LÓGICAS FINANCEIRAS E TERRITÓRIO: NOTAS DE PESQUISA A PARTIR DE UM ITINERÁRIO DE CAMPO

July 15, 2017 | Autor: Ricardo Scherma | Categoria: Economic Geography, Financeirização do mundo, Geography of Finance and Financial Crises
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São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6

LÓGICAS FINANCEIRAS E TERRITÓRIO: NOTAS DE PESQUISA A PARTIR DE UM ITINERÁRIO DE CAMPO1 Ricardo A. Scherma2 Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS [email protected]

INTRODUÇÃO Os estágios de pesquisa de curta duração são uma ótima estratégia para pesquisadores em formação conhecerem novas realidades em centros de excelência em pesquisa no exterior, bem como de ampliar a sua cultura pessoal e seu modo de ver o mundo, e ainda inserir a pesquisa brasileira em um âmbito de discussão internacional. Para além de uma formação objetivando aprender técnicas e teorias para depois aplicar em nossa realidade nacional, o desenvolvimento científico brasileiro permite hoje um diálogo e a apresentação, para a comunidade internacional, da situação da ciência em nosso país. O plano de pesquisa elaborado e aprovado pela junta do Dipartimento Interateneo Territorio da Università di Torino teve como objetivo principal aprofundar o conhecimento a respeito das relações entre sistema financeiro e território e tomar contato com a experiência italiana de pesquisa e ensino nesse tema. Isso dada a importância de se compreender como processos e ações políticas que ocorrem em escala mundial, como, por exemplo, a mundialização financeira e a financeirização do sistema econômico e do território, manifestam-se de maneira diversa em cada lugar. A seguir, apresento minhas anotações e reflexões que tratam de dois trabalhos realizados durante o estágio de pesquisa. Um primeiro que aborda os trabalhos de campo em Milão e no Bairro La Defense, em Paris.3; e um segundo que trata 1

Este trabalho foi escrito a partir de excertos do II Relatório de Pesquisa "Sistema Financeiro Mundial, Planejamento Estratégico e Uso Corporativo do Território Brasileiro" (PPGG – IGCE /UNESP campus de Rio Claro) apresentado a FAPESP em janeiro de 2012. Pesquisa Financiada pela FAPESP.

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Professor de Geografia Humana na Universidade Federal da Fronteira Sul – Chapecó (SC). Doutor em Geografia pelo IGCE – UNESP campus Rio Claro (SP)

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O principal objetivo dos trabalhos de campo foi o de coletar fotos, material informativo e vivenciar aquilo que os pesquisadores vêm denominando de “Landscape of Power”. O trabalho de campo buscou se desenvolver no sentido de entender como a recente concentração do sistema financeiro criou nas cidades essa nova paisagem

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das anotações que se referem à crise financeira no bloco europeu e a como a sociedade italiana reage a essa crise.

MILÃO – CENTRO FINANCEIRO DO TERRITÓRIO ITALIANO Em ritmo crescente, sistemas de objetos técnicos gigantescos, como os arranha-céus, são incorporados na paisagem das cidades europeias que assumiram a função de centros financeiros. O mesmo fenômeno também pode ser encontrado

em

outras cidades “nó de rede” do sistema financeiro ao redor do mundo. Para além da funcionalidade imediata que emerge da organização dessa paisagem onde a densidade técnica encontra sua situação limite, onde também a densidade comunicacional, dada pela proximidade física dos agentes, possibilita os negócios face-a-face, a produção dessas paisagens expressa simbolicamente o poder hegemônico do capital financeiro, bem como de outras grandes corporações ligadas aos setores de comunicação, marketing, consultorias e a indústria transnacional, que estabelecem nesses lugares seus centros internacionais de administração. A cidade se mostra, portanto, como resultado da ação e da ideologia dominante, que cria seus símbolos e se faz afirmar e reproduzir apoiadas neles. Podemos definir centro financeiro como uma área ou uma cidade onde se concentram empresas e instituições do sistema financeiro com capacidade de controle do setor, lugar em que essas empresas escolhem para instalar e fazer funcionar sua sede social. Considerar a cidade como um todo como centro financeiro é melhor que considerar somente uma parte dela, visto que nos últimos anos verifica-se uma desconcentração e expansão desses centros de controle do sistema financeiro para diversas áreas das cidades devido a processos de requalificação urbana que garantiram aos agentes do sistema financeiro novos espaços ótimos para operar nos centros metropolitanos. Durante os anos 90, os processos de aglomeração se acentuam em algumas metrópoles-centros financeiros. A presença, nessas grandes cidades, de sofisticadas estruturas institucionais e o emprego difuso da tecnologia de informática constituíram elementos distintivos do papel de comando que essas cidades desenvolveram. Também nesses territórios concentram-se especialistas dos setores de inovação financeira, análise de informação de mercado, além de gerentes com capacidade de construir redes de relacionamento e negócios internacionais. É ainda nessas cidades que a contínua interação urbana.

