Laboratório de ensino de gramática: questões, desafios e perspectivas

June 29, 2017 | Autor: Eloisa Pilati | Categoria: Metodologia de ensino da língua portuguesa
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Laboratório de ensino de gramática: questões, desafios e perspectivas Eloisa Nascimento Silva Pilati (UnB)1

Resumo: O presente capítulo apresenta um resumo dos temas de investigação e das discussões presentes na disciplina de Laboratório de Ensino de Gramática ofertada na Universidade Aberta do Brasil e também ministrada na Universidade de Brasília, para licenciados dos cursos de Letras Português, e revela de que forma a união dos temas teóricos abordados durante o curso podem contribuir para uma nova prática docente inovadora em relação à gramática em sala de aula. Palavras-chave: Ensino de gramática, metodologia de ensino, prática docente e formação de professores de língua portuguesa

Introdução O presente capítulo apresenta um resumo de alguns dos temas tratados na disciplina Laboratório de Ensino de Gramática ofertada da Universidade Aberta do Brasil, na modalidade do ensino a distância, na Universidade de Brasília, de forma presencial, e revela como a união dos temas teóricos abordados durante o curso podem contribuir para uma nova prática docente em relação à gramática em sala de aula.

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Eloisa Pilati é professora da Universidade de Brasília e doutora em Linguística pela mesma universidade (2006). Atualmente desenvolve pesquisas na área de sintaxe, no âmbito da Teoria da Gramática Gerativa e sobre metodologias de ensino de língua portuguesa. [email protected] Capítulo de livro publicado. In: Josênia Vierira; Francisca Cordelia. (Org.). O que a distancia revela: reflexões de professores e estudantes do Curso de Letras EAD/UnB. 1ed.Brasília: Gráfica e editora Movimento, 2014, v. 1, p. 48-67.

O capítulo está organizado da seguinte forma: na primeira seção serão apresentados aspectos relacionados às mudanças por que vem passando o ensino de Língua Portuguesa no Brasil e as influencias dos estudos linguísticos nessa mudança; na segunda seção serão apresentados os resultados da pesquisa de Neves (1990) que trazem uma descrição dos métodos e técnicas presentes nas aulas de gramática a fim de que se possa diagnosticar os aspectos didáticos que precisam ser repensados; na terceira seção apresentam-se as teorias utilizadas no Laboratório de Gramática no sentido de encontrar soluções para os problemas metodológicos enfrentados pelos professores nas aulas de gramática, para que se possa formar professores que tenham uma postura didática inovadora em sala de aula que possam promover o aprendizado efetivo de seus alunos em relação a temas gramaticais relevantes, por fim, na quarta seção são apresentadas três práticas linguísticas que têm o objetivo de promover o conhecimento linguístico explícito e contribuir para uma nova prática docente inovadora em relação à gramática em sala de aula.

Contribuições da linguística para o ensino de Língua portuguesa: da década de 50 à década de 90 De acordo com Ilari (2009), desde finais da década de 50, há publicações sobre questões relacionadas ao ensino de gramática no Brasil. Segundo o autor, em 1957, Joaquim Mattoso Câmara Júnior um dos eminentes linguistas do país publicou a obra Erros de Escolares como Sintomas de Tendências do Português no Rio de Janeiro. Nessa obra, Câmara Júnior, já traçava um paralelo entre as diferenças entre a variedade linguística usada no Rio de Janeiro e as predições das gramáticas normativas. Em 1960, inicia-se a introdução da disciplina Lingüística nos cursos de letras. Até então, ainda segundo Ilari, o ponto alto dos cursos de Letras eram as aulas de Filologia Românica, em que se estudavam textos clássicos. Ou seja, o principal momento da formação dos professores de licenciatura era o contato com estudos e análise de textos sob uma perspectiva teórica (filológica e gramatical) e não sob uma perspectiva prática ou didática (como ensinar língua

