Liberação De Gases Durante A Decomposição Anaeróbia De Três Espécies De Macrófitas Aquáticas

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LIBERAÇÃO DE GASES DURANTE A DECOMPOSIÇÃO ANAERÓBIA DE TRÊS ESPÉCIES DE MACRÓFITAS AQUÁTICAS CAMPOS, Jr., J. J. F. 1 & BIANCHINI Jr., I.2

No presente trabalho discute-se as liberações de gases ocorridas durante a decomposição anaeróbia de três espécies de macrófitas aquáticas, Scirpus cubensis, Cabomba piauhyensis e Salvinia sp. Para a realização do experimento foram montadas câmaras de decomposição nas quais foram adicionadas 4 g de planta (peso seco) em 1 litro de água. Para cada espécie foram montadas quatro câmaras de decomposição, no início do experimento em duas delas foi borbulhado nitrogênio e nas restantes foi borbulhado hidrogênio, de modo a se obter meios anaeróbios neutros e redutores, respectivamente. Os dados obtidos permitem observar uma maior liberação de gases a partir da decomposição de S. cubensis, enquanto que a degradação de C. piauhyensis apresentou baixas taxas de liberação, ficando a decomposição de Salvinia sp em uma posição intermediária. Observou-se, ainda, uma aparente inibição do processo de formação de gases nos frascos nos quais foi borbulhado hidrogênio, uma vez que tais câmaras apresentaram menores volumes de gases formados assim como um atraso do início do processo de liberação de gases, em comparação com as câmaras em que o nitrogênio foi adicionado.

GASES LIBERATION AT THE ANAEROBIC DECOMPOSITION OF THREE AQUATIC MACROPHYTES. This paper presents the preliminary results of a study about the anaerobic decomposition of three species of aquatic macrophytes, Scirpus cubensis, Cabomba piauhyensis e Salvinia sp. For this experiment four decomposition chamber were assembled for each macrophyte, two of then were burbled with hidrogen, and the other with nitrogen to have neutral and acid anaerobic environments. The colected data allows to observe that in the S. cubensis chamber the volume of released gas is higher than in the C. piauhyensis and Salvinia sp flasks. It’s also possible to observe an aparent inibition of the gas liberation process by the hidrogen, once that the chamber with this gas presented a low volume of decomposition gases released at the same preiod than the chambers with nitrogen.

INTRODUÇÃO Geralmente, nos ecossistemas lacustres, a principal fonte de energia e carbono está na forma de detritos orgânicos. Sendo que a maior parte do carbono orgânico apresenta-se como matéria orgânica particulada (MOP) e matéria orgânica dissolvida (MOD). Nestes ambientes, as macrófitas aquáticas da zona litoral, podem vir a ser responsáveis por até 50 % do aporte de matéria orgânica e nutrientes para as cadeias alimentares do sistema. A matéria orgânica na forma de detritos é utilizada nas formas de carbono orgânico dissolvido (COD) e particulado (COP). Uma vez que a maior parte destes detritos é derivada de plantas vasculares, constituindo-se de grande quantidade de polímeros altamente refratários, a microflora decompositora associada aos detritos se constitui a principal importante fonte de alimento assimilável para pequenos invertebrados que não tem capacidade de catabolisar 1 2

PPG -ERN / UFSCar, SP. DHB / UFSCar, SP.

estes compostos (BENNER, MORAN e HODSON, 1986; DE LA CRUZ e GABRIEL, 1974; WETZEL 1983). Durante o processo de decomposição da matéria orgânica, verifica-se a formação de vários gases liberados pelos organismos que atuam no processo de degradação da matéria orgânica. Segundo BALLESTER (1994) em condições anaeróbias os principais gases formados são o dióxido de carbono (CO2), via desnitrificação e redução de sulfatos, o metano (CH4) via a metanogênese e o N2 via desnitrificação. Ensaios de degradação anaeróbia da matéria orgânica de amostras de sedimentos, desenvolvidos em laboratório, indicam a seguinte composição aproximada dos gases formados durante os processos: metano = 85,2%, nitrogênio = 7,5% e dioxido de carbono = 7,1% (SOROKIN e KADOTA, 1972). Em geral em ambientes lacustres, estes gases possuem concentrações mais altas nas maiores profundidades e nas regiões próximas ao sedimento, embora possam, em alguns casos, vir a chegar as camadas superficiais da coluna de água. Estudos mostram que em ambientes eutróficos e hipereutróficos, a decomposição de matéria orgânica pode gerar a ebulição destes gases criando correntes de convecção interna que ressuspendem os nutrientes do sedimento, realizando assim uma fertilização interna de tais sistemas aquáticos (WETZEL, 1983). Este trabalho apresenta os resultados de um experimento que tem o objetivo de verificar a dinâmica de liberação de gases durante a decomposição anaeróbia de três macrófitas aquáticas: Scirpus cubensis, Cabomba piauhyensis e Salvinia sp, representantes das comunidades de macrófitas emergentes, submersas e flutuantes, respectivamente, de uma lagoa marginal da rio Mogi-Guaçu (Lagoa do Infernão).

