Luís dos Santos Vilhena: Pensamento Ilustrado na Colônia

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Graduando em História da Universidade Federal Fluminense. Desenvolve pesquisa sob orientação do Prof. Dr. Guilherme Pereira das Neves. Bolsista de iniciação científica (CNPq/PIBIC/UFF) vinculado a projeto coordenado pelo Prof. Dr. Luciano Raposo de Almeida Figueiredo. E-mail de contato: [email protected].
Cf. NEVES, Guilherme Pereira das. "Luís dos Santos Vilhena". In: VAINFAS, Ronaldo (dir.). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro, Objetiva, 2000.
A cartas estão disponíveis em duas edições: VILHENA, Luís dos Santos. A Bahia no século XVIII. Salvador, Itapuã, 1969, 3 v. e _____. Recopilação de notícias soteropolitanas e brasílicas. Bahia, Imprensa Oficial, 1921-22, 2 v.
VILHENA, Luís dos Santos. Pensamentos políticos sobre a Colônia. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, Série Publicações Históricas 87, 1987.
VILHENA, Luís dos Santos. Pensamentos políticos sobre a Colônia. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1987, p. 39.
Ibidem, p. 39.
Ibidem, p. 51, grifo meu.
Ibidem, p. 51.
Ibidem, p. 54.
MOTA, Maria Sarita. "Propriedade e Pensamento Político na América Portuguesa em fins do século XVIII". In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, 2011, p. 3.
Ibidem, p. 53.
MOTTA, Márcia Maria Menendes. Direito à terra no Brasil: a gestação do conflito, 1795-1824. São Paulo: Alameda, 2ª. ed, 2012, p. 49.
Ibidem, p. 57.
Ibidem, p. 58.
Ibidem, p. 59.
Ibidem, p. 73, grifo meu.
Ibidem, p. 74.
Cf. NEVES, Guilherme Pereira das. Rodrigo de Souza Coutinho. In: VAINFAS, Ronaldo (dir.). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro, Objetiva, 2000.
Cf. MAXWELL, Kenneth. "A geração de 1790 e a idéia de império luso-brasileiro". In: Chocolate, piratas e outros malandros. São Paulo, Paz e Terra, 1999.
VILHENA, op. cit., p. 74.
Ibidem, p. 77, grifo meu.
Ibidem, p. 77.
Ibidem, p. 78.
Cf. NEVES, Guilherme Pereira das. Sociabilidades modernas e poderes tradicionais no Rio de Janeiro de 1794. In: Actas do Congresso Internacional Espaço Atlântico de Antigo Regime: Poderes e Sociedades. Lisboa: Biblioteca Digital Camões, 2008. v. 1. p. 1-16.
Ver, principalmente, VENTURI, Franco. Utopia e reforma no Iluminismo. Bauru, EDUSC, 2003.
NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das; NEVES, Guilherme Pereira das. A Biblioteca de Francisco Agostinho Gomes: a Permanência da Ilustração Luso-Brasileira entre Portugal e o Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; Rio de Janeiro, v. 165, n.425, p. 11-28, 2004. Citação extraída da p. 14.
Ibidem, p. 14.
Ibidem, p. 14.
LUÍS DOS SANTOS VILHENA:
PENSAMENTO ILUSTRADO NA COLÔNIA
Gabriel de Abreu M. Gaspar

Luís dos Santos Vilhena nasceu em 1744, na vila de são Tiago do Cassino, no Alentejo e no ano de 1787 foi designado para o lugar de mestre régio de grego na Bahia. Permaneceu em Salvador até 1799, quando retornou à Portugal para tratar de sua saúde e solicitar o seu jubilamento, alcançado em 1801. Logo depois deve ter retornado à Bahia, onde faleceu em 1814. É autor de 24 cartas que descrevem e analisam a América Portuguesa no final do século XVIII. As primeiras 20 cartas foram escritas na colônia e são destinadas a Filopono, que se pode traduzir por "aquele que aprecia o esforço do trabalho", dedicadas ao príncipe regente D. João. As demais, foram completadas em Portugal e endereçadas a Patrífilo, o "amigo da pátria", Rodrigo de Sousa Coutinho, Secretário da Marinha e do Ultramar. É possível identificar um alinhamento entre as ideias do professor régio e as do ministro, ambos em um espaço das Luzes portuguesas, preocupadas, sobretudo, em corrigir as deficiências da administração, em promover a expansão da agricultura na colônia por meio de conhecimentos práticos e de métodos mais racionais.