portuguesa para estudantes em nível de primeiro ou segundo grau). Com o avanço dos estudos linguísticos nas universidades brasileiras, várias linhas de pesquisam se definem passam a influenciar a formação de novos professores e educadores. Em 1997, o Ministério da Educação, contando com o auxílio de pesquisadores de várias universidades do país, publica os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Tal documento, como o próprio nome indica, tinha o objetivo principal de traçar diretrizes para a educação no país e se configurava, portanto, como um ponto de partida para orientar escolas e professores em relação ao ensino. Em relação ao ensino de língua portuguesa, pode-se notar a influência de várias correntes de estudos linguísticos no documento. Um exemplo é a forma como o conceito de linguagem é apresentado no documento, em que são usados termos tais como “sistema de signos” entre outros termos próprios da linguística textual. Os PCNs adotam uma perspectiva sócio-interacionista da linguagem, segundo a qual: “a língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só a conhecer as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas.” (PCN, 1998: 24) Em relação ao trabalho docente, o documento propõe atividades de desenvolvimento e sistematização da linguagem interiorizada pelo aluno, incentivando sua verbalização, assim como o domínio de outras variedades linguísticas utilizadas em diferentes esferas sociais. Uma atividade sugerida, por exemplo, é comparação nos níveis semânticos, morfológicos e sintáticos de diferentes variedades linguísticas. Por se tratar de um conjunto de diretrizes para a atuação docente, o documento não apresenta alternativas práticas para a implementação das atividades acima mencionadas, principalmente no que concerne ao ensino de gramática. Pela breve apresentação sobre a relação entre as pesquisas linguísticas e atividades docentes vistas acima, pode-se observar que os estudos

linguísticos têm sido importantes para o ensino de língua portuguesa no Brasil e também que ainda há um longo caminho de pesquisas a ser trilhado, principalmente sob o ponto de vista da implementação prática dos aspectos teóricos relevantes ao ensino. A atuação de linguistas foi crucial, por exemplo, na elaboração do conceito de linguagem apresentados nos PCNs. No entanto, como tal documento oficial visava oferecer parâmetros para o ensino, não apresentava formas práticas para que os objetivos ali propostos fossem alcançados. Ou seja, não apresentava exemplos práticos de como o professor poderia desenvolver e sistematizar a linguagem interiorizada pelo aluno, como incentivar o domínio de outras variedades linguísticas etc. Não se pode negar que em relação à linguística textual e aos estudos dos gêneros textuais já há uma maior tradição de pesquisas relacionadas ao ensino. Não trataremos desse tema aqui, pelo fato de estarmos observando questões relacionadas ao ensino de gramática sob o ponto de vista da implementação prática. Em suma, não obstante atestar-se progressos no ensino de língua portuguesa, desde a década de 60, ainda há muito trabalho a ser feito. Principalmente em relação ao ensino de gramática de língua portuguesa, parece não ter sido construída uma abordagem que estabeleça uma articulação entre teoria e prática, entre linguística e ensino, de forma que o professor possa colocar em prática as concepções teóricas que lhe foram apresentadas e para que com isso possa ajudar os alunos a alcançar as habilidades e competências estipuladas como metas.

Lacunas metodológicas no ensino de língua portuguesa Em uma pesquisa para investigar como as aulas de gramática vinham sendo ministradas no Estado de São Paulo, Neves (1990) atestou que, nas escolas pesquisadas, há uma divisão nítida do ensino de língua portuguesa em três disciplinas, consideradas totalmente distintas: literatura, gramática e redação. Em relação às práticas adotadas pelos professores a pesquisa atestou que a maioria das aulas consiste na simples transmissão de conteúdos expostos nos livros didáticos. Quanto às atividades propostas, as principais foram: reconhecimento de classes de palavras reconhecimento de funções

sintáticas, preenchimento de lacunas, classificação de verbos quanto à transitividade. Para se ter uma noção maios clara, os exercícios sobre reconhecimento de classes de palavras e classificação de funções sintáticas correspondem a 75,56% das atividades realizadas. A pesquisa constatou que a maioria dos professores adotava a seguinte ordem. Primeiro a explicação do conteúdo, depois a aplicação prática por meio de exercícios de repetição. Cerca de 80% dos professores chegam à conceituação dos termos por meio da definição. Neves (1990: 41) faz o seguinte comentário sobre as práticas docentes adotadas pelos professores de gramática: “Não

