LEI GERAL DO TURISMO: FUNDAMENTOS LEGAIS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TURÍSTICOS

May 23, 2017 | Autor: Celso Brito | Categoria: Turismo, Regulamentação, Legislação Turística
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LEI GERAL DO TURISMO: FUNDAMENTOS LEGAIS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TURÍSTICOS Celso Caciano Brito1 Aguinaldo Cesar Fratucci2 1 INTRODUÇÃO Desde setembro de 2008, o exercício das atividades turísticas em âmbito nacional passou ser regulado, essencialmente pela Lei nº 11.771, conhecida como Lei Geral do Turismo (LGT). Até então, a legislação federal equivalente, que dispunha sobre as atividades e serviços turísticos, era a Lei nº 6.505 de 1977, revogada pela LGT. Esse hiato de mais de três décadas, sem a revisão da principal legislação do setor, configurou um descompasso entre as demandas da atividade e a sua regulamentação, gerando um cenário de insegurança jurídica. São os fundamentos legais estabelecidos pela LGT sobre a prestação de serviços turístico que este trabalho se propõe a abordar, buscando discutir os avanços e retrocessos desse novo dispositivo legal, e principalmente, contribuir para a sua difusão e entendimento, como instrumento importante no desenvolvimento da atividade turística brasileira.

2 A LEI GERAL DO TURISMO A LGT, além de específica e atual, é também a primeira legislação do turismo que procura disciplinar a matéria de forma abrangente (Araújo, 2012). A princípio, ela trouxe maior segurança jurídica para o exercício da atividade e contribuiu para consolidar o turismo como setor estratégico no desenvolvimento econômico e social do país; dado que qualquer atividade econômica precisa de uma base regulamentar sólida para se desenvolver. Portanto, não resta dúvida, que “a consolidação de um ambiente ideal para o desenvolvimento da atividade turística de forma plena demanda o aperfeiçoamento da regulamentação da atividade” (BRASIL, 2007, EMI nº 06/07). Para o Ministério do Turismo (MTur) a definição de

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Mestre em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Santa Catarina. Especialista em Gestão de Empreendimentos Turísticos pela Universidade Federal Fluminense. Contato: [email protected] 2 Doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense. Coordenador do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Turismo da UFF. Contato: [email protected]

marcos regulatórios é o que garante a continuidade e o fortalecimento da Política Nacional do Turismo (BRASIL, 2007, EMI nº 06/07). Como mencionado, a LGT é uma lei abrangente, que não trata apenas da regulamentação da prestação de serviços turísticos. Ela também define a Política Nacional de Turismo e as atribuições do Governo Federal, no planejamento, desenvolvimento e estímulo ao setor. Trata ainda do fomento à atividade turística, tendo como principal fonte de recursos o Fundo Geral do Turismo (FUNGETUR), e propõe a compatibilização da execução da Política Nacional de Turismo com as demais políticas públicas, por meio do Comitê Interministerial de Facilitação Turística (CIFat), criado pela lei. No entanto, para o recorte aqui proposto, interessa abordar a regulamentação da prestação dos serviços turísticos.

3 OS PRESTADORES DE SERVIÇOS TURÍSTICOS: DEFINIÇÕES, DIREITOS E DEVERES Os prestadores de serviços turísticos são definidos na LGT como “as sociedades empresariais, as sociedades simples, os empresários individuais e os serviços sociais autônomos que prestem serviços remunerados” (BRASIL, 2008, Art. 21º), e que exercem uma das seguintes atividades econômicas: meios de hospedagem, agência de turismo, transportadoras turísticas, organizadores de eventos, parques temáticos e acampamentos turísticos. Essas são as atividades com cadastro obrigatório junto ao MTur. A lei estabelece ainda o cadastro facultativo para outros prestadores de serviços, tais como restaurantes, bares, centros de convenções, parques temáticos aquáticos, etc. Autores, como Ferraz (2008), criticam esse fato, entendendo que não cabe a uma lei facultar ou recomendar e sim determinar. A definição de meios de hospedagem passou a independer da forma de constituição do empreendimento, se caracterizando essencialmente pela atividade de prestação de serviços de alojamento temporário. Como bem observa Lenhart e Cavalhero (2008), essa definição contribui para um melhor enquadramento legal dos apart-hotéis, flats e similares como meios de hospedagem. A unidade habitacional ficou definida como sendo local de frequência individual e de uso exclusivo do hóspede. Esse entendimento pode contribuir, por exemplo, para encerrar a discussão sobre a cobrança por exibição de som e imagem no

