LIDERANÇA ORGANIZACIONAL: uma análise a partir do ponto de vista de Maquiavel em O Príncipe

May 31, 2017 | Autor: Ewslainy Soeira | Categoria: Liderança, Maquiavel
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Descrição do Produto

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ

EWSLAINY CABRAL SOEIRA

LIDERANÇA ORGANIZACIONAL: uma análise a partir do ponto de vista de Maquiavel em O Príncipe

ILHÉUS – BAHIA 2014

EWSLAINY CABRAL SOEIRA

LIDERANÇA ORGANIZACIONAL: uma análise a partir do ponto de vista de Maquiavel em O Príncipe

Monografia apresentada à Universidade Estadual de Santa Cruz para obtenção de título de bacharel em Administração. Área

de

Concentração:

Liderança

e

Gestão Orientadora: Profa. Josefa Sônia Pereira da Fonseca

ILHÉUS – BAHIA 2014

EWSLAINY CABRAL SOEIRA

LIDERANÇA ORGANIZACIONAL: uma análise a partir do ponto de vista de Maquiavel em O Príncipe

Ilhéus, __/__/__

_________________________________________ Josefa Sônia Pereira da Fonseca - Dra. UESC (Orientadora)

__________________________________________ Antônio Oscar Santos Góes - Dr. UESC

__________________________________________ Adriana dos Santos Reis Lemos - Msc. UESC

À todos aqueles que contribuíram e fizeram parte desta trajetória tão especial em minha vida.

AGRADECIMENTOS

À minha mãe Dacy, meu pai Luis, minha irmã Jennifer, meu tio Júnior, minha vó Sisí, meu padrasto Reinaldo e à toda a minha família que sempre me apoiou financeira e emocionalmente para que eu completasse mais esta etapa de minha vida. À professora Josefa Sônia pela orientação mais que proveitosa e de importância fundamental para a conclusão deste trabalho. Aos professores Rozilton Ribeiro, Adriana Lemos e Antônio Oscar pela correção pertinente do mesmo. Ao meu amor Fernando pelo apoio nas dificuldades e pela companhia nas alegrias. À minha sobrinha Júlia por ter vindo em um momento muito especial e trazido muita felicidade à minha vida. Aos amigos, em especial, Nanda, Thi, Mick, Rod, Lú, Manú e Gabi por me mostrarem que a diversão é muito importante. Aos colegas, em especial Larissa, Paula, Olavo, Thiago e Calili pelo apoio acadêmico, pelos momentos de descontração e pela convivência durante este período. Aos professores e funcionários do Departamento de Administração da UESC que fizeram parte desta trajetória e oportunizaram a realização deste sonho que é a minha formação no ensino superior.

MUITO OBRIGADA!

LIDERANÇA ORGANIZACIONAL: uma análise a partir do ponto de vista de Maquiavel em O Príncipe

RESUMO

Os ensinamentos do pensador renascentista Nicolau Maquiavel continuam sendo admirados mesmo depois de cinco séculos de existência. Suas teorias são facilmente empregadas no âmbito da liderança organizacional na administração contemporânea. Esta pesquisa é resultado de uma investigação bibliográfica de caráter científico, catalogado a partir da coleta de material já existente sobre o tema, servindo como trabalho de conclusão de curso em Administração. O trabalho foi organizado em quatro capítulos: o primeiro contendo a introdução e a metodologia empregada. No segundo capítulo foi delimitada a evolução do conceito de liderança desde que se tem notícias até os dias de hoje, fornecendo bases teóricas sólidas para se alcançar o objetivo geral na pesquisa. No terceiro capítulo, as ideias de Maquiavel são introduzidas diretamente no contexto da liderança corporativa, o que representa o objetivo específico “a”. No quarto e último capítulo, foram apresentados os resultados da investigação, que discutiu os atributos necessários ao líder, segundo o pensamento de Maquiavel, de modo a responder ao objetivo específico “b”. A pesquisa possibilitou a identificação de habilidades que o pensador considerava imprescindíveis ao bom líder, que são: a habilidade de prever o futuro; de delegar funções; de saber influenciar; de ter foco e; de valorizar a mudança. Mesmo com todo o conhecimento apreendido com o pensador e mesmo com este conhecimento resumido no presente instrumento de consulta, cabe ao líder moderno ter o discernimento necessário para adequar os ensinamentos de Maquiavel à realidade atual das organizações. Palavras-chave: Liderança organizacional. Maquiavel. Habilidades.

LISTA DE FIGURAS

1 Relação Consideração vs Estrutura de Iniciação .......................................... 20 2 Comportamento de tarefa vs Comportamento de relacionamento ................ 21 3 A divisão do poder segundo Maquiavel ......................................................... 29

LISTA DE TABELAS

1

Resumo e principais autores das abordagens de liderança .............................. 22

2

Classificações comportamentais dos estilos de liderança ................................. 24

3

Os três estilos de liderança ................................................................................ 24

4

Resumo das habilidades indispensáveis ao bom líder a partir do pensamento de Maquiavel em O Príncipe .............................................................................. 38

SUMÁRIO

I CAPÍTULO 1.

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 11

1.1

Problema ....................................................................................................... 13

1.2

Objetivos ....................................................................................................... 13

1.2.1 Objetivo Geral ............................................................................................... 13 1.2.2 Objetivos Específicos ..................................................................................... 14 1.3

Justificativa ..................................................................................................... 14

2

METODOLOGIA ........................................................................................... 15 II CAPÍTULO

3

LIDERANÇA .................................................................................................. 17

3.1

Uma retrospectiva dos conceitos de Liderança ........................................ 17

3.2

Teorias Clássicas de Liderança .................................................................. 18

3.2.1 Teoria dos Traços ........................................................................................... 18 3.2.2 Teoria Comportamental .................................................................................. 19 3.2.3 Teoria Situacional ........................................................................................... 20 3.3

Estilos de Liderança ..................................................................................... 23 III CAPÍTULO

4

MAQUIAVEL E A LIDERANÇA CORPORATIVA ........................................ 26

4.1

Teorias de Maquiavel adaptadas para Líderes Contemporâneos ........... 28

4.1.1 O poder ........................................................................................................... 29 4.1.2 A virtù.............................................................................................................. 30 4.1.3 A fortuna.......................................................................................................... 30 IV CAPÍTULO 5

RESULTADOS E DISCUSSÃO ..................................................................... 33

5.1

Habilidades e Competências indispensáveis ao bom líder ............................ 33