MATERIAIS E MÉTODOS As plantas utilizadas foram coletadas na Lagoa do Infernão (21o 35’ S e 47o 51’ W), situada na Estação Ecológica do Jataí, município de Luiz Antônio, ( Estado de São Paulo). A Lagoa do Infernão faz parte de um conjunto de 15 lagoas que se localizam na planície de inundação do Rio Mogi-Guaçu, no trecho referente a Estação Ecológica do Jataí. Constitui-se de uma lagoa de infiltração que se conecta ao rio somente durante as épocas de maior precipitação (vazão). Seus dados morfométricos são apresentados através da Tabela I. Após coletadas, as macrófitas: Scirpus cubensis, Cabomba piauhyensis e Salvinia sp foram lavadas no próprio local. Foram levadas ao laboratório, lavadas novamente com água corrente e secas em estufa ( 40 oC), até peso constante. Em seguida, para cada espécie de planta foram montadas quatro câmaras de decomposição, contendo 4 gramas de planta em 1 litro de amostra de água da lagoa (previamente filtrada em lã de vidro). Durante os procedimentos de montagem, em duas das câmaras borbulhou-se, por 30 min., hidrogênio,

nas duas restantes foi borbulhado nitrogênio (30 min.) para a obtenção de meios anaeróbios redutores e neutros, respectivamente. Para a estimativa da liberação de gases, durante o processo de degradação destas plantas, utilizou-se o método manométrico, proposto por SOROKIN e KADOTA (1972). Para tanto, foi montado, para cada câmara, um sistema de tubos em “U” (manômetro de baixa pressão), no qual uma das extremidades foi conectada a câmara. Uma quantidade adequada de água foi adicionada ao sistema e a partir da variação de seu nível, foi possível registrar o volume de gases liberados durante o período entre duas medições (Figura 1). Nestas câmaras foram realizadas amostragens diárias durante um período de 100 dias. Através de um termômetro de mercúrio, medidas diárias de temperatura foram também realizadas. No início do experimento o pH da amostra de água da lagoa do Infernão foi determinado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Através das Figuras 2, 3 e 4 são apresentadas as variações temporais de temperatura e das taxas diárias de formação/assimilação dos gases. Apresentam-se, ainda nestas figuras, as quantidades acumuladas de gases formados (cinéticas) durante o período de 100 dias de decomposição anaeróbia das macrófitas aquáticas. Com base nos registros de temperatura verifica-se que o experimento desenvolveu-se sob uma temperatura média de 26,86 ºC com uma variação de 1,25 ºC (desvio padrão), nota-se, também, que durante o experimento não houve uma tendência definida, de longo prazo, de aquecimento ou resfriamento (Figuras 1A, 1B e 1C). Na comparação entre as variações de temperatura e das taxas diárias de liberação de gases (após, aproximadamente, o 20º dia) é possível notar uma aparente relação entre as variações temporais das taxas e das temperaturas, sendo os processos de liberação favorecidos sob as temperaturas mais altas. A interação entre temperatura e taxas de formação de gases de certo modo era esperada, uma vez que, as taxas refletem as velocidades de processos metabólicos. Neste sentido, vários estudos de decomposição tem apontado a temperatura como um dos principais fatores consicionantes do processo (SOROKIN e KADOTA, 1972; BIANCHINI Jr., 1982;BREZONIK, 1994). Ressalta-se que segundo inventários de campo efetuados por FERESIN (1992; 1995); NOGUEIRA (1989); ESTEVES (1990); BALLESTER (1995); ANTONIO (em prep.) as variações de temperaturas encontradas na lagoa do Infernão são da mesma ordem de grandeza que as registradas do decorrer deste experimento, não devendo se constituir, portanto, em fator inibidor dos processos de degradação em estudo. Por meio das figuras apresentadas é possível notar, ainda, que durante a decomposição de todas as espécies, houve a ocorrência de duas fases distintas nos processos de liberação de gases. Na primeira, ocorrida durante, aproximadamente, os 20 primeiros dias do experimento, observa-se o predomínio dos processos de consumo de gases sobre os de formação. Este predomínio pode ser comparado, quantitativamente, a partir da observação das taxas com sinal negativo, típicas deste período (Figuras 1B, 2B e 3B). Como consequencia do predomínio dos processos de consumo, a integração dos resultados