interior dos apartamentos, com base na lei dos direitos autorais, já que essa previsão legal trata de execuções públicas (Lenhart & Cavalhero, 2008). As agências de turismo ficaram definidas como pessoas jurídicas que exercem atividades de intermediação ou que as fornecem diretamente, e o preço dos seus serviços definidos como a comissão recebida dos fornecedores ou o valor agregado ao preço de custo. Entendimento similar foi dispensado aos organizadores de eventos, tanto sobre a atividade exercida quando sobre o preço dos serviços. Em relação às agências de turismo, Ferraz (2009) entende que essa definição encerra uma dúvida jurídica de ordem tributária, que tendia a considerar o preço de venda dos serviços como base para o cálculo dos tributos. Sobre os organizadores de eventos, o autor lembra que a inexistência de uma regra legal clara os submetia ao risco de serem tributados não apenas pelos valores recebidos por seus serviços, mas, também, por valores de terceiros, que recebiam e apenas transferiam (Ferraz, 2008). Já a questão da responsabilidade objetiva das agências de turismo, não foi regulada. O dispositivo que previa que as agências de turismo seriam responsáveis objetivamente apenas pelos serviços de intermediação e execução direta, e solidariamente pelos serviços cujos fornecedores não pudessem ser identificados ou fornecedores estrangeiros sem representação no Brasil, foi vetado (BRASIL, 2008, Mensagem nº 686). Ferraz (2009) é um dos autores que critica o veto, citando como fundamento o princípio da equidade, expresso no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Segundo o autor, o CDC já prever tratamento similar para os comerciantes de produtos. Oliveira (2009) e Zastawny (2012) são autores que têm o mesmo posicionamento. O transporte aéreo, ainda que para fins de lazer, não foi alcançado pela lei. Já os parques temáticos passaram ser entendidos como prestadores de serviços turísticos, desde que implantados em local fixo, e dependendo de parecer do MTur. A regulamentação não alcançou os parques temáticos aquáticos. Tal exclusão é incompreensível, bem como a dependência dos parques temáticos serem considerados de interesse turístico pelo MTur (Ferraz, 2008; Lenhart & Cavalhero, 2008). Já os acampamentos turísticos ganharam definição na lei, mas ficaram pendentes de regulamentação por parte do Poder Executivo. Essa regulamentação consta no Decreto nº 7.381 (2010).

A LGT regulou também os direitos e os deveres dos prestadores de serviços turísticos, bem como a fiscalização e penalidades as quais estão sujeitos. Sobre os direitos, a lei trata em um único artigo. Já em relação aos deveres, fiscalização, penalidades e infrações ela é bem mais abrangente e específica. Isso mostra de certa forma, que pelo menos em termos quantitativos, prevaleceu o caráter ainda disciplinador e regulador da lei. Ferraz (2008) corrobora com esse entendimento, afirmando que, em termos quantitativos a lei dá preferência à função fiscalizadora. Os direitos dos prestadores de serviços turísticos são basicamente três: a) acessar programas de apoio financeiro e outros benefícios de fomento ao turismo; b) possibilidade de menção dos empreendimentos ou atividades em campanhas do MTur e da EMBRATUR; c) utilização de siglas, palavras, marcas, logos, número de cadastro e selos de qualidades editados pelo MTur. Quanto aos deveres, a lei estabelece uma série de questões de ordem técnicas, que vão desde mencionar o número de cadastro em qualquer forma de divulgação, a manter obediência aos direitos do consumidor e as leis ambientais. A fiscalização ficou a cargo do MTur, e inclui as pessoas físicas ou jurídicas que exerçam a prestação de serviços turísticos, estando ou não cadastradas, incluindo aquelas que usem expressões, abreviaturas ou nomes que induzam ao erro quanto ao real objeto da sua atividade. Foi vetado também o dispositivo que previa classificar como atividade econômica exportadora o setor de turismo receptivo. A classificação não seria automática, dependeria de regulamentação pelo Poder Executivo, e permitiria, por exemplo, que esses prestadores de serviços tivessem direito a benefícios fiscais e acesso a linhas de crédito e financiamentos oficiais específicos do setor de exportação.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da análise, é possível afirmar que a LGT não conseguiu atender todas as demandas do setor turístico nacional. No entanto, isso não significa que ela não trouxe avanços, mas que possivelmente, as demandas e transformações de mais de três décadas, não puderam ser respondidas por um único diploma legal. Portanto, é legítimo afirmar, que a LGT representa uma conquista para o setor, e precisa ser não apenas comemorada, mas também discutida, entendida e colocada em prática. Pois o texto legal não pode revolucionar sozinho,