5.1.1 Prever o futuro ................................................................................................ 33 5.1.2 Delegar funções ............................................................................................. 35

5.1.3 Saber influenciar ............................................................................................. 36 5.1.4 Ter foco .......................................................................................................... 37 5.1.5 Valorizar a mudança ....................................................................................... 37 6

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 41

I CAPÍTULO

“Só há um caminho para a felicidade. Não nos preocuparmos com coisas que ultrapassam o poder da nossa vontade”. - Epicuro

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I CAPÍTULO

1 INTRODUÇÃO

Liderança é um tema bastante estudado por parte de profissionais de diversas áreas de atividade. Para Bernard Bass “existe quase o mesmo número de definições distintas sobre liderança quanto o número de pessoas que tentaram defini-la” (BASS apud JACKSON & PARRY, 2007 p.26). A maioria das definições a respeito de liderança elucidam características pessoais dentro do contexto comportamental. Não é conhecida com exatidão a origem desta temática, dando vasão a uma gama de interpretações derivada de sua vasta aplicabilidade, que gira em torno não só do ambiente organizacional, como de qualquer ambiente e situação que permita a diligencia de um indivíduo. Quanto à origem do termo, percebe-se que a definição de "liderar", palavra originada do inglês to lead, se tem registro do ano de 825 d.C. relacionada a direção, comando, condução. O termo "líder" remonta ao século XIV, caracterizando aquele que conduz, e "liderança" é encontrada na língua inglesa somente no início do século XIX (BITENCOURT, 2010). Nas escolas de administração, liderança pode ser alisada sob as diferentes perspectivas e enfoques. Na administração científica (taylorismo) prevaleceu a visão mecanicista voltada para a produtividade e a compreensão de liderança se restringia ao planejamento e ao controle exercidos pelos chefes. Na escola clássica (fayolismo), a liderança limitava-se no "comandar". Alguns princípios que flexibilizavam este comando foram definidos, contudo ainda imperava a autoridade rígida e formal. Já a primeira escola que voltou suas atenções para os liderados foi a das relações humanas, que pautou-se, basicamente, na motivação do trabalhador. Atualmente, personalidades como Jack Welch, Nelson Mandela, Abilio Diniz, o técnico Bernardinho, dentre tantos outros, são frequentemente associadas às características da boa liderança, servindo de inspiração para novos gestores que

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pretendem alcançar o sucesso com alto padrão de desempenho e eficiência. Essas inúmeras influências estão intrinsecamente relacionadas ao estilo de cada um, e por existir tantas definições sobre o que é ser líder e sobre o contexto processual da liderança, foi escolhido para ser analisada neste trabalho de conclusão de curso a liderança influenciada pela teoria de Maquiavel. Niccolò di Bernardo dei Machiavelli, ou simplesmente Nicolau Maquiavel é muito conhecido no círculo da Administração há bastante tempo. As teorias do autor continuam sendo influentes na esfera das organizações mesmo depois de cinco séculos de existência. Sua obra mais conhecida e reverenciada é O Príncipe, onde o pensador expõe sua opinião a respeito de como um líder deve se comportar frente a conflitos políticos, aos seus liderados, aos inimigos, dentre outras situações. É importante ressaltar que estas opiniões expressas na obra foram extraídas, pelo próprio autor, do estudo atento de principados de sua época e como seus líderes os governavam. Para facilitar a compreensão da transferência contextual da obra de Maquiavel para o ambiente da Administração Contemporânea - que é o intuito deste trabalho - é necessário fazer um paralelo compreendendo o Gestor como sendo o Príncipe, a Organização como o Reino e os Conflitos nas/entre Corporações como os Conflitos Militares dispostos em O Príncipe. É fundamental também entender as diferenças impostas pelos parâmetros éticos nas diferentes épocas e sociedades, facilitando assim a leitura e compreensão do contexto da pesquisa. Este trabalho busca apresentar similaridades existentes entre a Liderança Organizacional e o conteúdo da obra supracitada, contextualizando os principais aspectos compreendidos pelo tema e a relevância da reflexão crítica da obra em si, servindo como meio para melhor entendimento do pensamento de Maquiavel aplicado à Administração Contemporânea. Em função das informações contidas, este trabalho consistirá na definição do problema, dos objetivos e da justificativa abaixo delineados.

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1.1 Problema

Autores clássicos são usualmente procurados por leitores que pretendem adquirir e enriquecer os estudos sobre algum assunto ou área de conhecimento. Contudo, muitas vezes estes autores não tenham escrito a obra para o objetivo que o leitor procura, mas esta acaba se “encaixando” perfeitamente aos interesses vislumbrados.

Este

equívoco

consciente

é

costumeiramente

cometido

por

administradores e aspirantes ao consultar O Príncipe de Maquiavel no intuito de ampliar a compreensão sobre gestão empresarial. Num contexto histórico, Maquiavel é compreendido como criador de teorias políticas desde o século XVI e considerado pai da ciência política moderna. De maneira sistematizada, o autor demonstrou em seu trabalho como um líder pode utilizar-se de análises psicológicas, com enfoque comportamental, para influenciar seus liderados. Com o decorrer dos anos e das diversas pesquisas e aprofundamentos do legado de Maquiavel, o autor deixa de ser entendido pelo senso comum como malévolo, injusto, desonesto etc. e passa a ser sinônimo de liderança, poder, estratégia e dedicação às metas. Diante do exposto, questiona-se: Quais são as contribuições mais relevantes extraídas da leitura da obra O Príncipe de Maquiavel para a Liderança Organizacional no âmbito da Administração Contemporânea?

1.2 Objetivos 1.2.1 Objetivo Geral Conhecer a liderança organizacional contemporânea através da ótica de Maquiavel em O Príncipe.

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1.2.2 Objetivos Específicos a. Expor alguns tópicos de relação entre teorias levantadas por Maquiavel em O Príncipe e a liderança organizacional; b. Identificar atributos essenciais ao líder extraídos da obra objeto de estudo.