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entre economia financeira e a configuração da cidade acaba por assumir uma forte valorização simbólica visível na própria arquitetura dos edifícios que representam uma estética e uma ideologia do poder econômico (LUCIA, 2010). Na Itália, o recente processo de fusão do sistema bancário ocorrido após a liberalização financeira na década de 90 garantiu à cidade de Milão, na Região Norte do país, um controle muito forte de todo o sistema bancário italiano. Como asseveram Faravelli e Clerici (2011), a reorganização do sistema financeiro definiu Milão como “território-nó” e isso tem efeitos visíveis na transformação material e imaterial do espaço urbano. Nos anos 90, novas sedes bancárias são construídas como espaço para atividade administrativa. Lembram as autoras que Milão é hoje capaz de controlar um número 2 vezes maior de agências bancárias em relação a Roma. Contudo, se no final dos anos noventa em Milão o desenvolvimento de uma nova paisagem urbana marcada pela concentração de sedes financeiras estava apenas em seu início, hoje essa nova paisagem urbana, que simbolicamente busca demonstrar o poder do capital financeiro, já se mostra ao povo italiano e ao mundo. A opção de um plano urbanístico que possibilita a ocupação urbana de alta densidade garantiu a construção de novos complexos arquitetônicos que se avizinham a antigos palácios do século XVII,

requalificados para o uso das empresas do sistema

financeiro. Em Milão, hoje já é possível encontrarmos exemplos emblemáticos de “paisagens do poder”4.

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O termo encontrado na literatura italiana é “Landscape of Power”, categoria trabalhada e desenvolvida pela socióloga norte-americana Sharon Zukin.

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Foto 1: Edifício que abriga a Bolsa de Valores de Milão. Toda a região ao redor é plena de sedes de bancos e outras instituições do sistema financeiro.

Foto: Ricardo A. Scherma / dez. 2011

O maior projeto de requalificação urbana em Milão ligado ao sistema financeiro é o projeto Porta Nuova. Formado por um complexo que abriga residências, espaços comerciais, centros de direção e parques, Porta Nuova é considerado um dos maiores projetos de requalificação da Europa. Sob o comando financeiro e promoção imobiliária da operadora Hines5. O principal objeto geográfico do complexo é a moderníssima Torre Pelli, lugar para onde um dos maiores bancos da Itália, o Unicredit, transferirá sua sede. Em Porta Nuova, a conexão com o tecido urbano e extra-urbano será excelente devido a quatro linhas de metrô, duas estações ferroviárias, uma densa rede de transporte público de superfície e a disposição de linhas de trens de alta velocidade, tudo isso coligado e servindo de maneira eficaz a essa área urbana.

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Com investimentos em mais de 100 cidades nas regiões econômicas mais dinâmicas do planeta, lugares onde se concentram centros de gestão de empresas transnacionais e a classe dirigente neoburguesa, a empresa financeira Hines é um dos maiores fundos de investimento do setor imobiliário no mundo. Atualmente o portfólio de projetos da Hines engloba mais de 1.145 propriedades em que se concentram projetos de arranha-céus, uso misto, sedes corporativas, resorts, hospitais e residenciais de luxo. A empresa atualmente conta com ativos avaliados em US $23,4 bilhões.