se

observa

qualquer

reserva

de

espaço

sobre

procedimentos em uso, sobre os modos de relacionamento das unidades da língua, sobre as relações mútuas entre diferentes enunciados, sobre os propósitos dos textos, sobre a relação entre os textos e seus produtores/receptores...” Em relação ao conteúdo, a autora atesta que as atividades gramaticais são as mesmas, independentemente do nível de ensino. Ou seja, o mesmo tipo de atividade gramatical é feito por alunos de diferentes idades e níveis escolares. A pesquisa de Neves, embora tenha sido feita no estado de São Paulo, e há vinte anos revelou com clareza alguns aspectos interessantes das práticas docentes no país, principalmente em relação ao ensino de língua. Como se pode verificar, o ensino de gramática está diretamente relacionado a um único procedimento didático que é a apresentação de conceitos e elaboração de exercícios. Ou seja, o que se entende por aula de gramática é que é uma aula em que regras gramaticais são colocadas em práticas, em exercícios, ou espaços são preenchidos. Outras atividades que exijam atividades mentais mais complexas como comparação, argumentação, criação, investigação... não estão entre as exigidas nas aulas de gramática. Algumas observações que podem ser feitas diante dos resultados da pesquisa são: i) parece haver uma lacuna na formação de professores de língua portuguesa em relação a como transformas

seus

conhecimentos

linguísticos

em

aulas

interessantes,

instigantes e que promovam o verdadeiro aprendizado dos seus alunos da Educação Básica. Isso porque tais conhecimentos linguísticos devem ser apresentados aos alunos de maneira adequada, por meio de instrumentos didáticos completos o suficiente para auxiliá-los em suas aulas.

Laboratório de gramática e novos parâmetros teórico metodológicos para a abordar questões gramaticais em sala de aula Como visto nas seções anteriores, não obstante os avanços observados nas questões relacionadas ao ensino de língua portuguesa, tais como a entrada de conceitos oriundos da linguística na formulação de diretrizes e documentos oficiais, os professores de língua, em especial os de gramática, ainda apresentam dificuldades em relação aos métodos e técnicas de ensino de língua e na transposição de conteúdos teóricos para situações práticas de sala de aula. Nessa seção, apresentaremos de forma resumida alguns parâmetros para que se possa abordar questões gramaticais em sala de aula e questões de pesquisas a serem feitas dentro desses parâmetros. Uma primeira observação que tem de ser feita ao se falar de ensino é que os professores tem de ter consciência de duas dimensões básicas do ensino: a primeira dimensão diz respeito à necessidade de o ensino promover o desenvolvimento de habilidades mentais complexas e profundas; a segunda é que cada área do conhecimento tem suas características e especificidades, que também devem ser levadas em consideração durante as atividades de ensino e aprendizagem. Em relação ao ensino de língua, por exemplo, não se pode deixar de lado questões como as de que as línguas possuem estruturas próprias, são combinações de forma e significado, em que interagem certos traços e valores específicos como nos fenômenos de concordância nominal e verbal, regência... além das questões de variação e mudança linguística, por exemplo. Na aula de gramática, o

professor deve

aliar os conhecimentos

gramaticais ao

desenvolvimento das atividades complexas. Veremos a seguir, de forma breve, algumas questões relacionadas a cada uma dessas perspectivas.