1.3 Justificativa A principal proposta do presente trabalho é fazer uma reflexão sobre os princípios de Maquiavel aplicados no contexto organizacional, expondo a grandiosa relevância das contribuições do pensador. Este estudo se justifica pela necessidade de evidenciar a investigação científica de Maquiavel na esfera da Liderança em seus diversos estilos, demonstrando o pragmatismo de suas teorias e não obstante, os princípios essenciais para se obter êxito na liderança. Em toda parte do mundo, autores parafraseiam a literatura de Maquiavel em consonância com gerenciamento de empresas e estilos de liderança. Destacam-se as obras dos autores Antony Jay - Management and Machiavelli (Maquiavel e Gerência de Empresas, editora Zahar) e Gerald R. Griffin - Machiavelli on Management: Playing and Winning the Corporate Power Game (Maquiavel na Administração: Como Jogar e Ganhar o Jogo do Poder na Empresa, editora Atlas). O Príncipe ganhou até mesmo uma edição comentada pelo Napoleão Bonaparte em pessoa. Na esfera acadêmica, este trabalho segue a justificativa de servir de parâmetro para outras pesquisas mais aprofundadas, não só na área da Administração, mas também na Ciência Política, Sociologia, Filosofia, História, Psicologia, dentre outras. A relevância acadêmica deste estudo também está na associação dos ensinamentos de um grande pensador da idade moderna com a realidade empresarial nos tempos de hoje, evidenciando a extraordinária importância do contínuo estudo da história da humanidade.

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2 METODOLOGIA

A investigação será desenvolvida a partir do conceito de procedimentos bibliográficos, que segundo Gil (1999, p.65), são pesquisas que se desenvolvem por meio da coleta de material já elaborado sobre o tema, sendo esta a abordagem predominante no presente trabalho. A pesquisa se classifica no grupo dos estudos exploratórios que, ainda segundo o autor, “têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias”, e continua a elucidar que “pesquisas exploratórias são desenvolvidas com objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato” (GIL, 1999, p. 43). Os métodos adotados foram de abordagem qualitativa, que segundo Godoy (1995, p.58), ocorre por meio da constante observação e formulação conceitual a respeito do tema, ou seja, entre a percepção e o desenvolvimento teórico. O processo é o objetivo da abordagem e não o resultado. As análises foram realizadas de forma indutiva (do particular para o geral) pelo pesquisador, de forma que não houve necessidade de uso de técnicas quantitativas ou métodos estatísticos (GIL, 1999, p. 28).

II CAPÍTULO

“Ser líder é como ser uma dama: se você precisa provar que é, então você não é”. - Margaret Thatcher

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II CAPÍTULO

3 LIDERANÇA

3.1 Uma retrospectiva dos conceitos de Liderança Liderança sempre foi um tema de bastante discussão entre estudiosos e profissionais de diversas áreas. Bernard Bass observou que “existe quase o mesmo número de definições distintas sobre liderança quanto o número de pessoas que tentaram defini-la” (BASS apud JACKSON & PARRY, 2007 p.26). Conceito de liderança segundo Chiavenato: É uma influência interpessoal exercida em uma dada situação e dirigida por meio do processo de comunicação humana para a consecução de um ou mais objetivos específicos. Os elementos que caracterizam são, portanto, quatro: a influência, a situação, o processo de comunicação e os objetivos a alcançar (CHIAVENATO, 2000).

Maximiano (2000, p.331) dá uma definição de liderança mais voltada para organizações, e diz que "a liderança é uma função, papel, tarefa ou responsabilidade que

qualquer

pessoa

precisa

desempenhar,

quando

é

responsável

pelo

desempenho de um grupo". Fiedler defende a ideia de liderança como fenômeno da própria natureza humana e declara que “cada homem é potencialmente um líder e a sociedade tem que conseguir ainda identificar e treinar adequadamente aquele homem que será capaz de conduzir suas instituições” (FIEDLER 1967 apud BERGAMINI 1994, p. 25). James C. Hunter em seu best-seller “O Monge e o Executivo”, admite o conceito de liderança como habilidade que se adquire e promete transformar o leitor no que diz respeito da maneira de lidar com os outros. Hunter adverte sobre a distinção entre gerenciar e liderar: “Você gerencia seu inventário, seu talão de

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cheques seus recursos. Você pode até gerenciar a si mesmo. Mas você não gerencia seres humanos. Você gerencia coisas e lidera pessoas” (HUNTER, 2004, p.25). Bergamini alerta que “Liderança é um conceito escorregadio e ilusório, que deixa perplexos mesmo os cientistas sociais” e continua dizendo que os estudos de liderança lidam com aspectos que se contradizem, evidenciando que o que se mostra coerente num dado momento pode não se adequar em outra realidade (BERGAMINI, 1994, p. 24). Este fato abre caminho para que surjam abordagens e teorias a respeito desse assunto extremamente explorado ao logo dos anos.

3.2 Teorias Clássicas de Liderança 3.2.1 Teoria dos Traços Algumas teorias foram desenvolvidas ao longo do tempo numa tentativa de conseguir uma definição sobre Liderança. A teoria do “Grande Homem” do historiador e ensaísta do século XIX Thomas Carlyle (1826-1866), descreve que eventos históricos são determinados e desencadeados por grandes homens e sua influência nas massas. Essa teoria forneceu a base para o desenvolvimento da Teoria das Características ou Teoria dos Traços (CRAINER, S. 2009; GOODWIN, J. C. 2005; MARINOFF L. et al 2005; ROBERTS A., 2004; SCHERMERHORN, J. R et al 1998). Os estudos sobre a Teoria dos Traços afirmam que os líderes já nascem líderes, segundo suas características e que não existe a possibilidade de um indivíduo se tornar líder posteriormente. “O argumento é que certas características, como por exemplo, altura, integridade, inteligência, entre outras, estão relacionadas com o sucesso e, uma vez identificadas, podem ser usadas para escolher os líderes”. (SCHERMERHORN et al 1998 p.226) Sobre esta abordagem, Bergamini (1994 p. 28) explica que seus pesquisadores propunham que os líderes deveriam possuir certas características especiais, que seriam responsáveis não só por fazê-los líder, como também mantêlos no poder.

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Tomando outra visão, Crainer (2009 p.107) contesta essa abordagem esclarecendo que, na esfera administrativa, a teoria de liderança do grande homem dificilmente é válida, uma vez que “são as equipes que fazem funcionar a empresa”, e enfatiza que o interessante seria buscar não líderes individuais, mas grupos de pessoas com várias habilidades de liderança. O enfoque dos traços predominou até a década de 1940 e teve seu “declínio” quando Stogdill, um grande estudioso da área, sugere a impossibilidade de as características pessoais serem o único aspecto determinante da eficácia do líder (STOGDILL apud BERGAMINI 1994, p. 36).