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Foto 2: Uma das faixadas da moderníssima Torre Pelli, já quase totalmente construída, destaca-se na paisagem urbana do novo centro financeiro de Milão.

Foto: Ricardo A. Scherma / dez.2011.

Estranhamente, o Unicredit, ao mesmo tempo em que consolida seus planos de ocupar a Torre Pelli, anuncia mais 5.000 demissões, o que representa 12% de sua força de trabalho. O motivo: a crise financeira internacional. Certamente, um conglomerado com a capacidade de ocupar um complexo de torres como a Pelli não precisaria demitir trabalhadores em função da crise; essas demissões são, acima de tudo, motivadas pelas reestruturações advindas dos processos de fusões e aquisições que esse banco tem realizado nos últimos anos.

LA DEFENSE E A ESPECIALIZAÇÃO URBANA EM PARIS No atual contexto de competição e cooperação entre as cidades europeias, destaca-se, na Região Metropolitana de Paris, em sua área oeste, o distrito La Défense. Esse distrito, já reconhecido como centro financeiro, começou a ser edificado no início dos anos 60 e hoje é uma das principais áreas de negócios da Europa, com predominância absoluta das empresas do terciário e quaternário. Com enormes arranha-céus, esse bairro pode ser visto de quase toda a cidade de Paris. Seu imponente e futurista Arco do Triunfo, idealizado pelo arquiteto Johan Otto Von Spreckelsen, finalizado em 1989 e inaugurado na ocasião do segundo centenário da Revolução Francesa, é a obra de arte ao ar livre mais importante do 2285

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distrito, além de ser simbolicamente muito forte. Foto 3: Arco do Triunfo, de Otto Von Spreckelsen. A grandeza dessa obra faz lembrar aos que visitam La Défense o poder e a magnitude das empresas dominantes do novo capitalismo, “habitantes” do Distrito.

Foto: Ricardo A. Scherma / jan. 2012

La Défense abrigava, em 2009, 2.500 empresas, sendo 1.500 delas sedes sociais e ainda 15 sedes das 50 maiores empresas globais, que necessitam de 180 mil trabalhadores, sendo 57% desse total gerentes. Além das empresas, 22 mil pessoas habitam o distrito. Quanto à composição dos setores de atividades presentes nesse centro: 26% são firmas do setor de seguros e finanças; energia e petroquímica ocupam 21% dos escritórios; 7% referem-se ao setor público; 7% indústria; 6% auditoria; 5% informática; 5% mídia; 3% indústria farmacêutica; 3% indústria automotiva; 2% telecomunicações e 7% outros. Na história recente de Paris, particularmente no início dos anos 1990, grandes bancos e seguradoras abandonam o centro tradicional e passam a investir em La Défense; esse processo acaba por relacionar a imagem do lugar à de centro financeiro. Entre essas 2286

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empresas, encontra-se o grande conglomerado financeiro francês Societé Generale. Ocupando as modernas torres

Chassagneet Alicante, construídas em 1995, esse

conglomerado exibe, com suas torres, o seu poder ao mundo. Ainda podemos encontrar em La Défense outras grandes empresas do sistema financeiro, como HSBC, Dexia, AGF, Gan AXA etc. Foto 4: Torres Chassagne et Alicante. Sede do Conglomerado Financeiro Societé Generale.

Foto: Ricardo A. Scherma / jan. 2012.

Tanto Milão como La Défense, em Paris, foram nesses últimos anos cidades que conheceram a implantação de grandes projetos urbanos para atender a essa nova fase de desenvolvimento do sistema capitalista, em que os centros de gestão e controle se concentram em poucos lugares e os circuitos de produção e extração de mais-valia se tornam territorialmente cada vez mais estendidos. Esses grandes projetos urbanos,

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responsáveis por produzir nas cidades as atuais “paisagens de poder”, estão quase sempre ligados, sobretudo, à exigência de transporte, tecnologia, inovação e comunicação, tão reclamados no desenvolvimento dos espaços corporativos. E ainda parte discursiva desses projetos, num crescente contexto de internacionalização, ligar imagem da cidade ao moderno e à imagem de que essa está pronta para competição entre os lugares, características marcantes do contemporâneo período da globalização, ainda que pesem todas as carências da população, mesmo nos países desenvolvidos6. Foto 5. Praça da Bastilha. Durante os trabalhos em Paris, nos deparamos com uma família inteira vivendo dentro de uma cabine telefônica em um dos lugares mais importantes da cidade.

