si mesma e pessoas próximas ee aesfera pública e abandona-

da, enfraquencedo o capital social que permitira a comunidade reagir em conjunto, seja elevando o controle informal, seja cobrando ação social do setor público. Como há menor coniança na polícia, há também menor cooperação, segue dai que os crimes icam impunes. Comunidades degradadas concentram reduzido apoio parental, institucional e presença de homens de qualidade que sirvam de referência de padrão de sucesso convencional centrados na família. Tais fragilidades são um sinal de enfraquecimento dos laços sociais familiares e eicácia de política social, vide escola, polícia e justiça. Em seu lugar, a dureza de caráter e disposição para o confronto deinem o acesso a recursos, reputação, status, poder e mulheres. O código de conduta deine regras justas sobre quem deve ou não ser roubado ou agredido. Uma vez que os jovens avaliam que estão fazendo a coisa certa, é nesse ponto que tais percepções enviesadas de justiça se oporão às normas e leis convencionais.

3.2. De iniciante a mestre O jargão de que as prisões no Brasil são “universidades do crime” apresentam pouca pesquisa social que o corrobore. As taxas de reincidência criminal divulgados são vagos e pesquisadores tem limitado acesso a bancos de dados. Mas é bem provável que o jargão seja verdadeiro. No sentido estrito, trata-se da avaliação da baixa efetividade do sistema prisional para metas legais de ressocialização e, em um sentido teórico amplo, relaciona-se ao efeito da rotulagem institucional na internalização do comportamento desviante (Becker, 1966). Isso signiica que o infrator primário rotulado pelas agências de controle social como desviante passa a ser visto desse modo em seu meio, modiicando sua autopercepção, limitando sua sociabilidade convencional posterior e elevando a probabilidade de fortalecer seu vínculo com grupos delinqüentes. Trata-se do efeito adverso das instituições de controle social no qual, ao contrario de afastar o envolvido da prática do crime, termina por afastá-lo das relações sociais convencionais, cristalizando uma identidade desviante que cataliza o desvio posterior.

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Baixa autoestima e autodepreciação são um traço comum a delinquência, e que aprofunda-se com a rotulagem. Becker (1966) aponta que o registro burocrático e o modo de atuação dos operadores e das agências de controle social promovem a rotulagem informal de pessoas/ grupos de menor poder social de reação. Rotulagem informal piora via rotulagem institucional, afetando cognitivamente o acusado, reduzindo os seus recursos materiais e afetivos, desencorajando-os de acreditar que deve gozar, em pé de igualdade, das oportunidades sociais e econômicas convencionais, construindo assim incentivos perversos para o aprofundamento do comportamento desviante pela degradação da identidade convencional e concomitante emergência da identidade desviante (Lieberson, 1985; Link; Phelan, 2001). A rotulagem engendra relações sociais depreciativas que criam um abismo entre os identiicados como desviantes (outsiders) e as demais pessoas de seu meio social. As agências de controle social reforçam um conlito moral que piora a vida social do acusado, excluindo-os dos círculos convencionais e fortalecendo a inserção criminal ao enquadrá-lo em um estereótipo desviante. A rotulagem oicial mobiliza recursos assimétricos e reforça a rotulagem informal posterior via discriminação direta, humilhação, menor tolerância a desvios posteriores, redução de recompensas sociais, perda de emprego e exclusão de círculos convencionais (amigos, escola, igreja, etc.). As criticas dirigem-se aos ins declarados de recuperação e ressocialização e o efeito real de aprofundamento do comportamento desviante a partir da intervenção inadequada em desviantes primários. Desse modo, a rotulagem atinge grupos especíicos e jovens pobres com maior frequência, reforçando estereótipo social nos casos de delinquência juvenil. Jovens e grupos estigmatizados possuem menos recursos para reagir de modo adequado frente as instituições de controle social (polícia e justiça). Intervenção extemporânea e repressão desproporcional mostram as falhas das instituições policiais e do sistema de justiça frente a metas legais de recuperação criminal. Não podendo reagir de modo adequado, o acusado passa a se conformar e se comportar conforme o rótulo prescrito e se torna desviante por ter sido deinido como tal, e não que o seja em princípio. É