3.2.2 Teoria Comportamental Faz-se necessário destacar que os primeiros estudos de perspectivas comportamentais ou funcionais de liderança foram realizados por dois grandes centros de pesquisa, a Ohio State University e a University of Michigan, que ofereceram grandes resultados de investigações sobre o assunto. Os estudos de Michigan, como relatado por Schermerhorn (1998 p. 226), foram desenvolvidos no intuito de identificar os padrões de liderança que resultam na eficácia do desempenho. “Com base nas entrevistas feitas com grupos de alto e baixo desempenho em diversas organizações, os pesquisadores obtiveram duas formas básicas de comportamento do líder, a saber: centrado no funcionário e centrado na produção”. Os líderes centrados no funcionário são os que dão maior importância ao bem-estar dos seus liderados e os centrados na produção tendem a enfatizar as tarefas, dando maior atenção à conclusão do trabalho, continua Schermerhorn (1998 p. 226). As pesquisas de Ohio foram desenvolvidas quase que no mesmo período que as pesquisas de Michigan - a partir do final da década de 1940 perdurando nas duas décadas seguintes - e os resultados das pesquisas levaram à duas dimensões sobre a liderança: a estrutura de iniciação e a consideração (DUBRIN 2001, p. 269). Se for feita uma análise, pode-se perceber que tanto os estudos de Michigan quanto os de

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Ohio estão voltados para duas variáveis que examinam o envolvimento do líder com seus subordinados.

Figura 01 - Relação Consideração vs Estrutura de Iniciação

Fonte: DUBRIN, 2001, p 271.

A respeito das duas variáveis, Bowditch explica: Líderes fortes em estrutura inicial tinha tendência a dizer a seus subordinados o que fazer e como fazê-lo. Líderes com grande dose de consideração se concentravam na satisfação, nas necessidades interpessoais e no conforto geral dos subordinados. Assim líderes com muita estrutura inicial e pouca consideração eram vistos como autoritários, ao passo que aqueles com grande consideração e pouca estrutura inicial eram percebidos como democráticos, embora essas relações não fossem exatas. Também era possível a existência de líderes com alta ou baixa dosagem em ambas as dimensões, simultaneamente (BOWDITCH, 2004, p.122).

3.2.3 Teoria Situacional

A Teoria Situacional deriva das Teorias Contingenciais iniciadas por Fiedler (1964), que foi um dos primeiros pesquisadores a propor que a situação ou o contexto exercem influência no tipo de líder que seria bem-sucedido em determinada situação, como lembra Muchisky (2004, p. 419). Em uma abordagem mais genérica, Bergamini (1994, p. 47) explica: “As teorias contingenciais, também conhecidas como situacionais, exploram aquelas variáveis que acercam o processo de

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liderança, não deixando de lado os diferentes tipos de comportamentos dos líderes”. Esta é a teoria de liderança mais colocada em prática atualmente (NASCIMENTO 2012, p.77). Dentro desta teoria, uma vertente que ganha bastante força no ambiente empresarial é o modelo de Hersey & Blanchard (1988), que “explica como adequar o estilo de liderança à preparação dos membros do grupo” (DUBRIN 2001, p.174). O modelo se baseia na quantidade relativa de dois comportamentos básicos nos quais o líder se engaja, que são eles: o comportamento de tarefa, que é “o nível em que o líder se dedica em definir os deveres e responsabilidades de um indivíduo ou grupo e o comportamento de relacionamento, que é o nível em que o líder se envolve em comunicação”, como continua DuBrin.

Figura 02 - Comportamento de tarefa vs Comportamento de relacionamento.

Fonte: Situational Leadership®. DUBRIN 2001, p.176

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O autor explica que, se o nível de preparação dos seguidores é R4 (como é mostrado na figura 02) onde o membro do grupo é capaz e interessado, o administrador deverá utilizar um estilo de liderança de delegação - quadrante 4. DuBrin (2001, p.175-176) então arremata dizendo que o modelo proposto por Hersey & Blanchard apresenta categorias tão precisas que podem dar a impressão de infalibilidade, mas na verdade as situações de liderança não dispõe de definições tão claras como sugerem os quatro quadrantes. Bowditch (2004, p.129) parece concordar e ainda completa: “Embora este modelo impressione pela sua abrangência, (...) parece necessário fazer mais pesquisas para cuidar destas preocupações e esclarecer até onde o modelo é capaz de aguentar uma investigação empírica”.

Tabela 01 - Resumo e principais autores das abordagens de liderança.

Fonte: CHAMON, 2008, p.86. Adaptado pela autora.

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3.3 Estilos de Liderança Estudos feitos por Ronald Lippitt e Ralph White verificaram o impacto causado por três diferentes estilos de liderança em grupos de meninos orientados para realização de tarefas. Foram os estilos de liderança autocrática, democrática e liberal (laissez faire), como reproduz Chiavenato (2007). O autor continua relatando os resultados dos estudos de Lippitt & White, dizendo como meninos, orientados por estilos diferentes de liderança, se comportaram em cada caso: 1- Liderança autoritária, onde o líder é duro e imperativo: as reações observadas foram forte tensão, frustação e, sobretudo, agressividade. Também foi notada falta de espontaneidade, de iniciativa e falta de formação de grupos de amizades. 2- Liderança liberal ou laissez faire, onde o líder deixa todos à vontade: p individualismo preponderou e houve pouco respeito ao líder. 3- Liderança democrática, onde o líder toma decisões juntamente com o grupo: Houve relacionamentos cordiais e formação de grupos de amizades entre os liderados. Reponsabilidade, comprometimento pessoal e um bom clima de satisfação também foram notados neste grupo. Partindo dessa experiência, Bowditch descreve os resultados: O estudo revelou que o grupo autocrático produziu mais por uma pequena diferença, mas que o democrático fez coisas de qualidade melhor e apresentou um nível maior de satisfação entre seus integrantes. O grupo laissez faire foi o que se saiu pior dos três em quantidade, qualidade e satisfação dos integrantes (BOWDITCH, 2004, p.121).