Neste trabalho analisou-se a 24ª. Carta, publicada sob o título de "Pensamentos políticos sobre a Colônia" destacando seu caráter ilustrado sob os seguintes aspectos: suas considerações sobre a população, a proposta de uma lei de terras e as duras críticas ao comércio.
AS COLUNAS MAIS SÓLIDAS E BASES ESTÁVEIS DA COLÔNIA
População, agricultura e comércio são as colunas mais sólidas e a base mais estável das colônias que conservamos na América, compreendidas no Principado do Brasil. Carece refletirmos se tem havido a precisa atenção à solidez destas colunas, se se acham em estado de sustentar o grande peso que sobre elas gravita e o modo por que poderão sustentá-lo, no caso de terem saído do seu equilíbrio.
Segundo Vilhena, o essencial da economia brasileira podia ser descrito na frase supracitada, considerando que os pilares de sustentação da economia colônia eram população, agricultura e comércio, mas questiona se "tem havido a precisa atenção à solidez destas colunas". Entre as críticas e as propostas, o professor régio diagnostica que o Estado do Brasil está dividido em grandes capitanias gerais e capitanias subalternas, que, caso povoadas e cultivadas de acordo com a extensão e qualidade do terreno, nada teriam que invejar aos Estados da Europa. Contudo, este "país extensíssimo, fecundo por natureza e riquíssimo" é habitado por poucos colonos, em sua maior parte pobres e famintos:
É a capitania da Bahia a mais povoada, não é porém a mais extensa, pois que algumas há que a sucedem; por consequência, têm logo todas as capitanias uma população extremosamente pequena em comparação do âmbito, não só do todo do Estado, como de cada uma de por si.
Ao considerar que "sem homens não há sociedade, e sem meios de subsistência não pode haver homens", Vilhena afirma que a falta de população no Brasil é causada pela pobreza e considera a terra como "subsidiária dos viventes". Ele vai além e constata que "quem gera o cidadão é a propriedade". Assim, conforme salienta Maria Sarita Motta, esta concepção de propriedade na obra de Vilhena assume uma "dimensão social e política", pois ela emerge "como um principio organizador da sociedade liberal e burguesa em processo de construção de um e do outro lado do Atlântico".
Outrossim, estabelece-se aí a correlação entre propriedade da terra, atividade agrícola e população e diagnostica o problema das grandes propriedades, como "causa dos vícios de um e da miséria de inumeráveis" e obstáculos para a população. Os pobres não são os únicos culpados pela decadência da agricultura, a concentração fundiária também o era, já que a lei do morgadio impedia que os demais filhos do senhorio tivessem terras para produzir:
Quantos filhos segundos e terceiros estariam estabelecidos; seriam chefes de fecundas famílias se aquela reunião de propriedades vinculadas que privativamente passam à posse do primogênito fossem desanexadas e igualmente repartidas pelos irmãos a que o feio semblante da pobreza faz aborrecer o consórcio.
O morgado era uma instituição tipicamente ibérica e esteve em vigor até as reformas legislativas liberais do século XIX. A despeito das diversas regras de sucessão e nomeação dos morgados, a instituição dos morgadios
teria sido uma prática dos grupos dominantes agrários que poderia ter se estendido para outros grupos de lavradores. A instituição pressupunha a transmissão do patrimônio para o filho primogênito, para evitar a divisibilidade da terra.
Assim, ele conclui que a Lei de terras é uma necessidade, ao considerar a agricultura como chave mestra para a subsistência dos homens e expansão da população. Vilhena propõe uma lei agrária com limitação de tempo que redistribuísse as terras entre a população marginalizada, porém respeitando a classe senhorial. Diz ele que "(...) poderiam dividir-se as terras pelas famílias que se achassem em cada um dos distritos", considerando não só o número, mas a qualidade delas, além de suas comodidades e serventias. Estas terras deveriam permanecer indivisas e à medida do aumento dessas famílias, outros lotes de terras deveriam ser concedidos. As terras improdutivas deveriam ser confiscadas em um prazo de dois anos se não fossem cultivadas e as florestas de madeira de lei permaneceriam sob controle da coroa portuguesa. Além disso, ele identifica a necessidade de nomeação de um ministro intendente para zelar pela prática e cuidar para que fosse cultivado o gênero de acordo com as propriedades das terras, pois as incoerências de "querer que dê tabaco o terreno que tem propriedade para algodão e vice-versa" impede um melhor desenvolvimento agrícola, em suma, "há precisão de plantá-las de que elas melhor produzem". Se, para o autor, o cidadão é gerado pela propriedade e esta lei tornaria proprietários um grande número de brasileiros, um grande número de pessoas se converteria em cidadãos.