Foto: Arquivo Portal Infonet

criado assim um mecanismo de reforço comportamental negativo. o processo de rotulagem mostrase como uma profecia que se autocumpre (Merton, 1968). Ray (1961) airma que, ao tentar rebaixar um acusado à condição de desviante, termina-se por elevá-lo à categoria de mestre em desvio. O ritual transforma a identidade, passando-o de inexperiente a iniciado. E quanto mais forte o ritual de rotulagem e mais frágil os meios de reação, mais facilmente o rótulo será aceito e o acusado agirá em conformidade com o estereótipo prescrito. A transmutação do ato visto com mau para a pessoa vista irrecuperavelmente como má (Tannenbaum, 1957), as instituições, por meio de seus operadores, induzem uma nova identidade, excluindo o acusado dos círculos convencionais e aumentando a probabilidade de sua associação com pares delinquentes. O rótulo provoca a quebra nas relações sociais convencionais devido às diiculdades de gerenciamento de imagem (Link and Phelan 2001). Gofman (1981[1963]) assinala que relações das pessoas convencionais com estigmatizados frequentemente envolvem sinalizações e comportamento de rejeição, discriminação e assimetria de status. Quando essa situação se instala – ou seja, quando as relações sociais são predominantemente negativas e nega-se suporte à identidade convencional, bem como recursos convencionais - os rotulados evitam essas relações e buscam apoio em pares rotulados. É nesse meio que terão suporte à sua imagem degradada. A degradação subjetiva reduz o suporte familiar, afetivo e inanceiro (Bernburg; Krohn; Rivera, 2006; Bernburg; Krohn, 2003). Rotulados elevam a associação com outros igualmente rotulados, pois esse é o grupo em que serem aceitos (Heimer; Matsueda, 1994; Link et al., 1989; Matsueda, 1992). Gru-

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pos delinquentes oferecerem suporte à autoimagem degradada, provendo reconhecimento, respeito, identidade e acesso às oportunidades que os meios convencionais não lhes provê, e isso signiica redes de relações, recursos materiais e simbólicos, estratégias comuns e arendizado de técnicas de crime. Em resumo, se a intervenção caracteriza-se pela rotulagem, delinquentes primários tornam-se párias dispostos a crimes mais graves. Becker considera que a rotulagem desempenha papel maior que qualquer outro no aprofundamento da carreira criminal. Infratores primários tomam o estigma como símbolo de temor, e se empenharam em campanhas de reputação mobilizando seus vínculo com subculturas desviantes (Beyers et al., 2003; Paternoster; Iovanni, 1989). Em síntese, a rotulagem institucional deine (i) uma prescrição/ expectativa negativa das relações sociais. Tal prescrição (ii) aumenta a tensão na relação social por envolver assimetria de poder, fragilizando o acusado, que não consegue escapar ao rótulo; (iii) ocorre posteriormente a redução de apoio e recursos, o que levará (iv) à degradação subjetiva/ objetiva do rotulado; (v) provocando a exclusão dos rotulados dos círculos convencionais; (vi) rotulados reduzem a tensão nas relações sociais associando-se a grupos igualmente rotulados, e isso (vii) reforçará suas crenças e vínculos com subculturas, elevando a reincidência e carreiras criminais.

4. Prevenção como estratégia Crianças e jovens em situação de baixo monitoramento parental e déicit de referências positivas, fracasso escolar e histórico de transgressões precisam de atenção especial das políticas públicas para que a condição de abandono não se transforme em delinquência, reincidência e carreiras criminais. Prevenção de inserção criminal juvenil sofre de déicit de estratégias devido à baixa compreensão do fenômeno em si e do déicit de capacidades especíicas para a resolução do problema (inanciamento e treinamento adequado de operadores). Devemos chamar a atenção para a qualidade da intervenção, relacionada com a articulação de diferentes políticas públi-