Maximiano (2000) argumenta muito bem a respeito destes estilos e acrescenta duas intersecções que são as manifestações híbridas. O autor ainda aponta que se o foco passar do grupo em si exclusivamente para o comportamento do líder, têm-se então cinco classificações de comportamento como se pode ver a seguir:

24

Tabela 02 - Classificações comportamentais dos estilos de liderança Tirania*

Autocracia

Democracia

Liberalismo

Demagogia*

Abuso da

Centralização

Divisão dos

Delegação do

Busca de

autoridade;

de poder de

poderes de

poder de

popularidade

excesso de

decisão no

decisão entre

decisão ao

com os

poder.

chefe.

chefe e grupo.

grupo.

liderados.

Fonte: MAXIMIANO, 2000, p.[341]

*Tirania e Demagogia são os híbridos.

No intuito de facilitar a análise comparativa entre os três estilos, Chiavenato (2007) elabora um quadro no qual se pode visualizar melhor as características de cada classificação:

Tabela 03 - Os três estilos de Liderança

Fonte: CHIAVENATO, 2007, p.[98].

Chiavenato conclui dizendo ser impossível definir um estilo de liderança mais eficaz. A mais eficaz na verdade, será aquela com maior poder de influência sobre o grupo e capaz de unir os liderados em ações coordenadas rumo à obtenção de resultados positivos dos objetivos preestabelecidos.

III CAPÍTULO

“Eu acredito demais na sorte. E tenho constatado que, quanto mais duro eu trabalho, mais sorte eu tenho”. - Coleman Cox

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III CAPÍTULO

4 MAQUIAVEL E A LIDERANÇA CORPORATIVA

O turbilhão do panorama político da renascença italiana entre o século XIV e XVI, e o fato de ter ocupado o cargo de secretário do Conselho dos Dez da Guerra¹, fez com que Maquiavel convivesse com personagens poderosos e tentasse, de certo modo, compilar o que observou em um tipo de instrumento que serviria para orientar a postura e posicionamento do príncipe perante o povo. Instrumento este que era fruto de especulações acerca dos problemas que se apresentavam e de possíveis condutas e atitudes para se chegar à soluções e prevenções de tais problemas. A obra O Príncipe, datada de 1513, representa este instrumento que, certamente pode ser transferido para o âmbito da administração de empresas, ou seja, da liderança organizacional (MAXIMIANO, A. C. A. 2009; JAY, A. 1979; GRIFFIN, G. 1994). Em sua carta ao Magnífico Lourenço de Médici - a quem foi dedicado O Príncipe - Maquiavel racionaliza que não enfeitou a obra em questão com palavras bonitas, ao invés disso prezou para que fosse documentada puramente a verdade dos fatos (MAQUIAVEL, 1987). Muitas vezes, por este motivo, o autor é alvo de críticas e julgamentos negativos e é figurado como maléfico e antiético. Porém, após ponderado, este julgamento pode facilmente ser substituído pelo pensamento de que Maquiavel foi apenas um instrumento para documentar a verdade que ocorrera naquele tempo de controvérsias políticas muito acentuadas.

____________________________ ¹ Conselho dos Dez: Comitê executivo e judicial do governo da República de Veneza, responsável pela segurança do Estado. Fonte: Wikipédia

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"Ele [Maquiavel] referiu, aberta e sinceramente, a maneira como os homens costumavam agir, e não a maneira como deveriam agir", defende Antony Jay a tentativa de Maquiavel ao realizar sua investigação dos principados e continua ao dizer que a sua mensagem era: "Se você deseja o êxito político, este é, aparentemente, o método mais eficaz para consegui-lo" (JAY, 1979, p.38). Cientes deste fato e envolvidos com pensamentos maquiavelianos², muitos autores traduzem as ideias de Nicolau Maquiavel para a realidade do mundo empresarial. Maximiano (2009, p.39) reserva um momento em sua obra para falar deste grande pensador e ressalta sua importância para a administração quando diz: “Maquiavel pode ser entendido como um analista do poder e do comportamento dos dirigentes em organizações complexas”. Maximiano (2009, p.40) continua ao dizer que “se Maquiavel tivesse vivido na segunda metade do século XX, certamente seria um escritor de textos de administração e liderança” - afirmação na qual o autor defende a concepção de que as ideias do pensador podem ser facilmente aplicadas à esfera organizacional, e prossegue afirmando que as ideias de Maquiavel a respeito de liderança continuam atuais e no mesmo patamar “dos mais avançados conceitos” sobre o tema. Antony Jay, em 1979, formula uma análise da aplicação dos princípios de Maquiavel na administração de empresas, o que também faz Gerald Griffin em 1994, quando lança uma obra com o mesmo intuito. Numa abordagem mais ampla, Ari Lima (2012) e Michael A. Ledeen (1999) exaltam as ideias do pensador num contexto mais voltado para o tema “liderança”. Em sua tese de doutorado, Amorim e Perez (2010, p. 231) analisam a obra de Maquiavel em um trecho autoexplicativo: Há vários elementos importantes em Maquiavel para a reflexão sobre liderança. Primeiro, a positividade do poder como recurso para realizar um projeto – o senso comum reduz o poder a sua dimensão de tirania. Segundo, o poder só se legitima – e se sustenta – quando exercido em prol do bem comum. Terceiro, há liderados e líderes, funções e papéis diferentes. Quarto, o poder é passível de contestação, é permanentemente

__________________________ ² Maquiaveliano advém do Maquiavelismo, que é a denominação que se dá à doutrina política emanada do livro O Príncipe, escrito por Nicolau Maquiavel em 1513. Fonte: Wikipédia

28 ameaçado, obrigando o líder a consumir parte do seu tempo e energia para conservá-lo.

As autoras ainda ressaltam o quanto os princípios de liderança de Maquiavel se distanciam das análises dos traços de personalidade e do líder voltado para a tarefa ou para as pessoas. Porém um líder prudente reconheceria os ensinamentos do grande pensador renascentista e daria atenção ao diagnóstico da cultura e do clima no mundo dos negócios. Perceber os problemas no decorrer do processo de liderança também se faz necessário. Conflitos acontecem não só na guerra, mas também nas organizações, como bem lembra Lima (2012, p.07). Intrigas entre profissionais, chefes e subordinados e embates entre empresas acontecem mais que o imaginado, diz o autor, o que provoca graves danos às organizações. “Só mesmo uma liderança eficaz pode resolver a questão” conclui. Se analisarmos o comportamento e as atitudes de líderes que obtiveram sucesso ao longo da história, verificaremos que, em alguma medida e em certo sentido; eles souberam usar os padrões de comportamento ensinados na obra O Príncipe; por outro lado, os que fracassaram negligenciaram os ensinamentos ali contidos (LIMA, 2012 p.8).