Em relação ao conteúdo que vai ministrar, o professor deve dominar as especificidades do conteúdo que irá ensinar ao seu aluno. O professor deve entender o que é uma língua, quais são as especificidades desse sistema, quais são as características, que tipos de valores são levados em consideração nas diferenças operações sintáticas, morfológicas e semânticas para que possa auxiliar seu aluno a desenvolver seus conhecimentos linguísticos. Em se tratando de ensino de gramática, o professor deve ter clara uma abordagem de ensino, para que essa sirva como parâmetro de sua atuação docente. A abordagem deve tentar responder a questões cruciais: O que é uma língua? Como se adquire? Como se ensina? e Como se aprende? Além disso, o professor deve levar em consideração que, na escola, o aluno aprenderá uma nova modalidade de expressão lingüística: a escrita, e deve estar preparado para ensinar ao aluno as especificidades desse processo. Para que se possa entender os aspectos estruturais da língua portuguesa e também o fato de os alunos já entrarem na escola “sabendo” muito da gramática da língua portuguesa, adota-se na disciplina a perspectiva gerativista de Noam Chomsky (1957, 1975 entre outros). De acordo com o autor, os seres humanos possuem uma Faculdade da linguagem, ou seja, há uma dotação genética para língua, com uma arquitetura especial para lidar com os elementos presentes nas línguas naturais. Em relação à aquisição da linguagem, o autor defende que esta se dá por meio da interação entre a Faculdade da linguagem e a experiência (input). Ou seja, a mente guia a criança no período de aquisição. É pelo fato de as crianças possuírem essa faculdade da linguagem que elas aprendem uma língua tão facilmente durante a infância de de forma tão espontânea. Lobato (2003) observa que, de acordo com a perspectiva gerativista, a escola não vai ensinar gramática ao aluno, pois o aluno já chega com uma “gramática” adquirida ou em processo de aquisição. O processo de aquisição de uma língua é algo que acontece com a criança, por meio da gramática universal, mas, a partir da exposição aos dados lingüísticos. Sendo assim, a escola deve auxiliar o aluno a refletir sobre o que já sabe e sobre o que não sabe em termos de estruturas lingüísticas típicas da linguagem normativa (nas modalidades escrita e falada).

Considerando que quando a criança vai para escola ela está no processo de aquisição, como deve ser a exposição aos dados linguísticos? Em outras palavras, que tipo de informação linguística deve ser oferecida para que os alunos adquiram uma nova variedade linguística ou para que aumentem sua proficiência na variedade padrão na escola? Que recursos didáticos podem ser usados para que o aluno aprenda a usar seus conhecimentos linguísticos inatos, advindo de situações de oralidade e de informalidade, em estruturas escritas, numa variedade padrão da língua? Que tipo de dado linguístico pode servir como fonte de discussão em sala de aula? Quais tipos de atividades didáticas podem aliar consciência linguística, reflexão, produção textual? Há procedimentos básicos que podem ser aplicados a vários fenômenos linguísticos? Para responder a essas perguntas, a seguinte tabela é apresentada aos futuros docentes. Fala

Escrita

Faculdade da linguagem

Faculdade da linguagem + conceitos aprendidos (gêneros e tipos textuais, termos mais formais de expressão, organização das ideias, estratégias de argumentação.... )

Conhecimento linguístico explícito

A tabela tem o objetivo de apresentar, de forma resumida, algumas diferenças entre a fala e a escrita e a. Ao estabelecer uma relação direta entre a fala e a Faculdade da linguagem, pretende-se mostrar para o futuro professor que a fala é uma capacidade inata dos seres humanos e, sendo assim, ela não precisa ser ensinada em sala de aula (apesar de vários aspectos poderem ser desenvolvidos, tais como conhecimentos para falar em público, fazer

apresentações orais...). Além disso, essa tabela pretende despertar no professor a consciência de que seus alunos já possuem um vastíssimo conhecimento gramatical, que envolve aspectos fonológicos, morfossintáticos, pragmáticos entre outros, mas que tal conhecimento é inconsciente. A escrita, por sua vez, não é uma habilidade inata. Tem de ser aprendida na escola e, para isso, existem os processos de alfabetização (e letramento) e os processos de prática de escrita presentes em toda a educação básica. Além da alfabetização, há várias formas de se expressar por meio da escrita. Tais formas se adequam a diferentes gêneros textuais e cada gênero possui suas características próprias. Essas questões, dentre muitas outras, devem ser abordadas e ensinadas na escola. Para estabelecer a relação entre as duas habilidades há o “conhecimento linguísticos explícito” (termo adotado de Costa et all 2010). Promover o conhecimento, significa explicitar e demostrar aos alunos como funcionam determinados aspectos das línguas humana, para que os alunos entendam como a escrita funciona e quais os aspectos envolvidos no ato de escrever, para que o aluno possa compreender os elementos que estão em jogo nos diferentes tipos de textos escritos. Segundo Costa et all (2011) “O termo “Conhecimento Explícito” só faz sentido tendo como referência a ideia de que existe conhecimento implícito sobre a língua. Por outras palavras, um trabalho sobre conhecimento explícito assume, de forma inequívoca, que os alunos são falantes competentes, ou seja, utilizadores da língua que mobilizam de forma automática regras gramaticais para gerar e produzir enunciados na sua língua.” Uma pergunta natural, que surge dessa proposta metodológica é Como tornar o conhecimento linguístico implícito um conhecimento explícito? Para responder a essa pergunta, são adotados os ensinamentos apresentados na obra de Como as pessoas aprendem, organizada pelo Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos (2007). Segundo essa obra, para que ocorra a aprendizagem efetiva, é necessário que os estudantes tenham a oportunidade de entender o sentido