cas de prevenção e de controle social, bem como de avaliação posterior para prover a melhor medida para as vítimas de crime, mas também tratamento adequado às crianças e jovens envolvidos em crime. A despeito dos inúmeros probemas envolvidos, há os que buscam “soluções mágicas”. A esse respeito, reletindo sobre o as políticas de justiça dos EUA, o pesquisador Paul Mears(2010, p. 127–128), da Universidade da Califórnia airma: A ênfase dos decisores na implantação de políticas bala de prata... frequentemente repousa em graves falhas lógicas e teóricas... (E) a máxima de que crimes comoventes levam a leis ruins é digno de nota... reformas abrangentes de leis são decretadas com base em crimes amplamente noticiados (pela mídia) e que pouco reletem a situação da grande maioria dos crimes e problemas reais da justiça criminal... Independentemente dos fatores que contribuem para a tendência de busca de soluções bala de prata, é importante que os gestores tenham claro sobre o porquê exatamente essas soluções são susceptíveis de serem ineicazes e até mesmo prejudiciais. (tradução nossa).

A expressão bala de prata consiste na metáfora de uma solução simples que promete resolver um problema complexo com grande eiciência. Jovens envolvidos com crime têm sido descritos como monstros, e a bala de prata proposta por gestores e políticos tem sido o encarceramento em massa e uso massivo de tecnologia e equipamentos de vigilância, monitoramento e armas. Em conjunto, essas soluções simplistas cumprem menos do que prometem. Infelizmente, não existe bala de prata, de chumbo ou kriptonita, capaz de reduzir os níveis de crime de uma hora para outra e que seja ao mesmo tempo simples e eicaz. Enquanto as ações atacarem os efeitos ao invés das causas, o problema tende a persistir. Alegoricamente, o Batman - personagens da DC Comics - gasta bilhões em equipamentos tecnológicos (gadgets) em sua guerra contra o crime, quando na verdade parte considerável do problema da delinquência e criminalidade é passível de ser reduz-

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http://www.smbc-comics.com/comics/20130217.gif (tradução nossa)