Assim, os líderes atuais devem compreender o contexto em que se encontra inserido e saber que Maquiavel escreveu para dirigentes da Itália renascentista, que por sua vez vivia um momento de constantes turbulências políticas e o poder era conquistado, muitas vezes, de maneira brutal e desumana. Cabe ao administrador também entender como o posicionamento que Maquiavel aconselha pode ser adaptado ao meio gerencial e como isso pode interferir positivamente nos processos de liderança.

4.1 Teorias de Maquiavel adaptadas para Líderes Contemporâneos Das teorias levantadas por Maquiavel, destacam-se três facilmente aplicadas no contexto da liderança organizacional, são elas: Poder, Virtù e Fortuna, esclarecidas a seguir.

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4.1.1 O Poder "O poder é a causa mais próxima da liderança e o precursor do sucesso na administração" como bem lembra Gerald Griffin, e ainda alerta que o executivo tem dois desafios básicos para liderar um grupo: ganhar o controle e mantê-lo, e só obtém controle quem tem poder (GRIFFIN, 1994, p. 52). Em sua obra, Chalita define poder como “a faculdade de fazer com que uma ou mais pessoas realizem determinadas ações ou tarefas, submetendo-se à vontade de quem tem o poder” (2005, p. 21). Em outras palavras, o gestor que consegue fazer com que outros cumpram o que lhes foi instituído, este detém controle e consequentemente, poder. Chalita também faz uma análise da obra O Príncipe e observa que “cada capítulo atesta o caráter observatório nas diversas circunstâncias pelas quais pode o governante manter seu poder” (2005, p. 66). Maquiavel trabalha o poder como processo constante, que não pode parar. É necessária a manutenção contínua deste processo, a adaptação com o ambiente, com as circunstâncias e com os indivíduos, e sua manutenção requer qualidades específicas (CHALITA, 2005, p. 84). “Par tratar de poder, Maquiavel utiliza dois conceitos principais: a fortuna e a virtù [...]. Aquele que almeja o poder deve conhecer as circunstâncias e se adequar a elas” (CHALITA, 2005, p. 13). O autor explica que o processo do poder para Maquiavel é dividido em duas ideias que se complementam, que são a virtù e a fortuna, melhor trabalhados a diante.

Figura 03 - A divisão do poder segundo Maquiavel

Fonte: elaborado pela autora

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4.1.2 A Virtù Numa tentativa assertiva de conceituar a virtù tratada por Maquiavel em O Príncipe, Tunhas e Abranches (2012, n.p.) esclarecem: A conquista e a preservação do poder exigem do príncipe aquilo a que Maquiavel chama virtude (virtù) [...]. Significa a capacidade de agir no momento oportuno e de recorrer aos meios certos para obtermos a finalidade que pretendemos.

No mesmo intuito, Barros afirma que “também se definiu esta (virtù) como sendo a capacidade de adaptação do governante às novas circunstâncias políticas advindas inesperadamente, o que o torna homem de êxito” (BARROS, 2012, p. 96). A habilidade de fazer a coisa certa no momento certo e agir em adequação com a ocasião para então obter sucesso disso é o que de fato define a virtù. “Aqueles que, por suas virtudes, semelhantemente a estes [Moisés, Rômulo, Ciro e Teseu], se tornam príncipes, conquistam o principado com dificuldade, mas se mantêm facilmente” (MAQUIAVEL, 1987, p.24). Chalita explica este trecho de O Príncipe dizendo que a virtù está diretamente ligada à percepção da realidade e que a virtuosidade destes homens não pode ser confundida com a boa sorte que tiveram, pois se não tivessem se utilizado da virtù, não teriam percebido a oportunidade dada e consequentemente não alcançariam o poder (CHALITA, 2005, p. 86). Uma conclusão que Maquiavel tira do homem de virtù é que é tolice esperar a sorte. “Afinal a metade do sucesso depende do esforço do homem. Se vier a sorte, o sucesso será total; mas não vindo, a metade está garantida”, esclarece Chalita (2005, p. 70) retomando a ideia da divisão do poder em duas partes. Assim sendo, o homem virtuoso persegue a sorte, mas detém sempre consigo as habilidades necessárias para se alcançar o sucesso, o poder.

4.1.3 A Fortuna “Não obstante, e porque o nosso livre arbítrio não desapareça, penso poder ser verdade que a fortuna seja árbitra de metade de nossas ações, mas que, ainda assim, ela nos deixe governar quase a outra metade” (MAQUIAVEL, 1987, p.103). A

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fortuna, denominada por Maquiavel, é a parte da vida que não pode ser dirigida pela própria vontade do individuo. São os acontecimentos oriundos da sorte, do destino. O autor esclarece este conceito comparando a fortuna com um rio torrencial o qual não se pode governar. Foge das ações humanas controlar seus efeitos. O máximo que se pode fazer é, nos tempos de calma, construir barragens, reparar os danos e aproveitar a bonança (MAQUIAVEL, 1987, p. 103). Quanto à esta comparação, Chalita conclui que “o que importa é estar preparado para aproveitar o máximo sua passagem, e, quando ela [a fortuna] faltar, a virtù pode dar conta sozinha de sua função” (CHALITA, 2005, p. 90). Maquiavel também orienta que não se pode confiar totalmente na fortuna, pois esta atitude pode levar a ruína em razão de suas variações (1987, p. 104). Na mesa linha de raciocínio, Griffin lembra que a fortuna, ou sorte, não pode servir de desculpa para o fracasso próprio ou para o sucesso alheio. É muito mais benéfico usar o fracasso como experiência e aprender algo com isso, que usar as circunstâncias para justificar sua falta de êxito (GRIFFIN, 1994, p. 162). Chalita instrui que “a fortuna não é obstáculo para a virtù. Pelo contrário, ela é portadora das ocasiões de agir” (2005, p. 91). Ou seja, a união dos dois conceitos possibilita ao indivíduo perceber a ocasião e aproveitá-la. A sorte (fortuna) é a oportunidade do indivíduo (gestor) de demonstrar suas habilidades (virtù) para alcançar um objetivo. Para aquele que deseja alcançar ou manter o poder, o necessário é aliar a fortuna à virtù e assim ter sucesso na sua empreitada. A fortuna, a sorte, as oportunidades se apresentam a todos. Cabe ao indivíduo de virtù ter a sabedoria e o discernimento para aproveitá-las.