Não obstante, ele propõe outra lei para solucionar um problema colonial: a população ociosa, que terá "forças para fazer evacuar das cidades os preguiçosos vadios e povoar de agricultores as campanhas". Os vadios seriam convertidos em trabalhadores rurais, aproveitando-se os braços trabalhadores para o sucesso do projeto colonial.
O COMÉRCIO PORTUGUÊS EM FINS DO SETECENTOS
O comércio ocupou lugar importante na análise de Luís dos Santos Vilhena e foi considerado também um dos pilares sólidos para a conservação das colônias. O professor de grego afirma que a liberdade "é o espírito dominante do comércio, e que sem ela impossível é que este possa florescer", mas defende que cada um entende esta palavra segundo seu modo de pensar. Mas, para ele, ela consiste na liberdade na autoridade das leis, sabedorias e prudência de governo e felicidade dos povos, já que
é certo que em toda a parte deve a administração ser o sustentáculo da prosperidade dos povos, da opulência da nação; deve mostrar a sua influência na explanação das vidas por que os homens corram para a felicidade. [...] pelo que pertence ao comércio deve atender a que as províncias da sua dependência não sofram muito por causa da distância nem da proximidade, e que cada um tenha para a exportação e importação aquelas facilidades que forem relativas à sua posição.
Ele diagnostica que o comércio da América é útil e vantajoso, já que por meio dele são fornecidos gêneros indispensáveis à Europa. Ao mesmo tempo, "de todos os estabelecimentos de Portugal é o Brasil não só o mais rico como o mais suscetível de melhoramento" e o mais interessante ao comércio, desde que povoado e cultivado o quanto deve e pode ser. Cabe destacar a consonância desta perspectiva com a de Rodrigo de Sousa Coutinho, considerado, por Guilherme Pereira das Neves, "um dos mais notáveis representantes da Ilustração portuguesa". Secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos, entre 1796 e 1801, d. Rodrigo capitaneava um conjunto de letrados, denominados por Kenneth Maxwell de "geração de 1790", que buscavam reconhecer e mapear o império e percebiam a situação frágil em que se encontrava Portugal no fim do século XVIII.
Vilhena destaca a importância da prudência na escolha dos governadores para cada uma das capitanias e dos ministros e oficias para a administração da justiça e da fazenda. Cabia também à metrópole, fechar "as infinitas portas por onde se introduz o ruinosíssimo contrabando" e não permitir muitas fábricas nas colônias do Brasil, pois elas absorveriam as finanças das exportações e desequilibrariam o comércio de Portugal com o Brasil. Além disso, não dever-se-ia incumbir os comerciantes estrangeiros de transportar e nem vender diretamente à Colônia, para evitar que as riquezas do Estado fossem parar na mão desses "comissários ausentes".
A perspicácia de Luís dos Santos Vilhena se revela ao identificar o comércio "passivo e ruinoso" de Portugal:
Daquela época até o presente tem Portugal recebido do estrangeiro muito mais importações que expedido exportações, fazendo por isso um comércio pouco menos que passivo e por isso ruinoso, apesar do que é talvez Portugal a única nação a quem este gênero de comércio tem até o presente sido menos lesivo, pois que a moeda com que paga o excesso das suas importações é gênero de produção das suas minas do Brasil e não fruto da indústria, como nas outras nações, à exceção da Espanha.
Contudo, apesar de afirmar que este comércio desfavorável tem sido "menos lesivo" devido aos ingressos do ouro, ele defende que em breve haverá necessidade de propor medidas para quebrar os "canos por onde a indústria estrangeira conduz para fora a nossa moeda". Por fim, identifica que "é os estrangeiros nas mãos dos quais vai parar a riqueza toda das mesmas colônias".