ido com políticas de atenção que vão da infância No que trata a cooperação entre esferas governaà juventude, e envolvem famílias em situação de mentais, percebe-se o vácuo de competência entre pobreza concentrada, segregação socioeconômica, municípios e Estado quando se trata da prevenção fracasso escolar, baixa atenção parental, vulnerabili- da delinquência juvenil. A prioridade para a redade e desigualdade social. Evidentemente, atenção pressão nas políticas estaduais de segurança pública de políticas públicas às pessoas é um problema – direcionada à população adulta – dialoga pouco complexo que envolve tempo e atenção proission- com as políticas de prevenção municipal, focadas al de várias áreas e instituições, vide família, escola, mais na infância e pobreza e não na juventude e saúde, assistência social, polícia e sistema de justiça. na delinquência. Desse modo, quando o problema É ilusório achar que uma política pública, trabalhan- conjuga juventude, delinquência e prevenção, as arenas institucionais do de modo isolado são ausentes. Em redas demais resolverá sumo, o déicit de resozinha o problema. Você gastou bilhões de dólares se vestindo sponsabilização políticomo um idiota apenas para caçar alguns No que trata a preca claramente deinida bandidos e assaltantes. Você vai morrer venção, muitos gegera déicit de política algum d i a e todos nós estaremos em p i or stores e operadores pública. Como as insituação devido a corrida armamentista acreditam que é stâncias de juventude que você começou! Você tem ideia de um desperdício intem pouco poder nos quantos crimes poderiam ser evitados vestir em grupos vulgovernos, políticas juse investíssemos um bilhão em neráveis, pois não se venis especíicas são programas após a escola para deve acender vela boa deicitárias, logo, para crianças e jovens? para defunto ruim. a prevenção criminal Em outras palavras, há invariavelmente o foco na prevenção menos recursos, pesfocada nas pessoas é soas e infraestrutura. visto como panaceia, Se a meta é evitar enquanto soluções reque os jovens cheguem pressivas e tecnológiàs prisões, ou que secas como investimenjam vítimas de homto. Segue daí, portanto, icídio, então o meio a assimetria de recurPorque Batman nunca deve revelar sua consiste em evitar o sos para prevenção identidade secreta. fracasso escolar, o vínda delinquência juveculo com deliquência nil frente a ações repressivas. Buscam-se soluções e rotulagem pela identiicação e atuação sobre com“bala de prata” em equipamentos tecnológicos e portamentos desviantes no ensino fundamental e infraestrutura caros como se essas fossem essas as na comunidade, em especial nos bairros de maior únicas escolhas possíveis, enquanto as tecnologias vulnerabilidade e histórico de crimes. Trata-se de sociais e de atenção às crianças e jovens são desconreduzir a reincidência. Esse é o primeiro desaio da sideradas. Embora a maior parte dos jovens esteja política de segurança. As taxas gerais de mortalienvolvida em transgressões leves, a visão de que são dade por agressão (homicídios em 99% dos casos) criminosos sanguinários, psicopatas irrecuperáveis apresentam baixa capacidade explicativa, adquirine animais bestializados leva a intervenções equivodo consistência quando são identiicadas as vítimas cada e desastrosas. centrais: jovens pretos/ pardos do sexo masculino, Em resumo, premissas equivocadas em políti- de baixa escolaridade, residindo em bairros de subcas públicas e intervenções ineicientes terminam úrbio da região metropolitana e cidades polo. Repor enfraquecer o vínculosdos jovens com metas e dução de homicídio deve atuar nesse peril. comportamento convencional. Baixa compreensão Desenho de políticas públicas envolve coordenar dos fatores que induzem a inserção na delinquên- ações de planejamento urbano e atuação das insticia diiculta o desenho de políticas. Déicit de com- tuições de Estado e sociedade civil com comunidade preensão da delinquência juvenil como proble- e família para diminuir a exposição aos riscos e vulma social pode ser resolvido com pesquisa social nerabilidade social que catalisam a inserção crimie redução do ceticismo – relacionado às crenças nal de crianças e jovens. Isso envolve compreender privadas de que nada se deve fazer no sentido da as subculturas da delinquência e impedir a rotulprevenção da inserção e reincidência criminal. agem institucional. Os principais desaios vão além Deivison Souza Cruz