Foto: Ricardo A. Scherma / jan.2012.

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As revoltas ocorridas em Paris e em Londres nos últimos anos exemplificam bem essa afirmação. Ademais, durante meu estágio, encontrei notícias como a de uma família italiana que estava morando em seu carro parado há meses em um estacionamento subterrâneo de Turim, bem como o avistar cotidiano de pessoas pedindo esmolas nas ruas da cidade. Segurando placas como “Temos Fome”, “Não Somos Uma Miragem”, “Vende-se”, “É só para continuarmos vivendo” e prostrados em posições de extrema humildade, com a cabeça baixa ou mesmo de joelhos. Essa situação inaceitável de miséria humana demonstra o crescente desmonte do Walfare State nos países da Europa Ocidental.

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TERRITÓRIO EM CRISE: DÍVIDA PÚBLICA E TENSÕES SOCIAIS EM TERRITÓRIO ITALIANO Um dos objetivos dos meus estudos na Itália era também o de acompanhar como a crise financeira relacionada à dívida pública se desenvolvia no Bloco e como a sociedade europeia, em especial a italiana, reagia a essa crise. Quando no Brasil ainda preparava a minha documentação para a viagem (julho de 2011), acompanhava o agravamento da crise financeira e de seus desdobramentos, principalmente em território italiano. Setembro de 2011, mês de minha chegada, logo se mostrou um momento muito delicado, marcado por tensões sociais que se agravavam; essas tensões foram geradas pela estagnação econômica vivida já há anos no país e os recentes cortes nos gastos sociais, como medida econômica anti-crise, realizados pelo governo neoliberal de Berlusconi. Pude acompanhar pelos jornais e conversando com professores e estudantes a situação econômica e social em que se encontrava o país. O agravamento político e econômico da crise da dívida pública foi tamanho que gerou um turbulento período, culminando com a renúncia do Primeiro Ministro, Berlusconi, e a aprovação de um novo plano de austeridade e reformas. Destaca-se que entre os meses de setembro e final de novembro as cidades italianas foram cenários de intensos protestos sociais, marcados por passeatas e assembleias de estudantes, greves dos operários de empresas como a FIAT e muitas paralisações de funcionários do sistema público de transportes. Entre esses protestos, em Roma, no dia 15 de outubro, a Itália e o mundo presenciaram um intenso choque entre as forças da polícia e os manifestantes, em especial aqueles de orientação política anarquista, denominados Black Bloc. Durante minha estadia, pude acompanhar, como observador, algumas dessas manifestações. Uma delas (foto 6 e 7), organizada principalmente por jovens secundaristas, contou com aproximadamente 3 mil estudantes, que percorreram as principais vias da cidade de Turim para se reunirem em assembléia na Piazza Vitorio Venetto, lugar onde discutiram um projeto para afrontar os violentos cortes no sistema educacional promovidos pelo governo nos últimos anos, fragilizando muitíssimo a educação pública do país. Nesse mesmo dia, mais de 100 cidades italianas foram palco de protestos dos estudantes secundaristas.

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Foto 6: Alunos da escola secundária manifestam-se contra os cortes no orçamento da educação. Torino (Itália) - Outubro de 2011

Foto: Ricardo A. Scherma.