VI CAPÍTULO

“Vês que a razão, seguindo o caminho indicado pelos sentimentos, tem asas curtas". - Dante Alighieri

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IV CAPÍTULO

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A reunião de informações e investigação bibliográfica sobre os conceitos de liderança e das características do líder possibilitou a compreensão de uma análise da aplicação dos princípios de Maquiavel na administração de empresas. Percebese que, dentro do contexto atual, estes princípios podem ser inseridos facilmente na esfera da liderança organizacional, desde que analisados e utilizados de maneira útil para as organizações e para as pessoas que nelas atuam. A seguir serão destacados atributos essenciais ao bom gestor extraídos da reunião de conhecimentos adquiridos com o levantamento bibliográfico sobre liderança e com o estudo da obra objeto de estudo.

5.1 Habilidades e Competências indispensáveis ao Líder Antony Jay em seu livro concorda que Maquiavel sabia que o sucesso ou fracasso da liderança dependia diretamente das qualidades do líder (1979, p.39). Qualidades

estas

que

são

imprescindíveis

ao

se

pensar

em

liderança

organizacional. Assim sendo, destaca-se a seguir atributos indispensáveis ao bom gestor à luz das ideias de Maquiavel em O Príncipe.

5.1.1 Prever o futuro Este tópico pode dar, de início, uma ideia de certo poder sobrenatural. Na verdade não é este o intuito, e sim uma tentativa de se explicar a relevância do

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estudo atento de experiências anteriores de bons e maus líderes, de lideranças de sucesso e de fracasso. O bom líder deve observar a “repetibilidade” dos acontecimentos e selecionar exemplos de soluções para problemas que venham abater a organização. Deve também se antecipar frente à dificuldades e manter a postura de líder diante de seus liderados. A esta atitude de proatividade, de antecipação dos fatos, que se refere este tópico. O príncipe deve ler histórias de países e considerar as ações dos grandes homens, observar como se conduziram nas guerras, examinar as razões de suas vitórias e derrotas, para poder fugir destas e imitar aquelas; sobretudo, deve fazer como teriam feito em tempos idos certos grandes homens, que imitavam os que antes deles haviam sido glorificados por suas ações [...]. Um príncipe sábio deve observar essas coisas e nunca ficar ocioso nos tempos de paz; deve, sim, inteligentemente, ir formando cabedal³ de que se possa valer nas adversidades, para estar sempre preparado a resistir-lhes. (Maquiavel, O Príncipe: 60-1)

Maquiavel orienta o líder a não se acomodar na zona de conforto, mas sim estar sempre preparado para o caos. Na verdade, é impossível se preparar para algo que ainda não aconteceu, mas o empenho em se preparar para algo ruim acaba por habilitar o gestor a resistir melhor a eventuais adversidades que venham abater a organização. O líder deve ser prudente e não apenas remediar o presente, mas também prever os casos futuros e preveni-los com sabedoria, como adverte Maquiavel. Determinadas causas de êxitos ou de deméritos de certas ocasiões, podem auxiliar na análise de problemas organizacionais da

atualidade, já que,

supostamente, os mesmos efeitos culminam nas mesmas consequências. Em sua obra, Jay trabalha a ideia de que Maquiavel se utilizava do método de tomar um problema atual e examiná-lo de maneira prática, à luz da experiência de outro que já estiveram diante do mesmo problema (JAY, 1979, p.39). É mais que válido se deter de experiências anteriores para auxiliar a tomada de decisão.

__________________________ ³ Significado de Cabedal: 2- Dinheiro ou conjunto de bens; 3- O saber, considerado como riqueza. (fonte: dicionário Aurélio online).

35 Porque os romanos nestes casos fizeram o que todo príncipe prudente deve fazer: não só remediar o presente, mas prever os casos futuros e preveni-los com toda a perícia. (Maquiavel, O Príncipe: 12)

Numa visão prática, é inegável que em uma organização o gestor tem que saber com antecedência certas informações importantes para o bom funcionamento de atividades futuras, como por exemplo, informações sobre o mercado, a economia, sazonalidades etc. Independente do segmento da organização, o gestor deve, de certa maneira, prever o comportamento de variáveis específicas para que possa assim tomar decisões acertadas de curto e longo prazo.

5.1.2 Delegar funções Outro remédio eficaz é organizar colônias, em um ou dois lugares, as quais serão uma espécie de grilhões postos à província. (Maquiavel, O Príncipe: 11)

"Empoderar" pessoas também se torna necessário ao lidar com um grande grupo de liderados. Na obra fica claro que o pensador defende a ideia do que viria a ser o empowerment4 - termo bastante utilizado na administração que significa dar poder à pessoas, permitindo-lhes tomar decisões e participar ativamente da organização - obviamente sendo um pessoal qualificado para isto. Delegar funções é uma forma inteligente de fazer fluir as atividades corriqueiras dentro de uma organização e de elevar a autoestima da equipe de trabalho. Motivação esta que se transforma em maior rendimento e melhor qualidade no resultado. Ou seja, delegar tarefas com sabedoria influi positivamente no processo interno da organização.

_________________________ 4 “Empowerment significa fortalecimento do poder decisório dos indivíduos da empresa ou criação de poder decisório para os indivíduos” (ARAÚJO, 2001, p.195).

36 Se se está presente, veem-se nascer as desordens e pode-se remediá-las com presteza; no caso contrário, só se terá notícia delas quando não houver mais remédio. (Maquiavel, O Príncipe: 10)

Se delegar funções é importante para agilizar processos, se fazer presente aos subordinados também é pertinente. Nada adianta o líder delegar e deixar a cargo do empregado realizar tal ação de maneira aleatória e sem supervisão. Há de se levar em consideração que a pessoa que recebeu a tarefa pode não estar tão engajada na realização desta quanto se esperaria que ela estivesse. É preciso analisar se a pessoa que recebeu a tarefa tem a motivação, o comprometimento e as habilidades necessárias para se alcançar os objetivos propostos.