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de promover políticas para a juventude, mas sim implica na provisão de oportunidades reais para que que essas políticas cheguem de fato e o mais cedo os jovens consigam acessar metas sociais convenpossível ao peril de famílias e jovens afetados pela cionais de escolaridade (sucesso escolar), afetivas criminalidade, de modo a evitar assim a inserção, re- (se sentirem aceitas), relações sociais (autonomia, incidência e carreiras criminais. As políticas devem reconhecimento) e emprego (incluindo formação, atuar preventivamente reorientando os jovens para treinamento e redes sociais de apoio). valores e normas convencionais. As políticas focadas em delinquência devem reEm especial, é necessário atuar preventivamente verter à rotulagem dos jovens como criminosos, nos que já se encontram inseridos em delinquência. modiicando condutas de operadores públicos – tais A repressão é necessária, mas deve ser a última e como professores, assistência social e, principalnão a única medida. Trata-se de cuidar também os mente, polícia, tribunais e instituições de controle que se encontram em condição próxima ao risco, social. Práticas que incorram em rotulagem invivenciando dinâmicas familiares, comunitárias stitucional devem ser abolidas, sendo permutadas e escolares que inpor ações que auduzem a inserção mentem o senso de criminal. O probresp ons abi lidade lema da prevenção e integração com consiste em evitar família, escola e que crianças e jovcomunidade. Pais, ens – mas também professores, polícia suas famílias – estee justiça devem aujam sugeitas a indumentar o controle tores para a delinsocial ao mesmo quência, tornando tempo possíveis transgressores como sanções sejam vistas um resultado da como justas, corbaixa qualidade de retas e aceitáveis vida em que conpelos próprios FEJUNES (2011). Fonte: site senadora Ana Rita www.anarita.com.br/ vivem. jovens, que possam reforçar laços sociais convencionais e reNós propomos algumas orientações gerais de duzir o vínculo com pares delinquentes. políticas públicas para a redução da delinquência juvenil. O eixo central das intervenções é aqui toTrabalho coordenado de escola, comunidade, mado a partir do ponto de vista do enquadramento justiça e programas voltados aos jovens em condição da Teoria Geral da Tensão (Agnew; Brezina, 2011), de vulnerabilidade possuem maior sucesso que e implica prioritariamente na identiicação de cri- esforços isolados de uma ou outra instituição púanças e jovens expostos às tensões que imputam o blica, privada ou terceiro setor. Ao mesmo tempo, envolvimento criminal, e na necessidade reduzir a indivíduos, famílias e comunidades que vivenciam exposição a esses estressores e capacitar os próprio saliência de estressores tornam necessária interjovens, crianças, famílias e operadores públicos (es- venção pública complexa e planejamento estratégicola, assistência social, médicos) a lidarem com sua co. Adicionalmente, os jovens devem ser ouvidos, condição social altamente estressante (que muitas e isso inclui o tratamento respeitoso por parte da vezes envolvem intervenção de política social), e polícia e políticas públicas, o posicionamento bussua consequente ressigniicação, impedir que levem cando a regeneração (justiça restaurativa) nos julao crime. gamentos; penas com atividades que envolvam o Sobretudo em crianças e jovens, as políticas pre- empoderamento do ponto de vista convencional; cisam aumentar o monitoramento e ocupação do as cerimônias de reintegração social (comunidade, tempo de modo formal, o que implica em reforçar família, escola); e oportunidade de se envolver em o monitoramento por adultos e pessoas que sirvam papéis sociais que propiciem maior consciência do como referência (na família, escola e comunidade) dano por meio de ações que reduzam a reincidência de modo a aumentar a qualidade das relações so- e provejam oportunidades dos jovens ressigniicarciais, permitindo aos jovens criar identidades pos- em suas expectativas de vida. itivas e oportunidades efetivas de alcançarem, por O empoderamento individual, social (educacional, meios legítimos, metas individuais socialmente existência de redes de apoio e existência de referêndesejáveis de sucesso pelo estudo e trabalho. Isso cias positivas) e econômico (terem metas educacioDeivison Souza Cruz