Foto 7: Policiais das tropas de ordem pública em manifestação de estudantes universitários. Após os confrontos em Roma, as manifestações passam a ser fortemente vigiadas pela Polícia. Turim (Itália – Novembro de 2011)

Foto 7: Policiais das tropas de ordem pública em manifestação de estudantes universitários. Após os confrontos em Roma, as manifestações passam a ser fortemente vigiadas pela Polícia. Turim (Itália – Novembro de 2011) Foto: Ricardo A. Scherma

Foto: Ricardo A. Scherma

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A manutenção da crise na Itália também possibilita o crescimento de atividades financeiras como o micro-crédito, um outro interesse da pesquisa. Uma das empresas visitadas foi a PerMicro. Nascida em 2007, funciona como uma empresa que realiza a atividade de microcrédito por meio de dois canais: Microcrédito Família e Microcredito Empresa. A primeira modalidade, Microcrédito Família, trata da concessão de crédito para atender exigências pessoais como: mandar dinheiro para o exterior, comprar um carro usado, etc. Lendo os números do relatório da PerMicro, pode-se observar que do total de crédito concedido nessa modalidade, desde o nascimento da empresa, vemos que 46,8% foram usados pelas famílias para cobrirem despesas da casa, seguidos de despesas com a família (24,3%) e despesas médicas (8,4%); logo depois, constatam-se outras m porcentagens menores, como despesas com formação (2,3%), pagamento de dívidas (4,3%), etc. Foto 8: Progandas da financeira Per micro podem ser vistas em muitos pontos por onde circula a população pobre de Turim. Nesta foto, um dos cartazes, presente em um ponto de ônibus próximo à estação central da cidade

Foto Ricardo A. Scherma out.2011.

Entre seus clientes, a população imigrante é absolutamente dominante. Na modalidade Microcrédito Família, apenas 15,8% de seus clientes eram italianos. A participação de imigrantes do leste europeu, de maneira particular da Romênia, é bastante significativa, tendo essa população uma participação de 14,1%, seguida da comunidade 2291

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Ucraniana, com 7,1%. Outro grupo significativo são os Filipinos, que compõem, sozinhos, 22,7% da carteira de crédito da empresa nessa modalidade. Outro canal de fornecimento de crédito é de Microcrédito Empresas. Trata-se de uma modalidade de crédito que busca financiar pequenas empresas, concedendo o valor máximo de 15.000 euros. A preferência é para financiar pequenas empresas com atividades há pelo menos 2 anos, pois, assim, a partir da análise do balanço da microempresa, é possível saber sobre sua capacidade de pagamento; também adotam como metodologia de análise uma visita ao empreendimento. Depois da concessão de crédito, há também um processo de monitoramento, que é feito por telefone uma vez por mês e ainda por meio de um encontro a cada três meses. Esse monitoramento gera um custo significativo, no entanto, ele é necessário para garantir o retorno aos investidores. Em relação à nacionalidade dos tomadores de empréstimo, mais uma vez os estrangeiros se destacam como os maiores clientes: 32,8% das concessões foram realizadas a empreendedores Asiáticos, seguidos dos Africanos, com 28,5%; os comerciantes de países do Leste Europeu receberam 17,2% enquanto que os Latino Americanos compõem 7,7% da carteira de crédito da PerMicro. Os Italianos representam 17,2% na carteira de concessões. Observa-se que nos países da Europa Ocidental a demanda por acesso aos instrumentos técnico-financeiros relacionados às microfinanças vem crescendo de maneira especial devido à presença cada vez maior da população pobre imigrante (fotos 8 e 9). Nos últimos vinte anos, a cidade de Turim viu seu contingente de imigrantes crescer muitíssimo. Hoje em Turim ao menos um residente, entre dez, é de origem estrangeira e a proporção aumenta a cada ano. Os violentos processos e eventos, políticos econômicos e militares, que ocorreram no mundo no início dos anos 90, forçaram milhares de pessoas a buscarem um novo lugar para viver com um pouco de dignidade 7. Vencidas as barreiras culturais e jurídicas que impedem o desenvolvimento das microfinanças nos países da Europa Ocidental, a presença de uma população, sempre crescente, de imigrantes no território europeu abre novas perspectivas de lucro aos agentes do sistema financeiro, visto que, para a população pobre urbana, a possibilidade de obter dinheiro líquido na forma de crédito é mais importante do que quanto se pagará no final, em forma de juros. Partindo da definição de Microfinanças como uma atividade em que se oferece 7

A depressão econômica na Nigéria, fim do comunismo nos países do Leste Europeu; a guerra entre Senegal e Mauritânia; crise financeira na Federação Russa; os bombardeios da Otan sobre a Sérvia; a guerra norte-americana no Afeganistão foram alguns dos eventos que motivaram milhares de pessoas a partirem para Itália e para outros países da Europa (informações anotadas em visita a exposição Turin EARTH).