dos assuntos estudados. Segundo a obra, diversos currículos enfatizam mais a memória que o entendimento. Transpondo tais afirmações para a área da gramática, pode-se afirmar que vários conteúdos são apresentados em sala de aula de forma estanque e em forma de regras, seguindo sempre a sequência didática apresentação do conteúdo e elaboração de exercícios, como apresentado por Neves (2007), na seção anterior. Tal forma de apresentação do conteúdo leva o aluno a pensa que a gramática de uma língua é um conjunto de regras arbitrárias e sem sentido. Para modificar essa prática, os alunos da disciplina de Laboratório são motivados a formular sequências didáticas em que os alunos possam entender os princípios e o funcionamento da língua. Na seção 4, a seguir, serão apresentadas algumas atividades que têm o objetivo de mostrar para os alunos, de forma concreta e lúdica, alguns princípios relevantes para o entendimento do que é uma língua. A seguir serão apresentados alguns princípios a serem seguidos para que se possa promover o aprendizado efetivo na sala da aula. Na seção 4, será demonstrado como tais princípios foram colocados em prática nas aulas de Laboratório de Gramática. Os três princípios são os seguintes: primeiro princípio: levar em consideração o conhecimento prévio do aluno, segundo princípio: promover aprendizagem ativa e terceiro princípio, fazer com que o aluno compreenda os processos envolvidos. Em relação ao primeiro princípio, defende-se na obra que “mesmo os recém-nascidos são aprendizes ativos, que trazem certo ponto de vista para o ambiente de aprendizagem. O mundo que entram não é uma confusão de ecos e burburinhos em que cada estímulo é igualmente saliente. Em vez disso, o cérebro de um recém-nascido dá prioridade a certos tipos de informações: a língua, os conceitos básicos referentes aos números; as propriedades físicas e o movimento de objetos animados e inanimados. No sentido mais geral, a visão contemporânea a respeito da aprendizagem é que as pessoas elaboram o novo conceito e o entendimento com base no que já sabem e naquilo que acreditam”

Os professores devem prestar atenção aos entendimentos incompletos as crenças falsa e as interpretações ingênuas dos conceitos que os aprendizes trazem consigo sobre determinado assunto. Considerando esse primeiro princípio, é importante mostrar aos alunos o funcionamento da língua humana sob diferentes perspectivas para que o aluno possa compreender o próprio objeto de estudo e os objetivos das aulas de português. Em relação ao segundo princípio, o da aprendizagem ativa, os novos estudos sobre a aprendizagem mostram a importância de promover a aprendizagem ativa. Para que haja o aprendizado com o entendimento, é importante que as pessoas aprendam a identificar quando aprendem algo e quando precisam de mais alguma informação. Esse aprendizado ativo requer que nas práticas de sala de aula haja momentos para a criação do sentido, para a auto avaliação e para a reflexão sobre o que funciona e o que precisa ser melhorado. Essas práticas aumentam o grau em que os alunos transferem sua aprendizagem para novos cenários e eventos. Em relação ao ensino de gramática, é importante que as aulas sejam planejadas para que o aluno tenham contato com a língua em uso e para que possam usá-la efetivamente. Em outras palavras, os alunos devem experiência nas aulas de gramáticas as diferentes formas de expressão da modalidade escrita da língua para que possam testar seus conhecimentos, analisar formas gramaticais, reconhecer novas formas linguísticas e desenvolver suas habilidades. Somente de forma ativa, poderão ter consciência dos conhecimentos que já possuem sobre formas linguísticas típicas da escrita ou sobre variedades linguísticas. Além disso, poderão, por meio da prática e da reflexão, compreender em quais aspectos estão tendo dificuldade, como melhorar ais aspectos etc. O terceiro e último princípio é o de proporcionar aos alunos o conhecimento dos processos envolvidos. Para desenvolver uma competência numa área de investigação, os estudantes precisam: a) possuir uma base sólida de conhecimento factual, b) entender os fatos e as ideias no contexto do arcabouço conceitual e c) organizar o conhecimento a fim de facilitar a recuperação e a aplicação. Para os autores do livro “a capacidade de planejar uma tarefa, de perceber padrões, de gerar argumentos e explicações razoáveis, de fazer analogias