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nais efetivas, proissionalização e inserção no mer- os, bem como proteção de pessoas ameaçadas. Se há cado de trabalho) são metas da política social frente mais homicídios de jovens, maior aprisionamento aos jovens que vivenciam alta carga de tensão social. dos homicidas desses crimes torna-se imprescindívA redução da exposição a extressores vem a ser uma el para reduzir a taxa geral de homicídios em geral; condição necessária para que os jovens diminuam • Polícia: reputação policial positiva envolve resolusuas chances de inserirem-se ou manterem-se no tividade, respeito a ordem legal e comunitarização. crime, sendo que a política social deve romper a Agentes de polícia devem evitar o tratamento estigespiral de emoções negativas a que estão expostos. matizante, agressivo e discriminatório, fator esse A meta deve ser reverter a tendência, vista equivo- que eleva a visão negativa por parte da população cadamente ou por má fé como natural (em termos em geral e dos jovens em particular. Uma imagem de raça/cor, comunidade ou família), para o crime de eiciência e probidade eleva a coniança e isso de homicídio, o isso torna necessário ressigniicar, ajuda a reduzir os níveis de crime; por mieo de política pública, identidades e cursos • Justiça: melhoria de práticas de atendimento, cede vida de crianças, jovens família e comunidade. leridade e eiciência nos casos envolvendo crianças Em resumo, políticas de prevenção possuem estat- e jovens, bem como penas alternativas e ênfase para uto próprio, e devem reduzir tensões daqueles que a justiça restaurativa na redução da reincidência; – no nível individual e comunitário - apresentam Encarceramento: medidas de encarceramento previvenciam situações precursoras de respota crimi- cisam ser pensadas como última e não a única alnal. a meta da ternativa para política deve a prevenção e ser a de bloressocialização. quear/reverter Redução de à inserção e a aprisionamencarreira crimto provisório inal que leva o e pena alterjovem ao sistenativa focada ma prisional e em trabalho à vitimização social, bem por homicídio. como proxUm conjunimidade com a to de políticas família e oporpúblicas (edutunidades de cação, esporte, escolarização e No Brasil, “oito aviões por mês”. www.juventude.gov.br/juventudeviva/ lazer, cultura, trabalho. Apriproissionalização, etc.) precisam cumprir metas de sionamento massivo de jovens cristalizam identimonitoramento e apoio a adolescentes e jovens em dades desviantes; situação de vulnerabilidade social e envolvidos em infração legal e crime, articuladas de modo eicaz • Gestão: melhorar práticas de políticas públicas com políticas universalistas. Embora os pontos aci- torna necessária articulação institucional para ma possam ser interpretados como gerais, as mes- identiicar indivíduos e famílias em condição de mas podem se desdobrar em propostas práticas. delinquência e risco social. Para que os programas sejam disponibilizados a quem precisa, tornam-se Nós listamos algumas a seguir: imprescindíveis os diagnósticos prévios, monitora• Crenças e ações: os governos devem aprender a mento e avaliação constante para mensurar o imajustar soluções ao contexto, evitando pacotes de pacto das políticas. Gestores e operadores na ponsoluções e políticas “bala de prata”. Ações bem suce- ta precisam monitorar a delinquência e gangues didas mudam crenças dos gestores. O ceticismo de juvenis, priorizando comunidades e famílias esque jovens desejam abandonar o crime ceticismo pecíicas atuando no atendimento sobre crianças reforça o ceticismo para implantação de políticas de e jovens em situação de risco social, sobretudo prevenção. Torna-se necessário o uso de “tecnolo- os casos envolvendo baixa integração à escola, gias sociais” bem sucedidas, reduzindo a rotulagem, agressões na família, bulling, uso/tráico de droinserção e reincidência criminal; gas-álcool e cigarro, precocidade sexual, parentes/ • Homicídio: em princípio, a melhor política de re- amigos envolvidos em crime e crenças desviantes; dução de homicídios consiste na maior efetividade • Drogas: necessidade de descriminalização do uso de investigação de homicídio, tentativas de homicídi- de drogas e disponibilidade de políticas de saúde e Deivison Souza Cruz

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acompanhamento para desintoxicação, redução de danos e prevenção ao uso de entorpecentes; • Contratar ex-infratores: experiências internacionais mostram que ex-infratores são peça chave para promover o diálogo e exercerem liderança junto aos jovens em situação de risco e delinquência. Para isso, eles devem ser capacitados e contratados para o trabalho social. Técnicos isoladamente conhecem menos as comunidades e sabem menos a história de vidas dos moradores e jovens, diicultando no reconhecimento de sua autonomia, identidade e recuperação; • Provisão real de oportunidades: autonomia inanceira e acesso a bens culturais e simbólicos são essenciais para os jovens. Muitos programas falham porque desconsideram que o vínculo de jovens com delinquência se dá pela busca de reconhecimento, identidade e respeito. Bolsas em dinheiro condicionadas a metas educacionais e participação em programas tem efeito maior que participação em atividades, isoladamente. Programas culturais, esportivaos e de proissionalização precisam partir do diálogo e identiicação identiicados pelos jovens, promovendo assim sua autonomia e liderança; • Família: assistência e reforço do papel das famílias no monitoramento de crianças e jovens envolvidos em infrações e em situação de risco social. Priorizar jovens com baixo rendimento escolar, reduzindo a negligência parental e o comportamento agressivo. Isso envolve monitoramento de horários, monitoria para elevar o desempenho escolar e propiciar atividades e ocupação de tempo extraescolar. Visitas domésticas e presença dos pais nas escolas e em atividades são necessárias; • Escola: reduzir o fracasso escolar é mais do que manter uma criança na escola. Ações devem abar-