apresentados através das Figuras 1B, 2B e 3B geraram fases negativas nas curvas cinéticas de liberação de gases (Figuras 1C, 2C e 3C). Supõe-se que esta fase inicial do experimento tenha se caracterizado pela adaptação e seleção dos microrganismos presentes nas amostras de água. Outro fator que pode ter influenciado para que ocorressem taxas globais de liberação de gases “com sinal negativo” (taxas de assimilação) seria o predomínio dos processos de imobilização sobre os de mineralização. Neste sentido, de acordo com SWIFT et alli (1979), como imobilização de um dado elemento entende-se como sendo sua incorporação ou manutenção na forma orgânica; por outro lado, a mineralização ocorre quando as formas inorgânicas de um dado elemento são liberadas durante o catabolismo de um recurso. e o de assimilação de compostos e/ou gases presentes na mistura sedimento/água. Neste sentido, nTais processos devem ter gerado decompositores estejam passando por uma adaptação aos novos ambientes, o que deve gerar a mortalidade dos menos aptos a sobreviver nas condições impostas, sendo que a população de organismos restantes passa a utilizar os compostos já dissolvidos na água para se desenvolver. De acordo com esta hipótese, os processos de mineralização suplantariam os de imobilização somente a partir da adaptação das populações de decompositores é que estes irão ter condições para iniciar o processo de consumo da matéria orgânica das plantas de um modo mais efetivo, iniciando assim o processo de liberação de gases. Na seqüência, uma segunda fase pode ser notada. Na qual verifica-se que a liberação de gases excedeu substancialmente o seu consumo por parte dos organismos decompositores, gerando uma ascendência nas curvas. Nota-se na curva de liberação de gases durante a degradação de Salvinia sp (Figura 4(III)), a partir aproximadamente do 60o dia uma terceira fase, na qual o processo de liberação apresenta um tendência de estabilização com o processo de consumo gases. Supõese que este estágio tenha atingido quando os compostos de mais fácil degradação foram exauridos, restando apenas os compostos de decomposição mais difícil, de forma que os organismos se voltaram para a metabolização dos gases e compostos refratários (dissolvidos e particulados), resultando na tendência de equilíbrio ou mesmo de queda no processo de liberação de gases. Pode-se também observar que os processos em cujas câmaras foi borbulhado hidrogênio apresentaram uma defasagem (atraso) em relação aos que foram borbulhados com nitrogênio. Estudos feitos indicam menores taxas de decomposição de lignocelulose em ambientes redutores, motivo que pode ser a causa desta diferença entre as curvas de liberação. CONCLUSÕES Os resultados obtidos até o presente momento permitem chegar as seguintes conclusões: 1) A metodologia utilizada tem permitido uma boa observação comparativa dos processos de liberação de gases gerados durante a decomposição em ambientes aquáticos com diferentes condições de anaerobiose.

2) Até o momento, a diferença observada na dinâmica de liberação de gases entre as câmaras nas quais foi borbulhado hidrogênio e as em que foi borbulhado nitrogênio confirmam trabalhos já feitos nos quais se observou menores taxas de decomposição em ambientes redutores. 2) Com os resultados até o momento obtidos supõe-se que C. piauhyensis (Figura 3III), tem uma maior quantidade de compostos facilmente assimiláveis, levando a uma alta taxa de decomposição e intensa liberação de gases, ficando S. cubensis (Figura 2III) em um segundo lugar, e Salvinia sp, (Figura 4III) com maior quantidade de compostos de difícil assimilação gerando uma quantidade menor de gases. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. BALLESTER, M. V. R., 1994, Emissões de Metano na Planície de Inundação do Rio MogiGuaçu (Estação Ecológica de Jataí, São Paulo), Tese de doutorado, Univ. Fed. de São Carlos. BENNER, R., MORAN, M.A. & HODSON, R.E., 1986, Biogeochemical Cycling of Lignocellulosic Carbon in Marine and Freshwater Ecosystems: Relative Contributions of Procaryotes and Eucaryotes., Limnol. Oceanogr., 31(1): 89-100. DE LA CRUZ, A. A. and GABRIEL, B. C., 1974, Caloric, Elemental, and Nutritive Changes in Decomposing Juncus Roemerianus Leaves., Ecology, 55: 882-886. WETZEL, R. G., 1983, Limnology, Saunder College Publishing.

ENDEREÇO DOS AUTORES. UFSCar: Universidade Federal de São Carlos, Via Washington Luis, Km 235, Caixa Postal 676, São Carlos, SP. Cep 13565 - 905

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Figura 2: Variação da temperatura (I), das taxas de liberação de gases (II) e do volume acumulado de gases (III) durante a decomposição de S. cubensis.

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Figura 3: Variação da temperatura (I), das taxas de liberação de gases (II) e do volume acumulado de gases (III) durante a decomposição de C. piauhyensis.

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Figura 4: Variação da temperatura (I), das taxas de liberação de gases (II) e do volume acumulado de gases (III) durante a decomposição de Salvinia sp.

Tabela I - Características morfométricas da Lagoa do Infernão (BALLLESTER, 1994)

Área Volume Profundidade máxima Profundidade média Comprimento máximo efetivo Largura máxima efetiva Índice de desenvolvimento de margens Área da Bacia de Drenagem

0,0305 km2 66185,0 m3 4,9 m 2,1 m 325,0 m 96,0 m 2,2 1.494 km2

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