5.1.3 Saber influenciar Um príncipe deve ter duas razões de receio: uma de ordem interna, por parte de seus súditos, outra de ordem externa, por parte dos poderosos de fora. (Maquiavel, O Príncipe: 77)

Em sua obra, o autor aborda um ponto de grande importância para o administrador moderno, a preocupação não só com o público externo, mas também com o público interno. O gestor deve ter em mente que o bem-estar dos subordinados tem influência direta nos resultados da organização, pois é deles que depende o desenvolvimento das atividades essenciais para o bom funcionamento da organização. Conclui-se somente que é necessário a um príncipe que o povo lhe vote amizade; do contrário, fracassará nas adversidades [...] Conclui-se daí que um príncipe prudente deve cogitar da maneira de fazer-se necessário aos seus súditos. (Maquiavel, O Príncipe: 41-2)

O bom líder tem as competências necessárias para influenciar pessoas, que é saber transmitir sua opinião, interagir e ouvir sua equipe sempre que necessário. Este poder de persuasão é a habilidade que todo líder deve ter a sua disposição,

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uma vez que, se uma equipe não se convence do ponto de vista do líder, certamente não se empenhará em realizar com perfeição as tarefas propostas. A capacidade de estabelecer boas relações dentro da organização e ter uma visão comum com os liderados confere ao líder a qualidade de bom influenciador. O sucesso de um líder reside em seu poder de persuasão, ou seja, na habilidade de expor seu ponto de vista de maneira tão eficaz que convence a todos da veracidade e da importância do que está sendo dito. 5.1.4 Ter foco Deve proceder como os seteiros prudentes que, querendo atingir um ponto muito distante, e desconhecendo a capacidade do arco, fazem a mira em altura superior à do ponto visado. (Maquiavel, O Príncipe: 23)

Focar nos objetivos e metas é o que delineia o sucesso ou o fracasso da organização. Ter foco significa priorizar o que se apresenta com maior relevância, e a relação do líder com seus subordinados deve acontecer de maneira que facilite este empenho em atingir os objetivos estabelecidos. Para a organização, a falta de foco significa perda de tempo, e o valor do tempo nunca esteve tão alto. Uma boa administração do tempo é capaz de aumentar a produtividade da equipe e consequentemente melhora seu desempenho em atividades futuras, realizando assim um processo sinérgico bastante proveitoso para a organização.

5.1.5 Valorizar a mudança Deve-se considerar aqui que não há coisa mais difícil, nem de êxito mais duvidoso, nem mais perigosa, do que o estabelecimento de novas leis [...]. Essa fraqueza nasce parte do medo dos adversários, parte da incredulidade dos homens, que não acreditam na verdade das coisas novas senão depois de uma firme experiência. (Maquiavel, O Príncipe: 24)

O mundo muda constantemente, e as organizações devem acompanhar este processo de mudanças ou ficarão pra trás. Se adequar ao contexto atual é

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imprescindível visto que a mudança faz parte do processo evolutivo humano. É preciso se adaptar à novas tendências, ao surgimento de novos públicos-alvo, à novas tecnologias, novos procedimentos, enfim, tudo o que a modernidade trouxer e que seja fundamental para a organização. A mudança é difícil de ser implantada e mais ainda de ser bem aceita. Sair da zona de conforto incomoda a muitos e este incômodo resulta em resistência à mudança, ao novo. Mudar certamente é difícil, como o próprio pensador coloca, porém se negar a aceitar a mudança é uma forma de suicídio para a organização como um todo. Cabe ao líder usar suas habilidades de antecipar acontecimentos, delegar funções quando necessário, usar seu poder de persuasão para influenciar e manter o foco na mudança. Certamente a união destas qualidades resultará em uma liderança de sucesso.

Tabela 04 - Resumo das habilidades indispensáveis ao bom líder a partir do pensamento de Maquiavel em O Príncipe: Características:

Habilidades: Prever o futuro

Antecipar acontecimentos importantes minimizar os impactos negativos destes;

Citações: e

O Príncipe: p.60-1 e p.12

“Empoderar” pessoas para que possam desenvolver tarefas a modo a agilizar processos;

O Príncipe: p.11 e p.10

Saber influenciar

Usar o poder de persuasão para convencer os liderados;

O Príncipe: p.41-2

Ter foco

Administrar o tempo e manter as atenções no que realmente importa para a organização;

O Príncipe: p.23

Valorizar a mudança

Se adequar ao contexto atual acompanhando o processo de evolução dos novos tempos.

O Príncipe: p.24

Delegar funções

Fonte: Elaborado pela autora.

p.77

e

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Que existem excelentes teorias em O Príncipe é inegável, da mesma maneira que existe uma gama de estudos a respeito da obra. Todos esses pareceres, tanto empíricos quanto científicos, apresentam opiniões, ora corroborando com as ideias do autor, ora refutando seus ensinamentos. É justo discordar das ideias de Maquiavel, mas é difícil ignorar o fato de que o pensador deixou um valioso legado para a humanidade.

O pensador fez um

trabalho brilhante ao sintetizar o conhecimento empírico e resumi-lo em uma obra que, além de ser uma leitura essencial e obrigatória para estudantes de Administração, também é apreciável para os interessados e estudiosos de qualquer área de conhecimento. O presente trabalho se propôs a conhecer a importância da contribuição de Maquiavel para a Administração contemporânea, e, neste processo, constatou-se que as teorias levantadas na obra em estudo no período renascentista, também são de grande valor para os gestores modernos. A pesquisa realizada também possibilitou a identificação de algumas habilidades que o pensador acreditava serem indispensáveis ao sucesso de uma boa liderança e que são, do mesmo modo, indispensáveis nos tempos de hoje. São elas: a habilidade de prever acontecimentos importantes e minimizar seus impactos negativos; delegar funções para agilizar processos; usar o poder de persuasão para convencer a equipe do caminho certo a ser seguido; administrar o tempo e manter o foco no que realmente é importante; e se adequar aos novos tempos, fazendo mudanças necessárias para evoluir sempre.

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A partir da ótica de Maquiavel, chega-se a conclusão de que existem atributos de caráter universal indispensáveis ao líder. Porém, é necessário ter em mente que não existe fórmula exata para o sucesso do processo da liderança, pois sempre existirão adversidades circunstanciais que exigirão do líder a sagacidade para se adequar a cada situação. Mesmo com todos os ensinamentos apreendidos com o pensador, sem profissionalismo e competência técnica, o gestor está fadado ao erro e ao fracasso na liderança. Espera-se que este material possa servir de consulta para outras pessoas e organizações que buscam maior conhecimento na área da Liderança organizacional, e que procuram aprender um pouco mais com Maquiavel, um pensador tão influente até hoje.

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