car programas de tempo integral, monitoramento de faltas escolares, medidas que impeçam a evasão, aumentem a integração escolar, elevem a autoestima e o desempenho escolar. Suporte de proissionais (psicólogos e assistentes sociais) na escola ajudem jovens a lidarem com estressores, aumentando a sua auto-estima e expectativas de sucesso convencional; • Comunidade: Políticas para a juventude em geral não devem ser contrapostas às políticas para jovens delinquentes, ambas devem coexistir e dialogar, porém, ações positivas devem priorizar sempre crianças e jovens com histórico de delinquência e situação de risco. Políticas culturais, esporte e lazer devem criar um senso de integração competitiva, valoração de regras e espaços de diálogo e expressão individual e coletiva desses jovens para com seus grupos e comunidade.

5. Considerações inais Como conclusão, sabemos que o contexto atual decorreu de três décadas de relativo abandono de políticas para a juventude, mas é urgente implementá-las para que o futuro seja diferente do presente. Ainda assim, considerando que tendência atual persista, cabe apontar quais as novas características que se destacam no período atual e que coniguram a tendência dessa década na criminalidade do ES. Para tanto, citaJardim Angela (São Paulo) mos a a seguir alguns aspectos chaves das mudanças sociais relacionados à crimialidade comum. Embora haja possíveis “pontes” entre criminalidade organizada e estatal, tais fenômenos escapam ao foco da presente análise. Em primeiro lugar relembra-se que a década de 1980 contou com rápida mudança social. Houve na Região Metropolitana considerável crescimento

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populacional, formação de novos bairros a partir da ocupação dos morros, mangues, loteamentos e conjuntos habitacionais nos suburbios. Muitos desses bairros resultaram na concentração espacial de pobreza, e convivem ainda com déicit de infraestrutura e baixa efetividade de políticas públicas. Essa grande movimentação populacional relacionou-se aos crescimento do número de crimes de honra e contra a propriedade, ao passo que a política de segurança do Estado mostrou-se ainda debitária do período autoritário anterior. Na década de 1990, além dos problemas advindos da década anterior, cristalizou-se uma cenário de segregação urbana, socialização adversa e déicit de monitoramento parental e convencional resultante de pobreza concentrada e desemprego. Aspecto pouco citado é que o tempo gasto no transito - o “efeito tempo de deslocamento” - implicou na redução do monitaramento parental. Essa foi uma década de retração da capacidade de investimento dos governos e de colapso de serviços públicos (educação, saúde e assistência social, e segurança pública, dentre outros). Ainda que seja um fenomeno minoritário, as altas taxas de desemprego juvenil e falta de perspectivas elevaram a imigração (Europa e Estados Unidos). Todavia, maior parte da juventude persistiu em cenário de socialização adversa e déicit de oportunidades sociais. A partir de 1995, as cidades pólo começaram a apresentar tendência à mudança social em termos de sociabilidades mais próximas a metropolitana. A década de 2000 assistiu a consolidação da subculturas da delinquência que, na década de 1990, era um fenomeno residual. Nessa década ocorreu considerável expansão econômica, das política socias e do emprego, mas também dos mercados de drogas (com o acesso crescente ao crack como droga barata). Expandiu-se consideravelmente o acesso a armas de fogo e, sobretudo a partir de 2003, o encarceramento em massa. Tais fenomenos ocorreram em paralelo nos municípios polo, que passaram a apresentar características criminalidade mais