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toda uma gama de serviços financeiros a uma população não-bancarizada, as possibilidades se alargam para agentes do sistema financeiro, que podem, além do crédito, vender novos produtos financeiros, como microseguros e captação de poupança. Durante a pesquisa, tornou-se evidente como os bancos e instituições de microfinanças reconhecem que esses produtos financeiros são hoje mais importantes para eles que a própria oferta de crédito.

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Foto 9: Porta Pallazo – Turim/Itália - Localizado em uma região central da Cidade, este bairro passou por um processo de Gentrificação nos últimos anos. A partir de então, os imigrantes e italianos empobrecidos ocupam essa região da cidade, lugar onde se desenvolve essa economia pobre urbana, que acaba por ser uma forma de sobrevivência para um número cada vez maior de pessoas, mesmo dentro dos países desenvolvidos

Foto Ricardo A. Scherma Set-2011

Foto 10: Circuito inferior da economia urbana na cidade de Turim - Porta Palazzo

Foto Ricardo A. Scherma Set-2011

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LÓGICAS FINANCEIRAS E TERRITÓRIO: NOTAS DE PESQUISA A PARTIR DE UM ITINERÁRIO DE CAMPO EIXO 3 – Desigualdades urbano-regionais: agentes, políticas e perspectivas

RESUMO O processo de concentração territorial das sedes de gestão das empresas do sistema financeiro em poucas cidades do mundo tem provocado transformações urbanas importantes nessas cidades. Dentre essas transformações, podemos destacar a mutação e a própria construção de uma nova paisagem urbana. A instalação de grandes sedes bancárias e outras empresas ligadas ao setor financeiro, que vão a reboque para esses mesmos lugares aproveitando-se das vantagens aglomerativas dadas pela situação geográfica de oligopólio, acaba por modificar a própria organização do espaço urbano. Durante os anos 90, os processos de aglomeração se acentuam em algumas metrópoles-centros financeiros. A presença, nessas grandes cidades, de sofisticadas estruturas institucionais e o emprego difuso da tecnologia de informática constituíram elementos distintivos do papel de comando que elas desenvolveram. Também nesses territórios concentram-se especialistas dos setores de inovação financeira, análise de informação de mercado, além de gerentes com capacidade de construir redes de relacionamento e negócios internacionais. Nessas cidades, a contínua interação entre economia financeira e a configuração da cidade acaba por assumir uma forte valorização simbólica visível na própria arquitetura dos edifícios que representam uma estética e uma ideologia do poder econômico (LUCIA, 2010). Contudo, a crescente financeirização do sistema econômico e do território tem levado a crises econômicas e territoriais, mesmo nos países de capitalismo avançado, levando trabalhadores, estudantes e aqueles que dependem dos reucursos do Estado de Bem-Estar Social a situações de degradação das condições de existência. Para compreender esses processos, apresento parte do trabalho realizado durante estágio de pesquisa na Univertá di Torino (Turim - Itália). Primeiramente, trago as anotações e reflexões dos trabalhos de campo realizados em Milão e no distrito La Defense em Paris, para, em seguida, descrever e analisar, a partir das anotações de diário de campo, o acontecer da crise financeira no bloco europeu e como a sociedade italiana reagia a essa crise naquele ano de 2011. Destaca-se que, entre os meses de setembro e final de novembro de 201,1 as cidades italianas foram o lugar de intensos protestos sociais, marcados por passeatas e assembleias de estudantes, greves dos operários de empresas como a FIAT e muitas paralisações de funcionários do sistema público de transportes. Portanto, nas últimas duas décadas, a politíca econômica, urbana e territorial tem favorecido agentes do sistema financeiro mundializado na produção de espaços ótimos para acumulação financeira, ao mesmo tempo em que se fragiliza o Espaço da Nação, mesmo nos países em que a população historicamente tem mostrado o seu poder de renvidicação, como é o caso italiano. Palavras-chave: financeirização; espaço urbano; trabalho de campo. 2296

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