a sociedade precisa aceitá-lo como legítimo (Oliveira, 2009), e a consolidação de um ambiente ideal para o desenvolvimento da atividade turística passa pela sua regulamentação (BRASIL, 2007, EMI nº 06/07). Logo também se conclui, que o exercício dessa atividade de forma plena demanda um melhor entendimento da sua dimensão legal e regulamentar. Observou-se que existem questões ainda não reguladas e atividades que não foram alcançados pela lei. Ao mesmo tempo em que outras atividades ganharam mais destaque e melhor definição legal, além daquelas que estão figurando pela primeira vez em uma legislação específica do turismo. Em relação à regulamentação da prestação de serviços turísticos, objeto dessa abordagem, conclui-se que houve muitos avanços, mas também retrocessos. Os principais pontos onde se considera ter havido avanços com a regulamentação foram: a) na melhor definição das condições e meios de fomento da atividade; b) na definição legal dos prestadores de serviços turísticos e inclusão dos empresários individuais e serviços sociais autônomos como prestadores desses serviços; c) na definição legal dos meios de hospedagem e preço dos serviços de agências de turismo e organizadores de eventos; d) na inclusão de parques temáticos como prestadores de serviços turísticos; e) e na continuação das discussões sobre a atualização da lei. Por outro lado, entende-se que a lei não avançou de forma considerável nos seguintes pontos: a) ao estabelecer o cadastro facultativo para alguns prestadores de serviços turísticos; b) não incluir o transporte aéreo e os parques temáticos aquáticos como prestadores de serviços turísticos; c) impor condições para o cadastro dos parques temáticos; d) não classificar o turismo receptivo como atividade de exportação; e) permitir o cadastro de empresas organizadoras de evento a partir da atividade secundária; f) não regular os novos modelos de comercialização de serviços de hospedagem; g) e não regular a responsabilidade objetiva das agências de turismo. A LGT também não avançou ao dedicar grande parte das suas disposições a regulamentação do papel de agente fiscalizador do Estado. REFERÊNCIAS Araújo, C. P. (2012). Da EMBRATUR à Política Nacional de Turismo. Pós. Revista do Programa de PósGraduação em Arquitetura e Urbanismo da FAUUSP, v. 19, n. 31, 146-163. Recuperado em: http://www.revistas.usp.br/posfau/article/viewFile/48087/51858. BRASIL. (2008). Lei nº 11.771/2008. Diário Oficial da União, Seção 1. Nº 181 (18-09-08). _____. (2008). Mensagem nº 686/2008. Trata dos vetos dos dispositivos da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. Diário Oficial da União, Seção 1. Nº 181 (18-09-08).

_____. (2010). Decreto nº 7.381/2010. Regulamenta a Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008 e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1. Nº 231 (03-12-10). _____. (2007). E.M.I. no 6/2007 - MTur/MJ/MF/MRE/MP/MT/MMA/MDIC. Ministério do Turismo. Recuperado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/projetos/EXPMOTIV/EMI/2007/6%20%20%20MTur%20MJ%20MF%20MP%20MRE%20MT%20MMA%20MDIC.htm Ferraz, J. (2009). A lei geral do turismo e as agências de turismo. Instituto Politécnico de Beja, Portugal. Recuperado em: www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/Joandre09.doc ______. (2008). A Lei Geral do Turismo e os Prestadores de Serviços. Instituto Politécnico de Beja, Portugal. Recuperado em: www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/Joandre08_2.doc Lenhart, N. L., Cavalhero, L. (2008). Comentários à Lei Geral do Turismo (Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008) e proposições legais para o incremento do turismo no país. Brasília, DF: CNC/CCBC. Oliveira, T. (2009). A Lei do Turismo – Lei 11.771 de 17 de setembro de 2008: uma breve análise. Revista Turismo em Análise, v.20. n.2, 251-262. Recuperado em: http://www.revistas.usp.br/rta/article/viewFile/14184/16002 Zastawny, F. S. (2012). A participação de grupos de interesse e a Lei Turismo. Monografia do Curso de Especialização em Instituições e Processos Políticos do Legislativo, Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados, Brasília. Recuperado em: http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/9950

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