próximas em causalidade, mais não em intensidade, com os municipíos metropolitanos. A presente década inaugura um cenário de consolidação de um cenário de criminalidade sistêmica (Ousey; Augustine, 2001; Ousey; Lee, 2002; Ousey, 1999). Estruturas de oportunidades criminais se expandiram e consolidaram a tal ponto nas últimas três décadas, associado a concentração de pobreza e crime, que passam a ser parte indelével do processo de socialização de crianças e jovens em alguns bairros metropolitano. Em função do aumento do percentual de jovens no total de vítimas, e concomitante redução da idade média das vítimas, as pequenas cidades do interior caminham para um processo análogo - em menor intensidade - ao ocorrido na Região Metropolitana e cidades polo. A “bola da vez” da expansão das taxas de homicídio na presente década será as pequenas cidades interior do ES. Com o déicit de socialização e oportunidades convencionais para uma parcela dos jovens, bem como a mútua inluência de rotulagem institucional e subculturas de delinquência, a proissionalização da criminalidade apresenta-se como um fenomeno intergeracional. E esse traço tende a se expandir mesmo com o aumento da rotatividade de jovens atuando no tráico devido ao recente encarceramento em massa. Em função do modus operandi do mercado de drogas, ele tende também a se adaptar ao novo cenário. De início, se partimos da premissa de que parte da delinquência juvenil liga-se aos mercados de drogas, então devemos aceitar que a demanda é inlexível e tende a capturar mais jovens para repor postos na atividade à medida que se eleva o encarceramento, bem como elevar a taxa de retorno aos negócios ilegais entre os que saem do sistema prisional caso alternativas economicas não estejam disponíveis. Desse modo, se por um lado maior encarceramento eleva os riscos da atividade (encarceramento e homicídio), resulta também na alta rotatividade e mudança de modalidades de vendas de controle territorial (boca de fumo) para o mercado discreto

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e delivery (vide disque-drogas). Tal tendência já foi apontada por outros pesquisadores do Brasil, como Luiz Eduardo Soares em vários artigos e entrevistas sobre o tráico de drogas no Rio de Janeiro. Em resumo, aprisionamento em massa incentiva a inovação e conversão de usuários em traicantes eventuais. Comunidades com altos níveis de encarceramento aprofundarão ainda mais a precarização das relações sociais à medida que parte da sociabilidade da juventude dessas comunidades passe a ser estruturada nas prisões e instituições correcionais (iniciação prisional como estágio avançado da criminalidade), reforçando um abismo ainda maior entre c omp or t a mento convencional e delinquente. Ao mesmo, tempo, encarceramento em massa debilita o controle social familiar e reduz o déicit de homens de qualidade capazes de produzir referências normativas, centradas na família, e positivamente orientados para as vias convencionais de sucesso (Giordano; Cernkovich; Rudolph., 2002; Phillips 1997; Rogers 2001; Schwartz 2006). Na ausência de políticas de prevenção efetivas, o estágio prisional tende a se constituir como fase necessária da estrutura da criminadade nessa década. Nós chamamos a atenção pelo fato que, após três décadas de encarceramento em massa, os resultados nos os Estados Unidos elevaram a segregação socieconomica e racial, sobretudo comunidades de afrodescedentes, mas também pelo alto custo e efeitos limitados na redução na criminalidade, sobretudo tráico de drogas. Uma limitação do presente artigo é que as análises

(exceto as descritivas relacionadas aos dados apresentados) coniguram-se como insights e hipóteses para uma agenda efetiva de pesquisa e de orientação de políticas públicas. Apesar dessas limitações, nós apontamos como meta estratégica a redução dos efeitos da socialização adversa na infância e juventude como solução os problemas estruturais ligados a delinquencia juvenil. Reduções mais efetivas de crime tendem a ocorrer quando ações diversiicadas em termos de políticas públicas (educação, assistência social e políticas direcionadas ao público juvenil especíico) chegarem massivamente ao público de interesse apontando no início, e ao qual convergem tanto o peril de vítimas de homicídio quanto saliência no sistema prisional. Por im, mostra-se imprescíndivel a pesquisa empírica ajustada ao contexto para melhorar a efetividade da política pública. Há pouca cultura de diagnóstico social para o embasamento das políticas, mas também há um déicit de alinhamento das políticas implantadas e mais raro ainda a avaliação de sua efetividade. O mito que a solução para a criminalidade resume-se na repressão resiste a análise dos fatos. A inércia dos indicadores de crime possivelmente está ligado ao modo o problema vem sendo compreendido. Avaliamos que tecnologias sociais como investimento em prevenção criminal na juventude custa menos menos e os efeitos são mais duradouros e consistentes ao longo do tempo. Se esse diagnóstico é correto, soluções efetivas surgirão à medida que as práticas forem repensadas.

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