com outros problemas está mais intimamente entrelaçada com o conhecimento do que se acreditava antes. Mas o conhecimento de um grande conjunto de fatos desconexos não é suficiente. Para desenvolver competências numa área de investigação, os estudantes precisam ter oportunidades de aprender e compreender. A compreensão profunda do assunto transforma a informação factual em conhecimento utilizável.” Em resumo, os princípios que o professor deve ter em mente para promover a aprendizagem efetiva são os seguintes: primeiro princípio: levar em consideração o conhecimento prévio do aluno, segundo princípio: promover aprendizagem ativa e terceiro princípio: promover conhecimento dos processos envolvidos. O professor deve levar seus alunos a: a) aprender a identificar padrões; b) desenvolver compreensão profunda do assunto; c) aprender a quando, como e onde usar o conhecimento – conhecimento circunstanciado; d) possuir acesso fluente ao conhecimento. e) ter conhecimento do conteúdo pedagógico e f) aprender com metacognição e para toda a vida.

Colocando a teoria em prática Entre as atividades que são sugeridas para que se possa promover um entendimento sobre o funcionamento da língua e promover a aprendizagem de como a língua humana funciona e quais aspectos estão em jogo tanto na língua falada quanto na língua escrita, e o conhecimento linguístico explícito, citam-se as seguintes atividades: 1) Oficina sobre a estrutura linguística com material reciclado 2) Atividades de revisão textual e de reescrita 3) Análise de aspectos gramaticais em poemas e trechos literários Na Oficina sobre a estrutura linguística com material reciclado vários temas linguísticos podem ser abordados. O principal objetivo dessa oficina é trazer as estruturas linguísticas para o plano concreto e de manipulação dos estudantes. Por meio dessa atividade, os alunos poderão manipular, e entender, vários aspectos das construções linguísticas: da formação de palavras à estruturação

das sentenças, explorando a relação entre forma e signifcado. Pode ser feita com alunos de diferentes níveis escolares e é uma atividade muito lúdica e divertida. A proposta geral da atividade é que estruturas linguísticas sejam reproduzidas pelos estudantes, usando materiais reciclados de diferentes formatos, cores e texturas. Sugere-se que os alunos usem as diferenças dos materiais para representar diferenças de níveis também, por exemplo diferenças entre radicais e desinências ou sufixos, os diferentes significados decorrentes da união de diferentes sufixos, diferenças entre os planos da morfologia e da sintaxe, relações entre sintaxe e semântica e muitos outros Por meio da confecção de maquetes, pode-se demonstrar processos de formação de palavras e as diferenças semânticas resultantes do uso de diferentes sufixos, relações entre a morfologia e a sintaxe na construção de períodos, uso da vírgula, uso do sinal grave... entre muitos outros temas. As Atividades de revisão textual e de reescrita são atividades consideradas de extrema importância para que o aluno possa reconhecer padrões, colocar seu senso crítico em prática, e aprender a identificar desvios de norma, mas é uma atividade muito pouco usada nas aulas de gramáticas. Acredita-se que, por meio da revisão textual, o aluno terá acesso a diferentes estruturas linguísticas e poderá avaliar, com a ajuda do professor num primeiro momento e depois cada vez mais independentemente, textos de diversas naturezas. A revisão textual, que pode ser feita em grupo ou individualmente, serve para que o aluno desenvolva a consciência de aspectos linguísticos que devem ser observados nos textos escritos. Acredita-se que por meio dessa atividade, os alunos serão capazes acessar base sólida de conhecimento factual, entender os fatos e as ideias no contexto e organizar o conhecimento a fim de facilitar a recuperação e a aplicação nos contextos adequados, conforme propostas apresentadas na seção 3. A Análise de aspectos gramaticais em poemas e trechos literários, por sua vez, é uma atividade de investigação, identificação e análise dos recursos sintáticos utilizados por poetas em seus textos. Nessa atividade, além de poder apreciar diversas produções literárias, os alunos poderão ter contato com formas variadas de criação e de expressão linguística. Essa é uma atividade muito rica para os alunos e requer que seja utilizada a capacidade de análise de fenômenos e o entendimento dos resultados estilísticos advindo de