VILHENA E SEU LUGAR NAS LUZES IBÉRICAS
Depois de apresentados seus "pensamentos políticos" e sem a pretensão de terem sido esgotadas todas as possibilidades, cabe refletir sobre o caráter ilustrado de tais pensamentos no contexto das singulares Luzes ibéricas. A Ilustração luso-brasileira possuiu um caráter peculiar, mas, segundo Guilherme Pereira das Neves devido à falta de uma análise precisa, continua a receber adjetivos variados, seja como católicas, tímidas, pálidas ou envergonhadas. Contudo, estudo recentes demonstram a complexidade da recepção dessas ideias ao perceber a oposição entre uma "pequena vanguarda iluminada" e um "setor obscurantista majoritário", já outros identificam um discurso de "constitucionalismo antigo", retomado com a Restauração de 1640, que coexistia com uma "linguagem absolutista" do marquês de Pombal. Esta perspectiva pode ser alargada com os estudos de Franco Venturi, que destacam a oposição vívida nas Luzes entre "monarquia", a tentativa de centralização, e uma "tradição republicana", o sentimento de defesa da res publica, ao superar a interpretação puramente filosófica da Ilustração e propor extraí-la da sociedade, onde se enraízam as ideias, e da relação entre utopia e reforma.
No mundo luso-brasileiro, "a recepção das Luzes (...) adquiriu uma tonalidade própria, de acordo com as características peculiares daquela sociedade". E, por isso, foi dotada de um caráter ambíguo: de um lado, "sombrio", que se colocava a serviço da Coroa portuguesa, demonstrava uma secularização muito limitada e valorizava a religião como importante forma de conhecimento, de outro lado, "esclarecido", que buscava conhecimentos úteis para propor medidas e "luminosas reformas". Em suma,
adotava-se uma atitude de mudança pontual e limitada quase sempre dirigida pelas conveniências da Coroa, mas que não implicava em uma transformação profunda na estrutura da sociedade.
É nesta ambiguidade em que reside os pensamentos políticos de Luís dos Santos Vilhena e de outros memorialistas e administradores coloniais em fins do Setecentos.
CONCLUSÃO
Em sua racionalização, Vilhena conseguiu identificar as bases da colonização portuguesa: população, agricultura e comércio e propor medidas e leis para a manutenção da solidez destas colunas, propôs uma lei de terras que solucionaria diversos problemas como a pobreza, a ociosidade de parte da população e contribuiria para o progresso da agricultura e aumento da população. Além disso, diagnostica, com sucesso, a importância e os problemas do comércio lusitano, ao evidenciar o maior número de importações do que o de exportações e o quão lesivo isso era. Neste sentido, identificou a necessidade de "quebrar os canos" que conduziam para o estrangeiro a riqueza colonial. Encaixando-se, assim, como um representante do ambíguo pensamento ilustrado luso-brasileiro.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MAXWELL, Kenneth. "A geração de 1790 e a idéia de império luso-brasileiro". In: Chocolate, piratas e outros malandros. Ensaios tropicais. [tradução de Irene Hirsch, Lólio Lourenço de Oliveira, et alia.] São Paulo: Paz e Terra, 1999.
MOTA, Maria Sarita. "Propriedade e Pensamento Político na América Portuguesa em fins do séculoXVIII". In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, 2011.
MOTTA, Márcia Maria Menendes. Direito à terra no Brasil: a gestação do conflito, 1795-1824. São Paulo: Alameda, 2ª. ed, 2012.
NEVES, Guilherme Pereira das. Luís dos Santos Vilhena. In: VAINFAS, Ronaldo (dir.). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.
___________. Rodrigo de Souza Coutinho. In: VAINFAS, Ronaldo (dir.). Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.
___________. Sociabilidades modernas e poderes tradicionais no Rio de Janeiro de 1794. In: Actas do Congresso Internacional Espaço Atlântico de Antigo Regime: Poderes e Sociedades, v. 1. Lisboa: Biblioteca Digital Camões, 2008, p. 1-16.
___________; NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. A Biblioteca de Francisco Agostinho Gomes: a Permanência da Ilustração Luso-Brasileira entre Portugal e o Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: v. 165, n.425, 2004, p. 11-28.
VENTURI, Franco. Utopia e reforma no Iluminismo. [tradução de Modesto Florenzano] Bauru: EDUSC, 2003.
VILHENA, Luís dos Santos. Pensamentos políticos sobre a Colônia. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, Série Publicações Históricas 87, 1987.


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