diferentes construções linguísticas. Ao final de todas as três atividades aconselha-se que os alunos relatem as experiências vividas e as análise feitas por escrito, para que possam desenvolver ainda mais suas habilidades escritas. Considerações finais O capítulo apresentou os principais aspectos teóricos estudados na disciplina Laboratório de Ensino de Gramática e as soluções metodológicas encontradas a partir desses aspectos. Como se trata de uma disciplina que faz parte da formação de professores, há a preocupação em mostrar aos futuros docentes de que forma os estudos linguísticos podem ser efetivamente úteis nas aulas de gramática. O objetivo geral da disciplina é o de formar professores que tenham uma postura didática inovadora em sala de aula e que possam promover o aprendizado efetivo de seus alunos em relação a temas gramaticais relevantes. Para alcançar tais objetivos e promover aulas em que o entendimento seja a prioridade e não a memorização, são apresentadas três práticas linguísticas que têm o objetivo de promover o conhecimento linguístico explícito e a percepção e compreensão de fenômenos básicos presentes nas estruturas da língua portuguesa, de forma que tais conhecimentos sejam úteis para o desenvolvimento das habilidades linguísticas e textuais dos alunos. Eloisa Pilati é professora da Universidade de Brasília, possui doutorado em Linguística pela

Universidade de Brasília (2006), atualmente desenvolve pesquisas na área da gramática gerativa e sobre metodologias de ensino de língua portuguesa. Pertence ao grupo Lefog: www.lefog.pro.br, email: [email protected]

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Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. 1998. Parâmetros Curriculares nacionais: ensino médio: linguagens, códigos e suas tecnologias. Secretaria da educação. Fundamental. Brasília: MEC/SEF.. Costa et all 2010. Conhecimento linguístico explÍcito. Guião de implementação do programa. Lisboa. Ilari, Rodolfo. 2003. Lingüística e ensino da língua portuguesa como língua materna. Disponível em Lobato, Lucia. 2003. O que o professor de ensino básico deve saber sobre lingüística. Apresentação na SPBC 2003 (Manuscrito). Noam, Chomsky. 1957. Syntatic Structures. La Haya Mouton, _______ . 1975. Aspects of the theory of syntax. Cambridge Massachusetts, MIT Press. Neves, Maria Helena.1990. Gramática na escola. São Paulo: Contexto. Pilati, Eloisa; NAVES, Rozana; VICENTE, Helena Guerra; SALLES, Heloisa. Educação linguística e ensino de gramática na educação básica. In. Linguagem & Ensino, v.14, n.2, p.395-425, jul./dez. 2011. Pilati, Eloisa; Naves, Rozana; Vicente, Helena Guerra; Salles, Heloisa. 2011. Novas perspectivas para a língua portuguesa em sala de aula. Projeto de pesquisa apresentado ao Programa de Pós-graduação em linguística da Universidade de Brasília. Vicente, Helena & Pilati, Eloisa. Teoria Gerativa e “ensino” de gramática: uma releitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Verbum: cadernos de pósgraduação, n. 2, 2012, p. 4-14. 2013

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